Nusdeo. Pagamentos Por Servicos Ambientais

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4.2.

Polticas ambientais no Brasil e sua estrutura jurdica

A partir da discusso sobre o conceito de polticas pblicas e de sua relao com


o direito, no item acima, pode-se refletir sobre as polticas pblicas ambientais, vale
dizer, aquelas genericamente relacionadas ao objetivo da preservao e conservao
ambiental. Ou, como aponta Paul Little, aquelas polticas pblicas que procuram
garantir a existncia de um meio ambiente de boa qualidade para todos os cidados do
pas1.

A evoluo da preocupao com o tema ambiental no Brasil resultou nas


polticas que vieram a ser adotadas ao longo do tempo, de incio reativas a problemas e
demandas especficas do processo de desenvolvimento. Somente a partir dos anos 80
surge uma poltica mais propriamente ambiental, cujos objetivos so amplos e
autnomos com relao a problemas especficos da economia e da urbanizao.

Nesse sentido os estudos sobre a evoluo das polticas ambientais brasileiras


apontam a existncia de quatro fases que, ao longo do tempo se sobrepuseram e que
podem ser referidas como: administrao dos recursos naturais; controle da poluio
industrial; planejamento territorial e gesto integrada dos recursos naturais2.

A primeira delas deu-se no primeiro governo Getlio Vargas. Trata-se do


perodo que assistiu ao incio da industrializao, especificamente fomentada pelo poder
pblico federal. Esse contexto econmico exigiu a criao de regras sobre apropriao
de recursos naturais, do que resultou a edio de normas especficas sobre o uso e
gesto dos diferentes recursos: cdigos de guas, de pesca, florestal e de minerao.
Houve tambm uma tendncia conservacionista, com a criao de parques nacionais. Na
medida em que se estava diante de um governo autoritrio, essa fase caracterizou-se
tambm pela centralizao da administrao. rgos pblicos foram criados para
implementar as regras criadas por esses diversos cdigos, mas no se cogitava em
qualquer tipo de participao e envolvimento da sociedade ou de grupos sociais
especficos na poltica.

1
LITTLE, Paul. Os desafios da poltica ambiental no Brasil. In LITTLE, Paul E. Polticas ambientais no
Brasil. Anlises, instrumentos e experincias. So Paulo: Peirpolis, 2003, p 18.
2
SILVA-SANCHEZ, Solange. Cidadania ambiental. Novos direitos no Brasil. So Paulo: Annablume,
2. Ed., 2010, p. 66 -79.
A segunda fase, voltada ao controle da poluio industrial, desponta nos anos
70, como resultado do um processo de industrializao sem controle de efeitos
ambientais no pas. As primeiras iniciativas de edio de normas legais voltadas a esse
controle foram estaduais, at em razo da poltica de industrializao do governo militar
de ento3.

A terceira fase, do planejamento territorial, identificada criao da lei do


parcelamento urbano de 19794, surge como reao ao processo de urbanizao
descontrolada das dcadas anteriores e da necessidade de controlar seus efeitos. Alm
da lei do parcelamento do solo urbano, nessa fase editaram-se tambm leis sobre o
zoneamento industrial e, no Estado de So Paulo, leis de proteo aos mananciais.

Conforme j afirmado, essas diferentes fases no se substituem, mas se


sobrepem, at o surgimento da quarta e atual fase, iniciada com a edio da lei
6938/81. Nela os problemas que deram ensejo s fases anteriores so tratados de forma
interligada, dentro de uma abordagem ecolgica, na qual as diferentes questes so
vistas como interdependentes5.

A fase da gesto integrada dos recursos naturais deve ser enxergada tambm no
contexto da evoluo da preocupao ambiental no cenrio das relaes internacionais e
da posio conquistada pela questo na agenda diplomtica6. Esse processo
internacional corre em paralelo com a organizao de grupos ambientalistas na
sociedade civil brasileira, cujo papel foi decisivo no salto que se d na disciplina
jurdica da proteo ambiental entre a edio da lei 6938, em 1981, e a promulgao da
Constituio Federal de 1988, com seu importante captulo sobre o meio ambiente7.

A lei 6938/81, marco inicial dessa fase prope-se a estabelecer a poltica


nacional do meio ambiente, constituindo-se assim numa lei de suporte a uma poltica

3
A exemplo da lei paulista 997/1976, voltada ao controle da poluio.
4
Lei 6766 de 19/12/1977.
5
A definio de meio ambiente da lei demonstra essa viso interligada. O meio ambiente conceituado,
no artigo 3, como conjunto de condies, leis, influncias e interaes de ordem fsica, qumica e
biolgica, que permite,abriga e rege a vida em todas as suas formas.
6
NOBRE, Marcos. Desenvolvimento sustentvel. Origens e significado atual. In NOBRE, Marcos e
AMAZONAS, Maurcio. Desenvolvimento sustentvel: a institucionalizao de um conceito. Braslia:
IBAMA, 2002, p 45-48.
7
SILVA-SANCHEZ, Solange. Op. cit., 89-94.
pblica ambiental8. Assim, estabelece princpios, objetivos, instrumentos e at uma
estrutura institucional o SISNAMA dos rgos competentes para sua implantao.

O objetivo declarado da poltica a preservao, melhoria e recuperao da


qualidade ambiental propcia vida, visando assegurar, no pas, condies ao
desenvolvimento scio-econmico, aos interesses da segurana nacional e proteo da
dignidade da vida humana9. Objetivos menos abstratos so tambm apresentados, tais
como a compatibilizao do desenvolvimento econmico-social com a preservao da
qualidade do meio ambiente e do equilbrio ecolgico; desenvolvimento de pesquisas
e de tecnologias nacionais orientadas para o uso racional de recursos ambientais; a
difuso de tecnologias de manejo do meio ambiente; a divulgao de dados e
informaes ambientais e a formao de uma conscincia pblica sobre a necessidade
de preservao da qualidade ambiental e do equilbrio ecolgico10.

Uma extensa lista de instrumentos descreve alguns institutos que se tornaram


marcantes no direito ambiental brasileiro, tais como a avaliao de impacto ambiental; o
licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; o zoneamento
ambiental e a criao de espaos territoriais protegidos. A listagem legal dos
instrumentos passou a incluir, por meio das alteraes promovidas pela lei 11.284/2006,
tambm os instrumentos econmicos, como a concesso florestal, a servido
ambiental, o seguro ambiental e outros, abrindo-se s discusses acadmicas e dos
formuladores de polticas sobre a importncia dessas tcnicas de incentivo ao
comportamento preservacionista.

A implementao dos objetivos colocados pela poltica tem como um dos seus
desafios, num ambiente democrtico, a necessidade de lidar-se com um conjunto
heterogneo de atores polticos, como instituies e agncias governamentais,
movimentos sociais, empresas e organizaes ambientalistas. Os interesses desses
atores so divergentes ou contraditrios e, assim, a arquitetura da poltica ambiental
deve objetivar a sua incluso e uma participao consciente e efetiva em todas as etapas
do processo de formulao e gesto das polticas11.

8
BUCCI, Maria Paula Dallari. Op. cit. (o conceito de poltica pblica), p. 11.
9
Artigo 2.
10
Artigo 4.
11
LITTLE, Paul. Op. cit., p. 18. A discusso sobre a participao nas polticas ambientais ser
aprofundada no item 4.4., abaixo.
O desenho institucional fundamental da poltica consiste no Sistema Nacional do
meio ambiente SISNAMA. A noo de sistemas relaciona-se articulao de
competncias entre os diferentes entes da federao com competncia numa
determinada matria. O sistema de sade, organizado pela prpria Constituio no
Sistema nico de Sade, SUS, um exemplo ilustrativo.

Na medida em que a Constituio Federal atribui competncia aos entes dos trs
nveis federativos para proteger o meio ambiente, combater a poluio e preservar as
florestas, a fauna e a flora12, o SISNAMA articula a atuao dos rgos e entidades da
Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios competentes em matria ambiental13.

Os principais rgos federais do SISNAMA so o Conselho Nacional do Meio


Ambiente CONAMA e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente IBAMA. O
primeiro competente, entre vrias funes, para exercer atividade regulamentar
relativa disciplina de critrios para o licenciamento ambiental e estabelecimento de
normas e padres de controle da poluio e da qualidade ambiental. O IBAMA o
rgo executivo encarregado de executar a poltica ambiental e suas diretrizes. Os
rgos estaduais constituem, de acordo com a lei 6938/81, os rgos seccionais e os
municipais os rgos locais do sistema.

Sendo o CONAMA um rgo colegiado, sua formao atenta para a necessidade


de articulao entre os trs nveis federativos e, ainda, entre o governo e a sociedade
civil, buscando certo consenso de posies14.

Note-se que os rgos colegiados tm se espalhado na legislao ambiental, a


exemplo dos conselhos de recursos hdricos e comits de bacias, assim como conselhos
de unidades de conservao. Sem falar nos conselhos estaduais e municipais de meio
ambiente.

Ainda que a arquitetura institucional da poltica nacional do meio ambiente no


tenha garantido xito completo da consecuo dos objetivos nela estabelecidos, ou
mesmo a excelncia quanto conciliao e considerao dos interesses dos diferentes
grupos e atores sociais, representa um grande progresso em comparao s
caractersticas centralizadoras dos modelos adotados nas fases anteriores da poltica

12
Artigo 23.
13
Artigo 6. Da lei 6938/81.
14
Cf. MACHADO, Paulo Affonso L. Direito ambiental brasileiro. So Paulo: Malheiros, 2010, p. 160
ambiental brasileira e propiciou um avano notvel da legislao ambiental, e mesmo da
sua efetividade, decorrente do respaldo dado pelo Poder Judicirio a essa legislao15.

Finalmente, importante ressaltar o grau de abstrao e generalidade da poltica


nacional do meio ambiente delineada na lei 6938/81, que alm dos traos de uma
poltica ambiental, estrutura o quadro legal e institucional da proteo ambiental no
pas. Por essa razo, a prpria lei faz referncia a diretrizes da poltica nacional, a
serem formuladas em normas e planos, destinados a orientar a ao dos governos da
Unio, dos Estados e dos Municpios no que se relaciona com a preservao da
qualidade ambiental e manuteno do equilbrio ecolgico16. A implementao da
poltica nacional do meio ambiente exige a criao de polticas com maior grau de
especificidade, como a poltica nacional de recursos hdricos, estabelecida pela lei
9433/1997 ou mesmo uma futura poltica de pagamento por servios ambientais, assim
como de programas, com maior grau de concreo na articulao de meios e fins.

4.3. Polticas ambientais e seus instrumentos

O estudo dos instrumentos das polticas ambientais numa tica jurdica compe-
se de vrios ngulos complementares. Numa perspectiva macro de compreenso da
prpria poltica, aspectos como seu desenho, articulao e avaliao no devem ser
perdidos de vista. Por outro lado, comportam uma anlise do ponto de vista interno, vale
dizer, dos aspectos jurdico-dogmticos que garantem sua legalidade, aplicabilidade e
articulao a outros institutos jurdicos do ordenamento em questo.

Os debates sobre o desenho das polticas destacam a necessidade de combinao


entre duas estratgias possveis mas de natureza oposta para o controle e influencia
dos comportamentos dos seus destinatrios. Trata-se da utilizao de instrumentos de
comando e controle, por um lado e de instrumentos econmicos por outro.

15
Um exemplo desse respaldo consiste na posio consolidada no Superior Tribunal de Justia quanto
aplicao das regras do Cdigo Florestal (lei 4771/1965). Essa questo ser aprofundada no item 4.5.2,
abaixo.
16
Artigo 5. da lei 6938/81.
4.3.1. Instrumentos de comando e controle

Instrumentos de comando-controle, ou de controle, estabelecem normas, regras,


procedimentos e padres determinados para as atividades econmicas a fim de
assegurar o cumprimento dos objetivos da poltica em questo, por exemplo, reduzir a
poluio do ar ou da gua17. So denominados, por alguns autores18 de instrumentos de
controle direto, na medida em que se baseiam em determinaes de cunho
administrativo e no poder de polcia e cujo descumprimento acarreta a imposio de
sanes. De acordo com as normas em vigor no Brasil, essas sanes podem ser penais
ou administrativas.

Os instrumentos de comando e controle so veiculados por normas jurdicas cuja


estrutura aquela tradicional, composta da descrio de um comportamento tipificado
como jurdico, havendo a previso de sanes pelo comportamento desconforme quele.
No caso de normas penais, a norma descreve a conduta ilcita, imputando-lhe as
correspondentes penalidades.

Dentre os instrumentos da poltica ambiental, os de comando e controle so os


predominantes. Existe, portanto, um conjunto extenso de normas a exigirem o
cumprimento de padres ou restries de vrios tipos, determinando condutas
especficas ou proibindo prticas, a fim de se prevenir a poluio e a degradao do
meio ambiente. H muitos exemplos tpicos, tais como as normas de controle da
poluio do ar e da gua, que fixam padres, vale dizer, limites mximos de emisso no
ar ou lanamento na gua de certas substncias por fonte emissora. Ou a exigncia de
que os empreendedores submetam-se a procedimentos como o licenciamento ambiental
ou s leis de zoneamento. No tema florestal, temos a determinao de conservao das
reas de preservao permanente e da reserva legal. A prpria criao de unidades de
conservao implica na imposio de limitaes aos proprietrios de rea no seu
interior, que se caracterizam como comando e controle.

As normas do direito ambiental valem-se de estratgias preventivas, repressivas


e reparatrias. A literatura jurdico-ambiental, por sua vez, identifica a existncia de

17
Cf. MOTTA, Ronaldo Sera. Instrumentos econmicos e poltica ambiental. Revista de direito
ambiental, n. 20, out/dez 2000, p. 87 e NUSDEO, Ana Maria. O uso de instrumentos econmicos nas
normas de proteo ambiental. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de So Paulo, v 101,
2006, p. 364.
18
NUSDEO, Fbio. Desenvolvimento e ecologia. So Paulo: Saraiva, 1975, p. 78.
princpios que fundamentam as regras mais concretas de comportamento, em especial os
da preveno e da precauo, relacionados priorizao de medidas que evitem a
ocorrncia do dano ambiental. O primeiro, assim, expressa a preferncia a ser dada pelo
ordenamento jurdico s medidas que evitem a ocorrncia do dano ambiental. O
segundo, definido da Declarao do Rio de Janeiro de 1992, determina que a ausncia
de certeza cientfica absoluta no deve ser razo para o adiamento de medidas
economicamente viveis para a preveno da degradao ambiental quando houver
ameaa de danos graves ou irreversveis19.

Ao se analisar os instrumentos de comando e controle, verifica-se que os


comportamentos exigidos no seu mbito tm carter preventivo degradao. As
sanes imputadas ao seu descumprimento, por sua vez, correspondem estratgia de
represso, que pode ser de natureza administrativa ou penal.

Alm da estratgia de prevenir e punir, por meio dos instrumentos de comando e


controle, a poltica ambiental brasileira conta com a estratgia da reparao dos danos,
fundamentada no princpio do poluidor pagador, de acordo com o qual a reparao do
dano deve recair sobre aquele que lhe deu causa.

Algumas limitaes dos instrumentos de comando e controle deram ensejo a


crticas que levaram proposio de instrumentos mais flexveis em certas situaes.

As discusses mais ilustrativas sobre a sua adequabilidade e seus limites


referem-se especificamente questo do controle da poluio.

Esse controle, como sabido, d-se com base no instrumento dos padres. A
fixao dos padres, por sua vez, baseia-se em diferentes estratgias. Padres de
emisso referem-se imposio de limitaes de lanamento no ar ou na gua de
diferentes classes de poluentes, por fonte poluidora. Assim, criam deveres para as
pessoas fsicas ou jurdicas vinculadas a essas fontes. Padres de qualidade, por sua vez,
estabelecem limites mximos para a presena de determinadas substncias na atmosfera
e na gua ou ainda no tocante aos decibis para os rudos. Servem para orientar a
atividade de controle da poluio pelos rgos responsveis. A fixao dos dois tipos de
padro deve ser complementar, pois s vezes, o acmulo de poluentes emitidos dentro

19
Princpio 15. Disponvel em http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&id
Estrutura=18&idConteudo=576. Acessado em 19/08/2010.
dos limites de emisso para as fontes individuais pode resultar na ultrapassagem dos
padres gerais de qualidade.

A fixao de padres pode ser tambm tecnolgica e ento o critrio utilizado


referido como melhor tecnologia disponvel, que procura controlar os padres de
emisso e sua reduo, a partir de solues tecnolgicas que resultem na reduo das
emisses e que sejam, ao mesmo tempo, factveis para as fontes poluidoras.

As crticas do referido debate aos instrumentos de comando e controle na


regulamentao da poluio ganharam evidncia nos Estados Unidos nos anos 80 e
podem ser sintetizadas em trs elementos20.

Em primeiro lugar, a fiscalizao para garantir a obedincia aos padres de


emisso deve ser intensa, o que custoso ao poder pblico. Com efeito, a baixa
probabilidade de deteco incentiva o descumprimento da norma. Alm disso, o
governo depende de informaes do setor empresarial relativamente aos nveis de
emisso e s possibilidades de sua reduo a fim de fixar os padres

Mais importante, porm, a diferena entre plantas industriais cujas emisses so


praticamente incomparveis, dificulta o estabelecimento dos padres e deixa de
incentivar redues maiores do que a exigida em lei pelos agentes mais eficientes. No
estimulam tambm a inovao para mudanas de processos de produo que acarretem
menor poluio.

No mbito da proteo florestal as principais crticas apontam tambm a


dificuldade de fiscalizao do cumprimento das normas. Especificamente no caso
brasileiro, as exigncias legais de conservao que recaem sobre proprietrios
particulares - as reas de preservao permanente e a reserva legal, sobretudo na
Amaznia - so apontadas como onerosas uma vez que os seus benefcios recaem sobre
outros grupos sociais que no os proprietrios. Esse argumento foi intensificado nos
debates sobre as mudanas no Cdigo Florestal, mas utilizado tambm em anlises
acadmicas desvinculadas da disputa de interesses particulares relacionadas mudana

20
Cf NUSDEO, Ana Maria O. Op. cit (o uso de instrumentos econmicos)p. . Cf. ainda ANDERSON et
al. Environmental improvement through economic incentives. In FINDLEY, Roger, FARBER, Daniel R.
e FREEMAN, Jody. Cases and Materials on environmental law. St. Paul: West Publishing, 2003, p. 338-
340 65.
da legislao21 e cujo objetivo demonstrar a necessidade de criao de instrumentos de
incentivo preservao.

Finalmente, menos como crtica e mais para fim de comparao de instrumentos


alternativos, aponta-se as dificuldades implicadas na criao de reas pblicas de
conservao, que exigem um desembolso muito grande por hectare e pode implicar a
necessidade de remoo de populao residente nas reas, conforme o regime de
proteo22.

4.3.2. Instrumentos econmicos

As limitaes dos instrumentos de comando e controle e a insatisfao delas


decorrentes resultaram em propostas de criao de normas que trabalhassem com outra
estrutura de conduo dos comportamentos dos seus destinatrios. Assim, ao invs da
imposio de comportamentos obrigatrios baseados na potencialidade de uma sano,
passou-se a reclamar a criao, na poltica ambiental, de instrumentos que
incentivassem a adoo voluntria de prticas de reduo da poluio ou de preservao
ambiental ou, ao menos, que desse aos destinatrios um espao de escolha entre meios
alternativos para a consecuo dos seus objetivos. A defesa dos instrumentos
econmicos para o cumprimento desse papel surge juntamente com as crticas aos
instrumentos de comando e controle, nos anos 8023.

A discusso sobre os instrumentos econmicos iniciou-se, no Brasil, entre os


adeptos da economia ambiental. Um dos autores que se dedica questo, Ronaldo S. da
Motta, os define como aqueles que atuam diretamente nos custos de produo e
consumo dos agentes econmicos, cujas atividades esto compreendidas nos objetivos
da poltica24. Os exemplos so os tributos em geral e os preos pblicos, que podem ser
criados, majorados ou reduzidos. Deve-se observar, porm, que instrumentos de
comando e controle tambm atuam sobre os custos de produo e consumo dos agentes.

21
Por exemplo MOTTA, Ronaldo S. e OLIVEIRA, Luiz R. e ALTAFIN, Iara G. Proambiente: Uma
poltica de pagamentos por servios ambientais no Brasil. Universidade de Brasila, disponvel em
http://www.sober.org.br/palestra/9/421.pdf
22
As regras relativas s unidades de conservao sero analisadas no item 4.5.3, abaixo.
23
Cf. STEWARD, Richard B. A new generation of environmental regulation? Capital University Law
Review, v. 29, 2001, p. 21.
24
Instrumentos econmicos e poltica ambiental. Revista de direito ambiental no. 20, 2000, p. 88.
Afinal, normas fixando padres de emisso ou solues tcnicas e, ainda, os processos
de licenciamento e as solues mitigadoras para o empreendimento que deles advm
representam custos significativos para atividades ou projetos.

Elemento essencial da definio dos instrumentos econmicos portanto, o seu


carter indutor dos comportamentos desejados pela poltica ambiental, por oposio aos
instrumentos de controle que os obriga. Esse carter indutor d-se por meio da
imposio de tributos e preos pblicos, da criao de subsdios ou ainda, da
possibilidade de transao sobre direitos de poluir ou crditos de no poluio25.

Se os instrumentos de comando e controle so veiculados por normas que se


caracterizam por uma estrutura normativa tradicional, vale dizer, aquela que descreve
um comportamento lcito e prescreve uma sano negativa pelo seu descumprimento,
parte dos instrumentos econmicos so criados por normas jurdicas que propem
inovaes dentro da estrutura comportamento/sano.

Trata-se do fato de imputarem a um determinado comportamento uma sano


positiva, que pode ter o carter de prmio, retribuio ou mesmo de facilitao da
conduta desejada. A utilizao desse tipo de sano pelas normas decorre da adoo de
tcnicas de encorajamento e promoo pelo poder pblico que advm do fato de haver
assumido novas funes, voltadas a estimular condutas inovadoras26.

Os instrumentos econmicos podem ser divididos em duas categorias: os


instrumentos precificados e de criao de mercado27.

4.3.2.1. Instrumentos econmicos precificados

Os instrumentos econmicos precificados tm por caracterstica a alterao dos


preos dos bens e servios da economia, aumentando-os ou reduzindo-os conforme se
objetive o desestmulo ou o estmulo da conduta em questo. No primeiro caso, trata-se
de aumentar o custo de uma conduta a ser evitada e caracterizar um instrumento
econmico superavitrio, a exemplo dos tributos e preos pblicos que aumentam o

25
Cf. Nusdeo, Ana Maria. Op. cit.( O uso de instrumentos ...), p. 365-366.
26
Cf. BOBBIO, Norberto. Op. cit., p. 23-32.
27
MOTA, Ronaldo S. Op. cit, p. 88 e NUSDEO, Ana Maria. Op. cit.( O uso de instrumentos ... ), p. 366-
368. Note-se que classificao pode ser comparada com aquela apresentada por Fbio Nusdeo (op. cit.),
p. 81-92), entre as medidas de finanas pblicas e medidas com base no mercado, embora no haja plena
coincidncia entre os dois pares de categorias.
preo de um recurso natural. No segundo caso, fala-se em instrumento econmico
deficitrio, que subsidia a diminuio do preo ou estimula condutas de preservao.
Em contrapartida, requerem o aumento da carga fiscal em outras atividades para seu
financiamento.

A estratgia indutiva de comportamentos dos instrumentos econmicos


precificados consiste na opo pela taxao ou subsdio a determinadas condutas ao
invs de proibies ou imposio de limites ou ainda da obrigatoriedade das prticas
consideradas desejveis.

Esses instrumentos servem, genericamente, para trs funes28: corrigir uma


externalidade ambiental29; financiar determinadas receitas e cobrir custos e induzir um
comportamento social.

No primeiro caso, busca-se internalizar o custo ambiental gerado pela produo


de bens e servios no seu preo, a exemplo da cobrana pelo uso da gua, prevista na
legislao brasileira30 e implantada em algumas bacias. Mesmo que o uso do recurso
no cause danos ao meio ambiente, implica reduo do estoque natural, cada vez mais
escasso e, portanto, um custo para a coletividade. O financiamento de externalidades
positivas pode se dar por meio de instrumentos creditcios e fiscais voltados, por
exemplo, para empresas que adotam tecnologia limpa ou reduzam seu uso de recursos
ambientais. Ou, ainda, podem ser celebrados contratos de pagamento por servios
ambientais.

No segundo caso, o objetivo gerar receitas para o financiamento de custos


atravs da cobrana de taxas por servios determinados ou pelo exerccio do poder de
polcia. Tem-se como exemplo a taxa de controle e fiscalizao ambiental (TCFA),
instituda pela lei 6938/81, com a redao dada pela lei 10.165/2000, cujo fato gerador
o exerccio do poder de polcia do IBAMA para controle e fiscalizao das atividades
potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos naturais. A obteno de receitas
para financiamento da estrutura de rgos ou programas ambientais justifica-se em
razo das restries oramentrias que, frequentemente, impedem a efetividade das
normas e programas voltados ao meio ambiente, por falta de estrutura de fiscalizao ou

28
MOTTA, Op. Cit. p. 89-90. e Nusdeo, Ana Maria. Op. cit. (O uso de instrumentos econmicos), p. 366.
29
Para o conceito de externalidades, vide o item 1.1, do captulo 1, acima.
30
Especificamentre na lei 9433/1997.
monitoramento. A imposio de tributos sobre a utilizao de bens poluentes ou de
recursos naturais no renovveis ou escassos permite que o financiamento recaia, no
sobre a sociedade, mas sobre os grupos que causam maior presso sobre o meio
ambiente.

Finalmente, no terceiro caso, a correo do preo de um bem ou servio objetiva


primordialmente a induo de certos comportamentos pelos destinatrios da norma.
Aumentar ou reduzir custos de certos produtos, ou prticas, tende a resultar em
estmulos ou desestmulos especficos.

A criao de impostos ambientais, que podem consistir em impostos indiretos ou


alquotas diferenciadas de impostos indiretos j existentes sobre a produo ou consumo
de determinados bens ou ainda a criao de um tributo do tipo contribuio ambiental31,
tambm se encaixariam nessa categoria. As possibilidades de implantao de tal
contribuio no Brasil objeto de discusso na literatura especializada no direito
tributrio32.

As discusses acerca da aplicao de instrumentos econmicos precificados


propem a necessidade de conjugao entre os objetivos citados. O objetivo de gerao
de receita, de fato, deve ser acompanhado pela induo de comportamentos e/ou
correo de externalidades. Do contrrio, corre-se o risco de transformar-se em
instrumento arrecadatrio, desvirtuando-se como instrumento de poltica ambiental.
Idealmente os trs objetivos devem ser articulados.

Na medida em que os agentes que utilizam determinado recurso natural


retribuem sociedade pelo seu uso ou financiam a estrutura para a fiscalizao
ambiental, a utilizao de instrumentos econmicos precificados do concretude aos
princpios do poluidor-pagador33 e do usurio-pagador, caractersticos do direito
ambiental. O primeiro, como j explicado neste item, refere-se alocao dos custos de
reparao de danos ambientais sobre o seu causador. O segundo refere-se imposio

31
Vide, a respeito da proposta de criao da contribuio ambiental no Brasil, MOTTA, Ronaldo S.,
OLIVEIRA, Jos Marcos D. e MARGULLIS, Srgio. Proposta de tributao ambiental na atual reforma
tributria brasileira. IPEA. Texto de discusso 738, www.ipea.gov.br/pub/td738pdf, p. 17-21.
32
Para uma discusso sobre os limites impostos pelos princpios do direito tributrio brasileiro
implementao dessas medidas, confira-se SCHOUERI, Luiz Eduardo. Normas Tributrias Indutoras em
Matria Ambiental e FERRAZ, Roberto. Tributao ambiental orientada e espcies tributrias no Brasil.
Ambos em TORRES, Heleno T. Direito tributrio ambiental. So Paulo: Malheiros, 2005, p. 235-256. e
333-353, respectivamente.
33
O conceito do princpio do poluidor-pagador ser abordado no item 5.2.4., do captulo 5, abaixo.
de um preo ou exao sobre utilizao de um recurso natural, mesmo que no implique
na gerao de danos ao ambiente.

4.3.2.2. Instrumentos de mercado

Os instrumentos de criao de mercado ou, simplesmente, de mercado


estabelecem direitos transacionveis entre os agentes ou a negociao em mercado
aberto, como tem ocorrido com os crditos de carbono. Esses direitos podem se referir
emisso de substncias poluentes, a crditos decorrentes de prticas de preservao ou
reposio de recursos naturais ou, ainda, de comprovada reduo da emisso de
substncias poluentes ou de aquecimento da atmosfera.

Conforme j apontado, o debate acerca das vantagens de instrumentos


econmicos nas polticas ambientais referia-se inicialmente ao objetivo de controle da
poluio. Embora as origens das propostas de transao no controle da poluio
remontem ao trabalho de Ronald Coase na dcada de 60, esse debate intensificou-se nos
Estados Unidos, nos anos 80. ilustrativo da discusso o artigo publicado em 1985 por
Bruce Ackerman e Richard Stewart onde criticam o controle de poluio por padres
tecnolgicos e defendem uma reforma no sistema norte-americano relativo matria.
Segundo os autores, deveria ser permitido aos poluidores comprar e vender quotas de
emisso de poluentes entre si, criando, assim, um incentivo econmico poderoso para
que aqueles que pudessem reduzir seu nvel de poluio com menores investimentos
vendessem suas quotas para aqueles cujo custo de reduo mais alto. Alegavam ainda,
que esse sistema implicaria uma substancial economia de custos de fiscalizao e
obteno de informaes pelas autoridades ambientais34.

Mercados de emisso so formados mediante a criao de ttulos ou quotas


representativos de licenas para emitir substncias determinadas, alocadas entre as
indstrias instaladas que podem ser negociadas entre aquelas que no a utilizam em
totalidade e aquelas que necessitam ultrapass-las. A fim de evitar-se um aumento ou
mesmo a estabilizao das emisses, os programas mais bem sucedidos prevem uma
reduo progressiva das quotas em circulao no mercado.

34
Reforming Environmental Law. In REVESZ. Richard. Foundations of Environmental Law. New York:
Oxford University Press, 1987, p. 135/136.
A criao de um sistema de teto e comrcio d-se a partir das seguintes medidas.
Em primeiro lugar, a autoridade ambiental estabelece um limite total (teto) de emisses
de determinado(s) poluente(s) para um conjunto de fontes num determinado lapso
temporal. A segunda etapa a de dividir esse teto em quotas. Em seguida, essas quotas
so distribudas entre as fontes, conforme critrios definidos na regulamentao do
programa. Os critrios mais comuns so o histrico passado de emisses de cada agente
ou leiles. Essas quotas podem ser negociadas entre as fontes. O quarto componente
refere-se ao estabelecimento de um sistema de verificao das suas emisses pelas
empresas para gerar informaes a serem reportadas autoridade reguladora.
Finalmente, a autoridade compara as emisses das empresas com as suas quotas
(originalmente distribudas ou adquiridas) e impe penalidades se aquelas ultrapassarem
essas35. A articulao entre o limite total teto e a possibilidade de comrcio de
emisses explica a denominao desse instrumento de mercado como cap and trade, na
lngua inglesa, que podemos traduzir como teto e comrcio de quotas.

Algumas experincias de programas de teto e comrcio foram desenvolvidas nos


Estados Unidos a partir dos anos 9036. Os de maior destaque so o programa Acid
Deposition control, criado em 1995, e considerado bem sucedido e o Regional Clean
Air Incentives Market (RECLAIM), californiano, que no teve xito quanto ao objetivo
de reduo de poluentes.

O Acid Deposition Control foi criado em 1990 com o objetivo de reduzir as


emisses de dixido sulfrico (SO2) das usinas de gerao de energia eltrica movidas a
carvo. Desde sua implementao, o programa cumpriu, ou mesmo excedeu, as
expectativas relacionadas ao seu cumprimento e s taxas de reduo de emisses.

Um aspecto apontado como relevante para esse sucesso foi o papel


desempenhado pela Environmental protection Agency (EPA) e o sistema de
monitoramento por ela criado. Este consistia numa sofisticada tecnologia e exigia que
todas as fontes instalassem um sistema de monitoramento contnuo das emisses,
permitindo a mensurao das emisses de SO2 e de outros poluentes em bases

35
MCALLISTER, Lesley. Beyond playing banker: The role of the regulatory agency in emissions
trading. American Bar Association Administrative Law Review, n. 59, 2007, p. 274. E NUSDEO, Ana
Maria. El papel de los mercados y de los derechos de propriedad en la proteccin ambiental. In ALVEAR
Helena e BERGALHO, Paola. Derecho y propriedad. Buenos Aires: Libraria Edicciones, 2008, p. 275.
36
Essa descrio baseada em PERCIVAL et al. Environmental regulation. Law, Science and Policy.
New York: Aspen Publishers, 4th ed., 2003, p.542- 246 e MCALLISTER, Lesley. Op. cit. p, 273-277.
Vide tambm NUSDEO, Ana Maria. Op. cit. (El papel de los mercados), p. 275-278.
contnuas, em sequncia enviados EPA. O programa e pode-se dizer que seu sucesso
exigiu investimentos por parte dessa agncia e um corpo bem treinado de
funcionrios.

O RECLAIM um programa regional do Estado da Califrnia, mais exatamente


da bacia area da Costa Sul (Orange County, and parts of Los Angeles, San Bernardino,
and Riverside Counties), que comeou a ser implantado em 1994. O seu objetivo era
reduzir as emisses de NOx e SO2 das maiores fontes estacionrias na bacia37.

As fontes includas no RECLAIM so mais heterogneas do que aquelas


participantes do programa de acumulao cida, incluindo no apenas usinas de gerao
de energia, mas tambm refinarias, produtoras de cimento e asfalto e uma ampla
variedade de fontes industriais. Assim como o programa de acumulao cida, o
programa adotou um sistema de teto e comrcio.

O programa do RECLAIM objetivava uma mdia anual de reduo das emisses


da ordem de 47% entre 1994 e 2000. Entretanto, o resultado de fato atingido foi de
apenas 20% de diminuio, uma porcentagem menor do aquela promovida por polticas
de comando e controle entre 1989 e 1993 (38%).

As razes apontadas para esses resultados tmidos relacionam-se a um sistema


de monitoramento insuficiente, distribuio generosa de permisses nos primeiro
cinco anos do programa e falta de informaes suficientes s empresas, especialmente
s menores, que no lhes possibilitou planejar sua estratgia para reduzir emisses.
Alm disso, o RECLAIM no estabelecia sanes automticas pelo no cumprimento
de suas normas, diferentemente do programa de acumulao cida.

No Brasil, as experincias de mercados de emisso de poluentes so ainda


incipientes. No Estado de So Paulo, um embrio foi criado pelo Decreto 50.753 de
2006, que determina ser a implantao de novos empreendimentos ou a ampliao dos
existentes, em reas saturadas ou em vias de saturao, sujeitas reduo das emisses
de poluentes na regio, de forma a compensar as emisses relativas aos novos
empreendimentos ou s ampliaes. O mecanismo ento, vinculado ao instrumento do
licenciamento ambiental. O Decreto prev ainda que, a partir de futuros planos de
reduo da poluio, a renovao da licena ambiental ser condicionada reduo das
emisses na regio.

37
Para uma descrio do programa e desses resultados, cf. McAlister, op. cit, p. 293-298.
Embora haja a possibilidade de transaes entre empreendimentos que reduzam
suas emisses e interessados em instalar ou ampliar suas unidades, no h
regulamentao dispondo sobre a criao de ttulos representativos da reduo de
emisses e os critrios para sua transferncia. Por outro lado, o fato de ser atrelado ao
licenciamento incentiva a manuteno do crdito pelas empresas que o obtiveram, para
um possvel uso futuro, desestimulando o comrcio38.

Alm dos mercados para emisso de poluentes, pode haver mercados


relacionados utilizao e manejo de recursos naturais. No Brasil, existem negociaes
de crditos de reposio florestal, atrelados obrigao de reposio de vegetao por
setores empresariais que a utilizem em grande quantidade. Essa obrigao pode ser
cumprida por meio de plantio de iniciativa prpria ou de terceiros. As prticas de
reposio geram crditos junto autoridade estadual competente, podendo ser, ento,
transacionados39.

Os mercados de maior destaque na experincia brasileira, sem dvida, so os de


crditos de carbono. Trata-se tambm dos nicos que dizem respeito a um servio
ambiental propriamente dito, que o seqestro de carbono. Conforme j foi discutido,
h um mercado voluntrio de crditos de carbono e um mercado atrelado s obrigaes
estabelecidas no protocolo de Quioto de 199740. Em ambos os casos, os crditos podem
ser oriundos de prticas que reduzam as emisses de gases de efeito estufa para nveis
inferiores aos que ocorreriam na ausncia do projeto ou de prticas relacionadas s
florestas, como reflorestamento. O mercado voluntrio atribui crditos tambm a
prticas de preservao florestal.

Assim, embora os pagamentos por servios ambientais possam ser realizados por
sistemas pblicos corretores de externalidades, aproximando-se das caractersticas de
instrumentos precificados, podem tambm ser decorrentes de sistemas de mercado
criados para sua comercializao.

38
Em 29 de abril de 2010, porm, foi assinado um termo de cooperao tcnica entre a CETESB, a
Bovespa, a Bolsa de Mercadorias e Futuros e a Fiesp para a implementao de um mercado de emisses
de poluentes atmosfricos. http://noticias.ambientebrasil.com.br/exclusivas/2010/04/30/54373-exclusivo-
sao-paulo-vai-implantar-mercado-de-creditos-de-emissao-de-poluentes-atmosfericos.html. Acessado em
28 de julho de 2010.
39
Artigo 18 do Decreto 5975 de 30/11/2006.
40
Vide o item 1.3.6, do captulo 1, acima no qual foram discutidas as transaes associadas ao seqestro e
estocagem de carbono.
A gerao dos crditos negociveis de carbono d-se ao cabo de um processo
denominado pela literatura de ciclo do projeto, no qual intervm rgos pblicos,
agentes privados e rgo supra-nacional, vinculado s Naes Unidas: o Conselho
Executivo41.

O rgo pblico nacional competente para a anlise dos projetos de crditos de


carbono no Brasil a Comisso Interministerial de Mudana Global do Clima42 a quem
incumbe uma anlise geral do projeto e, mais especificamente, a declarao, nos termos
exigidos pelo Protocolo, da participao do pas no projeto ser voluntria e da existncia
de contribuio para o desenvolvimento sustentvel do pas.

As demais etapas da aprovao de um projeto ficam a cargo de outras entidades,


sendo a final emisso dos crditos de competncia do Conselho Executivo do MDL.
Incumbe ao Conselho, tambm, a importante tarefa de aprovar metodologias para
clculo da linha de base43 do projeto e para o monitoramento das redues de emisses
ou do seqestro de carbono.

A Resoluo 01/2003 da Comisso Interministerial de Mudana do Clima disps


sobre critrios considerados aptos a contribuir ao desenvolvimento sustentvel de um
projeto de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, que so os seguintes:

a) Contribuio para a sustentabilidade ambiental local.


Entende-se serem adequados projetos que contribuam para a melhora de
condies ambientais locais, como a reduo do acmulo de resduos
slidos, efluentes lquidos ou poluentes atmosfricos, a par de promover
reduo de emisses dos gases de efeito estufa;

b) Contribuio para o desenvolvimento das condies de trabalho e gerao


lquida de empregos.
Envolve tanto a gerao de empregos quanto elementos da atuao social e
trabalhista das empresas envolvidas;

41
A descrio dessas etapas est descrita na Portaria 01 da Comisso Interministerial de Mudanas do
Clima, de 11/09/03. Dado o interesse no funcionamento do processo de elaborao de projetos no mbito
do MDL, muitos trabalhos publicados descrevem e explicam as etapas de um projeto. Uma boa exposio
encontra-se em SABBAG, Bruno K. O protocolo de Quioto e seus crditos de carbono. Manual jurdico
Brasileiro de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, So Paulo: LTr 2008, p. 47-57.
42
Criada pelo Decreto de 7/07/1999.
43
O conceito de linha de base j foi apresentado no item 1.3.6.1, do captulo 1, acima.
c) Contribuio para distribuio de renda a ser gerada direta ou indiretamente
pelos benefcios econmicos do projeto populao de baixa renda.

d) Contribuio para capacitao e desenvolvimento tecnolgico, relacionada


ao grau de inovao do projeto ou existncia de transferncia de
tecnologia.

e) Contribuio para a integrao regional e articulao com outros setores.


Relaciona-se integrao do projeto com outras atividades socioeconmicas
na regio de sua localizao.

Dessa forma, os projetos submetidos aprovao da comisso interministerial


referida devem demonstrar a satisfao de algum ou mais de um - desses critrios.

H, ainda, a previso de participao de atores sociais no processo de elaborao


do projeto, tais como associaes comunitrias, o Ministrio Pblico, os rgos
ambientais estadual e municipal, a Prefeitura Municipal e a Cmara dos Vereadores do
municpio onde se localiza o projeto44. Deve ser enviada uma carta convite a esses entes
para que se manifestem sobre o projeto ainda na fase de sua concepo, devendo uma
cpia delas ser remetida Comisso Interministerial antes da aprovao do projeto.

Projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo podem gerar impactos


ambientais independentes da reduo de emisses ou seqestro de carbono promovidos.
Nesse caso, o processo deve se submeter s exigncias da legislao ambiental do pas
hospedeiro do projeto a respeito do desenvolvimento da atividade e da necessidade de
submisso a procedimento de licenciamento ambiental.

4.3.2.3. Crticas aos instrumentos de mercado

As crticas adoo dos instrumentos de mercado por polticas ambientais


podem ser agrupadas em duas ordens: inadequao aos fins ambientais objetivados e
incapacidade de garantir resultados equitativos nas relaes entre grupos sociais, setores
econmicos e mesmo na relao entre pases. Em ambos os casos, as crticas surgem a
partir da anlise e avaliao dos resultados de programas especficos e podem contribuir
ao aperfeioamento desses instrumentos e no desenho de novos.

44
Uma lista mnima, descrevendo quem so os principais atores foi estabelecida pela Resoluo 03/2003.
Quanto frustrao dos objetivos ambientais de certos mecanismos de mercado,
aponta-se que a necessidade de conferir fluidez s transaes de mercado para
possibilitar a sua eficincia econmica acaba por prejudicar o lastro ambiental das
transaes, ou comprometer sua integridade ambiental. Essa entendida como
capacidade de cumprir os objetivos para os quais foram criados sem ocasionar danos e
prejuzos ambientais colaterais45.

Mas crticas s fazem sentido diante das caractersticas especficas dos


diferentes programas ou mecanismos. A questo da presso pela expanso do mercado
em detrimento da garantia de benefcios ambientais se coloca especificamente no caso
do mercado de carbono, criado sob a moldura do Protocolo de Quioto. Isso porque a
constituio de crditos comercializveis depende da interveno de agentes privados,
de rgos estatais nacionais e de organismos vinculados organizao das Naes
Unidas, podendo esses ser pressionados para adoo de critrios de maior facilitao
aprovao dos projetos.

Embora a concepo jurdica do sistema de aprovao estabelea o controle das


metodologias de clculo e monitoramento pelo rgo das Naes Unidas, coibindo a
proliferao de projetos descriteriosos, em alguns aspectos, o sucesso do Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo o impediu de avanar na reduo das emisses e no estmulo
ao progresso das normas e prticas ambientais nos pases.

Nesse sentido, crticas so dirigidas falta de rigor da definio das linhas de


base e dos limites do projeto, que permitem a sua aprovao sem uma comprovao
mais profunda de que, na sua ausncia, as emisses seriam reduzidas, ou sem o devido
cuidado para evitar o vazamento das emisses, vale dizer, que as redues de emisso
promovidas pelo projeto sejam transferidas para localidades fora dos seus limites de
abrangncia. Como os crditos gerados pelos projetos permitem que os pases e seus
agentes obrigados a promover a reduo das emisses - possam faz-lo a menor, a falta
de critrios rgidos para a aprovao de projetos resulta num aumento das emisses ou
no mnimo, no atraso de medidas mais enrgicas para a mudana do padro de uso
energtico, necessria, a mdio prazo, para o sucesso do combate mudana
climtica46.

45
Cf. VOIGT, Christina. Is the clean development mechanism sustainable? Some critical aspects.
Sustainable development law and policy, v. 8, 2007-2008, p. 16.
46
VOIGT, Christina. Op. cit., p. 16-17.
Por outro lado, a anlise da adicionalidade inclui tambm uma dimenso
econmica, na qual a aprovao de projetos baseia-se na hiptese de que no se
realizariam na ausncia do incentivo econmico garantido pela obteno dos crditos.
Mas esse aspecto no objeto de anlise criteriosa, sendo aceitas afirmaes genricas
no sentido de que, na falta dos crditos, a empresa no faria o investimento necessrio.
Assim, acaba-se por aprovar projetos que poderiam ser desenvolvidos mesmo na
ausncia do mercado de carbono47.

Em certa medida, essas falhas relacionam-se ao fato de que o Mecanismo de


Desenvolvimento Limpo deveria ser um esquema transitrio, at que pases em
desenvolvimento tivessem metas de reduo de emisses. A ausncia dessas, e do
prprio atraso da entrada em vigor do Protocolo, resultou num sistema de comrcio sem
teto. Com efeito, os mercados relacionados emisso de substncia na atmosfera
propem-se a realizar uma alocao eficiente do nvel de poluio tolerada entre as
fontes emissoras. Na medida em que o sistema de Quioto no estabelece limites totais, a
concesso de crditos acaba por permitir mais emisses por parte dos agentes
submetidos obrigao de reduo de emisses. Quanto mais fcil a obteno dos
crditos, mais intenso ser esse fenmeno.

Nesse sentido, o sucesso do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, vale dizer,


o crescimento do volume de transaes e de projetos pode acarretar um aumento geral
das emisses de gases de efeito estufa. Sobretudo porque tem sido difcil avanar no
consenso quanto a metas de reduo mais rgidas para os pases desenvolvidos e nas
propostas para aqueles em desenvolvimento. Em conseqncia, pode ser mais barato
comprar crditos do que investir em mudanas tecnolgicas e reduo geral de padres
de consumo para reduzir as emisses.

Se for analisado tambm o fracasso do sistema do RECLAIM, pode-se perceber


uma semelhana s crticas sofridas pelo Mecanismo de Desenvolvimento Limpo no
tocante fartura de crditos e decorrente ausncia de incentivos para investimentos que
pudessem resultar na redues de emisses48.

47
SCHNEIDER, Lambert. Key lessons learned on the CDM and its use in the EU ETS Briefing paper for
a workshop by Ecologic at the EU Parliament, 3 June 2008. Disponvel em http://ecologic-
events.eu/cdm-workshop/documents/schneider_briefing.pdf. Acessado em 03/08/2010.
48
MCCALISTER. Op. cit., p.295.
O xito do programa de controle de deposio cida, por sua vez, pode lanar
luz para a necessidade dos mecanismos de mercado utilizados em polticas ambientais
serem submetidos a um controle e fiscalizao pblicos. A defesa dos instrumentos de
mercado para a proteo ambiental freqentemente relacionada a algum tipo de
descrena na habilidade do Poder Pblico para regular o controle da poluio ou a
conservao ambiental, ou no mnimo convenincia de reduo dos seus custos. A
experincia desse programa norte-americano permite contradizer a idia ingnua de que
os mecanismos de mercado podem prescindir de um aparato de controle e
direcionamento pblico nas polticas em questo. A discusso sobre o pagamento por
servios ambientais deve levar em considerao esses elementos.

A segunda ordem de crticas, quanto incapacidade dos instrumentos de


mercado levar consecuo de objetivos de equidade social, corresponde hiptese
apresentada neste trabalho, a partir da qual defende a necessidade de que a disciplina
jurdica dos servios ambientais articule objetivos de eficincia e equidade.

Parte dessas crticas aborda a prpria concepo do comrcio de emisso de


poluentes, apontando sua tendncia produo de efeitos contrrios idia de justia
ambiental49. A noo de justia ambiental relaciona-se distribuio de benefcios e
gravames decorrentes da legislao ambiental, ou mesmo dos prprios problemas
ambientais, entre diferentes grupos sociais. Uma distribuio injusta acarreta na
exposio de grupos raciais ou tnicos, ou mesmo de baixa renda, a maiores ndices de
poluio, contaminao e degradao em comparao com classes sociais favorecidas50.

As crticas apontam permitir o mercado de emisses a alocao de quotas entre


empresas de uma mesma regio e, caso atingidas as suas metas, a reduo geral de
poluentes nessa rea. Embora possa haver benefcios sade de todos os habitantes da
regio, aponta-se a necessidade de apreciao da distribuio da emisso de certas
substncias em reas locais especficas, cuja vizinhana pode ser impactada. Na mesma
linha de argumentao, destaca-se no ser socialmente vantajoso conceder a

49
Cf. CHINN, Lily. Can the Market Be Fair and Efficient? An Environmental Justice Critique of
Emissions Trading, Ecology Law Quarterly, 1999, p. 80-125 e DRURY, Richard T.,et alli.. Pollution
Trading and environmental injustices: Los Angelesfailed experiment air quality policy. Duke
Environmental Law & Policy Forum,Spring, 1999, p. 231-253.
50
Cf. NUSDEO, Ana Maria. Justia ambiental. Dicionrio de Direitos Humanos. Escola Superior do
Ministrio Pblico da Unio. Disponvel em http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tiki-
index.php?page=Justi%C3%A7a+ambiental. Acessado em 05/10/2010.
empreendimentos de grande impacto ambiental alternativas implantao de
tecnologias de controle da poluio e efetiva reduo de sua emisses.

Nesse sentido, em julho de 1997, um grupo de entidades de defesa dos direitos


humanos e da justia ambiental apresentaram uma representao administrativa perante
a Environmental Protection Agency, a agncia ambiental norte-americana, insurgindo-se
contra o uso de crditos de emisso de fontes mveis em Los Angeles, de acordo com o
qual permitia-se a compensao das emisses de gases de componente orgnico voltil
dos terminais martimos por crditos decorrentes da retirada de circulao de veculos
velhos. A representao afirmava que o resultado dessa compensao mantinha altos
nveis de concentrao dos gases nas vizinhanas pobres situadas nas imediaes dos
terminais. Esses gases so txicos quando da sua emisso embora, aps a disperso,
apenas contribuam para a poluio geral da regio, sem os efeitos de toxidade. Assim,
se estaria trocando uma possvel melhora na camada de poluentes da regio da bacia
rea, com impactos positivos quanto incidncia de doenas respiratrias e cardacas a
eles relacionados, pela piora ou manuteno de reas crticas, cujos impactos na
vizinhana local mais srio do que aquele causado pela camada de poluente51.

Outro elemento da crtica diz respeito falta de controle e discusso pblica dos
programas de comrcio de emisses. A criao de instrumentos regulatrios de
comando e controle permite a realizao de audincias pblicas e a possibilidade de
participao social. As decises quanto s emisses de poluentes em sistemas que
adotam o comrcio, porm, so tomadas pelas fontes emissoras, sem espao para a
discusso pblica52.

Discute-se ainda a incapacidade dos instrumentos de mercados de incluso de


agentes de baixa renda nas oportunidades que podem oferecer. Essa discusso
pertinente ao mercado de crditos de carbono do Mecanismo de Desenvolvimento
Limpo e tambm aos debates quanto a mercados de servios ambientais.

No caso do mercado de crditos de carbono, a questo colocada em termos


bastante amplos. Como foi apontado no item anterior, a aprovao de projetos no
Mecanismo de Desenvolvimento Limpo exige a sua contribuio ao desenvolvimento

51
CHINN, Lily. Op. cit., p. 82-83 e DRURY, Richard T.,et al.. Pollution Trading and environmental
injustices: Los angelesfailed experiment air quality policy.Duke Environmental Law & Policy
Forum,Spring, 1999, p. 254
52
DRURY, Richard et al. Op. cit. 278-279.
sustentvel do pas sede. Dada a vagueza do conceito, porm, tornam-se possveis
contribuies medocres.

A interpretao do que possa ser considerado contributivo ao desenvolvimento


sustentvel exige a existncia de ganhos de preservao ecolgica combinada a aspectos
sociais e econmicos. No caso dos projetos de MDL esses ganhos ecolgicos decorrem
da adicionalidade dos projetos e da condio de no causarem impactos ambientais
negativos. Mas a disciplina estabelecida pelo Protocolo de Quioto e posteriores decises
das suas partes exige que eles acoplem tambm benefcios econmicos e/ou sociais.

Numa pesquisa sobre o dividendo de desenvolvimento dos projetos de MDL


no mundo, o International Institute for Sustainable Development definiu dividendo de
desenvolvimento como benefcios aos pases em desenvolvimento para alm daqueles
estritamente relacionados s mudanas climticas, nas reas de crescimento econmico
por meio de investimentos; evoluo tecnolgica, alvio da pobreza e incrementos
humanos e de sade53.

Os critrios estabelecidos pela autoridade brasileira, de forma genrica,


permitem uma anlise desses benefcios. A efetividade deles, porm, depende da anlise
dos projetos especficos e da intensidade da concreta contribuio.

Possveis incrementos econmicos relacionam-se transferncia de tecnologia


ou ao desenvolvimento nacional de tecnologias de reduo de emisses. A gerao de
empregos permanentes e o treinamento de mo-de obra podem tambm gerar impactos
positivos economia do pas sede do projeto54. Evidentemente, saltos qualitativos de
desenvolvimento no sentido macroeconmico dependero de outros fatores e polticas
econmicas.

53
COSBY, Aaron, MURPHY, Deborah, DREXLAGE, John and BALINT, John. Making development
work in CDM. Phase II of Development Divident Project, October 2006.Available at http://
www.iisd.org/pdf/2007/making_dev_work_cdm.pdf. Acessado em 04/18/2010.
54
Em levantamento dos 114 projetos aprovados nos anos de 2006 e 2007, a autora identificou que em
75% deles havia gerao de empregos permanentes. Houve transferncia de tecnologia em 58% dos
projetos. Cf. NUSDEO, Ana Maria. Clean Development Mechanism and Distributional Issues: Ana
analysis of the Brazilian certified projects. Trabalho apresentado na Conferncia Climate Law and
Developing Countries, IUCN Academy of Law, Ottawa, 2008. Disponvel em
http://www.iucnael.org/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&id=55&Itemid=6
1. Acessado em 27/05/2010.
Numa abordagem mais crtica, aponta-se a dificuldade de participao de
pequenas empresas nos projetos bem como da concentrao deles em certos pases e
regies economicamente mais dinmicas.

No Brasil, com efeito, a maior parte dos projetos tem como proponentes
empresas de maior porte nos setores industriais, sucroalcooleiro e de energia eltrica.
H grande participao de projetos de reduo de emisso de metano em fazendas de
sunos, mas todos propostos por uma mesma empresa de consultoria de carbono55.

No tocante distribuio de projetos entre pases em desenvolvimento, a


tendncia sua concentrao naqueles de desenvolvimento mdio e maior dinamismo
econmico. Assim, China, India e Brasil so os trs primeiros em nmero de projetos.
Os pases de menor desenvolvimento contam com uma participao mnima no total
deles56. A distribuio geogrfica dos projetos brasileiros segue tambm a tendncia de
concentrao nas regies mais dinmicas57.

As tendncias apontadas so ilustrativas de que o mercado de carbono do


Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, seguindo a lgica de eficincia econmica,
procura a gerao de crditos pelo menor custo. Isso implica replicao de projetos cuja
metodologia j est consolidada e na participao de um mesmo grupo de agentes
sejam as partes, ou os consultores e formuladores de projetos especializados.
Normalmente esses atuam em reas geogrficas economicamente mais prsperas dentro
de um pas ou numa comparao entre pases.

A incluso de grupos sociais como populaes indgenas e tradicionais nos


projetos bastante reduzida. O motivo principal disso relaciona-se s limitaes
impostas pelo sistema de Quioto a projetos na rea de florestamento e reflorestamento58.

55
MICHELLIS, Ceclia M. Organizaes que se beneficiam de projetos MDL no Brasil: uma anlise
sobre o acesso de pequenas e mdias organizaes aos mercados de carbono. In BROSE, Marcos (org.).
O pagamento por servios ambientais. O mercado de carbono promove a incluso social? Goiania:
Editora da UCG, 2009. P. 104-106. Esses dados dizem respeito aos 191 projetos aprovados no Brasil
entre os meses de janeiro e outubro de 2008.
56
COSBY, Aaron et. al. apontam que de todos os projetos de MDL submetidos at junho de 2006, os
pases de menor desenvolvimento (least developed countries) sediavam apenas 1,2% do total. Op. cit, p.
83-84.
57
Dentre os projetos aprovados nos anos de 2006 e 2007, 47 localizavam-se na regio sudeste, 32 na
regio sul , 30 na centro-oeste, 17 na nordeste e 9 na norte. Cf. NUSDEO, Ana Maria. Op. cit (Clean
Development Mechanism and Distributional Issues).
58
Essas restries dizem respeito limitao dos crditos provenientes desse projeto para contabilizao
do cumprimento das obrigaes de reduo de emisses pelos pases do Anexo 1, impostas pela deciso
COP no. 11/2001. Para uma explicao mais completa, vide o item 2.2.3.1.1, no captulo 2, acima.
Nesse sentido, pode-se considerar que a prpria concepo do Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo torna-o um mecanismo de mercado voltado a redues de
emisses por setores econmicos dos quais esses grupos no participam. A demanda por
equidade, assim, poderia ser canalizada para a participao de grupos afetados nos
processos decisrios relevantes e pelo estmulo a projetos que gerem benefcios aos seus
trabalhadores e sua vizinhana. No caso dos servios ambientais, porm, h forte
potencial de incluso das populaes indgenas, tradicionais e de pequenos proprietrios
e agricultores familiares. Sua regulamentao e a implementao de programas
correlatos no deve desperdiar a oportunidade de promoo de objetivos de equidade
relacionados sua obteno de renda pela preservao ambiental e sua considerao
como agentes chaves no desenho

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