BIBLIOTECA VIRTUAL DE CINCIAS HUMANAS

JUDASMO E MODERNIDADE
METAMORFOSES DA TRADIO MESSINICA Bernardo Sorj Monica Grin
Organizadores

Bernardo Sorj Monica Grin

Organizadores

Esta publicao parte da Biblioteca Virtual de Cincias Humanas do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais www.bvce.org

Copyright 2008, Bernardo Sorj; Monica Grin Copyright 2008 desta edio on-line: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais Ano da ltima edio: 1993

Judasmo e Modernidade:
Metamorfoses da Tradio Messinica

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ISBN 978-85-99662-59-5

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Rio de Janeiro 2008

Sumrio
Introduo O judasmo moderno em perspectiva histrica: Do judasmo rabnico ao judasmo ps-moderno ................................1 I. Fontes Tor Shemot (xodo) .....................................................................14 Tor Dvarim (Deuteronmio) ........................................................18 Profeta Isaas .....................................................................................24 Profeta Jeremias ................................................................................31 Profeta Ezequiel ................................................................................37 O Talmud Sanhedrin (Sindrio) .....................................................46 II. Judasmo moderno Moses Mendelssohn (1729-1786) .....................................................66 O Sindrio Francs ............................................................................81 A Conferncia da Reforma Rabnica de Frankfurt ............................95 A Plataforma de Pittsburgh .............................................................109 Zacharias Frankel (1801-1875) .......................................................117 Samson Raphael Hirsch (1808-1888)..............................................123 Franz Rosenzweig (1886-1929) ......................................................136 Moses Hess (1812-1875) .................................................................152 Ahad Ha-Am (Asher Zvi Ginsberg) (1856-1927) ...........................171 Rav Kook (1865-1935)....................................................................192 Berl Katzenelson (1887-1944) ........................................................206 Martin Buber (1878-1965) ..............................................................213 Mordecai Menahem Kaplan (1881-1983) .......................................220 Yeshayahou Leibowitz (1903 1994) ............................................234

INTRODUO1
O judasmo moderno em perspectiva histrica: Do judasmo rabnico ao judasmo ps-moderno
Bernardo Sorj O judasmo moderno corresponde aos diversos esforos de traduzir a tradio judaica rabnica em conceitos e valores da modernidade. Esta traduo no foi somente intelectual, mas, fundamentalmente, prtica. Significou o abandono da auto-organizao comunal e a autonomia cultural e judiciria dos judeus que o rolo compressor do Estado moderno no podia suportar. Na viso dos defensores da causa judaica na Revoluo Francesa, a emancipao poltica dos judeus passava pela emancipao do judasmo. Os vcios judaicos hbitos alimentares repulsivos; misantropia eram generosamente explicados como se fora efeito do isolamento a que foram condenados. A integrao na sociedade permitiria uma rpida regenerao do povo judeu.2 Embora a emancipao tenha gerado conflitos no interior da comunidade judaica entre os defensores da tradio e da mudana, a rapidez e a disposio com que a maioria dos judeus se disps a aceitar a modernidade s explicada pelos sculos de opresso e humilhao que precederam ao Iluminismo.3 No casual que muitos judeus associaram a Revoluo Francesa com a chegada do messias. Traduzir o judasmo rabnico prtica da vida moderna implicou a separao entre o domnio pblico e o privado (para o qual era relegada a vida judaica) e na lealdade ao Estado nacional e suas instituies. Esta identificao era especialmente penosa para os judeus, pois, embora a
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Os dilogos com Julio Biler, Nilton Bonder e Tommy Peiser permitiram consolidar as ideias aqui apresentadas. Daniela Kestelman colaborou na correo do texto e Snia Olesko na transcrio final. 2 Cf. D. Feuerwerker, L Emancipation des Juifs en France, Albin Michel, Paris, 1976. 3 Para uma Sntese da histria sociopoltica do povo judeu nos tempos modernos, cf. S. Ettinger, Toldot Am Israel Vaet Hachadasha, Dvir, Tel Aviv, 1969. 1

modernidade europeia tenha sido fortemente secularizante, mantinha elos de continuidade com o mundo cristo: o dia de descanso continuou sendo o domingo, assim como a maioria dos feriados e o prprio calendrio (no casual que o esforo descristianizante da Revoluo Francesa culminou com um calendrio prprio, e que a festa mais lembrada pelos judeus seja o ano-novo, que sinaliza a vontade de autopreservao pela afirmao de um tempo prprio). Existencialmente, os tempos modernos significaram um conflito constante entre os valores tradicionais e os novos valores os primeiros vistos como particulares e os segundos como universais , entre lealdade coletividade tnica e lealdade ao Estado nacional ou humanidade. Intelectualmente, o esforo de traduzir a tradio judaica nos termos discursivos da modernidade deu-se em duas grandes direes, ambas redutoras e empobrecedoras da riqueza do judasmo. A primeira direo foi a de transformar o judasmo numa religio,4 eliminando os contedos nacionais e msticos da tradio rabnica para integr-la de forma no conflitiva ao discurso liberal e cidadania nacional. A outra tendncia foi transformar o judasmo numa nao com caractersticas sui-generis e que deveria ser normalizada para ter uma estrutura poltica autnoma, similar aos outros povos. O judasmo moderno se afastou da sntese rabnica, que organizou a vida judaica durante dois mil anos. Esta sntese aceitava a cultura como um bricolage composto de diversas partes que se agregavam no em funo de uma coerncia lgica ou de um plano preconcebido como numa obra de engenharia , mas como um conjunto de solues geradas em circunstncias determinadas e acumuladas na memria do povo.5 Este conjunto no coerente de criatividade armazenada reinterpretado em cada gerao, a qual reala certos elementos para esquecer outros, que podero reviver quando enfrentados novos desafios. Assim, velhos contedos passam a adquirir novos sentidos, enquanto aspectos antes dominantes so abandonados.

A cultura produto de um duplo bricolage, no sentido em que ela acumula e sedimenta as expresses mltiplas internas de um povo, assim como ela integra, absorve e redimensiona as experincias de outros povos. No seria exagero afirmar que a cultura judaica , em boa medida, como qualquer outra cultura, a reelaborao e adaptao criativa de invenes culturais realizadas por outros povos.6 A tradio rabnica manteve o carter bricoleur da cultura judaica, aceitando no seu interior a convivncia de interpretaes diversas, sustentando-se num trip de esperana messinica, obedincia aos mandamentos e auto-organizao comunal, que no pretendia nem desejava ser reduzido a um conjunto de dogmas ou a uma doutrina racional coerente. O judasmo rabnico era auto-referido, no procurando maior coerncia lgica e discursiva a coerncia de suas prticas se orientava no sentido de manter e reproduzir o judasmo. O judasmo moderno, em contraposio, quer ser sistemtico e coerente, centrado no outro, isto , procurando forar a convergncia e mesmo a identidade entre os valores judaicos e os valores modernos. A vontade racionalizante do judasmo moderno procura encobrir a dilacerao existencial, prtica, da vida judaica. Ele , fundamentalmente, autojustificatrio, procurando a legitimidade da existncia judaica na sua aceitao pelo mundo exterior. O Holocausto, a criao do Estado de Israel e o novo contexto do mundo ps-moderno levaram ao fim o judasmo moderno, gerando as condies para recuperar a variedade de contedos da cultura judaica, mas numa situao onde inexiste a vida comunitria e os laos de convivncia e solidariedade do mundo pr-moderno. Assim, no mundo ps-moderno o judasmo perde igualmente o seu carter de conjunto diferenciado como no judasmo rabnico, e de discurso ideolgico doutrinrio como no judasmo moderno, para transformar-se numa experincia fragmentada, vivida com mais ou menos intensidade em momentos circunstanciais, geralmente
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Passando a ser o judeu alemo, francs etc. de f mosaica. 5 Esta ideia de bricolage foi retirada de F. Jacob, Le jeu des Possibles, Fayard, Paris, 1981. 2

O carter de assimilao/reelaborao do judasmo apresentado de forma brilhante por Martin Buber, Moise, Paris. A interao entre povo judeu e seu contexto, cf. S. Baron, A Social and Religious History of the Jews, Columbia University Press, 1952. 3

atravs de ritos que procuram dar sentido a situaes existenciais particulares.

Judasmo moderno
O judasmo moderno corresponde ao perodo histrico que se estende do Iluminismo e a Revoluo Francesa at o Holocausto e a criao do Estado de Israel. Um perodo que durou aproximadamente dois sculos e que se nutriu do universalismo secular do Iluminismo e da cidadania nacional da Revoluo Francesa, os dois grandes valores que os judeus deveriam absorver para se beneficiarem do fim da Idade Mdia. Enquanto fenmeno sociocultural, o judasmo moderno foi, fundamentalmente, uma criao dos judeus Askenazim. Para grande parte do judasmo Sefaradi localizado no mundo muulmano o contato com o judasmo moderno se deu com a imigrao macia para Israel e com o fim do colonialismo na dcada de 50. Quais as caractersticas centrais do judasmo moderno? O judasmo moderno pode ser caracterizado em forma sinttica pelos seguintes elementos: A procura de absoro, integrao e legitimizao do judasmo nos valores modernos, mostrando que o judasmo capaz de conviver e se expressar em termos universais. Neste sentido o judasmo moderno assume constantemente um carter auto justificatrio, no qual procura abandonar todo contedo que pudesse implicar a no-aceitao pelo outro.7 De certa forma, todos os judasmos modernos foram estratgias de assimilao.8 Ainda que este termo tenha sido utilizado pelos judeus menos assimilados para classificar os outros, a assimilao o trao fundamental geral do judeu moderno. Inclusive o sionismo, um movimento
7 Paradoxalmente quanto mais os anti-semitas afirmavam a diferena, mais os judeus procuravam neg-la, gerando assim uma dialtica perversa na qual o judeu se afirmava autonegando-se e o anti-semita negava o judasmo afirmando sua especificidade. 8 No no sentido de absorver elementos do meio circundante o que sempre aconteceu, mas no sentido de um esforo para ser assimilado, digerido, aceito pelos outros como um igual. 4

aparentemente particularista, tinha como objetivo principal em seu programa a normalizao do povo judeu, isto , ter uma base territorial e um Estado, para ser igual aos outros povos. O estilo doutrinrio, discursivo, lgico, sistemtico do judasmo moderno, cioso de uma coerncia fundada na capacidade de sintetizar judasmo com modernidade, ainda que isto tenha como implicao renegar grande parte da tradio. O objetivo central desta lgica discursiva era colocar o judasmo no interior dos movimentos ideolgicos da modernidade. O judasmo moderno foi um judasmo poltico, enquadrado nos grandes movimentos ideolgicos de sua poca liberalismo, socialismo e nacionalismo , que colocavam projetos de engenharia social, via sistema poltico, como seus objetivos centrais. O ponto central da reflexo do judasmo moderno uma problemtica essencialista: identificar o que a essncia do judasmo, o que ser judeu. Esta pergunta tem como pano de fundo a questo de quanto do judasmo tradicional pode ser abandonado sem se deixar de ser judeu ou, inversamente, qual o mnimo que deve ser mantido para se continuar a ser judeu. Este mnimo, por sua vez, deveria ser traduzido e legitimado em termos modernos. Assim, por exemplo, no judasmo reformista o ideal messinico extirpado dos seus contedos histrico-poltico-nacional (de redeno do povo judeu na terra de Israel), para adquirir um carter de princpio tico de valor universal de utopia de justia para toda a humanidade. O judasmo moderno autojustificatrio, procurando fundar o direito de existncia do povo judeu seja, positivamente, pela contribuio do povo judeu humanidade, seja pelo negativo, na impossibilidade de assimilar-se. O judasmo moderno, ao nvel individual, foi vivido como uma crise de identidade entre tradio e modernidade, entre lealdade aos laos primrios e ao conjunto da sociedade, entre o privado e o pblico, entre sentimento e razo.

Judasmos modernos
Se as diversas correntes do judasmo moderno compartilham das caractersticas enumeradas anteriormente, a variedade de tendncias internas no pode ser esquecida, apresentando uma riqueza que foge a esta introduo. Ainda assim, possvel indicar alguns fatores que determinaram sua diversidade e vitalidade. O judasmo moderno expressava a variedade de experincias nacionais e sociais da passagem do mundo tradicional para o mundo moderno, ao mesmo tempo em que se alimentava de um dilogo interno interfronteiras. Assim, o judasmo russo, alemo, francs, austraco, polons procurava simultaneamente absorver e integrar a variedade de pensamentos gerados pela tumultuada convivncia com a modernidade, ao mesmo tempo em que a heterogeneidade social do povo judeu assegurava afinidades e confrontos internos e externos, que eram reelaborados em escala continental. Ao nvel cultural, o judasmo moderno pode ser subdividido em duas grandes correntes: religiosa e nacionalista. Ambas compartilham da vontade de integrar o judasmo vida social e poltica moderna. Porm, enquanto os movimentos de renovao religiosa tomaram como referncia a tradio rabnica, buscando relaxar as suas exigncias e disciplina, o judasmo nacionalista imaginou uma nova cultura judaica, secular, desvinculada da tradio rabnica. Enquanto os movimentos de renovao religiosa tinham uma colorao liberal, o movimento nacionalista era, majoritariamente, socialista.

imitao, de ser igual para ser aceito.9 O Holocausto acabou com as esperanas de integrao total, que se mostraram no s ilusrias como humilhantes. O Estado moderno, nos quais os judeus se apoiaram e se escudaram para alcanar a igualdade, se transformou no seu carrasco. O judasmo ps-Holocausto, ainda que mantenha como parmetro os valores iluministas da modernidade, no pode deixar de estar consciente de que estes valores podem ficar suspensos em qualquer instante, e que a vontade igualitria no elimina a possibilidade da discriminao e estigmatizao. No existindo a perspectiva de um retorno vida comunal, o judeu ps-Holocausto vive como um ser dividido entre a identificao com o conjunto da sociedade e a conscincia de poder ser cassado a qualquer momento em seus privilgios, entre a vontade de integrao e participao social e a conscincia de que sua sobrevivncia depende, em ltima instncia, de sua capacidade de autodefesa.

Do Holocausto ao Estado de Israel

O Holocausto destruiu parte da base social e muitos dos argumentos dos judasmos modernos, levando historicamente criao e identificao do povo judeu com o Estado de Israel, e o sionismo completa hegemonia sobre o povo judeu.10 difcil transmitir a intensidade e variedade de significados que a criao do Estado de Israel teve para uma gerao de judeus recm-sados do Holocausto. A recuperao da autoconfiana e da dignidade, a valorizao da coragem e do trabalho e a capacidade de autodefesa significaram uma revoluo na auto percepo dos judeus, sem a qual a sobrevivncia ao trauma do Holocausto seria difcil de ser imaginada. Se a importncia do Estado de Israel central na conscincia judaica contempornea, suas limitaes no sentido de renovar a cultura judaica so cada vez mais aparentes.
Cf. Z. Bauman, Exit Visas and Entry Tickets: Paradoxes of Jewish Assimilation, Telos, n. 77, 1988. 10 Cf. B. Sorj, A Dialtica do Holocausto, Novos Estudos Cebrap, vol. 2, n. 2, julho de 1983. 7
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Judasmo ps-moderno
A dinmica efetiva da sociedade moderna, na sua verso capitalista ou comunista, mostrou que a ideologia da igualdade, liberdade e fraternidade podia ser rapidamente negada por foras polticas capazes de mobilizar sentimentos xenfobos e o terrorismo de Estado, com amplo apoio social. Para os judeus, a fragilidade dos valores humanistas e a incerteza da vida moderna refletida na confrontao com o anti-semitismo, real ou potencial, geraram inicialmente uma vontade ainda maior de
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O sionismo e os colonos de Israel fizeram um esforo descomunal para criar uma nova cultura judaica em novas bases, seculares, que desconhecia praticamente os dois mil anos de exlio apresentando-o como um perodo puramente negativo de perseguies e humilhaes , enfatizando o perodo bblico at o Segundo Templo e as dimenses do ciclo natural e agropastoril das festividades religiosas. A estes aspectos se agregou, aps o Holocausto, a nfase em Israel como ltimo baluarte contra o anti-semitismo e de garantia da segurana fsica dos judeus, aspecto que, paradoxalmente, foi reforado pelo conflito com o mundo rabe. Os fatores que limitaram a transformao de Israel no centro hegemnico da cultura judaica so mltiplos. Porm, antes de analis-los, indicaremos as marcas mais importantes deixadas pelo Estado de Israel na vida judaica contempornea. Em primeiro lugar deve ser colocada a revoluo, j mencionada, na autoimagem do judeu. Em segundo lugar, a recriao da lngua hebraica como lngua franca do povo judeu. Embora tenha havido, durante dcadas, uma poltica sionista de suplantar o idiche pelo hebraico, o idiche esvaziou-se no Novo Mundo, por causas naturais, e, na Europa Oriental, destrudo pelo Holocausto e pelo stalinismo. O hebraico, sem chegar a ter na dispora um uso comparado ao do idiche ou ao do ladino, se transformou na base do lxico comum para os judeus do mundo todo. Junto com a lngua, Israel renovou a vida artstica do povo judeu, em particular a msica e a literatura. Os novos centros acadmicos geraram uma nova produo sobre o judasmo, renovando a pesquisa histrica sobre o perodo bblico e do Segundo Templo. Embora identificada com o destino de Israel, a maior parte dos judeus do mundo permaneceu na dispora, num contexto de ascenso social e participao na cultura global. O sionismo, ainda que convivendo com este fato, no chegou a elabor-lo. A imagem da dispora continua a ser representada como pura negatividade, imagem que no expressa a vivncia efetiva, geralmente positiva, que os judeus tm dos pases em que vivem. A nova cultura judaica israelense se mostrou limitada tanto em termos da incapacidade de aceitar e integrar a vivncia dos judeus da dispora, como inclusive na sua difuso entre os habitantes de Israel. A chegada constante de ondas de imigrantes, com sua prpria cultura judaica,
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geralmente de base tradicional, enfraqueceu o esforo de secularizao da ideologia sionista das primeiras geraes de pioneiros. Junto com a chegada de novos imigrantes, a sociedade israelense foi adquirindo um carter mais urbano e capitalista, corroendo assim o sentido agropastoril e trabalhista que a cultura colonizadora procurou dar s festividades e valores judaicos. Paradoxalmente, o conflito com o mundo rabe e a necessidade de apoio do judasmo da dispora inviabilizaram a possibilidade do desenvolvimento de uma cultura israelense separatista e mesmo oposta ao judasmo galtico (diasprico ). O reforo dos laos com o judasmo da dispora e a nfase no Holocausto revivido e reelaborado atravs da luta contra o mundo rabe , e o fracasso do judasmo secular colocam hoje perante a sociedade israelense temas como: o que uma cultura judaica, o papel da religio, quem judeu e o que uma educao judaica.

A sociedade ps-moderna11
A criao do Estado de Israel se deu num momento em que a lealdade aos Estados nacionais e a cidadania como fundamento da identidade comearam a entrar em crise sob o impacto da globalizao dos meios de comunicao, a homogenizao dos padres de consumo e o colapso das ideologias polticas prometeicas e totalizantes, levando perda de confiana na ideia de progresso. A globalizao e a homogenizao cultural, orientadas para o consumo e a ascenso individual, o esvaziamento da vida pblica e do Estado como meios para atingir fins coletivos, o questionamento de valores universais e da razo sintetizadora, a valorizao da diferena, da indeterminao e da multiplicidade de significados passaram a ser o novo substrato sociocultural no qual o judasmo contemporneo germina; um contexto em que os grandes agrupamentos de aglutinao permanente de interesses e ao coletiva deixam de ser os estruturadores principais das identidades individuais. Este mundo ps-moderno, cada vez mais global e unificado pela mass-media e o consumo, apresenta simultaneamente um carter fragmentado e catico, no qual todos se sentem desenraizados, participando esporadicamente de subculturas tribais em constante mutao,
Sobra a ps-modernidade, cf. Z. Bauman, Intimitations with Postmodernity, Routledge, London, 1992 e D. Harvey, The Condition of Posmodernity, Blackwell, Oxford, 1981. 9
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seja de grupos msticos ou patotas juvenis, e que paradoxalmente implica o redescobrimento de sentimentos nacionalistas, regionalistas ou movimentos religiosos fundamentalistas, capazes de dar segurana, sentido e dignidade para indivduos ou sociedades que no conseguem conviver com a incerteza, com a perda de sentido coletivo e com a decomposio dos laos primrios caractersticos do mundo contemporneo.

acordo com as necessidades circunstanciais, escolhendo, da vasta prateleira de produtos, aqueles mais adequados ao momento. Assim, o judasmo passou a ter um carter modular, construindo como um mix de acordo com o gosto individual, geralmente com componentes soft, isto , lembrando a tradio, mas de forma no muito exigente. Ser judeu se transformou no direito de passe livre ao consumo de uma tradio especfica, o judasmo. Se na ps-modernidade o judasmo se constitui num espao de passagem, de consumo circunstancial, levando a uma certa perda de densidade, por outro lado ele expande o mercado de consumo de bens judaicos na medida em que os judeus deixam de viver seu judasmo em grupos estanques (religiosos e seculares, sionistas e no-sionistas, assimilados e assumidos) para se transformarem todos eles em demandadores potenciais da diversidade de produtos disponveis. Igualmente, na medida em que o lar e o cotidiano deixam de ser fonte alimentadora de cultura judaica, a demanda de produtos elaborados tende a aumentar. No interior do judasmo continuam surgindo movimentos que procuram traduzi-lo s ideologias em voga feminismo, ecologismo , j no tanto como uma traduo do judasmo a ideologias universais, mas como esforos de atualizao da tradio. No mundo ps-moderno, os judasmos modernos tendem a se diluir, particularmente aqueles que mais enfatizaram a identificao dos valores judeus com os valores universais. Afinal, o que mais oferece a cultura moderna a homogeneidade, de forma que a atrao do judasmo passa a ser o seu potencial como diferenciador e gerador de uma identidade prpria. Assim, por exemplo, o judasmo reformista que avanou na direo de identificar o judasmo com uma tica universal parece involuir na direo de retorno a especificidade e diferena da tradio judaica; por sua vez, o fundamentalismo religioso passa a ter um apelo importante, ainda que limitado, por ser capaz de oferecer um pacote significativo completo para as incertezas da vida ps-moderna. Associado crescentemente ao nacionalismo sionista extremista, o fundamentalismo religioso judaico adquiriu dimenses de projeto poltico, representando o

O judasmo ps-moderno
Do ponto de vista histrico, o judeu, nos ltimos dois mil anos, conviveu com certos traos da ps-modernidade: desenraizado, tinha o mundo como referncia e a incerteza como parmetro. Neste sentido, judasmo e ps-modernidade tm elementos convergentes. Porm, se a psmodernidade por um lado favorece o retorno dos judeus riqueza da tradio judaica, no sentido de desvincul-lo de ideologias polticas e aceitar a multiplicidade de significados, por outro lado, com sua tendncia homogeneizadora, mentalidade consumista e perda de viso histrica, implode qualquer esforo de unificao da experincia judaica tradicional. O judasmo aparece como mais uma identidade tribal, um dos possveis caminhos para diferenciar-se num mundo cada vez mais homogneo, e do qual as pessoas se utilizam de acordo com estados de nimo circunstanciais e mais ou menos momentneos. O judasmo ps-moderno tem assim caractersticas de um judasmo soft, modular e de supermercado. No mundo ps-moderno, o judasmo deixou de ser uma presena constante na vida cotidiana dos judeus, como era no perodo rabnico, mas tambm perdeu a vontade racionalizadora, doutrinria e discursiva do judasmo moderno. O judeu ps-moderno funda sua identidade bsica na sua ascendncia, que o Holocausto assinalou como um destino que independe de sua vontade individual; porm, na sua vivncia cotidiana e auto percepo, o judeu ps-moderno compartilha das caractersticas bsicas da sociedade de consumo. O judeu ps-moderno lembra de seu judasmo em contextos particulares nascimentos e mortes, casamentos e Bar/Bat-Mitzvot e momentos especiais da trajetria pessoal doenas, crises existenciais, etc. O judasmo passou a ser, deste ponto de vista, um supermercado cultural-existencial, no qual se entra e do qual se sai, de
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primeiro esforo sistemtico de parte do rabinato ortodoxo em recuperar a hegemonia do judasmo.12 Um desafio central que a ps-modernidade coloca para as comunidades judaicas o de consolidao de suas organizaes e lideranas. Pelo carter de consumo circunstancial, o judasmo psmoderno particularmente frgil no que diz respeito sua capacidade de manter instituies slidas com uma base social constante. Por sua vez num processo que j havia comeado com a modernidade, h um afastamento das elites judaicas de suas comunidades, gerando, assim, uma dupla crise de carncia de base social e de lderes. Talvez a crise mais profunda do judasmo ps-moderno provenha de sua fragmentao. Enquanto o judasmo moderno, ainda que dividido, mantinha no interior de cada corrente uma certa capacidade prescritiva, no judasmo ps-moderno, o carter difuso, ad hoc, da vida judaica, limita qualquer capacidade efetiva de cristalizao de novas normas, orientaes, tradies. Assim, por exemplo, o judasmo continua incapaz de equacionar um drama central do judasmo moderno e ps-moderno, o casamento misto. O judasmo ps-moderno, sem ser um retorno ao judasmo rabnico, reivindica esta tradio como sua principal fonte inspiradora. Ainda assim, o judasmo secular e poltico, que perdeu seu impulso vital, continua sendo importante entre as lideranas comunitrias e nas escolas judaicas, incapazes de elaborar todas as consequncias da vida social ps-moderna. O desafio institucional principal do judasmo ps-moderno, caso no venha sofrer um novo trauma histrico, ser o de ser capaz de valorizar a positividade do exlio como fonte de riqueza e especificidade, de manter a memria do Holocausto sem que ela se sustente na parania e na psicologia do sobrevivente, de renovar-se aprofundando-se de forma contempornea na tradio rabnica. Dever ser capaz de justificar a vontade de ser diferente na afirmao de suas tradies prprias e no numa falta de alternativa assimilacionista ou no fantasma do anti-semitismo; de elaborar a
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diferena em forma no-xenofbica, de conjugar destino e liberdade, renovao e tradio.

Nota explicativa sobre a escolha dos textos

Os textos reunidos nesta coletnea no ambicionam ser uma representao sistemtica da diversidade intelectual das relaes entre judasmo moderno e messianismo, menos ainda das suas fontes bblicas e rabnicas. Centrando-nos nos eixos temticos das relaes entre judasmo, messianismo e modernidade, procuramos apresentar textos no traduzidos ou de difcil acesso. Nossa escolha se restringiu a autores que, explicitamente, se colocaram no interior da tradio judaica. Os tempos modernos provocaram o divrcio entre judeu e judasmo, isto , a origem judaica no implicava que os autores fundassem suas reflexes na tradio judaica. Hoje, de certa forma, virou moda mostrar as razes judaicas de autores que, pelo menos conscientemente, no consideravam sua produo como parte da tradio judaica. Ainda que estudos biogrficos e mapeamento de uma psicologia judaica consciente sejam relevantes, certa tendncia a forar paralelismos entre a estrutura e o contedo das obras destes autores e a tradio judaica, nos parece, por vezes, uma violncia intelectual desnecessria. Ao final poderiam ser encontradas tantas ou mais afinidades entre certos autores no judeus com o judasmo, do que aquelas encontradas em muitos autores judeus. Desta forma no foram includos, nesta coletnea, autores judeus que elaboraram obras sobre o messianismo sem referncia explcita ao messianismo judeu.

Sobre os dilemas de auto-organizao poltica do judasmo e suas relaes com Israel consultar o excelente trabalho de D. Biale, Power and Powerlessness in Jewish History, Schockem Books, New York, 1986. 12

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I. FONTES
Tor Shemot (xodo)
Segundo Livro da Tor (Pentateuco), Shemot, o (Livro do xodo), que narra a sada do povo de Israel do Egito, desenvolve trs temas principais: 1) A Libertao: Deus redime Israel da Escravido do Egito e demonstra a sua fidelidade (renovao da promessa de estabelecimento do povo em sua terra), sua compaixo e seu poder (xodo 1-7). 2) A Aliana: Deus estabelece um pacto com Israel consagrando-o como um reino de sacerdotes e uma nao sagrada, dando-lhe normas que devero ser obedecidas (xodo 19-24 e 34). 3) O Tabernculo: Deus ordena a construo de um santurio para ele no meio do povo que o acompanhar em sua jornada no deserto (xodo 25, 31, 35-40). Os trs temas tratados no Livro do xodo esto fortemente relacionados vida de Moiss, a quem alguns atribuem a autoria deste livro. Como expresso da vida de Moiss, o Livro do xodo pode ser assim definido: nascimento e juventude de Moiss que consagrado como mensageiro de Deus para livrar o povo de Israel da servido no Egito. Depois de prolongada confrontao com o Fara, o povo parte do Egito liderado por Moiss e seu irmo Aaro. Acampados no Monte Sinai, recebem instrues divinas, a que prometem obedecer. Moiss sobe o monte para receber novas ordens divinas. O captulo 34, selecionado para esta coletnea, apresenta a narrativa javista da Aliana do Sinai. O xodo, tambm chamado Livro da Aliana, retrata o declogo de Moiss no Monte Sinai, bem como as condies para o estabelecimento do pacto, a saber, as leis que o povo de Israel dever seguir para honrar o pacto. Referncias: Enciclopaedia Judaica, New York, The Macmillan Company, 1972, vol. 6, p. 1050. Coleo Judaica, Rio de Janeiro, A. Koogan, vol. I, pp. 35 e 58.
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xodo1
Iahweh disse a Moiss: Lavra duas tbuas de pedra, como as primeiras, sobe a mim na montanha, e eu escreverei as mesmas palavras que estavam nas primeiras tbuas, que quebraste. Fica preparado de manh; de madrugada subirs a montanha do Sinai e l me esperars, no cimo da montanha. Ningum subir contigo, e no se ver ningum em toda a montanha. Nem as ovelhas ou bois pastaro diante da montanha. Moiss lavrou duas tbuas de pedras como as primeiras, levantou-se de madrugada e subiu montanha do Sinai, como Iahweh lhe havia ordenado, e levou nas mos as duas tbuas de pedra. Iahweh desceu na nuvem e ali esteve junto dele. Ele invocou o nome de Iahweh. Iahweh passou diante dele, e ele exclamou:
Iahweh! Iahweh... Deus de compaixo e de piedade, lento para a clera e cheio de amor e fidelidade; que guarda o seu amor a milhares, tolera a falta, a transgresso e o pecado, mas a ningum deixa impune e castiga a falta dos pais nos filhos e nos filhos dos seus filhos, at a terceira e quarta gerao.

Imediatamente Moiss caiu de joelhos por terra e adorou; depois ele disse: Iahweh, se agora encontrei graa aos teus olhos, segue em nosso meio conosco, mesmo que este povo seja de cerviz dura. Perdoa as nossas faltas e os nossos pecados, e toma-nos por tua herana. Ento ele disse:
Eis que fao uma aliana. Farei diante de todo o teu povo maravilhas como no se fizeram em toda a terra, nem em nao alguma. Todo este povo, no meio do qual ests, ver a obra de Iahweh, porque coisa
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Extrado da Bblia de Jerusalm, So Paulo, Edies Paulinas, 1985, captulo 34, p. 156. 15

temvel o que vou fazer contigo. Est atento para observar o que hoje te ordeno: expulsarei de diante de ti os amorreus, os cananeus, os heteus, os ferezeus, os heveus e os jebuseus. Abstm-te de fazer aliana com os moradores da terra para onde vais; para que no te sejam uma cilada. Ao contrrio, derrubareis os seus altares, quebrareis suas colunas e os seus postes sagrados: No adorars outro deus. Pois Iahweh tem por nome Zeloso: um Deus Zeloso. No faas aliana com os moradores da terra. No suceda que, em se prostituindo com os deuses dele e lhes sacrificando, algum te convides e comas dos seus sacrifcios, e tomes mulheres das suas filhas para os teus filhos, e suas filhas, prostituindo-se com seus deuses, faam com que tambm os teus filhos se prostituam com os seus deuses. No fars para ti deuses de metal fundido. Guardars a festa dos zimos. Durante sete dias comers zimo, como te ordenei, no tempo fixado no ms de Abib, porque foi no ms de Abib que saste do Egito. Todo o que sair por primeiro do seio materno meu: todo macho, todo primognito de tuas ovelhas e do teu gado. O jumento, porm, que sair por primeiro do seio materno, tu o resgatars com um cordeiro; se no o resgatares, quebrar-lhe-s a nuca. Resgatars todos os primognitos dos teus filhos. No comparecers diante de mim de mos vazias. Seis dias trabalhars; mas no stimo descansars, quer na aradura, quer na colheita. Guardars a festa das Semanas: as primcias da colheita do trigo e a festa da colheita na passagem do ano. Trs vezes por ano todo o homem do teu meio aparecer perante o Senhor Iahweh, Deus de Israel. Porque expulsarei as naes de diante de ti, e alargarei o teu territrio; ningum cobiar a tua terra, quando subires para comparecer na presena de Iahweh teu Deus, trs vezes por ano. No oferecers o sangue do meu sacrifcio com po levedado. No ficars vtima da festa da Pscoa da noite para a manh.
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Trars o melhor das primcias para a Casa de Iahweh teu Deus. No cozers o cabrito no leite da sua prpria me.

Disse ainda Iahweh a Moiss: Escreve estas palavras; porque segundo o teor destas palavras fiz aliana contigo e com Israel. Moiss esteve ali com Iahweh quarenta dias e quarenta noites, sem comer po nem beber gua. Ele escreveu nas tbuas as palavras da aliana, as dez palavras. Quando Moiss desceu da montanha no Sinai, trazendo nas mos as duas tbuas do Testemunho, sim, quando desceu da montanha, no sabia que a pele de seu rosto resplandecia porque havia falado com ele. Olhando Aaro e todos os filhos de Israel para Moiss, eis que a pele de seu rosto resplandecia; e tinham medo de aproximar-se dele. Moiss, porm, os chamou; Aaro e os chefes da comunidade foram at ele, e Moiss lhes falou. Depois aproximaram-se todos os filhos de Israel, e ordenou-lhes tudo o que Iahweh havia dito sobre a montanha do Sinai. Quando Moiss terminou de lhes falar, colocou um vu sobre a face. Quando Moiss entrava diante de Iahweh para falar com ele, retirava o vu, at o momento de sair. Ao sair, dizia aos filhos de Israel que lhe havia sido ordenado, e os filhos de Israel viam resplandecer o rosto de Moiss. Depois Moiss colocava o vu sobre a face, at que entrasse para falar com ele.

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Tor Dvarim (Deuteronmio)

O ltimo dos cinco livros da Tor (Pentateuco), Dvarim (Deuteronmio) tem uma estrutura particular: define-se como um cdigo de leis civis e religiosas, proferido em um longo discurso de Moiss para o povo de Israel. O cdigo deuteronmico retoma, em parte, as leis promulgadas no deserto, relatos dos grandes acontecimentos do xodo, da Aliana do Sinai e da conquista de Cana que se iniciava. A base do pensamento deuteronmico a unidade monotesta de YHVH, a correspondente obrigao de Israel de ser nico e o amor e a fidelidade como elementos geradores do pacto entre Deus e o povo de Israel. O Deuteronmio como expresso da vida de Moiss pode ser assim definido: o fim de 40 anos de peregrinao pelo deserto, Moiss fala ao seu povo na plancie de Moab, na margem do rio Jordo, aqum de Cana, reiterando as instrues divinas, lembrando ao povo a promessa de ser fiel e acrescentando aos ordenamentos anteriores outras leis e preceitos. A Tor (Pentateuco) termina com a morte de Moiss. Os captulos 7, 8 e 11, selecionados para esta coletnea, tratam da eleio de Israel como um povo separado, nico; do amor e da fidelidade do povo promessa; dos preceitos que devem ser observados para a manuteno do pacto e da conquista da terra prometida. Referncia Coleo Judaica, R.J., A. Koogan, 1990, pp. 35 e 86.

Deuteronmio1
Quando Iahweh teu Deus te houver introduzido na terra em que ests entrando para possu-la, e expulsado naes mais numerosas do que tu os heteus, os gegeseus, os amorreus, os cananeus, os ferezeus, os heveus e os jebuseus , sete naes mais numerosas e poderosas do que tudo; quando Iahweh teu Deus entreg-las a ti, tu as derrotars e as sacrificars como antema. No fars aliana com elas e no tratars com piedade. No contrairs matrimnio com elas, no dars tua filha a um de seus filhos, nem tomars uma de suas filhas para teu filho; pois deste modo o teu filho se afastaria de mim para servir a outros deuses, e a clera de Iahweh se inflamaria contra vs, exterminando-te rapidamente. Eis como deveis trat-los: demolir seus altares, despedaar suas estelas, cortar seus postes sagrados e queimar seus dolos. Pois tu s um povo consagrado a Iahweh teu Deus; foi a ti que Iahweh teu Deus escolheu para que pertenas a ele como seu povo prprio, dentre todos os povos que existem sobre a face da terra. Se Iahweh se afeioou a vs e vos escolheu, no por serdes o mais numeroso de todos os povos pelo contrrio; sois o menor dentre os povos! e sim por amor a vs e para manter a promessa que ele jurou aos vossos pais; por isso Iahweh vos fez sair com mo forte e te resgatou da casa da escravido, da mo do Fara, rei do Egito, Sabers, portanto, que Iahweh teu Deus o nico Deus, o Deus fiel que mantm a Aliana e o amor por mil geraes, em favor daqueles que o amam e observam os seus mandamentos; mas tambm o que retribui pessoalmente aos que o odeiam: faz com que perea sem demorar aquele que o odeia, retribuindolhe pessoalmente. Observa pois, os mandamentos, os estatutos e as normas que eu hoje te ordeno cumprir. Se ouvirdes estas normas e as puserdes em prtica, Iahweh teu Deus tambm te manter a Aliana e o amor que ele jurou aos teus pais; ele te amar, te abenoar e te multiplicar; abenoar tambm o fruto do teu
Extrado da Bblia de Jerusalm, So Paulo, Edies Paulinas, 1985, captulos 7, 8 e 11, p.285. 19
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ventre e o fruto do teu solo, teu trigo, teu vinho novo, teu leo, a cria das tuas vacas e a prole das tuas ovelhas, na terra que prometeu aos teus pais que te daria. Sers mais abenoado do que todos os povos. Ningum do teu meio ser estril, seja o homem, a mulher, ou o teu gado. Iahweh afastar de ti toda a doena e todas as graves enfermidades do Egito que bem conheces. Ele no as infligir a ti, mais a todos os que te odeiam. Portanto, devorars todos os povos que Iahweh teu Deus te entregar. Que teu olho no tenha piedade deles e nem sirvas seus deuses: isto seria uma armadilha para ti. Talvez digas em teu corao: Estas naes so mais numerosas do que eu, como poderia conquist-las? No deves ter medo delas! Lembra-te bem do que Iahweh teu Deus fez ao Fara e a todo o Egito: as grandes provas que teus olhos viram, os sinais e os prodgios, a mo forte e o brao estendido com que Iahweh teu Deus te fez sair! Iahweh teu Deus tratar do mesmo modo todos os povos de que tens medo! Alm disso, Iahweh teu Deus enviar vespas contra eles, perecendo at os que tiverem restado e se tiverem escondido de ti. No fiques aterrorizado diante deles, pois Iahweh teu Deus, que habita em teu meio Deus grande e terrvel. Iahweh teu Deus pouco a pouco ir expulsando estas naes da tua frente; no poders extermin-las rapidamente: as feras do campo se multiplicariam contra ti. Iahweh teu Deus quem vai entreg-las a ti: elas ficaro profundamente perturbadas at que sejam exterminadas. Ele vai entregar seus reis em tua mo, e tu apagars o seu nome de sob o cu: ningum resistir em tua presena, at que os tenha exterminado. Queimareis os dolos de seus deuses. No cobiars a prata e o ouro que os recobrem, nem os tomars para ti, para que no caias numa armadilha pois so uma coisa abominvel a Iahweh teu Deus. Portanto, no introduzirs uma coisa abominvel em tua casa: tornar-te-ias antema como ela. Consideras-as como coisas imundas e abominveis, pois elas so antemas. Observareis todos os mandamentos que hoje vos ordeno cumprir, para que vivais e vos multipliqueis, entreis e possuais a terra que Iahweh,
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sob juramento, prometeu aos vossos pais. Lembra-te, porm, de todo o caminho que Iahweh teu Deus te fez percorrer durante quarenta anos no deserto, a fim de humilhar-te, tentar-te e conhecer o que tinhas no corao: iria observar seus mandamentos ou no? Ele te humilhou, fez com que sentisses fome e te alimentou com o man que nem tu nem teus pais conheciam, para te mostrar que o homem no vive apenas de po, mas que o homem vive de tudo aquilo que procede da boca de Iahweh. As vestes que usavas no se envelheceram, nem teu p inchou durante esses quarenta anos. Portanto, reconhece no teu corao que Iahweh teu Deus te educava, como um homem educa seu filho, e observa os mandamentos de Iahweh teu Deus, para que andes nos seus caminhos e o temas. Eis que Iahweh teu Deus vai te introduzir numa terra boa: terra cheia de ribeiros de gua e de fontes profundas que jorram no vale e na montanha; terra de trigo e cevada, de vinhas, figueiras e romzeiras, terra de oliveiras, de azeite e de mel; terra onde vais comer po sem escassez nela nada te faltar! , terra cujas pedras so de ferro e de cujas montanhas extrairs o cobre. Comers e ficars saciado, e bendirs a Iahweh teu Deus na terra que ele te dar. Contudo, fica atento a ti mesmo, para que no esqueas a Iahweh teu Deus, e no deixes de cumprir seus mandamentos, normas e estatutos que hoje te ordeno! No acontea que, havendo comido e estando saciado, havendo construdo casas boas e habitando nelas, havendo-se multiplicado teus bois e tuas ovelhas tendo aumentado, e multiplicando-se tambm tua prata e teu ouro, e tudo o que tiveres, que o teu corao no se eleve e no te esqueas de Iahweh teu Deus, que fez sair da terra do Egito, da casa da escravido; que te conduziu atravs daquele grande e terrvel deserto, cheio de serpentes abrasadoras, escorpies e sede; e que, onde no havia gua, para ti fez jorrar gua da mais pura pedra; que te sustentava no deserto com o man que teus pais no conheceram, para te humilhar e te experimentar, a fim de te fazer bem no futuro! Portanto, no vs dizer no teu corao, Foi a minha fora e o poder das minhas mos que me proporcionaram estas riquezas. Lembra-te de Iahweh teu Deus, pois ele que te concede fora para te
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enriqueceres, mantendo a aliana que jurou aos teus pais, como hoje se v. Contudo, se te esqueceres completamente de Iahweh, teu Deus seguindo outros deuses, servindo-os e adorando-os, eu hoje testemunho contra vs: certo que perecereis! Perecereis do mesmo modo que as naes que Iahweh vai exterminar vossa frente, por no terdes obedecido voz de Iahweh vosso Deus. Amars a Iahweh teu Deus e observars continuamente o que deve ser observado: seus estatutos, suas normas e mandamentos. Fostes vs que fizestes a experincia, e no vossos filhos. Eles no conheceram nem viram a pedagogia de Iahweh vosso Deus, sua grandeza, sua mo forte e seu brao estendido, os sinais e as obras que ele realizou no meio do Egito, contra Fara, rei do Egito, e contra toda a sua terra; o que ele fez contra o exrcito do Egito, seus cavalos e carros, fazendo as guas do Mar Vermelho reflurem sobre eles, quando vos perseguiam: Iahweh os aniquilou at o dia de hoje; e o que fez por vs no deserto, at que chegsseis a este lugar; e ainda o que fez a Dat e a Abiram, filhos de Eliab, o rubenita: a terra abriu sua boca e engoliu-os, juntamente com suas famlias, tendas e tudo o que se seguia, no meio de todo Israel. Vossos olhos foram testemunhas de toda a grande obra que Iahweh realizou. Observareis, portanto, todos os mandamentos que eu vos ordeno hoje, para vos fortalecerdes, entrardes e tomardes posse da terra para a qual passais, a fim de possu-la, e para que prolongueis os vossos dias sobre a terra que Iahweh, sob juramento, prometeu dar a vossos pais e sua descendncia: uma terra onde manam leite e mel! Pois a terra em que ests entrando a fim de tomares posse dela no como de onde sastes, a terra do Egito: l semeavas tua semente e irrigavas com o p, como uma horta! A terra para a qual vs ides, a fim de tomardes posse dela uma terra de montes e vales, que bebe gua da chuva do cu! uma terra de que Iahweh teu Deus cuida. Os olhos de Iahweh teu Deus esto sempre fixos nela, do incio ao fim do ano. Portanto, se de fato obedecerdes aos mandamentos que hoje vos ordeno, amando a Iahweh vosso Deus e servindo-o com todo o vosso corao e com toda a vossa alma, darei chuva para a vossa terra no tempo certo: chuvas de outono e de primavera. Poders assim recolher teu trigo, teu vinho novo e teu leo;
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darei erva no campo para o teu rebanho, de modo que poders comer e ficar saciado. Contudo, ficai atentos a vs mesmos, para que o vosso corao no se deixe seduzir e no vos desvieis para servir a outros deuses, prostrandovos diante deles. A clera de Iahweh se inflamaria: contra vs e ele bloquearia o cu: no haveria mais chuva e a terra no daria o seu produto; deste modo desaparecereis rapidamente da boa terra que Iahweh vos d! Colocai estas minhas palavras no vosso corao e na vossa alma, ataia-as como um sinal de vossa mo, e sejam como um frontal entre vossos olhos. Ensinai-as aos vossos filhos, falando delas sentado em tua casa e andando em teu caminho, deitado e de p; tu as escrevers nos umbrais da tua casa, e nas tuas portas, para que vossos dias e os dias dos vossos filhos se multipliquem sobre a terra que Iahweh jurou dar a vossos pais, e sejam to numerosos como os dias em que o cu permanecer sobre a terra.

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Profeta Isaas
A literatura proftica clssica que se inclui na narrativa bblica diferente do Pentateuco que composto por temas organizados em vrios sculos defronta-nos com pensamentos de homens historicamente identificveis que buscaram redefinir a relao de Israel com YHVN. Isaas, filho de Ams, nasceu em Jerusalm e profetizou por cerca de 40 anos, desde 742 a.E.C. O livro de Isaas contm muito mais que a profecia do histrico Isaas. Aceitam-se comumente os captulos 1-12, 1723 e 28-33 como autnticas mensagens do Isaas histrico e a segunda metade do livro de Isaas costuma-se atribuir a um profeta que viveu no exlio na poca em que Ciro ocupava a cidade da Babilnia. Os captulos 40-66 so denominados Deutero-Isaas, cuja temtica central define-se pela preocupao escatolgica, comum ao perodo exlico e ps-exlico. A profecia do primeiro Isaas caracteriza-se por um estilo potico vvido e por metforas de tipo singular. Sua temtica central refere-se moral social e aos desvios da lei. Na profecia de Isaas os orculos de castigo e de consolao alternam-se com frequncia em passagens de rara beleza. O acento da justia divina e o papel de Sion como centro do domnio universal de Deus sobre todas as naes parece caracterizar a mensagem proftica, monotesta e messinica de Isaas. Foram selecionadas para esta coletnea as seguintes passagens; 11-14 e 24. Referncias Enciclopaedia Judaica, New York, The Macmillan Company, 1972, vol. 9, p. 44. Coleo Judaica, Rio de Janeiro, A. Koogan, 1990, vol. I, pp. 76/80.

Profeta Isaas1
Um ramo sair do tronco de Jess, um rebento brotar das suas razes. Sobre ele repousar o esprito de Iahweh, esprito de sabedoria e de inteligncia, esprito de conselho e de fortaleza, esprito de conhecimento e de temor de Iahweh: no temor de Iahweh estar a sua inspirao. Ele no julgar segundo a aparncia. Ele no dar sentena apenas por ouvir dizer. Antes, julgar os fracos com justia, com equidade pronunciar uma sentena em favor dos pobres da terra. Ele ferir a terra com o basto da sua boca, e com o sopro dos seus lbios matar o mpio. A justia ser o cinto dos seus lombos e a fidelidade, o cinto dos seus rins. Ento o lobo morar com o cordeiro, e o leopardo se deitar com o cabrito. O bezerro, o leozinho e o gordo novilho andaro juntos e um menino pequeno os guiar. A vaca e o urso pastaro juntos, juntas se deitaro as suas crias. O leo se alimentar de forragem como o boi. A criana de peito poder brincar junto cova da spide, criana pequena por a mo na cova da vbora. Ningum far o mal nem destruio nenhuma em todo o meu santo monte porque a terra ficar cheia do conhecimento de Iahweh, como as guas enchem o mar.

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Texto extrado da Bblia de Jerusalm, So Paulo, Edies Paulinas, 1985, captulos 11, 14 e 24, p. 1377. 25

Naquele dia, a raiz de Jess, que se ergue com um sinal para os povos, ser procurada pelas naes, e a sua morada se cobrir de glria. Naquele dia, o Senhor tornar a estender a sua mo para resgatar o resto do seu povo, a saber, aquilo que restar na Assria. e no Egito, em Patros, em Cuch e no Elam, em Senaar, em Emat, nas ilhas do mar. Ele erguer um sinal para as naes e reunir os banidos de Israel. Ajuntar os dispersos de Jud dos quatro cantos da terra. Cessar o cime de Efraim, os adversrios de Jud sero exterminados. Efraim no tornar a ter cime de Jud, e Jud no voltar a hostilizar Efraim. Ambos atirar-se-o sobre os filisteus ao ocidente, juntos despojaro os filhos do oriente. Edom e Moab se sujeitaro ao seu domnio e os filhos de Amon se lhes submetero. Iahweh secar a baa do mar do Egito, ele agitar a sua mo contra o Rio, com a violncia do seu sopro. Dividi-lo- em sete canais, permitindo que seja atravessado at com sandlias. Haver um caminho para o resto do seu povo, para o que restar da Assria, como houve um caminho para Israel no dia em que subiu da terra do Egito.

servas. Reduziro ao cativeiro aqueles que os tinham feito cativos e dominaro aqueles que os tinham oprimido.
E suceder, no dia em que Iahweh te der descanso do teu sofrimento, da tua inquietude e da dura servido a que foste sujeitado, que entoars esta stira a respeito do rei da Babilnia: Como terminou o opressor? Como terminou a arrogncia? Iahweh quebrou a vara dos mpios, o cetro dos dominadores, daquele que feria os povos com furor, que feria com golpes interminveis, que com ira dominava as naes, perseguindo-as sem que o pudessem deter. O mundo inteiro repousa, est tranquilo; todos rompem em canto de alegria. At os ciprestes se regozijam por causa de ti, bem como os cedros do Lbano: Depois que jazes cado, ningum mais sobe at aqui para pr-nos abaixo! Nas profundezas, o Xeol se agita por causa de ti, para vir ao teu encontro; para receber-te despertou os mortos, todos os potentados da terra, fez erguerem-se dos seus tronos todos os reis das naes. Todos eles se interpelam e se dizem: Ento, tambm tu foste abatido como ns, acabaste igual a ns. O teu fausto foi precipitado no Xeol, juntamente com a msica das tuas harpas. Sob o teu corpo os vermes formam como um colcho, os bichos te cobrem como um cobertor. Como caste do cu, estrela dalva, filho da aurora! Como foste atirado terra, vencedor das naes! E, no entanto, dizias no teu corao: Hei de subir at o cu, acima das estrelas de Deus colocarei o meu trono, estabelecer-me-ei na montanha da Assembleia, nos confins do norte. Subirei acima das nuvens, tornar-me-ei semelhante ao Altssimo.
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Com efeito, Iahweh mostrar compaixo para com Jac; ele voltar a escolher a Israel. Estabelec-los- em seu territrio. O estrangeiro se unir a eles, fazendo parte da casa de Jac. Povos os tomaro e os traro sua terra. A casa de Israel os submeter na terra de Iahweh, fazendo deles servos e
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E, contudo, foste precipitado ao Xeol, nas profundezas do abismo. Os que te vem fitam os olhos em ti, e te observam com toda ateno, perguntando: Porventura este o homem que fazia tremer a terra, que abalava os reinos? Que reduziu o mundo a um deserto, arrasou as suas cidades e nunca permitiu que voltassem para a sua ptria os seus prisioneiros? Todos os reis das naes repousam com honra, cada um no seu jazigo. Tu, porm, foste lanado fora da tua sepultura, como um ramo abominvel, rodeado de gente imolada, trespassada espada, atirada sobre as pedras da fossa, como uma carcaa pisada aos ps. Tu no te reunirs queles na sepultura, pois que arruinaste a tua terra, fizeste perecer o teu povo, nunca mais se nomear essa raa de malvados. Por causa da maldade dos pais promovei a matana dos filhos. No se tornem eles a levantar para submeterem a terra e encherem de cidades a face da terra. Levantar-me-ei contra eles, orculo de Iahweh dos Exrcitos, e extirparei da Babilnia o seu nome e o seu resto, a sua descendncia e a sua posteridade, orculo de Iahweh. Farei dela uma morada de ourios e um brejo. Varr-la-ei com a vassoura do extermnio, orculo de Iahweh dos Exrcitos. Eis que Iahweh vai assolar a terra e devast-la, por em confuso a sua superfcie e dispersar os seus habitantes. O mesmo suceder ao sacerdote e ao povo, ao servo e ao seu senhor, serva e sua senhora, ao comprador e ao vendedor, ao que empresta e ao que toma emprestado, ao devedor e ao credor.
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Certamente a terra ser devastada, certamente ela ser despojada, pois foi Iahweh quem pronunciou esta sentena. A terra cobre-se de luto, ela perece; o mundo definha, ele perece; a nata do povo da terra definha. A terra est profanada sob os ps dos seus habitantes; com efeito, eles transgrediram as leis, mudaram o decreto e romperam a aliana eterna. Por este motivo a maldio devorou a terra e os seus habitantes recebem o castigo; por esse motivo os habitantes da terra foram consumidos: poucos so os que restam. O vinho novo se lamenta, a videira perece, gemem todos os que estavam alegres. O som alegre dos tambores calou-se, o estrpido das pessoas em festa cessou; cessou o som alegre das ctaras. J no se bebe vinho ao som do cntico, a bebida forte tem um sabor amargo para os que a bebem. A cidade da desolao est arruinada, todas as suas casas esto fechadas, ningum pode entrar nelas. Nas ruas clama-se por vinho, toda a alegria se acabou: o jbilo foi desterrado da terra. Na cidade s ficou a desolao, a porta ficou reduzida a runas. O que se passa na terra, entre os povos, algo semelhante ao varejar da oliveira, respiga do fim da vindima. Estes elevam a voz, gritam de alegria. Desde o ocidente proclamam ruidosamente a glria de Iahweh: Por isto glorificai a Iahweh no Oriente, o nome de Iahweh, Deus de Israel, nas ilhas do mar. Desde as extremidades da terra ouvimos ressoar o cntico glria ao Justo. Mas eu disse: Que desgraa para mim! Que desgraa para mim! Ai de mim! Os traidores traram; sim, os traidores cometeram uma traio! O pavor, a cova e a armadilha te ameaam, habitante da terral Aquele que fugir ao grito de pavor cair na cova,
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aquele que conseguir subir da cova ser apanhado na armadilha. Com efeito, as cataratas do alto se abriram, os fundamentos da terra se abalaram. A terra ser toda arrasada, a terra ser sacudida violentamente, a terra ser fortemente abalada. A terra cambalear como um embriagado, ela oscilar como uma cabana, seu crime pesar sobre ela, ela cair e no mais se levantar; E acontecer naquele dia: Iahweh visitar o exrcito do alto, no alto, e os reis da terra, na terra. Eles sero reunidos, como um bando de prisioneiros destinado cova; sero encerrados no crcere; depois de longo tempo, sero chamados s contas. A lua ficar confusa, o sol se cobrir de vergonha, porque Iahweh dos Exrcitos reina no monte Sio e em Jerusalm, e a sua Glria resplandece diante dos seus ancios.

Profeta Jeremias
As ltimas dcadas que precederam o exlio na Babilnia viram renascer o esprito da profecia clssica nas figuras de homens como Jeremias e Ezequiel. As preocupaes com os desvios da f, com suas sucessivas traies, ocupam fortemente as reflexes desses profetas. Jeremias nasceu em torno de 645 a.E.C., em Anathoth, Jerusalm, e iniciou sua vocao proftica no dcimo terceiro ano do reinado de Josias. A singularidade de Jeremias repousa em suas longas passagens biogrficas e autobiogrficas que retratam ideias, sentimentos, reaes e juzos sobre os acontecimentos do seu tempo. Vrios de seus poemas expressam emoes que vo da autocompaixo e angstia ternura e comoo profundas pelo sofrimento de seu povo. Os temas de Jeremias que o aproximam da profecia clssica so: a prostituio de Israel, a traio da confiana de Deus, a condenao do valor absoluto do culto e a exortao fidelidade e obedincia a Deus. A atitude resignada de Jeremias em relao invaso babilnica expressa a convico do profeta de que apenas uma total reforma tica do povo poder fazer merecer a ajuda de Deus. A simples confiana em YHVH o primeiro passo necessrio em direo ao verdadeiro arrependimento, uma entrega incondicional a Deus em qualquer circunstncia. Jeremias tinha a convico de que seu povo estava sob juramento divino e sentia-se mobilizado a buscar a converso total do povo como nica possibilidade de salvao. Referncias Enciclopaedia Judaica, N. Y., The Macmillan Company, 1972, vol. 9, p. 1345. Coleo Judaica, Rio de Janeiro, A. Koogan, 1990, vol. I, pp. 92/97.

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Profeta Jeremias

Percorrei as ruas de Jerusalm, olhai, constatai, procurai nas praas se encontrais um homem que pratique o direito, que procure a verdade: e eu a perdoarei, diz Iahweh. Mas se dizem Pela vida de Iahweh, na verdade eles juram falso. Iahweh, no para a verdade que teus olhos se dirigem? Tu os feriste: eles no sentiram dor. Tu os consumiste: eles recusaram aceitar a lio. Tornaram a sua face mais dura do que a rocha, recusaram converter-se. Ento eu pensava: Pobre gente, eles agem tolamente porque no conhecem o caminho de Iahweh, nem o direito de seu Deus. Vou dirigir-me aos grandes e falar com eles, porque eles conhecem o caminho de Iahweh e o direito de seu Deus! Mas tambm eles quebraram o jugo, romperam os laos! Por isso um leo da floresta os fere, um lobo da estepe os dizima, a pantera est espreita em suas cidades: todo aquele que sair delas ser despedaado. Pois seus crimes so numerosos, inmeras as suas rebeldias. Por que deveria eu perdoar-te? Teus filhos me abandonaram e juraram por deuses que no o so. Eu os saciei e eles se tornaram adlteros e correram para a casa da prostituta. So cavalos cevados e vagabundos, cada qual relincha pela mulher de seu prximo. Acaso no castigarei por causa destas coisas orculo de Iahweh ou no me vingarei de uma nao como esta?
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Escalai os seus terraos! Destru! Mas no aniquileis completamente! Arrancai os seus sarmentos, porque eles no so de Iahweh! Sim, realmente me traram, a casa de Israel e a casa de Jud orculo de Iahweh. Eles renegaram a Iahweh e disseram: Ele no existe! Nenhum mal nos atingir, no veremos nem espada nem fome! Seus profetas no so seno vento, a palavra no est neles; assim lhes acontea! Por isso, assim disse Iahweh, o Deus dos Exrcitos: Porque falaste esta palavra, eis que farei de minhas palavras um fogo em tua boca, e, desse povo, lenha que o fogo devorar. Eis que trago contra vs uma nao de longe, casa de Israel, orculo de Iahweh. uma nao duradoura, uma nao antiga, uma nao cuja lngua no conheces e no compreendes o que ela fala. Sua aljava como um sepulcro aberto, todos os seus homens so heris. Devorar a tua messe e o teu po, devorar os teus filhos e as tuas filhas, devorar as tuas ovelhas e as tuas vacas, devorar a tua vinha e a tua figueira; destruir pela espada as tuas cidades fortes em que colocas a tua confiana. Contudo, mesmo naqueles dias orculo de Iahweh no vos aniquilarei completamente. E quando perguntardes: Por que Iahweh nosso Deus, nos fez tudo isto?, tu lhes responders: Assim como me abandonastes para servir, em vossa terra, a deuses estrangeiros, assim tambm servirei a estrangeiros em uma terra que no vossa. Anunciai isto na casa de Jac, fazei-o ouvir em Jud: Ouvi isto, povo insensato e sem inteligncia! Eles tm olhos mas no vem, tm ouvidos mas no ouvem. A mim no temeis? orculo de Iahweh.
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Texto extrado da Bblia de Jerusalm, So Paulo, Edies Paulinas, 1985, captulos 5 e 7, p. 1483. 32

No tremeis diante de mim, que coloquei a areia como limite ao mar, barreira eterna que ele no poder ultrapassar: suas ondas se agitam, mas so impotentes, elas rugem, mas no podero ultrapassar. Mas este povo tem um corao indcil e rebelde; eles se afastaram e desertaram. No disseram em seus coraes: Temamos a Iahweh nosso Deus, que nos d a chuva de outono e a da primavera a seu tempo e que nos reserva semanas fixas para a colheita. Vossos delitos afastaram estas coisas, e vossos pecados vos privaram do bem. Sim, encontram-se mpios em meu povo, eles esto espreita, como passarinheiros que se agacham, eles colocam armadilhas, caam homens. Como uma gaiola cheia de pssaros, assim as suas casas esto cheias de rapina. Por isso tornaram-se grandes e ricos, gordos e reluzentes. Ultrapassaram, at mesmo, os limites do mal; eles no respeitam o direito, o direito dos rfos e, todavia, tm xito! E no julgam a causa dos indigentes. Acaso no castigarei por causa destas coisas orculo de Iahweh ou no me vingarei de uma nao com esta? Uma coisa horrvel e abominvel aconteceu na terra: Os profetas profetizam mentiras, os sacerdotes procuram proveitos. E meu povo gosta disto! Mas que fareis quando chegar o fim?

Este o Templo de Iahweh, Templo de Iahweh, Templo de Iahweh! Porque, se realmente melhorardes os vossos caminhos e as vossas obras, se realmente praticardes o direito cada um com o seu prximo, se no oprimirdes o estrangeiro, o rfo e a viva, se no derramardes sangue inocente neste lugar e no correrdes atrs dos deuses estrangeiros para vossa desgraa, ento eu vos farei habitar neste lugar, na terra que dei a vossos pais h muito tempo e para sempre. Eis que vs vos fiais em palavras mentirosas, que no podem ajudar. No assim? Roubar, matar, cometer adultrio, jurar falso, queimar incenso a Baal, correr atrs de deuses estrangeiros, que no conheceis, depois virdes a vos apresentardes diante de mim, neste Templo, onde o meu nome invocado, e dizer: Estamos salvos, para continuar cometendo estas abominaes! Este templo, onde o meu Nome invocado, ser porventura um covil de ladres a vossos olhos? Mas eis que eu tambm vi, orculo de Iahweh. Ide, pois, ao meu lugar, em Silo, onde eu, outrora, fiz habitar o meu Nome, e vede o que eu lhe fiz por causa da maldade do meu povo, Israel. Mas agora, visto que praticardes todos esses atos orculo de Iahweh , visto que no escutastes quando eu vos falava com instncia e sem me cansar, e no respondestes aos meus apelos, vou tratar o Templo, onde meu Nome invocado, e em que colocais a vossa confiana, o lugar que dei a vs e a vossos pais, como tratei Silo. Eu vos expulsarei de minha presena, como expulsei todos os vossos irmos e toda a raa de Efraim. Mas tu, no intercedas por este povo e no eleves em seu favor nem lamentos nem preces, e no insistas junto a mim porque no vou te ouvir. No vs tu o que eles fazem nas cidades de Jud e nas ruas de Jerusalm? Os filhos ajuntam a lenha, os pais acendem o fogo e as mulheres preparam a massa para fazerem tortas rainha dos cus; depois fazem libaes a deuses estrangeiros para me ofenderem. Mas ser a mim que eles ofendem?, orculo de Iahweh. No ser a eles mesmos, para a sua prpria vergonha? Por isso, assim disse o Senhor Iahweh: Eis que minha ira ardente se derramar sobre este lugar, sobre os homens, sobre os animais, sobre as rvores do campo e sobre os frutos da terra. Ela arder e no se extinguir.
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Palavra que foi dirigida a Jeremias da parte de Iahweh: Coloca-te porta do Templo de Iahweh e anuncia ali esta palavra e diz: Escutai a palavra de Iahweh, vs todos, judeus, que entrais por estas portas para adorardes Iahweh. Assim disse Iahweh dos Exrcitos, o Deus de Israel: Melhorai os vossos caminhos e as vossas obras, e eu vos farei habitar neste lugar. No vos fieis em palavras mentirosas dizendo:

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Assim disse Iahweh dos Exrcitos, Deus de Israel: Acrescentai os vossos holocaustos aos vossos sacrifcios e comei a carne! Porque eu no disse e nem prescrevi nada a vossos pais, no dia em que vos fiz sair da terra do Egito, em relao ao holocausto e ao sacrifcio. Mas eu lhes ordenei isto: Escutai a minha voz, e eu serei o vosso Deus e vs sereis o meu povo. Andai em todo caminho que eu vos ordeno para que vos suceda o bem. E no escutaram nem prestaram ouvido; andaram conforme os seus desgnios, na dureza de teu corao perverso, e deram as costas em vez da face. Desde o dia em que vossos pais saram da terra do Egito at hoje, enviei-vos todos os meus servos, os profetas; cada dia eu os enviei, incansavelmente. E eles no me escutaram, nem prestaram ouvidos, mas endureceram a sua cerviz e foram piores do que seus pais. Tu lhes dirs todas estas palavras, mas eles no te escutaro. Tu os chamars, e eles no te respondero. Tu lhes dirs: Esta a nao que no escutou a voz de Iahweh seu Deus, e no aceitou o ensinamento. A fidelidade pereceu: foi eliminada em sua boca.
Corta os teus cabelos consagrados e lana-os fora. Entoa sobre os cumes secos uma lamentao. Porque Iahweh desprezou e repudiou-a gerao de sua clera!

Profeta Ezequiel
Nascido em Jerusalm, admite-se que foi deportado para a Babilnia em 597 a.E.C. Ezequiel considerado um dos maiores escritores da Bblia e um dos mais populares em seu tempo. Seu estilo esteticamente elaborado, sua riqueza de imagens e cores resulta no bizarro, lembrando a literatura dos apocalipses e a literatura dos Midraschim. Seu livro tem sequncias onricas de grande beleza, bem como imagens assustadoras, maldies, ameaas e punies. A viso apocalptica e as especulaes msticas deste profeta foram fecundas e influenciaram vrias correntes da mstica judaica. Conhecido como o profeta do Senhor da Mercaba, a partir da que a sua ao proftica torna-se fecunda, destacando a onipotncia e a transcendncia de YHVH. No rastro da profecia clssica, Ezequiel previu a runa de Israel e igualmente falou do seu reerguimento, da restaurao nacional, transformando a responsabilidade individual pelos pecados na verdadeira essncia da religio judaica. Para Ezequiel, uma vez liberto, o povo ser restaurado e a organizao do culto ser a condio para que no ressurjam as desgraas anteriores. As passagens do livro de Ezequiel apresentadas nesta coletnea so: 34-37. Referncias Guinsburg, J., Do Estudo e da Orao, So Paulo, Perspectiva, 1968, pp. 51/58. Johnson, Paul, Histria dos Judeus, Rio de Janeiro, Imago, 1989, p. 87.

Sim, os filhos de Jud praticaram o mal diante de meus olhos, orculo de Iahweh. Eles colocaram suas Abominaes no Templo, no qual o meu Nome invocado, para profan-lo. Eles destruram os lugares altos de Tofet no vale de Ben-Enom, para queimar os seus filhos e as suas filhas, o que eu no tinha ordenado e nem sequer pensado. Por isso, eis que dias viro orculo de Iahweh em que no se dir mais Tofet nem vale de Ben-Enom, mas sim vale da Matana. Eles enterraro em Tofet por falta de lugar. Os cadveres desse povo sero alimento para os pssaros do cu e para os animais da terra, e ningum os incomodar. Eu farei cessar nas cidades de Jud e nas ruas de Jerusalm a voz de jbilo e a voz de alegria, a voz do noivo e a voz da noiva, porque a terra tornar-se- uma runa.

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Profeta Ezequiel

A palavra de Iahweh me foi dirigida nestes termos: Filho do homem, profetiza contra os pastores de Israel, profetiza e dize-lhes: Pastores, assim diz o Senhor Iahweh: Ai dos pastores de Israel que se apascentam a si mesmos! No devem os pastores apascentar o seu rebanho? Vs vos alimentais com leite, vs vestis de l e sacrificais as ovelhas mais gordas, mas no apascentais o rebanho! No restaurastes o vigor das ovelhas abatidas, no curastes a que est doente, no tratastes a ferida da que sofreu fratura, no reconduzistes a desgarrada, no buscastes a perdida, mas dominastes sobre elas com dureza e violncia. Por falta de pastor, elas dispersaram-se e acabaram por servir de presa para todos os animais do campo; e se dispersaram. O meu rebanho dispersou-se por todos os montes, por todos os outeiros elevados e por toda a superfcie da terra dispersou-se o meu rebanho. No h quem o procure ou quem v em sua busca. Portanto, pastores, ouvi a palavra de Iahweh. Por minha vida, orculo do Senhor Iahweh, eu vos asseguro: Visto que o meu rebanho objeto de saque e serviu de presa a todos os animais do campo, por no terem pastor, pois que os meus pastores no se preocupam com o meu rebanho, porque eles apascentam a si mesmos, mas no apascentam o meu rebanho, por isso, pastores, ouvi a palavra de Iahweh. Assim diz o Senhor Iahweh: Eis-me contara os pastores. Das suas mos requererei prestao de contas a respeito do rebanho e os impedirei de apascentar meu rebanho. Deste modo os pastores no tornaro a apascentar-se a si mesmos. Livrarei minhas ovelhas da sua boca e no continuaro a servir-lhes de presa. Com efeito, assim diz o Senhor Iahweh: Certamente eu mesmo cuidarei do meu rebanho e o procurarei. Como um pastor cuida do seu rebanho, quando est no meio das suas ovelhas dispersas, assim cuidarei das minhas ovelhas e as recolherei de todos os lugares por onde se dispersaram em um dia de nuvem e de escurido. Tr-las-ei dentre os
Texto extrado da Bblia de Jerusalm,, So Paulo, Edies Paulinas, 1985, captulos 34, 35,36 e 37, p. 1656. 38
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povos, reuni-las-ei dentre as naes estrangeiras e reconduzi-las-ei para o seu solo, apascentando-as sobre os montes de Israel, nas margens irrigadas dos seus ribeiros e em todas as regies habitveis da terra. Apascent-las-ei em um bom pasto, sobre os altos montes de Israel tero as suas pastagens. A repousaro em um bom pasto e encontraro forragem rica sobre os montes de Israel. Eu mesmo apascentarei o meu rebanho, eu mesmo lhe darei repouso, orculo do Senhor Iahweh. Buscarei a ovelha que estiver perdida, reconduzirei a que estiver desgarrada, pensarei a que estiver fraturada e restaurarei a que estiver abatida. Quanto gorda e vigorosa, guard-la-ei e apascent-la-ei com o direito. Quanto a vs, minhas ovelhas, assim diz o Senhor Iahweh: Eis que vou julgar entre ovelha e ovelha, entre carneiros e bodes. Porventura vos parece pouco o pastardes no melhor pasto, mas ainda pisais o resto do pasto com vossos ps, ou beberdes a gua lmpida, mas ainda turvais o resto com vossos ps? E asminhas ovelhas ho de pastar o pisado pelos vossos ps e o turvado pelos vossos ps? Pois bem, assim diz o Senhor Iahweh: Eis que vou julgar entre a ovelha gorda e a ovelha magra. Visto que empurrastes com os ombros e com os lados, escorneastes as ovelhas abatidas, a ponto de afugent-las para longe, eu mesmo vou trazer salvao ao meu rebanho, de modo que no mais sejam saqueadas. Sim, eu mesmo julgarei entre ovelha e ovelha. Suscitarei para elas um pastor que as apascentar, a saber, o meu servo Davi: ele is apascentar, ele lhes servir de pastor. E eu, Iahweh, serei o seu Deus e meu servo Davi ser prncipe entre elas. Eu, Iahweh, o disse. Concluirei com elas uma aliana de paz e extirparei da terra as feras, de modo que habitem no deserto em segurana e durmam nos seus bosques. Distribu-las-ei nos arredores do meu outeiro e trarei chuva no tempo certo, uma chuva abenoada. A rvore do campo dar o seu fruto, a terra produzir a sua safra, e elas estaro seguras em sua terra e sabero que eu sou Iahweh, quando eu quebrar as varas do jugo e as libertar da mo dos que as sujeitavam. Elas no voltaro a servir de presa s naes e as feras no as devoraro. Elas habitaro tranquilas, sem que ningum as amedronte. Proporcionarei a elas uma lavoura famosa, de modo que no voltem a ser colhidas pela fome na terra, nem voltaro a sofrer a afronta das naes. Ento sabero que eu, Iahweh, estou com elas, e que elas constituem o meu
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povo, a casa de Israel, orculo do Senhor Iahweh. E vs, minhas ovelhas, vs sois o rebanho humano do meu pasto e eu sou o vosso Deus, orculo do Senhor Iahweh. A palavra de Iahweh me foi dirigida nestes termos: Filho do homem, dirige a tua face contra o monte de Seir e profetiza contra ele. Dize-lhe: Assim diz o Senhor Iahweh: eis que me oponho a ti, monte de Seir. Estenderei a minha mo contra ti e te reduzirei a uma solido e a um deserto. Das tuas cidades farei uma runa. Assim, sers uma solido e sabers que eu sou Iahweh. Por teres cultivado um dio eterno e teres entregue espada os filhos de Israel, no tempo da sua calamidade, no tempo em que chegou ao fim sua culpa. Por isso, pela minha vida, orculo de Iahweh, eu te cobrirei de sangue eo sangue te perseguir. Tu te tornaste culpado, derramando sangue. Pois agora o sangue te perseguir. Farei do monte de Seir uma desolao e um deserto. Extirparei dele todo aquele que percorre a terra. Encherei os seus montes de trespassados: trespassados espada cairo em seus outeiros, vales e barrancos. Reduzir-te-ei a uma desolao eterna. As tuas cidades no sero habitadas e assim sabereis que eu sou Iahweh. Visto que disseste: As duas naes e as duas terras sero minhas. Ns teremos a posse delas, apesar de Iahweh estar ali. Por isso mesmo, por minha vida, orculo do Senhor Iahweh, agirei contigo de acordo com a ira e o cime com que te manifestaste contra eles em virtude do teu dio. Serei conhecido entre eles pela maneira por que eu te julgar. E sabers que eu, Iahweh, ouvi todos os insultos que pronunciaste contra os montes de Israel, dizendo: Eles esto reduzidos a uma desolao; eles nos foram dados para que os devorssemos. Levantaste a tua voz contra mim: muitos foram os teus discursos contra mim. Eu ouvi tudo. Assim diz o Senhor Iahweh: Para a alegria de toda a terra, farei de ti uma desolao. Como tu te alegrastes, porque a herana da casa de Israel ficou desolada, farte-ei o mesmo. Ficars desolado, monte de Seir, bem como todo o Edom, e sabero que eu sou Iahweh. Tu, filho do homem, profetiza aos montes de Israel e dize: Montes de Israel, ouvi a palavra de Iahweh. Assim diz o Senhor Iahweh: Pois que o inimigo disse, referindo-se a vs: Viva! Estes lugares altos eternos nos so
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dados como possesso: Profetiza e dize: Assim diz o Senhor Iahweh: Visto que vos devastaram e vos apanharam de todos os lados, a fim de que visseis a ser possesso do resto das naes, expostos ao falatrio e difamao dos povos, por esta razo, montes de Israel, ouvi a palavra do Senhor Iahweh. Assim diz o senhor Iahweh aos montes, aos outeiros, aos despenhadeiros e aos vales, s runas em desolao e s cidades abandonadas, entregues ao saque e zombaria das demais naes ao redor de ns. Pois bem, assim fala o Senhor Iahweh. Certamente no ardor do meu cime falei a respeito do resto das naes e a respeito de todo o Edom, que distriburam entre si a minha terra como possesso, com alegria de corao e desprezo da alma, a fim de saquearem os seus pastos. Portanto, profetiza a respeito da terra de Israel e dize s montanhas, aos outeiros, aos despenhadeiros e aos vales: Assim diz o Senhor Iahweh: Eis que falo no meu cime e na minha clera: pois que suportais o oprbrio das naes, assim diz o Senhor Iahweh: Estendi a minha mo e asseguro solenemente que as naes que vos cercam tero de suportar elas mesmas o seu oprbrio. E vs, montes de Israel, produzireis para o meu povo de Israel os vossos ramos e os vossos frutos, pois que ele h de voltar em breve. Com efeito, eu venho ter convosco, volto para vs e vs sereis lavrados e semeados. Multiplicarei os homens que ho de habitar sobre vs, a saber, toda a casa de Israel. As cidades sero habitadas e as runas, reedificadas. Multiplicarei sobre vs os homens e o gado: eles se multiplicaro e frutificaro. Farei com que sejais habitados como antes e vos assegurarei condies melhores do que as de outrora, e sabereis que eu sou Iahweh. Farei com que os homens tomem posse de vs, meu povo, Israel. Eles te possuiro e tu sers a sua herana e no tornars a priv-los dos seus filhos. Assim diz o Senhor Iahweh: Dizem de ti: Tu s uma devoradora de homens, tu privas de filhos a tua nao. Pois bem, no voltars a devorar os homens e no tornars a desfilhar a tua nao, orculo do Senhor Iahweh. Farei com que no voltes a ouvir os insultos das naes, no tornars a suportar a zombaria dos povos, nem voltars a privar a nao dos seus filhos, orculo do Senhor Iahweh.
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A palavra de Iahweh me foi dirigida nestes termos: Filho do homem, a casa de Israel, que habitava a sua terra, contaminou-a com o seu comportamento e com as suas aes, como a impureza de uma mulher no seu incmodo. Tal foi o seu comportamento diante de mim. Ento, derramei sobre eles a minha clera, em virtude do sangue que derramaram na terra e em virtude dos dolos imundos com os quais a contaminaram. Espalhei-os por entre as naes e eles foram dispersos por terras estrangeiras. Puni-os de acordo com o seu comportamento e com as suas aes. E nas naes para onde se dirigiram, profanaram o meu santo nome, pois se dizia deles: Este o povo de Iahweh. Eles tiveram que sair da sua terra. Mas eu tive considerao com o meu santo nome, que a casa de Israel profanou entre as naes para as quais se dirigiram. Por isso irs casa de Israel: Assim diz o Senhor Iahweh: No em considerao a vs que estou agindo assim, casa de Israel, mas sim por causa do meu santo nome, que vs profanastes entre as naes para as quais vos dirigistes. Santificarei o meu grande nome, profanado entre as naes, porque vs o profanastes entre eles, e sabero que eu sou Iahweh, orculo do Senhor Iahweh. Santificarei o meu grande nome; que foi profanado entre as naes, porque vs o profanastes no meio delas, e sabero as naes que eu sou Iahweh orculo do Senhor Iahweh , quando eu for santificado em vs aos seus olhos, quando eu vos tomar dentre as naes e vos reunir de todas as terras, reconduzindo-vos vossa terra. Borrifarei gua sobre vs e ficareis puros; sim, purificar-vos-ei de todas as vossas imundcies e de todos os vossos dolos imundos. Dar-vos-ei um corao novo, porei no vosso ntimo um esprito novo, tirarei do vosso peito o corao de pedra e vos darei um corao de carne. Porei no vosso ntimo o meu esprito e farei com que andeis de acordo com os meus estatutos e guardeis as minhas normas e as pratiqueis. Ento habitareis na terra que dei a vossos pais: sereis o meu povo e eu serei o vosso Deus; libertar-vos-ei de todas as vossas impurezas. Chamarei o trigo e o multiplicarei e j no vos entregarei fome. Multiplicarei os frutos das rvores e o produto do campo, a fim de no voltardes a sofrer o oprbrio da fome entre as naes. Ento vos lembrareis dos vossos maus caminhos e das vossas aes que no eram boas e sentireis asco de vs mesmos em virtude das vossas maldades e abominaes. Agirei assim, no por considerao para convosco orculo
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do Senhor Iahweh sabei-o bem e envergonhai-vos. Deveis sentir pejo do vosso mau caminho, casa de Israel. Assim diz o Senhor Iahweh: No dia, em que eu vos purificar de todas as iniquidades, farei com que sejam habitadas as vossas cidades e reconstrudas as vossas runas. E a terra desolada voltar a ser cultivada, em lugar da solido que havia antes aos olhos de todos os que passavam. Ento diro: Esta terra que era uma desolao est agora como o jardim do den, e as suas cidades, antes em runa, desoladas e arrasadas, constituem agora fortalezas habitadas. As naes que sobrarem em torno de vs sabero que eu, Iahweh, reconstru estas cidades arrasadas e replantei estes desertos. Eu, Iahweh, o disse e o fao. Assim diz o Senhor Iahweh: Ainda isto farei por eles: consentirei em ser procurado pela casa de Israel e os multiplicarei como um rebanho humano. Como um rebanho consagrado, como rebanho em Jerusalm por ocasio das assembleias solenes, tais sero as cidades arrasadas, cheias de um rebanho humano, e sabero que eu sou Iahweh. A mo de Iahweh veio sobre mim e me conduziu para fora pelo esprito de Iahweh e me pousou no meio de um vale que estava cheio de ossos. E a fez com que eu me movesse em torno deles de todos os lados. Os ossos eram abundantes na superfcie do vale e estavam muito secos. Ele me disse: Filho do homem, porventura tornaro a viver estes ossos? Ao que respondi: Senhor Iahweh, tu o sabes. Ento me disse: Profetiza a respeito destes ossos e dize-lhes: Ossos secos, ouvi a palavra de Iahweh. Assim fala o Senhor Iahweh a estes ossos: Eis que vou fazer com que sejais penetrados pelo esprito e vivereis. Cobrirvos-ei de tendes, farei com que sejais cobertos de carne e vos revestirei de pele. Porei em vs o meu esprito e vivereis. Ento sabereis que eu sou Iahweh. Profetizei, de acordo com a ordem que recebi. Enquanto eu profetizava, houve um rudo e depois um tremor e os ossos se aproximaram uns dos outros. Vi ento que estavam cobertos de tendes, estavam cobertos de carne e revestidos de pele por cima, mas no havia esprito neles. Ento me disse: Profetiza ao esprito, profetiza, filho do homem, e dize-lhe: Assim diz o Senhor Iahweh: Esprito, vem dos quatro ventos e sopra sobre estes ossos para que vivam. Profetizei
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de acordo com o que ele me ordenou, o esprito penetrou-os e eles viveram, firmando-se sobre os seus ps como um imenso exrcito. Ento ele me disse: Filho do homem, estes ossos representam toda a casa de Israel, que est a dizer: Os nossos ossos esto secos, a nossa esperana est desfeita. Para ns est tudo acabado. Pois bem, profetiza e dize-lhe: Assim diz o Senhor Iahweh: Eis que vou abrir os vossos tmulos e vos farei subir dos vossos tmulos, meu povo, e vos reconduzirei para a terra de Israel. Ento sabereis que eu sou Iahweh, quando eu abrir os vossos tmulos e vos fizer subir de dentro deles, meu povo. Porei o meu esprito dentro de vs e haveis de reviver: eu vos reporei em vossa terra e sabereis que eu, Iahweh, falei e hei de fazer, orculo de Iahweh. A palavra de Iahweh me foi dirigida nestes termos: E tu, filho do homem, toma uma acha de lenha e escreve sobre ela: Jud e os filhos de Israel que esto com ele. Em seguida tomars outra acha de lenha e escrevers sobre ela: Jos (acha de Efraim) e toda a casa de Israel que est com ele. Aproxima-as uma da outra, de modo que formem uma s acha de lenha; que elas formem uma s na tua mo. Ora, quando os filhos do teu povo te perguntarem: No nos explicars o que queres dizer com isto? Tu lhes dirs: Assim diz o Senhor Iahweh: Eu vou tomar a acha de lenha que Jos (a qual est na mo de Efraim) e as tribos de Israel que esto com ele, e as juntarei acha de lenha que Jud, e farei delas uma s acha de lenha, de modo que sejam uma s acha em minha mo. As achas de lenha sobre as quais escreveste estaro em tua mo diante dos seus olhos. Dize-lhes: Assim diz o Senhor Iahweh: Eis que vou tomar os filhos de Israel dentre as naes, para as , quais foram levados, e reuni-los-ei de todos os povos e os reconduzirei para a sua terra, e farei deles uma s nao na terra, nos montes de Israel, e haver um s rei para todos eles. J no constituiro duas naes, nem tornaro a dividir-se em dois reinos. No voltaro a contaminar-se com os seus dolos imundos, com as suas abominaes e com todas as suas transgresses. Hei de salv-los das suas apostasias com que pecaram e hei de purific-los, para que sejam o meu povo e eu seja o seu Deus. O meu servo Davi ser rei sobre eles, e haver um s pastor para todos, e andaro de acordo com as minhas normas
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e guardaro os meus estatutos e os praticaro. Habitaro na terra que dei ao meu servo Jac, terra em que habitaram os vossos pais. Nela habitaro eles, os seus filhos e os filhos dos seus filhos para sempre, e Davi, o meu servo, ser o seu prncipe para sempre. Concluirei com eles uma aliana de paz, a qual ser uma aliana eterna. Estabelec-los-ei e os multiplicarei, e porei o meu santurio no meio deles para sempre. A minha Habitao estar no meio deles: eu serei o seu Deus e eles sero o meu povo. Assim sabero as naes que eu sou Iahweh, aquele que santifica Israel, quando o meu santurio estiver no meio deles para sempre.

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O Talmud Sanhedrin (Sindrio)

O Talmud formado por dois subconjuntos a Mishn e a Guemar , desenvolvidos simultaneamente em duas verses o Talmud da Babilnia e o Talmud de Jerusalm sendo que a primeira tornou-se a mais difundida. O Sanhedrin, quarto tratado na ordem Mishn do Talmud, significa Corte da Justia, referindo-se ao grande Bet Din que compreende 71 eruditos ordenados e cortes subordinadas compostas de 23 juzes funcionando em vrias cidades. No Talmud, as indicaes sobre o Messias e a sua vinda so poucas, dispersas e nem sempre congruentes. A tradio rabnica incentivou a crena no Messias mas desestimulou elucubraes sobre quando e como ele chegaria. Somente a tradio mstica judaica (Kabala) se aventurou neste terreno. Em geral, o tratado descreve a composio e o poder das cortes de diferentes tipos e graus, o procedimento legal e a lei criminal. O texto apresentado nesta coletnea captulo VI retrata os tempos que precedem a vinda do Messias e a discusso sobre se a redeno de Israel, atravs do Messias, depende do arrependimento de seu povo. Referncia Enciclopaedia Judaica, N.Y., The Macmillan Company, 1972, vol. 14, p. 839.

O Talmud Sanhedrin (Sindrio)1

Rabi Nachman disse a Rabi Isaac: Ouviu dizer quando chegar Bar Nafle?2 Quem Bar Nafle? indagou ele. Messias, respondeu. Chama o Messias de Bar Nafle? Mesmo assim, replicou, conforme est escrito, Naquele dia levantarei [97a] o tabernculo de Davi ha-nofeleth [que est cado].3 Ele respondeu, Assim falou Rabi Johanan: Na gerao em que vier o filho de Davi [isto , o Messias], os eruditos sero poucos, e quanto aos demais, seus olhos falharo por tristeza e desgosto. Inmeras calamidades e decretos malignos sero novamente promulgados, cada novo mal chegando com pressa antes de o outro ter terminado. Nossos rabinos ensinaram: No ciclo de sete anos ao fim do qual vir o filho de Davi no primeiro ano este versculo se cumprir: E farei chover sobre uma cidade e sobre outra no;4 no segundo, as flechas da fome sero lanadas;5 no terceiro, uma grande fome, no decurso da qual homens, mulheres e crianas, devotos e santos6 iro morrer, e a Tor ser esquecida por seus estudantes; no quarto, abundncia parcial;7 no quinto, grande abundncia, quando homens iro comer, beber e se rejubilar, e a Tor voltar aos seus discpulos; no sexto, sons [celestiais];8 no stimo, guerras; e ao trmino do setnio vir o filho de Davi. Rabi Joseph contestou: Mas tantos setnios j passaram, e no entanto ele no veio!- Refutou Abaye:

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1 Texto extrado do The Babylonian Talmud Sanhedrin Seder Nezikin, vol. III. London, The Soncino Presa, 1935, p. 654. 2 Lit., filho dos cados. Bar Nafle geralmente presumido como representando os gregos. O filho das nuvens; cf. Daniel VII, 13. eis que vinha com as nuvens do cu um como um filho do homem, ao que Rabi Nachman deu uma conotao hebraica. 3 Ams, IX, 11. 4 Ibid., IV, 7. 5 Isto , no realmente fome, mas os primeiros sinais disso, ningum estando completamente satisfeito. 6 Lit., homens pelos quais ocorrem milagres Jast. 7 Lit., muito e no muito. 8 Ou vozes celestiais anunciando o advento do Messias ou os toques do grande Shofar; cf. Isaas XXVII, 13. 47

Houve ento sons [celestiais] no sexto e guerras no stimo! Alm do mais, estiveram elas [as calamidades] nessa ordem!9 [Com que, Senhor, teus inimigos tm vilipendiado; com que eles tm vilipendiado os passos do teu ungido.]10 Foi ensinado, disse Rabi Judah: Na gerao em que vier o filho de Davi, a casa de reunies11 ser para meretrizes, a Galileia estar em runas, Gablan despovoada,12 os habitantes da fronteiras13 vagando de cidade em cidade, sem receber hospitalidade, a sabedoria dos escribas desdenhada. Homens tementes a Deus desprezados, pessoas14 impudentes,15 e a verdade inteiramente ausente, como est escrito, Sim, a verdade sumiu, e quem se desvia do mal tratado como presa.16 O que significa sim, a verdade sumiu [needereth]? Os Eruditos da Escola de Rab17 disseram: Isto ensina que vai se dividir em grupos separados18 e partir.19 Qual o significado de e quem se desvia do mal faz de si prprio uma presa [mishtollel)? A Escola de Rabi Shila diz: Aquele que se desvia do mal ser chamado de tolo por seus semelhantes.20 Raba disse: Eu costumava inicialmente pensar que no havia verdade no mundo.21 Ao que um dos rabinos, cujo nome era Rabi Tabuth dizem outros que era Rabi Tabyomi que, mesmo se lhe fossem dados todos os tesouros do mundo, no iria mentir, me contou que certa vez ele chegou a
9 Embora calamidades e decretos malignos tivessem vindo em abundncia, no estavam na ordem prescrita. 10 Salmos. LXXXIX, 52. 11 Onde eruditos se renem. 12 [Gablan, a leste do Mar da Galileia e do Jordo superior.] 13 Os judeus vivendo junto s fronteiras da Palestina os homens de (a Sala das) Pedras Talhadas, isto , o Sanhedrin. 14 Lit., o rosto da gerao. 15 Isto , descaradas, sem vergonha umas das outras. 16 Isaas, LIX, 15. 17 V. p. 387, n. 7. 18 Adarim, adarim. se relaciona ao significado de bando, grupo. 19 Provavelmente significando que haver tantas opinies conflitantes quanto ao que verdade que esta se tomar, para quaisquer fins prticos, inacessvel. 20 Cf. J XII, 17: os conselheiros leva os despejados do seu cargo, e aos juzes faz desvairar. Sholal sendo paralelo a todos, leva a mesma conotao. 21 Isto , nenhuma pessoa fala sempre a verdade. 48

um lugar chamado Kushta,22 onde ningum jamais dizia mentiras, e onde nenhum homem morria antes do tempo. Ento ele casou com uma das mulheres deles, com quem teve dois filhos. Um dia estava sua esposa sentada e lavando seu cabelo quando chegou uma vizinha e bateu na porta. Pensando consigo mesmo que no ficaria bem [dizer a ela que sua esposa estava se lavando], ele disse: Ela no est aqui. [Como castigo por isso] seus dois filhos morreram. Vieram ento pessoas da cidade e o interrogaram: Qual a causa disso? A eles lhes relatou o que havia acontecido. Rogamos-lhe, responderam eles, saia desta cidade e no incite a Morte contra ns.23 Foi ensinado, Rabi Nehorai disse: Na gerao em que vier o Messias, os moos insultaro os velhos, e os velhos ficaro de p diante dos moos [para honr-los]; as filhas se levantaro contra suas mes, e as noras contra suas sogras. As pessoas ficaro descaradas, e um filho no se envergonhar na presena de seu pai. Foi ensinado, Rabi Nehemiah disse: Na gerao da vinda do Messias o impudor vai aumentar, a estima ser pervertida,24 o vinhedo produzir seu fruto, mas o vinho ser caro,25 e o Reino se converter heresia26 com ningum para censur-los. Isso apia Rabi Isaac, que disse: O filho de Davi s vir quando o mundo inteiro estiver convertido crena dos hereges. Raba disse: Que versculo [prova isso]? Tudo se tornou branco: ele est limpo.27

Lit., verdade. Lit., contra estes homens. 24 Isto , ningum ter estima por outro. Outra opinio: mesmo os mais estimados sero pervertidos e enganadores. 25 Todos estaro embriagados, de modo que, a despeito da produo, abundante, haver escassez. 26 [Hebr. Minuth. O Reino significa o Imprio Romano, e a afirmao uma notvel previso de Rabi Nehemias (150 a.C.) da coverso de Roma ao Cristianismo sob Constantino o Grande em 313; v., contudo, Herford, Christianity in the Talmud, 207, ss.]. 27 Levtico, XIII, 13. Isso se refere lepra: uma inchao branca um sintoma de impureza; no obstante, se a pele toda estiver assim afetada, ela declarada limpa. Assim, tambm aqui, todos sendo hereges, isso um sinal de que o mundo est a ponto de ser purificado pelo advento do Messias. 49
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Nossos rabinos ensinaram: Porque o Senhor julgar seu povo, e se compadecer dos seus servos, quando vir que o seu poder se foi, e j no h nem escravo nem liberto;28 o filho de Davi s vir quando houver denunciantes em abundncia.29 Outra interpretao [de seu poder se foi]: at haver poucos eruditos. Outra interpretao: at que a [ltima] perutah tenha sado da bolsa. Ainda outra interpretao: at no haver mais esperana de redeno, pois est escrito, j no h nem escravo nem liberto, como se fosse possvel [diz-lo] Israel no tivesse nem Defensor nem Auxiliador. Mesmo como Rabi Zera, que, sempre que se encontrava por acaso com eruditos tratando disso [isto , calculando o tempo do advento do Messias], dizia a eles: Eu lhes peo, no o adiem, pois foi ensinado: Trs chegam inesperadamente30 o Messias, um objeto achado e um escorpio.31 Rabi Kattina disse: Seis mil anos existir o mundo, e um [mil, o stimo] ficar despovoado, conforme est escrito, E somente o Senhor ser exaltado naquele dia.32 Abaye disse: Ficar despovoado dois [mil], conforme est dito, Depois de dois dias nos reanimar: no terceiro dia nos levantar, e viveremos diante dele.33 Foi ensinado de acordo com Rabi Kattina: Assim como o stimo ano um ano de remisso em sete, igual o mundo: mil anos em sete ser sem cultivo, conforme est escrito, E somente o Senhor ser exaltado naquele dia: e est dito tambm, Um Salmo e cntico para o Sabbat,34 significando o dia que inteiramente Sabbat35 e est igualmente dito, Pois mil anos aos teus olhos so como o dia de ontem se foi.36

O Tanna debe Eliyyahu ensina: O mundo existir seis mil anos.Nos primeiros dois mil anos houve desolao;37 por dois mil anos a Tora floresceu,38 e os dois mil anos seguintes so a era messinica,39 mas devido a nossas muitas iniquidades esses anos todos se perderam.40 Elijah disse a Rabi Judah, o irmo de Rabi Salla, o Pio: O mundo existir no menos que oitenta e cinco jubileus,41 e no ltimo jubileu vir o filho de Davi.42 Perguntou-lhe ele, No incio ou no fim?.43 Respondeu: Eu no sei. Dever [esse perodo] ser completado ou no?44 Eu no sei, respondeu. Rabi Ashi disse: Ele assim lhe falou, Antes disso, no o espere; depois, pode aguard-lo.45 Rabi Chanan b. Tachlifa mandou [dizer] a Rabi Joseph: Certa vez conheci um homem que possua um pergaminho escrito em hebraico com caracteres assrios.46 Disse eu a ele: Como lhe chegou isso? Respondeu: Empreguei-me como mercenrio no exrcito romano, e achei isso no meio dos arquivos romanos. Neles se afirma que quatro mil, duzentos e trinta47 e um ano aps a criao o mundo ficar rfo.48 Quanto aos anos subsequentes alguns deles sero gastos com a guerra dos grandes monstros
37 Isto , sem Tor. uma tradio que Abrao estava com 52 anos, quando comeou a converter homens adorao do verdadeiro Deus; de Ado at ento haviam transcorrido dois mil anos. 38 Isto , no 52 ano de Abrao at 172 anos aps a destruio do Segundo Templo. No significa isso que depois a Tor deveria acabar, sendo a meno apenas para distinguir essa era da seguinte. 39 Isto , o Messias vir nesse perodo. 40 Ele deveria ter vindo ao incio dos ltimos dois mil anos; o atraso devido aos nossos pecados. 41 De cinquenta anos. 42 [Messias. A crena na descendncia davdica j mencionada nos Salmos de Salomo XVII, 21.] 43 Dos ltimos cinquenta anos. 44 Isto , se ao fim do jubileu, ser no incio ou no fim do 50 ano? 45 Ele certamente no vir antes disso, mas depois poder demorar muito. 46 O carter quadrado das letras hebraicas, assim denominado por causa da grande semelhana com a escrita aramaica, sendo o nome Assria aqui usando no sentido mais amplo, para incluir os pases do Mediterrneo habitados pelos arameus. 47 Assim o Gaon de Vilna; v. A. Z.9b; nossas edies do noventa. 48 Em grande aflio, como um rfo que no tem ningum para cuidar dele. 51

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Deuteronmio XXXII, 36. Quando vir que seu poder se foi interpretado como significando que estaro merc de informantes; ento Deus julgar seu povo ir redimi-lo atravs do Messias. 30 Lit., quando a mente est distrada. 31 Donde em pensando nele estavam adiando sua chegada. 32 Isaas II, 11. 33 Oseias VI, 2: os dois dias significando dois mil anos. Cf. Salmos XC, 4 citado a seguir. 34 Salmos XCII, 1. 35 Isto , o perodo de completo abandono. 36 Salmos XC, 4: assim dia nos Versculos precedentes significa mil anos. 50

marinhos,49 e alguns na guerra entre Gog e Magog, e o [perodo] restante ser a era messinica, enquanto o Santssimo, louvado seja Ele, renovar seu mundo somente aps sete mil anos. Rabi Abba, o filho de Raba disse: A afirmao foi aps cinco mil anos. Foi ensinado: Rabi Nathan disse: Esse versculo penetra e desce ao verdadeiro abismo:50 Porque a viso ainda est para se cumprir no tempo determinado, mas no fim se expressar, e no falhar; se tardar, espera por ela, porque certamente vir, no tardar.51 No como nossos Mestres, que interpretaram o versculo at um tempo, dois tempos e metade de um tempo;52 nem como Rabi Simlai, que explicou D-lhes a comer po de lgrimas; e lgrimas a beber uma terceira vez,53 nem como Rabi Akiba que explicou, Ainda Uma vez dentro em pouco, farei abalar os cus e a terra54 mas a primeira dinastia [a saber, os Hasnioneus] durar setenta anos, a segunda [a Herodiana] cinquenta e dois, e o reinado de Bar Kochba dois anos e meio.55 O que significa mas no fim se expressar [we-yafeach] e no mentir? Disse Rabi Samuel b. Nachmani em nome de Rabi Jonathan: Destrudos sejam56 os ossos daqueles que calculam o fim.57 Pois diriam, como o tempo predeterminado chegou, e no entanto ele no chegou, ele nunca chegar. Mas [mesmo assim] o aguardem, pois est escrito, embora ele se atrase, espera. Se dissessem, Ns estamos aguardando [o seu advento] mas Ele no; por isso a Bblia diz: E por isso o Senhor espera,
Maharsha explica isso como uma referncia figurativa s grandes naes. Assim como no se pode alcanar o fundo de um abismo, assim tambm impossvel compreender o sentido integral desse versculo (Rashi). 51 Habacuc II, 3. 52 Daniel, VII, 25. 53 Salmos LXXX, 6. 54 Ageu II, 6. 55 Os versculos citados de Daniel, dos Salmos e de Ageu foram interpretados de modo a dar uma data precisa para o advento do Messias. Rabi Nathan, contudo, com base em Habacuc II, 3 afirma que todos esses clculos esto errados. Os trs versculos se referem aos Hasmoneus, aos Herodianos e ao reinado de Bar Kochha, mas o advento, do Messias incognoscvel. 56 O versculo dado como ele destruir aquele que calcular o fim. 57 Isto , o advento do Messias. 52
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para ter misericrdia de vs, e ser enaltecido, para se compadecer de vs.58 Mas como ns estamos esperando, e Ele tambm, o que atrasa [seu advento]? o Atributo de Justia que o atrasa.59 Mas como o Atributo de Justia que causa o atraso, por que estamos ns espera? Para sermos recompensados [por aguardar], pois est escrito bem aventurados todos os que esperam por ele.60 Abaye disse: O mundo precisa ter em cada gerao no mnimo trinta e seis homens justos, aos quais permitido [contemplar] o semblante da Shechin, pois est escrito Bem-aventurados todos os que esperam lo [por ele]; o valor numrico de lo trinta e seis. Mas no assim, pois no disse Raba: A fileira [de homens justos imediatamente] antes do Santssimo, louvado seja Ele, consiste de dezoito mil,61 pois no est escrito Sero dezoito mil em redor?62 Isso no dificuldade alguma: o nmero anterior [trinta e seis] refere-se queles que O vem atravs de um espelho brilhante e os outros so os que o contemplam atravs de um obscurecido.63 Mas h tantos assim? No disse Ezequias em nome de Rabi Jeremias por autorizao de Rabi Simenon b. Yochai: Eu vi os filhos do cu,64 mas so poucos; se h mil, eu e meu filho estamos includos; se forem cem, eu e meu filho estamos includos; e se somente dois, somos eles eu e meu filho? No h dificuldade: o nmero anterior [trinta e seis] se refere aos que entram [na barreira para contemplar a Shechin] com permisso; os outros [nmero incerto] so aqueles que podem entrar sem permisso. Rab disse: Todas as datas predestinadas [para redeno] j passaram, e a questo [agora] depende somente de arrependimento e boas aes. Mas Samuel sustenta: basta que um enlutado mantenha seu [perodo de] luto.65
Isaas XXX, 18. Isto , por no sermos ainda dignos dele. 60 Ibid. 61 Maharsha elimina parasanga. 62 Ezequiel XLVIII, 35. 63 Somente trinta e seis vem-nO com absoluta clareza. Os outros recebem Dele uma viso nublada. 64 Isto , aqueles que no futuro gozaro da viso da Shechin. 65 Os sofrimentos de Israel no Galut por si s justificam suficientemente sua redeno, independente de arrependimento. 53
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Essa questo contestada pelos Tanaim; Rabi Eliezer disse: Se Israel se arrepender, ser redimido; caso contrrio, no ser redimido. Disse-lhe Rabi Joshua: Se no se arrependerem, no sero redimidos! Mas o Santssimo, louvado seja Ele, vai submet-los a um rei, cujos decretos sero to cruis como os de Haman, pelo que Israel entrar em arrependimento, e assim ele os trar de volta ao caminho certo.66 Outro [Baraitha] ensinou: Rabi Eliezer disse: Se Israel se arrepender, ser redimido, conforme est escrito, Voltai, filhos rebeldes, eu curarei as vossas rebelies.67 Disse a ele Rabi Joshua: Mas no est escrito, Por nada vos vendestes, e sem dinheiro sereis resgatados?68 Por nada vos vendestes, por idolatria; e sem dinheiro sereis resgatados sem arrependimento e boas aes. Replicou Rabi Eliezer a Rabi Joshua: Mas no est escrito, Voltai a mim e eu voltarei a vs?69 Retorquiu Rabi Joshua: Mas no est escrito, Pois eu sou vosso senhor, e vos tomarei um de cada cidade, e dois de cada famlia, e vos levarei a Sion? Rabi Eliezer respondeu: Mas est escrito, Em voltar e sossegar est vossa salvao.70 Rabi Joshua respondeu: Mas no est escrito, Assim diz o Senhor, o Redentor e Santo de Israel quele que desprezado pelos homens, e detestado pelas naes, ao servo dos governantes: Reis vero e se levantaro, e prncipes tambm adoraro?71 Rabi Eliezer contestou: Mas no est escrito Se voltares,72 Israel diz o Senhor, volta para mim?73 Rabi Joshua respondeu: Mas em outra parte est escrito, Ouvi o homem vestido de linho, que estava sobre as guas do rio, quando levantou a mo direita e a esquerda ao cu, e jurou por aquele que vive eternamente, que isso seria depois de um tempo, dois tempos e metade de um tempo. E quando se

acabar a destruio do poder do povo santo estas coisas todas se cumpriro.74 Diante disso Rabi Eliezer permaneceu calado. Rabi Abba disse tambm: No pode haver mais evidente [sinal de] redeno que este: a saber, que est dito, Mas vs, montes de Israel vs produzireis os vossos ramos, e dareis o vosso fruto para o meu povo de Israel o qual est prestes a vir.75 Rabi Eleazar falou: Ento isso tambm, como est escrito, Porque antes daqueles dias no havia salrios para homens, nem os animais lhes davam ganho; E no havia paz para o que entrava nem para o que saa, por causa da desgraa.76 O que quer dizer no havia paz para o que entrava nem para o que saa, por causa da desgraa? Disse Rab: Mesmo para eruditos, a quem prometida a paz,77 como est escrito, Grande paz tm eles que tm a vossa lei,78 No haver paz por causa da desgraa. Disse Samuel, At que todos os preos sejam iguais.79 Rabi Chanina disse: O filho de Davi no vir at que um peixe seja procurado para um invlido e no possa ser conseguido, pois est escrito, Ento farei profundas as suas guas, e farei correr os seus rios

[No Talmud de Jerusalm a ltima frase, Mas o Santssimo... caminho certo dada como resposta de Rabi Eliezer a Rabi Joshua.] 67 Jeremias III, 22. 68 Isaas LII, 3 69 Malaquias III, 14: Sou vosso senhor implica mesmo contra vossa vontade isto , sem arrependimento de toda a nao (Rashi). 70 Isaas XXX, 15. 71 Ibid., XLIX, 7: ao que desprezado sugere que ainda um pecador no-arrependido (Rashi), ou que sua prostrao por si s trar a redeno (Yad Ramach). 72 Isto , vossa terra. 73 Jeremias IV, 1. 54

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74 Daniel XII, 7, provando assim que o advento do Messias depende apenas da prostrao total de Israel, e no de seu arrependimento. 75 Ezequiel XXXVI, 8. Quando a Palestina se tornar assim to frtil, o advento do Messias estar prximo, e no pode haver sinal mais claro do que esse (Rashi). 76 Zacarias VIII, 10; isto , quando no h mais nenhum dinheiro, e calamidades por toda parte. Cf. supra at que a perutah tenha sado da bolsa. 77 Lit., referente aos quais paz est escrito. 78 Salmos CXIX, 165. 79 Esta uma passagem difcil. Rashi a explica como significando que os preos de todos os artigos, como, por exemplo, trigo, vinho, azeite etc., sero idnticos, ou que todos os artigos sero igualmente caros. Mas difcil ver como isso explica no havia paz etc. Maharsha, consequentemente, associa esse versculo, para o que entrava ou saa com Ezequiel XLVI, 9: Mas quando vier o povo da terra perante o Senhor, nas festas solenes, aquele que entrar pela porta do norte, para adorar, sair pela porta do sul; e aquele que entrar pela porta do sul sair pela porta do norte... Consequentemente, ele interpreta: at que todas as portas sejam iguais, isto , a gente toda, quer esteja entrando ou saindo do Templo uma expresso denotando sem exceo ir sofrer. 55

como o azeite;80 embora esteja escrito,81 Naquele dia farei brotar o poder na casa de Israel.82 Rabi Chama b. Chanina disse: O filho de Davi no vir at que mesmo o mais insignificante dos reinos deixe [de ter poder] sobre Israel,83 conforme est escrito, Ele cortar os rebentos84 com podes, e cortar os ramos;85 e isso seguido por Naquele tempo ser levado um presente ao Senhor dos exrcitos de um povo que est disperso.86 Zeiri disse em nome de Rabi Chanina: O filho de Davi no vir enquanto houver homens presunosos em Israel, pois est escrito Ento tirarei do meio de vs os que exultam no vosso orgulho;87 o que seguido por Mas deixarei no meio de vs um povo pobre e afligido, e eles se refugiaro no nome do Senhor. 88 Rabi Simlai disse em nome de Rabi Eleazar, filho de Rabi Simeon: O filho de Davi no vir at que todos os juzes e dignitrios tenham sado de Israel, pois est escrito E voltarei contra vs a minha mo, e purificar-vosei das vossas escrias e tirarei de vs todo metal impuro. E restituir-vos-ei os vossos juzes, como no princpio.89 Ulla disse: Jerusalm s ser redimida por justia,90 pois est escrito, Sion ser redimida pelo direito, e seus convertidos pela justia. 91

Rabi Papa disse: Quando os arrogantes deixarem de existir [em Israel] os magos92 acabaro [entre os persas]; quando os juzes deixarem de existir [em Israel], acabaro igualmente os chiliarchi.93 Agora, quando os arrogantes deixarem de existir, os magos tambm acabaro, pois est escrito, E purificar-vos-ei de vossos arrogantes94 e tirarei de vs todo metal impuro.95 Quando os juzes deixarem de existir, acabaro igualmente os chiliarchi, pois est escrito, O Senhor retirou as sentenas que eram contra vs, lanou fora o vosso inimigo.96 Rabi Jochanan disse: Quando vires uma gerao minguando cada vez mais, espera por ele [o Messias], pois est escrito E salvars o povo aflito.97 Rabi Jochanan disse: Quando vires uma gerao afogada por muitos problemas como por um rio, espera-o, pois est escrito, quando o inimigo vier como uma torrente, o Esprito do Senhor levantar contra ele um estandarte;98 o que seguido por E vir o Redentor a Sion.99 Rabi Jochanan tambm disse: O filho de Davi s vir em uma gerao que seja ou inteiramente justa ou inteiramente m. Em uma gerao que seja inteiramente justa, pois est escrito, Todos os do vosso povo sero justos; para sempre herdaro a terra.100 Ou inteiramente m , pois est escrito, E viu que no havia homem algum, e admirou-se de que no houvesse um intercessor,101 e [em outra parte] est escrito, Por amor a mim, por amor a mim, que fao isto.102

80 Ezequiel XXXII, 14. Quando uma pelcula oleosa cobre a gua, no se pode pegar peixes uma previso dos estragos causados vida marinha nos tempos modernos por embarcaes que queimam leo em excesso? 81 [No mesmo sentido, lidando com a destruio do Egito (Maharsha).] 82 Ibid., XXIX, 21. 83 [Assim Maharsha. Rashi diz: at que mesmo o domnio mais insignificante acabe em Israel, isto , Israel ser privado de qualquer aparncia de poder.] 84 Metafrico para insignificantes reinos. 85 Isaas XVIII, 5. 86 Ibid., 7. 87 Sofonias III, 11. 88 Ibid., 12; isto , para eles vir o redentor. 89 Isaas I, 25 ss; isso prova que antes eles tm de ser removidos. 90 Isto , pelo exerccio da caridade. 91 Ibid, 27. 56

92 [Os guebros que eram responsveis por muito do sofrimento dos judeus sob os Sassnidas.] 93 [Persa Wezirpat, um governante. Funk, Schwarz Festschrift, p. 432]; o nome de uma classe de opressivos funcionrios persas. 94 Grande, arrogante. 95 Metaforicamente aplicado aos magos, como sendo um metal inferior. 96 Sofonias III, 15. 97 II Samuel, 28. 98 Isaas LIX, 19. 99 Ibid., 20. 100 Ibid., LX, 21. 101 Ibid., LIX, 16. 102 Ibid., XLVIII, 11. 57

Rabi Alexandri disse: Rabi Joshua b. Levi apontou uma contradio. Est escrito, em seu tempo [o Messias vir], conquanto tambm e suja escrito, Eu [o Senhor) apressarei isso!103 Se forem merecedores, eu o apressarei; se no, [ele vir] no devido tempo. Rabi Alexandri disse: Rabi Joshua ops dois versculos: est escrito, Eis que vinha com as nuvens do cu um como o filho do homem104 enquanto que [em outra parte] est escrito, [eis a o vosso rei...) humilde e montado num jumento!105 Se forem meritrios, [ele vir] com as nuvens do cu;106 se no, humilde e montado num jumento. O rei Shapur [I] disse a Samuel: Vs dizeis que o Messias vir montado num jumento; eu prefiro mandar-lhe um cavalo branco meu.107 Respondeu ele: Tendes um corcel de cem cores?108 Rabi Joshua b. Levi encontrou Elias de p junto entrada do tmulo de Rabi Simeon b. Yochai. Perguntou-lhe: Tenho eu uma poro no mundo por vir? Respondeu ele: Se este Mestre o desejar.109 Rabi Joshua b. Levi disse: Eu vi dois, mas ouvi a voz de um terceiro.110 Ele ento lhe perguntou: Quando vir o Messias? V e pergunte a ele mesmo, foi a resposta. Onde ele est sentado? Na entrada.111 E por qual sinal posso reconhec-lo? Ele est sentado entre os pobres leprosos; todos eles [as]112 desatam de uma vez, e voltam a reenfaix-las juntas,113 enquanto que ele desata e reenfaixa cada uma separadamente, [antes de tratar a seguinte],pensando, se me quiserem, [sendo hora para o meu aparecimento
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como o Messias] no devo ser atrasado [embora tendo de enfaixar muitas feridas]. Assim ele se aproximou dele e o saudou, dizendo A Paz esteja contigo, Mestre e Professor. A Paz esteja contigo, filho de Levi, respondeu. Quando que virs, Mestre?, indagou ele. Hoje, foi sua resposta. Ao retornar at Elias, este perguntou: O que foi que ele te disse? A Paz esteja contigo, filho de Levi, respondeu ele. Ao que [Elias] observou: Com isso ele assegurou a ti e a teu pai [uma poro] do mundo por vir. Ele me falou falsamente, retrucou, afirmando que viria hoje, mas no veio. Ele [Elias] lhe respondeu: Foi isso que ele te disse, Hoje, se ouvires sua voz.114 Os discpulos de Rabi Jos b. Kisma perguntaram-lhe: Quando vir o Messias? Ele respondeu: Temo que me peam um sinal [de que minha resposta seja correta]. Asseguraram-lhe: No lhe pediremos qualquer sinal. Ento ele lhes respondeu: Quando essa porta115 cair, for reconstruda, cair de novo, e mais uma vez reconstruda, e depois cair pela terceira vez, antes que possa ser reconstruda vir o filho de Davi. Disseram-lhe: Mestre, d-nos um sinal. Ele protestou: No me asseguraram de que no pediriam um sinal? Responderam: Mesmo assim [desejamos um]. Disse-lhes ele: Se assim , que as guas da gruta de Paneas se transformem em sangue; e elas se transformaram em sangue. Quando estava morrendo ele lhes disse: Ponham meu caixo bem fundo [na terra], pois no h na Babilnia uma palmeira a que no ser amarrado um cavalo persa, nem um caixo na Palestina do qual um cavalo da Mdia no comer palha.116 Rab disse: O filho de Davi no vir at que o poder [romano] envolva Israel117 por noves meses, pois est escrito, Portanto os entregar at o

Ibid., LX, 22; o versculo diz: Eu o Senhor apressarei isso a seu tempo. As duas frases so contraditrias, j que apressar implica antes do tempo apropriado. 104 Daniel VII, 13. 105 Zacarias IX, 7. 106 Velozmente (Rashi). 107 Isso mais apropriado. 108 Essa pilhria explicada por Krochmal (Hechalutz, I, p. 83) como um convite ostensivo aos judeus para auxiliarem Shapur em sua luta contra os romanos.] 109 Referia-se ele Shechin, que com eles estava (Rashi). Maharsha diz: quando forem dignos disso. 110 Isto , ele s viu ali ele mesmo e Elias, mas ouviu uma terceira voz a da Shechin. 111 Edies atuais trazem ... da cidade. O Gaon de Vilna elimina isso e substitui por de Roma. 112 As ataduras de suas feridas, para curativos. 113 Isto , se tm muitas feridas leprosas, eles primeiro retiram todas as ataduras e tratam cada ferida, e depois recolocam-nas juntas. 58

Salmos XCV, 7; assim ele tomou sua vinda condicional a condio no foi cumprida. [A porta de Caesarea Philippi, onde residia Rabi Jos. Sua queda seria um smbolo da destruio do poderio romano pelos partas. Bacher, AT. I. p. 402]. 116 Isso foi uma previso do futuro. Babilnia e Palestina seriam invadidas por persas, medas e partas e seus cavalos desencavariam os mortos, cujos caixes serviriam como manjedouras. 117 Isto , o mundo todo pelo qual Israel est disperso. 59
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tempo em que a que est em dores tiver dado luz; ento o restante de seus irmos voltar aos filhos de Israel.118 Ulla disse: Que ele [O Messias] venha, mas que eu no o veja.119 Rabbah disse igualmente: Que ele venha, e possa eu ser digno de sentar sombra da sela do seu jumento.120 Abaye perguntou a Rabbah: Qual a sua razo [para no desejar v-lo]? Digamos que por causa das dores de parto [precedendo o advento] do Messias?121 Mas tem sido ensinado, indagaram a Rabi Eleazar os discpulos: O que deve fazer um homem para ser poupado das agudas dores do Messias? [Respondeu ele] Que se dedique a estudo e benevolncia; e tu, Mestre, fazes ambos. Ele replicou: [Temo] que seja o pecado a caus-lo122 de acordo com [o ensinamento de] Rabi Jacob b. Idi, que contraps [dois versculos] [a saber] Est escrito, Eis que estou contigo, e te guardarei por onde quer que fores;123 mas est escrito Ento Jac teve medo e se perturbou124 Ele estava temeroso de que o pecado pudesse causar [a anulao da promessa de Deus]. Mesmo como foi ensinado, At que passe o teu povo, Senhor,125 isso se refere primeira entrada [na Palestina]: at que passe teu povo, que adquiriste,126 isso se refere segunda entrada deles. Da se pode concluir: Os israelitas eram to dignos de um milagre na segunda entrada quanto na primeira, mas o pecado causou isso [no acontecer]. Rabi Jochanan disse igualmente: Que ele venha, e que eu no o veja. Disse-lhe Resh Lakish: Por que isso? Digamos, porque est escrito, Como se um homem fugisse de um leo, e se encontrasse com um urso; ou entrando em casa, encostando a mo parede, fosse mordido por uma
Miqueias V, 2: portanto os entregar interpretado como significando a um poder estrangeiro ou seja, o romano e a durao de sua servido fixada por at o tempo etc., isto , nove meses, o perodo de gravidez. 119 V. n. 7. 120 [Seguindo o texto em Yalkut (v. Levy). Nossos textos dizem: esterco.] 121 Tais calamidades so geralmente referidas como dores de parto, por ser o trabalho de parto que precede o nascimento de uma nova era. 122 Que o pecado possa neutralizar os outros dois, e assim acabarei mesmo sofrendo. 123 Gnesis XXVIII, 15; falado por Deus a Jac. 124 Ibid. XXXII, 8; tendo em vista a promessa de Deus, por que teve medo? 125 xodo XV, 16. 126 Ibid. 60
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cobra?127 Mas venha, e lhe mostrarei que assim at mesmo nesse mundo. Quando algum vai ao campo e encontra um intendente,128 como se tivesse encontrado um leo. Quando entra na cidade, e abordado por um coletor de impostos, como se tivesse encontrado um urso. Entrando em casa, e vendo seus filhos e filhas com espasmos de fome, como se tivesse sido mordido por uma cobra!129 Mas [sua relutncia em ver o Messias] porque est escrito, Perguntai, pois, e vde, se acaso um homem tem dores de parto. Por que vejo, pois, cada homem [geber] com as mos na cintura, como uma mulher que est dando luz, e por que se tornaram plidos todos os rostos?130 O que significa por que vejo, pois, a cada geber? Raba b. Isaac disse em nome de Rab: Refere-se a Ele a quem toda geburah [fora] pertence.131 E qual o significado de e por que se tomaram plidos todos os rostos? Rabi Jochanan disse: [Refere-se isso ] famlia celeste [de Deus, isto , aos anjos] e sua famlia terrena [isto , Israel], quando. Deus diz: Estes [os no-judeus] so obra minha, e assim tambm so estes [os judeus]; como destruirei os primeiros por causa destes ltimos?132 Rabi Papa disse: Assim dizem os homens, Quando o boi corre e cai, o cavalo posto em seu estbulo.133 Disse Rabi Giddal em nome de Rabi: Os judeus esto destinados a comer [o bastante] nos dias do Messias.134 Rabi Joseph objetou: Isso no

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Ams V, 19. Que contesta seu direito ao campo (Jast.) Rashi traduz: um agrimensor oficial, que fixa os limites dos diferentes proprietrios, e assim pode aumentar ou reduzir a propriedade de algum. 129 Isto , ainda passamos agora pelas mesmas sucessivas agruras, sem o advento do Messias; por que, ento, ter medo disso? 130 Jeremias XXX, 6. 131 Isto , o prprio Todo-Poderoso deplora Israel em poder do no-judeu. 132 Para vingar os males sofridos pelos judeus. Porque o sofrimento seria to grande que at o Todo-Poderoso o lamentaria. Rabi Jochanan desejava ser poupado do advento do Messias. 133 O cavalo posto em seu lugar, mas quando o boi se restabelece, difcil remover o cavalo. Assim os israelitas, tendo cado, foram substitudos no poder pelos no-judeus; mas ao se restabelecerem ser difcil remover os no-judeus de sua posio sem infligir muito sofrimento. 134 Isto , os anos de abundncia que o Messias trar sero gozados pelos israelitas. 61

bvio, quem mais ento iria comer Hilek e Bilek?135 Isso foi dito em oposio a Rabi Hillel, que afirmava que no haveria nenhum Messias para Israel, uma vez que j tinham gozado dele durante o reinado de Ezequias.136 Rab disse: O mundo foi criado apenas por causa de Davi.137 Samuel disse: Por causa de Moiss.138 Rabi Jochanan disse: Por causa do Messias. Qual o nome dele [do Messias]? A Escola de Rabi Shila disse: Seu nome Sil, pois est escrito, at que venha Silo.139 A Escola de Rabi Yannai disse: Seu nome Yinnon, pois est escrito, Seu nome perdurar para sempre;140 enquanto resplandecer o sol seu nome Yinnon.141 A Escola de Rabi Chanin sustentava: Seu nome Chanin, pois est escrito, Onde eu no lhes darei Chanin.142 Outros dizem: Seu nome Menachem, filho de Ezequias, pois est escrito, Porque Menachem [o consolador], que devia aliviar a minha alma, est longe.143 Os Rabinos disseram: Seu nome o erudito leproso, pois est escrito, Certamente ele tomou sobre si as nossas dores, e levou sobre si as nossas tristezas: e ns o reputvamos um leproso, ferido de Deus e oprimido.144 Rabi Nachman disse: Se ele [o Messias] um daqueles que vivem [hoje], ele poderia ser como eu, pois est escrito, E seus nobres sero deles prprios, e seus governadores procedero do meio deles.145 Rab disse: Se ele dos vivos, seria o nosso Santo Mestre;146 se dos mortos, teria sido

Daniel o mais desejvel.147 Disse Rab Jud em nome de Rab: O Santssimo, louvado seja Ele, erguer um outro Davi para ns,148 pois est escrito, Mas serviro ao Senhor, meu Deus, e a Davi, seu rei, que lhes levantarei149 no Eu levantei, e sim levantarei, est dito. Disse Rabi Papa a Abaye: Mas est escrito, E Davi, meu servo, ser seu prncipe [nasi] eternamente?150 Por exemplo, um imperador e um vice-rei.151 Rabi Simlai exps: O que significa, Ai de vs, que desejais o dia do Senhor! Para que o desejais? o dia do Senhor de trevas, e no de luz.152 Isso pode ser comparado a um galo e um morcego que estavam esperanosamente aguardando a luz [isto , a aurora]. Disse o galo ao morcego: Espero pela luz porque tenho viso, mas que utilidade tem a luz para ti?153 E assim um Min154 disse a Rabi Abbahu: Quando vir o Messias? Ele respondeu: Quando a escurido cobrir essa gente.155 Est me amaldioando, exclamou. Ele replicou, apenas um versculo: Porque eis que as trevas cobriro a terra, e profunda escurido os povos; mas sobre ti resplandecer o Senhor, a glria Dele se ver sobre ti.156 Foi ensinado: Rabi Eliezer disse: Os dias do Messias duraro quarenta anos, pois est escrito, Durante quarenta anos segurarei essa gerao.157 Rabi Eleazar b. Azariah disse: Setenta anos, pois est escrito, E acontecer naquele dia que Tiro ficar esquecida setenta anos, segundo os dias de um rei.158 Ento, quem esse [singularmente distinto] rei? O
[Preferivelmente, se dos vivos, nosso santo Mestre (seria o tipo) do Messias; se dos mortos, Daniel.) 148 Lit., para eles. 149 Ibid., XXX, 9. 150 Ezequiel XXXVII, 25: prncipe (nasi) um ttulo inferior ao de rei. 151 O segundo Davi ser rei, e o Davi anterior ser seu vice-rei. 152 Ams V, 18. 153 Assim Israel deveria ter esperana de redeno, porque para eles ser um dia de luz: mas por que os no-judeus, j que para eles ser um dia de trevas? 154 V. p. 604, n. 12. 155 Aludindo ao perguntador e aos companheiros dele. 156 Isaas LX, 2. 157 Salmos XCV, 10: isto , domnio sobre eles atravs do Messias (descrito como Estive desgostoso) tem ligao com a raiz segurar. 158 Isaas XXIII, 15. 63
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Dois nomes fictcios qualquer fulano, beltrano e sicrano devero esses anos ser indiscriminadamente gozados por qualquer um? 136 Consequentemente, Rabi Giddal pe isso no futuro. 137 Para que ele pudesse cantar hinos e salmos a Deus. 138 Para que ele pudesse receber a Tor. 139 Gnesis XLIX, 10. 140 E. V. ser continuado. 141 Salmos LXXII, 17. 142 Jeremias XVI, 13. Assim, cada Escola demonstrava intensa admirao por seu mestre ao designar o Messias pelo nome dele atravs de um jogo de palavras. 143 Lamentaes I,16. 144 Isaas LIII, 4. 145 Jeremias XXX, 21: essa descrio se ajustava a Rabi Nachman, que, como genro do Resh Galutha, gozava de grande poder e prestgio. 146 Isto , Jud, o Nasi, geralmente denominado Rabi par excellence. 62

Messias; claro. Rabi disse: Trs geraes, pois est escrito, Eles te temero enquanto existir o sol e enquanto durar a lua [eles te temero], por gerao e geraes.159 Rabi Hillel160 disse: No haver Messias para Israel,161 porque j gozaram dele nos dias de Ezequias. Rabi Joseph disse: Possa Deus perdolo [por dizer assim]. Ento, quando foi que Ezequias vicejou? Durante o Primeiro Templo. Zacarias, no entanto, profetizando nos dias do Segundo, proclamou, Alegra-te muito, filha de Sion; exulta, filha de Jerusalm; eis que chega o teu rei! Ele justo e salvador; humilde, montado num jumento, e num jumentinho, cria de jumenta.162 Outro [Baraitha] ensinou: Rabi Eliezer disse: Os dias do Messias sero quarenta anos. Aqui est escrito, E ele vos atormentou, e vos deixou ter fome, e vos alimentou com man;163 enquanto que em outro lugar est escrito, Alegra-nos por tantos dias quanto nos tens afligido.164 Rabi Dosa disse; Quatrocentos anos. Est escrito aqui, E sero reduzidos servido; e sero por eles afligidos por quatrocentos anos;165 enquanto que em outra parte est escrito, Alegra-nos por tantos dias quanto nos tens afligido. Rabi disse: Trezentos e sessenta e cinco anos, assim como os dias do ano solar, pois est escrito, Porque o dia da vingana est no meu corao, e o ano de minha redeno chegado.166 O que significa o dia da vingana est no
159 Salmos LXXXII, 5. O versculo assim interpretado: Eles te temero quando vier o Messias, que referido como um sol (cf. 17), e eles te temero por causa do reinado da casa de Davi que comparado lua (cf. LXXXIX, 39: Ele ser para sempre estabelecido como a lua) por gerao (uma) e geraes (duas). 160 [Um irmo de Jud II.] 161 Mas o Todo-Poderoso ir ele prprio redimir Israel, e sobre eles reinar (Rashi). [Ele pode ter sido induzido a essa declarao pela pretensa descoberta por Orgenes, no Antigo Testamento, de passagens messinicas referentes ao fundador do cristianismo (J. E. VI, 401).] 162 Zacarias IX, 9. 163 Deuteronmio VIII, 3. 164 Salmos XC, 15: da, assim com foram durante quarenta anos afligidos no deserto, assim tambm se rejubilaro sob o reinado do Messias. 165 Gnesis XV, 13. 166 Isaas LXIII, 4. Isso interpretado: Pois est em meu corao (isto , inteno) que o ano (365 dias) de redeno vir, do qual cada dia ser to longo quanto o dia de minha vingana. O dia de vingana de Deus um ano, como no caso dos Espies, devido aos quais os 64

meu corao? Rabi Jochanan disse: Eu o tenho [por assim dizer] revelado ao meu corao, mas no aos meus membros [externos].167 Abimi, filho de Rabi Abbahu, ensinou: Os dias do Messias de Israel sero sete mil anos, pois est escrito, Assim como o jovem se rejubila com sua noiva, assim ir Deus se rejubilar de ti.168 Rab Judah disse em nome de Samuel: Os dias do Messias tero durao igual aos da Criao at agora, pois est escrito, [Que se multipliquem os vossos dias, e os dias de vossos filhos, na terra que o Senhor sob juramento prometeu dar a vossos pais], e sejam to numerosos como os dias do cu sobre a terra.169 Rabi Nachman b. Isaac disse: Igual ao tempo decorrido desde os dias de No at nossos dias, pois est escrito, Pois isso como as guas de No, que so minhas, assim jurei etc.170 Rabi Hiyya b. Abba disse em nome de Rabi Jochanan: Todos os profetas profetizaram [todas as coisas boas] somente em relao era messinica, mas quanto ao mundo por vir, o olho no viu, Senhor alm de ti, o que ele preparou para aquele que o espera.171 Ento, ele discorda de Samuel, que disse: Este mundo s difere [daquele dos] dias do Messias em relao servido sob potncias [estrangeiras].

israelitas foram condenados a vagar por quarenta anos no deserto um ano por cada dia da misso deles. Cf. Nmeros XIV, 34 (Rashi). Maharsha explica isso de maneira mais simples: Para cada dia do ano em que eles afligiram Israel, eu me vingarei um ano inteiro; como houve um ano de 365 dias, assim minha vingana ir durar 365 anos. 167 Isto , mantive minhas intenes fechadas em meu corao, sem lhes dar expresso com minha lngua, para que meus membros no tomassem conhecimento. 168 Isaas LXII, 5. O jbilo do noivo de sete dias, e um dia de Deus de mil anos. Cf. Salmos XC, 4: Pois mil anos aos teus olhos so como o dia de ontem que se foi. 169 Deuteronmio XI, 21: isto , tanto quanto o mundo j havia existido. Como no se tinham estabelecido h tanto tempo assim em sua terra, o perodo ser completado na era messinica. 170 Isaas LIV, 9. O tempo transcorrido desde os dias de No at o momento em que foi feita essa promessa considerado como sendo de Deus, e ele jura que por igual perodo no ficar irado com Israel, isto , quando sobre eles reinar o Messias. 171 Ibid., LXIV, 3. 65

II. JUDASMO MODERNO

Moses Mendelssohn (1729-1786)
Nasceu em Dassau, Prssia. Teve uma educao tradicional, dada pelo seu pai e pelo rabino da sua cidade, que o levou a Berlim em 1743. Frequentou a academia talmdica local e estudou, ainda, lnguas e cincias. Professor, guarda-livros e comerciante, sempre esteve atento filosofia do seu tempo. Em 1754, conhece Gotthold Ephraim Lessing e se aproxima de crculos intelectuais berlinenses, sempre debatendo problemas da filosofia e da crtica literria. Mendelssohn toma-se conhecido quando seu primeiro livro, Philosophische Gesprche (Conversaes Filosficas), foi lanado por Lessing. Em 1761, publicado Philosophische Schriften (Escritos Filosficos), no qual traa uma nova teoria filosfica cujo acento refere-se ao genuno carter da Esttica. Em 1763, volta-se para os problemas mais gerais da filosofia e escreve Uber Die Evidenz in Metaphysischen Wissenschaften (Da Evidncia nas Cincias Metafsicas). Mas o seu principal escrito no campo da investigao filosfica Phaedon (Fdon), resultado de suas correspondncias com Thomas Abbt. Este livro, na forma de um dilogo platnico, constitui um esforo para conciliar filosofia e religio, e harmonizar o racionalismo moderado (Leibniz-Wolff) com o judasmo histrico. Ficou conhecido nos guetos, a partir de ento, como o portador das primeiras luzes da Hascal (Iluminismo). Ao confessar publicamente o seu judasmo, torna-se o principal guia do judasmo esclarecido e se volta para a tarefa de renovao do judasmo. Escreve Ritualgesetze der Juden (Leis Rituais dos Judeus) preocupado com a legislao judaica e com questes educativas e formadoras. Como resultado da sua militncia pedaggica, foi um dos promotores da primeira escola hebraica Hinuch Naarin, em 1778. Em 1783, Mendelssohn escreve Jerusalem Oder uber Religise Macht ds Judentum (Jerusalm ou o Poder Religioso dos Judeus). Neste livro, considera que o judasmo no define uma f obrigatria, no podendo, portanto, haver conflito entre religio e pensamento; pois a crena
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de Israel no uma religio mas uma legislao revelada. Suas prescries dizem do modo de viver mas no do modo de pensar. Alm de normativos, os ensinamentos judaicos so de natureza filosfica e, neste sentido, claramente de acordo com a religio da razo. Mendelssohn procura mostrar igualmente em Jerusalem Oder uber Religise Macht des Judentum que nenhuma instituio religiosa pode usar da coero, cabendo apenas ao Estado a autoridade do uso da fora para o bem comum de todos os cidados. A tarefa da religio institucional, segundo o autor, incitar os homens ao cumprimento dos deveres para com Deus e para com seus pares, apenas atravs da persuaso. O homem deve estar convicto da verdade racional da sua crena. Mendelssohn prope que possvel a integrao dos judeus na sociedade civil sem que isto violente o direito deles de observar suas leis cerimoniais. A concluso de Jerusalem... exibe a defesa da particularidade das religies histricas em oposio proposta de consolidao de todas as religies numa crena universal nica, Uma vez que ele considera a natureza dessa proposta fortemente restritiva ao livre pensar dos homens. Mendelssohn se inscreve no leque de pensadores que inauguraram um novo momento na histria do judasmo, momento este adequado s novas demandas da modernidade europeia. Ao combinar judasmo e cultura moderna, este pensador garantiu o seu reconhecimento tanto no universo judaico quanto no universo de pensamento no especificamente judaico. Referncias Guinsburg, J. (Org.), O Judeu e a Modernidade, So Paulo, Perspectiva, 1970, p. 29. Coleo Judaica, Rio de Janeiro, A. Koogan, 1990, vol. II.

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Moses Mendelssohn1
Agora posso rapidamente resumir minhas concepes do judasmo dos tempos passados e unific-las em um ponto de vista. O judasmo era constitudo, ou deveria s-lo, segundo a inteno do fundador, de: 1) Doutrinas e proposies, ou verdades eternas sobre Deus e seu governo e sua providncia, sem as quais o homem no pode estar esclarecido e feliz. Estas no foram impostas f da nao sob a ameaa de punies eternas ou temporais, mas recomendadas ao conhecimento razovel, assim como condiz natureza e evidncia da verdade eterna. Elas no deviam ser administradas por uma revelao imediata, levada ao nosso conhecimento pela palavra e pela escrita, que somente so compreensveis aqui e agora; o Altssimo as revelou a todas as criaturas racionais atravs de coisas e conceitos, escritos na alma com uma escrita que legvel e compreensvel em qualquer tempo e em qualquer lugar. Essa a razo pela qual o cantor frequentemente citado entoa:
Os cus proclamam a glria de Deus e o firmamento anuncia a obra de suas mos. Um dia discursa a outro dia, e uma noite revela conhecimento a outra noite. No h linguagem, nem h palavras, e deles no se ouve nenhum som; [no entanto], por toda a terra se faz ouvir a sua voz, e suas palavras at os confins do mundo, l onde Deus ergueu uma tenda para o sol, etc.

Ou ento, como diz o profeta em nome do Senhor: Do nascer do sol ao seu poente, meu nome glorificado entre os povos; por toda parte me apresentam incenso, sacrifcios, oferendas puras, pois grande meu nome entre os povos. 2) Verdades histricas, ou informaes sobre o destino do mundo primitivo, sobretudo quanto s condies de vida dos fundadores da nao, de seu conhecimento do verdadeiro Deus, de sua conduta perante Deus, e at mesmo de suas faltas e da consequente punio paterna, da aliana que Deus com eles estabeleceu e da promessa que ele frequentemente lhes repetiu: fazer de seus herdeiros uma nao que lhe fosse dedicada. Essas notcias histricas continham o fundamento do vnculo nacional e, na qualidade de verdades histricas, s podem ser consideradas, segundo sua natureza, como uma f. Somente a autoridade lhes proporciona a necessria evidncia; esses acontecimentos da nao foram confirmados por milagres e apoiados por uma autoridade suficiente para colocar a f acima de qualquer dvida ou desconfiana. 3) Leis, preceitos e regras de vida que so prprias dessa nao e graas observncia das quais se dever chegar tanto felicidade nacional quanto felicidade pessoal de cada um dos seus membros. Deus era o legislador, e Deus no tanto como criador e sustentador do mundo, mas Deus como guardio e aliado de seus antepassados, como libertador, fundador e guia, como rei e soberano desse povo; e ele deu s suas leis a confirmao mais solene, publicamente e de maneira indita, miraculosa, pela qual imutvel dever e obrigao foram impostos nao e a todos os seus herdeiros. Essas leis foram reveladas, isto , tornadas pblicas pela palavra e pela escrita. Contudo, somente o essencial dessa matria foi confiado s letras; e essas leis escritas so tambm, sem as leis no-escritas, as explicaes, as limitaes e as determinaes precisas, transmitidas oralmente e transplantadas por um ensino oral e vivo, em grande parte incompreensvel, ou a assim se tornar com o tempo; pois nenhuma palavra ou sinal escrito conserva seu sentido inalterado atravs das geraes. As leis escritas, assim como as no-escritas, tm imediatamente, enquanto prescries de aes e regras de vida, como objetivo final a
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Seu efeito to universal quanto a benfazeja influncia do sol que, percorrendo sua trajetria, espalha luz e calor sobre a terra toda; tanto que o mesmo cantor se explica com ainda mais clareza em outro trecho:
Do nascimento do sol at o ocaso, louvado seja o nome do Eterno.

Texto extrado de MENDELSSOHN, Moses. Jerusalm, Paris, Press Aujourdhui, 1982, pp.170/188. 68

felicidade pblica e privada. Devem tambm, em grande parte, ser consideradas como uma espcie de escritura e possuem, na qualidade de leis cerimoniais, um sentido e uma significao. Elas conduzem compreenso procurando as verdades divinas, por um lado para as verdades eternas, por outro para as verdades histricas, nas quais se baseava a religio desse povo. A lei cerimonial foi o elo que devia unir ao e contemplao, vida e teoria. A lei cerimonial deveria ininterruptamente provocar uma relao pessoal, um elo social entre escola e professor, buscador e instrutor, deveria excitar e exortar emulao e imitao; e, nos primeiros tempos, cumpriu realmente esse destino, antes que a constituio se modificasse e que a imbecilidade humana se intrometesse uma vez mais, transformando bem em mal, til em nocivo, atravs de malentendido e desvio. Nessa constituio originria, o Estado e a religio no estavam reunidos e sim formavam um: no estavam ligados, mas eram uma s e mesma coisa. A relao do homem com a sociedade e a relao do homem com Deus uniam-se num ponto e no podiam entrar em conflito. Deus, o criador e conservador do mundo, era ao mesmo tempo o rei e o administrador dessa nao, e um ser nico que no permite a menor separao ou pluralidade nem em poltica nem em metafsica. O regente no tem qualquer necessidade ou exigncia dessa unio a no ser o que para seu bem, o que promove a felicidade do Estado. Assim como, por outro lado, o Estado no pode exigir nada que seja contrrio aos deveres para com Deus, nada que no seja antes ordenado por Deus ao legislador e administrador da lei da nao. por isso que, nessa nao, o civil ganhou um prestgio santo e religioso enquanto que cada servio civil era ao mesmo tempo um verdadeiro servio divino. A comunidade era uma comunidade de Deus, os impostos pblicos eram os impostos de Deus, e tudo, at as mnimas disposies de polcia, era cultual. Os levitas que viviam das receitas pblicas recebiam seus salrios de Deus. No podiam ter nenhuma propriedade no pas, pois Deus sua propriedade. Aquele que tem de vaguear fora do pas serve deuses estrangeiros. Em vrias passagens da Escritura, esse ponto no pode ser tomado ao p da letra e, no fundo, no significa nada mais que isso: ele est submetido a leis polticas estrangeiras que no so ao mesmo tempo um culto como as leis de seu prprio pas.
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E agora os crimes. Todo atentado contra o prestgio de Deus como legislador da nao era um crime de lesa-majestade e portanto um crime contra o Estado. Aquele que difamava Deus cometia crime contra a majestade; aquele que profanava criminalmente o Sabbat suprimia, na medida de sua culpabilidade, uma lei fundamental da sociedade civil, j que uma parte essencial da constituio se assentava no estabelecimento desse dia: Que o Sabbat seja um pacto imutvel entre mim e os filhos de Israel diz o Eterno, um smbolo perptuo de que em seis dias o Eterno etc. Tais crimes podiam portanto ser punidos civilmente, e nessa constituio tinham de s-lo, no como uma falsa opinio, no como atesmo, mas como crimes, como crapulosos crimes contra o Estado que tinham por objetivo arruinar ou enfraquecer o prestgio do legislador e desse modo solapar as fundaes do prprio Estado. E, no entanto, com quanta indulgncia foram punidos esses grandes crimes! Com que superabundante pacincia para com a fraqueza humana! Segundo uma lei no escrita, no se podia condenar morte ou a um castigo corporal se o criminoso no houvesse sido prevenido por duas testemunhas insuspeitas com a citao da lei e sob a ameaa da punio prevista; no que dizia respeito aos castigos corporais ou mortais o criminoso devia com palavras formais reconhecer sua punio, t-la aceito, e isso imediatamente aps haver cometido o crime em presena das mesmas testemunhas. Devido a tais estipulaes, quo escassa devia ser a jurisdio criminal, e quo numerosas foram as ocasies assim proporcionadas aos juzes de evitarem a triste necessidade da dar uma basto nada em seu semelhante, imagem de Deus tanto quanto eles mesmos! Um supliciado , segundo expresso da Escritura, uma maldio de Deus. Como os juzes devem ter hesitado, procurado e pensado em desculpas antes de assinar um julgamento de justia criminal! Conforme dizem as rabinas, cada tribunal preocupado com sua reputao deveria cuidar para no haver mais de uma pessoa condenada morte num perodo de setenta anos. Fica assim esclarecido que s conhecendo muito pouco das leis mosaicas e da constituio do judasmo se pode ser levado a acreditar que, segundo as mesmas, direito eclesial e poder da Igreja sejam autorizadas, ao que atesmo e heresia acarretam punies temporais. O Buscador da luz e da verdade, assim como o Sr. Morschel, esto portanto bem longe da verdade quando acreditam que eu liquidei o judasmo com minhas
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razes contra o direita eclesial e o poder da Igreja. A verdade no pode combater a verdade. O que a lei divina ordena, a razo no menos divina no pode suprimir. No foi o atesmo, nem a heresia e a erro que foram punidos, e sim o crapuloso crime contra a majestade do legislador, o crime que se chocava contra as leis fundamentais do Estado e da constituio civil, e s havia punio quando o crime ultrapassava todas as medidas em seu exagero, e havia ameaa de revolta; quando os criminosos no temiam ouvir a lei dita par dois cidados, ser ameaados com a punio, aceit-la e, na presena deles, cometer a crime. Nesse caso, o indigno religioso se torna um criminoso de lesa-majestade, um criminoso contra o Estado. Como dizem os rabinos: com a destruio do Templo, todas as punies corporais ou mortais, todas as reparaes, na medida em que sejam somente nacionais, deixaram de ser legais. Eis o que est de acordo com os meus princpios e sem eles inexplicvel. Os laos civis da nao tendo sido desfeitos, as faltas religiosas no eram mais crimes de Estado e de religio; esta, na qualidade de religio, desconhece qualquer punio, qualquer retratao, que no aquela da qual o pecador arrependida se incumbe espontaneamente. Desconhece qualquer corao, s intervm com indulgncia, age apenas sobre o esprito e o corao. Tentem explicar razoavelmente, sem meus princpios, essa afirmao das rabinos! Mas por que, ouo perguntar alguns leitores, por que tanta extenso para expor alguma coisa bem conhecida? O judasmo era uma hierocracia, um governo religioso, um Estado sacerdotal, uma teocracia. Ns j conhecemos as pretenses que uma tal constituio se permite. De maneira alguma. Todos esses termos artificiais lanam sobre a questo uma falsa luz, que eu devo evitar. Queremos sempre classificar, separar em compartimentos. Quando sabemos em que caso incluir uma certa coisa, ficamos satisfeitos, por mais incompleto que possa ser o conceito que dela temos. Por que procuram um artigo para algo nico, inclassificvel, que com nada pode ser posto sob uma mesma epgrafe? Essa constituio existiu apenas uma vez; chamem-na de Constituio Mosaica, sua denominao apropriada. Ela desapareceu e s o onisciente
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sabe quando, com que povo e em que sculo algo de semelhante poder de novo ser visto. Assim como, segundo Plato, deve haver um amor terrestre e um amor celeste, poder-se-ia dizer que h tambm uma poltica terrestre e uma poltica celeste. Considerem um aventureiro volvel, um desses arrivistas que as caladas de cada capital nos apresentam diariamente, e falem-lhe do Cntico dos Cnticos de Salomo, ou do amor de primeva inocncia no Paraso conforme descrito por Milton. Ele acreditar que esto sonhando, ou ento que querem lhe recitar uma lio referente maneira como sabem conquistar o corao de uma jovem austera por meio de carcias platnicas. Um poltico da moda igualmente os compreender muito pouco, se lhe falarem da ingenuidade e da grandeza moral dessa constituio original. Do mesmo modo que o primeiro s conhece do amor a satisfao de baixa concupiscncia, o outro em poltica s fala de poder, circulao de dinheiro, comrcio, equilbrio e multido; a religio para ele s um meio de manter sob controle homens indomveis e da qual o sacerdote se serve para sug-lo e comer seu tutano. Eu devia fazer desaparecer, aos olhos do meu leitor, esse falso ponto de vista, a partir do qual estamos habituados a considerar o verdadeiro interesse da sociedade humana. por isso que me abstive de qualificar com uma palavra a constituio mosaica, contentando-me em apresent-la, com suas propriedades e suas determinaes. Quando a olhamos diretamente, vemos na verdadeira poltica, como disse um filsofo a propsito do sol, uma divindade ali onde olhos comuns s vem uma pedra. Disse eu que a Constituio Mosaica: no durou muito tempo na sua pureza. J na poca do profeta Samuel, a construo tinha uma falha que se foi aprofundando cada vez mais, at que as partes se separaram completamente. A nao queria como regente um rei visvel, um rei de carne. possvel que os sacerdotes, conforme conta a Escritura a propsito do filho do gro-sacerdote, j tivessem comeado a abusar de seu prestgio junto ao povo, ou que o brilho de uma corte vizinha os tenha cegado; em resumo, eles exigiram um rei semelhante ao dos outros povos. O profeta a quem isso afligia mostrou-lhes o que um rei humano, que tem suas prprias necessidades e que pode aument-las vontade, e como um dbil
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mortal a quem se concede o direito divindade difcil de satisfazer. Em vo; o povo se ateve ao seu projeto, realizou seu desejo e tomou conhecimento de tudo com que o profeta o ameaara. A Constituio estava agora minada, a unidade dos interesses suprimida; o Estado e a religio no eram mais uma s e mesma coisa, e a coliso de deveres j no era mais uma impossibilidade. No obstante, permaneceu ainda bastante rara, durante o tempo em que o rei no s fazia parte da nao como ainda cumpria as leis da ptria. Acompanhemos, porm, agora a histria atravs de muitos destinos e transformaes, atravs de certos governos bons e ruins, tementes a Deus ou tendo-o esquecido, at esses tristes tempos em que o fundador da religio crist deu essa prudente ordem: Dai ao imperador o que do imperador, e a Deus o que de Deus. Oposio flagrante, coliso de deveres! O Estado se encontrava sob domnio estrangeiro, recebia suas ordens, por assim dizer, de deuses estrangeiros, e a religio nativa ainda era mantida, conservando uma certa influncia sobre a vida civil. H aqui exigncia contra exigncia, pretenso contra pretenso. A quem devemos dar; a quem devemos obedecer? Aguentem assim os dois fardos, foi a ordem, da melhor maneira que lhes for possvel, sirvam a dois senhores com indulgncia e devoo. Dem ao imperador e dem a Deus! A cada um do seu, j que a unidade de interesse est destruda! E ainda hoje no se pode dar tribo de Jac nenhum conselho mais sbio do que este: acomodem-se com os costumes e a Constituio do pas em que se encontram, mas atenham-se inabalavelmente religio de seus pais. Carreguem os dois pesos da melhor maneira que puderem! Por um lado, agrava-lhes o fardo da vida civil por causa da religio a que se conservam fiis, e pelo outro o clima e os tempos tornam a prtica de suas leis religiosas mais pesada do que ela . Nem por isso deixem de perseverar, permaneam sem se mexer no lugar que a providncia lhes atribuiu e suportem tudo pacientemente, como h muito tempo lhes anunciou seu legislador. Na realidade, no vejo como aqueles que nasceram na tribo de Jac possam se desembaraar da lei de algum modo que seja escrupuloso. -nos permitido refletir sobre a lei, sondar seu esprito, conjecturar aqui e acol uma razo, ali onde o legislador no deu razo alguma, que talvez fosse ligada aos tempos, lugares e circunstncias, que talvez pudesse ser mudada
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com os tempos, lugares e circunstncias, se apraz ao legislador mximo nos dar a conhecer suas vontades a esse propsito, nos dar a conhecer de maneira to forte, to pblica, to fora de qualquer dvida ou desconfiana, como a lei que Ele prprio deu. Enquanto tal coisa no ocorre, enquanto no pudermos fazer a prova de alguma liberao to autntica da lei, nossa raciocinao no pode nos liberar da rigorosa obedincia que devemos lei, e a venerao de Deus estabeleceu um limite entre a especulao e a prtica, limite que nenhum homem consciencioso pode transpor. por isso que renovo meu protesto, que coloquei no incio desse texto: A vida humana fraca e mope! Quem pode dizer: cheguei ao santurio de Deus, vi inteiramente o sistema de suas intenes, e posso determinar suas medidas, meta e limites? Eu posso supor, mas no decidir nem agir conforme minha suposio. No devo ousar, nas coisas humanas, agir contra a lei conforme minha prpria suposio e interpretao, em ponto pequeno, da lei, sem a autoridade do legislador ou do administrador. E muito menos em matria divina! As leis que esto em ligao necessria com a propriedade e a organizao fundiria trazem consigo sua liberao. Sem templo e sem sacerdotes e fora da Judeia no h nem lei de sacrifcio ou de propriedade, nem imposto sacerdotal, na medida em que dependem das propriedades fundirias. Mas os mandamentos pessoais, os deveres impostos aos filhos de Israel, sem relao com o culto do templo e a propriedade fundiria na Palestina, devem, no que nos seja possvel ver, ser cumpridos rigorosamente e ao p da letra da lei, at quando aprouver ao Todo-Poderoso tranquilizar nossa conscincia e nos dar a conhecer, clara e publicamente, a abolio da lei. Isso significa, com clareza, o seguinte: aquilo que Deus uniu, o homem no pode desunir. Se um de ns se transfere religio crist, eu no compreendo como ele pode com isso liberar sua conscincia e acreditar assim se livrar do jugo da lei. Jesus de Nazar nunca disse que veio para libertar da lei a tribo de Jac. E mais, ele disse mesmo expressamente o contrrio e, ainda mais, ele mesmo fez o contrrio. Jesus de Nazar no se satisfez em observar a lei de Moiss, ele tambm se ps de acordo com as prescries dos rabinos, e aquilo que, nos discursos e atos sobre ele escritos, parece a isso se opor na verdade s tem essa aparncia primeira vista. Olhando-os com preciso, tudo se harmoniza completamente, no s com a
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Escritura mas tambm com a tradio. Se ele veio para remediar a hipocrisia que ganhava terreno e a falsa devoo, ele no forneceu o primeiro modelo de falsa devoo e no autorizou, atravs de um exemplo, uma lei que devia destruir ou suprimir a precedente. De todo o seu comportamento, como do de seus discpulos dos primeiros tempos, evidencia-se o princpio dos rabinos: Aquele que no nascido na lei no tem de se ligar lei; mas o que nascido na lei tem de viver segundo a lei, e morrer segundo a lei. Se seus sucessores, em tempos posteriores, pensaram diferentemente, e se acreditaram liberar os judeus que seguiram sua doutrina, isso certamente ocorreu sem sua autoridade. E vs, caros irmos e semelhantes, que seguis a doutrina de Jesus! Como podeis nos querer mal quando fazemos o que o prprio fundador de vossa religio fez e conservou com seu prestgio? Como podeis crer que no podeis nos amar de novo fraternalmente, vos reunir civilmente conosco enquanto ns nos diferenciarmos de vs exteriormente pela observncia das leis cerimoniais, no comermos convosco, no casarmos convosco, o que, at onde podemos julgar, o prprio fundador de vossa religio no fez nem nos teria permitido fazer? Se essa vossa verdadeira convico, e deve permanecer tal como no podemos acreditar por parte de homens de convico crist, se a reunio civil no pode ser conseguida sob qualquer outra condio que no seja a de se afastar da lei que ainda temos como obrigatria para ns, ento ficamos desolados em nos considerar constrangidos a ter de explicar que devemos antes renunciar reunio civil; Dohn, o amigo dos homens, teria escrito em vo, e tudo ficar no estado sofrvel em que nos encontramos hoje, ou ento naquele em que vosso amor pelo homem achar por bem nos colocar. Aqui no nos cabe ceder; mas se somos honestos, cabe-nos amar-vos fraternalmente, e vos suplicar que nos tornem, tanto quanto vos for possvel, nossos fardos suportveis. No nos considereis como irmo e concidado, mas ao menos como semelhante e co-habitante do pas. Mostrai-nos o caminho, pondes em nossas mos o meio de podermos nos tornar homens e co-habitantes melhores, e deixainos gozar convosco, tanto quanto os tempos e as circunstncias o permitam, os direitos da humanidade. Ns no podemos conscienciosamente nos desviar da lei, ou de que serviriam concidados sem conscincia?
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Como a profecia segundo a qual, um dia, haver, um s pastor e um s rebanho poder se concretizar? Caros irmos que estais cheios de boas intenes pelos homens, no vos deixai ofuscar! Para que exista esse pastor onipresente, o rebanho no tem necessidade de pastar num mesmo prado, ou de entrar e sair por Uma s porta da casa do Senhor. Isso no est de acordo com o desejo do pastor nem compatvel com a prosperidade do rebanho. No esto procurando mudar as ideias e confundi-las intencionalmente? Disseram-vos que a reunio das confisses o caminho mais rpido para o amor e a tolerncia (Duldung) fraternas que caridosamente desejais com paixo. Se tivssemos todos Uma s crena, dizem-vos alguns, no poderamos mais nos odiar uns aos outros por causa da f, da diferena de opinies; o dio religioso e o esprito de inquisio seriam pois cortados pela raiz; o aoite seria retirado das mos da hipocrisia, a espada tirada do fanatismo, e comeariam os dias felizes conforme est dito: O lobo habitar com o cordeiro, e o tigre se deitar junto ao cabrito. Vs, os bons, que fazeis essa proposta, j comeastes a trabalhar; quereis servir como negociadores e realizar o esforo filantrpico de pr de p uma conciliao das confisses, negociando verdades e direitos como se se tratasse de mercadorias com desconto. Quereis encorajar, mandar, negociar, ameaar e obter o rogo; apressar, enganar, at que as partes se apertem as mos e o contrato de felicidade do gnero humano possa ser assinado. Muitos daqueles que rejeitam um tal projeto como quimrico e irrealizvel falam, entretanto, da unidade das confisses como um estado muito desejvel e se queixam do gnero humano por ser esse cume de felicidade inacessvel a foras humanas. Cuidado, amigos dos homens, para no ouvir tais opinies sem um exame mais acurado. Elas talvez sejam armadilhas que o fanatismo tornado impotente coloca diante da liberdade de conscincia. Vs sabeis que esse inimigo do bem de aparncias e formas vrias; a fria do leo e a doura do cordeiro, a ingenuidade da pomba e a astcia da serpente, nenhuma qualidade lhe estranha, quer ele a possua ou quer ele saiba assumi-la para atingir seus sanguinrios fins. Visto que lhe haveis tirado seu poder pblico com esses esforos benfazejos, ele reveste talvez a mscara da doura para vos enganar, finge amor fraterno, faz cintilar a tolerncia humana e j forja, em segredo, as correntes que pensa pr na razo para
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empurr-la de novo, de maneira imprevista, ao lodaal da barbrie, do qual acabastes de sair.2 Que no se pense que isso seja apenas um temor imaginrio nascido da hipocondria. Na realidade, uma reunio de confisses, se fosse posta em prtica, poderia somente acarretar consequncias as mais desastrosas para a razo e a liberdade de conscincia. Pois suponhamos que se chegue a um acordo sobre a frmula da crena que se pensa introduzir e estabelecer, que se ache smbolos contra os quais nenhum dos partidos religiosos importantes de hoje na Europa tenha algo a contestar, o que se teria realizado com isso? Alguma coisa do tipo de fazer todo mundo pensar da mesma maneira a respeito das verdades religiosas? Aquele que no tem seno algumas ideias sobre a natureza do esprito humano no pode nele acreditar. Portanto, a concordncia seria apenas quanto s palavras, quanto frmula. com esse objetivo que os reunificadores de confisses querem se encontrar; eles querem, aqui e acol, separar alguma coisa dos conceitos, aqui e acol alargar de tal forma as malhas das palavras, tornando-as de tal maneira imprecisas e vastas que os conceitos poderiam, qualquer que fosse sua diferena interna, ali ser inseridos in extremis. Que cada um ento, afinal de contas, envolva com os mesmos termos uma outra opinio que lhe seja prpria, e vos envaidecereis de ter reunido as crenas, de ter posto o rebanho sob vosso nico pastor. Por toda parte onde essa iluso geral viesse a atingir seu alvo, receio que se queira, antes de tudo, prender de novo o esprito libertado do homem. A tmida caa ser rapidamente capturada e presa na rede. Ligai de incio a f aos smbolos, a opinio a termos to moderados e flexveis quanto queiram, estabelecei de uma vez por todas os artigos. Cuidado com o miservel que chega um dia mais tarde e acha
Como, infelizmente, demonstra a experincia, o atesmo tem, ele tambm, seu fanatismo. Este, certamente, talvez jamais pode ser servido sem uma mistura de atesmo interior, mas que o atesmo exterior, manifesto, pudesse ele tambm se tornar fantico, isso to inegvel quanto difcil de compreender. Com efeito, por um lado, o ateu, se quiser ser congruente, deve agir por interesse pessoal, mas, por outro lado, parece em conformidade com esse interesse que o ateu tome partido e no tente guardar o segredo para si mesmo. por isso que o viram pregar suas doutrinas com o mais ardente entusiasmo, se enraivecer e at praticar a perseguio cada vez que sua pregao no encontrava eco. Esse zelo terrvel, j que anima um ateu declarado e a inocncia cai nas mos de um louco furioso que teme tudo exato Deus. 78
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alguma coisa a contestar nesses termos moderados e purificados! Um fomentador de distrbios! fogueira. Irmos, a verdadeira devoo preocupao vossa? Ento no criemos harmonia onde a diversidade manifestadamente plano e meta final da providncia. Nenhum de ns pensa e sente inteiramente igual a seu semelhante; por que queremos ento nos enganar uns aos outros com palavras mentirosas? J o fazemos em nossas relaes cotidianas, em nossas conversas sem significao particular. Por que tambm faz-lo com as coisas atinentes ao nosso bem-estar terrestre, a todo o nosso destino? Por que nos tornarmos irreconhecveis pelas mscaras, nas questes mais importantes da vida, visto que Deus no marcou em vo cada um com seus prprios traos no rosto? No significa isso opor-se providncia tanto como possamos faz-lo, fazer fracassar, se isso possvel, o objetivo da criao, agir contra nossa vocao, nosso destino nesta vida e na outra? Monarca da terra! Se permitido a um insignificante co-habitante desta at vs elevar a sua voz, no acreditai em vossos conselheiros que querem, com palavras melfluas, vos arrastar a to ms aes. Estejam eles prprios cegos e no vejam o inimigo da humanidade espreitando em emboscada, ou estejam eles procurando vos cegar. Se lhes derdes ouvidos, acabou-se vosso tesouro mais precioso, a liberdade de pensar! Em nome da felicidade geral e da vossa, reunio das confisses no tolerncia (Toleranz). Ela est radicalmente oposta verdadeira tolerncia (Dulgung). Em nome de nossa felicidade e da vossa, que vosso poderoso prestgio no concorde em transformar no importa qual verdade eterna, sem a qual a felicidade civil no pode subsistir, em uma lei; no importa que opinio religiosa indiferente ao Estado em lei do pas! Ocupai-vos com o agir do homem, arrastai-o perante o tribunal de sbias leis, e deixai-nos o pensar e a palavra, como nosso pai nos legou em inalienvel herana, e nos deu como direito imutvel. A ligao entre direito e opinio por demais antiquada, e o momento ainda por demais distante, para que possa ser completamente suprimida sem inquietante dano. Procurai ao menos atenuar, na medida do possvel, sua influncia nefasta, e impor sbios limites aos sombrios

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preconceitos.3 Para os herdeiros futuros, traai ao menos o caminho para esse alto nvel de cultura, a essa tolerncia universal do homem (Menschenduldung) pela qual a razo suspira em vo! No recompense e no puna nenhuma doutrina, no seduza nem corrompa nenhuma opinio religiosa. Aquele que no perturba a felicidade pblica, que age direito em relao s leis civis, em relao a vs e a seus concidados, deixai-o falar como pensa, invocar Deus sua maneira ou de seu pai, e procurar sua salvao eterna onde ele cr encontr-la. No deixai ningum em vossos Estados ser o escrutador dos coraes e o juiz de pensamentos, ningum arrogar-se um direito que o Onisciente s a si reservou Se devemos ao imperador o que do imperador, dai a Deus o que de Deus! Amai a verdade! Amai a paz!

O Sindrio Francs
A assembleia denominada Sindrio Francs reuniu-se em Paris de fevereiro a abril de 1807, por solicitao de Napoleo Bonaparte. A assembleia dos 110 judeus notveis (Assembleia dos Notveis), denominada Sindrio, uma aluso ao grande Sindrio da Palestina, supremo corpo religioso e jurdico dos judeus durante o domnio romano at a abolio do patriarcado (425 a.E.C.). A adoo do antigo smbolo da soberania judaica traduzia, em alguma medida, pressentimentos messinicos e a expresso de reconhecimento a Napoleo Bonaparte. Este evento teve particular importncia na histria da Reforma Rabnica. A Assembleia dos Notveis uma espcie de precursora de futuras conferncias rabnicas que tiveram lugar, sobretudo, na Alemanha e nos EUA e que procuravam harmonizar a tradio rabnica com as exigncias da modernidade. O Sindrio Francs, tal como o texto aqui apresentado demonstra, teve que responder a uma srie de questes colocadas por Napoleo para avaliar a capacidade dos judeus de conviver com as normas do novo Estado francs. As respostas, por vezes claras, por vezes evasivas, expressam a vontade adaptativa da liderana, bem como suas ambiguidades.

Infelizmente, j ouvimos o congresso da Amrica entoar a velha melodia e falar de uma religio dominante. 80

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O Sindrio Francs1
Perguntas feitas por Napoleo
1. lcito aos judeus casar com vrias esposas? 2. A religio judaica permite o divrcio? E o divrcio vlido sem a sano de um tribunal civil ou em virtude de leis em contradio com o cdigo francs? 3. Pode uma judia casar com um cristo, ou uma mulher crist com um judeu? Ou a lei s permite que os judeus se casem entre si? 4. So os franceses, irmos aos olhos dos judeus, ou so estrangeiros? 5. Em qualquer dos dois casos, que conduta a lei lhes determina para com os franceses que no so de sua religio? 6. Os judeus nascidos na Frana e tratados pela lei como cidados franceses consideram a Frana sua ptria, e sentem-se obrigados a defend-la, a obedecer as suas leis, e seguiras disposies do Cdigo Civil? 7. Quem nomeia os rabinos? 8. Que jurisdio de polcia exercem os rabinos entre os judeus? E que poder judicial exercem entre eles? 9. O prestgio dos rabinos regulado por lei, ou apenas consagrado pelo costume? 10. Existem profisses que a lei dos judeus os probe de exercer? 11. A lei dos judeus probe-os de praticarem a usura com seus correligionrios? 12. Ela probe ou permite praticar usura com estrangeiros?
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Convocao ao Sindrio
Das doze perguntas, a que gerou a controvrsia mais acalorada foi a terceira. A resposta final dos Notveis foi ambgua. Num gesto dramtico, ainda que cnico, Napoleo convocou uma conferncia ampliada, conhecida como o Grande Sindrio, para dar a sua aprovao aos debates preliminares dos Notveis. Uma proclamao foi emitida em hebraico, francs, italiano e alemo para incentivar as vrias regies no vasto domnio francs a enviarem delegados. Um grande acontecimento est em formao. Aquilo que nossos pais no viram no longo decurso de sculos, aquilo que no podamos esperar ver em nossos dias, reaparecer aos olhos de um mundo estarrecido. O dia 20 de outubro a data fixada para abertura do Grande Sindrio na capital de um dos mais poderosos imprios cristos e sob a proteo do prncipe imortal que o governa. Paris vai oferecer esse espetculo ao mundo, e esse acontecimento para sempre memorvel ser, para os remanescentes dispersos dos descendentes de Abrao, uma nova era de redeno e de felicidade. Quem no admiraria conosco os secretos desgnios de uma Providncia que no podemos sondar, que altera as formas de questes humanas, traz consolo aos oprimidos, levanta do p os humildes, e pe um fim s atribulaes que a vontade divina imps, e que mais uma vez restitui aos fiis guardies de Sua lei o respeito e a boa vontade da nao? Desde a nossa disperso, inmeras mudanas provaram a instabilidade das questes humanas. De tempos em tempos, naes expulsaram-se umas s outras e por vezes misturadas com outras. Somente ns nos opusemos correnteza de sculos e revoluo. [Segue-se um extravagante tributo a Napoleo e um apelo para o envio de delegados prxima Assembleia.]

O Sindrio decide legislao religiosa e civil

Ns declaramos que a lei divina, a preciosa herana de nossos antepassados, contm exigncias no s religiosas como tambm civis;
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Textos extrados de: PLAUT, G. The Growth of Reform Judaism, New York, World Union for Progressive Judaism, 1965, pp. 71/74; e MENDES-FLOHR & REINHARZ, J. The Jew in the Modem World, Oxford, Oxford University Press, 1980, capo m, pp. 116/121. 82

Que por sua prpria natureza as exigncias religiosas so absolutas e independem de circunstncia e tempo; No se d o mesmo com ordens civis, isto , com as que dizem respeito a governo e que foram planejadas para governar o povo de Israel na Palestina quando ele tinha seus reis, seus sacerdotes e seus magistrados; Que essas ordens civis deixaram de ser aplicveis quando Israel deixou de ser uma nao; Que ao consagrar essa distino, j estabelecida pela tradio, o Grande Sindrio declara-a ser um fato incontestvel; Que somente uma assembleia de homens eruditos na lei, unidos num Grande Sindrio, pode determinar as consequncias de tal desenvolvimento; e Que, se os antigos Sindrios no o fizeram, foi s porque as circunstncias polticas no o permitiam e porque, desde a completa disperso de Israel, nenhum Sindrio se havia reunido at agora. Consequentemente, empenhados neste devoto empreendimento, invocamos a inspirao divina da qual deriva todo bem, e nos consideramos obrigados a promover, at onde de ns depender, a consecuo da regenerao moral de Israel; e Consequentemente, em virtude do direito a ns conferido por nossos costumes e nossas leis sagradas, que determinam que numa assembleia de homens sbios da poca reside a capacidade essencial para determinar, de acordo com as necessidades do caso, aquilo que exigido pelas supracitadas leis, sejam elas escritas ou orais, ns agora seguimos declarando que a obedincia lei do Estado em questes civis e polticas religiosamente exigida.

Que uma obrigao religiosa para cada israelita na Frana, bem como no Reino da Itlia, considerar de agora em diante o casamento civil como uma obrigao religiosa e, Consequentemente, probe todos os rabinos ou qualquer outra pessoa nos dois pases de tomar parte num casamento religioso sem antes ter ficado estabelecido que o casamento foi concludo segundo a lei perante um funcionrio civil. O Grande Sindrio declara ainda que casamento entre judeus e cristos que foram contrados de acordo com as leis do cdigo civil so civilmente legais, e que, embora no possam receber sano religiosa, no devem estar sujeitos a proscrio religiosa.

Servio militar
O Grande Sindrio declara que qualquer judeu convocado para servio militar est, de acordo com a lei judaica, durante toda a durao do servio, liberado de observar todas as obrigaes religiosas que interferem com tal servio.

A assembleia de notveis judeus

RESPOSTAS A NAPOLEO2 Decidido, pelos delegados franceses professando a religio de Moiss, que a seguinte Declarao preceder as respostas dadas s perguntas propostas pelos membros da Comisso de Sua Imperial e Real Majestade. A assembleia, tomada por um profundo sentimento de gratido, amor, respeito e admirao pela sagrada pessoa de sua Imperial e Real Majestade, declara, em nome de todos os franceses professando a religio de Moiss, que esto plenamente determinados a se mostrarem dignos dos favores que Sua Majestade tenciona conceder-lhes, ajustando-se escrupulosamente s suas intenes paternais; que sua religio torna uma
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Casamento
O Grande Sindrio, tomando conhecimento do fato de que no Imprio Francs e no Reino da Itlia nenhum casamento vlido se no for precedido por um contrato civil perante um funcionrio pblico, declara em virtude da autoridade que lhe concedida:
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As respostas da comisso foram adotadas pela Assembleia em trs sesses sucessivas, nos dias 4, 7 e 12 de agosto de 1806. 85

obrigao considerar a lei do prncipe como lei suprema em questes polticas e civis; que consequentemente, caso seu cdigo religioso, ou suas vrias interpretaes, contenham ordens civis ou polticas em desacordo com as do cdigo francs, tais ordens deixariam, claro, de influenci-lo se govern-los, j que devem, acima de tudo, reconhecer e obedecer as leis do prncipe. Que, em decorrncia desse princpio, os judeus tm, em todos os tempos, considerado ser seu dever obedecer as leis do Estado, e que, desde a revoluo, eles, como todos os franceses, no reconheceram quaisquer outras. Primeira Pergunta: lcito aos judeus casar com vrias esposas? Resposta: No lcito aos judeus casar com mais de uma esposa: em todos os pases europeus eles seguem a prtica geral casando com apenas uma. Moiss no ordena expressamente tomar vrias, mas ele no o probe. Ele parece at adotar esse costume como em geral predominante, j que estipula os direitos de herana entre filhos de diferentes esposas. Embora essa prtica ainda prevalea no Oriente, seus antigos doutores ordenaramlhes abster-se de ter mais de uma esposa, exceto se o homem estiver capacitado por sua fortuna para sustentar vrias. No Ocidente o caso diferente; o desejo de adotarem os costumes dos habitantes desta parte do mundo induziu os judeus a renunciar poligamia. Mas como diversos indivduos ainda se entregavam a tal prtica, foi reunido em Worms, no sculo XI, um snodo constitudo por cem rabinos, com Gershom na presidncia.3 Essa assembleia proferiu um antema contra todo israelita que, no futuro, tivesse mais de uma esposa. Embora essa proibio no fosse durar eternamente, a influncia das maneiras europeias tem predominado universalmente.
Embora teoricamente permissvel, a poligamia era desestimulada pelos sbios do Talmud e foi explicitamente proibida entre os judeus asquenazim por uma proscrio popularmente atribuda ao Rabi (Rabbenu) Gershom ben Jehuda (960-1028), erudito talmdico e lder espiritual alemo. 86
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Segunda Pergunta: A religio judaica permite o divrcio? E o divrcio vlido quando no proferido por tribunais e em virtude de leis em contradio com o Cdigo francs? Resposta: O repdio permitido pela lei de Moiss; mas no vlido se no for previamente decidido pelo cdigo francs. Aos olhos de todo israelita, sem exceo, a submisso ao prncipe a primeira das obrigaes. um princpio comumente reconhecido entre eles que, em tudo relacionado a interesses civis ou polticos, a lei do Estado a lei suprema. Antes de serem admitidos na Frana para compartilhar os direitos de todos os cidados, e quando viviam sob uma legislao particular que lhes dava liberdade de seguir seus costumes religiosos, eles tinham a possibilidade de se divorciar de suas esposas; mas era extremamente raro ver isso posto em prtica. Desde a revoluo eles no reconheceram quaisquer outras leis sobre esse tpico a no ser as do Imprio. Quando foram admitidos categoria de cidados, os rabinos e os judeus principais compareceram perante as municipalidades de seus respectivos lugares de residncia, e prestaram um juramento de em tudo se ater s leis, e no reconhecer quaisquer outras regras em todas as questes civis (...). Terceira Pergunta: Pode uma judia casar com um cristo, ou uma mulher crist com um judeu? Ou a lei s permite que os judeus se casem entre si? Resposta: A lei no diz que uma judia no pode casar com um cristo, nem que um judeu no pode casar com uma mulher crist, e tampouco afirma que os judeus s podem casar entre si. Os nicos casamentos expressamente proibidos pela lei so com as sete naes cananeias, com Amon e Moab, e com os egpcios. A proibio absoluta em relao s sete naes cananeias; quanto a Amon e Moab, restringe-se, segundo muitos talmudistas, aos homens dessas naes, e no se estende s mulheres; pensa-se at que estas abraariam a religio judaica. Quanto aos egpcios, a proibio est limitada at a terceira gerao. A proibio em geral aplica-se apenas a naes idlatras. O Talmud declara formalmente que naes modernas no devem ser assim consideradas, j
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que adoram, como ns, o Deus do cu e da terra. E, consequentemente, tem havido, em vrios perodos, casamentos mistos entre judeus e cristos na Frana, na Espanha e na Alemanha: esses casamentos eram s vezes tolerados e s vezes proibidos pelas leis daqueles soberanos que haviam recebido judeus em seus domnios. Unies dessa espcie ainda so encontradas na Frana; mas no podemos negar que a opinio dos rabinos seja contrria a esses casamentos. Segundo sua doutrina, muito embora a religio de Moiss no tenha proibido os judeus de se unirem por casamento com naes de outra religio, o casamento, porm, segundo o Talmud, exige cerimnias religiosas denominadas Kidushim, com a bno usada em tais casos; e sem a realizao dessas cerimnias nenhum casamento pode ser religiosamente vlido. Isso no poderia ser feito com pessoas que no considerassem sagradas essas cerimnias; e nestes caso o casal poderia se separar sem o divrcio religioso; eles seriam ento considerados como casados civilmente mas no religiosamente. Tal a opinio dos rabinos, membros desta assembleia. De um modo geral, eles no estariam mais inclinados a abenoar a unio de uma judia com um cristo, ou de um judeu com uma crist, do que os prprios padres catlicos estariam dispostos a sancionar unies dessa espcie. Os rabinos reconhecem, contudo, que um judeu que casa com uma crist no deixa, por causa disso, de ser considerado um judeu por seus irmos, no menos do que se tivesse casado com uma judia civilmente e no religiosamente. Quarta Pergunta: Aos olhos dos judeus, so os franceses seus irmos, ou so estrangeiros? Resposta: Aos olhos dos judeus os franceses so seus irmos, e no so estrangeiros. O verdadeiro esprito da lei de Moiss est em harmonia com esse modo de considerar os franceses. Quando os israelitas formaram uma nao estabelecida e independente, sua lei tornou regra para eles considerar estrangeiros como irmos.

Com o mais tenro cuidado por seu bem-estar, seu legislador ordenalhes am-los; Amai, pois, os estrangeiros, diz ele aos israelitas, porque fostes estrangeiros na terra do Egito.4 Respeito e benevolncia para com os estrangeiros so impostos por Moiss, no apenas como uma exortao prtica da moralidade social, mas como uma obrigao imposta pelo prprio Deus.5 Uma religio cujas mximas fundamentais so tais uma religio que torna uma obrigao amar o estrangeiro que impe a prtica de virtudes sociais, deve certamente exigir que seus seguidores considerem seus concidados como irmos. E como poderiam eles consider-los de outro modo quando habitam a mesma terra, quando so governados e protegidos pelo mesmo governo e pelas mesmas leis? Quando gozam dos mesmos direitos e tm os mesmos deveres a cumprir? Existe, mesmo entre o judeu e o cristo, um lao que compensa abundantemente pela religio o lao da gratido. Esse sentimento foi inicialmente despertado em ns pela mera concesso de tolerncia. Tem aumentado, nesses dezoito anos, por novos favores do governo, a um tal grau de energia, que agora nosso destino est irrevogavelmente ligado ao destino comum de todos os franceses. Sim, a Frana o nosso pas, todos os franceses so nossos irmos, e esse glorioso ttulo, ao elevar nossa prpria estima, torna-se uma segura garantia de que nunca deixaremos de ser dignos dele. Quinta Pergunta: Em qualquer dos dois casos, que conduta a lei lhes determina para com os franceses que no so de sua religio? Resposta: A conduta determinada para com franceses que no so de nossa religio a mesma determinada para relaes entre os prprios judeus; no admitimos nenhuma diferena, exceto a de adorar o Ser Supremo, cada um sua prpria maneira. A resposta pergunta precedente explicou a conduta que a lei de Moiss e o Talmud determinam para com os franceses que no so de nossa
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Deuteronmio 10:19. As seguintes passagens da Escritura so citadas: xodo 22:21 e 23:9; Levtico 19:34 e 23:22; Deuteronmio 10:18-19 e 24:19; Salmos 145:9; e vrios textos talmdicos. 89

religio. Na poca presente, quando os judeus no formam mais um povo separado, mas gozam da vantagem de estarem incorporados Grande Nao (privilgio esse que eles consideram uma espcie de redeno poltica), impossvel que um judeu trate um francs, que no seja de sua religio, de qualquer outra maneira que no aquela com que trataria um de seus irmos israelitas. Sexta Pergunta: Os judeus nascidos na Frana e tratados pela lei como cidados franceses consideram a Frana sua ptria? Tm eles a obrigao de defend-la? So eles obrigados a obedecer s leis e seguir as disposies do Cdigo Civil? Resposta: Homens que adotaram um pas, que nele residiram por muitas geraes que, mesmo sob a restrio de leis especficas que reduziam seus direitos civis, estavam to ligados a ele que preferiam ficar privados das vantagens comuns a todos os demais cidados do que abandon-lo s podem se considerar franceses na Frana; e eles consideram como igualmente sagrado e honroso o obrigatrio dever de defender seu pas. Jeremias (captulo 29) exorta os judeus a considerar a Babilnia como seu pas, embora fosse ali permanecer apenas por setenta anos. Ele os exorta a cultivar o solo, a construir casas, a semear e a plantar. Sua recomendao foi to bem seguida que Esdras (captulo 2) diz que quando Ciro permitiu a eles retomar a Jerusalm para reconstruir o Templo, apenas 42.360 saram da Babilnia, e que esse total era em sua maior parte composto de gente pobre, tendo os ricos permanecido naquela cidade. O amor ao pas no corao do judeu um sentimento to natural, to poderoso, e to de acordo com suas opinies religiosas, que um judeu francs se considera na Inglaterra como estando entre estrangeiros, embora possa estar entre judeus; e o mesmo caso com judeus ingleses na Frana. A tal nvel esse sentimento mantido entre eles que, durante a ltima guerra, judeus franceses foram vistos lutando desesperadamente contra outros judeus, sditos de pases ento em guerra contra a Frana. Muitos deles esto cobertos de honrosas feridas, e outros obtiveram, no campo de batalha, as nobres recompensas da bravura.
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Stima Pergunta: Quem nomeia os rabinos? Resposta: Desde a revoluo, a maioria dos chefes de famlia nomeia o rabino, onde quer que haja um nmero suficiente de judeus para manter um, aps prvias inquiries quanto moralidade e erudio do candidato. Esse modo de eleio no , contudo, uniforme: varia de acordo com o lugar, e, at hoje, tudo o que diz respeito eleio de rabinos ainda se encontra num estado de incerteza. Oitava Pergunta: Que jurisdio de polcia exercem os rabinos entre os judeus? Que poder judicial exercem entre eles? Resposta: Os rabinos no exercem nenhum tipo de jurisdio de polcia entre os judeus. somente na Mishn e no Talmud que a palavra Rabi encontrada pela primeira vez aplicada a um doutor da lei; e ele comumente devia essa qualificao sua reputao, e opinio geral sobre sua erudio. Quando os israelitas foram totalmente dispersos, eles formaram pequenas comunidades naqueles lugares onde lhes era permitido se estabeleceram em certo nmero. Por vezes, nessas circunstncias, um rabino e dois outros doutores formavam uma espcie de tribunal, chamado Beth Din, isto , Casa de Justia; o rabino cumpria as funes de juiz, e os outros dois eram seus assessores. As atribuies, e mesmo a existncia desses tribunais, tm, at os dias de hoje, dependido sempre da vontade dos governos sob os quais os judeus tm vivido, e do grau de tolerncia que tm gozado. Desde a revoluo, esses tribunais rabnicos esto totalmente suprimidos na Frana e na Itlia. Os judeus, elevados categoria de cidados, ativeram-se em tudo s leis do Estado; e, consequentemente, as funes de rabinos, onde quer que estejam estabelecidos, limitam-se a pregar moralidade nos templos, abenoar casamentos, proferir divrcios etc. Nona Pergunta: Essas formas de eleio, essa jurisdio de polcia judiciria so reguladas por lei ou apenas consagradas pelo costume?
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Resposta: A resposta s perguntas precedentes torna intil dizer muita coisa sobre esta; pode-se apenas observar que, mesmo supondo que os rabinos tivessem conservado) at hoje, algum tipo de jurisdio judicial e policial entre ns, o que no o caso, nem tal jurisdio, nem as formas das eleies poderiam ser consideradas com sano legal; deveriam ser atribudas exclusivamente a costume. Dcima Pergunta: Existem profisses que a lei dos judeus os probe de exercer? Resposta: No h nenhuma; pelo contrrio, o Talmud (vide Kidushim, captulo 1) declara expressamente que o pai que no ensina uma profisso ao filho cria-o para ser um vilo. Dcima Primeira Pergunta: A lei dos judeus probe-os de praticarem a usura com seus irmos? Resposta: O Deuteronmio diz: A teu irmo no emprestars com juros, nem dinheiro, nem comida, nem qualquer coisa que se empresta com juros.6 A palavra hebraica neshekh tem sido impropriamente traduzida pela palavra usura; na lngua hebraica, ela significa juros de qualquer espcie, e no juros de usura. No pode ento ser tomada no significado agora dado palavra usura. Dcima Segunda Pergunta: Ela probe ou permite praticar usura com estrangeiros? Resposta: Vimos, na resposta pergunta anterior, que a proibio da usura, considerada, como o mais baixe juro, era uma mxima de caridade e benevolncia, e no um regulamento comercial. Sob esse ponto de vista, ela igualmente condenada pela lei de Moiss e pelo Talmud: ns somos, de um modo geral, proibidos, sempre por motivo de caridade, a emprestar com juros a nossos concidados de diferentes crenas, bem como a nossos correligionrios.

O dispositivo da lei que permite cobrar juros do estrangeiro refere-se, evidentemente, apenas a naes em intercmbio comercial conosco; de outro modo, haveria uma evidente contradio entre essa passagem e vinte outras das escrituras sagradas.7 Assim, a proibio se estendia ao estrangeiro que vivia em Israel; a Escritura Sagrada coloca-o sob a salvaguarda de Deus; ele um hspede sagrado, e Deus nos ordena trat-lo como a viva e como o rfo. Pode Moiss ser considerado o legislador do universo, por ele ter sido o legislador dos judeus? Haveria probabilidade de as leis que deu ao povo, que Deus confiara a seus cuidados, se tornarem leis gerais da humanidade? No emprestars a juros a teu irmo. Que garantia tinha ele de que, no intercmbio que seria naturalmente estabelecido entre os judeus e as naes estrangeiras, estas renunciariam a costumes geralmente predominantes no comrcio, e emprestariam aos judeus sem quaisquer juros? Estaria ele ento obrigado a sacrificar os interesses de seu povo e empobrecer os judeus para enriquecer naes estrangeiras? No inteiramente absurdo repreend-lo por ter posto uma restrio no preceito contido no Deuteronmio? Que legislador no teria considerado tal restrio como um princpio natural de reciprocidade? Como superior em simplicidade, generosidade, justia e humanidade a lei de Moiss, nessa questo, em relao s dos gregos e dos romanos! Podemos encontrar, na histria dos antigos israelitas, aquelas cenas escandalosas de rebelio provocadas pela dureza de credores para com seus devedores, aquelas frequentes abolies de dvidas para evitar que a multido, empobrecida pelas extorses dos emprestadores, seja levada ao desespero? A lei de Moiss e seus intrpretes tm distinguido, com louvvel humanidade, os diferentes usos de dinheiro emprestado. para sustentar uma famlia? Juros esto proibidos. para empreender uma especulao comercial, pela qual o principal arriscado? Juros so permitidos, mesmo entre judeus. Emprestem aos pobres, diz Moiss. Aqui o tributo de gratido
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Deuteronmio 23:19. 92

As seguintes passagens da Escritura so citadas: xodo 12:49 ss; Deuteronmio 1:16 e 10:18-19; Levtico 19:33; xodo 22:21; Levtico 25:15. 93

 a nica espcie de juros permitida; a satisfao de obsequiar a nica recompensa do benefcio conferido. O caso diferente em relao a capitais empregados em comrcio extensivo: l, Moiss permite ao emprestador ficar com uma parcela dos lucros de quem pediu emprestado; e como o comrcio era mal conhecido entre os israelitas, que eram exclusivamente dedicados a trabalhos agrcolas, e era realizado somente com estrangeiros, isto , com naes vizinhas, era permitido compartilhar dos lucros com elas (...). um ponto incontroverso, segundo o Talmud, que juros, mesmo entre israelitas, so legais em operaes comerciais, em que o emprestador, correndo alguns dos riscos de quem tomou emprestado, se torna um participante dos seus lucros. Esta a opinio de todos os doutores judeus. evidente que opinies pululando de absurdos e contrrias a todas as regras de moralidade social, embora apresentadas por um rabino, no podem ser imputadas doutrina geral dos judeus, assim como noes semelhantes, se apresentadas por telogos catlicos, no poderiam ser atribudas doutrina evanglica. O mesmo se pode dizer da acusao geral contra os hebreus, de que tm uma inclinao natural para a usura: no se pode negar que possvel encontrar alguns deles, embora no tantos quanto geralmente se supe, que seguem esse nefando trfico condenado por sua religio. Mas se h alguns no muito escrupulosos sob esse aspecto, justo acusar cem mil indivduos do mesmo vcio? No seria qualificado como injustia imputar o mesmo a todos os cristos porque alguns deles so culpados de usura?8

A Conferncia da Reforma Rabnica de Frankfurt

A Conferncia Rabnica de Frankfurt teve lugar em Frankfurt am Main, Alemanha, entre 15 e 18 de julho de 1845. Nesta ocasio pretendia-se analisar o relatrio da comisso sobre liturgia estabelecida na Conferncia prvia em Brunswick como consequncia da nova situao poltica e cultural dos judeus. Dois problemas emergiram em relao ao uso da lngua hebraica: primeiro, o hebraico era ininteligvel para muitos judeus; segundo, o uso da lngua nacional da antiga comunidade de Israel poderia contaminar a afiliao patritica dos judeus nos pases de sua residncia. Nesse sentido, a comisso sobre liturgia foi requerida para avaliar o lugar da lngua hebraica na liturgia. Igualmente, esta comisso foi chamada a reavaliar o lugar do messianismo no livro de oraes, uma vez que a liturgia judaica tradicional dava expresso preeminente ao anseio milenar pela vinda do Messias. Os sentimentos nacionais dessas oraes foram considerados perigosos pelos reformadores, pois exibiriam dvidas quanto identificao real dos judeus com o pas de sua residncia e cidadania.

A Assembleia, aps concluir a adoo das respostas s perguntas de Napoleo, declarou o 15 de agosto, aniversrio do Imperador, um dia que os judeus celebrariam com oraes, aes de graa e todas as demonstraes de uma pura e vvida alegria (M. Diogene Tama, Transactions of the Parisian Sanhedrin, traduo F. D. Kirwan [Londres, 1807], p. 212). 94

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A Conferncia da Reforma Rabnica de Frankfurt1

O Hebraico como lngua de orao judaica.2
Terceira Sesso, manh, 16 de julho de 1845 (...). O Presidente prope que seria desejvel discutir imediatamente o relatrio [da Comisso sobre Liturgia]. Pergunta 1: At que ponto a lngua hebraica necessria ao servio religioso pblico e, no sendo necessria, aconselhvel conserv-la por enquanto? Relatrio da comisso: Com relao primeira pergunta, no em todos os casos objetivamente necessria ao servio; e tampouco o Talmud, com excees bastante secundrias o determina. Mas como uma grande parte dos israelitas na Alemanha contempornea parece sentir uma necessidade subjetiva disso, a comisso considera o uso da lngua hebraica aconselhvel para partes tpicas da liturgia: o barechu,3 o parshat shem,4
Texto extrado de: MENDES-FLOHR & REINHARZ, J. The Jew in the Modern World, Oxford, Oxford University Press, 1980, capo IV, pp. 159/165. 2 Com trinta rabinos presentes, esta conferncia ocorreu em Frankfurt am Main, de 15 a 18 de julho de 1845. A conferncia de Frankfurt foi dedicada considerao do relatrio da Comisso sobre Liturgia criada na conferncia anterior em Brunswick. Em consequncia da nova situao poltica e cultural dos judeus, surgiram dois problemas distintos em relao ao continuado uso do hebraico como lngua de culto pblico judaico: primeiro, com o descaso para com o estudo judaico tradicional, ficava o hebraico cada vez mais incompreensvel para muitos judeus; e segundo, temia-se que o uso da lngua nacional da antiga nao de Israel iria anular a afiliao patritica dos judeus ao pais de sua residncia. Consequentemente, a Comisso sobre Liturgia foi solicitada a reavaliar o lugar do hebraico na liturgia. 3 Parte do servio dirio, o barechu (Louvado seja o Senhor que tem de ser louvado...) convoca a congregao orao, e afirma a crena na Criao como divina providncia. seguido pelo parshat shem. 4 Consistindo do shem (Deuteronmio 6:4-9), e bnos acompanhantes (extradas em grande parte de Deuteronmio 11:13-21 e Nmeros 15:3741), o parshat shem, recitado diariamente, proclama a aceitao por Israel da soberania de Deus e do jugo de Seus Mandamentos; vincula essa proclamao com as doutrinas da Criao, Revelao e Redeno. Alega-se que a expresso hebraica Adonai (isto , Deus) soa mais solene que a palavra alem Gott. A essa diferenciao eu devo seriamente fazer objeo, porque lanaria uma grande 96
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as trs primeiras e as trs ltimas bnos da liturgia, e as bnos para a leitura da Tor devem ser recitadas em hebraico; todas as demais partes da liturgia podem ser recitadas numa adaptao alem. O Presidente, de acordo com a proposta da comisso, faz agora a pergunta: rezar na lngua hebraica objetivamente, legalmente necessrio [objektiv gesetzlich notwendig]?

dvida sobre nosso juramento civil. (*) O nome Gott para mim to sagrado quanto Adonai, e espero que todos aqui concordem comigo quanto-a isso. (Consentimento geral e intenso.) No devemos ter nenhum elemento religioso arrebatado de ns. De acordo. Mas devemos antes concordar em relao natureza dos elementos religiosos. A lngua no um deles. O shem [Ouve, Israel] soa muito mais religioso ao alemo quando falado em alemo, e muito mais edificante ao ingls quando falado em ingls, do que quando falado em hebraico incompreensvel. Com a eliminao da lngua hebraica [da liturgia], ento, nada realmente se perderia (...). Eu voto pela introduo de um servio religioso puramente alemo (...). LOEWENGARD (**): Foi dito: Somos alemes e queremos ser alemes Se essa afirmao tem quaisquer implicaes polticas gostaria de lembrar-lhes que ainda no estamos emancipados. (Desaprovao generalizada. O orador explica que ele quer apenas manter fora do debate todos os aspectos polticos, porque a introduo dos mesmos s causa mal-entendidos.) Do ponto de vista religioso, fez-se uma distino entre orao e servio; isso foi correto. A leitura da Tor, por exemplo, tenciona demonstrar a unidade de Israel estabelecida pela Tor, conforme expressa em E esta a lei que Moiss props aos filhos de Israel. (***) Instruo [na Tor] poderia ser realizada sem essa leitura pblica, porque Bblias [impressas] esto agora disponveis em nmero suficiente. Como uma demonstrao [de unidade judaica], contudo, deveria bastar ler selees do Pentateuco hebraico [no servio pblico e no tambm as tradicionais passagens dos profetas]. (*) Na Idade Mdia foi instituda uma prtica que obrigava os judeus a prestarem um juramento especial (more judaico) ao testemunharem perante um tribunal no-judaico. Presumindo que os judeus no respeitassem a jurisprudncia crist, esses juramentos obrigavam os judeus a testemunharem sob a lei rabnica. Os juramentos eram acompanhados por maldies auto-impostas descrevendo a punio; frequentemente com horripilantes mincias, se fosse dado falso testemunho; s vezes, eram acompanhados de ritos humilhantes, tais como ficar de p sobre uma pele de porca. Na Frana, o more judaico s foi abolido em 1846, em partes da Alemanha somente na segunda metade do sculo XIX; e ainda era administrado na Rumnia de 1904. O Ducado de Brunswick revogou a prtica em 1845. (**) Joseph Loewengard, rabino de Lehren-Steinfels. (***) Deuteronmio 4:44; citado em hebraico. 97

Frankel5 toma a palavra. Ele considera a ocasio suficientemente importante para comear com algumas observaes gerais. Esta conferncia rabnica consiste de guias e mestres do povo. Esto familiarizados com as necessidades e os infortnios do povo; obrigao deles satisfazer essas necessidades, aliviar esses infortnios, e evitar qualquer discrdia [entre o povo]. dever da conferncia rabnica mostrar e atestar que movida por aspiraes srias e sagradas. Seus porta-vozes, consequentemente, tm de comear declarando seus princpios. orgulho do judasmo que nenhuma pessoa, e nenhuma classe social, pode presumir autoridade, mas que cada deciso precisa evoluir organicamente de princpios e derivar da sua validade. Pontos de vista podem ser declarados e postos em votao, mas sem princpios eles so meramente opinies particulares. Antes de tudo, portanto, as pessoas tm direito a uma exposio dos nossos princpios (...). O orador agora explica seus princpios: Ele favorvel a um judasmo positivo, histrico. [Essa abordagem postula que] a fim de compreender o judasmo no presente preciso olhar para trs e investigar seu passado. As formas positivas de judasmo esto profundamente enraizadas em seu mago e no devem ser descartadas fria e impiedosamente. Onde estaramos ns se fssemos estraalhar nossa vida interior e deixar uma nova vida brotar de nossas cabeas assim como Minerva brotou da cabea de Jpiter? No podemos retomar letra da Escritura. A lacuna [entre ela e ns] ampla demais para ser transposta. At mesmo uma nova exegese da Bblia est sujeita a mutveis fases de erudio e no poderia servir como alicerce de um edifcio firme. Deveramos admitir alguma influncia no Zeitgeist, no esprito do tempo? Mas o Zeitgeist to volvel quanto os
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tempos. E, alm disso, frio. Pode parecer razovel, mas jamais satisfar, consolar e acalmar a alma; o judasmo, por outro lado, sempre inspira e enche a alma de bem-aventurana. A reforma do judasmo, alm disso, no uma reforma da f, e sim de mandamentos religiosos. Estes ainda vivem no povo e exercem sua influncia. No somos chamados para enfraquecer, e sim para fortalecer essa influncia. No devemos considerar os indivduos que no os acatam; no somos um partido e precisamos, portanto, cuidar do todo. Agora necessrio conservar as coisas que so verdadeiramente sagradas para o povo inteiro, para evitar qualquer cisma em Israel. De preferncia a criar partidos novos devemos fazer as pazes entre os existentes (...). Quarta Sesso, tarde, 16 de julho de 1845... Geiger6 pede uma estrita aderncia expresso do problema como consistindo das duas perguntas seguintes: 1. a completa excluso da lngua hebraica da liturgia em geral desejvel? 2. Existem consideraes momentneas a favor de uma soluo provisria? As duas perguntas, entretanto, se sobrepem e no podem ser estritamente separadas no debate. O orador considera desejvel rezar na lngua materna, que a linguagem da alma. Nossas mais profundas emoes e sentimentos, nossos mais sagrados relacionamentos, nossos pensamentos mais sublimes nela encontram sua expresso. Ele se sente obrigado a reconhecer que, no que se refere a ele prprio embora o hebraico seja sua primeira lngua materna, que ele aprendeu antes de qualquer outra,

Zecharias Frankel (1801-1875). Ao tempo da conferncia, era rabino-chefe de Dresden e editor fundador da Zeitsdtrift fuer die religioesen Interessen des Judenthums [Revista para os interesses religiosos do judasmo], publicada de 1844 a 1847. Expoente, conforme suas prprias palavras, da Reforma moderada, Frankel criticou a conferncia de Brunswick (da qual se recusou a participar) por se apropriar da autoridade de um snodo eclesistico quando, na realidade, no passavam de um rgo consultivo. Alm do mais, acusou a conferncia de ter demonstrado uma falta de respeito nica aos sentimentos reinantes entre o povo judeu. Decidiu estar presente conferncia de Frankfurt a fim de garantir que seus colegas no ultrapassassem suas prerrogativas. 98

Abraham Geiser (1810-1874). Na poca da conferncia, era rabino-chefe de Breslau e o editor fundador da Wissenschaftlche Zeitschrift fuer juedische Theologie [Revista cientfica para a teologia judaica], 6 vols., 1835-1847.Considerado o esprito-guia das primeiras conferncias rabnicas, Geiser emergiu como o principal terico e porta-voz da Reforma na Alemanha. Procurou basear o estudo do judasmo numa abordagem erudita e histrica que tomaria vlida a concepo da Reforma do judasmo como um contnuo processo de evoluo. 99

e uma lngua que ele conhece a fundo uma reza alem o toca mais profundamente que uma reza hebraica. A lngua hebraica, prossegue ele, deixou de ser viva para o povo, e a linguagem de orao [judaica] certamente no mais a linguagem da Bblia. bvio, alm do mais, que mesmo uma leitura da Tor cansativa para grande parte da comunidade. A introduo do vernculo no servio religioso, alega-se, causa o desaparecimento da lngua hebraica e assim solapa os alicerces do judasmo. A essa objeo o orador responde que qualquer um que imagine que o judasmo esteja usando uma lngua como muleta ofende-a profundamente. Alm disso, considerando o hebraico como sendo de importncia central para o judasmo, este seria definido como uma religio nacional, porque uma lngua separada um elemento caracterstico de uma nao separada. Mas nenhum membro desta conferncia, concluiu o orador, gostaria de ligar o judasmo a uma nao em particular. Quinta Sesso, manh, 17 de julho de 1845... Frankel [toma a palavra]. O debate em curso, longe de oferecer novas ideias, vem, antes confirmar o ponto de vista [de Frankel]. Geiser considera uma lngua como sendo marca de uma nacionalidade separada e alega que a manuteno do hebraico iria comprovar nossas aspiraes nacionais; esse ponto, contudo, no essencial questo sob considerao. A causa da emancipao no tem nada a ver com religio, e nenhum aspecto religioso seria por ela sacrificado. Tudo atinente religio precisa ser conservado, e se nossa nacionalidade fosse religiosa, ento deveramos abertamente confess-lo. Em pases [que concederam aos judeus completa] emancipao,7 tais como Holanda e Frana, continua ele, a experincia tem felizmente mostrado que a lngua hebraica no impede os judeus de serem legtimos patriotas e de cumprirem todos os deveres para com o Estado. preciso ter muito cuidado com tais expresses; nossas reunies so pblicas, portanto, sbios, tomai cuidado com vossas palavras.8
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Se Geiser alega que uma reza alem o toca mais profundamente que uma hebraica, ele est fazendo uma afirmao puramente subjetiva. A maioria dos falantes de hebraico sentir diferentemente, porque essa lngua uma expresso mais forte de emoes religiosas; como testemunhas, o orador chama a maioria dos rabinos aqui reunidos, que esto familiarizados com a lngua hebraica. O hebraico, argumenta o orador, a lngua da nossa Bblia, que contm todos os ingredientes de nossa religio. A religio deve fornecer um elo no s abstrato mas tambm externo entre ns e a divindade, sendo esta a razo para preceitos tais como os tejilim9 e a mezuz;10 de maneira semelhante o uso do hebraico nas oraes serve como um elo externo. A lngua da Bblia um constante lembrete de nossa Aliana com Deus. Esses vrios elos e lembretes se parecem com o feixe de flechas na seguinte parbola. Enquanto as flechas permanecerem atadas juntas o feixe inquebrvel, mas to logo flechas sejam isoladamente retiradas do feixe, este rapidamente se desfar. Muitos elementos caractersticos do judasmo j foram a essa altura apagados; tempo de deter o processo. H um outro aspecto a ser tambm considerado. A Bblia foi dada aos judeus como um penhor a ser salvaguardado; eles foram chamados a lev-la pelo mundo por milhares de anos. Vejam bem, no foram somente os sacerdotes de Israel os incumbidos de faz-lo, e sim todo Israel. J Samuel, ao estabelecer escolas para profetas, minou a hierarquia; por isso, dele est escrito Moiss e Aro entre os Seus sacerdotes, e Samuel entre os que invocam Seu nome... [Salmos 99:6; citado em hebraico], e o Talmud corretamente observa Samuel equivalente a Moiss e Aro.11 Se os textos originais das Escrituras fossem se tornar propriedade exclusiva de uma classe separada de rabinos, teramos em breve novamente uma separao entre sacerdotes e leigos. Mas ns todos objetamos ao estabelecimento de uma casta de sacerdotes e desejamos obliterar
Filactrios, duas pequenas caixas pretas presas a tiras de couro, contendo quatro pores do Pentateuco escritas em pergaminho (xodo 13:1-16; Deuteronmio 6:4-9 e 11:13-12). So atadas (postas) no brao e na cabea do homem judeu durante as oraes da manh. 10 Rolo de pergaminho colocado num recipiente e afixado obreira da porta das moradias dos judeus. No rolo esto escritas pores de Deuteronmio 6:4-9 e 11:13-21. 11 Talmud, tratado Berackhot 31b; citado em hebraico. 101
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Os judeus da Alemanha, claro, no gozavam a esse tempo de plenos direitos civis e polticos. 8 Mishn, tica dos Pais 1:11; citado em hebraico. 100

qualquer lembrana disso. por isso que nossa juventude precisa ser instruda na lngua hebraica, a fim de que possa compreender o servio religioso e as Escrituras. O orador acrescenta, contudo, que necessrio conduzir parte do servio em alemo; mas o hebraico tem de predominar. A lngua da revelao, com que Deus falou a Moiss, tem de agir como um estmulo edificante. O hebraico , de fato, to essencial ao nosso servio que seu uso deveria ter sido assegurado por lei [da Halakh]; tivesse algum jamais pensado em abandonar a lngua hebraica, tal lei teria certamente sido aprovada. Os sbios permitiram, no servio, outra lngua alm do hebraico [isto , o aramaico]12 simplesmente em considerao aos fracos incapazes de encontrar sua paz de esprito numa orao hebraica. Eles nunca pensaram em excluir do Templo a lngua hebraica (...). PHILIPPSON: Todos os extremos devem ser evitados, e segundo o consenso geral nem o hebraico nem o alemo devem ser excludos do servio. A questo , pois, uma questo de propores. No trabalhamos para o momento e para comunidades individuais; trabalhamos para o futuro e para a totalidade [do judasmo]. Os elementos hebraico e alemo devem ser organicamente fundidos um no outro. Precisaremos distinguir entre orao e servios pblicos. Uma orao a expresso de especficos estados e emoes da alma, de felicidade e infelicidade, de alegria e sofrimento, de tristeza, arrependimento e penitncia; aqui, uma compreenso integral necessria, e uma lngua estrangeira completamente intil. Os servios pblicos de orao, por outro lado, no se referem ao indivduo [per se]; a reza pblica se destina a estimular e ensinar e a expressar a confisso. A lngua hebraica certamente serve como um estmulo. Nela, pela primeira vez, foram expressos o shem [Ouve, Israel, Deuteronmio 6:4], a unicidade de Deus; o princpio do amor puro pela humanidade,
O aramaico um cognato do hebraico que durante muitos sculos foi o vernculo da Palestina. Leituras bblicas eram traduzidas para o aramaico em beneficio dos membros da congregao que no compreendiam o hebraico. Algumas das oraes da liturgia tradicional ainda so em aramaico, mais notadamente a doxologia conhecida como o kaddish. 102
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Amars o teu prximo como a ti mesmo [Levtico19:18, citado em hebraico]; a proposio da igualdade de todos perante a lei, uma s lei e uma s regra [Nmeros 15;16, citado em hebraico]; Moiss falou a Deus em hebraico, Senhor, Senhor comeaste a mostrar ao Teu servo a Tua grandeza... [Deuteronmio 3:24]. Deus havia comeado a Se revelar a ele. Usando as expresses originais, portanto, o servio pblico de oraes age como poderoso estmulo. Quando a Tor lida, a lngua hebraica tambm agir como mestra. Essa leitura no deve ser abolida, pois de outro modo o povo perderia todo o contato com as Escrituras (...). Como um centro das confisses a lngua hebraica indispensvel. Os judeus alemes so alemes, eles sentem e pensam em alemo, e desejam viver e agir como patriotas. Mas o judasmo no alemo, universal. A Dispora dos judeus no equivalente Dispora do judasmo; esta, pelo contrrio, precisa manter seu carter unificado. O contedo desse carter a confisso; sua forma representada na lngua hebraica. Como cidados, nos esforam os para alcanar a unidade com nossos concidados; como membros de uma religio, contudo, somos permitidos, e at obrigados, a conservar aquilo que nos diferencia. Diante de uma maioria imensa, a minoria precisa de alguns aspectos diferenciadores. A lngua hebraica preenche tal finalidade. Alm do mais, a lngua hebraica no , conforme se alega, nem pobre nem morta. Com ela f.oram escritas obras-primas de imperecvel valor, e com.o uma lngua de religio ela tem permanecido plenamente viva. Repetindo, a lngua hebraica tem de ser conservada, mas ao mesmo tempo tem de ser organicamente unida ao elemento alemo. KAHN13: Estou falando somente sob um ponto de vista objetivo. Eu certamente desejo conservar, por enquanto, a lngua hebraica, mas devem.os reconhecer, gratamente, que seu uso para nossas oraes no est, em parte alguma, determinado. Nosso ideal, portanto, deve ser o
Joseph Kahn (1809-1875). Ele era o rabino-chefe de Treves (Trier), onde oficiou por mais de trinta anos. 103
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estabelecimento de um servio puramente alemo, porque a lngua, por si s, no constitui um elemento religioso. Nossa escola deveria ensinar em hebraico; o servio religioso, contudo, visa a edificar, a elevar, a instruir; no deve ser transformado em um meio para a preservao da lngua hebraica.

A questo do Messianismo14
Oitava Sesso, 20 de julho de 1845. Agenda: Discusso de questes pertinentes ao culto. Questo 2: at que ponto deve o dogma do Messias, ou qualquer coisa a ele atinente, ser levado em considerao na liturgia? Antes de abrir o debate, o Presidente15 considera necessrio observar que no estamos interessados no estabelecimento de uma certa doutrina do Messias, e que tais doutrinas no sero postas em votao; s estamos interessados em como a liturgia existente deve ser avaliada a esse respeito, ou talvez convenientemente alterada. Pontos de vista podem diferir subjetivamente, mas espera-se que surgir uma verso aceitvel por todos. Os numerosos oradores, especialmente os que entusiasticamente acreditam no messianismo tradicional, devem ter o cuidado de no criar quaisquer dvidas quanto sua lealdade para com o Estado. Tais contrastes e aparentes contradies so facilmente resolvidos na prpria: mente do crente. Aqui s estamos preocupados com as exigncias da honestidade, para que no rezemos por algo que no coincida com nossas convices. O relatrio da comisso diz o seguinte: O conceito do Messias deve continuar ocupando um lugar destacado na liturgia, mas todas as implicaes polticas e nacionais tm de ser evitadas.

EINHORN16: O conceito do Messias est intimamente associado a toda a lei cerimonial. Os que acreditam no Talmud s encontram sua salvao na reconstruo do Estado, no retorno do povo, no reincio dos sacrifcios etc. Aqui est a causa de todas as nossas lamentaes pela destruio do Templo, e nossas angstias pelas runas do altar. Uma ardente crena e uma inabalvel coragem eram expressas nessas esperanas, proferidas das escuras cavernas de nossas miserveis ruas. Agora, porm, nossos conceitos mudaram. No h mais necessidade de uma extensa lei cerimonial. A abordagem anterior restringia a orientao divina ao povo e terra [de Israel]; a divindade, acreditava-se, apreciava sacrifcios sangrentos, e eram necessrios sacerdotes para penitncia. Com crescente zelo, os profetas falaram abertamente contra essa viso restrita. Todos conhecem o trecho: Foi declarado a ti, homem, o que bom, e o que o Senhor exige de ti; apenas que pratiques a justia, e ames a misericrdia, e andes humildemente com teu Deus (Miqueias, 6:8, citado em hebraico]. O declnio da independncia poltica de Israel foi em certa poca lamentado, mas na realidade no foi uma desgraa, e sim um marco de progresso; no uma degradao e sim uma elevao de nossa religio, atravs do que Israel ficou mais prximo de cumprir sua vocao. O lugar dos sacrifcios foi tomado por sacra devoo. De Israel, a palavra de Deus teve de ser levada aos quatro cantos do mundo, e novas religies tm ajudado a realizar a tarefa. O Talmud se move em crculos; ns, contudo, somos a favor do progresso. Cheguei certa vez a encarar o conceito do Messias como um substituto para a ideia de imortalidade, mas agora no penso mais assim. Considero-o, antes, como uma esperana de salvao tanto mundana quanto celeste. Nem esta ideia nem o conceito de Povo Eleito contm algo de repreensvel. O conceito do Povo Eleito oferece, de fato, inegvel vantagem, pois cria uma benfica autoconscincia diante da igreja dominante.

A liturgia judaica tradicional d expresso destacada ao milenar anseio por um Messias pessoal da real Casa de Davi que anunciar o retorno dos exilados de Israel sua ptria ancestral. Os sentimentos nacionais dessas oraes eram considerados por alguns reformistas como lanando dvidas sobre a identificao dos judeus com o pas de sua residncia ou cidadania. A Comisso para Liturgia foi encarregada de reavaliar o lugar do messianismo no mbito do livro de oraes. 15 Leopold Stein (1810-1882). De 1844 a 1862, foi rabino em Frankfurt am Main. 104

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16 David Einhorn (1809-1879). Em 1842, foi nomeado rabino de Hoppstaedten e rabinochefe do principado de Birkenfeld. Em 1855, emigrou para os Estados Unidos, onde se tornou um lder da ala radical do movimento reformista. 105

Eu voto pela renncia a todas as peties a favor da restaurao dos sacrifcios e por nossa independncia poltica. Preferiria que nossas oraes pelo Messias expressassem uma esperana de um renascimento espiritual e a unificao de todos os homens na f e no amor atravs de Israel. HESS17: Ao discutirmos o conceito do Messias corremos o maior risco de nos perdermos em teorias difusas. A questo simplesmente se desejamos interpretar a Bblia em esprito, ou literalmente; se concebemos o messianismo como um ideal, ou como a ideia de nossa independncia religiosa, inatingvel sem a plena igualdade poltica dos israelitas; se, alm disso, o vemos como um elo com nossos irmos vivendo sob governantes opressores. Atenhamo-nos, portanto, ao fato de que o conceito de um Messias pessoal e poltico est morto para o judasmo alemo, e que no devemos pedir a Deus aquilo em que no mais acreditamos (...). HOLDHEIM18: Dois pontos de desentendimento precisam ser esclarecidos: 1. A esperana de uma restaurao nacional contradiz nosso sentimento pela ptria; alguns oradores tm alegado, por outro lado, que os dois podem coexistir. 2. Somos advertidos para no enfatizar o elemento nacional, a fim de que no haja interpretaes errneas; mas foi corretamente observado, por outro lado, que no devamos dar ateno a interpretaes equivocadas. O ponto principal, contudo, este: Ns representamos meramente os interesses religiosos, e no polticos, da comunidade. Os interesses polticos so suficientemente representados por outros porta-vozes. Nossa nacionalidade agora s expressa em instituies e conceitos religiosos. Diz-se: Nossa nacionalidade original se desenvolveu para religio. Mas isso errneo; um tal desenvolvimento no natural. preciso no confundir
Michael Hess (1782-1860). Um adepto da reforma completa, foi de 1806 a 1855 o diretor do Philanthropin, em Frankfurt, uma escola, primria e secundria judaica moldada segundo o esprito da Hascal. 18 Samuel Holdheim (1806-1860). Rabino da provncia de Mecklenburg-Schwerin de 1840 a 1846. Em 1847, aceitou um convite para ser o rabino da recm-fundada congregao reformada de Berlim, que sob sua liderana se tornou um centro da Reforma radical. 106
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um fenmeno nacional com um religioso, pois de outro modo muitos abusos poderiam ser justificados. O desejo de retomar Palestina para ali criar um imprio poltico para os que ainda so oprimidos por causa de sua religio suprfluo. De preferncia, dever-se-ia desejar um trmino da opresso, o que melhoraria a sorte deles como tem melhorado a nossa. O desejo, alm do mais, inadmissvel. Transforma a esperana messinica de religiosa em secular, da qual prazerosamente se desiste to logo a situao poltica mude para melhor. Mas a esperana messinica, verdadeiramente compreendida, religiosa. Expressa ou uma esperana por redeno e libertao de privao espiritual e a realizao de um Reino de Deus na terra, ou por uma restaurao poltica da teocracia mosaica onde judeus poderiam viver de acordo com a Lei de Moiss. A essa outra esperana religiosa s podem renunciar aqueles que tm uma concepo mais sublime do judasmo, e que acreditam que a consecuo da misso do judasmo no depende do estabelecimento de um Estado judeu, e sim de uma incorporao do judasmo na constelao poltica da ptria. Somente uma concepo esclarecida da religio pode deslocar uma obscurecida. Aqueles, porm, que acreditam que a religio exige uma restaurao poltica no devem renunciar a essa crena nem mesmo sob as melhores circunstncias [na Dispora], porque a religio no se contentar com nada menos que a completa satisfao de suas exigncias. Essa a diferena entre Ortodoxia rigorosa e Reforma: Ambas abordam o judasmo sob um ponto de vista religioso; mas enquanto a primeira visa a uma restaurao da antiga ordem poltica [no interesse da religio], a segunda visa unio mais estreita possvel com as constelaes polticas e nacionais de seu tempo [como exigncia da religio] (...). WECHSLER19: To logo tentamos definir o como de nossa esperana, a esperana imediatamente desaparece. Devemos no vivissectar nosso messianismo e sim moldar as oraes existentes de acordo com nossa conscincia. No podemos desconsideraras massas. Se tivssemos de compor novas oraes, a situao seria diferente.
Bernhard Wechsler (falecido em 1874). Em 1841, sucedeu a Samson Raphael Hirsch como rabino-chefe de Oldenburg. 107
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Consequentemente, tudo j em existncia deve ser admitido enquanto no for contrrio verdade comumente aceita. Poltico e nacional, de qualquer maneira, no parecem ser as expresses corretas. o Povo de Israel um termo nacional ou poltico? Se assim fosse, a palavra Povo no deveria ser usada, e todas as passagens na liturgia que a contivessem deveriam ser eliminadas. A questo s diz respeito orao por nosso retorno Palestina e todas as suas consequncias. Em todos os acrscimos contemporneos ao livro de oraes, nossa concepo moderna do Messias pode ser Claramente afirmada, inclusive a confisso de que nosso recm-obtido status de cidados constitui uma realizao parcial de nossas esperanas messinicas (...). Resoluo adotada pela maioria: A ideia messinica deve receber meno destacada nas oraes, mas todas as peties para nosso retorno terra de nossos pais e pela restaurao de um Estado judeu devem ser eliminadas da liturgia (...).20

A Plataforma de Pittsburgh
A Plataforma de Pittsburgh, Estados Unidos, foi adotada sem reservas pela conferncia central dos rabinos reformistas americanos em 1889. Essa plataforma permaneceu como expresso bsica das correntes de reforma da Amrica at a Conferncia de Columbus, em 1937. A Plataforma de Pittsburgh definia o judasmo como uma religio confessa devotada misso de liderar o mundo numa f universal. Tal misso deveria ser inteiramente compatvel com os ideais da Repblica americana, no havendo contradio entre a lealdade ao judasmo e a integrao na poltica e na cultura americanas.

A conferncia aprovou unanimemente a remoo da liturgia das tradicionais peties pela restaurao do culto sacrificial. A maioria da conferncia, entretanto, votou no sentido de que, desde que fossem recitadas apenas em hebraico, as passagens na Tor referentes ao sacrifcio deveriam permanecer na liturgia. 108

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A Plataforma de Pittsburgh1
Resolues (dos protocolos da conferncia)
Artigo 1. A meta messinica de Israel no a restaurao do antigo Estado judeu sob um filho de Davi, nem a continuada separao de outras naes, e sim a unio de todos os homens como filhos de Deus reconhecendo Sua unidade, e a unicidade de todos os seres racionais e seu chamamento santificao moral. Artigo 2. No consideramos a queda do segundo Estado judeu como uma punio pelos pecados de Israel, e sim como uma sequncia da inteno divina primeiro revelada numa promessa a Abrao e depois cada vez mais evidente no decurso da histria mundial, de enviar os membros da nao judaica a todas as partes da terra para que possam cumprir sua elevada tarefa sacerdotal de conduzir as naes no verdadeiro conhecimento e adorao a Deus. Artigo 3. O servio sacerdotal dos aaronitas e o culto sacrificial mosaico foram apenas passos preparatrios para o verdadeiro servio sacerdotal de todo o povo, que comeou na realidade com a disperso da nao judaica. Pois devoo interior e santificao tica so os nicos sacrifcios aprazveis a Deus. Essas instituies que lanaram os fundamentos para maior religiosidade deixaram de existir, de uma vez por todas, quando o segundo Templo foi destrudo. E somente nesse sentido que tm valor educativo e podem ser mencionados em nossas oraes. Artigo 4. Qualquer distino entre aaronita e no-aaronita em relao a obrigaes e ritos religiosos tornou-se, portanto, inadmissvel, tanto em ritual como na vida. Artigo 5. A escolha de Israel como um povo de f, como portador da mais elevada ideia de humanidade, deve ser enfatizada to vigorosamente como tem sido no passado, mas somente acompanhando uma igual nfase
Texto extrado de: PLAUT, C. (Org.). The Growth of Reform Judaism, New York, World Union for Progressive Judaism, 1965, cap. III pp. 30/36. 110
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na misso universal de Israel e no igual amor de Deus para com todos os Seus filhos. Artigo 6. A crena em ressurreio corprea no tem fundamento religioso, e o ensino da imortalidade deve ser expresso exclusivamente em relao continuada existncia espiritual. Artigo 7. O cultivo da lngua hebraica, em que foram expressos os divinos tesouros da revelao e em que os imortais monumentos de nossa literatura tm sido preservados (e cuja influncia dominante se estende a todas as naes educadas), deve em nosso meio ser considerado o cumprimento de uma sagrada obrigao. Todavia, essa lngua tornou-se de fato incompreensvel para a esmagadora maioria de nossos correligionrios atuais, e consequentemente no ato de rezar (que um corpo sem alma a no ser que seja compreendido) deve o hebraico assumir lugar secundrio, por trs de uma lngua que os devotos possam compreender, at onde isso parea aconselhvel sob as circunstncias vigentes.

A plataforma de Pittsburgh
Tendo em vista a ampla divergncia de opinio, bem como as conflitantes ideias predominantes no judasmo de hoje, ns, na qualidade de representantes do Judasmo Reformista na Amrica, em continuao ao trabalho iniciado na Filadlfia em 1869, unimo-nos sob os seguintes princpios: Primeiro Reconhecemos em todas as religies uma tentativa de compreender O Infinito, e em cada modo, fonte ou livro de revelao considerado sagrado em qualquer sistema religioso a conscincia do habitar de Deus no homem. Sustentamos que o judasmo apresenta a mais alta concepo da ideia-Deus conforme ensinada em nossas santas Escrituras e desenvolvida e espiritualizada pelos mestres judeus de acordo com o progresso moral e filosfico de suas respectivas pocas. Afirmamos que o judasmo preservou e defendeu em meio a contnuas lutas e provaes e sob isolamento forado essa ideia-Deus como a verdade religiosa central para a raa humana.
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Segundo Reconhecemos na Bblia o registro da consagrao do povo judeu sua misso como sacerdote do Deus nico, e valorizamo-la como o mais possante instrumento de instruo religiosa e moral. Sustentamos que as modernas descobertas de pesquisas cientficas nos domnios da natureza e da Histria no so antagnicas s doutrinas do judasmo, refletindo a Bblia as ideias primitivas de sua prpria poca, e por vezes vestindo com narrativas miraculosas sua concepo de divina providncia e justia para com o homem. Terceiro Reconhecemos na legislao mosaica um sistema de instruo do povo judeu para sua misso durante sua vida nacional na Palestina, e hoje em dia aceitamos como obrigatrias apenas as leis morais e mantemos somente aquelas cerimnias que elevam e santificam nossas vidas, mas rejeitamos todas as que no se adaptam s opinies e aos hbitos da civilizao moderna. Quarto Sustentamos que todas as leis mosaicas e rabnicas reguladoras de alimentao, pureza sacerdotal e vesturio se originaram em pocas e sob a influncia de ideias totalmente estranhas ao nosso atual estado mental e espiritual. No impressionam o judeu moderno com um esprito de sacerdotal santidade; sua observncia em nossos dias ir mais provavelmente obstruir do que incentivar a elevao espiritual moderna. Quinto Reconhecemos na era moderna de cultura universal do corao e do intelecto a aproximao da grande esperana messinica de Israel pelo estabelecimento do reino da verdade, justia e paz entre todos os homens. No mais nos consideramos uma nao mas uma comunidade religiosa, e consequentemente no esperamos nem um retorno Palestina, nem um culto sacrificial sob a administrao dos filhos de Aaro, nem o restabelecimento de quaisquer das leis referentes ao Estado judeu. Sexto Reconhecemos no judasmo uma religio progressista, sempre se esforando para estar de acordo com os postulados da razo. Estamos convictos da extrema necessidade de preservar a identidade histrica com nosso grande passado. Cristianismo e islamismo sendo religies-filhas do judasmo, apreciamos sua misso de auxiliar na difuso da verdade monotesta e moral. Reconhecemos que o esprito de ampla humanidade de nossa poca nosso aliado ao cumprimento de nossa
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misso, e portanto estenderemos a mo da amizade a todos os que conosco cooperam no estabelecimento do reinado da verdade e da justia entre os homens. Stimo Reafirmamos a doutrina do judasmo, de que a alma dos homens imortal, baseando essa crena na natureza divina do esprito humano, que para sempre encontra bem-aventurana na justia e misria na maldade. Rejeitamos como ideias no enraizadas no judasmo a crena tanto em ressurreio corprea quanto na Gueena e no den (inferno e paraso) como habitaes para eterna punio ou recompensa. Oitavo Em plena concordncia com o esprito da legislao mosaica, que se esfora para regular a relao entre ricos e pobres, achamos ser nosso dever participar da grande tarefa dos tempos modernos, para solucionar com base na justia e na honestidade os problemas apresentados pelos contrastes e males da atual organizao da sociedade.

Discusso em Pittsburgh
Aps a leitura da Plataforma, o Presidente, Dr. Wise, disse: Senhores, o que vo fazer com esta Declarao de Independncia? Dr. Moses: Sado com grande alegria esta declarao competente e maravilhosamente liberal. A plataforma admirvel e aceito-a com ambas as mos, e proponho sua aprovao nesta reunio. O Dr. Wise ento apresentou a questo e a plataforma como um todo foi aceita por unanimidade, ficando entendido que deveria ser submetida a meticuloso exame pela conveno, frase por frase. Ocorreu ento a releitura da plataforma e vrias emendas e correes verbais foram aceitas. Para o pargrafo 2 da plataforma, o Dr. Kohler props que suas palavras originais de Revelao Divina fossem inseridas antes de consagrao. Dr. Hirsch: Eu no usaria essa palavra, pois representa uma ideia que eu no sustento. No acredito em revelao, se com isso se quer dizer o que geralmente se supe ter ocorrido no Sinai. E tampouco a minha
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congregao. Eles foram ensinados por mim e por meus predecessores que religio o resultado de evoluo. Dr. Moses: A palavra revelao nos leva ao domnio do misticismo. O Dr. Hahn tambm faz objeo ao termo, declarando que os vrios filsofos judeus no foram claros em relao ao mesmo. uma questo filosfica que no deveria caber aqui. O reconhecimento de nossa misso sacerdotal implica a ideia de revelao. Rabino Weil: Se o judasmo no uma religio revelada, ento o que ? O Dr. [Michael] Machol quer uma expresso explcita para revelao. Dr. Kohler. Eu confesso, sou um evolucionista, mas acredito em revelao, e sou suficientemente ousado para dizer que A Tor min hashamayim, que revelao, precisa permanecer sempre uma das pedras fundamentais do judasmo. Obviamente, no acredito que Deus em pessoa desceu do cu e falou no Monte Sinai, mas quando uma nova verdade, em vez de ser buscada, procura seu instrumento apossando-se de uma nica pessoa ou de um povo e impelindo-os a se tornarem seu arauto, isso revelao, e nesse sentido que eu quero que seja compreendido e aceito. Dr. Sonneschein: Revelao, assim como socialismo, uma palavra que virou tabu, verdadeiramente linda no significado, mas mal compreendida, e por essa razo devia ser evitada na plataforma. Dr. Hirsch: Revelao atravs de gnio, individual ou coletivo, organicamente desenvolvida, nenhum de ns rejeita, mas o termo tcnico no transmite esse significado. Dr. Kohler. Vendo que a questo no uma questo de princpio, mas que todos concordam quanto aceitao da ideia de revelao, e que somente o uso da palavra desgostado na plataforma, eu retiro minha emenda, declarando expressamente que concordamos no princpio de uma sucessiva revelao Divina como um fato histrico. O pargrafo 2 foi aceito por unanimidade, havendo por proposta do Dr. Sonneschein uma chamada nominal.
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Ao Pargrafo 3, que dizia inicialmente Legislao Mosaica, o Dr. Hirsch objetou quanto a distino feita entre leis morais e cerimoniais. Embora sancionadas por um homem to ilustre quanto o santo Dr. Einhorn, apresenta dificuldades. No so os feriados leis cerimoniais, e iramos aboli-los? Aceitemos a oportunidade para nos declararmos abertamente contra o judasmo legal. Eu, por mim, associo-me opinio do Dr. Sam. Hirsch; judasmo uma Lehre [um ensinamento]: as denominadas leis cerimoniais so smbolos representando a ideia! Smbolos morrem; aqueles que esto mortos e, portanto, no mais inteligveis, ns abolimos; os que ainda esto imbudos de vida ns, claro, conservamos. Entre os primeiros eu incluo todos os regulamentos de pureza e alimentares; como leis, certamente, no so de origem judaica. Entre os outros, incluo os dias santos. E, como tais, oponho-me sua transferncia para domingo em minha prpria congregao! Depois do que o Dr. Kohler props substituir a palavra legislao. Aprovado. O Pargrafo 3 foi ento unanimemente aceito com chamada nominal, e assim tambm o Pargrafo 4. Ao Pargrafo 7, referente imortalidade, o Dr. Hahn levantou objees por ser dogmtico demais, e ter um excessivo sabor de saducesmo. O Dr. Falk manifestou o desejo de ver Recompensa e Punio salientadas como um indispensvel dogma judaico. O Dr. Wise referiu-se ao Yad Hachasaka (Hilch Theshuba) de Maimnides como sendo a melhor autoridade corroborando a concepo espiritual de Retribuio expressa na plataforma. Dr. Hirsch: A ressurreio j foi rejeitada pela Conferncia de Filadlfia, mas punio eterna e prazer do Paraso tambm devem ser descartados. Que nossos modernos judeus de Kaddish sejam lembrados que os doze meses queimando na Gueena so provavelmente de origem parse. Nunca ser demais insistir enfaticamente que a justia em si mesma uma recompensa e que a maldade traz consigo seu prprio castigo, e que o trabalho o objetivo da vida.
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Dr. Kohler. A expresso para sempre implica um eterno reajustamento das aes do homem atravs de todas as pocas ou uma evoluo da vida da alma, esta ascendendo de etapa em etapa com sua bemaventurana e seus infortnios. No precisamos de nenhuma recompensa ou punio real ou localizada. Isso no saducesmo. opinio de Antigonus de Sokho na Mishn: No sejam como criados que trabalham para seu patro apenas visando ao salrio! O Pargrafo 7 foi finalmente aprovado, e assim tambm o Pargrafo 8. Com a aprovao da plataforma como um todo, os trabalhos foram suspensos at a tarde.

Zacharias Frankel (1801-1875)

Considerado o fundador ideolgico do Movimento Conservador no judasmo, Zacharias Frankel foi uma das principais figuras da histria legal judaica do sculo XIX na Alemanha. Serviu como rabino em Dresden e depois em Berlim e foi o lder do recm-fundado Seminrio Rabnico de Breslau. A sua viso do judasmo combinava com uma nfase sobre a tradio com o reconhecimento de que o judasmo apresentava uma srie de problemas quando defrontado com as exigncias da modernidade. Reconhecia o crescimento histrico do judasmo mas discordava das reformas na ritualstica e nos preceitos da tradio. Participou da Conferncia Rabnica de Frankfurt (1845), que resultou no crescimento do Movimento de Reforma do qual ele era vigoroso oponente. Acreditava que os reformistas distorciam o judasmo, pois propunham mudanas precipitadas em troca da emancipao.

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Zacharias Frankel1
Sobre mudanas no judasmo
...Manter a integridade do judasmo simultaneamente com o progresso, este o problema fundamental do presente. Podemos negar a dificuldade de uma soluo satisfatria? Onde est o ponto em que os dois aparentes contrrios podem se encontrar? Qual deveria ser o nosso ponto de partida na tentativa de reconciliar o judasmo essencial com o progresso e que espcie de oposio podemos esperar encontrar? Como podemos assegurar repouso alma de modo que no seja dilacerada ou entorpecida por severas dvidas enquanto busca a calorosa radiao da f, e contudo atribuir razo seus direitos, e possibilitar-lhe emprestar fora e lucidez ao sentimento religioso que brota das emoes? Os elementos opostos que to raramente esto em equilbrio precisam ser unidos e esta a nossa tarefa (...). O judasmo uma religio que tem uma influncia direta na atividade de vida. uma religio de ao, exigindo a execuo de preceitos que ou objetivam diretamente enobrecer o homem ou, ao lembr-lo do divino, fortalecer seus sentimentos de dependncia de Deus. E por causa dessa caracterstica que nem a pura contemplao abstrata nem o obscuro misticismo jamais conseguiram lanar razes no judasmo. Isso, por sua vez, assegurou que as sublimes ideias religiosas fossem mantidas em sua pureza, da resultando que mesmo hoje brilha no judasmo a luz divina. Enfatizando a atividade religiosa, est o judasmo inteiramente atado vida e torna-se propriedade de todo judeu individualmente. Uma religio de meras ideias pertence principalmente aos telogos; as massas que no esto adaptadas a tais concepes pouco se interessam pelas particularidades dessas religies, porque elas pouco se relacionam com a vida. Uma religio de ao, por outro lado, est sempre presente, exigindo prtica em atividades e uma expresso de vontade, e suas exigncias se
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refletem na vida multiforme do indivduo, do que resulta tornar-se a f propriedade comum de todos os seguidores. Chegamos assim ao ponto de partida para a considerao dos atuais partidos no judasmo. O ponto de vista do partido Ortodoxo ntido. Ele cresceu na atividade devota; para ele, a execuo dos preceitos inseparvel da f, pois a seu ver esto ambas estreita e interiormente ligadas. Se viessem a se separar da observncia e desistir dos preceitos, eles se veriam alienados de si mesmos e se sentiriam como mergulhados num abismo. Dado esse ponto de vista, a direo e a nfase do partido Ortodoxo esto bem claras. Onde mais, a no ser na combinao de f e meticulosa observncia dos preceitos, poder ele encontrar aquela completa satisfao que tem gozado com a herana dos pais? Quando vai rejeitar aquilo que por tanto tempo manteve sagrado e inviolvel? No isso inconcebvel. Contra esse partido surgiu recentemente um outro [Reformista], que encontra seu objetivo na direo oposta. Esse partido v a salvao em superar o passado, em levar o progresso at o limite, em rejeitar as formas religiosas e retomar meramente simples ideia original. Na realidade, dificilmente podemos qualific-lo como um partido no judasmo, muito embora seus adeptos ainda usem a denominao de judeus, e como tais sejam considerados na vida social e poltica, e no pertenam a outra f. No pertencem, todavia, inteiramente ao judasmo, pois limitando-o a alguns princpios de f, colocam-se parcialmente fora dos limites do judasmo. Voltemo-nos agora para um terceiro partido que surgiu do primeiro, e no s permanece dentro dos limites do judasmo como tambm est repleto de verdadeiro zelo por sua preservao e se esfora por pass-lo aos descendentes e fazer dele o bem comum de todos os tempos. Esse partido est baseado na f racional e reconhece que a tarefa do judasmo a ao religiosa, mas exige que essa ao no seja vazia de esprito e que no venha a se tornar meramente mecnica, expressando-se principalmente na forma. Tambm alcanou o ponto de vista de que a prpria atividade religiosa deve ser trazida a um nvel mais elevado, dandose peso aos muitos significados de que deve ser dotada. Sustenta, alm disso, que devemos omitir certas aes no-importantes que no esto inerentemente ligadas nem com as elevadas ideias nem com as formas
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Texto extrado de: MENDES-FLOHR & REINHARZ, J. The Jew in the Modern World, Oxford, Oxford University Press, 1980, pp. 173-176. 118

religiosas delineadas pelas leis reveladas. Sente que precisamos tomar em considerao a oposio entre a f e as condies de nosso tempo. A verdadeira f, devido sua natureza divina, est acima do tempo, e assim como a parte mais nobre do homem no est sujeita ao tempo, assim tambm a f se eleva acima de todo o tempo, e a palavra que saiu da boca de Deus est enraizada na eternidade. Mas o tempo tem uma fora e um poder que tm de ser levados em conta. Cria-se, ento; um dualismo em que f e tempo se defrontam, e o homem escolhe viver alm do tempo ou estar sujeito a ele. nessa situao que o judeu se encontra hoje: no pode escapar da influncia das condies do tempo, e, no entanto, quando as exigncias da f o levam oposio ao esprito do tempo, espera-se que atenda a seu chamado encontre o poder de resistir s lisonjas dos tempos. Esse terceiro partido, ento, declara que o judasmo precisa ser salvo para sempre. Afirma tanto o valor divino quanto a base histrica do judasmo, e consequentemente, acredita que introduzindo algumas mudanas poder ser alcanado algum acordo com os conceitos e as condies do tempo em que se vive. A fim de ter uma concepo de que mudanas devem e podem ser introduzidas, precisamos nos perguntar permite o judasmo quaisquer mudanas em qualquer de suas formas religiosas? Considera todas elas imutveis, ou podem ser alteradas? Sem entrar na citao de autoridades pr e contra, podemos salientar que o judasmo permite, de fato, alteraes. Os antigos mestres, por interpretao, mudaram o significado literal das Escrituras; posteriormente eruditos alteraram o da Mishn, e os eruditos ps-talmdicos o do Talmud. Essas interpretaes todas no tinham a inteno de especulao. Dirigiam-se a preceitos de vida. Graas a tais estudos, o judasmo alcanou a estabilizao e evitou a alienao das condies do tempo em perodos vrios (...). [Os rabinos] instituram uma regra projetada como guardi e protetora contra mudanas indevidas. Diz o seguinte: aquilo que foi adotado pela comunidade inteira de Israel e foi aceito pelo povo e se tornou parte de sua vida no pode ser alterado por nenhuma autoridade. Nesta declarao fundamental est uma verdade viva. Atravs dela, fala uma profunda viso do judasmo que pode servir, para todos os tempos,
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como uma frmula para necessrias mudanas e que pode ser empregada tanto contra reformas destrutivas quanto contra a estagnao. Essa declarao fundamental ajuda a deixar claro para ns que mudanas no judasmo so justificadas e como podem ser feitas. verdade que o judasmo exige a atividade religiosa, mas o povo no simples barro a ser moldado pela vontade de telogos e eruditos. Em atividades religiosas, como na vida cotidiana, ele decide por si mesmo. Esse direito foi concedido ao povo pelo judasmo. Quando uma antiga ordenao religiosa no era aceita por toda a comunidade de Israel, desistia-se dela. Consequentemente, quando uma nova ordenao ia ser posta em vigor, era necessrio verificar se encontraria aceitao pelo povo. Quando o povo permite que certas prticas caiam em desuso, ento as prticas deixam de existir. No h em tais casos nenhum perigo para a f. Um povo acostumado atividade no vai se machucar e tampouco destruir suas prticas. Seu prprio senso de religiosidade o adverte contra isso. Somente aquelas prticas das quais se encontra inteiramente alienado e que no do nenhuma satisfao que sero abandonadas e assim morrero por si prprias. De um modo geral, h sempre um grande fundo de f e atividade religiosa para proporcionar segurana contra negao e destruio. Atingimos, ento, um ponto decisivo em relao a mudanas moderadas, a saber, que devem vir do povo e que a vontade de toda a comunidade que tem de decidir. Ainda assim, essa regra sozinha pouco pode realizar. A comunidade inteira um pesado corpo desarmnico e sua vontade difcil de reconhecer. S chega a se expressar aps muitos anos. Precisamos achar um caminho para efetuar tais mudanas de maneira apropriada, e isso s pode ser feito com a ajuda dos eruditos. O judasmo no tem sacerdotes como representantes da f nem requer especial beatice espiritual em seus porta-vozes. O poder de represent-lo no o quinho de uma famlia, e nem passa de pai para filho. Conhecimento e domnio da lei fornecem a santidade, e podem ser alcanados por todos. Na vida judaica, capacidade espiritual e intelectual acabou tomando o lugar do antigo sacerdcio que, mesmo em tempos primitivos, tinha sua funo limitada principalmente ao culto sacrificial. Mesmo em tempos antigos, o judasmo reconhecia a vontade do povo como uma grande fora, e devido a esse reconhecimento uma grande atividade religiosa veio a existir. Mas essa
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atividade foi por sua vez traduzida numa fora viva pelos mestres do povo atravs do uso de ordenaes originais e atravs de interpretao das Escrituras. Por vezes, essas aes dos sbios tornavam mais leve o volume de observncia; s vezes, o aumentavam. Que os resultados dos estudos e pesquisas dos mestres tenham encontrado aceitao entre o povo prova, por um lado, que os mestres conheciam o carter de seu tempo, e, por outro lado, que o povo confiava neles e os considerava verdadeiros representantes de sua f. Se telogos e eruditos judeus de nosso tempo conseguiram adquirir tal confiana, eles ento tero influncia com a introduo de quaisquer mudanas que possam ser necessrias. A vontade da comunidade de Israel encontrar ento seus representantes e o conhecimento ser seu exerccio apropriado. Os eruditos tm assim um importante dever a fim de tornar seu trabalho eficaz. o de guardar o senso de devoo do povo e de elevar seu esprito altura das grandes ideias. Para isso, precisam da confiana do povo. Oposio s opinies do povo, como a que alguns reformistas demonstram, mpia e infrutfera. O mestre assim perde o poder de tornar eficaz a essncia da f, pois em lugar daquela confiana que a base em corretas relaes entre mestre e comunidade vem a desconfiana e uma relutncia em segui-lo. As verdades da f tm de ser trazidas para perto do povo, de modo que ele possa aprender a compreender o divino contedo que tm e assim vir a compreender a natureza espiritual e o valor intrnseco das formas que corporificam essas verdades. Uma vez o povo saturado com uma percepo das verdades essenciais e das formas que as corporificam, ter sido estabelecido um terreno firme para a converso s prticas judaicas. E se o povo depois deixar de praticar alguns costumes e formas de observncia menos importantes, isso no ser motivo de maior preocupao. E no ir, como algumas recentes mudanas, levar alguns judeus a um estado de choque e desesperana. Eles no mais pensaro que todas essas mudanas levam ao desaparecimento de nossa f e lngua e nem, como sua pusilanimidade os faz acreditar, ao fim da existncia do judasmo.
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Samson Raphael Hirsch (1808-1888)

Nascido em Hamburgo, Alemanha, recebeu educao religiosa e secular estudando, na Universidade de Bonn, filologia e filosofia. Aspirou carreira rabnica, tornando-se rabino de Oldemburgo. Em 1851, a convite de um grupo tradicionalista, vai para Frankfurt. Sua pregao e seus escritos influenciaram a corrente anti-reformista, a qual passou a liderar. Nesta poca, escreve as Neunzehn Briefe uber das Judentum (Dezenove Cartas sobre o Judasmo), obra que lana a semente da chamada neo-ortodoxia; ou seja, a manuteno do tradicionalismo em termos religiosos embora de uma forma moderna. Em seu outro livro, Horeb; Oder Versuche Uber Jissroels Pflichte in der Zerstrenung (Horeb; ou ensaios Sobre os Deveres de Israel na Dispora), Hirsch desenvolve um sistema de doutrinas fundamentais do judasmo bblico-talmdico em seus aspectos ritual, tico e dogmtico. Em ambos os trabalhos, Hirsch pretende demonstrar a viabilidade do judasmo tradicional no mundo moderno. Contudo, reconhecia a necessidade de revisar certos aspectos externos do judasmo a saber, formas estticas do servio religioso pblico para facilitar o ajustamento dos judeus sensibilidade moderna. Hirsch rejeitava enfaticamente o Movimento de Reforma, bem como qualquer mudana que afetasse os princpios e contedos do judasmo halkhico (tradicional). A congregao e as instituies religiosas lideradas por ele tornaram-se paradigmas de sua viso do judasmo neo-ortodoxo, ou judasmo halkhico (tradicional), em harmonia com o mundo moderno. Em sua tentativa de preservar a ortodoxia sem renunciar educao moderna, Hirsch contribuiu sensivelmente para mobilizar o tradicionalismo no quadro de uma nova perspectiva e revitalizar o judasmo alemo do sculo XIX. Referncias GRUNFELD, I. (Edit), Judaism Etemal: Selected Essays from the Writings of Rabbi Samson Raphael Hirsch, London, The Soncino Press, 1956, vol. 2, p.213. GUINSBURG, J. (Org.). O judeu e a Modernidade, So Paulo, Perspectiva, 1970, p.115.
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Samson Raphael Hirsch

O judasmo moderno 2

Ento voc quer fazer pararem de girar as rodas do tempo, quer deter o progresso, quer nos lanar de volta ao antigo isolamento judaico, quer negar a necessidade de se mover com o tempo e tirar o judasmo do seu tmulo com suas formas h muito obsoletas! J h trinta anos vm sendo feitos esforos segundo o modelo dos velhos rabinos que, sob outros aspectos, preciso reconhecer, mal so merecedores de ateno de reformar o velho e rgido judasmo de acordo com as necessidades dos tempos; e voc acha que pode transtornar o trabalho da mais esclarecida e culta sabedoria judaica com seus miserveis artigos de Lua Nova! Seu futuro to escuro como a lua nova no calendrio, a orgulhosa marcha do tempo ri de suas labutas, e nossa juventude esclarecida passa a seu lado ignorando-o. Essa a amistosa acolhida com que estas pginas sero saudadas pela boca do judeu moderno, essa a jovial perspectiva que a moderna sabedoria judaica ir lhes oferecer. Examinemos com calma quanta verdade h nessa censura, quanta sabedoria existe nessa previso. Reformar o judasmo de acordo com as necessidades do tempo isto, segundo nossos crticos, a tarefa de nosso tempo, como tem sido a tarefa de todos os tempos. Foi isso o que ocupou os grandes mestres de todas as pocas, e somos apenas ns, obscurantistas retrgrados, que obstinadamente nos recusamos a dar ouvidos a tal sabedoria e agir nesse sentido.

Vejamos. Atualizar o judasmo, adapt-lo s necessidades do tempo, harmoniz-lo com as opinies geralmente predominantes em qualquer determinado perodo e com as condies e necessidades de qualquer determinado tempo esse seria o objetivo. Se alteramos nosso judasmo de modo a alinh-lo com as opinies predominantes em nosso tempo entre nossos irmos no-judeus, se removemos tudo que inconveniente e incmodo de realizar nas ,condies de nossa poca, ou cuja prtica nos levaria a sermos mal compreendidos e erroneamente julgados por nossos concidados, ento no assim? Teremos levado a srio a sabedoria moderna, e agido de acordo com ela. Vejamos. Era o judasmo to adequado aos tempos no passado? Poder em alguma ocasio vir a s-lo? Poderia alguma vez t-lo sido? Ir algum dia vir a s-lo? Era o judasmo de Abrao adequado aos tempos quando o governante de sua ptria o lanou na ardente fornalha caldeia por ter despedaado os dolos dos seus contemporneos? Era o judasmo de nossos antepassados adequado aos tempos quando, odiados pelos egpcios, tiveram durante sculos de curvar o pescoo sob o jugo da escravido e deixar seus bebs serem arrastados pelas ondas do Nilo? Era o judasmo de Daniel adequado aos tempos quando com os outros jovens com ele criados no palcio do rei da Babilnia ele se alimentava apenas com legumes, e quando enfrentou a fria do rei e a morte nas mandbulas do leo em vez de omitir suas oraes trs vezes por dia com seu rosto voltado para Jerusalm de acordo com o costume dos seus antepassados? Era o judasmo de Ananias, Misael e Azarias adequado aos tempos quando entraram na fornalha acesa por no obedecerem ordem do monarca de prestar homenagem sua esttua? Era o judasmo dos Macabeus adequado aos tempos quando, com herica coragem, resistiram introduo dos mais recentes costumes e cultura gregos? Era o judasmo do Beth Hilel e de Iochanan ben Zacai adequado aos tempos quando o reino da Judeia havia sido levado runa pela espada de Roma, quando o Templo de Jerusalm havia sido destrudo, e os filhos de Jud massacrados, vendidos no mercado de escravos e jogados s feras como espetculo para o Imperador, ou dispersos pelo mundo todo? E, sem dvida, a sabedoria moderna daquele tempo pregava que cabia ento,
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Texto extrado de: GRUNFELD, I. (Ed.). Judaism Eternal: Selected Essays from the Writings of Rabbi Samson Raphael Hirsch, London, The Soncino Press, 1956, Vol. 2, pp. 213/223. 2 Este artigo apareceu no primeiro nmero (outubro de 1854) da revista Jeshurun publicada pelo autor. 124

finalmente, abandonar o velho judasmo, acabar com os velhos costumes separatistas que eram somente motivo de zombaria para seus conquistadores, que era ento certamente impossvel continuar sendo judeus e judias. Eles prprios, contudo, com verdadeira grandeza de alma, olhavam adiante desse perodo de declnio, apertaram ainda mais o lao da f, ensinavam ainda mais apaixonadamente a santidade da lei e dos costumes judaicos, lanavam ainda mais insistentemente suas advertncias e admoestaes, suas regras e regulamentos, a fim de que nenhum fio da santidade judaica se perdesse na sujeio e na disperso. Era um judasmo adequado aos tempos aquele pelo qual, mais tarde, nossos antepassados durante sculos, em todos os pases e em todos os perodos, sofreram a mais ignominiosa opresso, o mais desdenhoso desprezo, e morte e perseguio sob mil formas? Em todos esses sculos, era o judasmo adequado aos tempos, adaptava-se aos pontos de vista da sociedade dominante, no estava exposto a incompreenses e a julgamentos severos, foi alguma vez conveniente e fcil ser um judeu ou uma judia? E, no entanto, dizem-nos que dever do judasmo ser em qualquer perodo adequado aos tempos! O que seria do judasmo se nossos antepassados tivessem considerado tarefa deles, em cada perodo, atualizar o judasmo, isto , plo em consonncia com as opinies e as condies predominantes em seu ambiente numa determinada poca? O que teria acontecido se assim tivessem feito, se tivessem tomado no Egito a sabedoria dos sacerdotes de Mroe, entre os babilnios os mistrios de Milita, entre os persas a magia de Zoroastro, entre os gregos os mistrios de Elusis ou a mitologia do Olimpo, do sistema filosfico em voga em determinada poca em Alexandria e em Roma o sincretismo de todas as crenas e opinies possveis, entre os celtas a sabedoria dos druidas, e na Idade Mdia claustros e monges, como padro para reformar o judasmo? O que vai acontecer agora se, em obedincia a esse ensinamento moderno, os judeus em todas as plagas e todos os pases reformarem seu judasmo de maneira tal a adapt-lo s opinies e aos costumes dos seus compatrcios? Pelo amor de Deus, que espcie de monstruosidade seria aquilo que se faria passar por judasmo? Opinies, costumes e necessidades variam de pas para pas, de dcada para dcada. Mas onde h uma religio que foi, como o judasmo,
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fadada a vagar por todas as terras e por todos os tempos e nos dizem para em toda parte atualiz-la! Mas, acima de tudo, que espcie de coisa seria o judasmo se ousssemos atualiz-lo? Se ao judeu fosse permitido, a qualquer momento, atualizar o seu judasmo, no precisaria mais dele em parte alguma; no mais valeria a pena, em parte alguma, falar de judasmo. Deveramos ento pegar o judasmo e jog-lo fora em meio a outros ilegtimos produtos de iluso e superstio, e no se ouviria mais falar de judasmo e da religio judaica. Se para mim a Bblia h de ser a palavra de Deus e o judasmo e a lei judaica a vontade revelada de Deus, ento me possvel postar-me na estrada do progresso humano e ansiosamente interrogar todo mortal peregrino na terra sobre seus pontos de vista e opinies, compostos como so de sonho e despertar, de bom senso e tolice, e submeter sua aprovao a palavra do Deus vivo, e mold-la para se adaptar sua imaginao, e depois dizer: Veja o judasmo atualizado, veja a palavra do Deus vivo conforme aprovada pelos homens e purgada e purificada por homens! Se a Bblia h de ser para mim a palavra de Deus, e o judasmo e a lei judaica a vontade revelada de Deus, posso indagar minha barriga, ao meu conforto e gozo sensual, minha vantagem temporria, se tambm doce fcil, ou lucrativo ou agradvel? possvel para mim pegar a religio, a minha religio, que me foi dada por Deus como um padro pelo qual medir a mim mesmo, minha gerao, e todas as minhas aes e inaes, e apar-la para se ajustar maldade, sensualidade e mesquinhez de meus prprios desejos numa determinada poca? Posso eu falsificar a Divina vara-demedir para servir s minhas prprias necessidades passageiras e depois exclamar jactanciosamente: Veja, aqui est o judasmo completamente peneirado e atualizado, aqui est a palavra de Deus Todo-Poderoso cortada na medida de minha prpria fraqueza. Vejam como estamos andando com passo certo, tanto eu quanto minha gerao! No nos deixemos iludir. Toda a questo simplesmente esta. a afirmao E Deus falou a Moiss dizendo, com que comeam todas as leis da Bblia judaica, verdadeira ou no? Acreditamos ns, real e verdadeiramente, que Deus, o Onipotente e Santo, assim falou a Moiss?
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Estamos falando a verdade quando diante de nossos irmos pomos nossa mo no rolo de pergaminho contendo essas palavras e dizemos que Deus nos deu essa Tor, que Sua Tor, a Tor da verdade e com ela da vida eterna, est plantada em nosso meio? Para que isso no seja apenas da boca para fora, um mero floreado retrico, precisamos manter e executar essa Tor sem omisses e sem queixas, em todas as circunstncias e todos os tempos. Essa palavra de Deus tem de ser nossa regra eterna superior a qualquer juzo humano, a regra com a qual nossas aes todas devem sempre estar de acordo; e em vez de reclamar que no est mais adequada aos tempos, nossa nica reclamao tem de ser que os tempos no esto mais adequados a ela. E se, novamente, ao pormos em prtica essa palavra de Deus optamos por seguir os ensinamentos e instrues que chegaram a ns dos rabinos, podemos e devemos faz-lo somente se, e porque, reconhecemos neles a mesma origem divina que na palavra escrita de Deus. Foram transmitidos a ns por geraes anteriores com a mesma garantia, como uma tradio transmitida por Deus, do mesmo Deus santo e onipotente, a Moiss, e de Moiss oralmente atravs de cada sucessiva gerao com o propsito de regular a observncia prtica da palavra de Deus. Essa tradio no nada mais que tradio, que a palavra de Deus transmitida oralmente, conforme o judasmo rabnico tem ensinado por sculos e sculos de sua histria. Mas se essa tradio no tradio, se apenas uma pia mscara sob a qual uma classe sacerdotal imps suas opinies ao povo como sendo a palavra de Deus oralmente transmitida, se os pais com isso enganaram seus filhos e netos, deixando-os viver e sofrer, resistir e morrer, por uma falsificao e por uma iluso, e se permissvel a ns tambm sermos cada qual seu prprio orculo e remodelar a lei bblica de acordo com nossos prprios pontos de vista e opinies, ento ela no mais, no pode e no deve ser mais a palavra de Deus; ento Deus no falou a Moiss; ento no temos em nosso poder a palavra de Deus; ento ns, e conosco toda a humanidade, cujas esperanas de salvao esto enraizadas nessa palavra, somos todos enganados e enganadores, e tempo de nos livrarmos abertamente de todo esse miservel estorvo.
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Esta a alternativa, no h outro caminho aberto. Se o judasmo foi estabelecido por Deus, ento est destinado a ensinar poca, e no se deixar ser por ela ensinado. Bem desde o incio, Deus colocou o judasmo e seus adeptos em oposio poca. Por milhares de anos, o judasmo foi o nico protesto contra um mundo completamente pago. E se essa oposio diminuiu de sculo a sculo, no foi porque o judasmo se alterou para se adaptar s condies no-judaicas de um tempo qualquer, e sim porque cada vez mais sementes do esprito judaico, centelhas da palavra judaica de Deus, encontraram alojamento no seio do mundo no-judeu, e porque cada vez mais a palavra judaica de Deus cumpriu sua silenciosa misso na terra. Levantando o vu do incio da histria, a palavra judaica de Deus nos revela que por dois mil anos o mundo retrocedeu e deixou cada vez mais de ser subserviente a Deus. Depois Deus disse a Abrao, o primeiro judeu: Ouse ir contra seu tempo, siga seu prprio caminho, longe do seu pas, de sua famlia, e da casa de seu pai, e ande diante de mim e que minha aprovao lhe baste. E entre os povos mais cultos de seu tempo, entre egpcios e fencios, Abrao caminhou, sozinho com Deus. E quando a famlia de Abrao havia crescido na amarga escola do sofrimento para se tornar um povo que viria a ser o portador da palavra de Deus, ento Deus novamente o colocou entre as naes mais cultas de seu tempo; Ele apontou para a cultura egpcia esquerda deles e para a cultura mesopotmica direita, e disse: Eu os separei desses povos, no andem nos costumes deles, sigam Minhas leis e preceitos e permaneam fiis. E quando o Estado judeu caiu em pedaos, porque Jeroboo com sua esperteza havia introduzido pela primeira vez o princpio da adaptao do judasmo s necessidades do tempo, e Jud novamente se viu vagando por terras estranhas, ento Deus, pela boca dos profetas, dirigiu-lhes a advertncia para todos os tempos: Mas o que pensam nunca ir acontecer, quando dizem, Queremos ser como os povos de todas as terras, adorar madeira e pedra. Lembraivos da lei de Moiss, meu servo, a qual lhe prescrevi em Horeb para todo Israel, at estatutos e ordenaes,
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Isso est claro do incio ao fim no registro da Bblia, E, no entanto, no ficam nossos judeus modernos to surpresos em descobrir que o judasmo segrega seus adeptos, e os faz parecer to obsoletos aos filhos superficiais de cada poca? Essa segregao, contudo, apenas superficial. Nenhuma doutrina to bem qualificada quanto o judasmo para suprir seus adeptos com um amor plenamente abrangente, para implantar neles um esprito e um corao aos quais nada humano no mundo inteiro estranho e que podem participar, da maneira mais calorosa e franca, de todo o sofrimento e bem-estar humanos. So os judeus que prontamente vem nos episdios mais obscuros da Histria a marcha de um propsito Divino, que junto ao tmulo do mais abandonado pecador esto prontos a plantar a bandeira da esperana de uma ressurreio e de um retorno a Deus, e cuja fora toda est na convico de que todos os homens caminham com eles rumo a um reino de Deus na terra, em que verdade e amor, justia e salvao estaro por toda parte. Considerem Abrao, o primeiro e mais isolado judeu na terra. Houve jamais algum to isolado? nico e sozinho com Deus na terra, nico e sozinho em conflito com o todo de sua poca. Que corao trazia ele em seu peito, cheio de modstia, cheio de bondade, cheio de compaixo e de amor por todos, pelos homens mais depravados de seu tempo! O julgamento de Deus est suspenso sobre Sodoma e Gomorra, sobre o mais vil poo de iniquidade conhecido na Histria, e Abrao quem reza por Sodoma e Gomorra! Deus firmou com ele e com seus descendentes o mais separatista dos pactos e marcou em seus corpos o mais separatista sinal dessa aliana. E vemos Abrao, com a dor infligida por esse sinal ainda fresca, sentado ao calor do sol diante de sua tenda e procurando com o olhar viajantes cansados, convidando idlatras estranhos sua casa e mostrando piedade e bondade e amor de Deus a todos os seus semelhantes sem distino. E como poderia ter sido diferente? No era esse universalismo, esse amplo humanismo de pensamento e ao, a prpria essncia e objetivo, a razo e significado de sua segregao? Quo diferente dos homens que construram a Torre de Babel usando como lema as palavras Faamos um
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nome para ns. Eles eram impelidos por egosmo, sensualidade e ambio para construrem uma torre famosa que chegaria at o cu, uma torre que, conquanto parecesse unir, na realidade isolava e dividia os homens entre si. Foi ento, segundo a profunda observao de nossos Sbios, que Deus chamou Abrao a Si e disse: V por outro caminho, no deseje nada para si mesmo, para sua prpria bno, para sua prpria fama, em Meu nome rena homens, seja uma bno para eles, pois veja, eu o destinei a ser um pai da humanidade, que isso seja sua bno e sua fama! Permaneceu isso como carter fundamental do judasmo. Abrao foi isolado no interesse da humanidade, e no interesse da humanidade o judasmo tem de prosseguir em seu caminho separado atravs dos tempos. O judasmo a religio que no diz Fora de mim no h salvao. O judasmo, que desmerecido por causa de seu suposto particularismo, precisamente a religio que ensina que os justos de todos os povos esto marchando em direo precisa meta. Dentre todos os homens so os rabinos, to ruidosamente execrados por causa do seu particularismo, que, apontando para as previses na boca dos profetas e cantores de um glorioso novo dia para a humanidade, enfatizam que no h meno nelas de sacerdotes, levitas e israelitas, mas que s se fala dos justos, honestos e honrados; e assim os justos, honestos e honrados de todos os povos esto includos nas mais nobres bnos. E nos mais negros tempos, quando o populacho enfurecido destrua as sinagogas judaicas e rasgava em pedaos os livros sagrados, o perseguido e desprezado judeu se punha diante do seu Deus e se consolava aguardando o tempo em que essa loucura tambm desaparecer, e o nome do Deus nico far entrar a justia e a paz em todos os coraes humanos. E filhos visitavam os tmulos dos pais que haviam sido massacrados por seu judasmo com a confiante esperana de que um dia, no prprio solo em que havia grassado a mais terrvel crueldade, o nome de Deus brilhar grande e sagrado e majestoso e Seu reino se estabelecer de um a outro extremo da terra. E por que no deveriam? O guia com o qual Deus os havia equipado para suas andanas havia solucionado, para eles, o enigma da Histria. Deus os levara de volta ao incio da histria humana e revelara a gloriosa culminao que viria aps o mais profundo desalento. Deus os havia
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chamado de Seu primognito porque dentre todos os filhos perdidos de Deus eles haviam sido os primeiros a encontrar seu caminho de volta a Ele; e por isso eles sabiam que todos os seus semelhantes iriam um dia segui-los at o corao do Pai. Deus os chamara de Seus sacerdotes, e por isso eles sabiam que toda a humanidade devia ser Seu povo, para o qual eles, como sacerdotes, teriam de proclamar Sua eterna promessa de salvao. E mesmo quando Deus lhes disse Eu os separei dos povos, os rabinos foram a eles e os advertiram: No esqueam: Deus no separou os povos como algum que entre os bons escolhe os ruins e os joga fora, pois ento eles seriam rejeitados para sempre; mas Deus os separou dos povos como algum que escolhe os bons dentre os menos bons e continua escolhendo de novo e de novo e acrescentando os melhores aos bons (Valkut, Kedoshim). Cada nova volta na histria do mundo, fosse ela para tristeza ou para alegria, eles encaravam como uma dessas selees e acumulao de todas as sementes de melhor promessa; e todos os cantos de seus poetas e todas as palavras de seus profetas no revelavam outra coisa a no ser esse caminho de Deus na histria do mundo e no cantavam outra coisa a no ser aquela brilhante manh que um dia ir raiar para toda a humanidade vista de todas as naes, e do que eles, os judeus, sero e permanecero os mensageiros e arautos. Assim justamente o judeu mais isolado que traz em seu peito os pensamentos e sentimentos mais universais. Com olhar sereno, ele caminha pelo mundo e pelos sculos afora, e com alegria d boas-vindas a cada apario em que, onde e como possa ser, ele v as sementes de uma pura adorao de Deus e do enobrecimento do homem, o reconhecimento de Deus e do divino destino do homem cultivados e preservados em crculos no-judaicos. E embora saiba que at essa manh chegar ele no encontrar, em parte alguma, plena e eterna salvao estabelecida na terra, ainda assim se rejubila por ver, em qualquer lugar, a soma total de verdade e bondade aumentada, ele v em cada aurora os raios da manh que ir um dia despontar desanuviada sobre a humanidade. Agora, finalmente, ele observa como aquele gro que h dois mil anos caiu da rica colheita da Sua Divina palavra no inteiramente isenta, verdade, da mistura com elementos estranhos no seio da humanidade, agora cresceu e se espalhou to viosamente que, por mais que
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algumas nuvens possam ainda escurecer o cu, j foi saudada por homens como uma completa redeno da humanidade. Ele pode seguir passo a passo as floraes que, desde ento, tm sido consciente e inconscientemente colhidas da rvore judaica da vida para enriquecer o domnio da verdade, do amor e da justia. Quando v isso, ele se enche de felicidade pensando na interminvel abundncia de salvao e bnos que a humanidade gozar quando as sementes da salvao espalhadas de Sua Divina palavra tiverem atingido a madureza e trazido a redeno completa da humanidade em que Deus destruir a morte para sempre, e enxugar as lgrimas de todos os rostos, e tambm por fim ao oprbrio do Seu povo na terra. Ento suas coisas sagradas ainda lhe sero mais sagradas, ento ele vai se apegar ainda mais ao seu divino tesouro, e se tornar ainda mais firme em sua resoluo de conduzir at o fim, sem recuos, esse recipiente que contm a salvao da humanidade, at que
nos ltimos dias acontecer que o monte da casa do Senhor ser estabelecido no cume dos montes, e se elevar sobre os outeiros, e para ele afluiro todos os povos. E iro muitas naes e diro: Vinde e subamos ao monte do Senhor, Casa do Deus de Jac, e Ele nos ensinar os Seus caminhos e andaremos por Suas veredas. Porque de Sion sair a lei e a palavra do Senhor de Jerusalm. E Ele julgar entre as naes e decidir por muitos povos, e eles convertero suas espadas em arados e suas lanas em podadeiras. Uma nao no levantar a espada contra outra nao, nem aprendero mais a guerra. (Isaas 2:2-4.) E o lobo habitar com o cordeiro e o leopardo se deitar junto ao cabrito; o bezerro, o leo novo e o animal cevado andaro juntos, e uma criana os guiar... e a criana de peito brincar sobre a toca da spide e a j desmamada estender alegremente sua mo aos olhos flamejantes do drago. No faro mal nem dano algum em meu santo monte, porque a terra se encher do conhecimento do Senhor assim como as guas cobrem o leito do mar. (Isaas 11:6,8,9.)

Ento, quando a isso os tempos estiverem adequados, estar o judasmo adequado aos tempos. Quando Deus tiver secado as lgrimas de todos os rostos, ento o oprbrio do Seu povo na terra terminar, assim falou o Senhor.
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Mas muito antes de atingir essa meta, em todas as suas andanas pelo tempo e pelo espao, o judeu, de maneira alguma, esteve to acentuadamente em contraste com os tempos e os pases em que tem vivido. Pelo contrrio, o prprio judasmo lhe mostrou como adapt-lo a cada poca e a cada pas em que o destino o jogou e como formar, com cada poca e com cada pas, os mais estreitos e amistosos laos. Porque o judeu sabe que os justos e puros em todas as sociedades humanas esto trabalhando com ele pelo estabelecimento do reino de Deus na terra. Ele sabe que por quase dois mil anos as sementes de uma humanidade mais pura, que estavam salvas mesmo nos dias do paganismo, e desde ento tambm outras genunas sementes de pensamento judaico tm germinado e chegaram fruio, para benefcio da humanidade, nas mais variadas atividades espirituais. E o seu prprio judasmo que o guia atravs do jardim da natureza e das galerias da Histria, que o convida plena expanso dos seus poderes a servio de Deus, o faz encontrar em cada nova verdade que proposta uma bem-vinda contribuio revelao mais clara de Deus na natureza e na Histria, e ver em cada nova arte e cada nova cincia um bem-vindo acrscimo aos meios de prestar servio perfeito a Deus. Consequentemente, o judeu no ir desaprovar nenhuma arte, nenhuma cincia e nenhuma cultura, desde que seja constatada ser verdadeira e edificante, e realmente promover o bem-estar da humanidade. Ele precisa provar de tudo por meio da irrepreensvel pedra de toque de sua lei divina; e o que quer que no passe nesse teste para ele no existe. Mas quanto mais firmemente ele assumir sua posio no rochedo do seu judasmo, mais plenamente ele estar imbudo da conscincia de seu prprio judasmo, e mais disposto estar para aceitar e agradecidamente se apropriar de tudo que for verdadeiro e bom em outras fontes, segundo os padres judaicos; de qualquer mente em que se tenha originado, de qualquer boca de que tenha sado, ele estar sempre pronto, como dizem os Sbios; a receber a verdade daquele que a proferiu. Em lugar algum ele jamais sacrificar um s fio do seu judasmo ou o aparar para se ajustar s necessidades do tempo. Sempre que seu tempo lhe oferecer algo consoante com seu judasmo, ele o adotar de bom grado. Em qualquer perodo, considerar ser seu dever dar, do ponto de vista do seu judasmo, a devida
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apreciao poca e s suas condies, e utilizar os novos meios proporcionados por qualquer perodo para que, nas condies do mesmo, ele possa fazer o velho esprito judaico se expandir em nova beleza e possa desempenhar sua obrigao para com ele com sempre renovados vigor e lealdade.

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Franz Rosenzweig (1886-1929)

Judeu alemo, fillogo e telogo. Nasceu em Cassel, Alemanha, em 1886, no seio de uma famlia j em vias de assimilao. Abandonou a medicina, doutorando-se em histria e filosofia pela Universidade Leipzig. Instigado pelo movimento de retorno religio que influenciou grande parte da juventude alem no incio deste sculo, acaba se convertendo ao cristianismo. Na tentativa de conhecer o cristianismo, reencontra-se com o judasmo. Neste perodo, entrou em estreito contato com o pensamento de Herman Cohen, filsofo judeu-alemo neokantiano. Dedicou-se simultaneamente ao estudo da filosofia e da erudio judaicas e elaborao da sua tese de doutorado Hegel und der Staat (Hegel e o Estado), sob orientao de Meinecke, publicada em 1919. Serviu como voluntrio no exrcito germnico na frente de luta balcnica na Primeira Guerra, e em plena batalha escreve em tiras de papel suas reflexes e concepes sobre o judasmo, que viriam a ser publicadas sob o ttulo Stern der Erlosung (Estrela da Redeno) em 1919. Neste livro, que, pode-se dizer, foi o mais relevante do conjunto de sua obra, Rosenzweig d uma grande contribuio para o pensamento teolgico do sculo XX. Fundou o Freies Judisches Lehrhaus (Casa livre de Estudos judaicos), famoso nos crculos culturais alemes. Entre os professores desse instituto figuravam Martin Buber, Ernst Simon, Erich Fromm e Leo Lowenthal. Viu interrompidas as suas atividades devido a uma paralisia progressiva que iria priv-lo da capacidade de escrever e falar. Contando com a ajuda de sua esposa, Edith Rosenzweig, produziu alguns outros trabalhos como: Sechzig Hymnen und Gedichte des Jehuda Halevi in Deutsch (Sessenta livros de jud Halevi em Alemo), 1924; Ensaio Introdutrio aos Escritos Judaicos de Herman Cohen; Um Estudo sobre a Lei Judaica; a traduo da Bblia hebraica para o alemo em colaborao com Martin Buber; Briefe (Cartas) e Kleinere Schriften (Escritos Menores), que s vieram a pblico aps a sua morte. Em Estrela da Redeno, de onde foi retirado o texto apresentado nesta coletnea, Rosenzweig ope o tempo histrico das naes ao tempo messinico do judasmo. Segundo Lwy (1989), suas fontes se encontram
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tanto na teoria das idades do mundo de Schelling quanto na mstica da cabala. Neste livro, igualmente, a aproximao entre a revoluo e a vinda do Messias se faz presente. Referncias GUINSBURG, J. (Org.). O Judeu e a Modernidade, So Paulo, Perspectiva, 1970, pp.505/508. LOWY, Michel. Redeno e Utopia, So Paulo, Cia. das Letras, 1989, pp. 55/63.

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Franz Rosenzweig1
Os Raios ou O Caminho Eterno
A ETERNIDADE DA COMPREENSO Nenhum homem tem o poder de compreender o pensamento do Criador, pois seus caminhos no so nossos caminhos e seus pensamentos no so nossos pensamentos. Essa descrio dos caminhos de Deus conclui o grande exame do contedo total da lei escrita e oral que Maimnides apresentou a ns como a Repetio da Lei. Introduz as subsequentes proposies sobre o caminho do verdadeiro Messias e sobre o grande erro de adorar outro alm de Deus, a que o mundo foi levado, segundo a profecia do Livro de Daniel, por filhos apstatas de vosso povo, que presumem cumprir a viso e tropearo. E nosso grande mestre continua assim. Todas essas questes serviram somente para desobstruir o caminho do Rei Messias, e preparar o mundo inteiro para adorar Deus unanimemente, pois est escrito Sim, a esse tempo transformarei a fala dos povos numa fala pura, a fim de que todos eles possam invocar o nome do Senhor e servi-lo unanimemente. Assim, a esperana messinica, a Tor e os mandamentos se tornaram tpicos familiares, tpicos de conversa entre os habitantes de ilhas distantes e muitos povos, incircuncisos de corao e de carne. Eles discutem essas questes e os mandamentos da Tor. Dizem alguns: Aqueles mandamentos eram verdadeiros, mas perderam sua validade e no so mais obrigatrios; outros declaram que tinham um significado esotrico e no se destinavam a ser interpretados literalmente, que o Messias j havia chegado e revelado sua significao oculta. Mas quando aparecer o verdadeiro Rei Messias e for bem-sucedido, enaltecido e elevado, eles imediatamente se retrataro e compreendero que nada herdaram de seus pais a no ser mentiras.

O CAMINHO ATRAVS DO TEMPO: HISTRIA CRIST Os raios se projetam do flamejante ncleo da Estrela. Procuram um caminho atravs da longa noite dos tempos. Tem de ser um caminho eterno, e no temporrio, muito embora passe atravs do tempo. No que possa negar o tempo afinal de contas, destina-se a conduzir atravs do tempo mas o tempo no deve adquirir poder sobre ele. Por outro lado, no deve criar seu prprio tempo, e assim se liberar do tempo, maneira do povo eterno, continuamente se reproduzindo em si mesmo. Mas como poderia isso acontecer? Como poderia um caminho que atravessa o tempo dividir o tempo em vez de ser ele prprio dividido pelo tempo? POCA A pergunta j abrange a resposta. O ritmo do tempo, afinal, s determina tudo que nele ocorre porque o tempo mais velho e mais moo que tudo que ocorre. Se ele se visse diante de uma ocorrncia com incio e fim fora dele, ento o pulso dessa ocorrncia poderia regular as horas do relgio do mundo. Tal ocorrncia teria de se originar alm do tempo e seguir seu curso num alm-temporal. verdade que estaria dentro do tempo em qualquer presente, mas, sabendo-se independente do tempo em seu passado e em seu futuro, sente-se forte contra o tempo. Seu presente fica entre passado e futuro. O momento, contudo, no fica. Mais precisamente, ele desaparece com a velocidade de uma flecha. Consequentemente, nunca est entre seu passado e seu futuro: desapareceu antes que pudesse estar entre o que quer que fosse. A trajetria do mundo conhece um intervalo apenas no passado. Somente o ponto em tempo-passado um ponto-notempo, uma poca, uma parada. O tempo vivo no conhece nenhum ponto: to logo comea a ser atravessado pelo momento com a velocidade de uma flecha em vo, cada ponto j est atravessado. Mas no passado as horas ficam naquela justaposio imvel. Ali h pocas, estaes no tempo. Podem ser reconhecidas pelo fato de serem precedidas e seguidas pelo tempo. Esto entre tempo e tempo. O tempo, contudo, s atinge gravidade como tal no intervalo. Agora no pode mais desaparecer como uma flecha. A poca no passa mais antes de eu tomar conscincia dela, nem se transforma antes que eu a perceba.
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ROSENZWEIG, Franz. The Star of Redemption, New York. Notre Dame Press. 1985, Book Two: The Rays or The Eternal Way, pp. 336/348. 138

Mais precisamente, ela significa algo. Algo: em outras palavras, tem substancialidade, como uma substncia. No passado, a trajetria do mundo assume a forma de substncias imveis, de eras, pocas, grandes momentos. E s pode fazer isso porque no passado os momentos que desaparecem so capturados como paradas, mantidos entre um antes e um depois. Como um intervalo, no podem mais escapar; como intervalo tm estabilidade, ficam parados como horas. O tempo perdeu seu poder sobre o passado, que consiste inteiramente de intervalos. Ele ainda pode adicionar ao passado, mas no pode mais mud-lo exceto, no mximo, atravs daquilo que adiciona. No pode mais participar na estrutura interna do passado, pois est fixada, ponto por ponto integrado. A cadncia sincronizada dos anos pode parecer dominar to completamente o presente que a impacincia de um reformador do mundo, a queixa de algum desafortunadamente consciente de sua mudana de f, se empertigam contra isso em vo. No passado, contudo, essa cadncia perde seu poder. No passado, acontecimentos dominam o tempo, e no vice-versa. Uma poca aquilo que fica fica parado entre seu antes e depois. Pouco importa quantos anos lhe so atribudos pela crnica; cada poca pesa o mesmo, quer tenha a durao de sculos ou dcadas ou apenas anos. Aqui os acontecimentos dominam o tempo, marcando-o com seus entalhes. O acontecimento, no entanto, s existe dentro da poca; ele fica entre o antes e o depois. E um intervalo estacionrio s existe no passado. Se ento o presente tambm fosse elevado ao domnio do tempo, ele teria de ser tambm um intervalo. O presente cada presente teria de se tornar memorvel. E o tempo como um todo teria de se tornar a hora, essa temporalidade. Como tal teria de ser jungido eternidade, com eternidade seu incio, eternidade seu fim, e todo o tempo exceto o intervalo entre aquele incio e aquele fim. CRONOLOGIA CRIST Assim o cristianismo, que fez do presente uma poca. Somente o tempo anterior ao nascimento de Cristo agora ainda passado. Todo o tempo subsequente, da estada terrena de Cristo ao seu segundo advento, agora aquele nico grande presente, aquela poca, aquela parada, aquela suspenso dos tempos, aquele nterim sobre o qual o tempo perdeu seu
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poder. O tempo agora mera temporalidade. Como tal, pode ser observado em sua totalidade de qualquer um de seus pontos, pois incio e fim esto equidistantes de cada um de seus pontos. O tempo tornou-se um caminho nico, mas um caminho cujo incio e fim esto alm do tempo, e portanto um caminho eterno. Em contraste, em caminhos que levam de dentro do tempo para dentro do tempo, somente o segmento seguinte que pode ser observado. Cada ponto no caminho eterno , alm disso, um ponto central, j que incio e fim so, afinal de contas, equidistantes, no importando como o tempo avana. um ponto central no porque est no momento exato, o ponto presente de modo algum, pois ento seria ponto central por um momento e j no instante seguinte no. Isso equivaleria espcie de vitalidade com que o tempo recompensa uma vida que se submete a ele: uma vitalidade puramente temporal. a vitalidade de uma vida no momento de ser vida no tempo, de se deixar levar pelo passado, de convocar o futuro. Homens e naes vivem assim. Deus retirou o judeu dessa vida arqueando a ponte de sua lei bem acima da correspondncia do tempo que daqui por diante, e para toda a eternidade, corre impotente por baixo de seus arcos. O cristo, entretanto, assume a competio com a corrente. Pe ao lado dela os trilhos do seu caminho eterno. Aquele que viaja por essa estrada mede o lugar do rio que est olhando apenas pela distncia entre os pontos de partida e de destino. Ele mesmo est sempre e somente em viagem. Sua verdadeira preocupao somente a de estar j e ainda no caminho, j e ainda entre partida e meta. Por mais frequentemente que olhe pela janela, a corrente do tempo, sempre ainda passando pelo lado de fora, lhe diz isso e nada mais. Aquele que viaja na prpria corrente s pode ver de uma curva seguinte. Para o que viaja pelos trilhos, a corrente como um todo apenas um sinal de que ainda est em viagem, apenas um sinal do intervalo. Olhando a corrente, ele nunca pode esquecer que o lugar de onde vem assim como o lugar para onde vai esto alm do territrio da corrente. Ele se pergunta onde que pode estar agora, neste momento, a corrente no lhe responde, ao passo que a resposta que d a si mesmo sempre: em viagem. Enquanto a corrente dessa temporalidade ainda estiver correndo, assim tambm estar ele prprio, a cada momento, a meio caminho entre o incio e o fim de sua trajetria. Incio e fim esto ambos igualmente perto
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dele a cada momento, pois ambos esto no eterno, e somente por isso que ele sabe estar em todos os momentos no ponto central ponto central no de um horizonte que ele perscruta, mas de um trecho que consiste inteiramente de ponto central, que , de fato, todo meio, todo Entre, todo caminho. Ele pode e deve sentir cada ponto ao longo desse caminho como um ponto central s porque seu caminho todo meio e porque ele sabe disso. O trecho inteiro, consistindo inteiramente de pontos centrais, em resumo apenas um nico ponto central. Tivesse Cristo nascido mil vezes em Belm e no nascido tambm em voc voc ainda assim estaria perdido esta mxima de O Peregrino Querubnico para o cristo um paradoxo apenas na ousada conciso de sua expresso, no em seu esprito. Para o cristo, o momento se torna representativo da eternidade no como momento mas como ponto central do tempo mundial cristo. E como ele permanece e no perece, esse tempo mundial consiste de tais pontos centrais. Cada acontecimento est a meio caminho entre o incio e o fim da eterna trilha e, devido a essa posio central no domnio mdio temporal da eternidade, cada acontecimento em si mesmo eterno. Assim o cristianismo consegue domnio sobre o tempo fazendo do momento uma poca memorvel. Do nascimento de Cristo em diante, s h presente. O tempo no salta fora da cristandade como faz com o povo judeu; o fugitivo tempo foi detido e precisa, da em diante, servir como um criado cativo. Passado, presente, futuro outrora perpetuamente se interpenetrando, perpetuamente se transformando tornaram-se agora figuras em repouso, pinturas nas paredes e cmaras morturias da capela. Da, tudo que precedeu o nascimento de Cristo, incluindo profetas e orculos sibilinos, histria passada, detida de uma vez por todas. E o futuro, hesitantemente iminente e no entanto inescapavelmente atrado, o Juzo Final. O tempo mundial cristo est entre esse passado e esse futuro como uma nica hora, um nico dia; nele tudo meio, tudo igualmente brilhante como o dia. Assim, os trs perodos de tempo se separaram em eterno incio, eterno meio e eterno fim no eterno caminho atravs dessa temporalidade. A prpria temporalidade desenganada de sua autoconfiana e permite que essa forma seja sobre ela forada na cronologia crist. Deixa de acreditar que mais antiga que o cristianismo e conta seus anos a partir do nascimento do cristianismo. Tolera que tudo anterior a isso
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parea tempo negado, tempo irreal por assim dizer. At agora, tem recontado o passado pela contagem de anos; agora essa contagem tornou-se prerrogativa do presente, do caminho sempre presente. E o cristianismo trilha esse caminho, trilha-o deliberadamente, certo de sua prpria presena eterna, sempre no meio do mundo ocorrente, sempre no acontecimento, sempre au courant, sempre com arrogante olhar do conhecimento de que o caminho eterno que ele trilha, e no qual o tempo agora o segue com seu obediente pedmetro. CRISTANDADE

Mas o que cristandade se no gente, sucessivas geraes, naes, estados, pessoas diferindo em idade, condio, sexo, cor, educao, amplitude de viso, dons e capacidade? E devem eles, no obstante, ser de agora em diante a cada momento somente um, reunidos num nico ponto central e esse ponto central por sua vez o ponto central de todos os outros pontos centrais deste grande centro? Essa pergunta afeta o elemento formador nessa comunidade do cristianismo. No livro precedente, levantamos a questo do elemento formador na comunho do judasmo, que o dogma judaico poderia ter respondido com a Tor. Mas no nos sentimos autorizados a ficar satisfeitos com aquela resposta, e a resposta dogmtica Cristo no nos serviria melhor aqui. , antes, precisamente a maneira pela qual uma comunho baseada em dogma d a si mesma a realidade que desejamos sondar. Mais exatamente ainda pois sabemos que tem de ser uma comunho eterna perguntamos de novo, como no livro precedente, de que modo uma comunho pode se fundar para a eternidade. Sondamos isso para a comunho da vida eterna; agora, fazemos a pergunta em relao comunho do caminho eterno. A diferena no pode simplesmente estar no fato de que em cada ponto do caminho h um ponto central. Afinal de contas, em cada momento da vida do povo [judeu] havia a vida inteira. Deus conduziu todos os indivduos para fora do Egito: Fao essa aliana... no s contigo mas tanto com os que no esto aqui conosco neste
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dia... quanto com os que esto aqui conosco neste dia. Tanto a vida eterna quanto o caminho eterno tm isso em comum: eles so eternos. A eternidade, afinal de contas, apenas isso: que tudo est em todos os pontos e em todos os momentos. Assim, no est aqui a diferena. Em anlise final, ela tem de estar naquilo que eterno, e no em seu carter eterno. E assim . A vida eterna e o caminho eterno so to diferentes quanto o infinito de um ponto e o infinito de uma linha. O infinito de um ponto s pode consistir do fato de ele nunca ser apagado; assim ele se preserva na eterna autopreservao de sangue procriador. O infinito de uma linha, contudo, cessa onde seria impossvel estend-la; consiste da prpria possibilidade de irrestrita extenso. O cristianismo, como o caminho eterno, tem de se propagar cada vez mais. Meramente preservar seu status significaria, para ele, renunciar sua eternidade e, com isso, a morte. O cristianismo precisa fazer proslitos. Isso lhe to essencial autopreservao quanto o , para o povo eterno, fechar a fonte pura de sangue a misturas estranhas. De fato, o proselitismo , para o cristianismo, a verdadeira forma de autopreservao. Ele se propaga espalhando-se. A eternidade torna-se eternidade do caminho fazendo de todos os pontos do caminho, um por um, pontos centrais. No povo eterno, a procriao d testemunho da eternidade; no caminho eterno, a testemunha precisa realmente ser autenticada como testemunha. Cada ponto do caminho deve uma vez dar testemunho de saber que um ponto central do caminho eterno. Naquele, o fluxo fsico do sangue d testemunho do antepassado no neto engendrado. Neste, a efuso do esprito tem de estabelecer a comunho de testemunho na ininterrupta corrente de gua batismal correndo de um para outro. Cada ponto que essa efuso do esprito alcana tem de ser capaz de perscrutar todo o caminho como uma eterna comunho de testemunho. Mas o caminho s pode ser perscrutado se ele prprio for o contedo do testemunho. No testemunho da comunho, o caminho tem de ser autenticado ao mesmo tempo. A comunho
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torna-se uma s atravs da crena autenticada. A crena uma crena no caminho. Todos na comunho sabem que no h outro caminho eterno a no ser aquele que esto percorrendo. S pertence ao cristianismo aquele que sabe que sua prpria vida est no caminho que leva de Cristo chegado a Cristo vindo.
CRENA Esse conhecimento crena. crena como contedo de um testemunho. crena em alguma coisa. Isso exatamente o contrrio da crena do judeu. Sua crena no o contedo de um testemunho, e sim o produto de uma reproduo. O judeu, engendrado judeu, autentica sua crena continuando a procriar o povo judeu. Sua crena no em algo: ele mesmo a crena. Ele cr com uma instantaneidade que nenhum dogmatista cristo jamais poder atingir para si. Essa crena pouco se importa com sua fixao dogmtica: ela tem existncia, e isso vale mais do que palavras. Mas o mundo tem direito a palavras. Uma crena que procura conquistar o mundo precisa ser uma crena em algo. Mesmo a mais nfima unio de unidades unidas para conquistar uma parcela do mundo exige uma f comum, uma senha pela qual aqueles unidos podero se reconhecer. Qualquer um que queira criar no mundo um pedao de caminho prprio tem de acreditar em alguma coisa. Simplesmente acreditar jamais lhe permitiria atingir algo no mundo. S aquele que acredita em alguma coisa pode conquistar alguma coisa a saber, aquilo em que ele acredita. E exatamente assim na crena crist. dogmtica no sentido mais elevado, e tem de ser assim. No pode dispensar palavras. Ao contrrio: simplesmente no pode ter palavras bastante, no pode fazer bastante palavras. Deveria realmente ter um milhar de lnguas. Deveria falar todas as lnguas. Pois tem de desejar que tudo venha a se tornar seu. E assim, o algo em que acredita tem de ser no um algo e sim tudo. Por essa mesma razo crena no caminho. Crendo no caminho, a crena crist prepara o caminho ao caminho para o mundo. Dando testemunho, gera primeiro o caminho eterno no mundo. A crena judaica, por outro lado, segue a vida eterna do povo como um produto.
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IGREJA Assim a crena crist, testemunha do caminho eterno, criativa no mundo. Une aqueles que do testemunho numa unio no mundo. Une-os como indivduos, pois dar testemunho sempre uma questo individual. Alm do mais, o indivduo aqui supostamente d testemunho com respeito sua atitude para com o indivduo pois o testemunho, afinal de contas, diz respeito a Cristo. Cristo o contedo comum a todos os testemunhos de crena. Mas embora estivessem unidos como indivduos, a crena agora os dirige em direo ao comum no mundo. Pois a preparao do caminho o trabalho comum de todos os indivduos. Cada indivduo s pode, afinal de contas, se pr em um nico ponto do caminho eterno o seu ponto e fazer dele o que o caminho todo tem de se tornar para ser o caminho eterno: centro. E assim a crena estabelece aquela unio de indivduos, como indivduos, para o trabalho comum que corretamente leva o nome de ecclesia. Pois esse nome original da igreja tirado da vida das antigas cidades-estados, e designa os cidados reunidos para deliberao em comum. O Povo de Deus designou seus festivais como convocaes sagradas, o que era uma expresso essencialmente semelhante. Mas para si mesmo usou palavras, tais como povo ou congregao, que outrora designava o povo-em-armas, aquela entidade, em outras palavras, em que o povo aparece como o todo completo de si mesmo no qual os indivduos se dissolvem. Na ecclesia, porm, o indivduo e continua sendo um indivduo, e somente sua determinao comum e se torna res publica. CRISTO O cristianismo d a si mesmo exatamente essa denominao de ecclesia, o nome de uma assembleia de indivduos para um trabalho comum. Ainda assim, esse trabalho s vem se realizar em virtude de cada um atuar em seu lugar como indivduo. Na assembleia, analogamente, a determinao comum s emerge devido ao fato de cada um expressar sua opinio e votar inteiramente como um indivduo. Assim, tambm, a comunidade da Igreja pressupe a personalidade e a integridade podemos seguramente dizer: a alma de seus membros. A analogia de Paulo da congregao como corpo de Cristo no implica uma espcie de diviso de
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trabalho como, digamos, a famosa parbola de Mennio Agripa sobre os membros e o estmago. Alude, antes, precisamente a essa perfeita liberdade de cada indivduo na Igreja. iluminado pelo grande? Tudo vosso... e vs sois de Cristo.2 Tudo subserviente ao cristianismo porque o cristianismo e todo indivduo cristo dentro dele procedem do crucificado. Todo cristo tem o privilgio de se saber no caminho, no simplesmente em qualquer ponto arbitrrio, e sim no centro absoluto do caminho que, afinal de contas, ele prprio inteiramente centro, inteiramente intervalo. Mas visto que o cristianismo e o indivduo [cristo] ainda aguardam o segundo advento, aqueles que acabaram de ser manumitidos como senhores de todas as coisas imediatamente sabem ser novamente escravos de todos. Pois aquilo que fazem ao menor dos Seus irmos, o fazem tambm quele que voltar para julgar o mundo.3 Como ento ir a ecclesia se constituir com base naquela liberdade e integridade dos indivduos que tm de ser preservadas? Que aparncia deve ter o elo que nela liga um ao outro? Deve, afinal de contas, deixar os indivduos livres enquanto os est atando; em verdade, deve de fato primeiramente torn-los livres. Deve deixar todos conforme os encontre, o homem como homem, a mulher como mulher, os idosos velhos, os moos jovens, o senhor como senhor, o escravo como escravo, o abastado rico, o indigente pobre, o sbio sbio e o tolo tolo, o romano um romano e o brbaro um brbaro. O elo no deve colocar ningum no status de outro, e no entanto deve transpor o abismo entre marido e mulher, entre pai e filho, entre senhor e escravo, entre rico e pobre, sbio e tolo, romano e brbaro. Deve libertar cada um como ele , em todas as suas dependncias naturais e dadas por Deus com as quais est no mundo da criao. Deve coloc-la no centro daquele caminho que leva de eternidade a eternidade. o elo de fraternidade que assim pega os homens conforme os encontra e, no entanto, os amarra juntos apesar das diferenas de sexo, idade, classe e raa. A fraternidade liga pessoas em quaisquer circunstncias independentemente dessas circunstncias, que simplesmente continuam existindo como iguais, como irmos no
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1 Corntios 3: 21-23. Cf. Mateus 25: 40. 147

Senhor. De homens eles se tornam irmos, e a crena comum no caminho comum o contedo para isso. Nesse pacto de fraternidade crist, Cristo tanto incio quanto fim do caminho, e consequentemente contedo e meta, fundador e dominador do pacto, bem como o centro do caminho, e portanto presente onde quer que dois se tenham reunido em seu nome.4 Onde quer que dois se tenham reunido em seu nome, l est o meio do caminho. Dali o caminho inteiro pode ser observado. Ali, o incio e o fim so equidistantes porque aquele que incio e fim fica entre os l reunidos. Assim, no meio do caminho Cristo no um fundador nem senhor de sua igreja, e sim um membro dela, ele mesmo um irmo de sua aliana. Como tal, ele tambm pode estar em fraternidade com o indivduo: mesmo o indivduo e no apenas dois que se reuniram j se sabe cristo. Embora aparentemente s consigo mesmo, ele no entanto sabe que membro da Igreja, porque essa solido estar junto de Cristo. Cristo est junto a esse indivduo naquela forma qual seus sentimentos fraternos podem mais prontamente se direcionar. O indivduo, afinal de contas, h de permanecer o que ; o homem um homem, a mulher uma mulher, a criana uma criana. Assim, Cristo um amigo para o homem, um noivo espiritual para a mulher, um meninozinho sagrado para a criana. Atado ao Jesus histrico, Cristo pode privar-se dessa identificao com a figura familiar do vizinho, o objeto de amor fraterno; mas ali os santos tomam o lugar do prprio Cristo. Fazem-no, pelo menos, na Igreja de Pedro, do amor, a Igreja que mais ardororosamente prende seus crentes ao caminho e lhes permite lembrar menos do incio e do fim dela. O homem tem o privilgio de amar Maria como a virgem pura, e a mulher o de am-la como a divina irm, e cada um de amar o santo de sua classe e nao de dentro de sua classe e nao. De fato, todos tm o privilgio de cada um amar seu santo homnimo como um irmo de dentro dos mais estreitos limites do Eu, conforme contido em seu nome de batismo. Essa Igreja de amor ainda mais intrinsecamente uma Igreja do caminho que as outras. E nela a figura do vivo caminhante do mundo se pe frente, at mesmo do falecido Deus na cruz; nela mais do que nas igrejas irms esse caminhante se torna um exemplo a ser seguido como um exemplar irmo
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humano; nela, ao mesmo tempo, toda a multido de santos intercedendo por seus fracos irmos e irms, se avoluma diante do juiz do juzo final, onde o caminho atinge sua meta. ATO CRISTO Assim a fraternidade tece seu lao entre homens dos quais nenhum se iguala a outro. Tampouco essa fraternidade, de modo algum, identidade de tudo com semblante humano, e sim a harmonia precisamente de homens com os mais diversos semblantes. Obviamente, uma coisa necessria, mas somente uma: que os homens tenham algum semblante, que se vejam uns aos outros. A Igreja a comunho de todos aqueles que se vem uns aos outros. Ela une homens como coevos, como contemporneos em lugares dspares do amplo espao. Contemporaneidade algo que em temporalidade nem mesmo existe. Na temporalidade s h antes e depois. O momento em que algum v a si prprio s pode preceder ou seguir o momento em que avista outro. Simultaneamente ver a si prprio e a outro impossvel. Essa razo a mais profunda para a impossibilidade de amar seu vizinho como a si prprio no mundo pago, que , afinal de contas, precisamente temporalidade. Na eternidade, contudo, h tambm contemporaneidade. Nem preciso dizer que, visto de sua margem, todo o tempo simultneo. Mas tambm aquele tempo que, como caminho eterno, leva de eternidade a eternidade admite simultaneidade. Pois somente enquanto centro entre eternidade e eternidade que possvel s pessoas nele se encontrarem. Assim, aquele que no caminho se avista a si mesmo est no mesmo ponto isto , no exato ponto central do tempo. a fraternidade que transporta os homens at esse ponto. O tempo, j dominado, posto a seus ps; resta apenas ao amor atravessar o espao separador. E assim, em seu vo, atravessa a hostilidade de naes bem como a crueldade de sexo, o cime de classe e barreira da idade. Assim ele permite a todos os hostis, cruis, ciumentos e limitados se verem uns outros como irmos em um e no mesmo momento central do tempo. O ATO JUDAICO Os contemporneos avistam-se uns aos outros no meio do tempo. Nas fronteiras do tempo, analogamente, haviam se encontrado uns com os

Cf. Mateus 18: 20. 148

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outros aqueles para os quais as diferenas de espao no significavam uma separao que antes precisava ser superada. Pois l essas diferenas j haviam sido superadas, desde o incio, na inata comunho do povo. L o trabalho do amor tanto o amor divino pelo homem quanto o amor humano de um pelo outro tinha de ser dirigido unicamente para a preservao dessa comunho atravs do tempo, para a criao de contemporaneidade das sequncias de geraes separadas em temporalidade. Esse o pacto entre descendente e ancestral. Em virtude desse pacto, o povo se torna um povo eterno. Pois ao se avistarem um ao outro, descendente e ancestral se avistam no mesmo momento do ltimo descendente e do primeiro ancestral. Descendente e ancestral so assim a verdadeira encarnao do povo eterno, eles ambos um para o outro, ambos juntos para quem est entre eles, assim como o semelhante tornado irmo a Igreja encarnada para o cristo. Ns sentimos nosso judasmo com imediao em ancios e crianas. O cristo sente seu cristianismo na sensao daquele momento que conduz o irmo a ele no auge do caminho eterno. Para ele, o cristianismo todo parece ali se amontoar. Est onde ele est, e ele est onde est o cristianismo: no meio do tempo entre eternidade e eternidade. A ns tambm mostrada eternidade pelo momento, mas diferentemente: no no irmo que est mais prximo de ns, e sim naqueles que esto mais afastados de ns no tempo, nos mais velhos e nos mais moos, no ancio que admoesta e no jovem que pergunta, no ancestral que abenoa e no neto que recebe a bno. assim que a ponte da eternidade nos faz sua transposio: do estrelado cu da promessa que arqueia sobre aquele momento de revelao do qual nasceu o rio de nossa vida eterna, at as ilimitadas areias da promessa lavadas pelo mar em que esse rio desemboca, o mar do qual ascender a Estrela da Redeno quando a terra espumar, como nas mars altas, com o conhecimento do Senhor. CRUZ E ESTRELA Em ltima anlise, ento, aquela tenso de incio e fim esfora-se ademais, vigorosamente, em direo ao fim. Embora como tenso se origine apenas em ambos, ela finalmente se concentra, no obstante, em um ponto a saber, no fim. A criana com suas perguntas , em ltima anlise, ainda e totalmente um admoestador mais possante que o ancio. No importa o quanto possamos perpetuamente extrair nutrio do inesgotvel tesouro da
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inspirada vida do ancio, no importa o quanto possamos nos manter e fortalecer pelo mrito dos pais: o ancio se transforma numa lembrana, somente criana compele. Deus estabelece seu reino somente pelas bocas de bebs e lactentes. Em ltima anlise, a tenso, afinal de contas, se concentra inteiramente no fim, no derradeiro germinar, sobre o Messias que aguardaramos. Assim tambm a aglomerao crist no ponto central finalmente no permanece grudada quele ponto. Que o cristo reconhea Cristo em seu irmo: em ltima anlise ele , afinal, impelido para alm do irmo ao prprio Cristo, sem mediao. Que o meio seja apenas meio entre incio e fim: ele atrado, a despeito de tudo isso, para o incio. Que o homem reconhea tanto a cruz quanto o juzo final do meio do caminho em eterna proximidade: ele no pode deixar que isso o satisfaa. Ele se pe diretamente sob a cruz, e no descansar at que a imagem do crucificado cubra para ele o mundo inteiro. Nesse voltar-se somente para a cruz, ele pode esquecer o julgamento: a despeito de tudo, ele continua no caminho. Pois embora ainda pertena ao eterno incio do caminho, a cruz, afinal de contas, no mais o primeiro incio; est ela prpria j a caminho e quem quer que se ponha sob a mesma est assim ao mesmo tempo em seu meio e incio. Assim a conscincia crist, toda ela embebida em crena, pressiona em direo ao incio do caminho, ao primeiro cristo, o crucificado, ao passo que a conscincia judaica, toda concentrada em esperana, pressiona em direo ao homem do fim dos tempos, ao broto real de Davi. A crena pode renovar-se eternamente no seu incio, assim como os braos da cruz podem ser estendidos ao infinito. A esperana, contudo, une-se eternamente por toda a multiplicidade de tempo no prximo e distante momento-noespao do fim, assim como a Estrela no escudo de Davi concentra-se toda no flamejante ncleo. Enraizamento no mais profundo eu esse tem sido o segredo da eternidade do povo [eterno]. Difuso atravs de tudo que exterior esse o segredo da eternidade do caminho [eterno].

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Moses Hess (1812-1875)

Judeu alemo, socialista e precursor do sionismo. Nascido em Bonn, de famlia profundamente ortodoxa, foi educado no esprito da tradio religiosa judaica. O ingresso na universidade acaba por despertar no jovem Hess interesses cada vez mais fortes com relao questo social, sobretudo os problemas vividos pelo proletariado europeu. Liberdade e justia so causas pelas quais passa a lutar. O seu socialismo um misto de revolta e oposio ao velho regime com manifestao de uma piedade sentimentalista, fruto da educao religiosa cultivada por seu av. Viaja para a Inglaterra, Frana e Blgica e escreve seu primeiro livro em 1837: Histria Sagrada da Humanidade por um Jovem Spinozista. As influncias da tica de Spinoza e da filosofia da histria de Hegel so claramente visveis em sua obra. Em 1840, retoma a Paris, onde passa a atuar junto aos crculos socialistas e escreve alguns artigos colaborando com os fundadores do socialismo cientfico. Participa de vrios congressos de trabalhadores, mantendo vivo interesse pelo movimento socialista. O interesse pela questo judaica aparece em suas meditaes publicadas sob o ttulo Roma e Jerusalm, em 1862. Neste livro, Hess apresenta suas concepes vitalistas do Cosmo, sua teoria geral do socialismo nacional e sua doutrina do renascimento nacional judaico, onde cada questo se liga s outras organicamente. Tambm desenvolve a tese de que a regenerao dos povos (entre eles o povo judeu) um dado fundamental para a libertao ltima da humanidade. Com este fim, Moses Hess prope a reabilitao poltica e nacional do povo judeu. Referncia AVNERI, Shlomo. The Making of Modern Zionism, New York, Basic Books, 1981, pp. 36/46.

Moses Hess1
Roma e Jerusalm
DCIMA CARTA Assim como anteriormente me apresentou o dilema Humanitarismo ou Nacionalismo, assim agora me pe diante de outro dilema, exclamando Liberdade ou Necessidade. Alega ser puro fatalismo considerar a humanidade apenas um organismo mais elevado e perceber a mesma lei eterna tanto na histria das naes quanto na histria da terra e dos planetas. Aqui na vida csmica e orgnica, crena sua, no h nenhum poder moral operando apenas foras naturais que podem antecipadamente ser calculadas. No assim na vida social. Esta tambm, pode de fato estar ligada a condies da natureza, mas precisamente determinao de homens livres superar o fatalismo da natureza atravs da liberdade de vontade, sem a qual nenhuma moralidade e nenhum progresso num sentido mais elevado so concebveis. Acredito que a Liberdade Moral seja determinao de seres humanos e da humanidade. S que, para mim, essa mais elevada das metas coincide com aquele reconhecimento de Deus que o judasmo tem proclamado, promovido e tornado acessvel a todos os povos histricos desde Spinoza. Especulao filosfica no a ltima palavra do desenvolvimento espiritual assim como a especulao industrial e o domnio do Capital no so a ltima palavra do desenvolvimento material. A cincia exata, que reconhece somente a observao e a experincia como meios de adquirir posses materiais e espirituais, parece estar discrepante da filosofia que eleva o esprito acima da natureza e da religio, que santifica natureza e esprito ao subordinar ambos numa essncia. Essa aparncia de discrepncia, porm, desaparece com o conhecimento mais amplo que compreende a lei da natureza e da histria como sendo uma e mesma coisa, embora isso, tambm, tivesse sua justificativa e fosse uma necessria discrepncia durante a histria do desenvolvimento da humanidade.
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152 HESS, Moses. Rome and Jerusalem, New York, Philosophical Library, 1958, pp. 67/89.

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Mesmo hoje cincia, filosofia e religio no esto reconciliadas. A explicao dessa contradio terica, como os antagonismos prticos da vida social, est no desenvolvimento instvel da humanidade, no relacionamento de classe e raas dominantes e servis, na disparidade entre trabalho material e intelectual e a recompensa da resultante; uma desigualdade que aumenta com o nvel de civilizao e pela qual toda a sociedade antiga foi destroada. No entanto, ir certamente admitir, de um modo geral, que a verdade na cincia emprica no pode ser diferente da verdade em filosofia, ou nesta ltima da religio. Ignoram-se entre si, na melhor das hipteses, apenas por pouco tempo. Finalmente, contudo, tm de confiar uma na outra e se unirem entre si. Informemo-nos, de incio, sobre os equivocados conceitos de Liberdade e Progresso! A crena numa razovel Lei Divina, que por esse motivo tambm discernvel, tendo sido revelada humanidade atravs do ensinamento moral e da histria no judasmo, essa crena numa Divina Providncia, em um criativo Plano de Criao, no uma crena num incompreensvel destino cego. Exclui licenciosidade e ilegalidade. No digo, com os materialistas, que o mundo orgnico e espiritual, assim como o inorgnico, esteja sob a mesma lei de um mecanismo exterior; digo, ao contrrio, que os fenmenos mecanicistas csmicos tm o mesmo plano, o mesmo propsito, se originam da mesma Vida sagrada que os fenmenos orgnicos e espirituais de movimento. Natureza e humanidade esto sujeitas mesma Lei Divina. A diferena , antes de tudo, que na natureza a lei seguida cegamente; o homem, contudo, se estiver completamente desenvolvido, segue-a com sua conscincia e vontade. Outra diferena, que quando esquecida resulta numa falsa compreenso do conceito de Liberdade e Progresso, est no fato de que as esferas de vida natural do mundo csmico e orgnico, sobre cujos alicerces ns construmos nossa esfera de vida social humana, j completaram seu desenvolvimento, ao passo que a humanidade ainda est empenhada na criao de sua vida. Enquanto a sociedade humana ainda estiver empenhada na produo de seu organismo, o homem, sua essncia criativa, aparece como a essncia que incalculvel e aparentemente irreprimida, embora seja to sujeita lei eterna em suas criaes quanto o a natureza em sua lei. A falsa concepo de liberdade como licena se d somente porque ainda no conhecemos a lei de
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desenvolvimento da vida social e sua meta final, e ainda no conhecemos essa lei empiricamente porque ainda estamos empenhados em desenvolvimento. Mas mesmo que a cincia ainda esteja calada sobre essa lei, ela foi h muito proclamada por nossa vocao religiosa. Ns judeus sempre temos levado conosco, desde o incio da histria, a crena na Era Messinica do mundo. Est expressa em nossa religio histrica atravs da observncia do Sabbat. Na observncia do Sabbat est encarnada a ideia de que o futuro ir certamente nos trazer um Sabbat da Histria como no passado nos trouxe o Sabbat da Natureza; que a histria, assim como a natureza, ter sua era de perfeio harmoniosa. A Histria Bblica da Criao foi dada apenas por causa do Sabbat. Ela nos conta: Quando a Criao do mundo natural foi completada com a criao do Homem e o Criador celebrou Seu Sabbat da Natureza, s depois disso comearam os dias de trabalho da histria, ento comeou a histria da criao do mundo social, que celebrar seu Sabbat aps completado todo o trabalho da histria mundial, na Era Messinica do mundo. Aqui se tem o alto significado do Gnesis Mosaico, em que pessoas de mentalidade estreita estudam a cincia da natureza. Como v, a lei do Sabbat j nos d a garantia da harmoniosa e eterna Lei Divina que reina na natureza e na histria. livre toda criatura que capaz de viver e se desenvolver irrestritamente conforme sua prpria determinao e vocao. Mas somente moralmente livre aquela criatura que vive consciente e voluntariamente de acordo com sua determinao, cuja vontade est em harmonia com a vontade e a lei de Deus. Toda outra vontade no passa de licena cuja presena devida no ao sagrado e harmonioso carter divino daquele que decide, mas existe apenas por instintos tacanhos. Essa aptido de acompanhar paixes e inclinaes o homem s possui enquanto seu carter no estiver aperfeioado. uma enfermidade do desenvolvimento travado pela humanidade. Coloca-o abaixo do animal, pois a vida animal, assim como a vegetal, j est em nossa poca plenamente desenvolvida. A lei mundial a lei de origem e desenvolvimento. Em outras palavras, do Progresso. Essa lei ainda no reconhecida em todas as trs esferas de vida. Para seu completo reconhecimento, ainda falta o fim do desenvolvimento social. A lei da histria ainda no pode, portanto, ser cientificamente reconhecida; os caminhos da Providncia ainda esto escuros para ns. Mas eles foram, indubitavelmente, trazidos cada vez para
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mais perto do esprito da humanidade graas vocao religiosa dos judeus e suas Divinas Revelaes desde o incio de sua histria, primeiro a Profecia e depois o misticismo. Ainda resta investigar a lei da histria por meio das cincias empricas. Atravs de estudos cientficos e histricos, cheguei concluso de que uma lei rege todos os fenmenos de movimento e vida, sejam das esferas no espao, dos organismos da terra ou dos povos na histria. H um pequeno, constante e contnuo progresso possvel no mundo da sociedade humana, assim como no mundo vegetal ou animal, cujo pice o homem, o ainda no-desenvolvido; e to pequeno quanto na esfera da vida csmica, cujo palco o espao infinito. Tudo se origina e se desenvolve, atinge sua meta de vida e morre, s para ser novamente liberado, e se ressuscitado como uma nova vida no eterno ciclo da infinita, unificada e Divina Vida. Aquilo que denominamos Progresso o desenvolvimento da etapa da semente etapa da maturidade. Nesta, todo ser ter alcanado seu destino. To variados como so os seres do tomo esfera do mundo e do infusrio ao homem; assim tambm so to variados sua maturidade e, consequentemente, seu destino. Mas nada vivo no tempo e no espao permanece inalterado; nada eterno, tudo se origina e acaba, aps ter cumprido seu destino, para ser novamente ressuscitado como nova vida. Os planetas se originam e se desenvolvem em espao mundial, em tempo para o qual no temos medida; a vida orgnica nos planetas precisa de uma Era Paleontolgica; o homem, finalmente, que inicia seu desenvolvimento espiritual e social na maturidade da esfera orgnica, atinge seu destino depois que o desenvolvimento histrico da humanidade est completo. Este, contudo, no de modo algum ilimitado e sem lei. Aquilo que nasce em tempo precisa de um determinado tempo final para seu cultivo. Ns percebemos somente um nico Ser eterno, infinito no tempo e no espao. Ns O percebemos por meio de uma lei nica e absoluta na vida natural e histrica, da qual apenas o judasmo tem revelaes divinas. Percepo e ao, ensinamento divino e vida so inseparveis. Dissenso luta e triunfo da virtude s existem antes do reconhecimento total
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de Deus. Durante essa era, podemos e devemos nos esforar para alcanar a moralidade; depois de completado o reconhecimento de Deus ou de Sua lei, s podemos viver moralmente. Essa compulso moral santidade. O judasmo, que revelou a unidade e a santidade da lei divina na natureza e na histria, consequentemente estabelece, desde o incio, o domnio da santidade; suas profecias todas apontam para a era de pleno conhecimento de Deus (Levtico 19:2; Jeremias 31:31, 33,45). No podemos trazer at ns qualquer imagem temporal-espacial nem da essncia sagrada de Deus nem de nossa divina essncia; o reconhecimento alcanado verdadeiramente a conquista completa do tempo e do espao, isto , do desenvolvimento histrico nas esferas da vida csmica, orgnica e social. apenas um sinal de nosso ainda no-atingido desenvolvimento e no-amadurecido reconhecimento quando prevemos para ns mesmos eternidade como durao de tempo. As revelaes do esprito divino apontam, de fato, para nenhum outro futuro a no ser o do mundo social na maturidade de vida. Essa idade do mundo comea de acordo com nossa religio histrica com a Era Messinica. a era em que a nao judaica e todos os povos histricos ressurgiro para uma nova vida, o tempo da Ressurreio dos Mortos, do Retorno do Senhor, da Nova Jerusalm, ou quaisquer outras denominaes das vrias designaes simblicas. A Era Messinica a presente poca mundial que comeou a surgir com Spinoza e se fez historicamente presente com a grande Revoluo Francesa. Com a Revoluo Francesa comeou o renascimento das naes que devem ao judasmo sua religio histrica nacional. A esfera de vida social se desenvolve, como a csmica e a orgnica, em trs pocas que so bastante anlogas s trs esferas de vida. A terceira histria de revelao, a atual idade mundial da esfera de vida social, a idade da maturidade, est agora desenvolvendo na vida social sua luta final de classe e raa, a fim de alcanar a reconciliao de todos os contrastes, rumo a um equilbrio entre produo e consumo, e em direo a um completo ciclo de vida que caracteriza, em toda parte, a era da maturidade.

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DCIMA PRIMEIRA CARTA Mais uma vez est me levando de volta questo da Palestina. E contrasta a nobre religio histrica do meu regenerado judasmo com o Sanguinrio Culto Sacrificial dos antigos israelitas. Ao mesmo tempo, presume que meu amor por minha nao no chega ao ponto de novamente aceitar, em considerao a esse amor, tambm o culto sacrificial. Se este fosse realmente inseparvel do nacionalismo judaico, eu o aceitaria sem mais delongas. Mas at agora estou convencido do contrrio. Em nossa nobre religio histrica, que s respira amor pela humanidade e conhecimento de Deus, o culto sacrificial no pode ser essencial. H questes que parecem insolveis mas que so resolvidas no decurso do desenvolvimento histrico. Entre essas questes est o cultivo de formas explcitas de culto derivadas do esprito tico-religioso daquele povo que foi o criador de sua religio em cada era de seu desenvolvimento. Michael Sachs diz: A ampla base de minha realidade histrica no para ser contida num preexistente sistema de normas. A corrente viva tranquilamente leva os diques que a emparedavam, e sabe muito bem como penetrar em suas curvas e sinuosidades. Somente com a extino da existncia do povo que havia cultivado as normas religiosas tanto quanto estas o haviam determinado, foi que a norma religiosa assumiu uma rigidez que ela deve necessariamente voltar a perder quando o livre fluxo de um desenvolvimento nacional e histrico de novo penetrar nas rgidas normas de suas Curvas e Sinuosidades. O esprito sagrado, o gnio criativo, do qual emanaram a vida e o ensinamento judaicos, afastou-se de Israel desde o tempo em que comeou a se sentir envergonhado de sua nacionalidade. Mas esse esprito reanimar nosso povo depois de ele ter re-acordado para a vida e far surgir criaes das quais presentemente ainda no temos noo. A religio judaica ser certamente to diferente de sua forma atual quanto de sua forma antiga. Em e por si mesmo o culto sacrificial no contm absolutamente nada que seja oposto a humanitarismo. Em contraste com o abominvel sacrifcio humano dos povos que na Antiguidade cercavam os israelitas por todos os lados, era, ao contrrio, uma vitria do humanitarismo. E o sacrifcio, tambm, parece ainda hoje ser uma
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expresso natural de uma mente devota. Goethe relata como em sua juventude ele s podia satisfazer seu senso religioso atravs do sacrifcio que trazia ao Eterno quando acendia uma fogueira e nela jogava seus brinquedos que mais estimava. O sacrifcio animal , sem dvida, uma concesso que nossa Tor teve de fazer ao paganismo a fim de evitar uma recada neste, ou talvez seja possvel ver no culto sacrificial aes simblicas cujo significado e necessidade no conhecemos mais. Mas isso certo: os judeus tinham, a despeito de seu Sanguinrio Sacrifcio, uma averso maior a derramar e consumir sangue, Que Vida, do que os nossos povos modernos que consomem o sangue com a carne sem sacrifcio e sem cerimnia. Por outro lado, nossos profetas da Antiguidade e rabinos da Idade Mdia nunca consideraram o rito do sacrifcio humano, assim mais tarde a orao iria suceder ao sacrifcio animal. Os Profetas e cantadores santos j o haviam repetidamente proclamado: Oseias VI, 6; XIV, 4; Miqueias VI, 6-8; Isaas I, II, LXVI, 1. Uma polmica contra o rito sacrificial tambm praticamente sempre includa com as mensagens profticas contra a idolatria. J o Rabi Iochanan ben Zacai se declara, com referncia expresso proftica em Oseias VI, 6, a favor da substituio do sacrifcio pela caridade. A religio que um dia praticaremos na nova Jerusalm pode e deve no presente permanecer uma questo aberta. Estultificar a religio no atual estado do seu progresso tambm impensvel aps a ressurreio da nao judaica, j sendo inconcebvel porque a reza judaica desde a destruio de Jerusalm em toda parte gira em torno da tristeza pela queda e da esperana pela ressurreio da nao judaica. A nova forma da religio ir necessariamente caminhar de mos dadas com a da nao. Roma no foi construda em um dia; tambm a nova Jerusalm exige tempo para sua gigantesca reconstruo. O que hoje precisamos fazer para restabelecer a nacionalidade judaica consiste, antes de tudo, nisso: manter viva a esperana para nosso renascimento poltico. Ento quando os acontecimentos mundiais, que esto se preparando no Oriente, permitirem um incio prtico para o restabelecimento do Estado Judeu, esse incio poder, antes de tudo, consistir na fundao de colnias judaicas na Terra dos Pais, ao que a Frana estar indubitavelmente inclinada a prestar ajuda. Considere as palavras do Profeta Isaas (XL, 1):
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Consolai, consolai o meu povo, diz vosso Deus. Encorajai Jerusalm. Proclamai-lhe que j findo o tempo de sua servido, Que sua culpa est paga; Que j recebeu em dobro das mos do Senhor Por todos os seus pecados. Uma voz clama: Preparai no deserto o caminho do Senhor, Endireitai no ermo uma vereda a nosso Deus. Todo vale ser aterrado, E todos os montes e outeiros nivelados, E o tortuoso ser retificado, E os lugares speros aplanados; A glria do Senhor ser revelada, E toda a carne a ver; Pois a boca do Senhor o disse.

Acredita agora que nessas palavras com que o segundo Isaas iniciou sua elocuo proftica, assim como nas palavras das profecias do Profeta Abadias, estejam espelhadas as condies de nosso tempo? No esto sendo feitos preparativos? No est o caminho da cultura no deserto sendo construdo atravs do trabalho no Istmo de Suez, atravs de ferrovias que ligam Europa e sia? Na realidade, ainda no h em tudo isso nenhum pensamento de restabelecer nossa nacionalidade. Mas, assim como outrora procuraram no Ocidente um caminho para a ndia e acharam um novo mundo, encontraro outro no caminho, que hoje est sendo aberto no Oriente, para a ndia e a China a nossa ptria perdida. DCIMA SEGUNDA CARTA A publicao do francs Ernest Laharanne, que apela aos judeus para restabelecerem seu antigo Estado por consideraes puramente polticas e humanas, parece ter despertado novas dvidas. As naes crists, o que acredita, fariam talvez menos objees contra a restaurao do Estado Judeu, j que assim poderiam esperar se ver livres de uma populao estranha que sempre foi um espinho em seu lado. No s franceses, mas tambm alemes e ingleses por mais de uma vez se expressaram a favor do retomo dos judeus Palestina. Cita-me nominalmente um ingls que fornece prova, da Bblia, para esse retomo e, ao mesmo tempo, da converso de todos os judeus ao cristianismo. Outro ingls pretende fazer a
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presente dinastia inglesa descender diretamente da dinastia de Davi, e quer que a pedra em que nosso patriarca Jac descansou a cabea quando sonhou com a escada desempenhe um papel importante na coroao dos monarcas ingleses. Finalmente, um terceiro poria generosamente todos os navios ingleses disposio dos judeus que desejassem retomar Palestina. Isso, contudo, (lhe) parece ser, por um lado, apenas uma forma mais branda de um desejo que em perodos anteriores se expressou na forma mais brutal de uma expulso geral de judeus; brandura essa pela qual nossos irmos deveriam, de fato, ser muito gratos. Por outro lado, deve certamente haver entre propostas anlogas muitas implicaes insidiosas, que em ltima anlise, esto enraizadas num furor religioso e em simples loucura, e que dispensam maiores consideraes. De qualquer maneira, tais desejos teriam todos os judeus contra eles se fossem alimentados por cristos devotos; se o fosse por judeus devotos todos os cristos iriam contra eles. Pois assim como um grupo ordenaria o retorno Palestina somente sob a condio de que na nova Jerusalm os antigos sacrifcios fossem trazidos de volta, o outro grupo havia oferecido sua ajuda somente ficando entendido trazermos ao Santo Sepulcro nossa religio nacional judaica como um sacrifcio religio crist. Nesse rochedo, crena sua, todas as aspiraes nacionais dos judeus se estraalhariam. Sem dvida, se o rgido dogma cristo e a inflexvel Ortodoxia judaica jamais viessem a ser afetadas pela corrente viva da histria, ento iriam necessariamente levantar uma intransponvel barreira contra nossos anseios patriticos. Consequentemente, a ideia de retomar a posse de nossa ptria s foi capaz, de um modo geral, de ser seriamente considerada numa poca em que essa rigidez j estivesse quebrada. E no presente isso realmente o caso no s entre os esclarecidos mas tambm entre judeus e cristos devotos. Alm disso, o Talmud, em que toda a Ortodoxia judaica nos dias de hoje se apia, j levou em considerao as reivindicaes da vida. Se a nao judaica uma nao viva, ento ela no se permitir ter medo de quaisquer dificuldades, e se por a trabalhar por seu renascimento poltico. Embora ainda no tenha chegado o tempo de o cordeiro pastar tranquilamente ao lado do lobo, a maioria dominante no possui mais seu apetite lupino nem a minoria oprimida sua aparncia de cordeiro. A tolerncia religiosa tornou-se um artigo de f mais geral do que qualquer outro. Alm do mais, conforme eu disse, suponho as futuras religies de
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todas as naes renascidas to diferentes das atuais religies que nos vieram de uma era em que nacionais individuais eram oprimidos, que no vejo nessas religies que no podem continuar por muito tempo qualquer dificuldade para nossa futura religio nacional. Finalmente, devo mais uma vez enfatizar, nossa futura religio, como a de todos os outros povos, no proceder o renascimento e sim o seguir. Antes de tudo, uma questo do despertar de um sentimento patritico nos coraes dos judeus instrudos e da liberao das massas judaicas atravs desse patriotismo revivido. Se nesse incio formos bemsucedidos, ento superaremos pela prpria experincia as dificuldades que a execuo prtica ainda apresentar em abundncia. Somente se todos os coraes judaicos estiverem mortos, somente se os judeus no fossem mais capazes de entusiasmo patritico, que teramos de desistir de uma tarefa que, como todas as grandes tarefas histricas, no pode ser realizada sem grande luta. Os judeus, a despeito de mal compreendidos iluminismo e ortodoxia, tm por demais bom senso para se associarem a fantasias religiosas sem base no presente. Mas precisamente esse senso de realismo de nossa raa que finalmente ir converter nossos irmos que ainda possuem um corao judaico, no importa se esclarecido ou ortodoxo, s aspiraes nacionais que s se movem na base prtica da realidade. As objees de judeus esclarecidos ao restabelecimento do Estado judeu so, em ltima anlise, baseadas no naquele cultivo da mente e do corao, que nunca foge das dificuldades de uma grande tarefa, que nunca antecipadamente considera o sacrifcio que seria exigido na consecuo da mesma, e sim em estreiteza moral e intelectual que incapaz, por si mesma, de se elevar a um alto posto de observao humano, nico lugar onde toda a magnitude do infortnio a ser remediado, bem como os meios de ajuda explcita, podem ser avistados. A religio judaica tem realmente sido por dois mil anos, conforme Heine e com ele todos os contemporneos judeus instrudos j corretamente sentiram, mais uma infelicidade do que uma religio. Mas no possvel, como os instrudos pretendem se persuadir, fugir a essa infelicidade quer por esclarecimento quer por batismo. Todo judeu, quer ele queira ou no, est solidamente ligado sua nao, e s quando o povo judeu estiver liberado do fardo que por milhares de anos tem carregado nos ombros com herica coragem e sacrifcio que ele ser
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tambm removido dos ombros daqueles esclarecidos que sempre constituiro apenas uma pequena minoria em extino. Todos ns temos de suportar at o fim o Ol Malchut Shamaim. Na primeira intoxicao dos modernos embates pelo esclarecimento era talvez possvel ater-se iluso de que todo o povo judeu poderia ser alienado de sua religio nacional por meio de um fraco humanitarismo, em que o judasmo como toda vida separatista iria perecer. Hoje, at mesmo o mais superficial racionalista no pode mais acalentar essa iluso filantrpica. Por falta de um olhar mais profundo sobre a vida da natureza e da histria, a evoluo histrica do judasmo contemporneo j se preveniu para a abertura dos olhos dos racionalistas; pois no Ocidente, onde os judeus esto em mais ntimo contato com a civilizao geral, o esclarecimento foi incapaz de despedaar a antiga religio judaica. A maioria dos judeus ocidentais ainda hoje lhe prestam homenagens. Nem a emancipao nem o proselitismo em favor do cristianismo por vantagens materiais, e nem o indiferentismo religioso foram capazes de levar a maioria desero. Pelo contrrio: mais recentemente, esto aparecendo simpatizantes entre justamente aqueles que anteriormente buscavam a desero do judasmo como um ideal humanstico para o antigo modo de vida judaico, e seu nmero aumenta diariamente. Mas as tendncias assimilacionistas permaneceram sem qualquer influncia sobre as grandes massas judaicas, e assim sempre permanecero. Em parte alguma so as massas movidas por abstraes intelectuais em direo a ideias progressistas, cujos motivos principais, em toda parte, esto bem mais profundos do que os prprios revolucionrios socialistas imaginavam. Com os judeus, ainda mais do que com naes que so oprimidas em seu prprio pas, a independncia nacional deve preceder a todo progresso polticosocial. Um solo nativo comum para eles a condio primordial para uma vida econmica mais saudvel. O homem social, semelhana das plantas e animais sociais, precisa para sua prosperidade e progresso de um solo amplo e livre, sem o que afundar a um estado de parasita que s consegue se manter custa dos outros. A maneira parastica, de se sustentar atravs da explorao de gente, desempenhou at agora, sem dvida, um grande papel na histria do desenvolvimento da humanidade e no , de modo algum, peculiar apenas ao judeu. Enquanto cincias e indstria ainda estavam engatinhando, o solo que anteriormente pertencera a uma nao nunca foi suficiente, por muito tempo, para sustentar seus habitantes; e as
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naes foram obrigadas a lutar e a se escravizarem umas s outras ou ento estabelecer em seu prprio meio classes dominantes e servis. Mas o reino social animal que vive na explorao do homem pelo homem est se acabando desde quando cincia e indstria modernas dominam o mundo. As naes civilizadas esto se preparando para a explorao comum da natureza por meio de esforos que contam com as conquistas da cincia, e que no precisam mais de quaisquer parasitas intermedirios, aos quais, por isso, no se permitir mais surgir. Esto se preparando para essa nova era por meio da conquista de um territrio nacional livre, atravs da destruio de todo domnio de raa e classe, de dentro e de fora, e atravs de uma livre associao de todas as foras produtivas em que a oposio hostil do capital especulativo e do trabalho produtivo ir desaparecer junto com a da especulao filosfica ao trabalho cientfico. Sei muito bem que tambm no judasmo profundamente sentida a necessidade de condies econmicas normais que estejam baseadas na explorao da natureza pelo homem. Sei dos grandes esforos que se fazem entre ns para educar nossa jovem gerao judaica para um trabalho til. Mas sei tambm que os judeus na Dispora, pelo menos na maioria dos casos, nunca podem se dedicar a tais tarefas porque lhes falta a condio primordial para as mesmas, o solo nativo, e porque no podem se assimilar com as naes entre as quais vivem dispersas sem se tornarem desleais sua religio nacional. Esses louvveis esforos por relaes de trabalho mais sadias entre os judeus iro portanto, por provirem indiretamente da destruio da religio judaica, permanecer totalmente to infrutferos quanto os esforos de reforma que da provm diretamente. Na Dispora, o judasmo no pode ser regenerado por meio de reformas e esforos filantrpicos. Na melhor das hipteses, pode levar apostasia. E isso no trar vantagem alguma a qualquer reformador ou qualquer tirano. As massas judaicas s participaro do grande movimento histrico da humanidade moderna quanto tiverem uma ptria judaica. Mas enquanto a massa de judeus persistir em sua posio excepcional, os relativamente poucos judeus que em vo empreendem todos os esforos para sair dessa falsa posio do povo judeu sero pela mesma afetados bem mais dolorosamente que a massa que se sente apenas infeliz mas no desonrada. Consequentemente, o judeu, seja ele ortodoxo ou no, no pode recuar da tarefa de cooperar pela elevao de todo o judasmo. Todo judeu, mesmo que batizado, conjuntamente responsvel pelo renascimento de Israel.
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Somente se primeiro compreendermos o papel infinitamente trgico que at o presente o povo judeu desempenha na histria que poderemos reconhecer tambm o. nico mtodo para uma cura explcita de nosso infortnio. Esse mtodo, rio presente, no to impossvel como pode parecer primeira vista. tanto no interesse da poltica francesa quanto na simpatia de seu povo que a Frana estende sua obra de redeno tambm ao povo judeu... A magnnima ajuda que a Frana concedeu aos povos civilizados para o restabelecimento de seu nacionalismo no encontrar em parte alguma um povo mais agradecido que o nosso. O povo judeu, no entanto, deve primeiro se mostrar digno do renascimento de sua religio histrica mundial, deve sentir primeiro a necessidade de seu renascimento nacional, a fim de alcan-lo. At ento, no nos cabe ainda pensar na construo do Templo e sim em como conquistar os coraes de nossos irmos para uma tarefa que redundar na eterna glria do povo judeu e levar a humanidade inteira salvao. Para assentamentos judaicos na futura estrada para a ndia e a China no faltam nem trabalhadores nem talentos e capital judaicos; e embora apenas sob a proteo de grandes potncias europeias um modesto incio seja feito, a nova rvore da vida ento crescer por si mesma e dar frutos. Est sorrindo compassivamente por eu acreditar no patriotismo judaico. Leu a Cena do Gueto e pe diante de mim a figura do velho Mendel Vilna, que estava obcecado pela ideia de convencer os Rothschilds a reconstrurem a Cidade Santa e o Templo, mas que s conseguiu infundir seu pio desejo numa criana. Esta tornou-se mais tarde, quando cresceu e frequentou a universidade, suficientemente sbia para compreender que s criana e tolos poderiam pensar em reconstruir Jerusalm. O poeta judeu, o que diz, aludindo ao dirio de seu heri, parece contemplar e oferecer, nos sentimentos patriticos de judeus devotos, nada alm do que ele descreve como rvores de Natal judaicas para crianas pequenas e grandes tolos. Tudo isso, meu caro amigo, caracteriza no mximo o moderno poeta judeu que adotou a Cultura Germnica, que no derrama, como Iehuda Halevi, o sangue do seu corao em sua poesia judaica e que, impelido por saudade pela terra dos seus sonhos, pega o basto do caminhante para ali procurar seu tmulo. Isso no caracteriza a verdadeira vida judaica. Certamente conhece a mxima: Crianas e tolos dizem a verdade. A ideia com que Mendel Vilna, o pequeno neurtico, e Moritz, quando ainda era
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chamado Moishele, estavam obcecados a ideia fundamental de todos os judeus devotos desde a destruio de Jerusalm at a poca presente. E ainda h judeus assim, com todo o devido respeito ao Sr. Kompert, mesmo entre os da rica Casa de Rothschild. Alm disso, no deve deixar de perceber o fato de que Kompert pe a negao do nacionalismo judaico na boca de um estudante, que, com certeza, reflete muito fielmente o ceticismo da idade ao questionar os pensamentos devotos de renascimento poltico para nosso povo. Que judeu instrudo teria ousado mesmo recentemente, especialmente na Alemanha, se manifestar pela restaurao de nossa nacionalidade sem ser declarado louco? E mais, Kompert deu, certamente no sem inteno, ao estudante judeu, com sua indiferena terica e real entusiasmo por sua nao, como amigo um bomio [da Bomia] que teoricamente se entusiasma por Hussand Ziska, mas tambm se torna um vaidoso clrigo que troca clice e espada por estola e turbulo. J encontro, portanto, na descrio que Kompert faz de judeus instrudos, nada mais que lastimvel indiferentismo, de que, de fato, at recentemente uma parte de nossos judeus alemes poderia ter sido acusada. Hoje, ao contrrio, essa acusao, como eu j disse, no deve ser lanada contra eles sem grandes ressalvas. No esquea, caro amigo, que foi sua a crtica de ter eu julgado com excessiva severidade os cultos judeus alemes, aos quais tive de dar o que lhes era devido. Reconheci a sadia reao do patriotismo judeu, que se afirmou contra um indiferentismo que existia mais como mania da poca e nos lbios dos Modernos do que em seus coraes. O anseio pela Terra dos Pais e o desejo de preparar para nossos leais irmos um destino melhor tambm cativou os coraes dos instrudos. Viagens a Jerusalm e fundao na Palestina de instituies educacionais e de caridade no so mais provenientes apenas das fileiras ortodoxas. A questo apenas a necessidade de incluir mais planejamento no trabalho patritico. Em Jerusalm, como em toda parte, nossos filantropos judeus se deparam com obstculos intransponveis, quando desejam aliviar o infortnio histrico de nossos irmos, ou quando gostariam de incentivar um desenvolvimento tico-espiritual de nossos irmos orientais, desmoralizados por aflio, atravs de mtodos tericos de educao, destitudos de qualquer fundamento social. A aquisio de um solo nativo comum, o esforo por obter condies legais sob cuja proteo o trabalho
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possa prosperar, a fundao de organizaes judaicas para agricultura, indstria e comrcio de acordo com os princpios mosaicos, isto , socialistas, so esses os alicerces sobre os quais o judasmo no Oriente ir ressurgir, dos quais o bruxuleante fogo do antigo patriotismo judaico voltar a irromper, e atravs do que todo o judasmo se tornar revitalizado. Sobre a base comum do patriotismo judeu, os devotos e os esclarecidos, os pobres e os ricos iro novamente se reconhecer como descendentes dos mesmos heris que se empenharam na luta contra os povos mais poderosos do mundo antigo, contra Egito e Assria, contra Grcia e Roma, e combateram at o fim daquele mundo, que somente eles sobreviveram, como filhos da mesma tribo que, como nenhum outro povo na histria do mundo, suportaram firmemente dois mil anos de martrio e sempre carregaram bem alto, e consideraram sagrado, o estandarte de sua nacionalidade, o Pergaminho da Lei, pelo qual foram perseguidos... Foi-me entregue nesse momento a obra, recentemente publicada na lngua hebraica, de um erudito judeu que, aps um tratamento minucioso da questo do nacionalismo judaico do ponto de vista talmdico, chega a exatamente as mesmas concluses que o cristo francs em sua A Nova Questo Oriental. Com essas concluses eu concordo inteiramente. Desse trabalho hebraico, tambm, quero lhe comunicar a essncia em traduo alem. O autor encerra sua obra com essas palavras:
Mesmo que ainda no tenha chegado a Hora da Graa; de pensar em como deveramos erguer em Sion o Altar do Senhor, mesmo que ainda esteja distante a esperana de obter para isso a permisso do Sulto turco, ainda assim as propostas seguintes devem ser aconselhveis numa poca em que, com a ajuda de Deus, homens altamente considerados em Israel alcanaram influncia poltica, homens como Montefiore, Albert Cohn, Rothschild, Fould, e outros, verdadeiros prncipes judeus, tais como no eram mais encontrados desde a destruio do Estado judeu. Que Deus os guarde! Eles deveriam criar uma Sociedade para o Desenvolvimento da Terra Santa, uma Chevrat Eretz Noshebet! Pois para o judeu devoto no h mrito maior do que tornar a Terra Santa habitvel atravs do trabalho. Judeus ilustres e ricos de todas as partes do mundo deveriam se juntar a eles, judeus que amam a Terra Santa. Sua atividade deveria consistir no seguinte:

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a) Empreender coletas de contribuies monetrias a fim de comprar na Terra Santa muitos povoados, campos e vinhedos abandonados pelo que o deserto se tornar um Lbano, o monto de runas uma plancie frutfera, e a terra despovoada e deserta florescer de novo como um lrio, e dar frutos para gozo, como o campo que o Senhor abenoou. Colinas e vales, aldeias e cidades ermas iro assim, pouco a pouco, tornar-se propriedade da sociedade, que poderia emitir aes que, sem dvida, no imediatamente mas mais tarde iriam tambm ser lucrativas. b) Muitos judeus da Rssia, da Polnia e da Alemanha deveriam ser apoiados pela Sociedade, na qual teriam de ingressar; e sob a direo de peritos em agricultura, a no ser que fossem eles prprios agricultores experientes, receberiam distribudas pores de terra, no incio gratuitamente, at se tornarem capazes depois de a terra cultivada, com a ajuda do capital da Sociedade, de explor-la como agricultores arrendatrios. c) Judeus militarmente treinados tm de ser nomeados a fim de impedir vorazes ataques de bedunos, formar a polcia, dar fora lei e estabelecer a ordem no pas. d) Uma escola agrcola deve ser estabelecida para treinar meninos e jovens judeus em mtodos prticos para a agricultura palestinense. Esta escola, em que tambm outras cincias e artes poderiam ser ensinadas, desde que no divergissem das nobres metas de nossa religio, pode ser fundada na Palestina ou mesmo fora dela. Entretanto, apenas em um pas que (como, por exemplo, a Frana) produza vinho e azeite, os produtos da Terra Santa, onde os alunos sero capazes de ser treinados na prtica para o tipo especial de agricultura que nativa na Palestina. Deus ento nos abenoar com Sua Graa, e ns seremos, embora comeando modestamente, capazes de adquirir cada vez mais propriedades na Terra Santa, como previu o Profeta. O incio, porm, tem de vir de ns, de acordo com a prova que eu trouxe do Talmud e do Midrash.

De outra fonte relatado que em dezembro de 1861, em Melbourne, foi realizada uma grande reunio em que notveis cristos e judeus propuseram resolues bastante anlogas s propostas por nosso erudito francs e judeu. A reunio aprovou resolues para coleta de dinheiro a fim de adquirir propriedades para judeus na Palestina. De modo que no s judeus de diferentes pases e nveis de cultura como tambm muitas naes civilizadas e denominaes crists se associam ao desejo de ajudar nosso povo a recuperar sua herana nacional; e o mais impressionante a respeito disso que todos eles concordam quanto aos mtodos que propem para atingir essa meta. Se ainda me fosse necessria uma confirmao das convices que amadureceram em mim como resultado de longos anos de estudo e de uma vida de experincia, eu certamente a encontraria na irresistvel concordncia de opinies de tanta gente e naes, que, sem se conhecerem uns aos outros e decorrendo dos mais diversos pontos de vista, chegaram s mesmas concluses. J vejo a Sociedade tomando vida e um incio de colonizao da Terra Santa por trabalhadores judeus sob a proteo de naes civilizadas ocidentais. Uma vez surgida a prosperidade sob a proteo da lei e com fundamento no trabalho, ento surgiriam universidades judaicas sob a liderana de competentes eruditos, cuja instruo no precisaria mais entrar em conflito com a antiga religio judaica. Os fiis guardies do santo sepulcro do nosso nacionalismo, no obstante sua pobreza, no iro querer saber de nenhuma espcie de ajuda, atravs da qual a velha religio judaica posta em perigo; e nossos filantropos ocidentais nunca se cansam de se queixar que Com essa gente nada se pode fazer. Com certeza, a sua falta de planejamento e seus planos absurdos no levam a nada; s podem fazer mal. Acuse seu desconhecimento das necessidades do judasmo e da poca, se to pouco capaz de alcanar um resultado feliz tanto no Oriente quanto no Ocidente. Em contraste com a ortodoxia, que no pode ser destruda de fora sem pr em perigo o nacionalismo judaico, a armadura que ainda cerca os coraes de nossos judeus modernos s pode ser destruda, de fora, por um poderoso golpe que as condies mundiais esto destinadas a desferir em futuro prximo. A estrutura de velho mundo da sociedade europeia, que j foi tantas vezes danificada pelas tempestades revolucionrias e constantemente consertada, est rachando por toda parte. No pode mais
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Isso foi escrito pelo Rabino Kalischer, de Thorn. No tinha eu razo quando lhe louvei o senso prtico e sadio de nosso povo e afirmei que os judeus devotos estenderiam sua mo aos judeus esclarecidos na base comum de nosso nacionalismo?
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resistir a uma tormenta. Aqueles oportunistas, que ficam entre a revoluo e a reao, que so destinados a criar a sociedade moderna e, depois de ela estar fortaleci da, a serem por ela engolidos como o escorpio-me por seus filhotes aquelas parteiras do progresso que pregam sabedoria, moderao e frugalidade ao prprio Criador, para que no possa agir sem excessiva considerao natureza em Suas obras aqueles portadores de cultura, aqueles salvadores da sociedade e gerentes de instituies de poupana; os especuladores em poltica, em religio, em filosofia e na indstria, esses no sobrevivero ltima tempestade. Por outro lado, aps a ltima catstrofe cuja aproximao est claramente visvel atravs de inconfundveis sinais do tempo, tambm o povo judeu, juntamente com outros povos histricos, ter novamente permisso de reivindicar seus direitos.
Lembra-te dos dias de outrora, Considera os dias de muitasgeraes; Pergunta a teu pai e ele te informar, Aos teus ancios, e eles te diro. Quando o Altssimo distribua as heranas s naes, Quando separava os filhos dos homens uns dos outros, Ele fixou as fronteiras dos povos Segundo o nmero dos filhos de Israel. (Deuteronmio 32, 7-8)

Ahad Ha-Am (Asher Zvi Ginsberg) (1856-1927)

Nascido em Skivra, Ucrnia, filho de famlia hassdica (corrente religiosa com fortes componentes msticos), recebeu uma forte educao religiosa, com o estudo do Talmud, da literatura rabnica e do hassidismo. Aproximou-se do racionalismo esclarecido, buscando novas ideias nas obras literrias da Rssia e da Alemanha. Conheceu o positivismo de D. I. Pisarev, perdendo a f religiosa. Aprofundou seus estudos do positivismo e do evolucionismo ingls, que influenciariam seu pensamento. Seu primeiro artigo Lo z Ha-Derech (No este o Caminho), foi publicado em 1889. Nele, defendia a tese de que a retomada da ptria judaica no poderia se dar antes da revitalizao do povo e das foras espirituais da nacionalidade. A inteno de Ahad Ha-Am era revisar os conceitos e mtodos do Movimento de Retorno e proceder a uma reformulao doutrinria geral. Pretendia dar uma forma orgnica aos membros que se consagrassem misso de cultivar e propagar os valores do ser coletivo de Israel e os ideais de renascimento nacional. O grupo que se formou em torno das ideias de Ahad Ha-Am teve influncia considervel no movimento sionista. Entre 1891 e 1893, escreveu uma srie de artigos, Sobre a verdade de Eretz Israel resultado de suas primeiras viagens Terra Santa nos quais indicava os erros cometidos na ao colonizadora. Em 1896, tornou-se redator do mensrio Ha-Schloach, onde estruturou sua teoria do sionismo espiritual em oposio ao sionismo hertzliano (sionismo poltico), redigindo muitos dos artigos que compem a coletnea Al Parschat Drahim (Na Encruzilhada dos Caminhos, 4 volumes). Publicou em 1919 o estudo Entre Duas Opinies, no qual traa a linha divisria entre judasmo e cristianismo. Foi um dos principais conselheiros de Weizman lder da Organizao Sionista Mundial nas negociaes que conduziram Declarao Balfour (1917). Em 1922, fixa-se em Tel Aviv, onde morre em 1927. Referncia AVNERI, Shlomo. The making of Modern Zionism, New York, Basic Books, 1981, pp.112/124.

Assim como aps a catstrofe final da vida orgnica, quando as raas histricas apareceram no mundo, aos povos foram simultaneamente atribudos sua posio e papel, assim tambm aps a catstrofe final da vida social, quando o esprito das naes histricas tiver alcanado a maturidade, tambm o nosso povo, junto com outras naes histricas, ir simultaneamente assumir seu lugar na histria mundial.

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Ahad Ha-Am (Asher Zvi Ginsberg)1

A lei do corao (1894)
A relao entre um povo normal e sua literatura uma relao de desenvolvimento paralelo e interao recproca. A literatura responde s exigncias da vida, e a vida reage orientao da literatura. A funo da literatura plantar as sementes de novas ideias e novos desejos; plantada a semente, a vida faz o resto. O tenro broto nutrido e levado maturidade pela ao espontnea de mentes humanas, e seu crescimento moldado pelas necessidades das mesmas. Com o tempo, a nova ideia ou desejo tornase uma parte orgnica de conscincia, uma fora dinmica independente, to pouco relacionada sua origem literria quanto a obra de um grande escritor cartilha que este aprendeu na escola. Mas um povo do livro, diferentemente de um povo normal, um escravo do livro. Entregou sua alma toda palavra escrita. O livro deixa de ser o que deveria ser, uma fonte sempre nova de inspirao e fora moral; ao contrrio, sua funo na vida enfraquecer e finalmente esmagar toda espontaneidade de ao e emoo, at os homens se tornarem inteiramente dependentes da palavra escrita e incapazes de responder a qualquer estmulo, na natureza ou na vida humana, sem sua permisso e aprovao. E nem mesmo sendo encontrada tal sano a resposta simples e natural; ela tem de seguir um plano pr-organizado e artificial. Consequentemente, tanto o povo quanto o seu livro no progridem de um sculo a outro; pouco ou nada muda, porque o impulso vital para mudana est ausente de ambos os lados. O povo estagna porque os coraes e as mentes no reagem direta e imediatamente a acontecimentos externos; o livro estagna porque, como um resultado dessa ausncia de reao direta, os coraes e as mentes no se erguem em revolta contra a palavra escrita quando est deixou de estar em harmonia com necessidades correntes. Ns judeus temos sido nesse sentido um povo do livro h quase dois mil anos; mas nem sempre fomos assim. Nem preciso dizer que no ramos um povo do livro na poca dos Profetas, da qual nos afastamos
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tanto que nem mais podemos compreend-la. Mas mesmo no perodo do Segundo Templo os coraes e as mentes no haviam perdido sua espontaneidade de ao e sua autoconfiana. Naquele tempo, ainda era possvel encontrar a fonte da Lei e o rbitro da palavra escrita no corao humano, conforme testemunha a famosa mxima de Hillel: No faas a teu vizinho o que no queres que ele faa a ti; est toda a Lei. Se de vez em quando a espontaneidade do pensamento e das emoes os punha em conflito com a palavra escrita, eles no se apegavam em obedincia aos seus ditames; revoltavam-se contra ela quando no atendia mais s suas necessidades, e assim foravam-na a um desenvolvimento em consonncia com suas novas exigncias. Por exemplo: a lei bblica de olho por olho foi considerada pelo senso moral mais desenvolvido de uma poca posterior como sendo selvagem e indigna de uma nao civilizada; e naquele tempo o julgamento moral do povo ainda era o mais alto tribunal. Consequentemente, foi encarado como bvio que a palavra escrita, que tambm era autorizada, devia ter significado o valor de um olho por um olho, isto , uma pena em dinheiro. Mas esse estado de coisas no perdurou. A Lei Oral (que na realidade a lei interior, a lei do senso moral) foi ela prpria reduzida a texto escrito e fossilizada; e ao senso moral restou apenas uma nica convico clara e firme a da sua prpria total impotncia e sua eterna subservincia palavra escrita. A conscincia no tinha mais, por si s, qualquer autoridade; o livro, e no a conscincia, que se tornou o rbitro em todas as questes humanas. E ainda mais: a conscincia nem tinha mais o direito de aprovar o que a palavra escrita prescrevia. Assim, dizem-nos que um judeu no deve falar que no gosta de carne de porco: faz-lo equivaleria ao impudor de um escravo que concorda com seu senhor em vez de cumprir suas ordens sem discutir. Em tal atmosfera, no de surpreender que alguns comentaristas vieram a encarar a interpretao moral da Lei por Hillel como sacrlega e se viram obrigados a invalidar explicativamente o mais belo dito do Talmud. Com teu vizinho, disseram eles, Hillel realmente queria dizer o Todo-Poderoso: no deves ir contra a Sua vontade, porque no gostarias que teu vizinho fosse contra tua vontade. E se a doutrina do olho por olho tivesse sido estipulada no Talmud Babilnico, e no na Lei Mosaica, e sua interpretao consequentemente coubesse no aos antigos Sbios e sim aos comentaristas talmdicos, estes teriam indubitavelmente aceito a doutrina em seu sentido literal; rabinos e gente comum teriam igualmente silenciado
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Texto extrado de: HERTZBERG, Arthur. The Zionist Idea: A Historical Analysis and Reader, New York, Meridian Books, 1960. Parte IV, pp. 251/269.

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 fora o protesto de seu prprio senso moral contra uma injuno explcita, e se atribuiriam mrito por assim fazer. Os autores da ltima gerao da Hascal no chegaram causa fundamental dessa tirania da palavra escrita. Puseram a culpa principalmente na insensibilidade e no obstinadamente tacanho conservadorismo dos rabinos, que no se importavam nem um pouco em sacrificar a felicidade do indivduo no altar de um meticuloso legalismo. Assim, em O Ponto de um Yod, Gordon retrata o rabino como
Um homem que no buscava a paz e no se compadecia, Para sempre proscrevendo isso, proibindo aquilo, Condenando aqui, e punindo ali.

amor dela por David sua felicidade tambm. Mas quando ele casualmente descobre que David da famlia sacerdotal, e portanto no pode casar com Hannah, que tecnicamente uma mulher divorciada por causa de uma brincadeira boba de um jovem, suas primeiras palavras, no obstante sua angstia, so Graas a Deus que eu soube a tempo. Todos os apelos de David justia e compaixo so em vo. a lei de Deus, e tem de ser obedecida. Voc pensa, diz Reb Shmuel ao final de uma longa e dolorosa cena, que eu no morreria para fazer Hannah feliz? Mas Deus ps esse fardo sobre ela e eu s posso ajud-la a suport-lo. No: Vofsi e todos os de sua espcie no so monstros de crueldade. Eles so suficientemente compassivos; mas seus sentimentos naturais no tm livre alcance. Cada sentimento, cada impulso, cada desejo se d por vencido, sem luta, pelo ponto de um yod. Onde o jogo natural do corao e da mente assim sufocado, no podemos esperar encontrar auto-afirmao ou fora de propsito em nada fora do campo da palavra escrita. Lgica, experincia, bom senso e sentimento moral so igualmente impotentes para conduzir homens a novos caminhos em direo a uma meta de sua prpria escolha. Inevitavelmente, conforme demonstrou nossa experincia, essa condio geral coloca obstculos no caminho da soluo de todo e qualquer problema nosso. H muito tem sido bvio a homens racionais no haver esperana para qualquer medida particular de melhoria a no ser que, antes de tudo, seja ,endireitada a condio geral. A questo suprema , pois, se existe alguma possibilidade de curar essa to duradoura enfermidade; se o povo judeu ainda pode se libertar de sua inrcia, recuperar o contato direto com a realidade da vida, e no entanto continuar sendo o povo judeu. este ltimo requisito que torna a questo to difcil. H uma gerao, o movimento da Hascal mostrou como o processo de despertar poderia ser realizado. Deixando em paz os mais velhos, apoderou-se dos jovens e normalizou sua atitude para com a vida, inserindo-os na cultura europeia atravs da educao e da literatura. Mas no conseguiu cumprir sua promessa de introduzir o humanismo na vida judaica sem perturbar a continuidade judaica: sobre isso seus produtos do amplo testemunho. Ingressando na vida judaica de fora para dentro, a Hascal achou mais fcil
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Esses escritores apelavam ao senso moral do homem comum contra a severidade da Lei. Pensavam que pintando o contraste em cores suficientemente chocantes poderiam provocar uma revolta que levaria ao triunfo do senso moral sobre a palavra escrita. Mas nisso estavam completamente errados. No havia, de fato, qualquer diferena entre a atitude do rabino e a do homem comum. Quando Vofsi declarou nulo o documento de divrcio, ele pode ter tido tanta pena das vtimas quanto a congregao reunida, que, segundo as palavras do poeta,
Estavam todos trmulos, como se a sombra da morte Houvesse cado sobre eles.

Somente o rabino nunca duvidou, nem por um s instante, onde estaria a vitria num conflito entre o senso moral e a palavra escrita; a congregao nem sonhava em questionar a deciso do rabino, e muito menos em questionar a prpria Lei. Se estavam todos trmulos, era apenas como algum poderia tremer diante de uma catstrofe devida ao inaltervel curso da natureza. Um povo normal reagiria a uma tragdia desse tipo determinando que tal coisa nunca mais voltasse a acontecer; mas um povo do livro s pode reagir com tristeza muda, como a que seria ocasionada se a herona casse morta no seu casamento. Culpar a palavra escrita, revoltar-se contra o rigor da Lei isso est fora de cogitao. Zangwill est mais prximo da verdade em seu Children of the Ghetto. Nesse romance h um incidente semelhante ao do poema de Gordon, mas o tratamento bastante diferente. O rabino, Reb Shmuel, ele prprio o pai da moa, e um pai muito afetuoso. A felicidade da filha no
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criar um molde inteiramente novo para seus seguidores do que consertar os defeitos do molde judaico preservando suas caractersticas essenciais. Da no poder haver uma resposta completa nossa pergunta enquanto um novo e compulsivo impulso para a normalizao no irromper de dentro de ns, da nossa prpria vida judaica, e for comunicado gerao mais jovem atravs de educao e literatura, de modo que possa se fundir com o humanismo da Hascal e impedi-Ia de subjugar e obliterar o molde judaico. Um impulso nativo dessa espcie entrou recentemente em jogo sob a forma da ideia que ns denominamos Hibat Tzion, embora esse nome seja inadequado para expressar o significado total da ideia. O verdadeiro Hibat Tzion no simplesmente uma parte do judasmo, e tampouco algo acrescentado ao judasmo; o judasmo todo, s que com um foco diferente. Hibat Tzion no excluiu a palavra escrita nem procura modificla artificialmente por adio ou subtrao. Representa um judasmo que ter com o seu foco o ideal de unidade de nossa nao, seu renascimento, e seu livre desenvolvimento atravs da expresso de valores humanos universais nos termos do seu prprio esprito caracterstico. Essa a concepo de judasmo em que nossa educao e nossa literatura devem se basear. Precisamos revitalizar a ideia do renascimento nacional, e usar todos os recursos possveis para fortalecer seu domnio e aprofundar suas razes, at que se torne um elemento orgnico na conscincia judaica e uma fora dinmica independente. Parece-me que somente dessa maneira pode a alma judaica ser libertada de seus grilhes e retomar contato com a ampla corrente de vida humana sem ter de pagar pela liberdade com o sacrifcio de sua individualidade.

carne e do prazer dos sentidos como um refgio da vacuidade da vida; e tambm no olhava para cima a fim de criar no Paraso uma habitao eterna para as almas dos homens. Oferecia a vida eterna aqui na terra. Fazia-o enfatizando o senso de coletividade, ensinando o indivduo a se considerar no como unidade isolada, com uma. existncia limitada por seu prprio nascimento e morte, mas como parte de um todo maior e mais importante, como um membro do corpo social. Essa concepo desloca o centro de personalidade no do corpo para o esprito mas do indivduo para a comunidade; concorrentemente, o problema da vida transferido do plano individual para o social. Eu vivo em considerao perpetuao e ao bemestar da comunidade a que perteno; morro para dar lugar a outros, que iro remoldar a comunidade e salv-la da petrificao e da estagnao. Quando o indivduo ama a comunidade como a si prprio e se identifica completamente com o bem-estar da mesma, ele tem algo pelo que viver; sente menos intensamente suas privaes pessoais, pois conhece o propsito pelo qual vive e sofre. Obviamente, porm, isso s ser vlido se a prpria comunidade viver para algum propsito que o indivduo possa considerar como justificativa para qualquer sacrifcio de sua parte; de outro modo, volta-se questo antiga, s que no plano da comunidade. Eu suporto a vida a fim de que a comunidade possa viver; mas por que a comunidade existe? A que fim ela serve, para que eu possa animadamente suportar em seu beneficio as minhas agruras? Assim, tendo deslocado o centro da vida do indivduo para a comunidade, foi o judasmo obrigado a encontrar resposta para o problema da vida coletiva. Teve de dotar a vida da comunidade com um propsito suficientemente amplo e importante para sustentar o moral do indivduo mesmo quando sua vida pessoal lhe era um fardo. Da, a comunidade de Israel tornou-se um reino de sacerdotes e uma nao sacra, destinada desde o incio a ser um exemplo para toda a humanidade atravs de sua Tor: Essa soluo do problema no deixou espao no judasmo para os dois pontos de vista extremos. O homem um e indivisvel; todos os seus membros, sentidos, emoes e pensamentos constituem um nico todo. Mas a existncia do homem que um judeu no sem propsito, porque ele membro do povo de Israel, que existe para um propsito sublime. E como a comunidade apenas a soma de seus membros, cada israelita tem o direito
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Carne e esprito (1904)

...No perodo de nossa antiga existncia nacional o perodo do Primeiro Templo no encontramos nenhum vestgio da concepo de uma dualidade de corpo e alma. O homem, como um ser vivo e pensante, uno em toda as suas partes. A palavra hebraica nefesh inclui tudo, corpo e alma, e tudo que lhes pertence. O nefesh, o ser humano individual, vive como um todo e morre como um todo; nada sobrevive. No obstante isso, o judasmo primitivo no se mostrava perplexo diante do problema da vida e da morte. Nada sabia do desespero que gera a filosofia materialista da exaltao da
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de se considerar um elo indispensvel na corrente da vida de seu povo e de compartilhar de sua imperecibilidade. por isso que o verdadeiro ascetismo desconhecido no perodo inicial da histria judaica. O verdadeiro ascetismo, dio da carne e desejo de sua aniquilao, s possvel onde os homens, incapazes de encontrar o propsito da vida neste mundo, so obrigados a procur-lo em outro. verdade que na primitiva vida judaica havia os nazarenos, que observavam algumas das prticas exteriores do ascetismo; mas isso era simplesmente parte do ritual de sacrifcio e nada tinha a ver com dio carne. preciso lembrar que mesmo um heri to no-asctico quanto Sanso era considerado um nazareno. Essa atitude perante a vida, que eleva o indivduo acima do amor a si mesmo e o ensina a encontrar o propsito de sua existncia na perpetuao e no bem-estar da comunidade, encarada por muitos estudantes de religio no-judeus como supermaterialista; e com base nisso declaram o judasmo inferior, porque, diferentemente de outras religies, no promete vida imortal a todos e uma recompensa aos justos aps a morte. No poderia haver melhor exemplo da cegueira do preconceito... No perodo inicial da histria judaica havia um grupo considervel que assumia uma viso materialista da vida nacional, no sentido de no ter outro ideal alm de tornar o Estado supremo internamente, respeitado no exterior e seguro contra agresso. Era esse o partido aristocrata; abrangia o squito do rei, os lderes militares, e a maioria dos sacerdotes todos aqueles, em resumo, que em suas vidas individuais no tinham qualquer experincia do sofrimento que exige consolao. No davam qualquer experincia aoaspecto espiritual da vida nacional, e quase sempre estavam dispostos a abandonar os ideais espirituais da nao a servir todos os deuses se achassem que havia alguma vantagem poltica em faz-lo. O idealismo moral dos Profetas travou guerra incessante contra esse materialismo poltico, at que, com a destruio do Estado, ele automaticamente desapareceu. , porm, inteiramente errneo afirmar, como fazem alguns historiadores modernos, que os Profetas se opunham ao Estado como tal, que encaravam a prpria existncia deste como incompatvel com a vida espiritual que tinham como ideal, e que portanto desejavam a derrubada do mesmo. Esse ascetismo poltico, esse desejo de aniquilamento do organismo fsico da vida nacional a fim de promover seu progresso espiritual, na realidade totalmente repugnante atitude proftica. Basta ler aquelas passagens dos Profetas em que eles se rejubilam
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com as vitrias do Estado (na poca de Senquerib, por exemplo) e lamentam suas derrotas, para constatar imediatamente que alto valor eles davam vida poltica, e quo integralmente compreendiam que a independncia nacional era uma condio essencial para a consecuo dos seus prprios ideais. Ao mesmo tempo, porm, eles nunca esqueciam que somente pelo esprito que a vida, quer individual quer nacional, pode ser elevada a um plano mais alto, e que apenas do esprito ela pode derivar significao e propsito; consequentemente, insistiam que o fim no podia estar subordinado aos meios, que ao corpo no se devia dar domnio sobre o esprito. Assim, os Profetas simplesmente enunciaram em nvel nacional o princpio que o judasmo havia estipulado para a vida individual: a unidade de corpo e esprito, no sentido acima explicado. Foi somente no perodo do Segundo Templo que o ascetismo poltico encontrou expresso na vida do Estado Judeu. Os essnios no tinham qualquer antipatia vida fsica no que concerne ao indivduo; mas no plano nacional, em relao ao Estado, sua atitude era exatamente a do asceta. Esses homens espiritualmente inclinados viam que, do ponto de vista espiritual, o Estado Judeu ia de mal a pior. Seus governantes, como os do primeiro reinado, adoravam somente o poder material; seus homens de viso desperdiavam as energias deles numa luta v para deter a corrupo do corpo poltico, j nas garras de implacveis inimigos, e insuflar nele o esprito do verdadeiro judasmo. Nessa situao, os essnios desistiram desesperados da vida poltica, deram as costas sua incurvel corrupo, e se retiraram para o deserto, para ali viverem suas vidas individuais em pureza e santidade. Em sua recluso de eremitas, a antipatia dos essnios pelo Estado tornou-se cada vez mais intensa, e quando o Estado estava exalando o ltimo suspiro, entre a vida e morte, alguns deles no fizeram qualquer tentativa de esconder sua satisfao. O ascetismo poltico dos essnios, contudo, no teve muita influncia sobre a tendncia geral de pensamento. No era a eles e sim aos fariseus que o povo recorria para instruo e liderana, e os fariseus representavam a concepo proftica do judasmo, com sua unificao de corpo e esprito. Assim, longe de se desviarem da vida e de condenarem o Estado ao ostracismo, eles no abandonaram seu posto no grosso da refrega, e fizeram todos os esforos possveis para salvar o Estado da degenerao moral e mold-lo em conformidade com o esprito do judasmo. Estava claro para
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eles que um esprito sem um corpo no poderia ter realidade, e que o esprito do judasmo era incapaz de se desenvolver e se realizar sem expresso concreta num organismo poltico. Por isso os fariseus estiveram sempre combatendo em duas frentes: contra os materialistas polticos no interior do Estado, e lado a lado com eles contra o inimigo externo pela preservao do Estado. Foi s no ltimo instante, quando no havia mais a menor sombra de dvida quanto iminente destruio do organismo poltico, que a diferena interna de ideais levou inevitavelmente a um rompimento. Os materialistas polticos, para quem a preservao do Estado significava tudo, no tinham mais interesse na vida, e tombaram lutando desesperadamente entre as runas que amavam; mas os fariseus lembravam mesmo nessa hora de agonia, que se importavam com o Estado apenas no interesse do esprito nacional nele incorporado e necessitando de sua ajuda. No lhes poderia ocorrer supor que o fim do Estado significasse o fim da nao e de tudo que fazia a vida valer a pena ser vivida. Ao contrrio, para eles era imperiosamente necessrio encontrar alguns meios temporrios de preservar a nao e seu esprito sem o organismo poltico, at que aprouvesse ao Todo-Poderoso restaurar Seu povo sua terra e liberdade. Assim a aliana foi rompida: os fanticos polticos permaneceram, espada na mo, nas muralhas de Jerusalm, e os fariseus, com a Tor na mo, foram para Iavn. A obra dos fariseus gerou frutos. Eles conseguiram criar uma espcie de corpo poltico, sem razes em terra slida; no mbito desse imaginrio arcabouo, o esprito nacional hebraico tem vivido h dois mil anos sua caracterstica viva prpria. A organizao do gueto, cujos alicerces datam do perodo imediatamente subsequente destruio de Jerusalm, um milagre sem paralelo na histria humana. Sua concepo originria a de que o propsito da vida a perfeio espiritual, mas que o esprito precisa de um corpo que sirva como seu instrumento. At que a nao pudesse encontrar, mais uma vez, uma habitao para seu esprito em um organismo poltico independente e completo, os fariseus achavam necessrio proporcionar um substituto provisrio artificial. Seu mtodo era o de concentrao em vrias e dispersas comunidades, todas construdas segundo um mesmo padro, todas vivendo um tipo de vida, e todas unidas, a despeito da geografia, pela conscincia de sua origem
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comum, pela devoo a um nico ideal, e pela esperana de uma completa reunio no futuro. Essa estrutura artificial, construda ao tempo em que se esperava, para qualquer momento, o raiar da era messinica, estava originalmente destinada a servir apenas por um curto perod6. Perdurou por tempo demasiado longo; agora, finalmente, est num estado de avanada decadncia, com rachaduras e fissuras em toda parte. Deste modo, mais uma vez judeus espiritualmente inclinados ressuscitaram o ascetismo poltico dos essnios. Eles vem seu povo exilado e disperso, sem esperana de um retorno ao seu estado anterior; vem a organizao do gueto, que oferecia pelo menos alguma aparncia de uma vida nacional concreta, em processo de dissoluo. Em seu desespero, renunciam ao elemento fsico da vida nacional, e consideram o elemento espiritual como sua nica base. Para eles, o povo judeu um esprito sem um corpo. O esprito no somente o propsito da vida, mas a totalidade da vida; o corpo no est apenas subordinado ao esprito: um inimigo perigoso, que amarra o esprito e o impede de entrar em seu reino. Como era de se esperar, a reao contra essa teoria extrema produziu uma teoria igualmente extrema no lado oposto, e tem havido uma recrudescncia daquele materialismo poltico que v o organismo fsico o Estado Judeu como o todo e o fim da vida judaica. Tal evoluo ainda recente demais para ter percorrido toda a sua trajetria; mas, se a Histria um guia, temos o direito de acreditar que nenhuma dessas duas teorias extremas reflete verdadeiramente o esprito de nosso povo. Ambas, podemos crer, iro desaparecer, e abriro caminho para a nica viso que realmente tem suas razes no judasmo: a viso que tinham os Profetas no primeiro Estado judeu, e os fariseus no segundo. Se, conforme esperamos, houver um terceiro, seu princpio fundamental, tanto no plano nacional quanto no individual, no ser nem a predominncia do corpo sobre o esprito nem a supresso do corpo por causa do esprito, e sim a elevao do corpo pelo esprito.

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Sobre nacionalismo e religio (1910)

BADEN-BADEN, 18 DE SETEMBRO DE 1910 AO DR. J. L. MAGNES (Nova Iorque) ...O objetivo da sua Sociedade, diz o senhor, estabelecer Sinagogas e Casas de Estudo. No tenho certeza se considera a Sinagoga e a Casa de Estudo como duas instituies distintas e se pretende estabeleclas separadamente uma da outra; se assim for, no creio que alcanar seu objetivo. A experincia em toda parte, e especialmente na Amrica, tem demonstrado que a Sinagoga por si s, exclusivamente como uma Casa de Orao, no capaz de salvar o judasmo, que, diferentemente de outras religies, no depende de oraes. Tampouco pode a separada Casa de Estudo, que destinada a jovens em busca de conhecimentos, servir como um instrumento de educao popular. O que precisamos fazer retomar aos sistemas que nossos antepassados adotaram em tempos que j vo longe e ao qual devemos nossa sobrevivncia: temos de tornar a prpria Sinagoga uma Casa de Estudo, tendo o aprendizado judaico por preocupao principal e a orao como uma questo secundria. Encurtem as oraes o quanto queiram, mas faam de sua Sinagoga um abrigo de conhecimentos judaicos, tanto para crianas quanto para adultos, para os instrudos assim como para a gente comum. O sermo dos sabbats e dias santos deve dar aos congregados instruo na Tor, e no frases de melflua devoo. Mas s o sermo no suficiente. A Sinagoga deve ser o centro ao qual aqueles que querem aprender sobre judasmo recorrem diariamente. Leituras sobre temas judaicos podem ser organizadas todas as noites, separadamente para os mais e os menos instrudos. Foi isso que nossos antepassados fizeram, com bons resultados. O esprito do ensino tem de ser diferente para se adequar s condies alteradas; o prprio sistema, porm, no pode ser melhorado. Em tempos antigos, a leitura vespertina consistia do Ain Jacob com o comentrio de Rashi, ou o Menor Hamaor, para gente comum; e do Talmud para os instrudos. Em nossos dias, claro, devemos introduzir leituras mais adequadas s exigncias modernas. Mas aprender-aprenderaprender: este o segredo da sobrevivncia judaica. Depois o senhor diz que quer propagar a religio nacional e o nacionalismo religioso. Devo confessar que tal frmula no me
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inteiramente clara. Religio nacional sem dvida alguma: o judasmo essencialmente nacional, e todos os esforos dos reformistas para separar a religio judaica do seu elemento nacional no tiveram outro resultado a no ser arruinar tanto o nacionalismo quanto a religio. Obviamente, ento, se deseja construir e no destruir, tem de ensinar religio com base no nacionalismo, com o qual est inseparavelmente entrelaada. Mas quando o senhor fala em propagar nacionalismo religioso no sei o que est querendo dizer (a no ser que esteja simplesmente dizendo a mesma coisa com outras palavras). Pensa realmente em excluir das fileiras dos nacionalistas todos aqueles que no acreditam nos princpios da religio? Se essa a sua inteno, no posso concordar. Em minha opinio, nossa religio nacionalismo , um produto de nosso esprito nacional mas o inverso no verdadeiro. Se impossvel ser um judeu no sentido religioso sem reconhecer nossa nacionalidade, possvel ser um judeu no sentido nacional sem aceitar muitas coisas em que a religio exige crena...

O estado judeu e o problema judaico (1897)

Alguns meses se passaram desde o Congresso Sionista, mas seus ecos ainda ressoam na vida diria e na imprensa. Reunies de toda espcie grandes e pequenas, locais e regionais esto ocorrendo. Desde quando os delegados voltaram para casa, eles tm convocado reunies pblicas, regalando-nos repetidamente com histrias das maravilhas que foram encenadas diante de seus prprios olhos. O pblico miservel e esfomeado fica ouvindo, entra em xtase, e espera a salvao. -lhes inconcebvel que eles os judeus do Ocidente possam deixar de ser bem-sucedidos naquilo a que se propem. Cabeas esquentam e coraes batem depressa, e muitos lderes que durante anos at agosto ltimo haviam vivido apenas pela colonizao da Palestina, e para quem um tosto de do nativo em auxlio ao trabalho judaico na Palestina ou Escola de Jaffa tinha um valor imenso, agora se desorientaram e perguntaram uns .aos outros: De que adianta essa espcie de trabalho? Os dias do Messias esto prximos, e a gente se ocupa com bagatelas! Chegou a hora de grandes feitos, pois grandes homens, homens do Ocidente, se alistaram na causa e marcham nossa frente. Houve uma revoluo no mundo deles, e, para enfatiz-la, deram prpria causa um nome novo: no mais Amor a Sion (Hibat Tzion) e sim Sionismo (Tzioniut). E h at mesmo precisionistas que, estando
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decididos a no deixar nenhuma brecha para erro, usam apenas a forma europeia do nome (zionismus) anunciando assim ao mundo todo que no esto falando sobre nada to antiquado quanto Hibat Tzion, e sim sobre um movimento novo, atualizado, que provm, como seu nome, do Ocidente, onde as pessoas desconhecem a lngua hebraica. O discurso de Nordau sobre a situao geral dos judeus foi uma espcie de introduo s atividades do Congresso. Descreveu com palavras incisivas as tristes agruras, materiais ou espirituais, que afligem os judeus no mundo inteiro. Nos pases do Leste, o problema deles material: precisam lutar sem esmorecimento para satisfazer as mais elementares necessidades fsicas pela cdea de po e o sopro de ar que lhes negado por serem judeus. No Ocidente, em terras onde os judeus esto legalmente emancipados, sua condio material no especialmente m, mas grave seu estado espiritual: eles querem aproveitar ao mximo seus direitos legais, e no podem; anseiam por aceitao pela maioria no-judaica e por fazer parte da sociedade nacional, mas so mantidos distncia; esperam por amor e fraternidade, mas por todos os lados encontram olhares de dio e desprezo; sabem que no so de modo algum inferiores aos seus vizinhos em capacidade ou virtude, mas continuamente lhes jogado na cara que so do tipo inferior e inaptos a se elevarem ao nvel dos arianos. E assim por diante. Bem e ento? O prprio Nordau no tocou nessa questo, que estava fora do mbito do seu discurso. Mas o Congresso em si foi a resposta. A comear pelo discurso de Nordau, o Congresso significou isso: a fim de escapar desses problemas todos necessrio estabelecer um Estado Judeu. No h dvida de que, mesmo quando o Estado Judeu estiver estabelecido, a colonizao judaica s poder avanar pouco a pouco, conforme for permitido pelos recursos do prprio povo e pelo progresso do desenvolvimento econmico do pas. Enquanto isso, o aumento natural da populao judaica, tanto na coletividade palestinense quanto na Dispora, continuar, da resultando, inevitavelmente, que a Palestina ter cada vez menos espao para os novos imigrantes e, por outro lado, que, a despeito da contnua emigrao, o nmero dos que permanecem fora da Palestina no diminuir consideravelmente. Em seu discurso inaugural no Congresso, o
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Dr. Herzl, desejando demonstrar a superioridade de sua ideia do Estado sobre a forma anterior de colonizao palestinense, calculou que por este ltimo levaria novecentos anos para que todos os judeus pudessem ser estabelecidos em sua terra. Os membros do Congresso aplaudiram isso como um argumento conclusivo. Foi, porm, uma vitria de pouco valor. O prprio Estado Judeu, faa o que fizer, no encontrar maneira de efetuar um clculo mais favorvel. A verdade amarga, mas com toda a sua amargura melhor do que a iluso. Temos que admitir para ns mesmos que o recolhimento dos exilados, inatingvel por meios naturais. Podemos algum dia, por meios naturais, estabelecer um Estado Judeu; possvel que nele os judeus possam aumentar e se multiplicar nesta nao at a terra estar repleta deles mas mesmo ento a maior parte de nosso povo continuar dispersa em solo estrangeiro. Recolher nossos dispersos dos quatro cantos da Terra (segundo as palavras no Livro de Orao) impossvel. Somente a religio, com sua crena numa redeno milagrosa, pode prometer tal resultado. Mas se assim, se o Estado Judeu, tambm, no significa um recolhimento dos exilados e sim o estabelecimento de uma pequena parte de nosso povo na Palestina, ento como ir isso solucionar o problema material das massas judaicas nos pases da Dispora? O problema material no acabar com o estabelecimento de um Estado Judeu, e est, de fato, alm de nosso poder resolv-lo de uma vez por todas. (Mesmo agora h vrios meios nossa disposio para, em maior ou menor grau, aliviar esse problema, como, por exemplo, aumentando a proporo entre nossa gente, de agricultores e artesos em todos os pases etc.) Quer criemos ou no um Estado Judeu, a situao material dos judeus depender sempre, basicamente, das condies econmicas e do nvel cultural das vrias naes entre as quais estamos dispersos. Por isso somos impelidos concluso de que a verdadeira e nica base do sionismo tem de ser encontrada em outro problema, o espiritual. Mas o problema espiritual aparece sob duas formas diferentes, uma no Ocidente e outra no Oriente, o que explica a diferena fundamental entre o sionismo ocidental e o Hibat Tzion oriental. Nordau tratou apenas da forma ocidental do problema, e aparentemente nada sabendo sobre a
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oriental; e o Congresso como um todo concentrou-se na primeira prestando pouca ateno segunda. O judeu ocidental, tendo sado do gueto e buscado aceitao pela maioria no-judaica, infeliz porque sua esperana de ser recebido de braos abertos resultou em decepo. Forosamente, ele retorna ao seu prprio povo e tenta encontrar no mbito da comunidade judaica aquela vida pela qual anseia mas em vo. A vida e o horizonte da comunidade judaica no o satisfazem mais. Ele j se acostumara a uma vida social e poltica mais ampla, e intelectualmente o trabalho a ser feito por nossa cultura nacional no o atrai, porque essa cultura no desempenhou qualquer papel em sua instruo primria e para ele um livro fechado. Nesse dilema, ele se volta para a terra dos seus antepassados e imagina como seria bom se ali fosse restabelecido um Estado Judeu um Estado e uma sociedade organizados exatamente segundo os padres de outros Estados. Ento ele poderia viver uma vida plena e completa entre seu prprio povo, e poderia encontrar em casa tudo aquilo que agora v l fora, bamboleando diante de seus olhos mas fora de seu alcance. Nem todos os judeus, claro, sero capazes de levantar vo e ir para seu Estado; mas a prpria existncia do Estado Judeu elevar tambm o prestgio daqueles que permanecem no exlio, e seus concidados no mais os desprezaro e mantero distncia, como se fossem pobres escravos, inteiramente dependentes da hospitalidade dos outros. E continuando a contemplar essa fascinante viso, subitamente desperta em sua conscincia que mesmo agora, antes de estabelecido o Estado Judeu, a simples ideia do mesmo lhe d quase completo alvio. Proporciona-lhe uma oportunidade para trabalho comunitrio e excitao poltica; suas emoes encontram uma sada num campo de atividade que no subserviente a no-judeus; e ele sente que, graas a esse ideal, est mais uma vez espiritualmente ereto e recuperou sua dignidade pessoal, sem muitos transtornos e exclusivamente por seus prprios esforos. Logo, dedica-se ao ideal com todo o entusiasmo de que capaz; solta as rdeas de sua imaginao e deixa-a elevar-se vontade, para alm da realidade e das limitaes do poder humano. Pois no da consecuo do ideal que ele precisa; a busca do mesmo j suficiente para cur-lo de sua enfermidade espiritual, que a de um complexo de inferioridade, e quanto mais sublime e distante o ideal, tanto maior o seu poder de exaltar.

Essa a base do sionismo ocidental e o segredo de sua atrao. Mas o Ribat Tzion oriental se originou e desenvolveu num ambiente diferente. Ele, tambm, comeou como um movimento poltico; mas, sendo resultante de males materiais, no poderia se contentar com uma atividade consistindo apenas de exploses de sentimentos e de belas frases, que podem satisfazer o corao mas no o estmago. O Hibat Tzion comeou imediatamente a se expressar em atividades concretas no estabelecimento de colnias na Palestina. Esse trabalho prtico no tardou a cortar as asas da fantasia e a demonstrar de modo conclusivo que o Hibat Tzion no podia diminuir um mnimo que fosse o infortnio material dos judeus. Poder-seia, portanto, ter pensado que, ao se tornar evidente esse fato, os Hovevei Tzion desistiriam de seu esforo e deixariam de gastar tempo e energia com um trabalho que no os fazia chegar mais perto de sua meta. Mas, no: permaneceram fiis bandeira deles e continuaram a trabalhar com o antigo entusiasmo, embora muitos no compreendessem, mesmo em suas prprias mentes, por que o faziam. Sentiam instintivamente que precisavam prosseguir; mas, como no avaliavam claramente a natureza desse sentimento, as coisas que faziam nem sempre estavam efetivamente direcionadas para a verdadeira meta, qual inconscientemente se dedicavam. Pois ao mesmo tempo que a tragdia material no Leste atingia o auge, o corao dos judeus orientais estava tambm sensvel a outra tragdia uma tragdia espiritual; e quanto os Hovevei Tzion comearam a trabalhar pela soluo do problema material, o instinto nacional do povo sentiu que nesse trabalho encontraria o remdio para sua inquietao espiritual. Por isso, o povo se agrupou em tomo desse esforo, no o abandonando nem mesmo depois que se tomou bvio que era um instrumento ineficaz para curar o problema material dos judeus. A forma oriental do problema espiritual totalmente diferente da ocidental. No Ocidente o problema dos judeus; no Leste, o problema do judasmo. O primeiro pesa sobre o indivduo; o segundo, sobre a nao. O primeiro sentido por judeus que tiveram uma educao europeia; o outro, por judeus cuja educao foi judaica. Um produto do anti-semitismo, e dele depende para sua existncia; o outro um produto natural de um verdadeiro elo com uma cultura milenar, e permanecer sem soluo e noafetado mesmo se os judeus no mundo inteiro. atingirem confortveis posies econmicas, estiverem nas melhores relaes possveis com seus
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vizinhos e forem admitidos mais completa igualdade social e poltica. No foram somente os judeus que saram do gueto; o judasmo saiu, tambm. Para os judeus, o xodo do gueto est restrito a certos pases e devido tolerncia; o judasmo, porm, saiu (ou est saindo) espontaneamente, onde quer que tenha entrado em contato com a cultura moderna. Esse contato com a cultura moderna derruba as defesas internas do judasmo, de modo que ele no pode mais permanecer isolado e viver uma vida parte. O esprito de nosso povo deseja se desenvolver mais; quer absorver os elementos bsicos da cultura geral que o esto alcanando do mundo exterior, digeri-los e torn-los parte de si mesmo, como fez antes em vrios perodos de sua histria. Mas as condies de sua vida no exlio no so adequadas a tal tarefa. Em nossa poca, a cultura por toda parte se expressa atravs da forma do esprito nacional, e o estranho que queira fazer parte da cultura deve enterrar sua individualidade e ficar absorvido no ambiente dominante. No exlio, portanto, o judasmo no pode desenvolver sua individualidade sua prpria maneira. Quando ele deixa os muros do gueto, corre o perigo de perder seu ser essencial ou no mnimo sua unidade nacional; corre o perigo de ficar rachado em tantas espcies de judasmo, cada um com carter e vida diferentes, quantos so os pases da disperso. O judasmo est, consequentemente, num dilema: no pode mais tolerar a forma de Galut que teve de assumir, em obedincia sua vontade de viver, quando foi exilado de seu prprio pas; mas sem essa forma sua vida est em perigo. Assim, procura retornar ao seu centro histrico, onde ser capaz de viver uma vida desenvolvendo-se de um modo natural, por em jogo seus poderes em cada departamento da cultura humana, ampliar e aperfeioar aqueles haveres nacionais que adquiriu at agora, e assim contribuir para o cabedal comum da humanidade, no futuro como tem feito no passado, com uma grande cultura nacional, fruto da no-tolhida atividade de um povo vivendo luz de seu prprio esprito. Para tal propsito o judasmo pode, presentemente, se contentar com pouco. Ele no precisa de um Estado independente, mas somente da criao em sua terra natal de condies favorveis ao seu desenvolvimento: um estabelecimento de bom tamanho de judeus trabalhando sem estorvo em cada ramo da civilizao, desde agricultura e trabalhos manuais at cincia e literatura. Esse estabelecimento judaico, que ser um crescimento gradual, vai se tornar no decorrer do tempo o centro da nao, onde seu esprito encontrar expresso pura e se desenvolver em todos os seus aspectos at o mais alto
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grau de perfeio de que capaz. Ento, a partir desse centro, o esprito do judasmo se irradiar para a grande circunferncia, para todas as comunidades da Dispora, para inspira-las com nova vida e para preservar a unidade global de nosso povo. Quando nossa cultura nacional na Palestina tiver atingido esse nvel, podemos estar confiantes de que produzir, na prpria Terra de Israel, homens que sero capazes, num momento favorvel, de ali estabelecer um Estado um que no seja simplesmente um Estado de Judeus e sim realmente um Estado Judaico. Esse Hibat Tzion, que se preocupa com a preservao do judasmo numa poca em que os judeus sofrem tanto, algo estranho e incompreensvel para os sionistas polticos do Ocidente, assim com a exigncia do Rabi Johanan ben Zakai por Iavn foi estranha e incompreensvel ao grupo equivalente de seu tempo. O sionismo poltico no pode satisfazer aqueles judeus que se importam com o judasmo; o crescimento deste lhes parece cheio de perigo para o objetivo de sua prpria aspirao. O segredo da persistncia do nosso povo como tentei demonstrar noutra parte que num perodo bem inicial os Profetas lhes ensinaram a respeitar apenas o poder do esprito e a no adorar o poder material. Devido a isso, diferentemente de outras naes da Antiguidade, o povo judeu nunca chegou ao ponto de perder seu amor-prprio diante de inimigos mais poderosos. Enquanto permanecermos fiis a esse princpio, nossa existncia ter uma base segura, e no perderemos nosso amor-prprio, pois no somos espiritualmente inferiores a qualquer nao. Mas um ideal poltico que no est baseado em nossa cultura nacional est propenso a nos seduzir, afastando-nos da lealdade ao nosso esprito interior, e a gerar em ns uma tendncia para encontrar o caminho da glria na consecuo de poder material e domnio poltico, rompendo assim o fio que nos une ao passado e solapando nosso alicerce histrico. Desnecessrio dizer que, se o ideal poltico no foi alcanado, isto ter consequncias desastrosas, porque perderemos a antiga base sem achar uma nova. Mesmo que seja alcanado sob as condies atuais, quando somos um povo disperso no apenas no sentido fsico mas tambm no espiritual ainda assim estar o judasmo em grande perigo. Quase todos os nossos grandes homens isto , aqueles cuja educao e posio social os prepararam para estar frente de um Estado Judeu esto espiritualmente muito afastados do judasmo e no tm uma
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real concepo de sua natureza e de seus valores. Tais homens, por mais leais que sejam ao Estado e dedicados aos seus interesses, iro necessariamente encarar esses interesses pelos padres da cultura estrangeira que eles prprios sorveram; e se empenharo, por persuaso moral ou at pela fora, em implantar aquela cultura no Estado Judeu, de modo que no fim o Estado Judeu ser um Estado de alemes ou franceses de raa judaica. Ns temos mesmo agora um pequeno exemplo desse processo na Palestina. A Histria nos ensina que nos dias da Casa de Herodes a Palestina era de fato um Estado Judeu, mas a cultura nacional era desprezada e perseguida. A famlia governante fez todo o possvel para implantar no pas a cultura romana e desperdiou os recursos da nao na construo de templos pagos, anfiteatros e assim por diante. Um tal Estado Judeu significaria morte total e degradao para o nosso povo. Um tal Estado jamais alcanaria suficiente poder poltico para merecer respeito, pois estaria separado da viva fora espiritual interior do Judasmo. O pequeno Estado, jogado como uma bola entre seus poderosos vizinhos, e s mantendo sua existncia por manobras diplomticas e contnuas humilhaes perante os favorecidos pela sorte, no seria capaz de nos dar um sentimento de glria nacional; a cultura nacional, em que poderamos ter buscado e encontrado nossa glria, no teria sido implantada em nosso Estado e no seria o princpio de sua vida. Deveramos ento realmente ser muito mais do que somos agora uma nao pequena e insignificante, escravizada em esprito aos favorecidos pela sorte, lanando um olhar invejoso e cobioso s foras armadas de nossos poderosos vizinhos; nossa existncia em tais termos como Estado soberano no acrescentaria um captulo glorioso nossa histria nacional. Para um povo antigo que foi outrora um farol para o mundo, no seria melhor desaparecer do que terminar por alcanar uma meta como essa? O Sr. Lilienblum lembra-me de que existem hoje pequenos pases, como a Sua, que esto resguardados contra qualquer interferncia das outras naes e no so forados a contnuas humilhaes. Mas uma comparao entre a Palestina e pases pequenos como a Sua no leva em conta a posio geogrfica da Palestina e a sua importncia religiosa para o mundo todo. Esses dois fatos tornaro praticamente impossvel aos seus poderosos vizinhos (expresso com a qual, claro, eu no quis me referir,
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conforme interpreta o Sr. Lilienblum, aos drusos e aos persas) deix-la em paz. Mesmo depois que se tornar um Estado Judeu, ficaro todos de olho nela, e cada potncia tentar influenciar sua poltica numa direo favorvel a si prpria, conforme o padro de acontecimentos em outros pases fracos (como a Turquia) em que as grandes naes europeias tm interesses. Em resumo: o Hibat Tzion, no menos que o sionismo, quer um Estado Judeu e acredita na possibilidade do estabelecimento de um Estado Judeu no futuro. Mas enquanto o sionismo pretende que o Estado Judeu fornea um remdio para a pobreza e proporcione tranquilidade completa e glria nacional, o Hibat Tzion sabe que nosso Estado no nos dar todas essas coisas at que a Justia universal esteja entronizada e domine todas as naes e Estado espera que um Estado Judeu proporcione apenas um refgio seguro para o judasmo e um vnculo cultural para unir nossa nao. O sionismo, portanto, inicia seu trabalho com propaganda poltica; Hibat Tzion comea com a cultura nacional, porque somente atravs da cultura nacional e em considerao mesma pode um Estado Judeu ser estabelecido de maneira a corresponder vontade e s necessidades do povo judeu.

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Rav Kook (1865-1935)

Pensador mstico, talmudista, chefe ortodoxo e lder sionista. Um dos primeiros sintetizadores do sionismo com a tradio rabnica, onde o restabelecimento de Israel aparece no puramente como um acontecimento secular mas sobretudo como um acontecimento pleno de religiosidade. Nascido em um Schtetl (vilarejo) da Curlndia, foi discpulo da Academia Talmdica de Vilojin. Em 1923, tornou-se gro-rabino da comunidade asquenazi na Palestina. A recuperao da vida nacional como o eterno retorno origem, ou seja, o reencontro do povo com a terra prometida, tal era a predestinao e a misso, na viso de Kook, que cabia a Israel, uma vez que s esta nao poderia irradiar a mensagem libertadora para todo o mundo. Sua obra caracteriza-se basicamente por coletneas de pensamentos, como o caso dos aforismas publicados aps a sua morte sob o ttulo Luzes da Santidade (Orot Ha Kodesh). Referncia AVNERI, Shlomo. The Making of Modem Zionism, New York, Basic Books, 1981, pp. 187/197.

Rav Kook1
A terra de Israel (1910-1930)
Eretz Israel no algo separado da alma do povo judeu; no mera possesso nacional, servindo como meio de unificar nosso povo e escorando sua sobrevivncia material ou mesmo espiritual. Eretz Israel faz parte da prpria essncia de nossa nacionalidade; est organicamente atada sua prpria vida e existncia interior. A razo humana, mesmo no que tem de mais sublime, no pode comear a compreender a santidade nica de Eretz Israel; no pode mexer as profundezas de amor pela terra que esto adormecidas em nosso povo. O que Eretz Israel significa para o judeu s pode ser sentido atravs do Esprito do Senhor que est em nosso povo como um todo, atravs do molde espiritual da alma judaica, que irradia sua influncia caracterstica a toda emoo sadia. Essa luz mais elevada brilha at o ponto em que o esprito de divina santidade encha os coraes dos santos e eruditos de Israel com celestial vida e bem-aventurana. Encarar Eretz Israel como simplesmente um instrumento para estabelecer nossa unidade nacional ou mesmo para sustentar nossa religio da Dispora pela preservao de seu carter e sua f, devoo e observncias uma noo estril; indigna da santidade de Eretz Israel. Um fortalecimento vlido do judasmo na Dispora s pode provir de uma aprofundada ligao com Eretz Israel. A esperana pelo retorno Terra Santa a contnua fonte da natureza distinta do judasmo. A esperana de Redeno a fora que sustenta o judasmo na Dispora; o judasmo de Eretz Israel a prpria Redeno. A criatividade original judaica, seja no domnio das ideias ou na arena da vida e da ao cotidianas, impossvel exceto em Eretz Israel. Por outro lado, o que quer que o povo judeu crie em Eretz Israel assimila o universal em caracterstica e singular forma judaica, para grande benefcio do povo judeu e do mundo. Os prprios pecados que so a causa de nosso exlio tambm poluem a prisca nascente do nosso ser, de modo que a gua impura na, fonte. E uma vez a nascente nica da individualidade de Israel
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Texto extrado de: HERTZBERG; Arthur. The Zionist Idea: A Historical Analysis and Reader, New York, Meridian Books, 1960. Parte IV, pp. 419-314.

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corrompida sua originalidade primeva s pode se expressar naquela rea de mais elevada criatividade universal que pertence ao judeu e somente na Dispora, enquanto a prpria Terra Natal se torna erma e devastada, expiando sua degradao com sua runa. Enquanto a vida e o pensamento de Israel encontram sadas universais e so dispersos pelo mundo inteiro, a prisca nascente do esprito judeu deixa de fluir, as poludas correntes emanando da fonte esto secando, e a fonte se limpa, at que sua pureza original retome. Quando esse processo se completar, o exlio se tornar repugnante para ns e ser descartado. A Luz Universal, com todo o seu poder, voltar a se irradiar da fonte nica de nosso ser; o esplendor do Messias que ir reunir os exilados comear a se evidenciar; e o amargo lamento de Rachei chorando por seus filhos encontrar doce e glorioso consolo. A criatividade do judeu, em toda a sua glria e singularidade, voltar a se reafirmar, impregnada das totalmente abrangentes riquezas do esprito do maior gigante da humanidade, Abrao, convocado pelo TodoPoderoso a ser uma bno para o homem. Um judeu no pode ser to dedicado e fiel aos seus prprios sentimentos, ideias e imaginao na Dispora quanto em Eretz Israel. Revelaes do Sagrado, em qualquer grau, so relativamente puras em Eretz Israel; fora de Eretz Israel esto misturadas com entulho e muita impureza. Todavia, quanto maior foi o anseio de algum por, e sua ligao com, Eretz Israel, tanto mais puros se tornaro seus pensamentos, pois vivem ento no ar de Eretz Israel, que sustenta todos que venham a contemplar a Terra. Na Terra Santa, a imaginao do homem lcida e clara, limpa e pura, capaz de receber a revelao da Verdade Divina e de expressar em vida o sublime significado do ideal da soberania da santidade; l a mente est preparada para compreender a luz da profecia e ser iluminada pela radiao do Esprito Santo. Em terras no judaicas, a imaginao obscurecida, anuviada de escurido e sombreada de impiedade, e no pode servir de recipiente para efuso da Luz Divina ao se elevar para alm da baixeza e da estreiteza do universo. Porque razo e imaginao so entrelaadas e interagem entre si, nem mesmo a razo pode brilhar em sua mais verdadeira glria fora da Terra Santa. Bem no fundo do corao de todo judeu, em seus mais puros e mais sagrados recessos, resplandece o fogo de Israel. No h como confundir
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suas exigncias por um elo orgnico e indivisvel entre a vida e todos os mandamentos de Deus; pelo derramar do esprito do Senhor, o esprito de Israel que impregna inteiramente a alma do judeu, em todos os recipientes que foram criados para esse determinado propsito; e pelo expressar, completa e precisamente, a palavra de Israel nos domnios da ao e da ideia. Nos coraes de nossos santos esse fogo est constantemente ardendo com lnguas de sagrada chama. semelhana do fogo no altar do Templo, ele arde incessantemente, com uma chama constante, no corao coletivo de nosso povo. Existe at mesmo, escondido nos mais fundos recessos de suas almas, entre os apstatas e pecadores de Israel. No mbito do povo judeu como um todo, a fonte viva de seu desejo por liberdade, de seu anseio por uma vida digna do nome para homem e comunidade, e de sua esperana de redeno da busca por uma vida judaica plena, isenta de contradies e ilimitada. esse o significado do imorredouro amor do judeu por Eretz Israel a Terra da Santidade, a Terra de Deus em que todos os mandamentos Divinos so cumpridos em sua forma perfeita. Esse impulso para mostrar ao mundo a natureza de Deus, para erguer a cabea em Seu Nome a fim de proclamar Sua grandeza em sua real dimenso, afeta todas as almas, pois todos desejam tornar-se unos com Ele e compartilhar da bem-aventurana de Sua vida. Esse anseio por uma vida de verdade, uma que seja moldada por todos os mandamentos da Tor e iluminada por todo o seu enaltecedor esplendor, a fonte da coragem que leva o judeu a afirmar, diante do mundo todo, sua lealdade herana do seu povo, preservao de sua identidade e valores e sustentao de sua f e viso. Algum de fora poder se perguntar: Como podem aparentes descrentes serem movidos por essa fora vital, no simplesmente proximidade do Deus universal mas at em direo a uma autntica vida judaica a expressar concretamente os mandamentos divinos em imagem e ideia, em cano e ao? Mas isso no mistrio para algum cujo corao esteja profundamente em harmonia com a alma do povo judeu e que conhea sua maravilhosa natureza. A fonte desse Poder est no Poder de Deus, na eterna glria da vida.

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A guerra (1910-1930)
Foras externas nos obrigam a abandonar a arena poltica do mundo, mas nossa retirada foi tambm motivada por uma concordncia interior, como que querendo dizer que estvamos aguardando o advento de um tempo mais feliz, quando seria possvel conduzir o governo sem crueldade e barbaridade. Esse o dia pelo qual esperamos. Para que venha a ocorrer precisamos, obviamente, despertar todas as nossas potencialidades e utilizar todos os meios que a poca nos torna disponveis: Tudo evolui pela vontade do Criador de todos os mundos. Mas o atraso necessrio, pois nossa alma ficou desgostosa com os terrveis pecados que acompanham o domnio poltico em tempos ruins. Chegou o dia est bem prximo quando o mundo se tornar mais benigno; podemos comear a nos preparar, pois em breve nos ser possvel dirigir um estado prprio baseado em bondade, sabedoria, justia e na clara Luz de Deus. No apropriado a Jac empenhar-se em vida poltica numa poca em que a condio de Estado requer sangrenta crueldade e exige um talento para o mal. No incio de nossa histria concederam-nos apenas os alicerces, o mnimo necessrio para estabelecer uma nao. Depois que nossa raa foi desaleitada, nossa soberania poltica foi destruda, e fomos dispersos entre os povos e semeados nas profundezas do solo, at chegar o tempo de cantar, e a voz da rola for ouvida na terra. O asseguramento da estrutura do mundo, que agora ameaa cair com as sangrentas tempestades da guerra, exige o estabelecimento da nao judaica. A construo do povo e a revelao de seu esprito so um mesmo processo; indispensvel reconstruo do mundo abalado, que est espera da suprema e unificadora fora a ser encontrada na alma da Sagrada Congregao de Israel. A alma de Israel est repleta do esprito de Deus, do esprito do Nome, e nenhum homem que seja sensvel s exigncias de sua alma pode permanecer calado nessa grande hora. Ele tem de clamar aos adormecidos poderes de nosso povo: Despertem e ergam-se para cumprir sua tarefa. A voz de Deus brada poderosamente. Seu chamado se evidencia nos recessos de nossa alma e pelos mutveis processos da vida: Israel precisa destampar a fonte de sua vida, e plantar-se aos ps de seu carter espiritual.
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A civilizao mundial est se esfacelando, o esprito humano est enfraquecido, e a escurido envolve todas as naes. O tempo est maduro. Luz eterna, a verdadeira Luz de Deus, a Luz do Deus de Israel, revelada por seu assombroso povo, deve se elevar ao nvel da conscincia. Esse conhecimento deve penetrar no mago de nosso povo, de modo que ele reconhea a unicidade definitiva de suas prprias potencialidades e se torne consciente do Deus Que nele reside. Uma vez sabendo que Deus est dentro dele, nosso povo tambm saber como haurir de sua prpria fonte bsica. Nossa nao chamada a beber no de nascentes estranhas mas de suas prprias profundezas. Que ela encha seus recipientes com vontade do fundo de suas oraes, com vida da nascente de sua Tor, com coragem das razes de sua f, com ordem da integridade de sua razo, e com herosmo do poder de seu esprito, pois tudo que aparece sob o dossel de seus cus deriva do esprito de Deus que paira sobre o universo, do incio ao fim do tempo. Todas as civilizaes do mundo sero renovadas pelo renascimento de nosso esprito. Todas as discrdias sero resolvidas, e nossa revivificao far toda vida ficar luminosa com a alegria de um novo nascimento. Todas as religies vestiro nova e preciosa roupa, lanando fora tudo que for sujo, abominvel e impuro; elas se uniro no embeber do blsamo das Sagradas Luzes, que foram aprontadas para toda a humanidade, no incio do tempo na fonte de Israel. O ativo poder da bno de Abrao a todos os povos do mundo se tornar evidente, e servir de base nossa renovada criatividade em Eretz Israel. A destruio de nosso dia uma preparao para uma nova e singular renascena de dimenses as mais profundas. A graa da Luz de Deus est brilhando. O nome de Deus, Eu sou aquele que sou, cada vez mais revelador. Testemunhemos pela grandeza de nosso Deus.

O renascimento de Israel (1910-1930)

O mundo e tudo o que ele contm est aguardando a Luz de Israel, a Enaltecida Luz que se irradia Daquele Cujo Nome h de ser louvado. Esse povo foi moldado por Deus para falar de Sua glria; foi-lhe concedida a herana da bno de Abrao para que pudesse disseminar o conhecimento
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de Deus, e foi-lhe ordenado viver sua vida separado das naes do mundo. Deus o escolheu para limpar o mundo inteiro de toda impureza e escurido; esse povo dotado de um tesouro oculto, a Tor, por meio da qual foram criados o Cu e a Terra. A Luz de Israel no um sonho utpico, nem alguma abstrata moralidade ou simplesmente um pio desejo e uma nobre viso. No lava suas mos do mundo material e de todos os seus valores, abandonando a carne e a sociedade e o governo para chafurdarem na impureza, e desertando as foras da natureza, que tombaram na Queda do Homem, para permanecerem em sua baixa condio. , antes, uma elevao de toda a vida. Nenhum povo cresceu ainda o suficiente, em mente e esprito, para ser capaz de apreciar o sagrado do universo, a alegria na grandeza de Deus, a entronizao da Criao desde o incio at o fim, completamente envolvida, como o mundo, pela infinita bondade, poderosa fora e perfeita pureza do Deus nico. Todos os povos, como bem sabemos, esto sob as influncias de suas variadas civilizaes. Conhecemos o valor exato de cada uma; podemos estimar o quanto de luz e trevas esto misturadas em seus respectivos ideais e aspiraes. No decurso de nossa histria subjugamos as mais opressivas e sinistras foras do paganismo, e estamos agora empenhados em superar manifestaes menores da escurido. Uma antiga heresia judaica, em que estava presente influncia pag, anunciou a abolio dos especficos mandamentos da Tor, enquanto arrogante e grandiloquentemente assumia valores ticos e religiosos do judasmo. Tal escurido provm da incapacidade da mente no-judaica de compreender o significado completo do esplendor da nobre ordem Divina, que une Cu e Terra, corpo e alma, crena e realizao, imagem e ao, indivduo e sociedade, este mundo e o mundo por vir, o incio e o fim da Criao, a grandeza da eternidade e a alegria do Cu e da Terra e todas as suas hostes. Mas chegar um tempo quando at a mais baixa das profundezas do mundo ser purificada de sua imundcie, at o que estiver mais torto ser indireitado, e at a mais leve das perverses ser corrigida. Ento a luz brilhar para os justos.
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O mundo dos no-judeus est esfarrapado e rasgado. Em sua viso, o corpo est dividido da alma, e no h nenhum vnculo interno e identidade entre matria e esprito, nenhuma unidade bsica entre ao e ideia. No presente, antes de a Luz de Israel se tornar evidente, a doutrina do comunismo representa a mais elevada ascenso espiritual da cultura nojudaica. Mas quo pobre um mundo em que essa negra malignidade ergueu sua cabea e pretende ser sua aspirao mais elevada. Que tesouro de maldade est escondido nessa mais terrvel mentira, que tem um to perigoso brilho exterior de pureza! Quo deplorveis so as correntes espirituais sadas do mundo judaico de verdadeira santidade que fluem para esse pntano de maldade! Quanto muito mais incandescente ter de se tornar a Luz a fim de redimir os raios que caram na escurido! Mas eles sero redimidos, de uma vez por todas, com a redeno do Povo Sagrado. A Redeno contnua. A Redeno do Egito e a Redeno Final fazem parte do mesmo processo, da poderosa mo e do brao estendido, que comeou no Egito e est evidente em toda a histria. Moiss e Elias pertencem ao mesmo ato de redeno; um representa seu incio e o outro o seu auge de modo que juntos eles cumprem seu propsito. O esprito de Israel est afinado com o zunido do processo redentor, com as ondas sonoras de seus labores que s terminaro com o advento dos dias do Messias. um grave erro ser insensvel distinta unidade do esprito judeu, imaginar que a matria Divina que singularmente caracteriza Israel comparvel ao contedo espiritual de todas as outras civilizaes nacionais. Esse erro deu origem tentativa de separar, no judasmo, o elemento nacional do elemento religioso. Uma tal diviso falsificaria tanto o nosso nacionalismo quanto a nossa religio, pois cada elemento de pensamento, emoo e idealismo que esteja presente no povo judeu pertence a uma entidade indivisvel, e todos juntos constituem seu carter especfico. Mas, por errnea que seja a tentativa de dividir esses componentes indivisveis do esprito judeu, um erro ainda maior imaginar que tal diviso teria possibilidade de ser bem-sucedida; , portanto, intil travar uma amarga e mal-concebida guerra contra os que so leais a somente um aspecto do carter judaico. Se a nica barreira a separar os vrios elementos espirituais presentes na congregao de Israel fosse a de que isso proibido pela lei da Tor, ento teramos, de fato, a obrigao de a isso resistir at o fim. Mas sendo tal diviso uma impossibilidade absoluta, podemos ter a certeza de que seus protagonistas
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s podem errar em teoria, mas no na prtica. No importa o que possam pensar, o elemento particular do esprito judeu que possam adotar, estando enraizado na vida total de nosso povo, tem de inevitavelmente conter todos os aspectos de seu carter. Nossa divergncia com eles deve ser dirigida apenas tarefa especfica de demonstrar seuerro e lhes provar que todo o esforo deles para fragmentar a unidade mais elevada de Israel est antecipadamente condenado ao fracasso. Ns que representamos a integridade da vontade e do esprito judaicos devemos reagir de um modo profundamente natural, simplesmente analisando as posies contrrias para demonstrar que qualquer elemento individual do esprito judaico no pode deixar de incluir todos os valores que os separadores esperam esquecer e destruir. Uma vez estabelecida essa verdade, nossos opositores acabaro tendo de compreender que esto desperdiando esforos. Os valores que eles tentaram banir estavam, no obstante, presentes, ainda que apenas de forma atenuada e distorcida, em suas teorias, e o resultado de seus trabalhos s6 poderia ser fome espiritual, horizontes estreitados, e a perda de qualquer verdadeiro sentido de direo. Somente um caminho estar ento aberto aos nossos adversrios: reconhecer a verdade provada por experincia e apegarse ao inteiro contedo vivo e sagrado da completamente evidente Luz de Israel. Suas almas ento no sero mais torturadas por ideias nebulosas e fantasmagricas das quais no podiam se libertar nem encontrar nelas clara iluminao do esprito. Eles ento compreendero que nacionalismo, ou religio, ou qualquer outro elemento do esprito de Israel, somente pode se realizar no contexto de uma vida judaica que seja plena, ativa e inteiramente fiel a cada matiz de sua essncia.

um erro fundamental dar as costas nica fonte de nossa elevada condio e descartar o conceito de que somos um povo eleito. No somos apenas diferentes, de todas as naes, postos parte por uma experincia histrica que nica e sem paralelo, mas tambm somos de uma bem maior e mais elevada ordem espiritual. Para realmente nos conhecermos, precisamos estar conscientes de nossa grandeza. Do contrrio, cairemos muito baixo. Nossa alma abrange o universo inteiro, e o representa em sua mais elevada unidade. , portanto, inteira e completa, totalmente isenta de todas as incoerncias e contradies que prevalecem entre todos os outros povos. Ns somos um povo, um como a unidade do universo. Esse o enorme potencial espiritual de nosso carter inato, e os vrios processos de nossa estrada histrica, a estrada de luz que passa entre as montanhas de trevas e perdio, nos levam a compreender a essncia oculta de nossa natureza. Todos os sine qua nons mundanos de identidade nacional so transmudados pela abrangncia total do esprito de Israel. impossvel cortar qualquer ramo da grande e folhosa rvore de nossa vida e dar-lhe uma existncia prpria. Cada fibra de nosso ser iria se opor e, em total autopercepo, iramos reagir com toda a fora interior nossa disposio. A longa estrada de nossa histria tem sido determinada pela esperana de completo renascimento de ns mesmos e de tudo o que nosso. Nada pode ser ignorado nem uma s linha na imagem de nosso povo pode ser apagada. Sim, somos mais fortes que todas as culturas dos sculos e mais duradouros que todas as permanncias do mundo. Nosso anseio redespertar para a vida na amplido de nossos antepassados e ser ainda maiores e mais dignos do que eles. Demos grandes contribuies morais ao mundo, e agora estamos prontos a nos tornarmos seu instrutor de vida alegre e vibrante. Nosso esprito no tem medo das pocas que passam; ele faz nascer essas pocas e pe nelas a sua marca. O poder de nossa criatividade tal que ela imprime a mais sublime espiritualidade na matria prtica da vida. medida que a vida evolui para formas mais elevadas, esse poder criativo aumenta, e seu processo de moldar o mundo em expresses tangveis do esprito se torna cada vez mais maravilhoso de ser contemplado. E tudo isso alcanar sua mais alta realizao quando nossa vida judaica estiver renascente em todos os seus aspectos.
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Luzes para renascimento (1910-1930)

Nossa vida nacional, tanto intrinsecamente quanto em seu relacionamento com toda a humanidade, teve uma longa carreira. Existimos h longo tempo, e, consequentemente, temos nos expressado de vrias maneiras. Somos um grande povo, e nossos erros so igualmente grandes; consequentemente, nossos infortnios e as subsequentes consolaes so ambos em vasta escala.

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A sociedade est hoje num estado de movimento e tumulto; mas como esta poca pobre e estultificante, e como vasto o vazio que permanece no corao, aps todas as exaltadas emoes de guerras e rumores de guerra! pois tudo isso destitudo de propsito final e representa apenas a vida passageira de um ou outro grupo de homens. Tampouco h muito mais valor em amplas revolues sociais, especialmente quando acompanhadas por grandes sublevaes que inflamam o corao e confundem a mente. Sem um ideal espiritual definitivo que possa elevar todo o esforo do homem ao nvel das mais altas formas concebveis por razo e sublime emoo, nenhum movimento pode ter qualquer valor, nem perdurar por muito tempo. Voltemos, porm, ao propsito Divino, que realizar o bem geral atravs da perfeio de cada pessoa e grupo. No basta exemplificar esse ideal num momento de alta emoo. Para se aproximar da condio de inteireza espiritual e ter assegurada a sobrevivncia, uma sociedade precisa expressar o ideal claramente em cada aspecto de sua alma. Aquilo que est alm do alcance da linguagem ser dito, com toda a fora, pela futura, totalmente abrangente e eterna ordem divina. verdade que nos dias de nosso declnio as centelhas de luz espiritual esto obscurecidas, e se acham presentes, em sua maior parte, nas lembranas incorporadas ao nosso tradicional modo de vida, e em todos os mandamentos e regras religiosas que provm do passado e olham para o futuro. Mas elas conservam enorme vitalidade, e a poeira que a insensibilidade espiritual permitiu que nelas se acumulasse ser sacudida por um movimento realmente srio de renascimento nacional. As flamejantes centelhas se tornaro visveis; elas se uniro numa grande chama divina, aquecendo o mundo e iluminando seus mais extremos locais. Nosso presente apenas uma traduzi da sombra de nosso grande passado; est sempre voltado para o grandioso futuro, um futuro que to nobre que ilumina o presente e lhe d dimenses de poder ativo no justificadas por sua condio real, que a de aguardar e ansiar pelo futuro. Tudo depende do valor do passado e do futuro: alguns passados e futuros s podem dar luz e calor ao presente mais imediato, e outros so suficientemente grandes para tornar o presente, que vive pelo poder deles, uma poca verdadeiramente viva e criativa. Nosso passado um grande passado, e nosso futuro ainda maior, conforme evidenciado por nossa busca pelos ideais de justia que esto latentes em nossas almas. Essa
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grande fora inspira nosso presente e lhe d vida plena. Da profunda extenso de nossas lembranas extramos muitos exemplos, uma espcie particular de sabedoria e criatividade, uma viso nica do mundo, mitzvot, tradies e costumes tudo impregnado de contedo espiritual, amor e bondade, e alimento pelo orvalho de vida, herosmo e majestade por nossa prpria bondade, nosso prprio herosmo, e nossa prpria majestade. Excludo o alimento que recebe do revigorador orvalho da santidade de Eretz Israel, o judasmo na Dispora no tem verdadeiros alicerces e vive apenas pelo poder de uma viso e pela lembrana de nossa glria, isto , pelo passado e pelo futuro. Mas h um limite ao poder de tal viso de carregar o fardo da vida e dar direo carreira de um povo e esse limite j parece ter sido alcanado. O judasmo da Dispora est portanto se desintegrando num ritmo alarmante, e para ele no h esperana a no ser que se replante junto nascente da verdadeira vida, da inerente santidade, que s pode ser encontrada em Eretz Israel. Mesmo uma centelha dessa verdadeira vida pode reanimar grandes reas da espcie de vida que apenas uma sombra de uma viso. A real e orgnica santidade do judasmo s pode se tornar evidente pelo retorno do povo sua terra, o nico caminho que pode levar ao seu renascimento. Q que quer que seja sublime em nosso esprito e nossa viso s pode viver at o ponto em que haja uma vida tangvel para revigorar o fatigado sonho. medida que o mundo vai se tornando espiritual e o esprito do homem se desenvolve a nveis mais elevados, fica cada vez mais forte no homem a exigncia para viver de acordo com sua verdadeira natureza. Esse apelo contm muita verdade e justia, e cabe liderana moral cuidar para que o purifique e o dirija ao canal certo. O homem cada vez mais descobre Deus dentro de si mesmo, em seus impulsos corretos; mesmo, porm, aqueles impulsos internos que superficialmente parecem se desviar do que convencionalmente considerado o caminho verdadeiro, pode o homem elevlos a um to alto nvel que eles, tambm, contribuem para o definitivo bem. Ao despertar para a vida, a comunidade de Israel ir redescobrir sua coragem e sua dignidade. A pureza e a santidade que costumava demonstrar em submisso mostrada cada vez mais pela coragem da alma em aes de herosmo nacional. Esses dois estados sero como um, e, ao se unirem, o herosmo se tornar tanto maior porque ter sido adoado por santidade.
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H um pacto eterno que garante a toda a Casa de Israel que ela jamais se tornar completamente impura. Pode, sim, ser parcialmente corroda, mas nunca poder ser totalmente isolada da fonte de vida divina. Muitos dos adeptos da presente revivificao nacional afirmam que so secularistas. Se um nacionalismo secular judaico fosse realmente imaginvel, ento estaramos, de fato, correndo perigo de cair to baixo que a redeno se tornaria impossvel. Mas nacionalismo secular judaico uma forma de auto-iluso; o esprito de Israel est to estreitamente ligado ao esprito de Deus que um nacionalista judaico, por mais secularista que possa ser sua inteno, deve, a despeito de si mesmo, afirmar o divino. Um indivduo pode cortar o lao que o ata vida eterna, mas a Casa de Israel como um todo no Pode. Todas as suas mais queridas possesses nacionais sua terra, lngua, histria e costumes so recipientes do esprito do Senhor. Como devem homens de f responder a uma poca de fermentao ideolgica que afirma esses valores todos em nome do nacionalismo e nega sua fonte, o enraizamento do esprito nacional, em Deus? Opor-se ao nacionalismo judaico, mesmo em discurso, e denegrir seus valores no permissvel, pois o esprito de Deus e o esprito de Israel so idnticos. O que eles tm de fazer dedicar-se ainda mais arduamente tarefa de revelar a luz e a santidade implcitas em nosso esprito nacional, o elemento divino que seu ncleo. Os secularistas sero assim obrigados a compreender que esto imersos e enraizados na vida de Deus e banhados pela radiante santidade que vem de cima. No obstante os graves defeitos de que temos conhecimento em nossa vida em geral, e em Eretz Israel em particular, devemos sentir que estamos renascendo e que estamos mais uma vez sendo criados como no incio do tempo. Toda a nossa herana espiritual est presentemente sendo absorvida em sua fonte e est reaparecendo sob um novo aspecto, muito reduzido em extenso material mas qualitativamente muito rico e vioso e cheio de fora vital. Somos chamados a um novo mundo impregnado da mais elevada luz, a uma poca cuja glria ultrapassar a de todas as grandes pocas que a precederam. Nosso povo todo acredita que estamos na primeira etapa da Redeno Final. Essa profunda f o prprio segredo de sua existncia; o divino mistrio implcito em sua experincia histrica. Essa antiga tradio sobre a Redeno d testemunho da luz
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espiritual com a qual o judeu compreende a si mesmo e todos os acontecimentos de sua histria at a ltima gerao, aquela que aguarda a Redeno que est prxima. A reivindicao de nossa carne grande. Precisamos de um corpo sadio. Ns nos ocupamos muito com a alma e temos negligenciado a santidade do corpo. Temos negligenciado a sade e a destreza fsica, esquecendo que nossa carne to sagrada quanto nosso esprito. Temos dado as costas vida fsica, ao desenvolvimento de nossos sentidos, e a tudo que est envolvido na tangvel realidade da carne, porque fomos tomados por temores servis, e faltou-nos f na santidade da Terra. A f exemplificada pelo tratado Zeraim (Plantas) o homem prova sua f na vida eterna plantando. Nosso retorno s ser bem-sucedido se for marcado, junto com sua glria espiritual, por um retorno fsico que criar carne e sangue sadios, corpos fortes e bem-formados, e um fogoso esprito encaixado em poderosos msculos. Ento a alma fraca brilhar da carne forte e sacra, como um smbolo da ressurreio fsica dos mortos.

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Berl Katzenelson (1887-1944)

Nasceu em Bobruisk, Rssia Branca, onde ainda adolescente se viu envolvido no debate doutrinrio e partidrio do movimento socialista. Apesar de ser um socialista ativo e militante no movimento poltico russo, manteve interesse pela lngua hebraica e pela causa nacional judaica, adotando mais tarde as ideias sionistas. Disto resultou a sua ida para Israel em 1909. Logo se destaca como organizador de grupos operrios, cujos problemas tratava pela imprensa partidria. Durante a Primeira Guerra, alista-se em uma das unidades judaicas do exrcito britnico. Foi um dos fundadores da corrente Achdut Avod (Unidade do Trabalho), da Histadrut (Confederao Geral do Trabalho) e, posteriormente do Mapai (principal partido poltico de Israel durante trs dcadas). O pensamento de Katzenelson prope a sntese do socialismo e do sionismo de acordo com as lies e necessidades da realidade histrica, como instrumento doutrinrio capaz de guiar a ao nacional e a reconstruo coletiva. Seus escritos esto distribudos em 12 tomos. Referncia GUINSBURG, J. (Org.). O Judeu e a Modernidade, So Paulo, Perspectiva, 1970, pp.379/381.

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Revoluo e tradio (1934)
Gostamos de nos dar a denominao de rebeldes. Mas permitam-me perguntar: Contra o que estamos nos rebelando? apenas contra as tradies de nossos pais? Se assim for, estamos chovendo no molhado. Muitos predecessores nossos fizeram justamente isso. Nossa rebelio tambm uma revolta contra muitas rebelies que precederam a nossa. Temos nos revelado contra a venerao dos diplomas entre a nossa intelectualidade. Temos nos rebelado contra a falta de razes e o intermediarismo, e no s nas formas sob as quais apareceram nos mais antigos modos de vida judaicos; temos nos rebelado tambm contra suas verses modernas, contra o intermediarismo e a falta de razes de alguns dos intelectuais internacionalistas e nacionalistas judeus, que achamos ainda mais repugnantes que todas as manifestaes anteriores dessas enfermidades. Temos nos rebelado contra a utopia assimilacionista da mais antiga intelectualidade socialista judaica. Temos nos rebelado contra o servilismo e a pobreza cultural do Bund. Ainda nos defrontamos com a tarefa de treinar nossa juventude para se rebelar contra o servilismo dentro da revoluo sob todas as suas formas a comear pelos judeus que eram to escravos da Revoluo Russa que chegavam at a distribuir proclamaes convocando para pogroms em nome da revoluo; e incluindo o Partido Comunista Palestinense de nossos dias, que atua em aliana com os pogromistas de Hebron e Safed. H muitos que pensam em nossa revoluo de um modo por demais simples e primitivo. Destrocemos inteiramente o velho mundo, queimemos todos os tesouros que acumulou durante sculos, e comecemos de novo como bebs recm-nascidos! H nessa abordagem audcia e fora de protesto. De fato, houve muitos revolucionrios que assim retratavam os dias do Messias. Mas duvidoso se essa concepo, que comea em total inocncia a renunciar herana dos sculos e prope construir o mundo de cima a baixo, realmente revolucionria e progressista, ou se nela est
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Texto extrado de: HERTZBERG, Arthur. The Zionist Idea: A Historical Analysis and Reader, New York, Meridian Books, 1960. Parte VI, pp. 390/395.

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implcita uma profundamente sinistra fora reacionria. A Histria nos fala de mais de um velho mundo que foi destrudo, mas o que apareceu sobre suas runas no foram mundos melhores e sim absoluta barbrie. Grcia e Roma pecaram atrozmente e foram destrudas por seus pecados, mas em lugar desse mundo antigo, com sua arte e criatividade, foi estabelecida uma sociedade brbara, que hoje uma fonte de inspirao e nostalgia para Hitler. Centenas de anos se passaram at o esprito do homem ascender um tanto alm dessa barbrie mas outro retrocesso est agora ocorrendo diante de nossos prprios olhos. No irei questionar o realismo dessa concepo ou sua exequibilidade. No indagarei qual seria a linguagem do homem depois de essa operao destruindo a estrutura total do Velho Mundo ter sido completada. (Vem-nos lembrana o heri tragicmico de uma estria de Gorki, que se prope suprimir todas as suas ms qualidades e consequentemente fica sem qualidades de espcie alguma.) Abordarei essa questo apenas do ponto de vista da tendncia educacional envolvida. O homem dotado de duas faculdades memria e esquecimento. No podemos viver sem ambos. Se existisse apenas a memria, seramos esmagados sob seu fardo. Ns nos tornaramos escravos de nossas lembranas, de nossos antepassados. Nossa aparncia seria ento mera cpia de geraes precedentes. E se fssemos governados inteiramente pelo esquecimento, que lugar haveria para cultura, cincia, conscincia de si mesmo, vida espiritual? O arquiconservadorismo tenta nos privar de nossa faculdade de esquecer, e o pseudo-revolucionarismo encara cada lembrana do passado como o inimigo. Mas se a humanidade no tivesse conservado a lembrana de seus grandes feitos, nobres aspiraes, perodos de florescimento, tentativas hericas e esforos de libertao, nenhum movimento revolucionrio teria sido possvel. A raa humana teria estagnado em eterna pobreza, ignorncia e escravido. O revolucionarismo primitivo, que acredita que destruio implacvel a cura perfeita para todos os males sociais, lembra-nos, em muitas de suas manifestaes, a criana em crescimento que demonstra seu domnio das coisas e curiosidade sobre a estrutura das mesmas quebrando seus brinquedos. Em oposio a esse revolucionarismo primitivo, deve o nosso movimento, por sua prpria natureza, sustentar o princpio do construtivismo revolucionrio. Essa viso no se conforma, de maneira
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alguma, com os defeitos da ordem existente; ela v a necessidade de uma revoluo completa, mas, ao mesmo tempo, sabe que a potencialidade criativa da destruio severamente limitada, e dirige seus esforos para a ao construtiva, a nica capaz de assegurar o valor de uma revoluo. Exatamente porque reconhecemos plenamente o estado catastrfico do mundo em que vivemos, porque vemos a necessidade da mais fundamental reviravolta, porque sabemos que junto porta de cada novo sistema social os pecados do antigo esto espreita para entrar que insistimos que empenhos revolucionrios (que prometem uma nova estrutura) so destitudos de valor a no ser que sejam acompanhados de renovadas e aperfeioadas energias construtivas. Nosso critrio de sucesso revolucionrio no a quantidade de sangue derramado (como afirma o profeta revisionista do sionismo revolucionrio) e sim suas realizaes construtivas. Nosso construtivismo revolucionrio no pode se restringir apenas ao campo econmico; precisa abranger nossa vida inteira e deixar sua marca em nossa cultura e em nosso ambiente. Os principais profetas da revoluo foram homens de memria histrica que estavam enraizados em, e valorizavam, sua herana cultural. Marx adorava Shakespeare, admirava grandemente Darwin, e respeitava nosso historiador Graetz. Nenhuma verdadeira revoluo concebvel sem intensa vida espiritual. Revolucionrios profissionais, que medem tudo com a rgua de sua profisso, empobrecem, o esprito do movimento. Essa a degenerao burocrtica que ameaa a revoluo da mesma forma que ameaa a religio. Esses profissionais que entram se esgueirando e exploram o movimento revolucionrio relacionam-se com os homens de princpios, com os profetas que anunciaram a revoluo e a puseram em movimento de modo idntico maneira como os funcionrios religiosos que servem aos desejos dos ricos se relacionam com Rabi Akiba e com o Rambam. Uma gerao renovadora e criativa no joga na lata de lixo a herana cultural de sculos. Ela examina e investiga, aceita e rejeita. s vezes pode conservar e adicionar a uma tradio aceita. s vezes desce em grutas em runas para escavar e remover a poeira daquilo que havia sido esquecido, a fim de ressuscitar velhas tradies que tm o poder de estimular o esprito
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da gerao renovadora. Se um povo possui algo antigo e profundo, capaz de educar o homem e trein-lo para suas tarefas futuras, ser que verdadeiramente revolucionrio desprezar e se manter afastado disso? Se a revolta de Esprtaco houvesse sido preservada na memria do povo europeu, e a Igreja tivesse comemorado o Dia de Esprtaco, qual teria sido a atitude de um movimento trabalhista digno desse nome? Deveria ter desdenhado e menosprezado aquela data ou deveria t-la redimido das mos da Igreja e estimulado e consagrado a lembrana daquela trgica revolta? Comemoram-se presentemente muitos dias que so artificiais, que tm uma importncia passageira, ou at absolutamente nenhuma. Talvez um em mil ser lembrado por muito tempo, mas o resto ir murchar aps a primeira tempestade. Mas aqueles dias que se enraizaram no solo da nao e aos quais gerao aps gerao deram de seu esprito tero um destino diferente. O ano judaico est crivado de dias que, em profundidade de significao, no tem paralelo entre outros povos. Ser que vantajoso ser que uma meta para o movimento trabalhista judeu desperdiar o valor potencial neles armazenado? Os assimilacionistas afastaram-se de nossos feriados judaicos como obstculos no caminho de sua submerso entre a maioria porque tinham vergonha de qualquer coisa que os identificasse como um grupo distinto mas por que devemos continuar mantendo a tradio deles? O assimilacionismo e o iluminismo burgueses, e at o socialismo judeu que seguiu na esteira deles, no se desfizeram de muitos elementos valiosos de melhora social contidos em nossa tradio? Se somos realmente socialistas-sionistas; no condiz conosco nos comportarmos como animais tolos seguindo qualquer tradio boba, s porque se diz moderna e no consagrada por idade. Precisamos determinar o valor do presente e do passado com nossos prprios olhos e examin-los do ponto de vista de nossas necessidades vitais, do ponto de vista do progresso rumo ao nosso prprio futuro. Vejamos alguns exemplos: Pessach. Uma nao vem, h milhares de anos, comemorando o dia de seu xodo da casa de servido. Atravs de toda a dor da escravido e do despotismo, da inquisio, da converso forada e do massacre, o povo judeu tem levado em seu corao o anseio por liberdade e tem dado a esse desejo uma expresso popular que inclui cada alma de Israel, cada alma oprimida e empobrecida! De pais para filhos, atravs de todas as geraes, a lembrana do xodo do Egito tem sido
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transmitida como uma experincia pessoal e por isso conservou seu brilho original. Em cada gerao todo homem tem de se encarar como se ele pessoalmente houvesse sido redimido do Egito. No h cume mais elevado de conscincia histrica, e a Histria dentre todas as civilizaes do mundo e em todas as pocas no pode achar nenhum exemplo de maior fuso do indivduo com o grupo do que o contido nesse antigo mandamento pedaggico. No conheo nenhuma criao literria que possa evocar maior dio escravido e amor liberdade que a histria da servido e do xodo do Egito. No conheo nenhuma outra recordao do passado que seja to inteiramente um smbolo de nosso presente e futuro quanto a lembrana do xodo do Egito. E Tisha bAv. Muitas naes so escravizadas, e muitas at sofreram o exlio. A orgulhosa Polnia, cujos refugiados viveram no exlio por apenas duas ou trs geraes, padeceu imediatamente uma considervel assimilao. Massas de refugiados do poderoso povo russo foram dispersas no exterior aps a Revoluo de Outubro, e j esto lamentando a assimilao e a alienao cultural da gerao mais jovem e apontam como exemplo a nao judaica que ainda no foi derrotada, aps dois mil anos de disperso. Sim, de fato, Israel soube como preservar do esquecimento o seu dia de luto, a data de sua perda de liberdade. Nesse dia, cada gerao e cada pessoa em Israel sentiam-se como se seu prprio mundo tivesse acabado de ser destrudo. Em cada aniversrio ardentes lgrimas eram derramadas e cada gerao expressava sua dor. A memria nacional associou com esse dia de ira muitas de suas amargas experincias, a comear com a destruio do Primeiro e Segundo Templos e passando pela expulso da Espanha at o nosso prprio tempo, at a ecloso da Guerra Mundial. Nossa memria nacional foi capaz, com esses meios bem simples, de fazer todas as almas judaicas no mundo inteiro sentirem intenso luto no mesmo dia e mesma hora. Cada rgo que ainda estivesse, de algum modo, ligado ao corpo da nao envolvia-se em tristeza, mergulhava na dor, e deixava seu corao ficar impregnado por um sentimento de runa, servido e exlio. Cada gerao criativa acrescentava algo de prprio a esse sentimento de desgraa, dos pesarosos cnticos de Jeremias, aos da Espanha e Alemanha, e ao Pergaminho de Fogo de Bialik. Conta-se de Adam Mickiewicz, o grande poeta polons que durante sua vida toda lastimava a submisso da Polnia e traava planos
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revolucionrios para sua libertao que em Tisha bAv ele ia a uma sinagoga judaica para se juntar aos judeus em seu luto pela perda da sua terra natal. Esse no judeu compreendia o poder e a profundidade de Tisha bAv. No estou estabelecendo regras especficas quanto forma que nossos feriados deveriam assumir. Formas adequadas iro surgir de um sentimento vivo no corao e de um esprito reto e independente. Eu quero, entretanto, refutar a opinio que afirma: No devemos, certamente, esquecer Tisha bAv, mas uma nao que est retomando para reconstruir seu lar agora tem de transformar o dia de luto num feriado festivo. Nossas realizaes neste pas podem rapidamente se multiplicar, e mesmo depois de termos atingido uma vida de dignidade, no diremos estamos redimidos at que todo nosso exlio tenha terminado. Enquanto Israel estiver disperso e vtima de perseguio e dio, de desprezo e converso forada, como no Imen na sia, na Arglia na frica, e na Alemanha na Europa ou menos que goze de emancipao comprada atravs de assimilao na Frana capitalista e na Rssia comunista eu nunca esquecerei, nunca serei capaz de esquecer o dia mais terrvel de nosso destino o dia de nossa destruio. Como se comportar nosso povo depois que seus dispersos se tiverem reunido, depois de sua completa libertao da servido inclusive sua libertao da opresso de classe por classe? Talvez comemore ento esse dia com danas e canes, ou talvez deseje que cada criana nascida em liberdade e igualdade, desconhecendo a fome e a opresso material, conhea os sofrimentos de todas as geraes precedentes. Discutiremos isso quando esse dia chegar.

Martin Buber (1878-1965)

Filsofo e telogo, nasceu em Viena e passou a infncia em Lemberg com seu av, Salomon Buber, grande estudioso do Talmud. Desde 1896, estudou nas Universidades de Berlim, Leipzig e Zurique, tendo sido discpulo dos filsofos Wilhelm Dilthey e Georg Simmel. Participou do movimento sionista em 1898, tornando-se delegado do Terceiro Congresso Sionista. Em 1901, Buber foi escolhido editor do semanrio do rgo central do Movimento Sionista, o Die Welt, no qual enfatizava a necessidade de uma atividade cultural. A nfase no cultural mais do que nas atividades polticas suscitou no Quinto Congresso Sionista a formao de uma faco sionista democrtica que se opunha a Theodor Herzl. Buber, como membro dessa faco, fundou com amigos o Juedischer Verlag, em Berlim, no qual publicava livros de natureza literria. Aos 26 anos iniciou seus estudos do hassidismo. Num primeiro momento, seu interesse foi puramente esttico. Depois, tentando traduzir os contos do Rabbi Nachman de Brastlav na Alemanha, decide recont-los em alemo na forma de uma livre adaptao. Disso originaram-se Die Geschkhten des Rabbi Nachman e Die Legende des Baal-Schem. Seu interesse, ento, desloca-se do aspecto esttico para o contedo do hassidismo. Profundamente tocado pela mensagem religiosa do hassidismo, considerava seu dever difundir a mensagem hassdica para o mundo. Entre os livros que Buber escreveu sobre hassidismo encontram-se: For the Sake of Heaven (1941), Hassidismo e o Homem Moderno (1945) e The Origin and Meaning of Hassidism (1960). Com o advento da Primeira Guerra Mundial, Buber fundou em Berlim o Comit Nacional Judaico, que trabalhou durante toda a guerra em defesa dos judeus dos pases da Europa do Leste sob ocupao alem e em defesa dos judeus da comunidade judaica da Palestina. Em 1916, fundou o Der Jude, que por oito anos foi o mais importante rgo do movimento do renascimento judaico na Europa Central. A partir da, Buber define a sua posio sionista socialista e sua adeso ao socialismo utpico, onde assume sua afinidade com Gustav Landauer. Nos anos que se seguiram Primeira Guerra Mundial, Buber tornou-se porta-voz do que chamou Humanismo Hebreu, para o qual o sionismo era um caminho sagrado mais do que apenas um movimento nacionalista.

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Em 1923, publicou Ich und Du (Eu e Tu), que contm a formulao bsica de sua filosofia do dilogo. Traduziu junto com Franz Rosenzweig a Bblia para o alemo, tentando preservar o carter original da Bblia hebraica. E 1930, foi apontado professor de religio na Universidade de Frankfurt; em 1933, teve que deixar a Universidade com a chegada dos nazistas ao poder. Em 1932, Buber publicou sua Koeningtum Gottes, que trata das origens da crena messinica no judasmo (este trabalho nunca foi terminado). Em 1933, foi convidado para chefiar o Juedisches Lehrhaus em Frankfurt. Em 1938, vai para a Palestina e nomeado professor de Filosofia Social na Universidade Hebraica at 1951. Em 1942, publicou seu primeiro livro em lngua hebraica, Torah Ha-Neviim (The Profetic Faith, 1949). No livro Moses, Buber demonstra a sua tentativa de buscar o significado essencial da Bblia. Tornou-se conhecido no mundo como um dos grandes lderes espirituais de sua gerao, provocando um profundo impacto nos pensadores judeus e cristos. Referncia Enciclopaedia Judaica, New York, The Macmillan Company, 1972, vol. IV, p. 1429.

Martin Buber1
A misso de Israel e Sion
Parece-me justificada a discordncia de Ben-Gurion com a opinio expressa por Ezekiel Kaufmann de que o monotesmo o aspecto diferenciador que separa Israel de todas as demais naes. No se justifica, porm, que sustente a tese de que a combinao de religio com tica distingue Israel de todas as outras naes. O monotesmo, essa viso religiosa que afirma que existe somente um Deus, desenvolveu-se entre vrios povos, se bem que em diversos graus de intensidade e nfase, e no h necessidade de presumir que um povo tomou emprestada a ideia de outro. Mas a combinao de religio e tica tambm encontrada, por exemplo, nos primitivos ensinamentos da ndia e da Prsia. O que peculiar a Israel a exigncia de que o povo submeta toda a sua vida, inclusive sua atividade poltica e social, vontade de Deus, como o verdadeiro Rei. Temos aqui no uma combinao de religio e tica e sim uma unidade completa, que impregna tudo. O que distingue o monotesmo do judasmo de todos os outros monotesmos a totalmente abrangente subservincia ao Soberano divino, estendendo-se, sem exceo, a todas as reas da vida nacional. vontade desse Deus que o mundo humano reconhea sua soberania livre e efetivamente. E de Israel Ele exige que comece a dar expresso exemplar ao Seu reino submetendo toda a sua vida social ao Seu domnio, o que significa a realizao de justia e verdade em seus relacionamentos nacionais tanto internos quanto externos, e na conduta privada do indivduo em Israel, especialmente em seu comportamento como um membro da sociedade um cidado do Estado. Essa aspirao e a ordem social que ela visa no podem ser qualificadas de teocracia no sentido habitual do termo, que, conforme bem sabido, tem sua origem em Josefo e se refere hegemonia da classe sacerdotal. A teocracia bblica apareceu sob duas formas: a primeira foi o governo primitivo, conforme descrito no Livro dos juzes, segundo o qual naqueles dias de antigamente, em tempos de crise, homens possudos pelo
Texto extrado de: BUBER, Martin. In Israel & The World: Essays in a Time of Crisis, New York, Schoken Books, 1976, pp. 258/263.
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esprito proferiam julgamentos em nome de Deus, o soberano nico; a segunda, forma histrica, cuja essncia achou expresso no fato de os profetas ungirem os reis para serem representantes de Deus, e na repetida exigncia dos profetas de que os reis cumprissem a obrigao a eles imposta ao tempo da uno, a obrigao de incorporar os divinos ideais de justia e verdade na vida social e poltica do povo. Esses profetas so homens destitudos de qualquer poder poltico e somente capazes de protestar: assim eles se pem diante dos governantes e protestam em nome do Deus deles, e em Seu nome eles confrontam os governantes com a decisiva escolha. verdade que outros povos do antigo Oriente tambm acreditavam ser o rei responsvel por seus atos perante seu pai, o Deus que o adotara e lhe dera domnio. Essa relao de responsabilidade, porm, s era expressa de forma simblica. Sabemos, por exemplo, que na Babilnia o sumo sacerdote abordava o rei no dia de Ano-Novo e o esbofeteava, e imediatamente aps esse ritual tudo voltava situao anterior e o rei continuava a agir como antes. Na religio bblica, contudo, no se achar nenhum rito simblico realizado em relao aos reis alm do solitrio rito da uno. Assim, por suas iniquidades, pelas iniquidades do rei, chamado de o filho de Deus (II Samuel 7, 14), Deus ordena-lhe ser castigado com varas de homens, e isso realmente feito; e os profetas vm como mensageiros do Cu e o censuram por trair sua misso e profetizam que calamidades iro recair sobre ele e seu povo se ele no se emendar e no cumprir as obrigaes assumidas ao ser ungido. Essa misso era executada ao risco de suas vidas. Esse o transcendental realismo que distingue a f de Israel: no h espao aqui para smbolos vazios. O que exatamente os profetas censuravam quando encaravam os governantes? Reprovavam os meios que eles usavam para chegar ao seu objetivo final, em relao ao que os profetas no divergiam a glria de Israel. Esses meios contradiziam os fins, e um dos no-expressos princpios da profecia que os fins no justificam os meios. E se a natureza dos meios est em contradio com a natureza do fim, eles o profanam, o envenenam e o tornam uma coisa de horror. Ben-Gurion est certo ao afirmar que a juventude em Israel est muito interessada em certas partes da Bblia, especialmente nas histrias sobre a conquista do territrio, nas histrias sobre os reis-heris, e tambm
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em algumas palavras dos profetas. Mas de modo algum devem os profetas ser considerados separadamente de sua misso histrica que os enviou queles homens que haviam tomado as rdeas do poder, a fim de convoclos a serem julgados por seu Deus que provisoriamente os fizera reis. Ben-Gurion v corretamente na viso messinica a segunda pedra fundamental do judasmo vivo. Mas tambm isso necessita maior solidez. No basta colocar a redeno de Israel lado a lado com a redeno da raa humana. A mensagem messinica nica na exigncia que Deus faz s naes de homens para que realizem Seu reino e desse modo tomem parte da redeno do inundo. A mensagem aplica-se especialmente a Israel e exige deste que faa um incio exemplar no verdadeiro trabalho de realizao, que seja uma nao a estabelecer justia e verdade em suas atividades e instituies. Consequentemente, Isaas no somente apela aos no-judeus que acorram ao Monte Sion e l recebam a segunda Tor, a universal; ele complementa isso com sua convocao Casa de Jac para caminhar diante deles na luz do Senhor. Assim como o monotesmo de Israel diferia dos outros em que, segundo ele, o povo devia viver sua vida toda como um grande servio a Deus, assim tambm as notcias de redeno diferiam em Israel de todas as outras por convocarem o povo a comear a desempenhar a sua parte para pr essa ideia em prtica. No temos aqui somente pensamentos e vises e sim exigncias reais de cujo cumprimento depende o destino do povo. Tais exigncias no so dirigidas somente s geraes a que foram primeiramente apresentadas mas a todas as geraes, e especialmente nossa, a primeira gerao aps dois mil anos que tem o pr-requisito para cumprir sua tarefa, isto , a independncia de um forte ncleo. Isso d nossa gerao, finalmente, o poder de determinar por si mesma, em grande parte, suas instituies, seus modos de vida e suas relaes com outras naes. Por trs de tudo que Ben-Gurion tem dito sobre esse assunto, est, me parece, a vontade de tornar supremo o fator poltico. ele um dos proponentes daquela espcie de secularizao que cultiva seus pensamentos e vises to diligentemente que impede os homens de ouvirem a voz do Deus vivo. Essa secularizao assume a forma de uma exagerada politizao. Essa politizao da vida atinge aqui o prprio esprito. O esprito com todos os seus pensamentos e vises declina e se
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torna uma funo da poltica. Esse fenmeno, que presentemente supremo no mundo inteiro, tem razes muito antigas. Diz-se que at mesmo alguns reis de Israel chegaram ao ponto de empregar falsos profetas cujo profetizar era meramente uma funo da poltica estatal. Estreitamente ligado a tudo que venho dizendo o problema do sionismo em nossos dias. Ben-Gurion afirma que ele no possui mais um contedo real ou positivo e que aos olhos da gerao israelense, em cujo nome ele fala, tornou-se um anacronismo ideolgico. O sionismo, argumenta ele, significa um anseio por Sion; e como esse anseio j alcanou sua meta, no h mais razo alguma para o mesmo. Mas aqueles que inscreveram o nome Sion em sua bandeira; denominando-se inicialmente Amantes de Sion e depois sionistas, no tinham em mente algo que existiu e que s precisava ser recuperado. Ainda me lembro o que esse crculo de jovens sionistas ao qual pertenci h uns sessenta anos queria dizer com essa denominao. Se nos tivessem perguntado: Esto se esforando por um pas de judeus em Israel?, teramos respondido: Estamos nos esforando por Sion e a fim de estabelecer Sion desejamos independncia para nosso povo em nosso pas. Mesmo hoje h muitos sionistas que compartilham desse sentimento, e no s entre os mais velhos; eu mesmo conheo vrios que vieram a este pas e que continuam a sonhar esse sonho que ainda no foi realizado, o sonho de Sion. Eles esperam, de todo o corao, que este pas, conforme , seja o primeiro passo na direo de Sion. Esse quasesionismo que se esfora apenas por um pas alcanou seu propsito. Mas o verdadeiro sionismo, o amor a Sion, o desejo de estabelecer algo como a cidade de um grande rei (Salmos 48, 3), de o rei (Isaas 6, 5), uma coisa viva e duradoura. Venham, despertemos esse sionismo nos coraes que nunca o sentiram, tanto na Dispora quanto aqui. Pois aqui neste pas tambm precisamos de um movimento que se esforce por Sion, aspirando ao aparecimento de Sion reconstrudo a partir dos materiais nossa disposio. Precisamos de sionistas de Sion, aqui e no exterior. O que Ben-Gurion disse sobre a atual gerao israelense indubitavelmente verdade quanto sua maioria. Uma impressionante e ao mesmo tempo compreensvel mudana tomou conta de ns, bem como do mundo inteiro, em nossos dias: aps uma gerao que, embora tivesse realizado grandes feitos, foi incapaz de fazer frente catstrofe, veio outra gerao que se apega execuo prtica de grandes ideias a execuo que
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ocorreu em nosso tempo em grande ou pequena escala (e certamente o que foi feito por ns no foi de modo algum pequeno). Os membros dessa gerao, seja aberta ou secretamente em seus coraes, desconfiam de ideias como ideias e s depositam confiana na realidade tangvel. Ser desejvel advogar tal nfase no material, que ameaa engolir as ideias que ainda esto vivas, ou nosso dever reprimir essa tendncia? E agora Ben-Gurion nos diz que o pensamento sionista est morto mas que a ideia messinica est viva e viver at o advento do Messias. E eu lhe respondo com a pergunta: Em quantos coraes desta gerao em nosso pas a ideia messinica vive numa forma que no seja a estreita forma nacionalista que se limita Reunio dos Exilados? Uma ideia messinica sem o anseio pela redeno da humanidade e sem o desejo de tomar parte em sua realizao no mais idntica s vises messinicas dos profetas de Israel, e tampouco pode aquela misso proftica ser identificada com um ideal messinico esvaziado da crena no advento do reino de Deus.

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Mordecai Menahem Kaplan (1881-1983)

Nasceu na Litunia e emigrou ainda criana para os EUA. Recebeu sua educao secular na Universidade de Columbia e sua formao rabnica no Jewish Theological Seminary of America, do Movimento Conservador. Torna-se importante professor no Instituto do Seminrio Rabnico e um dos lderes espirituais e comunitrios dos judeus americanos. Aos poucos rompe com a orientao mais conservadora da comunidade religiosa, tornando-se cada vez mais liberal-progressista, e acaba por fundar a Society for the Advancement of Judaism em 1922. Sua trajetria, quer como escritor quer como leitor, se pautou a servio da renovao do judasmo no contexto da sociedade americana. Fundador do Movimento Reconstrucionista, do qual fala em seu livro Judaism as a Civilization (1934). Seu programa reconstrucionista se caracteriza pela crtica ortodoxia e ao conservadorismo dos crculos judaicos e prope a sobrevivncia criativa do judasmo na realidade intelectual, poltica e social do sculo XX. Sua obra baseia-se na psicologia social, no pragmatismo filosfico, no naturalismo religioso e no sionismo cultural.

Mordecai Menahem Kaplan1

O futuro do judeu-americano
No obstante a tendncia em certos setores de considerar ideias como simples subprodutos da ao recproca entre cegas foras sociais e econmicas, e de encarar a razo como mera racionalizao de instintivos desejos e paixes, ns judeus devemos insistir num pensamento claro e direto como algo indispensvel. Precisamos nos esforar para superar a inrcia que nos mantm acorrentados a um mundo de pensamentos inteiramente estranho ao esprito moderno. H tanta diferena entre nosso universo de discurso e aquele em que nossos pais viviam antes da Emancipao como entre a moderna imagem mental do universo fsico e a que prevalecia at Coprnico provar que a Terra se move em torno do sol. Assim como, em tempos antigos, os homens pensavam que a Terra era o centro do universo, e que seus prprios lares, sendo por todos os lados equidistantes do horizonte, eram o centro da Terra, assim tambm nossos pais, em tempos pr-modernos, encaravam o drama da vida humana como esgotando todo o significado da criao e o povo judeu como o heri desse drama, com todas as outras naes sendo apenas o elenco secundrio. A ideia de Israel como Povo Eleito deve, portanto, ser entendida como pertencendo a um mundo de pensamentos que no mais habitamos. Ajusta-se a um conjunto de ideias que, em seu tempo, eram bastante coerentes e racionais. Mas no pode mais nos ajudar a compreender relaes ou nos orientar para condies conforme existem hoje. A prpria noo de que um povo possa, para sempre, ser o eleito de Deus implica uma concepo pica ou dramtica da Histria, uma Histria predeterminada na forma e no objetivo. Atualmente, qualquer povo qualificar-se de eleito ser culpado de auto-adorao. paradoxal, para o povo judeu, ser coletivamente culpado de auto-adorao quando individualmente tantos
1 Textos extrados de: PLAUT, Gunter (Org.). The Growth of Reform Judaism, New York, World Union for Progressive Judaism, 1965, pp. 176/179; MENDES-FLOHR, P. & REINHARZ, J. (Eds.). The Jew in the Modern World, Oxford, Oxford University Press, 1980, Cap.IX, pp. 396/399; e WAXMAN, Mordecai. Tradition and Change: The Development of Conservative Judaism, New York, The Burning Bush Press, 1958, pp.473/477.

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judeus so culpados de dio a si prprios. A atitude ctica do judeu mdio em relao doutrina do Povo Eleito pode ser percebida na maneira popular idiche de apresentar a clssica frase Escolheste-nos dentre todos os povos. Essa maneira idiche Vos hostu gevolt hoben fun die Yiden? O que quiseste dos judeus? A Emancipao solapou o status dos judeus como nao. Iluminismo ou racionalismo solaparam o status dos judeus como uma kenesset ou uma ecclesia. A base tradicional para a crena de que Israel era o Povo Eleito de Deus era a suposio de que os miraculosos eventos registrados na Tor em relao aos Patriarcas e seus descendentes no Egito representavam verdade factual. Desses eventos miraculosos o mais significativo era, de longe, a auto-revelao de Deus a Israel no Monte Sinai. Era to inconcebvel questionar a veracidade daqueles eventos quanto questionar a realidade do prprio corpo. Sob tais circunstncias, no havia possibilidade de os judeus no se considerarem o mais privilegiado de todos os povos. Tais circunstncias, contudo, no prevalecem mais entre a maioria dos homens e mulheres de mentalidade moderna. O judeu de mentalidade moderna s pode considerar os miraculosos eventos registrados na Tor e no resto da Bblia como lendrios. Ele, consequentemente, no pode aceit-los como prova da tradicional doutrina judaica de que Israel o Povo Eleito de Deus. O lugar anteriormente ocupado na conscincia judaica pela doutrina da eleio ter de ser preenchido pela doutrina da vocao. Todo o curso da histria judaica tem sido to dominado por motivao religiosa que os judeus no podem ser leais a si mesmos, como povo, sem salientar o carter religioso do judasmo. A religio judaica faria a civilizao judaica contribuir para uma elevao no s da vida judaica mas tambm da vida da humanidade, ajudando assim a tornar evidente o propsito csmico da vida humana. A religio judaica espera que o judeu viva a civilizao de seu povo num esprito de compromisso e dedicao. Viver assim viver com um senso de vocao ou chamado, sem nos envolvermos em qualquer das hostis distines implcitas na doutrina da eleio, e no entanto preenchendo as legtimas necessidades espirituais que a doutrina procurava satisfazer. Presume-se geralmente que a ideia de vocao uma ideia crist, especialmente uma ideia protestante. Na realidade, essa ideia no menos judaica do que crist. Assim lemos no Talmud: Um dito familiar na boca
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dos Sbios de Iavn era este: Eu (que estudo a Tor) sou uma criatura (de Deus); meu trabalho na cidade, o dele no campo; eu levanto cedo para o meu trabalho, ele levanta cedo para o trabalho dele. Assim como ele no pode se sobressair em meu trabalho, eu no posso me sobressair no dele. Talvez direis: eu fao muito e ele faz pouco (pela Tor): mas ns temos aprendido que aquele que oferece muito e aquele que oferece pouco so iguais, desde que ambos dirijam seu corao ao Cu. O judasmo deve ampliar o significado da vocao para incluir tanto naes quanto indivduos. Nenhuma nao escolhida, ou eleita, ou superior a qualquer outra, mas todas elas devem descobrir sua vocao ou chamado, como fonte de experincia religiosa, e como um meio de salvao para os que compartilham de sua vida. Tem sido sugerido que para um indivduo sentir a presena de Deus em sua vida como um chamado divino, ele precisa atender s seguintes condies: tem de estar empenhado em realizar um trabalho necessrio, trabalho que pe em prtica o melhor de seus poderes e estimula o desenvolvimento dos mesmos, e finalmente, que lhe possibilite contribuir com sua parcela para o bem-estar da humanidade. Se os judeus desejam sentir um senso de vocao, tudo o que precisam fazer e se dedicar quelas tarefas que com mais probabilidade atenderiam, para o povo judeu, s trs exigncias precedentes. Se ns judeus aceitssemos isso, ou algum programa semelhante, como nossa vocao, no teramos necessidade de ter nosso moral sustentado por anacronismos espirituais tais como louvar Deus por no nos ter feito como as outras naes. Em vez disso, acharamos nosso chamado como povo to absorvente, to satisfatrio e to emocionante que teramos todas as razes do mundo para agradecer a Deus por ter manifestado Seu amor a ns, como o faz a todos os homens e naes que encontraram sua verdadeira vocao, e por nos ter tornado dignos de sermos identificados com Seu grande e santo nome.

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A reconstruo do judasmo2
Em primeiro lugar, estamos intensamente desejosos de ter o judasmo desempenhando um papel importante na vida espiritual da humanidade, e, consequentemente, nos recusamos a encarar calmamente a angustiosa situao em que o judasmo se encontra hoje. No somos enganados pelos poucos sinais espordicos de atividade e de interesse por coisas judaicas, pois sabemos muito bem que representam nada mais que o impulso da vida judaica no passado. Se uma nova sinagoga fundada, seus organizadores no so homens nascidos e criados num ambiente americano, e sim os que imigraram para este pas vindos da Europa Oriental. Se, como resultado de ingentes esforos, surgem umas poucas organizaes estudantis em algumas de nossas universidades, em nove de dez casos a iniciativa tomada por nascidos no estrangeiro, ou por aqueles que foram criados nos guetos judaicos de nossas maiores cidades. O judasmo nos Estados Unidos no deu o menor sinal de ser capaz de se perpetuar. Pouqussimos se h algum lares judaicos americanos produziram rabinos, ou professores de religio, ou lderes comunitrios. Nossa pobreza espiritual to grande que no temos, neste pas, um nico estabelecimento tipogrfico para a publicao de livros que so essenciais preservao do judasmo. No temos uma s edio original do tradicional livro de oraes, isso para no falar da Bblia ou da literatura ps-bblica. Esses e muitos outros fatos semelhantes provam que o judasmo, sob condies democrticas tais como as que prevalecem neste pas, no foi at agora capaz de desenvolver aquela vitalidade que poderia dot-lo de poder criativo e torn-lo capaz de esforo sustentado e adaptabilidade (...). Em segundo lugar, concordamos que a salvao do judasmo no pode vir nem da Ortodoxia nem da Reforma. A Ortodoxia est totalmente em desacordo com a marcha do pensamento humano. No tem qualquer considerao pela viso de mundo da mente contempornea. Nada pode ser mais repugnante ao homem pensante de hoje do que a doutrina fundamental da Ortodoxia, que a de que a tradio infalvel. Tal infalibilidade poderia ser acreditada enquanto a mente humana pensasse em Deus e na Revelao em termos semimitolgicos (...).
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Nossa divergncia com o judasmo reformista ainda mais acentuada do que a discordncia quanto Ortodoxia. Se nos conformamos em suportar muita coisa da Ortodoxia que no aprovamos, para que no nos classifiquem com os reformistas. A razo para essa nossa atitude em relao Reforma que somos enfaticamente contrrios negao do judasmo. Os princpios e prticas do judasmo reformista, a nosso ver, contribuem inevitavelmente para o completo desaparecimento da vida judaica. O judasmo reformista representa, para ns, um rompimento absoluto com o judasmo do passado (...). O terceiro ponto sobre o qual concordamos, e que portanto nos d razo para acreditar que possamos chegar a concluses aceitveis para todos ns, o fato de sermos sionistas. Ns no s compartilhamos da aspirao de ver Israel restitudo sua ptria, como tambm apoiamos o princpio de que tal aspirao sinnimo de revivescimento do judasmo. O prprio ato de traduzir o anseio por restaurao em esforo prtico abriunos uma nova vista de pensamento judaico. Ajudou-nos a descobrir a realidade da alma e da conscincia judaicas por trs do sistema de crenas e prticas identificado como judasmo. Se professamos um sionismo que mais do que meramente poltico, devemo-lo em grande parte a Ahad HaAm, que foi o primeiro a expressar claramente a significao espiritual do movimento sionista. Embora praticamente nada houvesse sido feito para desenvolver as implicaes mais amplas dessa viso mais profunda do sionismo, h uma larga base para cooperao na convico comum a todos ns de que o destino do judasmo est ligado ao sucesso do sionismo (...). Em vista do fato de que as existentes congregaes e organizaes rabnicas parecem estar insensveis ao perigo que ameaa o judasmo, e passam a maior parte de seu tempo ou aperfeioando sua maquinaria ou ouvindo discursos de calmantes banalidades, imperativo que, separadamente daquelas organizaes, se faa imediatamente algo para sustar o iminente desastre para nossa religio (...). Pondo-nos a trabalhar num programa para a reconstruo do judasmo devemos ter o cuidado de no errar no clculo da tarefa que est nossa frente. A no ser que estejamos preparados para ir at as razes dos males espirituais na vida judaica, seria melhor nem comear. No devemos ser como os mdicos que se satisfazem em tratar os sintomas de uma doena em vez de atacar a causa, e que, em lugar de sugerir um remdio de
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Fonte: Mordecai M. Kaplan, Um Programa para a Reconstruo do Judasmo, The Menorah Journal, 6 (4 de agosto de 1920), pp. 181-93.

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verdade, recomendam algum medicamento patenteado ou um encantamento. A verdadeira questo no como ajustar nosso ritual s exigncias da vida moderna, e sim como tornar o nosso povo suficientemente interessado em religio para querer um ritual. Se no estamos preparados para fazer pelo judasmo muito mais do que revisar o livro de oraes, devemos deixar este em paz. Defrontamo-nos com um problema que nada menos do que transformar a mente e o corao do povo judeu. A no ser que suas ideias mitolgicas a respeito de Deus cedam lugar concepo de divindade inerente s atividades do esprito humano, que sua viso esttica de autoridade ceda lugar ao dinmico sem sucumbir por ilegalidade individualista, e que seja capaz de desenvolver um senso de histria sem, ao mesmo tempo, ser um escravo do passado, o povo judeu nada mais ter a contribuir para a civilizao (...). A adoo do ponto de vista social um pr-requisito indispensvel para uma reviso completa da crena e da prtica judaicas. Esse ponto de vista nos possibilitar deslocar o centro de interesse espiritual do domnio de dogmas abstratos e tradicionais cdigos de leis para a pulsante vida de Israel. Compreenderemos ento que nosso problema no sustentar crenas e manter leis, e sim possibilitar ao povo judeu funcionar como um organismo social altamente desenvolvido e preencher os poderes espirituais nele latentes. No cabe aqui discorrer sobre a maneira como a abordagem social do judasmo iria revitalizar as ideias fundamentais da religio (...). Na realidade, nossa adeso ao movimento sionista j preparou o caminho para uma aceitao comum do ponto de vista social no judasmo, pois o problema principal do movimento sionista como o povo judeu ir viver. Como sionistas, o problema do judasmo para ns simplesmente o problema da vida espiritual do povo judeu, e no um problema de abstratos credos e leis (...). Em vista dessas consideraes, acredito que um programa para a reconstruo do judasmo deveria incluir os trs itens seguintes: (1) A interpretao da tradio judaica em termos do pensamento atual. (2) O incentivo solidariedade social do povo judeu atravs da construo da Palestina e o estabelecimento de Kehils e centros comunitrios na Dispora. (3) A formulao de um cdigo de prticas judaicas de modo que todo judeu possa saber claramente o que constitui lealdade ao judasmo.
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Conquanto todas essas atividades devam ser institudas to logo seja possvel, a ordem em que so mencionadas representa o grau de nfase a ser posta sobre cada uma na poca presente. Assim, qualquer tentativa em ampla escala para mudar o ritual seria agora mesmo inteiramente prematura, antes de nos termos firmemente alicerado nessa viso mais nova da religio e judasmo, e de termos desenvolvido pelo menos algumas das mais importantes implicaes dessa viso. Mesmo ento, porm, acredito que a maior parte da energia e do tempo nossa disposio ter de ser dedicada ao que se poderia qualificar de uma campanha educativa para popularizar a abordagem social do judasmo. A consecuo de nosso propsito ser facilitada se nossas atividades iniciais nos associarem na mente do povo com uma nova escola de pensamento no judasmo, e no como uma nova espcie de Reforma. Se, por exemplo, apresentarmos uma concepo nova e revitalizada da obrigao judaica para com o Talmud Tor, em seu sentido mais abrangente, haver menos probabilidade de sermos mal compreendidos. Devemos reconhecer que importante no s agir certo mas tambm parecer certo. Embora no queiramos atrasar indevidamente a adoo de alteraes muito necessrias em nossas prticas cerimoniais, devemos, por todos os meios, evitar uma deformao de questes tal como a que responsvel por fazer da questo de usar ou no usar o chapu a principal linha de separao entre tipos diametralmente opostos de vida judaica. Seramos sem dvida salvos de tal destino se nossos primeiros esforos visassem a reintegrar o estudo judaico como uma obrigao religiosa da qual nenhum judeu, velho ou moo, deveria estar isento (...). A segunda linha de atividade, que deveria consistir de esforos para fortalecer a solidariedade social do povo judeu por toda a Dispora, requer de nossa parte tanta ateno quanto o trabalho de transformar a mente do povo judeu. No h, presentemente, nenhum grupo judaico organizado que esteja capacitado para fomentar a vida comunitria judaica na Dispora. Tanto os judeus ortodoxos quanto os reformistas tm uma tendncia para concentrar todos os seus esforos em um aspecto limitado da vida judaica, uns sobre um servio apropriado: os outros sobre uma refeio kosher. Os sionistas radicais, que consideram impossvel uma vida espiritual fora da Palestina, certamente no tm pacincia com qualquer tentativa de pr ordem no caos existente na vida comunitria da Dispora. A prpria
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existncia desse caos, acreditam eles, constituir um incentivo adicional queles que so intensamente judaicos para emigrarem Palestina. Eles, consequentemente, nada fariam para melhorar o status da vida comunitria judaica. Nesse nterim, surgiu frente uma classe por demais ansiosa para assumir o controle das questes comunitrias judaicas a fim de afast-las do judasmo. Refiro-me classe dos filantropos judeus que esto decididos a matar o judasmo pela caridade. Esto prontos a dar assistncia ao judeu onde quer que ele esteja em dificuldades, a cur-lo em sua doena, a prestar-lhe socorro se estiver necessitado, a proporcionar a seus filhos facilidades sociais e diverses decentes, e, se necessrio, distribu-lo pelos quatro cantos do mundo. Mas eles sistematicamente se opem a qualquer coisa e a tudo que possa fortalecer a conscincia judaica ou promover solidariedade judaica. A poltica deles fez existir um novo tipo de questo social cujo principal problema como administrar um anestsico ao povo judeu, de modo a tornar sua morte indolor. Se, aqui e ali, for encontrado um assistente social que se recuse a contribuir para essa soluo do problema, no lhe ser fcil justificar-se perante sua diretoria. Deve ser o objetivo de um movimento como o nosso cuidar para que o controle das instituies judaicas passe s mos daqueles que acreditam no judasmo e no futuro judaico. H, obviamente, nessa segunda linha de atividade muito mais do que simplesmente aperfeioar a maquinaria de organizao. organizao judaica na Dispora deve ser dada uma filosofia, de modo a salv-la de incompreenses tanto por parte de judeus quanto por parte de no-judeus. Muito trabalho educacional ter de ser feito para ensinar o nosso povo a criar instituies que favoream objetivos judaicos. Quanta energia mal dirigida teria sido evitada se aos que construram sinagogas houvesse sido mostrado que o futuro de muitas congregaes ficou comprometido pelo fracasso em proporcionar facilidades sociais e recreativas na prpria sinagoga. A relao de vida social e recreativa com desenvolvimento espiritual s se tornou evidente em anos recentes, e a verdade a isso referente precisa de ampla difuso, a fim de que nosso povo no repita os erros cometidos nas vrias instituies judaicas religiosas, filantrpicas e educacionais que foram estabelecidas (...).

Um novo sionismo3
Precisamos de um novo tipo de sionismo, um sionismo que vivifique a sinagoga, motive interesse por Israel e contribua para o crescimento de uma civilizao que seja religiosamente judaica, sem ser teocrtica ou clerical. O novo sionismo deve ter como finalidade a redeno do povo judeu e a regenerao de seu esprito. Para alcanar tais propsitos, o novo sionismo tem de se basear em uma compreenso adequada do que possibilitou ao judasmo mundial sobreviver at os dias de hoje, e em um diagnstico correto do enfraquecimento da vontade de sobrevivncia judaica em anos recentes. A razo pela qual os judeus, como povo, conseguiram sobreviver aos seus mais cruis perseguidores que o clima de opinio que prevaleceu no passado no era nada menos do que aquele que eles, os prprios judeus, haviam gerado atravs de sua civilizao religiosa. Os seus perseguidores, fossem eles cristos ou muulmanos, tiraram toda a sua perspectiva de vida, suas ideias de Deus, do mundo, da natureza e do destino humanos quase que inteiramente da tradio judaica. Esse fato foi suficiente para convencer os judeus de que longe de estarem descompassados com a realidade, eles eram, de fato, seus mais verdadeiros expoentes. S isso bastava para manter vivo seu senso de superioridade que baixou a um mnimo o potencial assimilatrio de seu ambiente. Dessa posio de segurana interna, independentemente do que acontecia l fora, nosso povo foi subitamente lanado, h aproximadamente um sculo e meio, num clima de opinio que lhe era inteiramente estranho. E desde ento sua autoconfiana foi substituda por autoquestionamento, e seu senso de orgulho por um senso de inferioridade. No , pois, de admirar que o potencial assimilatrio do ambiente tenha aumentado rapidamente. O caso do povo judeu veio a ser o de um animal marinho subitamente lanado terra por um terremoto. A no ser que possa se metamorfosear, e desenvolver os rgos essenciais vida no novo ambiente, no poder sobreviver.

Selees de um discurso proferido perante a Conveno de 1954 da Rabbinical Assembly of America.

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A no ser que o povo judeu desenvolva atitudes de mente e esprito que o tornem apto a sobreviver na atmosfera contempornea de cientificismo, nacionalismo e socialismo deste mundo, estar destinado a sucumbir. No tendo ainda alcanado aquelas atitudes de mente e esprito, os judeus desconfiam que o povo judeu se tornou um anacronismo. Essa dvida de si mesmo, que por vezes degenera em dio a si mesmo, est solapando a vontade de sobrevivncia judaica. A metamorfose pela qual ns judeus temos de passar envolve a reconstruo da condio de povo dos judeus, a recuperao de Eretz Israel, e o reabastecimento da Tor. Devem ser esses, de agora em diante, os principais objetivos no novo sionismo. Embora esses objetivos precisem ter suas razes no judasmo histrico, ele tm de ser tomados relevantes s realidades sociais, culturais e intelectuais do mundo em que vivemos, mesmo que seja para desafi-los ou modific-los de acordo com as injunes da f da razo e da experincia.

O grupo a que um indivduo pertence o terreno em que ele est, escreve Kurt Lewin. A firmeza ou fraqueza desse terreno pode no ser conscientemente percebida, assim como nem sempre se pensa na firmeza do terreno fsico em que pisamos. Dinamicamente, contudo, a firmeza e a clareza desse terreno determinam o que o indivduo deseja fazer, o que ele pode fazer, e como ele o far. Isso igualmente verdade tanto para o terreno social quanto para o fsico. Sem uma sentida realidade de um povo judeu, escreve o Rabino Theodore Friedman, meu prprio ser como judeu se dissolve em insignificncia. A abordagem individualista do judasmo deu origem ao que Ernst Simon adequadamente denomina de ponto de vista protestante. Alis, na realidade, percorreu quase o caminho todo para se colocar dentro do clima de opinio que o recente cristianismo neo-ortodoxo, existencialista, est tentando gerar, e difere deste apenas por umas poucas saneia. Tal abordagem encara a devoo pessoal como uma soluo para a presente crise na religio judaica. No , contudo, como o prprio Simon reconhece, uma legtima construo do judasmo como tal. Quando numa floresta h um incndio, no tempo de podar as rvores. Quando uma casa est prestes a cair, em consequncia de um terremoto, no tempo de discutir com o decorador que espcie de cortinas usar na sala de estar. Agora que a Casa de Israel corre perigo de desabamento, no tempo de concentrar em problemas teolgicos ou rituais excluindo os problemas que afetam a prpria sobrevivncia do judasmo mundial como um grupo identificvel, e isso para no falar de sobreviver como um grupo criativo no mundo melhor que luta para nascer. O novo sionismo precisa achar uma nova denominao, ou dar um novo significado a uma denominao antiga, com que identificar os judeus no mundo inteiro como uma unidade social. Essa denominao deve abranger em seu mbito a maioria de judeus que no pode, ou no quer, emigrar para o Estado de Israel. Ter de adquirir uma significao religiosa, mesmo ao custo de redefinir o termo religio. Talvez o velho termo povo seja o mais adequado a esse propsito. O judasmo mundial ter de constituir, de agora em diante, uma permanente sociedade internacional religioso-cultural conhecida como um povo, tendo na comunidade judaica em Israel mas no no Estado de Israel seu ncleo mais criativo.
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A reconstruo da condio de povo judaico

Sem algum ato formal para reconstituir o judasmo mundial numa unidade social auto-aceitvel bem como publicamente reconhecida, os judeus no passam de uma nao dispersa. A nao judaica comeou a se desagregar quando seus membros foram admitidos como cidados das naes ocidentais. certo que eles ainda so tratados como uma unidade social por no judeus incapazes de se libertarem de sua tradio religiosa, em que os judeus figuram como um povo amaldioado. Assim a poro maior da fora que sustenta a Casa de Israel vem de fora e no de dentro. No se pode mais permitir que tal condio anormal continue. Por outro lado, presumir que a condio de nao judaica pode ser reconstituda em Israel ilusrio. Israel, como um Estado democrtico moderno, tem de promover a condio de nao de Israel, da qual os judeus da Dispora no participam. Seu vnculo de unidade apenas com a comunidade judaica em Israel. Tudo isso torna evidente quo imperativo para os judeus no mundo inteiro reafirmarem sua unidade como um povo, que o portador de uma tradio moral e espiritual. O judeu precisa dessa tradio a fim de confirmar sua f na capacidade dada por Deus de atingir salvao e motivlo a se esforar para alcan-la.
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O Congresso Sionista Mundial, reconhecendo essa necessidade, deveria nomear uma comisso para realizar um meticuloso estudo do problema do status de grupo, tendo em vista emitir uma declarao formal referente ao status do judasmo mundial e ao papel da unidade judaica.

refletidamente de nossa ligao ao Estado de Israel como espiritual. Essa ligao deve exercer uma influncia vitalizadora e espiritualizadora na vida judaica americana. Se os judeus se reconstiturem como um povo funcionando atravs da condio de nao em Eretz Israel e atravs da religio em toda parte, eles se colocaro na vanguarda de todos os povos que aprendero a olhar para suas prprias civilizaes nacionais como fonte de salvao pessoal; mas, ao mesmo tempo, iro compreender que devem integrar aquelas civilizaes numa estrutura internacional. De outro modo, a humanidade retomar idolatria nacional, com todos os seus excessos nacionalistas, dos quais as religies histricas, se despertas para sua responsabilidade, ainda podero salvar a humanidade. Assim, tratando a recuperao de Eretz Israel como parte de um moderno movimento messinico ou religioso, esto os judeus em uma posio nica de serem capazes de servir a humanidade fomentando um mtodo de vida grupal pela qual a salvao deste mundo ser alcanada. Isso justificar a secular recusa do povo judeu de renunciar sua reivindicao de Eretz Israel. O mtodo de viver que est implcito na ligao do povo judeu a Eretz Israel precisa agora ser tornado explcito. Esse mtodo de viver consiste em utilizar para sua auto-realizao como seres humanos aquela vasta gama de interatividade que somente possvel entre aqueles que esto enraizados numa terra comum. Os interesses naturais a que essa interatividade d origem devem constituir a matria da qual seres humanos poderiam moldar seu destino. Essa a contribuio judaica ao mtodo de salvao do qual Deus a fonte e a garantia.

A recuperao de Eretz Israel

O segundo objetivo do novo sionismo deve ser a recuperao de Eretz Israel. A consolidao do Estado de Israel deveria ser tratada apenas como um meio, embora absolutamente indispensvel, para o estabelecimento de judeus em Eretz Israel e a construo ali de uma civilizao que seja animada pelo mais elevado idealismo proftico. O novo sionismo ter de interpretar esse objetivo particular num esprito que leve em conta o atual clima de opinio com seu cientificismo, nacionalismo e socialismo, fazendo Eretz Israel tornar-se o centro de valores morais e espirituais to superiores a essas doutrinas correntes quanto o monotesmo tico superior a variadas idolatrias. O judasmo, ao retomar sua carreira em Eretz Israel, o pas se encarna suas mais altas aspiraes, demonstrar a validade de um princpio altamente importante que est implcito em sua tradio. O princpio em questo o seguinte: A religio, ou a busca de salvao, deve normalmente consistir em utilizar como meio para a salvao as experincias cotidianas decorrentes de toda a gama de interaes a que um territrio comum torna necessrio aos que nele vivem. Essa concepo de religio d ao povo judeu uma alta vocao, algo pelo que viver, tanto na Dispora quanto em Israel. Dada essa vocao, os judeus que vivem na Dispora provavelmente agiro como freio para as tendncias chauvinistas que a luta israelense por sobrevivncia estar por demais propensa a despertar nos judeus de Israel. Por outro lado, tambm provvel que compartilhem da experincia dos judeus em Eretz Israel, juntamente com os valores espirituais e morais que tais experincias proporcionariam. Basta apenas lembrar quo de perto o judeu americano mdio ainda acompanha os acontecimentos dirios em Israel e quo sensvel ele ao que ali se passa. O elo com o povo judeu onde quer que ele possa viver, declarou recentemente Moshe Sharett, o slido alicerce de nossa vida, assim como a ligao espiritual ao Estado de Israel o fato central na vida do povo judeu. Sharett fala
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Yeshayahou Leibowitz (1903 1994)

Cientista e filsofo. Nascido em Riga, Leibowitz estudou qumica, filosofia e medicina. Em 1935, emigrou para a Palestina, tornando-se professor e diretor da seo de bioqumica da Universidade de Jerusalm. Paralelamente, ensinava Histria e Filosofia da Cincia. A viso que Leibowitz tem do judasmo nica. Para ele, o judasmo um fenmeno histrico e religioso, que se caracteriza pelo reconhecimento de servir a Deus segundo a halakh (leis estabelecidas pela tradio). Leibowitz considera que no existem uma filosofia, uma teologia, uma cincia e uma doutrina genuinamente judaicas. Ao contrrio, segundo o autor, o judasmo deve ter como propsito servir a Deus e no realizar a perfeio espiritual ou fsica, o desenvolvimento da sociedade ou a perfeio do mundo. A doutrina de Leibowitz contm elementos kantianos em conformidade com a sua estrita concepo halkhica do judasmo. Leibowitz repetidamente expressava sua opinio pessoal sobre os aspectos religiosos e polticos da vida moderna israelense. Antes do estabelecimento do Estado de Israel, adotou uma atitude negativa em relao ao sistema de governo partidrio, incluindo a existncia de partidos religiosos e as relaes das instituies rabnicas com o Estado. Posteriormente defendeu a separao da religio judaica do Estado, e o fim do confronto entre essas esferas. Foi contra a anexao dos territrios ocupados, tornando-se uma figura controversa nos crculos religiosos e seculares. Sua obra representa uma reflexo maior sobre o judasmo, na qual ele fala sobre a observncia dos mandamentos da Tor, bem como sobre as relaes entre a religio e a histria, o Estado e o povo judeu e os judeus e os cristos. Referncia Enciclopaedia Judaica, N.Y., The Macmillan Company, 1972, vol. X, p. 1587.

Yeshayahou Leibowitz1
Do judasmo, do povo, do Estado
OS JUDEUS ENTRE SI, EM SEU PAS E DENTRE AS NAES2 O Dr. George Steiner, escritor e pensador anglo-americano e judeu, esboou um quadro do judasmo em nossa poca situando o homem judeu contemporneo, conforme ele o percebe, na qualidade de indivduo inteiramente implicado no mundo sociocultural do Ocidente esclarecido e participando de todos os seus problemas e aspiraes. Mas, paralelamente a essa associao, ele est consciente de pertencer ao grupo judeu, que permanece sendo uma comunidade parte no mundo que o seu e isso, precisamente, por seu judasmo. George Steiner define a essncia desse judasmo pelo papel de vanguarda que os judeus desempenharam no combate pelos valores e pelo progresso da humanidade nos domnios social, moral e intelectual; e, a partir dessa definio, ele reconhece a existncia de um povo judeu e diz dele fazer parte. Constata-se, pois, que o problema aqui levantado no diz respeito a George Steiner, que, por seu lado, analisa seu estatuto pessoal no seio de um povo que ele s situa em funo e a partir de seu papel universal, ao nvel de sua contribuio cultural e dos valores geralmente qualificados de humanistas. Em outras palavras, George Steiner define o povo judeu somente em relao ao mundo no-judeu no qual ele vive e s reconhece pertencer a esse povo (ou seja, sua condio de judeu) a partir desse elo. Ele no concede ao judasmo nenhum contedo intrnseco e particular, a menos que queira voluntariamente ignor-lo!... Ora, todos os valores e qualidades louvados por Steiner como essncia do judasmo so reencontrados entre os no-judeus pelo menos nas correntes de pensamento ideolgicas ou filosficas que o Dr. Steiner considera positivas. Na histria do povo judeu e do judasmo pululam tais correntes e ideologias, diferentes umas das outras e por vezes contraditrias e querer fazer delas um inventrio
Texto extrado de: LEIBOWITZ, Yeshayahou. Judasme, Peuple Juif et Etat DIsrael, Paris, Jean Claude Lattes, Cap. 10, pp. 169/183. 2 Conferncia proferida no simpsio Judasme et judit, no mbito do 6 Dilogo anual americano-israelense, consagrado ao tema O futuro de uma relao, 1968.
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exaustivo seria to vo quanto fastidioso. Mas no se pode falar objetivamente de judasmo e de valores do judasmo a no ser a partir da realidade judaica que prevaleceu durante cerca de cem geraes e de sua manifestao concreta nessa realidade. Esse judasmo histrico-emprico no um determinado sistema ideolgico, nem mesmo um mosaico de diferentes maneiras de pensamento, e sim um modo de vida especfico, institudo pela Tor e as mitzvot e que se cristalizou na Halakh. A judeus como George Steiner, que no aceitam esse modo de vida e chegam at a refut-lo, pode-se fazer a seguinte pergunta: qual o sentido e a legitimidade de sua conduta quando proclamam a permanncia de seu vnculo com o povo judeu se esse vnculo est vazio de qualquer contedo do significativo? Poder-se-ia responder que George Steiner, humanista cosmopolita, feroz adversrio do nacionalismo, participa do povo judeu pelo nico vis do nacionalismo... Paradoxo que rivaliza com a ironia!... DEUS NO O POLICIAL DA HISTRIA... J dissemos que se poderia glosar interminavelmente sobre o judasmo e disso extrapolar muitas ideologias e tudo aquilo permanecer subjetivo; foi dito igualmente que o debate sobre o judasmo deveria ser tomado como prova de vida, de ao e da obra de judeus que seguiram um caminho batizado pelos atributos judeus e cuja ao e obra se nutriram nas fontes do judasmo que s podem provir da Tor, no sentido mais amplo do termo. Permitam-me lembrar que os judeus na qualidade de indivduos viveram, atuaram e criaram, como todos os demais homens, em todos os domnios da vida situados fora de sua esfera judaica ou, como dizem as Escrituras, no espao das quatro varas da Halakh. No havia, porm, nessa atividade e nessa criao, nada de judaico no sentido especfico do termo. No decorrer do debate os nomes de Marx, Einstein e Freud foram muitas vezes lembrados como contribuio judaica humanidade. No me estenderei sobre o sentido da palavra judeu aplicada ao apstata antisemita que foi Marx. Quanto ao judeu Einstein, era ele um fsico alemo que ressentiu, durante a segunda metade de sua vida, seu pertencer ao povo judeu e se definia como judeu. Mas na realidade ele no tinha em si nada do que distingue Israel das outras naes; chegou mesmo a desposar uma nojudia e, consequentemente, seu filhos, formalmente falando, no so judeus.
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Sua obra principal nutre-se inteiramente da gigantesca cultura ocidental, da cincia cosmopolita e, alis, no poderia estar ligada a uma outra fonte. Os trs mil anos de histria do povo judeu e o fato de Einstein ter sido uma mealha na longa corrente de geraes desse povo e de sua cultura em nada contriburam, e no poderiam contribuir, para a obra cientfica de Einstein. Desse ponto de vista faramos bem em inverter a frmula de contribuio do judasmo humanidade, dizendo que Einstein, como gnio cientfico, uma contribuio da humanidade ao judasmo (encarnado pelos filhos do povo judeu). Diremos igualmente que a obra de Einstein no tem significao particular no que se refere ao presente e ao futuro do povo Judeu alm do seu valor para a cultura da humanidade inteira, qual igualmente contribuem os judeus. Quanto a Freud, que tanto impressionou vastos crculos de intelectuais, judeus e no-judeus, a mitologia que criou no decorre, ela tambm, do judasmo (mais exatamente do fato de Freud ter sido judeu) e sua obra no tem nenhuma significao para o judasmo e sua permanncia. No pode haver criao judaica original a no ser a proveniente do espao da Tor e das mitzvot: no mundo da matria pelo modo de vida ditado pela Halakh; nas esferas do esprito pela reflexo e meditao religiosas sob todas as suas formas: a homiltica (Agad), a poesia litrgica (Piyut), a filosofia, a mstica, a moral. A filosofia judaica nunca deixou de ser teolgica, e sua razo de ser era proporcionar um alicerce racional ao modo de vida baseado na Tor e no exerccio das mitzvot. A contribuio de judeus dentre os quais alguns grandes pensadores filosofia, fora da esfera de reflexo segundo a Tor, no pode ser considerada como filosofia judaica: ela no corolrio do judasmo e sim da filosofia europeia, que igualmente contava com esses filsofos judeus. E tudo isso tanto mais verdadeiro para a tica e a moral judaica, rebentos de uma vontade de laicizar o judasmo. Religio e moral no so compatveis pois tudo est na inteno: a escolha de um indivduo religiosa se a inteno que o inspira provm do Cu; moral quando parte do homem, percebido como finalidade suprema. evidente que essas duas intenes se excluem mutuamente. Admitindo isso, diremos que somente o ateu pode ser um ser moral, enquanto que aquele que se submete Lei divina conhece a mitzv e no a lei moral. Se o judasmo a religio de Israel; a moral do judasmo, que fez correr rios de tinta e inspirou tantos escritores nas fileiras do liberalismo religioso ou epicurista essa moral no existe, nunca existiu e
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no poderia existir. A literatura moral do judasmo tradicional, desde os Deveres dos coraes e O caminho dos Justos at o movimento moralista do sculo XIX, marca uma vontade de interiorizao e aprofundamento da prxis das mitzvot, e no uma tica no sentido habitual da palavra. A tica no uma linha de conduta, j que todo ato em si mesmo indiferente do ponto de vista moral. Se dois homens apertam o gatilho de um fuzil carregado, apontado contra um terceiro, e o matam, um poder ser condenado por assassinato, ao passo que o ato do outro poder ser considerado como faanha herica de um combatente leal sua ptria. No , portanto, o prprio ato que moral ou imoral, e sim o impulso voluntrio do qual esse ato consequncia. A tica do mundo ocidental prope duas grandes respostas ao problema da orientao volitiva do indivduo: primeira, a socrtica, a saber: a escolha moral do homem est na orientao de sua volio em conformidade com seu conhecimento da verdade de realidade; segunda, a kantiana: a escolha moral do homem est na orientao de sua volio em conformidade com a conscincia do seu dever. Mas aquele que recita duas vezes por dia o Shema Israel l tambm: No seguireis as tendncias de vosso rao e de vossos olhos; No seguireis vossos olhos o que a negao do princpio socrtico, enquanto que No seguireis as tendncias de vosso corao a negao do princpio de Kant. Quanto justificao e ao sentido do versculo, ele se resume nessa frmula: Eu sou o Eterno, vosso Deus. Assim como na filosofia, judeus se distinguiram e ainda se distinguem no pensamento e no ensino tico; mas seus sistemas no cresceram no terreno do judasmo, que, alis, nesse domnio no pode inspir-los. No encontramos, nas Escrituras e nas fontes judaicas, nenhum indcio dando a entender que os judeus viam sua especificidade na perfeio moral, na luta para emendar o mundo ou na salvao e redeno do homem como se esses valores e essas aspiraes no fossem igualmente encontrados nas civilizaes no-judaicas... A especificidade dos judeus a seus prprios olhos assim como aos olhos dos no-judeus residia em seu apego s mitzvot prticas: o Sabbat, a pureza ritual alimentar (Kashrut), a pureza da famlia, o estudo da Tor. por a que os judeus se distinguiam dos povos ao seu redor. E foi graas a essas mitzvot que eles no se assimilaram entre as naes, e no graas aos sistemas e conceitos morais, sociais, humanistas ou filosficos, supostamente especficos do judasmo.
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Foi por essas mitzvot prticas que os judeus se diferenciaram dos nojudeus na poca de Ezra e Neemias, assim como os praticantes dessas mitzvot diferiam dos helenizantes na poca do Segundo Templo e foi por e em nome dessas mesmas mitzvot que os Hasmoneus desencadearam uma guerra civil no seio do povo judeu, que a historiografia nacionalista moderna apresenta como uma sublevao nacional. No judasmo histrico no encontramos nenhuma justificao de valores estranhos s mitzvot religiosas ou para alm dessas mitzvot. Essa constatao no normativa e sim emprica; ela no decorre de uma certa percepo, positiva ou negativa, da histria do povo judeu. O judeu que rejeita a tradio histrica do povo judeu tradio que Tor e mitzvot , segundo essa mesma tradio, um judeu transgressor, mas nem por isso ele deixa de ser judeu. Isso o que distingue judasmo de judeidade. Hoje em dia numerosos so os judeus de fato, a maioria do povo judeu que no aceitam o verdadeiro contedo do judasmo, mas se dizem judeus, e o proclamam bem alto. Esse fenmeno que faz com que judeus, tendo perdido a experincia de um vivido judaico, queiram sinceramente continuar a pertencer ao povo judeu e trabalhar por sua perenidade no deve absolutamente ser desprezado. Eles no tm outra escolha seno a de substituir o sentido religioso da noo de judasmo por um sentido laico, e o do povo judeu como Knesset Isral (Comunidade judaica), definido por sua Tor, pela noo de nao, no sentido laico moderno. Est a o grande problema existencial contemporneo do povo judeu e convm debat-lo, tanto do ponto de vista dos valores quanto em nvel pragmtico. Na anlise do judasmo, em nossa poca, convm fazer uma distino entre os diferentes sistemas de valores, que se chocam e se contradizem, tanto no pensamento quanto na ao do indivduo. O teocentrismo a essncia do judasmo percebido atravs da Tor e das mitzvot. O servio divino pois a finalidade e sua divisa abre o Shulchan Aruch, o Cdigo ritual judaico: [O homem judeu] retesa os msculos como um leo para se pr desde manh cedo a servio do seu Criador. No a servio do homem, da sociedade, do povo, do Estado, da humanidade, mas a servio de Deus. Donde o sentido profundo das mitzvot prticas, que encarnam e concretizam a inteno do Servio divino. Nessa conscincia religiosa judaica, o smbolo supremo da f est na situao do Patriarca Abrao no monte Mori para o sacrifcio de seu filho Isaac, e que lhe valeu a denominao de
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Temente-a-Deus: os valores humanos, tanto individuais, como a piedade de um pai para com seu filho, quanto universais, referentes ao povo e humanidade inteira, prometidos na Aliana de Abrao, se apagam diante do culto de Deus. O sistema humanista antropocntrico gira em torno de um s eixo: o homem elevado a valor supremo e, de algum modo, divinizado, como na filosofia de Kant: o homem por si mesmo como finalidade o que bem a expresso suprema do atesmo. H tambm o humanismo desnaturado, o atesmo se escondendo sob uma mscara religiosa que o cristianismo. Tambm a est o homem no centro de todas as coisas e sua salvao arrasta a inteno: Deus apenas um instrumento e um meio para chegar a essa salvao: A Cruz, atributo supremo da f crist, ilustra bem essa inteno: Deus sacrificado em proveito do homem; o essencial do contedo cristo est portanto na anulao do Servio divino que o exerccio das mitzvot. A escolha fica ento entre os dois grandes sistemas de valores: sistema religioso, portanto teocntrico: o judasmo da Tor e das mitzvot, baseado essencialmente na situao do homem perante Deus e sistema atesta-humanista, portanto antropocntrico, que considera a situao do prprio homem. Disso a expresso autntica o kantismo, sendo o cristianismo uma verso adulterada. Mas existe igualmente um outro sistema de valores que no somente vil e desnaturado, mas tambm abjeto: o conceito etnocntrico, apresentando como finalidade no Deus, nem mesmo o homem, mas uma coletividade humana povo, raa, Estado etc. que um fundamento natural, ou um produto da conscincia ou da vontade humana; e esse sistema julga o homem no mais em relao sua situao perante Deus, nem mesmo diante de si mesmo, mas em funo dessa mesma coletividade, elevada divindade. esse conceito que fonte de uma boa parte do mal e da maldade no mundo e seu resultado lgico o fascismo. de se temer que um povo judeu novo, reunindo judeus ignorantes dos valores essenciais do judasmo, mas decididos a assegurar a perenidade do povo judeu e sua pertena a esse povo, caia, despeito de si mesmo, na armadilha desse sistema etnocntrico, do qual Ben-Gurion hoje [1969] a encarnao por excelncia. Se essa tendncia prosseguir e todos os indcios permitem assim pensar no veremos mais um povo judeu tendo erguido uma estrutura poltica da qual assegura a existncia para suas necessidades, e sim um Estado fabricando seu prprio povo. Essa nova nao no ser apenas cortada da corrente histrica do povo judeu e do judasmo, mas com
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o passar do tempo ela igualmente romper com as comunidades judaicas que no esto fisicamente ligadas ao Estado. No decurso deste congresso, ouvimos propsitos que lembram essa concepo etnocntrica exatamente da boca dos porta-vozes do judasmo nacional-religioso oficial, propsitos que permitem pensar que, para essa corrente religiosa, o povo se tornou Deus, o patriotismo uma f, e o Estado uma religio. No o povo judeu como povo da Tor (de fato ou em potencial) que preocupa os adeptos dessa ideologia, mas a Tor como meio de satisfazer os interesses do povo e do Estado. Aqui temos de analisar o sentido do proclamado lema Eretz Israel para o povo de Israel, conforme a Tor de Israel, levando em conta o fato de que o Estado de Israel no encarna o judasmo. Apresentemos inicialmente uma questo de princpio: Pode-se concretamente conceber um Estado regido conforme a Tor no sentido da histria real do povo de Israel e da humanidade (que preciso no confundir com uma concepo messinico-utpica)? E precisamente o fiel convencido da essncia divina da Tor que forosamente responder pela negativa: o aparelho poltico de todo Estado, no passado, no presente e no futuro, s pode ser o instrumento para satisfazer as necessidades e os interesses humanos, e assegurar a existncia do indivduo e da sociedade, mas nunca a expresso do Servio divino, que tarefa do homem sobre a terra. Por essa razo, a eterna tenso entre religio e Estado uma coisa que vem da base e depende da natureza das coisas. O povo de Israel jamais teve um Estado conforme a Tor. Mas na medida em que, no meio do povo, homens trabalharam nos caminhos de Deus, portanto com um esprito desinteressado, todo Estado judeu foi teatro de um combate pela realizao da Tor geralmente sem sucesso. E o prprio fato desse combate, na qualidade de fenmeno cardinal e epicentro da vida poltica e social, conferiu ao Estado sua dimenso religiosa. Isso verdade tanto para a poca do Primeiro Templo quanto para a do Segundo, e tambm o ser, parece, por toda poca futura; pois precisamente o crente que compreende que a Tor por sua essncia divina no pode ser realizada pelo homem e que viver conforme a Tor no tem outra significao a no ser no continuado esforo de viver em seu esprito, recusando abdicar diante dos fatores naturais e histricos com os quais sempre se chocar nesse combate sem fim. somente no contemporneo Estado de Israel que esse confronto entre o judasmo e o Estado judeu est ausente, e isso no porque o Estado seria, Deus nos livre, teocrtico (como pretendem os imbecis), mas ao
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contrrio porque a religio encarnada pelos homens, instituies pblicas e oficiais que a representam se traiu a si prpria, se amesquinhou a ponto de se tornar um msero apndice integrado ao aparelho laico do Estado; e ainda mais: ela ergueu posio de valor santificado os elementos do poder, do governo e da administrao laicas. Por essa razo, o Estado de Israel no tem significao religiosa atual; esta s existe nele em potencial, como o Estado dos judeus. O Reino de Jeroboo ben Nabat era tambm um reino de Israel, sem sombra de dvida..; O Profeta Elias no contestou a legitimidade de Acab como rei e foi exatamente a razo pela qual ele se levantou contra o mesmo: Acab era um rei perverso de Israel. Nosso Estado de Israel, embora tenha transgredido a Tor de Moiss, o Estado de Israel, mas o Estado e o judasmo no se superpem nem coincidem. Um Rabinato nomeado por um poder laico, agindo por graa e autoridade desse poder, assim como uma representao poltica religiosa associada a um governo que anula o Sabbat, a que pode tudo isso ser comparado? Ao Profeta Elias promovido posio de Profeta de Deus por Jezebel... A FUNO DA RELIGIO Este ttulo da conferncia central do simpsio que nos interessa deveria, at mesmo no seu enunciado, suscitar uma enrgica oposio. Uma religio que tem uma funo, ou seja, utilizada como meio para um certo fim, no uma religio. Se o Servio divino no reconhecido como finalidade do homem, a religio no tem mais qualquer sentido, pois ela no pode fundar nem consolidar valores humanistas laicos, e no que se refere a interesses nacionais e polticos ela antes fator de discrdia. Pode-se, entretanto, falar de funo da religio na medida de sua capacidade de frear ou neutralizar fatores decorrentes de valores polticos e de dominar as consequncias das paixes nacionalistas e patriticas proibindo ao homem ver na nao e no Estado valores absolutos. Do ponto de vista religioso (e preciso acrescentar: do ponto de vista humanista igualmente), o Estado no tem outra significao a no ser a de instrumento funcional; ele um utenslio necessrio obteno de coisas que, precisamente, so tidas por valores ou que so necessrias ao homem. O Estado e seu aparelho so indispensveis ao indivduo que vive com, e entre, outros indivduos) assim como ao povo que se quer soberano e independente. Consequentemente, a relao do indivduo com seu Estado
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deve ser a mesma que a de um trabalhador com suas ferramentas, das quais cuidar muito bem mas sem nada lhes dever. Elevar o Estado posio de valor urna concepo fascista e conferir-lhe um valor religioso equivale a verdadeira idolatria. No h santidade alguma ligada noo de Estado. Eu refuto o argumento corrente dos sionistas religiosos que afirmam que s se pode viver plenamente o judasmo. num Estado judeu em Eretz Israel. O essencial do judasmo foi vivido na Gol e no exlio que o herosmo dos judeus, por sua vida e sua morte pelo judasmo, se manifestou em toda a sua grandeza. Uma vida judaica plenamente vivida um ideal a que preciso aspirar incessantemente, seja em Eretz Israel ou na Gol. Mas quanto a mim, assim como muitos dos meus semelhantes, somos sionistas porque j estamos fartos de sermos escravizados nos pases estrangeiros; no queremos mais que o povo judeu viva na dependncia de no-judeus. Eu no santifico o Estado a nvel religioso, mas me apego a ele com todas as minhas foras e o defenderei at o fim, porque me atenho nossa independncia e nossa soberania. No vejo nisso uma funo religiosa: o culto a Deus uma tarefa da qual o povo de Israel est incumbido e no uma misso a servio do povo de Israel. Eu refuto a opinio geralmente aceita inclusive nos meios religiosos dizendo que o sentido e o valor do judasmo na histria do povo de Israel era o de assegurar a existncia do povo judeu como tal e que ainda hoje o judasmo e segundo uma outra verso: somente o judasmo est em condies de assegurar a existncia do povo. Ainda uma vez, ver no judasmo um meio e um instrumento a servio do povo transformar a religio num monstro nacionalista e patriota. A Tor e as mitzvot so em si mesmas um fim, e no instrumentos para outra finalidade. Um dos oradores neste debate exclamou num belo arroubo de fervor que ele diariamente rezava pela paz do povo judeu e por sua continuidade. Receio que esse cavalheiro ignore a significao religiosa da orao. No me cabe informar ao Santssimo-abenoado-seja-Ele sobre minhas necessidades ou as de meu povo; e se consegui superar tendncias idlatras no foi para tentar influenciar o Criador. Se a cada manh eu encontro na sinagoga algumas dezenas de judeus que ali vo como eu no a necessidade de confiar a Deus nossos desideratos, nem a esperana de ver nossa reza acolhida e transformada em resultados concretos que nos retine, e sim a inteno coletiva de realizar publicamente a mitzv da orao. O judasmo, em seu significado de exerccio das mitzvot, urna
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finalidade em si; visto de outra maneira, no tem nenhum sentido e nem mesmo qualquer utilidade para o nacionalismo e o patriotismo judaicos. O rabino Yossef Caro, o autor do Shulchan Aruch, sabia muito bem o que fazia ao iniciar sua obra com: Ele retesa seus msculos como um leo..., pois o Servio divino exige do homem um esforo sobrehumano. No est na natureza do homem inclusive na do homem judeu ele se fazer o servidor de Deus e o guardio de Sua lei. E, tambm, pretender que a especificidade da histria do povo judeu decorre de um fator religioso que est na prpria alma da nao israelita uma inpcia. Essa afirmao no s deprecia a significao da f e do herosmo religioso manifestados pelos judeus ao longo dos sculos, como tambm sobretudo falsa. Toda a histria do povo judeu um infindvel conflito entre o judasmo e o povo que reputadamente seu portador; e foi isso que expressaram nossos Sbios no Midrash homiltico sobre a Coao da Montanha (Monte Sinai). Essa coao, alis, de nada serviu, pois foi precisamente a gerao que teve a revelao da presena divina que fez o bezerro de ouro. Os quarenta e oito profetas e as sete profetisas (segundo a contagem da tradio) escolhidos por Deus para falar por suas bocas no fizeram voltar uma s alma ao caminho certo. Mas sabemos tambm que durante dezenas de geraes no foram apenas alguns e sim multides que acreditaram profunda e intensamente em Deus e sacrificaram a vida pela Tor. E no entanto essas geraes no viveram a, revelao do Sinai, a da Presena divina. Elas no testemunharam milagres e no tiveram profetas, mas foram educadas e se educaram elas prprias no esprito da Tor e no exerccio das mitzvot. Isso nos leva a refutar os propsitos sobre a significao religiosa dos milagres realizados para Israel durante sua histria, e sobretudo o palavrrio sobre o milagre da Guerra dos Seis Dias. A Bblia assim como a histria de Israel, desde as origens at nossos dias, provam a inanidade dos milagres com a Justificao da f. No foi pelos milagres que os judeus se abriram f, mas foi a partir de sua f que vieram a considerar miraculosos acontecimentos vividos por seus pais ou por eles prprios. O milagre da Guerra dos Seis Dias reside no fato de a sociedade judaica em Israel ter sido capaz de organizar um exrcito moderno, o que os pases no rabes no souberam fazer durante essa gerao. No se encontro louvores ao pacifismo nas Escrituras do judasmo, que consideram a guerra como um elemento da realidade humana. Mas igualmente no encontraremos o culto
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do herosmo guerreiro, e tampouco uma apreciao religiosa das vitrias militares e das conquistas. Um rei perverso conheceu vitrias e realizou conquistas, enquanto que um rei sbio e justo foi morto numa guerra e arrastou o povo sua perda. Deus no se revela na Histria, que (segundo um dos maiores historiadores) no passa de um tecido de crimes... de loucuras e de catstrofes do gnero humano. Deus no o policial da Histria e no h nada mais falso do que ver em certos acontecimentos histricos o Dedo de Deus. Pois a Deus a Terra e tudo o que ela contm, o que supe todo o desenvolvimento da Histria, quer se trate de seu desenvolvimento normal, quer do que poderia parecer como saindo dessa normalidade. Todos os acontecimentos valem, do ponto de vista de sua significao religiosa; em outras palavras: todos os acontecimentos so indiferentes do ponto de vista religioso e s existe significao religiosa nos atos realizados no sentido do divino, ou seja, de maneira desinteressada. O mundo segue seu curso e nesse mundo que cabe ao homem servir a Deus. Eu no aprovo a comparao aqui feita entre a guerra dos Hasmoneus e a dos Seis Dias. Esta no foi travada em nome da Tor e por ela, nem sob sua inspirao. Ela foi conduzida sob o signo e pela fora do patriotismo judeu, ao qual me associo e que comum a centenas de milhares de judeus, sejam ou no observantes da Tor. Mas o meu patriotismo, como o de qualquer outro judeu, no tem nenhum sentido religioso. Aquele que luta pela nao, pela ptria e pela liberdade motivado pela nao, pela ptria e pela liberdade, coisas perfeitamente legtimas e humanas tanto para o judeu quanto para o no-judeu. Mas somente a vontade de servir a Deus que est investida de uma significao religiosa. Aquele que cai no campo de batalha pela defesa de seu povo, de seu pas ou dos que lhes so caros no morreu pela santidade do Nome Divino e no um mrtir na acepo religiosa do termo. Da mesma forma, o herosmo em combate , ele tambm, algo indiferente do ponto de vista religioso. Ao longo de toda a Histria, tanto a de Israel quanto a das outras naes, encontramos entre os heris e todos aqueles que tombaram, por uma nobre causa Justos e Maldosos, bons e maus, puros e perversos. Esta gerao deu prova de herosmo em combate, e foi graas a ela que ns resistimos e vencemos. Esse herosmo vital para nossa existncia em nosso Estado, mas no em si mesmo um valor e, desnecessrio dizer, no um valor especfico do judasmo.
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Uma pergunta muito importante tem sido feita com frequncia: o que que liga os judeus que vivem segundo a Tor e praticam as mitzvot aos que no as praticam, e o que que faz com que sejam um s e mesmo povo? No grupo humano de aproximadamente catorze milhes de indivduos, que se consideram eles prprios judeus e/ou so como tais considerados pelos outros, h uma parte e espero que no seja a maioria para qual o fato de pertencer ao povo judeu est hoje destitudo de sentido. Eles sabem somente que so de origem judaica e consideram esse fato insignificante, assim como os americanos de origem italiana em relao sua italianidade ou os de origem irlandesa em relao sua irlanidade. Almejam assimilar-se entre os no-judeus e esto, portanto, perdidos para o povo judeu; Mas estamos falando aqui de vrios milhes de judeus, em Israel e no estrangeiro, unidos na conscincia de pertencer ao nosso povo e na vontade de manter esse povo e esse pertencer. No obstante essa conscincia comum e essa vontade coletiva, esse grupo est, ele tambm) dividido em dois: praticantes e no-praticantes. Esta fenda de ordem existencial, e no de ordem judaica e formal. A Halakh no situa o judeu em funo de seu comportamento e seu modo de vida; ela define como filho do povo judeu todo indivduo, que tem obrigao para com o judasmo obrigao de viver conforme a Tor e de praticar as mitzvot , e para ela essa obrigao diz respeito a todo indivduo nascido de uma filha de Israel ou o que se empenha a assegur-la, no caminho ditado por essa mesma Halakh (converso ao judasmo). Visto que tal empenho diz respeito diretamente a um indivduo (por seu nascimento ou por sua converso ao judasmo), ele automaticamente judeu, e no ser jamais dispensado desse dever para com o judasmo. O judeu que no o assume transgressor e, se a Tor fosse aplicada ao p da letra, ele seria levado a um tribunal e at mesmo passvel da pena de morte e por essa razo ele no deixa de ser judeu. Sob esse ponto de vista somos todos filhos do povo judeu, e ligados, uns aos outros; e a esse vnculo formal vm se acrescentar uma memria coletiva e sentimentos comuns. Mas por trs dessa cortina de proclamaes e de sentimentos existe, quanto ao modo de viela, um profundo rasgo, que no permite aos dois campos viverem realmente juntos, e essa diferena factual ir finalmente passar adiante da comunidade de conscincia. Um judeu ou uma judia religiosos no podero casar com um judeu ou uma judia laicos se cada um deles mantiver suas posies e pretender seguir seu modo de vida, nem que
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seja apenas devido s regras de pureza do casal e da famlia;3 e um judeu que observa o Sabbat no pode se associar num empreendimento agrcola ou industrial, num fundo comercial ou num escritrio, ou mesmo numa pesquisa cientfica a um judeu que no o observa; pois o Sabbat no simples dia da semana; ele supe uma organizao dos seis outros dias de maneira a poder observar o Sabbat segundo a Halakh; e um judeu que come kasher no poder se sentar mesa daquele que no respeita as regras de Kashrut. Portanto, nada de casamento, nada de atividade econmica e tcnica em comum, nem mesmo esse gole que tomado junto e que aproxima os coraes. Como, em tais condies, se pode manter a unidade da nao? No, h nisso, alis, nada de novo: ao longo de toda a histria de Israel a Tor e as mitzvot foram fatores de diviso entre o povo: a ciso entre os servidores de Deus e os adoradores do Baal, entre judeus e samaritanos, entre hassidim e helenizantes, entre rabinistas (ou talmudistas) e caratas.4 Ehieh de Silo, Ezra e Neemias, e os Sbios de Israel sob a dinastia dos Hasmoneus, e ainda mais tarde, no hesitaram em dividir o povo em nome do que lhes era ainda mais precioso que o interesse nacional em nome da Tor de Deus. possvel que tambm ns, em vida, venhamos a conhecer uma tal crise, mas em Israel onde a paixo comum pelo nacionalismo e pelo patriotismo esconde a fissura, a unidade da nao se tornou um tema sagrado ao mesmo tempo para os religiosos e para os laicos. Os valores no criam a unio, mas, ao contrrio, a dividem. Foi sempre assim e a Histria, tanto a de Israel quanto a das outras naes, est a para prov-lo. Em Israel, pode-se falar de unio nacional entre os representantes de diferentes correntes e partidos polticos, mas na realidade ela s existe sob a forma de um certo consenso assegurando a todos o gozo de um negcio em comum,o Estado, em virtude de um acordo entre as diferentes partes. E esse um dos fatores da decadncia espiritual, moral e religiosa em nossa sociedade, e tambm uma pequena contribuio do Estado soluo do
Convm lembrar aqui, no que se refere a esse ponto fundamental, que a lei sobre casamento e divrcio da Knesset do Estado de Israel no faz nenhum sentido. 4 Caratas: a seita que se separou do judasmo no sculo VIII. Os caratas rejeitam a Halakh ou seja, a Tor oral e s reconhecem a Tor escrita, que pretendem aplicar ao p da letra. Os herdeiros dessa seita, alguns milhares, vivem hoje em Israel.
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problema dos judeus que procuram sinceramente um contedo e uma expresso para sua identidade judaica. As divises decorrentes de uma luta sobre valores dados so tributrias da realidade de toda sociedade ou civilizao. Quanto religio, ela s justifica sua existncia na medida em que oposio aos valores da laicidade. O que ns precisamos, a fim de recuperar nossa sade espiritual,. exatamente aquilo que tanto assusta os ingnuos (ou os que se fazem de ingnuos) e que chamado, na gria poltica europeia, um Kulturkampf.

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