Direito Eleitoral Do Inimigo
Direito Eleitoral Do Inimigo
Direito Eleitoral Do Inimigo
2010
9 771414 514001
Estudos eleitorais
Volume 5, Nmero 1
jan./abr. 2010
ISSN: 14145146
Estudos eleitorais / Tribunal Superior Eleitoral. v. 1. n. 1
(1997) . Braslia : TSE, 1997- v. ; 24 cm.
Quadrimestral.
Revista interrompida no perodo de: maio 1998 a dez.
2005, e de set. 2006 a dez. 2007.
1. Direito eleitoral Peridico. I. Brasil. Tribunal Superior
Eleitoral.
CDD 341.2805
Presidente
Ministro Ricardo Lewandowski
Vice-Presidente
Ministra Crmen Lcia
Ministros
Ministro Marco Aurlio Mello
Ministro Aldir Passarinho Jnior
Ministro Hamilton Carvalhido
Ministro Marcelo Ribeiro
Ministro Arnaldo Versiani
Procurador-Geral Eleitoral
Roberto Monteiro Gurgel Santos
Conselho Cientfico
Ministro Ricardo Lewandowski
Ministro Aldir Guimares Passarinho Junior
Ministro Hamilton Carvalhido
Andr Ramos Tavares
Antonio Carlos Marcato
Lus Virglio Afonso da Silva
Marcelo de Oliveira Fausto Figueiredo Santos
Marco Antnio Marques da Silva
Paulo Bonavides
Paulo Gustavo Gonet Branco
Paulo Hamilton Siqueira Junior
Walber de Moura Agra
Composio da EJE
Diretor:
Andr Ramos Tavares
Vice-diretor:
Thales Tcito Pontes Luz de Pdua Cerqueira
Assessora-chefe:
Juliana Delo Rodrigues Diniz
Servidores:
Ana Karina de Souza Castro
Camila Milhomem Fernandes
Geraldo Campetti Sobrinho
Jorge Marley de Andrade
Julio Csar Sousa Gomes
Quren Marques de Freitas da Silva
Colaboradores:
Andrey do Amaral dos Santos
Liliane Cervo de Moraes
Sueli Rodrigues da Costa
apresentao
Dando continuidade a sua programao editorial, a Escola Judiciria
Eleitoral (EJE) apresenta o primeiro nmero da revista Estudos Eleitorais de 2010.
Trata-se do volume cinco, que ser completado no decorrer do corrente ano com
mais dois fascculos, retomando, nessa oportunidade, a periodicidade quadrimestral
em suas publicaes aliada ao ineditismo dos estudos apresentados.
Ao cumprir seu papel no desenvolvimento do marco terico, das avaliaes
prticas e das abordagens histricas sobre democracia, cidadania e eleies, a Escola
apresenta cinco artigos de estudiosos da matria eleitoral.
No primeiro artigo, o Ministro Presidente do TSE, Ricardo Lewandowski,
estabelece a relao entre segurana jurdica e proteo da confiana com o tema da
perda de mandato por infidelidade, na matria: Infidelidade partidria e proteo
da confiana.
Na sequncia, Andr Ramos Tavares avalia em que medida os resultados
da democracia atualmente praticada correspondem aos anseios da sociedade,
especialmente quanto legitimidade posterior desses resultados eleitorais, no
artigo: H uma crise de legitimao eleitoral no mundo?
Carlos Mrio Velloso e Walber de Moura Agra discorrem sobre a aplicao
da legislao na propaganda eleitoral na imprensa escrita, no rdio, na televiso e
na internet por meio do texto: Propaganda eleitoral e sua incidncia.
Thales Tcito Pontes Luz de Pdua Cerqueira analisa dvidas de
constitucionalidade provenientes da publicao da Lei Complementar no 135/2010,
paraincluir hipteses de inelegibilidade visando proteger a probidade administrativa
e a moralidade no exerccio do mandato, escrevendo sobre: Fichalimpa& questes
constitucionais: direito eleitoral do inimigo (retroagir?).
Em seu estudo na Seo Memria, Jos Carlos Francisco associa a histria
dos partidos polticos afirmao do regime democrtico, destacando o papel que
desempenham como agentes das principais mudanas na idade moderna. A matria
intitula-se: Traos histricos dos partidos polticos: do surgimento at a segunda era
da modernidade.
A EJE pretende continuar valorizando os estudos eleitorais, de cunho
cientfico e pragmtico, fazendo divulgar artigos e textos de excelncia na rea.
Outra das finalidades destacadas desta Revista est em divulgar amplamente a
matria eleitoral a todos que por ela se interessem, esperando, com isso, provocar
vvidos estmulos para novas empreitadas nessa seara.
Sumrio
Infidelidade partidria e proteo da confiana
Enrique Ricardo Lewandowski.............................................................................................9
H uma crise de legitimao eleitoral no mundo?
Andr Ramos Tavares.......................................................................................................21
Propaganda eleitoral e sua incidncia
Walber de Moura Agra e Carlos Mario da Silva Velloso. .................................................37
Fichalimpa& questes constitucionais: direito eleitoral do inimigo (retroagir?)
Thales Tcito Pontes Luz de Pdua Cerqueira.....................................................................65
Memria
Traos histricos dos partidos polticos: do surgimento at a segunda era da
modernidade
Jos Carlos Francisco.......................................................................................................79
INFIDELIDADE PARTIDRIA
E PROTEO DA CONFIANA
Enrique Ricardo Lewandowski
Ministro Presidente do Tribunal Superior Eleitoral.
Professor titular da Universidade de So Paulo.
Afirma que os partidos polticos compem um corpo indispensvel ao atual processo
democrtico participativo, no apenas porque expressam a multiplicidade de interesses e
aspiraes dos distintos grupos sociais, mas, sobretudo, porque concorrem para a formao
da opinio pblica, para o recrutamento de lderes, com a seleo de candidatos aos cargos
eletivos, bem como para a mediao entre o governo e o povo. A fidelidade partidria
ressaltada por representar passo importante para o fortalecimento do sistema partidrio
brasileiro. Demonstra a relao entre segurana jurdica e proteo da confiana com o tema
da perda de mandato por infidelidade, defendendo o respeito s situaes consolidadas,
sob pena de solapamento da confiana dos cidados nas instituies, com as consequncias
nefastas que isso pode acarretar para o convvio social.
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PARTIDRIA
NO
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nomes de todos os seus filiados, da qual dever constar a data de filiao, o nmero
dos ttulos eleitorais e das sees em que esto inscritos para efeito de candidatura
a cargos eletivos (art. 19, da Lei no 9.096/95).
Isso porque, para concorrer a cargo eletivo, o eleitor dever estar filiado
ao respectivo partido, pelo menos um ano antes da data fixada para as eleies
(art. 18, da Lei no 9.096/95).
Ademais, para desligar-se do partido poltico a que pertena, o filiado deve
apresentar, obrigatoriamente, comunicao escrita ao rgo de direo partidria
e ao juiz de sua respectiva Zona Eleitoral (art. 21 e 22, pargrafo nico, da Lei
no 9.096/95).
Ressalte-se que, pela legislao eleitoral brasileira, o filiado no precisa
informar, Justia Eleitoral, o motivo pelo qual se desligou do partido, mas to
somente comunicar o seu desligamento da agremiao.
Tanto assim que o Sistema de Filiao Partidria Informatizado da
Justia Eleitoral, denominado FILEX no possui um mdulo de desfiliao. Para
tal procedimento, basta que o usurio digite a opo excluso do filiado sem
qualquer justificativa.
Foroso convir, pois, que a mudana de partido por candidatos eleitos foi
regulamentada pela Justia Eleitoral, no tendo ela feito, ao que se saiba, qualquer
objeo referida prtica desde a Emenda Constitucional no 24/85, a qual, como
visto, suprimiu a sano de perda de mandato por infidelidade partidria prevista
na Carta de 1967, entendimento ratificado pelos constituintes de 1988.
Essa prtica, ademais, importa repisar, encontrava-se solidamente amparada
no s na doutrina dominante, como tambm em pacfica jurisprudncia desta
Suprema Corte.
____________________
MS no 20.916, rel. Min. Carlos Madeira; MS no 20.927, rel. Min. Moreira Alves; MS no 23.405, rel.
Min. Gilmar Mendes.
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18
REFERNCIAS
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SARLET, Ingo Wolfgang. A eficcia do direito fundamental segurana jurdica:
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19
20
1 APRESENTAO DO PROBLEMA
Embora a Democracia componha, em sua estrutura e funcionamento, os
Estados ocidentais, sua recorrncia e popularidade no so suficientes para eximi-la
de insatisfaes e questionamentos, muitos dos quais alcanam a centralidade de
sua concepo e objetivos.
Alis, o prprio sentido de democracia j suscita dvidas, independentemente
de outras dificuldades de ordem prtica. Se perguntarmos a Schumpeter, Freeman
e Gutmann, para utilizarmos, aqui, autores que se tm, fortemente, dedicado ao
tema, qual o conceito de democracia, teremos trs respostas distintas (problema
este que ser ainda mais acentuado se aumentarmos o nmero de entrevistados).
Para Schumpeter, por exemplo, democracia pressupe ou apresenta como elemento
22
23
2 ELEIES E FRAUDE
No final de agosto de 2009, o Afeganisto passou por eleies presidenciais,
marcadas por ameaas de grupos extremistas, como o Talib6, os quais denominavam
o processo eleitoral como um ato de propaganda americano.7 No se trata,
____________________
Cf. Attacks, fear weaken Afghan voter turnout. Disponvel em: <http://www.msnbc.msn.com/
id/32470364/ns/world_news-south_and_central_asia/>.Acesso em: 20.09.2009.
7
Cf. Comeam eleies no Afeganisto, publicado em 20.09.2009 em G1. Disponvel em: < http://
g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL1273696-5602,00.html>.Acesso em: 20.10.2009.
6
24
25
26
27
recontagem dos votos, com base no argumento de que os possveis votos vlidos
existentes dentre os 9.000 votos no computados pelas mquinas poderiam
alterar o resultado da eleio naquele estado. Ambas as decises foram suspensas
pela Suprema Corte dos EUA (Bush v. Palm Beach e Bush v. Gore), destacando a
inconstitucionalidade do processo de recontagem de votos. No houve qualquer
deciso final dos tribunais a respeito da existncia ou no de fraude eleitoral.
Diversos acadmicos questionaram a legitimidade da deciso da Suprema
Corte, dentre os quais Alan Dershowitz, o qual afirmou que a deciso proferida no
caso sobre a eleio da Flrida pode ser elencada como a mais corrupta deciso na
histria da Suprema Corte, porque a nica que eu tenho conhecimento em que a
maioria dos juzes decidiu da forma como decidiram por conta de suas identidades
pessoais e afiliaes polticas quanto aos litigantes (2001, p. 174), ou at mesmo
doutrinadores estrangeiros, como Carlos Blanco de Morais (2002, p. 319), que reputa
a deciso no caso Bush v. Gore, como um paradigma to patolgico como at
humilhante. Rotunda, por outra banda, afirmou que a deciso em apreo no foi,
em certo sentido, surpreendente, porquanto acompanhou uma srie de precedentes
quanto manipulao de resultados eleitorais (2003, p. 1).
(tal como ocorre no Brasil, por meio da Justia Eleitoral, rgo especializado do
Poder Judicirio). Nos Estados Unidos, houve a atuao do Judicirio.
Contudo, invariavelmente, os resultados que estes rgos alcanam no so
suficientes para dissipar a nvoa de dvidas que cerca a legitimidade do candidato
eleito. Pelo contrrio. Argumenta-se que, uma vez compostas por pessoas vinculadas
ao regime vencedor ou ao oposicionista vencido, o mesmo processo de verificao,
levado a efeito pelos entes de fiscalizao, poder resultar maculado (vide o caso
Bush vs. Gore). Mas no s. H um ntido choque entre aspectos de relevo poltico
e social com elementos tcnicos do processo judicial, elementos estes muitas vezes
insuficientes para pacificar a sociedade. preciso, nesses casos, que as instituies
responsveis pela certificao e controle eleitoral sejam reconhecidas, em suas
decises, pela sociedade, independentemente do resultado. Ainda assim possvel
que a tcnica utilizada seja constantemente questionada politicamente, ou utilizada
para fins polticos, ou, ainda, deturpada politicamente.
Como consequncia, outros mecanismos foram idealizados e aplicados.
o caso, por exemplo, da votao de sada, traduo literal do mecanismo exit
poll, simulao eleitoral realizada por entidades independentes que abordam os
eleitores, individualmente, aps terem proferido os seus votos, com o propsito de
verificar a semelhana entre o resultado oficial anunciado com aquele amealhado
pela entidade. Verificaes como esta foram realizadas nas eleies do Mxico, em
1994 e 2000, Rssia e Srvia.
No referendo realizado na Venezuela, em 2004, acerca do processo de recall
do Presidente Hugo Chavez, uma exit poll foi realizada pela empresa Penn, Schoen
& Berland, com o seguinte resultado: 59% dos eleitores seriam favorveis ao recall,
enquanto 41% seriam contrrios. O resultado oficial foi o oposto: 58% dos votos pr
Chavez e 42 contra Chavez. Em face desta discrepncia, sugeriu-se a ocorrncia de
fraude eleitoral, por meio da manipulao das urnas eletrnicas22, no confirmada
por observadores internacionais23 e cuja contestao no foi levada adiante.
No mesmo ano, em eleies promovidas na Ucrnia, o resultado do pleito
eleitoral, em segundo turno, sinalizou a vitria de Viktor Yanukovych, ento
Primeiro-Ministro e apoiado pelo governo, como vencedor do pleito Presidncia,
contra Viktor Yushchenko. Assim como ocorrido na Venezuela, o resultado oficial
____________________
Cf. Exit Polls in Venezuela. Disponvel em:
<http://www.usnews.com/usnews/opinion/baroneweb/mb_040820.htm>. Acesso em: 20.10.2009.
23
Vide, como exemplo, o relatrio da NORDEM - Norwegian Resource Bank for Democracy and
Human Rights. Disponvel em: <http://docs.google.com/gview?a=v&q=cache:rVP3-2SO4xIJ:www.
humanrights.uio.no/forskning/publikasjoner/nordem-rapport/2004/13.pdf+Venezuelan+electi
on+fraud+2004+and+judicial+decision&hl=pt-BR&gl=br&sig=AFQjCNHJCh-lEPC0LtnDL3g9fRP_
uLfemQ>. Acesso em: 21.09.2009.
22
29
divergia fortemente do resultado apurado pelo exit poll. Este apontava a vitria de
Viktor Yushchenko por uma diferena de 11%. O resultado oficial atribuiu a vitria
a Yanukovych por uma diferena de 3%24. Como no poderia deixar de ocorrer,
levantaram-se suspeitas de fraude eleitoral, seguida de intensa manifestao popular
contra e a favor do presidente eleito. Embora a Comisso Eleitoral Central tenha
confirmado a legitimidade do resultado, sob a suspeita de ter atuado ativamente
no processo de fraude, a Suprema Corte da Ucrnia suspendeu o resultado25 e,
posteriormente, determinou novas eleies. Nestas, Yushchenko obteve 51.99%
dos votos, e Yanukovych 44.20%. Neste caso, percebe-se que o exit poll serviu
como importante instrumento de comparao/parmetro para a verificao da
legitimidade do resultado oficial. certo, porm, que a atuao da Suprema Corte,
ao contrrio do que ocorreu na Venezuela, teve um papel essencial na reverso do
resultado. Ressalte-se, porm, que a posse de Yushchenko no pacificou o pas. Em
2006, aps Yushchenko dissolver o parlamento, Yanukovych foi nomeado PrimeiroMinistro pelo prprio Yushchenko, em razo da dificuldade deste em obter maioria
no Parlamento26, em uma clara tentativa de formar um gabinete de coalizao,
tendo sido premi por um breve perodo de 2006. Contudo, nas eleies presidenciais
de 7 de fevereiro de 2010, concorreu novamente Yanukovych, agora tendo como
principal opositora Yulia Tymoschenko, que era premi desde 2007 e que aps ter
apoiado Yanukovych na Revoluo Laranja, no pleito de 2004, havia rompido
politicamente com este, para ser premi na Presidncia de Yushchenko. Yushchenko
foi derrotado nessas eleies e Yanukovych finalmente assumia o poder, em um
pleito que foi considerado regular, e cuja vitria j havia sido preanunciada pelas
pesquisas de boca-de-urna. Tymoschenko, contudo, durante o processo eleitoral,
acusou Yanukovych de preparar novas fraudes. A Comisso Central de Eleies da
Ucrnia no considerou a acusao da candidata derrotada em segundo turno,
Yulia Tymoschenko, que, apesar da recomendao do Presidente eleito, recusava-se
a deixar o cargo de Primeira-Ministra.
Pavol Demes, diretor do German Maschall Fund em Bratislava e supervisor
do Programa do instituto para a Europa Central e do Leste, em entrevista concedida
nas ltimas eleies considerou que Yushchenko fracassou como presidente, mas
eu acho que a culpa tambm do sistema poltico da Ucrnia. Todo mundo concorda
que eles precisam de uma reforma constitucional. A diviso de poderes no clara.
E a relao entre poderes econmicos e polticos tambm confusa.27
____________________
Cf. The orange revolution. Disponvel em: <http://www.time.com/time/europe/html/041206/
story.html>. Acesso em: 21.10.2009.
25
Cf. Disponvel em: < http://news.bbc.co.uk/2/hi/4042979.stm>. Acesso em: 21.10.2009.
26
Cf. New bloc backs Ukraine president. Disponvel em: <http://news.bbc.co.uk/2/hi/
europe/6929336.stm>. Acesso em: 21.10.2009.
27
Folha de S.Paulo, 7 fev. 2010, Mundo, p. A20.
24
30
____________________
Cf. Italian election too close to call. Disponvel em: <http://www.guardian.co.uk/world/2006/
apr/10/italy>. Acesso em: 21.10.2009.
29
Cf. Berlusconi disputes Prodi election victory. Disponvel em: <http://www.dailymail.co.uk/news/
article-382615/Berlusconi-disputes-Prodi-election-victory.html>. Acesso em: 21.10.2009. Vide,
tambm, Claims of fraud in italian election. Disponvel em: <http://www.theaustralian.news.com.
au/story/0,20867,20824976-2703,00.html>. Acesso em: 21.10.2009.
30
Cf. Claims of fraud in italian election. Disponvel em: <http://www.theaustralian.news.com.au/
story/0,20867,20824976-2703,00.html>. Acesso em: 21.10.2009.
31
Cf. Juiz da comisso de investigao afeg sobre fraude eleitoral renuncia, disponvel em: <http://
veja.abril.com.br/agencias/afp/veja-afp/detail/2009-10-12-560940.shtml>. Acesso em: 20.10.2009.
28
31
Indcios de
Fraude/Origem
Beneficiado
Controle/Como
Confirmao da Fraude/
Resultado
Afeganisto
Sim/ Observadores
internacionais.
Candidato do Governo.
Sim. Comisso
Eleitoral
Independente do
Afeganisto.
Ir
Sim/Oposio.
Candidato do Governo.
33
Pas
Indcios de
Fraude/Origem
Beneficiado
Controle/Como
Confirmao da Fraude/
Resultado
Equador
Sim/Oposio.
Governo deposto.
____
Mxico
Sim/Oposio.
Candidato do Governo.
Sim. Poder
Judicirio.
Venezuela
Sim/Observadores
externos (exit poll)
+ oposio.
Candidato do Governo.
_____
Ucrnia (2004)
Sim/Observadores
externos (exit poll)
+ oposio.
Candidato do Governo.
Sim. Comisso
Eleitoral Central +
Poder Judicirio.
Itlia
Sim/Vencido.
Candidato da oposio.
Sim. Poder
Judicirio.
No se reconheceu existncia
de fraude/ Manuteno do
resultado.
EUA
Sim (erros na
contagem de voto)/
Vencido.
Candidato da Oposio
(Porm, o Estado da Flrida
era governado pelo irmo
e membro do Partido do
beneficiado.
o seu processo eleitoral perseguido e como o seu resultado final absorvido (ou
no) pela mesma sociedade.
Na Ucrnia, por exemplo, superado o problema da fraude de 2004 e
empossado o Governo de Direito, por assim dizer, houve, num curto espao de
dois anos, duas novas eleies no Parlamento, sendo que em uma delas, o prprio
fraudador foi nomeado Primeiro-Ministro pelo ento prejudicado Yushchenko,
embora por um curto perodo, para em seguida retornar como Presidente eleito.
Se correto assumir que a fraude no processo eleitoral produz instabilidade
social e uma insegurana j no ponto inicial de construo do Governo a ser
respeitado, no menos acertada a concluso de que a fraude eleitoral surge em
circunstncias j instveis, de fragmentao do poder, sendo difcil diferenciar a
causa da consequncia.
Talvez no seja o caso de concluir por uma crise da legitimao eleitoral, mas
sim de aceitar tais solavancos como variveis normais da Democracia nas sociedades
atuais. Afinal, no a maneira de administrar o Poder que polmica, mas sim o
seu prprio objeto, o poder.
35
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36
38
2 Propaganda eleitoral
A permisso para sua realizao comea a partir do dia 6 de julho do ano
da eleio, cinco dias depois da data-limite para a realizao das convenes, que
o dia 30 de junho. Qualquer tipo de propaganda eleitoral realizada antes ilcita,
exceo daquela denominada intrapartidria.
Conveno o procedimento regido pelo estatuto de cada agremiao para
decidir quais candidatos disputaro o pleito eleitoral. Depois de serem ungidos por
essa deciso, providencia-se a solicitao do registro eleitoral. Quando o nome no
consensual, a escolha decidida pelo voto dos convencionais, razo pela qual permitiu
a legislao a realizao de propaganda intrapartidria. A Justia Eleitoral entende
que ela permitida para cooptar apoio dos convencionais a determinados candidatos,
restringindo-se sua abrangncia pela especificao do eleitorado almejado.
Dessa forma, a Lei Eleitoral permite ao postulante a candidato, na
quinzena anterior escolha partidria, a utilizao de propaganda interna a seus
correligionrios com a finalidade da indicao de seu nome na conveno (art.
36, 1o, da Lei no 9.504/97). Entretanto, veda-se a utilizao de rdio, televiso ou
outdoor porque sua abrangncia se limita aos convencionais, cidados que votam
nos pleitos partidrios, e tambm porque a utilizao de rdio, televiso e outdoor
desequilibra o resultado da escolha partidria em prol daqueles que tm maior
poder econmico.
Propaganda intrapartidria uma espcie de propaganda eleitoral,
diferenciando-se em virtude de seu alcance reduzido. Ela se destina apenas aos
cidados que vo participar da conveno, os convencionais, na tentativa de cooptar
votos para os candidatos que desejam ser aclamados pela escolha partidria.
Permite-se o envio de mensagens aos convencionais e a fixao de cartazes e faixas
39
perto do local de votao; por outro lado, impede-se a utilizao de rdio, televiso
e outdoors (art. 1o, 1o, da Resoluo no 22.261/2006).
Devido propaganda eleitoral, no segundo semestre do ano do pleito
no se veicula propaganda partidria gratuita, nem se permite qualquer tipo de
propaganda poltica paga no rdio e na televiso. Caso haja descumprimento dessas
proibies, o responsvel pela divulgao e seu beneficirio, quando comprovado
seu prvio conhecimento, sujeitar-se- pesada multa ou ao equivalente ao custo
da propaganda, se for maior (art. 36 da LE). Frise-se que o beneficirio tem que ter
conhecimento da publicidade, sendo requisito inafastvel sua comprovao, sob
pena de no se configurar qualquer tipo de ilcito.
Toda publicidade poltica realizada aps o dia 5 de julho do ano da eleio
considerada como legal, devendo, entretanto, atender aos requisitos expostos
normativamente. No caso de propaganda de candidatos a cargos majoritrios,
devero constar, tambm, o nome dos candidatos a vice ou a suplentes de senador,
de modo claro e legvel, em tamanho no inferior a 10% do nome do candidato
a titular (art. 36, 4o, da Lei no 9.504/97). O no cumprimento dessa obrigao,
tambm sujeita os responsveis ou seu beneficirio, quando comprovado seu
conhecimento, a multa no valor de R$5.000,00 a R$25.000,00, ou ao equivalente ao
custo da propaganda, se este for maior.
Como no se dava nfase nas propagandas eleitorais exposio dos nomes
dos vices e suplentes de senador, emergiu essa nova regra, visando a possibilitar
ao eleitor saber em quem est votando para, eventualmente, ocupar o mandato
poltico. A principal razo para essa disposio reside nos cargos de suplentes de
Senador, que assumem frequentemente o mandato, sem que o eleitor saiba, na
hora da eleio, quem so esses cidados, ensejando que pessoas sem nenhuma
densidade intelectual e moral possam concorrer a esses cargos.
Em bens particulares, independentemente de obteno de licena municipal
e de autorizao da Justia Eleitoral, autorizada a veiculao de propaganda
eleitoral por meio da fixao de faixas, placas, cartazes, pinturas ou inscries,
conquanto no excedam ao tamanho de 4m e que no contrariem a legislao
eleitoral, sujeitando-se o infrator s penalidades previstas de multa e de restaurao
do bem (art. 37, 2o, da Lei no 9.504/97).4
____________________
Localizao. Via pblica. No caracterizao. Propaganda em bem pblico. Ausncia de
prequestionamento do art. 37, 1o, da Lei no 9.504/97. Dissdio jurisprudencial no configurado.
Reiterao de argumentos j apresentados. Agravo desprovido. I Os agravantes no aportaram
aos autos qualquer fato capaz de afastar os fundamentos da deciso agravada. II O fato de o
aparato do outdoor estar localizado em via pblica no o caracteriza como bem pblico, por se
tratar essencialmente de bem de natureza particular. TSE, AgR-REspe no 35.414, rel. Min. Ricardo
Lewandowski, DJe 16.3.2010.
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A redao posta atualmente, afastando-se da sistemtica civilstica, descurouse, assim, de abranger os bens de uso especial e os dominicais, que, juntamente com
os comuns, so tambm classificados de bens pblicos. Desse modo, para que no
se chegue a consequncias prticas esdrxulas de, por exemplo, no se autorizar
publicidade poltica em uma praa, mas a permitir em um hospital, deve-se dar
expresso bens de uso comum o significado de bens de uso pblico, abrangendo
todos os imveis e mveis utilizados pelo poder pblico.
Faz-se necessrio ressaltar que essa vedao tambm se aplica aos bens
particulares, cujo uso ou explorao dependa de cesso ou permisso do Poder
Pblico. Ento, todas as empresas concessionrias ou permissionrias, como empresas
de nibus ou faculdades privadas, esto impedidas de veicular propaganda eleitoral.
At mesmo em estabelecimentos comerciais, incluindo seus estacionamentos, ainda
que pagos, que so propriedades privadas de acesso pblico, vedado promover
qualquer tipo de propaganda eleitoral.
Consubstanciando essa extenso, registre-se o entendimento do Tribunal
Superior Eleitoral no sentido de que tambm se considera vedada a veiculao de
propaganda eleitoral em txis, que, mesmo sendo bens particulares, prestam servio
pblico por meio de concesso do poder pblico.
Inovao importante foi a extenso dessa vedao aos locais onde a
populao tem acesso de forma coletiva, como cinemas, estdios, clubes, hospitais
particulares, igrejas, dentre vrios outros exemplos.5 Nesse sentido, o TSE fixou
entendimento de que bem de uso comum, para fins eleitorais, compreende tambm
os privados abertos ao pblico. Alberto Rollo fala que a finalidade da extenso do
conceito de bens pblicos para os privados, cujo acesso seja destinado populao
em geral, evitar que o eleitor seja surpreendido por propagandas em locais nos
quais no est acostumando a receb-las: estudando, divertindo-se, buscando
atendimento mdico etc.
____________________
Cuida-se de recurso especial interposto pela Coligao Melhor para So Bernardo contra o
v. acrdo proferido pelo Tribunal Regional Eleitoral de So Paulo, assim ementado: Recurso
eleitoral. Propaganda eleitoral em bem de uso comum - Mantida a deciso de ilegitimidade
passiva de um dos representados porquanto no se tratava de candidato a cargo poltico ou
responsvel pela organizao do evento. Manifestao poltico-partidria em auditrio de
universidade. Local fechado, de acesso restrito aos convidados para o evento. No caracterizada
a utilizao de bem de uso comum para fins de propaganda eleitoral - Inteligncia do art. 13
da Resoluo-TSE no 22.718/2008. [...] considero que o art. 37, caput, da Lei no 9.504/97 no foi
violado pois, conforme se extrai do acrdo recorrido, o evento o qual, registre-se, sequer foi
descrito na base ftica do acrdo, no foi realizado em bem de uso comum, a que a populao
em geral tem acesso (fl. 180). Conforme se extrai do v. acrdo: o evento foi realizado nas
dependncias de uma universidade, porm, em um auditrio especfico, previamente alugado
pelo partido poltico (fls. 45-46), local cujo acesso era restrito a convidados (fl. 47). TSE, REspe
no 35.551/SP, rel. Min. Flix Fischer, DJE 26.2.2010.
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ou passionais (art. 5o). Este dispositivo uma mera reproduo literal do art. 242,
caput, do Cdigo Eleitoral.
Do mesmo modo, no ser tolerada propaganda:
a) de guerra, de processos violentos para subverter o regime, a ordem
poltica e social, ou de preconceitos de raa ou de classes;
b) que provoque animosidade entre as Foras Armadas ou contra elas, ou
delas contra as classes e as instituies civis;
c) de incitamento de atentado contra pessoa ou bens;
d) de instigao desobedincia coletiva ao cumprimento da lei de ordem
pblica;
e) que implique oferecimento, promessa ou solicitao de dinheiro, ddiva,
rifa, sorteio ou vantagem de qualquer natureza;
f) que perturbe o sossego pblico, com algazarra ou abuso de instrumentos
sonoros ou sinais acsticos;
g) por meio de impressos ou de objeto que pessoa inexperiente ou rstica
possa confundir com moeda;
h) que prejudique a higiene e a esttica urbana;
i) que caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa, bem como atingir
rgos ou entidades que exeram autoridade pblica;
j) que desrespeite os smbolos nacionais (art. 14, incisos I a X, da Instruo
n 131, Resoluo do TSE no 23.191, de 11.1.2010).
o
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legislao, no subsistem motivos para cerce-la. Desde que seja lcita a propaganda,
sob qualquer de suas modalidades, a ningum dado impedi-la, inutiliz-la, alterla ou perturb-la, por qualquer argumento. Considera-se crime eleitoral a conduta
que assim se configurar.
O acrscimo da nova Lei Eleitoral foi a determinao, de forma explcita,
de que a propaganda lcita no pode tambm ser mitigada por alegao de
violao de postura municipal. A houve o estabelecimento de certa hierarquizao
normativa, dando prioridade s normas eleitorais, em virtude do mbito especfico
de sua proteo, para que essa prerrogativa no seja mitigada por mandamentos
municipais, muitos dos quais, desarrazoados e autoritrios.
O poder de polcia compreende as providncias necessrias para inibir
prticas ilegais, sendo vedada a cesura prvia sobre o teor dos programas a serem
exibidos na televiso, no rdio ou na internet. Este poder de polcia ser exercido
pelos juzes eleitorais e pelos juzes designados pelos tribunais regionais eleitorais
(art. 41, 1o e 2o, da Lei no 9.504/97).
A propsito, o poder de polcia pode ser entendido como a faculdade de
que dispe a Administrao Pblica para regulamentar, impondo condies para o
uso de bens, atividades e direitos, em benefcio da coletividade ou na consecuo dos
interesses estatais. Outrossim, o Cdigo Tributrio Nacional apresenta uma definio
mais completa a respeito do assunto, afirmando ser o poder de polcia a atividade
da administrao pblica que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou
liberdade, regula a prtica de ato ou absteno de fato, em razo de interesse pblico
concernente segurana, higiene, ordem, aos costumes, disciplina da produo
e do mercado, ao exerccio de atividades econmicas dependentes de concesso ou
autorizao do Poder Pblico, tranquilidade pblica ou ao respeito propriedade e
aos direitos individuais ou coletivos (art. 78, do Cdigo Tributrio Nacional).
Para evitar a prtica de condutas desarrazoadas e ilegtimas por parte dos
agentes pblicos, com relao ao controle sobre a publicidade eleitoral, a legislao
atual veda expressamente a censura prvia sobre as mesmas, que um instrumento
tpico das ditaduras para se perpetuarem no poder. O artifcio da censura prprio
de regimes totalitrios, no se compatibilizando com o Estado Democrtico de
Direito. Tendo em vista as nefastas consequncias que ela pode produzir, pois
inibe a liberdade de expresso, a liberdade de informao, o pluralismo poltico e,
sobretudo, a democracia em si mesma, deixou-se clara a vedao a sua utilizao.
Ainda, para extirpar as dvidas sobre quem poder exercer o poder de
polcia, imps-se que esta funo caberia exclusivamente aos juzes eleitorais e
aos juzes indicados pelos Tribunais Regionais Eleitorais. Por outras palavras, o que
a legislao eleitoral afirma que a polcia ou a autoridade do poder municipal
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para veiculao da propaganda eleitoral. Todavia, muitos entendiam que, pela sua
prpria natureza, o acesso propaganda exposta na internet dependia de vontade
do eleitor, ou seja, somente teria acesso quem a procurasse, razo pela qual no
haveria a possibilidade de prticas propagandsticas irregulares, ou, no mnimo, seu
acesso seria diminuto.
Para evitar abusos diante da expanso da internet, buscou-se uma
harmonizao dos institutos da legislao eleitoral, estabelecendo que a
propaganda eleitoral na internet permitida aps o dia 5 de julho do ano da
eleio, unificando-se o lapso temporal que toda publicidade pode ser veiculada
(art. 57-A, da Lei no 9.504/97). Se a propaganda nos outros meios de comunicao
permitida tambm a partir dessa data, no haveria motivao alguma para que o
legislador impusesse outro momento.
De bom alvitre ressaltar, que, em regra, a propaganda eleitoral realizada
antes da data legalmente fixada, 5 de julho do ano da eleio, ser considerada
propaganda antecipada, extempornea, portanto, ilcita.
Nesse sentido, caso a propaganda na internet se inicie antes do marco legal
fixado, caracterizar-se- a extemporaneidade da publicidade eleitoral veiculada,
sobrevindo, desse modo, a sua ilicitude. Outrossim, ainda que o acesso a site de
candidato na internet dependa unicamente da vontade do internauta, no ser
afastada a hiptese de responsabilizao do criador daquele domnio, em caso de
eventual caracterizao de propaganda eleitoral antecipada.
Devido diversidade de possibilidades de realizao de propaganda
eleitoral na internet, a nova legislao cuidou de estipular os modos pelos quais
ela poder ser desenvolvida. Assim, a propaganda eleitoral na internet poder ser
utilizada atravs das seguintes formas:
a) Em stio do candidato, com endereo eletrnico comunicado Justia
Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de servio de internet
estabelecido no pas;
b) Em stio do partido ou da coligao, com endereo eletrnico comunicado
Justia Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de servio de
internet estabelecido no pas;
c) Por meio de mensagem eletrnica para endereos cadastrados
gratuitamente pelo candidato, partido ou coligao;
d) Por meio de blogs, redes sociais, stios de mensagens instantneas e
assemelhados, cujo contedo seja gerado ou editado por candidatos, partidos ou
coligaes ou de iniciativa de qualquer pessoa natural (art. 57-B, I, II, III e IV da Lei
no 9.504/97).
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ou opor embaraos sua execuo, a ele ser aplicada a sano de deteno, de trs
meses a um ano, com o pagamento de dez a vinte dias-multa.
Alm das outras sanes impostas, a violao das regras de veiculao
de propaganda irregular sujeitar seu responsvel e, quando comprovado seu
prvio conhecimento, o beneficirio multa no valor de R$5.000,00 a R$30.000,00
(art. 57-D, 2o, da Lei no 9.504/97).
A multa aplicada, como sano extrapolao da liberdade de pensamento
na propaganda eleitoral, tem os mesmos valores econmicos daquela aplicada aos
casos de veiculao de propaganda eleitoral paga na internet, prevista no art. 57-C,
2o, da mesma Lei.
Aplicam-se ao provedor de contedo e de servios multimdia que hospeda
a divulgao da propaganda eleitoral de candidato, de partido ou de coligao
as penalidades previstas nesta Lei, se, no prazo determinado pela Justia Eleitoral,
contado a partir da notificao de deciso sobre a existncia de propaganda
irregular, no tomar providncias para a cessao dessa divulgao (art. 57-F, caput,
da Lei no 9.504/97).
Desde que intimado da deciso que considerar determinada propaganda
eleitoral irregular e, mesmo assim, nada fazendo para sobrest-la, o provedor que
a hospeda est, efetivamente, contribuindo para a circulao da propaganda ilcita.
Deste modo, a ele sero aplicadas as sanes previstas para tanto, como multa de
R$5.000,00 a R$30.000,00.
De toda sorte, o provedor de contedo ou de servios multimdia s ser
considerado responsvel pela divulgao da propaganda se a publicao do material
for comprovadamente de seu prvio conhecimento (art. 57-F, pargrafo nico, da
Lei no 9.504/97).
Considerao que deve ser feita em relao diferena do texto
normativo desse dispositivo, aplicado na situao em que o provedor previamente
consciente da veiculao da propaganda irregular, sendo, portanto, o responsvel;
com o da redao anterior, aplicado quando o provedor no faz algo para cessar a
propaganda.
As mensagens eletrnicas enviadas por candidato, partido ou coligao, por
qualquer meio, devero dispor de mecanismo que permita seu descadastramento
pelo destinatrio, obrigado o remetente a providenci-lo no prazo de quarenta e
oito horas (art. 57-G, caput, da Lei no 9.504/97). A propaganda eleitoral desempenhada
por meio de mensagens eletrnicas, como e-mail, no podem ser autovinculativas,
de tal modo que seu destinatrio fique impossibilitado de no receb-las,
contrariamente sua vontade. Para isso, delas devem constar mecanismos que
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possam viabilizar seu descadastramento, que dever ser realizado pelo emissor no
prazo mximo de 48h, de forma obrigatria.
Destarte, as mensagens eletrnicas enviadas aps o trmino do prazo
de 48h, contados do pedido de descadastramento, sujeitam os responsveis ao
pagamento de multa no valor de R$100,00 por mensagem (art. 57-G, pargrafo
nico, da Lei no 9.504/97).
Sem prejuzo das demais sanes legais cabveis, ser punido, com multa
de R$5.000,00 a R$30.000,00 quem realizar propaganda eleitoral na internet,
atribuindo indevidamente sua autoria a terceiro, inclusive a candidato, partido ou
coligao (art. 57-H da Lei no 9.504/97).
Como exposto acima, devido a internet propiciar ampla celeridade e, como
regra geral, sem maiores formalidades para a divulgao de suas informaes, a nova
lei eleitoral se preocupou em aplicar sano ao agente que veicular propaganda
eleitoral, atribuindo sua autoria a terceiro, ou mesmo a candidato, partido poltico
ou coligao. Assim, o agente que impor a autoria de propaganda eleitoral via
internet pessoa que no a tenha realizado, sofrer aplicao da pena de multa no
valor de R$ 5.000,00 a R$ 30.000,00, alm das demais sanes aplicveis.
Por fim, no se aplica a vedao constante do pargrafo nico do art. 240 do
Cdigo Eleitoral propaganda eleitoral veiculada gratuitamente na Internet, no stio
eleitoral, blog, stio interativo ou social, ou outros meios eletrnicos de comunicao
do candidato, ou no stio do partido ou coligao (art. 7o da Lei no 12.034/2009).
O art. 240, pargrafo nico, do Cdigo Eleitoral, aduz que, desde 48 horas
antes at 24 horas depois da eleio, vedada qualquer propaganda poltica,
realizada atravs de radiodifuso, televiso. Deste modo, no h limite temporal
para a veiculao de propaganda poltica atravs da internet, como ocorre, por
exemplo, para a publicidade realizada atravs de televiso e rdio.
Deste modo, no h limite temporal para a veiculao de propaganda
poltica atravs da internet, como ocorre, por exemplo, para a publicidade realizada
atravs de distribuio de material grfico, caminhada, carreata, passeata, que
podero ser realizadas at as vinte e duas horas do dia que antecede a eleio,
conforme disposio do art. 39, 9o, da Lei no 9.504/97.
Questo interessante o confronto do art. 7o da Lei no 12.034/2009 com
o art. 39, 5o, III, da Lei no 9.504/97, que afirma ser crime a divulgao, no dia
da eleio, de qualquer espcie de propaganda de partidos polticos ou de seus
candidatos. Como soluo hermenutica, deve-se entender, ento, que s no crime
a divulgao de propaganda eleitoral realizada na internet, sendo considerados
crimes eleitorais todas as outras.
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1 VISO CONSTITUCIONAL
A LC no135/2010, quealtera a Lei Complementar no 64, de 18 de maio de
1990, para incluir hipteses de inelegibilidade que visam proteger a probidade
administrativa e a moralidade no exerccio do mandato, caracterizou-se pela
ambiguidade jurdica.
De um lado, uma lei com enorme repercusso social, de contedo
moralizador e profiltico. De outro, a quebra de diversos princpios constitucionais
ao buscar sua retroatividade para alcanar fatos pretritos ou em curso.
Por fora disso, algumas dvidas de constitucionalidade surgiram com a
publicao da LC no135/2010:
1. inconstitucionalidade por vcio formal as emendas do Senado das
expresses os que tenham sido para os que forem, segundo parte doutrinria,
no configuram mera emenda de redao e sim alterao de contedo, razo pela
qual deveriam retornar para Cmara dos Deputados e no sano do Presidente
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3 CONCLUSO
a) A lei da Ficha Limpa LC no 135/2010 no inconstitucional por vcio
formal (violao do processo legislativo), porquanto as emendas de redao do
Senado apenas indicaram interpretao constitucional, a ser feita pelo STF, no
sentido da impossibilidade de retroatividade;
b) A lei da Ficha Limpa LC no 135/2010 no inconstitucional por vcio
material consistente na violao do princpio da inocncia, pois este se aplica apenas
na esfera criminal e no cvel eleitoral. Ademais, tal princpio foi atenuado pela
consagrao da certeza jurdica, uma vez que o artigo 26-C da LC no 64/90 (com
redao dada pela Lei da Ficha Limpa) permite a suspenso da inelegibilidade,
logo, em casos onde poderia haver injustia, como recentemente o TSE5 o STF6
concederam.
c) Porm, a lei da Ficha Limpa LC no 135/2010 inconstitucional por vcio
material consistente na violao do princpio da segurana jurdica (artigo 16 da
CF/88), alm da ofensa a coisa julgada e ao devido processo legal (contraditrio e
ampla defesa), caso retroaja a nova lei Direito Eleitoral do Inimigo.
Portanto, na tarefa sublime em que me encontro como doutrinador, sou
obrigado a examinar se o bem no oculta o mal que tanto condenamos, qual seja,
o casusmo, ainda que do bem, a violao do artigo 16 da CF/88. Nisto reside a nossa
divergncia com quem tanto deseja aplicar a lei nova a menos de um ano e um dia
do pleito, reconhecendo, nestes juristas, o melhor dos propsitos. Basta imaginar os
seguintes exemplos:
Hiptese 1 - o cidado condenado, por exemplo, por 30-A, 41-A e 73/77
antes da publicao da LC no 135/2010. Antes, no gerava inelegibilidade. Com a
nova LC no 135/2010, passa a ficar inelegvel por 8 anos. Se a lei retroagir, alm
de ferir a coisa julgada, ir aplicar-lhe uma inelegibilidade (alis, totalmente
____________________
Sobre a suspenso de inelegibilidade do casal Garotinho no TSE (AC no 142.085/2010) e a forma
que foi concedida, conferir na obra Reformas eleitorais comentadas, Saraiva, 2010, desse autor.
6
No RE no 281.012, por meio da Petio no 37.159/2010 o Ministro Gilmar Mendes,
monocraticamente, proferiu a primeira suspenso de inelegibilidade do STF, para o senador
Herclito Fortes, mas na verdade como forma de efeito suspensivo ao recurso extraordinrio,
porm, ad referendum ao Pleno do STF. Outro caso no STF: Ministro Dias Toffoli converteu a
petio avulsa em medida cautelar incidental (caso Isaura Lemos) ao recurso extraordinrio, cuja
admissibilidade foi objeto de deciso no AgRg no 709.634/GO. Conferir o estudo completo desses
casos na obra Reformas Eleitorais Comentadas, Saraiva, 2010, desse autor.
5
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MEMRIA
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Memria
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Memria
10
83
___________________
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11
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