Gabriel Cohn - A Atualidade Do Conceito de Indústria Cultural
Gabriel Cohn - A Atualidade Do Conceito de Indústria Cultural
Gabriel Cohn - A Atualidade Do Conceito de Indústria Cultural
A atualidade do conceito
de indstria cultural
dos
agora ao
GABRIEL COHN*
registrado
de
atuais.
:::.
~
~ .
como
10
11
"
os de poder e de autoridade
anomia durkheimiana
a atualidade
de conceitos
ou a ao racional weberiana,
o conceito
associada ao esclarecimento,
nas tendncias
de
constru-
completar:
de indstria
"mas o conceito
se insere, j contm
de
prprio
um exerc-
dominante,
destino". Trata-se de
no incorpora
que o conceito
original-
mente como
est pro-
para
servir pesquisa em
Esquece-se facilmente que as primeiras referncias "indstria cultural" aparecem no livro que Max Horkheimer e
Theodor W. Adorno escreveram entre 1942 e 1944 no seu exlio
americano e publicaram em 1947 numa pequena editora de
Amsterd, sobre a "dialtica do esclarecimento" (ou do "iluminismo"). Livro desconcertante, cujo impacto no cenrio cultural do
ps-guerra ningum poderia esperar na hora do seu modesto
aparecimento. Nele, nada de um plano rigoroso, nem de captulos
bem ordenados e articulados. Trata-se, explicitamente, de "fragmentos", peas dispersas que exprimem, no que tm de inacabado e cheio de arestas, um mundo estilhaado. Mundo do qual (e
este o ponto da "teoria crtica da sociedade", que as informa)
se busca caracterizar, sempre a contrapelo daquilo que ele exibe
como seus traos bsicos, a unidade por detrs da diviso e a
diviso que se oculta na unidade. Trata-se portanto, na sua origem,
de um fragmento no interior de uma obra inacabada. Um
aguilho para ferir o pensamento convencional
mais do que
uma lupa para ampliar o que est vista.
Est em jogo, na dialtica
imanente
12
em
assim
"Para ns
como a
desenvolvimento
do esclarecimento,
e isto
-.l
nem na
.:."
o<;
histria, a contrapartida ao otimismo irrefletido das luzes ocultada pela tradicional idia de progresso. Est em jogo a noo
de que a histria no s avano linear mas envolve intrinsecamente a possibilidade
da
uma crtica
irracionalista
Essas formulaes
um tanto altissonantes
so necessrias
bastante
ambicioso
e ao
13
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(mesmo
tempo
um trao
explicitamente
do momento
fragmentrio
histrico
de fazer frente a
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...
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como
de subalter-
razo inadvertidamente
to em que acreditou
irrefletidamente.
instrumentalmente,
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liberal, marcada
pela incapacidade
de
anti-razo explcita.
Naquelas circunstncias as grandes linhas de confronto poltico-ideolgico no eram suficientes para captar com a finura
devida os percalos da razo, que se exprimiam nas formas mais
abertas da barbrie, mas no unicamente nestas. A crtica da
economia poltica de Marx apresentava-se como uma referncia
fundamental para pensar a questo em todo o seu alcance, desde
que livre da carapaa economicista que a ela aderira. Uma
questo que esses tericos crticos da sociedade tinham que
enfrentar desde logo era, portanto, a de exercitar formas mais finas
de percepo da dinmica ideolgica do que os clssicos do
marxismo tinham chegado a fazer. Dcadas antes de~nnah
A;;;ft)e por outros caminhos e em outro registro, Horkheimer e
Adorno voltaram seus olhares para a "banalidade do mal", para a
necessidade, como diria Adorno em outro momento, de "erguer
a pedra sob a qual se encuba o monstro".
mais inofensivas
de conduo da vida no mundo contemporneo
que se deveria
dirigir a ateno, em busca do que nelas possa haver de
regressivo - especialmente quando se apresentam como formas progressivas de satisfao dos desejos mais espontneos
de homens e mulheres livres para escolher. Isto significava, na
14
do pensa-
mento racional-crtico
haviam deixado para trs na Europa
meaada pela expanso do nazismo reapresentavam-se, sob
outras formas mais "benignas", no seu exlio norte-americano.
E a questo imediata era a mesma que tambm preocupava o
do
mas se di-
da razo instrumental
aparece dissimula-
do no que se apresenta como seu oposto: na produo simb} lica, na forma da cultura ou como mero entretenimento?
Na
primeira formulao dos seus autores a indstria cultural aparece vinculada ao processo de esclarecimento pela sua condio de "engodo das massas". Essa ligao deve ser levada a
srio. Numa primeira aproximao, o termo indstria remete,
neste contexto, ao seu sentido mais arcaico, de astcia e engano. Isto j permite entrever que o termo "indstria cultural"
no foi inventado por esses autores para descrever, ainda que
num registro negativo, um estado de coisas dado observao
direta. Serve, isso sim, para caracterizar a associao de duas
formas de regresso: a da cultura e tambm a da indstria, e
no apenas a da primeira quando submetida aos ditames da
produo industrial. claro que isto tambm se d, e importante no conceito: as formas de expresso cultural vem-se
submetidas lgica da produo industrial em grande escala,
em detrimento
dos seus requisitos prprios. Mas convm
destacar desde logo que, se o conceito
.....
de indstria cultural
comprometido
cultura (porque
fica
na sua produo).
15
desejvel ou insuportvel
um dado
objetivo
aproximao,
um
especifica
do particular encontra-
esto subordinadas
nica
est inscrito
identidade.
Ocorre
identidade,
numa
que distingue
grande
diferena,
a do todo
e
em
no outro,
sobre as conseqncias
aviltamento da cultura, despojada que da sua pureza espiritual pela presso das contingncias materiais mais subalternas,
linear
e I
dies e tendncias
as con-
dadas bloqueiam.
A ideologia
sem questionar-se
a natureza e os condicionantes
social
dessa expe-
resultado
Na linguagem
de Adorno
a ideologia
d como
como
cultura
circula
como
mercadoria.
Est a a marca do
implica diferena, protesto do particular contra o geral, individualizao no lugar do comensurvel. Os produtos da indstria
cultural no representam,
portanto,
..,
-c
...
culturais
se reduzam
a especificidade
cidade industrial.
da indstria cultural,
cultural em proveito
da especifi-
neste
enredado
o da
na prpria ideo-
17
rt"
'ndividualizao do produto
3:)
cultural
como
resultado
que a da equivalncia
de um
mais do
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(a lgica capitalista
da
...
subordinados
que os controladores
da indstria
cultural
so to
(partidos, representao
da indstria
cultural
que mais
descritiva
na
isoladamente,
que se constri
(sobretudo
no sentido
multidimensional
nveis da
percepo e da conscincia dos consumidores de seus produtos). Para alm da sua dimenso descritiva, que no negligen-
,
"'
'-
..,
....,
quela
que, ao contrrio
do objeto
...
no campo
2a sociedade:
intimamente
...<
importante
Na realidade,
"...
cepo
J a idia da multidimensionalidade
dos produtos da indstria cultural permite retomar por um ngulo crtico uma con20
o contato
com a
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I
,
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C
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do mero entretenimento,
"
11I
Na realidade, no contexto
a questo da atualidade
o da complexidade,
do conceito
que
de indstria
as ocorridas
alcance,
mais recente a
do sistema mais]
:-
~plo
importante
institucional
c.
~
~
>
~
<
empresariais
de produo
que processam as
e difuso simblica
plexidade, a concentrao do controle sobre o processo cultural no mbito das exigncias da produo rentvel ainda que
em nome da suposta soberania do consumidor, a prevalncia
"
-'.
.,
de pensamento",
no s a caracterizao
22
fechado e sem
real).
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I
O
ao imprio das
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,-
que os frankfur-
..
como conjunto
;;
s;
que os consumidores
o.
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"'-:'
;
e~subsistema
a nfas~
da pelos frankfurtianos.
no elimina heterogeneidades
no interior do processo.
Os defensores do conceito de indstria cultural tm sua
disposio uma resposta imediata muito plausvel a essa reivindicao de mais cuidado
:
~
dos padres de
pela prpria
entretanto,
geneizar ou indiferenciar
produo,
manter a iniciativa
no processo, planejando
Ipode
Mas no podemos
I torne
mundo
mediante o monitora-
suscitados
recebe do mesmo
pela evidncia
modo
de
as mesmas
da diferenciao
nos
das
a pontos extre-
(ou ritualizada)
da primazia
do plo da
de iniciativa eJ
nesse processo.
diferenciado
ou no
a contribuio
a horizontal
de
sistema)
expresses do princpio
te diferenciado
complexidade
na origem da construo
quanto ao recebido;
assinalando, portanto,
passos no funcionamento
24
da indstria
grau de dvida
possveis descom-
cultural.
Nada disso,
generalizada)?
rico particular
Pois
de alta complexi-
do conceito
valendo,
no seu momento
hist-
-e;
<:.
da equivalncia
"
.;;.
um segundo
..
..",
I~
f::>
\J
dominante
no mundo contemporneo
capitalista, como
caracterizar com preciso esse capitalismo (e portanto captar
o que nele representa a circulao de mercadorias enquanto
sobre "personalidades".
dade ningum sustenta a srio que ele seja pura e simplesmente monoltico)
sobre a
dos mercados).
e do controle
quando exami-
25
,.-
leconomia
a obsoles-
e portanto
do conceito
demonstrar
to a ela pertencente
prprios.
de indstria
propem,
Artes plsticas,
fluxo visual globalizado
e mudanas na percepo
da "Escola de Frankfurt"
cultural
seria preciso
maior:
n-Ia no caminho.
No caso do conceito
e consumo
de indstria cultural,
contemporneas
da produde material
simblico as intuies bsicas da teoria acerca das duas dimenses de complexidade presentes nesse processo: a sistmica e
a da multiplicidade
de nveis em profundidade,
discorrendo
te-
26
Cu/ture.
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