Controle de Convencionalidade - Novo Paradigma para a Magistratura Brasileira
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Sobre este e-book
Tal tarefa não envolveu a leitura de um texto de difícil compreensão, como à primeira vista me parecia, pois mesmo mantendo o rigor científico inerente às pesquisas acadêmicas, e não obstante a complexidade do tema, a autora trata de forma clara, didática e objetiva a questão relativa à necessidade de em determinados casos o juiz exercer não somente o tradicional controle difuso de constitucionalidade de atos normativos, mas também um controle difuso de convencionalidade, "in casu", consistente no exame de compatibilidade das leis nacionais com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e a respectiva jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
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Controle de Convencionalidade - Novo Paradigma para a Magistratura Brasileira - Sylvia Marlene de Castro Figueiredo
1 O PLURALISMO DE FONTES: O DIREITO INTERNACIONAL E O DIREITO INTERNO
1.1 O direito internacional contemporâneo: fatores para o aumento da complexidade e a internacionalização dos direitos
Marcelo Figueiredo aponta que o fenômeno da internacionalização dos direitos é uma realidade
.³
De acordo com o mesmo autor, o direito internacional dos direitos humanos está presente no âmbito regional e internacional, e ingressa nos Estados através das Constituições ou dos tratados internacionais, acarretando, por consequência, a produção de um novo direito constitucional, cujas características são o fato de ser mais globalizado e de possuir standards comuns a todos os Estados em matéria de direitos humanos.
Vale registrar que a abertura do direito interno ao direito internacional é fixada no texto constitucional, como se extrai das Constituições de Portugal de 1976 (art. 16.2⁴), da Espanha de 1978 (art. 10.2⁵), do Brasil de 1988 (art. 5º, §§ 2º e 3º⁶) e da África do Sul de 1996 (art. 39.1.c⁷).
Marcelo Dias Varella afirma que o direito contemporâneo passa por um processo de transição e segue na mesma direção do processo de globalização ou mundialização, em que há um aumento da complexidade dos direitos nacionais dos Estados e do direito internacional, com a alteração da lógica normativa do direito internacional clássico, e aponta as principais características desse processo de internacionalização do direito:
(i) integração frequente entre os direitos nacionais, o direito de sistemas regionais de integração e o direito internacional;
(ii) multiplicação de fontes normativas, além do Estado-nação;
(iii) multiplicação de instâncias de solução de conflitos fora do Estado;
(iv) inexistência de hierarquia formal entre as normas jurídicas ou entre as instâncias de solução de conflitos;
(v) acúmulo de lógicas distintas no direito nacional e internacional, cuja interação é impossível com os métodos tradicionais de solução de conflitos ou de jurisdição.⁸
Com efeito, o cenário internacional é marcado por vários processos de integração regional e multilateral de diversas naturezas, que envolvem simultaneamente inúmeros Estados.
Tem-se o fenômeno do deslocamento de fronteiras, com os processos de integração global, exemplificados com a Organização Mundial do Comércio (OMC) ou a Organização das Nações Unidas (ONU), e integração regional, tal como ocorre na União Europeia, que constitui um exemplo avançado de integração regional, e o Mercado Comum do Sul (Mercosul), a Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) e o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA), existindo também sistemas não institucionalizados de integração, como os tratados sobre a proteção dos direitos humanos, do meio ambiente e sobre as mudanças climáticas, dentre outros.
Vale destacar que o processo de integração mundial varia conforme o tema, como no caso das regras de direito humanitário, comandado pelo Conselho de Segurança das Organizações das Nações Unidas, que promove a construção de um direito penal obrigatório.
Além da existência de ordens jurídicas reguladas pelos Estados, no direito internacional contemporâneo há a construção de ordens jurídicas paralelas ao Estado, que estão relacionadas com diversos atores privados, tais como os da iniciativa da sociedade civil organizada, como as normas ISO 9000 e 1400.
Portanto, nesse processo de integração mundial há a descentralização das fontes, com a criação de redes paralelas ou que interagem, tanto no nível nacional, como nos níveis regional e internacional.
Além disso, os valores globais fazem com que o Estado deixe de ser o único comandante do processo de produção normativa internacional e os conceitos de ordem, de espaço e de tempo normativo escapam-lhes das mãos.
Assim, o conceito de soberania do Estado é forçado a se modificar, já que os Estados soberanos deixam de ser a fonte exclusiva da produção do direito.
Carlos Ayala Corao⁹ assinala que a soberania nacional passa a ser limitada, denominando-a como soberania dos direitos, em que o Estado é limitado pela dupla fonte constitucional e internacional, cujos objetivos e propósitos estão adstritos à proteção universal da pessoa humana.
Nesse passo, destaque-se que o surgimento da necessidade de solução de controvérsias por mecanismos interestatais constitui um fator decisivo para o aumento da complexidade e para a internacionalização dos direitos.
Anote-se que, após o advento da Segunda Guerra Mundial, criaram-se várias cortes, como, por exemplo, Tribunal de Justiça da União Europeia, Corte Europeia de Direitos Humanos, Corte Interamericana de Direitos Humanos, Tribunal sobre o Direito do Mar, Tribunal Militar de Nuremberg, Tribunal Internacional Militar, Tribunal para as Reclamações do Irã e dos Estados Unidos, Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, Tribunal Penal Internacional para Ruanda.
Cumpre frisar, outrossim, a criação de órgãos de solução de conflitos que nasceram no âmbito do Acordo Geral das Tarifas e Comércio e da Organização Mundial do Comércio, com instrumentos similares no Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA).
Registre-se que, em função da importância de algumas organizações para o direito, a economia e a política mundial, seus tribunais administrativos adquiriram uma primazia, como os da Organização das Nações Unidas, da Organização Internacional do Trabalho e do Banco Mundial.
Por fim, cabe citar o Comitê dos Direitos do Homem das Nações Unidas, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, a Comissão Europeia dos Direitos do Homem, e a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos.
Em sendo assim, nesse cenário caracterizado pela internacionalização do direito constitucional, para os fins deste estudo, cabe questionar se os operadores do direito devem atuar com observância a essa rede de normas ou se devem apenas estar focados em seus ordenamentos jurídicos internos.
Ora, pensamos que o pluralismo de fontes jurídicas está a exigir do operador do direito a alteração dos paradigmas inicialmente traçados por Hans Kelsen, devendo se abrir para essa rede de normas, principalmente no que concerne à observância aos tratados internacionais de direitos humanos e, por consequência, os julgados da Corte Interamericana de Direitos Humanos, no caso específico dos magistrados brasileiros.
Com efeito, no direito tradicional, os conflitos entre normas são resolvidos pelas regras de hierarquia, especificidade e temporalidade, com base na estrutura da pirâmide de normas de Hans Kelsen.
No cenário atual, contudo, faz-se necessário compreender o direito contemporâneo em novos sistemas de inter-relação, em rede de normas, não se aplicando exclusivamente a forma piramidal de normas identificada por Hans Kelsen.
Portanto, o fenômeno de deslocamento de fronteiras dos Estados, a multiplicidade de fontes do direito e a existência de valores comuns e globais em vários ordenamentos jurídicos nacionais, voltados para a promoção da tutela da pessoa humana, estão a exigir do operador do direito a compreensão da interdisciplinaridade do direito constitucional e internacional, que o submete a essa rede de normas, com a finalidade inclusive de preservar o princípio da dignidade da pessoa humana.
Destaque-se que o pluralismo de ordens jurídicas, em que as normas internacionais e nacionais se reúnem no âmbito do Estado nacional, gera inúmeros fenômenos, que serão objeto deste estudo, que refletem tanto harmonia como dissonância.
Assim, fixados os motivos que ensejaram o aumento da internacionalização dos direitos, que constitui mola propulsora do fenômeno da pluralidade de ordens jurídicas, urge examinar, no próximo tópico, a fontes do direito constitucional e, em seguida, se o direito internacional constitui uma fonte do direito constitucional, estudando-se o pluralismo constitucional e o modo pelo qual essa abertura constitucionalista ao direito internacional e aos raciocínios jurídicos desenvolvidos em outros países poderá contribuir para que o magistrado, pelo diálogo entre cortes e o controle de convencionalidade, chegue à solução de uma controvérsia.
1.2 As fontes do direito constitucional
¹⁰
Como vimos no tópico anterior, o direito constitucional contemporâneo não se circunscreve apenas às normas jurídicas produzidas internamente.
Neste passo, importa indagar se o pluralismo constitucional está ou não a exigir do intérprete constitucional a realização diálogo entre cortes, principalmente através do controle de convencionalidade, para a solução das controvérsias sob sua análise, como forma de preservação do princípio da dignidade da pessoa humana.
De acordo com Marcelo Figueiredo: Hoje, diferentemente do século passado, as normas produzidas na esfera regional ou internacional são tão ou mais importantes (não nos referimos ao tema hierárquico ou formal, mas pragmático) ao direito nacional e condicionam no mundo o conhecimento, a vigência e a interpretação do direito nacional.
¹¹
Atualmente, portanto, fala-se em interdisciplinaridade entre o direito constitucional e o direito internacional, havendo uma complexidade disciplinar que resulta, por consequência, no direito constitucional internacional, cujo fim reside em resguardar o valor da primazia da pessoa humana.
Há a dialética da relação entre Constituição e direito internacional dos direitos humanos, em que cada um dos termos da relação interfere e interage.
Portanto, cremos que a interdisciplinaridade existente entre o direito constitucional e o direito internacional, principalmente o direito internacional de direitos humanos, almeja reforçar os direitos constitucionalmente assegurados, com o fortalecimento de mecanismos nacionais de proteção da pessoa humana.
Passemos ao exame das fontes do direito constitucional, tendo-se em mente que o direito constitucional contemporâneo não se limita às normas jurídicas produzidas internamente.
José Horácio Meirelles Teixeira apresenta os três principais enfoques da expressão fontes do direito
: (i) causa eficiente, origem do direito; (ii) órgãos do Estado, de que emanam as normas jurídicas; (iii) modos ou formas de revelação das normas jurídicas, como podemos conferir:
a) na primeira acepção, designa-se por fonte do Direito
a causa eficiente da sua existência, a que lhe explica a própria origem e o fundamento. Neste sentido, para uns, o Direito resultaria, pura e simplesmente, da vontade do Estado, cuja expressão típica é a lei; para outros, dos fatos sociais, como resultante da própria vida social; [...] até atingir, afinal, a fase de elaboração racional e reflexiva, representada pela lei; para outros, o Direito resultaria de um contrato tácito entre os membros da coletividade, e, portanto, do consenso e da vontade humana; para outros, ainda, de um Direito Natural, isto é, de certas relações necessárias, derivadas da própria natureza das coisas [...]; finalmente, para outros, o Direito encontra sua explicação e fundamento na própria natureza social do homem, das suas necessidades como indivíduo e como membro do grupo social, e das necessidades desse mesmo grupo, as quais se concretizam todas no Bem Comum. [...]
b) Na segunda acepção, por fonte do Direito
significaríamos os órgãos do Estado, de que dimanam as normas jurídicas, e teríamos, [...], como fontes do Direito Constitucional as Assembleias Constituintes, o Poder Legislativo, o Poder Executivo [...] e [...] também o Poder Judiciário, através dos juízes e dos tribunais.
c) Finalmente, podemos ainda designar por fontes do Direito os modos ou formas de elaboração ou revelação da norma jurídica – e é justamente neste sentido que nos interessa aqui indagar quais sejam as fontes do direito constitucional. Trata-se, aqui, segundo terminologia de alguns autores, de fontes "juris congnoscendi", ao passo que na primeira e na segunda acepção de fontes "juris essendi".¹²
Neste trabalho, utilizaremos o enfoque dado por Meirelles Teixeira, que vislumbra a fonte do direito como modo ou forma de elaboração ou revelação da norma jurídica.
Segundo Meirelles Teixeira, as fontes do direito constitucional se dividem em fontes imediatas, ou primárias, diretas, positivas, e fontes mediatas, ou subsidiárias, indiretas.
De acordo com o autor, a fontes imediatas são aquelas que revelam diretamente o Direito, tais como a Constituição, leis, decretos, regulamentos, ao passo que as fontes mediatas são as que revelam indiretamente, ou seja, através, ou pela força ou autoridade de uma fonte imediata, como os costumes, a jurisprudência, a doutrina, os princípios gerais do direito, as convicções sociais vigentes, a ideia de justiça e manifestações diversas da consciência jurídica nacional.
Ao discorrer a respeito da Constituição como a fonte máxima do direito constitucional, Meirelles Teixeira destaca que:
É a Constituição [...] o instrumento das decisões políticas fundamentais da Nação, e nela se exprimem as normas jurídicas relativas à estrutura do Estado, à competência de seus órgãos, aos seus fins essenciais, aos limites de sua atuação e aos direitos e deveres dos cidadãos. [...] Só a Constituição não conhece norma jurídica que lhe seja superior, e daí dizer-se que a Constituição é uma forma de produção originária, de produção do Direito, pois que nela se estabelecem as normas fundamentais de um sistema jurídico, é nela que se encontra o seu nascimento, sem apoio em nenhuma norma positiva prévia.¹³
Nessa seara, a Constituição representava a fonte máxima do direito constitucional e todas as outras normas retiravam dela seu fundamento de validade.
Hoje, no entanto, cremos que a multiplicidade das fontes normativas e a existência de valores globais comuns, ambos voltados para a promoção dos direitos humanos, acarretam a unificação dos direitos constitucional e internacional.
Ao examinar a jurisprudência como fonte mediata do direito constitucional, Meirelles Teixeira aponta que alguns a consideram fonte apenas em sentido relativo, impróprio, e outros lhe negam tal qualidade, não obstante o autor ressalte que, mesmo em países de Constituição rígida como o nosso, a jurisprudência desempenha um relevante papel no processo de unificação dos conteúdos constitucionais, de generalização, desdobramento e concretização desses conteúdos.
Por sua vez, Paulo Bonavides¹⁴ assinala que no direito constitucional podemos distinguir duas modalidades de fontes: as escritas e as não escritas.
O mesmo autor revela que as fontes escritas englobam: a) as leis constitucionais; b) as leis complementares ou regulamentares, nas quais estão inseridas as leis ordinárias, que fazem com que inúmeros preceitos constitucionais tenham aplicação; c) as prescrições administrativas, contidas em regulamentos e decretos; d) os regimentos das Casas do Poder Legislativo, ou do órgão máximo do Poder Judiciário; e) os tratados internacionais, as normas de direito canônico, a legislação estrangeira, as resoluções da comunidade internacional pelos seus órgãos representativos, sempre que o Estado os aprovar ou reconhecer.
De acordo com Paulo Bonavides, a jurisprudência e a doutrina também são fontes do direito constitucional, como destaca:
[...]
f) a jurisprudência, não obstante o caráter secundário que as normas aí revestem, visto que, em rigor, a função jurisprudencial não cria Direito, senão que se limita a revelá-lo, ou seja, a declarar o Direito vigente (sua importância constitucional é, todavia, extraordinária, atestada pelo exemplo dos Estados Unidos, onde as sentenças da Suprema Corte, conforme assinala Sanchez Agesta, integram quase metade da Constituição); g) e, finalmente, a doutrina, a palavra dos tratadistas, a lição dos grandes Mestres, que desde Savigny se reputa uma das fontes do Direito, com o caráter auxiliar de fonte instrumental ou de conhecimento, e não propriamente de fonte técnica.¹⁵
Segundo Paulo Bonavides, duas são as fontes não escritas do direito constitucional: o costume e os usos constitucionais.
O costume se constitui quando a prática repetida de certos atos induz uma determinada coletividade à crença ou convicção de que esses atos são necessários ou indispensáveis
¹⁶. Sua constituição independe da intervenção dos órgãos de um grupo social e se funda no consentimento tácito que o uso reiterado autoriza.
O costume é importante para o direito constitucional, pois ele completa e modifica a Constituição.
A segunda categoria das fontes não escritas, composta pelos usos constitucionais, encontra maior relevância nos países desprovidos de Constituição escrita, como na Inglaterra − chamados de conventions of the Constitution, como a convocação do Parlamento e a dissolução dos Comuns − e nos Estados Unidos, cujos usos constitucionais tratam das convenções partidárias e do funcionamento do Poder Executivo, sendo, portanto, matérias constitucionais de grande importância.
Marcelo Figueiredo assinala que é imprescindível ter em mente que a Constituição é a fonte primeira e primária do direito constitucional (positivo), destacando que:
A Constituição define, ela própria, o sistema de fontes formais do direito. É ela a fonte das fontes. Inaugurando um novo sistema, original, portanto, configura e estrutura toda uma ordem jurídica
com rigidez e superioridade.
[...]
Assim, o tema das fontes imbrica-se no nosso modelo, com a) a rigidez constitucional; b) a distinção entre o poder constituinte originário e derivado, que fundamenta a distinção já comentada; c) e a própria estrutura do documento constitucional, suas opções políticas, ideológicas, em uma palavra seu fundamento essencial.¹⁷
O autor refere que a jurisdição constitucional não pode ser classificada rigorosamente como fonte de produção do direito constitucional, embora exerça relevante papel na interpretação e concreção, ou efetividade, do direito constitucional contemporâneo.
Atualmente, o Estado Democrático de Direito está centrado no princípio da constitucionalidade e, em face da insuficiência da lei, ou dos abusos praticados pelo Parlamento, é que os direitos humanos e suas garantias e os direitos fundamentais, especialmente os direitos sociais, foram reconhecidos e fortalecidos diante do alvedrio do administrador público.¹⁸
Marco Geraldo Monroy Cabra divide as fontes do direito constitucional em materiais e formais. As fontes materiais são a realidade constitucional: fatores econômicos, sociais, políticos, religiosos e históricos. As fontes formais são representadas pela Constituição e pelas leis. O direito internacional passa a ser considerado como fonte de direito constitucional, ainda que com distinto valor e com diversas modalidades, segundo o previsto no ordenamento jurídico respectivo, cujos modos de recepção dos tratados internacionais serão examinados em tópico próprio. Ss fontes não formais são constituídas pelo costume constitucional, princípios e valores constitucionais. A doutrina constitucional se trata de uma fonte auxiliar, ao passo que a jurisprudência constitucional é considerada fonte principal por grande parte da doutrina.¹⁹
Roberto Dias e Michael Freitas Mohallem apontam haver um processo de convergência entre as famílias jurídicas dos sistemas de civil law e common law, na medida que os sistemas de civil law passam por transformações, tornando o precedente de decisões judiciais fonte do direito.
De acordo com esses autores, a Emenda Constitucional n. 45/2004 introduziu o princípio do stare decisis, através do instrumento da repercussão geral e das súmulas vinculantes, o que, aliado à interpretação concretista do mandado de injunção, e principalmente à via concentrada do controle de constitucionalidade, são amostras da importância do sistema de precedentes na resolução de litígios.²⁰
Mireille Delmas-Marty diz que, na atualidade, pedimos marcos, e não demasiadas fontes
.²¹
No Ocidente, o Estado e a lei, na tradição romano-germânica, são os pontos de referência históricos, onde o direito identificou-se com o Estado, separando-se da moral e da religião.
A lei é a fonte estatal por excelência e se tornou a principal fonte no final do século XVII, ao estabelecer a ordem jurídica de que temos conhecimento.
Mireille Delmas-Marty, ao tratar da lei como fonte máxima do direito, diz se tratar de mapa em relevo em que a pirâmide das normas domina a paisagem, dando visibilidade e estabilidade à ordem jurídica instituída
.²²
No entanto, a mesma autora revela que os componentes dessa paisagem se espalharam devido à "retirada de marcos, de surgimento de fontes novas que acabariam relegando o Estado e a lei à categoria de acessório e de deslocamento das linhas que modificam o plano de composição, de modo que as pirâmides [...] fiquem como que cercadas de anéis estranhos que se escarnecem do velho princípio da