Ciencia e Construcao Do Conhecimento Cientifico PDF

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CINCIA E CONSTRUO DO CONHECIMENTO CIENTFICO:

CONCEPES DE PS-GRADUANDOS EM QUMICA DE UNIVERSIDADES


PBLICAS DA CIDADE DE SO CARLOS SP
SCIENCE AND CONSTRUCTION OF THE SCIENTIFIC KNOWLEDGE:
CONCEPTIONS ABOUT SCIENCE PRESENTED BY GRADUATE
CHEMISTRY STUDENTS FROM SO CARLOS CITY, SO PAULO.
Anielli Fabiula Gavioli Lemes
1

Karina Aparecida Freitas Dias de Souza
2
, Arnaldo Alves Cardoso
3

1 Universidade Federal de So Carlos, UFSCar/Departamento de Qumica; [email protected].
2 Universidade de So Paulo, USP/Instituto de Qumica; [email protected].
3 Universidade Estadual Paulista, UNESP/Instituto de Qumica; [email protected].
Resumo
As relaes entre cincia e tecnologia esto em seu auge neste incio do sculo XXI. A
universidade, como sua principal produtora, tem uma grande responsabilidade sobre as
vises irradiadas acerca da produo do trabalho cientfico e tecnolgico. Em virtude
disso e considerando que na ps-graduao que sero formados os futuros
articuladores do planejamento e continuidade da cincia brasileira, esse trabalho teve
como objetivo buscar quais so as concepes sobre cincia e construo do
conhecimento cientfico, apresentadas por alunos regularmente matriculados nos cursos
de ps-graduao em qumica de universidades pblicas da cidade de So Carlos, estado
de So Paulo. Os resultados apontam que os futuros professores das universidades
possuem uma crena cientfica, apoiada em radicalizaes de aspectos componentes da
natureza da cincia, por exemplo, o empirismo extremo. No entanto, se no forem
estancado nesse nvel de aprendizagem, sero irradiadas ao longo de um ciclo escolar.
Palavras-chave: ps-graduao; concepes de cincia.
Abstract
The relations between science and technology at the peak condition in this century. The
university, that produces mainly this, has a substantial responsibility on propagation of
views of science. Hence, and considering that it is in graduate program that will form
the future articulators of planning and continuity of Brazilian science, this article had
for objective to research what are the conceptions of the nature of science, presented
from students of graduate program in public universities of So Carlos city, in the State
of So Paulo. The results show that future professors have a scientific belief, supported
by an extremely empirical foundation, for example, and that if does not stop in this
degree of learning, will be propagated along the scholar cycle.
Keywords: graduate; conceptions of science.

1. Introduo

1.1. As concepes de cincia

A cincia muda ao longo do tempo, s vezes de um modo radical,
sendo na verdade um conhecimento provisrio, construdo por seres
humanos falveis e que, por seu esforo comum (social), tendem a
aperfeioar esse conhecimento, sem nunca possuir a garantia de
poder chegar a algo denitivo.[...] A cincia no se desenvolve em
uma torre de cristal, mas sim em um contexto social, econmico,
cultural e material bem determinado. (Martins, 2006, p.3 - 4)

As palavras de Martins (2006) aproximam-se ao conceito que Bazzo (2003)
apresenta sobre cincia. Esta seria entendida como processo social que gera uma forma
de conhecimento. Ela se distingue das outras formas de construir o conhecimento
(crenas religiosas, mitos, esoterismo, etc), pressupondo que existe uma coleo de
habilidades com um suporte instrumental e terico, um conjunto heterogneo de
mtodos que se aproximam do ideal para alcanar fins particulares (Bazzo et al., 2003).
Sob este ponto de vista, a cincia um processo de produo de verdades transitrias e
o trabalho dos cientistas uma reorganizao das experincias em um esquema racional
para a produo dessas verdades (Lopes, 2007). Esta concepo sobre cincia
apenas uma dentre diferentes possibilidades descritas na literatura. A importncia de se
conhecer concepes cientifica fundamental para o trabalho de qualidade do cientista.
A cincia de qualidade s pode ser construda pelo cientista que conhece os limites dos
resultados de seus experimentos e dos modelos construdos.
Diferentes vises epistemolgicas foram e so discutidas, cada qual em sua
poca, com suas similaridades e pontos de divergncia. No sculo XVII, Francis Bacon
defendia o mtodo empirista-indutivista e Alfred J ules Ayer o positivismo lgico com o
seu empirismo extremo (Chalmers, 1998). No sculo XX, porm, surgiu a contestao
sobre essas ideias de conhecimento seguro e permanente, da existncia de uma verdade
nica atingvel alcanada unicamente pela experimentao. Assim discutido o
racionalismo crtico de Popper e Lakatos, o racionalismo dialtico de Bachelard, os
paradigmas de Kuhn, o anarquismo epistemolgico de Feyerabend, dentre outras
propostas importantes (Borges, 1996). No entanto, os resultados apresentados por
Lemes e colaboradores (2008), ao discutir a prevalncia de concepes deturpadas entre
ps-graduandos, abre espao a concluir que no est havendo discusses dessas
questes epistemolgicas entre estes personagens importantes na construo da cincia.
Mas como explicar isso?
Uma das formas mais importantes de divulgao cientfica desenvolve-se nos
bancos escolares, desde a formao bsica at a universitria, onde os professores
trazem a sua concepo de cincia para o contexto do ensino, o que o influencia na
seleo dos contedos e na forma metodolgica de desenvolv-los (Maldaner, 2000, p.
63). Sob essa perspectiva, existem vrios trabalhos que sugerem concepes
equivocadas, existentes sobre a natureza da cincia (Albell; Smith, 1994; Bazzo et al.,
2003; Fernndez et al., 2002; Peres et al., 2001, entre outros). Dentre esses trabalhos,
Peres e colaboradores (2001) listam uma srie de concepes deturpadas sobre a cincia
que so muito discutidas na literatura: Emprico-indutivista e aterica; Viso rgida;
Viso dogmtica e fechada (aproblemtica);Viso exclusivamente analtica;Viso
acumulativa de crescimento linear; Viso individualista e elitista. Completando essa
lista de concepes, Bazzo e colaboradores (2003) acrescentam mais duas: Viso de
sentido comum; Viso descontextualizada, socialmente neutra.
importante ressaltar que as diferentes vises apresentadas por Peres e
colaboradores (2001) e Bazzo e colaboradores (2003) podem constituir diferentes
facetas de diferentes atividades relacionadas construo do conhecimento cientfico.
Um problema passa a existir, porm, quando imagens cientficas reducionistas so
construdas com base extrema nessas vises.
Essas idias sobre a natureza da cincia esto presentes no ensino bsico (Abell
e Smith, 1994), no ensino mdio (Fernndez et al., 2002; Peres et al., 2001,) e no meio
cientfico (Maldaner, 2000; Schwartz e Lederman, 2008). No h um ponto inicial dessa
divulgao, mas como destaca Maldaner (2000, p. 119): o circulo vicioso fica mantido
porque os ocupantes dos postos na produo e reproduo do conhecimento cientfico e
tcnico so sempre de novo formados dentro da mesma crena epistemolgica.. Sendo
assim, indiscutvel a necessidade de um momento de reflexo sobre a cincia por parte
daqueles que estudam ou trabalham na sua construo e divulgao, papel evidente das
universidades e cursos de ps-graduao.

1.2.A ps-graduao em qumica

No final dos anos 60, aps a institucionalizao da ps-graduao stricto sensu
no Brasil, o departamento de qumica da Universidade de So Paulo (USP), pioneiro na
ps-graduao em qumica, j havia formado cerca de 40 doutores (Braga e Azevedo,
2002). Essa formao era fundamentada na tradio alem, mesclando slidos
contedos experimentais com uma ampla formao de cultura geral, nas cincias, nas
artes e na filosofia (Braga e Azevedo, 2002, p. 307). Para o desenvolvimento desse
tipo de formao, foram estabelecidos diversos incentivos por parte da agencia criada
para fins de formao de quadros para a Universidade na poca conhecida como
Campanha de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior - Capes (atual
Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior) e do Conselho
Nacional de Pesquisas - CNPq (atual Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico
e Tecnolgico), para todas as reas do conhecimento. Na rea qumica o
desenvolvimento foi destacado, se comparado com as outras reas. Em 1968, existiam
cinco cursos de ps-graduao em qumica no pas, sendo que somente dois ofereciam
mestrado e doutorado. Em 1972, esse nmero passou para quinze programas de ps-
graduao, sendo que nove envolviam mestrado e doutorado. Em 1980, j haviam vinte
e dois cursos de ps-graduao em qumica, onze oferecendo mestrado e doutorado, e a
rea continuou em expanso.
Em 1996, a durao mdia do mestrado era de 3,4 anos e a do doutorado de 5
anos. Porm, em 2007, os perodos de obteno dos ttulos diminuram para uma mdia
de 2,3 anos para o mestrado e 4,3 para o doutorado (Capes, 2008). Para Braga e
Azevedo, 2002, essa diminuio reflexo das polticas adotadas pela agncia de
fomento, principalmente a Capes, para a melhoria do rendimento da ps-graduao
stricto sensu.
Para termos embasamento para comearmos a discutir a questo da qualidade da
ps-graduao, que hoje est mais relacionada diminuio do tempo de obteno de
ttulos e ao aumento da produtividade cientfica, temos que considerar uma estrutura
que abarca toda ela. Por isso, este trabalho busca trazer uma contribuio para tal
reflexo, relatando quais as concepes sobre cincia e construo do conhecimento
cientfico apresentadas por alunos regularmente matriculados nos cursos de ps-
graduao em qumica de universidades pblicas paulistas.

2. Metodologia

Diante do exposto e considerando a discusso de Harres (1999), sobre a
necessidade de maior estruturao das metodologias para a investigao de concepes
de cincia, empregando e explicitando o embasamento terico filosfico na construo
das mesmas e utilizando tambm instrumentos diversificados, esse trabalho utilizou um
pr-teste aplicado a seis doutorandos em qumica, para que pudssemos estruturar
melhor a metodologia e validar os resultados. A estrutura do pr-teste, portanto,
constituiu-se em levantamento dos dados; uma entrevista semi-estruturada; e um
questionrio/entrevista com quinze sentenas, com as etapas de entrevista gravadas em
udio, para no deixarmos de considerar nenhum trecho da fala dos entrevistados. Essa
metodologia apesar de ter se demonstrada vivel para o pretendido, teve vrios
inconvenientes que se tornavam obstculos para a pesquisa, sendo o maior deles a
demora no seu desenvolvimento, refletindo assim, na menor adeso de entrevistados
pesquisa.
Uma vez levantada as dificuldades do pr-teste, seguiu-se a reestruturao do
contedo da atividade buscando o levantamento das noes de cincia de um modo
mais objetivo, mas a estrutura da atividade foi mantida. Aps reviso de cada uma das
questes, chegou-se a uma nova proposta de questionrio e roteiro de entrevista. Um
resultado direto observado foi a maior aceitao e conseqente adeso dos entrevistados
pesquisa. Somente o questionrio para o levantamento de dados, por sua vez, foi
conservado visto que essa etapa no apresentou inconvenientes. As solicitaes para o
levantamento das informaes dos entrevistados foram: graduao; curso de ps-
graduao atual e data de ingresso; se bolsista. Outra solicitao foi o preenchimento
de O que voc pretende fazer ao concluir o curso de ps-graduao? Enumere, de
acordo com sua prioridade, apenas as atividades com as quais se identifica. e
apresentamos as seguintes alternativas: i)Trabalhar na indstria; ii) Fazer doutorado/ps
doutorado; iii) Atuar como docente no Ensino Superior; iv) Atuar como docente no
Ensino Mdio; v) Prestar concursos em outras reas; vi) Outras atividades? Especifique.
A seleo dos atores da pesquisa foi aleatria e relacionou-se facilidade de
abordagem e disponibilidade dos ps-graduandos. Com isso a pesquisa teve um espao
amostral de vinte e trs ps-graduandos em qumica das universidades da cidade de So
Carlos SP. As condies no momento da pesquisa eram:
1. Universidade de So Paulo (IQSC - USP):
Cinco mestrandos
Cinco doutorandos.
2. Universidade Federal de So Carlos (DQ - UFSCar):
Oito mestrandos;
Cinco doutorandos.
Logo aps a coleta dos dados pessoais, iniciou-se uma conversa, a qual se
mostrou importante, no sentido de entender o que significa, para os ps-graduandos,
estar num programa de ps-graduao.
As sentenas do formulrio seguinte (Quadro 1) foram inspiradas nos trabalhos
de Perez e colaboradores (2003), Caetano e Neto (2005), Chalmers (1995) e Lopes
(2007). O vnculo entre as concepes de cincias investigadas e as proposies no
formulrio foram abrangentes, pois a maioria das sentenas traz mais de uma
concepo, porm nos detemos a investigar as concepes viso emprico-indutivista;
rgida e dogmtica; neutra; teoria anarquista do conhecimento; analtica; acumulativa de
crescimento linear.

Quadro 1 Conjunto de novas sentenas para o levantamento das concepes de cincia.
Voc concorda ou discorda dessas sentenas? Por que?
I - A experimentao cautelosa e a observao neutra dos fenmenos possibilitam o rigor da
construo do conhecimento cientfico.
II Sempre existe a possibilidade de se provar que uma teoria estabelecida est errada, mas
nunca podemos provar que ela correta.
III A cincia bsica pode modificar significadamente a sociedade e a tecnologia.
IV A construo do conhecimento cientifico feito com base em um projeto de trabalho, com
objetivos e metas definidas. Desvios sobre as metas e resultados inconsistentes com o projeto
no contribuem para o conhecimento cientfico.
V O conhecimento cientfico uma forma do Homem explicar o mundo e os fenmenos
naturais. Essas explicaes no so melhores, nem piores que as explicaes baseadas em mitos
antigos ou crenas religiosas.
VI A cincia, descrita nos manuais e em artigos cientficos, objetiva, sem influncia de
preferncias pessoais, modismo e presses econmicas ou polticas.
VII O conhecimento cientfico no uma criao ou construo do ser humano. O trabalho do
cientista resume-se em fazer uma releitura dos fenmenos naturais dentro de certos parmetros.
VIII O caminho para o desenvolvimento do conhecimento cientfico requer cada vez mais
uma maior especializao do cientista. S desta forma possvel explicar a complexidade dos
fatos cientficos.
IX - A evoluo do conhecimento cientifico acumulativo e condicionado ao conhecimento
anterior, no existindo crises ou remodelaes profundas. A relao entre a Alquimia e a
Qumica um bom exemplo dessa afirmao.
X A cincia segue etapas pr-estabelecidas pelo mtodo cientfico. A aplicao desse mtodo
distingue a cincia de mera especulao, confere rigor ao conhecimento cientfico e possibilita
atingir um conhecimento seguro, baseado na observao de experimentos controlados.
Uma estratgia adotada para a verificao da coerncia das falas dos entrevistados
foi a reapresentao de idias em sentidos diferentes em algumas sentenas ou at
ambigidade de idias na mesma sentena. Por exemplo, tanto a afirmao V quanto a
VII, aborda a cincia como construo humana. No entanto, as diferentes formas de
abordagens permitiram maior aproximao do que realmente entendido pelo
entrevistado.

3. As concepes de cincia dos ps-graduandos

3.1. O perfil dos entrevistados

Aps a coleta e organizao dos dados, obtivemos o perfil dos mestrandos e
doutorandos. Tivemos a necessidade de distino entre mestrandos (M) e doutorandos
(D), pois os mestrandos apresentaram argumentao mais ingnua que a dos
doutorandos, o que poderia ser explicado, ainda que no caibam afirmaes categricas,
pelo menor nmero de momentos para reflexo em razo do menor tempo de trabalho.
Feita essa primeira distino, observamos que o momento de ingresso e os cursos de
origem eram variveis (Tabela 1).

Ps-graduando Graduao Mestrado Doutorado Bolsa
M1 e M2 Bacharel em Qumica - UFSCar 2 ano pela USP - Sim
M3 Bacharel em Qumica - UEM 3 ano pela
UFSCar
- Sim
M4, M8 e M10 Bacharis em Qumica - UFSCar 3 ano pela
UFSCar
- Sim
M5 Bacharel em Qumica - UFSCar 3 ano pela USP - Sim
M6 Licenciado em Qumica - UFSCar 2 ano pela
UFSCar
- Sim
M7 Bacharel em Qumica - USP 2 ano pela USP - Sim
M9 e M12 Bacharel em Qumica - UFSCar 2 ano pela
UFSCar
- Sim
M11 Bacharel em Qumica Ambiental
UNESP - IBILCE
2 ano pela USP - Sim
M13 Bacharel em Qumica - UNICAMP 2 ano pela
UFSCar
- No
D1 Licenciada em Biologia - UEPG - 4 ano de
Doutorado Direto
pela USP
Sim
D2 Licenciado em Qumica UFSCar pela USP 3 ano pela USP Sim
D3 Bacharel e Licenciado em Qumica
- UNICENTRO
pela
UNICENTRO
2 ano pela
UFSCar
Sim
D4 Graduado em Farmcia - UFC pela UFC 3 ano pela
UFSCar
Sim
D5 Bacharel em Qumica Industrial -
UFC
pela UFSCar 2 ano pela USP Sim
D6 Bacharel em Qumica - USP pela USP 2 ano pela USP Sim
D7 Bacharel e Licenciado em Qumica
- UFSCar
pela USP 4 ano pela USP Sim
D8 Bacharel em Qumica UFSCar pela UFSCar 1 ano pela
UFSCar
Sim
D9 Bacharel e Licenciado em
Qumica- UFU
pela UFSCar 1 ano pela
UFSCar
No
D10 Bacharel em Qumica Industrial -
UFMA
pela UFMA 2 ano pela USP Sim
Tabela 1- informaes sobre os ps-graduandos
Em relao ao objetivo profissional, dentre os vinte e trs entrevistados, vinte
destacaram que se identificam com a atividade docente. Dentre esses vinte, nove
entrevistados colocaram como a primeira opo atuar como docente no Ensino
Superior e cinco participantes colocaram a opo de docncia como segunda, pois a
primeira seria a opo fazer doutorado/ps-doutorado. Portanto 87% ps-graduandos
entrevistados cogitam a docncia e 61% a tem como prioridade.

3.2. As concepes de cincia dos ps-graduandos

As vises mais recorrentes entre os ps-graduandos foram s vises empiristas e
rgidas, que nos remetem a uma a crena cientfica, caracterizada por conceber a
cincia como verdade, algo que foi provado (com experimentos), imutvel, eterno
(Martins, 2006).
Nesse sentido, a fundamentao das respostas dos ps-graduandos M1, M3, M4,
M6, M11, M13, D4 e D7, para as sentenas II e X, baseou-se somente na manipulao
dos experimentos para a comprovao da verdade. Essa viso emprico-positivista de
que o conhecimento advm dos experimentos d a impresso da existncia de um real
dado, conceito discutido por Lopes (2007) quando apresenta o pensamento do filsofo
francs Bachelard, como sendo uma cincia que se encontra em algo visvel, que se
captura o real, porm o aparente fonte de enganos, de erros (Lopes, 2007, p. 40).
Entretanto os ps-graduandos parecem crer s naquilo que se apresenta nos sentidos,
nas evidncias que so geradas pelos experimentos, esquecendo as teorias, aparentando
a concepo de experimento como sinnimo de teoria. Essa concepo exemplificada
nas falas destacadas:

M3: [Referindo-se sentena II]. Discordo!
Lemes: Por que?
M3: Porque a gente pode provar que ela correta. Se ela correta tem que ter um jeito da
gente conseguir... que nem em artigo, n?! Voc vai ler artigo a voc fala: Nossa ele
conseguiu? Ento eu vou conseguir tambm, n?! Chega na hora voc no consegue... a voc
no consegue porque ele deixou de colocar alguma coisinha ali que da certo, mas voc tem que
descobrir, mas voc consegue... tem que conseguir, se outra pessoa conseguiu voc tem que
conseguir.
------------
M3: [Referindo-se sentena X] Aqui ele fala que aplicando esse mtodo voc acaba falando
que a cincia no uma mera especulao... e eu concordo porque se voc fizer anlises,
experimentos pra voc comprovar aquilo que ele acabou de dizer verdade, isso acaba tirando,
isso acaba distinguindo a cincia de uma mera especulao. Concordo. Atravs de
conhecimentos cientficos, experimentos, n?!Ento eu concordo.
----------
M13: Discordo [Referindo-se sentena II], possvel realizar experimentos para confirmar
uma teoria e valid-la, bem como possvel demonstrar que uma teoria esteja errada com
experimentos.
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M13: [Referindo-se sentena X] Concordo, preciso seguir algumas etapas pr-
estabelecidas (como por exemplo: reviso bibliogrfica ou reviso do conhecimento at este
momento) para que se certificar que aquele conhecimento no baseado em suposies
erradas ou na percepo do cientista. Tambm necessrio seguir algumas etapas, ou uma
rotina lgica, para que o experimento possa ser repetido por outro cientista.
-------------
D4: [Referindo-se sentena II] Sempre existe a possibilidade de se provar que uma teoria
estabelecida est errada at a tudo bem. Mas nunca podemos provar que ela correta? Eu
acho que pode ser provado sim. tanto que ela virou uma teoria. Algum provou que ela
existe, n? No caso da teoria errada, voc pode provar que ela ta errada atravs de alguns
experimentos, entendeu? Mas o contrrio no. At o momento que voc v que a teoria correta,
se voc no conseguir provar ao contrrio, ela correta.
-------------
D7: No concordo com a segunda. Essa parte de que nunca pode se provar que ela correta?
No. Eu posso fazer uma sntese aqui, descrever, voc l da federal, vai seguir o procedimento
que eu escrevi, a no porque voc no conseguiu reproduzir que ela ta errada.
------------
D5: Na dois tambm ... no necessariamente todos, mas em alguns artigos que so publicados
em revistas de alto nvel... e eu sei que aquele experimento ali ta errado. Por que eu fiz um
igual e no deu certo e ali ta errado. A ... como que eu vou falar... agora em relao a essas
teorias, dos grandes cientistas, a gente no pode, a gente na verdade a gente ta seguindo o que
eles j identificaram no passado e a gente vai seguindo o que eles dizem de certa forma. E a a
medida que a gente vai treinar as coisas no laboratrio e vendo os procedimentos, voc vai
estabelecendo determinada metodologia podendo alterar ou no aquela ...e eu acho que s pela
experimentao.
Lemes: Ento voc acha que voc concorda?
D5: Eu acho que algumas teorias esto corretas sim, mas algumas esto erradas, entendeu?


Outra observao intrigante depreendida da fala do ps-graduando D5 foi o
trecho: (...) agora em relao a essas teorias, dos grandes cientistas, a gente no pode, a
gente na verdade a gente ta seguindo o que eles j identificaram no(...). Essa fala se apia
em argumentos de autoridades que seria um chamamento dos tericos clssicos para
embasar a sua certeza cientfica. Isso pode ser consequente do uso de argumentos de
autoridade que se encontram no ensino da histria cientfica. Usando um exemplo da
invocao da autoridade de Martins (2006, p.10): Embora a gente no entenda direito
a teoria da relatividade, ela foi estabelecida pelo grande fsico Albert Einstein.
Outros ps-graduandos, houve a vinculao da cincia como sendo unicamente
baseada no uso da autoridade (M10, D2 e D5), resumido pela fala do ator D2:

D2: [Referindo-se sentena II] Eu acho que sempre h a possibilidade de se provar que uma
teoria est errada e tem coisas que tem como provar que certa. No: mas nunca podemos
provar que ela correta. Se agente no pudesse provar que ela correta, a gente no se
baseava... baseia em conhecimentos que vem de outros sculos, entendeu?

Outros ainda, simplesmente concordam que a cincia correta no deixando
espao para discusso aps a sua fala. Percebe-se que colocam o conhecimento
cientifico como um dogma (M2, D3,):

M2: Ah! Eu discordo [Referindo-se sentena II] por que voc pode provar que correta!
---------
D3: [Referindo-se sentena II] Da mesma forma que eu acho que voc tem possibilidade de
provar que a teoria est errada... claro que com argumentos cientficos e mostrando atravs
do conhecimento... mostrando ali a cincia, voc pode provar que ela ta correta sim, nunca
provar [que correta]? No concordo.

Acresce que tambm encontramos discusses adequadas sobre a validade do
conhecimento cientfico (M7, D1, D8, D9). Essas discusses continham as
consideraes das convenes e parmetros que as teorias cientficas e os experimentos
se baseiam; e tambm a discusso da verdade transitria que se funda a cincia.

M7: [Comentando a sentena II] Eu acho que realmente algumas teorias no d pra voc
provar que elas esto corretas.[...]tipo teoria como se fosse um conhecimento terico, tem umas
coisas que pode-se provar, que ela ta correta pelo menos nas nossas convenes e se voc
mudar as convenes voc vai mudar a teoria... ela verdadeira dentro das convenes que a
gente tem...
-----------
D1: Eu concordo tambm com essa daqui... [Referindo-se sentena II] A gente pode chegar
muito perto da verdade... Eu acho que difcil a gente afirmar isso verdade. Eu acho que
tudo relativo.

Outra questo que podemos relacionar com a realidade desenvolvida acima a
discusso da afirmao V. Essa afirmao mostrou que a maioria, com ressalva de oito
ps-graduandos (M3, M9, M12, D1, D5, D6, D7, D8), tem convico de que a cincia
superior a qualquer tipo de conhecimento, que pode ser entendido tambm como uma
nova religio para os crticos, uma religio moderna (Chalmers, 1995), com os
experimentos como seu Deus:

M5: [Referindo-se sentena V] Essa aqui uma questo um pouco complicada. Porque tudo
cai dentro do comodismo do ser humano. O que pra ele melhor. Se uma pessoa ela muito
crtica, ela vai querer uma explicao cientfica, porque ela racional, porque ela coesa,
aquilo vai fazer razo. Se algum que no ta nem a pra nada, voc pode dizer que chove
porque Deus quer, que pra ele ta bom, n?
-----------
M4: [Referindo-se sentena V] Sim, so melhores sim. Hoje em dia a gente tem uma srie de
experimentos, a provar, por exemplo, quantos anos que o universo existe... temos hoje aparatos
cientficos, tecnologia cientfica pra fazer experimentos que no podia ser feito antigamente.
------------
D3: [Comentando a sentena V] Tem mitos, tem crenas que no tem fundamento cientfico,
ento com certeza a cincia serve para dar uma explicao bem melhor ou no sobre isso, mas
tem alguns mitos ou crenas, mas agora no me vem... eu acho que pra certos casos, eu acho,
que a explicao da cincia melhor do que as outras explicaes.

Nesse caso, no entramos no mrito de relativismo extremo (Feyerabend), pois
no consideramos que as teorias S se resumem por opes determinadas em valores
subjetivos e desejos dos indivduos, elas tm esse tipo de influencia sim, mas no s
isso. O que temos claro que cada forma de conhecimento tem a sua peculiaridade e
aceito dependendo da crena de cada indivduo da sociedade. No podemos ter pr-
conceitos contra isso, pois tambm so construes humanas tais como a cincia.
No caso dos entrevistados M9 e D10, eles entendem a cincia como uma
verdade transitria, porm eles explicitam em suas falas outra viso: a de crescimento
linear ou acumulativa:

M9: [Comentando a sentena II] A teoria serve pra explicar um conjunto de coisas que voc
compreende muito bem... mas nunca ela ta totalmente certa... ela no consegue abranger tudo,
pelo menos a maioria das teorias, n?! Ela uma representao, ela uma tentativa de
explicar alguns fenmenos... no que ela est totalmente correta, s uma tentativa, um
esboo... vrias teorias so derrubadas e so construdas outras, n?! Tem a teoria dos
modelos (atmicos) l...
Lemes: Ento voc concorda: Mas nunca podemos provar que ela ta correta...Podemos provar
que ela errada...
M9: No, no podemos provar que ela errada... o que a gente pode falar que essa teoria ela
limitada por isso, mas nunca que ela errada. Porque se voc ta falando que ela errada
voc tem que propor outra, n?! Pra explicar o fenmeno... mas a sua tambm nunca vai
abranger todos os fenmenos... a primeira parte da frase no, a segunda sim.
_______
M9: [Comentando a sentena IX] Isso verdade tambm, voc v que pra fazer uma mudana...
vai a passos lentos...(...) nada de mudana... ruptura, n?!
Lemes: Sem remodelaes profundas?
M9: Isso.

------------
D10: No concordo com a afirmao [Referindo-se sentena II]. No dessa forma. Eu acho
que... no provar que est errada. Mas provar que ela pode ser melhorada. Uma teoria que
aconteceu a 100, 200 anos, tudo bem ela funcionou, ajudou a entender vrias coisas...at
ento... at a gente perceber que essas coisas podiam acontecer de outra forma. No quer dizer
que ela tava errada. Ela foi fundamental, ela foi importante naquele determinado perodo, com
o conhecimento que ns tnhamos naquela poca.
---------
D10: Aqui j ta repetindo um pouco as de cima, n? [Referindo-se sentena IX] No
concordo de forma alguma. Que acumulativo? . Mas no condicionado s ao que existe.
Tem que sempre ter desenvolvido um experimento novo, n?! Ta falando o mesmo da questo ...
eu acho que a 2...

As falas acima explicitaram a crena em uma formulao de novas teorias
baseada somente nas correes das velhas. Essa viso acumulativa, segundo Lopes
que discorre sobre a questo que Bachelard defende, [...]se dirige idia da existncia
de um fio condutor de influncias ao longo da Histria Lopes, 2007, p.36). O filsofo
francs defende que o passado no a preparao do presente ou futuro, pois h uma
ruptura nos valores e no uso da razo em comparao do passado e do que hoje. Essa
concepo foi encontrada nas discusses das sentenas II e IX em todos os ps-
graduandos exceto nos D8 e D1.

D8: [Referindo-se sentena IX] A evoluo do conhecimento cientfico acumulativa. No.
No acumulativa. Tem coisas que a gente descarta, n?! e condicionado ao conhecimento
anterior, no. Nada no diz que a gente no pode descartar algo e comear tudo de novo. No
eu no concordo. Eu acho que a gente pode simplesmente descartar alguma coisa a partir do
momento que ela no deu certo ou agregar, n?!
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D1: No condicionada ao conhecimento anterior [comentando sentena IX] Pode ser uma
coisa que no foi nada estudado antes voc de repente viu alguma coisa e se interessou e
comeou a estudar. Existe remodelaes e antigamente era at mais forte isso... nos congressos
eles brigavam um com o outro mesmo! [...]Eles refutavam as idias dos outros... ou provar uma
coisa melhor, uma tcnica melhor... acho que isso.

Dando continuidade anlise da terceira parte da metodologia, outra viso
predominante foi a descontextualizada ou neutra. Alguns ps-graduandos sabem da
relao que a cincia tem com a sociedade, mas eles ou as pessoas podem,
particularmente, no sofrer influencia nenhuma. Isso s no pode ser identificado nas
falas de M6, M10, D2, D3, D5, D6 e D10. Para elaborarmos essa inferncia,
comparamos as conversas nas afirmaes I e VI. A tendncia do cientista numa torre
de marfim pode ser elucidada pelas falas:

M9: [Referindo-se sentena I] Essa observao neutra, seria o que? Sem interveno ou sem
pr-conceitos?
Lemes: Os dois... no sentido amplo.
M9: Ento ta razovel.
Lemes: Por que?
M9: Porque o qumico tem que ser assim, n?! Ele tem que fazer a experimentao dele com
bastante rigor, pra que ele possa conhecer mais o fenmeno. igual na [Disciplina de]
experimental. Se voc no faz com rigor, com controle da um resultado l que voc no sabe
interpretar... ento se voc faz com rigor voc consegue conhecer mais a questo.
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M9: [Referindo-se sentena VI] Sim! Pelo menos nos artigos que eu to vendo, n?! Concordo
sim, porque voc percebe isso com tanto de revista com tantos ttulos que tem em reas que pra
voc no interessa nada... na rea de cristalografia que eu tava lendo... uns artigos que o
pessoal pega faz um cristal l... Eu to falando que pra mim no tenho interesse pra minha
rea... Mas pros caras o o que h! Ta vendo? Se fosse tendncia mercadolgica aquilo no
seria... no comercial... A parte que da mais lucro pra empresa a da Engenharia de
Materiais... e pra voc ver a Qumica recebe tanto recurso quanto a Materiais... se fosse s pra
parte tecnolgica direto seria a Engenharia de Materiais ... tem gente que pesquisa cada coisa
que voc diz: ta vendo, no influencia. Tem gente que s fica na parte terica, terica to
terica que voc acha que no vai somar nada, n?! Mais soma porque pesquisa de base, n?
No tem modismo ou presses... o pesquisador pesquisa o que ele quer e ele recebe dinheiro da
FAPESP, CNPq... s ele saber escrever e pedir.
--------

M3: [Referindo-se sentena VI] hmm... ela bem objetiva! At a ta. sem influncia de
preferncias pessoais? Deveria ser, n?! modismo e presses econmicas ou polticas. , eu
concordo, n?! Pelo menos deveria ser assim... no sei se todos so assim...
Lemes: mas na sua pesquisa sim?
M3: , sim! A minha , n?!
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M7: [Referindo-se sentena VI] Eu discordo em partes. A cincia sempre tem a influencia de
preferncias pessoais, no pelo fato de resultados, mas pelo fato daquilo que voc quer
trabalhar. Voc no vai trabalhar numa coisa que voc no quer. Tudo bem que na cincia
voc deve ser mais imparcial possvel, se o cientista for tico! Mas se o cientista no for tico,
ele vai... ai ele desvirtua completamente... ele deixa de ser objetivo, deixa de ser... tem presses
econmicas ou polticas. Mas se o cientista for tico, realmente, a cincia objetiva, sem
influencia de preferncias pessoais, embora voc escolha o que voc faa... sem modismo e sem
presses econmicas ou polticas. Mas a cincia descritas nos manuais e artigos cientficos elas
sempre andam lado a lado com as presses econmicas, porque a cincia est relacionada com
a tecnologia. Se voc no gera novas tecnologias, por causa da presso econmica, o pas no
flui. Nesse ponto a cincia sofre influencias de presses econmicas. Mas no o fato de
modificao de resultado, nem nada... isso vai da pessoa que escreve o artigo.

Essas falas evidenciam que momento de construir o conhecimento, fazer o seu
experimento e a sua observao, eles esto a parte de tudo. Isolados de seus pr-
conceitos e do mundo. S depois, eles discutiro ou relacionaro com outras formas de
pensamento ou teorias. Porm, temos alguns exemplos de uma imagem menos ingnua:

M6: [Referindo-se sentena I] Eu acho que alm do experimental, da observao, a parte
terica... a parte do conhecimento engloba tudo, n?! No s a parte experimental... voc
precisa estudar, voc precisa observar, voc precisa alm de tudo ter uma idia do que ta
envolvido. Por exemplo, voc vai fazer um experimento, tem n fatores qumicos e fsicos que
interferem, ento voc precisa ter, pra a sua parte experimental ter sucesso, voc precisa ter
uma base terica.

Na questo VII, a maioria concorda que o conhecimento cientfico uma criao
ou construo do Homem, mas eles tambm concordam que esse conhecimento uma
releitura dos fenmenos naturais (M1, M2, M4, M5, M8, M9, M10, M11, M12 e M13,
D4, D7 e D8). Isso pode ser ilustrado nas falas:

M5: Perfeito, concordo sim [Referindo-se sentena VII]. Tudo existia j, antes do cientista
observar... a nica coisa que ele fez foi descrever o que alguns punham ateno outros no
sabiam bem o que era.
---------
M13: [Referindo-se sentena VII] Discordo, porque o conhecimento cientfico uma criao
do ser humano, baseado em observaes e pensamentos lgico... cientfico.
---------
D8: [Comentando a sentena VII] ... tentar explicar a viso do que a gente observa... uma
construo do ser humano, eu no concordo no. uma maneira de olhar os fenmenos
naturais.

Os estudantes M12 e D10 acham que antigamente a pesquisa cientfica era uma
releitura, mas hoje com a tecnologia no mais:

M12: discordo da sete, o conhecimento cientfico... como eu posso dizer... o cru, os primeiros
pesquisadores... tinham o objetivo de reler os fenmenos naturais, pesquisar os fenmenos
naturais, mas acho que atualmente a gente no busca mais ler os fenmenos naturais, por
causa do prprio crescimento tecnolgico.

D10: [Comentando a sentena VII] Isso aqui um tema antigo da cincia, n? Antes , na poca
de Aristles, era esse tipo de cincia... era querer entender, explicar. Hoje a gente j passou
dessa fase a gente s no tenta explicar os fenmenos a gente tenta descobrir meios de
melhorar a qualidade de vida, reduzir os efeitos causados pela atividade antropognica... e
assim vai...

Bachelard tambm critica isso, exemplificando o trabalho dos qumicos para a
construo do conhecimento cientfico. Para ele, pensar em somente re-ler os
conhecimentos uma viso positivista. Segundo o filsofo, para os positivistas, os
dados esto a sua espera, e o cientista s observa e orienta-os, para uma elaborao de
novas teorias (Lopes, 2007). Porm o francs defende (Lopes, 2007, p. 42): a cincia
no descreve ela produz fenmenos. Ou ainda (Lopes, 2007, p. 43): O qumico pensa
e trabalha em um mundo recomeado. A razo qumica, em seu dilogo com a tcnica,
avana na realizao do possvel.. Ou seja, criasse um real cientfico, baseado no em
teorias e experimentos, um real produzido pela fenomenotcnica (Lopes, 2007).

4. Reflexes Finais

Os resultados desse trabalho revelam vises ingnuas por parte da maioria dos
participantes. A inquestionabilidade, confiana e empirismo tratados de forma principal
na formao do conhecimento cientfico podem ter razes em todo seu processo de
formao. Maldaner (2000) em seu livro diz que a viso empirista/indutivista pode
advir das experincias de ensino somente ilustrativas que tiveram como objetivo a
comprovao do acerto das teorias ou pretenso de chegar a elas por meio de
generalizaes a partir da observao. O conhecimento cientfico deve ser respeitado e
no venerado. Para isso um ensino voltado a histria, filosofia e epistemologia da
cincia podem auxiliar tanto na difuso das vises adequadas, quanto nos contedos a
serem ensinados.
Acreditamos que a qualidade de ps-graduao/ps-graduandos no deve ser
decidida somente sob aspectos quantitativos, mas tambm qualitativo. A publicao de
artigos cientficos um nmero positivo, mas no pode ser o aspecto mais relevante,
constituindo o termmetro da qualidade dos programas de ps-graduao.
Na dissertao de Dall'orto (1999), e no artigo de Souza e Cardoso (2008) so
apresentadas situaes de alguns professores do ensino superior e ps-graduandos em
Qumica, sendo questionada a formao de meros tcnicos executores qualificados em
detrimento da formao de profissionais reflexivos em relao sua prtica, o que
representa risco no s para a formao de novos pesquisadores, mas tambm para o
desenvolvimento e progresso cientfico no pas.
No cabe, porm, atribuir os resultados obtidos com essa pesquisa somente aos
programas de ps-graduao. Estamos cientes que a mediao da insero desses
aprendizes nas prticas e idias da natureza da cincia no papel exclusivo de um ou
outro momento da histria escolar desses indivduos, o que bem discutido no trabalho
de Souza e Cardoso (2009). No entanto, professores e instituies responsveis pela
formao desses futuros profissionais precisam estar conscientes que no devem
negligenciar o trabalho das concepes da natureza da cincia nessa etapa de
formao.Para isso, Osrio (2003), defende a explorao dos contedos especficos

[...] no paradigma da complexidade e da razo plural, em que as
prprias cincias, ao se constiturem, reclamam-se umas das outras e
se exigem na reciprocidade das relaes que mantm com a
multiforme atuao dos homens e com a criatividade histrica. p. 192

A insero de disciplinas e debates relacionados com questes sobre a natureza
da cincia, visando maior compreenso das dinmicas sociais, cognitivas e epistmicas
da cincia (Freitas, 2006), tambm pode ser uma sada ao problema agora destacado.
Pois se entende que a instituio educacional tem um papel especfico que propiciar e
fomentar a capacidade de pensar, de refletir, de analisar e de assimilar os conhecimentos
trabalhados, buscando o sentido que eles representam educao, escola e sociedade
(Taminato, 2006). Com isso esse trabalho vem a contribuir defendendo a importncia
das discusses de questes epistemolgicas na formao de futuros professores
formadores de professores que Silva e Schnetzler (2005), pois ainda hoje v-se que a
formao de professores entendida como um processo que afeta professores de nveis
no universitrios e que pouco tem a ver com os docentes da universidade (p. 1123).

5. Referncias Bibliogrficas


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