Habeas Corpus
Habeas Corpus
em favor de Paciente: Laila Layana, com 19 anos na data dos fatos, brasileira, casada,
RG nº..., inscrita no CPF sob o nº..., empresária, sócia-administradora do supermercado
“Compre mais”, na região de Samambaia-DF, endereço..., por conta da coação ilegal
perpetrada pelo Juízo da Primeira Vara Criminal, ora denominado autoridade Coatora,
nos autos do Processo nº..., sem justa causa, pelos fatos e razões de direito que passa a
expor:
I – DOS FATOS
Eméritos Julgadores,
01. Colhe-se dos autos do processo supra aludido, que a Paciente fora
denunciada pelo Ministério Público Estatal, razão pela qual, teve em seu
estabelecimento a visita de um fiscal da Secretaria de Estado de Fazenda, que
analisando os livros de registros de entradas e saídas das mercadorias da Empresa
“Compre mais”, constatou haver omissão em alguns registros, fato que ensejou a
lavratura de um auto de infração por sonegação de ICMS.
02. Consta ainda que, no prazo legal, a Paciente ofereceu impugnação ao
auto de infração, que foi julgada improcedente, havendo confirmação da lavratura.
Além do mais, tempestivamente, a Paciente ofereceu recurso administrativo para ver
reformada a decisão que implicou na autuação.
03. Por sua vez, o Ministério Público, por entender que a autuação tinha
sido lavrada nos conformes da Lei, ofereceu denúncia em face da Paciente em 19 de
janeiro de 2021, tipificando o fato como crime tributário constante no art. 1º, I, da Lei
8.137/90, tendo sido o crime efetivamente cometido quando da constatação da omissão
em 20 de janeiro de 2015.
04. Em seguida, a denúncia foi recebida em 23 de janeiro de 2021 pelo
Juízo da Primeira Vara Criminal, ora denominado autoridade Coatora. Diante do feito, o
juiz determinou a citação da Paciente para responder ao processo nos termos esposados
na exordial acusatória.
05. Desta feita, inexiste justa causa para o prosseguimento da ação penal,
razão pela qual é impetrada a presente ação de habeas corpus, com o propósito de fazer
cessar a coação ilegal a que a Paciente está sendo submetida, conforme passa a expor:
I I– DO DIREITO
II.1 – DA COAÇÃO ILEGAL POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA
Inicialmente, faz-se mister mencionar que, a Constituição Federal/88 prevê
em seu art. 5º, inciso LXVIII:
“Que conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se
achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de
locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.”
Bem como o exposto no art. 647, do CPP, que estatui:
Art. 647 - Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar
na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir
e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.
Na doutrina brasileira pode ser sintetizada da seguinte maneira:
“O Habeas Corpus é o remédio constitucionalmente adequado sempre
que houver coação, ilegalidade e abuso de poder, independentemente da
ocorrência de um constrangimento físico direito ou da prisão (SOUZA,
2008).”
De antemão, temos que a denúncia como ofertada não é proficiente para a
iniciação de persecução penal em face da Paciente. Cabe ressaltar que, após ser
denunciada pelo Ministério Público, por um auto de infração por sonegação de ICMS, a
Paciente teve violado e coagido, o seu direito de recurso legal pela via administrativa.
Consoante o previsto no Art. 648, I, do CPP, que diz: A coação considerar-se-á ilegal: I
– quando não houver justa causa.
Ocorre, Excelências, que em conformidade com o que consta da exordial
acusatória, antes mesmo do oferecimento da denúncia feita pelo Ministério Público,
quando do auto de autuação feito pelo Parquet, a Paciente, no prazo legal, ofereceu
Impugnação ao auto de infração, que foi julgada improcedente pelo o Douto Órgão,
havendo a confirmação da sua lavratura. Diante de tal procedimento, tempestivamente,
a Paciente ofereceu Recurso Administrativo para ver reformada a decisão que implicou
na autuação, que de sorte, obteve a negativa do pedido, sendo este, indeferido.
Vale dizer, que é unânime na doutrina, em decorrência da própria Teoria
Geral do Delito, que o crime de sonegação fiscal é um crime material, e somente se
consuma com seu resultado, que é o dano ao Erário causado pelo inadimplemento da
obrigação tributária validamente constituída e exigível, somente após o procedimento
administrativo e definitivamente concluído e efetuado o lançamento tributário.
Para melhor ilustrar, vejamos o entendimento do Tribunal de Justiça do
Estado do Espírito Santo TJ-ES.
Habeas Corpus: HC 0001043-95.2008.8.08.0000
Ementa
HABEAS CORPUS - CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA-
SONEGAÇÃO FISCAL - CRÉDITO TRIBUTÁRIO EM DISCUSSÃO NA
SEARA ADMINSTRATIVA - CONSTRANGIMENTO ILEGAL
CARACTERIZADO - TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL - ORDEM
CONCEDIDA. É unânime na doutrina, decorrência da própria Teoria
Geral do Delito, que o crime de sonegação fiscal é um crime material,
somente se consuma com seu resultado, que é o dano ao erário causado
pelo inadimplemento da obrigação tributária validamente constituída e
exigível. Conforme explicitado, ao crédito tributário que ainda se
encontra em fase de discussão administrativa, falta o requisito da
exigibilidade. Sendo assim, mesmo havendo indícios da ocorrência do
delito, não se pode falar que houve o resultado do crime.
(TJ-ES - HC: 00010439520088080000, Relator: ADALTO DIAS
TRISTÃO, Data de Julgamento: 16/07/2008, SEGUNDA CÂMARA
CRIMINAL, Data de Publicação: 04/08/2008).
Como visto, a Paciente procurou discutir administrativamente o ato de
omissão que ensejou a lavratura do auto de infração por sonegação de ICMS. E,
conforme expresso de forma clara e precisa, o crédito tributário que ainda se encontra
em fase de discussão administrativa, não pode ser fruto de denúncia, porque falta o
requisito da exigibilidade para configurar o resultado do crime tributário.
Dessa maneira, não é cabível o início da ação penal em relação ao crime de
sonegação fiscal, enquanto o procedimento administrativo não for definitivamente
concluído, e for feito a efetuação do lançamento tributário. Requisito necessário para a
exigibilidade da consumação do crime.
É cabal aqui, a citação do seguinte julgado do Tribunal de Justiça de Sergipe
TJ-SE, senão vejamos:
HABEAS CORPUS: HC 2007304342 SE
Ementa
E M E N T A HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM
TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL. EXAURIMENTO DO
PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO CONDIÇÃO DE
PROCEDIBILIDADE. PARCELAMENTO DO DÉBITO. EXTINÇÃO DE
PUNIBILIDADE. - Não se admite o início da ação penal em relação a
crime de sonegação enquanto o procedimento administrativo não for
definitivamente concluído, e efetuado o lançamento tributário. - O
parcelamento do débito tributário, efetivado antes do recebimento da
denúncia, enseja a extinção de punibilidade prevista no art. 34 da Lei
9249/95. - Habeas corpus concedido para trancar a ação penal. - Ordem
concedida. Decisão unânime.
(TJ-SE - HC: 2007304342 SE, Relator: DES. GILSON GOIS SOARES,
Data de Julgamento: 04/06/2007, CÂMARA CRIMINAL)
Diante do exposto, fica evidente que não é cabível a denúncia feita pelo
Ministério Público em face da Paciente, com o entendimento de que a autuação tinha
sido lavrada nos conformes da Lei, que em 19 de janeiro de 2021, tipificou o fato como
Crime Tributário constante no art. 1º, I, da Lei 8.137/90, tendo sido o crime
efetivamente cometido quando da constatação da omissão em 20 de janeiro de 2015.
Além do que, a denúncia foi ofertada prematuramente, visto a não conclusão do
procedimento pela via administrativa, para demonstrar de forma definitiva a apuração
do crédito tributário para então denunciá-lo.
Contudo, a denúncia foi recebida pela autoridade Coatora em 23 de janeiro
de 2021, que poderia ter rejeitado a mesma, mas, diante do feito, o juiz determinou a
citação da Paciente para responder ao processo nos termos esposados na exordial
acusatória. Acontece que, a coação é ilegal, visto que falta justa causa para a ação penal
pela prática do crime tipificado no art. 1º, I, da Lei 8.137/1990 - que é material ou de
resultado, enquanto não haja decisão definitiva do processo administrativo de
lançamento, quer se considere o lançamento definitivo uma condição objetiva de
punibilidade ou um elemento normativo de tipo, necessário para o prosseguimento da
ação penal, podendo neste caso, o processo criminal ser trancado.
Haja vista, o que dispõe a Súmula Vinculante nº 24, do Supremo Tribunal
Federal:
“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no
art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/1990, antes do lançamento definitivo
do tributo”.
Nesse sentido, vejamos o posicionamento jurisprudencial da nossa Corte
Suprema:
Supremo Tribunal Federal
Ementa
Habeas corpus. Crime contra a ordem tributária (art. 1° da Lei n°
8.137 /90). Delito de natureza material. Impossibilidade de realização
de atos persecutórios antes da formação definitiva do crédito tributário.
Entendimento consolidado na Súmula Vinculante n° 24. Ordem
concedida. 1. Os delitos previstos no art. 1° da Lei 8.137 /90 são de
natureza material, exigindo-se, para a sua tipificação, a constituição
definitiva do crédito tributário para o desencadeamento da ação penal.
2. Carece de justa causa qualquer ato investigatório ou persecutório
judicial antes do pronunciamento definitivo da administração fazendária
no tocante ao débito fiscal de responsabilidade do contribuinte. 3. No
caso em exame, é incontroverso que não houve a constituição definitiva
do crédito, uma vez que o próprio Tribunal Administrativo de Tributos
Estaduais do Estado de Rondônia/RO reconheceu a inexistência do
ilícito tributário apontado pelo fisco. 4. Constrangimento ilegal
reconhecido. 5. Ordem concedida.
(STF - HABEAS CORPUS HC 108159 RO).
Diante do feito, o processo caminha para instrução processual e julgamento
do mérito, situação que não merece ser admitida, pois é manifestamente ilegal a
continuidade do processo diante da ausência de justa causa mínima contida na peça
exordial.
Nesta linha de entendimento, segue o julgado do Tribunal de Justiça de
Alagoas TJ-AL, que passa a expor:
Habeas Corpus: HC 0800239-18.2015.8.02.0000 AL
0800239-18.2015.8.02.0000
Ementa
HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM
TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL. ART. 1º, I, LEI Nº 8.137/90.
NECESSIDADE DE EXAURIMENTO DA FASE ADMINISTRATIVA
COM O DEVIDO LANÇAMENTO DO TRIBUTO DEVIDO NA DÍVIDA
ATIVA PARA A PERSECUÇÃO PENAL. INOCORRÊNCIA DE JUSTA
CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO. ORDEM
CONCEDIDA. UNÂNIME.
(TJ-AL - HC: 08002391820158020000 AL 0800239-
18.2015.8.02.0000, Relator: Des. José Carlos Malta Marques, Data de
Julgamento: 03/06/2015, Câmara Criminal, Data de Publicação:
08/06/2015).
Destarte, vale dizer que, a Paciente é pessoa idônea, tem domicilio e
residência fixa, com ocupação lícita, comprovantes anexos, é primária e certamente que
não voltará à mesma prática, depois que tomou conhecimento da seriedade e
consequência desse ato. Depois de apurado o feito administrativamente, firma o
compromisso de arcar com sua responsabilidade e custa.
Logo, a presente impetração em sede de Habeas Corpus, à primeira vista,
denuncia patente ilegalidade por parte da autoridade Coatora em determinar a
continuidade do processo diante da clarividente ausência de justa causa da denúncia,
para instauração de persecução criminal, assim, a Paciente pleiteia o sequente
trancamento de processo criminal.
Nas palavras de Alexandre de Moraes:
O Habeas Corpus: “É meio idôneo para garantir todos os direitos do
acusado e do sentenciado relacionados com sua liberdade de locomoção,
ainda que pudesse na simples condição de direito-meio ser afetado
apenas de modo reflexo, indireto ou oblíquo” (Moraes, Alexandre,
Direito Constitucional, Ed. Atlas, 7ª Ed., p.131).