Longa Duração: o Desmonte Do Ford Ka

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Testes

Longa Duração: o desmonte do


Ford Ka
Tudo parecia bem até o último teste, aos 60.000 km. Mas, no desmonte, a
surpresa...
Por Péricles Malheiros
access_time2 maio 2018, 16h50 - Publicado em 27 jul 2016, 17h08

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Após 1 ano e 4 meses e 60.000 km rodados, o Ka foi desmontado

Após 1 ano e 4 meses e 60.000 km rodados, o Ka foi desmontado (Marco de Bari/Quatro Rodas)

O último Ford no Longa Duração decepcionou: em janeiro de 2014, o EcoSport se


despediu reprovado. Pouco mais de um ano após a saída do SUV, outro Ford – tão ou
mais promissor que o Eco – entrou para a frota.
Em fevereiro de 2015, compramos um Ka. Bem maior que a primeira geração, com
motor três cilindros 1.0 de alta eficiência e um invejável menu de equipamentos de
segurança, as vendas dispararam e, hoje em dia, o Ka é um dos modelos mais
vendidos do Brasil.
Pelo nosso, versão SEL, com pintura metálica (Laranja Savana), pagamos R$ 38.610
– hoje, o zero-quilômetro está R$ 14.380 mais caro, R$ 52.990.

A desvalorização no mercado de usados, porém, não assusta: 17,1%, como mostrou


nossa simulação de venda, em abril de 2016, quando ouvimos ofertas de até R$
32.000.
Mas se no mercado o Ka mostra força e confiabilidade, o desmonte revela que,
mecanicamente, ainda há o que melhorar.

A atual geração do hatch chegou 6 anos após a primeira ter passado pelo Longa Duração

A atual geração do hatch chegou 6 anos após a primeira ter passado pelo Longa Duração (Marco de
Bari/Quatro Rodas)
Como todos os carros de Longa, o Ka foi submetido a um teste de pista completo aos
1.000 km e aos 60.000 km. “Em geral, os números de desempenho e consumo são
bons indicativos para os trabalhos de desmonte. Se o carro perdeu saúde ao longo do
teste, muito provavelmente ele vai piorar no segundo teste”, explica Fabio Fukuda,
responsável pelos desmontes.

No caso do Ka, tudo parecia bem, inclusive com alguma melhora entre os testes. Mas
nos 500 km percorridos após os 60.000 km, o desempenho desabou.

“Entre a oficina e minha casa, subo um trecho de serra. Fiquei espantado com a falta
de fôlego. Na hora, percebi que algo estava errado”, disse Fukuda. E estava mesmo.

Com o motor em temperatura de trabalho, nosso técnico iniciou as análises. Com


valor aferido de 2,7 bar com o motor em marcha-lenta e 2,8 bar a 3.000 rpm, tudo
certo com a pressão de óleo – a fábrica tolera 3,2 em ambas situações, com variável
(acima ou abaixo) de 15%. A grande decepção veio a seguir.

Com a mudança de geração o Ka conquistou o público e se tornou um dos mais vendidos


Com a mudança de geração o Ka conquistou o público e se tornou um dos mais vendidos (Marco de
Bari/Quatro Rodas)

Na medição de pressão de compressão, média de 70 psi – muito abaixo, portanto, do


valor mínimo de 101 psi tolerado pela Ford. “Estava explicada a apatia do motor”,
disse Fukuda.

Com o início da desmontagem, fim do mistério. No cabeçote, válvulas de admissão


com severo acúmulo de carvão denunciavam a falência dos retentores. Nas câmaras
de combustão, a cabeça dos pistões ainda estavam com poucos sinais de
contaminação.

“O problema é que boa parte do carvão que se soltou das válvulas, em algum
momento, ficou entre a própria válvula e a zona de assentamento, comprometendo
seriamente a vedação da câmara. Apesar de ser um dano quase microscópico, a
consequência do espelhamento da superfície da zona de assentamento é terrível”, diz
Fukuda.

Antes ultracompacto, o Ka cresceu e atualmente é capaz de levar até pranchas de surf


Antes ultracompacto, o Ka cresceu e atualmente é capaz de levar até pranchas de surf (Marco de Bari/Quatro
Rodas)

Dada a velocidade do agravamento do caso, é provável que o nosso Ka ficasse ainda


mais fraco. “A princípio, esse problema não parece ser um problema de projeto. Creio
que seja algo isolado, específico da nossa unidade”, ressalta Fukuda.

Todos os demais componentes do motor analisados estavam dentro das especificações


da fábrica.

Mais 60.000 km

Diferentemente do motor, o câmbio terminou o teste impecável. Anéis


sincronizadores, luvas e garfos de engate, engrenagens e rolamentos: tudo estava em
estado de novo. Até a embreagem chegou elogiada aos 60.000 km.

“Considerando que um disco novo tem 6,7 milímetros de espessura e o limite mínimo
declarado pela Ford é de 5,2 mm, foi uma surpresa encontrar nosso carro com a peça
com 6,15 mm. Acredito que o sistema aguentaria pelo menos outros 60.000 km”,
disse Fukuda.
Lâmpada do pisca: na rede, só sob encomenda

Lâmpada do pisca: na rede, só sob encomenda (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Freios e suspensão tiveram seus altos e baixos. Sem necessidade de manutenção no


decorrer do teste, ambos os sistemas chegaram originais ao fim da jornada.

Nos freios, o disco esquerdo estava com 22,9 mm de espessura e o direito, com 22,93
mm, medidas surpreendentemente mais próximas das de um novo (23 mm) do que do
limite mínimo tolerado pela Ford, 21 mm.

No entanto, o do lado direito foi encontrado com desvio lateral (empenamento) de


0,07 mm, ou seja, acima do limite de 0,05 mm. “Era ele o responsável pela leve
trepidação sentida no pedal durante as frenagens”, diz Fukuda.

No freio traseiro, o cilindro direito foi encontrado com vazamento. “Parecia ser algo
recente, pois o guarda-pó ainda conseguia manter o fluido em seu interior. Mas é certo
que, com o tempo, o vazamento se agravaria e o fluido acabaria entrando em contato
com as lonas”, diz Fukuda.
Em uma das ocorrências do Ka, o serviço de resgate da Ford funcionou bem

Em uma das ocorrências do Ka, o serviço de resgate da Ford funcionou bem (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Na média, as lonas estavam com 3,09 mm de espessura, bem distante do limite de 1


mm estabelecido pela Ford.

Algumas reclamações de ruído na suspensão foram feitas ao longo do teste. E os


responsáveis foram detectados no desmonte, todos na dianteira.

Bieletas e buchas de bandeja, danificadas, trabalhavam com ligeira folga e geravam o


barulho que se ouvia na cabine. Mancais da barra estabilizadora, amortecedores e
molas, porém, estavam em ótimo estado, assim como todo o conjunto traseiro.

A carroceria se mostrou protegida contra poeira e água. E revelou integridade dos


demais sistemas. “A parte elétrica é adequadamente isolada e tem terminais bem
travados e sem sinais de oxidação nos contatos. Para evitar barulho, os painéis de
acabamento poderiam ter mais pontos de fixação. Mas os que existem são firmes”, diz
Fukuda.
Revendas Ford: variação bruta na cotação do Ka

Revendas Ford: variação bruta na cotação do Ka (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Aos 49.650 km, houve o problema de superaquecimento do motor, causado pelo


subdimensionamento do fusível de proteção do eletroventilador do radiador (que
acabou sendo trocado por outro, de maior capacidade, tanto nos carros que passaram
por revisão quanto nas unidades novas saídas de fábrica).
Contribuiu para isso também o fato de o Ka não ter indicador de temperatura, apenas
uma luz advertindo que o motor ferveu.

Outros problemas vieram da Ford, que criou uma revisão extra antes da primeira
parada, fazendo com que alguns clientes, inclusive nós, caíssem em uma condição de
perda de garantia.

Felizmente, após algum tempo, tudo se resolveu. Nas revisões, nada de empurrar
serviços desnecessários, problema recorrente no primeiro Ka de Longa Duração,
desmontado em junho de 2010.
Por outro lado, nenhuma autorizada conseguiu dar fim à dificuldade de fechar as
portas e a tampa traseira.

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Com mais virtudes do que defeitos (e destes, um único grave), o Ka se despede


aprovado – mas com a ressalva de que há pontos a evoluir.

O QUE FOI APROVADO

Anéis, bielas: tudo certo no bloco


(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Mesmo com a severa carbonização das válvulas de admissão, não foram encontrados
no bloco e em seus componentes sinais de ataque por pedaços de carvão desprendidos,
como era de se esperar.
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Suspensão
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Amortecedores e respectivos batentes, todos em bom estado, mostraram-se bem


preparados para nossas ruas esburacadas.
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Desvio
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Não raramente, carros do mesmo porte do Ka pedem troca de pastilhas e até de discos
ao longo dos 60.000 km. O Ford chegou ao fim da jornada com os componentes
originais.

Longa vida
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

No desmonte, todos os componentes do câmbio foram encontrados absolutamente


livres de sinais de ataque.

Disco de sucesso
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Destaque do desmonte, o conjunto de embreagem nem sentiu o teste: o disco, com


baixo índice de desgaste, suportaria ao menos outros 60.000 km.

Expressão corporal
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Desmontada, a carroceria se mostrou bem protegida contra a invasão de poeira e água,


mantendo o bom nível do Ka anterior, testado em 2010.

O QUE MERECEU ATENÇÃO

Torce, retorce
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

O dano ainda era pequeno, mas o coxim inferior, responsável por controlar o
movimento torcional do motor, foi encontrado com a borracha rompida.

Corpo de borboleta
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Com o tempo, a sujeira poderia dificultar a movimentação da borboleta, levando o


motor a responder inadequadamente ao acelerador.

Folgadas
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Buchas de bandeja e bieletas trabalhavam com folga. Eram elas as responsáveis pelos
barulhos na dianteira do carro.
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Tambor de óleo
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

O discreto vazamento no cilindro da roda traseira até é aceitável em um carro com


60.000 km, mas também é verdade que raramente é encontrado tal problema nos
carros de Longa Duração.

O QUE FOI REPROVADO

Invasão da câmara
Ao deixar de cumprir a função de impedir a passagem do óleo do cabeçote para as
câmaras, os retentores ganharam o título de grandes vilões do motor.

“Partes do óleo carbonizado acabaram espelhando a zona de assentamento das


válvulas, impedindo uma perfeita vedação. Era por ali que vazava a pressão de
compressão”, diz o consultor técnico Fabio Fukuda.
(Marco de Bari/Quatro Rodas)

Linha do tempo
Fevereiro de 2015: há um ano e quatro meses, o novo Ka estreava na frota. Seis anos
atrás, o primeiro Ka de Longa Duração era desmontado, em junho de 2010.
Março de 2015: o manual do Ka indicava um plano de manutenção, o site da Ford
dizia outra coisa. Chegamos a ser avisados de que a garantia estava cancelada.
O manual do carro dizia uma coisa e o site da marca outra

O manual do carro dizia uma coisa e o site da marca outra (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Agosto de 2015: há tempos, os motoristas do Ka reclamavam do acabamento. A


revisão dos 20.000 km resolveu alguns deles. Mas as portas, duras de fechar,
persistiram nos 60.000 km.
Outubro de 2015: antes um carro ultracompacto, hoje ele atende famílias inteiras
com uma cabine capaz de levar até algumas pranchas de surfe.
Novembro de 2015: o valor da quarta revisão assustou: R$ 920. Pelas três primeiras
revisões do Volkswagen Up!, desmontado em 2015, pagamos R$ 933.
Dezembro de 2015: o Ka teve duas lâmpadas queimadas substituídas ao longo do
teste: uma de seta e outra de placa. Por elas, pagamos salgados R$ 92.
Março de 2016: o motor ferveu! Na apuração do fato, achamos o culpado: um fusível
subdimensionado. Mas o serviço de resgate da Ford funcionou bem – clique aqui para
ler o relato completo.
Abril de 2016: se levarmos em conta a melhor oferta que ouvimos na simulação de
venda, a desvalorização foi de 17%. Pena que, hoje, o mesmo Ka zero-quilômetro está
28,1% mais caro.
Veredicto

Com uma boa relação custo-benefício, o Ka não demorou a conquistar o consumidor.


Espaçosa, moderna e com itens de segurança raros no segmento, a nova geração
assumiu o posto de carro da família, algo impensável no primeiro Ka, um
subcompacto caro, com apenas duas portas e espaço para quatro pessoas.

Mas o desmonte revelou que é cedo para comemorar: suspensão, freio e motor
precisam mostrar mais confiabilidade.

Folha corrida

Preço de compra R$ 38.610 (fevereiro 2015)

Quilometragem total 60.131 km

Quilometragem rodoviária 43.465 km

Quilometragem urbana 16.666 km

Combustível em litros 6.256,7 litros


(etanol)

Custo de combustível R$ 14.615,78

Consumo médio 9,6 kml (etanol)

Revisão dos 10.000 km R$ 240 (Forte)

Revisão dos 20.000 km R$ 283 (Superfor)

Revisão dos 30.000 km R$ 428 (Studio)

Revisão dos 40.000 km R$ 920 (Mix)

Revisão dos 50.000 km R$ 445 (Caoa)


Alinhamento, balanceamento e rodízio de pneus (R$ 745);
Peças extras às revisões
lâmpadas (R$ 92)

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