Ensinando Multiplicação Do 1º Ao 3º Ano
Ensinando Multiplicação Do 1º Ao 3º Ano
Ensinando Multiplicação Do 1º Ao 3º Ano
ENSINANDO
MULTIPLICAÇÃO
E DIVISÃO DO
1º ao 3º ano
ISBN: 978-85-8151-149-8
ENSINANDO
MULTIPLICAÇÃO
E DIVISÃO DO
1º ao 3º ano
AUTORES
Débora Cabral Lima
Claudia Roberta Araújo Gomes
Ernani Martins dos Santos
Eurivalda Ribeiro dos Santos Santana
Juliana Ferreira Gomes da Silva
Síntria Labres Lautert
Revisão
Maria Luiza Castro Araújo
Editoração Eletrônica
Via Litterarum Editora
Apoio financeiro
ISBN: 978-85-8151-149-8
CDD – 372.7
PREFÁCIO ...................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................................9
PROFESSORES DO 1º AO 3º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL QUE
PARTICIPARAM ATIVAMENTE DO PROCESSO FORMATIVO E-MULT ..........13
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
AUTORES ..............................................................................................................................................129
PARTICIPANTES DA REDE E-MULT ..........................................................................................133
PREFÁCIO
Foi com muito gosto que aceitei o convite da Síntria para prefaciar esta obra,
cujo caminho acompanhei desde o início, ou melhor, quando eram ainda valiosas
ideias a serem implementadas no âmbito de um projeto de pesquisa em rede, cujo
foco principal foi a formação em serviço de professores. Trata-se do primeiro de
uma coletânea de três volumes, todos relacionados à pesquisa intitulada “Um estu-
do sobre o domínio das Estruturas Multiplicativas no ensino fundamental” (Edital
OBEDUC, CAPES).
O projeto, realizado simultaneamente em três estados distintos (Bahia, Pernam-
buco e Ceará), teve por objetivo investigar e intervir na prática de professores do
ensino fundamental no que tange às Estruturas Multiplicativas e todo o processo
teve por sustentação a Teoria dos Campos Conceituais.
A Teoria dos Campos Conceituais, em especial o Campo Conceitual Multi-
plicativo, embora já muito referida na literatura, não é tão simples para ser enten-
dida. Isso porque seus conceitos, longe de serem óbvios, exigem um reolhar para a
maneira de como se pensar em uma multiplicação ou uma divisão. Além do mais,
esta obra segue, com muita propriedade, a releitura que meus colegas e eu (MAGI-
NA; SANTOS; MERLINI, 2014) fizemos desse campo multiplicativo, no que tange
à classificação das relações nele envolvidas, dentro de situações lineares.
No caso desse material bibliográfico, tenho a convicção de que ele muito pode
contribuir para a área da educação matemática, em especial para aqueles que têm
como foco de estudo, e/ou de trabalho, os anos de alfabetização. Por essa ótica, o
livro pode interessar não apenas aos pesquisadores e estudantes de pós-graduação
nas áreas de Ensino, Educação e Psicologia, bem como professores e futuros pro-
fessores dos anos inicias do ensino fundamental.
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Assim, apoiado na Teoria dos Campos Conceituais, o livro traz dois enfo-
ques muito interessantes e inovadores para abordar as Estruturas Multiplicativas:
(1) a partir do fazer do estudante, discute, interpreta e explica as estratégias e os
esquemas utilizados para resolver situações-problema multiplicativas à luz da Teo-
ria dos Campos Conceituais (Capítulo II); e (2) a partir de reflexão, planejamento,
ação e, novamente, reflexão (metodologia RePARe) do professor, apresenta uma
rica e instigante discussão sobre possibilidades de ações pedagógicas para o ensino
das Estruturas Multiplicativas, tendo como aporte o viés psicológico (Capítulo III).
Esse último capítulo, inclusive, merece destaque especial, pois seu viés psicológico,
próprio de autores com tal formação, fez toda a diferença na maneira como a for-
mação foi abordada.
A obra ainda oferece, no fim do Capítulo III, um conjunto significativo de situa-
ções-problema elaboradas pelos professores que atuavam nos anos de alfabetização
(1o, 2o e 3o anos do ensino fundamental), no momento dessa formação em serviço.
Dessa forma, concluo este prefácio agradecendo aos autores, amigos muito
queridos, a oportunidade de ter lido, em avant premiere, obra tão agradável, escrita
de maneira direta, objetiva, ilustrativa sem, contudo, perder a simplicidade peculiar
de uma escrita sóbria. Recomendo definitiva e enfaticamente sua leitura para todos
que têm interesse na Teoria dos Campos Conceituais, em especial nas Estruturas
Multiplicativas e, ainda, para todos aqueles que, de alguma maneira, atuam nos anos
iniciais do ensino fundamental.
Parabéns aos autores!
Sandra Magina
Ilhéus, outubro 2017.
8
INTRODUÇÃO
Este livro faz parte de uma coletânea de três livros que se complementam e apre-
sentam resultados da pesquisa intitulada “Um estudo sobre o domínio das Estrutu-
ras Multiplicativas no Ensino Fundamental”, uma pesquisa desenvolvida no âmbito
do Programa Observatório da Educação – OBEDUC, financiada pela Coordena-
ção de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, Projeto Nº15727,
referente ao Edital 049/2012/CAPES/INEP.
A pesquisa teve suas fases realizadas pela rede que denominamos Rede E-Mult,
composta por universidades de três estados da Região Nordeste: Bahia, Ceará e
Pernambuco (apresentadas no Quadro 1) e com a colaboração de um pesquisador
da Universidade Nove de Julho do estado de São Paulo.
9
A Rede E-Mult teve como finalidade principal investigar e intervir na prática
de professores do ensino fundamental no que tange às Estruturas Multiplicativas,
baseada no modelo de formação “reflexão-planejamento-ação-reflexão”. Para al-
cançar o objetivo, a Rede E-Mult realizou a pesquisa durante quatro anos, de 2013 a
2016. Em 2013, foi conduzido um estudo dos modelos disponibilizados pela Prova
Brasil e de seus descritores, dos currículos das escolas e da Teoria dos Campos Con-
ceituais, desenvolvida por Gérard Vergnaud no que se refere ao Campo Conceitual
Multiplicativo.
Tendo como base os estudos realizados em 2013, no ano seguinte, o projeto foi
apresentado para 12 escolas de ensino fundamental dos três estados, sendo quatro
escolas por estado, que foram denominadas escolas parceiras, visto que se buscou,
desde o início, estabelecer, em cada escola, um grupo com características colabora-
tivas composto por professores que ensinam matemática; gestores e coordenadores
pedagógicos; pesquisadores1 e estudantes de graduação, mestrado e doutorado.
Paralelamente, foi elaborado, testado e aplicado um instrumento diagnóstico
contendo 13 situações envolvendo o Campo Conceitual Multiplicativo. O estudo
diagnóstico foi feito com 3.890 estudantes do 1º ao 9º ano do ensino fundamental
das 12 escolas parceiras. Ainda no ano 2014, foi dado início às análises referentes
ao desempenho e aos esquemas usados pelos estudantes para resolver as situações
apresentadas no instrumento diagnóstico.
Em 2015, realizou-se o processo formativo da Rede E-Mult com 84 professores
das 12 escolas que estavam em sala de aula e em cargos de gestão. O processo for-
mativo possibilitou colaborar para o desenvolvimento profissional dos professores,
facilitando a reflexão de suas ações, seguida pelo planejamento reflexivo de suas
novas ações num movimento espiralar crescente.
No ano 2016, a Rede E-Mult desenvolveu, de modo mais intenso, o processo de
organização e de análise dos dados obtidos e a continuidade do processo formativo
com professores de sete das doze escolas parceiras.
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Os principais resultados referentes ao estudo seguem apresentados nos três li-
vros da Coletânea Cadernos E-Mult, que fazem parte da Série Alfabetização Mate-
mática, Estatística e Científica. O primeiro livro é direcionado aos professores que
atuam do 1º ao 3º ano do ensino fundamental, o segundo, aos que atuam no 4º e no
5º ano do ensino fundamental e, o terceiro, àqueles que atuam do 6º ao 9º ano do
ensino fundamental.
O livro Ensinando Multiplicação e Divisão do 1º ao 3º ano, compõe o primeiro
livro da coletânea e foi estruturado em três capítulos. No Capítulo I, apresentamos,
numa linguagem simples, as bases principais da Teoria dos Campos Conceituais no
que se refere ao Campo Conceitual das Estruturas Multiplicativas da forma como
foi abordada na Rede E-Mult. No Capítulo II, apresentamos os resultados do de-
sempenho dos estudantes no teste diagnóstico aplicado em 2014, bem como dis-
cutimos sobre os esquemas e formas de registros adotadas pelos estudantes desses
anos escolares em situações que obtiveram maiores percentuais de acertos. No Ca-
pítulo III, tratamos sobre o processo formativo colaborativo desenvolvido na Rede
E-Mult, no ano 2015, discutimos as situações elaboradas pelos professores, que
foram aplicadas aos seus estudantes e analisadas no grupo colaborativo. E, por fim,
são trazidas narrativas acerca da experiência do professor e o processo formativo,
entrelaçando-se as memórias compartilhadas e o rebatimento na sua ação docente
dos conhecimentos adquiridos ao longo desse processo. Para finalizar, acrescenta-
mos situações elaboradas e aplicadas pelos professores e que não foram contempla-
das na escrita do Capítulo III.
Desejamos a todos uma boa leitura e que os resultados aqui apresentados pos-
sam contribuir com o fazer do professor em sala de aula.
Os organizadores
11
Professores do 1º ao 3º ano do Ensino fundamental
que participaram ativamente do Processo formativo E-Mult
1º Ano
Ana Cristina Alves de Souza Silva Ilhéus - Bahia
Aniele de Oliveira Coelho São José da Vitória - Bahia
Antônia Gerusa Lopes Maciel Barreira - Ceará
Jane Eyre Vieira de Souza Fortaleza - Ceará
Livia Carvalho de Paula São José da Vitória - Bahia
Luciene Gonçalves Dumas Nascimento Recife - Pernambuco
Manuela Rodrigues da Silva Barreira- Ceará
Maria do Socorro Marinho Lima Recife - Pernambuco
Martha Nadja Gonçalves de Oliveira Recife - Pernambuco
Monica da Silva Costa São José da Vitória - Bahia
Rosilene Gomes Ferreira de Moura Recife – Pernambuco
Regina Antonia Lima da Silva Fortaleza - Ceará
Silvana Lopes da Silva Santos São José da Vitória - Bahia
Suzye Egley Tavares Ilhéus – Bahia
2º Ano
13
Nayara Santana dos Santos São José da Vitória - Bahia
Nelma Carla Florêncio Vilar Recife – Pernambuco
Norma Maria Sousa de Lima Fortaleza – Ceará
Roberta Conceição Vieira São José da Vitória - Bahia
Samara Souza de Oliveira Ilhéus – Bahia
Sandra Maria de Souza Cruz Serafim Fortaleza- Ceará
Socorro Aclécia Araújo Pereira Medeiros Barreira – Ceará
Zenaide dos Santos Sacramento São José da Vitória - Bahia
3º Ano
Nota: * Professor atuava em cargo de Gestão e realizou as atividades com esse ano escolar.
14
CAPÍTULO I
A Teoria dos Campos Conceituais fornece um quadro teórico para trabalhar com
elementos que fazem parte do desenvolvimento cognitivo do indivíduo, tais como,
a linguagem, o raciocínio, a percepção e a memória.
Essa teoria concebe o conhecimento em Campos Conceituais e define o Campo
Conceitual como um conjunto variado de situações, conceitos, conteúdos, relações
e operações de pensamento, que podem estar interconectados durante o processo
de aquisição (VERGNAUD, 1983).
As situações1 são o ponto de entrada para um dado Campo Conceitual e elas dão
sentido ao conceito e, esse, necessita de uma variedade de situações para tornar-se
significativo (SANTANA, 2012).
Com essas concepções, a teoria auxilia o professor a analisar os processos pe-
los quais os estudantes adquirem o conhecimento, permitindo que ele tenha mais
clareza sobre os elementos conceituais, as propriedades, as operacionalizações que
estão sendo ensinadas e, assim, possa mediar situações nas quais exista a intenção
de ampliar o conhecimento deles.
1 Usamos o termo situação como sinônimo de problema, situação-problema e tarefa.
15
Para que ocorra a aprendizagem de um conceito, o estudante precisa ser confron-
tado com diversas situações e essa aprendizagem pode ocorrer num longo período
de tempo, por meio da experiência oportunizada ao longo dos anos, da maturação
inerente ao desenvolvimento biológico e da aprendizagem possibilitada principal-
mente pela escola (VERGNAUD, 1996; SANTANA, 2012).
Ser confrontado com uma variedade de situações que deem sentido a um con-
ceito e, com diferentes níveis de complexidade, é importante para que o estudante
compreenda um determinado conceito, de modo que esse confronto propicie não
apenas filiações, mas também rupturas, pois, às vezes, para a formação de uma com-
petência, é preciso abandonar ideias assumidas anteriormente, para assumir outras
ideias (VERGNAUD, 2011).
Referindo-se à multiplicação, a filiação, está ligada à adição por meio da soma
de parcelas iguais, quando o estudante resolve as situações multiplicativas com o
conhecimento do Campo Aditivo. A ideia de a multiplicação ser tratada apenas
como soma de parcelas iguais, reduz o significado dessa operação. É necessário que
o estudante compreenda que a adição de parcelas iguais não é suficiente para com-
preender e resolver algumas situações que envolvam a multiplicação, mas é essencial
ter rupturas para que o estudante possa compreender o conceito de multiplicação
e suas relações.
Um dos motivos para que a escola sustente essa ligação da adição com a multi-
plicação, relaciona-se
[...] com a própria concepção de currículo que norteia a ação pedagógica do pro-
fessor, qual seja: a ideia de que o currículo apresenta uma sequência lógica de
conteúdos: primeiro se aprende a adição, depois a subtração e, em seguida, a
multiplicação e a divisão (SANTOS, 2015, p. 100).
O professor, enquanto mediador, pode elaborar um conjunto de situações que
não leve em consideração essa ordem, pois as ideias de cada uma dessas operações
podem ser trabalhadas desde o primeiro ano da educação básica, sem que precise
trabalhar com o algoritmo. Entretanto, o momento para a aprendizagem do algorit-
mo de cada uma dessas operações é que precisa ser organizado numa certa ordem.
16
Para o entendimento das relações envolvidas nas situações multiplicativas, é im-
portante a compreensão da grandeza e das suas medidas.
As grandezas são atributos de objetos2, isto é, características ou qualidades de
objetos, que não pertencem à essência do objeto, porém é determinada por essa es-
sência. Escolhido um atributo, é possível comparar objetos conforme esse atributo
(MORAIS; TELES, 2014). Por exemplo, comprimento, largura, altura são atributos
de uma caixa.
Para comparar as grandezas é preciso que elas tenham a mesma natureza: com-
primento com comprimento, temperatura com temperatura, unidades com unida-
des, etc. Ao observar dois terrenos podemos escolher o atributo área e comparar:
quantas vezes a área de um terreno é maior que a outra, qual a maior área ou qual
a menor área.
A medida de uma grandeza é determinada por meio da comparação com uma
unidade de medida e o resultado de cada medição é expresso por um número indi-
cando a unidade de medida (MORAIS; TELES, 2014).
Para a representação numérica de grandeza, podemos assumir que é um par for-
mado pelo número (medida) e a unidade de medida escolhida. Mas, não apenas as
medidas padronizadas compõem as unidades de medida de uma grandeza, vejamos
a situação do Exemplo 1:
Exemplo 1: Na bandeja rosa cabem seis copos e, na bandeja verde, três copos.
17
A relação ternária é definida como uma ligação de “três elementos entre si” e, a
quaternária, de quatro elementos entre si. A relação quaternária tem frequentemen-
te a forma “a está para b assim como c está para d” (VERGNAUD, 2014, p. 57-72).
Nas relações quaternárias em que as quantidades podem assumir a forma a está
para b, assim como c está para d, a correspondência entre as quantidades pode ser
determinada pelo operador escalar e pelo operador funcional e, esses operadores,
podem ser usados como esquema de resolução de situações com essas relações.
O operador escalar permite a transformação entre as medidas de uma mesma
grandeza e é representado por um número (operador escalar – porque não tem a
unidade de medida). Um exemplo:
Exemplo 2: Se em uma caixa tem seis lápis, quantos lápis terão em oito caixas
iguais a essa?
18
O operador funcional expressa a passagem das medidas de uma grandeza para outra
(grandezas distintas). Na relação de uma grandeza em função da outra, a Figura 1.2
apresenta o operador funcional para o Exemplo 2.
19
Vamos exemplificar aqui três formatos de situações em que se pode utilizar as
operações de multiplicação ou de divisão para a sua resolução: Proporção Direta,
Comparação Multiplicativa e Produto de Medidas. A primeira está associada à pro-
porcionalidade entre as grandezas distintas (quantidade de pacotes, quantidade de
biscoitos, quantidade em metros, valor em dinheiro, quantidade de pessoas, entre
outras) e tem o foco na Proporção Direta4 (simples, dupla e múltipla). Quando
temos duas grandezas, temos quatro medidas (quantidade) relacionando-se e carac-
terizando uma relação quaternária.
4 Quando as grandezas de uma situação são diretamente proporcionais, ou seja, se a medida de uma das
grandezas aumenta (ou diminui), a medida da outra grandeza aumenta (ou diminui) na mesma proporção.
Neste livro abordamos apenas situações que são diretamente proporcionais.
20
A quantidade de pacotes aumentou significando que a quantidade de litros tam-
bém vai aumentar. A essa relação de aumento que uma grandeza influencia na outra
é chamada proporção e, no Exemplo 3, é direta porque as duas aumentam.
Será uma proporção direta entre as grandezas quando a medida de uma grandeza
aumentar e a medida da outra grandeza também aumentar ou se a medida de uma
grandeza diminuir a outra também diminuir.
A segunda forma de relação multiplicativa é o Produto de Medidas e relaciona
três medidas, refere-se a uma Relação Ternária pois, relaciona uma medida ao pro-
duto de duas outras. Vejamos o Exemplo 4.
Exemplo 4: Alice quer comprar um tapete para a sala e, para ir à loja, ela
mediu o comprimento de 2m e a largura de um metro e meio do espaço que será
ocupado pelo tapete. Qual será a área da sala a ser coberta pelo tapete?
Exemplo 5: Ana tem 12 lápis de cor e Pedro tem três vezes mais lápis de cor do
que Ana. Quantos lápis de cor Pedro tem?
21
Quantidade de lápis de cor de Ana = 12
Relação entre a quantidade lápis de cor de Ana e de Pedro = 3 vezes mais
Quantidade de lápis de cor de Pedro = x
Para saber a quantidade de lápis de cor de Pedro, é preciso saber a quantidade
de lápis de cor de Ana e a relação que existe entre elas (três vezes mais). Temos a
Relação Ternária, pois estabelece a relação entre três elementos.
22
Figura 1.5 – Esquema do Campo Conceitual Multiplicativo
23
A Proporção Simples é uma relação proporcional entre duas grandezas, envol-
vendo quatro medidas. Elas podem ser classificadas na classe de um para muitos ou
de muitos para muitos.
5 As situações dos exemplos de 6 a 17, com exceção das situações 9 e 13, são apresentadas aqui conforme
elaboradas nas ações da Rede E-Mult, para compor o teste diagnóstico da pesquisa.
24
Figura 1.6 – Proposta de resolução do
Exemplo 6 com operador escalar e operador funcional
25
entre as grandezas é proporcional e ampliada seis vezes, portanto, a quantidade
de 30 biscoitos é encontrada multiplicando 5 pacotes por 6(biscoitos/(pacote de
biscoitos)).
Essa situação do Exemplo 6 pode ser elaborada buscando a quantidade de paco-
tes de biscoito ou a quantidade de biscoitos por pacote, o que modifica a comple-
xidade da situação, vejamos:
Exemplo 6(a) – Joana sabe que em um pacote há seis biscoitos. Ela tem 30 bis-
coitos. Quantos pacotes Joana tem?
Exemplo 6(b) – Joana sabe que 30 biscoitos foram embalados igualmente em
cinco pacotes. Ela tem um pacote. Quantos biscoitos Joana tem?
A Figura 1.7 apresenta o esquema de resolução para as situações dos exemplos
6, 6(a) e 6(b).
Com os exemplos das situações 6, 6(a) e 6(b) queremos mostrar a importância de se-
lecionar e confrontar o estudante com situações com diferentes níveis de complexidade.
Podemos observar que, no Exemplo 6, a quantidade de pacotes aumenta cinco vezes, com
a ideia de que o operador escalar multiplica a quantidade de biscoitos em cada pacote por
cinco e determina a quantidade de biscoitos para cinco pacotes, utilizando uma multiplica-
ção para resolver a situação.
No Exemplo 6(a), para determinar o operador escalar, divide-se a quantidade total de
biscoitos pela quantidade de biscoitos por pacote. Esse tipo de divisão é chamado divisão
26
por quota (divisão entre as medidas de uma mesma grandeza). O resultado da divisão é o
valor do escalar que, multiplicado por um, da grandeza quantidade de pacotes, vai deter-
minar a resposta da situação.
No Exemplo 6(b), para determinar o operador escalar, divide-se a quantidade total de
pacotes por um. O operador escalar 5 deve ser usado para determinar a quantidade de
biscoitos por pacote, ou seja, divide-se a quantidade total de biscoitos (30) pelo escalar (5).
Outra forma de resolver sem pensar no operador escalar é utilizar o operador funcional,
usar o que denominamos divisão por partição (divisão entre as medidas de grandezas dis-
tintas), dividir 30 (quantidade total de biscoitos) por 5 (quantidade total de pacotes).
Ao alterar o termo desconhecido nas situações, é possível observar que o nível de com-
plexidade da situação varia, pelas relações a serem compreendidas em cada situação e pela
operação a ser utilizada. Mas, é importante que o professor confronte os estudantes com
situações que estimulem o raciocínio e favoreçam a constituição de novas aprendizagens.
Vejamos, na Figura 1.8, dois esquemas para solucionar essa situação, um usando
operador escalar e, outro, o operador funcional.
27
Exemplo 7 - Relação quaternária, eixo da Proporção Simples, classe muitos
para muitos.
Grandezas - Quantidade de tecido em metros e quantidade de fantasias.
28
Considerando o ano escolar em que estejam sendo abordados os conceitos do
Campo Conceitual Multiplicativo, a resolução da situação com o operador funcional
pode ficar mais complexa, pois ele expressa uma relação entre as medidas de duas
grandezas, tornando-o mais difícil de compreensão.
No quarto e quinto ano do ensino fundamental, é importante que o operador
funcional seja apresentado (mas não exigido como forma de resolver a situação)
permitindo o reconhecimento da existência dos dois operadores: na vertical entre
as medidas de uma mesma grandeza (operador escalar) e, na horizontal, entre as
medidas de grandezas distintas (operador funcional).
PROPORÇÃO DUPLA
O segundo eixo da relação quaternária é a Proporção Dupla. Nas situações
que envolvem esse eixo tem-se, no mínimo, três grandezas de diferentes naturezas.
Quando se tem três grandezas, uma é proporcional às outras duas. Uma grandeza
é diretamente proporcional a cada uma das outras. O Exemplo 8 apresenta uma
situação de Proporção Dupla.
29
Figura 1.9 – Proposta de esquema para resolução
do Exemplo 8 com o operador escalar
30
em seis dias. Assim, aumentando a quantidade de pessoas (de uma para quatro),
alterou-se o consumo, mas não houve interferência nos dias. Do mesmo modo,
aumentando o número de dias (de dois para seis) em nada influenciou no número
de pessoas. Por esses motivos, dizemos que, na Proporção Dupla, as grandezas
não são todas proporcionais entre si, assumem duplas de proporcionalidades.
PROPORÇÃO MÚLTIPLA
Exemplo 9: Dona Maria vende caixas com pacotes de doce. Em uma caixa, há oito
pacotes. Cada pacote contém 20 doces. Se vender cinco caixas, quantos doces o
cliente levará?
Apresentamos, na Figura 1.10, uma possível solução para essa situação utilizando
o operador escalar.
31
Figura 1.10 – Proposta de esquema para resolução
do Exemplo 9 com o operador escalar
32
1.3 Situações com a relação ternária
No esquema da Figura 1.5, a relação ternária tem dois eixos: Comparação Multi-
plicativa e Produto de Medidas. A seguir, analisaremos esses eixos.
COMPARAÇÃO MULTIPLICATIVA
Para a Comparação Multiplicativa, vamos usar a separação das classes, feita por
Lima (2016), identificando cada classe desse eixo separadamente, nomeadamente:
relação, referente e referido. A situação, a seguir, é um exemplo.
Exemplo 10: Cido tem uma coleção de 6 carrinhos e José tem uma de 24 carri-
nhos. Quantas vezes a coleção de Cido é menor do que a de José?
33
Figura 1.11 – Proposta de esquema para resolução da situação do Exemplo 10
34
Figura 1.12 – Proposta de esquema para resolução para a Situação 11
Exemplo 12: Ontem Tonho tinha 18 figurinhas e hoje ele tem 3 vezes menos.
Quantas figurinhas ele tem hoje?
35
Figura 1.13 – Proposta de resolução para a situação do Exemplo 12
Exemplo 13: A filha de Madá tem 30 anos. Sabendo que a filha é duas vezes mais
nova que a mãe, qual a idade de Madá?
36
Figura 1.14 – Proposta de resolução para a situação do Exemplo 13
Observe, na Figura 1.14, que a idade da filha de Madá é colocada como depen-
dente da idade de Madá. Assim, a idade da mãe constitui-se numa referência (refe-
rente desconhecido) para se determinar a idade da filha (referido). A relação indica
uma divisão, pois a expressão “duas vezes mais nova” representa que a idade da
filha será a metade da idade da mãe. Em sala de aula, é essencial a discussão para
a compreensão da relação envolvida na situação e, depois, efetivar a resolução em
nível de cálculo numérico.
PRODUTO DE MEDIDAS
A relação ternária do eixo Produto de Medidas é composta por duas classes: a
Configuração Retangular e a Combinatória. Vergnaud (2014, p. 264) afirma que elas
podem envolver uma multiplicação, quando se quer “encontrar a medida-produto,
conhecendo-se as medidas elementares” ou uma divisão, quando se procura “as
medidas elementares”, conhecendo-se a outra e a medida-produto.
37
PRODUTO DE MEDIDAS – CONFIGURAÇÃO RETANGULAR
Assumimos que, na Configuração Retangular, as medidas referem-se às for-
mas retangulares. A ideia de retangular baseia-se na tabela cartesiana, pois, para
Vergnaud (2014, p. 254), “é a noção de produto cartesiano de conjuntos que explica
a estrutura do produto de medidas”.
Quando no referimos a grandezas diferentes (comprimento, área, volume), as
unidades de medida são distintas para cada uma delas. A unidade de medida de
comprimento é o metro – comprimento de um segmento de reta. A unidade de área
1m2 representa a área de um quadrado com 1 m de lado e não resulta de fazer 1m
x 1m, pois não se podem multiplicar as unidades de grandezas. O mesmo para a
unidade de volume – 1m3 é o volume de um cubo com 1m de aresta.O Exemplo 14
apresenta uma situação da Configuração Retangular.
Exemplo 14: Rute quer mudar o piso do quarto dela. Este quarto tem 3m de lar-
gura e 6m de comprimento. Quantos metros quadrados Rute precisa comprar?
38
Observe na Figura 1.15, que se dispõe de duas quantidades (comprimento e lar-
gura) e procura uma terceira medida de outra quantidade (área). Nesse caso, o pro-
duto entre as medidas lineares (comprimento e largura) resulta na medida da área da
superfície. Assim, 6 x 3 tem como resultado 18, ou seja, a área é de 18m². Vejamos
outro exemplo de Configuração Retangular.
Exemplo 15: A área do jardim da casa de Vera é retangular e tem 24m². A largura
é 4m. Qual é o comprimento em metros desse jardim?
39
PRODUTO DE MEDIDAS – COMBINATÓRIA
Nas situações de Combinatória que envolvem uma relação ternária, é possível
fazer o produto entre as quantidades de elementos de dois conjuntos e se determi-
nar a quantidade de elementos de um novo conjunto. Vejamos um exemplo.
Exemplo 16: Na aula de dança de forró tinham 6 rapazes (Alex, Beto, Caio, Davi,
Edu, Ivo) e 4 moças (Mari, Fabi, Lara, Suzi). Todas as moças dançaram com todos
os rapazes. Quantos casais diferentes foram formados?
40
Nessa situação, são apresentadas as partes, o número de rapazes e de moças e
busca-se o todo que é a quantidade de casais formados com as duas partes.
É possível que o estudante adicione as quantidades dos conjuntos obtidos pelas
combinações entre os seis rapazes e as quatro moças (4 + 4 + 4 + 4 + 4 + 4 =
24), mas também, é possível que ele opte por efetuar o produto das quantidades
correspondentes aos rapazes e às moças, isto é, 6 rapazes × 4 moças = 24 casais
diferentes. Vejamos outro exemplo:
41
Na situação do Exemplo 17, são dadas as quantidades de tipos de sanduíches
(o todo) e os tipos de pães (uma das partes) e, procura-se a quantidade de recheio
(a outra parte). Para resolver, efetuamos a divisão entre as grandezas 15 tipos de
sanduíches e 3 tipos de pães (15 ÷ 3 = 5). Podemos observar que essa situação é
diferente da anterior, pois, para a sua resolução, é utilizado outro raciocínio.
Neste capítulo, abordamos pontos da Teoria dos Campos Conceituais com exem-
plos de situações do Campo Conceitual Multiplicativo que podem ser trabalhados
em sala de aula com os estudantes, cabendo ao professor adaptar essas situações
para a realidade de sua sala de aula conforme as compreensões apresentadas pelos
estudantes e seus desempenhos de aprendizagem. No capítulo seguinte, apresenta-
remos o desempenho de estudantes ao resolverem situações do Campo Conceitual
Multiplicativo, bem como esquemas de resolução utilizados por eles.
42
REFERÊNCIAS
MAGINA, Sandra Maria Pinto; MERLINI, Vera Lucia; SANTOS, Aparecido dos.
O Raciocínio de estudantes do ensino fundamental na resolução de situações
das estruturas multiplicativas. Ciência e Educação (UNESP. Impresso), v. 20,
2014. p. 517-533.
MORAIS, Maria das Dores de; TELES, Rosinalda Aurora de Melo. Texto 1:
Grandezas e medidas no ciclo de alfabetização. In: Cadernos da TV Escola:
Um salto para o futuro. Grandezas e medidas no ciclo de alfabetização. Ano
XXIV-Boletim 8 – set, 2014.
43
VERGNAUD, Gérard. A Teoria dos Campos Conceituais. In: BRUN, J. Didác-
tica das matemáticas. Tradução por Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto
Piaget, 1996. p. 155-191.
44
Capítulo II
45
2.1. O desempenho
Em 2014, foi aplicado um instrumento diagnóstico a 3.890 estudantes do 1º ao
9º ano do ensino fundamental da rede pública dos três estados participantes da
Rede E-Mult. Desses, 1.384 eram estudantes dos três primeiros anos do ensino
fundamental, sendo 402 estudantes cursando o 1º ano, 391, o 2º ano e, 591, o 3º
ano.
O Quadro 2.1 apresenta as 13 situações referentes às relações quaternárias e
ternárias que avaliaram o desempenho dos estudantes sobre o Campo Conceitual
Multiplicativo nos diferentes anos escolares2. Essas situações abordam apenas
três dos eixos propostos por Magina, Santos e Merlini (2014): Proporção Simples,
Comparação Multiplicativa e Produto de Medida; investigando as classes um para
muitos, muitos para muitos, relação desconhecida, referido desconhecido, Confi-
guração Retangular e Combinatória.
2 Mais informações a respeito do desempenho dos estudantes do 1º ao 9º ano podem ser obtidas em Santa-
na, Lautert e Castro-Filho (2015) e, em Santana, Lautert, Castro-Filho e Santos (2016).
46
Quadro 2.1 – Situações apresentadas no instrumento diagnóstico
Relação S10. Cido tem uma coleção de 6 carrinhos e José tem uma coleção
de 24 carrinhos. Quantas vezes a coleção de Cido é menor do que
desconhecida
a de José?
Comparação
S2. A distância entre a casa de Luís e a escola é de 5 quilômetros e
Multiplicativa a casa de José é 4 vezes mais distante. Qual a distância entre a casa
Referido de José e a escola?
desconhecido
S13. Ontem Tonho tinha 18 figurinhas. E hoje ele tem 3 vezes me-
nos. Quantas figurinhas ele tem hoje?
S5. Rute quer mudar o piso do quarto dela. Este quarto tem 3m de
Ternária largura e 6m de comprimento. Quantos metros quadrados, de piso,
Configuração Rute precisa comprar?
retangular
S7. A área do jardim da casa de Vera é retangular e tem 24m2. A
largura é 4m. Qual é comprimento em metros desse jardim?
Produto de
Medida S11. Na aula de dança de forró tinha 6 rapazes (Alex, Beto, Caio,
Davi, Edu, Ivo) e 4 moças (Mari, Fabi, Lara, Suzi). Todas as moças
dançaram com todos os rapazes. Quantos casais diferentes foram
formados?
Combinatória
S9. A Lanchonete do Ernani vende 15 tipos de sanduíches. Para
cada sanduíche é usado apenas um tipo de pão e um tipo de recheio.
Tem 3 tipos de pão (leite, integral e francês). Quantos tipos de re-
cheio são necessários para fazer todos os tipos de sanduíches?
Fonte: Rede E-Mult (2013/2017).
47
Nota: as situações denominadas S1, S2, S3, S5, S6, S7, S9, S10, S11 e S12 foram apresentadas e discutidas
no Capítulo I, nos respectivos eixos: Proporção Simples, Comparação Multiplicativa e Produto de Medida.
Média
Proporção Simples Comparação Produto de Medida
Ano geral
Multiplicativa Média
um para muitos para Média relação referido Configuração Combinatória
muitos muitos desconhecida desconhecido Retangular
1o ano 4,39 2,32 3,36 4,98 1,99 1,37 1,00 1,95 2,60
2o ano 15,86 4,01 9,93 4,60 3,58 1,53 2,56 2,85 6,12
3 ano
o
27,92 4,34 16,13 4,91 14,38 6,35 2,12 7,23 11,34
Média 17,68 3,66 10,67 4,84 7,73 3,54 1,91 4,46 7,33
Como pode ser observado na Tabela 2.1, no geral, o desempenho dos estudan-
tes foi de 2,6% no 1º ano; 6,12%; no 2º e 11,34%; no 3º. Esses resultados revelam
que os estudantes apresentam uma compreensão intuitiva sobre o Campo Concei-
tual Multiplicativo e que avançam de forma expressiva, à medida que o currículo
escolar orienta que os conceitos multiplicativos sejam explorados em sala de aula.
Nesse sentido, torna-se interessante olhar para as situações em que os estudan-
tes apresentaram melhores desempenhos, nos três primeiros anos do ensino fun-
damental, considerando as relações, os eixos e as classes propostas por Magina,
Santos e Merlini (2014), apresentadas e discutidas no Capítulo I.
48
De modo geral, verificamos que os estudantes apresentaram melhores desem-
penhos nas relações quaternárias (1º ano: 3,36%; 2º ano: 9,93%; 3º ano: 16,13%)
quando comparados com as relações ternárias (1º ano: 1,95%; 2º ano: 2,85% e 3º
ano: 7,23%.) Isso talvez ocorra porque as relações quaternárias estão mais presen-
tes no cotidiano das crianças desse nível escolar.
Os percentuais de acerto nas relações quaternárias revelam que os estudantes
do 1º ao 3º ano apresentam melhores desempenhos nas situações envolvendo a
classe um para muitos (17,68%) quando comparados à classe muitos para muitos
(3,66%). Isso talvez ocorre porque, nas situações um para muitos, em geral, as
relações entre as grandezas são explícitas, em termos da unidade de uma das gran-
dezas, o que facilita a compreensão, já que parte da relação um para muitos, ao
contrário da relação muitos para muitos. Por exemplo, nas situações cotidianas, é
possível dizer que um carro tem quatro rodas e que três carros, terão 12 rodas (a
relação um para quatro está explícita).
Na situação S1 “Joana sabe que, em um pacote, há 6 biscoitos. Ela tem 5 paco-
tes. Quantos biscoitos Joana tem?”, os estudantes podem estabelecer uma relação
entre a quantidade de pacotes e a quantidade de biscoitos, tendo como ponto
de referência a unidade (um pacote de biscoitos) que representa o cardinal um,
considerado o elemento neutro da multiplicação. Fazendo a correspondência do
número de pacotes (no caso, um) com a quantidade de biscoitos, é possível en-
contrar em um pacote (nessa situação, seis). Elas estabelecem a relação um para
seis e, possivelmente, conseguem compreender que, se em um pacote há seis bis-
coitos, em cinco pacotes iguais a ele, a quantidade total de biscoitos será 30 (cinco
vezes a quantidade seis).
As situações muitos para muitos, não partem da unidade como referência, em-
bora em algumas situações o estudante possa encontrar a unidade. Na situação
S3 “Para fazer 3 fantasias são necessários 5m de tecido. Ana tem 35m de tecido.
Quantas fantasias ela pode fazer?”, por exemplo, o estudante, ao estabelecer a re-
lação entre a unidade de fantasias e a quantidade de metros de tecido, poderá ob-
ter um número fracionário (5/3), que se refere a uma quantidade menor que um
49
inteiro (um número decimal) e, posteriormente, operar com o valor encontrado.
Isso aumenta o grau de dificuldade para a resolução desse tipo de situação, pois
envolve um número racional.
Embora os estudantes dos três anos iniciais do ensino fundamental apresentem
um desempenho mais baixo nas relações ternárias, verifica-se que eles demons-
tram melhores desempenhos no eixo da Comparação Multiplicativa (classes refe-
rido desconhecido 7,73% e relação desconhecida: 4,84%) quando comparado ao
eixo de Produto de Medida (classes Configuração Retangular: 3,54% e Combina-
tória: 1,91%), evidenciando que as situações do eixo Produto de Medida são mais
complexas.
Por exemplo, na situação S11 “Na aula de dança de forró, tinha 6 rapazes
(Alex, Beto, Caio, Davi, Edu, Ivo) e 4 moças (Mari, Fabi, Lara, Suzi. Todas as
moças dançaram com todos os rapazes. Quantos casais diferentes foram for-
mados?”, verifica-se que os estudantes precisam estabelecer uma relação entre
dois elementos (rapazes e moças) que vão se compor para formar um terceiro
elemento (casais); existe uma relação entre três quantidades: número de rapazes,
número de moças e número de casais formados; que são obtidos pelo produto
de duas dessas quantidades (número de rapazes vezes número de moças resulta
no número de casais). Segundo Nunes e Bryant (1997), situações como essa se-
riam mais difíceis para crianças nessa idade, pois o esquema de correspondência
um para muitos está implícito, ou seja, a relação de combinação entre rapazes e
moças parece não ser tão evidente para os estudantes dos primeiros três anos do
ensino fundamental que tendem a usar formas de resolução do tipo combinação
por pares fixos (MORO; SOARES, 2006; PESSOA; BORBA, 2009; SPINILLO;
LAUTERT; FERREIRA, 2016).
Considerando que os estudantes resolveram 13 situações, buscamos verificar
em qual situação eles apresentam melhor desempenho nas relações quaternárias
e nas relações ternárias. A Tabela 2.2 apresenta os percentuais de acertos por ano
escolar em cada situação, por relação, por eixo e por classe.
50
Tabela 2.2 – Percentual de acertos em cada situação por ano escolar
Relação Quaternária Relação Ternária
1o ano 6,72 3,23 3,23 0,50 4,98 1,49 4,98 1,74 2,24 1,24 1,49 0,50 1,49 2,60
2 ano
o
26,85 12,79 7,93 0,77 7,93 3,32 4,60 4,60 2,56 0,77 2,30 0,26 4,86 6,12
3o ano 39,09 26,06 18,61 3,38 4,91 4,74 4,91 26,57 2,20 9,48 3,21 1,69 2,54 11,34
Média 26,23 15,68 11,13 1,81 5,78 3,40 4,84* 13,15 2,31 4,62 2,46 0,94 2,89 7,33
51
Dito isso, cabe problematizar sobre as representações e os esquemas que con-
duziram os estudantes a respostas corretas ou incorretas nas situações (S1, S2,
S4 e S8), com vistas a contribuir para o trabalho do professor nos anos iniciais do
ensino fundamental.
52
Passamos agora a observar as representações e os esquemas usados por estudan-
tes quando resolvem as situações com maior percentual de acertos4.
S1. Joana sabe que, em um pacote, há 6 biscoitos. Ela tem 5 pacotes. Quantos
biscoitos Joana tem?
4 Todos os nomes apresentados são fictícios atendendo as normas referentes às questões éticas em pesqui-
sa, bem como foram selecionados exemplos de registros dos estudantes de escolas distintas para discutir
em cada uma das figuras.
53
1º ano: Maria
1ºano: Jorge
54
Na Figura 2.2, apresentamos dois exemplos de estudantes do 3º ano que usam o
esquema de agrupamento utilizando o registro pictográfico e icônico.
S1. Joana sabe que, em um pacote, há 6 biscoitos. Ela tem 5 pacotes. Quantos
biscoitos Joana tem?
3º ano: Fernanda
3º ano: Juliana
55
quantidade de pacotes de biscoitos e a quantidade de biscoitos que deve ter em cada
pacote de acordo com o proposto no enunciado da situação), mas errou na conta-
gem. O fato de ter chegado ao resultado 31 nos leva a supor que Juliana, depois de
ter representado cada uma das parcelas envolvidas, usou a contagem. Isso porque é
pouco provável que chegasse a esse resultado, se realizasse a operação de multipli-
cação ou a soma de parcelas iguais.
Tanto Juliana como Jorge (Figuras 2.2. e 2.1, respectivamente) parecem compre-
ender as relações envolvidas na situação, no entanto, ambos se confundem ao fazer
a contagem. O professor deve auxiliar os estudantes, tanto na contagem como no
uso correto das operações que auxiliem na contagem dos agrupamentos realizados.
No esquema apresentado pelos estudantes, em que foram representados cinco pa-
cotes contendo seis biscoitos, o professor pode, por exemplo, questionar a respeito
de qual operação matemática pode simbolizar o que foi registrado (o agrupamento).
Dialogar com os estudantes sobre a condição de ter cinco vezes o mesmo evento
acontecendo: se em um pacote tem seis biscoitos significa que para o total de cinco
pacotes teremos seis vezes a quantidade de um biscoito (unidade), e isso pode ser
resolvido com a multiplicação de 5 x 6 igual a 30. Ressaltamos que a compreensão
dos agrupamentos com os números naturais de 1 a 10 é importante para que o es-
tudante possa memorizar com mais facilidade essas multiplicações. Isso pode ser
feito através do estudo da tabuada e dos significados a ela atribuídos, que pode ser
potencializado com o uso de diferentes recursos didáticos com desafios, brincadei-
ras, contação de histórias e jogos (recursos para essa faixa etária).
Tomando o esquema proposto por Jorge e Juliana, o professor poderá levantar
questões aos estudantes. Por exemplo, é possível utilizar uma operação matemáti-
ca para representar essa contagem? Dependendo das respostas dos estudantes, ele
pode ser mais diretivo: pode ser que operação? Quais são os termos (números) que
podemos utilizar nas operações mencionadas por vocês? O que cada termo repre-
senta na situação? As discussões em torno da operação a ser enfatizada dependerão
do ano que os estudantes estão cursando. Nessa direção, sugere-se que o professor
faça o registro, no quadro, da operação de multiplicação, mesmo que seja com os
estudantes do 1º e 2º anos.
56
Outra possibilidade é socializar com a turma os registros usados por outros estu-
dantes. Com essa atividade, é possível facilitar a participação de todos e evidenciar
as diferentes formas de pensar e resolver a situação (ver Figura 2.3).
S1. Joana sabe que, em um pacote, há 6 biscoitos. Ela tem 5 pacotes. Quantos
biscoitos Joana tem?
3º ano: Rafaela
3º ano: Davi
57
Outras formas de resolução usadas pelos estudantes podem ser observadas nas
Figuras 2.4 e 2.5, nas quais eles usam a operação de adição para resolver a S1. En-
tretanto, essas formas de resolução apresentam diferenças na forma como os estu-
dantes estão entendendo a situação proposta, como veremos a seguir.
S1. Joana sabe que, em um pacote, há 6 biscoitos. Ela tem 5 pacotes. Quantos
biscoitos Joana tem?
3º ano: Paulo
3º ano: Vitor
Como pode ser observado Paulo, apresenta a resposta correta. Ao fazer a so-
lução, ele repete o número seis (quantidade de biscoitos) cinco vezes (que corres-
ponde à quantidade de pacotes) e usa o sinal da operação da adição. A forma usada
por Paulo, assim como a apresentada por Vitor evidenciam que eles estão compre-
endendo a situação em termos de adições com parcelas repetidas. Essa é uma das
58
formas usadas pelos estudantes quando estão iniciando a compreensão da multipli-
cação, mas que precisa ser ampliada, uma vez que a multiplicação não pode ser vista
apenas como adições de parcelas repetidas, conforme discutido no Capítulo I.
S1. Joana sabe que, em um pacote, há 6 biscoitos. Ela tem 5 pacotes. Quantos
biscoitos Joana tem?
3º ano: Bruna
3º ano: Marta
Observe, agora, o esquema usado por Bruna, que realiza uma operação de adição
obtendo como resultado 11 biscoitos. Em seu esquema, o seis corresponde à quan-
tidade de biscoitos e, o cinco, à quantidade de pacotes, ambos os números presentes
no enunciado da situação. Marta demonstra na sua representação que, inicialmente,
fez o registro do número seis (a quantidade de biscoitos) cinco vezes (quantidade
59
de pacotes), mas, ao invés de realizar adição de parcelas repetidas, ela registra o
número seis em duas parcelas e ensaia uma adição, dando como resultado final 226.
Diferentemente de Paulo e Vitor (Figura 2.4) que trazem uma das ideias básicas
da multiplicação (adições com parcelas repetidas), os estudantes que apresentam
esses esquemas, como os apresentados por Bruna e Marta (Figura 2.5) precisam
de uma maior atenção por parte do professor. Elas usam os números presentes no
enunciado de forma distinta, mas que revelam a sua compreensão sobre a situação
proposta e a sua forma de operacionalização. Ao fazer o registro dos números, Mar-
ta dá indícios de que pode, inicialmente, ter considerado o raciocínio multiplicativo,
entretanto, a forma como registra a operação com o resultado, revela que ela não
compreende o valor posicional dos números, bem como abandonou o esquema
inicial para dar conta da resolução, enquanto que, para Bruna, somar os números
presentes no enunciado estaria dando conta de achar a solução para a situação,
usando talvez uma das operações que ela compreende, uma vez que o resultado ob-
tido encontra-se correto para a operação realizada por ela, diferentemente de Marta
(666+66= 226).
Passamos agora a observar as representações e os esquemas usados por estudan-
tes quando resolvem a situação S4.
60
Figura 2.6 – Resoluções com registros pictográficos e icônicos
S4. A Escola Recanto fará uma festa para 36 convidados. Em cada mesa ficarão 4
convidados. Quantas mesas a escola precisará alugar?
1º ano: Maria
2º ano: Ana
3º ano: Pedro
3º ano: Rute
61
Como podemos observar, os estudantes usam esquemas que envolvem agru-
pamentos, conceito esse trabalhado com os estudantes desde o 1º ano do ensino
fundamental e que, possivelmente, eles já se apropriaram. Pedro usa uma represen-
tação mais detalhada, quando comparado aos outros três estudantes. Ele representa,
de forma pictográfica, o número de convidados (36), o número de mesas (9) e usa
linhas que ligam cada quatro convidados a uma mesa. O esquema usado por Pedro
permite que ele explicite a relação “um para quatro” implícita na situação (quatro
convidados para cada mesa), diferentemente de Maria e Ana que realizam a repre-
sentação pictográfica de uma mesa com quatro cadeiras e procedem à contagem de
quantas mesas serão necessárias. Verificamos, também, que Ana e Rute usam a re-
presentação simbólica, um número para registrar a quantidade de mesas necessárias,
chegando ao número 9, que corresponde à quantidade de mesas solicitadas. Cons-
tata-se, ainda, que Rute parece ter registrado, inicialmente, a quantidade de convi-
dados (cada um representado por um círculo), para depois separar a quantidade de
convidados por mesa (cada traço representado separa a quantidade de convidados
por mesa) e, acima dessa quantidade, insere o número que corresponderá a cada
mesa que irá precisar.
Vejamos, agora, exemplos de esquemas dos estudantes que usam apenas a ope-
ração (representações simbólicas) e que conduzem tanto ao acerto como ao erro.
S4. A Escola Recanto fará uma festa para 36 convidados. Em cada mesa ficarão 4
convidados. Quantas mesas a escola precisará alugar?
62
3º ano: Davi
3º ano: Vanessa
Observamos que Vanessa, assim como Davi5, usam a operação adequada, a divi-
são, e que ela faz o registro da tabuada para encontrar o número que, multiplicado
por 4, resultaria em 36. O registro da tabuada pelos estudantes que estão aproprian-
do-se do Campo Conceitual Multiplicativo, pode contribuir para que eles compre-
endam o agrupamento sem a necessidade de realizar a contagem.
S4. A Escola Recanto fará uma festa para 36 convidados. Em cada mesa ficarão 4
convidados. Quantas mesas a escola precisará alugar?
5 Davi usa a representação simbólica em outras situações (ver Figura 2.3) resolvendo de forma adequada.
63
3º ano: Débora
3º ano: Paulo
6 Paulo usa adições de parcelas repetidas para resolver a situação S1(ver Figura 2.4).
64
Passamos, agora, a observar as representações e os esquemas usados por estu-
dantes quando resolvem a Situação S8.
Tal como nas situações anteriores (S1 e S4), observamos que os estudantes ten-
dem a fazer uso de representações pictográficas e icônicas (desenhos) acompanha-
das ou não de representações simbólicas (números e operações). Por exemplo:
S8. Um supermercado fez uma promoção: “Leve 4 litros de suco por apenas 12
reais.” Quanto vai custar cada litro de suco?
3º ano: Jéssica
3º ano: Beatriz
65
Jéssica e Beatriz utilizam representações pictográficas e icônicas (desenhos), res-
pectivamente, bem como procedem à distribuição do valor total em reais (12), para
obter o valor de uma caixa de suco. A distribuição dos reais para cada litro de suco,
parece-nos mais evidente no esquema usado por Jéssica, quando ela desenha quatro
garrafas e, abaixo de cada uma delas, distribui unidades (risquinhos) de forma equi-
tativa, que podem ser visualizados, tanto na horizontal (três linhas com a quantidade
de quatro risquinhos em cada uma) como na vertical (quatro colunas com a quan-
tidade de três risquinhos abaixo de cada litro). A divisão equitativa entre as partes
é um dos invariantes7 operatórios da divisão que os estudantes precisam dominar
para lidar com a divisão enquanto operação matemática.
Vejamos, agora, a Figura 2.10 que ilustra duas representações icônicas com es-
quemas, também de agrupamento.
S8. Um supermercado fez uma promoção: “Leve 4 litros de suco por apenas 12
reais.” Quanto vai custar cada litro de suco?
3º ano: Vera
3º ano: Bianca
66
Observamos, na Figura 2.10, as duas representações com esquemas de agrupamen-
to realizados por Vera e Bianca que, em um primeiro momento, o professor pode achar
que os estudantes estão pensando da mesma forma, usando a propriedade comutativa
da multiplicação (a ordem dos fatores não altera o produto, 3 x 4 ou 4 x 3 resulta em 12).8
Isso porque ambas as estudantes usam a representação icônica (risquinhos que tan-
to representam caixas como reais) e apresentam como resposta “É três reais os
litros” e “3 reais.”
No entanto, Vera resolve utilizando um raciocínio que evoca a divisão, uma vez
que ela registra 12 risquinhos, em três grupos com quatro risquinhos. Ou seja, ela
divide os 12 reais por quatro litros e chega ao valor de três reais (preço de um litro).
Bianca registra 12 risquinhos e faz um agrupamento com três risquinhos, quatro
vezes. Três reais (preço de um litro) vezes quatro litros resultam em 12 reais (preço
de quatro litros). Se Bianca tivesse pensado em termos da divisão, ela estaria consi-
derando 12 reais divididos por três reais resultando em quatro litros, mas essa não é
sua resposta final para a solução do problema, uma vez que registra como resposta
três reais (resposta correta), o que nos leva a inferir que Vera e Bianca estão consi-
derando o raciocínio multiplicativo, na solução da situação, independentemente da
técnica operatória empregada por elas.
Os esquemas de resolução usados por Vera e Bianca indicam que esses esquemas
e formas de registro precisam ser problematizados, na sala de aula, pelo professor,
de forma complementar e não isolada, conforme discutido no Capítulo I.
Observemos, agora, os esquemas de resolução adotados por estudantes que usa-
ram operações para resolver a situação S8.
8 A comutatividade acontece quando a sequência das operações não afeta o resultado. Por exemplo, tanto
faz vestir a camisa e depois pôr a bermuda como pôr a bermuda e depois vestir a camisa, porque o resultado
é o mesmo: a pessoa estará vestida com a mesma roupa. Mas, escovar os dentes e ir tomar café da manhã
é diferente de ir tomar café da manhã e escovar os dentes, porque, na primeira situação, a pessoa fica com
os dentes sujos após a refeição e, na segunda, não. Na Matemática, a propriedade comutativa é muito usada
quando se fala em operações aritméticas. Na adição e na multiplicação, verifica-se facilmente que 2 + 3 =
3 + 2 = 5 (adição) e que 2 x 3 = 3 x 2 = 6 (multiplicação). Nesse último exemplo, temos que a ordem dos
fatores (2 e 3) não altera o produto (6).
67
Figura 2.11 – Uso de representação simbólica
S8. Um supermercado fez uma promoção: “Leve 4 litros de suco por apenas 12
reais.” Quanto vai custar cada litro de suco?
3º ano: Laura
3º ano: Davi
68
compreender que a situação requer a operação de divisão e ele opera corretamente,
encontrando o número três (o quociente – resultado). Ele não consegue interpretar
o resultado encontrado, visto que dá como resposta “vai custar 12 reais.”
Os esquemas de resolução usados pelos estudantes, que conduzem à resposta
certa ou à incorreta, podem ajudar o professor a identificar e compreender o que ele
precisa discutir de forma individual ou coletiva, na sala de aula. O professor, con-
forme já comentamos, precisa discutir com os estudantes sobre as relações envolvi-
das no enunciado da situação (ver Capítulos I e III), os agrupamentos e as técnicas
usadas para resolver a operação de multiplicação e de divisão.
Passamos, agora, a observar as representações e os esquemas usados por estu-
dantes quando resolvem a situação S2.
69
3º ano: Isabela
3º ano: Davi
Como pode ser observado na Figura 2.12, embora a situação traga a palavra “ve-
zes mais” (dando uma dica de que a situação envolve a multiplicação), Isabela, que
está cursando o 3º ano, usa a adição de parcelas repetidas para resolver a situação,
chegando ao resultado correto, ao invés de fazer o uso da multiplicação. Bruno
ilustra, através do registro pictográfico, buscando compreender a situação como a
distância entre dois pontos (a casa e a escola), entretanto, ele faz o registro do nú-
mero quatro seis vezes (4-4-4-4-4-4), o que nos leva a inferir que ele está fazendo
o uso de uma adição de parcelas repetidas, que não conduz ao resultado esperado.
Essa compreensão da multiplicação partindo da adição de parcelas repetidas é mui-
to presente no raciocínio dos estudantes, nesse nível de escolaridade, o que os leva
a utilizar esse raciocínio independentemente da natureza da situação multiplicativa
proposta.
Para outros estudantes, a expressão “vezes mais” pode estar contribuindo
para que eles utilizem a operação de adição, como ilustrado na Figura 2.13.
70
Figura 2.13 – Resolução através da operação de adição
3º ano: Lívia
Fonte: Rede E-Mult (2013/2017).
Observamos que Lívia não compreende que a situação proposta envolve o ra-
ciocínio multiplicativo, ela arma e efetua usando a operação de adição na vertical.
Nesse sentido, ressaltamos a importância de o professor problematizar sobre o que
a situação propõe e o significado de palavras e expressões presentes no enunciado
que podem ou não estar associadas à problemática da situação a ser resolvida.
Identificamos, também, estudantes do 3º ano que fazem uso de representações
pictográficas acompanhadas da operação correta para resolver a situação, como o
realizado por Rute (Figura 2.14).
71
3º ano: Rute
Como pode ser verificado, Rute9 está buscando compreender a relação multipli-
cativa (quatro vezes mais) através do estabelecimento de relações entre a distância
da casa de José e de Luiz até a escola. Para isso, ela faz o registro pictográfico da
distância da casa de Luís para a escola, bem como a distância da casa de José para
escola, utilizando traços que podem ser pensados enquanto representantes das dis-
tâncias percorridas. Além da representação pictográfica, Rute faz uso da represen-
tação simbólica (a operação) de forma adequada.
Salientamos que, assim como nas situações apresentadas anteriormente (S1, S4 e
S8) identificamos estudantes do 3º ano que usam as operações de adições demons-
trando que eles não conseguem compreender as relações presentes no enunciado,
mesmo tendo iniciado com conceitos do Campo Conceitual Multiplicativo, confor-
me as orientações oficiais para o currículo escolar.
Assim, parece-nos importante que o professor disponibilize momentos para re-
fletir junto aos seus estudantes sobre as diferentes representações (pictográficas,
icônicas e simbólicas), bem como sobre o raciocínio empregado nas relações terná-
rias e quaternárias, que, embora abordem o raciocínio multiplicativo, contêm carac-
terísticas distintas entre si segundo apresentado no Capítulo I.
9 Rute usa representações icônicas para resolver outra situação (ver Figura 2.6).
72
O que podemos levar para a prática na sala de aula com os estudantes?
Ao longo deste capítulo, apresentamos os desempenhos e discutimos so-
bre os esquemas e as formas de registro usadas por estudantes do 1º ao 3º ano do
ensino fundamental. Os desempenhos apresentados por eles revelam que, embo-
ra apresentem baixo percentual de acertos para resolverem as situações do Cam-
po Conceitual Multiplicativo, demonstram, em seus esquemas de resolução, uma
compreensão intuitiva e avançam, de forma expressiva, à medida que o currículo
proposto nas escolas passa a explorar de forma mais sistemática os conceitos mul-
tiplicativos.
Acreditamos que, ao analisar diferentes esquemas de resolução usados por
seus alunos, o professor poderá verificar, na solução apresentada, se eles conseguem
interpretar o enunciado ou se estão usando “expressões verbais” (dicas) para esco-
lher a operação a ser utilizada. Além disso, perceber se eles empregam corretamente
os elementos que relacionam as quantidades presentes no enunciado, bem como se
armam acertadamente e efetuam as operações escolhidas para a resolução. Por fim,
analisar se eles compreendem as trocas e os agrupamentos necessários para resolver
a operação e as regras referentes ao sistema de numeração decimal.
Nesse sentido, chamamos a atenção para a importância de o professor ob-
servar os esquemas de resolução e os registros usados pelos estudantes, quer con-
duzam a respostas corretas ou incorretas. Isso porque ele poderá identificar, na sua
turma, a forma como seus alunos estão compreendendo as situações envolvendo o
Campo Conceitual Multiplicativo e os equívocos que eles comentem na resolução,
com vistas a propor atividades que contribuam para uma ampliação conceitual.
Por exemplo, o uso sistemático de representações pictográficas e icônicas (dese-
nhos) pelos estudantes desses anos escolares para resolver as situações envolvendo
o Campo Conceitual Multiplicativo, mostra que esse é um recurso didático a ser
explorado pelo professor com seus alunos, na sala de aula. Isso porque esse tipo
de representação permite não apenas o estudante fazer registro das quantidades
presentes no enunciado, mas, sobretudo, acompanhar o processo de resolução da
situação.
73
Fazer atividades em sala de aula envolvendo uso de representações pictográficas
ou icônicas não significa deixar de explorar o uso da operação para a resolução das
situações propostas, mas essas podem ser o ponto de partida para apresentação da
operação a ser usada. O entendimento da operação não deve ser o único critério
usado pelo professor para avaliar se os alunos compreendem as relações multiplica-
tivas presentes nas situações propostas no contexto escolar.
Se desejamos que os estudantes dos primeiros anos do ensino fundamental am-
pliem suas concepções sobre o Campo Conceitual Multiplicativo, precisamos pla-
nejar atividades de modo a contemplar diferentes eixos, classes e estimular que
eles usem formas diversificadas de registros (pictográfico, icônico e simbólico) para
representar a situação proposta. O grande desafio no processo de ensino- apren-
dizagem é ampliar as dificuldades para os estudantes, no conjunto de situações
propostas, sabendo o que se está propondo e onde se deseja chegar com o que está
sendo proposto.
Nesse sentido, organizamos, em 2015, um processo formativo com os professo-
res parceiros da Rede E-Mult, para apresentar e discutir sobre a Teoria dos Campos
Conceituais, bem como analisar e elaborar situações envolvendo o Campo Con-
ceitual Multiplicativo. Esse processo formativo possibilitou a troca de experiências
entre os professores, de diferentes anos, e pesquisadores, culminando na organiza-
ção do próximo capítulo que trata sobre as memórias da formação: as atividades
elaboradas pelos professores e as narrativas acerca da experiência vivenciada.
74
REFERÊNCIAS
MAGINA, Sandra Maria Pinto; MERLINI, Vera Lúcia; SANTOS, Aparecido dos. O
raciocínio de estudantes do ensino fundamental na resolução de situações das
estruturas multiplicativas. Ciência e Educação (UNESP. Impresso), v. 20, 2014.
p. 517-533.
MORO, Maria Lúcia Farias; SOARES, Maria Tereza Carneiro. Níveis de raciocí-
nio combinatório e produto cartesiano na escola fundamental. Revista Educa-
ção Matemática Pesquisa, São Paulo, v. 8, n. 1, 2006. p.99-124.
75
PESSOA, Cristiane; BORBA, Rute Elizabete de Sousa. Quem dança com quem:
o desenvolvimento do raciocínio combinatório de crianças de 1ª a 4ª série. Zete-
tike, v.17, jan/jun, 2009. p.105-150.
76
Capítulo III
77
3.1. A Formação Colaborativa E-Mult
No ano 2014, iniciamos o contato com as possíveis escolas parceiras, visando
desenvolver uma formação continuada, no âmbito do Campo Conceitual Multi-
plicativo. Tal formação deveria atender às particularidades das escolas e das cida-
des envolvidas em cada um dos estados, tendo como fio condutor o modelo pro-
posto por Magina (2008), que apresenta o método da ação-reflexão-planejamento-ação.
Nos três estados, a formação colaborativa iniciou-se com uma reflexão sobre
o desempenho dos estudantes no instrumento diagnóstico (ver Capítulo II), se-
guida de discussões sobre a Teoria dos Campos Conceituais (ver Capítulo I), da
elaboração e aplicação de situações do Campo Conceitual Multiplicativo. Essas
atividades tiveram, por objetivo, promover a reflexão com os professores sobre as
diferentes estratégias de ensino e aprendizagem que possibilitam a apropriação e
expansão do Campo Conceitual Multiplicativo, pelos estudantes.
A cada encontro, os professores realizavam discussões teóricas sobre o con-
teúdo matemático (por exemplo, Proporção Simples, Comparação Multiplicativa,
entre outros); elaboravam as situações e, ainda, planejavam as atividades didáticas
sobre como trabalhar o que foi elaborado com sua(s) turma(s), configurando-se,
assim, em ação – reflexão – planejamento (como no modelo de Magina, acima
citado) em grupo, para posterior aplicação em sala de aula.
É importante destacar que, embora a execução da ação tenha ocorrido de
modo individual na escola, onde cada professor aplicou, separadamente, a ativida-
de com a sua turma, as situações e o planejamento da aplicação foram elaborados
no grupo. As atividades eram construídas, inicialmente, em pequenos grupos e,
posteriormente, discutidas no grande grupo, juntamente com o professor-forma-
dor (pesquisador). Quando necessário, as atividades eram revistas e reformuladas
para posterior aplicação com os estudantes, seguidas de discussões sobre ações
didáticas.
No encontro seguinte, a formação iniciava-se com um momento de discussão
sobre a aplicação das situações em sala de aula (por exemplo: como o professor
desenvolveu a atividade com a sua turma? Quais as dificuldades observadas?),
78
seguido de uma discussão sobre os procedimentos utilizados pelos estudantes de
cada turma na resolução da situação (por exemplo: quais foram as formas de re-
gistro utilizadas pelos estudantes? Quais os esquemas de resolução empregados?).
De modo simultâneo e paralelo, eram promovidos momentos de reflexão sobre as
principais dificuldades apresentadas pelos estudantes e as possíveis formas de in-
tervir, abordando os registros e os esquemas usados pelos estudantes para resolver
a situação proposta.
Antes de iniciarmos a apresentação e discussão de situações elaboradas pelos
professores, resgatamos pressupostos básicos presentes na Teoria dos Campos
Conceituais que são relevantes para o ensino e a aprendizagem da Matemática,
pautando-se em discussões que tratavam de aspectos da teoria já abordados e dis-
cutidos nos Capítulos I e II deste livro.
Conforme visto no Capítulo I, Vergnaud (1996, 2003, 2011, 2009) discute que o
conhecimento emerge a partir da resolução de situações sendo ele considerado um
processo cognitivo que está presente nas diversas atividades cotidianas ou nos am-
bientes formais de ensino, iniciando com validade restrita e se desenvolvendo por
um longo período de tempo. Para esse teórico, o que se desenvolve “são as formas
de organização da atividade e essa forma de organização da atividade concerne a
vários registros dessa atividade” (VERGNAUD, 1996, p.11). Ao abordar o conceito
de organização, ele chama a atenção para a noção de esquema, inicialmente proposto
por Piaget e ampliado por ele.
É nas situações cotidianas que as crianças deparam-se com várias ideias mate-
máticas que não são visíveis e que serão, posteriormente, exploradas na forma de
conceitos, no contexto escolar, de forma sistemática. Por exemplo, uma criança de
cinco anos, ao ser solicitada pela mãe para ajudá-la a contar quantas pessoas irão
almoçar em casa e que estão espalhadas na sala e no jardim, poderá proceder da for-
ma que apresentamos a seguir. Ela irá na sala, conta apontando para a quantidade
de pessoas: um, dois, três, quatro, e retorna dizendo para a mãe que tem “quatro”.
Então, a mãe solicita que ela conte quantas pessoas estão no jardim e ela procede da
mesma forma: um, dois, três e informa à mãe que tem “três”. A mãe solicita que ela,
dessa vez, conte quantas pessoas, ao todo, estão na sala e no jardim para o almoço.
79
Essa mesma criança irá à sala e contará: “um”, “dois”, “três”, “quatro” e depois irá
ao jardim e conta “cinco”, “seis”, “sete” e retorna para informar à mãe que tem
“sete”. A mesma criança, dois anos mais tarde, não irá recontar o todo novamente.
Ela dirá para mãe que, se na sala têm “quatro” e no jardim têm “três”, então, 4+3
são 7. Por que ela faz isso? Porque essa criança apropriou-se da noção de cardinal,
como sendo o representante de um conjunto, ou seja, o quatro representa a quan-
tidade total de pessoas que estão na sala e o três a quantidade total de pessoas que
estão no jardim. Essa nova organização permitirá a essa criança responder à mãe
sem precisar realizar a contagem de cada uma das pessoas novamente.
O exemplo, acima descrito, proposto por Vergnaud (1996), ilustra duas ideias
matemáticas extremamente importantes que não são visíveis quando as crianças
estão realizando a atividade: a correspondência biunívoca e o conceito de cardinal.
Portanto, o esquema envolve uma organização invariante da conduta para uma classe
de situações, que vão desde o gesto até uma explicitação simbólica compartilhável
– a qual Vergnaud denomima conceitos.
Esse teórico afirma, também, que uma única situação, em geral, exige a consi-
deração de vários conceitos e que, para o estudante compreender um conceito, ele
precisará interagir com uma diversidade de situações. Nos dois capítulos anteriores,
discutimos diversas situações que devem ser apresentadas pelo professor aos estu-
dantes para que eles possam compreender a multiplicação e a divisão. Aqui, neste
capítulo, buscamos discutir sobre o fato de uma situação exigir a consideração de
vários conceitos. Vejamos o exemplo de uma situação elaborada pelos professores
durante a formação do Projeto E-Mult:
Andrea foi à feira e comprou quatro abacaxis a cinco reais a unidade. Quanto An-
drea gastou?
Ao perguntarmos a um professor que ensina Matemática, nos anos iniciais do
ensino fundamental, quais conceitos estão presentes nessa situação, ele, muito pro-
vavelmente, enfatizará o conceito da multiplicação que está mais evidente na proble-
matização: multiplicando a quantidade de abacaxis pela quantidade de reais pagos
para cada abacaxi, obteremos o valor gasto por Andréa. É bem provável, também,
80
que ele faça referência ao conceito do campo aditivo, considerando a adição de
parcelas repetidas como abordagem inicial da multiplicação (o valor pago em reais,
nesse caso, cinco, poderá ser somado considerando-se a quantidade de abacaxis
comprados, no caso, quatro). No entanto, é preciso atentar para outros conceitos
que estão inseridos nessa atividade e que se fazem presentes para a compreensão da
situação na perspectiva da Teoria dos Campos Conceituais. Por exemplo, o conceito
de cardinal (o número quatro representa a quantidade total de abacaxis comprados
e, o número cinco, a quantidade total de reais a ser paga por cada abacaxi); o con-
ceito de proporção (existe uma relação entre a quantidade de abacaxi e a quantidade
em reais a ser paga: se a quantidade de abacaxi aumentar, aumenta a quantidade de
reais a ser paga), como também os conceitos de medida, de grandezas, entre outros.
Tais reflexões apresentadas chamam a atenção para o fato de que “não é em alguns
dias ou em algumas semanas que a criança adquire uma competência nova ou compre-
ende um conceito novo, mas sim ao longo de vários anos de escola e de experiência”
(VERGNAUD, 2011, p.16). Para que isso aconteça, é necessário que ela interaja com
uma diversidade de situações e que o professor reconheça que uma situação, por mais
simples que seja, envolve vários conceitos e que um conceito por mais simples que seja,
está inserido em várias situações, como ilustrado ao longo dessa coleção sempre que
apresentamos a abordagem dos campos conceituais. Por essa razão, fala-se que a for-
mação de um conceito é gradual e progressiva, uma vez que está frequentemente sendo
reconstruída a cada nova situação problematizada. O grau de dificuldade de uma situação
será determinado pela sua estrutura e não pela aplicação de uma ou outra operação, ou
algoritmo da Matemática.
O que temos discutido até este momento – e que foi abordado e discutido com todos
os professores no processo formativo – leva-nos a refletir sobre a importância de os pro-
fessores (que ensinam Matemática e atuam nos anos iniciais do ensino fundamental) terem
conhecimento acerca dos diferentes tipos de situações que compõem o Campo Conceitual
Multiplicativo, uma vez que eles podem empregar a mesma operação em sua resolução,
mas apresentarem níveis de dificuldade distintos. Nesse sentido, o professor deve se ques-
tionar: qual seria o obstáculo, se as situações apresentadas em sala de aula são sempre as mesmas?
Será que estaríamos contribuindo para uma ampliação conceitual dos estudantes quando apresentamos
81
situações semelhantes? Defendemos que não. Por isso, retomamos, aqui, o Campo Conceitual
Multiplicativo, apresentando situações que foram elaboradas pelos professores durante o
processo formativo, para que eles possam trabalhar com seus alunos diversas situações, em
que emerjam vários conceitos e que apresentem, também, diferentes níveis de dificuldade.
82
3.2.1.1. Proporção Simples: um para muitos
Observamos que essa situação parte da unidade de uma das grandezas (um sa-
quinho), caracterizando-se, assim, como pertencente à classe um para muitos. Ela
é prototípica quando se ensina a multiplicação na escola; ou seja, comumente os
professores partem desse tipo de situação quando abordam o conceito de multipli-
cação. Diante disso, entendemos que a operação mais indicada para a sua resolução
é a multiplicação, conforme apresentamos na Figura 3.1. Muitas crianças, nessa fase
escolar, trabalham as ideias multiplicativas a partir da adição de parcelas repetidas
ou da contagem de agrupamentos. Mesmo diante dessa constatação, encorajamos
o seu trabalho com o conceito multiplicativo, explorando os conceitos da situação,
conforme o esquema proposto, para o seu aprofundamento no entendimento das
relações presentes nessa situação.
83
Essa situação, assim como outras quaternárias de proporção simples, pode ser
resolvida partindo das ideias discutidas no Capítulo I. Iniciamos nossa discussão
utilizando o operador escalar (observe as setas) que, nesse caso, é cinco, conforme
a Figura 3.1 acima. Analisando especificamente a grandeza “quantidade de saqui-
nhos”, notamos que ela aumentou de um para cinco, ou seja, multiplicamos a unida-
de pelo operador escalar (5). Para manter a proporcionalidade, aplicamos o mesmo
operador escalar (5) na grandeza “quantidade de figurinhas”, multiplicando esse
operador escalar pela quantidade de figurinhas de um saquinho (que também é 5) e
obtendo, assim, o valor total de figurinhas – que é 25. A ideia, nesse caso, é sempre
manter a proporcionalidade: se em uma grandeza, as quantidades são alteradas pela
multiplicação de um operador escalar, esse mesmo operador deve ser utilizado para
alterar a quantidade da outra grandeza.
C o
84
Sobre os erros encontrados, os professores do 1º ano indicaram que fo-
ram realizadas contagens e distribuições aleatórias, representações pic-
tóricas erradas, dificuldades na interpretação da situação (lê, mas não
compreende) e tentaram realizar uma operação aritmética, mas, de forma
incompleta. Os professores do 3º ano indicaram o equívoco na operação
aritmética, uma vez que os estudantes empregaram procedimentos adi-
tivos, mesmo evidenciando uma adição de parcelas repetidas (em alguns
casos), o que demonstra o início de um pensamento multiplicativo.
Utilizando a metodologia da formação, os professores discutiram coleti-
vamente a situação, os erros dos estudantes e planejaram uma nova ação
para trabalhar os erros encontrados. Os professores do 1º ano realizaram
uma nova aplicação da situação, de forma coletiva (em grupos), obser-
vando os diálogos e os procedimentos dos estudantes nessa nova apli-
cação. Nesse processo, a todo momento, eles assessoravam os grupos
questionando as possibilidades de respostas e estratégias de resolução
levantadas pelos estudantes. Os professores do 3º ano optaram por re-
solver a situação, na lousa, evidenciando os procedimentos operatórios e
trabalhando outros exemplos semelhantes.
Os professores classificaram essa atividade como ótima, porque levou os
estudantes ao raciocínio lógico. Os professores do 1º ano destacaram que
não haviam trabalhado anteriormente com esse tipo de situação, em sala
de aula, já que os conceitos multiplicativos não fazem parte do currículo
escolar.
85
O Exemplo 2 também envolve uma relação quaternária, do eixo Proporção Sim-
ples e classe um para muitos; nessa direção, a proposta de resolução também em-
prega o operador escalar.
86
Mesmo com apenas um estudante errando a resposta, o professor chama
a atenção para o fato de, no 3º ano, apenas 50% dos estudantes consegui-
rem realizar a operação corretamente. A outra metade acertou utilizando
a estratégia da representação pictográfica, evidenciando que esse ainda é
um recurso recorrente quando os estudantes não dominam a operação
de divisão para resolver a situação proposta e chegar ao resultado correto.
O professor destaca que o erro encontrado refere-se ao procedimento
de resolução da operação (algoritmo da divisão). Para sanar a dificuldade
desse e de outros estudantes, o professor realizou a explanação da situa-
ção, no quadro, explicando os procedimentos operatórios da divisão.
Na discussão coletiva, no momento de reflexão durante a formação, o
professor classificou a atividade como boa, pois, apesar da dificuldade da
turma com a operação de divisão, eles conseguiram solucionar e tiveram
um bom resultado.
Exemplo 3. João tem um pote em que cabem 10 bolas de gude, mas ele
tem 20 bolas de gude. Quantos potes ele precisa ter para colocá-las?
87
Figura 3.3. Proposta de resolução do Exemplo 3 com o operador escalar.
88
Os professores relataram que os estudantes utilizaram representações
pictóricas, além do registo apenas do resultado final de forma numérica
(utilização de algarismos), nas suas resoluções.
Com relação aos erros encontrados, eles destacaram a confusão con-
ceitual entre a quota (número de potes) e a parte (número de bolas de
gude); e, também, o uso de números aleatórios com quantidades que não
correspondiam aos dados presentes na situação.
Buscando trabalhar os erros e, ao mesmo tempo, introduzir o conceito
de divisão, os professores utilizaram os esquemas proporcionais das re-
lações quaternárias na resolução e explanação da situação para os estu-
dantes e, à medida que a resolução era apresentada, os professores foram
questionando as crianças acerca dos processos de resolução, os números
presentes na situação e os significados presentes nesse processo.
Os professores classificaram essa situação como ótima, porque ela con-
duziu os estudantes ao raciocínio lógico, resolvendo questões que, cos-
tumeiramente, não são trabalhadas em sala de aula nesse nível escolar, já
que evocam, explicitamente, os conceitos multiplicativos (nesse caso, o
da divisão).
89
Figura 3.4. Proposta de resolução do Exemplo 4 com o operador escalar
90
Com relação aos erros encontrados, ela destaca o uso dos pares numéri-
cos com procedimentos aditivos, uso de números aleatórios, na tentativa
de solução, e dos desenhos que não conduzem ao resultado.
Esses erros foram trabalhados coletivamente, convidando cada estudan-
te a vir resolver a situação, no quadro, e explicar para os colegas o seu
raciocínio. À medida que isso acontecia, a professora trabalhava o enten-
dimento da resolução da situação, apresentando procedimentos referen-
tes ao pensamento multiplicativo existente na situação.
A professora relata que teve uma experiência bastante positiva em repla-
nejar a aplicação da situação e que, não necessariamente, precisou tra-
balhar as operações de multiplicação e divisão com os estudantes (algo-
ritmo). Ela focou no uso de contagens, bem como na compreensão das
relações estabelecidas na situação, conduzindo os estudantes ao pensa-
mento multiplicativo presente na situação. O estímulo ao trabalho coleti-
vo foi o ponto forte destacado pela professora e, também, a socialização
das representações dos estudantes para a compreensão do resultado final.
91
3.2.2.1 Referido
Exemplo 5. Iago tem 5 anos e seu irmão tem 3 vezes mais que a idade
dele. Qual a idade de seu irmão?
Esse diagrama ilustra matematicamente que, se o irmão de Iago tem três vezes a
idade do Iago, para determinar a idade desse irmão, é preciso multiplicar a idade de
Iago pela relação entre essas idades (no caso, três). Aplicando a operação aritmética,
temos: 5×3 = 15.
Destacamos, assim, que o uso das denominações dos elementos (referido, refe-
rente e relação) não necessariamente precisa ser ensinado aos estudantes do 1º ao
3º ano. Como este texto é um recurso para ampliar o entendimento e, consequente-
mente, o trabalho em sala de aula, achamos pertinente destacar essa terminologia. A
nossa intenção, na construção desse diagrama, é facilitar a interpretação na situação
(cálculo relacional). Esse diagrama também pode ser útil para evidenciar aos estu-
dantes a compreensão das relações da situação sem, necessariamente, referir-se aos
termos em destaque (referido, referente e relação).
92
Comentários feitos pelos professores que aplicaram o Exemplo 5 em
sala de aula:
Essa situação foi aplicada com 17 estudantes do 1º ano e desses, 13 con-
seguiram solucioná-la.
Para a solução, os estudantes empregaram representações gráficas, con-
tagens com os dedos e fizeram uso de operações aritméticas, como, por
exemplo, a adição.
Os erros encontrados pelo professor foram referentes ao uso da opera-
ção de adição entre os pares numéricos presentes na situação.
Para trabalhar a questão dos erros, o professor realizou questionamentos
aos estudantes, durante a reaplicação da situação em aula, explicitando
os procedimentos de cada etapa e conduzindo-os a um raciocínio lógico
referente ao conceito envolvido (raciocínio multiplicativo).
Os professores, na discussão sobre a situação elaborada e sobre os pro-
cedimentos de reaplicação da situação, classificaram as atividades desen-
volvidas, na aplicação e reaplicação da situação, como ótimas, uma vez
que, no processo de ensino e aprendizagem, ela promoveu a interação
entre os estudantes e houve debates sobre as hipóteses de cada um deles
acerca da resolução e do resultado obtido.
3.2.2.2 Relação
93
O Exemplo 6 envolve, também, uma relação ternária do eixo Comparação Mul-
tiplicativa. Nesse caso, temos o referente (quantidade de mangas), o referido (quan-
tidade de laranjas) e é solicitada a relação entre as quantidades de manga e laranjas
(quantas vezes mais), conforme podemos observar na Figura 3.6, apresentada a
seguir.
Figura 3.6. Diagrama para compreender a situação
comparativa com relação desconhecida
94
Comentários feitos pelos professores que aplicaram o Exemplo 6 em
sala de aula:
No total, 36 estudantes do 3º ano, de turmas diferentes, resolveram a
situação e 11 deles conseguiram solucioná-la corretamente.
Os esquemas observados pelos professores, na resolução dos estudantes,
foram contagens, representações pictóricas, explicações orais com regis-
tro numérico do resultado e uso de operações aritméticas.
Os erros mais encontrados, nesse caso, foram a contagem errada da
quantidade e o uso equivocado da operação (emprego da adição com os
pares numéricos ou o resultado errado no cálculo multiplicativo).
Para trabalhar os erros, os professores expuseram a resolução da situação,
no quadro, construindo um diagrama das relações, detalhando o que era
pedido, na situação, e solicitando aos estudantes que explicassem como
era possível chegar ao resultado. À medida que os questionamentos sur-
giam, eram exemplificadas situações semelhantes, que faziam referência
aos questionamentos realizados, e os professores solicitavam que os es-
tudantes pensassem, nesse exemplo, como relação à situação proposta.
95
Figura 3.7. Diagrama para compreender a situação
comparativa relação explícita desconhecida
96
Os erros encontrados explicitam que os estudantes fizeram a contagem
errada ou utilizaram a operação errada (adição ou subtração ao invés da
divisão). A dificuldade, nesse caso, parece residir na compreensão do
termo “menor que”.
Para trabalhar os erros, os professores apresentaram a resolução da situa-
ção e discutiram as respostas de forma coletiva com os estudantes, com
representação de figuras para o referente e o referido para explicitar o
raciocínio multiplicativo presente na situação e que expressa uma divisão
equitativa.
97
O Exemplo 8 aborda uma relação ternária, em que são apresentados dois
conjuntos disjuntos2: o conjunto das figuras geométricas (triângulo, círculo e qua-
drado, totalizando três figuras) e o conjunto das cores (azul, amarelo, vermelho e
verde, totalizando quatro cores). Busca-se encontrar um terceiro conjunto que é
o da combinação entre as figuras e as cores apresentadas na situação, o conjunto
das figuras coloridas. A operação mais indicada para resolução, nesse caso, é a de
multiplicação dos conjuntos disjuntos (figuras geométricas e cores), ou seja, 3×4 =
12 conjuntos da combinação de figuras geométricas com cores (figuras coloridas).
Situações da classe Combinatória, que envolvem quantidades pequenas, podem
ser resolvidas, facilmente, com o uso de listas ou do diagrama de árvore, conforme
apresentado na Figura 3.8, a seguir.
2 Dois conjuntos são classificados como disjuntos quando eles não têm nenhum elemento em com
98
A utilização do diagrama de árvore, segundo o apresentado acima, ou da tabela
de dupla entrada é bem pertinente para a solução de situações de combinatória com
estudantes do 1º ao 3º ano e faz-se importante para a interpretação da situação.
Contudo, também é essencial evidenciar/introduzir o cálculo aritmético envolvido,
a operação de multiplicação, principalmente para o professor do 3º ano, em que a
multiplicação encontra-se presente no currículo escolar.
Exemplo 9. Luiza tem 12 bolos diferentes e 3 tipos de cobertura (cho-
colate, morango e baunilha). Em cada bolo, ela usa um tipo de recheio e
uma cobertura diferente. Quantos recheios diferentes Luiza utilizou para
montar os seus 12 bolos?
99
O Exemplo 9 envolve uma relação ternária, do eixo Produto de Medidas, da clas-
se Combinatória, sendo dados dois conjuntos: o conjunto de bolos (combinação
entre recheios e coberturas) e o conjunto de coberturas (três tipos de cobertura:
chocolate, morango e baunilha). É solicitado encontrar o conjunto dos recheios. A
operação mais indicada para a resolução, nesse caso, é a de divisão do conjunto de
bolos (12 bolos com recheio e cobertura) pelo conjunto de coberturas (três tipos
diferentes):12 ÷ 3 = 4 recheios diferentes, formando, assim, o conjunto dos bolos
com recheio e cobertura.
Para esse tipo de situação envolvendo quantidades pequenas, o uso da ideia da
tabela de dupla entrada ou da árvore de possibilidades, apresentada no Exemplo 8,
auxilia na interpretação da situação. A Figura 3.9 apresenta a ideia da tabela de dupla
entrada para o Exemplo 9.
S
12 bolos
Nesse caso, a tabela de dupla entrada, como recurso auxiliar, deve ser construí-
da até atingir as 12 possibilidades propostas pela situação (12 bolos com recheio e
coberturas diferentes). Porém, ressaltamos que esse esquema restringe-se a situa-
ções com quantidades pequenas, porque fica fácil listar todas as possibilidades de
100
combinação dos conjuntos disjuntos (conjunto dos recheios e das coberturas). Sen-
do esse o ponto inicial para a compreensão da resolução da situação, destacamos
que também é importante trabalhar com o uso de operações do Campo Conceitual
Multiplicativo (operações de divisão ou multiplicação), principalmente para os estu-
dantes do 3º ano. Isso porque, de acordo com o currículo escolar, como visto antes,
eles são introduzidos ao Campo Conceitual Multiplicativo e é preciso dar um salto
qualitativo nas resoluções, não se limitando ao uso das ideias do diagrama de árvore
ou da tabela de dupla entrada.
101
gressivamente, um elemento ao conjunto originário, verificando as combinações
possíveis de serem construídas na situação. Essas estratégias estão relacionadas à
estrutura aditiva, fazendo uso de contagem e, por serem limitadas do ponto de vista
da quantidade de elementos de cada conjunto, perdem a eficiência, quando o obje-
tivo é o pensamento multiplicativo.
3. 2.4. As situações de Configuração Retangular
As situações presentes na classe Configuração Retangular também são ternárias e
tratam das medidas referentes às formas retangulares, tanto na horizontal como na
vertical, conforme ilustrado no Capítulo I. Vejamos alguns exemplos de situações
elaboradas com essa classe e que podem ser trabalhadas com os estudantes do 1º
ao 3º ano.
102
Figura 3.10. – Ideia presente na resolução do Exemplo 10
103
A situação envolve uma relação ternária, do eixo Produto de Medida, da classe
Configuração Retangular, sendo dada a área (todo), a largura (uma das partes) e
busca-se encontrar a medida do comprimento (a outra parte). É possível resolver
a situação por meio de uma operação de divisão, da seguinte maneira, C/A=B, em
que C é a área, A representa a largura e B o comprimento. Ou seja, 2÷2 = 1.
Exemplo 11: Um campo tem 2 metros de largura e sua área mede 2 me-
tros quadrados. Qual é o comprimento desse campo?
Comprimento = Área/Largura
Comprimento = 2m²/2m
Comprimento = 1m
104
Para trabalhar os erros dos estudantes, duas das professoras fizeram
intervenções orais sobre os conceitos explorados no problema e alguns
alunos resolveram a situação no quadro. Eles também utilizaram a ma-
lha quadriculada para explicar as dimensões da área. Outra professora
chamou os alunos que haviam acertado para responderem, no quadro,
e explicarem para os outros como haviam resolvido.
Uma professora classificou essa atividade como razoável, pois seus
alunos não atingiram 50% de acertos. As outras duas consideraram
ruim, devido ao seu grau de dificuldade, e os alunos não fizeram por-
que não sabiam
A reflexão dos professores sobre a análise dos erros dos estudantes, em suas
tentativas de resolução, evidencia que essa atividade não deve ser pautada apenas
na reprodução da resposta correta do quadro, a qual deverá ser copiada pelo es-
tudante que tenha cometido um erro. Eles compreenderam, a partir do processo
formativo, a necessidade de problematizar com os estudantes sobre a situação e as
possibilidades de resolvê-la, discutindo sobre os erros e as estratégias utilizadas por
eles para resolver uma determinada situação, buscando a reestruturação do pen-
samento e, consequentemente, a aprendizagem matemática. Isso evidencia para o
professor a necessidade de repensar sobre os tipos de situações a serem desenvol-
vidas e trabalhadas com os estudantes e as metodologias a serem utilizadas, a fim
de contribuírem com o desenvolvimento do conhecimento no Campo Conceitual
Multiplicativo.
Diante dos exemplos de situações elaboradas pelos professores e das estratégias
didáticas empregadas nos momentos de replanejamento da ação, após reflexão cole-
tiva sobre o desempenho dos estudantes, na resolução dessas situações, fica evidente
a necessidade de o professor refletir junto com seus estudantes sobre as diferentes
formas de registros e os esquemas. Dessa forma, eles poderão ser mobilizados na
busca da resolução para as situações envolvendo o Campo Conceitual Multiplicati-
vo, independentemente se ela evoca uma resolução por multiplicação, por divisão
105
ou a combinação de ambas as operações. O fato de o estudante encontrar a resposta
correta para a solução não significa que ele está usando um raciocínio multiplicativo.
Por isso, convidá-lo para explicitar as bases de seu raciocínio, tornando-as passíveis
de serem compartilhadas e discutidas, comparadas com os outros, quer seja em
pequenos grupos ou no grande grupo (no quadro), poderá possibilitar a tomada
de consciência dos processos que ele adota e da origem das suas formas de pensar.
No próximo tópico, vamos discutir as narrativas acerca da experiência do pro-
fessor e o processo formativo; a ideia é compreender como elas se entrelaçam, de
forma a elucidar sobre a aquisição do conhecimento por parte dos estudantes e dos
professores, na experiência vivenciada durante o E-Mult.
106
Dessa forma, foram selecionadas duas entrevistas de cada ano escolar, de forma
aleatória, realizadas com as professoras de cada um dos três estados participantes
da Rede E-Mult, contemplando narrativas dos três primeiros anos do ensino funda-
mental, totalizando seis participantes.
107
Portanto, Maria acredita que a Formação Continuada do E-Mult trouxe um
enorme diferencial para a sua prática. Aprendeu que não adianta o professor pen-
sar que os conhecimentos vêm prontos, que o que parece ser errado para um, está
certo, de acordo com o pensamento que a criança traz. Ou seja, que possibilitar a
esse estudante apresentar seu modo de pensar, sua estratégia de resolução, é mui-
to importante para a sua aprendizagem: quando os meus alunos resolviam um problema,
e, aparentemente, era errado, eu perguntava como eles haviam pensado, como eles tinham estru-
turado o pensamento para chegar naquela resposta e, aí, eu entendia que estava realmente certa.
A principal contribuição foi essa, de a gente compreender mais o pensamento do nosso aluno e
parar para ouvir, pois, mais importante que a resposta é o processo, como ele pensa!
A formação, assim, foi o ‘divisor de águas’ para Maria em sua trajetória. Na
sua prática, partiu para a reestruturação do seu planejamento de aula e vem im-
plantando uma nova dinâmica dentro de sala de aula. Refletir sobre o conceito
aprendido por ela acerca da multiplicação era bem simplista – a multiplicação é a
soma de parcelas iguais – com as atividades propostas para as diferentes estrutu-
ras multiplicativas, ampliou seu aprendizado e deseja também proporcionar aos
seus alunos uma aprendizagem mais abrangente: estruturar o meu planejamento dá
mais espaço, porque a Matemática é uma coisa gostosa, não precisa ser só aquele conteúdo que
a gente tem nos livros; a gente pode ir muito além, fazer com que as crianças participem muito
mais, pois, quando elas têm oportunidade de falar, de dizer o que estão pensando, elas ficam
mais seguras, com mais interesse em participar; elas perdem aquele medo de errar. Então, vão
estruturando, cada vez mais, o pensamento e apresentando coisas maravilhosas.
Assim, a formação propôs a Maria outras possibilidades de compreensão des-
se componente curricular, permitindo-lhe compreender os tipos de pensamento
multiplicativo, o que fomentou espaço para trabalhar essas estruturas com seus
estudantes, de forma bastante tranquila, independentemente da idade ou ano es-
colar.
Branca, licenciada em Letras após cursar o Magistério e o ensino médio, espe-
cialista em Arte Educação, atua há 18 anos como professora do 1º ano do ensino
fundamental.
108
Defende que a importância do Campo Conceitual Multiplicativo como com-
ponente curricular está relacionada ao fato da sua compreensão atual no contexto
do dia a dia. Relembra que, quando estudante, era bem mais difícil. A percepção
que tinha da Matemática era de muitos mitos. E que nunca tinha tido nenhuma
formação que trabalhasse desmitificando isso, como, por exemplo, no caso de a
multiplicação ser mais difícil e complexa porque primeiro vinha a adição para che-
gar à multiplicação...agora, com a formação, percebe que esse não é o caminho. A
partir do momento que o estudante interpreta, ele compreende, seja com núme-
ros ou desenhos. A questão principal para Branca reside no fato de que a Matemá-
tica torna-se difícil pela compreensão indevida de que se deve ensinar e aprender
tudo no formato linear: primeiro as continhas – pois envolve já os números; e só
depois aplicar nas situações. Então, não se valoriza a contextualização, ou seja,
colocar o significado nas contas que nada mais é do que mostrar que a Matemática
está na vida.
Branca conta que a formação desfez esse mito da Matemática para ela: não há
trabalho linear, não há idade definida para aprender isto ou aquilo... A construção
do conhecimento matemático ocorre por meio das diferentes representações, o que
traz significado e que, muito disso, ela aprendeu na Formação, o que a desperta para
a mudança na sua prática docente, sendo mais crítica e entendendo que a prática
pode ser transformada, que a escolha de uma situação ser vivenciada, na sala de aula
e até a do livro didático, pode ser realizada de forma mais criteriosa. Ainda deixa o
recado de que seu desejo era que essa Formação pudesse atingir um número bem
maior de professores participantes.
Da interlocução das narrativas das professoras do 1º ano, acima apresentadas, é
perceptível o impacto que essa formação continuada colaborativa do E-Mult trouxe
para a prática docente delas. Desmistificar a Matemática da escola como um conhe-
cimento linear, desprovido de contextos e significados, em que se aprende apenas
procedimentos, certamente, foi a maior contribuição. Aprender como fazer a Ma-
temática que cada um realiza no seu dia a dia. Ainda mais, estender isso a outras
situações, produzindo, então, uma mudança substancial no seu planejamento diário
das aulas, assim como em sua ação docente no ensino da Matemática.
109
3.3.2. 2o ano – Aurora e Tiana: a interface entre conhecimentos
prévios e histórias de vida
Aurora é professora do 2º ano do ensino fundamental. Ela é pedagoga, especia-
lista em Psicopedagogia e atua em sala de aula há 28 anos. Afirma que a importância
do Campo Conceitual Multiplicativo está elencado no currículo e relaciona-se ao
fato de que há vivências com multiplicação desde sempre, mesmo que os estudantes
não compreendam ou não relacionem isso: se a gente observar a vida de hoje, é tanta mul-
tiplicação como a divisão. Então, constantemente, eles estão multiplicando o tanto que vão gastar
de tempo, o tanto que vão gastar em casa, o tanto que vão precisar para alguma coisa e dividindo
esses valores também para se organizarem.
Os alunos de Aurora, segundo ela, aprendem de uma maneira mais informal,
através de brincadeiras, ou seja, quando há um contexto na situação, há facilidade
para resolver a ‘Matemática’, diferentemente de quando isso é transformado em
atividade. Para ela, as dificuldades apresentadas para aprender o Campo Conceitual
Multiplicativo estão sedimentadas já no discurso familiar – A gente já cresce escutando
que a multiplicação é a coisa mais difícil, que o menino é capaz de aprender a somar e subtrair,
mas, multiplicar, não. Então, os pais em casa, usam isso, porque, multiplicar, eles nunca apren-
diam. Um fato relevante aconteceu na vida de Aurora, provocado por uma professo-
ra em relação à multiplicação e que ela traz até hoje como um ‘trauma’, uma ‘barrei-
ra’ em seu dia a dia: havia sabatinas diárias com a tabuada e não se permitia nem a
professora repetir a pergunta nem a aluna Aurora colocar a mão para trás (estratégia
para facilitar a contagem nos dedos). O resultado é que, até os dias atuais, qualquer
pergunta que se faça a ela de forma ‘súbita’, sobre qualquer assunto, ela trava e não
consegue responder de imediato e ela sabe que essa foi uma consequência da prática
da sua professora.
Aurora relata que a Formação trouxe uma contribuição imensa a sua vida, pois
mudou o ‘seu olhar’ sobre a multiplicação, desfez o que a traumatizou: não é mais
sabatina, é possível compreender de uma forma divertida e por vários caminhos;
que não tem problema usar os dedos para contar, é possível somar o mesmo núme-
ro várias vezes e chegar ao resultado e afirma: e quando eu perder esse medo, eu vou acabar
chegando num caminho mais curto sem sentir dor nenhuma no caminho.
110
Já as informações novas trazidas, na Formação, já estão incrementando seu
trabalho na sala de aula, como, certamente, o “saber de fato” que ‘a multiplicação
não é apenas adição de parcelas repetidas’: aspectos que podia até conhecer, mas
que não eram sedimentados em sua prática na sala de aula. Tanto que a ideia dos
termos da multiplicação, embora conhecida, não tinha sentido em sua ação docente
porque não utilizava no ensino: o referente, o referido e a relação. Assim, tem feito grande
diferença na hora que eu fui programar essa última atividade que planejei para os meninos. Eu
percebi que, eu tendo consciência desses três termos, ficou bem mais fácil de elaborar o problema,
do problema se tornar mais fácil ou mais difícil.
Tiana é professora do 2º ano do ensino fundamental em uma escola da rede pú-
blica municipal. Atua há 16 anos em sala de aula – já que havia realizado o magisté-
rio – mas se formou em Pedagogia há apenas três anos.
No ano passado, atuou, também, com turma do 1º ano. Considera, então, impor-
tante o trabalho com o Campo Conceitual Multiplicativo, desde o início, pois pro-
voca uma adaptação à Matemática com maior facilidade e compreensão. Relata que
tudo que é novidade para os estudantes, que causa uma vontade de aprender e se
isso acontece desde o 1º ano, ao chegar no 2º ano, eles já apresentam um certo do-
mínio e seguem com mais firmeza: ano passado mesmo, eu trabalhei com a turma do 1º ano
e eles deram um show, principalmente na feira de Matemática. Eu pensei em trabalhar o Campo
Aditivo, por serem alunos do 1º ano, mas eu vi que eles foram mais além, eles conseguiram. Tinha
aluno que já sabia. É, eu trabalhei com os números de um a 50 e, na Feira de Matemática, ele
contou de um a 100. Ele [o aluno] foi mais além do que eu já tinha ensinado. Então, eles mostra-
ram para as pessoas que vieram assistir à apresentação deles, que eles podiam e iam mais além”.
Tiana acredita que a maior dificuldade de seu alunado com relação à Matemática
é a falta de acompanhamento da família nos estudos e quem termina ajudando é
apenas o professor. Se houvesse um estímulo e atenção da família, o ciclo de apren-
dizagem – estudante, professor, família – completava-se.
Quanto à passagem entre as quatro operações, apesar de considerar uma tarefa
difícil, ela afirma que, como vem sempre trabalhando da adição para a multipli-
cação, os seus alunos têm mais facilidade para compreender a questão da tabuada
111
– multiplicação como adição de parcelas repetidas – exemplificada, inicialmente,
com material concreto simples e, depois, passando para a escrita convencional da
Matemática.
A Formação trouxe novas experiências para Tiana que já fazia parte de um
grupo de formação. As atividades, inicialmente, pareciam difíceis e ela imaginava
como poderia trabalhá-las com seus alunos, nos anos iniciais. Mas a experiência
formativa ampliou seu repertório de atividades a serem levadas para a sala de aula.
E, com isso, pôde desmistificar, muitas vezes, o ‘bicho de sete cabeças’ que fazem
da Matemática, a partir do momento que instigou, nos estudantes, um olhar para
as várias possibilidades que um problema pode criar de estratégias de resolução.
A contribuição mais nova para ela foi a da ideia do ‘muitos para muitos’, no
Campo Conceitual Multiplicativo: porque aí foi onde eu fiz um projeto. No primeiro mo-
mento, eu ia trabalhar com o projeto o Campo Aditivo, mas quando eu vi que os alunos estavam
bem além, eu parti para multiplicação. Então, fui criando um projeto junto com os alunos e
depois levei para a Feira de Matemática, aí fui pra feira na cidade (...) onde lá, o projeto foi esco-
lhido em primeiro lugar e aí fomos apresentar em outra cidade4. Então, isso foi muito gratificante,
porque foi um trabalho que foi feito dentro da sala de aula juntamente com os alunos e, depois,
a gente foi mais além e a gente vê que teve um retorno, um retorno gratificante, com parceria do
GPEMEC, juntamente com o professor, até a aprovação do projeto.
Assim, o salto entre o trabalho mais tradicional que já desenvolvia e o trabalho
mais contextualizado, do material concreto para as situações, foi o que de mais es-
pecial Tiana aprendeu com a Formação. E isso, ela acredita, foi o mote para mudar
e facilitar a aprendizagem de seus estudantes. A observação era clara de que, dessa
forma, o interesse em aprender a Matemática mudou mesmo, passando do medo
em tempos anteriores – quando a gente era estudante, quando se falava em Matemática a
gente tinha muito medo – para a vontade de aprender com compreensão.
Refletindo sobre as observações construídas por Aurora e Tiana, vemos aqui
histórias de vida pessoal que se intercruzam com relação à aprendizagem de Ma-
temática enquanto estudantes, carregada de afetividade. Do trauma instigado
4 O nome da cidade foi substituído por “outra cidade”.
112
pela professora de Aurora para a “sabatina” da multiplicação (decorar a tabuada)
ao medo da Matemática de Tiana, produzem experiências dolorosas acerca dessa
aprendizagem. Assim, afirmam, algumas vezes, que somente após a vida adulta,
enquanto professoras, puderam ressignificá-la e que a Formação teve, também, um
impacto forte nessa construção de um outro olhar para a Matemática, da impor-
tância que a família deve ter nessa aprendizagem, do uso do material concreto para
construir significado real, até a sua contextualização em situações.
Tais narrativas demonstram o quanto aprender Matemática é fortemente anco-
rado na afetividade e que as vivências na vida de estudante marcam, muitas vezes,
tanto a escolha quanto a ação docente enquanto profissional professor, imprimin-
do, nessa via, um olhar dotado do significado dado pelo sujeito às situações vividas.
É uma prova real de que cognição e afetividade são processos imbricados e que
se constituem mutuamente na subjetividade humana (ARAÚJO-GOMES, 2005;
ARAÚJO-GOMES; DA ROCHA FALCÃO, 2012).
113
propostas, pois ela tinha certo de que eles não conseguiriam: no primeiro momento, eu
logo disse – os meninos não vão conseguir fazer isso, isso é difícil pra mim, eu não vou conseguir,
os meninos não vão conseguir. Mas, aos poucos, eles foram percebendo que, mais do que certo e er-
rado, o que era importante era o processo, como cada um pensava e as estratégias que usavam para
resolver, muitos dos quais usando os dedos das mãos e dos pés, ou qualquer outro procedimento
que pudesse explicitar como tinha desenvolvido. (...) No início, era complicado, até para motivar
os alunos, eles diziam: ah, eu não sei, eu não vou fazer. Para encorajá-los, eu dizia: é do seu
jeito, agora é o seu momento. Tinha o momento também de relatar, eles iam à frente
relatar como foi a construção. Olha, eu fiz assim – eles iam no quadro – ah, tia, eu fiz assim,
ah, eu pensei assim e eu não dizia se estava certo ou errado.
A experiência rica do pós-teste5, segundo a professora, demonstrou o quanto
eles haviam aprendido a refletir sobre seu pensamento, numa atividade metacogniti-
va6, antes mesmo de responder, pois já esperavam que houvesse questionamentos
sobre suas anotações e resoluções. Isso é importante por já enfatizar que há muito
pensar envolvido na resolução dos problemas matemáticos e isso é essencial para
a aprendizagem e, também, o resultante do que as narrativas produzidas na for-
mação imprimiram em suas práticas.
Essa mudança de postura dos estudantes, nessa sala de aula, foi um marco
interessante do processo formativo. Muitos deles que ainda tentavam ‘olhar para
o trabalho do colega’ antes de responder, na tentativa de confirmar suas estraté-
gias, foram deixando de lado esse procedimento e buscando melhor explicitar seu
modo próprio de pensar e as diferentes estratégias escolhidas.
Com relação às dificuldades atreladas ao Campo Conceitual Multiplicativo
apresentadas pelos estudantes, Beatriz argumenta que podemos pensar em alguns
aspectos: (I) o limite de partir sempre da adição de parcelas repetidas para chegar
à multiplicação; (II) a falta de vivências práticas das situações multiplicativas, so-
bretudo nos terceiros anos, em detrimento do campo aditivo, que é bem trabalhado;
5 Uma parte dos professores da rede, no fim do processo formativo, aplicaram novamente com seus alunos
o instrumento diagnóstico apresentado no Capítulo II.
6 Metacognitiva no sentido de que os estudantes são chamados a explicitar sua forma de pensar através da
sua fala, relatando ao professor. Com base nos estudos acerca da Metacognição, essa atividade organiza e
orienta o pensamento ‘na ação’, o que constitui um bom prognóstico de aprendizagem.
114
(III) a escassez de processos de formação continuada para os professores dos anos
iniciais em Matemática, o que rebate na organização e no seu planejamento pedagó-
gico, que terminam por propor sempre a multiplicação ‘apenas’ quando o estudante
domina as operações de adição e subtração.
Tais aspectos limitam o processo de reflexão e aprendizagem acerca das estrutu-
ras multiplicativas. Os estudantes terminam por usar apenas a estratégia da adição
de parcelas repetidas para a operação da multiplicação acreditando que o caminho
é apenas e sempre esse. Muitos deles iniciam por resolver a multiplicação usando o
quadro valor lugar através das sucessivas adições. E esse fato pode ser promovido,
também, devido a outro aspecto afirmado por Beatriz: ...as dificuldades que os alunos
apresentam em estruturas multiplicativas podem ser desencadeadas devido à ansiedade que o pro-
fessor tem de ver o menino fazendo a conta, de ver o menino escrevendo, de ver o menino lendo...
supervalorizar essas áreas em detrimento de outras e de outras atividades, como: os jogos, o relato
dos alunos após terem respondido uma situação-problema, o desafio, deixar o menino pensar. Mas
aquela ânsia de ver fazendo, de ver produzindo, então, eu acho que sai atropelando etapas im-
portantes. Eu tenho me contido, às vezes, eu chego no fim de semana e fico: meu Deus, eu não dei
conta do planejamento dessa semana, vou ter que repetir tudo! O planejamento de segunda, ainda
estou no planejamento de segunda.
Para a professora, permitir que o estudante explicite seu caminho de raciocínio
para uma determinada situação é um grande facilitador e orientador do processo
de aprendizagem. E a sua experiência, em especial com essa turma, foi de gran-
des mudanças, sobretudo no comportamento deles, que saíram de uma indisciplina
completa, no 2º ano (possivelmente porque não compreendiam nada do que faziam em sala de
aula), para um comportamento de interesse na descoberta da Matemática: e, assim,
terminei o terceiro ano muito feliz. Quando eu cheguei na escola, ainda no segundo ano, a turma
era muito indisciplinada e as dificuldades eram grandes, acredito que, por conta das dificuldades,
cheguei a solicitar a mudança de turma, o que não foi aceito pela direção da escola. Já no terceiro
ano, e com a turma mudada quanto ao comportamento e, agora, com um bom relacionamento entre
nós, eles chegaram a fazer um abaixo-assinado para que eu continuasse sendo a professora deles,
no ano seguinte, quarto ano.
115
A principal contribuição trazida pela Formação para a sua prática docente, se-
gundo Beatriz, relaciona-se com a segurança em compreender o porquê e como re-
alizar as atividades, assim como que não há obrigação, na Matemática, de um único
caminho para se chegar à resposta ‘certa’. O erro deve ser reconhecido como uma
outra estratégia e, analisá-lo, permite ao estudante compreender, no confronto com
outras soluções, o que aconteceu no caminho. Outra contribuição relatada é a valo-
rização pessoal: ...o que o outro tem para mim no momento que compartilhamos nossos saberes.
Eu não sei mais nem menos. Estou aqui para aprender. A desmistificação que Matemática é só
cálculo, é só número, que multiplicação é só tabuada.
Na sua ação docente, Beatriz afirma que já vem ousando fazer mudanças em sua
prática docente após a Formação, pois estabelece consigo um processo contínuo de
autorreflexão de sua ação em sala de aula. Com isso, vai aos poucos estabelecendo
situações desafiadoras e contextualizadas, envolvendo, inclusive, os outros com-
ponentes curriculares, para onde tem transferido o que aprendeu nos momentos
dessa e de outras formações continuadas em que já participou. Outro ponto posi-
tivo considerado por ela, de grande relevância para sua ação pedagógica, resgata a
importância imprescindível das relações humanas e interpessoais, no contexto da
aprendizagem: tem o cuidado que você tem de falar com o outro; que a gente percebeu isso cla-
ramente nas formações. O cuidado de levar esse conhecimento ao outro, sem que o outro ache que
o que ele sabe não serve pra nada. A gente tem total consciência de que vocês, por terem estudado
mais, sabem mais. Eu trago isso no meu relato, que vocês chegaram tão abertos a ensinar, mas
assim, que existia, realmente, a questão do estranhamento e o medo e, esse medo, a gente escondia.
O menino levado, o menino que não sabe na sala de aula, ele aparece como? Com a indisciplina.
E o professor faz o quê? Se fecha. Para não mostrar o que não sabe.
Yanca é professora do 3º ano do ensino fundamental em uma escola da rede
pública municipal. Formada em Administração Pública, decidiu, posteriormente,
pelo caminho da educação, tendo feito Magistério e Pedagogia, além de duas espe-
cializações: Psicopedagogia e Educação Especial, que concluiu há cerca de 10 anos.
Atua em sala de aula, há 27 anos, já informando que se aposenta no próximo ano.
Durante a Formação, e retomou aqui, na entrevista, relatando sua experiência
específica como participante em um projeto de doutorado que trabalhava Matemá-
116
tica, e que foi desenvolvido durante três anos numa parceria entre a universidade e a
escola privada em que lecionava. Afirma que foi muito importante para sua prática.
Defende que o Campo Conceitual Multiplicativo está inserido no programa des-
sa etapa de ensino, pois aprofunda, nos estudantes, aquilo que tão bem sabem intui-
tivamente, como multiplicar: a gente precisa transpor da escola, da vida comum para a escola
com outra linguagem, para que eles compreendam a diversidade que a Matemática fornece, que ela
produz, ela tem essa amplidão de conhecimento.
Yanca avalia que os seus alunos têm uma lacuna na reflexão sobre as estruturas
multiplicativas. Isso porque, ela própria, apesar de ter participado do projeto, aci-
ma relatado, há alguns ‘bons anos’ atrás, não conhecia a abordagem dos Campos
Conceituais do Gérard Vergnaud. Ela considera de suma importância a apropriação
desse novo conhecimento para despertar em seus alunos a compreensão de forma
ampliada sobre multiplicação e divisão e ir desenvolvendo isso ao longo da trajetória
escolar. Assim, as dificuldades que os estudantes apresentam no Campo Conceitual
Multiplicativo estão atreladas ...justamente por eles não terem esse trabalho, como o professor
não trabalha, acredito que, por falta de conhecimento mesmo, eles não sabem. A dificuldade é do
professor, não é do aluno não, porque, se o aluno vir um trabalho sistemático, ele vai vencendo
essas etapas, uns com mais, outros com menos dificuldades, mas vai vencendo essas etapas, então,
a dificuldade é do professor porque, se o professor não acreditar e não entender o que está fazendo,
como é que ele vai? Eu aprendo uma coisa lá, mas eu tenho que pegar isso que eu aprendi lá no
curso, as estruturas multiplicativas e ver qual metodologia vou aplicar. Como eu vou aplicar isso?
Eu não posso passar para a criança da forma que eu recebi.
Para Yanca, é necessário, ainda, que se discuta mais sobre a forma como se pode
transpor a metodologia da construção do Campos Conceitual Multiplicativo a ser
levada diretamente para a sala de aula dessa etapa de ensino. Ou seja, o professor
deve ter um determinado conhecimento e saber transitar entre esse e o que ele pode
desenvolver com seu alunado.
O aprendizado que essa Formação trouxe foi de grande impacto já para a prática
de Yanca, na sala de aula, e na visão crítica de outras instituições: eu tenho dois netos,
117
sobrinhos que me chama de avó, que estudam numa escola muito conceituada de Recife e quando
eu pego as avaliações que eles chagam felizes da vida porque tiraram nove e dez, quando eu pego as
avaliações de Matemática, é só aquele estruturinha multiplicativa – quantas caixas tem tantos e
quantas vezes são – não fala nada de outra estrutura como a gente viu. Então, não sou
só eu que não estou sabendo. Acho que muita gente por aí também não sabe...
Assim, a clareza acerca da abordagem dos Campos Conceituais foi a princi-
pal aprendizagem nessa Formação. Apesar da ação-reflexão fazer parte do cotidiano
dessas construções, ela defende que replanejar, após o desenvolvimento das ações,
provoca a necessidade de se construir o conhecimento junto com a criança e que
isso é o motor do aprender: não tem nada que você não passe, que não lhe acrescente,
eu procuro sempre retirar o melhor, eu sempre aprendo alguma coisa, não é porque eu quero ser
melhor que ninguém não, mas é que sempre tem alguma coisa que você não se ligou e aquela pessoa
vai falar e você pensar: ah, não tinha pensado nisso. A gente tem que estar sempre aprendendo, a
vida é isso!
Tecendo inter-relações entre as questões fomentadas por Beatriz e Yanca,
vemos o quão importante é a construção com significado das situações-problemas
para a compreensão matemática dos estudantes. Dar sentido ao Campo Conceitual
Multiplicativo está ‘para além’ de apenas aprender a multiplicar – como adições su-
cessivas – e dividir – em partes ou em quotas. Mas, sobretudo, está imbricada, com-
pletamente, desde a formação continuada do professor para refletir sobre diferentes
estratégias e seus confrontos, sua ansiedade em ensinar de várias formas diferentes,
até a produção de atividades carregadas de sentidos, na sala de aula, fazendo com
que o estudante transponha para as suas aprendizagens matemáticas e para outros
componentes curriculares e alcance sua compreensão provocando-lhe um desem-
penho favorável.
118
ação-reflexão-planejamento-ação, em um processo contínuo, precisam ser organi-
zadas considerando os profissionais que vão atuar nos anos iniciais, pois é, nesse
nível, que se faz necessário um olhar mais cuidadoso, já que esse profissional é o
responsável por construir as bases para a introdução das crianças no processo for-
mal de aprendizagem.
Diante da complexidade curricular exigida no curso de Licenciatura em Pedago-
gia, lócus de formação do professor dos anos iniciais, torna-se importante pensar
nas instituições de ensino superior que oferecem essa modalidade e da consequente
necessidade de repensar o currículo no aspecto da formação, de forma a garantir
um processo que contemple ação-reflexão-planejamento-ação. Isso porque, se a
formação inicial não for bem estruturada, prejudicará, de forma direta, a sua atua-
ção docente, devido ao pouco preparo no que diz respeito aos processos de ensi-
no-aprendizagem.
Portanto, enquanto essa mudança não se efetiva na formação inicial, o incremen-
to de práticas continuadas formativas como essa, aqui discutida e proposta nesta
coleção, torna-se especialmente necessária.
119
REFERÊNCIAS
121
APÊNDICE
123
9. A mãe de Gildevan vende jujubas num pacotinho. Em cada pacote, ela põe 8
jujubas. Quantas jujubas ela usará para encher 10 pacotes de jujubas?
10. Silvana comprou uma pizza com 24 pedaços para 8 pessoas. Quantas fatias
cada uma recebeu, se todas receberam a mesma quantidade de fatias?
11. Maria tem 30 bombons para distribuir igualmente com 6 amigos. Quantos
bombons cada amigo receberá?
12. Na festa de João, foram distribuídos 12 convites. Cada convite permite a en-
trada de 4 pessoas. Quantas pessoas foram convidadas?
13. Ana tem 20 figurinhas. Ela quer distribuir igualmente as figurinhas em 4 ál-
buns. Quantas figurinhas ela colocará em cada álbum?
14. Marcelo ficou feliz porque comprou uma cartela com 10 carrinhos. Se ele
comprasse 2 cartelas iguais a essa, com quantos carrinhos ele ficaria?
15. Ana comprou 1 pacote de pirulitos por R$ 5,00 reais. Se ela fosse comprar 2
pacotes iguais a esse, quanto ela pagaria?
16. Pedrinho tem um álbum que tem 5 páginas. Em cada página cabem 10 figuri-
nhas. Quantas figurinhas Pedrinho precisa ter para completar o álbum?
17. Mariana recebeu, no recreio, um pacote com 8 biscoitos. Se ela ganhasse 2
pacotes, quantos biscoitos ela ganharia?
18. Roberta tem 24 bolinhas de gude e quer colocar 6 bolinhas em cada saquinho.
Quantos saquinhos ela vai precisar?
19. José fez uma pipa com 4 papéis. Quantas pipas iguais a essa ele fará com 12
papéis?
20. Joana viu no mercado um pacote com 20 pirulitos. Se ela comprar 2 pacotes
desses, quantos pirulitos ela terá?
21. Um padeiro entrega 250 pães por dia. Em 5 dias, quantos pães ele irá entre-
gar?
22. Uma livraria vende um kit com 6 canetas coloridas. Maria comprou 4 kits.
Com quantas canetas coloridas Maria ficou?
124
23. Seu Pedro tem 28 reais. Ele vai presentear seus 2 netos repartindo essa quan-
tia em partes iguais. Quanto seu Pedro dará a cada neto?
24. Carlos tem 24 bolinhas para dividir igualmente entre os seus irmãos. Cada um
receberá 3 bolinhas. Quantos irmãos tem Carlos?
25. Luiza comprou uma caixa com 12 brigadeiros para doar a uma colega que
gosta muito. Se ela comprar três caixas iguais a essa, quantos brigadeiros irá
comprar?
26. Para a festa de Carlos, mamãe fez 30 salgadinhos. Ela quer colocar 5 salgadi-
nhos em cada bandeja. Quantas bandejas ela vai precisar?
Comparação Multiplicativa
1. Paulo comprou um jogo por 6 reais e um quebra-cabeça que custa 3 vezes
mais que o jogo. Quanto custa o quebra-cabeça que Paulo comprou?
2. A escola tem uma distância de 2Km até o Bairro Novo e a fazenda Ipanema
fica 8 Km distante da escola. Quantas vezes a distância da Fazenda Ipanema
à escola é maior que a distância da escola para o Bairro Novo?
125
3. Ana tem que andar 7 quarteirões para chegar ao posto médico e Paulo tem
que andar 5 vezes mais quarteirões do que Ana. Quantos quarteirões Paulo
tem que andar?
4. Mariana tem 21 anos. Pedro tem três vezes menos a idade de Mariana. Qual
é a idade de Pedro?
5. Kauan tem 8 bolas de gude e Marcos tem 40. Quantas vezes a quantidade de
bolas de gude de Marcos é maior que a de Kauan?
6. Júlia tem 2 bonecas e sua amiga Raiara tem o dobro. Qual a quantidade de
bonecas de Raiara?
7. Marcos tem 3 carrinhos. João tem 2 vezes mais carrinhos que Marcos. Quan-
tos carrinhos João tem?
8. Uma bola na loja de Zé custa R$ 5,00. Na loja de Maria a mesma bola custa
3 vezes mais. Quanto custa essa bola na loja de Maria?
9. João tem 8 bolas de gude. Marcos tem 3 vezes mais. Quantas bolas de gude
Marcos tem?
10. Num jogo de basquete, na escola Alegria, os meninos fizeram 5 pontos e as
meninas 15. Quantas vezes mais pontos as meninas fizeram no jogo de bas-
quete?
11. João tem 8 bolas de gude. Pedro tem 5 vezes mais bolas de gude que João.
Quantas bolas de gude tem Pedro?
12. Maria tem 8 reais em seu cofrinho e sua irmã Ana conseguiu juntar 3 vezes
mais do que Maria em seu cofrinho. Quanto Ana conseguiu juntar em seu
cofrinho?
13. José tem 20 anos e Maria, sua irmã, tem 4 vezes menos. Qual a idade de Ma-
ria?
14. João tem 15 figurinhas e Davi tem 5. Quantas vezes a quantidade de figuri-
nhas do Davi é menor do que a do João?
15. Bia não sabe quanto tem na carteira. Beth diz que tem 21 reais e que Bia tem
3 vezes menos que ela. Quantos reais, então, Bia tem?
126
16. Carlos tem 8 chaveiros em sua coleção. Ana tem 3 vezes a quantidade de cha-
veiros de Carlos. Qual a quantidade de chaveiros que Ana tem?
17. Tadeu tem 5 pirulitos. Já seu primo Paulo tem 20. Quantas vezes a quantidade
de pirulitos de Paulo é maior que a de Tadeu?
127
7. Bia tem 5 blusas coloridas (azul, verde, amarela, vermelha e rosa) e 3 saias
(pretas, branca e cinza). Quantas combinações diferentes de saia e blusa Bia
pode formar?
128
AUTORES
129
em Matemática e na Coordenação de Concursos Acadêmicos da mesma institui-
ção. Suas pesquisas têm foco em Educação Matemática, atuando principalmente
nos seguintes temas: Psicologia da Educação Matemática, Ensino-Aprendizagem
de Matemática e Etnomatemática.
E-mail: [email protected]
130
JOSÉ AIRES DE CASTRO FILHO
Ph.D em Mathematics Education pela University Of Texas At Austin. Pro-
fessor Titular da Universidade Federal do Ceará (UFC). Atua principalmente nos
seguintes temas: Educação a Distância, Informática Educativa e Psicologia da
Educação Matemática.
E-mail: [email protected]
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PARTICIPANTES DA REDE E-MULT
O E-Mult foi idealizado inicialmente pela Dra Sandra Magina, a ela todo nosso
agradecimento. E, várias foram as mãos que construíram e desenvolveram essa
Rede. Gratidão é palavra para todos que se dedicaram no planejamento e imple-
mentação da pesquisa, para simbolizar essa gratidão deixamos o nome de cada um
gravado neste livro.
Estudantes de Graduação
Alice Zenyanne Moreira dos Santos - UECE
Ariedja de Carvalho Silva – UFPE
Brena Rabelo dos Santos – UECE
133
Catarina Maria de Melo Linhares – UFPE
Claire Souza da Costa Marques – UESC
Clarissa Távora Tavares Cavalcante Viana – UFPE
Dacymere da Silva Gadelha – UFPE
Daniela Brayner de Farias Xavier – UFPE
Danielle Sobral Maciel – UFPE
Danilo do Carmo de Souza – UECE
Dara Catarina Santos da Silva – UFPE
Débora Silva dos Santos – UFPE
Deborah Monte Medeiros – UFC
Fabiane Santana da Silva – UESC
Farildes da Silva de Souza – UESC
Francisca Wellingda Leal da Silva – UECE
Gerlândia Santos Silva – UFC
Gleiciane Ferreira Farias – UECE
Hanna Gisellia Nogueira Antunes - UECE
Hosana de Fátima Melo da Silva – UECE
Jacilma Barata de Lima – UESC
Joyce Maria dos Santos – UFPE
Layane Carolinne de Lima Santos – UFPE
Maria Silvânia Marques Xavier de Souza - UFC
Maria Eduarda Chaves de Mendonça Galvão – UFPE
Maritza Maria Lima de Almeida Souza – UESC
Mônica de Moraes Oliveira – UFPE
Nássara Maia Cabral Cardoso Gomes – UECE
Nerivaldo Honorato da Cruz Santos – UESC
134
Paulo César da Silva Batista – UECE
Priscila Alves de Paula Belo – UECE
Sarah Rayssa Silva de Azevedo – UFPE
Thaynara Dias Martins – UECE
Taynan Vitória Lima de Castro – UECE
Valeria Conceição dos Santos – UESC
Estudantes de pós-graduação
Alexis Martins Teixeira – UESC
Ana Carla Amâncio Machado Dias – UFC
Anna Bárbara Barros Leite – UFPE
Antônio Cézar Teixeira – UESC
Caio Fábio dos Santos Oliveira – UESC
Camila Xavier Dias Souza Sena – UESC
Clara Raissa Fernandes de Melo – UFPE
Débora Cabral Lima – UESC
Dennys Leite Maia – UFC
Eliziane Rocha Castro – UECE
Elys Vânny Fernanda Rodrigues de Oliveira - UECE
Emanuella Figueira Pereira – UESC
Emília Isabel Rabelo Souza – UESC
Jaqueline Santana de Souza Santos – UESC
Joserlene Lima Pinheiro - UECE
Larissa Elfisia de Lima Santana – UFPE
Leidy Johana Peralta Marín – UFPE
Lemerton Matos Nogueira – UESC
135
Luana Cerqueira de Almeida – UESC
Mariana Oliveira Santos – UESC
Pedro Henrique Milagre – UESC
Taianá Silva Pinheiro – UESC
Jaqueline Santana de Souza Santos – UESC
Rayssa Melo de Oliveira – UECE
Rodrigo Lacerda de Carvalho – UFC
Silene Cerdeira Silvino da Silva - UECE
Silvana Holanda da Silva – UECE
Tamiles da Silva Oliveira – UESC
Pesquisadores
Alex Alexandre Alves – IFBA
Alina Galvão Spinillo – UFPE
Antônio Luiz de Oliveira Barreto – UECE
Aparecido dos Santos – UNINOVE
Claudia Roberta Araújo Gomes – UFRPE
Diná da Silva Correia – UESC
Ernani Martins dos Santos – UPE
Eurivalda Ribeiro dos Santos Santana – UESC
Irene Mauricío Cazorla – UESC
José Aires de Castro Filho – UFC
Juscileide Braga de Castro – UFC
Juliana Ferreira Gomes da Silva – UFAL
Marcilia Chagas Barreto - UECE
Rute Elizabete de Souza Rosa Borba – UFPE
Sandra Maria Pinto Magina – UESC
Síntria Labres Lautert – UFPE
Vera Lúcia Merlini – UESC
Coordenadores
Eurivalda Ribeiro dos Santos Santana – responsável pela coordenação Geral e
pelo Núcleo Ilhéus
José Aires de Castro Filho – responsável pela coordenação do Núcleo Fortaleza
Síntria Labres Lautert – responsável pela coordenação do Núcleo Recife
Primeira edição impressa em 2017
Síntria Labres Lautert
José Aires de Castro Filho
Eurivalda Ribeiro dos Santos Santana
ENSINANDO
MULTIPLICAÇÃO
E DIVISÃO DO
1º ao 3º ano
ISBN: 978-85-8151-149-8