Maria Firmina dos Reis
Maria Firmina dos Reis | |
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Busto de Maria Firmina na Praça do Pantheon, em São Luís, Maranhão. | |
Nascimento | 11 de março de 1822[1] São Luís, MA |
Morte | 11 de novembro de 1917 (95 anos)[2] Guimarães, MA |
Nacionalidade | brasileira |
Ocupação | escritora e educadora |
Magnum opus | Úrsula (1859) |
Escola/tradição | romantismo |
Maria Firmina dos Reis (São Luís, Maranhão, 11 de março de 1822[1] – Guimarães, 11 de novembro de 1917) foi uma escritora brasileira. É considerada a primeira romancista negra do Brasil.[3][4] Ela publicou em 1859 o livro Úrsula, considerado o primeiro romance abolicionista do Brasil. O romance conta a história de um triângulo amoroso no qual os personagens são pessoas negras que contestam o sistema escravocrata.[5]
Biografia
Juventude e família
Maria Firmina dos Reis nasceu na Ilha de São Luís, no Maranhão, em 11 de março de 1822, sendo batizada somente a 21 de dezembro de 1825, em virtude de uma enfermidade que a acometeu nos primeiros anos de vida. Segundo o registro, Maria Firmina foi batizada na freguesia de Nossa Senhora da Vitória, em São Luís do Maranhão, sendo padrinhos o capitão de milícias João Nogueira de Souza, e Nossa Senhora dos Remédios, não sendo informada nem sua paternidade nem a data do nascimento. Em 25 de junho de 1847, visando a inscrição no concurso público da cadeira de primeiras letras da vila de São José de Guimarães, então apenas possível para a idade mínima de 25 anos, Maria Firmina solicitou nova certidão de justificação de batismo, na qual informou a data de nascimento como 11 de março de 1822, e o nome de sua mãe, Leonor Felipa, mulata forra, sendo o processo concluído em 13 de julho desse ano. Leonor Felipa havia sido escrava do comendador Caetano José Teixeira, falecido em 1819, grande comerciante e proprietário de terras na vila de São José de Guimarães, proprietário de uma companhia comercial com avultadas transações no fim do período colonial, e no início do Império.[1]
Tanto o registro de batismo como a certidão de 1847 são omissas em relação ao nome do pai de Maria Firmina, o qual apenas é declarado no seu registro de óbito, datado de 17 de novembro de 1917, com o nome de João Pedro Esteves. João Pedro Esteves, homem de posses, era sócio do antigo dono da mãe de Maria Firmina, a escrava Leonor Felipa, na sua companhia comercial.[1]
Segundo algumas fontes, seria prima do escritor maranhense Francisco Sotero dos Reis por parte da mãe, embora se desconheça com que fundamento e em que grau.[1]
Em 1830, mudou-se com a família para a vila de São José de Guimarães, no continente. Viveu parte de sua vida na casa de uma tia materna mais bem situada economicamente. Em 1847, concorreu à cadeira de Instrução Primária nessa localidade e, sendo aprovada, ali mesmo exerceu a profissão, como professora de primeiras letras, de 1847 a 1881.[6] Maria Firmina dos Reis nunca se casou.[7]
Carreira
Em 1859, publicou o romance Úrsula considerado o primeiro romance de uma autora do Brasil.[8] Em 1887, publicou na Revista Maranhense o conto "A Escrava", no qual se descreve uma participante ativa da causa abolicionista.[9]
Aos 54 anos de idade e 34 de magistério oficial, anos antes de se aposentar, Maria Firmina fundou, em Maçaricó, a poucos quilômetros de Guimarães, uma aula mista e gratuita para alunos que não podiam pagar: conduzia as aulas num barracão em propriedade de um senhor de engenho, à qual se dirigia toda manhã subindo num carro de boi.[10] Lá, lecionava às filhas deste, aos alunos que levava consigo e a outros que se juntavam.[10] A acadêmica Norma Telles classificou a iniciativa de Maria Firmina como "um experimento ousado para a época".[10] Essa ação inovadora vai ao encontro das lutas das feministas brasileiras do final do século XIX que desejam a igualdade de ensino para meninas.[7]
Maria Firmina dos Reis participou da vida intelectual maranhense: colaborou na imprensa local, publicou livros, participou de antologias, e, além disso, também foi musicista e compositora.[11] A autora era abolicionista:[9] ao ser admitida no magistério, aos 22 anos de idade, sua mãe queria que fosse de palanquim receber a nomeação, mas a autora optou por ir a pé, dizendo a sua mãe: "Negro não é animal para se andar montado nele."[12] Chegou também a escrever um "Hino da Abolição dos Escravos"[12]
Descreveu-se, em 1863, como tendo "uma compleição débil, e acanhada" e, por conta disso, "não poderia deixar de ser uma criatura frágil, tímida, e por consequência, melancólica."[11] Os que a conheceram, quando tinha cerca de 85 anos, descreveram-na como sendo pequena, parda, de rosto arredondado, olhos escuros, cabelos crespos e grisalhos presos na altura da nuca.[11] Uma antiga aluna caracterizou-a como uma professora enérgica, que falava baixo, não aplicava castigos corporais, nem ralhava, preferindo aconselhar.[11] Era reservada, mas acessível, sendo estimada pelos alunos e pela população da vila: toda passeata de moradores de Guimarães parava em sua porta, ao que davam vivas e ela agradecia com um discurso improvisado.[11]
Morte
Maria Firmina dos Reis morreu, cega e pobre, aos 95 anos, na casa de uma ex-escrava, Mariazinha, mãe de um dos seus filhos de criação.[12]
É a única mulher dentre os bustos da Praça do Pantheon, que homenageiam importantes escritores maranhenses, em São Luís.[13]
Homenagens
Maria Firmina dos Reis foi homenageada em um doodle do Google, em 11 de outubro de 2019, em comemoração ao seu 194º aniversário.[14]
Obra
Conceição Evaristo apresenta a “escrevivência” como a escrita de um corpo, de uma condição, de uma experiência negra no Brasil. O primeiro elemento que compõe a escrevivência, o corpo, reporta à dimensão subjetiva do existir negro, sendo um arquivo de impressões ao longo da vida, marcado na pele e na luta constante por afirmação e reversão de estereótipos.[15] A condição da mulher negra, o segundo elemento, evidencia diversos problemas herdados da situação colonial, visto que, por meio da escravidão, as mulheres foram subjugadas em diversos âmbitos.[16] A escrevivência de Maria Firmina dos Reis, uma escritora negra, também pode ser percebida na representação das suas personagens negras, pois a história da literatura influencia diretamente na nacionalidade e, por consequência, também na construção da imagem dos gêneros, meio utilizado para consolidação do poder masculino.[16]
Maria Firmina apresenta o negro em sua dimensão humana e confere a ele uma posição de sujeito de discurso, o que pode revelar uma íntima identificação com o negro escravizado, apresentando uma solidariedade que, nas palavras de Eduardo de Assis Duarte, “nasce de uma perspectiva outra, pela qual a escritora, irmanada aos cativos e a seus descendentes, expressa, pela via da ficção, seu pertencimento a este universo de cultura”.[7]
Lista de obras
Seleção obtida a partir do livro Escritoras brasileiras do século XIX: Antologia.[6]
- Úrsula. Romance, 1859.
- Gupeva. Romance, 1861/1862 (O jardim dos Maranhenses) e 1863 (Porto Livre e Eco da Juventude).
- Poemas em: Parnaso maranhense, 1861.
- A escrava. Conto, 1887 (A Revista Maranhense n° 3)
- Cantos à beira-mar. Poesias, 1871.
- Hino da libertação dos escravos. 1888.
- Poemas em: A Imprensa, Publicador Maranhense; A Verdadeira Marmota; Almanaque de Lembranças Brasileiras; Eco da Juventude; Semanário Maranhense; O Jardim dos Maranhenses; Porto Livre; O Domingo; O País; A Revista Maranhense; Diário do Maranhão; Pacotilha; Federalista.
- Composições musicais: Auto de bumba-meu-boi (letra e música); Valsa (letra de Gonçalves Dias e música de Maria Firmina dos Reis); Hino à Mocidade (letra e música); Hino à liberdade dos escravos (letra e música); Rosinha, valsa (letra e música); Pastor estrela do oriente (letra e música); Canto de recordação (“à Praia de Cumã”; letra e música).
Ver também
Referências
- ↑ a b c d e Cruz, Mariléia dos Santos; Matos, Érica de Lima de; Silva, Ediane Holanda (2018). «"Exma. Sra. d. Maria Firmina dos Reis, distinta literária maranhense": a notoriedade de uma professora afrodescendente no século XIX» (PDF). CEMOrOc-Feusp / Univ. Autònoma de Barcelona. Notandum. XXI (48)
- ↑ Souza Dorea 1995.
- ↑ Lobo, Luiza. «A literatura de autoria feminina na América Latina». Consultado em 17 de setembro de 2018. Cópia arquivada em 29 de setembro de 2009
- ↑ juliana.silva. «Personalidade Negra – Maria Firmina dos Reis». Fundação Cultural Palmares. Consultado em 11 de outubro de 2019
- ↑ «Muito além da princesa Isabel, 6 brasileiros que lutaram pelo fim da escravidão no Brasil». BBC News Brasil. Consultado em 13 de maio de 2022
- ↑ a b Muzart 1999, pp. 271-272.
- ↑ a b c «Na contramão: A narrativa abolicionista de Maria Firmina dos Reis - Crítica - Literatura Afro-Brasileira». www.letras.ufmg.br. Consultado em 1 de julho de 2019
- ↑ Priore & Pinsky, p. 410.
- ↑ a b Priore & Pinsky, p. 415.
- ↑ a b c Priore & Pinsky, pp. 411-412.
- ↑ a b c d e Priore & Pinsky, p. 412.
- ↑ a b c Priore & Pinsky, p. 416.
- ↑ «Notícia: Concluída primeira etapa das obras na Rua Grande, em São Luís (MA) - IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional». portal.iphan.gov.br. Consultado em 7 de janeiro de 2019
- ↑ «Conheça as obras essenciais de Maria Firmina dos Reis». O Globo. 11 de outubro de 2019. Consultado em 11 de outubro de 2019
- ↑ Oliveira, Luiz Henrique Silva de (maio–agosto de 2009). «"Escrevivência" em Becos da memória, de Conceição Evaristo». Revista Estudos Feministas. 17 (2): 621–623. ISSN 0104-026X. doi:10.1590/S0104-026X2009000200019
- ↑ a b Filho, Nelson Martinelli; Lopes, Michelly Cristina Alves (2018). «A escre(vivência) presente em Maria Firmina dos Reis e Conceição Evaristo: Uma análise dos contos "A escrava" e "Maria".». REVELL - REVISTA DE ESTUDOS LITERÁRIOS DA UEMS. 3 (20): 314–334. ISSN 2179-4456
Bibliografia
- Priore, Mary del; Pinsky, Carla Bassanezi, eds. (2012). História das mulheres no Brasil 10ª ed. São Paulo: Contexto. ISBN 978-85-7244-256-5
- Blake, Augusto Victorino Sacramento. Diccionario Bibliographico Brazileiro. 6. [S.l.: s.n.] p. 232
- Muzart, Zahidé Lupinacci, ed. (1999). Escritoras brasileiras do século XIX: Antologia. Florianópolis/Santa Cruz so Sul: Editora Mulheres/EDUNISC. ISBN 85-86501-09-3
- Mendes, Algemira Macêdo (2006). Maria Firmina dos Reis e Amélia Beviláqua na história da literatura brasileira: representação, imagens e memórias do século XIX e XX (Tese). Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
- Mendes, Algemira de Macedo (2011). «O discurso antiescravagista em Úrsula, de Maria Firmina dos Reis». Universidade de Brasília. Revista Cerrados. 20 (31): 75-92
- Andreta, Bárbara Loureiro; Alós, Anselmo Peres (2013). «A Voz e a Memória dos Escravos: Úrsula, de Maria Firmina dos Reis». São Leopoldo. Identidade!. 18 (2): 194-200. ISSN 2178-437X
- Souza Dorea, Alfredo (1995). «Maria Firmina dos Reis, negra memória do Maranhão». Salvador: Centro de Estudos e Ação Social. CEAS, 300 anos de Zumbi (edição especial). Cadernos do Ceas: 13-18. ISSN 2447-861X. (pede subscrição (ajuda))
Ligações externas
- Úrsula, disponível na Biblioteca Pública Benedito Leite.
- Úrsula, disponível em vários formatos digitais.
- Úrsula, edição de 2017, por Cadernos do Mundo Inteiro.
- Poemas de Maria Firmina dos Reis. Jornal de Poesia.