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  • Crítica | Velozes e Furiosos 9

    Crítica | Velozes e Furiosos 9

    Velozes e Furiosos 9 tem seu início em 1989, com o patriarca dos Toretto, Jack, correndo em um circuito da Nascar e sofrendo um trágico acidente sob o olhar atônito dos dois filhos. Esse preâmbulo serve para estabelecer que o Dominic Don Toretto de Vin Diesel tem uma ligação emocional com os carros, e ainda introduz Jakob, seu irmão, vivido quando adulto por John Cena, como o novo antagonista.

    Justin Lin retorna a direção e como é visto na introdução esse seria um filme mais dramático que os anteriores. Um dos fatores curiosos da série de filmes era sua capacidade de rir de si mesmo, além de introduzir piadas e memes do público em sua própria história. Fato é que a franquia tinha em seu elenco atores medíocres que repetiam clichês de família para tudo, boas cenas de ação e de carros em velocidade, e invariavelmente se vendia como um filme de assalto ou de conspirações com governos envolvendo carros. Não havia muita preocupação dramática. Muita ação, frases de efeito e diversão, contudo quando a jornada se leva a sério demais, mesmo os defensores mais ardorosos penam na tentativa de justificar toda essa movimentação.

    A fórmula claramente se desgastou, o que sobra é a sensação de que a corda esticou demais. Nem os absurdos e momentos impossíveis funcionam, some-se a isso os adiamentos causados por uma pandemia que matou milhões, e o impacto desse filme beira a zero, nem mesmo o choque de uma revelação familiar dos Toretto quebra essa sensação.

    O filme chegou a ser exibido em grandes festivais, como em Cannes, e teve lançamento de dois cortes, inclusive com uma versão do diretor (com míseros quatro minutos a mais e pouco muda o espírito da obra), fora isso, há conveniências difíceis de engolir, como o retorno de um terceiro irmão Toretto, nunca mencionado. O longa não se contenta em ser um projeto de prequel, como também faz retcons.

    Outra questão foram as brigas das estrelas e a bifurcação do elenco da saga Velozes e Furiosos, com Vin Diesel e Dwayne Johnson não trabalhando juntos dentro desta franquia. Se Hobbs & Shaw é legal, mesmo sem uma bilheteria vultuosa, esse não conseguiu quase nada, foi prejudicado em arrecadação por conta do novo coronavírus e não acerta no quesito escapismo. Parece de fato que algo foi perdido e o apelo a personagens antigos já não é mais o mesmo.

    O longa tem sacadas, ainda que esparsas e meio perdidas no roteiro, como a indagação de um dos personagens ao fato deles terem tantos feitos impossíveis sem nenhuma cicatriz ou perda significativa seja para atrapalhar suas vidas ou como lembranças, mas quando essa sentença é dita pelo ator mais canastrão do elenco, Tyrese Gibson, perde força. A realidade é que mais do que antes, não há nenhum temor pelo destino dos aventureiros.

    Ao terminar de ver Velozes e Furiosos 9 a impressão que fica é que a saga já se esgotou, e que uma trama tão pretensamente adulta que envolve rivalidade entre irmão e até insinuações de parricídio, não deveria se levar tão a sério ou deveria ser introduzido de outra forma. Não após quase duas décadas de duração e dez filmes contando spin offs. É pouco, e nem os retornos forçados do filme compensam suas fragilidades.

  • Crítica | Red 2: Aposentados e Ainda Mais Perigosos

    Crítica | Red 2: Aposentados e Ainda Mais Perigosos

    Red 2: Aposentados e Ainda Mais Perigosos também começa com os créditos iniciais referenciando a revista da DC Comics, com o traço característico, mostrando Frank Moses (Bruce Willis) lidando com seu par, Sarah (Mary Louise Parker) um mercado mega store, despreocupadamente, quando é interrompido por seu velho amigo Marvin (John Malkovich), para que retornasse a agencia de super espiões. Eis que o antigo amigo do protagonista sofre com a explosão do carro e o  chamado a aventura passa a ser algo impossível de ignorar. A forma como o roteiro de Jon Hoeber e Erich Hoeber lida com a recusa do protagonista é inteligente, ainda mais em se tratando de uma adaptação de quadrinhos.

    A ação que se segue após a sequencia inicial é frenética, e Willis se mostra muito bem fisicamente para esse tipo de historia, que não exige dele mais do que ser um sujeito forte mas que entende as limitações que a idade lhe impõe. 2013, o ano de lançamento desta continuação é o mesmo de Duro de Matar:  Um Bom Dia Para Morrer, e nesse capitulo cinco da saga de John McLane claramente não há o mesmo nível de comprometimento do interprete e nem de veracidade e fidelidade com o personagem, apesar de que a adaptação dos quadrinhos de Warren Ellis e Cully Hammer seja caricata e irreal também, mas dentro dessa proposta, funciona.

    O modo que Dean Parisot conduz o filme é baseado demais em um caráter super estiloso, que põe os personagens que são preparados ou não para o trabalho de super espiões para fazer proezas mil e para serem heróis de ação custe o que custar. Isso evidentemente tem um preço, a suspensão de descrença é completamente abdicada, mas em um produto que mira ser um pastiche das historias em quadrinhos isso não é exatamente um problema.

    Mesmo a exploração de clichês baixos, como a ressurreição de personagens e crises de ciúmes de outros é bem justificada, pelo fato do texto final não se levar a sério. Red 2 usa e abusa do escapismo e de algumas breguices, mas isso em nada denigre o resultado final, e apesar de esse não ser superior a Red: Aposentados e Perigosos, as cenas de ação são muito boas e o conteúdo é divertido e entretém sem dúvida nenhuma.

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  • Crítica | A Maldição da Casa Winchester

    Crítica | A Maldição da Casa Winchester

    Em San Jose, na Califórnia, está localizada uma casa considerada mal-assombrada e que com o passar dos anos se tornou atração turística em função dos mistérios que preenchem seus cômodos. A residência foi propriedade de Sarah Winchester, esposa do empresário da indústria de armamentos, William Wirt Winchester. E é baseado na história dessa curiosa construção, que o filme A Maldição da Casa Winchester, dos irmãos Michael e Peter Spierig, se concentra.

    É sempre difícil encontrar algo do gênero terror que mantenha a qualidade de sua construção do enredo, mas se o objetivo de quem procura por filmes assim é sentir alguns sustinhos na sala escura do cinema, a satisfação é garantida facilmente. Para criar o clima propício não é necessário inserir criaturas horripilantes, mas elaborar situações de tensão por meio dos clichês que nos assustam desde a infância.

    Esse filme consegue fazer isso a partir do momento em que o psiquiatra Eric Price (Jason Clarke) entra na residência para elaborar um relatório sobre o estado de saúde da viúva Winchester (Helen Mirren), a fim de declarar se ela está apta a continuar administrando a mais importante empresa fabricante de armas dos EUA. Eric é bem recebido por empregados da mansão, com muitos cômodos de madeira – o que já traz aquela sensação de desconfiança que só uma casa antiga consegue provocar, por meio de estalos muito bem explicados pelo estudo científico da dilatação térmica dos materiais, mas que a irracionalidade insiste em apontar para outras causas.

    Antes de chegar à casa, as cenas são cheias de fotografias de paisagens lindas, mostrando como era a vida entre o final do século XIX e início do século XX. Eric sai de sua vida entediante –embora regada ao uso de uma droga alucinógena e o convívio rotineiro com prostitutas para obter o prazer necessário que o faça esquecer de seu passado – para assumir a missão que lhe garantirá o pagamento atrasado de sua hipoteca.

    Todos os elementos clichês do gênero então se apresentam: uma senhora grisalha e misteriosa fala aquilo que ninguém acredita no princípio, mas que aos poucos se torna verossímil; uma criança passa a se comportar de maneira estranha, com olhos que mudam de cor e feição que varia entre o angelical e o diabólico; a mãe dessa criança é a mulher jovial que precisa ser salva por um homem corajoso; e o homem corajoso, que tem a coragem e inteligência para solucionar os mistérios.

    Trata-se de uma obra composta por tudo que já estamos cansados de ver, com um enredo cheio de falhas, mas com diversão garantida para quem ainda reage às armadilhas dos filmes ruins de terror.

    Texto de autoria de André Luiz Cavanha.

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  • Crítica | Beleza Oculta

    Crítica | Beleza Oculta

    Quando foi divulgado o primeiro trailer de Beleza Oculta (Collateral Beauty), de David Frankel, eu me interessei mais pela ideia de toda a história do que pelo grande elenco que o filme tem, já esperava um melodrama no formato usual de sempre, porém o que temos aqui é uma ideia mal aproveitada, um drama que quer ser comédia (e fracassa) e um elenco que parece ter aceito participar do filme porque tinha umas semanas livres.

    Howard (Will Smith) é um empresário de muito sucesso que acredita no amor, no tempo e na morte como “segredos” do sucesso, até que uma tragédia abala a vida dele, fazendo-o mandar uma carta para o Amor, uma para o Tempo e outra para a Morte. Então, passa a receber visitas de pessoas que dizem ser essas coisas.

    Primeiramente, saiba que os materiais de divulgação vendem algo bem diferente do que o filme é, não por distorção, mas por omitir muitas coisas que fazem parecer que Beleza Oculta irá para certa direção quando o filme tem uma completamente diferente, e isso de certa forma foi uma surpresa agradável de início, o problema é que o primeiro ato é tão bagunçado e desconexo que o sentimento que fica é o de descontentamento. Kate Winslet, Edward Norton e Michael Peña interpretam os amigos e colegas de trabalho da personagem de Smith e de certa forma protagonizam este primeiro ato. A química é inexistente, os diálogos entre os três carregam uma atmosfera humorística que não funciona em nenhum momento e que só consegue soar propícia a vergonha alheia, pra não dizer ridículo. As atuações são motoras e parecem desconfortáveis, menos a de Peña que parece desconfortável por estar fazendo algo do que não é habituado, não por ser motora. Neste ato também é quando descobrimos qual é o principal plot do filme e por conta de todos esses problemas já citados, só soa, mais uma vez, ridículo, acrescentando aqui um “forçado”.

    O segundo ato consegue ser mais estável e possui dois dos três méritos do filme, o primeiro fica por conta de Naomie Harris, atriz indicada ao Oscar deste ano pelo seu papel brilhante em Moonlight: Sob a Luz do Luar, ela mesmo com um roteiro claramente limitado e que parece prezar apenas por falas de efeito, entrega uma atuação muito bonita e equilibrada. Inclusive, a atuação de Smith só funciona nas cenas em que ele precisa estar cara a cara com a personagem de Naomie, pois o papel dele parece uma reciclagem do que ele já fez em À Procura da Felicidade, Sete Vidas e Esquadrão Suicida (sim!). Já o segundo mérito do filme é de bem peculiar, que é como o filme mesmo sendo falho ele consegue prender a atenção, principalmente pela perspectiva de querer saber como toda a trama vai se resolver, mas isso acaba sendo bem dualístico por acabar ressaltando mais os defeitos do longa do que as qualidades.

    Chegando perto de seu final, Beleza Oculta reafirma de vez que seu elenco não quis fazer parte do filme, Helen Mirren que faz a Morte parece pelo menos se divertir, enquanto Keira Knightley (Amor) e Jacob Latimore (Tempo) se salvam pelo mínimo de carisma que conseguem transpassar no pouco que tinham em mãos. Este terceiro ato  também liga algumas pontas nos relacionamentos de seis personagens, mas desde o seu começo já parecia bem previsível.

    Claramente um filme comercial para o Natal (lançou nas vésperas do Natal de 2016 nos EUA), Beleza Oculta é mais do mesmo, ideia mal aproveitada e elenco subaproveitado, algo que vemos em Hollywood todos os dias, já dizia toda a internet: nada novo sob o sol. Ah, não quero falar muito sobre o final, mas sabe quando o filme entrega a melhor cena de todas, ligando coisas que você realmente não percebeu, mas decide fazer mais e mais só para te fazer cair da cadeira? Então…

    Texto de autoria de Felipe Freitas.

  • Crítica | Decisão de Risco

    Crítica | Decisão de Risco

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    Dirigido por Gavin Hood, Decisão de Risco narra uma situação que inicialmente seria apenas a operação de captura de uma das cinco maiores terroristas, em Nairóbi, no Quênia, transformando-se em uma operação de eliminação de três perigosos terroristas em vias de cometer um atentado. Da Inglaterra, a coronel Katherine Powell (Helen Mirren) e o general Frank Benson (Alan Rickman) acompanham a movimentação através de drones estrategicamente posicionados.

    Mesmo não sendo o foco da narrativa, não é possível ignorar o questionamento sobre o uso dos drones como aparato militar. E o roteiro o faz de modo mais coerente e eficiente que a miscelânea mal estruturada do Robocop, dirigido por José Padilha. O grau de miniaturização dos artefatos impressiona e, mesmo duvidando que aqueles usados no filme sejam “de verdade”, uma pesquisa rápida esclarece que a mecânica de voo utilizada neles é perfeitamente factível.

    Apesar de, a princípio, parecer que a intenção da história é essa discussão sobre o uso dos drones, o roteiro vai bem além. Assistindo ao filme, o espectador se pergunta: até que ponto é aceitável bisbilhotar e invadir a intimidade de uma casa? Qual é o limite entre o respeito à privacidade e a prevenção de violência de qualquer tipo? E, polarizando ainda mais, quanto falta para que essa tecnologia deixe de ser aplicada apenas como recurso militar em defesa da segurança mundial e passe a fazer parte do cotidiano?

    Mas o ponto central da trama não é esse. É uma versão do clássico “dilema do bonde” ou “dilema do trem”. Apresentado a voluntários pelo filósofo e psicólogo evolutivo Joshua Greene, da Universidade Harvard, em linhas gerais, propõe o seguinte:

    Um trem está prestes a atingir cinco pessoas que trabalham desprevenidas sobre a linha. Você tem a chance de evitar a tragédia acionando uma alavanca que leva o trem para um desvio, onde ele atingirá apenas uma pessoa. Você mudaria o trajeto?

    A maioria das pessoas diz que é aceitável mudar o trajeto e matar uma pessoa em vez de cinco. Há, nessa reação uma mescla entre o impulso biológico de preservação da espécie e a consciência moral de favorecer um “bem maior”. Mas a ética de escolher o mal menor tem alguns problemas. É possível mensurar o valor de uma vida para conseguir tomar essa decisão? Quem garante que essa outra pessoa que se escolheu matar não seria responsável por atos infinitamente mais benéficos à humanidade que as outras cinco, que foram salvas? E, não só isso, multiplique-se a quantidade de pessoas por milhares ou milhões e chegamos a uma situação similar à maioria dos regimes totalitaristas. O extermínio dos “diferentes” para benefício da maioria. Visto dessa forma, a decisão ainda é válida?

    Sobre a questão de mensurar o valor da vida, há uma cena bastante instigante, em que o general Benson está aguardando a decisão dos membros do alto escalão sobre a ação contra os terroristas, e uma executiva do governo norte-americano entra em contato. Ela explica que eles – exército e/ou governo americano – fazem uso de uma escala de pontuação (algo como a escala Richter de terremotos) para avaliar estatisticamente a situação e evitar que dilemas éticos e morais “atrapalhem” a tomada de decisão. E que, na presente operação, essa pontuação indica que a decisão correta é exterminar os terroristas o mais rápido possível.

    Inevitavelmente, a opinião do espectador oscila à medida que acompanha o evoluir da situação, já que não há uma verdade absoluta que dê conta de resolver esse dilema ético. Afinal, como é dito logo no início do filme, “Na guerra, a primeira coisa que perece é a verdade”. Em cada um dos locais em que a ação se desenrola, exibe-se uma das facetas da questão. Se, em dado momento, o espectador está convicto de sua opinião, no momento seguinte algo pode fazê-lo mudar de ideia com a mesma convicção anterior.

    E a montagem do filme colabora para esse alternar entre as diversas facetas da questão. Cada um dos cenários tem seus próprios pequenos dilemas. Em Nairóbi, Jama Farah (Barkhad Abdi) se arrisca para conseguir se aproximar do local onde os terroristas estão reunidos. Na cabine de operações, Steve Watts (Aaron Paul) e Carrie Gershon (Phoebe Fox), de certa forma representando o espectador, questionam as decisões tomadas e as ordens recebidas. No QG, a coronel Powell se esforça para chegar a termo da missão, driblando meandros legais. No gabinete do Ministério da Defesa estão o ministro Brian Woodale (Jeremy Northam), o procurador-geral George Matherson (Richard McCab), a conselheira parlamentar Angela Northman (Monica Dolan) deliberando sobre a decisão a ser tomada e pesando as implicações éticas, legais e políticas, sempre mediados pelo general Benson. Sem se demorar demais em cada um dos quatro locais, a montagem consegue dar ao filme o ritmo correto, nem lento nem corrido demais, fazendo as mudanças de locação agirem de forma a manter a tensão da narrativa.

    A direção de fotografia também está muito bem feita. Sem exagerar nos close-ups, consegue deixar o cubículo em que estão os operadores ainda mais claustrofóbico. Usa alguns enquadramentos das filmagens aéreas para intensificar a tensão e o suspense da trama. E, sendo um filme de guerra, sem ser um filme de ação, a câmera mantém-se sóbria, sem muitas movimentações, muitas vezes sendo apenas mera espectadora dos eventos.

    Além de os personagens serem suficientemente bem construídos a ponto de fazer o espectador se importar com eles, o elenco garante boas atuações. Helen Mirren e Alan Rickman (em seu último papel no cinema) em ótimas performances, dão a seus personagens a dose correta de seriedade e de urgência nas cenas. Aaron Paul, assim como o Jesse Pinkman em Breaking Bad, dá à trama a carga emocional necessária. E vale destacar Barkhad Abdi, que dá a seu personagem a justa dimensão da dificuldade de ação de um agente disfarçado num local como aquele.

    Um filme de guerra sem oficiais berrando ordens no campo de batalha, nem saraivadas de tiros, nem soldados olhando fotos da família. Um roteiro que facilmente poderia pender para a pieguice, mas que consegue não apenas se sustentar como um ótimo suspense mas também instigar o público a (tentar) escolher um lado.

    Texto de autoria de Cristine Tellier.

  • Crítica | A Dama Dourada

    Crítica | A Dama Dourada

    A Dama Dourada - poster

    A Dama Dourada (Woman in Gold, EUA, 2015, Dir: Simon Curtis) é daqueles filmes com uma história tão impressionante que só faria sentido se ela fosse baseada em fatos reais, como é o caso. Quase 50 anos depois, Maria Altman, uma judia austríaca radicada nos EUA, tenta reaver do principal museu da Áustriao quadro A Dama Dourada do pintor Gustav Klimt, roubado pelos nazistas com a conivência do governo austríaco.

    O roteiro do desconhecido Alexie Kaye Campbell conseguiu compilar a batalha jurídica de Maria Altman e Randy Shoenberg em uma narrativa de fácil entendimento. Ele acerta ao mostrar de forma didática todas as etapas de um processo complexo e inédito além das implicações, gerando a premissa do filme: a justiça na reparação histórica como o seu principal questionamento, a quem pertence uma obra de arte? A quem o pagou ou ao público?

    Campbell também opta por contar em paralelo a história da fuga de Maria da Áustria para os EUA, além do roubo do quadro do Klimt pelos nazistas. Há um diálogo entre as situações e o roteiro acerta ao reforçar a grande discussão.

    O roteiro, no entanto, falha ao escolher a via melodramática ao criar vilões e situações que não necessitavam de tanta carga emocional, dessa forma o filme perde muita força. Outro problema narrativo é não dar informações suficientes sobre a situação financeira de Randy, como se manteve depois de pedir demissão.

    A direção de Simon Curtis já era conhecida pelo bom filme Sete Dias com Marilyn, e aqui ele mantém uma narrativa visual satisfatória. No entanto, o tom melodramático na escolha de um roteiro que escolheu ir por um caminho fácil diversas vezes, além da direção de atores, pode incomodar.

    O elenco é um dos grandes trunfos da obra. Helen Mirren compõe bem Maria Altman, e as participações especiais do ótimo Daniel Brühl e Katie Holmes, e ainda as pontas de Charles Dance e Jonathan Pryce só enriquecem o filme, isso sem esquecer Tatiana Maslany e Max Irons, que dão vida à jovem Maria e seu marido. A maior surpresa, no entanto, vem de uma atuação satisfatória de Ryan Reynolds, que conseguiu imprimir sentimentos críveis ao advogado Randy Shoenberg.

    A fotografia de Ross Emery alterna entre o presente do final dos anos 90 em Los Angeles e Viena onde é naturalista, e o passado dos anos 40 em Viena, em que escolhe tons de cinza e bege, além de uma saturação, para marcar a diferenciação entre as épocas. A edição de Peter Lambert segue o roteiro ao mostrar em paralelo os eventos passados sempre dialogando com o presente. Em especial a sequência da fuga de Maria e seu marido dos nazistas e as cenas nos tribunais são a grande contribuição da edição ao filme.

    A produção vale a pena para tentar entender a reparação histórica e as suas consequências em diversos níveis.

    Texto de autoria de Pablo Grilo.

  • Crítica | A 100 Passos de Um Sonho

    Crítica | A 100 Passos de Um Sonho

    A culinária como metáfora ao cinema. E não só ao Cinema, mas a qualquer arte: Passou do ponto e o caldo engrossa pra nunca mais voltar atrás. É puro tempero, pura experimentação a partir de um paladar refinado, mesmo a favor de quem não sabe distinguir o bom do ruim, um queijo assim, um queijo assado; um quadro sagrado de um quadro estragado. Não há remendos ou curativos, isso é arte médica. Seja na panela ou numa câmera, a metalinguagem entre duas ou mais formas de expressão se faz valer na formação de um manifesto emocional ou cultural, na compatibilidade entre visões de mundo que se chocam e viram uma só. Lindo, tudo na teoria é lindo, mas em A 100 Passos de Um Sonho a culinária é mero subtexto e coerência extravisual de duas culturas (indiana e britânica), usando uma combinação de ingredientes como contraponto realmente fraco a pré-conceitos sociais, ou seja: uma mera desculpa para fazer o filme parecer comida fina, quando é só arroz e feijão requentado.

    A história do filme. Uma história de superação. Após perder a matriarca num incêndio doméstico, uma família liderada pelo pai e pelos sonhos deste e do filho mais velho se mudam de continente, em busca do sucesso e acolhimento europeu, além das espetaculares cores do oeste regional que se refletem na matéria-prima do que a família sabe fazer: cozinhar. Acabam atraindo a atenção da Madame Mallory (Helen Mirren), que como numa fábula de Pavel Bazhov não tenta lhes passar para trás e garantir a soberania de seu restaurante tradicional (como diz o slogan do pôster), mas quase os acolhe, com amor e admiração conquistados pouco a pouco pela própria família Kadam, numa excessiva duração do filme. Nada mais convencional, essa versão de Ratatouille no mundo real. Só não vale perguntar quem seriam os ratos se a visão do filme não fosse fabulesca…

    O Cinema como metáfora à culinária. Como captar com a íris de uma câmera o frescor (e o vigor, o brio) do ambiente e mixar, com a força visual de um bólido errante na tela, a infinita abundância de cores dos sítios franceses e âmbitos urbanos de Paris, ao que é mostrado no prato, em todo seu colorido que vem destes lugares? A fotografia do filme, resumindo, é espetacular. Uma cena, em especial, quando um dos casais nessa história dividida entre realização pessoal e sucesso comercial, caminham juntos pelos prados cintilantes durante a aurora crepuscular, é absolutamente exemplar a beleza que surge em nossos olhos, e debulha em prol de qualquer conceito sensorial a favor da imagem, degustada pelos nossos olhos. Quanto aos ouvidos, a trilha-sonora cumpre seu papel primordial e nada destacável a quem não se impressiona fácil, aqui, regida pelo famoso A. R. Rahman, o maestro da boa trilha de Quem Quem Ser Um Milionário?, que sabe a hora certa para pincelar no prato seus timbres extra-diegéticos, em certos momentos-chave do filme. Ainda assim, o choque musical entre ocidente e oriente em As Aventuras de Pi e Viagem a Darjeeling, principalmente o segundo, é apenas ‘‘mais completo”, para não usar de superlativos.

    Mas aonde está a alma do filme?, é a pergunta. A 100 Passos de Um Sonho é motivacional como deseja ser, ou só um filme para assistir antes de dormir e ter bons sonhos? Os matizes da culinária apresentada, e sem uma introdução adequada ao espectador que gostaria de conhecer mais do que rola nos comes e bebes da Índia, fazem relevo ou oposição ao brilho dessa história de esperança e sonho em família? A resposta é não, eles não fazem, e o filme nem chega perto de fazer, pura e simplesmente por não tentar não se ater ao lugar comum dos ‘‘filmes-estômago”. Um subgênero que já nasceu saturado esse, das iguarias e petiscos, que encontra na sua essência a razão para se colocar no Cinema, pois assistir a um filme é afinal saborear uma iguaria com os cinco sentidos, mas entendê-lo é comer de olhos vendados.

  • Crítica | Red: Aposentados e Perigosos

    Crítica | Red: Aposentados e Perigosos

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    A 1ª adaptação para o cinema dos quadrinhos de Warren Ellis, em seus primeiros minutos, se mostra diferentíssima do texto original, a começar pela abordagem, bastante relacionada a comédia romântica – ainda que não tarde a chegar as cenas de ação, com a linda derrubada de uma casa por conta de um tiroteio desvairado.

    Após começar a caça em si, Frank Moses/Bruce Willis no automático, tem de resgatar sua princesa encantada, Sarah (a ainda deliciosa Mary Louise Parker), o que contradiz o perfil do seu personagem, o solitário e auto-suficiente ex-agente da CIA com grandes contatos. Robert Schwentke tenta angariar dois nichos distintos para sua obra, os fanboys e o público feminino, e ao menos nesse quesito, a fórmula é bem executada e equilibrada.

    As cenas de perseguição no píer são tão galhofadas que parecem retiradas de um cartoon do Pernalonga – nenhum filme do Looney Tunes Live Action levou tão a sério o conceito quanto neste Red. A comédia e o humor rasgado predominam em quase toda a trama, o que não empobrece as outras sequências de luta, muito bem filmadas e coreografadas, aliadas a uma fotografia competente. As cores vivas escolhidas pelo realizador remetem ao tom escapista das HQs de super-humanos da DC.

    O roteiro dos irmãos Join e Erich Hoeber (Terror na Antártida) trata da inadequação do bando de agentes aposentados a vida civil (tema retirado da graphic novel, mas ampliado a mais personagens), e da vontade de Frank em finalmente ter uma vida normal, com paixões, uma família, anseios comuns, inerentes a qualquer ser humano comum. A vida amorosa dos super-espiões é mostrado como algo confuso e cheio de contradições, mas é claro, sem jamais se levar a sério.

    A direção de atores exercida por Robert Schwentke é muito boa, pois não atrapalha. Os artistas estão livres para trabalhar: Morgan Freeman, John Malkovich, Bryan Cox, Helen Mirren estão soltos, enquanto Karl Urban faz o antagonista honrado de uma maneira muito lúcida, seu personagem William Cooper é a síntese do quanto o serviço secreto mudou, no que tange aprimoramento físico, se modernizando para suplantar a geração anterior, mas seu código moral é muito semelhante ao de seus antecessores, e ele não se permite mudar de lado, mesmo que seus superiores o tentem impingir a isso.

    Red mantém o tom jocoso o tempo inteiro, e apesar da pouca semelhança com a história em quadrinhos, é um bom exercício de humor. Tem em seu caráter algo parecido com o que foi visto no primeiro Mercenários de Sylvester Stallone, reunindo um elenco veterano para brincar com os clichês dos filmes de ação.

  • Crítica | A Lenda dos Guardiões

    Crítica | A Lenda dos Guardiões

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    Após Watchmen, Zack Snyder se refugiou em uma animação, baseada no romance de Kathryn Lasky, A Lenda dos Guardiões é a chance do realizador em fazer penas de corujinhas caírem no seu ritmo conhecido, regado a muito slow motion.

    Desde 300, Snyder demonstra um enorme esmero com o visual e fotografia em seus filmes, e este não é diferente. O contraste entre as inúmeras espécies e subespécies de aves, suas cores, seu visual de asas abertas é algo estonteantemente belo.

    Apesar da maioria da filmografia do diretor ser de qualidade discutível, seus filmes ainda eram um bom entretenimento, conseguiam prender a atenção do individuo desatento, que pouco se importa com coesão ou de baixa expectativa em relação a consumir uma história bem construída. Era um entretenimento minimamente divertido, totalmente diferente desse Legend of the Guardians. O roteiro não é mal feito, mas a animação não distrai, não faz rir e não emociona. O alívio cômico só aparece depois de decorrido mais de um terço da trama, e ainda assim é não é nada demais. A trajetória dos aventureiros até encontrar os seus heróis é muito curta, falta perigos reais em sua jornada, os personagens são insossos e nada carismáticos, não há como se importar com o destino deles. As virtudes e auxílios se aproximam muito facilmente do grupo de alados.

    Ao menos, é passada uma mensagem muito boa, através do mentor do protagonista. Soren, a coruja dublada por Jim Sturges (do também “excelente” Cloud Atlas), ouve do seu herói idealizado, que um guerreiro não recebe louros após as batalhas, o que perdura e marca suas vidas são as cicatrizes, contudo, o importante é ter o foco em fazer o que é correto.

    As batalhas em câmera lenta entre corujas vestindo armaduras e armas brancas contra morcegos devem ser interessantes em algum lugar mas não aqui, torna-se ainda mais difícil se importar com o destino dos passarinhos, principalmente por causa do protagonista Loren – uma ave que só faz chorar, que é insegura e extremamente chata. A tentativa em tornar o herói em um ser mais humano esbarra no fato básico dele ser um animal. Falha miseravelmente no quesito, e torna todo esse drama deveras maçante.

    Os efeitos especiais não deixam a desejar, e infelizmente mal dá para analisar o estrelado – Geoffrey Rush, Helen Mirren, Hugo Weaving, Sam Neill – que estão no automático e quase não são acionados. A Lenda dos Guardiões é fraco e tem dificuldade em descobrir qual é o seu público.

    Ouça nosso podcast sobre Zack Snyder.

  • Crítica | Hitchcock

    Crítica | Hitchcock

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    Desde a fundação da sétima arte, alguns profissionais – sejam produtores, diretores ou atores – desenvolvem uma carreira tão ímpar, muitas vezes com talento destacado, que transformam-se também em personagens para futuras histórias, de criador para criatura.

    Retratar uma personalidade em um filme biográfico, apresentando sua vida em totalidade, sempre é uma missão ingrata. Algumas produções vêm optando por apresentar parte da história, em um momento significativo que apresenta o cerne do biografado de forma que seja possível compreendê-lo – Sete Dias Com Marilyn e Capote utilizaram-se deste estilo.

    Hitchcock abrange o período de criação de Psicose, uma das obras mais significativas do mestre do suspense. Prestigiado desde a época, o diretor sofria leve pressão da crítica e do público, que aguardavam ansiosos por um novo e excelente projeto, questionando se a idade não teria amenizado Hitchcock. Em meio as incertezas, Hitch investe em um romance recém-lançado de Robert Bloch, uma narrativa inspirada no serial killer Ed Gein – homicida, ladrão de lápides que utilizava cadáveres como troféus – que nenhum outro estúdio se atreveu a utilizar.

    A trama inicia-se em uma representação da história de Gein, emulando o programa de televisão “Hitchcock apresenta”, em que o diretor era mestre de cerimônia. Dialogando com o público, Hitch justifica que, se não houvesse a horrenda história do assassino, sua obra-prima não viria à tona.

    Filmar uma história real, violenta ao extremo, em época moralista e com censura cinematográfica era um processo difícil. O diretor teve que investir dinheiro do próprio bolso para a realização, já que a Paramount Pictures, com que tinha um contrato, aceitou somente distribuir a produção.

    Dono de um perfil genial e genioso, dedicado aos prazeres da comida, romântico ao se apaixonar por cada uma de suas estrelas loiras, boa parte da sustentação de Hitchcock vinha de sua esposa, Alma Reville, roteirista e editora que teve um papel fundamental na conclusão de Psicose mas que, durante a produção, sente-se negligenciada pelo marido.

    A problemática profissional e pessoal parece eclodir em Psicose, dando corpo à loucura da personagem e ao genialismo de Hitchcock, ciente de que a censura negaria a distribuição do filme e trabalhando de maneira minuciosa para produzir cenas que sugerissem as ideias mais agressivas, sem de fato mostrá-las, como a famosa cena do chuveiro, que se tornaria um marco cinematográfico.

    O desenvolvimento desta biografia consegue apresentar os bastidores de uma grande obra sem cair no fetichismo da curiosidade de revelar a história por trás da história. Sustenta-se principalmente pela composição das personagens, com Anthony Hopkins incorporando o diretor com pesada maquiagem, desafiando a imagem de um homem genial o tempo todo, também carente de atenção e estranhamente encantado por suas atrizes. E Helen Mirren sempre em atuações pontuais como a esposa porto seguro que compreende as limitações do marido sem nunca deixar de amá-lo.

    Foi um dos filmes mais grandiosos da carreira de Hitchcock e sua composição tornou-se exemplo para outros filmes que viriam. Nesse longa biográfico com direta homenagem a ele, com maquiagem indicada ao Oscar, a trama mistura-se à história do cinema para apontar como uma lenda se transforma em lenda.

    O roteiro foi baseado no livro Alfred Hitchcock e Os Bastidores de Psicose de Stephen Rebello, lançado no país pela Intrínseca, com tradução de Rogério Durst (Clique aqui para comprar). A história do diretor também gerou uma produção da HBO Films com a BBC, intitulada The Girl.