Fichamento de Envie Meu Dicionário - Cartas de Paulo Leminski para Régis Bonvicino
Fichamento de Envie Meu Dicionário - Cartas de Paulo Leminski para Régis Bonvicino
Fichamento de Envie Meu Dicionário - Cartas de Paulo Leminski para Régis Bonvicino
dificultar a ordenao das cartas; e assim por diante. A prpria disposio na pgina
pode no ser linear, havendo interferncias, acrscimos entre as linhas ou nas margens,
pode haver ainda outros elementos grficos em jogo: mudana de instrumento de escrita
(parte mquina, parte caneta), anexos em folhas parte, insero de desenhos. Todos
os casos aventados constituem situaes de fragmentao e, a partir da, de disperso, de
incompletude.
p. 12
Naturalmente a interligao de todos esses elementos que compem o texto a ser lido,
texto esse que, composto de fragmentos, rompe uma possvel linearidade.
p. 13
h um desenvolvimento da carta, entre o relato e a reflexo, que vrias vezes acaba se
resolvendo, entre sntese e insight, num ritmo beira da composio de um poema.
p. 14
O fato que a poesia de Leminski alia recursos construtivos provenientes de seu
aprendizado concretista a uma dimenso informal, coloquial que a poesia dita marginal
dos anos 70 experimentava a partir de uma certa leitura do modernismo. Com certeza
no o caso de falar de uma poesia de sntese, (...). Assim, Leminski produziu uma
descompresso (...) jogo de palavras, (...), numa tirada (...) se alcana alguma
iluminao o que tambm era bem prprio de sua postura intelectual. (...) arquiplagos
de ideias-constelao,
p. 14-15
INTRODUO PRIMEIRA EDIO
Rgis Bonvicino
(...) montei minha vida para me sobrar todo o tempo do mundo / para ficar olhando o
sol se pr / e pensar o que bem entender.... este vnculo intenso, raro, conjuno entre
existncia e poesia (...) que desejo explicitar
p. 17
Um hierglifo egpcio pode estar muito mais cheio de sentido do que uma
palavrinha qualquer borrifada em holograma, que pode no passar de uma mera
exposio das possibilidades tcnicas de uma nova mdia. Ficar basbaque com isso,
pra mim, coisa de caipira. Como poeta de vanguarda, eu, caipira de luxe, prefiro
Homero. Lido em Grego, claro.
Com Julio Plaza, tenho vrios poemas passados para vdeo-texto, recurso que eu
acho legal, o texto em movimento (as film-letras, enfim, que Augusto de Campos,
poeta, profeta, j queria em 1955, para os poemas em cores do seu poetamenos).
Esses poemas menos foram apresentados na bienal passada.
Como se v, no sou nenhum brucutu potico defendendo o soneto, nem tenho
o hbito de soltar marimbondos de fogo pela boca.
Hoje, sei. Vanguarda coisa que pode estar em toda parte. Augusto a descobre
em Lupicnio Rodrigues. Haroldo em Li-Tai-Po, Itamar Assumpo em Adoniran
Barbosa.
p. 25
No terreno da arte, porm, no h evoluo desse tipo.
Um quadro de Matisse no portador de mais informao do que uma tela de
Rembrandt. O teatro de Brecht no superior ao de Sfocles.
A arte no avana, indo para a frente, como as pernas quando caminham.
Avana para todos os lados, como a pele num dia de muito frio ou muito calor.
A metfora do passa frente vem nos lembrar que a palavra vanguarda
uma expresso de origem militar, designando o corpo da elite que vai adiante, abrindo
caminho para o grosso da tropa, que vem l atrs. Com o conceito de produssumo,
Dcio Pignatari liquidou com esse equvoco, h vrios anos.
[...]
Mas a palavra tirnica, o instrumento das leis. Onde a palavra chega, j chega
botando ordem.
[...]
O nico modo de fazer as palavras perderem sua tendncia nazi-fascista, essa mania de
mania de marchar em passo-de-ganso, faz-las cantar. Ou voar. O que, no fundo, a
mesma coisa.
Caetano Veloso: Apresentao primeira edio
POSSVEIS
influxo/tangncia/convergncia com msica popular (cano/letra)
oral, coloquialidade, a moeda corrente da fala...
repdio da literatura: poesia/signo/VIDA
incorporao natural das literaturas da vanguarda 56 (espacializao,
montagem, fragmentao, sintaxe analgico-ideogrmica, paronomsia,
conscincia de cdigo, multimdia)
7) predomnio do poema curto: extrema sntese, brevidade, economia
8) prioridade do cartum sobre o lrico e o pido (abertura para o cartum)
9)...maior margem ao acaso, mais riscos, menos segurana, menos apoio
logstico da teoria
[p. 192] 11) distanciamento em relao metalinguagem, metalinguagem NA
obra, tendncia produo de mensagens primeiras, epifnicas (conscincia do
cone)
12) material pobre x material nobre (luxo/lixo): VULGATA
13) partes com a coisa-rimbaud alm do mallarm, legado pe anterior
p. 193 carta 38 texto de Leminski publicado na revista Escrita, 1979, num
28, muito semelhante carta 38.
Sobre poesia e conto: um depoimento
Sobre poesia
A descoberta do haiku. Sntese e vazio zen.
...
Evito a literatura.
mitologia, ideologia, religio.
Procuro enxergar o texto luz dos signos, da linguagem, da semitica.
Poetas me interessam na medida da sua originalidade e coerncia estrutural.
(seguindo, p. 194) E sempre tive averso natural pelo surrealismo, pelo
metafrico, pelo arbitrrio, pelo profundo, pelo psicolgico, pelo tpico. ...
Mas estou alerta a que as coisas novas costumam pintar em estado inacabado,
irregular, errado, discutvel, problemtico, perigoso, experimental.
...
No que fao, subsiste um componente acentuado de expresso, de comunicao,
portanto. Isso s possvel com certo teor de redundncias, de facilidades,
cuja dosagem controlo e regulo.
...
O resultado deve ser raro, os ingredientes tm que ser simples.
...
Detesto poesia dita profunda. Estou cagando e andando para a psicologia.
No tenho psique. Sou apenas uma besta dos pinheirais.
...
Poesia tem que me surpreender. Poesia envolvente e insinuante me cheira a
vigarice. Eu vejo logo o truque. Eu quero o susto e o eco do susto.
Criativamente, prefiro a companhia de programadores visuais e de msicos. No
consigo aprender nada com escritores.
Poesia, alis, territrio limtrofe entre o verbo e outras artes.
(seguindo, p. 195) Fico literatura, poesia no. Um poeta, embora use
palavras, est mais prximo de msicos e plsticos do que ficcionistas que usam,
aparentemente, as mesmas palavras que ele.
mais prximo da fonte da fala.
...
Falamos com cones. Escrevemos smbolos.
(continuando, p. 196) ...um poema convencional continua medocre mesmo que
invista contra toda a opresso do mundo.
Sobre o conto
p. 197 Contar uma histria a maneira mais bvia de estruturar um texto.
Mas h um infinito de maneiras.
Por que preferir o bvio ao infinito?
O nascente e crescente pblico consumidor de textos no-prticos assim o quer.
O tempo anda to caro e to escasso, para que complicar a vida das pessoas?
...
Mas acredito, como Dcio Pignatari, que, no conto, interessa o que no conto.
Interessa o que outra coisa: signo, violao, flagrante delito.
(seguindo, p. 198)
O conto o soneto de hoje.
O soneto tambm foi veculo cmodo e porttil para divulgar e generalizar a prtica e o
consumo da poesia.
...
Quem escreve como se escrevia h vinte anos atrs sai de livros de literatura, no da
vida. Inovar! Aprendam com a vida, que me inesgotvel de processos, formas e
estruturas.
p. 203 Com quantos paus se faz um Catatau
importante acontecimento da cultura brasileira nos ltimos dez anos. A poesia concreta
cartesiana. A tropiclia brasileira. O atrito entre essas duas realidades revelou-se
riqussimo. O encontro do mar com o rio. Amazonas versus Atlntico.
macunama para turistas [critica Mrio]
Mas se Descartes/Cartsio do Catatau tem que ser o heri de carter demais, sua
muiraquit a Europa. o passado. o teorema de Pitgoras.
p. 209
Poesia concreta, para mim, sempre foi conscincia inter-semitica e assimilao, pela
criatividade, da Revoluo Industrial.
Poesia, para mim, a capacidade de produzir informao nova, em nvel de linguagem.
Quanto mais alta a novidade, melhor a poesia.
H anos, procuro transladar minha poesia para outros cdigos alm do verbal.
p. 210 A palavra, a frase, a sintaxe, todas essas coisas do verbal, para mim, tm cor,
sabor, peso, cheiro. Sou um poeta materialista.
Todos os meus poemas acontecem.
Nunca os fao.
Poesia e realidade? Sou um poeta participante. Engajado.
p. 212 - Caprichos e relaxos Rgis
vnculo no epigonal com o modernismo e o concretismo os movimentos de
vanguarda que modificaram nossa cena literria e cultural neste sculo.
Leminski desenvolveu atividade intensa de editor, polemista, resenhista, ensasta e
colaborador de todas as pequenas revistas literrias, de origem construtivista, surgidas
na dcada de 70.
este poeta que combinou construo e expresso, formas literrias com vivncias
emergentes.