Este documento é um trabalho de conclusão de curso sobre o tema "Flow-Feeling no esporte: Uma revisão bibliográfica". O trabalho foi realizado na Universidade Federal de Juiz de Fora e apresenta uma revisão sistemática da literatura sobre o estado mental de "flow" no contexto esportivo entre 1980 e 2009. O objetivo é integrar os estudos sobre o tema e avaliar o estado atual das pesquisas para facilitar novos estudos e preencher lacunas de conhecimento. Foram identificados e analisados 62 artigos relevantes por me
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Este documento é um trabalho de conclusão de curso sobre o tema "Flow-Feeling no esporte: Uma revisão bibliográfica". O trabalho foi realizado na Universidade Federal de Juiz de Fora e apresenta uma revisão sistemática da literatura sobre o estado mental de "flow" no contexto esportivo entre 1980 e 2009. O objetivo é integrar os estudos sobre o tema e avaliar o estado atual das pesquisas para facilitar novos estudos e preencher lacunas de conhecimento. Foram identificados e analisados 62 artigos relevantes por me
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Universidade Federal de Juiz de Fora
Faculdade de Educao Fsica e Desporto
Helder Zimmermann de Oliveira Flow-Feeling no esporte: Uma reviso bibliogrfica J uiz de Fora Dezembro de 2009 Helder Zimmermann de Oliveira Flow-Feeling no esporte: Uma reviso bibliogrfica Trabalho de concluso de Curso Apresentado como requisito para obteno de Grau de Bacharel em Educao Fsica na Faculdade de Educao Fsica e Desporto da UFJ F Orientador: Professor Dr.Renato Miranda Co-orientadora: Mestranda Simone Salvador Gomes J uiz de Fora Dezembro de 2009 Flow-Feeling no esporte: Uma reviso bibliogrfica Trabalho de concluso de Curso apresentado como requisito para obteno de grau de Bacharel em Educao Fsica na Faculdade de Educao Fsica e Desporto da UFJ F. Orientador: Professor Dr.Renato Miranda Co-orientadora:Mestranda Simone Salvador Gomes Trabalho de Concluso de Curso tendo como banca de avaliao composta pelos seguintes membros: Prof. Dr. Renato Miranda (UFJ F) - Orientador Prof.Dr. Maurcio Gatts Bara Filho (UFJ F) - Convidado Prof.Esp. Simone Salvador Gomes Co-orientadora _________________________________________________________________ Prof. Esp.Danilo Reis Coimbra (Unipac-J F) Convidado _________________________________________________________________ J uiz de Fora Dezembro de 2009 AGRADECIMENTOS Deus pela vida e dons oferecidos Aos meus pais: Antonio Carlos e Maria Eunice, por todo amor, carinho e apoio irrestritos, Aos meus irmos: Luciana e J os Gabriel pelo carinho e admirao, todos meus amigos e familiares pelas alegrias e por acreditarem em mim, Ao Professor Renato Miranda, pela oportunidade de realizao deste trabalho e convite para estudar a psicologia do esporte, Mestranda Simone S. Gomes por todo ensinamento, apoio e pacincia fundamentais para a efetuao deste trabalho. RESUMO: O presente trabalho tem o objetivo de revisar sistematicamente estudos sobre o flow no esporte e avaliar o estado atual das pesquisas, com o intuito de facilitar e suprir a carncia que existe sobre o tema. As investigaes sobre o flow-feeling tiveram sua origem em questionamentos sobre os motivos pelos quais algumas pessoas se encontram altamente envolvidas em atividades sem nenhuma recompensa externa bvia. Flow-feeling ou fluir um Estado de conscincia em que um indivduo chega a estar totalmente absorvido pelo que est fazendo at alcanar a excluso de todo outro pensamento ou emoo (J ackson e Csikszentmihalyi 2002). Conhecer melhor esse fenmeno no esporte facilita o envolvimento e o controle emocional de atletas, treinadores, rbitros e todos os praticantes de atividades fsicas. A busca de referncias relevantes se fez atravs da explorao de bancos de dados das bases SPORTDiscus e PsyINFO utilizando os seguintes termos: flow experience, flow state, autotelic experience, sports, exercise, physical activity em combinaes e idiomas variados. Palavras Chave: Flow-Feeling, Psicologia do Esporte, Reviso sistemtica. Sumrio Introduo.............................................................................................6 Metodologia...........................................................................................9 Entendendo o Flow Feeling..............................................................11 Conceituao e breve histrico..................................................13 Caractersticas/dimenses.........................................................15 Instrumentos de avaliao do Flow....................................................25 Panorama atual das pesquisas sobre o Flow.....................................26 Concluso - Desafios e perspectivas para o futuro.............................29 Referncias.........................................................................................30 6 1 Introduo A Psicologia do Esporte Desde o final do sculo XIX, alguns estudos e pesquisas tm sido desenvolvidos (a respeito de motivao, ansiedade e estresse, emoes no esporte, liderana, concentrao entre outros) para se conhecer cada vez mais as questes psicofisiolgicas no esporte. Assim como em outras reas da psicologia, existe vrios conceitos e diversas discusses sobre a origem da psicologia do esporte. (Vasquez, 2005). A mais aceita e, portanto, mais encontrada na literatura a verso que atribui o seu surgimento ao psiclogo americano Norman Triplett, que queria entender a razo pela qual ciclistas pedalavam mais rapidamente quando emgrupo do que quando pedalavam sozinhos (Triplett, 1898 apud Weinberg e Gould 2001). Embora o estudo com ciclistas tenha sido pioneiro na rea, quem ficou conhecido como pai da psicologia esportiva nos EUA foi Coleman Griffith que dedicou uma poro significativa de sua carreira psicologia do esporte (Weinberg e Gould, 2001). Ele desenvolveu o primeiro laboratrio em psicologia do esporte, publicou diversas pesquisas e dois livros considerados clssicos na rea: Psychology of coaching (Psicologia do tcnico) e Psychology of athletes (Psicologia de atletas) (Vasquez, 2005). Segundo Samulski (2009) no ano de 1965, foi fundada em Roma a Sociedade Internacional de Psicologia do Esporte (Internetional Society of Sport Psychology), principal entidade criada com o objetivo de congregar pessoas interessadas em psicologia do esporte. 7 Na America Latina o desenvolvimento teve incio na dcada de 1970, em 1979 foi fundada a Sociedade Brasileira de Psicologia do Esporte, da Atividade Fsica e da Recreao (SOBRAPE), e, em 1986, foi criada a Sociedade Sul- Americana de Psicologia do Esporte, da Atividade Fsica e da Recreao (SOSUPE). A psicologia do esporte e do exerccio pode ser entendida como o estudo cientfico de pessoas e seus comportamentos em atividades esportivas e atividades fsicas e a aplicao prtica desse conhecimento (Weinberg e Gould,2001; Samulski,2009). Uma das tarefas da psicologia esportiva a aplicao das suas teorias e mtodos no desporto e a comprovao de sua utilidade na prtica.. (Samulski, 2009). J ackson (1992) apontou que as pesquisas em psicologia do esporte tm focado primariamente aspectos negativos das experincias dos atletas. Estados motivacionais negativos e sua relao com a performance, relaes entre ansiedade-desempenho, o fenmeno do drop-out, e pesquisas sobre o estresse em diferentes populaes de atletas so alguns exemplos que a autora destaca. Por isso constata-se que pouca ateno tem sido dada experincia positiva dos atletas, particularmente aos estados de experincia positivos durante a performance esportiva. O trabalho de Ravizza (1973-1984) uma notvel exceo, tendo focado no fenmeno da experincia pico no esporte. J untamente com a experincia pico, o estado mental associado com a performance pico tem sido investigado. (Cohn, 1991; Garfield & Bennett, 1984; J ackson ET AL 1992). Entretanto, esses estudos sobre experincia e performance timas dos atletas figuram fora do que parece ser o foco dominante no estudo da psicologia do 8 esporte, isto , investigar estados motivacionais negativos que influencia as performance e as experincias dos atletas no esporte. As investigaes sobre o flow-feeling tiveram sua origem em questionamentos sobre os motivos pelos quais algumas pessoas se encontram altamente envolvidas em atividades sem nenhuma recompensa externa bvia. (ENGESER ET AL, 2008). Tambm conhecido como fluir, fluidez, fluxo ou experincia mxima, o flow-feeling uma teoria proposta por Mihaly Csikszentmihalyi na dcada de 70 que se refere basicamente a um estado mental no qual as pessoas parecem fluir, quando mostram um esforo produtivo e motivado, associado a vrias emoes relacionadas a comportamentos positivos e funcionais. (CSIKSZENTMIHALYI, 1990; MURCIA ET AL, 2006; ENGESER ET AL, 2008, MIRANDA; BARA FILHO, 2008) O presente estudo tem o objetivo de integrar os estudos sobre o flow no esporte e avaliar o estado atual das pesquisas, com o intuito de facilitar novos estudos e suprir a carncia que existe sobre o tema. Trata-se de uma reviso sistemtica da literatura abrangendo o perodo de 1980 a 2009, incluindo artigos de lngua portuguesa, inglesa, e espanhola. Devido importncia e vanguarda do tema para o esporte, faz-se necessrio um estudo bibliogrfico a respeito do tema, na tentativa de reunir e facilitar novas pesquisas a respeito dessa teoria. 9 2 Metodologia Trata-se de uma reviso sistemtica de literatura sendo feita uma busca de referncias relevantes para elaborao da pesquisa que se fez atravs da explorao de bancos de dados das bases SPORTDiscus e PsyINFO utilizando os seguintes termos: flow experience, flow state, autotelic experience, sports, exercise, physical activity em combinaes variadas e diferentes idiomas. Alm disso, as referncias bibliogrficas de todos os artigos considerados relevantes foramtambmavaliadas com o objetivo de localizar os artigos que no haviam sido encontrados pela busca eletrnica. Os principais livros, que embasaram toda a fundamentao terica desses estudos tambm foramutilizados neste trabalho. 2000 1990 1980 Dcada de Publicao 70,0% 60,0% 50,0% 40,0% 30,0% 20,0% 10,0% 0,0% P e r c e n t 10 Sessenta e dois artigos foram identificados e considerados pertinentes ao presente estudo. Observa-se na Figura 1 que na dcada de 1980 apenas 2 artigos (3,2%) foram publicados; na dcada de 1990 houve um crescimento das pesquisas sendo encontrados 18 artigos (29%) sobre o tema. Do total, 42 artigos (67,7%) foram publicados na ltima dcada, o que indica um crescente o aumento do investimento em pesquisas sobre o tema e contribui para a importncia e relevncia do presente estudo. Os artigos selecionados foram publicados em 32 peridicos diferentes das reas de educao fsica e psicologia. Os mais comumente encontrados foram os selecionados partir de peridicos relacionados Psicologia do Esporte : J ournal of Exercise Psychology (8 artigos); J ournal of Applied Sport Psychology (7 artigos); The Sport Psychology (6 artigos); Psychology of Sport and Exercise (5 artigos), Athletic Insight (4artigos); International J ournal of Sport & Exercise Psychology (2). Os demais peridicos continham apenas um artigo cada um. 11 3 Entendendo o Flow Feeling A teoria do flow-feeling foi proposta por Mihaly Csikszentmihalyi, a partir da dcada de 70. Ela ajuda a entender melhor por que algumas pessoas realizam certas tarefas com o mximo de desempenho e em alto grau de motivao (Miranda e Bara Filho, 2008). Sentir-se completamente envolvido na atividade a ser realizada diante de alguns fatores negativamente estressantes do cotidiano (cobrana por resultados, presso da famlia e dos patrocinadores...) tem se tornado cada vez mais difcil. Compreender melhor essa teoria tem o intuito de facilitar as pessoas/atletas a vivenciarem momentos de timo desempenho em suas vidas. Flow um fenmeno psicolgico complexo que tem sido estudado em outras reas mais do que no esporte(Csikszentmihalyi, 1988). Alm da sua complexidade, vrios termos e expresses so utilizadas para fazer referncia a esse fenmeno, o que dificulta seu estudo. Torres (2006) afirma que existe mais de 30 expresses diferentes utilizadas para fazer referncia ao flow, porm com o passar dos anos algumas se tornaram mais comuns. Entre as mais conhecidas esto: fluir, fluidez, fluxo, experincia mxima (optimal-experience), ou simplesmente flow. Csikszentmihalyi (1990) ainda refere-se ao flow como divertimento (fun) e prazer (enjoyment). Segundo J ackson (1996), o divertimento ou diverso o primeiro motivo que leva a muitas pessoas a se tornarem praticante de esportes. Mas isoladamente essa varivel no pode ser considerada sinnimo de fluir. Alguns outros autores como Ravizza (1984) tentaram associar o pico de performance a caractersticas psicolgicas, focando apenas nas descries dos 12 atletas de alto nvel sobre os seus melhores desempenhos. Porm no conseguiu aprofundar nos fatores e condies psicolgicas que os levaram a tal resultado. Em outra associao similar, J ackson (1996) distingui o pico de performance (peakperformance; peak-experience) o divertimento ou prazer (fun; enjoyrment) do flow devido a existncia de vrias outras dimenses que esses conceitos desconsideraram. Isso demonstra a profundidade do estado psicolgico da pessoa que se encontra no estado de fluidez (flow), nem sempre o melhor desempenho estar associado ao canal do fluir, porm caso a pessoa atinja esse canal, certamente sua performance ser otimizada. 13 3.1 Conceituao e Breve Histrico Antes de se constituir um conceito para o fenmeno estudado Woodworth (1918) apud Engenser ET AL (2008) percebeu que em certas atividades, adultos e crianas desenvolviam ateno especial e pareciam to absorvidas que demonstravam um interesse e motivao nicos. O conceito de flow foi desenvolvido em meados da dcada de 70 por Mihaly Csikszentmihalyi em estudos nas reas do trabalho, social e educacional. Antes de estudar esse fenmeno no esporte, explorou o flow nas reas de jogos e estudos sobre a felicidade. No total publicou 10 livros a respeito do tema. J untamente com Susan A. J ackson, Csikszentmihalyi tambm foi pioneiro nesses estudos na rea esportiva. Atualmente os dois continuam sendo as maiores referncias sobre o flow e todos os trabalhos encontrados e utilizados nessa monografia citavam e utilizavam esses dois autores como base para as publicaes. muito difcil estabelecer uma nica definio dessa teoria, devido aos inmeros conceitos encontrados A complexidade desse fenmeno no esporte reflete um pouco na variedade de expresses que so utilizadas para se referir assim como os diferentes conceitos que se pode encontrar sobre esse fenmeno (J ackson e Csikszentmihalyi, 2002; Torres, 2006). Csikszentmihalyi (1977) apud Fossmo (2006) em seu primeiro livro definiu flow como uma sensao holstica que a pessoa sente quando age com total envolvimento. Csikszentmihalyi (1992 e 1997) tambm define flow como o estado mental na qual as pessoas parecem fluir, quando mostram um esforo produtivo e motivado, associado a vrias emoes relacionadas a comportamentos positivos 14 e funcionais. A pessoa e as atividades passam a ser nicos. como ela no se percebesse separada da prpria ao de to envolvida na atividade. J ackson e Csikszentmihalyi (2002) apresentam outra definio: Estado de conscincia em que um indivduo chega a estar totalmente absorvido pelo que est fazendo at alcanar a excluso de todo outro pensamento ou emoo Consta que Csikszentmihalyi (1992) tambm defeniu o flow como o estado no qual as pessoas esto de tal maneira mergulhadas em uma atividade que nada mais parece ter importncia. A experincia em si to agradvel que as pessoas vivenciariam mesmo pagando um alto preo pelo simples prazer em senti-la. J ackson e Eklund (2002) definem estado psicolgico timo que representa momentos em que tudo favorece a performance; Freqentemente est associado a altos nveis de performance e experincias altamente positivas. Pode-se entender como um estado psicolgico timo, em que os atletas e praticantes de atividade fsica conseguem abstrair-se completamente do seu rendimento, at um ponto em que suas sensaes, percepes e aes so experimentadas de forma extremamente positiva, e aparentemente chegam a efetuar um bom rendimento de forma quase automtica (J ackson, 2000) Vale ressaltar alguns aspectos comuns a quase todas as definies que podem ser destacados: O alto nvel de concentrao, a satisfao e apreciao por sentir o flow e a relao com o rendimento timo. A seguir apresentaremos as caractersticas da teoria que ressaltam esses aspectos comuns aos conceitos. 15 3.2Caractersticas/Dimenses do Flow J ackson e Csikszentmihalyi (2002) abordam as nove dimenses do flow reconhecidas pelos atletas como componentes do prazer e quando esto totalmente envolvidos na tarefa, independentemente de ser em treinos ou em competies. Torres (2006) ressalta que o Flow pode variar em seu nvel de intensidade e profundidade. A presena das nove caractersticas/dimenses correspondem a um estado total e profundo do fluir. As nove dimenses so as seguintes: (J ackson 2000; J ackson e Csikszentmihalyi 2002; Torres 2006; Miranda e Bara Filho 2008): 1. Equilibrio desafio-habilidade 2. Fuso entre ao e ateno 3. Objetivos claros 4. Feedback imediato 5. Concentrao intensa na tarefa 6. Controle absoluto das aes 7. Perda da autoconscincia 8. Perda da noo de tempo 9. Experincia autotlica Porm Privette (1983) props outras caractersticas/dimenses menos utilizadas e encontradas na literatura, por isso essa reviso ir apenas cit-las e haver apenas um aprofundamento nas 9 dimenses apresentadas acima. 16 Os componentes segundo Privette (1983) so: 1. Diverso 2. Alto nvel de prazer 3. Alto nvel de comprometimento 4. Fuso com o mundo 5. Sociabilidade 6. Perda do ego 7. Motivao intrnseca 8. Atividade planejada e estruturada 9. Experincia autotlica 10.Ludicidade 11.Perda da noo de espao e tempo Como podemos observar existem algumas caractersticas semelhantes. Porm segundo Torres (2006) as caractersticas propostas por Privette, baseiam- se apenas em estudos tericos, no levando em conta dados obtidos em investigaes. 3.3.1 Equilbrio desafio-habilidade Corresponde a primeira caracterstica de uma experincia tima (Csikszentmihalyi, 2002). Miranda e Bara Filho (2008), afirmam que o principal segredo dessa caracterstica reside no fato de a atividade ser desafiante para o atleta, e ele ter potencial de realiz-la com sucesso. Desafios tcnicos, tticos, fsicos e psicolgicos precisam ser includos nos treinamentos e competies, buscando sempre elevar o nvel de rendimento dos atletas. 17 Para que o atleta vivencie o fluir, necessrio equacionar o grau de dificuldade da tarefa com sua capacidade psicofsica, de modo a proporcionar atividades que exijam um devido investimento de energia psicofsica, mas que no poderiam ser realizadas sem as aptides adequadas. (Csikszentmihalyi 1992). J ackson e Csikszentmihalyi (2002) ainda sugerem que a ocorrncia do estado de fluidez inicia-se quando os desafios e as habilidades vo um pouco alm das possibilidades do nvel do atleta. Vale mencionar que um dos objetivos do treinamento desportivo gerar desafios (estmulos) ligeiramente mais altos do que as habilidades treinadas, para proporcionar aos atletas que cheguem em nveis de treinamento mais elevados (Torres,2006) A figura a seguir ilustra bem o flow e o equilbrio necessrio entre o desafio e a habilidade. Desafio alto
Ansiedade Flow baixo alto Habilidade Apatia Relaxamento/Tdio Baixo Modelo do estado do Fluir (J ackson e Csikszentmihaly, 2002, p.59) 18 O atleta s atinge o Fluir quando o nvel desafiohabildiade, encontra-se equilibrado. Caso o desafio seja muito fcil para a habilidade do atleta, ele se sentir aptico ou ir relaxar na atividade, gerando tdio. Caso o desafio seja muito complexo para o atleta, ele ficar ansioso e no conseguir ter xito na atividade. Pormcaso o nvel esteja adequado a sua capacidade psicofisiolgica, ele ter um dos pr-requisitos para que atinja o canal da fluidez. 3.3.2 Fuso entre ao e ateno Essa dimenso refere-se ao fato da pessoa concentrar-se intensamente na tarefa, isto , toda a ateno volta-se exclusivamente para tarefa que est sendo realizada (Csikszentmihalyi, 2002). Segundo Miranda e Bara Filho (2008) a concentrao to intensa que o atleta percebe seus movimentos como parte de si prprio, realizando-os em uma fuso entre corpo-mente. No precisa pensar como realizar determinado movimento tcnico ou orientao ttica. Alm disso, sua concentrao no abalada por aes externas como adversrios, arbitragem, torcida, etc. Torres (2006) acredita que essa concentrao to intensa seja a chave para abrir a porta do flow. Levando-o a um estado mais profundo do fluir. Essas aes realizam-se espontaneamente, de uma forma natural, sem esforo, inclusive so capazes de ignorar a dor e entram num ritmo sem esforo que transforma a agonia em xtase(J ackson e Csikszentmihalyi,2002). Tais percepes aparecem durante a fuso dos processos psquicos com os fsicos, criando uma percepo unificada e um equilibrado sentido de coordenao de movimentos. A conscincia unificada que acompanha a fuso da ao e da ateno talvez o aspecto mais revelador da experincia do fluir (Miranda e Bara Filho 2008). 19 3.3.3 Metas claras Atletas e tcnicos utilizam-se dessa dimenso para direcionar treinamentos e estabelecerem objetivos nos quais se quer alcanar. O estabelecimento de metas claras permite ao atleta saber exatamente o que tem que fazer durante a execuo de algum movimento desportivo. Alm do mais, essa caracterstica o alicerce para a construo da motivao (Torres, 2006). Para atingir o canal do fluir Csikszentmihalyi (1998), considera que as metas devem ser bem claras, para que os atletas saibam exatamente o que deve ser feito. Isso deve ocorrer porque quanto mais clara for a meta, mais intenso ser o foco de ateno e as distraes sero mais facilmente eliminadas. 3.3.4 Feedback Imediato Alguns autores consideram uma nica dimenso ao falar de feedback e de metas claras. Porm a maioria segue a linha proposta originalmente por Csikszentmihalyi. Feedback uma retroinformao interna e/ou externa sobre seu rendimento para ajustar seus movimentos, suas aes, suas metas, suas intensidades, etc. Um feedback imediato ajuda os atletas a manter-se concentrados no que esto fazendo e ajudam a ter um melhor desempenho na tarefa que est sendo realizada pois a partir disso eles tero a certeza de que esto no caminho certo para atingirem seus objetivos (Csikszentmihalyi,2003) 20 O manejo adequado do feedback pode facilitar a experincia de flow, uma vez que nesse estado, o feedback parece claro e preciso, e ajuda a manter a mente centrada, com uma sensao de certeza, de que tudo encaixa no seu lugar (J ackson e Csikszentmihalyi, 2002). 3.3.5 Concentrao intensa na tarefa Um desportista que deseja obter sucesso na realizao de uma tarefa deve concentrar toda a ateno possvel na tarefa. E segundo J ackson e Csikszentmihalyi (2002) essa caracterstica a mais evidente do estado de fluidez do atleta. Porm no fcil conseguir permanecer concentrado inteiramente numa prova porque muitos so os fatores que distraem as pessoas. Alguns autores descrevem essa dimenso juntamente com a fuso entre a ao e ateno, devido suas caractersticas serem muito semelhantes. O grau de envolvimento do atleta passa a ser to intenso que as conseqncias dessas duas dimenses se confundem. Tais como as questes de concentrao e distrao, automatismo e percepo do movimento. Porm Torres (2006) afirma que a concentrao uma das capacidades mais treinveis dentre as dimenses do flow. E que deve ser bem trabalhada de acordo com cada esporte, e com cada atleta. Devendo ser bem praticada as questes dos distintos focos de ateno e como evitar possveis fatores distraidores. 3.3.6 Sensao de Controle No esporte muito claro que o controle que se tem sobre o desempenho, depende fundamentalmente de uma boa preparao, de um treinamento completo e disciplinado, e por pressuposto outras dimenses do flow (Torres, 2006). 21 O mesmo autor ressalta tambm a importncia que tem o esforo do atleta, o trabalho duro em todos os nveis psicolgicos, fsicos, tcnicos e tticos para experimentar a sensao de controle. Mas essa sensao faz com que a tarefa parea fcil, solta e sem esforo. J ackson e Csikszentmihalyi (2002) acreditam que a sensao de controle elimine a possibilidade de medo e fracasso, criando uma sensao de fortaleza e seguridade para enfrentar os desafios e cumprir os objetivos planejados. Isso levaria tambm ao atleta elaborar pensamentos e aes que facilitem o acesso e a permanncia no estado de flow. 3.3.7 Perda da autoconscincia Essa dimenso se refere perda da representao que a pessoa tem de si mesma e a falta de preocupao que tem com sua prpria personalidade quando se envolvem em atividades que lhe agrada (Csikszentmihalyi, 1990). Para o mesmo autor, h um componente que desaparece da conscincia e que merece uma referncia especial: o self 1 . A perda do senso de um self separado do mundo volta , algumas vezes, acompanhada de um sentimento de unio com o ambiente, seja uma montanha, uma piscina, um time ou um carro de corrida. 1 Em resumo, a idia-self constituda por trs elementos principais: a imaginao de nossa aparncia para outra pessoa; a imaginao do julgamento dessa pessoa sobre nossa aparncia; algum tipo de auto-sentimento, como orgulho ou mortificao.(SOUZA.M.L ET AL, 2005) 22 Segundo Torres (2006) essa dimenso aparece em conjunto com outras dimenses. J amais isoladamente, por conter uma condio mais de ordem psicolgica, sem ter tanta relao com o planejamento, treinamento ou resultados obtidos. 3.3.8 Perda da noo de tempo Segundo Miranda e Bara Filho (2008) com o corpo sob controle, o tempo e o espao tomam diferentes dimenses. Pessoas num estado de fluidez relatam que o tempo parece passar em um ritmo diferente do normal. Segundo Torres (2006) o mais comum entre os atletas que fluram relatar que seus longos perodos de tempo em uma prova ou jogo passaram muito rapidamente. Porm ocorre tambm em atletas de provas curtas como os 100 metros rasos ou em provas de exploso na natao, eles afirmam ter a sensao de haver todo o tempo do mundo para realizar as aes. J ackson e Csikszentmihalyi (2002) tentam explicar essa dimenso com base no profundo envolvimento e concentrao do atleta na tarefa, isso levaria a pessoa a ter uma alterao na percepo de tempo. 3.3.9 Experincia autotlica Uma das definies descritas para experincia autotlica foi uma sensao muito positiva, de profundo envolvimento, produto da realizao da prpria atividade, ou seja recompensadora em si mesma, que gera uma forte motivao intrnseca e portanto deixa em segundo plano os resultados, incentivos externos, recompensas posteriores (Csikszentmihalyi e Csikszentmihalyi, 1998). 23 J ackson e Csikszentmihalyi (2002) acreditam que no esporte a experincia autotlica a resultante dos outros componentes do flow, por isso tambm foi identificado como componente do flow, ou ao menos como sua qualidade bsica. Portanto, a prtica de qualquer atividade desportiva em que o fim da atividade est nela mesmo, ter um efeito muito positivo para a maioria das pessoas e favorecer o aparecimento das outras dimenses do flow. A experincia autotlica, ou o fluir, eleva o curso da vida a um nvel diferente. A alienao d lugar ao envolvimento, a satisfao substitui o tdio, a impotncia se transforma num percepo de controle, e a energia psquica atua para reforar a sensao do self, em vez de se perder atendendo a objetivos exteriores. Quando a experincia intrinsicamente gratificante, a vida se justifica no presente, em vez de ser mantida como refm de um hipottico ganho futuro. (Csikszentmihalyi, 1992). 3.3.10 Anlise das dimenses Miranda e Bara Filho (2008) trazemdimenses um pouco diferentes das apresentadas acima, pois como j foi descrito, fundem em uma nica dimenso objetivos claros e feedback imediato, e unificam tambm, concentrao na tarefa e fuso entre ao e ateno. Torres (2006) afirma que ainda no est muito claro na literatura e que se faz necessrio uma reviso na dinmica das interaes entre as dimenses que se pode estabelecer no flow. Outra dimenso que Miranda e Bara Filho (2008) acrescentam : alegria espontnea e experincia intrinsecamente compensadora. Que em resumo fala da no preocupao por parte do atleta em recompensas externas (elogio, poder, 24 dinheiro, prmios, etc.). E fala da tambm que a alegria espontnea o que caracteriza o comportamento de um atleta que flui. Nesse contexto os mesmos autores indicam quatro condies bsicas do fluir: a) Relacionar a estrutura da atividade habilidade do atleta b) Oferecer percepo de descoberta c) Impulsionar o atleta para nveis mais elevados de desempenho d) Conduzir o atleta a estados de conscincia jamais sonhados 25 4 Instrumentos de avaliao do flow Desde os primeiros estudos sobre o flow, verifica-se a importncia que se tem de encontrar instrumentos e procedimentos vlidos e confiveis para a evoluo do flow e que permitam compreender melhor esse estado. (J ackson e Roberts, 1992). Os mesmos autores ainda destacam que quando se trata de fenmenos subjetivos como o flow, os mtodos qualitativos so uma fonte valiosa de informao, e que tem potencial de revelar mais dados acerca de experincias subjetivas. A partir disso J ackson e Marsh (1996) criaram a primeira escala do flow. A Flow State Scale (FSS), que se baseou nas nove caractersticas/dimenses apresentadas acima. Outros estudos posteriores confirmaram a validade e eficincia da escala proposta por J ackson e Marsh. Porm houve a necessidade de alterar cinco perguntas do questionrio original, dando origem assim a Flow State Scale-2 (FSS-2) validadas por J ackson e Eklund (2002). Devido as diferenas individuais encontradas para se alcanar o canal do fluir, foi criada uma nova escala que mede a disposio do atleta para o flow. O dispositional flow scale (DFS) elaborada tambm por J acskson e Eklund (2002), por isso toda baseada no FSS. E assim como a FSS, elaboraram visando as mesmas correes o (DFS-2). Em 2004, Lopez validou a FSS-2 e a DFS-2 para a lngua espanhola. Ainda no existe esse questionrio validado para o portugus. 26 5 Panorama atual das pesquisas sobre flow Nas primeiras investigaes sobre as variveis relacionadas com o flow no esporte utilizaram-se mtodos qualitativos, sobretudo os fatores psicolgicos que facilitam, ou impedem o estado do fluir durante o rendimento desportivo (Torres 2006). Para quantificar essas variveis as escalas elaboradas por J ackson e colaboradores permitiramuma anlise quantitativa dos resultados. Uma das primeiras investigaes a esse respeito foi feita por J ackson ET AL (1992) atravs de entrevistas com patinadores profissionais. Em seus estudos ela concluiu que atitude mental positiva, relao pr e ps competitiva com o patinador companheiro, manter-se focado e estar bem preparado fisicamente, favorecem a ocorrncia do estado do fluir.No mesmo estudo ela concluiu que os fatores interruptores do flow foram: problemas fsicos e erros, incapacidade de manter-se focado, atitude mental negativa e falta de resposta do pblico (varivel sem controle). Outro estudo feito por J ackson (1996) atravs de entrevistas com atletas profissionais de vrios esportes concluiu que o flow tem relao positiva com: planejamento pr-competitivo e competitivo, confiana e atitude positiva, preparao fsica tima e disposio, almejar nveis timos antes de competir, motivao, boa sensao de rendimento, concentrao, condies ambientais, interao com a equipe e experincia. Fossmo (2006) relacionou as variveis motivao, flow e auto-estima com a idade de atletas 145 atletas, sendo a maioria atletas profissionais em diferentes esportes (individuais e coletivos).. O autor concluiu que a idade um bom preditor para as variveis estudadas, pois a relao encontrada foi positiva. 27 Russell (2002) pesquisou o flow em atletas da rea escolar de diversos esportes e afirmou que assim como os atletas de elite, eles tem uma experincia de fluir similar, independente do gnero e do tipo de esporte (coletivo ou individual). Asakawa (2004) fez um estudo com estudantes japons e verificou que o flow independe da cultura dos atletas. O estudo foi realizado com estudantes e afirmou ser positiva tambm, a relao positiva entre o atleta autotlico e a percepo desafio-habilidade. Murcia ET AL (2005,2006) estudou na Espanha com atletas de escola que possuam entre 12 e 16 anos, e concluiu que existe uma relao positiva tanto com motivao intrnseca quanto com a extrnseca. Afirmou tambm que alunos que gostam de educao fsica possuem uma maior disposio para o flow. Wanner ET AL (2006) estudou o fenmeno do fluir nos esportes e em atividades recreacionais. Comprovou ser similar a experimentao do flow nessas atividades, e reafirmando que tambm est relacionado com o bem estar. Stavrou ET AL (2007) reafirmou que o flow est relacionado com estados emocionais positivos e nveis altos de performance Eric ET AL (2007), comparou o flow em esportes de campo variadas em jovens australianos com mdia de 20 anos de idade. Utilizou o FSS-2 e concluiu que esportes de campo facilitam a apario do flow. Martin, A.J . ET AL(2008), analisou duas formas de se medir o fluir, uma (short-flow) foi feita atravs da aplicaes dos questionrios conhecidos para se medir as caractersticas/dimenses do fluir. A outra (core-flow) reflete o fluir atravs de uma percepo subjetiva do prprio sujeito. O autor concluiu que 28 ambos so positivos e esto associados com a motivao. Afirmou ainda, que as duas formas de se analisar o fenmeno so apropriadas e eficiente. Schuler. e Brunner (2009) em um estudo com maratonistas profissionais afirmou ter uma relao positiva entre o flow e a motivao. Porm no foi encontrada uma relao positiva do fluir com o nvel de performance. Todas as pesquisas indicam o fenmeno estudado como positivo, embora exista uma necessidade considervel de novas pesquisas para esclarecer a relao de algumas variveis como demonstram os estudos acima. 29 6 Concluso - Desafios e perspectivas para o futuro Vrios autores apontaram para a necessidade de mais estudos na rea de psicologia do esporte a respeito do flow de outras caractersticas positivas relacionadas ao esporte. Algumas dificuldades foram apontadas, o fato de ser um fenmeno relativamente recente no esporte, dificultou uma padronizao nos termos a serem utilizados. Um nmero significante de autores apontamque a ausncia de estudos na rea leva a algumas variveis relacionadas ao flow conflitarem sobre sua relao. Na lngua portuguesa a nica publicao registrada foi um captulo do livro Construindo um atleta vencedor escrito por Renato Miranda e Mauricio G. Bara Filho de 2008. Conclui-se ento da necessidade de mais estudos sobre o tema, principalmente em portugus. Existe tambm carncia em alguns assuntos mais especficos que permanecem conflitantes. Como a relao entre alguma variveis e algumas dimenses. Gerar novas discusses sobre o flow-feelig e aplic-las cada vez mais ao desporto tambm se faz necessrio. 30 7 Referncias ASAKAWA, K. Flow Experience and Autotelic Personalitu in Japanese College Students: How do they experience challenges in daily life?*J ournal of Happiness Studies.Vol: 123154, 2004. CSIKSZENTMIHALYI, M. e CSIKSZENTMIHALYI I. Optimal Experience Psychologicals Studies of Flow in Consciouness. Cambridge: Cambridge University Press, 1988. 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