Pinto A Avaliação em Educação - Pp. 3-40
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PARTE I
A avaliação está intimamente articulada com a actividade humana e, como tal, a sua
história parece ser também bastante antiga (Hadji, 1989). Mas a avaliação tal como a
conhecemos tem um passado recente, estando intimamente ligada ao desenvolvimento
da escola pública de massas. Assim, podemos dizer que a avaliação tal como a
conhecemos hoje tem pouco mais de um século. Nesta sua breve história que marcou
várias gerações de estudantes e professores e faz ainda parte de inúmeras instituições,
com particular destaque para a Escola, a avaliação sofreu várias conceptua lizações e
conheceu práticas distintas, muito embora a sua utilização tenha ficado colada
dimensões administrativas em detrimento das de natureza pedagógica. (Blak &
William, 2010). Concebida como uma medida, que se destinava a informar vários
processos administrativos de organização (por ex. organização de turmas) e gestão
dos sistemas educativos (ex. retenção, transição de ano ou ciclos de estudos), a
avaliação é hoje entendida como um processo de decisão compreensiva
contextualizada (Weiss, 1996), como um processo de construção social (Pinto, 2002)
orientada para sustentar uma utilização pedagógica, ou seja, uma intervenção
reguladora das aprendizagens. Estas diferentes formas de olhar a avaliação ocorreram
mais rapidamente no plano teórico que no prático (Dominicé, 1979). Assim, é natural
que a imagem da avaliação como medida seja ainda muito forte, até pela sua
manutenção no quadro das instituições e nos discursos políticos e sociais. De resto o
facto de emergirem novas ideias e mesmo eventualmente práticas não significa que as
novas substituam as mais antigas. O mais comum é que haja uma coexistência de
todas elas no mesmo campo institucional. Todavia hoje e dia, as práticas de avaliação
mais conservadoras ligadas à medida através dos exames ou seus subs titutos mais
aligeirados dos rankings ou dos testes internacionais marcam hoje não só o universo
conceptual, mas também as práticas profissionais de professores (Pinto, 2002).
Também a crescente visibilidade dos resultados destas provas lançadas como notícias
para a opinião pública pelos média sem uma explicação sobre o que traduzem
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reforçam a ideia de avaliação como medida, isto é que ela mede com rigor o que os
alunos sabem ou as escolas e os seus atores fazem.
Até há poucos anos raramente se falava de avaliação nem esta marcava as agendas de
política educativa. Contudo, a crise da escola tem levado a que a avaliação tenha uma
visibilidade social e um lugar mais central nos discursos sobre educação. Mas a
passagem de uma zona de penumbra para a ribalta social não foi acompanhada por
uma reflexão profunda sobre os conceitos, os usos e porventura mesmo os abusos da
avaliação (Vial, 2013)
Tal como qualquer atividade humana e, em particular no campo social, a avaliação não
é algo de uma dimensão única, tanto na sua conceptualização e práticas, como nos
seus usos sociais e nos valores que veicula. Ao contrário do que muitas vezes se
pretende fazer crer - que a avaliação é uma técnica neutra, reveladora da verdade - a
avaliação é um "objecto" cultural (Pinto, 2002). Não há uma avaliação, mas avaliações.
Este frenesim avaliativo que hoje vivemos, em que se preconiza a avaliação de tudo e
de todos, como se este acto fosse em si redentor das ações educativas, solução
mágica para todas as crises, sinónimo de transparência, não tem contribuído para
aprofundar um debate em torno desta praxis. De facto, tal como o reconhecem Estrela
e Nóvoa (1993), a avaliação nunca mereceu, salvo raras excepções, um lugar de
destaque em termos de investigação até aos finais do Seculo XX. É já neste final de
século que a problemática da avaliação em Portugal é tomada de uma forma mais
nítida como objeto de investigação (Barreira & Pinto 2006; Fernandes 2006) levada a
cabo no quadro das Instituições Universitárias Portuguesas.
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conceptuais que marcaram a avaliação no último século e por ultimo a sua relação e
racionalidade com os modelos pedagógicos.
Contudo, não existem processos de avaliação sem os seus actores. Para compreender
e agir sobre a avaliação é então necessário construir uma teoria sobre os actores da
avaliação (Chevallard, 1990). A construção desta teoria deverá ser rica, para ser eficaz
e permitir perceber melhor os objectos em avaliação. Nesta perspectiva, ela deve
integrar os diferentes olhares dos actores sobre um mesmo processo e reconhecer que
estas visões são fruto de um tempo e de um espaço cultural (Figari, e Achouche,
1997). Deste modo, esta teoria será menos redutora do que aquelas que actualmente
prevalecem, baseadas numa ideia de modelo rígido, normalizador e controlador das
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actividades de avaliação. Para conseguir este objectivo, é necessário ver de uma forma
mais nítida a avaliação como um processo interactivo entre diversos actores que ocorre
num espaço e tempo institucional. Ao esquecer ou ignorar os protagonistas mais
directamente envolvidos na operação da avaliação atribui-se a esta um estatuto de
operação técnica que existe independentemente daqueles que a realizam. Nestas
condições, como refere Chevallard (1990), a avaliação é vista: "Como um processo
semelhante à reparação de um automóvel. Esta só falha na mão de inexperientes. A
avaliação aparece como uma tecnologia pura." (p.19) . Esta postura sobre a avaliação,
de par com o seu uso generalizado, permite à avaliação furtar-se mais facilmente, à
crítica e ao debate social. O modelo aparentemente sustentado na cultura científica,
torna-se mais importante que o dispositivo, criando a ilusão que existe apenas a
avaliação. É este o caso dos modelos de avaliação apoiados nas correntes positivistas.
Estas contribuíram fortemente para que a avaliação fosse vista como a determinação
de uma medida, a medida de um valor pretendido (Chevallard, 1990). A avaliação
aparece, assim, como um processo concebido separadamente da sua realização e que
pode ser pensado independentemente dela. A avaliação transforma-se num processo,
em que os técnicos substituíram as pessoas implicadas e conscientes (Hameline,
1985).
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É nesta perspetiva, que Lecointe (In Figari e Achouche, 1990, p. 11) considera que se
a relação é o verdadeiro centro da avaliação, esta deve ser vista numa perspectiva
ética, e não na perspectiva tecnicista, que branqueia muitas vezes a própria avaliação.
Seguir neste sentido implica a necessidade de construir uma teoria sobre o agir
avaliativo e não apenas sobre o conceito de avaliação . À necessidade de descrever as
práticas, tal como existem, e torná-las inteligíveis, junta-se também a importância da
definição dos quadros de referência para que tal prática seja satisfatória (Hadji, 1997),
em termos dos avaliadores, dos avaliados e dos objectivos da própria avaliação num
dado momento. Encarar a avaliação como uma ética, isto é, como um conjunto
organizado de procedimentos em acção que visam a promoção de um conjunto de
valores, implica olhar a avaliação e os seus gestos integrados num paradigma pluralista
onde ainda se estão a dar os primeiros passos (Chevallard, 1990).
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A avaliação nunca acontece por acaso. Ela é uma resposta a pedidos sociais
(Barlow,1992) Ao longo do tempo, a avaliação enquanto prática social institucional
desempenhou diversas funções. Estas estão estreitamente ligadas, não só à evolução
da Escola e dos sistemas educativos, mas também aos vários conceitos de cultura e
saber, bem como à organização do trabalho.
· um interesse crescente pela medida, pelo seu rigor e pelos seus procedimentos. De
facto, é no final do século XIX que começam a aparecer os primeiros instrumentos
de medida de funções psicológicas, os testes psicológicos, cujo desenvolvimento
deixam perceber uma forte intencionalidade de medida de diversos aspectos, quer
ao nível da actividade humana, quer das faculdade mentais, onde inteligência
assume um lugar de destaque;
O século XIX parece ser assim um marco importante de uma nova ordem social e
consequentemente dos sistemas educativos da maioria dos países em vias de
industrialização. Pode supor-se que estas transformações tenham constituído uma
razão para a afirmação de novas funções da avaliação. Estas funções mantêm-se ainda
no século XXI, bastante atuais, talvez não tanto ao nível dos discursos, mas sobretudo
ao nível das práticas. Além disto, os discursos atuais sobre a necessidade de
transparência sobre tudo e sobre todos, faz ressurgir de novo a função fiscalizadora da
avaliação. Também as transformações introduzidas pela Escola Pública de Massas
estão ainda bem presentes nalguns sistemas de ensino. A fragmentação e dispersão
curricular; a organização vertical dos sistemas educativos e a linearidade na sua
progressão; a classe como estrutura organizativa e a normalização com valor, tanto ao
nível das tarefas de ensino como das aprendizagens dos alunos, encaminham a
avaliação para funções essencialmente administrativas. A selecção e a certificação são
aspectos centrais para o funcionamento deste sistema. O exame, ou os seus
substitutos, são a expressão da ideia de medida, o gesto avaliativo. A aprovação ou
reprovação, o resultado do acto avaliativo. Este quase sempre percebido em termos
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Podemos dizer que a avaliação, ao longo do último século, assumiu funções que se
prendem mais fortemente com pedidos de natureza social do que pedagógicos. O
controlo das qualificações profissionais, a rentabilidade dos recursos investidos na
educação e a garantia da segurança dos indivíduos e das comunidades através da
regulação do exercício de certas profissões, são três razões sociais invocadas por
Reuchelin (1974), que justificam e legitimam a avaliação, não só no passado, como no
presente.
Contudo, à medida que os sistemas educativos vão evoluindo, que as crises nos
sistemas educativos se vão instalando, e que as reformas aparecem, novos pedidos
são feitos à avaliação, nomeadamente a sua intervenção no campo pedagógico. A
gestão do processo de ensino aprendizagem, os apoios às dificuldades dos alunos
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De acordo com Cardinet (1983) pode dizer-se que são três as funções da avaliação:
(ii) uma avaliação certificativa que sustenta a garantia social das aquisições
feitas através do ciclo de estudos e que deve ocorrer quando o ciclo termina
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O desenvolvimento das funções da avaliação referidas não foi casuístico, mas antes
uma resultante da evolução da sociedade, dos sistemas de ensino, das suas relações
com o mundo de trabalho e com a própria noção de cultura. Como refere Perrenoud
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(1984), a cultura com sentido universal passou a estar fortemente limitada à cultura
escolar. A cultura passou a ser aquilo que é definido como tal no contexto escolar, algo
a ensinar e a transmitir, codificada num curriculum, normalmente construído
centralmente, por especialistas que especifica os conteúdos e os temas de ensino
veiculados normalmente através de um discurso magistral para um aluno epistémico
(Formosinho & Machado, 2012). Toda a formação tende a orientar-se para a aquisição
dessa cultura escolar e ou escolarizada. A avaliação é assim a garantia do
reconhecimento da posse dessa cultura. É ela que é também responsável pela
hierarquização dos indivíduos em função da sua excelência em termos dos seus
saberes escolares e consequentemente culturais. A própria cultura vai sendo invadida
lentamente não só pelos saberes escolares teóricos e práticos, mas também pelos
valores que são inerentes ao funcionamento escolar. O domínio de uma cultura escolar
de base torna-se numa norma à qual ninguém escapa e ser o melhor sobrepõe-se ao
saber mais, numa escola obrigatória, que ensina o mesmo a todos. Aí está a avaliação,
como instrumento e meio de certificar através de uma verificação/medição do que
cada um sabe, ou melhor da determinação do lugar que cada um ocupa na hierarquia
da posse desse saber, ou seja, da excelência escolar. A vertente certificativa da
avaliação ganha um peso social incomparável no contexto escolar e social e vai
funcionar como imagem de toda a avaliação. Mas esta importância social tem que ser
compatível com rigor, equidade e isenção da medida. Não é por acaso que esta f oi e é
ainda uma preocupação dominante no campo da avaliação.
É visível que houve ao longo do século XX uma evolução notável dos conceitos de
avaliação. Ao discutir a natureza e funções da avaliação vimos que elas se foram
desenvolvendo ao longo do tempo embora coexistam hoje entre si. Contudo, como
vimos a evolução das ideias sobre avaliação não ocorreram todas ao mesmo tempo.
Tiveram uma evolução ao longo dos anos, solidária com o desenvolvimento das ideias
noutros campos, nomeadamente no campo social.
O facto de a avaliação ocorrer num contexto social específico leva a que o seu
significado mais profundo se radique na relação que estabelece com esse contexto e
com os seus actores. Por isso, é nesta relação que deve ser encontrada a sua razão de
ser. É o que faremos na análise que se segue.
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Embora não havendo uma unanimidade total entre vários autores (Pelletier, 1978;
Dominicé, 1979; Hadji, 1989; Guba e Lincoln, 1989) na definição dos diversos
momentos dessa evolução, todos convergem no reconhecimento de quatro grandes
ideias que marcaram a avaliação ao longo do último século: a avaliação como uma
medida; a avaliação como uma congruência; a avaliação como um julgamento de
especialistas; a avaliação como uma interacção social complexa. Estas ideias,
naturalmente, que não são estanques entre si, e a emergência de uma nova ideia não
anula necessariamente as que já existem. Mas é de salientar o diferencial que sempre
houve entre as ideias e as práticas correspondentes. Estas mudam de uma forma
muito mais lenta. É fácil encontrar hoje práticas que decorrem ainda das concepções
iniciais de avaliação.
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Durante a I ª Guerra Mundial e nos anos seguintes, foi possível acumular dados e
estabelecer comparações entre os resultados obtidos em diversos tipos de testes
aplicados a populações diferentes e em diferentes países. Também no campo
educativo, o sucesso/ insucesso escolar merecem atenções particulares. Assim,
aumenta o interesse pelo estudo dos exames, dos seus resultados e das condições em
que ocorrem. A acumulação de observações e dados fazem surgir a ideia da pouca
fidelidade e validade das medidas efectuadas. Deste modo, se por um lado se assiste à
contestação da ideia de avaliação como medida, por outro, desenvolvem-se estudos,
nomeadamente ao nível dos instrumentos e dos procedimentos, para tornar a
avaliação, e os exames mais objectivos, fidedignos e válidos. É neste quadro que
Pierron, em 1930, propõe um novo domínio de estudo, a docimologia, que tem como
objectivo o estudo sistemático dos exames, dos sistemas de notação, dos
comportamentos tanto dos examinadores como dos examinados (Pierron, 1963). Esta
nova área de saber, emergente, é constituída por duas disciplinas com os seguintes
objectivos: (i) a docimástica, o estudo dos exames e das suas técnicas; (ii) a
doxologia, o estudo sistemático do papel que a avaliação desempenha na educação
escolar. Há, assim, um eixo mais centrado nas técnicas e outro mais centrado nas
pessoas e nos seus gestos avaliativos, isto é, na cultura de avaliação. Todavia, é o
primeiro eixo que se irá desenvolver, relegando para segundo plano as preocupações
relativas ao segundo eixo. Só nos meados dos anos noventa estas preocupações
voltam a estar na ordem do dia.
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É esta a esta etapa da avaliação que Guba e Lincoln (1989) chamam a geração da
medida.
Na sequência de uma investigação sobre os efeitos dos currículos nos resultados dos
alunos à entrada para a universidade, R.W. Tyller, coordenador do estudo, insiste na
ideia de que o currículo necessita de se organizar em torno de objectiv os (Mateo,
2000). Estes seriam não só a base da planificação curricular mas também os termos de
referência para elaborar os exames. Assim, a referência central da avaliação passa ser
o conjunto de objectivos pré estabelecidos , deixando de lado as provas normativas e o
grupo/turma. Por outras palavras, há um sistema de referência igual para todos os
alunos que frequentem um determinado ciclo de estudos. A avaliação é assim uma
comparação entre os objectivos que constituem o sistema de referência e o estado do
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Em virtude das grandes críticas feitas em redor do sistema educativo nos Estados
Unidos nos anos 50, estas ideias não fazem grande caminho. Na realidade, é preciso
esperar até aos finais da década de 60 para ver reaparecer estas mesmas ideias, mas
com novos desenvolvimentos.
Por seu turno, Scriven (1967) destaca a possibilidade da avaliação poder assumir
diversas funções, nomeadamente a formativa e a sumativa. A formativa é aquela que
se põe ao serviço de um programa em desenvolvimento, com o objectivo de o
melhorar. A sumativa é a que se orienta para comprovar a eficácia do programa no
final do seu desenvolvimento. Este autor critica ainda a quase obsessão pelos
objectivos previamente estabelecidos, sem olhar o seu valor intrínseco. É nesta linha
que Scriven introduz a noção de avaliação intrínseca e extrínseca. A primeira avalia o
elemento em si próprio, a segunda os seus efeitos.
Também Glasser (1963), que se preocupava não só com a definição dos objectivos,
mas também com a melhor forma de os avaliar, desenvolveu a noção de teste criterial,
por contraponto com os anteriores que eram referidos à norma. Estabelece assim uma
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É neste quadro que B. Bloom e seus colaboradores (Bloom et al. 1976) introduzem
algumas destas novas ideias na avaliação escolar decorrente do seu modelo
pedagógico conhecido como a pedagogia por objectivos . Nesta perspectiva conceptual,
Bloom destaca o papel estratégico que a avaliação tem na m elhoria da gestão do
processo ensino/aprendizagem. A este tipo de avaliação chamou de avaliação
formativa. O diagnóstico e a intervenção remediadora são as duas componentes
fundamentais nesta nova ideia de avaliação.
Em síntese, podemos dizer que a estas novas ideias agrupadas em redor dos
objectivos, Guba e Lincoln (1989) designam como a segunda geração da avaliação.
Esta perspectiva tem vários méritos e alguns inconvenientes que na opinião de Hadji
(1989) são os seguintes:
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Não há hoje nenhuma concepção moderna de avaliação que não aceite que a
avaliação só tem sentido se permitir sustentar a decisão sobre alternativas de acção .
D.L. Stufflebeam (1973) um dos mais lapidares representantes desta segunda corrente
define a avaliação como o processo de delimitar, obter e providenciar informação útil
para ponderar possíveis decisões.
(i) toda a realidade avaliada tem uma ordem formal que deve ser objecto de
análise.
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(ii) os que se inscrevem numa perspectiva sócio – crítica que procuram revelar,
através do diálogo e da negociação com os actores da cena social em estudo,
os factos mais relevantes de uma inovação que se pretende introduzir. No caso
da escola isto tanto é válido para os professores, como para os pais ou
professores.
Nos anos 90 com a afirmação clara do paradigma socio construtivista nas ciências
sociais e humanas, a avaliação acolhe um novo olhar em que se destaca a sua
natureza relacional e comunicacional. Assume-se também, que a prioridade da
avaliação, através do avaliador(es), é responder a problemas e a questões reais que
afectam os diversos actores num determinado contexto ou situação concreta. Esta
perspectiva, não só enfatiza a questão da razão de ser da avaliação, mas também o
facto de a avaliação incidir sobre uma acção situada e num sistema de relações em
desenvolvimento em que os problemas, consoante o estatuto e papel dos actores no
quadro dessa relação, assumem diferentes perspetivas.
A avaliação torna-se, em larga medida, numa acção feita por pessoas que entram no
sistema de relações que já existe e onde os diversos actores têm estatutos e papéis
diferenciados. O objectivo da avaliação é encontrar respostas em situação dinâmica,
para melhorar o desenvolvimento tanto das acções como das relações numa dada
situação social. A contribuição de R. Stake (1976) foi fundamental para o
desenvolvimento desta perspectiva ao distinguir uma pluralidade de métodos
diferentes na avaliação de programas de ensino. Para tal, este autor chama a atenção
para oito dimensões de análise entre aquelas que são mais frequentemente utilizadas
para descrever e situar os modelos de avaliação. Estas dimensões correspondem a oito
eixos sobre os quais é possível associar cada um dos modelos (Hadji, 1989):
§ o terceiro eixo, põe em contraponto uma avaliação centrada apenas num objecto ou
situação particular considerada na sua singularidade, ou uma avaliação que usa
essa a situação como uma amostra representativa de outras realidades;
§ o sétimo eixo põe em contraponto uma avaliação global, que toma como um todo
os vários objectos em análise, e uma avaliação analítica que se interessa pelas
variáveis descritivas e pelas suas relações;
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i. o espaço das intenções que inclui o primeiro eixo (objectivos) e o quinto eixo
(vontade descrever ou apreciar);
ii. o espaço dos problemas técnicos ou do dispositivo , que inclui o quarto eixo
(segmentação da realidade em processo ou produto), o sexto (modo de
construção do referente), o sétimo (modo de construção do referido), o
segundo (do actor privilegiado) e o oitavo (do lugar que este actor ocupa face
ao objecto avaliado);
iii. o espaço do uso social da avaliação e dos seus produtos englobando de novo
segundo eixo (o contexto público privado da avaliação) e o terceiro eixo (a
incidência sobre uma parte da realidade).
§ que assume a avaliação como um acto que incide sobre uma realidade em acção
onde se cruzam diversos actores, colocando em destaque a problemática da
comunicação e a necessidade da partilha de códigos que assegurem o seu
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§ que permita uma reflexão crítica sobre a própria acção avaliativa e trace novas
perspectivas de futuro enquadrando os novos problemas emergentes.
(ii) a avaliação orientada para o estudo dos processos, que através de uma
compreensão global da informação, procura chegar a conclusões que
fundamentem uma intervenção nas realidades educativas imediatas sujeitas à
avaliação. A sua utilização fica confinada à situação em que ocorre;
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Cada um destes processos pode ser ameaçado, isto é, o elemento passivo pode tornar-
se subitamente activo, desorganizando a relação estabelecida. Se os alunos não se
interessam pela matéria, ou pelas actividades propostas pelo professor, se faltam, se
resistem a certo tipo de trabalho ou estão desinteressados e distraídos o professor –
entendido como a pessoa tem a responsabilidade institucional da gestão do processo
ensino/aprendizagem - não pode ensinar e o processo tem de mudar. Emerge então
uma nova relação de força e um dos outros elementos assume o papel passivo,
mudando a lógica das relações e o sentido das actividades. A persistência de um
processo estruturante acontece quando é deixada alguma margem de manobra a
outras possibilidades pedagógicas de modo a que possam eventualmente coexistir de
uma maneira satisfatória com outras relações estruturantes entre os três elementos,
embora numa lógica de segundo plano. A rigidez de um eixo leva frequentemente à
sua queda, porque o elemento passivo desenvolve mais facilmente processos reactiv os
transformando-se em hiperactivo, impedindo assim o seu funcionamento. Tal como na
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Saber(es)
Avaliação Avaliação
sumativa formadora
Ensinar
Aprender
Formar
Aluno
Professor
Avaliação formativa
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medida em que fornece informações relevantes ao professor sobre o estado dos alunos
no sentido de o ajudar a gerir o processo de ensino/ aprendizagem. Pode dizer-se
assim que este contexto não só favorece, como necessita de uma avaliação continuada
que seja posta ao serviço da gestão curricular: a avaliação formativa . A avaliação
aparece como um instrumento que fazendo o balanço do estado real do aluno em
relação ao estado esperado, ajuda o professor a tomar decisões ao nível da gestão do
programa, no sentido de criar melhores condições de aprendizagem. O erro aparece
neste processo como uma sinalização sobre o funcionamento pedagógico. Contudo,
tomar uma decisão para a intervenção implica ter um quadro conceptual que permita
interpretar essa informação (Allal et al., 1979). Acontece que, os quadros conceptuais
mais influentes sobre ensino/aprendizagem são ainda muitas vezes de natureza
comportamentalista, não permitindo o desenvolvimento de hipóteses muito diversas.
Dar mais tempo para aprender, ou estabelecer uma melhor relação entre objectivos a
trabalhar e as possibilidades do aluno são as mais frequentes. Mas, mesmo estas
intervenções entram muitas vezes em colisão com a necessidade de cumprir um
programa num certo período de tempo. A pressão do tempo e a própria pressão social
leva muitas vezes ao abandono desta postura pedagógica. Em organizações que se
estruturam tomando como modelo a escola de massas, há uma tensão permanente
entre a necessidade do grupo e a necessidade do aluno na sua especificidade. Esta
tensão acaba por colocar na primeira linha de preocupações a necessidade de uma
nova organização social do trabalho escolar nomeadamente do trabalho cooperativo
em grupo e da gestão das relações e dos processos de comunicação entre professores
e alunos, em particular um maior papel dos avaliados no próprio processo de avaliação
reconhecendo que o aluno é um actor e não um produto passivo de determinantes
biológicas e sociais.
Em síntese, podemos dizer que o processo assente nesta relação, toma a avaliação
mais como um sinalizador de dificuldades no processo de ensino/aprendizagem, do
que um meio para as ultrapassar. Esta situação pedagógica, aparentemente
interessante, torna-se na maior parte das vezes insustentável quando o seu tempo é
muito dilatado porque os professores, não só têm de provocar a aprendizagem nos
alunos, como os alunos e os pais exigem que se ensine a matéria. Esta situação, tanto
da parte dos alunos, como dos professores, trás para primeiro plano a urgência dos
saberes, desorganizando a relação professor/aluno. A solução pode ser um regresso ao
passado, isto é, à situação pedagógica de ensinar ou então um avanço para um novo
processo.
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Contudo, para que isto aconteça é necessário que o aluno seja o protagonista da sua
própria avaliação. Deste modo, a autoavaliação aparece como a forma de avaliação
privilegiada (Pinto &Santos, 2006). Uma vez que está centrada no aluno cria-lhe
oportunidade de reflectir sobre o seu próprio percurso enquanto sujeito em
aprendizagem. Contudo, ser em simultâneo sujeito e objecto num processo de reflexão
é uma tarefa muito exigente, e mesmo, por vezes, bastante difusa porque não é claro
qual o referencial a utilizar, isto é, o termo de comparação. Ora para que a
autoavaliação reguladora se desenvolva é necessário perceber onde se está num certo
momento e onde seria desejável que estivesse, de modo a perceber o que fazer para
voltar ao trilho da aprendizagem, apoiado ou não pelo professor ou pelos seus pares
(William, 2007). Assim, o trabalho em redor dos critérios de avaliação torna-se numa
prioridade de modo a criar as condições para que estes critérios apropriados –
negociados ou não – pelo aluno funcionem como referencial da autoavaliação e como
recursos para a aprendizagem.
O fim último da avaliação não é identificar, embora isso seja necessário, mas ajudar a
tomar a melhor decisão em termos de acção reguladora. Contudo, o próprio processo
de avaliação desenvolvido pelo aluno é já em si mesmo um momento de
aprendizagem. Naturalmente que, para além da auto-avaliação, utilizam-se outras
modalidades ou meios de avaliação, mas o objectivo é, em última instância, fazer um
balanço para encontrar os melhores caminhos na superação das dificuldades. É de
salientar neste âmbito o papel do professor e do seu feedback ao aluno. Normalmente
os professores fazem anotações ou apreciações avaliativas quer nos trabalhos dos
alunos, quer durante as tarefas realizadas nas aulas. Contudo, este processo de
avaliação não é inócuo em termos de aprendizagem. Se este processo de comunicação
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incidir sobre as produções dos alunos, comentando-as, interpelando o seu autor sobre
as razões de tal resposta e apontando de forma clara para pistas concretas estamos
perante uma situação potencialmente rica em termos de avaliação (Dias & Santos,
2009)
Em síntese, cada uma destas situações pedagógicas, bem como o modelo de avaliação
que lhe está associado, têm tendência a funcionar em ciclo fechado. É difícil suportar,
em termos de práticas, um funcionamento na lógica do ensinar e uma avaliação
baseada na auto-avaliação regulada, porque esta não faz sentido no processo de
ensinar. Podem naturalmente acontecer situações episódicas mas tendem a
desaparecer com o tempo. O que há é mudanças de lógica global, isto é, a passagem
de um processo a outro traz necessariamente uma mudança na lógica de avaliar. Uma
mudança decisiva no processo de avaliação acarreta uma mudança na própria situação
pedagógica (Gather-Thurller e Perrenoud, 1988). As lógicas destes três processos
parecem ser assim mais exclusivas do que complementares. Contudo, em termos de
avaliação procuram-se hoje estabelecer pontes possíveis entre a avaliação sumativa e
formativa muito embora estes processos sejam acompanhados de tensões entre as
instituições os docentes e mesmo os alunos (Santos, L.; Pinto, J.,2014)
Tal como se tem afirmado ao longo deste artigo, o contexto faz parte integrante do
próprio acto de avaliação. Assim, ao assumir-se que a educação é uma realidade social
que se concretiza em situações sociais específicas, estas não podem deixar de ser
tomadas em consideração. As instituições educativas não são entidades neutras,
porque têm missões sociais a cumprir e porque são constituídas por profissionais com
as suas crenças e as suas práticas sobre o que é ensinar/aprender e avaliar como
sublinha De Ketele (1990): “A historicidade e o meio envolvente interagem para
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influenciar a avaliação praticada pelo professor” (p. 183). Deste modo, a situação
social onde a avaliação decorre de uma forma mais ou menos explícita, condiciona a
prática pedagógica do professor onde se integram também os procedimentos de
avaliação. Se considerarmos a instituição escolar podemos reconhecer que há, de uma
forma geral, uma certa relação entre o tipo de instituição e a form a como se organiza
em termos pedagógicos. Enquanto na instituição escolar tudo se passa e organiza
como se fosse quase natural e mesmo obrigatório ensinar (Houssaye, 1990), noutros
contextos de ensino /aprendizagem, nomeadamente ao nível do pré-escolar a
organização estrutura-se mais em redor da lógica do aprender (Oliveira-Formosinho,
Lino, D., 2001). Pelo menos, aparentemente, tem menos constrangimentos para que
isso não aconteça.
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referência. Este processo de simplificação vai obrigar a que alguns factores sejam
necessariamente mais decisivos que outros. No julgamento avaliativo formal pesa mais
na decisão não o progresso individual mas a diferença que o separa do seu grupo de
referência. É esta diferença que no final dos anos lectivos ou nos momentos de
transição entre níveis de ensino sustenta as decisões avaliativas (Pinto, 2002). Há
efectivamente por vezes uma coexistência de uma lógica formativa e sumativa, mas
quando se trata de formalizar a avaliação para decisões de natureza institucional, a
lógica sumativa impõe-se, anulando toda a atitude formativa.
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4.CONSIDERAÇÕES FINAIS
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pluralidade de concepções, métodos, critérios, objectos e valores são hoje aceites com
naturalidade. Todavia, este facto cria a sensação de que tudo é avaliar e tudo é
objecto de avaliação. O alargamento da noção de avaliação traz também o perigo do
seu esvaziamento e da sua banalização. Para contrariar esta tendência é fundamental
assumir a importância da reflexão em torno da coerência entre as finalidades, os
objectos e as metodologias da avaliação. Só deste modo se pode perceber a sua
coerência e também a sua pertinência.
Como em geral acontece noutros domínios sociais, a rapidez da evolução teórica não
foi acompanhada da necessária evolução das práticas. Assim, há uma tendência para
um certo encaixe de umas práticas nas outras, não parecendo claro que algumas
perspectivas de avaliação implicam uma ruptura no sentido epistemológico com a
concepção anterior. Deste modo, as práticas não podem seguir uma lógica de
continuidade, mas têm elas próprias de se ancorar noutros pressupostos.
Esta rede complexa que sustenta o agir avaliativo exige uma abordagem
interdisciplinar para a sua compreensão. Esta convoca um conjunto de disciplinas cada
vez mais alargado desde as mais tradicionais, tais como a psicologia, sociologia e
pedagogia, até às disciplinas emergentes neste campo como a comunicação, a filosofia
e a teoria da acção. Esta postura ecléctica trouxe necessariamente novas metodologias
de trabalho científico, nomeadamente aqueles que se enquadram no paradigma
qualitativo. O debate hoje já não se centra tanto na legitimidade dos métodos mas
antes na sua compatibilidade/incompatibilidade com as diversas concepções de
avaliação e os seus objectos de estudo. Perceber os seus valores implícitos torna -se
hoje uma perspectiva incontornável face aos discursos redentores da sociedade e da
escola em particular que nos empurram para crer nos benefícios e virtualidades de
uma sociedade avaliadora . O progresso e bem-estar social estiveram sempre
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Interpelar a avaliação e a sua racionalidade torna-se cada vez mais uma imperiosidade
nas profissões do humano e sobretudo na educação, pois é este conhecimento que
pode iluminar a ética do agir educativo.
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