Geraldo de Majella - Jayme Miranda Um Revolucionário Brasileiro
Geraldo de Majella - Jayme Miranda Um Revolucionário Brasileiro
Geraldo de Majella - Jayme Miranda Um Revolucionário Brasileiro
Geraldo de Majella1
Jayme Amorim de Miranda (1926-1975), jornalista, advogado e dirigente
comunista, nasceu em Macei, no bairro do Poo, no dia 18 de julho de 1926, filho do
casal Manoel Simplcio de Miranda e Herm Amorim de Miranda, o segundo de uma
famlia de dez filhos. So eles: Haroldo (1925-1988), Jayme (1926-1975), Valter,
Edvar, Zenaide, Wilton (1931-2006), Nilson (1933), Neiza, Hlio, Manoel Manelito
Amorim de Miranda.
Casa-se com Elza Rocha de Miranda e constituem uma famlia de quatro filhos.
Dois nasceram em Macei e dois no Rio de Janeiro: Olga Tatiana (1960) e Yuri Patrice
(1961), so alagoanos; os outros dois, Jaime (1965) e Andr Rocha de Miranda (1970),
so cariocas.
Teve origem numa famlia de classe mdia baixa: o pai era proprietrio de um
bar e lanchonete na regio central de Macei, onde os filhos mais velhos o ajudavam no
balco. A famlia morou por muitos anos num bairro tambm de classe mdia, o Poo.
Iniciou os estudos, o antigo curso primrio, em escolas pblicas. Em 1937 foi
matriculado no colgio Diocesano (Marista), onde cursou o ginasial, sendo em 1941
transferido para o Liceu Alagoano e a concluindo o curso colegial em 1944.
No final de 1944, presta vestibular para Qumica em Recife numa
manifestao de um desejo acalentado desde a adolescncia pelas cincias exatas , mas
no foi aprovado. No ano seguinte, em Macei, presta novamente vestibular desta vez
para o curso de Direito e aprovado para a Faculdade de Direito de Alagoas, onde se
bacharelou.
Entre 1941 e 1945 tem dupla jornada de trabalho como revisor dos jornais:
Jornal de Alagoas, rgo dos Dirios Associados, e A Notcia, vespertino, alis o nico
no gnero em Alagoas. Nesse perodo o mundo vivia os horrores da II Guerra (19391945). Nas redaes dos jornais em Macei trabalhavam alguns jornalistas
simpatizantes e outros militantes do Partido Comunista Brasileiro (PCB). nesse
ambiente de ebulio poltica que Jayme Miranda aprende o ofcio de jornalista e
intensifica as suas relaes com a militncia clandestina do PCB.
Estudante de Direito e revisor, inicia a militncia poltica na Unio da Juventude
Comunista (UJC), participando das manifestaes de ruas contra o nazi-fascismo,
mobilizando a populao para pressionar o governo Vargas a romper com o Eixo
(Alemanha, Itlia e Japo).
Os vnculos polticos e ideolgicos com o PCB tiveram laos familiares
evidentes, pois dois dos seus tios paternos, Ezequiel2 e Isaias Simplcio de Miranda, e
Geraldo de Majella, historiador, escreveu Caderno da Militncia histria vivida nos
bastidores da poltica (Edufal, 2006), Execues Sumrias e Grupos de Extermnios em
Alagoas (1975-1998, Edufal, 2006), Rubens Colao: Paixo e vida A trajetria de um lder
sindical (Edies Bagao, 2010), O PCB em Alagoas: Documentos 1982-1990 (Cepal, 2011) e
Mozart Damasceno, o bom burgus (Edies Bagao, 2011).
1
uma tia, Tabita Miranda, haviam se ligado ao partido na dcada de 1930. Ezequiel
Miranda se filia Aliana Nacional Libertadora (ANL), entidade legal e de massas.
Aps a proibio de funcionamento da ANL, mantm a militncia comunista e participa
do processo de organizao da Insurreio Comunista, movimento que ficou conhecido
como Intentona Comunista de 1935. preso em Macei, processado pelo Tribunal de
Segurana Nacional (TSN) e condenado a cinco anos de priso, pena cumprida no
presdio da Ilha de Fernando de Noronha.
Escola de Sargento das Armas
No ano de 1946 ocorre uma mudana radical na vida do jovem acadmico de
Direito. Ao se inscrever e prestar concurso para a Escola de Sargento das Armas (ESA),
foi aprovado e segue para Realengo no Rio de Janeiro, onde inicia a carreira militar. No
ano seguinte promovido a terceiro-sargento, indo servir em Pindamonhangaba (SP). O
curso de sargento tinha durao obrigatria de cinco anos, perodo no cumprido
integralmente.
A vida na caserna no lhe fez bem; a rigidez e outras formas de controles,
incluindo a formao militarista, causaram-lhe srios transtornos disciplinares. Tomou
conhecimento, por colegas de fardas, de que seria transferido para o estado do Mato
Grosso, como punio. Antes que isso se efetivasse, rescindiu o contrato e regressou a
Macei, na condio de terceiro-sargento.
O amigo de infncia, Rubens Jambo (1926-2010), que tambm havia sido
aprovado no concurso da ESA e com quem Jayme mantinha contatos frequentes, se
ligou ao PCB no meio militar. Naquela poca O PCB tinha um ncleo de militares de
vrias patentes e possivelmente foram esses companheiros que o informaram, levando-o
a tomar a deciso de rescindir o contrato.
Em Macei e com 22 anos, no dia 15 de setembro de 1948 contratado e tem a
carteira assinada como escriturrio da Cooperativa dos Plantadores de Cana de Alagoas.
O emprego contou com a influncia do ento deputado udenista Rui Palmeira, naquela
poca aliado dos comunistas.
O contrato de trabalho assinado pela Cooperativa dos Plantadores de Cana de
Alagoas foi o primeiro e nico vnculo empregatcio na vida do jornalista e dirigente
comunista. As anotaes encontradas na carteira profissional n 34.659 indicam que
teve durao de apenas um ano. A vida dupla, de trabalhador na principal organizao
da elite rural, as atividades como estudante de Direito e as tarefas, cada vez maiores,
como membro da Unio da Juventude Comunista (UJC) do PCB, tornou-se
impraticvel. A opo entre o trabalho com carteira assinada e a atuao exclusivamente
no movimento estudantil e na organizao do PCB deu-se pela segunda das alternativas
2
A Voz do Povo, 1951, p. 3. A coleo do jornal foi salva pelo historiador Moacir Medeiros de
SantAna, aps o golpe militar de 1964, quando trabalhava na assessoria do general Bittencourt,
na secretaria de segurana pblica de Alagoas. Em depoimento ao autor no dia 19/8/2005, o
historiador disse que: Trabalhamos muito tempo depois de 64. Ento, resolvi carregar. No
pedi, no. E se eu pedisse, no daria e terminaria dando fim quilo ali. A, tranquilamente,
amaciei o Rivoredo e, realmente, tirei de l e fui para casa. Morava bem pertinho. Alis,
mandavam me levar para casa de carro.
5
Idem.
10
Nas eleies de 1955 votaram 106.984 eleitores. Muniz Falco (PSP) obteve 53.085 votos;
Afrnio Salgado Lages, 49.669 votos; 1.927 votos brancos e 2.303 votos nulos. Jnior, Heider
Lisboa de S, A Justia Eleitoral em Alagoas, Macei, 2008, p. 195
apoiado pelo governador Arnon de Mello. A disputa pela prefeitura de Macei se deu
entre Abelardo Pontes Lima (PTB), Osas Cardoso (UDN e Sebastio da Hora (PSP),
antigo militante do PCB.11
O empenho do PCB na campanha de Muniz Falco passou a ser uma questo de
sobrevivncia, j que os comunistas vinham de uma longa jornada de represso nos dois
perodos governamentais, o de Silvestre Pricles e o de Arnon de Mello. A aliana
poltica estabelecida entre o PCB e Muniz Falco tinha origem nas boas relaes
polticas travadas desde o perodo em que o lder petebista havia exercido a funo de
delegado do Ministrio do Trabalho em Alagoas.
A vitria de Muniz Falco descortinou um novo cenrio para os comunistas em
Alagoas. Os movimentos sociais, o PCB e o PSB passaram a ser tratados com respeito
e o aparelho policial cessou a represso aos comunistas e ao movimento sindical. Jayme
Miranda no participou dessa jornada de lutas, pois se encontrava trabalhando na
organizao do PCB no estado do Par. A conquista da liberdade em Alagoas um
caminho para os comunistas rapidamente se reorganizarem em Macei e em muitas
cidades do interior.
A edio de A Voz do Povo, n 38, de 29 de setembro de 1957, traz no
expediente Jayme Miranda como diretor e Nelito Nunes de Carvalho como secretrio. O
jornal abriu a sede na rua do Comrcio, 606, e realizou uma vigorosa campanha de
finanas para modernizar o semanrio com a aquisio de novas mquinas. Os
anunciantes durante o governo de Muniz Falco no foram importunados por quaisquer
perseguies policiais ou pelo Fisco estadual. Atuando com liberdade o PCB encontrou
as condies essenciais para ampliar as relaes do jornal com o empresariado,
conquistando anunciantes.
Renalvo Siqueira e Mironildes Peixoto, vereadores comunistas
O sapateiro Renalvo Siqueira e o funcionrio pblico Mironildes Vieira Peixoto
foram eleitos vereadores em Macei nas eleies de 1958. Ambos eram militantes do
PCB. Renalvo, nessa poca, j no trabalhava como sapateiro; era dirigente estadual do
PCB. No jargo comunista, era um revolucionrio profissionalizado, mas em face da
precariedade da redao do jornal A Voz do Povo, vinha trabalhando como reprter,
responsvel pela cobertura das atividades parlamentares na Cmara Municipal de
Macei.
Esse tipo de trabalho era comum naquela poca, e a direo do jornal estimulava
os militantes a serem correspondentes em seus locais de trabalho, moradia, estudo, no
movimento sindical e tambm nas casas legislativas, na assembleia e nas cmaras
municipais.
A Voz do Povo, sem que tivesse essa preocupao histrica, serviu de escola
para vrias geraes de operrios, estudantes, profissionais liberais e jovens intelectuais,
no exerccio dirio de jornalistas formados na prtica cotidiana.
Tenrio, Douglas Apratto. A Tragdia do Populismo O impeachment de Muniz Faco,
Macei, Edufal, 2 edio, 2007, p.167.
11
13
Idem, p. 243.
Unio Sovitica, a Paris, Lisboa e outras cidades europeias. Foi a primeira vez que
Jayme esteve na antiga URSS.
A primeira viagem como membro do comit central ao exterior aconteceu em
1961, como membro de uma delegao composta de jornalistas, advogados, polticos,
sindicalistas de Alagoas e de outros estados do Brasil, organizada pelo ento deputado
federal Francisco Julio (PTB-PE), fundador e coordenador nacional das Ligas
Camponesas. Fizeram parte da delegao os jornalistas alagoanos Alberto Jambo e
Nilson Miranda, o advogado Ciro Casado Rocha e o deputado estadual Mendes de
Barros (PSP) este no concluiu a viagem, pois quando estava pronto para embarcar
pelo aeroporto do Recife, recebeu a notcia de que Robson Mendes, seu primo e prefeito
de Palmeira dos ndios, havia sofrido um atentado a bala, o que o fez retornar a
Alagoas.
O jornalista, e deputado estadual do Rio Grande do Norte, Luiz Incio Maranho
Filho tambm fez parte da delegao. Os membros da delegao participaram de vrias
sesses pblicas com os principais dirigentes da revoluo cubana, entre eles Fidel
Castro e Ernesto Che Guevara, e tambm vrios dirigentes do Partido Comunista
Cubano, sob a direo do secretrio-geral Francisco Caldero Blas Roca.
Jayme Miranda, secretrio poltico do PCB em Alagoas e outros dirigentes
nacionais do PCB se encontraram reservadamente com Fidel Castro e Che Guevara e se
reuniram num outro momento com o secretrio-geral do Partido Comunista Cubano,
Blas Roca.
A segunda viagem internacional na condio de membro da direo nacional foi
para a China, em companhia do tambm dirigente comunista gacho Jover Teles.
Ambos participaram da primeira delegao oficial do PCB quele pas e se reuniram
com vrios dirigentes do Partido Comunista Chins (PCCh). Os dirigentes brasileiros
tiveram um encontro reservado com o lder da Revoluo chinesa, Mao Ts Tung. Para
chegar a Pequim, passaram alguns dias em Moscou, cidade a que Jayme, durante os
prximos anos, voltaria algumas vezes.
Em 1974 e 1975 Jayme Miranda foi novamente a Moscou. A rota pela Europa,
passando pelo aeroporto de Orly em Paris, onde vigiado pelo servio secreto francs,
como consta do seu pronturio. Essa foi, sem que ele pudesse supor, a sua ltima
viagem internacional. No dia 4 de fevereiro de 1975, no Rio de Janeiro, sequestrado
pelo Doi-Codi. At hoje no apareceu, nem as foras armadas entregaram seus restos
mortais. Jayme Amorim de Miranda um dos desaparecidos polticos brasileiros.
Bibliografia
Lima, Mrio de Carvalho. Sururu Apimentado Apontamentos para a histria
poltica de Alagoas, Macei, Editora Imprensa Oficial Graciliano Ramos, 2008, p. 275,
276.
Miranda, Nilson. http://www.jaymemiranda.org/
A Voz do Povo, edio de 1951. H poucos exemplares do jornal no Arquivo Pblico
de Alagoas; este no tem outras informaes que no sejam apenas as do ano da edio.
Direito Memria e Verdade: Comisso Especial sobre Mortos e Desaparecidos
Polticos/Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidncia da Repblica,
Braslia, 2007, p. 397.
Jnior, Heider Lisboa de S. A Justia Eleitoral em Alagoas, Macei, 2008, p. 195.
Majella, Geraldo de. Rubens Colao: Paixo e Vida A trajetria de um lder sindical,
Recife, Edies Bagao, 2010, p. 36, 37.
Coelho, Marco Antonio Tavares. Herana de um sonho, as memrias de um comunista.
Rio de Janeiro, Record, 2000, p. 150, 151, 154.
Vinhas, Moiss. O Partido a Luta por um partido de massas 1922-1974, So
Paulo, Editora Hucitec, 1982, p. 183, 243.