Demografia - (Apontamentos) Jorge Loureiro
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NDICE
1. A CINCIA DA POPULAO: A PROGRESSIVA MATURAO DA
COMPLEXIDADE DO SEU OBJECTO DE ESTUDO
1.1. As primeiras reflexes sobre a populao
1.2. A questo da populao no sculo XVIII e a emergncia da Demografia como
cincia
1.3. A importncia do pensamento de Malthus na emergncia da cincia da
populao
1.4. Malthusianismo, neomalthusianismo e as reaces ao pensamento
malthusiano
1.5. A transio demogrfica
1.6. O objecto de estudo da Demografia
1.7. Unidade e diversidade da Demografia
1.7.1. A Demografia Histrica
1.7.2. Os Estudos de Populao ou Demografia Social
1.7.3. As Polticas Demogrficas
1.7.4. A Ecologia Humana
1.8. A metodologia da Demografia
2. A EXPLOSO DEMOGRFICA: UM VELHO PROBLEMA COM NOVAS
DIMENSES
2.1. A populao antes do aparecimento da escrita
2.2. Os primeiros dados numricos de interesse demogrfico
2.3. A Antiguidade: do crescimento ao primeiro mundo cheio
2.4. O Nascimento do Ocidente Medieval e o declnio da populao
2.5. A recuperao demogrfica do Ocidente Medieval e o aparecimento de um
segundo mundo cheio
2.6. A peste negra
2.7. O Modelo Demogrfico do Antigo Regime
2.8. O crescimento da populao na Europa Ocidental e o terceiro mundo cheio
2.9. A evoluo da Populao nas restantes partes do mundo
2.10. A exploso demogrfica: um fenmeno novo ou um velho problema com
novas caractersticas?
3. ASPECTOS INICIAIS DE UMA INVESTIGAO EM ANLISE DEMOGRFICA:
OS RITMOS DE CRESCIMENTO E A ANLISE DAS ESTRUTURAS
DEMOGRFICAS
3.1. Volumes, ritmos de crescimento de uma populao e densidades
3.2. As estruturas demogrficas
3.2.1. As pirmides de idades
3.2.2. As relaes de masculinidade
3.2.3. Os grupos funcionais e os ndices-resumo
3.2.4. O envelhecimento demogrfico
4. OS SISTEMAS DE INFORMAO DEMOGRFICA E A ANLISE DA
QUALIDADE DOS DADOS
4.1. Os sistemas de informao demogrfica
4.1.1. Os recenseamentos da populao
4.1.2. As estatsticas demogrficas de estado civil
4.1.3. Outros sistemas de informao demogrfica
4.2. A anlise da qualidade da informao
4.2.1. A Relao de Masculinidade dos Nascimentos
4.2.2. O ndice de Whipple
4.2.3. O ndice de Irregularidade
4.2.4. O ndice Combinado das Naes Unidas
4.2.5. A Equao de Concordncia
5. OS PRINCPIOS DE ANLISE DEMOGRFICA
5.1. O Diagrama de Lexis
5.2. Princpios Gerais de Anlise Demogrfica
5.3. Princpios de anlise longitudinal
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5.4. Princpios de anlise em transversal
6. ANLISE DA MORTALIDADE
6.1. As Taxas Brutas de Mortalidade enquanto medidas elementares da
mortalidade geral
6.2. As medidas de mortalidade em grupos especficos
6.2.1. As medidas de mortalidade infantil
6.2.2. A mortalidade por meses
6.2.3. A mortalidade por causas de morte
6.3. O princpio da translao: a construo das tbuas de mortalidade
7. ANLISE DA NATALIDADE, FECUNDIDADE E NUPCIALIDADE
7.1. As Taxas Brutas enquanto medidas elementares de anlise da natalidade e
da fecundidade
7.2. Tipos particulares de natalidade e fecundidade
7.2.1. A fecundidade por idades e por grupos de idades
7.2.2. A fecundidade dentro do casamento
7.2.3. A fecundidade fora do casamento
7.2.4. A natalidade por meses
7.3. O princpio da translao
7.4. Anlise da nupcialidade e do divrcio: as taxas brutas enquanto medidas
elementares de anlise
8. ANLISE DOS MOVIMENTOS MIGRATRIOS
8.1. Os mtodos directos de anlise dos movimentos migratrios
8.2. Os mtodos indirectos de anlise dos movimentos migratrios
8.2.1. A equao de concordncia
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1. A CINCIA DA POPULAO: A
PROGRESSIVA MATURAO DA
COMPLEXIDADE DO SEU OBJECTO DE
ESTUDO
No presente captulo apresentamos, de forma sinttica, o modo como foi
amadurecendo ao longo dos sculos a conscincia das grandes questes directa ou
indirectamente ligadas aos aspectos quantitativos da dinmica populacional.
Quem foram e o que disseram os homens que transformaram em cincia um
conjunto de problemas que nos aparecem relatados nos primeiros documentos
escritos? Qual realmente o objecto de estudo da Demografia? Quais so as
grandes teorias e os grandes problemas de Demografia na poca contempornea?
Por que que a Demografia simultaneamente una e diversa? Quais so as
grandes divises da cincia da populao actual? Estas so algumas das questes
que iremos analisar neste captulo introdutrio.
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populao. Talvez tivesse sido a caracterstica urbana do ideal estacionrio
que impossibilitou a percepo da existncia de um declnio demogrfico, o
qual seria fatal para a continuidade temporal desta importante civilizao.
J muito prximo do final da civilizao grega, o historiador Polbio
(200-120 a. C.), contemporneo de um perodo de declnio da populao,
constata que o pas est em decadncia. particularmente interessante esta
observao: A Grcia sofre de uma diminuio de procriao e de uma falta
de homens tal que as cidades esto despovoadas; as pessoas hoje gostam do
fausto, do dinheiro e da preguia a um nvel tal que no se querem casar, ou
quando se casam no querem famlia; no mximo tm dois filhos a fim de os
deixar ricos e de os educar no luxo. (Chaunu, 1990).
Os romanos no so filsofos como os gregos. So militares e juristas
que analisam os problemas populacionais numa ptica prtica, ao sabor dos
acontecimentos. Apesar da abundante legislao os resultados positivos
alcanados foram bastante magros, porque nem sempre ao rigor formal das
leis corresponde um rigor nos costumes.
Globalmente, podemos afirmar que na Antiguidade as questes
relacionadas com a populao foram fundamentalmente analisadas numa
perspectiva poltica e social. Na Idade Mdia, dominada pelo pensamento
cristo, a perspectiva foi bem diferente. Foi dominantemente teolgica e moral.
Trs grandes pensadores destacaram-se por entre os demais na anlise de
problemas que, nos dias de hoje, so o objecto de estudo da Histria da
Populao ou da Histria do Pensamento Demogrfico: Santo Agostinho
(345-430), So Gregrio (540-604) e So Toms de Aquino (1235-1274).
Ao admitir que a maioria das pessoas incapaz de praticar semelhante
ascetismo, a Igreja defende igualmente o valor do casamento, desde que este
seja indissolvel e fecundo.
nesta linha de pensamento que preciso situar as atitudes de Santo
Agostinho (345-430) e de So Gregrio (540-604) ao defenderem que o
casamento une marido e mulher para gerar filhos. A fome, a guerra, ou
qualquer outro cataclismo que se abata sobre a humanidade considerado um
acidente que no pode pr em causa a confiana na providncia divina.
No fim da Idade Mdia, uma mudana intelectual comea a operar-se. O
pensamento de So Toms retomado e desenvolvido pelos escolsticos que
procuram subordinar a prpria vida econmica e social doutrina. Cada
indivduo tem direitos e deveres, preciso dar ao trabalho a sua dignidade, o
crescimento da populao um favor divino, o casamento sagrado e o
celibato (com excepo do religioso) condenvel.
Porm, a existncia de um compromisso entre a doutrina crist e a
ordem material ir ser posto em causa com o Renascimento.
Assim, numa primeira fase, a doutrina crist bastante indiferente s
questes relacionadas com a populao o crescei e multiplicai-vos
entendido como ide e ensinai todas as naes. Numa segunda fase, com a
defesa explcita do valor do casamento, desde que tenha como finalidade a
procriao, podemos admitir a existncia de uma atitude implcita em relao
populao, a qual pode ser considerada como moderadamente populacionista.
Uma srie de grandes transformaes est associada emergncia dos
tempos modernos: a intelectual do Renascimento, a geogrfica das
Descobertas, a material da apario do livro, a poltica do aparecimento dos
estados modernos.
nesta linha de ideias e acontecimentos que se deve interpretar o culto
do ideal mercantilista pela riqueza, associado valorizao do Estado. A
existncia de um Estado forte implica a existncia de um exrcito numeroso.
Um exrcito numeroso s possvel quando a populao abundante.
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Neste contexto, no de admirar que a doutrina de inspirao
mercantilista seja considerada, no seu conjunto, explicitamente populacionista.
Este populacionismo defendido por um conjunto variado de pensadores que
explicitam vrias reflexes interessantes sobre a populao, acelerando assim
um processo que ir conduzir ao aparecimento da Demografia como cincia.
No mercantilismo italiano existem trs grandes pensadores com
reflexes particularmente relevantes sobre a populao: Maquiavel
(1467-1527), Campanela (1568-1639) e Botero (1540-1617).
Maquiavel, apesar de o seu pensamento ser globalmente considerado
como mercantilista, no aceita todas as ideias que caracterizam esta corrente
de pensamento, nomeadamente no que diz respeito ao princpio de que o
Estado forte quando favorece o enriquecimento dos cidados.
Campanela elabora os fundamentos filosficos de um comunismo
utpico, desenvolvendo ideias eugnicas muito prximas das de Plato.
Para Botero, uma populao numerosa deve ser a primeira preocupao
do Estado. Para que tal seja possvel, defende o desenvolvimento da
agricultura, da indstria e a diversificao dos ofcios.
No mercantilismo francs existem duas correntes diferenciadas: a que
defende um populacionismo intransigente (Bodin, Montchrestien) e a que
defende um populacionismo mais racional (Vauban).
Bodin (1530-1596) um adepto de um reforo da autoridade do rei.
Elabora algumas anlises interessantes sobre a populao do seu pas,
desenvolvendo uma tese que se resume numa simples frase: No existe maior
riqueza do que os homens. hostil emigrao dos artesos, que na poca
iam em grande nmero trabalhar para Espanha, porque enfraquece o poder da
Frana.
Montchrestien (1575-1621) tem um populacionismo mais qualitativo do
que o de Bodin. Defende o ponto de vista de que a grande riqueza da Frana
a inesgotvel abundncia dos seus homens, mas a abundncia em causa a
de um grupo especfico o dos artesos. A sua multiplicao seria uma forma
de evitar a entrada em massa de estrangeiros, asseguraria o funcionamento
da economia, ajudaria a constituir uma classe mdia forte, de forma a evitar o
confronto entre grupos econmicos muito desiguais.
O mercantilismo de Bodin e Montchrestien foi na prtica materializado
por Colbert, ministro das finanas de Lus XIV, no perodo 1661 a 1683. Este
poltico defendeu o aumento da populao com o argumento de que este
favorvel balana de pagamentos, favorecendo as famlias numerosas e a
imigrao.
No que diz respeito ao estmulo das famlias numerosas, publica leis
importantes: os contribuintes que se casam antes dos 20 anos so isentos de
impostos at aos 25 anos, os que se casam aos 21 anos so isentos de
impostos at aos 24 anos, os pais de 12 filhos vivos legtimos ficam isentos
para sempre de qualquer imposto, os membros da nobreza que tenham mais
de 10 filhos tm direito a uma penso.
Vauban (1633-1707) preconiza um populacionismo mais racional. um
antecessor das ideias que se iro desenvolver no sculo XVIII, ao precisar que
a grandeza de um monarca no se mede pelo nmero dos seus sbditos.
populacionista ao defender que a falta de populao a maior desgraa que
pode acontecer ao reino. Revela-se moderado ao precisar que o volume no
suficiente e que necessrio que os sbditos sejam felizes, em particular os
que pertencem s classes inferiores. Vauban ficou conhecido na histria do
pensamento demogrfico no s pelas estimativas que elaborou (estima em
25 mil o nmero mximo de habitantes que a Frana pode ter), como por ser o
inventor dos recenseamentos, ao chamar a ateno para a sua importncia e
grande utilidade para a administrao: no possvel gerir uma nao sem se
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saber o nmero exacto de habitantes, a sua profisso, religio e condies de
vida.
Na Inglaterra, o mercantilismo toma um aspecto diferente do
mercantilismo francs e do mercantilismo italiano. menos homogneo e
evolui ao longo do tempo. Existem questes de fundo que deram origem ao
aparecimento de duas correntes distintas: no princpio, a populao
considerada como uma varivel, entre tantas outras, do sistema social;
posteriormente, a populao aparece como interessante em si prpria... So
os primrdios da demografia cientfica.
Thomas More (1478-1535), ao estudar as causas da misria do seu pas,
pensa que esta devida a trs factores fundamentais: o luxo da nobreza, a
existncia de muitos domsticos improdutivos e a extenso das pastagens em
prejuzo das terras cultivadas. Denuncia as reservas dos proprietrios da terra,
ergue-se com vigor contra a extenso da criao de carneiros (carneiros
carnvoros que devoram os homens, ao reduzirem as superfcies das terras
cultivadas), considera que a base das cidades so as famlias e desenvolve
ideias de estacionaridade muito prximas das defendidas por Plato.
Francis Bacon (1561-1626) preconiza um crescimento da populao
dominantemente qualitativo, e Thomas Hobbes (1588-1679) concentra as suas
atenes no equilbrio entre a populao e os recursos. Para que exista tal
equilbrio necessrio um esforo produtivo, conteno no consumo, recurso
emigrao e, em caso extremo, o recurso guerra. A linha fundamental do
seu pensamento pode ser resumida na sua famosa frase: O homem lobo do
homem.
Contudo, se estes trs filsofos ingleses esto fundamentalmente
preocupados com o equilbrio entre o crescimento da populao e os recursos,
no sculo XVII, algo de novo ocorre em Inglaterra: a Demografia comea a dar
os seus primeiros passos como cincia.
Aparecem nomes como William Petty, John Graunt e Edmund Halley,
que comeam a considerar que os problemas da populao devem ser
analisados e medidos independentemente das questes doutrinais e das
relaes que possam ter com quaisquer outros problemas econmicos,
polticos e sociais. Estes autores sero objecto de anlise no ponto seguinte.
Nos pases de lngua alem, na poca mercantilista, domina a ideia da
necessidade de uma populao numerosa. Lutero, que comeou a sua aco
em 1517, mostra-se hostil ao celibato e favorvel ao casamento generalizado
a todos os grupos sociais, incluindo o religioso. Ernst Carl (1682-1743) talvez
seja o nico a pr o acento tnico, maneira inglesa, no equilbrio entre a
populao e os recursos, ao defender o princpio de que um pas deve viver
dos seus prprios recursos. Em todo o caso, o pensamento mercantilista
alemo bastante mais moderado do que o francs e o italiano.
Em sntese, a poca mercantilista poca do absolutismo dos prncipes
uma poca dominada pela ideia do crescimento da populao ser um bem
precioso a defender. No de admirar tal facto. A populao progredia muito
lentamente, era constantemente ameaada pelas crises e era necessrio
proteger o comrcio dos prncipes com um exrcito numeroso, o qual s seria
possvel com uma populao numerosa.
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homens. Mirabeau tambm julga que a Europa do seu tempo se est a
despovoar e que a causa principal a decadncia da agricultura, o luxo e o
consumo demasiado de um pequeno nmero de habitantes. Esta viso
verdadeiramente optimista da relao entre a populao e a subsistncia,
subjacente ao pensamento de Mirabeau, como alis ao de todos os outros
fisiocratas como Quesnay (1694-1774) e Necker (1732-1804), resume-se na
seguinte frase: O maior bem so os homens e, em seguida, a terra.
Finalmente, sem procurarmos ser exaustivos, existe um conjunto de
autores que durante o sculo XVIII, ao explicitarem a ideia da progresso
aritmtica, da progresso geomtrica, do equilbrio entre a populao e os
recursos, como o caso de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), William
Godwin (1756-1836), Adam Smith (1732-1790), Benjamin Franklin
(1706-1790), Stewart (1712-1780), Young (1741-1820), anunciam o
aparecimento de Malthus e da Demografia como cincia.
A paternidade da palavra Demografia , em geral, atribuda a Achille
Guillard. Em 1855 publicou uma obra intitulada Elementos de Estatstica
Humana ou Demografia Comparada (Guillard, 1855). Curiosamente, no
prefcio, o autor pede desculpa ao leitor pela fraqueza de ter cedido s
exigncias do seu editor. As exigncias consistiram em Achille Guillard, por
razes comerciais, ter sido obrigado a alterar o ttulo inicialmente previsto para
esta obra Estudos de Demografia Comparada.
Estes primeiros passos consistiram em considerar os temas
populacionais como interessantes em si, sendo por isso passveis de
tratamento cientfico. O acento tnico comea a deixar de ser exclusivamente
posto na discusso das vantagens e inconvenientes do crescimento da
populao, no equilbrio entre a populao e os recursos, ou ainda na
discusso das consequncias de certos aspectos qualitativos e quantitativos
de uma populao. O que passou a ser importante foi a procura de uma
medio rigorosa daquilo a que hoje chamamos os movimentos e o estado de
uma populao. a fase dos aritmticos polticos.
William Petty (1623-1687) foi o primeiro a inventar o termo, cujo
contedo procura explicitar logo no prefcio da sua obra intitulada Aritmtica
Poltica: O mtodo que emprego ainda no muito vulgar... consiste em
exprimir em termos numricos, pesos e medidas, em servir-me unicamente
dos argumentos dados pelos sentidos, em considerar exclusivamente as
causas que tm bases visveis na natureza... (Dupquier, 1985).
Porm, foi John Graunt (1620-1674) quem verdadeiramente escreveu o
primeiro livro de Aritmtica Poltica intitulado Observaes naturais e polticas
feitas atravs das Listas de bitos (Vilquin, 1977).
Edmund Halley (1656-1742), astrnomo e matemtico, foi igualmente um
dos primeiros cientistas da populao. Os seus trabalhos so bastante
interessantes devido anlise que faz da qualidade dos dados existentes nos
arrolamentos utilizados.
Buffon (1707-1788) explicita trs leis fundamentais da fecundidade
animal:
a fecundidade inversamente proporcional dimenso do animal,
o nmero de nascimentos masculinos excede o nmero de nascimentos
femininos e
a domesticao das espcies aumenta a fecundidade.
Contudo, na histria natural do homem que encontramos vrios
ensinamentos importantes para a consolidao do pensamento demogrfico
numa perspectiva cientfica. precisamente a partir da verificao que o
homem morre em qualquer idade, que lhe surge a ideia de construir uma tbua
de mortalidade em termos cientficos. Como, na poca, os seguros eram
elaborados a partir das tbuas dos bitos dos clientes, Buffon apercebe-se da
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existncia de uma veracidade duvidosa por dizer respeito a uma populao
muito particular a populao dos rendeiros. Consegue mostrar que se tem
uma possibilidade em duas, de morrer antes dos 8 anos de idade e que a
esperana de vida (este termo no empregue por Buffon) de 28 anos.
Johann Peter Sussmilch (1707-1767), em a Ordem Divina (Hecht, 1984),
levou a efeito um conjunto de anlises demogrficas notveis. O seu objectivo
claramente teolgico, ao afirmar que o povoamento da terra est sempre
conforme a vontade do criador e que a Ordem Divina se manifesta de vrias
formas, nomeadamente atravs da relao entre os nascimentos e os bitos.
Daniel Bernoulli (1700-1782), mdico e matemtico, o autor do
teorema sobre a lei dos pequenos nmeros.
Finalmente, Moheau (1745-1794) publicou em 1788 uma obra intitulada
Investigaes e Consideraes sobre a Populao da Frana. Se Petty,
Graunt e Halley so referenciados como os iniciadores da atitude cientfica em
relao populao, se Guillard inventa a palavra Demografia, Moheau
escreve o primeiro tratado de demografia cientfica. Moheau parte dos factos
para a teoria segundo um mtodo indutivo e favorvel ao aumento da
populao. Confiante no progresso da tcnica e no desenvolvimento da diviso
do trabalho, pensa que a populao pode ser superior fecundidade do solo,
desde que se encontrem na indstria os meios de suprir as suas
necessidades. Condena o luxo, a desigual repartio da riqueza e bastante
crtico em relao aos costumes da sua poca.
Porm, em finais do sculo XVIII, na sequncia de todo este conjunto de
ideias e mtodos, que surgiram em torno da problemtica populacional, um
acontecimento particularmente importante vai marcar o desenvolvimento da
Demografia como cincia da populao Malthus publica o seu Ensaio sobre
o Princpio da Populao.
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O livro faz escndalo devido a uma das suas teses: a assistncia aos pobres
no serve seno para os multiplicar sem os consolar. Tambm escandaliza
devido forma como a tese apresentada. Um simples pargrafo
desencadeia uma grande indignao num mundo onde emergiam os ideais da
igualdade, do socialismo e da solidariedade entre as classes oprimidas: Um
homem que nasce num mundo ocupado, se no lhe possvel obter dos seus
pais os meios de subsistncia... e se a sociedade no tem necessidade do seu
trabalho, no tem direito a reclamar a mnima parte da alimentao e est a
mais. A notcia de que existem alimentos para todos enche a sala de
numerosas pessoas. A ordem e a harmonia da festa so perturbadas, a
abundncia que reinava anteriormente transforma-se em fome, a alegria dos
convivas aniquilada pelo espectculo da misria e da penria que reinaro
em todas as partes da sala e pelos clamores inoportunos daqueles que esto
furiosos por no encontrarem os alimentos que lhes tinham prometido.
(Vilquin, 1980).
A controvrsia que o pargrafo do banquete gerou nos sales elegantes
da poca foi de tal forma importante que fez passar para segundo plano os
aspectos mais interessantes da sua obra.
A grande diferena entre os vrios ensaios fundamentalmente entre as
primeiras duas edies. Esta diferena mais do que uma simples questo
formal. Foi o tipo de trabalho efectuado e o tom com que foi escrito que foi
profundamente modificado na viragem do sculo. A primeira edio terica,
onde o princpio da populao funciona como argumento principal na polmica
que ope Malthus a Godwin e a Condorcet. A segunda edio um autntico
tratado de natureza cientfica, bem fundamentado em numerosas observaes
quantificadas e em leituras.
Talvez toda a polmica gerada em torno do contedo e do verdadeiro
sentido das diferentes edies estivesse resolvida se, como sugere J.
Dupquier (Vilquin, 1980), Malthus tivesse chamado Ensaio apenas primeira
edio, uma vez que a partir da segunda edio o que se tem um Tratado do
Princpio da Populao com pequenas variaes formais entre esta ltima e as
quatro seguintes revistas em vida por Malthus.
No difcil encontrar precursores do seu pensamento mas, uma vez
que o prprio autor reconheceu a sua dependncia em relao a determinados
nomes, interessante apreciarmos o contedo dessas ideias. Os autores que
influenciaram Malthus intervm em momentos diferentes do tempo:
existem autores que provocaram o ensaio Godwin e Condorcet a
tal ponto que, na 1. edio, os seus nomes so mencionados;
no prefcio da 2. edio Malthus esclarece que, na 1. edio (1798),
utilizou apenas os materiais que tinha sua disposio no campo, ou
seja, as obras de David Hume, Robert Wallace, Adam Smith e Richard
Price;
na 2. edio, utiliza as obras fundamentais de Montesquieu, Franklin,
Stewart, Young e Townsend.
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populao inerente a este estado de felicidade? Godwin pensou no
problema e responde antecipadamente a eventuais crticas dizendo
que, em primeiro lugar, a populao se adapta aos meios de
subsistncia de que dispe e que, em segundo lugar, numa sociedade
igualitria, o equilbrio mais fcil porque os homens apenas
procriaro quando devem; finalmente, Godwin pensa que ridculo
temer no presente problemas que apenas iro ocorrer no futuro.
Condorcet (1743-1794) este filsofo procura elaborar uma sntese
histrica dos progressos do esprito humano; nele encontramos a
mesma f numa sociedade igualitria, na perfeio humana, no
progresso da cincia e interessa-se por esclarecer a questo da
expanso demogrfica porque pode criar problemas ao seu sistema
igualitrio; Condorcet acredita que a questo populacional um
problema longnquo porque a espcie humana encontrar luzes que
no momento no so imaginveis, prevendo assim o progresso da
agricultura; a perspectiva de ver a humanidade atingir o limite dos
meios de subsistncia no o assusta porque no futuro a contracepo
regular a populao.
Para responder a estes dois autores que provocaram o ensaio, Malthus,
na 1. edio, inspira-se fundamentalmente em quatro autores:
David Hume (1711-1776) para este filsofo existe uma enorme
capacidade prolfica nas populaes devido ao rpido crescimento da
populao nas colnias e capacidade de recuperao a seguir a um
desastre; a quantidade de meios de subsistncia um obstculo no
qual vai embater a capacidade prolfica dos homens; D. Hume
optimista ao pensar que um bom governo capaz de fazer aumentar
os meios de subsistncia, no defendendo o ponto de vista de que
preciso travar o instinto de reproduo e que o crescimento da
populao a origem de todos os males, ao contrrio de Malthus, que
pessimista ao afirmar que o nico remdio o domnio do instinto,
uma vez que o melhor dos governos nada pode fazer;
Robert Wallace (1694-1771) defende ideias contrrias s de D. Hume
ao afirmar que as populaes eram mais numerosas no passado
porque obstculos como a pobreza, o luxo, as instituies corrompidas
so mais actuantes nos tempos modernos; procura igualmente
demonstrar qual seria o crescimento da populao se ela dependesse
unicamente da sua tendncia para a multiplicao, ou seja, se os
governos afastassem todos os obstculos; explicita assim, a ideia da
progresso geomtrica que ser um dos pilares do pensamento de
Malthus, bem como a ideia de que uma sociedade igualitria corre a
caminho da perdio devido reproduo descontrolada dos homens
e avareza da terra; antes de Malthus, Wallace desenvolve ideias
contrrias s de Godwin e Condorcet; Malthus apenas o criticar pelo
facto de Wallace pensar que este problema s ocorrer num futuro
longnquo;
Adam Smith (1723-1790) ao observar a dinmica do instinto
reprodutor interroga-se acerca da existncia de uma duplicao da
populao cada 25 anos na Amrica, quando na Europa tal no
acontece; a explicao s pode residir na existncia de meios de
subsistncia abundantes; para Adam Smith a escassez de meios de
subsistncia agrava a mortalidade infantil das classes inferiores
(obstculo positivo para Malthus) e desencoraja o casamento porque,
paralelamente ao instinto de reproduo, existe o instinto de poupana
e de melhoria das condies de vida (obstculo preventivo de
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Malthus); Malthus aprendeu com Adam Smith a ideia de duplicao da
populao a um ritmo rpido quando os recursos so abundantes, a
ideia de que a expanso demogrfica mais lenta quando existe uma
insuficincia de meios e a ideia de equilbrio entre populao e meios
de subsistncia;
Richard Price (1723-1791) importante no pelas ideias mas pela
informao numrica sobre o crescimento da populao americana
que Malthus utilizar em diversas passagens do seu Ensaio.
Em sntese, antes de Malthus j se pensava que uma populao,
submetida influncia nica do instinto de reproduo, duplica cada 25, 20 ou
15 anos, que a terra era incapaz de produzir uma quantidade de alimentos
suficiente para acompanhar este crescimento populacional, que existem
obstculos que podem ajustar as populaes ao nvel de recursos disponveis.
Malthus, aproveitando todas estas ideias dispersas, original pela ligao que
estabelece entre todas elas, pela fora e preciso com que trata estes temas,
pelas anlises detalhadas que elabora dos diversos tipos de obstculos e por
ter explicitado as consequncias do princpio da populao.
neste contexto que justo reconhecer a importncia de Malthus, no
s em ter chamado a ateno para a importncia da populao no
funcionamento da sociedade como por ter dado um contributo decisivo
consolidao de uma cincia da populao. verdade que o pensamento de
Malthus rico, variado e polmico, mas que existe explicitamente uma clara
atitude cientfica em relao populao um mrito que todos temos de lhe
reconhecer, concordemos ou no com as suas ideias.
O fundamental sobre a atitude cientfica de Malthus em relao
populao encontra-se concentrado nos captulos I e II do Livro I e no captulo
I do Livro IV e pode ser sistematizado em torno de trs eixos fundamentais:
populao e subsistncia, obstculos e remdios.
1. Populao e subsistncia Malthus distingue duas leis antagnicas: a
lei da populao que cresce em progresso geomtrica (1, 2, 4, 8, 16,
32...) e a da subsistncia que cresce em progresso aritmtica (1, 2, 3, 4,
5, 6...). Para Malthus a lei da populao pode ser formulada nos seguintes
termos: quando a populao no controlada, duplica todos os 25 anos,
crescendo de perodo em perodo, segundo uma progresso geomtrica,
enquanto que os recursos tm tendncia a crescer segundo uma
progresso aritmtica.
Esta viso simples e catastrfica necessita de uma resposta a duas
questes fundamentais que esto intimamente associadas: o que uma
populao no controlada? Qual o ritmo malthusiano de crescimento?
Em relao primeira questo, o pensamento do autor muito pouco claro
na 1. edio. S a partir da 2. edio, Malthus explica quais so as trs
condies para que uma populao cresa rapidamente:
os casamentos so fecundos porque contrados numa idade precoce;
quanto maior for o nmero de crianas, maior ser o nmero de
casamentos mais tarde;
o intervalo que medeia entre o casamento e a morte tende a aumentar
devido ao aumento da durao mdia de vida.
Em relao segunda questo, o crescimento malthusiano significa que a
populao duplica cada 25 anos, como o caso da populao americana.
Qualquer populao com base no mesmo instinto tende igualmente a
crescer a este ritmo, se bem que em muitos casos os obstculos o tornem
impossvel... a progresso geomtrica no algo de real mas uma
tendncia.
15
No deixa de ser admirvel, neste incio do sculo XXI, constatarmos como
Malthus soube visualizar, no incio do sculo XIX, os elementos internos da
dinmica das populaes humanas e as suas consequncias a
percepo do fim do casamento tardio, o efeito gerao, as consequncias
do aumento da durao mdia de vida.
Malthus admite que possam existir factores que contrariem a lei da
populao tal como a utilizao de novas terras, a importao de produtos
alimentares e o progresso tcnico, mas, so factores que no resolvem o
problema do equilbrio entre a populao e os recursos, apenas o adiam,
no acreditando por isso que sejam uma soluo... e passado o sculo XIX
e olhando para o sculo XX sabemos hoje como Malthus no se enganou.
2. Os obstculos ao crescimento da populao coexistem dois tipos de
classificao nas sucessivas edies do ensaio. Na edio de 1798,
Malthus apenas admite o vcio e a misria; a partir de 1803, junta um
terceiro obstculo a obrigao moral.
Quanto ao vcio, difcil compreender o seu pensamento. Em todo o caso,
Malthus distingue dois tipos de vcios:
o vcio no celibato (celibato sem respeitar as regras da castidade) e
o vcio no casamento (infanticdio, aborto, mtodos anticoncepcionais,
instabilidade das unies e adultrio).
Quanto misria, este obstculo engloba um conjunto de factores que
levam morte prematura. Os agentes mais importantes so os que esto
ligados insuficincia dos meios de subsistncia maus climas, trabalhos
penosos, guerra.
Por ltimo, a obrigao moral. Malthus entende que se trata do celibato em
conjunto com a castidade prolongada, at ao momento em que se capaz
de alimentar uma famlia.
Contudo, Malthus no acredita que os homens sejam suficientemente
virtuosos para praticar a obrigao moral.
3. Os remdios Malthus no hesita em afirmar que o nico remdio que
no prejudica nem a felicidade moral nem a felicidade material a
obrigao moral. Mas, antes de analisarmos este remdio, vejamos o que
que se entende por falsos remdios que s servem para agravar a
situao:
os sistemas igualitrios so os preconizados por Godwin e
Condorcet, os quais, Malthus critica severamente por no resolverem o
problema fundamental;
a emigrao em 1798 no acredita nesta soluo mas, em 1817, j
afirma que pode trazer algum consolo sem, contudo, resolver a questo
formulada no seu princpio da populao;
a lei dos pobres que Malthus considera como um factor de expanso
da misria; um aumento na procura sem que aumente em paralelo a
produo provoca necessariamente uma alta de preos... esta alta de
preos vai fazer com que muitos que viviam do seu trabalho sejam
obrigados a recorrer assistncia... o que representa um factor de
multiplicao dos pobres; acresce ainda o facto de esta lei encorajar a
proliferao dos mais necessitados, uma vez que estes no
encontraro razes para retardar o casamento... neste contexto que
escrita uma frase que provoca um escndalo quase igual frase do
banquete os pobres no tm o direito a viver no por culpa das
classes mais abastadas, nem devido falta de clarividncia do governo
mas devido pura e simplesmente escassez dos meios; no entanto,
medida que as edies vo sendo revistas, Malthus atenua a sua
16
posio inicial admitindo at, na ltima edio, alguma caridade pblica
e privada;
crescimento dos meios de subsistncia Malthus admite que um pas
rico e industrializado possa, graas aos seus produtos manufacturados,
comprar meios de subsistncia e atenuar os efeitos da lei da
progresso geomtrica; mas, apenas se est a adiar a resoluo do
problema, porque o desenvolvimento econmico dos pases
exportadores pode alterar o equilbrio existente.
neste contexto que emerge a soluo da obrigao moral como sendo
a nica soluo possvel. A riqueza do pensamento de Malthus reside na
forma como soube sintetizar e articular um conjunto de ideias que estavam
dispersas e sem articulao entre si, bem como na anlise da dinmica das
populaes humanas, anunciando assim a emergncia da Demografia como
cincia.
17
na vitria do proletariado porque s sendo numerosos que se toma o poder.
(Russel, 1979).
Com o fim da Primeira Guerra Mundial, seguido da crise econmica dos
anos trinta, este debate de ideias entra em esquecimento na Europa ou, mais
propriamente, no eixo entre Paris e Londres e passa para os Estados Unidos
onde bem aceite.
Foi preciso esperar pelo fim da Segunda Guerra Mundial para que o
Birth Control perdesse a sua componente ideolgica e se transformasse
progressivamente num direito fundamental das pessoas a terem os filhos que
querem e quando quiserem...
Porm, enquanto a maturidade das ideias em torno da sequncia
Malthus-Malthusianismo-Neomalthusianismo-Limitao dos NascimentosPlaneamento Familiar no chegou ao fim, ou seja, enquanto no se
generalizou a ideia de que o direito ao Planeamento Familiar um direito
fundamental que est para alm das opinies de carcter ideolgico, as
reaces ao pensamento malthusiano sucederam-se durante os sculos XIX e
XX.
O pensamento liberal de tendncia malthusiana tem em J. Baptiste Say
(1767-1832) o seu principal representante ao constatar que, a natureza
multiplicou os germens da vida com uma profuso tal que, quaisquer que
sejam os acidentes subsiste sempre um nmero de pessoas mais do que
suficiente para que a espcie humana continue. Partilha com Malthus a opinio
de que a populao de um pas deve ser proporcional aos recursos e que os
homens no so suficientemente previdentes. A maior originalidade de J. B.
Say reside na substituio da noo malthusiana de meios de subsistncia
pelo conceito de meios de existncia, onde se inclui para alm dos bens
alimentares outros bens como o vesturio, a habitao e outros bens
necessrios a que hoje chamamos condies bsicas de existncia.
Um ponto de convergncia com Cantillon a interpretao cultural das
necessidades o meio social faz variar a intensidade das necessidades, os
membros de certos grupos sociais contentam-se em viver com pouco,
enquanto que outros, pelo contrrio, so mais exigentes, sendo por isso o
nmero de habitantes uma funo dependente do modo de vida.
Joseph de Maistre (1753-1821) adepto da origem divina da sociedade,
admira a soluo proposta por Malthus para resolver o problema da populao
incluindo o recurso ao celibato como forma para controlar a populao.
Em Inglaterra, as ideias malthusianas expandem-se muito rapidamente e
foi neste pas que se realizou a primeira campanha a favor da limitao dos
nascimentos. Do ponto de vista doutrinal, so vrios os autores que adoptam o
pensamento de Malthus na sua variante neomalthusiana nos quais se destaca
Stuart Mill (1806-1876). Retoma o ideal estacionrio de Plato cuja construo
ser possvel atravs do individualismo, do gosto pela independncia e pelo
desenvolvimento das responsabilidades. dos primeiros autores a pensar que
a generalizao do trabalho feminino ter como consequncia o declnio da
natalidade.
Durante o sculo XX a escola liberal francesa afasta-se
progressivamente das teses malthusianas, e no fim do sculo est consumada
a separao com os restantes pensadores liberais.
A. Dumont (1849-1902) chama ao processo de movimentao na
estrutura social a capilaridade social, que se manifesta particularmente nas
sociedades democrticas que combinam a igualdade social com a igualdade
econmica.
Para mile Durkheim (1858-1917), um dos fundadores da sociologia
cientfica, a expanso da populao acompanhada por uma mudana
18
qualitativa da sociedade. A competio e a luta pela vida no seio de uma
sociedade so tanto mais vivas quanto mais a populao se torna densa.
A soluo s pode ser encontrada intervindo directamente na populao,
ou seja, incitar os trabalhadores a trabalharem mais e a terem menos filhos.
Os autores socialistas, pelo contrrio, defendem globalmente o ponto de vista
que uma aco directa sobre a populao deve passar para segundo plano,
porque s com uma modificao profunda das estruturas capitalistas
possvel trazer uma soluo durvel aos problemas com que se debatem os
trabalhadores.
Charles Fourier (1772-1837) contra as ideias malthusianas por pensar
que a sociedade deve criar condies de crescimento harmnico, e que uma
mudana nos costumes no domnio alimentar, no trabalho das mulheres ou na
educao fsica suficiente para disciplinar naturalmente a fecundidade.
Proudhon (1809-1865) procura provar que a ameaa malthusiana falsa
e alarmista contrapondo um conjunto de clculos que tm como objectivo
demonstrar que o Princpio da Populao assenta em clculos irrealistas. So
clculos sem fundamentao e de qualidade duvidosa. No entanto,
interessante salientar que o principal terico das ideias anarquistas chame a
ateno para a aco moderadora da civilizao no instinto de reproduo.
Marx (1818-1883) critica Malthus por ter concebido a sua lei da
populao no contexto de uma sociedade natural, composta por seres
humanos isolados, entregues livre concorrncia e ignorando o facto de os
fenmenos populacionais, tal como todos os outros fenmenos sociais,
estarem submetidos evoluo histrica. Admite que no sculo XIX existe um
excesso de populao, mas tal no se pode generalizar a outros momentos da
histria, porque estes excedentes so devidos estrutura econmica da
sociedade liberal e no penria de bens alimentares. Em ltima anlise, o
sistema capitalista que responsvel pelo elevado nmero de
desempregados, porque obriga os empresrios a aumentarem o capital fixo
em detrimento do capital circulante que serve para remunerar os
trabalhadores.
Engels (1820-1895) e Lenine (1870-1924) tambm defendem ideias
muito prximas de Marx, no acrescentando praticamente nada de novo ao
afirmarem que o malthusianismo uma doutrina de classe dirigida contra os
trabalhadores. Talvez o aspecto mais interessante do seu pensamento resida
na associao do pessimismo malthusiano decadncia da burguesia, que
est inquieta em relao ao futuro porque sabe que a sua posio de classe
dominante tem os dias contados.
A maior parte dos autores anarquistas julga que os recursos alimentares
so suficientemente abundantes para alimentar a totalidade da populao e
que a questo da populao um falso problema. No entanto, encontramos
vrios textos com posies manifestamente neomalthusianas. So posies
muito pouco fundamentadas, quer cientificamente quer doutrinalmente, e no
apresentam, em geral, argumentos com elementos novos.
O homem devasta a terra, cultivando-a sistematicamente e sem
precauo, fazendo com que os recursos alimentares comecem a ser
insuficientes face a uma populao que no pra de crescer. Foi com base nas
suas investigaes sobre este tema que William Vogt anunciou o fim do
mundo pela fome no mundo. A posio do agrnomo francs Ren Dumont
muito semelhante, apenas diferindo da anterior pela incluso mais explcita da
componente ambiental. Recusa uma civilizao baseada no consumo e
contra o crescimento descontrolado da populao por aumentar a poluio e
delapidar as riquezas existentes.
Na mesma linha de preocupaes temos Josu de Castro, que
considerado um antimalthusiano por defender a ideia que no o excesso de
19
populao que gera a fome mas o inverso. As carncias alimentares
estimulam o instinto sexual e aumentam a fecundidade das populaes: Os
bens alimentares na mesa do pobre so escassos mas o seu leito fecundo.
Josu de Castro verificou que os pases de maior fecundidade so os de
menor consumo de protenas e que inversamente os de menor fecundidade
so os de maior consumo de protenas.
O debate sobre as questes do excessivo crescimento da populao ,
no entanto, admiravelmente enriquecido e sistematizado durante o sculo XX
com Alfred Sauvy. As dezenas de obras importantes que publicou, em
particular na segunda metade do sculo, no permitem reduzir a riqueza do
seu pensamento a meia dzia de frases simplistas nem to pouco possvel
examinar a importncia de todo o seu legado cientfico. Escolhemos apenas as
temticas que, em nosso entender, so as mais relevantes no s pela
profundidade com que foram tratadas nas sucessivas obras que foram
publicadas como pela actualidade que ainda hoje tm.
O primeiro grande tema est relacionado com o complexo de anlises
feito acerca do tema o ptimo da populao. O problema da populao que at
ao aparecimento de Sauvy tinha sido sempre discutido numa perspectiva de
relao entre a populao e os recursos passa a ter uma configurao muito
diferente e pragmtica: qual deve ser o nmero ptimo de habitantes de um
dado territrio para que o nvel de vida seja o mais elevado possvel? Esta
formulao inicial do problema teve consequncias assinalveis a todos os
nveis de pensamento e da administrao, na medida em que no se trata de
saber se existe gente a mais ou gente a menos, mas de saber num
determinado pas (ou uma determinada regio) qual o equilbrio ptimo entre
a populao e os recursos. Como no podia deixar de ser surgiram muitas
crticas acerca da possibilidade de encontrar um ptimo da populao para
cada unidade espacial o que levou Sauvy a, numa segunda fase, fixar dois
nmeros exactos, determinados atravs de uma complexa formulao
matemtica, entre os quais podia variar a populao. O seu ptimo de
populao no um nmero rgido, porque entre os dois limites superior e
inferior possvel fixar vrias hipteses intermdias que asseguram o bemestar generalizado da populao. Este ponto de equilbrio dinmico depende
do nvel tecnolgico, dos meios de produo, das necessidades do consumo e
das estruturas sociais, fazendo assim com que este ptimo populacional seja
varivel no tempo e no espao e que possa ser ultrapassado pela populao
real sem que nenhum problema especial ocorra. Na fase final da sua vida e da
sua investigao Sauvy substitui a ideia de ptimo da populao pela ideia de
crescimento ptimo da populao. Mais importante do que encontrar um
nmero fixo de habitantes, ou um intervalo de variao aceitvel, fixar um
ritmo de crescimento ptimo na populao que permita atingir os seus
objectivos especficos, objectivos esses que nunca podem pr em causa a
ordem ambiental, social e econmica em que se insere a populao.
Outra grande temtica de Sauvy a insero da temtica populacional
nos seus clculos de economia da populao, dando assim um contributo
decisivo naquilo a que mais tarde se passou a chamar a nova Ecologia
Humana. O raciocnio prodigioso sob o ponto de vista pedaggico. As cabras
comem a pastagem e os lobos comem as cabras, mas felizmente para as
cabras que os lobos no gostam de pastagem porque, se assim fosse, sendo
mais fortes, comeriam a pastagem toda e as cabras no poderiam existir. Com
base nesta anlise, que pode ser alargada a sistemas mais vastos e
complexos, resultam duas coisas: as cabras devem a vida a quem as come e o
interesse dos lobos o de que no terreno existam montanhas inacessveis a
eles para as cabras se refugiarem. Se um espao plano, os lobos
multiplicam-se, comem as cabras todas e com o desaparecimento da ltima
20
cabra desaparecem todos os lobos, mas se um espao tem redutos
inacessveis, os lobos vo comendo apenas o rendimento sem tocar no
capital, encontrando assim o crescimento ptimo que os permite ajustar ao
crescimento do rendimento disponvel. Em linguagem actual, os
consumidores primrios s podem existir se os produtores no forem
exterminados e os consumidores secundrios s podem existir se no houver
consumo excessivo dos consumidores primrios. No fundo, o que Sauvy nos
transmite que a questo da populao muito mais do que um simples
equilbrio entre populao e subsistncia. o equilbrio entre os diversos
elementos da cadeia alimentar que preciso assegurar em cada unidade
espacial.
Finalmente, o nome de Sauvy ficou para sempre ligado explicao de
um dos maiores dilemas com que nos debatemos no momento actual
crescer ou envelhecer. verdade que os pases no podem crescer
indefinidamente porque no existem condies de alimentao e ambientais
para que tal acontea.
Por vrias vezes Sauvy demonstrou at que ponto as sociedades mais
desenvolvidas seriam todas atingidas por este processo de envelhecimento.
neste contexto que todos os povos esto confrontados com um dos maiores
dilemas da histria da humanidade: crescer ou envelhecer?
21
igualmente elevada; a necessidade de uma descendncia
numerosa uma consequncia da existncia de ms condies
sanitrias, o que implica a existncia de uma mortalidade elevada;
o crescimento natural da populao muito reduzido;
2. fase do declnio da mortalidade como consequncia de uma melhoria
generalizada das condies de higiene e de sade; o nvel de
fecundidade mantm-se inalterado e existe uma consequente
acelerao do crescimento natural da populao;
3. fase do declnio da fecundidade como consequncia de uma nova atitude
face vida apoiada por meios modernos de interveno na
fecundidade; a mortalidade continua a declinar embora a um ritmo
mais moderado e o crescimento natural da populao diminuiu de
intensidade;
4. fase do quase-equilbrio moderno entre uma mortalidade com baixos
nveis e uma fecundidade igualmente baixa; o crescimento natural
da populao tende para zero.
Os diferentes pases do mundo podem assim ser comparados segundo
este modelo, ou seja, atravs da sua situao face ao processo da transio.
A totalidade dos pases em vias de desenvolvimento j passou ou est a
passar pela segunda fase (declnio da mortalidade), e muitos j chegaram
terceira fase (declnio da fecundidade).
A totalidade dos pases desenvolvidos encontra-se na ltima fase da
transio demogrfica e em alguns pases desenvolvidos at j se entrou
numa fase a que se comeou a chamar de ps-transio, devido ao facto de o
seu nvel de fecundidade no garantir a substituio das geraes e de o
nmero dos bitos ser superior ao nmero dos nascimentos.
O sculo XX, sob o ponto de vista demogrfico, foi um sculo onde o
homem aprendeu a controlar o seu destino. O fatalismo milenrio que se
abatia sobre a sua vida biolgica foi dando lugar aco humana e livre
escolha. O homem, depois de ter conseguido dominar a morte, a qual foi
atirada para as idades mais avanadas, acabou por dominar a vida escolhendo
o nmero de filhos segundo os seus desejos (Chesnais, 1995).
medida que nos aproximamos do sculo XX o declnio da mortalidade
expande-se a todos os pases europeus e aos outros continentes tendo como
consequncia mais visvel o aumento da populao: a populao mundial
estimada em cerca de 461 milhes de habitantes em 1500, atinge o primeiro
milhar de milho em 1804, o segundo milhar de milho 123 anos mais tarde
(1927).
O efeito global do declnio da mortalidade s se tornou claramente
perceptvel entre as duas grandes guerras mundiais: globalmente, a taxa de
crescimento da populao nas regies menos desenvolvidas duplica ao passar
de + 0,5% no perodo de 1900-1920 para + 1,0% no perodo entre 1920-1940;
nas regies mais desenvolvidas, apesar da sangria provocada pelas duas
guerras mundiais, o mundo industrializado ainda tem no perodo 1900-1920
uma taxa de crescimento anual mdia ligeiramente superior (+ 0,8%) e, no
perodo de 1920-1940 o ritmo de crescimento igual ao das regies menos
desenvolvidas (+ 1,0%).
a partir de 1940 que a transio demogrfica inicia globalmente o seu
processo nos pases menos desenvolvidos: + 1,3% no perodo 1940-1950,
valores de crescimento anual mdio superiores a 2% at 1990, incio da
reduo do crescimento populacional a partir de 1990 com valores j inferiores
a 2%.
Em sntese, a ideia central da teoria da transio demogrfica, que a
de provar a existncia dos efeitos da modernizao nos comportamentos
22
demogrficos, parece estar mais do que demonstrada pelos factos. A
revoluo contraceptiva fez tambm generalizar a ideia de que um baixo nvel
de fecundidade um smbolo de modernidade, seja escala de um pas seja
escala dos indivduos e dos casais.
23
24
1. no se analisam pessoas isoladas mas conjuntos de pessoas
delimitadas espacialmente e com um significado social (um
continente, um pas, um distrito, uma Nut, um concelho). Esta anlise
feita observando, medindo e descrevendo a dimenso, a estrutura
e distribuio espacial desse conjunto de pessoas;
2. este estudo cientfico da populao no se pode ocupar apenas do
aspecto esttico, ou seja, descrever os aspectos especficos
mencionados num determinado momento do tempo; tambm se deve
preocupar em saber quais so as mudanas ocorridas nos elementos
que caracterizam o estado da populao e qual a intensidade e
direco dessas mudanas;
3. analisa os factores, ou as variveis demogrficas que so
responsveis pelas variaes ocorridas no estado da populao;
essas variveis so de trs tipos: natalidade, mortalidade e
migraes; esta ltima varivel demogrfica abrange trs situaes
distintas emigrao, imigrao e migraes internas; a nupcialidade
no uma varivel demogrfica autntica, porque o seu aumento ou
a sua diminuio no contribuem directamente para a modificao do
estado da populao, actuando dominantemente atravs da
natalidade; em sntese, o estado da populao tem uma determinada
dimenso, estrutura e distribuio espacial, porque nesse conjunto
de pessoas acontecem nascimentos, bitos e migraes;
4. a Demografia tambm se ocupa dos efeitos que cada uma das
variveis demogrficas tem nos aspectos globais e estruturais da
populao, bem como dos efeitos inversos; por exemplo, interessase por saber at que ponto um aumento na natalidade modifica
estruturalmente a populao ou em que medida uma mudana
estrutural da populao se reflecte na modificao da evoluo da
natalidade; finalmente
5. a Demografia tambm se preocupa com questes relacionadas com
as determinantes dos comportamentos demogrficos e com as
consequncias da evoluo do estado da populao.
25
Demografia Social. Tambm o seu desenvolvimento comeou a fazer aparecer
disciplinas como a
Sociologia dos comportamentos demogrficos,
Economia da Populao,
Antropologia da Populao,
Psicologia da Populao,
Ecologia Humana,
Prospectiva,
as quais rapidamente ganharam uma certa autonomia.
Outro ramo que depressa ganhou autonomia, a partir do fim da Segunda
Guerra Mundial, foi a Demografia Histrica, que tem como objectivo
fundamental aplicar os mtodos e as tcnicas da Anlise Demogrfica ao
estudo das populaes do passado. Tambm as Teorias Demogrficas se
desenvolveram ao procurarem analisar e sistematizar os fundamentos tericos
da cincia da populao, dando especial relevo ao pensamento demogrfico.
Finalmente, temos as Polticas Demogrficas que procuram orientar a
evoluo dos comportamentos demogrficos.
Nem todos os ramos tm um desenvolvimento igual nem nos parecem
ser de igual importncia. So raros os pases que atingiram um nvel de
desenvolvimento que permita a existncia de todos os ramos mencionados em
separado. Em geral, as diferentes Demografias aparecem agrupadas em
seis grandes reas disciplinares:
a Anlise Demogrfica,
as Projeces Demogrficas e a Prospectiva,
a Demografia Histrica,
os Estudos de Populao ou Demografia Social,
as Polticas Demogrficas e
a Ecologia Humana
A Demografia caminhou, assim, da unidade inicial, onde a sua
problemtica era formulada em termos simples e fundamentalmente tcnicos,
para uma crescente diversidade e complexidade.
A Demografia tem a vantagem de ser simultaneamente a mais exacta
das cincias sociais e de ser o ponto de encontro das cincias sociais e
humanas com a biologia, o direito, a economia e as cincias polticas. uma
cincia dura no seio das cincias moles, oferecendo um slido ponto de
apoio para a observao da sociedade. Os fenmenos demogrficos prestamse a medidas exactas e a um conhecimento objectivo, ao mesmo tempo que
so dotados de uma inrcia bastante grande: uma pirmide de idades, por
exemplo, antes de mais uma justaposio de geraes que acumula os
principais acontecimentos do passado durante um sculo.
Em sentido lato, a Demografia uma autntica biologia social ao estudar
os movimentos profundos que afectam a sociedade: a vida, o amor, a morte,
as migraes. Contudo, errado pensar que o desenvolvimento da
Demografia quebrou a sua unidade inicial. A Demografia uma s, apesar das
diferentes especialidades, ou seja, todos os ramos perdem por completo o
sentido sem a referncia constante a um ncleo de base: a Anlise
Demogrfica.
A Demografia assim uma cincia social instrumental, de reflexo e de
aco. Saber se pelo facto de a Demografia ser uma cincia social
instrumental, de reflexo e de aco teremos uma cincia social original algo
a que difcil dar uma resposta. Numa certa perspectiva, a Demografia igual
a todas as outras cincias sociais, visto ter um objecto especfico de estudo, se
bem que em termos globais o seu objecto seja igual ao das outras cincias
sociais: o estudo do comportamento do Homem em sociedade.
26
Pierre Chaunu, privilegiando as relaes entre a Demografia e a Histria
escreve: Quer se trate de durao quer se trate de espao, evidente que
o Homem que procuramos, o Homem que a Demografia nos oferece face a si
prprio, face sucesso das geraes; de todos os casamentos entre as
cincias humanas e a Histria, nenhum to importante. A Demografia a
mais central, a mais importante das cincias do Homem. Qualquer cincia
humana sem uma poderosa base demogrfica no mais do que um frgil
castelo de cartas.
Todo o fechamento de campo perigoso e a Demografia no se pode
reduzir Anlise Demogrfica. O rigor dos seus mtodos no deve fazer com
que passe para segundo plano a sua natureza autntica: ser uma cincia
social de raiz biolgica. Os dois grandes fenmenos demogrficos a
natalidade e a mortalidade so antes de mais manifestaes de processos
biolgicos. Ora, em nosso entender, no estudo dos fenmenos, que sendo
biolgicos na origem sofrem profundas modificaes quando inseridos na
sociedade e no ambiente, que assenta a maior originalidade da Demografia.
Deixando os mtodos e as tcnicas de Anlise Demogrfica e das
Projeces Demogrficas para os captulos seguintes, vejamos ainda neste
captulo de introduo cincia da populao, numa forma sucinta, quais so
os principais problemas tratados pela Demografia Histrica, pelos Estudos de
Populao ou Demografia Social, pelas Polticas Demogrficas e pela Ecologia
Humana.
27
atravs de uma metodologia especfica que permite analisar fontes
diferentes das escritas. Estas fontes so, em geral, constitudas por
material antropolgico e arqueolgico (esqueletos e epitfios), material
toponmico (nomes de lugares) e por informaes paleogeogrficas
(condies climticas).
Os primeiros estudos paleodemogrficos foram realizados na
antiguidade utilizando-se para o efeito material arqueolgico.
A Histria da Populao era uma espcie de cincia auxiliar
abandonada aos eruditos locais e aos curiosos.
Aps o fim da Segunda Guerra Mundial, um conjunto de vrios
factores comeam a convergir para o aparecimento da Demografia
Histrica como ramo autnomo da Demografia.
Mas o que verdadeiramente se passou de novo foi o aparecimento
do mtodo cientfico, baseado na reconstituio das famlias,
inventado quase simultaneamente por P. Goubert e L. Henry.
Dois anos depois, L. Henry e M. Fleury publicam Dos Registos
Paroquiais Histria da Populao e Manual de Anlise e de Explorao
do Estado Civil Antigo (Fleury e Henry, 1956).
A preciso, o detalhe, a forma prtica como foi redigido este
manual, facilitaram a leitura e a compreenso deste novo mtodo. No
entanto, era insuficiente, uma vez que os ndices estatsticos que se
podiam construir entraram em coliso com o que era tradicional fazer em
Histria da Populao.
O mtodo de L. Henry imps-se de tal forma que o prprio P.
Goubert acabou por recomend-lo aos seus alunos. Foi em vo que P.
Chaunu e P. Goubert tentaram alargar a curiosidade dos seus alunos
para novos horizontes. Em sntese, o grande sucesso do mtodo de
Henry deve-se a trs factores fundamentais:
ao caminho traado pelo mtodo os dividendos so grandes e
o risco bastante limitado;
estandardizao do mtodo e dos materiais que se utilizam,
garantindo a qualidade e a comparao dos resultados;
organizao da investigao que permitiu ultrapassar as
querelas pessoais.
28
alimentos de qualidade duvidosa e aparecem as epidemias, sobretudo
de carcter digestivo, que se propagam atravs dos mendigos e dos
viajantes...
Em 1972, quando a Sociedade de Demografia Histrica
comemorou o seu 10. aniversrio, algo estava incontestavelmente
comprovado uma nova disciplina e um novo ramo da Demografia tinha
nascido.
Para que fosse possvel o desenvolvimento da Demografia
Histrica, num to curto espao de tempo, dois factores foram decisivos:
o desenvolvimento da Anlise Demogrfica e o aparecimento da
chamada Nova Histria. A Anlise Demogrfica forneceu a componente
tcnica, a Nova Histria contribuiu com os frutos da vaga neopositivista,
como, por exemplo, o retomar das fontes. Comearam a aparecer
acusaes de que se quer reduzir o campo da Histria ao utilizar fontes
que so estruturalmente qualitativas.
P. Aris foi o grande pioneiro desta nova maneira de pensar: ...
parti dos dados demogrficos para passar s realidades que eles
ocultam; destas realidades das atitudes perante a vida, a idade, a
doena, a morte, os homens de outros tempos no gostavam de falar, ou
at no eram deles conscientes; a anlise das sries numricas fazem
aparecer modelos de comportamento at agora inacessveis e
clandestinos; assim, a mentalidade aparece sempre no fim de uma
anlise das estatsticas demogrficas. (Aris, 1991). Foi neste contexto
que emergiram alguns dos novos caminhos da Demografia Histrica
actual:
analisar o progresso da instruo atravs da frequncia das
assinaturas;
compreender a sexualidade, a liberdade dos costumes e a
ilegitimidade explorando as fichas dos casamentos e dos nascimentos;
reexaminar a prtica religiosa atravs da explorao do movimento
sazonal dos casamentos e dos nascimentos;
explorar a existncia de crises de mortalidade atravs de uma simples
contagem dos bitos.
29
os factores sociais e culturais podem ser encarados como variveis
independentes que explicam a estrutura e a dinmica populacional;
por outro lado,
questes como a de saber em que medida a dinmica populacional
afecta os diferentes problemas da sociedade so igualmente
importantes.
Depois dos anos 70 so raras as obras publicadas com o nome de
Demografia Social.
Na Anlise Demogrfica utilizam-se apenas variveis demogrficas
que so utilizadas como variveis independentes e como variveis
dependentes. Nas novas disciplinas que integram a Demografia Social, o
acento tnico da anlise desloca-se para as variveis no demogrficas
que so utilizadas como causas ou como consequncias. A diferena
reside, assim, no facto dos fenmenos demogrficos poderem ser
explicados por factores diferentes dos demogrficos, ou seja, factores
sociais, psicolgicos, econmicos, culturais, histricos, ambientais.
Em funo do exposto, podemos afirmar que em Estudos de
Populao, os factores no demogrficos so utilizados para explicar os
problemas demogrficos:
a influncia dos nveis de rendimento ou dos estilos de vida no nvel
de fecundidade;
a influncia do tabagismo e da situao profissional no nvel de
esperana de vida.
Mas, tambm possvel uma segunda aproximao. Os factores
demogrficos serem variveis independentes ou explicativas de variveis
no demogrficas ou de problemas sociais contemporneos:
explicar a influncia da estrutura por idades na votao partidria ou
nos hbitos de consumo;
o efeito do aumento da durao mdia de vida no aumento do nmero
de pensionistas.
Inicialmente defendeu-se o ponto de vista que apenas o primeiro
tipo de questes (variveis no demogrficas explicarem variveis
demogrficas) era objecto de estudo da Demografia Social.
Argumentava-se que no segundo tipo de estudos os objectivos eram
exgenos problemtica da Demografia Social. Contudo, como muitas
vezes acontece a prtica que determina o contedo e no as questes
de carcter epistemolgico. Ora, a prtica veio demonstrar que, muitas
vezes, eram os demgrafos que chamavam a ateno para a
importncia da componente demogrfica na explicao de certos
problemas prticos com que se debatem as sociedades complexas dos
dias de hoje.
O nmero mdio de filhos por mulher em todos os pases
desenvolvidos tem tendncia para estabilizar com valores que so
claramente insuficientes para que as geraes se renovem.
O progresso da biotecnologia, em particular a possibilidade de
determinar o sexo e a crescente capacidade de interveno directa no
embrio humano in utero, criam novas potencialidades cujos efeitos so
ainda mal conhecidos. As tcnicas de procriao artificial so
susceptveis de perturbar a noo de indivduo e de famlia, afastando a
pessoa das suas razes biolgicas, dando cada vez mais importncia ao
parentesco social do que aos laos de sangue. A noo de famlia
cada vez mais complexa, fluida e multiforme.
Assim, sem pretendermos ser exaustivos, podemos dizer que as
grandes preocupaes dos Estudos de Populao, nos dias de hoje, so
as seguintes:
30
31
admitiram por unanimidade, que o controlo do crescimento demogrfico
uma necessidade fundamental de qualquer pas, seja qual for o seu
nvel de desenvolvimento. O debate concentrou-se mais em saber por
que que certos pases conseguiram controlar com eficcia o seu
crescimento demogrfico enquanto noutros pases tem havido maior
dificuldade. Compreende-se, assim, porque que as discusses e o
documento aprovado abandonaram os velhos termos deste tipo de
debates e as atenes se concentraram no papel da educao, no lugar
da mulher na sociedade e no mercado de trabalho, nos problemas de
sade, das migraes e da urbanizao.
bem possvel que a adopo de um documento com estas
caractersticas trave a tendncia que se tinha observado nos ltimos
anos para as polticas sectoriais de clara natureza demogrfica (polticas
de famlia, de emigrao, de terceira idade) e se retome a dimenso
social global que esteve em risco de se perder.
32
vivos e nos diferentes componentes do seu ambiente fsico (gua,
atmosfera, solo), bem como nas suas inter-relaes.
So conhecidas actualmente no globo terrestre cerca de um milho
e meio de espcies animais e 500 mil espcies vegetais. Na Biosfera
vivem os animais e os vegetais e esta compreende a atmosfera at uma
altitude de cerca de 15 mil metros, o solo ou a litosfera at a algumas
dezenas de metros de profundidade, as guas doces e as camadas
superficiais das guas marinhas formam a hidrosfera.
Embora com desenvolvimento em momentos distintos, a identidade
de pontos de vista, a utilizao de um vocabulrio comum e de
metodologias semelhantes do lugar emergncia da Ecologia Geral, na
qual identificado um conjunto de ideias fundamentais que estruturam
todo o pensamento ecolgico moderno, sendo comuns a todas as
divises que foram surgindo durante todo o sculo XX. (Acot, 1988):
33
Biomassa, para sistemas mais maduros, mais organizados, de
grande diversidade e pouca produo primria; ao conjunto de
ecossistemas, escala mundial, chamam-se Biomas.
Apesar de, nos nossos dias, a Ecologia ter um objecto de estudo
claro e preciso, continua a ser uma das cincias mais complexas e
abrangentes pelo que se recorre sua diviso em ramos mais
especializados no sentido de tornar o seu estudo mais simples e
operativo. Das muitas formas que existem para considerar a Ecologia,
sobrevivem, desde o incio do seu estabelecimento como cincia, duas
divises clssicas:
a auto-ecologia e
a sineecologia.
Naturalmente que esta, como todas as outras tentativas de dividir a
Ecologia em sectores (o primeiro critrio de diviso foi o topogrfico, ao
dividi-la em ecologia da floresta hmida, ecologia do deserto, ecologia
dos lagos...) apenas uma separao terica, como um meio til para
facilitar a anlise e a compreenso de cada campo de estudo.
Foi Shroter (Acot, 1988) que em 1896 criou o termo auto-ecologia
para designar a parte da Ecologia que estuda a influncia dos factores
externos sobre os seres vivos. O grande interesse da auto-ecologia ,
pois, o de nos permitir conhecer as adaptaes dos seres vivos ao meio
que habitam e as suas necessidades. Posteriormente, em 1902, o
mesmo autor distinguia a sineecologia que diz respeito s comunidades
de espcies, isto , ao estudo das relaes existentes entre uma
comunidade e o ambiente em que se insere, especialmente no que
respeita sucesso ecolgica.
A influncia do ambiente bem mais importante no Homem do que
nas outras espcies animais. Uma das causas apontadas por Lamy
(Lamy, 1996) reside no facto de o Homem ser praticamente a nica
espcie animal ubiquitria, ou seja, a nica que tanto vive no Equador
como nos Plos e que, por isso, se confronta com meios muito diversos.
Mais ainda, o Homem uma espcie biolgica heterotrfica, capaz de
comunicar com grande eficcia, capaz de criar um ambiente construdo.
Este ambiente construdo de grande complexidade porque nele se
integram elementos muito diversos como a habitao, os transportes, as
comunicaes, o trabalho, a organizao social, os valores.
Estas e muitas outras questes, at ento pertena das cincias
sociais, foram ganhando uma crescente importncia no pensamento
ecolgico nas ltimas dcadas do sculo XX, emergindo assim a
Ecologia Humana, uma nova e ainda recente rea do saber, que
perspectiva o estudo do Homem, agrupado em populaes, numa
constante interaco com o ambiente que o rodeia.
Quando pensamos em termos de ecologia das espcies, sabemos
que o Homem, apogeu do fio evolutivo dos vertebrados, parte
integrante da espcie animal. A Ecologia Humana no pode ser apenas
um ramo da ecologia, como o caso da ecologia animal ou da ecologia
vegetal, uma vez que nas populaes humanas existem outros
elementos como a conscincia do tempo, a livre escolha e os valores.
No incio dos anos 20, o estudo da sociedade humana, agrupou
socilogos, antroplogos, gegrafos, eclogos, entre outros, de modo a
que fosse possvel encontrar um campo de contacto e de
interdisciplinaridade entre si, tendo surgido assim a Ecologia Humana.
Na Ecologia Humana intervm todos os factores biticos e
abiticos que interferem na ecologia das plantas e dos animais, no
34
entanto as dualidades Homem/animal e cultura/natureza defrontam-se
com o facto de o Homem no ser apenas um indivduo biolgico ou
psicossocial, mas uma totalidade bio-psico-social.
Como refere Buttel (Kormondy, 1998): Esta dualidade traduz-se
em, por um lado, o homem pertencer reserva viva da biosfera terrestre
e, por outro lado, ser o criador de ambientes sociais nicos.
Em 1921, a diversidade dos comportamentos humanos no espao
e as diferentes respostas sociais e culturais ao meio que interessam
aos primeiros eclogos humanos. Park, Burgess e Mackensie foram os
primeiros a aplicarem ao estudo das comunidades humanas os
esquemas tericos bsicos da ecologia vegetal e animal (Young, 1983).
Na perspectiva de Park e dos seus colegas da escola de Chicago,
a Ecologia Humana era um mtodo e um conjunto de conhecimentos
essenciais para o estudo cientfico dos problemas sociais e uma
disciplina bsica para todas as cincias sociais.
Segundo Quinn, a Ecologia Humana um campo especializado de
anlise sociolgica que investiga:
os aspectos subsociais (biticos), tanto espaciais como funcionais,
que surgem da interaco entre o Homem e o meio ambiente;
a natureza e forma dos processos, atravs dos quais surge e se altera
a estrutura social.
Neste sentido, uma estrutura ecolgica a comunidade com uma
determinada distribuio no espao e com uma diviso funcional do
trabalho.
Para Hawley, a Ecologia Humana uma abordagem holstica da
organizao, ao nvel macro do estudo das organizaes humanas.
Parte do pressuposto darwiniano da luta pela existncia, da
necessidade de adaptao ao meio. Esta luta tem de ser colectiva e no
individual fazendo, assim, do conceito de comunidade, o conceito-chave
da teoria. A estrutura da comunidade concebida como organizao de
actividades de subsistncia, como a forma em que a populao se
organiza para subsistir num determinado habitat.
No existe Ecologia Humana sem populao, dado que a
adaptao se realiza mediante uma organizao, e nesta o que conta
so as propriedades de grupo. A importncia da organizao pode ser
considerada em duas perspectivas: a esttica (conjunto de funes e
relaes) e a dinmica (processo de adaptao a um meio ambiente)
que correspondem s perspectivas da organizao social e
importncia do equilbrio, equilbrio esse que sempre instvel, dado
que a populao est sempre aberta ao meio.
Na mesma linha de Hawley est Ducan. Para este, o conceito mais
importante da Ecologia Humana o de Ecossistema, que constitudo
por quatro elementos:
Populao,
Meio Ambiente,
Tecnologia e
Organizao.
O ajustamento de uma populao ao seu meio, no um modo de
equilbrio esttico, mas sim um processo contnuo e dinmico. Desta
interaco surge a cultura que pode ser material-tecnolgica e no
material-organizao.
Na actualidade, a Ecologia Humana considerada como um novo
nvel de pensamento ao alcance das diferentes disciplinas, deixando de
ser vista como um captulo de uma cincia ou a sntese de todas as
cincias ou ainda o estudo das reas marginais de todas as cincias.
35
definida como o estudo das relaes, em tempo e espao, entre a
espcie humana e as outras componentes e processos do ecossistema
de que parte integrante. O seu objectivo conhecer a forma como as
populaes humanas concebem, usam e afectam o ambiente, bem como
o tipo de respostas existentes s mudanas ocorridas no ambiente
biolgico, social e cultural.
Ao definir-se Ecologia Humana, como o conjunto de interaces
entre as populaes e o ambiente, torna-se evidente a necessidade de
uma maior preciso sobre o conceito de ambiente, visto que a percepo
que o Homem tem sobre o que o ambiente considerada fundamental,
representando assim o principal ponto de partida para qualquer anlise
sobre as relaes Homem-Ambiente.
Historicamente, o conceito de ambiente, tem vindo a ser
lentamente mais amplo e abrangente. Desde o conceito primrio de
ambiente sinnimo de natureza e de proteco natural, no qual o
Homem era considerado um ser independente do ambiente que o
rodeava, at ao conceito que inclui outros aspectos do ambiente
humano, tais como factores sociais, naturais, culturais, econmicos... foi
percorrido um longo caminho evolutivo, resultando desta mudana, a
emergncia de uma perspectiva holstica que integra estas
caractersticas num todo.
A Ecologia desempenhou um papel chave ao reabilitar a noo de
ambiente/natureza, na qual inseriu o homem e mostrou que o ambiente
no era s desordem e passividade.
A grande versatilidade ecolgica do Homem, beneficiando da sua
capacidade cultural, alterou o original nicho humano, sendo pertinente
interrogar-se sobre a capacidade de adaptao fsica e comportamental
s novas condies ambientais. Ora, justamente no desafio
capacidade de adaptao que se pode situar a problemtica do
desenvolvimento sustentvel.
neste contexto que Ducan (Kormondy, 1998) define Ecologia
Humana como o estudo das interaces entre as populaes humanas e
os ambientes, por meio de uma tecnologia regulada pela organizao
social.
36
Metodologia Geral da Anlise Demogrfica
QUESTO DE PARTIDA
Volumes e Densidades
Ritmos de Crescimento
Estruturas Demogrficas
1. ETAPA
2. ETAPA
A EXPLORAO
Anlise dos Sistemas de Informao Demogrfica
Anlise da Qualidade da Informao
3. ETAPA
A PROBLEMTICA
Diagrama de Lexis
4. ETAPA
ANLISE DA MORTALIDADE
E DAS CONDIES GERAIS DE SADE
5. ETAPA
ANLISE DA NATALIDADE,
FECUNDIDADE E NUPCIALIDADE
6. ETAPA
7. ETAPA
CONCLUSO
CRESCIMENTO DEMOGRFICO
CRESCIMENTO TOTAL
POPULAO NO FIM DO PERODO POPULAO NO INCIO DO PERODO
CRESCIMENTO ENTRE RECENSEAMENTOS
(NASCIMENTOS BITOS) + (IMIGRANTES EMIGRANTES)
CRESCIMENTO ENTRE RECENSEAMENTOS
CRESCIMENTO NATURAL + CRESCIMENTO MIGRATRIO
37
NATALIDADE
ESTRUTURA
DIMENSO
NVEL
MORTALIDADE
CRESCIMENTO DEMOGRFICO
ESTRUTURA
DIMENSO
MIGRAES
NVEL
ESTRUTURA
CRESCIMENTO
NATURAL
EMIGRAO
IMIGRAO
MIGRAES
INTERNAS
CRESCIMENTO
MIGRATRIO
VOLUME
ESTRUTURA
DISTRIBUIO
ESPACIAL
Caracterizao Social
e Histria
PROSPECTIVA
DEMOGRFICA
PLANEAMENTO ESTRATGICO
Caracterizao
Ecolgica
AMBIENTE
38
39
2. A EXPLOSO DEMOGRFICA: UM
VELHO PROBLEMA COM NOVAS
DIMENSES
A primeira Histria da Populao Mundial foi elaborada por Marcel Reinhard
em finais dos anos 50. Este livro pioneiro totalmente refundido e desenvolvido
cerca de vinte anos depois num trabalho conjunto do autor com Andr Armengaud e
Jacques Dupquier. Esta ltima verso da Histria da Populao Mundial, publicada
pela primeira vez em 1968, apesar de ter tido vrias edies sem modificaes
substanciais, continua a ser a obra mais completa que se conhece sobre a evoluo
da populao mundial desde as primeiras civilizaes at ao sculo XX.
Posteriormente, nos ltimos vinte anos, outros trabalhos importantes foram
realizados na dupla perspectiva da longa durao e da globalizao da informao.
Nestes ltimos anos, a abundncia de informao acumulada pela
investigao foi de tal forma importante (em particular em Frana e Inglaterra) que
comeou a optar-se pela elaborao de histrias de populao por pases. As duas
obras fundamentais nesta linha de pensamento so, no presente momento, The
Population History of England, 1541-1871 A Reconstruction publicado, em 1981,
por E. A. Wrigley e R. S. Schofield e a Histoire de la Population Franaise, publicada
em quatro volumes por Jacques Dupquier, em 1988. Noutros pases europeus
vrios trabalhos deste tipo j foram publicados ou esto em vias de publicao,
parecendo que cada vez mais se opta por um caminho que se baseia em conhecer
em profundidade os diferentes pases, regies ou pocas para posteriormente se
retomar o caminho da globalidade e da longa durao. Um bom exemplo o recente
trabalho sobre a Europa elaborado por Jean-Pierre Bardet e Jacques Dupquier,
intitulado Histoire de la Population de l'Europe.
Apresentar uma evoluo global da populao, sem exemplificar a realidade
de um pas e sem identificar as causas das diversas dinmicas populacionais
encontradas, tem o risco de retirar prtica demogrfica uma das suas
caractersticas essenciais o rigor da medio; pelo contrrio, se privilegiarmos o
rigor da anlise das dinmicas demogrficas especficas de um pas, com manifesto
prejuzo da compreenso e da interpretao das grandes etapas de evoluo da
populao mundial, corremos o risco de dar a entender que a Demografia uma
simples questo de quantificao que prescinde de um adequado enquadramento
histrico, espacial, econmico, social e cultural.
40
100 mil a viver em conjunto (Chaunu, 1979); para Mc Evedy e Jones no
teriam ultrapassado os 70 mil e com o aparecimento do Homo Erectus que
se inicia a grande expanso espacial da populao (Mc Evedy e Jones, 1978).
Uma das caractersticas mais importantes desta poca a disperso. A
velocidade e a extenso dessa disperso eram condicionadas por dois
factores fundamentais: o clima e a aptido do Homem em explorar as
vantagens e em superar os inconvenientes que resultavam desse clima.
Durante milhes de anos a errncia dos caadores-colectores nmadas foi
limitada pelas condies climatricas. Enquanto no souberam fabricar
utenslios, construir abrigos ou fazer vesturio estavam merc dos
elementos. O fogo, inventado ou descoberto pelo Homo Erectus, foi um dos
elementos mais importantes na luta do Homem pela sobrevivncia.
As grandes migraes da sia para a Europa, com o incio do Paleoltico
Superior, foram interrompidas, quando um novo avano do gelo se produziu,
mas esses seres, que j se sabiam adaptar a tal situao, foram capazes de
sobreviver nestas condies desfavorveis. Houve sempre populaes que
foram ficando na rectaguarda e que esto na origem das culturas mesolticas.
Os utenslios so adaptados a novas utilizaes: aparece o machado de
pedra para abater rvores e trabalhar a madeira, a caa passa a ser feita com
o arco e a flecha, aprende-se a pescar. A vegetao era rica em frutos e
razes, e os mares, agora sem gelo, possibilitam a sua explorao. Troncos de
rvores foram transformados em canoas e o peixe comea a fazer parte da
alimentao.
Em relao ao perodo anterior a primeira sepultura j uma
humanidade que emerge. Se o primeiro milho se atinge em 12.000 anos a.
C., entre 9000 e 8000 a. C. a humanidade seria j de 2 a 3 milhes. certo
que com o Mesoltico e o fim da ltima glaciao, a alimentao abundante
favoreceu o crescimento da populao, mas a verdadeira exploso
demogrfica s ocorre com o Homem acabado.
A exploso da China bastante mais tardia. a China do trigo antes do
arroz. Nessa altura, a populao do Imprio Romano estimada em cerca de
54 milhes de habitantes (Reinhard, Armengaud, Dupquier, 1968).
O que impediu o Homem do Paleoltico de crescer foi a obrigao de
errncia das tribos em territrio de caa. A vitria da agro-pastorcia antes de
mais a estabilidade do lar e uma melhor proteco da mulher grvida e da
criana.
41
outras consequncias demogrficas importantes: escravatura, massacres e
migraes foradas. Os vencidos eram massacrados, capturados, reduzidos
escravatura, separados e, por vezes, eram obrigados a grandes migraes
colectivas.
Em Israel, a existncia de uma populao de 5 milhes no tempo de
David (igual populao da Mesopotmia) difcil de admitir, tendo em conta
a dimenso do espao e a riqueza do solo. A caracterstica mais interessante
deste povo, sob o ponto de vista demogrfico, a de ser um povo
essencialmente migrante (nmada nas primeiras idades, conduzido Terra
Prometida, condenado disperso).
uma demografia de povos imigrantes cuja errncia ritma a Histria,
misturando populaes, costumes e civilizaes.
42
um marido a sua mulher para semear como num terreno frtil e ter
belos filhos).
Os romanos eram muito orgulhosos dos seus conhecimentos sobre a
populao. O termo recenseamento -lhes devido e a sua realizao comeou
no sculo V antes da nossa era e prolongou-se at ao ano 73. Os
recenseamentos, ao serem essencialmente concebidos para fins fiscais e
militares, so dirigidos a grupos especficos da populao.
Apesar de dispormos de abundantes informaes, que permitiram
elaborar estimativas sobre a evoluo do total da populao nas diversas
regies do Imprio, a grande dificuldade em interpretar os resultados
fundamentalmente a mesma: as variaes espaciais de cada uma das regies
no tempo. Apesar desta dificuldade, parece no haver dvidas que a
populao comeou a diminuir significativamente a partir do sculo III da nossa
era devido ao efeito combinado de vrios factores (Chaunu, 1990):
as crises de mortalidade (a peste antonina a mais bem
conhecida apareceu em 166, atinge Roma em 172 e fez-se sentir
at 180 deixando atrs de si um assinalvel rasto de destruio);
as fomes (entre 250 e 270 dispomos de descries de sucessivas
fomes com efeitos importantes no aumento da mortalidade);
a limitao dos nascimentos; no possvel encontrar informaes
quantificadas mas, ao explorarmos os autores clssicos que
descreveram os costumes desta civilizao, encontramos autores
como Petronius onde se afirma que ningum quer famlia nem
educar crianas, porque se algum tem a infeliz ideia de ter herdeiros
legtimos no ser nunca convidado para os banquetes e festas, no
tem nenhum dos prazeres da vida e viver na obscuridade
vergonhosa; pelo contrrio, aqueles que no so casados e no tm
parentes prximos so acumulados de honras;
a importncia dos escravos e o regime particular a que se
encontravam submetidos (no lhes era permitido o casamento e a
reproduo).
43
Mas precisamente neste momento que a iluso de mundo cheio est
no seu apogeu (Chaunu, 1990):
Tertuliano afirma: Somos um fardo para o mundo; os elementos no
nos bastam; as nossas necessidades so prementes; todo o mundo
se queixa porque a natureza no satisfaz as nossas necessidades; a
peste, a fome, as guerras e o desaparecimento das cidades so
enviadas como remdios para o crescimento da raa humana.;
S. Jernimo em 380, num momento de inequvoco declnio
demogrfico, afirma que o mundo est cheio e j no existem mais
lugares superfcie da terra.
44
grandes fluxos de pestes, 18 dos quais atingiram o Oriente e 11 o Ocidente
(Biraben, 1975):
45
direito ao casamento mesmo os mais humildes, o casal deve evitar
prticas que afastam o casamento da sua funo procriadora;
as regras mais restritivas que procuraram regular as relaes sexuais
em funo do calendrio litrgico nunca foram rigorosamente
aplicadas.
neste contexto que Dubois, ao constatar a existncia de um aumento
significativo da populao a partir do ano 1000, julga estarem criadas as
condies para o aparecimento de uma nova atitude face vida, ou seja, de
uma nova mentalidade que se traduz na existncia da segunda conscincia de
um mundo cheio (Dupquier, 1988):
Joo XXII na Gallia Christiana escreve, a propsito da criao das
dioceses de Lavaur, Mirepoix, Rieux e Sarlat, tendo em conta o
facto de o nmero de habitantes crescer desmesuradamente... a
diocese de Toulouse tem tanta gente que j no suficiente um
nico pastor...;
os pais nascidos no ano 1000 tm por agregado familiar uma mdia
de 3,5 filhos, enquanto que os pais nascidos em 1075 tm 5 ou 6
filhos.
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47
48
A confirmao da primeira destas regras tem sido objecto de bastantes
investigaes as quais tm vindo a demonstrar que a ilegitimidade era
bastante baixa. Nos sculos XVII e XVIII oscila entre os 40 e os 50 por mil,
apesar de no ser um fenmeno homogneo: as cidades tm maior
ilegitimidade do que o mundo rural e, no campo, a ilegitimidade varia com o
rigor do controlo social. De qualquer forma, devido ao facto de a ilegitimidade
ser pouco expressiva, no se pode deduzir apressadamente que eram
inexistentes as relaes sexuais fora do casamento. Atravs da reconstituio
das famlias tem sido possvel analisar os intervalos protogensicos (distncia
entre o casamento e o primeiro nascimento). Os resultados obtidos tm
demonstrado que a ilegitimidade e a ausncia de relaes sexuais fora do
casamento deram origem a todo o tipo de variaes: existem regies onde as
relaes sexuais fora do casamento e a ilegitimidade so frequentes (embora
seja importante verificar o que se entende por ilegitimidade) e existem regies
onde a importncia das relaes sexuais fora do casamento no
acompanhada em importncia pela expresso numrica da ilegitimidade.
A segunda e terceira regras implicam que o casamento s seria possvel
quando o casal era capaz de assegurar a sua independncia econmica, ou
seja, capaz de fundar um lar. Esta situao reduz os jovens, enquanto os
pais esto vivos, a permanecerem numa posio subalterna, ou seja, a
ocuparem o seu tempo como empregados no campo ou na cidade, a fim de
juntarem um peclio que lhes permita estabelecerem-se por conta prpria.
Mais do que o casamento tardio, seria melhor falar em celibato forado e
temporrio: os jovens eram privados do direito a ter relaes sexuais enquanto
no tivessem um peclio suficiente para se estabelecerem. Se os pais fossem
dizimados por uma crise de mortalidade, a herana ficava imediatamente
disponvel e os jovens podiam casar-se.
a morte dos pais que desencadeia todo o processo de dinamizao da
populao: um casal com cerca de cinquenta anos, j infecundo, substitudo
por um jovem casal que noutras circunstncias teria de esperar mais uns anos.
Na ausncia de crises, constitui-se um exrcito de reserva de rapazes
e raparigas que esto espera da primeira oportunidade para se casarem. Os
jovens celibatrios constituam assim um verdadeiro stock matrimonial, cuja
funo era a de permitir sociedade a manuteno das unidades econmicas
de base, com um volume mais ou menos constante. Se a criao de novas
exploraes fosse livre (ou a sua diviso possvel) a expanso demogrfica
deixaria de ser momentnea e controlada. Porm, nas estruturas econmicas
e sociais do Antigo Regime, o nmero de exploraes variava muito
lentamente:
uma grande parte das terras era alugada e estava nas mos da
nobreza e do clero;
a grande maioria dos camponeses era proprietria de terras
minsculas constitudas por uma casa e um pequeno terreno muito
difceis de dividir;
a construo de uma nova casa no estava ao alcance de um
assalariado, por mais econmica que fosse e, mesmo que tal fosse
possvel, as terras disponveis eram poucas.
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pequenos ofcios mas, a longo prazo, o patrimnio tenderia a pulverizar-se
caso as descendncias continuassem a ser grandes.
ao nvel dos agregados familiares que funciona, efectivamente, este
mecanismo auto-regulador e se articulam a economia, a sociedade e a
populao.
O povoamento funo no somente das aptides naturais e das
condies de subsistncia, mas tambm das estruturas agrrias e das
relaes de produo cuja origem se perde no tempo e cuja variao muito
lenta.
certo que nesta sociedade bloqueada se podem, por vezes,
observar variaes. Em primeiro lugar, no caso de haver uma catstrofe, a
populao pode reduzir-se 30, 40 ou 50%; normalmente o mecanismo autoregulador funcionava e repunha a situao anterior, mas, em certo tipo de
catstrofes, como o caso das guerras, a passagem dos exrcitos no
afectava somente a populao mas a prpria organizao econmica
(consumo das reservas alimentares, incndio das casas, destruio das
exploraes) o que tornava difcil, seno impossvel, a recuperao.
Em segundo lugar, podia tambm ocorrer a situao inversa, quando, na
sequncia de mutaes econmicas, existe um desenvolvimento no artesanato
e o nmero de fogos aumenta; menos dependente das estruturas agrrias, os
fogos dos artesos podiam multiplicar-se mais rapidamente; nos agregados
onde existiam corporaes funcionando com regras rgidas era muito difcil a
um jovem estabelecer-se sem uma longa aprendizagem (o que lhe retardava o
casamento), mas, no campo, onde as profisses eram mais livres, a sua
instalao era mais rpida e mais sumria; o empolamento dos efectivos
populacionais e a correspondente constituio de uma reserva de mo-de-obra
era bastante vantajoso para as manufacturas.
na sequncia da emergncia deste tipo de acontecimentos que se vai
registando em toda a Europa Ocidental, nos sculos XVIII e XIX, a destruio
do mecanismo auto-regulador que tinha funcionado durante sculos e que o
principal elemento caracterizador da demografia do Antigo Regime.
50
1. etapa (1650-1750): as populaes submetidas a crises peridicas de
mortalidade pem a funcionar em pleno o mecanismo autoregulador; este mecanismo, ao fazer aumentar de intensidade a
nupcialidade, proporciona a existncia de estruturas de idades
muito jovens;
2. etapa (segunda metade do sculo XVIII): os acidentes, sendo menos
frequentes, associados a um certo progresso tcnico da medicina,
diminuem a mortalidade e a populao aumenta; mas, o
mecanismo regulador, que tinha funcionado bem numa direco,
revelou-se ineficaz na direco inversa; mais ainda, este
mecanismo tem um peso desagradvel nos destinos individuais
os quocientes de nupcialidade diminuem, a idade mdia do
casamento aumenta, os jovens tm cada vez mais dificuldades em
estabelecer-se; a indstria nascente passa a dispor de uma
reserva de mo-de-obra abundante e a baixo preo; as tenses
sociais aumentam e aparecem conflitos de geraes;
3. etapa (primeira metade do sculo XIX): a industrializao, ao permitir
fazer baixar a idade do casamento, relana o crescimento
demogrfico; a emigrao para o outro lado do Atlntico vai-se
tornando cada vez mais importante;
4. etapa (segunda metade do sculo XIX): o recuo da mortalidade,
associado a um grande progresso da medicina e das condies de
higiene e sade, acaba de vez com o mecanismo auto-regulador;
com o aumento da durao de vida dos pais, as jovens geraes
camponesas perdem a esperana de se estabelecerem com uma
idade razovel; no lhes resta mais do que escolher entre o
celibato definitivo ou o xodo para stios mais ou menos longnquos
(como operrios, funcionrios, militares ou colonos).
O sistema auto-regulador do Antigo Regime demogrfico preparou os
caminhos do crescimento e, simultaneamente, da destruio parcial do meio
social que o fez nascer. Tal aconteceu, porque as suas capacidades de
travagem eram inferiores s de acelerao. Quando as crises comeam a ser
mais espaadas e menor a sua intensidade, comeou a manifestar-se o
problema inverso.
Em sntese podemos observar, numa ptica de longa durao, as
grandes fases de evoluo da populao no continente europeu:
51
da populao europeia (146 milhes em 1800, 295 milhes em 1900,
341 milhes em 1920, 385 milhes em 1940, 448 milhes em 1960,
484 milhes em 1980); visto escala de sculo e meio a populao
europeia triplicou apesar de estar no centro de duas grandes guerras
mundiais e da grande crise econmica dos anos 30; este crescimento
da populao no continente europeu foi de tal ordem que ultrapassou
os limites da prpria Europa; a Europa voltou, pela terceira vez na
sua histria, a estar confrontada com um mundo cheio; graas a
circunstncias histricas excepcionais, uma vaga de emigrao, com
uma amplido sem precedentes, ocorreu principalmente durante o
sculo XIX, em direco Amrica do Norte, cuja populao passou
de 5 milhes em 1800 para 90 milhes em 1900 e para,
praticamente, 325 milhes de habitantes no final do sculo XX;
finalmente, a ltima fase do crescimento europeu a que ocorre a
partir de 1994; a populao europeia, que estava com tendncia para
estabilizar volta dos 500 milhes de habitantes, devido integrao
da quase totalidade da populao da URSS na Europa, aumenta
entre 1994 e 1995 para cerca de 730 milhes de habitantes; as
novas projeces, corrigidas por este importante acontecimento,
apontam para uma estabilizao da sua populao, no final dos
primeiros vinte e cinco anos do sculo XXI, volta de 722 milhes de
habitantes.
Esta expanso privilegiada foi a expresso numrica de uma dupla
revoluo, cujos benefcios foram, durante muito tempo, reservados apenas a
menos de um tero da humanidade: exploso ou revoluo demogrfica, numa
primeira fase, devido ao efeito conjunto do aumento do nmero de
nascimentos e da diminuio do nmero de bitos; numa segunda fase, a
revoluo econmica tornou possvel uma nova ruptura do equilbrio
populao/recursos (o progresso cientfico e tcnico possibilitaram um
crescimento econmico que acompanhou e at ultrapassou o crescimento da
espcie humana).
Posteriormente a 1940, apesar do baby-boom que se seguiu ao fim da
Segunda Guerra Mundial, a maturidade do sistema demogrfico europeu,
caracterizado fundamentalmente pelo declnio da natalidade e pelo
envelhecimento demogrfico, fizeram com que a Europa fosse reduzindo,
gradativamente, o seu crescimento. A dissoluo da URSS foi um aumento
pontual que em nada parece vir alterar a ideia de estabilidade de uma
populao que, no prximo milnio, ter cerca de 740 milhes de habitantes.
52
O declnio da populao foi, portanto, devido ao efeito das guerras, mas
tambm uma consequncia da passagem de uma situao de elevada
densidade de ocupao agrcola para uma baixa densidade populacional,
normalmente associada a situaes onde predomina a pastorcia.
As regies mais determinantes na evoluo do continente asitico so a
China e o conjunto ndia/Paquisto/Bangladesh.
O aparecimento de arrozais inundados, com seleco de espcies e
colheitas mltiplas nos sculos XI e XII, so verdadeiros sinais de mutao.
Quando comparamos a evoluo numrica da China com a da Europa, a
diminuio observada em termos relativos no muito diferente. Porm,
enquanto a Europa, a partir do sculo VII, inicia uma recuperao gradativa
que ao atingir um volume de 74 milhes de habitantes em 1340 capaz de
resistir aos embates da peste negra, a China evolui de forma mais irregular.
O subcontinente indiano (ndia, Paquisto, Bangladesh) tem uma
evoluo bastante menos irregular do que a China. Estes dois grandes
conjuntos populacionais da sia alternam, numa perspectiva de longa durao,
a supremacia populacional: no incio da era crist a China tinha quase o dobro
da populao; entre o ano 400 e o ano 1000 as diferenas so pouco
significativas; do ano 1000 a 1250 a China quase duplica a populao em
relao ao subcontinente indiano; entre 1300 e o incio do sculo XVIII o
subcontinente indiano tem sempre mais populao do que a China; segue-se
depois um perodo, que vai at aos nossos dias, em que a populao da China
sempre mais importante.
O crescimento lento da populao do continente africano observado at
ao sculo XVI no mais do que uma consequncia de ser praticamente
desconhecida de quase todos os povos do continente africano a revoluo
agrcola (no incio da era crist, a frica tinha 26 milhes de habitantes e em
1500 tinha apenas 87 milhes). com o fim da sangria populacional, causada
pelo trfico de escravos e com a progressiva libertao da tutela colonial que,
j em pleno sculo XX, a frica comea a crescer: 138 milhes em 1900, 176
milhes em 1940, 353 milhes em 1970, 861 milhes em 2000, 1289 milhes
no ano 2025.
Quanto ao continente americano do centro e do sul, nas vsperas da
conquista espanhola, a populao era relativamente reduzida em nmero. O
impacto do processo da conquista neste continente foi de tal forma importante
que a populao total diminui para um quarto, levando ao extermnio quase
total de importantes civilizaes como a dos Incas e a dos Aztecas (10 milhes
de habitantes em 1600, 15 milhes em 1750, 19 milhes em 1800).
As populaes amerndias no estavam, ao contrrio das europeias,
imunes a certos micrbios e sofreram uma aniquilao quase total,
principalmente atravs da varola. A partir de meados do sculo XIX, o modelo
de crescimento muito idntico ao africano (75 milhes em 1900, 131 milhes
em 1940, 212 milhes em 1960, 540 milhes em 2000) prevendo-se, no
entanto, que a diminuio do ritmo de crescimento, observado nos ltimos
anos, leve a uma estabilizao da sua populao que pouco ultrapassar os
700 milhes de habitantes em 2025.
53
54
dos pases desenvolvidos temos 20% da populao mundial, um crescimento
natural praticamente igual a zero, uma mortalidade infantil reduzida, baixas
percentagens de jovens, elevadas percentagens de idosos e um PNB per
capita que quase vinte vezes superior.
A existncia destes dois grandes conjuntos populacionais, de
caractersticas opostas e de convergncia lenta, mostra ser impossvel
falarmos, nos dias de hoje, de um problema chamado populao mundial. A
populao mundial, actualmente, o resultado de uma adio sem interesse,
que tende a ocultar a realidade concreta a que se chegou no sculo XX: num
mundo teoricamente global existem dois grupos populacionais completamente
distintos, tendo cada um os seus prprios problemas.
Se a primeira grande diferena deste novo mundo cheio a diviso
em dois grandes blocos, a segunda grande diferena a unidade de
contagem: no primeiro mundo cheio a unidade de contagem o milho (do
incio ao fim do Neoltico passou-se de 1 a 30 milhes); no segundo mundo
cheio, a unidade de contagem passou a ser as centenas de milho (do sculo
VII ao sculo XIV, a populao mundial passou de 208 para 442 milhes); no
terceiro mundo cheio, a unidade de contagem passou a ser o milhar de
milho (o primeiro milhar de milho atinge-se em meados do sculo XIX, o
segundo em 1930, o terceiro em 1960, o quarto na dcada de 70, o quinto na
dcada de 80, o sexto no final da dcada de 90...).
A terceira diferena consiste na unidade de tempo utilizada na anlise.
Nas primeiras duas situaes, a contagem feita em sculos (se a populao
mundial estimada em 252 milhes no incio da nossa era e 578 milhes em
1600 foram precisos dezassete sculos para que a populao duplicasse),
mas, nos dias de hoje, a contagem feita por anos (entre o penltimo milhar
de milho e o ltimo mediaram cerca de 10 anos).
Finalmente, a ltima dimenso a capacidade de previso.
Ser possvel encontrar um dinamismo econmico e um contexto
ecolgico que sustente este dinamismo e responda permanncia da situao
actual, ou seja, uma populao que cresce diariamente quase 200 mil
habitantes e anualmente cerca de 100 milhes de habitantes (tanto como o
total da populao da Europa em meados do sculo XVIII)?
Sendo o mundo constitudo por dois blocos com caractersticas
demogrficas totalmente diferentes, e havendo necessidade de uma certa
unidade na aco como traar uma estratgia comum para a aldeia global
se 80% da populao mundial tem crianas a mais (e os consequentes
problemas relacionados com o crescimento da populao) e 20% dessa
populao tem crianas a menos, problemas de envelhecimento e de no
renovao das geraes?
na procura de uma resposta a este tipo de grandes questes que
constatamos estar confrontados no com um fenmeno novo mas, pelo
contrrio, com problemas e factos que j ocorreram em momentos diferentes
da aventura humana.
55
56
o contnuo,
o aritmtico e
o geomtrico.
No caso do ritmo de crescimento contnuo, temos:
Pn = P0 ean
1n (Pn / P0) = an
(e = 2,718282)
a = [1n ( Pn / P0)] / n
n = log 2 / log (1 + a)
n = 0,30103 / log (1 + 0,0020545)
n = 0,30103 / 0,0008894
n = 338, 46413
n = 339 anos
R: A populao de Portugal duplica
ao fim de 339 anos.
57
Amrica do Norte
1970 1950 = 20 anos
log 228 / P0 = 20 log (1 + 0,00805)
log 228 / P0 = 0,06964
228 / P0 = 1,17392
228 = 1,17392 x P0
P0 = 228 / 1,17392
P0 = 194 milhes de habitantes
Portugal
1821 1801 = 20 anos
log 3.276.203 / P0 = 20 log (1 +
0,00205)
log 3.276.203 / P0 = 0,01779
3.276.203 / P0 = 1,04181
3.276.203 = 1,04181 x P0
P0 = 3.276.203 / 1, 04181
P0 = 3.144.722 habitantes
58
59
60
na explicao da reduo dos efectivos, sempre mais precoce no sexo
masculino do que no sexo feminino.
Consequentemente, medida que avanamos na idade, a
superioridade dos efectivos masculinos comea a diminuir, normalmente
entre os 20 e os 30 anos de idade a importncia dos sexos igual e, nos
ltimos grupos etrios, o sexo feminino tem sempre um maior volume
populacional do que o masculino.
Este modelo natural, que formado apenas pela evoluo e pelos
nveis de mortalidade e de natalidade, pode no entanto ser perturbado
por outros factores, tais como: as migraes, por serem movimentos que
normalmente incidem mais em determinados grupos etrios.
O grfico das relaes de masculinidade mostra como que os
efectivos existentes num determinado grupo de idade so partilhados
entre o sexo masculino e o sexo feminino.
O seu clculo bastante simples: basta dividir em cada idade (ou
grupo de idades) os efectivos masculinos pelos efectivos femininos,
multiplicar o resultado por 100 e represent-los graficamente.
Se os sexos tivessem tendncia a ser igualmente repartidos em
todas as idades, a representao grfica limitar-se-ia a traar um
segmento de recta com o valor 100 e a observar as variaes em torno
desse valor. Assim, naturalmente, devido ao efeito do excedente de
nascimentos masculinos em relao aos femininos os primeiros valores
so, em geral, superiores a 100.
No entanto, convm sempre lembrar que cada gerao tem a sua
histria prpria, marcada por diferentes situaes sanitrias, por
migraes diferenciais segundo o sexo, o que pode implicar o
aparecimento de profundas modificaes no modelo natural deste grfico
o efeito gerao.
O efeito das migraes produz em Cabo Verde um significativo
declnio das relaes de masculinidade nos grupos etrios 25-29 anos a
40-44 anos, seguido de um retomar dos valores dessas relaes, que s
pode ser explicado pelo retorno de muitos dos cabo-verdianos. Em Cabo
Verde, tal como aconteceu com Portugal nos anos 60 e 70 a emigrao
mais masculina do que feminina.
61
Outros critrios podem ainda ser utilizados em funo de
determinados objectivos especficos como, por exemplo, o da
escolaridade. Os grupos funcionais passariam a ser: populao em idade
pr-escolar (0-5 anos), populao em idade escolar (5-18 anos) e
populao em idade de frequentar o ensino superior (18-24 anos).
Uma vez decomposta uma estrutura demogrfica em grupos
funcionais podemos proceder sua manipulao, no sentido de os
transformar em indicadores que resumam a abundncia de informao
existente numa repartio por sexos e idades: so os ndices-resumo.
Na construo destes ndices tanto faz utilizar o critrio de agrupamento
0-14 anos/65+ anos, como o critrio 0-19 anos/60+ anos. Porm, como
cada vez mais no que diz respeito aos grandes sistemas de informao
demogrfica a nvel internacional se utiliza o primeiro critrio,
aconselhvel a sua utilizao para facilitar as comparaes.
Sem pretendermos ser exaustivos os ndices-resumo mais
utilizados em anlise demogrfica so os que agrupam a informao
respeitante populao potencialmente activa, os que aprofundam a
anlise do processo de envelhecimento e os que procuram proceder a
estimativas indirectas de determinados parmetros demogrficos.
Os principais ndices-resumo das estruturas demogrficas so os
seguintes:
Frmula:
Percentagem de Jovens
(Populao com 0-14 anos / Populao Total) x 100
Percentagem de Idosos
(Populao com 65 e + anos / Populao Total) x 100
62
Frmula:
ndice de Juventude
(Populao com 0-14 anos / Populao com 65 e + anos) x
100
Frmula:
Frmula:
ndice de Longevidade
(Populao com 75 e + anos / Populao com 65 e + anos)
x 100
Definio: Compara o peso dos idosos mais jovens com o peso dos
idosos menos jovens. tambm um indicador de medida do
envelhecimento demogrfico.
Frmula:
Frmula:
Frmula:
envelhecimento
da
populao
63
Frmula:
Frmula:
ndice de Maternidade
(Populao com 0-4 anos / Populao com 15-49 anos) x
100
ndice de Tendncia
(Populao com 0-4 anos / Populao com 5-9 anos) x 100
Frmula:
ndice de Potencialidade
(Populao com 20-34 anos / Populao com 35-49 anos) x
100
64
Os nascimentos tendem sempre a aumentar durante o processo de
declnio da mortalidade, a no ser que uma nova atitude face vida
comece igualmente a surgir.
O principal factor natural responsvel pelo envelhecimento
demogrfico foi o declnio da natalidade. Uma reduo no nmero de
nascimentos produz na estrutura etria de uma populao uma
diminuio progressiva dos efectivos mais jovens o envelhecimento na
base e consequentemente um aumento da importncia relativa dos
mais idosos o envelhecimento no topo. O envelhecimento demogrfico
do continente europeu assim uma consequncia directa do acentuado
declnio da fecundidade nas ltimas dezenas de anos.
verdade que o fenmeno do envelhecimento demogrfico no
um processo exclusivamente explicado por factores naturais. Embora
seja a dinmica das relaes entre a mortalidade e a natalidade que
transmite uma certa unidade ao processo, no possvel ignorarmos
que a dinmica das populaes humanas movida tambm por outros
factores.
O homem um ser dotado de uma grande mobilidade. As
migraes, sendo selectivas, produzem necessariamente efeitos
estruturais importantes.
Se um pas, ou uma regio, recebedor de populao, os
potencialmente activos aumentam. Este aumento implica a existncia de
uma diminuio nos outros dois grupos de idades os jovens diminuem
proporcionalmente (logo temos um envelhecimento na base) e os idosos
tambm
diminuem
proporcionalmente
(o
que
implica
um
rejuvenescimento no topo).
Inversamente, num pas ou numa regio exportadora de mo-deobra, a tendncia natural para o aumento da importncia da populao
idosa acentuada pelos movimentos migratrios.
Numa populao submetida apenas a movimentos naturais, as
mulheres idosas so, em geral, o dobro ou o triplo dos idosos do sexo
masculino. Esta situao pode, conforme vimos anteriormente, ser
agravada ou atenuada com o efeito dos movimentos migratrios.
Finalmente, o ltimo aspecto do envelhecimento demogrfico diz
respeito ao progressivo aumento dos efectivos nas idades mais
avanadas. Este fenmeno particularmente visvel nos pases onde a
esperana de vida bastante elevada.
Em sntese, a causa fundamental do envelhecimento demogrfico
o declnio da fecundidade.
A universalidade do processo de envelhecimento demogrfico
obriga-nos a repensar o conceito de velho na sociedade actual (uma
coisa so os problemas econmicos que resultam de se parar a
actividade aos 60 ou 65 anos, e outra os problemas relacionados com a
velhice e a dependncia que ocorre muito mais tarde) e o conceito de
poltica de terceira idade... no ser antes uma poltica global da idade
que se torna urgente implementar em vez de polticas destinadas a
grupos especficos?
65
4. OS SISTEMAS DE INFORMAO
DEMOGRFICA E A ANLISE DA
QUALIDADE DOS DADOS
No captulo anterior, identificmos os problemas iniciais de uma investigao
em anlise demogrfica. A anlise destes aspectos iniciais permite conhecer o tipo
de regio que estamos a analisar e formular um conjunto de questes iniciais:
66
da recolha uma das caractersticas principais dos recenseamentos
estes devem ser realizados num determinado ano e por referncia a um
determinado dia do ms. A outra caracterstica fundamental dos
recenseamentos a exaustividade, ou seja, sempre o total da
populao que se procura conhecer e caracterizar.
Em Portugal, o censo realizado em 1 de Janeiro de 1864
considerado como o 1. Recenseamento Geral da Populao, atendendo
ao facto de terem sido seguidas as orientaes das reunies dos
Congressos Internacionais de Estatstica de Bruxelas (1853) e Paris
(1855). No censo de 1864, os indivduos foram recenseados atravs dos
boletins de famlia, cuja distribuio assentou na lista dos fogos, com
recurso ao mtodo directo e nominal. Os dados publicados so
apresentados por distritos, por concelhos e freguesias, sempre com o
mesmo tipo de informao: idades, sexos, estado civil, ausentes,
populao flutuante e fogos. No fim do volume, antes do censo das Ilhas
Adjacentes, a informao est agrupada por distritos. As principais
dificuldades encontradas foram fundamentalmente de trs tipos:
identificao dos fogos, devido a ser pouco frequente a existncia de
nmeros de polcia;
a impreciso nas respostas profisso (o que impediu o seu
apuramento), e
a dificuldade em separar a populao urbana da populao rural
(eram urbanas todas as pessoas que viviam nas capitais de distrito e
em mais algumas cidades de interesse histrico ou poltico).
O 2. Recenseamento da Populao foi publicado em 1881 e tem
praticamente as mesmas caractersticas do censo anterior. As profisses
voltaram a no ser apuradas e persistiram as dificuldades na aplicao
dos conceitos de populao rural e populao urbana (no essencial,
adoptaram-se as definies do recenseamento anterior). Saliente-se
ainda que, no fim do volume, foram introduzidos quatro mapas que
facilitam a visualizao espacial dos resultados obtidos.
O 3. Recenseamento da Populao estava marcado para 1888
mas, para se ter em conta as directrizes do Congresso Internacional de
Estatstica de 1872, o qual preconizou a realizao dos censos nos anos
terminados em zero, houve um adiamento de dois anos. O momento
censitrio foi antecipado para o 1. de Dezembro, para evitar a data de
31 de Dezembro/1. de Janeiro onde ocorrem muitos movimentos
migratrios. Quanto s novidades, temos fundamentalmente as
seguintes:
uma introduo bastante desenvolvida, procedendo-se a comparaes
com os resultados obtidos anteriormente;
a informao sobre os estrangeiros mais detalhada;
aparecem as profisses at ao nvel de concelho;
os grupos etrios voltam a ser modificados quer na fixao dos limites
do apuramento quer no nvel de desagregao, as estruturas etrias
s so publicadas at ao nvel de concelho.
O 4. Recenseamento da Populao teve lugar em 1 de Dezembro
de 1900. A informao publicada tambm muito semelhante do
censo anterior, com excepo da profisso (os grandes grupos
profissionais so desenvolvidos e cruzados com a varivel idade) e da
religio (aparece publicada pela primeira vez este tipo de informao
agrupando os indivduos em catlicos, protestantes, ortodoxos, israelitas,
maometanos, sem religio e de religio ignorada).
O 5. Recenseamento da Populao era para ter sido realizado em
1910, mas a alterao do regime poltico fez adiar esta operao para
67
um ano mais tarde. Tambm foi publicado em 4 volumes e muito
semelhante, no tratamento da informao, ao censo anterior. Na IV
Parte, so apresentados dados sobre a longevidade (pessoas com mais
de 80 anos) at ao nvel de freguesia. Tambm na ltima parte, a
populao de facto de cada freguesia distribuda pelos ncleos de
populao que a constituem.
O 6. Recenseamento da Populao teve lugar em 1 de Dezembro
de 1920. Os resultados foram publicados em apenas dois volumes e
apresentam as mesmas caractersticas do censo anterior. No se
encontram mudanas relevantes a assinalar, a no a de uma melhor
preciso do conceito de profisso, que identificada com o ofcio
exercido.
O 7. Recenseamento da Populao teve lugar em 1 de Dezembro
de 1930. Os resultados foram publicados em trs volumes e dois
folhetos. As profisses ocupam por inteiro o terceiro volume, se bem que
a confuso entre profisses e actividades continue a ser grande. De
resto, em tudo igual aos censos anteriores mais prximos.
O 8. Recenseamento da Populao ocorreu em 12 de Dezembro
de 1940. Foi o primeiro censo realizado pelo Instituto Nacional de
Estatstica. Os resultados foram publicados em 25 volumes e 2 folhetos
(Memria Descritiva, Relatrio, um volume para cada distrito e um
volume com a informao total do pas). Surgem novos conceitos e
outros so clarificados: aparece, pela primeira vez, o conceito de prdio
(toda a construo permanente que possa ser destinada a habitao,
alojamento ou abrigo de pessoas); precisa-se o conceito de famlia
(grupo de pessoas unidas por parentesco legtimo ou ilegtimo que
residiam na mesma habitao e cujas refeies eram normalmente
tomadas em conjunto; a pessoa s em habitao separada); foi criado o
conceito de casal e de convivncia.
O 9. Recenseamento da Populao teve lugar em 15 de
Dezembro de 1950. Foi publicado em cinco volumes, e apresenta
algumas inovaes metodolgicas. Pela primeira vez os recenseados
so questionados (com a tcnica de pergunta com resposta fechada)
sobre as condies de habitao, e introduzem-se novos conceitos
relacionados com as caractersticas econmicas.
O 10. Recenseamento da Populao ocorreu em 15 de Dezembro
de 1960. Foi publicado em seis tomos, alguns deles com vrios volumes.
A populao residente passa a ser a base do apuramento das diversas
caractersticas publicadas. No ltimo volume, so apresentados dados
retrospectivos at ao nvel de freguesia que so muito teis.
O 11. Recenseamento da Populao foi realizado em 15 de
Dezembro de 1970. Os dados publicados foram extrados de uma
amostra a 20%. A informao apresentada no rica, variada e de
qualidade como nos censos anteriores. Felizmente, o fundamental foi
publicado: a populao total at ao nvel de freguesia, as estruturas
populacionais at ao nvel de concelho, a composio das famlias e a
populao activa.
O 12. Recenseamento da Populao foi realizado em 16 de Maro
de 1981. A inquirio foi extensiva a toda a populao e a todas as
unidades de alojamento. A informao respeitante residncia anterior
(particularmente til para o estudo das migraes) desenvolvida ao
introduzir dois momentos temporais o 31 de Dezembro de 1979 e o 31
de Dezembro de 1973.
O 13. Recenseamento da Populao teve lugar em 15 de Abril de
1991. Este censo, tal como os dois anteriores, ocorreu em simultneo
68
com o Recenseamento Geral da Habitao e foi realizado em
colaborao com as autarquias locais. A disponibilidade dos dados foi
efectuada ao longo de quatro fases (dados preliminares, provisrios, prdefinitivos e definitivos). Os resultados finais foram apresentados em oito
publicaes (uma para cada uma das sete NUTS II e uma para o total de
Portugal). Os Censos-91 foram realizados com base na utilizao de seis
questionrios (Edifcio, Alojamento, Famlia Clssica, Famlia
Institucional, Indivduo e Colectivo) e definiu a seguinte estrutura de
unidades estatsticas primrias e de variveis a observar:
Edifcio;
Alojamento;
Famlia Clssica;
Famlia Institucional;
Indivduo.
Dimenso do lugar;
Tipo de lugar;
Isolado;
Grupo socioeconmico;
Famlia clssica;
Ncleo familiar.
69
casamento ou bito e indicar simultaneamente o servio pblico
encarregue de atestar esses factos.
costume ir buscar ao Conclio de Trento os comeos deste tipo
de registos por este Conclio alargar a todo o mundo catlico a
obrigatoriedade do registo dos principais acontecimentos naturais do
ciclo de vida nascimentos, casamentos e bitos.
Apenas em Fevereiro de 1911 se determinou a obrigatoriedade do
registo civil, retirando-se aos assentos paroquiais lavrados, a partir
daquela data, os efeitos civis que at ali tinham tido e ordenou-se que os
assentos paroquiais anteriores a 1911 fossem recolhidos nas
Conservatrias do Registo Civil.
No incio do sculo, o tratamento dado aos nascimentos era inferior
ao tratamento dado mortalidade e s migraes.
No incio do sculo, a mortalidade e a emigrao eram as grandes
preocupaes de carcter demogrfico dos governos.
No que diz respeito s grandes alteraes ocorridas nos ltimos
anos salientamos apenas o facto de, a partir de 1988, as Estatsticas
Demogrficas passarem a utilizar a Nomenclatura das Unidades
Territoriais para Fins Estatsticos (NUTS). Os dados concelhios, em vez
de se agruparem por distritos (como acontecia desde o sculo XIX)
passaram a ser agrupados por NUTS.
verdade que foram interrompidas as sries temporais distritais,
mas tal atitude por parte do INE resultou do cumprimento de normas
resultantes da adeso de Portugal Comunidade Econmica Europeia,
e que foi regulamentada inicialmente pela Resoluo do Conselho de
Ministros n. 34/86 de 5 de Maio e posteriormente pelo decreto-lei n.
46189 de 15 de Fevereiro.
70
Os Recenseamentos Eleitorais, que anualmente nos fornecem uma
base de dados, contemplam a populao com capacidade eleitoral, ou
seja, com mais de 18 anos. Seria uma fonte preciosa para os anos
intermdios dos recenseamentos da populao se no fosse o caso de
existir um significativo empolamento dos efectivos estimados devido
fundamentalmente a dois factores: o no abatimento imediato dos bitos
e as sadas migratrias.
Na dcada de 80 foi fundamentalmente por estas razes que se
teve a iluso que a populao portuguesa estava a aumentar
significativamente e que j tinha ultrapassado a barreira dos 10 milhes
de habitantes, o que na realidade no aconteceu. Foi preciso esperar
pelos resultados definitivos de 2001 para nos certificarmos daquilo que o
movimento da populao j nos indicava o Recenseamento de 1991 foi
de muito boa qualidade, conforme podemos verificar quando
comparmos a consistncia dos dados entre 1991 e 2001.
Nestas circunstncias, o Recenseamento Eleitoral continua a ser
importante desde que, no mnimo, se tenha em conta a existncia de um
erro global de 10% a 15%, devido s dificuldades de actualizao dos
bitos e das migraes.
71
intervalo de variao deste erro, que devido existncia de
populaes pouco numerosas:
para um total de 1000 nascimentos temos, em teoria, 512
nascimentos masculinos e 488 nascimentos femininos, ou seja,
uma proporo de rapazes de 0,512;
os limites do intervalo de confiana a 95% so determinados por
____________________________
72
Este ndice pode variar entre 100 (ausncia total de concentrao)
e 500 (caso limite em que todas as pessoas se declaram em idades
terminadas em 0 e 5).
Suponhamos que num determinado recenseamento a populao
total de 23 a 62 anos (inclusive) de 1 774 524 no sexo masculino e de
2 024 972 no sexo feminino. Sabemos ainda que a populao com 25,
30... 60 anos no sexo masculino de 364 498 e no sexo feminino de
412 637 pessoas.
Clculo dos ndices de Whipple:
IW (H) = [ 364 498 / (1 774 524 / 5) = 103
IW (M) = [ 412 637 / (2 024 972 / 5) = 102
73
masculinidade obtidas, somam-se em mdulo e calcula-se a
diferena mdia para se obter o ndice de regularidade dos
sexos;
para cada sexo calcula-se um ndice de regularidade das idades;
este ndice obtm-se calculando, em primeiro lugar, as relaes
de regularidade dividindo cada grupo de idades pela mdia
aritmtica dos dois grupos que o enquadram; posteriormente
fazem-se as diferenas a 100 e faz-se a mdia das diferenas
absolutas;
o ICNU obtm-se dando um coeficiente 3 ao ndice de
regularidade dos sexos e um coeficiente 1 aos dois ndices de
regularidade das idades.
74
um tipo de anlise semelhante que temos sempre de elaborar
para cada caso. Porm, a anlise nem sempre fcil. Como
recomendao de carcter prtico sugerimos a observncia das
seguintes fases no raciocnio:
face s diferenas que no conseguimos explicar devem sempre ser
formuladas todas as hipteses possveis em funo do sinal obtido;
em seguida, em funo dos outros tipos de informao sobre a
qualidade dos dados, exclumos as hipteses pouco plausveis; assim,
se os recenseamentos forem de qualidade aceitvel afasta-se a
hiptese de recenseamentos de m qualidade; se a qualidade do
estado civil for boa tambm se afasta essa hiptese; fica, ento
residualmente a hiptese dos movimentos migratrios, que so
enquadrados no tipo de movimentos dominantes (emigrao,
imigrao ou migraes internas);
finalmente, como princpio geral, deve admitir-se que mais frequente
uma ausncia no registo da informao do que o fenmeno contrrio,
ou seja, existiram registos a mais no sistema em anlise.
75
5. OS PRINCPIOS DE ANLISE
DEMOGRFICA
Compete Anlise Demogrfica encontrar os fios condutores desta meada de
influncias que aparecem misturadas nos acontecimentos que so recolhidos.
Assim, a Demografia, ao analisar fenmenos e ao recolher acontecimentos pode ser
redefinida, numa perspectiva de anlise, como a cincia que estuda determinados
fenmenos (natalidade, mortalidade, migraes) a partir dos acontecimentos
(nascimentos, bitos, migrantes). A anlise destes fenmenos feita atravs de um
conjunto de princpios que comum a todas as variveis: so os Princpios de
Anlise Demogrfica.
Antes de explicitarmos os Princpios da Anlise Demogrfica comearemos
por apresentar um tipo de representao grfica, que embora tenha originalmente
sido especfico da Demografia, acabou por ser utillizado por outros domnios
cientficos e, sem o qual se torna difcil compreender o funcionamento da lgica da
anlise demogrfica: o Diagrama de Lexis.
76
(FGIH), os acontecimentos repartem-se por dois anos completos
(FGH) e trs anos completos (GHI);
I
96 640
G
96 742
145
98 000
A
1939
96 942
96 520 M
39
40
96 599 J
41
42
96 682 H
60
65
96 807 F
135
97 087 D
913
2 000
100 000 C
1940
L
96 559
O
1941
1942
1943
P
1944
1945
77
I = (1 / N) ax
C = ( x ax) / ax
78
I = I(1) + I(2) + ... + I(k)
C = (1 / I) (I(1) C(1) + I(2) C(2) + ... + I(k) C(k))
Ou seja, a intensidade de um acontecimento renovvel (por exemplo, os
nascimentos) igual soma das intensidades dos acontecimentos no
renovveis que o integram (primeiro nascimento, segundo nascimento, ... k
nascimentos). O calendrio de um acontecimento renovvel obtm-se
multiplicando o inverso da intensidade do acontecimento renovvel pela soma
dos produtos da intensidade e calendrio dos acontecimentos no renovveis
que o integram.
No caso dos acontecimentos no renovveis, possvel ainda encontrar
outras caractersticas da sua distribuio. A probabilidade de ocorrncia de um
acontecimento entre as idades exactas x e x+n tem o nome de quociente e
igual a:
qx = ax / Nx
Este conceito pode ser generalizado pelas duraes de x a x + n.
A extrapolao imediata:
q = nax / Nx onde nax so os acontecimentos entre x e x + n e Nx os
sobreviventes at idade x.
Os quocientes mais usados em anlise demogrfica so o quociente de
nupcialidade (nnx) que mede o risco dos celibatrios se casarem num
determinado intervalo de idades, e o quociente de mortalidade (nqx) que mede
o risco das pessoas morrerem tambm num determinado intervalo de
idades. A partir destes quocientes podemos determinar mais duas
distribuies: os acontecimentos no renovveis ax entre as idades exactas; e
os efectivos de indivduos que ainda no foram submetidos ao fenmeno,
partindo de um determinado efectivo inicial.
Este processo de obteno dos acontecimentos e dos efectivos a partir
dos quocientes corresponde ao clculo de um instrumento de anlise em
Demografia, conhecido pelo nome de tbuas. Embora sejam estes os tipos de
tbuas mais vulgares trata-se de um mtodo que pode ser generalizado a
todos os outros acontecimentos no renovveis tais como os nascimentos pela
ordem, divrcio pela ordem.
Dissemos anteriormente que no caso dos acontecimentos no
renovveis era possvel encontrar outras caractersticas da sua distribuio
sem ser a intensidade, o calendrio e os acontecimentos reduzidos. A primeira
dessas caractersticas apresentadas foi a noo de quociente, ponto de partida
para a elaborao de uma tbua.
A taxa definida como a diviso dos acontecimentos pela populao
mdia:
n x
tx = ax / [(Nx + Nx+1) / 2]
ou,
t = nax / (n / 2) (Nx + Nx+n)
n x
= 2tx / (2+tx)
= (2 . n . ntx) / (2 + n . ntx)
79
ax = Px tx
Ou seja, o nmero de acontecimentos observados durante um ano
igual soma dos produtos de cada populao mdia na durao x pela taxa
nessa mesma durao. O conjunto Px (P0, P1, P2, ... Pw) a estrutura
populacional e o conjunto tx so as frequncias (taxas ou acontecimentos
reduzidos) a que tambm costuma chamar-se modelo de fenmeno.
Assim, precisados os acontecimentos observados durante um ano
determinado, j podemos redefinir os objectivos da anlise transversal ao
responder a duas importantes questes:
Qual o impacto de cada um dos factores Px e tx no nmero total de
acontecimentos observados durante um determinado perodo?
O objectivo da anlise demogrfica ser, neste caso concreto,
separar o impacto, na dinmica populacional que devido estrutura
populacional, do impacto que devido s frequncias (taxas,
acontecimentos reduzidos) ou modelos dos fenmenos demogrficos.
Ao princpio de anlise que concretiza este objectivo em anlise
transversal chama-se estandardizao;
Em que medida as frequncias observadas num determinado perodo
reflectem o comportamento das coortes?
O objectivo da anlise demogrfica, neste caso, ser o de
procurar medir a intensidade e o calendrio. Ao princpio de anlise
que concretiza este objectivo, em anlise transversal, chama-se
translao.
80
Assim, por exemplo, se num determinado pas a populao em 1 de
Janeiro de 41 928 200, em 31 de Dezembro desse mesmo ano de 42 683
400 e se o nmero de bitos observados nesse ano de 503 228, a Taxa
Bruta de Mortalidade igual a:
T.B.M. = 503 228 1 [(41 928 200 + 42 683 400) / 2] x 1000 = 11,9 por mil
sendo a populao mdia, ou seja, a populao estimada em 30 de Junho,
igual a 42 305 800.
Quanto ao interesse das taxas brutas em anlise demogrfica,
facilmente se constata que as grandes vantagens so a sua rapidez de clculo
e necessitar de muito poucos dados. O seu grande inconveniente resulta de
ser um ndice muito grosseiro e inadequado para distinguir a influncia das
frequncias e das estruturas na mudana do volume populacional.
Em todo o caso, apesar da sua simplicidade de clculo, algumas
precaues devem ser tomadas:
evitar tanto quanto possvel as populaes estimadas; deve procurarse fazer coincidir a populao mdia com a populao de um
recenseamento;
evitar tanto quanto possvel trabalhar com um s ano, pois pode haver
erros ou at mesmo flutuaes aleatrias quando lidamos com
pequenos nmeros; a soluo consiste em calcular taxas respeitantes
aos pares de anos que enquadram um recenseamento dividindo os
acontecimentos por dois, quatro, seis ou mais anos.
Nas taxas definidas em funo das idades ou grupos de idades, aplicase exactamente o mesmo raciocnio das taxas brutas, com as mesmas
precaues. Apenas se diferenciam no facto de serem calculadas por idades
ou grupos de idades.
Depois de precisadas as vrias precaues e variantes a ter em conta no
clculo das diversas taxas, concentremo-nos agora no princpio da
estandardizao, que tem como objectivo fundamental manter constante o
efeito das estruturas. Por outras palavras, procura saber-se qual o impacto
na dinmica populacional que devido estrutura e o impacto que devido ao
modelo do fenmeno em anlise.
Quando temos possibilidade de calcular as frequncias por idades ou
grupos de idades (ou seja, quando os acontecimentos esto disponveis nas
estatsticas de estado civil por idades e as estruturas populacionais so
conhecidas), podemos recorrer aos seguintes mtodos:
estandardizao directa,
mdias de frequncias e
anlise por componentes principais.
Quando os acontecimentos no esto disponveis no estado civil, mas as
estruturas populacionais so conhecidas, podemos recorrer ao mtodo da
estandardizao indirecta.
Dissemos anteriormente que o nmero de acontecimentos observados
numa determinada populao, durante um perodo de tempo (normalmente um
ano) igual soma dos produtos de cada populao mdia na durao x pela
taxa nessa mesma durao.
Quando a natureza dos dados o permite, o mtodo da estandardizao
directa ou mtodo da populao-tipo consiste em calcular as taxas em cada
durao x nas diversas populaes a comparar e multiplicar essas taxas por
uma populao modelo ou uma populao-tipo.
evidente que diferentes modelos produzem diferentes resultados e em
princpio a sua escolha arbitrria. Por outro lado, quando procedemos a
81
comparaes no espao, usual escolher-se a estrutura correspondente ao
grupo que integra os subgrupos em anlise. Assim, se estamos a comparar
concelhos no interior de um distrito ou de uma NUT, escolhe-se a estrutura
desse distrito ou da NUT, se estamos a comparar pases da Unio Europeia
escolhemos a estrutura da Unio Europeia.
Quanto ao mtodo da mdia das frequncias, consiste em comparar
directamente as mdias das frequncias sem se recorrer a uma populaotipo; a mdia mais usualmente empregue a mdia aritmtica.
Um outro mtodo consiste em aplicar a anlise por componentes
principais s frequncias.
Finalmente, resta-nos o mtodo da estandardizao indirecta ou o
mtodo das taxas-tipo, quando a natureza dos dados no nos permite calcular
as frequncias nas diferentes idades.
Alguns autores defendem que os mtodos da estandardizao tm
interesse na anlise dos fenmenos no demogrficos. Pensamos que
semelhante tomada de posio s admissvel no caso dos pases que, tendo
dados muito completos, podem aplicar outros mtodos, nomeadamente os
inerentes anlise longitudinal. Na realidade, estes mtodos revelam-se
bastante teis quando existe carncia de dados ou quando estes no so de
confiana. Mais ainda, quando se trata de proceder a comparaes entre
populaes de reduzida dimenso, mesmo que os dados estejam disponveis,
a existncia de pequenos nmeros pode produzir flutuaes errticas. Neste
caso, as medidas obtidas atravs da estandardizao devem at ser preferidas
aos outros ndices passveis de serem calculados.
Quanto ao segundo princpio susceptvel de ser aplicado numa anlise
em transversal o princpio da translao tem objectivos diferentes do
princpio da estandardizao. Procura responder a duas importantes questes:
Ser possvel deduzir a intensidade e o calendrio do fenmeno em
anlise a partir das frequncias calculadas num determinado perodo
de tempo?
Ser possvel transformar as medidas transversais em medidas
longitudinais?
82
83
6. ANLISE DA MORTALIDADE
A sua diversidade no tempo e no espao deriva do facto de a sua
caracterstica principal durante o sculo XX ser o seu declnio.
As investigaes sobre a mortalidade enquanto fenmeno social gravitam em
torno de trs eixos fundamentais:
84
Para alm das diferenas espaciais e temporais nos nveis de mortalidade, nos
pases desenvolvidos sobretudo a eliminao da mortalidade diferencial o principal
objectivo a atingir nas modernas polticas sanitrias e da sade pblica.
A eliminao das diferenas entre pases ricos e pases pobres um objectivo
a atingir escala mundial, mas a sua eliminao implica um melhor conhecimento
dos comportamentos demogrficos.
verdade que preciso ter um melhor conhecimento dos factores sociais e
ambientais que intervm na manuteno destas diferenas, mas tambm
necessrio aprofundar as tcnicas de medio e caracterizao da mortalidade
enquanto varivel demogrfica. deste ltimo aspecto que se ocupa a anlise
demogrfica e da qual nos iremos ocupar no presente captulo.
85
encontra-se, na maior parte dos casos, uma pequena elevao na curva, que
exprime o modelo de mortalidade entre os 20 e os 40 anos; quando a
diarreia ou a enterite uma das principais causas de morte, o declnio rpido,
que normalmente observado nos primeiros anos de vida, em geral mais
suave.
A partir destes princpios gerais, se observarmos com ateno os valores
numricos das taxas de mortalidade por grupos de idades em 1950 e em 1990,
podemos identificar as diferenas tpicas entre os modelos da mortalidade
antiga (das sociedades de Antigo Regime ou dos pases no desenvolvidos)
e os modelos da mortalidade moderna (das sociedades desenvolvidas
actuais):
nos modelos de mortalidade antiga, a mortalidade no primeiro ano
de vida bastante elevada (quanto mais subdesenvolvido um pas,
ou quanto mais recuamos no tempo, maior a elevao do brao
esquerdo do U);
nos modelos de mortalidade moderna, a mortalidade no primeiro
ano de vida bastante baixa e o brao esquerdo do U pouco
elevado.
86
continua a ser muito importante o estudo da mortalidade infantil nas suas
mltiplas vertentes.
O indicador de mortalidade infantil mais conhecido a Taxa de
Mortalidade Infantil.
Se, numa perspectiva de anlise demogrfica, aplicarmos a noo
de taxa, teramos apenas de dividir o total de bitos observados entre os
0 e 1 anos exactos pela populao mdia existente nesse intervalo de
idades:
1. verso do clculo da TMI (aplicao da noo de taxa)
TMI = (bitos com menos de 1 anos / Populao Mdia) x 1000
Porm, quando se fala de taxa de mortalidade infantil, chama-se
taxa a algo que na realidade um quociente, ou seja, quando dividimos
os bitos com menos de um ano de vida pelo efectivo de nascimentos
observados nesse ano. Estamos assim perante um indicador que se
obtm atravs da generalizao da noo de quociente e no aplicando
a noo de taxa:
2. verso do clculo da TMI (aplicao da noo de quociente)
TMI = (bitos com menos de 1 anos / Nascimentos) x 1000
taxa de mortalidade infantil, que resulta da aplicao da
generalizao da noo de quociente, usual chamar-se Taxa de
Mortalidade Infantil Clssica. Tem a incontestvel vantagem de
relacionar directamente os bitos no primeiro ano de vida com os
nascimentos, em vez de os relacionar com a populao mdia, como o
caso da aplicao da noo de taxa.
Porm, esta forma de calcular a mortalidade infantil tambm no
inteiramente satisfatria porque os bitos observados num ano civil, num
ano completo, pertencem a duas geraes.
evidente que este novo valor tanto mais divergente do
calculado anterior quanto maior diferena houver entre os efectivos das
geraes. Se os efectivos forem iguais, basta calcularmos a Taxa de
Mortalidade Infantil Clssica. No entanto, conforme j dissemos
anteriormente, a dupla classificao recente em Portugal e quando
trabalhamos a uma escala muito reduzida, esta informao no est
disponvel. A nica soluo imputar os bitos infantis a uma mdia
ponderada dos dois efectivos de nascimentos em causa. Chama-se a
este processo de clculo o mtodo da mdia ponderada e a taxa de
mortalidade infantil passa a chamar-se a Verdadeira Taxa de
Mortalidade Infantil e que tem a seguinte frmula de clculo:
3. verso do clculo da TMI (a verdadeira taxa infantil)
TMI = (bitos com menos de 1 anos / (k N0 + k' N1)) x 1000
As causas que originam a mortalidade infantil podem ser
agrupadas em duas grandes categorias:
as endgenas e
as exgenas.
As primeiras so a consequncia de deformaes congnitas (que
nascem com o indivduo), de taras hereditrias ou de traumatismos
causados pelo parto. Quanto aos bitos exgenos, esto ligados a
causas exteriores (doenas infecciosas, subalimentao, cuidados
hospitalares insuficientes e acidentes diversos).
Os bitos endgenos so obtidos fazendo a diferena entre o total
de bitos infantis e os bitos exgenos. A Taxa de Mortalidade Infantil
87
Endgena obtm-se dividindo o total de bitos endgenos pelos
nascimentos e a Taxa de Mortalidade Infantil Exgena obtm-se
dividindo o total de bitos exgenos pelos nascimentos.
Consequentemente, a Taxa de Mortalidade Infantil Clssica igual
Taxa de Mortalidade Infantil Endgena mais a Taxa de Mortalidade
Infantil Exgena.
Em anlise demogrfica, a decomposio da mortalidade infantil
em endgena e exgena incontestavelmente o tipo de anlise mais
utilizado. Porm, dada a importncia da mortalidade nos primeiros anos
de vida, existem outros tipos de taxas que so muito utilizados como
indicadores do estado sanitrio de uma populao.
As principais so as seguintes:
A Taxa de Mortalidade Fetal Tardia ou Mortinatalidade obtmse dividindo o nmero de fetos-mortos com 28 ou mais semanas
de gestao pelos nascimentos;
88
(bitos mensais / dias do ms) x (365 ou 366 / P. mdia) x 1000
ou
[(365 ou 366 / dias do ms) x bitos mensais)] x P. mdia x 1000
89
Este mtodo simplificado o mais utilizado nos pases com uma
esperana de vida elevada, como o caso da populao portuguesa.
90
por grupos de idades. Mesmo que seja possvel obter os dados para unidades
espaciais de pequena dimenso, subsiste sempre o problema da flutuao dos
pequenos nmeros.
Finalmente, convm salientar que no caso de uma tbua de mortalidade
abreviada, as diversas funes so calculadas por grupos de idades
quinquenais, excepto no primeiro grupo, onde devido importncia da
mortalidade infantil se costuma dividir o grupo 0-4 anos completos em dois
grupos: menos de 1 ano e 1-4 anos completos.
As funes de uma tbua de mortalidade so as seguintes:
n x
n x
n x
91
n
Px = nLx+n / nLx
92
93
7. ANLISE DA NATALIDADE,
FECUNDIDADE E NUPCIALIDADE
A principal caracterstica da natalidade no sculo XX o seu declnio, declnio
esse que , em geral, posterior ao da mortalidade. Se a diminuio dos nveis de
mortalidade na maior parte dos pases desenvolvidos anterior ao nosso sculo, o
mesmo no acontece com a natalidade, cujo declnio ocorre praticamente no sculo
XX.
Em alguns pases em desenvolvimento, o declnio da natalidade ainda est no
incio do processo de transio.
Os factores responsveis pela evoluo da fecundidade so de diferente
natureza:
94
Essa correco consiste em relacionar os nascimentos directamente com a
parte da populao em que eles ocorrem: a populao feminina no perodo
frtil (por conveno, dos 15 aos 50 anos).
Assim, se nos pases A e B as populaes femininas no perodo frtil
forem respectivamente de 14 309 800 e de 319 084 mulheres, as Taxas de
Fecundidade Geral so as seguintes:
TFG (A) = 778 526 / 14 309 800 x 1000 = 54,41 por mil
TFG (B) = 54 043 /
319 084 x 1000 = 169,37 por mil
Se o nvel de fecundidade fosse correctamente medido atravs destes
indicadores de fecundidade geral poderamos dizer que a diferena de nvel
entre os dois pases era de 211% em vez de 198%.
Ao compararmos as diferenas de nvel entre os dois pases, se
utilizarmos as TBN estamos a subestimar a diferena em 13%.
Quando analismos a mortalidade decompusemos as taxas brutas nos
seus elementos constitutivos. Podemos proceder de idntica forma no caso da
natalidade, mas atendendo ao facto de no ocorrerem nascimentos em todos
os grupos populacionais, aconselhvel servirmo-nos das taxas de
fecundidade por idades ou por grupos de idades. No caso de existirem
nascimentos em que as mes tm menos de 15 anos a melhor soluo
integrar esses nascimentos no grupo 15-19 anos; no caso de existirem
nascimentos em mes com mais de 50 anos procede-se de idntica forma, ou
seja, integram-se no grupo de idades anterior.
Assim, tal como aconteceu com a anlise das taxas de mortalidade,
podemos redefinir as taxas de fecundidade geral como sendo uma soma dos
produtos das estruturas relativas em cada grupo de idades do perodo frtil das
mulheres pelas taxas nesses mesmos grupos de idades:
TFG (A) = px (A) tx (A)
TFG (B) = px (B) tx (B)
Quer calculando as taxas de fecundidade pelo processo mais simples,
quer por esta forma mais complexa, tal como aconteceu com a mortalidade, o
resultado sempre o mesmo.
As diferenas observadas entre os dois pases tm necessariamente
significados totalmente diferentes: variaes entre modelos significam a
existncia de diferentes modelos de natalidade; diferenas entre estruturas
so, em princpio, alheias ao fenmeno em anlise.
No caso da fecundidade, apesar das diferenas existentes entre os
diversos pases do mundo, tambm existe um modelo nico que tem a forma
de um chapu:
os valores partem de 0 no grupo 0-15 anos de idades;
a partir dos 15 anos, a fecundidade crescente at atingir um mximo
entre os 20 e os 35 anos;
a partir deste mximo, a fecundidade diminui at atingir de novo o
valor 0 por volta dos 50 anos ( praticamente inexistente a ocorrncia
de nascimentos a partir desta ltima idade).
95
a contracepo est pouco difundida; e a variante (no nosso exemplo
representada pelo pas A) tpica de uma populao que utiliza a contracepo
em larga escala e que concentra a sua fecundidade entre os 20 e os 35 anos.
A fecundidade mxima obtida quando uma populao combina uma
fecundidade do tipo do pas B (reduzida utilizao da contracepo) com um
incio de relaes sexuais precoces.
A representao grfica muito importante neste tipo de anlises, mas
nem sempre suficiente. Esta informao deve ser completada com o clculo
do calendrio, ou a idade mdia da fecundidade (IMF) e com a varincia das
taxas de fecundidade (VTF).
Quanto menos utilizada a contracepo, mais elevados so os valores
das taxas de fecundidade nos ltimos grupos etrios do perodo frtil e mais
elevado o valor do calendrio da fecundidade.
Quanto varincia, baixa quando o casamento tardio associado a
uma elevada prtica contraceptiva. Inversamente, a varincia elevada
quando o casamento precoce est associado ausncia de prticas
contraceptivas. A existncia de uma grande varincia uma necessidade
lgica para se obter uma fecundidade elevada e uma fecundidade baixa , em
princpio, obtida com uma varincia baixa.
96
mas que so unies estveis (exemplo Alentejo) o que torna
difcil a utilizao deste tipo de separao dos nascimentos.
3. importa saber que a fecundidade dentro e fora do casamento
pode ser medida globalmente, ou medida por idades ou grupos
de idades, e que o perodo de observao (no nosso exemplo
15-49 anos) pode variar em funo dos dados observados ou
disponveis, o que torna as comparaes temporais e espaciais
ainda mais difceis.
97
desenvolvidos, para a separao entre os comportamentos da nupcialidade e
da fecundidade.
Assim, por exemplo, se num determinado pas tivermos 72 330
casamentos e 9 675 573 habitantes como populao mdia, a Taxa Bruta de
Nupcialidade a seguinte:
TB Nupcialidade = 72 330 / 9 675 573 x 1000 = 7,48 por mil
Se utilizarmos o mesmo procedimento que adoptmos para a anlise da
fecundidade e da mortalidade chegamos concluso que a Taxa Bruta de
Nupcialidade tambm pode ser considerada como o resultado da interaco
entre o modelo do fenmeno e a estrutura por idades. O processo de clculo
o mesmo.
O modelo da nupcialidade muito semelhante ao da fecundidade: parte
de 0 no grupo 0-14 anos completos, atinge um mximo entre os 25 e os 35
anos e depois vai diminuindo gradualmente. A grande diferena em relao
fecundidade que, para alm dos 50 anos, podem continuar a ocorrer
casamentos, em todas as idades, se bem que a intensidade seja, em princpio,
mais reduzida.
O segundo aspecto a reter que, utilizando a lgica das taxas, podem
calcular-se vrios outros indicadores, que analisam aspectos particulares deste
fenmeno. No seremos exaustivos nem os desenvolveremos. Apenas nos
limitaremos a apresentar os diversos tipos de taxas que nos parecem ser os
mais importantes na perspectiva de anlise demogrfica:
Taxa de Nupcialidade Geral
relaciona os casamentos com as pessoas casveis
Taxa Nupcialidade Geral = Casamentos / Pop. com + 15 anos x 1000
Taxa de Nupcialidade Geral dos Solteiros
relaciona os casamentos com as pessoas casveis, excluindo
os vivos e os divorciados
T. Nupcialidade Geral dos Solteiros = Casamentos / Pop. solteira com
mais de 15 anos x 1000
Taxa de Nupcialidade por idades ou grupos de idades e sexos
relaciona os casamentos num determinado grupo de idades
com a populao nesse mesmo grupo
por exemplo temos no grupo de idades 25-29 anos
Taxa Nupcialidade no grupo 25-29 anos = Casamentos H (25-29
anos) / Pop. H (25-29 anos) x 1000
e que a taxa de nupcialidade do sexo masculino no grupo 25-29
anos de idade
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Taxa de Nupcialidade por ordem
quando se tem em conta a ordem
por exemplo, a taxa do primeiro casamento igual a:
Taxa Nupcialidade (1. ordem) = Casamentos de ordem 1 / Solteiros
+ 15 anos x 1000
Tambm vulgar calcular esta taxa por grupos de idades,
sexos separados; assim, aos 20-24 anos temos:
Taxa Nupcialidade (1. Ordem aos 20-24 anos) = Casamentos de
Solteiros c/ 20-24 anos / Solteiros c/ 20-24 anos x 1000
Taxa de Nupcialidade de 2. Ordem (exemplo)
relaciona os segundos casamentos com as pessoas casveis
T. Nupcialidade (2. ordem) = Casamentos de ordem 2 /
(Vivos + Divorciados) x 1000
Taxa Bruta de Divrcio
relaciona o nmero de divrcios com o total da populao
Taxa Bruta Divrcio = Divrcios / Populao x 1000
Vrias sofisticaes podem ser introduzidas:
Taxa Bruta de Divrcio Geral = Divrcios / Pop. c/ +15 anos x 1000
Taxa Bruta de Divrcio Geral (H) = Divrcios /
/ Pop. (H) c/ +15 anos x 1000
Taxa Bruta de Divrcio Geral (M) = Divrcios /
/ Pop. (M) c/ +15 anos x 1000
Taxa Bruta de Divrcio Casados = Divrcios /
/ Pop. Casada (H ou M) x 1000
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100
demogrfica, no a mobilidade espacial o objecto de estudo mas sim as
migraes. No estamos perante palavras sinnimas, mas perante conceitos com
contedos diferentes: a mobilidade espacial a capacidade de as pessoas se
deslocarem no espao, as migraes implicam a mudana do lugar de residncia.
As migraes internas so, assim, um subconjunto da mobilidade espacial.
Quando se analisa a totalidade das movimentaes quotidianas dos indivduos no
espao, estamos a falar de um conjunto finito de movimentos que so em geral
identificados como as deslocaes entre a residncia e o local de trabalho, de
estudo, de compras, de lazer e outras caractersticas semelhantes. Estamos a falar
do espao de vida ou do centro de gravidade onde tm origem os movimentos.
A modificao da residncia habitual pode ocorrer dentro do pas (migraes
internas) ou para fora do pas (emigrao e imigrao).
Procuraremos apresentar um conjunto de mtodos e tcnicas comuns aos
diversos tipos de movimentos migratrios que nos parecem ser os mais importantes,
tendo em conta a natureza dos dados disponveis em Portugal. Foi tambm a
natureza dos dados que motivou o nosso critrio de agrupamento dos mtodos:
existem tcnicas que se baseiam na utilizao directa da informao (mtodos
directos) e tcnicas indirectas que procuram construir a informao, ou seja, j
no so sistemas de informao das migraes, mas uma autntica produo de
conhecimento migratrio.
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FIM