Psicologia e Políticas Públicas
Psicologia e Políticas Públicas
Psicologia e Políticas Públicas
e Políticas
Públicas
U1 - Título da unidade 1
Psicologia e políticas
públicas
Eliane da Silva
Cláudia Capelini Picirilli
© 2016 por Editora e Distribuidora Educacional S.A.
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer
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Daniel Roggeri Rosa
Adilson Braga Fontes
Diogo Ribeiro Garcia
eGTB Editora
Silva, Eliane da
S586p Psicologia e políticas públicas / Eliane da Silva, Cláudia
Capelini Picirilli. – Londrina : Editora e Distribuidora
Educacional S.A., 2016.
240 p.
ISBN 978-85-8482-449-6
CDD 158.26
2016
Editora e Distribuidora Educacional S.A.
Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza
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e-mail: [email protected]
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Sumário
Políticas públicas
Convite ao estudo
Nosso objetivo geral é ajudá-lo a conhecer e atuar como
Psicólogo em Políticas Públicas. Nesta primeira Unidade de
Estudo nossos assuntos principais serão Conceitos de Políticas
Públicas e sua importância na Saúde. Vamos buscar entender sua
definição, como se apresentam e como direcionam o trabalho do
profissional que atua junto a elas nas diferentes áreas da Saúde.
Primeiro estudaremos a Definição de Políticas Públicas (PP), o
que são e onde se apresentam na sociedade. Você vai ser capaz
de identificar, nos serviços prestados pelo Governo, quais são as
políticas presentes e como elas fazem parte de nosso cotidiano.
Esse aprendizado o capacitará a ter uma visão mais ampla e
crítica do funcionamento do sistema de saúde. Em seguida,
iremos pesquisar as Leis e Saúde, buscando conhecer as normas
mais importantes para a Saúde. E, por último, conheceremos os
Princípios Básicos para a Área, que fundamentam a atuação do
profissional na execução das Políticas.
Temos no Brasil uma Situação Real que interessa a você
conhecer melhor!
O panorama atual do Ensino de Psicologia não está
atendendo às demandas de trabalho nos órgãos que atendem
ao público em geral. Os profissionais chegam para trabalhar
em repartições públicas sem ter qualquer noção de como elas
funcionam e se inter-relacionam com as políticas públicas (PP).
Encontramos novas necessidades de inserção do Psicólogo
para atuar na Área de Gestão de ONGs e outras Instituições,
como também na Rede de Atenção Básica à Saúde, Hospitais,
junto a Trabalhos de Assistência Social e outros. Isso significa
um aumento de campo de trabalho real para muitos Psicólogos.
U1 - Políticas públicas 7
Como exemplo dessa situação, vamos acompanhar o caso
de Sandra: Sandra é estudante do último ano de Psicologia, mora
com os pais e cursa a Faculdade à noite. A situação financeira
da família não está boa, pois seu pai é motorista de ônibus
aposentado, sua mãe faz “quentinhas” para a vizinhança, e seu
único irmão, que ajudava com o salário que recebia por seu
trabalho em uma firma de construção civil, foi mandado embora.
Sandra ajuda sua mãe, mas o que ganha não é muito, só dá para
manter seus gastos com os estudos e a condução. Sandra está
pensando muito sobre seu futuro profissional e no que fazer
para ajudar mais sua família. Ouve sempre sua mãe falar para
ela prestar Concurso Público, pois é mais garantido, e emprego
em Escola e Hospital está difícil. Quanto a ter um consultório
particular, imagina como poderia pagar o aluguel de uma sala até
formar clientela, considerando que ainda não tem experiência.
Tudo parece sem solução... Mas, do Serviço Público, Sandra só
escuta reclamações. Na faculdade ela vai cursar uma matéria
que fala de Políticas Públicas e Psicologia, mas Sandra ainda não
entende o que Política tem a ver com o Psicólogo.
Vamos ajudá-la?
8 U1 - Políticas públicas
Seção 1.1
Políticas públicas - conceitos e importância na saúde
Diálogo aberto
Nesta primeira Unidade e nesta seção de nosso livro didático
você poderá buscar aumentar seu nível de informações sobre
as Políticas Públicas. Você vai conhecer a definição de políticas
públicas, fará uma introdução às suas leis e identificará os princípios
básicos para a área. Nossa busca terá como objetivo auxiliar a
resolver uma Situação-Problema muito comum entre estudantes em
vésperas de Conclusão de Curso: Sandra resolveu que vai realmente
prestar o Concurso para o Serviço Público na área da Saúde. Seus
pais ficaram contentes com sua decisão e estão apostando muito
em seu sucesso. A responsabilidade é grande, ela sabe; por isso,
ela decidiu que iria fazer tudo o que pudesse para realmente ser
aprovada. Sandra nunca ouviu falar em Políticas Públicas – só sabe
que é um assunto importante, segundo o Edital do concurso. E
agora, o que ela deve fazer, já que não sabe nem como começar?
Sandra vai precisar, então, ter uma visão geral das políticas
públicas, conhecer leis importantes e seus princípios básicos. Vamos
ajudar Sandra a resolver este caso!
U1 - Políticas públicas 9
Federação, que variam seu poder de atuação e influência de acordo
com sua amplitude e abrangência geográfica. Ao ir para o trabalho,
por exemplo, usamos o Sistema Público de Transportes; se vamos
à feira livre – Sistema de Distribuição de Alimentos; ao acendermos
uma lâmpada elétrica em casa – Sistema de Distribuição de Energia
Elétrica; ao tomarmos as vacinas contra a gripe – Sistema de
Prevenção a Doenças – Sanitarista; e assim por diante.
Talvez você nem se dê conta de como estamos apoiados nessas
Políticas, pois funcionam em todas as áreas na vida de um cidadão.
Na nossa vida... e na vida de Sandra. Ela tem ouvido muitas queixas
de seu pai, que precisa de remédio para pressão alta e diabetes. Para
ter acesso aos medicamentos o pai de Sandra sofre primeiro no
ônibus cheio, em que mal consegue subir porque é “alto o degrau”,
e depois na fila no “Postinho”, sem nenhum banquinho para sentar,
e por aí vai. Sandra pensou em aceitar um estágio no “Postinho”
em que o pai pega seus remédios, perto de sua casa. E quem daria
supervisão a ela? Lembrou-se da Professora de Psicologia Clínica,
mas, antes, queria entender do que mesmo aquela matéria de
Políticas Públicas falava... Lembre-se de que ela “ainda não entende
o que Política tem a ver com o Psicólogo”.
Começou, novamente, a lembrar-se das queixas da mãe na volta
do mercado com preços altos, do pai com seus remédios, do irmão
com seu desemprego, do vizinho, Sr. Odair, que tem um filho “fraco
da cabeça“, da D. Maria, coitada, com depressão... Sandra resolveu
então prestar mais atenção no Professor dessa matéria e fazer mais
perguntas, afinal, já ia terminar o curso e ser Psicóloga. Na última
aula de Políticas Públicas, ficou muito atenta às informações do
Prof. Carlos. Vamos acompanhar o que Sandra está aprendendo.
Em primeiro lugar, a Psicologia atual não é mais vista da mesma
forma de quando se iniciou no Brasil. Sua imagem era de profissionais
preocupados em ler mentes e comportamentos, que aplicavam
testes para seleção e atuavam em indivíduos percebidos de forma
isolada em sua subjetividade, e seu trabalho era voltado às classes
mais favorecidas. Hoje, a Psicologia está visivelmente participativa
nos problemas sociais atuais e visivelmente comprometida com a
construção de uma sociedade mais justa e ética, tendo os indivíduos,
enquanto cidadãos, inseridos em uma comunidade com deveres e
outros direitos a serem conquistados. Prova disso é a inclusão desses
profissionais na construção de novas práticas e saberes dentro das
Políticas Públicas. Você sabia que o Psicólogo foi introduzido nos
serviços públicos no ano de 1970, com a missão de, em grupos
10 U1 - Políticas públicas
multiprofissionais, propor modelos novos de Hospital Psiquiátrico?
Enfim, é o Psicólogo trabalhando pela construção de um mundo
melhor para todos.
Leis e Saúde
Vamos fazer um rápido percurso sobre a História da Saúde Pública
no Brasil. Na década de 1920, segundo (CARVALHO, 2013), tivemos
as campanhas sanitárias para atacar as epidemias que assolavam a
população. Nesse momento surgiu a lei Eloy Chaves, que criou as
CAP – Caixas de Aposentadorias e Pensão, exclusivamente para
trabalhadores contratados. Na década de 1930, na chamada de Era
Vargas, criaram-se os IAP – Institutos de Aposentadorias e Pensões.
Nos anos de 1960 e 1970 foram criados o INPS – Instituto Nacional
de Previdência Social e o INAMPS – Instituto Nacional de Assistência
Municipal de Previdência Social, sendo que este último continuou
funcionando até o ano de 1993, quando foi encerrado. Nos anos
de 1980 e 1990 as reformas foram maiores. A sociedade brasileira
teve muitas mudanças para melhor no final do século XX. Com
maior consciência de sua cidadania, foram realizadas conquistas
importantes, como o direito à Previdência Social, conquistas na área
da Saúde e na Educação. Devemos lembrar que também houve a
interferência do modelo europeu Pós-Segunda Guerra Mundial,
quando uma nova política do Capitalismo buscou intervir como Estado
na garantia de favorecer o “bem-estar social”. Em 1986, tivemos a 8a
Conferência Nacional da Saúde, que, com suas propostas, conseguiu
influenciar nosso governo na época, provocando a Reforma Sanitária
no Brasil. Então, em 1988, pela Constituição Federal, na Seção Saúde
- nos artigos 196 a 200, tivemos a criação do SUS – Sistema Único
de Saúde, afirmando ser de relevância pública o Serviço de Saúde. O
artigo 197 da Constituição Federal cuidou de regulamentar, fiscalizar
e controlar o funcionamento da Saúde, cabendo ao Poder Público
dispor por suas ações.
O SUS – Sistema Único de Saúde, segundo o Ministério de Saúde
(2005), veio para tratar da promoção, da proteção e da recuperação
da saúde e serviços correlatos, para todos os brasileiros, sem
nenhuma distinção e com iguais direitos. Mas era necessária ainda
uma lei que regulamentasse mais detalhadamente o funcionamento
desse Sistema. Então, em 19 de setembro de 1990, foi criada a Lei
n° 8.080/90, que delibera sobre a organização e o funcionamento
do SUS. Estávamos no Governo do Presidente Fernando Collor de
Mello, que interferiu com vetos na aplicação dessa lei. Isso gerou
uma insatisfação popular que culminou, então, com a promulgação
U1 - Políticas públicas 11
de uma nova lei: a Lei n° 8.142/90, de 28 de dezembro de 1990, que
iria legislar sobre o financiamento regular feito pelo Governo Federal
e a participação social dentro do SUS. Essas duas leis, 8.080/90 e
8.142/90, são muito importantes, porque norteiam a Saúde Pública
do Brasil até hoje, e são conhecidas como Leis Orgânicas da Saúde.
Iniciava-se naquele momento uma mudança importante
para todo o País, principalmente na área da Saúde Mental. Esse
conjunto de Leis e suas complementações trouxeram a ideia
de descentralização e revelaram o dever do Governo de assumir
suas diferentes instâncias e competências dentro do SUS, para sua
efetivação e manutenção em cada pedaço de nosso território.
Você pode se perguntar: como foram feitas as complementações
dessas Leis?
Foram feitas por meio das NOBS - Normas Operacionais Básicas
de Saúde e das NOAS – Normas Operacionais da Assistência à Saúde.
Somente doze anos depois, em 2002, surge a lei nº 10.216/02, que
institui a Política Nacional de Saúde Mental. Com ela, mudam as
formas de organização do atendimento, que difere do anterior por
acreditar na inclusão do tratamento integrado com o meio ambiente
e a família, ou seja, não segregando o indivíduo em sofrimento e
garantindo o trânsito desses indivíduos nos serviços de tratamento,
além do convívio social, cultural e outros. Outras providências foram
tomadas para aperfeiçoar e instrumentalizar a implantação dessas
novas Políticas Públicas.
Em 13 de fevereiro de 2004, o Ministério da Saúde, com a Portaria
198/GM/MS, instituiu a PNEPS – Política Nacional de Educação
Permanente em Saúde, que busca orientar a educação dos profissionais
e trabalhadores da área. Sua filosofia diz que o atendimento ao usuário
deve buscar promover a saúde e a prevenção, já que a doença é fruto
de muitos fatores de risco somados, como a presença de hábitos. Esse
conceito também é utilizado em outros países.
Tivemos ainda mais uma providência tomada pelo governo
(BRASIL, 2009), criando a PNH - Política Nacional de Humanização
da atenção, para orientar o trabalho no SUS, com o programa
Humaniza SUS. Seu objetivo foi valorizar a atenção nos atendimentos
em sua dimensão subjetiva, e também seu aspecto coletivo de
integração com a sociedade, mudando o antigo conceito de doença
e de isolamento do paciente-usuário e sempre levando em conta a
humanização no atendimento. O aspecto de atenção aos direitos
e cidadania também foi reforçado, assim como a participação do
coletivo para exercer um controle na prestação de serviços.
12 U1 - Políticas públicas
Assimile
Lembra-se do Princípio da Integralidade? É o cuidado do indivíduo como
um ser integral, e está se referindo à mudança de paradigma na Saúde.
Antes, por muito tempo (e ainda hoje, por parte de alguns profissionais),
tínhamos a visão de que nossos órgãos podiam ser tratados de forma
independente. Hoje sabemos que é preciso trabalhar em conjunto com
a intersetoriedade, buscando ajuda com outros profissionais da Saúde.
Afinal, a Saúde é um todo.
E do Controle Social, você se lembra? A sociedade e os usuários da Saúde
devem se atualizar sobre seus direitos, e você faz parte desse contingente
de pessoas que têm o direito de utilizar esses serviços de Atenção Básica.
Portanto, é importante manter-se informado de tudo o que tem relação
com você e sua família, seus amigos e vizinhos, que podem precisar de
auxílio e estão contemplados nessas Políticas.
U1 - Políticas públicas 13
muitas vezes, a “vontade política” dos gestores não é a mesma do
povo que deveria ser por elas beneficiado. Por isso é tão importante
a participação da população na formação dessas Leis de Políticas
Públicas, para que todos possam lutar por seus direitos e melhorar
os atendimentos às suas necessidades. Sandra, nossa companheira
de viagem, já está atordoada com tanta informação, mas gosta de
ouvir o que o Prof. Carlos ensina. Nós, assim como Sandra, vamos
continuar nosso estudo.
Reflita
Você conhece os serviços de saúde de sua cidade? Quais?
• Você acha que os Princípios da Política de Humanização realmente podem
ser vividos na prática dos atendimentos da Saúde que você conhece?
• Acredita que nossas Políticas Públicas atuais na área da Saúde podem
ser melhoradas, ou será que ainda devem ser efetivamente implantadas?
• Você se imagina exercendo um cargo dentro de algum serviço de
Atendimento à Saúde e ajudando, com seu trabalho, na busca pela
qualidade de vida dos usuários?
14 U1 - Políticas públicas
Cabe lembrar que essas práticas e leis devem partir também
daqueles a quem elas se destinam: os cidadãos.
Pesquise mais
Visite este site muito interessante sobre os vários aspectos da formação
profissional necessária para poder desenvolver um bom trabalho nas
áreas das Políticas Públicas.
PIRES, Ana Cláudia Tolentino; BRAGA, Tânia Moron Saes. O psicólogo
na saúde pública: formação e inserção profissional. Disponível em:
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-
389X2009000100013>. Acesso em: 20 set. 2015.
Pesquise mais
Estamos tendo no Brasil um crescimento na área de novos cargos da
Psicologia no Terceiro Setor. Conheça mais do assunto neste livro:
• COELHO, Simone de Castro T. Terceiro setor: um estudo comparado
entre Brasil e Estados Unidos. São Paulo: SENAC, 2000.
Este é um bom trabalho que apresenta o histórico da inserção do
Psicólogo nas PP:
• ZURBA, M. C. A história do ingresso das práticas psicológicas na
saúde pública brasileira e algumas consequências epistemológicas.
Universidade Federal Santa Catarina. 2011. Disponível em: <http://www.
fafich.ufmg.br/memorandum/revista/wp-content/uploads/2011/06/
zurba01.pdf>. Acesso em: 11 out. 2015.
U1 - Políticas públicas 15
Sandra achou interessante existir tantas oportunidades novas de
trabalho para ela. Já planejava contar para seus pais, como novidade,
essa história das Políticas Públicas e a Psicologia. E você, já parou
para pensar se tem alguma área da sua vida em que gostaria de ver
as Políticas Públicas melhorarem? Quais?
Sandra, quando chegou em sua casa, além de conversar com
seus pais sobre a aula do Prof. Carlos, foi rapidamente acessar a
internet para buscar alguma informação sobre o “Postinho” em que
ia fazer estágio – já havia se decidido, e também para pesquisar
quais Políticas Públicas atuavam naquele serviço.
Pesquise mais
É sempre interessante que você procure novas informações sobre esse
autoestudo.
Leia este texto para saciar sua curiosidade. ROMAGNOLI, R. C. A formação
dos psicólogos e a saúde pública: pesquisas e práticas psicossociais,
2006. Disponível em: <http://www.ufsj.edu.br/portal-repositorio/File/
revistalapip/RobertaRomagnoli.pdf>. Acesso em: 24 set. 2015.
Exemplificando
Como podemos experimentar os direitos presentes nas Políticas Públicas
da Saúde?
Já sabemos que todos temos o direito de usar os serviços do SUS,
através do atendimento nos CAPS (Princípio do Acesso Universal) e
outros serviços. Para tanto, é importante que tenhamos em mãos alguns
documentos: RG, Cartão SUS e comprovante de residência.
16 U1 - Políticas públicas
Não podemos negar que há muitos problemas para serem resolvidos.
Esse quadro é capaz de assustar quem desconhece o que está sendo
feito e o que ainda podemos fazer para melhorar a atual situação. Por isso,
é necessária uma formação profissional mais qualificada e consciente
do funcionamento das Políticas Públicas, pois temos muito a contribuir,
junto com os governos, na melhoria destes serviços. Você percebe
que temos muitos desafios nessa área; por isso, a conscientização
dos profissionais e gestores desses serviços deve, em primeiro lugar,
incentivar a participação junto aos usuários com o conhecimento de
seus direitos e de suas necessidades para novas práticas.
Há muito para conhecer nesse Campo das Políticas Públicas. Por
isso, vamos continuar juntos!
Vocabulário
SUS – Sistema Único de Saúde, no Brasil.
ONG – Organização Não Governamental.
UPA – Unidade de Pronto Atendimento.
CAPS – Centro de Atenção Psicossocial.
UPAS – Unidade de Pronto Atendimento à Saúde.
U1 - Políticas públicas 17
Para resolver o problema da Sandra, retome a seção “Não Pode
Faltar” de seu Livro Didático (LD) e busque seus pontos mais importantes.
Relembre que políticas públicas, como o próprio nome diz, são políticas
voltadas ao atendimento da população. Suas leis básicas são as que
regulamentam estes serviços – no caso da saúde, especialmente a
Constituição Federal, de 1988, e as leis orgânicas nº 8.080/90 e nº
8.142/90. Elas vão apresentar os princípios gerais do SUS: Acesso
Universal, Integralidade, Equidade, Descentralização e Controle Social.
Graças a seu esforço, você e a Sandra sabem agora mais do que
sabiam no início deste autoestudo sobre a Psicologia e Políticas
Públicas. Você mesmo pode estar se preparando para prestar um
Concurso Público, se assim decidir, mas é sempre bom estudar
mais. Veja o site indicado a seguir para seu aprofundamento.
Experiências em Psicologia e Políticas Públicas: Caderno do
II Prêmio Margarete de Paiva Simões Ferreira. Disponível em:
<http://www.crprj.org.br/site/wp-content/uploads/2016/04/2o-
premiomargarete.pdf>. Acesso em: 20 set. 2015.
Atenção
É importante que você perceba que neste modelo organizado pelo Ministério
da Saúde o foco não é mais a doença em si, e sim a saúde como produção
de vida, trazendo novas relações e maior fortalecimento do indivíduo como
participante de seu lugar de convívio. Não falamos mais de uma relação de
poder do profissional sobre “a doença” instalada no “paciente”, que só vai
buscar ajuda. Agora falamos de Centros de Atenção à Saúde, onde pessoas
devem receber “cuidados” e “atenção básica” ou mais específica, de acordo
com a necessidade do caso.
Ou seja, esse usuário já traz sua experiência, sua vivência e suas capacidades,
e recebe uma escuta que vai organizar com ele novas possibilidades de
“existir”. O objetivo é que o ser que sofre se reorganize para reocupar seu
espaço em suas inter-relações e produção social, ou seja, sua originalidade.
É também um resgate de sua cidadania e melhora da qualidade de vida.
Lembre-se
As políticas públicas no Brasil são articuladas por um conjunto de leis que
determinam o funcionamento do sistema. As mais importantes para o
SUS são a Constituição Federal e as leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90.
Avançando na prática
Temos outra Situação-Problema para Resolver em Políticas Públicas:
18 U1 - Políticas públicas
Seu avô recebeu de seu médico uma receita e, quando foi
até a farmácia, ficou abismado com o preço do medicamento.
Como você pode ajudá-lo a conseguir esse remédio usando
o que aprendeu em Políticas Públicas? Vamos pensar. Existem
alguns programas dentro da Secretaria de Saúde que envolvem
a distribuição gratuita de medicamentos, por meio do SUS. Mas,
como fazer para se informar melhor?
Com a receita de seu avô na mão, você tem duas opções. Ou
você vai pessoalmente a um CAPS próximo à região em que seu avô
mora (lembra por quê? É o princípio da territorialidade, que pede a
cada CAPS que atenda seus moradores regionais), ou você realiza
uma pesquisa na Internet para descobrir o telefone de um CAPS.
Seu trabalho: buscar informações e fazer um roteiro de passos
que seu avô terá que seguir para chegar à Farmácia de Alto Custo.
Lembre-se de que seu estudo de PP pode ser muito útil. Então,
aproveite e passe a informação conseguida para seu avô e para seu
professor e colegas. Uma dica: procure pesquisar no site: <www.
blog.saude.gov.br>. (Acesso em: 25 out. 2015).
Seu avô vai ficar muito contente com você e seu aprendizado.
Bom trabalho!
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações. Realize as atividades e depois as compare com as de seus colegas.
“Saindo em campo”
1. Competência
Conhecer políticas públicas e programas sociais.
fundamentos da área
Que o aluno saiba relacionar os princípios das PP com as
2. Objetivos de demandas da sociedade para os serviços de Psicologia.
aprendizagem Pesquisar e apresentar sugestões para a solução de
problemas.
3. Conteúdos
As Políticas Públicas sobre Saúde no Brasil.
relacionados
O professor determinou que você montasse uma
entrevista que contivesse pelo menos três itens
4. Descrição da SP importantes como os princípios básicos do SUS, para
verificar se esses princípios estão sendo cumpridos
naquele serviço.
U1 - Políticas públicas 19
Você deveria montar um questionário com 5 perguntas
e procurar algum atendente em um CAPS próximo
à sua casa que as respondesse rapidamente. Você
deveria anotar as respostas, analisá-las e fazer uma
5. Resolução da SP síntese. Poderia trocar com seus colegas de classe suas
experiências. O objetivo é saber: qual é a equipe de
trabalho, do quê esse Serviço tem maior carência, quais
são os cuidados dessa Unidade, se os princípios do SUS
estão sendo aplicados etc.
Lembre-se
É muito importante a conscientização dos profissionais e gestores dos
serviços de saúde, além do incentivo à participação dos usuários.
Vamos fazer uma pesquisa em sua rua ou com seus familiares e colegas
sobre quais são as Políticas Públicas que eles utilizam em seu cotidiano,
e pedir que pensem em propostas para melhorar esses serviços. Escreva
um texto a partir dessa pesquisa, utilizando os conhecimentos até aqui
adquiridos e faça um resumo crítico de pelo menos três ideias que julgue
plausíveis de serem implantadas. Dê para seu professor analisar e, quem
sabe, até enviar para algum político. Você poderá iniciar um bom trabalho
nas Políticas Públicas.
20 U1 - Políticas públicas
a) O que os políticos falam em época de eleições.
b) Leis que regulam os serviços do Governo para o público.
c) Normas para passar em Concurso Público.
d) Leis que atrapalham o Governo.
e) Aquilo que o povo fala em época de greves.
U1 - Políticas públicas 21
Seção 1.2
O psicólogo atuando nas políticas públicas
Diálogo aberto
Olá, caro aluno! Estamos na segunda seção de nosso autoestudo.
Aqui veremos o Psicólogo atuando nas Políticas Públicas: na Atenção
Básica, Secundária e Terciária, e nas ONGs.
Lembre-se de que na seção anterior você estudou com Sandra: a
Definição de Políticas Públicas, suas principais leis e seus princípios
básicos na área da saúde.
Agora vamos estudar o que você e Sandra precisam conhecer
sobre: o psicólogo atuando nas Políticas Públicas, na Atenção
Básica, Secundária e Terciária, e nas ONGs.
Esta é a situação-problema desta seção: Sandra tem que compreender
a distribuição de responsabilidades em cada equipamento de saúde, de
acordo com a legislação. Além disso, tem que compreender o papel
do psicólogo em cada um destes lugares do serviço público e em
outras frentes de trabalho, como as ONGs.
Você lembra que na seção anterior vimos que temos hoje uma
realidade na sociedade brasileira que interessa a nós Psicólogos?
Sim, estou falando da defasagem entre a necessidade de novos
profissionais trabalhando na Saúde Pública e os ensinamentos
oferecidos aos Psicólogos em formação para exercer esses cargos.
E nossa amiga Sandra, como anda? Você sabe o que ela tem feito
junto às Políticas Públicas? Ela está estudando, é claro! Como sabe,
Sandra decidiu prestar o Concurso Público para trabalhar na Área da
Saúde. Quando foi fazer sua inscrição, descobriu a exigência do Edital
sobre o conhecimento das funções que um Psicólogo pode exercer
na Saúde Pública. Sandra percebeu que vai ter que se aprofundar
nos estudos. Buscou mais ajuda nas aulas de Políticas Públicas, pois
está muito decidida a passar nesse Concurso. Nosso trabalho será
acompanhar Sandra na busca de informações sobre os temas do
Edital do Concurso, a fim de prepará-la para uma boa classificação.
22 U1 - Políticas públicas
em muitas áreas dentro da Saúde, como: centros de atendimento
psiquiátrico, hospitais e os programas do SUS, nos quais também
atua para prevenir doenças.
No caso de Sandra e o Concurso Público, ela só sabe quais são
os temas do Edital, nada mais que isso. Então, vamos começar
vendo as possibilidades de trabalho para o Psicólogo nessa Área da
Saúde Pública, um dos temas desse Edital. Por falar em Saúde...
Você já deve ter ouvido falar da Psicologia Hospitalar. Sua
atuação poderia ser incluída nos preceitos da Clínica, mas pede
uma especialização. Na instituição hospitalar é possível realizar um
trabalho de prevenção secundária e terciária.
Temos também a Psicologia da Saúde, que vem atuando na
prevenção nos dois níveis de Atenção. A Psicologia Clínica sempre
foi muito estudada, no entanto, nos dias de hoje, precisamos notar
que a prática da psicoterapia individual, tida como o centro de nossa
atividade profissional, nem sempre será a forma mais adequada
para atender às demandas, que são diferentes. A formação dos
estudantes também não os conscientiza sobre problemas que sofre
grande parte de nossa população. Com suas condições precárias de
vida, está sujeita a todos os tipos de males, enfim, vive onde quase
tudo é deficitário, e ela também precisa de nós, Psicólogos.
Assimile
• É importante que você saiba que nossa profissão de Psicólogo só
recebeu em 1997, do Conselho Nacional de Saúde, por sua Resolução
nº 218, o reconhecimento como Profissional de Saúde de Nível Superior,
assim como outros profissionais.
• É dessa resolução que derivam nossas obrigações como Profissional
da Saúde.
• No Sistema SUS ainda aguardamos a oficialização dentro da Atenção
Matricial, que é composta só por médicos e enfermeiros.
U1 - Políticas públicas 23
Atenção ao indivíduo como um todo, inserido em sua realidade
psico-física-sociocultural e até política.
Você percebe por que Sandra toda hora se lembrava das pessoas
de sua família e vizinhança com problemas. Ela sabia que para ajudar
realmente uma pessoa é preciso que essas variáveis de Sofrimento
sejam todas consideradas e atendidas. Você deve estar pensando:
mas como a Psicologia vai dar conta de tudo isso? Pois, é, não é
uma tarefa fácil. Mas antes, no passado, tínhamos uma psicologia
baseada em um modelo psicodinâmico, que era descontextualizado
e desconectado das realidades macrossociais da Saúde no Brasil.
Era uma atividade mais voltada para uma minoria.
Hoje já temos uma nova consciência como classe profissional
(BOCK, 2003), com novos questionamentos, e transformações. O
importante é que estamos menos alienados da realidade de nosso
povo, com um olhar mais amplo, mais sanitarista e global para
tentarmos ser agentes sociais de mudança. Então, surge a pergunta:
Como deveríamos promover a formação desses psicólogos para
atuar em PP? Oferecendo ao estudante conhecimentos teóricos
e práticos sobre bases bio-sociopsicológicas da saúde/doença;
técnicas para avaliar, assessorar e intervir na saúde; políticas públicas;
trabalho multidisciplinar; ética e leis e metodologia de pesquisa.
Você já percebeu que o SUS é um espaço muito rico para o
desenvolvimento de competências importantes para o profissional.
Sua diversidade de demandas suscita a busca de práticas diferentes
das tradicionais com ênfase na doença e psicopatologia, já que
se baseia em um modelo assistencial e de equipe interdisciplinar.
Voltando à dinâmica do SUS, você sabia que existe uma diferença
entre os termos Atenção Básica e Atenção Primária?
A Atenção Básica trata de ações mais amplas dentro da Saúde
Pública do País (BRASIL, 2013). Envolve a promoção e proteção da
saúde, o diagnóstico, a reabilitação, o tratamento e a manutenção
da saúde. Ela tem suas ações pautadas na prática da vigilância
preconizada pelo SUS e orientada pela Estratégia de Saúde da
Família. É chamada de porta de entrada no atendimento do SUS,
sendo realizada através do CAPS. Esse primeiro atendimento é o
que vai servir de referência para organizar os demais serviços na
rede de atenção, orientando e encaminhando o usuário, quando
necessitar, para outros serviços de atenção secundária ou terciária,
como nos casos de saúde mental e suas ações cotidianas de
tratamento. A Atenção Primária tem seu significado utilizado a nível
internacional e de modo mais específico, sendo relativo a ações
24 U1 - Políticas públicas
de promoção e prevenção na saúde coletiva. Mas os dois termos
podem ser sinônimos no Brasil, pois o primeiro estágio da Atenção
trata da organização de todo o sistema e de suas ações integrais.
Hoje o psicólogo que trabalha no SUS se depara com outros
problemas que não fazem parte da clínica, e sim das condições de vida
do cidadão. Por isso, suas atividades psicoterápicas vão sendo adaptadas
de acordo com a necessidade de seu público (CREPOP, 2008), utilizando
outras modalidades, como terapia breve, de apoio, individual e grupal.
Isso quer dizer que o profissional vai poder intervir e levar sua ajuda
também àqueles sem condições de pagar por isso e em seu território.
O Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2014) especifica que cabe
aos profissionais da área da Saúde, em primeiro lugar, “realizar seus
serviços dentro dos mais altos padrões de qualidade e dos princípios
da ética e bioética”, em nível individual e coletivo, podendo atuar na
prevenção, proteção e reabilitação da saúde psicológica e psicossocial.
Na prática, no nível de Atenção Primária, encontramos já há algum
tempo o psicólogo atuando na equipe mínima, ou equipe matricial,
no Sistema Penitenciário. É muito bom para a saúde pública que o
psicólogo tenha sido integrado pelo SUS, pois, tendo como seu eixo
norteador a integralidade do paciente-usuário e a interdisciplinaridade,
faz crescer, com outros saberes, o exercício da cidadania.
Atenção Secundária é a parte da Rede de Atenção que cuida do
atendimento mais especializado de casos crônicos ou de alto risco,
chamados de média complexidade. O usuário recebe o diagnóstico
com exames, tratamento terapêutico, odontológico, nutricionista,
psicológico, de urgência e emergência, cirurgias, internações,
tratamento ambulatorial com médicos especialistas e também sua
medicação. Nessa instância de Atenção Secundária é que teremos o
atendimento de saúde mental, quando necessário. Oferece ainda o
tratamento de casos de doenças infectocontagiosas – AIDS, HIV, sífilis,
cardiopatias, diabetes, hipertensão e outras. Ocorre nos NAPS/CAPS
(Núcleo de Atenção Psicossocial e CAPS), nas Equipes de Apoio em
Saúde Mental e no NASF (Núcleo de Assistência à Família), setores que
desenvolvem o Apoio Matricial e a atenção à Saúde Mental dentro da
Atenção Básica. A atenção secundária também obedece à diretriz de
territorialidade, como referência no atendimento de todo o Município.
Você sabia que alguns serviços de atenção secundária podem
ser contratados ou conveniados? Nesses casos eles são chamados
de terceirizados, assim como serviços pactuados com outros
municípios quando o Governo não conta com o serviço necessitado
em sua Rede Pública.
U1 - Políticas públicas 25
Para facilitar essas transições entre os serviços de Atenção em seus
níveis primário, secundário e terciário, o SUS mantém um cadastro
chamado SISREG - Sistema Nacional de Regulação, que mantém as
informações completas do usuário e de seu processo de atendimento
– seu prontuário eletrônico, assim como uma agenda também
informatizada. Ao paciente que necessitar de transporte para outras
unidades do SAMU será disponibilizada uma ambulância do UPAS.
O trabalho do Psicólogo no Nível Secundário de Atenção se
dá de várias formas: no atendimento e promoção do usuário,
na prevenção, no diagnóstico, no tratamento, na reabilitação, na
orientação de sua família e na coordenação de práticas em parceria
com os demais especialistas da Unidade.
Sandra, e acredito que você também, ficou impressionada com
tantas coisas novas nas PP.
“E o que é Atenção Terciária?”, perguntaram Sandra e seus colegas.
Como vimos, à atenção primária cabe resolver a maioria dos problemas
da saúde da população, e também cabe a ela encaminhar o usuário
que necessite de graus de atenção de maior complexidade para o
nível secundário, com técnicos especializados e maiores recursos
diagnósticos. E, nos casos ainda mais complexos, o usuário será
encaminhado para o Terceiro Nível, ou Atenção Terciária. Os principais
atendimentos nessa área de Atenção são os procedimentos cirúrgicos
em geral e o atendimento a portadores de doenças crônicas.
É nesse nível que são atendidos os pacientes com crises de
saúde mental, e, em casos de emergência, esse nível poderá ser
considerado a porta de entrada no SUS, sem necessidade de contato
prévio com a equipe de profissionais para ser atendido. Isso quer dizer
que a família poderá levar o paciente direto a esses locais durante
uma crise, onde encontrará médico psiquiatra e a medicação para
o caso. Após o atendimento de emergência, essa equipe passará
o relato para a Equipe de Saúde da Família, a fim de organizar os
demais serviços. Também temos os tratamentos quimioterápicos,
radioterapia, medicina nuclear, terapia renal substitutiva, o processo
transexualizador em todas as suas etapas, atenção à gestante de alto
risco, atenção ao paciente grave, neurologia, cardiologia e outros,
como colocação de prótese e órtese. Esse nível é integrado por CAPS
III, Hospitais e Ambulatórios, para os casos que necessitem de alta
tecnologia e de alto custo. Sua atuação se estende geograficamente
à Macrorregião, pelo grau de investimento físico-técnico e por possuir
profissional especializado e serviço mais sofisticado.
Por causa da exigência de maiores capacitações e treinamentos
26 U1 - Políticas públicas
(CREPOP, 2008), para trabalhar na Atenção Terciária o Psicólogo
deve possuir outro nível de especialização, como é o caso da
Psicologia Hospitalar.
Reflita
Atenção
Atenção Básica: É o primeiro atendimento, que vai servir de referência
para organizar os demais serviços. Também é chamada de Atenção
Primária e se dá nos CAPS.
Atenção Secundária: É onde ocorre o atendimento do usuário em
internações e cirurgias, com situações de emergências e urgências, além
do atendimento de casos crônicos, doenças infectocontagiosas, casos
de alcoolismo e drogas, entre outros. Ela se dá nos CAPS-AD, NAPS/
CAPS, NASF e Equipes de Apoio em Saúde Mental.
Atenção Terciária: É para onde são encaminhados os casos de maior
gravidade e alto risco, ou alta complexidade. Engloba próteses e órteses,
crises de pico de Doença Mental, tratamento de quimioterapia, radiologia,
casos de emergência e de necessidade de alta tecnologia. Ela se dá nos
CAPS III, Hospitais e Ambulatórios.
U1 - Políticas públicas 27
E o Trabalho em ONGs, como é feito? Como vimos antes, a
sociedade está mais voltada em nossos dias para o compromisso
social, e a Psicologia caminha com ela na busca de novos horizontes
de atuação. Com as novas Políticas Públicas voltadas para a Assistência
Social abriram-se mais desafios para o Psicólogo. O Terceiro Setor é
formado por ONGs – Organizações Não Governamentais, OSCIPs
– Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, Entidades
Filantrópicas, Organizações sem fins lucrativos e Organizações
paraestatais de modo geral, que atuam em parcerias com o Governo.
Mas por que é chamado de Terceiro Setor? Porque o Primeiro
Setor é o Estatal, e o Segundo é o Privado. Então, o Terceiro Setor
é formado pelas empresas ou organizações privadas da sociedade
que buscam a produção de bens públicos, que são de interesse
público. Elas trabalham com a assistência social, atividades de lazer,
profissionalização, ações de conscientização, educação sexual,
esporte, cultura, meio ambiente e muitas outras ações. Temos aí,
além das ONGs, os institutos, as Organizações da Sociedade Civil de
Interesse Público (OSCIPs), as associações profissionais, as fundações,
as entidades de classe, dentre outros. Enfim, são entidades que
atuam em diferentes áreas sociais. Também vemos nesse Setor as
entidades paraestatais ou de cooperação, ou seja, elas não estão na
administração pública, mas trabalham com o Estado desempenhando
atividades para o benefício do público. São os conhecidos serviços
sociais autônomos, tais como o SENAI, o SESC, o SESI, etc.
É necessário ao profissional buscar se reinventar para atender as
peculiaridades e diferentes demandas desse novo campo de atuação,
que engloba desde a organização da ONG até o atendimento
psicoterápico individual ou em grupo, a coordenação de diversas práticas
socioeducativas, a supervisão dos membros em sua atuação política e
outras tarefas afins. Esse é um campo novo e muito promissor no país.
Pesquise mais
O psicólogo que trabalha no SUS se depara com outros problemas que
não fazem parte da clínica, mas dizem respeito às condições de vida do
cidadão. Leia mais em:
BOCK, Ana Maria B. Psicologia e o compromisso social. São Paulo: Cortez, 2003.
É sempre bom estudar mais. Então, aqui vai outra dica para
seu estudo: ZURBA, Magda do Canto (Org.). Psicologia e Saúde
Coletiva. Florianópolis: Tribo da Ilha, 2012. Disponível em: <http://
psicologia.paginas.ufsc.br/files/2012/06/Miolo_Psicologia-e-Saude.
pdf>. Acesso em: 6 out. 2015.
28 U1 - Políticas públicas
Pesquise mais
Neste artigo você vai encontrar uma reflexão sobre como evoluiu a
Psicologia em nossa história, e por consequência como foi construída
nossa identidade profissional. Vale a pena ler! FIGUEIREDO, Luís Claudio
M.; DE SANTI, Pedro Luiz R. Psicologias uma (nova) introdução: uma
visão da psicologia como ciência. São Paulo: EDU, 2009.
Exemplificando
Vamos ver alguns Exemplos Práticos de Atuação do Psicólogo na Saúde.
Como Psicóloga do SUS, Sandra pode:
• Fazer Grupos de Psicoprofilaxia para, por exemplo, prevenir agravantes
de doenças, e levá-los para todos os níveis de atenção.
• Trabalhar com Gestantes, preparando-as psicologicamente para tornar
o seu parto natural indolor.
• Trabalhar nos Centros de Nefrologia, conforme você viu na Webaula.
U1 - Políticas públicas 29
como as Organizações Não Governamentais e as OSCIP, que
normalmente atuam de maneira complementar ao Estado.
Estas são as ideias principais que Sandra precisa compreender
para prestar seu concurso.
Além destes tópicos, já presentes neste LD, é possível buscar
conhecimento e exemplos em outras fontes, como professores,
sites de concursos, outros livros etc.
Atenção
O trabalho das ONGs é muitas vezes complementar à ação do Estado e
pode ser um interessante campo de atuação para o psicólogo.
Lembre-se
O Psicólogo deve aproveitar todas as oportunidades de aprendizagem
oferecidas pelo Conselho Federal de Psicologia para aprofundar-se nas
novas práticas dentro dos programas do SUS.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois as compare com as de seus colegas.
30 U1 - Políticas públicas
Você pode buscar as informações também por telefone,
identificando-se como um aluno da disciplina de Políticas
Públicas. Em seguida, imprima as informações de modo
que possam ajudar a todos, até seus familiares e vizinhos.
Lembre-se
U1 - Políticas públicas 31
c) O Atendimento Básico só é feito na Base Comunitária, e o Primário, não.
d) O Atendimento Primário vem primeiro, e depois vem o Básico para o usuário.
e) O Atendimento Básico nunca é feito junto com o Primário.
32 U1 - Políticas públicas
Seção 1.3
CREPOP - centro de referência técnica em
psicologia e políticas públicas
Diálogo aberto
Como você sabe, temos acompanhado nossa amiga Sandra, que
está estudando muito para ter uma formação melhor e conseguir
estar preparada para uma boa colocação profissional. Sandra, com os
problemas de sua família e de sua vizinhança na cabeça, vai estagiar
no Posto de Saúde para adquirir mais experiência profissional e se
familiarizar com suas práticas e concepções de atendimento, além de
estudar sobre como trabalhar com Assistência Social no Setor Público.
Na Seção 1.1 já iniciamos nosso percurso no território das
Políticas Públicas dentro da Saúde. Na Seção 1.2 estudamos o
funcionamento do SUS e seus instrumentos de Atuação. E agora,
nesta Seção 1.3, vamos com Sandra conhecer o CREPOP - Centro
de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas. Este órgão
foi criado pelo CFP - Conselho Federal de Psicologia para orientar os
profissionais com Normas e Metas de trabalho dentro das Políticas
Públicas. Também estudaremos sobre sua origem, objetivos e
diretrizes básicas, além de sua relação com o SUAS - Sistema Único
de Assistência Social e o CRAS.
Nossa Situação-Problema consiste em ajudar Sandra a: pesquisar
informações sobre os serviços dentro do SUS estudados através
do CREPOP, seus objetivos e diretrizes básicas, e sua integração
com o CRAS e o SUAS. Assim, Sandra e você terão acesso a muitas
informações úteis sobre o CREPOP e seu trabalho.
U1 - Políticas públicas 33
Operamos com a ideia de que saúde não é um objeto que
encontramos através dos tempos, independentemente da
relação que se tem com ele e do modo como é acessado.
Estamos falando de algo que está perenemente sendo
forjado: as regras, as ações. [...] A Psicologia, ao tornar-se
parte do dispositivo da saúde, cria ou recrudesce certos
modos de viver, forjando subjetividades (MEDEIROS, 2005).
Assimile
O CREPOP tem o objetivo de manter diálogo com os profissionais que
atuam nas Políticas Públicas em todo o território nacional. Para isso ele
conta com o Programa de Pesquisa Permanente em Políticas Públicas,
possibilitando assim a presença contínua do CFP e a busca de novas
áreas de trabalho para o Psicólogo.
OBJETIVOS DO CREPOP:
34 U1 - Políticas públicas
[Sua] ideia fundamental é produzir informação qualificada
para que o Sistema de Conselhos possa implementar novas
propostas de articulação política visando maior reflexão e
elaboração de políticas públicas que valorizem o cidadão
enquanto sujeito de direitos, além de orientar a categoria sobre
os princípios éticos e democráticos para cada política pública.
U1 - Políticas públicas 35
• Atentar para as oportunidades de Atuação que podem surgir e
ir à busca delas.
• Manter espaço de interlocução com a formulação, gestão e
execução dessas PP.
Pesquise mais
Neste site você encontrará um bom artigo sobre a atuação do Psicólogo
no SUS como gestor: Senhoras e senhores gestores da Saúde, Como
a Psicologia pode contribuir para o avanço do SUS. Organização: CFP.
Colaboradores: MAIA, A. H. N.; TONDIN, C. F.; CILIBERTI, M. E.; BARROS,
M. N. S. Brasília, 2011. Disponível em: <www.pol.org.br>. Acesso em: 14 out. 2015.
36 U1 - Políticas públicas
A construção desses documentos do CREPOP é feita sob a forma
de consulta pública, com várias maneiras de coleta de informações:
questionários online, seminários, entrevistas etc., dando assim a todos
a oportunidade de participar como protagonistas de sua formação,
acrescentando em suas experiências e saberes. Essa atitude tem como
consequência a melhor capacitação de nosso profissional. Você também
não gostaria de produzir algo importante nas Políticas Públicas?
Você e qualquer pessoa podem contribuir para somar boas ideias
às pesquisas do CREPOP. Pesquise mais sobre o assunto no site
do CREPOP. Disponível em: <http://crepop.pol.org.br/novo/2192_
marcos-logicos-e-legais-em-pdf>. Acesso em: 10 out. 2015.
U1 - Políticas públicas 37
Sandra começou novamente a pensar naquelas pessoas tão
carentes que sempre vê na rua, escondidas pelos cantos como animais
indefesos à espera de alguém que se digne a olhar para seus corpos
“invisíveis” e dar-lhes alguma migalha de suas “moedinhas”, se possível
sem encará-los. Pensava se como psicóloga poderia fazer algo mais
que isso. A condição de vulnerabilidade social de grande parte de
nossa população também pode ser alterada por ação dos profissionais
da Psicologia. Atuando no CRAS/SUAS, o Psicólogo deve ter como
objetivo fortalecer os recursos subjetivos dessas pessoas tão carentes,
e, com informações e ações, ajudá-los a sair da vulnerabilidade em
que se encontram. “Nada fácil!”, pensou Sandra, “Mas como seria bom
ajudar ao menos uma pessoa com seu trabalho!”.
Vocabulário
CREPOP – Centro de Referência Técnicas em Psicologia e Políticas Públicas.
CRAS – Centro de Referência em Assistência Social.
SUAS – Sistema Único de Assistência Social.
LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social.
PNAS – Política Nacional de Assistência Social.
NOB – Normas Operacionais Básicas.
Pesquise mais
38 U1 - Políticas públicas
A Assistência Social deixa o caráter anterior de órgão que atua em
benevolência de alguns, dependente da bondade e caridade de outros, para
transformar-se em um direito do cidadão e responsabilidade do Estado.
Surgiram, então, vários programas governamentais (alguns até
eleitoreiros) tendo a Assistência Social como tema de sustentação.
Como exemplo, temos o programa “Bolsa Família”, que oferece
um benefício financeiro à família de baixíssima renda, que, por sua
vez, deve seguir algumas “condicionalidades”, como vacinar suas
crianças e mantê-las na escola. Caso essas exigências não sejam
cumpridas, o benefício é cortado ou suspenso até que a família
retorne às condições necessárias.
A partir de então, em 2004, instituiu-se no Brasil a PNAS – Política
Nacional de Assistência Social (PNAS, 2004), contendo as bases da
estruturação do SUAS – Sistema Único de Assistência Social. Já em
2005, o Governo legislou sobre seu financiamento e gestão, ocasião
em que a PNAS passou a ser operacionalizada pelo Sistema Único de
Assistência Social. Tivemos em 2006 a NOB/RH - Norma Operacional
Básica. Em 2009, criou-se a Tipificação Nacional de Serviços
Socioassistenciais, e, mais tarde, em 2012, a nova NOB/SUAS.
Exemplificando
Na Vara de Família o psicólogo é chamado para assistir a uma das
partes envolvidas em um conflito e dar seu parecer diagnóstico sobre
os envolvidos, como no caso de pais que ao se separarem brigam pela
guarda do filho, acusando um ao outro de maus tratos à criança. Cabe
ao psicólogo analisar com cuidado a situação real em que vive essa
criança, como ela sente a figura do pai e da mãe em sua subjetividade
e também a atitude e os sentimentos de cada um deles pelo o filho.
Daí decorrerá a produção de um Laudo de Perícia Psicológica, que será
entregue ao Juiz da Vara de Família, e a orientação aos pais e à criança –
o ser mais frágil nessa situação. Todo o detalhamento do passo a passo
desse caminho, como as técnicas de diagnóstico a serem utilizadas e a
formatação desse Laudo, pode ser encontrado nas Referências Técnicas
para a Prática de Psicólogos, no site do CREPOP.
U1 - Políticas públicas 39
Faça você mesmo
Como estamos estudando a ação do CREPOP como mediador das ações
do Psicólogo nas PP, você vai realizar uma nova pesquisa para saber em
que outras áreas e em que campos de atuação já foram referenciados
nossos trabalhos. Faça um resumo com esses tópicos.
40 U1 - Políticas públicas
são resolvidos judicialmente casos com uma complexidade maior,
encaminhados pelos CREAS, Fundação Casa etc. Pesquise no
LD estes e outros casos e verifique se realmente compreendeu a
evolução dos serviços prestados ao longo do tempo.
Lembre-se
As ações do CREPOP têm o objetivo de auxiliar os Psicólogos em seus
procedimentos junto às Políticas Públicas. Portanto, o CREPOP fornece ao
Psicólogo material para consulta e diretrizes para ação junto à Assistência Social.
Atenção
A criação do CREPOP ampliou as contribuições de novas experiências
e pesquisas, uma vez que o Centro aceita propostas de novos trabalhos
dentro das Políticas Públicas.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar em seu trabalho. Realize as atividades e depois
as compare com as de seus colegas.
U1 - Políticas públicas 41
Lembre-se
O CFP orienta o Psicólogo que atua junto à Assistência Social criando em
2014 a CONPAS: Comissão Nacional de Psicologia na Assistência Social.
Vale a pena saber mais sobre o assunto. Disponível em: <http://conpas.
cfp.org.br/>. Acesso em: 8 out. 2015.
42 U1 - Políticas públicas
3. Uma das três Diretrizes Básicas do CREPOP é a Pesquisa Permanente em
Políticas Públicas, que fala sobre a necessidade de o Profissional de Psicologia
manter-se sempre atualizado e informado em seu campo de atuação.
Quais são as outras duas diretrizes básicas do CREPOP?
a) Recurso de Gestão e Investigação da Prática Profissional.
b) Unidades Estaduais e Investigação da Prática Profissional.
c) Campo de Trabalho e Pesquisa Permanente.
d) Informação e Trabalho do Psicólogo.
e) Banco Social e Políticas Públicas.
U1 - Políticas públicas 43
Seção 1.4
A atuação do psicólogo junto ao C.R.A.S.-S.U.A.S.
Diálogo aberto
Estudamos que existe uma visível defasagem entre a formação de
profissionais de Psicologia e as novas demandas das Políticas Públicas e
do Terceiro Setor. Acompanhamos Sandra, um exemplo personificado
desse fato. Finalmente, depois de dois meses, o dia do Exame chegou.
Nesse momento Sandra já estava bem mais preparada e até com mais
prática, proporcionada pelo Estágio no CAPS. “Ai, que medo!”, pensava
Sandra quando foi publicado o resultado do Concurso da Prefeitura, já
que ela ia finalmente saber se foi ou não classificada. Suspense! Alegre-
se, caro aluno, pois com sua ajuda ela conseguiu ser aprovada! Valeu a
pena todo o esforço com este autoestudo bem feito, que você também
conquistou com ela! Agora, Sandra já sabe que foi locada para trabalhar
em uma Unidade de Saúde e Assistência Social.
Com o novo emprego, surge uma nova Situação-Problema: Sandra
precisa conhecer mais sobre o tipo de Atendimento do SUAS e descobrir
o que um psicólogo faz no CRAS. Vamos ajudá-la novamente, buscando
mais informações sobre a atuação do Psicólogo junto à Assistência
Social. Vamos também pesquisar sobre os princípios do SUAS e como
se relaciona com outros profissionais (interdisciplinaridade) e com outros
setores (intersetorialidade). Estes são elementos importantes para a
resolução das demandas de seus usuários.
Vimos nas seções anteriores as Políticas Públicas dentro da Saúde,
o SUS, o CREPOP – Centro de Referência Técnica em Psicologia e
Políticas Públicas e sua relação com o CRAS e o SUAS.
Em especial, na Seção anterior (1.3) estudamos: a formação do
Sistema Único de Assistência Social (SUAS) do Brasil, a Política Nacional
de Assistência Social (PNAS), o CRAS, o CREAS e o Sistema Nacional de
Informação (SNI) – Rede SUAS.
Nesta Seção 1.4, última de nossa primeira unidade, vamos nos
aprofundar no estudo da atuação do Psicólogo junto ao CRAS - Centro
de Referência de Assistência Social e no SUAS - Sistema Único de
Assistência Social. Vamos aprofundar esse estudo com seus princípios: a
interdisciplinaridade e a intersetorialidade.
44 U1 - Políticas públicas
Garanto que você vai gostar do campo da Assistência Social.
Podemos começar!
U1 - Políticas públicas 45
Vamos encontrar no CREPOP (2007) a seguinte definição: “A
prática interdisciplinar é uma prática política, um diálogo entre pontos
de vista para se construírem leituras, compreensões e atuações
consideradas adequadas, e visa à abordagem de questões relativas ao
cotidiano, pautadas sobre a realidade dos indivíduos em seu território”.
Já a diretriz de Intersetorialidade orienta o trabalho na busca da
integração e articulação do Serviço com os demais Órgãos Setoriais
oferecidos pela rede socioassistencial e com as demais políticas. Um
exemplo da ação dessa diretriz é o caso em que o usuário precisa da
ajuda do CREAS para encontrar um lugar para morar, enquanto passa
por tratamento como usuário de drogas ou álcool. O mesmo ocorre
quando há a necessidade de ajudar na confecção de documentos
novos, encaminhar uma pessoa ou família para outro estado ou cidade,
buscar por pessoas desaparecidas e detectar trabalho infantil escravo etc.
Muitas vezes, para que o SUAS possa atender ao princípio da
integralidade de seu usuário, é necessário recorrer à ajuda de outros
setores públicos, como Justiça, Educação, Trabalho e Saúde.
Assimile
A situação social em que vive o indivíduo interfere em sua subjetividade, e a
atuação em sua subjetividade deve empoderá-lo para agir nessas influências.
46 U1 - Políticas públicas
Assistência Social Básica, feito pelo CRAS; e o Atendimento em
Assistência Social Especial, para casos mais graves e complexos,
encaminhados para o CREAS.
Os principais programas desenvolvidos no CRAS são: Programa de
Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI);
Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS); Proteção Social a
adolescentes em cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade
Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade (MSE); Proteção Social
Especial para Pessoas Deficientes, Idosos e Famílias (PCDIF); Serviço
Bolsa Família; Programa Leite das Crianças; Oficinas de Contraturno
Escolar; Unidade de Acolhimento Adulto (UAA); Programa de Atenção
Integral à Família (PAI); Programa de Apoio Integral às Escolas (PAIE);
Grupo de Reorganização Familiar; entre outros.
Outro exemplo de ação conjunta da Assistência Social é a
Revista OCA. Trata-se de uma publicação da OCAS – Organização
Civil de Ação Social, sem fins lucrativos, cujo tema é a desigualdade
e a inclusão social das pessoas em situação de risco. O morador
de rua recebe dois terços do valor da revista e um por cento fica
para a publicação. A revista é dirigida para ser vendida somente por
moradores de rua (São Paulo e Rio de Janeiro), para que possam
promover o próprio sustento melhorando também sua autoestima.
Estes contatos possibilitam, além de alguma renda, o aumento de seu
convivo social com os leitores, propiciando sua inclusão social como
vendedores e até podendo facilitar a obtenção de um emprego.
Conheça mais sobre o projeto. Disponível em: <www.ocas.org.br>.
Acesso em: 30 out. 2015.
O SUAS também oferece a disponibilização de vários direitos ao
usuário com necessidade de ajuda, tais como:
O Benefício de Prestação Continuada de Assistência Social – BPC
é um direito garantido por lei que consiste em pagamento mensal
de um salário mínimo a idosos com mais de 65 anos de idade e
a pessoas com deficiência de qualquer idade que comprovem
ter renda per capita inferior a 1/4 de salário mínimo. É pago com
recursos do MDS/FNAS.
Programas como os restaurantes Bom Prato são realizados por
convênio firmado entre o Governo e entidades privadas, que oferecem
refeições pelo preço de R$1,00 (um real) à população carente e
recebem do Estado um repasse maior que o dobro desse valor.
U1 - Políticas públicas 47
Oferta de atendimento às famílias e indivíduos que se encontram em
situação de abandono, ameaça ou violação de direitos, necessitando
de acolhimento provisório fora de seu núcleo familiar de origem.
a) Serviço de Acolhimento Institucional, nas seguintes modalidades:
Abrigo Institucional; Casa-Lar; Casa de Passagem; Residência Inclusiva.
b) Serviço de Acolhimento em República.
c) Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora.
d) Serviço de Proteção em Situações de Calamidades Públicas e
de Emergências.
Os Conselhos Tutelares fazem parte dos órgãos que devem ser
avisados em primeiro lugar nos casos de violência contra crianças e
adolescentes, cabendo inicialmente a esse Órgão acolher a denúncia
desses casos, tanto as já confirmadas como as queixas de suspeitas.
Depois, a informação deve chegar aos CREAS. A partir daí serão
feitos os encaminhamentos necessários para outros equipamentos,
como o CAPSi, para que os usuários recebam atendimento da
equipe de saúde mental, psicológico, ambulatorial etc.
Pelo princípio da intersetorialidade podemos e devemos buscar
ajuda em Setores que vão complementar o atendimento, e depois,
no Ministério Público.
Alguns serviços são especializados no atendimento de
crianças e adolescentes vítimas de violência, que pode ser intra
ou extrafamiliar, como o NAECA - Núcleo de Atenção Especial à
Criança e ao Adolescente, onde as vítimas receberão atendimento
psicossocial. Porém, quando ainda não há confirmação da queixa, e
sim suspeita, as vítimas devem ir para o Núcleo de Atenção à Criança
e ao Adolescente Vítimas de Maus Tratos (NACA), onde receberão
atendimento e avaliação psicossocial da violência.
É importante lembrar que deixar de denunciar esses casos,
segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990), é
crime. Isso inclui o psicólogo em seus atendimentos, caso não
denuncie qualquer suspeita ao Conselho Tutelar.
Podemos ter também os casos encaminhados através da
Delegacia da Criança e do Adolescente, da Delegacia da Mulher e do
Juizado da Infância e Juventude. Eles serão atendidos na ordem de
entrada no serviço, se não tiverem outros componentes de agravo
que justifiquem sua priorização. Quando esses componentes existem
48 U1 - Políticas públicas
eles são considerados e até podem mudar o encaminhamento. Tais
componentes constituem-se nos agravantes de lesões físicas e
psicológicas, medidas judiciais e outros.
Como em muitas outras situações que exigem sigilo, o
psicólogo, médico ou assistente social pode e deve recorrer ao
CID - Código Internacional de Doenças, atualmente CID-10, para
diagnosticar o caso e manter o sigilo apontando as legendas
associadas. Por exemplo: 74.0 Negligência e abandono; 74.1 Sevícias
físicas; 74.2 Abuso sexual; 74.3 Abuso psicológico; 74.9 Síndrome
não especificada de maus tratos. É difícil para o usuário relatar
repetidamente as condições de sofrimento que o levaram até a
Unidade de Atendimento. Por isso, o cuidado com termos e com
a divulgação do diagnóstico deve ser muito considerado. O serviço
Público se refere ao tipo de acesso, e não à divulgação pública da
intimidade de cada indivíduo – ela é sempre sagrada!
Pesquise mais
Este é um vídeo curto e um bom exemplo de trabalho de equipe em um
caso atendido no CRAS/SUAS, em que atuam a interdisciplinaridade e a
intersetorialidade.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=R35tuFnBZwk>.
Acesso em: 18 out. 2015.
U1 - Políticas públicas 49
Pesquise mais
O que você acha de vermos mais um exemplo da atuação do Psicólogo?
Acompanhe neste vídeo: Vista a Camisa Contra a Violência - CRAS e
CREAS. TVRGB. Município de Sertãozinho. Disponível em: <https://www.
youtube.com/watch?v=8NgXLgBU2XU>. Acesso em: 27 out. 2015.
Reflita
O que você acha que seria importante fortalecer dentro de si mesmo
para executar um bom trabalho no CREAS? Você gostaria de trabalhar
junto à Assistência Social?
50 U1 - Políticas públicas
Segundo o CREPOP, o Psicólogo que atua no CRAS deve ter
sua atenção voltada para a prevenção de situações de risco,
atuando nas situações de vulnerabilidade do usuário. Para isso deve
trabalhar de forma a fortalecer os vínculos familiares e também
com a comunidade, buscando desenvolver suas potencialidades e
aquisições pessoais e coletivas.
Ainda o CREPOP (2008) nos lembra que já somos agentes de
transformação social, na medida em que a Psicologia hoje no
Brasil tem o compromisso de atuar também junto aos indivíduos
representantes da população ainda oprimida por condições
precárias de sobrevivência.
Mas como fazer para dar conta de toda essa complexidade de
problemas e conteúdos?
Pesquise mais
Leia mais sobre a orientação do CREPOP: Referências Técnicas para a
atuação do Psicólogo no CRAS/SUAS. Disponível em: <http://site.cfp.
org.br/wp-content/uploads/2007/08/cartilha_crepop_cras_suas.pdf>.
Acesso em: 24 out. 2015.
U1 - Políticas públicas 51
com o Sistema de Garantia de Direitos e com outras organizações
privadas parceiras.
O CREAS também capacita profissionais para uma abordagem
de forma especial, chamada de busca ativa, que pesquisa por locais
onde possa haver trabalho infantil, crianças em situação de rua ou
exploração sexual de crianças e adolescentes.
Outro serviço ofertado é o de Proteção Social Especial para
Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias: “destinado à
promoção de atendimento especializado a famílias com pessoas
com deficiência e idosos com algum grau de dependência, que
tiveram suas limitações agravas por violações de direito” (MDS, 2012).
Conforme vimos, os problemas são muitos, e nosso trabalho é
construir um lugar de significados novos de poder, onde o usuário
tenha sua subjetividade valorizada e tenha também a possibilidade de
satisfazer suas necessidades, de construir seus direitos, respeitando as
diferenças culturais, regionais, socioeconômicas, políticas e territoriais.
Para isso, a criação de vínculos será necessária, pois só assim
teremos um real envolvimento que facilitará o reencontro de sua
identidade como ser único e significativo em seu território.
Há ênfase na necessidade de estabelecermos vínculos com
o usuário, considerando-o uma pessoa com consciência, com
sentimentos e única. Somente desse modo conseguiremos
fortalecer dentro dessa pessoa a potência que a ajudará a sair de
seu estado de passividade para ir em busca de melhorias para si e
para a sua comunidade.
É por meio do vínculo que podemos mobilizar os afetos para a
mudança. É somente através do outro que somos comprometidos
socialmente e mais fortes. O fortalecimento do vínculo do
profissional e da equipe com o usuário se faz valorizado também
dentro do SUAS.
Sobre este aspecto temos ainda que observar a necessidade de o
indivíduo poder expressar suas angústias, necessidades e conflitos,
para evitar que um possível “sufocamento” seja transformado em
uma agressividade e se manifeste com maior facilidade.
No que se refere à esfera das palavras, encontramos a possibilidade
da busca por novos campos de sentidos para a existência e também
por novos campos de ressignificados.
52 U1 - Políticas públicas
O Conselho Federal de Psicologia orienta os Psicólogos que
já estão trabalhando ou vão trabalhar em Políticas Públicas e em
Assistência Social a buscarem parâmetros nos Marcos Normativos
da Assistência Social, citando o Guia de Orientação Técnica – SUAS
nº 1 (BRASIL, 2005), no qual encontram-se diretrizes sobre o PAIF
e outras ações. Um dos princípios fundamentais do exercício da
profissão de Psicólogo no SUAS é a promoção da qualidade de vida
das pessoas e, através delas, das coletividades.
Vocabulário
PSB - Proteção Social Básica.
PSE - Proteção Social Especial.
PSE/AC - Proteção Social Especial de Alta Complexidade.
MDS - Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
U1 - Políticas públicas 53
Lembre-se de que é essencial compreender a situação do
profissional no SUAS como um todo: as responsabilidades do psicólogo
em sua área de atuação, a parceria que os demais profissionais podem
oferecer em suas especialidades (a Interdisciplinaridade) e os tipos de
casos que compõem a demanda da Unidade.
Também é preciso conhecer quais são as outras questões
que estão presentes e necessitam de atenção para que a ajuda
ao usuário seja efetivada. E é nesse momento que o profissional
deverá procurar saber sobre o funcionamento e a aplicação da
Intersetorialidade no CRAS/CREAS/SUAS.
Lembre-se
Cada área de saber tem suas peculiaridades e deve ser respeitada como
componente importante na resolução das diferenças que cada caso
apresenta. Este é o princípio da troca de saberes na interdisciplinaridade.
Atenção
O acolhimento no SUAS vai ter suas características divididas entre funções
de assistencialismo e fortalecimento de direitos. Cabe ao profissional
saber dosar essas duas demandas do usuário mais necessitado.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho.
54 U1 - Políticas públicas
como este. Não sabe como começar, mas sabe que tem
regras para seguir e, pela gravidade da situação, vai ter que
pedir ajuda a outros profissionais e talvez a outros setores.
Vamos seguir os passos para a instrução necessária do
profissional:
• Investigar como é desenvolvido o PAEFI no Centro de
Referência Especializado de Assistência Social – CREAS.
• Consultar o CREPOP no Meta Programa associado.
• Consultar o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente.
5. Resolução da SP • Buscar informações de como deve ser feito o acesso ao
Conselho Tutelar, ativando a Intersetorialidade.
• Buscar associação com a Interdisciplinaridade do CREAS,
conversando com profissionais de outras especialidades e
com mais experiência no assunto.
• Reunir os dados das pesquisas, fazendo um roteiro com
os passos a serem seguidos para a intervenção.
Lembre-se
A Interdisciplinaridade está muito presente no trabalho dentro do SUAS, e
a Intersetorialidade também é fundamental para efetivar a ajuda ao usuário
em casos de maior complexidade. Cabe ao psicólogo saber utilizá-las.
U1 - Políticas públicas 55
2. Os Princípios do SUAS são: Universalidade, Gratuidade, Integralidade
da proteção social, Intersetorialidade e Equidade. Para o usuário isso
quer dizer que:
a) Pode ser atendido em todo o Universo sem pagar.
b) O SUAS garante que todo o serviço seja dado a todo cidadão, sem ônus
e com completude da proteção, recebendo ajuda de outros setores se
necessitar e sendo igual para todos.
c) Deve procurar em outro setor a ajuda de que precisa.
d) O usuário não pode ficar esperando que o Governo resolva sua vida.
e) O SUAS só pode atender a quem paga pelos serviços.
56 U1 - Políticas públicas
Referências
BOCK, Ana M. B. A psicologia a caminho do novo século: identidade
profissional e compromisso social. São Paulo: Estudos de Psicologia, 1999.
CRUZ, Lilian R.; GUARESCHI, Neuza. (Orgs.). O psicólogo e as
políticas públicas de assistência social. Petrópolis: Vozes, 2012.
SAWAIA, Bader B. Psicologia e desigualdade social: uma reflexão
sobre liberdade e transformação social. São Paulo: Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, 2009.
_____. Psicologia e compromisso social. São Paulo: Cortez, 2003.
_____. Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre
liberdade e transformação social. São Paulo: Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, 2010.
Bibliografia Complementar
COELHO, Jaciara Siqueira. Psicóloga do CREAS. Belo Horizonte, 2011.
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Código de ética do
profissional. Brasília: CFP, 2005.
______. Centro de referência técnica de psicologia em políticas
públicas. Brasília: CFP, 2006.
______. Referência técnica para atuação do psicólogo no CRAS/
SUAS. Brasília: CFP, 2008.
______. Prática psicóloga. Centro de Referência Especializado da
Assistência Social, CREAS. Brasília: CFP, 2012.
______. Referência técnica profissional do psicólogo. Centro de
Referência Especializado da Assistência Social, CREAS. Brasília: CFP, 2013.
______. Documentos de referência CREPOP – Temática Saúde.
Brasília: CFP, 2014.
SAWAIA, Bader Burihan. Psicologia e desigualdade social: uma reflexão
sobre liberdade e transformação social. São Paulo: Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, 2010. Disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=R35tuFnBZwk>. Acesso em: 20 out. 2015.
U1 - Políticas públicas 57
58 U1 - Políticas públicas
Unidade 2
Atenção básica
Convite ao estudo
U2 - Atenção básica 59
Como a população cresceu além do previsto – diante
da chegada dos novos moradores – o Centro de Saúde
não está conseguindo atender a demanda, o que deixa os
usuários insatisfeitos, a ponto de tratar mal os funcionários,
agredindo-os verbalmente e ameaçando-os. Essa situação
gera grande estresse na equipe que, em uma determinada
reunião, manifestou o desejo de recusa ao atendimento desses
moradores, a partir de um estereótipo segregador, afirmando
que "essas pessoas só sabem brigar".
Você, psicólogo da equipe, está nesta reunião. A pergunta
que todos – mesmo silenciosamente – fazem é: qual é o papel
do serviço público nesta conjuntura? E você se pergunta: e o
psicólogo no serviço público, como pode ajudar?
60 U2 - Atenção básica
Seção 2.1
A concepção do processo saúde/doença e o cuidado
Diálogo aberto
Nesta seção, vamos acompanhar a situação dos moradores do
novo bairro, o Residencial Alhures, que estão revoltados com a falta
de infraestrutura da prefeitura para atendê-los.
Você trabalha no Centro de Saúde e seus colegas também estão
insatisfeitos com a situação causada pelo aumento repentino da
demanda.
Em meio às discussões em relação ao atendimento, são
levantados questionamentos sobre o que a equipe pode fazer para
atender melhor a população, como cuidar da saúde e enfrentar as
doenças que se alastram, além do papel do atendimento básico no
cuidado das pessoas. Será que este modelo brasileiro de atendimento
sempre foi assim? Será que estes problemas são conjunturais ou
decorrem da concepção de saúde/doença do Brasil?
São estas questões que constituem nossa Situação-problema
(SP) que vai permear esta unidade. Vamos estudar a história
das concepções de saúde e doença, as noções de cuidado por
traz delas, a evolução da noção de atenção primária no SUS e
o papel do psicólogo nesta tarefa. Vamos ver se com estas
informações conseguimos ajudar a equipe a se organizar melhor e
se descobrimos qual é nosso papel como psicólogos na atenção
básica. Será que assim poderemos atender melhor a população de
Alhures? Vamos tentar?
U2 - Atenção básica 61
Não podemos falar de corpos, doença e saúde sem relacioná-
los ao domínio público. A história da saúde é também a
história dos países e cidades, do trabalho, das guerras e das
viagens. Historiadores e sociólogos há muito tempo vêm
analisando instituições assistenciais e políticas de saúde,
determinando a evolução das epidemias e descrevendo
as principais fases em “saúde coletiva”. [...] À medida que o
Estado de Bem-estar Social foi tomando forma, a saúde se
tornou um tema político; e o “homem doente” desapareceria
sob o exame atento da ciência. Em consequência, por um
longo período, negligenciamos olhar para a saúde e a doença
como experiências privadas e pessoais.
62 U2 - Atenção básica
Figura 2.1 | Ritual de cura de um índio pelo Pagé
U2 - Atenção básica 63
qualquer outra e, assim, sempre esteve presente, a partir do
desenvolvimento do capitalismo e de suas práticas aderentes, como
a medicação que a tudo pretendia resolver.
Encontramos em Cruz (2004) a descrição do conceito biomédico
da doença como sendo um desajuste ou falha do organismo na sua
adaptação frente a um estímulo ou, até, a ausência de sua reação,
ocasionando, com isso, uma dificuldade de funcionamento que
vai perturbar as funções de um órgão, de um sistema ou podendo
comprometer todo o funcionamento vital do organismo.
Nesse período, por ocasião do Renascimento, buscaram-se novas
teorias a respeito da saúde/doença, acrescentando o ambiente
como fator externo no surgimento da doença. A culpa de doenças
infectocontagiosas passou a ser atribuída ao que chamaram de
miasmas: gases gerados pela putrefação de matéria orgânica.
Já imaginou como era viver uma doença nessa época?
Reflita
64 U2 - Atenção básica
Modelo Epidemiológico: no início do século XVIII, surgiu a
pesquisa das epidemias, com a descoberta dos microrganismos, por
Louis Pasteur (1822- 1895), cientista francês que conseguiu provar que
os seres vivos se originam somente a partir de outros seres vivos. A
Teoria Microbiana derrubou a ideia dos miasmas, trazendo o conceito
de que a doença teria como causa um agente identificável. Essa
teoria também foi chamada de unicausalidade que dizia ter somente
um agente etiológico na origem da doença (o microrganismo vivo).
Porém, esse modelo necessitou de complementação por não poder
explicar todos os casos de patologias mais complexos. Essas e outras
descobertas deram origem a uma revolução nas pesquisas sanitárias,
que passaram a incluir elementos na pesquisa, como organização
social, pobreza, meio ambiente e suas relações com as doenças.
No século XX surge um novo e importante conceito: a
multicausalidade, em que o agente etiológico, o hospedeiro e o
meio ambiente eram associados aos fatores causais da doença. Mas
a visão das ações das causas como separadas ainda persistia.
Você sabia que só a partir deste momento a Psicologia é inserida
na área da saúde? Essa foi outra conquista desse século: a inclusão,
nas possíveis causas das doenças, do psiquismo do indivíduo, que
passa, então, a ser visto como um ser biopsicossocial. A profissão
passou a ser valorizada dentro das Políticas Públicas. Assim, a doença
e a saúde se constituíram, não como dois fatores isolados e opostos,
mas como um processo integrado, tendo como componentes os
fatores psicológicos, biológicos, econômicos, culturais e sociais.
Modelo da História Natural das Doenças ou Modelo Processual:
como vimos nos estudos anteriores, a partir da microbiologia e demais
especialidades, chegamos ao conhecimento de como algumas
patogêneses e moléstias se desenvolvem, suas características de
vida, locais onde se manifestam com maior frequência e outras
informações importantes.
A partir daí, a História Natural das Doenças (HND), ou Modelo
Processual dos Fenômenos Patológicos, foi criada por Leavell e Clark
em 1976, tendo como pressuposto ser um conjunto de processos que,
ao interagirem, geram um estímulo patológico: ao agente causador,
ao meio ambiente ou externo (natureza física, biológica, sociopolítica e
cultural) e ao meio interno (onde se processam as mudanças químicas,
fisiológicas e histológicas do organismo vivo que o agente patológico
encontrará, ou não, para se instalar e se desenvolver). Classificaram,
U2 - Atenção básica 65
então, em dois os períodos de desenvolvimento da doença: o nível Pré-
patogênico e o Patogênico. Para atuar nesses dois níveis, os autores
aconselham o trabalho com três fases de prevenção:
• 1ª fase: é a fase que antecede a doença, é a prevenção primária,
com medidas destinadas a desenvolver uma saúde geral melhor,
como educação para a saúde, boa alimentação, moradia adequada,
lazer, atividades individuais e em grupo, entre outras.
• 2ª fase: é a fase do diagnóstico e tratamento, chamada de
prevenção secundária.
• 3ª fase: é a fase de prevenção terciária, em casos que necessitam
de reabilitação. Nessas três fases de prevenção, teríamos pelo menos
cinco níveis em que as medidas preventivas poderiam ser aplicadas,
dependendo do conhecimento da história natural de cada doença.
É esse conhecimento que é aplicado na busca de prevenir
e eliminar os fatores que originam ou transmitem doenças. Um
exemplo são os casos dos mosquitos transmissores da dengue no
Brasil, que preconizam a campanha sanitarista: “Se o mosquito da
dengue pode matar, ele não pode nascer”.
Você tem a seguir um quadro explicativo das fases da HND dos
autores Leavell e Clark (1976):
Figura 2.2 | Modelo da História Natural das Doenças
Períodos Pré-Patalógico e Patológico da História Natural da Doença
Morte
Doença Doença Convalescença Invalidez
Interação de agentes precoce avan-
mórbidos, o discer- çada Cronicidade
hospedeiro humano e nível Limiar clínico
os fatores ambientais
Alterações
precoces
66 U2 - Atenção básica
Modelo Epidemiológico atual: outro nome para a HNS, trouxe uma
união dos conhecimentos anteriores dos modelos biomédico, sistêmico,
epidemiológico com a descrição do processo saúde/doença, sendo um:
“conjunto de processos interativos que cria o estímulo patológico no
meio ambiente, ou em qualquer outro lugar, passando pela resposta do
homem ao estímulo, até as alterações que levam a um defeito, invalidez,
recuperação ou morte” (LEAVELL; CLARK, 1976).
Esse modelo embasou a sistematização dos níveis de cuidado
do Sistema Único de Saúde e os níveis de prevenção na Atenção
Primária, com a integração de ações de identificação dos fatores que
produzem ou reproduzem as doenças. A inteiração das fases e de
elementos, como fatores sociais, pede um sistema de saúde com mais
complexidade para o enfrentamento desses problemas. E esse modelo
propicia isso, fundamentando os tipos de cuidados atuais do SUS.
Exemplificando
Em 1979, a Declaração da Organização Mundial da Saúde definiu a
saúde como:
U2 - Atenção básica 67
Assimile
Vivemos uma mudança de paradigmas na Atenção Primária do SUS: a
busca da cura mudou para CUIDADO; o conceito de doença transformou-
se em ESTADO FUNCIONAL; diagnósticos e tratamentos são substituídos
por MANEJOS SIMULTÂNEOS; e medicina isolada para assistência muda
para ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR.
Pesquise mais
Os artigos a seguir fazem um resumo histórico sobre a evolução dos
conceitos de saúde e doença. Vale a pena conhecer!
• BACKES, Maria Teresinha S. et al. Conceitos de Saúde e Doença ao
Longo da História sob o Olhar Epidemiológico e Antropológico. Rev. Enf.,
UERJ, Rio de Janeiro, 17(1), jan/mar, 2009. Disponível em: <http://www.
facenf.uerj.br/v17n1/v17n1a21.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
• HERZLICH, Claudine. Saúde e Doença no Início do Século XXI: Entre
a Experiência Privada e a Esfera Pública. PHYSIS, Rio de Janeiro, 14(2),
2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/physis/v14n2/v14n2a11.
pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
68 U2 - Atenção básica
Além disso, hoje, dá-se ênfase no conceito Promoção da Saúde,
que não é vista como objetivo único da vida e, sim, um recurso a
mais do indivíduo, que pode e deve ter outras metas, pois a doença
não é mais percebida como principal foco do cuidado. Isso implica
que todos os profissionais envolvidos, incluindo os psicólogos,
devem trabalhar para ajudar o usuário a ter, sim, um olhar para além
de suas dores e queixas, buscando ajudá-lo a ampliar e suprir suas
diferentes necessidades.
Assimile
A Atenção Primária busca construir uma rede de relações de assistências
visando atingir aos diferentes componentes do processo saúde/doença. O
usuário deve ser comtemplado com cuidado amplo em suas necessidades.
Lembre-se
O conceito de “cuidado com escuta ativa” significa uma atenção do
profissional diante do usuário, observando outros elementos que podem
estar presentes na motivação da doença, como fatos significativos que
auxiliarão na melhora do quadro.
U2 - Atenção básica 69
Cabe ao psicólogo perceber melhor os questionamentos que
geram conflitos na pessoa a quem atende e oferecer, por meio da
escuta ativa, o acolhimento necessário, respeitando todas as suas
diferenças e características.
Como você notou, nosso tema tem repercussões importantes
no trabalho do psicólogo e de outros profissionais, em todas as
áreas das Políticas Públicas da Saúde.
Pesquise mais
Acesse o link a seguir, da Fundação FIOCRUZ, para encontrar mais
informações sobre o cuidado em saúde: CRUZ, Marly. A concepção de
saúde-doença e o cuidado em saúde. Manual de Qualificação de Gestores
do SUS. Disponível em: <http://www5.ensp.fiocruz.br/biblioteca/dados/
txt_14423743.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
70 U2 - Atenção básica
Sem medo de errar
Você se lembra da sua situação no Centro de Saúde que atende
os moradores de Alhures?
Surgiu aquela discussão sobre o que significa cuidar da saúde e
enfrentar as doenças da população, além de pensar qual é o papel
do atendimento básico no cuidado das pessoas. Também nos
perguntamos sobre o modelo de saúde pública brasileiro: se ele
sempre teve esta organização e se este era o motivo do problema.
Além disso, surgiram questionamentos se problema vivenciado era
apenas conjuntural, devido à inauguração do bairro às pressas e
outras reflexões sobre o papel do psicólogo na equipe.
Vimos que a noção de saúde/doença mudou muito ao longo
da história da humanidade e que o modelo brasileiro é afinado com
as concepções mais modernas, já que caminhamos do modelo
biomédico até o modelo de História Natural da Doença (HND) nos
dias de hoje. Com esse conceito, a saúde deve procurar atender
ao usuário não somente na supressão de suas doenças, mas, sim,
propiciar condições de melhoria em sua qualidade de vida como um
todo. Para tanto, necessita de uma estrutura mais ampla, com acesso à
interdisciplinaridade e à intersetorialidade dentro das Políticas Públicas.
E como “cuidar” da população? O que significa isso? Como vimos,
o termo “cuidado” refere-se a todo o processo de atendimento e
prestação dos serviços ao usuário. Portanto, cuidar, na esfera do SUS,
significa auxiliar na promoção de sua autonomia e capacitá-lo a atender
melhor suas necessidades enquanto cidadão de direitos e deveres.
O papel do psicólogo é, de acordo com novos paradigmas,
contribuir para o crescimento e seu empoderamento, utilizando-se,
para isso, de todas as ferramentas e programas que estiverem ao
alcance, buscando apoio na equipe multidisciplinar.
Podemos concluir, então, que o problema maior de nossa
situação estudada é conjuntural, havendo a falta de estrutura de
pessoal para organizar o atendimento. Cabe então aos funcionários
e a você, psicólogo do Centro de Saúde, recorrer ao sistema de
saúde para requerer melhores condições de trabalho, adequando-as
à demanda da população atual de Alhures. Até porque este um dos
princípios do SUS, lembra-se? Princípio da territorialidade, tornando,
assim, direito desses novos moradores cobrarem do poder público
um melhor atendimento no exercício de sua cidadania!
U2 - Atenção básica 71
Lembre-se
Atenção
A promoção da saúde não a vê como objetivo único da vida da pessoa
e, sim, um recurso a mais para o homem, pois a doença não é mais
percebida como principal foco do cuidado.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho, pensando no SUS.
Realize as atividades e depois as compare com a de seus colegas.
72 U2 - Atenção básica
Lembre-se
O trabalho do psicólogo na Atenção Primária do SUS exige sua constante
atualização sobre seus conceitos, programas, normas, diretrizes e Leis
dentro das Políticas Públicas.
U2 - Atenção básica 73
Seção 2.2
Construção da autonomia possível de usuários e
familiares
Diálogo aberto
Você se lembra dos moradores do Residencial Alhures? Trata-se
daquela comunidade carente, composta por ex-moradores de várias
regiões da cidade em situação de risco (como beira de córregos) e
que foram transferidos para este novo bairro.
Vários problemas decorrem desta situação: novas relações de
vizinhança, infiltração do narcotráfico, falta de atendimento médico
e de escolas, entre outras coisas. Mas, mesmo nestas situações, os
problemas não param de surgir. Eduardo e Mônica se casaram na
década de 1980, tiveram gêmeos, que agora já têm quase trinta
anos e ainda moram com os pais, ou melhor, voltaram a morar. A
filha, Eunice, vem de um casamento interrompido e, por falta de
recursos, se abrigou novamente no antigo barraco – agora uma
casa de alvenaria, mas bem pequena –, tendo que suportar as
“indiretas” do pai, que atribui a ela o fracasso do casamento. Miguel,
gêmeo de Eunice, foi trabalhar no porto de Santos, mas, com a
modernização, perdeu o emprego devido à falta de qualificação
para as novas exigências. Sem alternativas, voltou para a casa dos
pais e vive de bicos, fora outras coisas não reveladas, mas cujos pais
desconfiam, graças às péssimas companhias com as quais convive.
Miguel tornou-se agressivo e a todo momento alguém bate na porta
para “tirar satisfação” com o rapaz. A vizinhança, receosa, também
hostiliza a família. O clima é péssimo e então resolveram procurar
ajuda da assistência social no Centro de Saúde em que você trabalha.
Ao atendê-los, você se depara com as seguintes perguntas:
Como deve ser conduzido o trabalho de fortalecimento dos
vínculos da família e o usuário em situação de risco? Como ajudar
sua autonomia? Como o restante da equipe pode ajudar? Será que
na região onde eles moram (ou moravam antes) você pode obter
outros meios? Afinal, este caso é de responsabilidade do CRAS ou
do CREAS? E qual a função do psicólogo?
74 U2 - Atenção básica
Não pode faltar
Caro aluno, nesta seção, vamos tratar de um serviço muito importante
na Proteção Básica do SUAS: o trabalho com famílias em situação de risco.
Veremos como se desenvolve a política pública do Sistema Único
de Assistência Social, realizado por meio do CRAS e do CREAS, com
o objetivo de promover a construção de maior autonomia do usuário
e família. Lembre-se das seguintes diretrizes: Interdisciplinaridade
na execução do trabalho e Intersetorialidade com outras políticas
públicas, interagindo em ações de diferentes serviços, como saúde,
educacionais, de assistência social especializada em atender o idoso,
adolescente e a criança, entre outros. Além de estarem presentes as
parcerias com a Sociedade Civil em diversos serviços.
Segundo o MDS (2009), foi a partir da articulação das várias funções,
serviços e atividades oferecidas pelos diferentes serviços públicos que
se reconheceu as potencialidades dos membros das famílias e novas
estratégias possíveis para o enfrentamento de suas vulnerabilidades.
O método de atuação na oferta de um atendimento efetivo deve
iniciar buscando conhecer as famílias e o território onde as políticas
públicas vão se realizar.
Muitas vezes estão na própria comunidade as informações mais
importantes sobre os indivíduos que não são computadas em pesquisas
oficiais. As atividades que serão desenvolvidas junto à comunidade se
utilizam desses dados anteriormente coletados para reunir os usuários
em atividades de grupo e coletivas. Há encontros com outros agentes
de outras políticas, como Funai, Funasa e outras, de onde saem novas
parcerias. Essa pesquisa deve incluir os chamados atores sociais,
como as ONGs, igrejas, redes, associações comunitárias, além dos
movimentos sociais e clubes, para saber também com quem se pode
estabelecer parcerias e encaminhar os casos, quando necessário.
Para isso, podemos usar bancos de dados, como o IBGE, o IPEA, o
SEAD e o próprio MSF. A busca de informações mais precisas sobre
as características próprias dessa população e suas demandas deve
englobar os recursos existentes na região e deve preceder o cuidado.
Vocabulário
Escuta Ativa: é o atendimento ou cuidado com uma atitude de uma
escuta sensibilizada do usuário e sua dinâmica como um todo.
U2 - Atenção básica 75
Busca Ativa: é a atitude proativa do sistema de saúde, saindo em busca
do usuário que pode necessitar de atendimento, inclusive, em sua
própria residência.
Usuário: cidadão que utiliza os serviços públicos do SUS ou do SUAS.
76 U2 - Atenção básica
os demais, que também vise à formação de vínculo e promoção de
seu empoderamento, que significa o fortalecimento da autoestima
e capacidades do usuário.
A oferta desse cuidado com as famílias segue as regras da
tipificação dos serviços socioassistenciais do SUAS com seus dois
níveis: Proteção Social Básica e Proteção Social Especial.
Assimile
Empoderamento é o fortalecimento do usuário através do aumento de
sua autoestima e de suas capacidades de enfrentar seus problemas.
U2 - Atenção básica 77
“prevê o desenvolvimento de potencialidades e aquisições das famílias
e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários por meio de
ações de caráter preventivo, protetivo e proativo” (BRASIL, MDS, 2013).
Reflita
Você se sentiria bem atuando em um CREAS nesses casos mais graves
com famílias?
Quais pré-requisitos precisaria ter um profissional de Psicologia nesse
trabalho?
Acredita na recuperação possível dos vínculos entre o usuário e sua
família em situações de risco? Em quais casos?
Exemplificando
78 U2 - Atenção básica
lar, casa de passagem, residência inclusiva), república, família acolhedora
e proteção em situação de calamidade pública e emergência.
Vale lembrar que no CREAS funciona o Serviço de Proteção e
Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI).
Assimile
Lembre-se de que o serviço do CREAS, por meio do PAEFI, é direcionado
às pessoas e famílias em situações de violação de direitos que são
encaminhadas até ele por identificação ou por meio de serviços de
proteção e vigilância social, Sistema de Segurança Pública e outros
órgãos do Sistema de Garantia de Direitos e outros.
Pesquise mais
Leia mais sobre o funcionamento do CRAS/SUAS:
• BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
Sistema Único de Assistência Social – SUAS. Brasília: MDS, 2012.
• CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Referências técnicas para
Prática de Psicólogas (os) no Centro de Referência Especializado da
Assistência Social - CREAS. Brasília: CFP, 2012.
U2 - Atenção básica 79
Complexidade, e podem ter como objetivo atender às mulheres e
suas famílias em situação de violência doméstica e de gênero.
Além disso, cursos diversos são oferecidos, além da criação de
grupos comunitários e o oferecimento de palestras escolhidas para
esse grupo, oficinas com habilidades específicas, entre outros. Tudo
isso reforça a ideia de que a autonomia do usuário e de sua família
é um processo de produção de saúde com o protagonismo dos
cidadãos na sua construção ou reconstrução social.
80 U2 - Atenção básica
Como vimos, quase ou todos os integrantes dessa família
carecem de autonomia e, aqui, o psicólogo pode ajudar muito,
com o acolhimento, escuta ativa, encaminhando quem considerar
mais necessitado para atendimento individual e fazendo reuniões
com todos os membros da família. Isso fortalece as potencialidades
destas pessoas para conseguir autossustento com alguma formação
e capacitação de trabalho, além de melhorar autoestima de todos,
restabelecendo os vínculos afetivos entre os membros familiares.
Os outros profissionais, como o assistente social, os professores
e os médicos, podem auxiliar com suas especialidades para compor
a ajuda das áreas complementares ao cuidado, como, por exemplo,
verificar o que os idosos podem ter direito (benefício continuado),
necessidade de encaminhamento para o SUS para medicação (para
depressão, se for o caso), grupos de orientação para drogadito, grupos
de capacitação e outros serviços que considerarem necessários.
Também pode ser útil buscar informações na comunidade em que
moravam antes para saber outros vínculos que tinham e outras
informações que podem ser úteis para ajudar no atendimento.
Finalmente, se considerarmos a questão da suspeita do filho
como possível, ou tendendo a ser drogadito, será o CREAS o local
de atendimento dessa família. O psicólogo, portanto, inicialmente,
tem a tarefa de, junto com os demais colegas de equipe, acolher
essa família com toda sua dinâmica e diversidade de problemas.
Além disso, deve procurar, junto a eles, dirimir os conflitos, dando-
lhes esperanças para mudar o foco de suas vidas para melhor;
aumentando a afetividade entre eles.
Você pode recuperar, também, nas descrições do trabalho do
psicólogo no livro didático, outras ações que considerar pertinentes
ao caso, além do que já mencionamos aqui.
Atenção
O trabalho do psicólogo com a família tem como foco principal tentar
restabelecer os vínculos afetivos entre seus membros.
Lembre-se
Autonomia vem do grego: auto (próprio) mais nomos (lei, regra, norma),
formando “autogoverno”, ou seja, a capacidade de tomar as próprias
decisões para sua vida, saber o que é bom para seu “bem-estar”. Ajudar
na sua construção é uma tarefa do Psicólogo.
U2 - Atenção básica 81
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois compare-as com a de seus colegas.
Lembre-se
No vídeo a seguir, temos uma apresentação das atividades de um CREAS
dando uma visão do trabalho com família.
YOUTUBE. Famílias que mudaram de vida - O filme. Disponível em: <https://
www.youtube.com/watch?v=7NUIXz9KGtw>. Acesso em: 30 jan. 2016.
82 U2 - Atenção básica
Faça você mesmo
Assista ao vídeo a seguir sobre os serviços do SUAS no acolhimento das
famílias e anote três conceitos importantes já estudados nesta seção e
que você considera importantes.
YOUTUBE. Síntese da Tipificação de Serviços Socioassistenciais em
vídeo CEGOV – Capacita SUAS. Disponível em: <https://www.youtube.
com/watch?v=UmrNuVraEKU>. Acesso em: 30 jan. 2016.
U2 - Atenção básica 83
Seção 2.3
Trabalho com crianças e adolescentes
Diálogo aberto
Você se lembra do Residencial Alhures? Aquele novo bairro que
ainda não conta com toda a infraestrutura para seus habitantes, que
tentam sobreviver com a falta de muitos serviços básicos e ainda
enfrentam questões graves como tráfico de drogas, epidemia de
dengue e outros problemas? O Centro de Saúde em que você
trabalha como psicólogo passou a atender esta nova população e
também enfrenta problemas pelo aumento repentino da demanda.
Você já deve imaginar que no Residencial Alhures, além dos
problemas já citados, existem muitos outros, até pela diversidade de
moradores com famílias que são constituídas por muitas crianças e
adolescentes. O Centro de Saúde funciona como uma unidade do
SUAS e é por isso que é lá que essa população vai buscar ajuda.
Uma forma de ajudar é receber denúncias, como esta: um casal,
segundo os vizinhos, bate nas crianças e grita com elas, acusando-
as de ter comprado balas com os trocados que ganharam pedindo
esmolas nos faróis e que deveriam trazer para casa. Essa cena foi
ficando repetitiva: a gritaria dos pais, seus xingos e os pedidos de
socorro do garoto mais velho que só tem 6 anos, tentando proteger
o irmão pequeno das agressões do pai, que sempre está sob efeito
de álcool. Só isso já seria o suficiente para chamarem a polícia. Mas
não era só este problema da família. As meninas da Clei, como são
chamadas, com os nomes Jacimara (16 anos), Janaína (15 anos), Juraci
(14 anos) e Jurema (13 anos), são agenciadas pela própria mãe em sua
casa ou “servem a domicílio”, como são anunciadas pelo WhatsApp.
Cansada dessas cenas recorrentes, uma vizinha foi com Juraci
pedir ajuda no SUAS que você trabalha. E agora? Como ajudar esta
menina que não quer mais “trabalhar” assim para os pais e nem
apanhar? E quanto aos meninos?
O que fazer nesses casos? O que se define como criança? E
como trabalhar com crianças e adolescentes? O que é situação de
violação e de risco? Como o Estatuto da Criança e do Adolescente
pode ajudar? O que podemos chamar de violência na infância e
84 U2 - Atenção básica
adolescência? Quais os órgãos que garantem direitos e que tipos
de assistência podem ser oferecidos pelas políticas públicas? Enfim,
como o psicólogo pode ajudar na Linha de Cuidado?
Vamos buscar saber todas essas questões juntos e resolver este
problema!
U2 - Atenção básica 85
ensino; Ministério Público; Varas da Infância e da Juventude; delegacias
especializadas para crianças e adolescentes; Instituto Médico Legal;
Disque 100 para Denúncia Nacional de Violência Sexual; Programa de
Atenção à Criança e ao Adolescente Ameaçado de Morte; e ONGs.
Ainda na área das legislações que apoiam e regulam o atendimento
às crianças e adolescentes, em 1990, tivemos a Lei de n. 8.069, que
criou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Sua origem
está na Convenção dos Direitos da Criança na Assembleia Geral das
Nações Unidas, em 1989. Hoje, apesar das críticas de setores mais
conservadores, o ECA é um marco jurídico do Brasil e já recebeu
algumas modificações, como em 2009, incluindo a Lei de Adoção,
que acelerou o processo de adoção e regulou o tempo de jovens
em abrigos. Compõe-se de 267 artigos com temas, como saúde,
educação, esporte, lazer, cultura, dignidade, respeito, liberdade,
proteção contra o trabalho infantil, regras de guarda, tutela e
adoção, convivência familiar e comunitária, crianças e adolescentes
com adição de drogas e álcool, entre outros temas.
Você pode se perguntar: mas por que tantos órgãos para cuidar
das crianças e adolescentes?
Porque, segundo o MS, é na infância que vão ser absorvidos
os valores básicos, como conceitos morais e éticos, formando
a personalidade do indivíduo. E o fator violência, no início da
vida e na adolescência, deixará marcas com danos que poderão
ser irreparáveis por toda vida. Há vários tipos de violência: física,
psicológica, sexual, negligência.
Portanto, é evidente que a violência pode gerar problemas
sociais, emocionais, psicológicos e cognitivos capazes de impactar
fortemente a saúde das pessoas ao longo de toda sua existência.
Isso reforça a importância de orientar as ações e pactuar
estratégias para a atenção integral à saúde de crianças, adolescentes
e suas famílias em situação de violência, de acordo com as diretrizes
da Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes
e Violências, da Política Nacional de Promoção da Saúde e da Política
Nacional de Atenção Básica/Primária, entre outras, conforme
aconselha o próprio Ministério da Saúde.
Portanto, MS/SUS criou, dentro da Atenção Básica, uma estratégia
de ação para a efetivação dos direitos da criança e do adolescente,
chamando-a de Linha de Cuidado, que visa à produção do cuidado,
86 U2 - Atenção básica
com diretrizes e ações, desde o início, com a atenção primária, até o
mais complexo nível de atenção, interagindo com os demais sistemas
de garantia de direitos, proteção e defesa de crianças e adolescentes.
Seu propósito é, também, o de se agregar às demais estratégias,
programas e políticas sociais, com vistas a assegurar recursos e
garantir os direitos de crianças e adolescentes. São os princípios da
Linha de Cuidado: igualdade, democracia, respeito, solidariedade,
cooperação e integração entre os atores e organizações.
A Linha de Cuidado tem por objetivos o estímulo e promoção da
Saúde e da Cultura da Paz; orientação de profissionais na integralidade
do atendimento; e, também, a sensibilização dos gestores para a
importância da organização dos serviços em rede no território.
Lembre-se
Cuidado é a “[...] designação de uma atenção à saúde imediatamente
interessada no sentido existencial da experiência do adoecimento, físico
ou mental, e, por conseguinte, também das práticas de promoção,
proteção ou recuperação da saúde” (AYRES, 2004, p. 22).
U2 - Atenção básica 87
Além disso, lançada em 2006, a Política Nacional de Promoção da
Saúde (PNPS) surge com o objetivo de trabalhar com os fatores das
doenças e agravos, investindo na priorização de modelos de promoção
da qualidade de vida, para prevenir violência e estimular a paz, induzindo
novos modos de vida mais saudável em ambientes saudáveis.
Em 2010, o MS criou o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF),
formado por equipe multiprofissional para apoiar as Equipes de Saúde
da Família e de Atenção Básica para populações específicas, com apoio
especializado (matricial). O núcleo faz o estudo de caso e do cuidado
compartilhado aos pacientes, orientando situações de sofrimento,
transtorno mental e aos casos de uso de álcool e outras drogas.
Reflita
Você acha que são muitas iniciativas, programas, ações em defesa da
criança? Imagine como seria o Brasil sem todo este esforço para a defesa
de nossas crianças!
88 U2 - Atenção básica
Lembre-se
Para conhecer mais ainda sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente,
acesse o link a seguir:
UNICEF. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: <https://
www.unicef.org/brazil/pt/resources_10079.html>. Acesso em: 30 jan. 2016.
Atenção
O acolhimento não é um momento do cuidado e, sim, uma atitude a ser
seguida durante todo o processo de contato com o usuário. A criança
precisa ter sua confiança no adulto restaurada, porque é vítima de um
esquema social perverso ao seu desenvolvimento.
U2 - Atenção básica 89
saúde de crianças, adolescentes e suas famílias em situação de violências.
Brasília, 2010. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/
linha_cuidado_criancas_familias_violencias.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
Já o manual de Direitos a seguir é uma ótima cartilha de atuação na saúde
pública. Veja com atenção:
PINHO, A. et al. Manual básico de saúde pública: Um guia prático para
conhecer e garantir seus direitos. Editora dos Autores: Penápolis, 2012.
Disponível em: <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/Cartilhas/
manual_basico_saude_publica.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
90 U2 - Atenção básica
mencionam a importância da supervisão familiar e da religiosidade
na formação da resiliência, principalmente em situações de crise.
Vocabulário
Ambiência: tratamento com atenção ao espaço de atendimento, com
vistas a ofertar ao usuário um acolhimento melhor, que facilite a formação
de vínculos.
Resiliência: capacidade de superar adversidades e frustrações, lidando
com situações problemáticas com mais positividade e assertividade.
Linha de Cuidado: estratégia de ação para efetivação de direitos da
criança e do adolescente, visando à produção do cuidado integral.
Exemplificando
Uma família insiste em mandar seu filho de 7 anos bater na porta das
casas pedindo dinheiro para comprar comida e gás. A irmã da criança,
que se recusa a fazer o mesmo, foi até o CREAS e pediu ajuda. Você
acha que a reclamação procede? Que fundamentos legais dão respaldo
à reclamação da criança?
Na Constituição Brasileira, o artigo 7, inciso XXXIII, determina a "proibição
de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de
qualquer trabalho a menores de dezesseis anos" (BRASIL, 1988, on-line).
Também assegura que a única exceção é dada aos aprendizes, que
podem trabalhar a partir dos 14 anos.
O psicólogo deve recorrer à Linha de Cuidado para desenvolver suas
ações, buscando no LD as diretrizes e os passos para saber como
desenvolver a aproximação com a família e com a criança que está
sendo vitimada. Num trabalho como esse, é importante se atentar para
todos os itens que envolvem as famílias, incluindo outros profissionais e
setores que podem auxiliar na recuperação da família e da criança.
U2 - Atenção básica 91
profissional. O cuidado também é carinho e aconchego, facilitando
a promoção da autoestima. Esse mesmo cuidado deve ser mantido
na atuação com a família, dando-lhe mais espaço para expor seus
sentimentos, suas experiências e, principalmente, oferecendo
condições de ressignificar as relações entre seus componentes.
Quanto à prevenção da violência, o profissional pode encontrar
apoio nas publicações do Ministério da Saúde, do Centro de Referência
Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (CREPOP) e de sites
relacionados aos temas buscados. No entanto, lembramos que o mais
significativo é sempre a atitude interna de querer realmente ajudar, ser
aquele se propõe a ajudar. É bom lembrar, também, que o próprio
profissional precisa de ajuda de outros profissionais, tanto para articular
o caso que atente, como para cuidar de si mesmo, quando precisar.
Você também, não acha que esse cuidado é bom para todos?
Figura 2.3 | Crianças Quebrando Pedras para Construção
Assimile
Qualquer violência, inclusive a psicológica, causa danos à autoestima, à
identidade e ao desenvolvimento da criança e do adolescente. E o cuidado
deve promover vínculos significativos para diminuir os efeitos danosos.
Reflita
1. Mesmo tendo o ECA determinado que toda criança e adolescente tem
direito à saúde integral, você acredita que ele é sempre cumprido?
2. Você acredita que exista em seu meio alguma criança ou adolescente
em situação de risco ou de violação de direito?
3. Já viu alguma criança em situação de trabalho infantil?
92 U2 - Atenção básica
Faça você mesmo
Pesquise no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os artigos sobre
o cuidado a ser oferecido aos adolescentes com dependência em drogas
e bebidas alcoólicas. Selecione-os e anote os setores e procedimentos
envolvidos para o cuidado desses casos. Imagine uma estratégia de
atuação dentro das normas do SUS.
Este artigo é muito explicativo sobre o ECA e pode te ajudar:
MARINHEIRO, Maria do L. Alves et al. Oficina do Eca: Estatuto da Criança e
do Adolescente. Editora Batista Independente: Campinas, 2013. Disponível
em: <http://www.redemaosdadas.org/wp-content/uploads/2014/05/
Cartilha-Oficina-do-ECA-volume-2.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
U2 - Atenção básica 93
Atenção
A Rede de Cuidado e de Proteção Social para a Atenção Integral às
Crianças, Adolescentes e suas Famílias em Situação de Violência e o
Conselho Federal de Psicologia, assim como o Conselho Tutelar e o
Sistema de Garantia de Direitos (SGD) e dos Órgãos podem ser acessados
na composição da rede de assistência para cada caso.
Lembre-se
O Conselho Federal de Psicologia oferece referências para o Psicólogo
atuar em casos de violência familiar. Veja o artigo:
CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Serviço de Proteção Social
a Crianças e Adolescentes Vítimas de Violência, Abuso e Exploração
Sexual e suas Famílias: referências para a atuação do psicólogo. Conselho
Federal de Psicologia: Brasília, 2009. Disponível em: <http://site.cfp.org.
br/wp-content/uploads/2009/10/CREPOP_Servico_Exploracao_Sexual.
pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois compare-as com a de seus colegas.
94 U2 - Atenção básica
• Conhecer mais a terminologia do SUS na área de saúde
pública.
• Conhecer os programas para atendimento à criança e
2. Objetivos de
ao adolescente.
aprendizagem
• Conhecer os direitos da Criança e do Adolescente.
• Conhecer os programas e diretrizes de assistência e
proteção social.
Estatuto da Criança e Adolescente (ECA). Programa
3. Conteúdos
de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI); Centro de
relacionados
Referência em Políticas Públicas (CREPOP).
Você acabou de entrar no CREAS e não sabe como deve
ser o procedimento do psicólogo quando tem que atender
4. Descrição da SP uma criança ou adolescente em situação de violência e
violação de direitos. Portanto, precisa conhecer melhor as
orientações para essa atuação profissional. O que fazer?
Os procedimentos pertinentes à função do psicólogo
dentro da Linha de Cuidado, além do acolhimento integral
e escuta ativa, têm como base as orientações do Ministério
da Saúde e do Conselho Federal de Psicologia para o
5. Resolução da SP bom exercício da profissão e para a eficácia do cuidado
junto a essas crianças e adolescentes. A ação junto à
família, de nossos pequenos usuários, deve ser lembrada.
Busque referências em nosso Livro Didático e, também, no
CREPOP e suas cartilhas.
Lembre-se
A Linha de Cuidado tem por objetivos: estimular e promover a saúde e a
cultura da paz; orientar profissionais na integralidade do atendimento; e
sensibilizar os gestores na organização dos serviços em rede no território.
U2 - Atenção básica 95
a) Colocar o cuidado como uma atitude de aceitação, credibilidade e
aproximação do usuário.
b) Colocar o profissional para refletir sobre seu comportamento desumano.
c) Colocar o SUS como modelo de comportamento humano.
d) Colocar a atenção do SUS como não sendo desumana.
e) Colocar o usuário como dependente do SUS para poder tratá-lo.
96 U2 - Atenção básica
Seção 2.4
O trabalho com o idoso
Diálogo aberto
Você trabalha como psicólogo em uma unidade do SUAS
que atende o Residencial Alhures. Além disso, o Centro de Saúde
também enfrenta problemas diante do aumento repentino da
demanda. Portanto, nesta seção, vamos lidar com outra Situação-
problema vivida pelos moradores do novo bairro: o CREAS de lá
tem recebido outra demanda de queixas para resolver. Pessoas
idosas têm denunciado maus tratos e até violência por parte de
seus cuidadores, que, inclusive, roubam suas parcas economias
ou pensões. Alguns casos de desvio de dinheiro chegam a ter um
esquema de caráter profissional, com a presença de “coiotes”,
que são pessoas que fraudam o sistema previdenciário com
documentos falsos, lesando os idosos sem qualquer pudor. Se isso
não bastasse, ainda sofrem de doenças típicas dessa faixa de idade,
como reumatismos, pressão, problemas cardíacos, Alzheimer e
tantos outros, necessitando utilizar medicações caras.
Como o serviço público pode atender a estas denúncias? Como
atender as demandas desta faixa de idade da população? Afinal, o
que é ser idoso? Quais os conceitos, as leis e normas que regem
este atendimento? Quais os programas e órgãos existentes na
Saúde Pública para assistir o idoso? O que é o Estatuto do Idoso?
Quais as teorias que embasam o trabalho do SUS para este público?
Como o psicólogo pode ajudar no serviço público?
U2 - Atenção básica 97
Não pode faltar
Vamos estudar nesta Seção 2.4 um tema que reflete uma nova
realidade na sociedade, que apresenta duas faces. Por um lado,
com os avanços da Ciência, o ser humano está vivendo mais. Por
outro, com o envelhecimento de um maior número de pessoas, o
Sistema Público de Saúde não está conseguindo atender de forma
eficaz essa nova demanda. Essa parte da população encontra muitas
dificuldades, pois, nossa cultura atual não valoriza o idoso como
alguém importante, mas o considera um fardo para a sociedade,
com carências e problemas, sem algo a contribuir. Com isso, a
qualidade de vida do idoso pode piorar muito e, ao se aposentar, na
maioria das vezes, seus rendimentos são menores do que quando
estava trabalhando, agravando a situação.
Os problemas para as pessoas acima de 60 anos englobam
também abandono pela família e até maus tratos, além de uma
condição física mais debilitada.
Por causa deste quadro, o Ministério da Saúde criou o Centro
de Pesquisa em Desenvolvimento/e Envelhecimento (CEPEDEN).
Seu objetivo é dar assessoria e orientação às famílias de idosos,
oferecendo elementos para promover uma sensibilização na
sociedade e procurando estimular uma velhice sadia, mais produtiva
e agregada à família. O trabalho envolve orientação às famílias a
respeito do idoso: desde a compreensão dos fatores de risco à saúde
física e mental, até o incentivo à sua autonomia e participação na
rede social, bem como e adaptação às novas condições do idoso e
seus valores. Para isso, oferece cursos, palestras e outras atividades.
Vamos agora percorrer o caminho das Legislações do Brasil
sobre o trabalho com o idoso. A Lei n° 6.179/1974 instituiu a Renda
Mensal Vitalícia para pessoas com 65 anos ou mais, por meio do
Instituto Nacional de Previdência Social (INPS). Dois anos mais tarde,
instituiu-se o Programa de Assistência ao Idoso (PAI), para formar
grupos de convivência que aconteciam nos postos do INPS. Já em
1987, houve uma reestruturação na LBA e no PAI, que resultou no
novo Projeto de Apoio ao Idoso (PAPI). Nesse mesmo ano, criou-se
mais um projeto, o Vivência, com mais ações de saúde, assistência
social, educação e cursos para a terceira idade, preparando os
idosos para a fase da aposentadoria e, também, para entrarem em
Universidades Federais para a terceira idade.
98 U2 - Atenção básica
Em 1979, ocorreu a Comissão Especial de Gerontologia Social,
hoje chamado de Departamento de Gerontologia Social. Em 1985,
foi fundada a Associação Nacional de Gerontologia. A Constituição
Federal de 1988 também contempla o idoso nos artigos 14,
40, 201, 203, 229 e 230. Em 1993, por meio da Lei Orgânica da
Assistência (Lei n° 8.742/1993), foi criado o Benefício de Prestação
Continuada da Assistência Social, que permite a todos os idosos que
se enquadrem em seus critérios receberem um benefício, mesmo
sem terem contribuído.
Em 1994, com a Lei n° 8.842/1994, tivemos a Política Nacional
do Idoso (PNI), com o objetivo de garantir o seu bem-estar físico,
emocional e social, priorizando o atendimento não mais de forma
asilar, mas em suas famílias. A PNI buscou o apoio de profissionais
de saúde para ações de promoção do idoso. Além disso, capacitou
pessoas para serem cuidadores informais, que são profissionais que
podem dar um apoio responsável e humano a essas pessoas, com
treinamento e supervisão. Também foi buscar apoio em instituições,
centros-dia e apoio familiar.
Em 1998, criou-se o Programa Terceira Idade em Ação, com o
Núcleo de Pesquisa e Extensão Universitário (NUPEUTI), oferecendo
cursos de duração de dois anos para idosos, com atividades
socioeducativas, como a Universidade Aberta à Terceira Idade. Em
seguida, a Lei n° 10.048/2000 priorizou o cuidado ao idoso e a Lei
Estadual n° 5.244/2002 criou a Política Estadual do Idoso (PEI), no
Estado de São Paulo.
Em 2003, foi criada a Lei n° 10.741, que institui o Estatuto do
Idoso, com o objetivo de regulamentar os direitos e as ações com o
idoso. Como exemplo, seu artigo 2º diz:
U2 - Atenção básica 99
É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do
Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade,
a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à
cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência
familiar e comunitária (BRASIL, 2003, p. 1).
E as autoras continuam:
Pesquise mais
Pesquise mais sobre os recursos e orientações para trabalho com o idoso
no documento a seguir:
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome;
Secretaria Nacional de Assistência Social; Departamento de Proteção
Social Básica. Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para
Pessoas Idosas. Brasília, 2012. Disponível em: <https://craspsicologia.files.
wordpress.com/2013/09/orientacoes-tecnicas-do-scfv-para-pessoas-
idosas.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
Neste link, temos os dispositivos do Estatuto do Idoso:
BRASIL. Lei n. 10.741, de 1 de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto
do Idoso e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.741.htm>. Acesso em: 30 jan. 2016.
Assimile
Tanto no SUS como no SUAS a família é o centro da matricialidade e deve
ser sempre presente no cuidado ao usuário.
Vocabulário
ESF: Estratégia de Saúde da Família.
CEDEPEN: Centro de Pesquisa em Desenvolvimento/e Envelhecimento.
Atenção
Pessoa Idosa busca dar apoio e acolhimento à terceira idade. Veja o artigo
a seguir para conhecer mais sua filosofia:
PEREIRA, Potyara A. P. Política de Assistência Social para a Pessoa
Idosa. Disponível em: <http://www.observatorionacionaldoidoso.fiocruz.br/
biblioteca/_eixos/4.pdf>. Acesso em: 30 jan. 3016.
Lembre-se
O Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas
(CREPOP) nos oferece referência para o trabalho com idoso por meio
do seguinte manual:
CREPOP. Práticas profissionais de psicólogos e psicólogas na atenção
Básica à Saúde. Brasília, 2010. Disponível em: <http://crepop.pol.org.br/novo/
wp-content/uploads/2011/02/Praticas_ABS.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2016.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois compare-as com a de seus colegas.
Lembre-se
Como você pode ver, o trabalho deve sempre ter a ajuda da Equipe
Multidisciplinar, da Estratégia da Saúde da Família (ESF) e de outros tipos
de programas que couberem a cada caso atendido. Lembramos que
os idosos e suas famílias são enquadrados no nível de casos de maior
complexidade e devem ser cuidados pelo CREAS.
Figura 2.5 | Idosa Agredida Recebendo Atendimento do CREAS
Territorialidade
Convite ao estudo
Nas unidades anteriores, você aprendeu sobre o conceito de
políticas públicas e o papel do psicólogo; conheceu o Centro
de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas (um
instrumento muito importante para a categoria nortear seu
trabalho nesse campo que cresce cada vez mais para a psicologia);
entendeu a diferença de atuação do psicólogo no CRAS e no
CREAS; a importância da intersetorialidade; a definição de saúde
e a função da atenção primária; a construção da autonomia
e do protagonismo dos usuários dos serviços públicos e suas
famílias; o trabalho desenvolvido para as crianças e adolescentes,
embasado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e o
trabalho com a população idosa, respeitando o Estatuto do
Idoso e seu lugar no Programa de Estratégia de Saúde da Família.
Agora, esta unidade de ensino, denominada “Territorialidade”,
abordará aspectos da política de assistência social e da política
pública de saúde, objetivando estabelecer uma relação paralela
entre ambas. Com isso, você aprenderá sobre o conceito de
território no SUS e no SUAS, regionalização e descentralização;
conhecerá os serviços de convivência e programas de interação
entre usuário e sociedade; as novas políticas de saúde, como
consultório na rua e o Programa Telessaúde Brasil Redes;
compreenderá qual a função do psicólogo enquanto gestor de
serviços; e, por fim, a importância da produção de pesquisas
sobre os temas tratados, enquanto consolidação da ciência
psicológica e produção de novas tecnologias de trabalho.
Agora, imagine que você é psicólogo de uma Unidade Básica
de Saúde (UBS), referência da área central de sua cidade. Essa
área contempla comércios, residências e pessoas em situação de
rua. Nas residências, moram muitos idosos – antigos moradores
U3 - Territorialidade 115
da região. Já a população em situação de rua é plural, sendo
composta por adultos jovens, idosos, crianças e adolescentes.
Esses dois grupos possuem relações muitos diferentes com o
serviço de saúde: a população que reside nas casas acessa o
centro de saúde com frequência. Já a população em situação de
rua mantém-se distanciada dos cuidados básicos. A partir dessa
realidade, reflita: qual a característica desse território? Como a
psicologia poderá se aproximar da população em situação de
rua? Como garantir a essa população marginalizada o direito
à saúde? E o gestor do centro de saúde? Qual o seu papel
enquanto coordenador de serviço público?
116 U3 - Territorialidade
Seção 3.1
Territorialidade na saúde
Diálogo aberto
Esta seção objetiva apresentar a você a definição de territorialidade,
diferenciando os princípios do Sistema Único de Saúde:
regionalização e descentralização.
A partir da situação apresentada acima, reflita sobre o lugar da
psicologia no contexto das políticas públicas. Qual o nosso papel?
Quais os nossos desafios? Quais as nossas bandeiras de luta?
Veja o que acontece no seu trabalho quando Antonio, um
morador dessa região, procurou pela Unidade Básica de Saúde para
solicitar apoio a um projeto que está protagonizando: um abaixo-
assinado para retirar as pessoas em situação de rua do território.
Antonio e seus vizinhos estão convencidos de que a criminalidade
aumentou por conta da presença dessas pessoas. Antonio é coronel
do exército, aposentado, possui ideias rígidas e pré-concebidas sobre
a ordem pública. Como a psicologia pode atuar nessa situação?
Para começar a pensar sobre essa questão, é importante recordar
alguns conteúdos trabalhados em unidades anteriores: lembre-
se de que as políticas públicas contemplam as leis que regulam e
norteiam a criação e manutenção de atendimentos e serviços para
toda a população do país. Não perca esta questão do foco: para
toda a população, ou seja, não poderá privilegiar uns em detrimento
de outros. Também é importante atentar-se para o fato de que, hoje,
a saúde só é pública por conta de uma intensa luta que culminou na
criação do Sistema Único de Saúde (SUS), portanto é uma legislação
que tem por missão contemplar a todos (embora saibamos que
seus desafios ainda são muitos), incluindo em seu princípio básico o
acesso universal e a equidade.
Dessa forma, tanto Antonio quanto a população em situação de rua
possuem os mesmos direitos de acesso à saúde. Outro ponto muito
importante é que a ciência psicológica também possui princípios
fundamentais: basear o seu trabalho no respeito e na promoção da
liberdade, dignidade, igualdade e integridade, apoiado nos valores
que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos;
U3 - Territorialidade 117
trabalhar visando promover a saúde e qualidade de vida das pessoas
e coletividade, contribuindo para a eliminação de quaisquer formas
de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão; atuar com responsabilidade social, analisando de forma
crítica e histórica a realidade, e zelar para que o exercício profissional
seja efetuado com dignidade, rejeitando situações em que a psicologia
esteja sendo desonrada ou desvalorizada (CFP, 2005).
Perceba, então, como o nosso trabalho é delicado e demanda
muita reflexão, análise crítica e desconstrução de conceitos pré-
concebidos. Vamos ao trabalho!
118 U3 - Territorialidade
Portanto, estudar a territorialidade é estudar também a subjetividade
humana, é estudar o grupo social e suas identidades coletivas:
Assimile
U3 - Territorialidade 119
Mas do que se tratam a descentralização e a regionalização,
citadas pelos autores?
Segundo o Ministério da Saúde, a descentralização é a
reorganização das responsabilidades entre o município, o estado
e a federação. Seu objetivo é reforçar o poder municipal sobre o
cuidado em saúde, cabendo às prefeituras a maior responsabilidade
na execução de serviços e ações voltadas à população (BRASIL,
1990). Conforme contemplado na Lei 8.080/90, dá-se “ênfase na
descentralização dos serviços para o município” (Art. 7; inciso IX).
No contexto do SUAS, também está contemplada a ação
descentralizadora do Estado, visando facilitar as ações mais próximas
do território. Portanto, apresenta a mesma lógica do sistema de saúde.
Com relação ao conceito de regionalização, contemplado na
política do SUS, a Cartilha do Ministério da Saúde, denominada ABC do
SUS, destaca que o conceito de regionalização está associado a outro
princípio que rege a organização do sistema: hierarquização. Portanto,
na regionalização e na hierarquização os serviços são organizados
em níveis de complexidade tecnológica (atenção básica, média e alta
complexidade), do menor para o maior (por isso são hierarquizados), e
localizados em uma área geográfica delimitada (tal qual o conceito de
território) e com população definida (BRASIL, 1990).
Também no SUAS aplica-se o conceito de hierarquia dos
serviços, como você já aprendeu, organizada em proteção básica e
especial (BRASIL, 2005).
Exemplificando
120 U3 - Territorialidade
privadas que estabelecem parceria, ou convênio, com o SUS. Importante
lembrar que a Lei 8.080/90 aponta que essa parceria só poderá ser
realizada “quando as suas disponibilidades (do SUS) forem insuficientes
para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada
área” (Art. 24). Mas será que é isso que acontece na prática?
U3 - Territorialidade 121
Assimile
Essa noção de regionalização é fundamental na organização e funcionamento
do serviço público de saúde, pois é constituída por um conjunto de unidades
de atendimento, com diferentes funções e complexidades, que tem por
objetivo executar ações de forma articulada no território, atendendo a
demanda da população, conforme nos esclarece Luciana Lima (ENSP, 2014).
122 U3 - Territorialidade
a terceirização do serviço torna precário o exercício do
trabalho, uma vez que o trabalhador foi absorvido sem
concurso público, sem vínculo com o Estado, o que infringe a
Constituição Federal (inciso II do art. 37) [...] e a descontinuidade
na execução da política acabam por prejudicar diretamente
a população que necessita de atenção permanente e de
qualidade no SUS (BRASIL, 2011, p. 15).
Pesquise mais
O link abaixo apresenta algumas propostas de superação aos desafios
vivenciados no processo de regionalização, a partir de estudos realizados
pelo pesquisador Gastão Wagner – referência na área da saúde pública –
do Instituto de Saúde Coletiva da FCM/UNICAMP.
Região e Redes. Regionalização é o futuro do SUS. Disponível em:
<http://www.resbr.net.br/regionalizacao-e-o-futuro-do-sus/>. Acesso em:
23 dez. 2015.
U3 - Territorialidade 123
ou não, para a execução eficiente do sistema. Os partidos políticos
também devem tomar a questão da saúde pública em suas pautas e
em suas ações, deixando de agir em nome de interesses próprios e,
claro, a sociedade precisa estar comprometida com o SUS, através do
controle social, apontando falhas e, principalmente, movimentando-
se (por meio dos conselhos locais de saúde, por exemplo) no sentido
de fiscalizar o poder executivo e pressionar o poder legislativo.
Reflita
124 U3 - Territorialidade
A análise da psicologia social e sua crítica quanto à medicalização
do sofrimento mental e das práticas manicomiais foram fundamentais
para que a categoria se ocupasse da reforma psiquiátrica, como
apontam também os autores citados acima.
Spink et al. (2010, p. 87) abordam ainda a necessidade da psicologia
ampliar seu olhar para além da classificação das doenças. Os autores
não negam a importância do uso do CID-10 (Código Internacional
das Doenças) e da epidemiologia, porém, para eles, é importante
que “o psicólogo perceba as demandas que lhe são postas na
Saúde Pública também por outros prismas, e que possa distinguir
diagnóstico de queixa e de demanda”.
Para ficar mais claro, a queixa é o que leva o sujeito a procurar
pelo atendimento, sendo relacionada ao primeiro momento do
contato entre ele e o profissional. Já a demanda é uma leitura mais
profunda, quando o sujeito entra em contato com o seu desejo e
toma consciência do que precisa. Já o uso do CID-10 é facultativo
ao psicólogo, ou seja, segundo a Resolução CFP nº 007/2003, seu
indicativo está a critério do profissional.
Exemplificando
Uma pessoa procura o psicólogo relatando a queixa de insônia, falta de
apetite, tristeza há mais de semanas, falta de vontade de fazer coisas
do cotidiano. A sua hipótese diagnóstica pode ser depressão (hipótese,
porque ela será esclarecida ao longo do processo de cuidado). Porém,
a demanda do sujeito pode estar relacionada ao desejo de ser amado,
de ter mais atenção e valorização dentro do contexto de trabalho, por
exemplo. Percebe a diferença entre diagnóstico, demanda e queixa?
U3 - Territorialidade 125
Pesquise mais
Veja no link abaixo um exemplo do compromisso da psicologia com o SUS:
CFP integra atividades da 15ª Conferência Nacional de Saúde. Disponível
em: <http://site.cfp.org.br/representantes-do-cfp-integram-atividades-da-
15a-conferencia-nacional-de-saude/>. Acesso em: 19 jan. 2016
126 U3 - Territorialidade
Como você viu anteriormente, a psicologia tem o papel de
provocar inquietações, então precisamos pensar: por que expulsar
quando a comunidade poderia incluir e proteger?
Atenção
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois compare-as com as de seus colegas.
U3 - Territorialidade 127
Lembre-se
Spink et al. (2010, p. 87) apontam para a necessidade da psicologia olhar
além da classificação das doenças. Para eles, é importante que “o psicólogo
perceba as demandas que lhe são postas na Saúde Pública também por
outros prismas, e que possa distinguir diagnóstico de queixa e de demanda”.
2. Assim como o SUS, o SUAS possui sua definição de território, que está baseado:
a) na população.
b) na rede intersetorial.
c) no CRAS.
d) na vulnerabilidade.
e) no CREAS.
128 U3 - Territorialidade
Seção 3.2
Promoção da cidadania
Diálogo aberto
Na seção anterior, você foi apresentado a uma situação que
versava sobre o seu trabalho em um centro de saúde da região
central de seu município.
Ainda imerso nesse cenário, atuando como psicólogo nesse
equipamento público, você conhece João, uma criança de 9 anos
que mora em uma casa precária com seus pais. A família toda faz
mendicância para sobreviver, pois a renda proveniente do Programa
Bolsa Família é muito baixa. Diante dessa realidade reflita: será
que os benefícios de transferência de renda, por si só, promovem
cidadania? Como envolver as crianças no processo de emancipação
e empoderamento, tão fundamentais na busca por cidadania? Quais
estratégias de enfrentamento às desigualdades sociais o psicólogo
pode desenvolver com a comunidade?
Ao final desta seção, é esperado que você tenha atingido
estes objetivos de aprendizagem: compreender a aplicação do
termo cidadania na sociedade brasileira; identificar de que forma
o psicólogo pode trabalhar na promoção da cidadania; conhecer
projetos de interação com a comunidade, promotores de cidadania.
Procure correlacionar questões apresentadas nesta seção
aos conteúdos da seção anterior, refletindo sobre o sentimento
de pertencimento dos sujeitos que habitam território. Enquanto
estudante de psicologia busque, somado ao conhecimento técnico
científico, realizar o exercício de reflexão constante, procurando
desconstruir conceitos enraizados, trabalhar e potencializar novos
conceitos que ampliem seu entendimento a respeito do sofrimento
e das possibilidades de vivências humanas, disponibilizando-se a
ouvir, profunda e acolhedoramente, as histórias desses outros que
integram seu trabalho.
O psicólogo, em sua atuação nas políticas públicas, precisa estar
sempre atento às relações de poder que alimentam as instituições e as
interações humanas, compreender os movimentos políticos, a lógica da
inclusão x exclusão. A quem serve o interesse de excluir e marginalizar?
U3 - Territorialidade 129
Não pode faltar
A cidadania é um conceito dinâmico e variável, a partir da
cultura de determinado país. Portanto, a concepção de cidadania
no Brasil será inevitavelmente diferente da concepção chinesa ou
paquistanesa, por exemplo.
Moisés (2005) nos conta que a palavra “cidadão” tem origem no
termo latino civitas, mas a ideia de igualdade pode ser observada
em textos religiosos antigos que apontavam que toda pessoa seria
igual perante Deus. Depois, na Grécia antiga, as ideias de igualdade
e liberdade (princípios fundamentais do conceito atual de cidadania)
tiveram relevância no contexto das cidades porque os laços entre
os cidadãos formavam a base da comunidade e a protegiam da
hostilidade e da invasão de vizinhos e estrangeiros. Aqui havia
um movimento de preservação das propriedades privadas, mas
também está implicada a importância do sentimento de cidadania
na proteção da comunidade, do território.
Mais tarde, prossegue o autor, nos séculos XVII e XVIII, Rousseau
e Locke problematizaram outras questões que ofertaram as bases
filosóficas do conceito e, com o advento das revoluções (inglesas,
americana e francesa), o uso desse conceito estabeleceu um vínculo
entre a questão jurídico-legal e as noções de liberdade, igualdade,
fraternidade e o Estado. O cidadão passou a ser reconhecido como
quem pertence àquela comunidade e, portanto, a possuir o direito
de participar da escolha de governos e representantes.
Podemos compreender que o conceito de cidadania possui uma
íntima relação com o direito de voto. No caso do Brasil, o modelo
de governo presidencialista supõe um estado de democracia no
qual seus cidadãos (acima de 16 anos) elegem seus representantes
através do voto direto. A democracia também pressupõe que toda a
população, independente de sua idade, manifeste-se e questione o
sistema no qual estão inseridos.
Segundo Moisés (2005), esse modelo democrático – que também
aponta diferenças de posses materiais, poder ou status social – não
descarta a questão da igualdade perante a lei, mas, fazendo referência
à Marx, o autor aponta que a questão da cidadania, baseada nesses
conceitos jurídico-legais, acaba ocultando a exclusão e a desigualdade
verdadeiras, que são geradas pelas relações capitalistas.
130 U3 - Territorialidade
Exemplificando
Considerar, no plano jurídico, que todos são iguais perante a lei pode
transmitir uma falsa sensação de igualdade, porque na realidade o
sistema capitalista alimenta as desigualdades sociais.
Reflita
Se a cidadania está também relacionada ao direito de voto (ao direito
de escolhermos nossos representantes), um modelo de governo
antidemocrático, como a intervenção militar, nos retiraria a cidadania?
U3 - Territorialidade 131
percepção das carências comuns aos cidadãos e vinculando-se
fortemente à noção de direitos básicos.
As demandas mobilizadas pelo coletivo inquietam o sistema,
questionam o governo, apontam falhas, pressionam.
Mas será que somos preparados para questionar? Quem
ocuparia esse lugar de “preparador”? Muitos estudiosos atribuem
essa tarefa à escola, porque, como apontam Fischman e Hass
(2012), está implícita a crença de que uma pessoa educada produz
um cidadão melhor, reconhecendo, portanto, que ninguém nasce
com habilidade para a cidadania.
Sim, a cidadania é praticada a partir da socialização, da inserção
do sujeito na cultura, na linguagem, por isso, para promovermos
cidadania, é preciso, primeiro, promover espaços qualificados de
questionamentos, concorda?
Mas Biesta (2007) apud Fischman e Hass (2012) rebate esse lugar
ofertado à escola, dizendo
132 U3 - Territorialidade
Exemplificando
Outro exemplo são os movimentos antidemocráticos, citados há pouco.
Se considerarmos que, por exemplo, a intervenção militar já cerceou
direitos civis e políticos época da ditadura militar, como o voto direto e as
livres manifestações, vamos compreender que esse movimento caminha
na contramão dos direitos instituídos pela própria Constituição Federal.
Portanto, direitos instituídos seriam feridos.
Assimile
A cidadania possui como princípios básicos a igualdade e a liberdade.
Porém, precisamos analisar em qual contexto a busca por igualdade
de direitos se localiza, pois, ao mesmo tempo em que conquistamos
inúmeros deles, a sociedade capitalista não permite que sejam efetivados,
pois se permitissem não haveria necessidade de mobilização social em
busca de garantia de direitos.
U3 - Territorialidade 133
O empoderamento é uma forma de combate à pobreza e
a exclusão social, pois ele oferta condições para que os sujeitos
olhem para si e, a partir de suas histórias, das deficiências e carências
vividas, possam propor ações e criar bandeiras de lutas, pois as
ações de governo, na área social, vêm se pautando acentuadamente
na questão da transferência de renda. Claro que essas ações são
importantes para que as pessoas tenham o básico de seus direitos
garantidos (como acesso ao alimento, por exemplo), mas, como
aponta Bronzo (2006) apud Barreto e Paula (2014), a literatura
descreve que o fenômeno da pobreza e da exclusão não envolve
somente a questão da carência material básica, mas múltiplas
dimensões subjetivas (inclusive a questão de poder e dominância)
e, portanto é fundamental que o governo supere a lógica de prover
material e proponha outras dimensões complementares, como
a própria questão que estamos tratando aqui: empoderamento,
reflexão, condição de acesso ao conhecimento e a história.
Pesquise mais
Acesse a noticia no link que aborda um projeto mineiro chamado
Programa Polos de Cidadania. Assim você visualiza possibilidades de
construção de cidadania na prática.
Disponível em: <http://www.childhood.org.br/programa-polos-de-cidadania-
une-pesquisa-e-acoes-sociais-no-enfrentamento-da-violencia-infantojuvenil>.
Acesso em: 13 mar. 2016.
134 U3 - Territorialidade
laços sociais”. Eles não se configuram como espaço de assistência
(como CAPS ou Unidade Básica, por exemplo) e sim como “espaço
de articulação com a vida cotidiana” (BRASIL, 2005).
Embora tenham nascido com a vocação de reinserir pessoas
em sofrimento mental à sociedade, os Centros de Convivência
estão abertos a toda população. Neles, são desenvolvidas diversas
atividades como: culinária, prática de esportes, artesanato, roda de
conversa, dança. Esse equipamento contempla uma equipe mínima
de um gerente e três oficineiros (artistas plásticos, músicos, atores,
artesãos etc.). Alguns espaços contam também com psicólogos,
terapeutas ocupacionais, pedagogos, entre outros.
Pesquise mais
Para você visualizar a experiência dos Centros de Convivência, acesse o
link disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=NUpD069X-Iw>.
U3 - Territorialidade 135
histórias contadas, relata a autora, “transformamos um lugar de medo,
de risco, de degradação em espaço de brincar, espaço de criança feliz,
espaço de cuidado, espaço onde adultos brincavam com crianças”
(WARPECHOWSKI, 2012, p. 233).
A autora encerra sua narrativa relatando que as histórias
possibilitaram a construção de vínculos e espaços de saúde e vida,
em que foi possível ouvir a dor, as agressões, o desamparo. Essa
proposta é um exemplo de como o psicólogo pode promover
cidadania através de sua inserção com a comunidade, pois a
experiência proporcionou lugar social a essas crianças, contribuiu
para que tomassem posse de seus desejos e se apropriassem de
suas manifestações subjetivas, colocando-se no mundo como
sujeitos ativos e transformadores.
Portanto, a psicologia na promoção da cidadania resgata a
potência de cada sujeito, independente de sua idade, e constrói
bases sólidas de luta e enfrentamento às desigualdades sociais tão
perversamente persistentes em nosso sistema. Seu papel principal
é contribuir para o processo de reflexão crítica do sujeito sobre o
contexto no qual está inserido, analisando como podemos nos tornar
protagonistas de nossas histórias, como podemos nos emancipar e
permanecer na luta por direitos conquistados e a conquistar.
136 U3 - Territorialidade
Lembre-se
Como aponta Bronzo (2006) apud Barreto e Paula (2014), a literatura
descreve que o fenômeno da pobreza e da exclusão não envolve somente
a questão da carência material básica, mas múltiplas dimensões subjetivas.
Atenção
São os espaços de participação que consolidam a resistência da
população frente à exclusão e a marginalização das pessoas (OLIVEIRA,
2007 apud VIEIRA et al., 2013).
U3 - Territorialidade 137
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois compare-as com as de seus colegas.
Lembre-se
Os Centros de Convivência, além de ofertarem espaço de produção
de saúde, também são promotores de cidadania, resgatam a dignidade
humana, principalmente das pessoas egressas do hospital psiquiátrico,
garantindo-lhes direito ao acesso à saúde, à educação, ao lazer, à
liberdade, proporcionando o compartilhar das histórias, das alegrias e
desafios do viver cotidiano de todos nós.
138 U3 - Territorialidade
Faça você mesmo
Verifique se em seu município há espaços como o Centro de Convivência.
Se existir, procure conhecer o local, compreender seu funcionamento,
identificar seus frequentadores. Se não houver, procure levantar quais
outros locais trabalham a democracia cidadã.
U3 - Territorialidade 139
Seção 3.3
Programas de políticas públicas de base nacional
Diálogo aberto
Nesta seção, aprofundaremos dois programas de base nacional,
muito importantes para a política de saúde: o Telessaúde Brasil
Redes e o Consultório na Rua.
Inserido no contexto de trabalho da UBS, localizada na região
central de sua cidade, hoje conheceremos Jéssica, uma jovem de 27
anos que reside nas ruas desse território desde os 15 anos, e Francisco,
seu companheiro que tem 30 anos, e reside nas ruas desde os 11 anos
de idade. Juntos tiveram dois filhos, que hoje estão em acolhimento
institucional. Foram retirados de sua família após denúncias ao
Conselho Tutelar e à Vara da Infância e Juventude porque seus pais
faziam, e ainda fazem, uso de crack. Mas nem Jéssica nem Francisco
acessam a UBS em que você trabalha, pois se sentem discriminados e
acreditam não possuir o direito à saúde, “já que não pagam impostos”,
como ouviram uma vez de um morador do bairro.
Qual a contribuição da psicologia para esta realidade? Como as
pessoas em situação de rua podem ter acesso à psicologia? Como
trabalhar questões de direitos com essas pessoas? Como ofertar
atendimento a esses cidadãos?
Ao final desta seção, é esperado que você consiga: compreender
o funcionamento e a importância do serviço Consultório na Rua;
ampliar seu entendimento sobre a vivência em situação de rua;
aprender sobre o Programa Telessaúde Brasil Redes; identificar como
este programa atua na educação continuada dos trabalhadores
do SUS, e localizar como a psicologia se relaciona com as novas
políticas de atenção à saúde.
140 U3 - Territorialidade
público de saúde, porque se localiza próximo ao território dos
usuários. Segundo o Ministério da Saúde, a nova PNAB, instituída
em 2011, amplia ações e inclui serviços como o Consultório na Rua
(CR), destinado a pessoas que vivem em situação de rua, como você
verá adiante. Essa nova política de Atenção Básica propõe ampliar
também sua resolutividade e a continuidade do atendimento através
do programa Telessaúde Brasil Redes (BRASIL, 2012).
Esses dois dispositivos são o foco de atenção desta seção.
Comecemos pelo primeiro. Você já ouviu falar desse serviço?
Tem ideia de sua proposta? O que seria um consultório inserido na
rua? Como ele atua?
Pois bem, como descrito há pouco, o CR foi implantado graças à
nova PNAB, instituída pela Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011.
O CR constitui-se por “equipes da atenção básica, compostas por
profissionais de saúde com responsabilidade exclusiva de articular e
prestar atenção integral à saúde das pessoas em situação de rua”
(BRASIL, 2012, p. 62).
As atividades são realizadas em unidade móvel, itinerante, que
se desloca até a população, desenvolvendo ações em parceria com
as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e com os Núcleos de Apoio à
Saúde da Família (NASF). Apenas para esclarecer, os NASFs, embora
façam parte da rede da atenção básica, não possuem unidades
físicas e não são de acesso livre à população. Suas equipes atuam
ofertando apoio às UBSs, com o intuito de melhorar a resolutividade
das questões (BRASIL, 2012). Dessa mesma forma, atuam com as
equipes que atendem populações específicas, como é o caso da
população em situação de rua.
Porém, outros serviços também devem compor a rede de
articulação das equipes da atenção básica que atuam com
população específica, como os Centros de Atenção Psicossocial, da
Rede de Urgência, serviços e instituições pertencentes ao Sistema
Único de Assistência Social (SUAS), entre outras instituições públicas
e da sociedade civil que forem necessárias (BRASIL, 2012).
Podemos, então, observar que o trabalho das equipes do CR é
articulado a outros serviços, dada a complexidade das questões que
o envolvem. Além disso, as pessoas que vivem em situação de rua
necessitam da garantia de diversos direitos, sendo o acesso à saúde
apenas um deles. Portanto, as ações devem partir do pressuposto
U3 - Territorialidade 141
de que a política de saúde tem o dever de articular-se com demais
serviços e políticas públicas.
Segundo a legislação que institui a PNAB, o horário de
funcionamento das equipes dos CR’s deve atender à demanda
da população, podendo ocorrer, inclusive, em períodos noturnos,
todos os dias da semana. Contudo, nem todos os municípios
já contam com esse dispositivo. Dessa forma, na ausência desse
serviço, é a própria unidade básica de saúde que deverá ofertar as
ações à população em situação de rua.
Reflita
Como desenvolver ações de saúde voltadas para uma população marginalizada
e discriminada? Como garantir que essas pessoas, despercebidas socialmente,
sintam que também são parte do sistema de garantia de direitos?
Reflita
Por que o termo utilizado é “situação de rua” e não “população de rua”?
142 U3 - Territorialidade
reconhecimento e garantia de direitos e promoção de dignidade
humana que toma o pano de fundo da “situação de rua”.
Retomando a questão da Política Nacional para Pessoas em
situação de rua, Hallais e Barros (2015) afirmam que ela assegura a
esta população o acesso à saúde, mas tanto os serviços de assistência
como as unidades de acolhimento (albergues) não possuem estrutura,
ou recursos humanos, para realizar o atendimento à saúde.
Por essa razão, prosseguem os autores, surgem os Consultórios
na Rua – a partir da PNAB, como você viu, mas com organização e
funcionamento definidos pela Portaria nº 122, de 25 de janeiro de 2012.
Ainda segundo os autores, os CRs priorizam que o cuidado seja
realizado no próprio território – veja que a noção de território é a
mesma estudada por você na seção 3.1.
U3 - Territorialidade 143
Exemplificando
As DSTs geralmente estão associadas a herpes, gonorreia, sífilis e,
por vezes, HIV (embora outras doenças possam estar presentes). As
doenças dermatológicas estão associadas, muitas vezes, à escabiose
(ou sarna humana). Em relação aos transtornos mentais, não é incomum
encontramos sujeitos psicóticos. Além disso, muitas vezes (mas não em
todos os casos) há o uso abusivo de substâncias psicoativas, como crack,
cocaína, álcool, tabaco, maconha, entre outros.
144 U3 - Territorialidade
Assimile
Pesquise mais
U3 - Territorialidade 145
Além da responsabilidade individual na busca por aperfeiçoamento
técnico e teórico, o SUS tem o dever de ofertar educação continuada
a seus profissionais, conforme previsto na Lei nº 8.080/90.
Uma dessas ações voltadas à educação continuada e à formação
dos trabalhadores do SUS é o Programa Telessaúde Brasil Redes.
Como você viu no início desta seção, esse programa também
está associado à PNAB. Ele se refere a “uma ação nacional que busca
melhorar a qualidade do atendimento e da atenção básica no SUS,
integrando ensino e serviço por meio de ferramentas de tecnologias
da informação” (BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Disponível em:
<http://programa.telessaudebrasil.org.br/vhl/expansao/sobre-
teste/>. Acesso em: 20 jan. 2016).
Silva (2014) apud Pereira e Machado (2015, p. 3283) define o
termo Telessaúde como sendo “uma nova maneira de pensar os
processos de saúde, quebrando a barreira da distância, usando as
tecnologias da informação e telecomunicação”.
Mas, antes de entendermos como esse programa se desenvolve,
faremos uma breve retrospectiva histórica de sua criação.
Segundo o Ministério da Saúde, o início do projeto, que se
chamava Programa Nacional de Telessaúde, ocorreu em 2005. Mas
somente no ano de 2007 é que o programa foi implementado, através
de um projeto-piloto que envolveu nove Núcleos de Telessaúde
(instituições formadoras) localizados em universidades nos estados
do Amazonas, Ceará, Pernambuco, Goiás, Minas Gerais, Rio de
Janeiro, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A meta deste
projeto era qualificar aproximadamente 2.700 equipes da Estratégia
de Saúde da Família e com isso propor melhoria na qualidade
de atendimento das UBSs, com bons níveis de resolutividades
das questões, reduzindo custo e tempo, agilizando atendimento
prestado e otimizando recursos dentro de todo o SUS, beneficiando
quase 10 milhões de usuários. Em 2011, foi aprovada a Portaria nº
2.546 de 27 de outubro, redefinindo e ampliando o programa, além
de substituir sua denominação por Programa Nacional Telessaúde
Brasil Redes (Telessaúde Brasil Redes).
Em 2012, também passou a ser ofertada teleconsultoria por
telefone, oferecendo suporte aos médicos da atenção básica que
participam do Programa Mais Médicos, por exemplo (BRASIL, 2015).
146 U3 - Territorialidade
Segundo o Ministério da Saúde, em 2015 o Programa encontrava-
se em funcionamento em 22 estados, reunindo aproximadamente
6.000 pontos instalados em UBSs de 2.600 municípios e envolvendo
50.000 profissionais (idem).
Esse programa é composto por gestores da saúde, instituições
formadoras de profissionais da saúde e serviços de saúde do SUS.
Os serviços desenvolvidos por eles, segundo o Ministério da Saúde,
são: teleconsultoria, telediagnóstico, segunda opinião formativa e
tele-educação.
Vamos conhecê-los:
1. Teleconsultoria: ocorre quando os profissionais ou gestores,
através de instrumentos de comunicação, solicitam ajuda de
um consultor para esclarecer dúvidas sobre procedimentos,
questões de processo de trabalho ou outras ações em saúde
(BRASIL, 2011b).
Exemplificando
Pesquise mais
O artigo abaixo relata a experiência de Pernambuco com o Programa
Telessaúde Brasil Redes a partir de equipes de saúde mental inseridas
em UBSs.
NOVAES, Magdala de Araújo et al. Tele-educação para educação
continuada das equipes de saúde da família em saúde mental: a
experiência de Pernambuco, Brasil. Interface (Botucatu), Botucatu, v.
16, n. 43, p. 1095-1106, dez. 2012. Disponível em <http://www.scielo.br/
scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-32832012000400018&lng=en
&nrm=iso>. Acesso em: 19 jan. 2016.
U3 - Territorialidade 147
Essa nova possibilidade de transmissão de conhecimento, de
troca de saberes a partir das inovações tecnológicas, demonstra uma
tentativa do país em caminhar ao lado dos avanços tecnológicos,
transformando-os em instrumentos facilitadores das práticas
cotidianas. Porém, há desafios, também.
O programa não é desenvolvido exclusivamente no Brasil.
Conforme observado por Santos et al. (2014) vários países da
América Latina implementaram projetos como este, tais como:
Colômbia, Equador, México e Panamá. Outros encontram-se em
processo de elaboração e implantação: Bolívia, Costa Rica, Cuba, El
Salvador, Guatemala, Peru e Venezuela.
O que os autores observam é que em países em desenvolvimento:
148 U3 - Territorialidade
mantermos, enquanto profissionais de políticas públicas, antenados
com as novas configurações de trabalho que objetivam resolver as
questões, de forma eficaz, dos usuários dos serviços.
Atenção
Se em seu município não houver o serviço de CR as ações para a
população em situação de rua devem ser realizadas pela UBS.
Lembre-se
Para a resolução desta SP, é muito importante que você tenha claro o
conceito de população em situação de rua. Ela é definida como “grupo
populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema,
os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de
moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e
as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma
temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para
pernoite temporário ou como moradia provisória” (BRASIL, 2009, Art. 1,
parágrafo único).
U3 - Territorialidade 149
e poderá contar com o recurso do Programa Telessaúde Brasil Redes
para discutir casos emblemáticos e se aperfeiçoar tecnicamente,
através do processo de educação continuada.
O psicólogo precisa ter como norte uma atuação baseada na
escuta desprendida de preconceito, de dó ou outro sentimento que
possa interferir negativamente na autonomia e escolha dos sujeitos.
É fundamental conhecer suas trajetórias, identificar suas histórias de
vida a partir do que é possível ser contado, respeitando o silêncio
quando ele vier.
A psicologia também pode inserir-se nas ações de redução de
danos, oferecendo orientação, tratamento, articulando a rede de
saúde e os responsáveis pela oferta de insumos, para evitar que
as pessoas se contaminem ao compartilhar instrumentos no uso
de substâncias psicoativas ou em práticas sexuais. Na estratégia
de redução de danos, também está contemplada a orientação
quanto aos direitos dos sujeitos em situação de rua. O psicólogo
precisa estar muito atento à abordagem das pessoas, respeitando o
espaço territorial e procurando não impor a interrupção do uso de
substâncias psicoativas, sem utilizar de discursos morais sobre o que
é “bom ou mau”. A proposta é ofertar orientação para que o sujeito
faça a sua escolha e que o psicólogo suporte qualquer que seja ela,
tendo em vista que, se necessário, procure sua própria psicoterapia.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois compare-as com as de seus colegas.
Identidade pressuposta
1. Competência de
Conhecer e atuar em Políticas e Programas de Saúde.
fundamentos de área
• Compreender o funcionamento e a importância do
serviço Consultório na Rua;
• compreender a vivência em situação de rua;
2. Objetivos de • conhecer o Programa Telessaúde Brasil Redes;
aprendizagem • identificar como este programa atua na educação
continuada dos trabalhadores;
• compreender como a psicologia se relaciona com as
novas políticas de atenção à saúde.
150 U3 - Territorialidade
3. Conteúdos
Consultório na Rua. Programa Telessaúde Brasil Redes.
relacionados
Você é psicólogo e atua em uma UBS muito distante
de outros dispositivos da saúde pública. Sua equipe
encontra-se com dificuldade para resolver uma questão
de um adolescente com uma grave doença genética e
que está depressivo. Você atende o jovem há pouco mais
4. Descrição da SP
de seis meses, mas também acredita que precisa de ajuda
para ampliar sua compreensão sobre o caso. Além de sua
equipe, não há outros profissionais com quem você possa
discutir o caso clínico. Como você e a equipe devem
proceder nessa situação?
Primeiramente, você e a equipe precisam identificar se em
sua UBS há um ponto de Telessaúde e utilizar do recurso de
Teleconsultoria para obter o aprofundamento necessário
para a resolução deste caso clínico; se não houver este
recurso, a equipe poderá fazer uso do número de telefone
5. Resolução da SP
do programa disponibilizado aos médicos. É muito
importante que a equipe discuta as informações recebidas,
analise as propostas e avalie se elas são aplicáveis, antes de
realizar qualquer procedimento com o usuário, inclusive a
psicologia.
Lembre-se
Telessaúde é “uma nova maneira de pensar os processos de saúde,
quebrando a barreira da distância, usando as tecnologias da informação
e telecomunicação” (SILVA, 2014 apud PEREIRA; MACHADO, 2015, p.
3283) e que, segundo o Ministério da Saúde, busca melhorar a qualidade
do atendimento ofertado pelo SUS.
a) NASF d) CAPS
b) Telessaúde e) Assistência Social
c) Atenção Básica
U3 - Territorialidade 151
2. O Consultório na Rua (CR) é um dispositivo criado para atender pessoas
que vivem em situação de rua. Assinale a alternativa que melhor descreve
as ações desenvolvidas por esse serviço:
a) O CR deve articular suas ações a política de assistência social, para
que as pessoas em situação de rua sejam encaminhadas aos albergues.
A equipe que atua neste dispositivo é multiprofissional e está vinculada
à UBS. Porém, na ausência desse serviço no município, a população em
situação de rua é atendida em caso de urgência, já que não possuem
documentos nem comprovante de endereço.
b) O CR deve articular suas ações de cuidado em saúde com as demais
políticas públicas do território. Ele atua com equipe multiprofissional, em
horários que atendam a demanda da população. Quando o município não
conta com o serviço de CR, o atendimento a esta população específica
deve ser ofertado pela UBS.
c) O CR é um serviço da política de assistência social, que conta com uma
equipe multidisciplinar para atender à demanda urgente e emergente da
população em situação de rua. Na ausência desse serviço, quem deverá
ofertar atendimento são os hospitais, através do pronto-atendimento.
d) O CR é um serviço da política de assistência social, mas que conta com a
política de saúde para prestar atendimento médico às pessoas em situação
rua. O horário de funcionamento é comercial, pois no período noturno as
pessoas deverão ser encaminhadas a instituições de acolhimento, para dormir.
e) O CR atua em parceria com a saúde, desenvolvendo ações de redução
de danos e ofertando espaço de moradia às pessoas em situação de rua.
O funcionamento da instituição acontece de acordo com a demanda da
população.
152 U3 - Territorialidade
Seção 3.4
Novas políticas e práticas – Brasil-República inclusiva
Diálogo aberto
Chegamos à última seção desta unidade 3, que se propôs a
tratar do conceito de territorialidade. Para atingir esse objetivo, você
conheceu o conceito de território no SUS e no SUAS, incluindo as
concepções de regionalização, hierarquização e descentralização.
Aprendeu também o conceito de cidadania, que estabelece uma
relação muito profunda e direta com o território no qual estamos
inseridos, por tratar-se de uma ideia dinâmica e cultural. Depois você
conheceu os serviços de Telessaúde Brasil Redes e o Consultório
na Rua, dois dispositivos fundamentais na política de saúde e que
também dialogam com o conceito de territorialidade.
Nesta seção, você aprenderá outros fazeres da psicologia: seu
envolvimento no processo de gestão e também na produção de
conhecimento.
Na última situação-problema desta unidade, você foi promovido
de psicólogo a gestor da UBS que se localiza na região central de seu
município. O que mudará em sua atuação profissional? Quais seus
novos desafios? Como você deve conduzir a gestão de seu grupo de
trabalho? Nesta nova função, você resolveu também pesquisar como
estão as produções científicas da categoria, para incentivar seus
profissionais a produzirem material escrito. O que você encontrou?
Produzimos muito ou pouco cientificamente? Qual a importância da
pesquisa e da produção de saber na atuação do psicólogo?
Os objetivos de aprendizagem relacionados desta seção são:
identificar tipos de liderança; compreender a função do colegiado gestor
no SUS; diagnosticar a produção de periódicos científicos na psicologia.
Para tanto, os conteúdos desta seção versarão sobre o psicólogo
como gestor de ONGs e setor público; e pesquisa e produção de saberes.
U3 - Territorialidade 153
Você vem aprendendo como o psicólogo pode atuar nas
diversas realidades encontradas no território, especialmente na
interlocução com o SUS e com o SUAS. Agora, vamos tratar aqui
de uma atuação pouco divulgada, que é a gestão dos serviços. O
psicólogo poderá assumir a coordenação tanto dos serviços de
saúde como dos serviços de assistência social. Entretanto, é muito
difícil apontar se esse papel tem sido assumido pela categoria, a
nível nacional, porque as publicações científicas sobre esse fazer
são extremamente precárias.
Se psicólogos têm assumido o lugar de gestão, eles não têm
publicado seu fazer, seus desafios, suas invenções e conquistas – o que
configura um prejuízo muito grande para o avanço da ciência psicológica,
principalmente no que se refere às novas práticas em psicologia.
Em 2012, segundo o CFP, havia 60 mil psicólogos atuando no
SUS. Quantos desses assumem o lugar de gestão? Não sabemos,
pois não há estatísticas acessíveis que apontem esses números.
Antes de aprofundarmos sobre a importância de escrevermos e
publicarmos cientificamente nosso fazer, vamos entender melhor do
que se trata o conceito de gestão, especialmente na política de saúde.
Como você sabe, o verbo gerir está relacionado a gerenciar,
portanto indica um papel social de coordenação de uma equipe,
certo? Mas qual lugar o psicólogo deve ocupar ao assumir um
cargo de gerência?
Obviamente quando falamos em gerência esse conceito
pressupõe também conhecimentos técnicos que vão além das
questões psíquicas. Um gestor deve conhecer sobre planejamento,
gastos, organização financeira, planilhas e instrumentos que
concretizem os trabalhos das ONGs e dos serviços públicos (quantos
atendimentos, quantas visitas domiciliares, quantas intervenções
etc.). Parece óbvio, mas não é. Muitos profissionais psicólogos
que assumem a cadeira da gerência acabam tomando o processo
gerenciador como uma extensão de seu trabalho terapêutico,
analisando o comportamento humano de seus colaboradores, por
exemplo. Claro que não podemos perder a visão humana que nos
orienta, compreendendo os aspectos dos colaboradores de forma
integrada e global – esse é um ponto muito importante do lugar
do psicólogo na gerência –, mas, como gestor, espera-se que o
psicólogo também organize e oriente as equipes de trabalho.
154 U3 - Territorialidade
Se o psicólogo não amplia o seu olhar para as questões macros
das políticas públicas, ele desenvolve um trabalho amador. Esse
amadorismo pode ser percebido em qualquer instância e em
diversas situações de gestão.
A falta de gestão profissionalizada pode ser vista em todos os níveis
que envolvam condução, planejamento, programação, auditoria,
avaliação, regulação, legislação e gestão de recursos e serviços.
Além disso, há a prevalência de indicação dos ocupantes dos
cargos de gestão, muitas vezes através de filiação ou envolvimento
partidário. Portanto, assumir um lugar de gestão no sistema público
não é tarefa simples (PAIM; TEIXEIRA, 2007).
Segundo os autores, muitos dos que assumem postos gerenciais
já estão sendo formados por especializações nas áreas, que contam
com o apoio do Ministério da Saúde e de Secretarias Estaduais e
Municipais de Saúde, “constituindo um dos desdobramentos dos
esforços que vêm sendo realizados nos últimos anos em torno da
implementação de programas e atividades de formação e educação
permanente dos profissionais e trabalhadores do SUS” (p. 1826).
Segundo o CFP (2013, p. 55), o psicólogo, enquanto gestor de
serviço de saúde ou da assistência social, deve “transitar, compor,
influenciar, transformar e provocar a Referências Técnicas para a
Atuação de Psicólogas (os)”, em diversas políticas. Para esse órgão,
o psicólogo tem um papel fundamental nas articulações entre
os diversos setores e atores que integram as redes de serviços,
especialmente a saúde, desenvolvendo potenciais parcerias
e construções coletivas, buscando a integralidade em suas
intervenções. Dentre suas funções, estão a proposição de ações que
organizem o trabalho, como a escuta qualificada, a própria educação
permanente abordada anteriormente, a gestão participativa – que
você verá a seguir –, a discussão de metas em espaços coletivos e a
promoção da saúde e da qualidade de vida do trabalho.
Outro ponto importante ao gestor é o seu estilo de liderança, pois
é a partir da relação que assume com o seu grupo de trabalho que o
profissional gestor empodera ou adoece seus membros, potencializa
ou paralisa os processos de trabalhos que possuem reflexos diretos
aos usuários do SUS, ou do SUAS. Mas o que é liderança?
Sadler (2003) apud Dias e Borges (2015) aponta que a liderança
é o centro do processo de grupo. Nesse sentido, Freedman,
U3 - Territorialidade 155
Carlsmith e Sears (1973) apud Pereira, Rizzon e Braghirolli (2011, p.
143) destacam também que “um dos fatos mais impressionantes e
universais sobre grupos é que eles têm quase sempre um líder”.
Mas o que determina a eficiência de uma liderança é a questão
situacional, ou seja, cada situação exige um perfil diferente de líder.
Assim, a liderança passa a ser compreendida como “ação que
auxilia o grupo a atingir seus objetivos dentro de uma determinada
situação” (PEREIRA; RIZZON; BRAGHIROLLI, 2011, p. 145).
Outro ponto é que a liderança, como centro do processo de
grupo, envolve também uma questão de personalidade, de exercício
de influência e persuasão, com um esforço de interação, a partir de
um papel diferenciado (SADLER, 2003 apud DIAS; BORGES, 2015).
Há alguns estilos de liderança.
Segundo Bass e Avolio (1997) apud Dias e Borges (2015), há: a
liderança transacional, transformacional e a laissez-faire. Pereira, Rizzon e
Braghirolli (2011) também destacam três tipos de lideranças: a autocrática,
a democrática e também a laissez-faire. Vamos compreendê-las:
Liderança transacional: o líder acompanha e orienta
os subordinados com vistas a atingir as metas e objetivos
organizacionais, segundo Nord e Fox (1996) apud Dias e Borges
(2015). Os líderes transacionais desenvolvem uma ligação entre
desempenho e recompensa, ou seja, oferece-se recompensa a um
bom desempenho ou são feitas ameaças aos desempenhos ruins.
Outro comportamento exercido por esses líderes é que ou intervêm
no grupo somente quando procedimentos ou normas não são
cumpridos ou atuam como monitores para detectar erros.
Liderança transformacional: o líder procura aumentar a
sensibilidade dos liderados, procurando motivá-los além das
expectativas, segundo Bass e Avolio (1997) apud Dias e Borges
(2015). O comportamento desses líderes está associado,
normalmente, a quatro características: influência idealizada (líder é
modelo para os seguidores), motivação inspiradora (líder procura
expressar a importância dos objetivos desejados de maneira simples
e proporciona significado e desafios com o trabalho proposto),
estímulo intelectual (os líderes desafiam as ideias dos seguidores
para a solução de problemas) e a consideração individualizada
(líderes passam mais tempo ensinando e treinando, de forma
individualizada). Segundo Neto et al. (2012) apud Dias e Borges
156 U3 - Territorialidade
(2015), esses líderes compreendem os erros como possibilidades
de aprendizado, enfrentando melhor a complexidade do trabalho
e suas incertezas, lidam melhor com a resistência, assumem riscos,
buscando ir além do processo mecânico da liderança transacional.
Liderança laissez-faire: o líder interfere pouco nas decisões
do grupo, dando-lhe liberdade para tomarem decisões, evitando
também esclarecer as expectativas e resolver os conflitos,
transferindo sua autoridade ao grupo, abrindo mão do poder de
tomar decisões, segundo Bass e Avolio (2000) apud Dias e Borges
(2015). Nesse sentido Pereira, Rizzon e Braghirolli (2011) também
apontam que estudos revelam que este estilo de liderança provoca
desorganização, baixa produção e insatisfação no grupo.
Liderança autocrática: os líderes estabelecem sozinhos as
normas dos grupos, determinam as atividades e quem vai trabalhar
com quem, por exemplo. Elogiam ou criticam alguém e não se
envolvem nas atividades do grupo, permanecendo, como descrito
por Pereira, Rizzon e Braghirolli (2011, p. 151), no “pedestal” de sua
função. É um estilo de liderança muito semelhante ao transacional.
Em estudos realizados pelos autores, comprovou-se que esse estilo
de liderança promovia maior quantidade de produção, porém as
relações interpessoais eram hostis, agressivas e havia uma queda
importante na produção quando o líder se ausentava.
Liderança democrática: o líder decide junto com o grupo as
diretrizes, os membros têm liberdade para escolher seus parceiros
de trabalho. Nesse caso o envolvimento do grupo, em estudos
apontados pelos autores, apresentava motivação e envolvimento
com a tarefa, a qualidade das relações interpessoais era melhor e
quando o líder se ausentava a produção não caía em quantidade
ou qualidade, pois todos estavam comprometidos com o processo.
Alguns autores afirmam que a melhor forma de liderar é a
democrática. Esse estilo, inclusive, permite que haja mais de um líder
no grupo. No caso do SUS essa liderança compartilhada (gestão
participativa, citada anteriormente) pode acontecer, por exemplo,
pelo Colegiado Gestor e pelo Apoio Institucional – dois métodos
instituídos pela Política Nacional de Humanização.
Segundo o CFP (2013b), para que a consolidação da política do
SUS seja exitosa, é fundamental que haja a gestão participativa, ou
seja, que o profissional gestor envolva efetivamente todos os atores
U3 - Territorialidade 157
sociais do SUS (outros gestores, profissionais da ponta e usuários).
Somente dessa forma conseguiremos garantir compromissos reais
e continuidade e aprimoramento do sistema. Para o órgão:
Assimile
Há diferentes formas de liderar uma equipe. Dentre elas, a liderança
transacional que, assim como a liderança autocrática, está centrada
na tarefa; a liderança transformacional, que, assim como a liderança
democrática, está centrada nas relações interpessoais, nas quais os
líderes não cumprem somente protocolos técnicos, mas envolvem toda
a equipe no comprometimento das ações (não por recompensa ou
punição, mas por sensibilização); e a liderança laissez-faire, que é quando
o líder ausenta-se de sua função de coordenação e deixa o grupo “solto”
para tomar suas próprias decisões.
158 U3 - Territorialidade
Exemplificando
Por exemplo, uma UBS que possui um colegiado gestor e que conta
com um enfermeiro (que representa os demais enfermeiros da
instituição), um técnico de enferma gem, um psicólogo e um médico,
além do coordenador da UBS. São tratadas nessas reuniões as questões
cotidianas do serviço, a assistência à saúde e são pensadas coletivamente
as ações. Elas, portanto, não ficam centralizadas no gestor, mas nesse
colegiado de pessoas. Outra forma é que membros representem sua
equipe, independente da categoria profissional, ou seja, se em uma UBS
há três equipes, cada equipe elege o seu representante para compor o
colegiado gestor.
U3 - Territorialidade 159
Reflita
O quanto características de personalidade dos indivíduos que assumem
a posição de gestão impactam no estilo de liderança? Qual a sua
característica? Entre os modelos de liderança, qual seria o mais facilmente
exercido por você?
Pesquise mais
No artigo abaixo as autoras abordam detalhadamente o processo do
apoio institucional e sua implantação no município, a partir da análise
sobre o despreparo dos profissionais gestores.
MAERSCHNER, Rosane de Lucca et al. Apoio institucional – reordenamento
dos processos de trabalho: sementes lançadas para uma gestão indutora
de reflexões. Interface (Botucatu), Botucatu, v. 18, supl. 1, p. 1089-
1098, 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S1414-32832014000501089&lng=en&nrm=iso>. Acesso em:
8 fev. 2016.
160 U3 - Territorialidade
Como descrito anteriormente, não é possível saber quantos
dos gestores do SUS, atuantes em serviços públicos ou em ONG
cofinanciadas pelo poder executivo, são psicólogos, porque faltam
pesquisas científicas sobre esse tema. Também não sabemos
quantos desses gestores acolhem o apoio institucional e a gestão
colegiada no seu fazer cotidiano.
Com essa escassez de informação, estamos fadados a nos
basearmos em teorias genéricas ou em experiências particulares.
O desenvolvimento de pesquisas científicas e a publicação de
artigos que abordem as experiências profissionais da categoria
em novas práticas são fundamentais para o amadurecimento
da psicologia enquanto ciência e profissão. Você já conheceu o
CREPOP, responsável por coletar informações dos psicólogos e
transformar os números em referência técnica para sua atuação
em políticas públicas. Mas o processo de qualificação da psicologia,
enquanto ciência, não pode estar relacionada somente a este
centro de pesquisas. É preciso que cada profissional se envolva e
se implique em contribuir para o crescimento da ciência e para o
compartilhamento de seu fazer.
Segundo o CFP, há quase 270.000 psicólogos em todo o
país, concentrando suas ações em áreas como clínica particular,
saúde, assistência social, educação, psicologia jurídica, docência,
entre outros. Imagine como seria se pelo menos metade desses
profissionais publicasse suas práticas? Mas será que é assim?
U3 - Territorialidade 161
Mas qual a característica desses periódicos científicos publicados
pelos psicólogos? Segundo os autores, trata-se de um veículo
que tem como leitor principal e autor o pesquisador, ou alunos
de qualquer nível “e o que é publicado, prioritariamente, por
sociedade científica ou instituição acadêmica” (COSTA, AMORIM,
COSTA, 2010, p. 39). Ou seja, para os autores, o artigo científico
é um canal de comunicação entre atores que estão envolvidos
no meio acadêmico (sejam eles produtores ou consumidores do
conhecimento). Não envolvem, portanto, profissionais que não
estejam vinculados a essas instituições.
Os autores também identificaram que menos de 20%, dos
produtores dos periódicos científicos, se encontram em ação.
Como afirmam: “tratando-se de artigos que abordam a temática
da atuação profissional, poder-se-ia esperar que houvesse uma
participação expressiva de profissionais em ação compartilhando
experiências ou refletindo sobre a sua prática. Todavia, não é o que
ocorre” (COSTA, AMORIM, COSTA, 2010, p. 48).
Se esses materiais estão fortemente vinculados à academia,
ou seja, à universidade, poderíamos supor que os psicólogos
escrevem por obrigação, uma vez que eles precisam publicar seus
achados? E, se assim o for, como podemos mobilizar a categoria
para compartilhar seus fazeres e suas experiências cotidianas,
conversando de profissional atuante para profissional atuante?
Fica aqui um desafio, para esta e para as futuras gerações de
psicólogos: compartilhar saberes e práticas espontaneamente e
contribuir cada vez mais para o crescimento da psicologia enquanto
ciência e profissão.
162 U3 - Territorialidade
Atenção
Ao pensar sobre seu novo papel social, identifique qual o seu estilo de liderança:
transacional, transformacional, laissez-faire, autocrática ou democrática?
Lembre-se
U3 - Territorialidade 163
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu, transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois compare-as com as de seus colegas.
Lembre-se
A liderança autocrática, segundo Pereira, Rizzon e Braghirolli (2011),
promove maior quantidade de produção, porém as relações interpessoais
são hostis, agressivas e há uma queda importante na produção quando o
líder se ausentava.
164 U3 - Territorialidade
Faça você mesmo
Eleja 10 pessoas, entre conhecidos ou familiares. Questione-os sobre
como seus líderes se comportam e como eles se sentem diante desse
comportamento. Procure identificar em qual estilo de liderança eles se
enquadram. Se você conseguir aplicar esse exercício com profissionais das
políticas públicas (saúde, assistência social, educação, entre outros), melhor
ainda. Caso não consiga, poderá ampliar para outras atividades a fim de
identificar os estilos de liderança e o impacto no trabalho dos profissionais.
U3 - Territorialidade 165
Referências
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166 U3 - Territorialidade
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U3 - Territorialidade 167
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WARPECHOWSKI, Marisa Batista. Era uma vez...: contação de histórias na
comunidade. In: CRUZ, Lílian Rodrigues da; GUARESCHI, Neusa (Orgs.). O
psicólogo e as políticas públicas de assistência social. Petrópolis: Vozes, 2012.
170 U3 - Territorialidade
Unidade 4
Saúde mental
Convite ao estudo
Reflita
Você já imaginou o que é ficar enclausurado por tantos anos,
simplesmente por ser diferente da ‘média-padrão’? Você consegue
imaginar como é ter o último registro de sua imagem no espelho aos 18
ou 20 anos? Consegue mensurar a violência que é isso? Você consegue
dimensionar o sofrimento a que essas pessoas estiveram submetidas?
Assimile
O hospital surge na Idade Média e até o século XVII era um espaço
privilegiado da igreja, com viés filantrópico, e que objetivava acolher,
hospedar, receber pessoas pobres, adoecidas, sem moradia. Não tinha,
portanto, base médica. A medicina apropria-se desse espaço, nos
moldes como o conhecemos, a partir da Revolução Francesa. Muitas
pessoas, internadas mediante o antigo regime monárquico, receberam
alta hospitalar, e outras instituições foram sendo criadas para acolher as
demandas que, até então, eram demandas ao hospital. Nesse sentido,
surge a figura de Philippe Pinel, um médico que desacorrentou os sujeitos
considerados loucos, mas atribuiu a eles o isolamento em nome da
crença de que era preciso afastar os “alienados” do meio social – origem
de todo sofrimento. Assim, surgem os hospitais psiquiátricos, com a
proposta de privar os sujeitos do convívio da sociedade.
Pesquise mais
Nesse trabalho a autora apresenta narrativas de pessoas internadas em
hospitais manicomiais.
WADI, Yonissa Marmitt. Entre muros: os loucos contam o hospício. Topoi
(Rio J.), Rio de Janeiro, v. 12, n. 22, p. 250-269, jun. 2011. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2237-101X201
1000100250&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 9 fev. 2016.
Vocabulário
Nosologia = classificação das doenças.
Assimile
O modelo de Franco Basaglia inspirou o Brasil, através do movimento dos
trabalhadores, familiares e usuários da saúde mental, a lutar pela reforma
psiquiátrica no país. Essa reforma objetiva substituir, aos poucos, para não
causar desassistência, os leitos em hospitais psiquiátricos por serviços
substitutivos, como CAPS. Dessa forma, o ponto de partida do tratamento
é a sociedade e a reintegração do sujeito ao meio social, contrapondo o
modelo praticado por Pinel e seus seguidores, que há séculos vem sendo
executado. A reforma psiquiátrica brasileira teve início no final da década
de 1970, com o Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental e, até hoje,
ainda não se consolidou efetivamente. Em 1989, o projeto de Lei nº 3.657,
do Deputado Federal Paulo Delgado, começou a tramitar no congresso
e só foi aprovado em 2001. Em 1989 ocorre também a intervenção no
Hospital Psiquiátrico “Anchieta” em Santos, provocando ser possível um
novo modelo de tratamento aos sujeitos em importante sofrimento mental.
Pesquise mais
O Brasil foi sentenciado, pela Corte Interamericana, devido à morte de
Damião Ximenez, torturado e assassinado quando estava internado na Casa
de Repouso Guararapes, no município de Sobral/CE. Disponível em: <http://
global.org.br/programas/o-caso-damiao-ximenes-o-primeiro-contra-o-
brasil-na-corte-interamericana-de-direitos-humanos-sera-decidido-entre-
os-dias-3-e-4-de-julho-na-costa-rica/>. Acesso em: 9 fev. 2016.
Exemplificando
Em 2012, foi assinado um termo de ajustamento de conduta (TAC) por um
hospital no interior de São Paulo, no qual os diretores se comprometeram
a fechar esta instituição, em um prazo máximo de três anos. Na ocasião
havia, ainda, 405 pessoas internadas em regime manicomial. Hoje,
começo de 2016, o hospital ainda não cumpriu com seu acordo e resiste
ao fechamento de seus leitos.
Atenção
Há ainda hoje muitos modelos manicomiais que precisam ser combatidos.
A desinstitucionalização dos sujeitos em sofrimento ainda está em
processo no nosso país e demanda, cada vez mais, força do coletivo
para se consolidar. Você, enquanto estudante de psicologia, também é
parte desse movimento.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois as compare com as de seus colegas.
Pesquise mais
Para ter acesso à reportagem acesse o link:
BIRMAN, Joel. Saúde mental: a identidade do psiquiatra. Rev. Saúde em
Debate, Rio de Janeiro, n. 13, p. 62, 1981. Disponível em: <http://docvirt.
com/asp/acervo_cebes.asp?Bib=SAUDEDEBATE&PASTA=N.13&pesq=&
x=80&y=21>. Acesso em: 5 mar. 2016.
Pesquise mais
Para compreender melhor o movimento da redução de leitos psiquiátricos
acesse o link:
DUARTE, Silvia Louzada; GARCIA. Reforma psiquiátrica: trajetória de
leitos psiquiátricos no Brasil. Emancipação, Ponta Grossa, v. 13, n. 1, p.
39-54, 2013. Disponível em: <http://www.revistas2.uepg.br/index.php/
emancipacao/article/view/3871>. Acesso em: 27 fev. 2016.
Assimile
A Lei nº 10.216/2001 é um marco na história da reforma psiquiátrica
brasileira. Após 12 anos de tramitação, sua promulgação determinou
a proteção aos direitos das pessoas em sofrimento mental e o
redirecionamento das ações de saúde. Porém, embora ela seja
fundamental, há diversos pontos que não foram contemplados em sua
aprovação. Por esta razão, outras legislações foram sendo criadas e
aprovadas – movimento que se segue até os dias atuais. Uma dessas
ações é a determinação de que os leitos psiquiátricos fossem desativados
progressivamente, na medida, em os serviços extra-hospitalares fossem
criados, para não ofertar desassistência ao usuário desospitalizado.
Pesquise mais
Leia o artigo abaixo, escrito por duas psicólogas, que trata da experiência
de acolhimento em saúde mental em uma UBS.
MINOIA, Natali Pimentel; MINOZZO, Fabiane. Acolhimento em Saúde
Mental: Operando Mudanças na Atenção Primária à Saúde. Psicol.
Cienc. Prof., Brasília, v. 35, n. 4, p. 1340-1349, dez. 2015. Disponível
em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-
98932015000401340&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 27 fev. 2016.
Exemplificando
Exemplificando
Imagine que você trabalha em uma UBS e está acompanhando um sujeito
em importante sofrimento mental (devido ou não o uso de substâncias
psicoativas). Pode chegar um determinado momento em que você e a
sua equipe já não sabem mais como conduzir o caso clínico, em razão
de sua complexidade. Então, vocês solicitam um apoiador ou matriciador
de um serviço de outra complexidade, como o CAPS, para discutir o caso
e pensar junto. O matriciador não possui um saber absoluto, por isso a
construção é coletiva. Ele pode discutir o caso, atender junto com você,
realizar visitas domiciliares a fim de compreender amplamente o caso
clínico e propor caminhos que façam sentido para o usuário e para a
equipe da UBS.
Pesquise mais
Lembre-se
Define-se PTS como uma “estratégia de cuidado que articula um conjunto
de ações resultantes da discussão e da construção coletiva de uma
equipe multidisciplinar e leva em conta as necessidades, as expectativas,
as crenças e o contexto social da pessoa ou do coletivo” (BRASIL, 2007
apud BRASIL, 2013, p. 55).
Atenção
Segundo o Conselho Regional de Psicologia do Estado de São Paulo (CRP/
SP) a saúde mental é uma área tradicionalmente vinculada ao exercício
da psicologia na saúde pública. Os psicólogos atuam diretamente com o
usuário e também com as equipes de trabalho.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois as compare com as de seus colegas.
A importância do matriciamento
1. Competência de Conhecer e atuar em Políticas e Programas de Saúde.
fundamentos de área
• Conhecer a legislação brasileira em saúde mental;
•..Compreender a organização da assistência em
saúde mental a partir dos conceitos de matriciamento,
2. Objetivos de
referência e contrarreferência;
aprendizagem
•..Compreender como funcionam, nos dias de hoje, os
hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico;
• Identificar o lugar da psicologia nesse cenário.
Lembre-se
O matriciamento propõe a retaguarda especializada e o suporte técnico-
pedagógico em um modelo colaborativo de cuidados à população
(MELLO FILHO, 2005 apud BRASIL, 2013). O apoio matricial em momento
algum é um encaminhamento ao especialista. Ao contrário, ele é um
instrumento inovador no acolhimento integral do sujeito em sofrimento.
Exemplificando
Comprar uma peça de roupa ou um objeto são estratégias de resgate da
subjetividade e que nem sempre são simples aos sujeitos que viveram o
processo de clausura.
Pesquise mais
O artigo abaixo foi descrito a partir de pesquisa realizada em duas
residências terapêuticas na cidade de Salvador/BA.
LIMA, Sheila Silva; BRASIL, Sandra Assis. Do Programa de Volta para Casa
à conquista da autonomia: percursos necessários para o real processo
de desinstitucionalização. Physis, Rio de Janeiro, v. 24, n. 1, p. 67-88,
mar. 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0103-73312014000100067&lng=en&nrm=iso>. Acesso em:
9 mar. 2016.
Pesquise mais
Nesse artigo são abordados o processo histórico da construção das SRTs
e seus desafios cotidianos, como o resgate da subjetividade.
SUIYAMA, Renata Cristina Boaretto; ROLIM, Marli Alves; COLVERO, Luciana
de Almeida. Serviços residenciais terapêuticos em saúde mental: uma
proposta que busca resgatar a subjetividade dos sujeitos? Saúde Soc., São
Paulo, v. 16, n. 3, p. 102-110, dez. 2007. Disponível em: <http://www.scielo.
br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902007000300010&lng=
en&nrm=iso>. Acesso em: 9 mar. 2016.
Assimile
O Programa de Volta para Casa está vinculado ao auxílio-reabilitação
psicossocial que prevê o pagamento mensal de benefício aos usuários
que permaneceram internados por dois anos ou mais em instituições
psiquiátricas. Assim como as residências terapêuticas, que são moradias
inseridas no âmbito urbano, este programa compõe os serviços
substitutivos ao modelo manicomial e objetiva a reinserção e reabilitação
psicossocial dos sujeitos em importante sofrimento psíquico.
Exemplificando
A lei determina que não se interne mais os sujeitos em crise nos hospitais
psiquiátricos. Eles são atendidos no próprio serviço ao qual está vinculado,
permanecendo por curto período de tempo até que seja possível o
retorno para casa.
Reflita
Seria o diagnóstico desnecessário nesse novo modelo de tratamento,
uma vez que a lógica que impera é do sujeito livre e cidadão de direitos?
Pesquise mais
Sobre a medicalização da infância leia o artigo abaixo:
DECOTELLI, Kely Magalhães; BOHRE, Luiz Carlos Teixeira; BICALHO,
Pedro Paulo Gastalho de. A droga da obediência: medicalização, infância
e biopoder: notas sobre clínica e política. Psicol. Cienc. Prof., Brasília, v.
33, n. 2, p. 446-459, 2013. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932013000200014&lng=en&nrm=
iso>. Acesso em: 9 mar. 2016.
Reflita
Esse modelo, que defende que é preciso afastar do meio social que
adoece, te lembra alguma coisa? Pinel? Desacorrentar e trancar, em
nome da proteção e da cura?
Atenção
O referenciamento é o trânsito do caso clínico a outro serviço, de forma
responsável. Portanto, não é o simples encaminhamento do caso.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois as compare com as de seus colegas.
Lembre-se
Se for necessário, para atenção à crise, o sujeito poderá fazer uso do leito
do CAPSad III (que funciona 24 horas) ou, na ausência deste, do leito em
hospital geral.
Exemplificando
Se eu nasci em São Paulo e me mudo para Minas Gerais, eu serei um
imigrante em Minas Gerais e um emigrante em São Paulo. A mesma
lógica vale para mudança de país. Se eu me mudo do Brasil para a França,
eu serei um imigrante brasileiro na França e um emigrante brasileiro que
reside na França.
Vocabulário
Aculturação: é o processo de modificação cultural que pode se dar a
partir da convivência com determinada cultura (se eu vou morar no
Japão é possível que eu modifique elementos da minha cultura para me
adaptar à cultura japonesa), ou de forma violenta como ocorreu com os
indígenas brasileiros.
Reflita
Mas, como cuidar das pessoas que emigram em consequência da
violência de seus países de origem?
Pesquise mais
Veja a reportagem que aborda o tema dos refugiados nigerianos no Brasil:
CAMPOS, Amanda. IG São Paulo. Brasil vira destino de nigerianos em
fuga do Boko Haram. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/
mundo/2015-07-18/brasil-vira-destino-de-nigerianos-em-fuga-do-boko-
haram.html>. Acesso em: 11 mar. 2016.
Reflita
Como atuar no cuidado considerando a diferença cultural sem procurar
intervir para que o sujeito se adapte à nossa realidade perdendo suas raízes?
Como não promover uma aculturação violenta aos imigrantes e refugiados?
Vocabulário
Disforia = “sentimento generalizado de ansiedade e depressão” (CABRAL;
NICK, 2001, p. 80).
Sine qua non = termo latino que significa ‘sem o qual não’, ou seja, é
indissociável.
Assimile
Travestis são pessoas que se identificam com as imagens e estilos de
gêneros contrários ao seu sexo biológico, que desejam se apropriar
de roupas e adereços desse outro gênero. Os transexuais são pessoas
que não se identificam com seus genitais biológicos podendo, às vezes,
utilizar da cirurgia de transgenitalização para construir suas expressões
de gênero. Os transgêneros são pessoas que temporariamente se
caracterizam como o sexo oposto, na maioria das vezes com finalidades
artísticas, lúdicas ou eróticas.
Reflita
O que há em comum entre: a condição de imigrantes refugiados, os
sujeitos com identidades trans e os adolescentes em conflito com a lei?
Atenção
Além de aprender uma nova língua, romper com laços territoriais, os
refugiados, principalmente as crianças, enfrentam também a desconfiança
em relação ao outro e com isso apresentam importante sofrimento psíquico.
Lembre-se
Para Achotegui (2009 apud KNOBLOCH, 2015), muitos imigrantes vão
adoecer no processo de deslocamento, pelo motivo do nível alto de estresse
que acaba também comprometendo a adaptação. Mas para o autor, a
imigração em si não é a causa do transtorno mental, mas um fator de risco,
uma vulnerabilidade, já que envolve uma série de perdas, traumas e luto.
Avançando na prática
Pratique mais
Instrução
Desafiamos você a praticar o que aprendeu transferindo seus conhecimentos para
novas situações que pode encontrar no ambiente de trabalho. Realize as atividades
e depois as compare com as de seus colegas.
Despatologizando as diferenças
Competência de
Conhecer e atuar em Políticas e Programas de Saúde.
fundamentos de área
• Abordar o tema da saúde mental de imigrantes
refugiados no Brasil;
• Compreender o conceito de identidades trans;
2. Objetivos de •..Ampliar o olhar para o fenômeno da adolescência
aprendizagem em conflito com a lei;
• Encontrar correlação entre os três temas desta
unidade: imigrantes refugiados, identidade trans e
adolescentes em conflito com a lei.
Saúde mental no processo de migração e imigração;
3. Conteúdos
saúde mental nas identidades trans; saúde mental e
relacionados
adolescente em conflito com a lei.
Marília lhe procura para atendimento psicoterápico
porque apresenta importante sofrimento psíquico.
Diz querer curar-se de sua condição homossexual e
conseguir construir relações afetivas com homens.
4. Descrição da SP Marília afirma que não aguenta mais a pressão da família
e que já foi agredida na rua por estar de mãos dadas
com sua namorada. Você percebe que há importante
adoecimento devido a essa situação e resolve traçar um
projeto de intervenção. Qual seria esse projeto?
Primeiramente é preciso entender profundamente
a causa do sofrimento, ajudando o sujeito em sua
emancipação e enfrentamento dos preconceitos e
estigmas sociais. É preciso desconstruir a ideia de cura,
uma vez que a homossexualidade não é doença. Além
5. Resolução da SP disso, precisamos ampliar nosso olhar para questão
homoafetiva, compreendendo que toda a diversidade
de gênero e os preconceitos a ela relacionados
passam por construções sociais, políticas e históricas
que também devem ser objetos de intervenção da
psicologia.