Luís Roberto Barroso, ministro e presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou nesta segunda-feira (10) haver implicância nas críticas aos gastos com viagens dos membros da corte.
Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, ele afirmou não haver exigência legal nem regimental para transparência de agenda dos magistrados, de modo que cada um pode escolher se torna públicas suas atividades, e que não há nada de irregular nessas decisões individuais.
Barroso disse ainda não achar prioritária a discussão de um código de ética para os ministros, como fez a Suprema Corte dos Estados Unidos. "Não acho que seja uma assombração, mas, se há uma percepção negativa da sociedade, então é possível que haja discussão interna."
O presidente da corte saiu em defesa dos gastos com a segurança dos magistrados, alegando haver uma incompreensão em relação ao tema. Disse que autoridades como os presidentes da República, da Câmara dos Deputados e do Senado utilizam agentes de segurança para locais privados e que não é possível regular a vida particular deles.
"Se um ministro for agredido fisicamente, tomar um tiro durante um jogo de futebol ou em uma sessão do Supremo, a fratura institucional é igual", declarou.
Barroso disse que surgiu um tipo de agressividade que não existia na sociedade brasileira, reiterando o que afirmava a nota divulgada pela corte na última quinta-feira (6), após a revelação de que um segurança do ministro Dias Toffoli recebeu R$ 39 mil em diárias internacionais por uma viagem ao Reino Unido que incluiu ida à final da Champions League, no último dia 1º.
A nota dizia que, até recentemente, os membros da corte circulavam sozinhos, algo que deixou de ser possível devido à hostilidade e à agressividade contra os ministros, fomentada nos últimos anos. O texto não fazia referência à pressão por transparência nos gastos com diárias e passagens.
Na entrevista nesta segunda, Barroso afirmou ainda que há um preconceito com empresários.
Ele alegou que os magistrados da corte conversam com vários setores da sociedade, citando comunidades indígenas, jornalistas e sindicalistas, mas apenas em conversas com empresários são vistas como negativas.
Disse ainda que todos os interesses da sociedade brasileira chegam ao Supremo e que reuniões com esses segmentos não resultam em decisões carentes de objetividade ou independência.
"Já fui a eventos fora, não de empresas específicas, mas de organizações que reúnem empresários, e considero uma ótima oportunidade de conversar com essas pessoas, ouvir essas pessoas, como eu converso regularmente com jornalistas, com comunidades indígenas."
"É um equívoco achar que as pessoas chegam a essa altura da vida disponíveis a qualquer tipo de sedução como uma passagem para ir à Europa ou um hotel de qualidade. A maior parte das pessoas que está lá tem toda condição de ir sem ser convidado", concluiu o magistrado.
Além do gasto com a ida à final da Champions League, a Folha mostrou que o Supremo já tinha desembolsado R$ 99,6 mil para um segurança acompanhar Toffoli em eventos realizados em Londres e Madri.
A corte chegou a tirar do ar, há cerca de três semanas, todo o portal de transparência com informações à sociedade sobre gastos com passagens, diárias, funcionários, contratos e prestação de contas.
O Supremo também pagou quase R$ 200 mil em diárias para quatro policiais federais acompanharem membros da corte em viagem de fim de ano aos Estados Unidos. No período, apenas o ministro Edson Fachin divulgou compromissos públicos, todos no Brasil.
No Roda Viva, o presidente do STF afirmou que há uma "ênfase no negativo sem nenhuma percepção das coisas boas que a gente faz".
Ele também minimizou decisão da corte, tomada em 2023, que permitiu que ministros atuem em causas envolvendo clientes de escritórios de seus parentes. "Desde que o Supremo decidiu nessa linha, contra o meu voto, eu não soube de nada que tivesse acontecido [de errado]."
Questionado sobre o projeto de lei que proíbe delações premiadas de presos, o presidente do STF afirmou que a decisão é do Congresso, mas disse considerar legítima a colaboração de uma pessoa detida, desde que a reclusão seja legal.
"O fato de o réu estar preso não é, em si, um problema", afirmou.
O presidente do STF declarou ainda que o instrumento tem sido utilizado positivamente após limitações realizadas pela corte, tais como a necessidade de outras provas de corroboração. Para ele, a colaboração premiada contribui para a investigação e para a persecução penal.
"Se ele está preso, legitimamente, e deseja abreviar seu tempo de permanência fazendo uma delação, baseada em fatos verdadeiros e corroborada por outras provas, acho que é perfeitamente legítimo."
Barroso disse ainda que deve pautar a regulação de redes sociais no STF caso o Congresso não se debruce sobre o tema.
O tema, inicialmente previsto no chamado PL das Fake News, travou na Câmara após o presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP-AL), anunciar a criação de um grupo de trabalho para formular um novo projeto de lei.
"Essa regulação tem que vir em toda a parte do mundo. Se não vier do Congresso, como desejavelmente deve vir, o Supremo vai decidir, e eu vou pautar isso daqui a pouco", afirmou o presidente da corte.
Barroso também disse acreditar que o inquérito das milícias digitais, prorrogado por mais 180 dias pelo ministro Alexandre de Moraes, é reflexo de um risco real, de uma "ascensão vertiginosa de uma extrema-direita que está disposta a qualquer papel".
Para ele, o inquérito não está sendo excessivamente prolongado, os fatos é que não cessam. Segundo declarou, a investigação é necessária para evitar a repetição de episódios como os ataques golpistas de 8 de janeiro.
"O Supremo não pode deixar passar, porque o próximo [candidato à Presidência da República] que perder vai achar que seus apoiadores podem invadir Congresso, o palácio presidencial e o Supremo", disse. "Se a gente não reagir, isso vai virar um padrão nacional."
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