Pobreza em Moçambique
Pobreza em Moçambique
Pobreza em Moçambique
Março de 2011
*
Esta é a segunda parte da revisão documental da "Análise da Pobreza em Moçambique", um estudo para o
grupo de doadores bilaterais (G19) realizado através de um acordo com Embaixada do Reino dos Países Baixos
em Maputo. Os termos de referência e a primeira parte do estudo, constam do Anexo 3. Esta última consistiu de
uma breve avaliação do relatório "Pobreza e Bem-Estar em Moçambique: Terceira Avaliação Nacional da
Pobreza" (MPD-DNEAP, 2010). Esta segunda parte tem como objectivo fornecer uma análise aprofundada do
padrão de pobreza desde 1997, baseada principalmente em três inquéritos de grande escala aos agregados
familiares, que também formam a espinha dorsal do relatório MPD-DNEAP.
Correspondência: Bart van den Boom, SOW-VU, Centre for World Food Studies, VU University, Amsterdam,
The Netherlands, [email protected]:[email protected].
ii
Agradecimentos
Este relatório foi preparado sob a supervisão do Vasco Molini (Banco Mundial, Maputo),
com orientação adicional de Thomas Kring (PNUD, Maputo) e com a assistência de Alex
Halsema (Centre for World Food Studies, da VU University, Amsterdam). Agradecemos o
apoio Embaixada do Reino dos Países Baixos em Maputo, onde o relatório foi apresentado
em 23 de Fevereiro de 2011. Devemos um muito obrigado ao Vasco Molini por iniciar e
facilitar o trabalho, a Christine Pirenne (Embaixada Holandesa em Maputo) por organizar e
presidir à reunião, e a Thomas Kring por presidir a uma outra reunião no ACNUR em 24 de
Fevereiro de 2011. Gostaríamos também de agradecer aos participantes pelas suas
observações estimulantes e a Keyzer Michiel (Centre for World Food Studies, VU University
Amsterdam) e Elbers Chris (Departamento de Economia da VU University Amsterdam)
pelos comentários a uma versão anterior.
iii
Resumo
Agradecimentos ii
Este relatório foi preparado sob a supervisão do Vasco Molini (Banco Mundial, Maputo), com
orientação adicional de Thomas Kring (PNUD, Maputo) e com a assistência de Alex Halsema
(Centre for World Food Studies, da VU University, Amsterdam). Agradecemos o apoio
Embaixada do Reino dos Países Baixos em Maputo, onde o relatório foi apresentado em 23 de
Fevereiro de 2011. Devemos um muito obrigado ao Vasco Molini por iniciar e facilitar o
trabalho, a Christine Pirenne (Embaixada Holandesa em Maputo) por organizar e presidir à
reunião, e a Thomas Kring por presidir a uma outra reunião no ACNUR em 24 de Fevereiro de
2011. Gostaríamos também de agradecer aos participantes pelas suas observações estimulantes e
a Keyzer Michiel (Centre for World Food Studies, VU University Amsterdam) e Elbers Chris
(Departamento de Economia da VU University Amsterdam) pelos comentários a uma versão
anterior. ii
Resumo iii
1 Introdução 1
†
Esta é a segunda parte da revisão documental da "Análise da Pobreza em Moçambique", um estudo para o
grupo de doadores bilaterais (G19) realizado através de um acordo com Embaixada do Reino dos Países Baixos
em Maputo. Os termos de referência e a primeira parte do estudo, constam do Anexo 3. Esta última consistiu de
uma breve avaliação do relatório "Pobreza e Bem-Estar em Moçambique: Terceira Avaliação Nacional da
Pobreza" (MPD-DNEAP, 2010). Esta segunda parte tem como objectivo fornecer uma análise aprofundada do
padrão de pobreza desde 1997, baseada principalmente em três inquéritos de grande escala aos agregados
familiares, que também formam a espinha dorsal do relatório MPD-DNEAP.
Correspondência: Bart van den Boom, SOW-VU, Centre for World Food Studies, VU University, Amsterdam,
The Netherlands, [email protected]:[email protected].
v
5 Discussão 26
5.1 Principal constatação 26
5.2 Análise da pobreza 28
6 Conclusão 31
Referências 34
ANEXO 1: Mapas 37
ANEXO 2: Tabelas 40
1 Introdução
A história recente de Moçambique tem sido de uma luta contínua pelo desenvolvimento. Logo
depois do país ter ganho a independência em 1975, teve lugar uma perturbação civil que levou a
uma guerra civil, que durou mais de 15 anos. Esta terminou com o cessar-fogo em 1992, e uma
posterior transição para a democracia multipartidária em 1994.
Previsivelmente, o caminho do desenvolvimento de Moçambique foi pavimentado por reais
desafios, incluindo as complexidades envolvidas na recuperação pós-conflito, a construção da paz
e da governação partilhada. Um outro grande desafio de igual dimensão diz respeito ao padrão de
vida excepcionalmente baixo da maioria da população. A prevalência da pobreza é elevada em
todo o país, nomeadamente a inadequação do consumo e das condições de saúde e nutrição. Além
disso, as famílias estão vulneráveis a vários riscos, nomeadamente o risco que está associado com
as grandes cheias do rio Zambeze, que destroem as colheitas, casas e infra-estruturas, e os riscos
causados pelo aumento da epidemia do HIV / SIDA que cobra um alto preço em termos de óbitos
na primeira infância e de crianças que ficam órfãs.
Na verdade, ainda hoje Moçambique é considerado como um dos países mais pobres e
menos desenvolvidos. Isso reflecte-se no facto de Moçambique se encontrar situado nos últimos
lugares em várias listas de países classificados de acordo com o seu nível de desenvolvimento.
Por exemplo, Moçambique é número 197 de 210 no “ranking” de países por nível de renda ““per
capita”” (World Bank, 2010). Da mesma forma, numa lista do Banco Mundial de países que
foram classificados em termos de riqueza “per capita”, Moçambique ocupa a posição 139 de um
total de 152, enquanto que sua posição é nº 177 de entre os 195 países na lista das Nações Unidas,
ao aumentar a sua taxa de mortalidade de crianças com menos de 5 anos de idade (ONU, 2010).
Da mesma forma, na lista dos países africanos classificados pelo seu Índice de Desenvolvimento
Humano, apenas o Burundi, o Níger, o Congo e o Zimbabwe têm um índice ainda menor.
O presente estudo apresenta uma análise dos padrões actuais da pobreza em Moçambique.
O ponto de partida são os três grandes inquéritos consecutivos aos agregados familiares, que
fornecem uma riqueza de informação sobre os padrões da pobreza e as suas alterações na história
recente (INE, 1998, 2004, 2010). Com base nesses mesmos inquéritos, três "Avaliações
Nacionais da Pobreza" confirmaram que, apesar de se terem operado importantes melhorias, a
pobreza continua a grassar no país (MPF / UEM / IFPRI, 1998; MPF / IFPRI / PU, 2004; MPD-
DNEAP , 2010). Contudo, o retrato que emerge dessas avaliações da pobreza não é unívoco e em
um certo sentido inesperado. Em particular, quando se olha para a medida principal da pobreza –
a deficiência de consumo “per capita” - parece que a dinâmica da pobreza nacional e a dimensão
rural-urbana e provincial da pobreza se encontram um tanto em desacordo com a intuição,
2
embora a evidência sugira que a relação entre a situação de pobreza do agregado familiar, por um
lado e outros indicadores comummente utilizados de padrão de vida, por outro lado, deixe muito
a desejar.
Para tratar essas questões e explorar as suas implicações, o relatório procede da seguinte
forma. Após resumir as constatações nas avaliações nacionais da pobreza e sublinhando a
imagem que delas emerge (Secção 2), olhamos com mais atenção para as razões que poderiam
explicar a incongruência relevante dos padrões de pobreza ao longo do tempo, bem como em
vários grupos populacionais, províncias e localidades urbanas e rurais (Secção 3).
Especificamente, esta secção contém uma breve análise da metodologia para identificar e calcular
as linhas de pobreza (Ravallion, 2010a). Seguindo a prática em Moçambique, o enfoque será na
abordagem do Custo das Necessidades Básicas, e nos pressupostos sobre o grupo de agregados
familiares sobre os quais um certo custo estimado empiricamente se aplica. Desde já se deve
dizer que as avaliações nacionais da pobreza utilizam os preços locais (valores da unidade do
agregado familiar) e padrões de consumo local e dinâmicos ("cabaz flexível ajustado"), o que
acarreta muitas linhas de pobreza de contexto específico1 (Tarp et al, 2002;. Arndt e Simler,
2010). A avaliação resultante é única em África no sentido de que a linha de pobreza tem uma
especificidade incomum. Com efeito, de um ponto de vista teórico, as linhas de pobreza de
contexto específico podem ajudar a determinar o estado de pobreza dos agregados familiares com
mais precisão. Por exemplo, supondo que um agregado familiar num ambiente de alto custo
económico (cidade) está à beira da pobreza a um certo nível de despesas, um agregado familiar
semelhante com um mesmo nível das despesas pode ser não-pobre num ambiente de baixo custo
(aldeia). Ao mesmo tempo, a especificidade das linhas de pobreza também pode vir com um
custo, nomeadamente, uma certa perda de consistência e robustez. Por exemplo, pode acontecer
que os dados disponíveis sobrestimem grosseiramente a diferença urbano-rural no custo de vida e
no padrão de vida, o que pode levar a uma situação que muitos agregados familiares na aldeia
sejam erradamente classificados como agregados familiares não-pobres e muitos na cidade como
pobres. Como demonstrado por Ravallion e Bidani (1994) para o caso da Indonésia, isso pode
levar a uma inversão completa da dimensão urbana e rural da pobreza.
1
A primeira avaliação da pobreza emprega 13 linhas diferentes de pobreza, com base nos preços locais e nos
padrões de consumo local observados no inquérito IAF 1996/97 (Niassa e Cabo Delgado, rural e urbano;
Nampula, rural e urbano; Sofala e Zambézia, rural e urbano; Manica e Tete, urbano e rural; Gaza e Inhambane,
rural e urbano, Província de Maputo, rural e urbano; Cidade de Maputo). Para a segunda avaliação, cada uma
destas linhas é ajustada de acordo com as mudanças dos preços locais e os padrões de consumo local observados
no inquérito subsequente IAF 2002/03, enquanto que a terceira avaliação emprega um outro conjunto de 13
linhas de pobreza estimadas usando o inquérito IOF 2008 / 09.
3
2
As amostras dos três inquéritos são grandes e geograficamente muito bem equilibradas (respectivamente, cerca
de 42.700, 44.100 e 51.100 indivíduos em cerca de 8.250, 8.700 e 10.800 agregados familiares em todo o país).
Apenas 1 em 146 distritos está ausente na amostra de 2009, apenas 2 em 2003 e 18 em 1997. A nível das 11
províncias, a população está convenientemente representada em cada amostra, enquanto que o peso de
amostragem do censo foi aplicado para se obter resultados que sejam representativos da população em geral.
Ver a tabela A2.1 do Anexo 2, que contém as tabulações dos dados que fundamentam os números apresentados
no texto principal.
5
Como ponto de partida vamos resumir as principais conclusões, nas três avaliações
nacionais da pobreza. Como já mencionado, os padrões de pobreza que surgem são num certo
sentido inesperados. Em especial, quando se olha para a principal medida de pobreza - que é a
deficiência do consumo dos agregados familiares, medida em termos de consumo “per capita”
abaixo de uma certa linha de pobreza - parece que alguns resultados estão em desacordo com a
intuição, enquanto que outros resultados indicam que a relação entre a situação da pobreza do
agregado familiar e os indicadores comummente utilizados de padrões de vida, tais como estado
nutricional das crianças, propriedade de bens e a parte da alimentação no consumo total de deixa
muito a desejar.
Para ilustrar isto, considere um resultado contra-intuitivo relativo à evolução da pobreza
durante os dois períodos de seis anos entre dois inquéritos consecutivos.
Como indicado na figura 1 pela linha azul - a linha vermelha será discutida na Secção 4 e pode
ser ignorada neste momento3 - concluiu-se que a prevalência da pobreza em Moçambique reduziu
acentuadamente no primeiro período de 1997-2003 (de 69% para 54%), mas manteve-se
praticamente na mesma no período recente de 2003 a 2009, mesmo com um ligeiro aumento (de
54,1% para 54,7%). No entanto, na última década a economia apresentou um crescimento
3
As linhas e as barras azuis nesta figura e em todas as figuras subsequentes ilustram os resultados que estão de
acordo com incidência da pobreza nas três avaliações nacionais da pobreza. As linhas e as barras vermelhas nas
mesmas figuras ilustram os resultados depois de substituir as linhas de pobreza de contexto específico por uma
linha nacional de pobreza, ver a Secção 3. A comparação entre as duas é adiada para a Secção 4.
6
económico anual sustentado de até 8% (PNUD, 2009), enquanto que, apesar de um aumento
moderado na desigualdade, haver pouca evidência de que a distribuição de renda tenha mudado
dramaticamente (James et al., 2005).
A dimensão rural-urbana é outro caso onde os resultados parecem ser fora do comum, ver
figura 2, e mais uma vez, considere apenas as linhas azuis.
Verificou-se que a incidência da pobreza nas zonas rurais em Moçambique não é muito maior em
comparação com as zonas urbanas, enquanto que nos países da África Sub-saariana a pobreza
rural é geralmente cerca de duas ou três vezes maior. Por exemplo, no Gana, a pobreza rural é de
39% em comparação com 11% na área urbana, e no Uganda 34% em comparação com 14% e no
Quénia, 50% em comparação com 32%, ver World Bank (2011). Como pode ser visto na figura,
para Moçambique, a recente avaliação classificou cerca de 50% da população urbana como pobre
comparado com 57% da população rural, enquanto que em 2003 essa diferença é ainda menor:
52% de pobreza na área urbana e 55% na área rural. Além disso, a redução da pobreza no
primeiro período, avançou a um ritmo ligeiramente menor na área urbana (pobreza urbana de
61% para 51%; pobreza rural de 72% para 55%), ao mesmo tempo que continuou o declínio no
segundo período, embora a uma velocidade muito baixa (de 51,5% para 49,6%). A diminuição da
pobreza rural no primeiro período é ainda mais extraordinária, mas, ao contrário da pobreza
7
urbana, constatou-se que a pobreza rural aumentou um pouco no segundo período (de 55% para
57%).
Como se vê nos três painéis superiores da figura 3, as diferenças por província são
igualmente surpreendentes (barras em azul; recorde-se que as barras vermelhas nos painéis
inferiores serão discutidas na Secção 4 e podem ser ignoradas por enquanto). No inquérito
recente, a incidência da pobreza é menor no Niassa, Maputo Cidade e Cabo Delgado (em 32, 36 e
37%, respectivamente), seguido de Tete (42%) e Nampula (55%). A posição de Maputo é notável
no sentido de que a pobreza é quase tão alta como em diversas outras partes do país. Em outros
países africanos, a posição relativa da capital está consistentemente no topo.
Além disso, a comparação dos números da pobreza nas províncias e as classificações da
pobreza ao longo do tempo mostram um padrão incomum, especialmente porque as três amostras
foram concebidas para serem representativas a nível provincial. Durante os dois períodos
consecutivos de seis anos de 1997 a 2003 e 2003 a 2009, algumas províncias viram oscilações da
incidência da pobreza de mais de 20 por cento de pontos para cima e para baixo com uma
contínua reclassificação das províncias ao longo dos três inquéritos. Por exemplo, enquanto que
Sofala apareceu como a província mais pobre em 1997 (incidência da pobreza 88%) tornou-se a
província menos pobre em 2003 (36%) e era medianamente pobre em 2009 (58%). Outro
exemplo é Niassa, onde os números mostram um notável sucesso, de uma classificação entre as
províncias mais pobres em 1997 (71%) para uma posição intermediária em 2003 (52%) e uma
posição de topo no mais recente inquérito 2009 (32%). Um outro número notável diz respeito ao
empobrecimento da Cidade de Maputo entre 1997 e 2003 (de 47% para 54%) durante um período
em que a pobreza diminuiu significativamente em todas as outras províncias, excepto Cabo
Delgado.
Em outros países africanos, a posição da capital e a classificação das províncias em termos
de incidência de pobreza são geralmente muito mais robustas. Mesmo se factores externos
específicos das províncias, tais como secas, ciclones, doenças das culturas e choques de preços
são levados em conta, parece um assunto complicado explicar a amplitude das taxas provinciais
da pobreza em Moçambique.
8
2.4 Estado nutricional das crianças com menos de cinco anos de idade
O quadro que emerge das três avaliações da pobreza também é notável quando os dados da
pobreza (consumo) são comparados com os outros (não monetários), os indicadores de pobreza
dos ODM para os quais foram colectados dados nas rondas consecutivas de inquéritos e em
outros inquéritos que abrangem o mesmo período. Parece que a situação de pobreza dos
agregados familiares está apenas fracamente correlacionada com outros indicadores.
No que respeita a isto, o estado nutricional das crianças menores de cinco anos de idade é
frequentemente utilizado como um monitor importante para o sucesso dos esforços de redução da
pobreza. A partir dos dados sobre a idade, altura e peso, calculamos a medida usual para a
desnutrição crónica, insuficiência de peso, e desnutrição aguda por meio de curvas de
crescimento padrão (OMS, 2007). A Figura 4 mostra a evolução recente da desnutrição crónica e
insuficiência de peso. A figura mostra os resultados da antropometria infantil colectados como
parte dos inquéritos aos orçamentos de 1997 e 2009, (INE, 1998a; INE 2010a), enquanto
informações adicionais são tiradas do Inquérito Demográfico e de Saúde - e do Inquérito de
Indicadores Múltiplos Agregados (INE, 1998b, 2004b; INE / UNICEF, 2009). Estes últimos três
inquéritos são especialmente interessantes para uma avaliação do estado nutricional das crianças
e dos padrões de pobreza em Moçambique, porque o tempo mais ou menos coincide com os
inquéritos do orçamento. Assim, podemos colocar lado a lado os números do DHS1997 e do
MICS2008 com aqueles dos IAF1997 e IOF2009 e, mais interessante, podemos usar o DHS2003
para ver como o estado nutricional das crianças menores de cinco anos de idade evoluiu entre
1997 e 2008.
Como indicam as barras amarelas e azul claro, cerca de 45% dos menores de cinco anos
sofriam de desnutrição crónica em 2009 (ou seja, tinham uma altura-para-idade muito baixa),
uma melhoria em relação a 49% em 1997. Estas taxas de subnutrição estão entre as mais altas do
mundo. Os valores para as crianças com baixo peso para a idade mostram uma melhoria mais
notável de 25% em 1997 para 19% em 2009 (barras castanhas). Os números correspondentes do
DHS / MICS estão muito próximos destes valores e as diferenças podem ser atribuídas às
diferenças na estrutura de tempo dos inquéritos (ver Figura 3-12 na MPD-DNEAP, 2010).
10
A característica que mais chama à atenção que surge da Figura 4 é a evolução da desnutrição
crónica e insuficiência de peso observada nos números do DHS / MICS que estão disponíveis
para os três anos. Olhando para a desnutrição crónica (as três barras amarelas), podia parecer que
o progresso é lento, mas também que a situação no período recente mostra um pouco mais de
progresso. Olhando para a insuficiência de peso (as barras verde escuro), parece que durante a
primeira parte do período de 1997 a 2009, a situação melhorou significativamente, enquanto que
depois de 2003, a melhoria continuou num ritmo mais lento. Vale a pena comparar estas
tendências com a tendência da pobreza na Figura 1 (linha azul). Há uma espécie de incongruência
no sentido de que a última tendência indica que a redução da pobreza teria paralisado nos últimos
anos, enquanto que as tendências da subnutrição continuam a mostrar algumas melhorias.
11
2.5 Alimentos como uma parte no consumo total e outros correlatos da pobreza
Dada esta análise, não é surpresa nenhuma que a relação entre a situação de pobreza
(consumo) por um lado e outras restantes medidas que são indicativas do padrão de vida do
agregado familiar seja considerada igualmente fraca. Como ilustração final, analisando os dados
14
do último inquérito, as barras azuis da Figura 8 mostram a baixa correlação com a alfabetização
do chefe do agregado familiar e a posse de bens domésticos seleccionados duradouros.
Os padrões da pobreza (consumo) em Moçambique, tal como surgem das três avaliações
nacionais da pobreza parecem bastante inesperados em vários casos ilustrados na secção anterior.
Além disso, as relações entre a situação de pobreza dos agregados familiares e outros indicadores
de bem-estar parecem bastante fracos. Isto merece uma investigação suplementar dos factores que
podem explicar esta situação, sobretudo tendo em conta o papel que desempenham os índices da
pobreza na monitoria, desenho e avaliação dos esforços de desenvolvimento.
A linha de pobreza é um dos factores que podem ter impacto sobre os padrões de pobreza e,
como argumentaremos abaixo, isso pode de facto explicar algumas das incongruências relevantes
dos padrões ao longo do tempo, bem como sobre os diversos grupos populacionais, províncias e
zonas urbanas e rurais.
16
De acordo com Ravallion (2010a), a linha de pobreza é definida como a métrica do valor
monetário que um agregado particular necessitaria para alcançar um padrão de vida mínimo, num
determinado local e num determinado ano. Apesar do consenso geral sobre esta definição, na
prática, pode levar a valores muito diferentes, que vão desde o PPP-dólar-por-dia por um lado -
talvez o proxy mais credível do nível mínimo de consumo global – até ao custo local de um cabaz
específico, por outro lado - provavelmente o melhor proxy para comparar o custo das
necessidades básicas num país. A disponibilidade de dados detalhados de consumo dos inquéritos
recorrentes aos agregados familiares provocou várias aplicações deste último tipo de linhas de
pobreza, e esse é o caso de Moçambique.
As comparações de pobreza de um modo geral estão relacionadas com a definição das
necessidades básicas tais como os alimentos considerados necessários para alcançar um requisito
mínimo de calorias na dieta, mais um orçamento para cobrir os bens não-alimentares. As
comparações devem também ser receptivas às características dos dados, tais como a medição das
quantidades de consumo e dos valores unitários para os alimentos produzidos em casa. Estes
aspectos podem desafiar a robustez da estimativa da pobreza. Por exemplo, no caso da Indonésia,
Ravallion e Bidani (1994) discutem as implicações das linhas de pobreza alternativas. Eles
comparam os resultados das linhas de pobreza com base nos cabazes locais para cada província,
separadamente calculados para as áreas rurais e urbanas com o resultado de uma única linha de
pobreza com base no cabaz dos que se encontram na situação da menor despesa “per capita”. O
quadro muda drasticamente. Nomeadamente, nas dietas específicas rural e urbana, a pobreza
urbana ultrapassa a pobreza rural, enquanto que o inverso é verdadeiro, quando se considera a
dieta alimentar nacional, sendo que a razão principal é que a variação espacial da linha de
pobreza é muito menos pronunciada quando se trata da dieta alimentar nacional.
Para o caso de Moçambique, o estudo de Tarp et al. (2002) aborda a mesma questão,
nomeadamente, a robustez dos padrões de pobreza para a escolha da linha de pobreza.
Analisando os dados do inquérito do orçamento 1997 (INE, 1998a), os autores concluem que os
padrões de pobreza com base no custo das necessidades básicas são sensíveis ao cabaz de
alimentos que é escolhido. Com poucas excepções, como uma alternativa para um único cabaz
nacional, as linhas de pobreza com base em 13 cabazes locais regionais estão associadas com
uma mudança significativa para fontes mais baratas de calorias em resposta às variações regionais
de preços (valores unitários). Porque isto poderia capturar o comportamento de demanda
localmente relevante, cabazes regionais poderiam ser preferíveis.
No entanto, ao mesmo tempo, a incidência da pobreza a nível provincial correspondente à
utilização de um único cabaz nacional pareceu ser mais robusta em termos de uma associação
mais forte com outros indicadores de bem-estar de nível provincial, como a subnutrição infantil
17
(Tarp, op. Cit. , Tabela 9), embora a associação não seja particularmente forte. A nível do
agregado familiar, a correlação entre a situação de pobreza e a presença de crianças desnutridas
parece significativa quando se utiliza o cabaz nacional, mas, surpreendentemente, é zero quando
se utilizam os cabazes regionais (Tarp, op. Cit., Tabela 10).
Outra questão diz respeito à utilização dos valores unitários médios observados nos
inquéritos do orçamento como um indicador das diferenças de preços em Moçambique. Aqui,
também o argumento é que juntar a especificidade às linhas de pobreza pode ajudar a determinar
o estado de pobreza dos agregados familiares com mais precisão. Por exemplo, supondo que um
agregado familiar num ambiente de alto custo económico (cidade) está no limiar da pobreza a um
certo nível de despesas, um agregado familiar semelhante a um mesmo nível de despesas pode ser
não-pobre num ambiente de baixo custo (aldeia). No entanto, as diferenças de preços podem
também reflectir erros de medição, e, mais importante, diferenças de qualidade. Como resultado,
as diferenças de preços são muitas vezes pouco confiáveis e grandes, e o seu uso em linhas de
pobreza espacial pode criar graves distorções nos padrões de pobreza resultantes. De facto, um
estudo recente para Moçambique considera que o grande diferencial de preços que se diz existir
entre Maputo e o resto do país, é provável que seja a fonte de distorções consideráveis, com uma
grande sobrestima da pobreza na cidade de Maputo (Maia e van den Berg, 2010).
Tudo isto sugere que uma certa especificidade da componente alimentar da linha de
pobreza pode ser preferível a partir de um ângulo teórico, mas, empiricamente, pode vir com um
custo, ou seja, uma certa perda de consistência e robustez. Pode acontecer que os dados
disponíveis sobrestimem grosseiramente a diferença urbano-rural no custo de vida e no padrão de
vida. Isso pode levar a uma mudança completa da dimensão urbana - rural causada pelo risco de
muitos agregados familiares na aldeia serem erroneamente classificados como não-pobres e, por
outro lado, muitos agregados na cidade serem erroneamente classificados como pobres. As
evidências para a Indonésia em Ravallion (1994) e para Moçambique em Tarp et al. (2002), entre
outros, indicam que esta distorção urbana está longe de ser imaginária.
Há razões para acreditar que, no caso de Moçambique, o uso de padrões de consumo
observados localmente e preços imputados localmente (valores da unidade do agregado familiar)
ser susceptível de conduzir a uma subestimação das linhas de pobreza rural e uma sobrestimação
das linhas urbanas. As linhas de pobreza rural podem ser muito baixas, como resultado do facto
de os itens consumidos nos cabazes observados não serem homogéneos e por vezes consistirem,
de vários bens ("outras hortaliças", "carne" e "peixe fresco, refrigerado ou congelado"). Portanto,
os preços relativamente baixos na área rural são susceptíveis de reflectir não só condições de
mercado, mas também uma qualidade relativamente baixa. Ao contrário, na medida em que os
18
preços mais elevados nas áreas urbanas reflectem uma maior qualidade, as linhas de pobreza
alimentar urbana são provavelmente demasiado altas.
A linha de pobreza urbana alimentar pode também ser muito alta, porque os pobres urbanos
tendem a consumir mais refeições fora de casa, para as quais a sub-notificação é mais provável
que aconteça, e que não estão no cabaz de alimentos. No caso de Moçambique esta sub-
notificação constitui de facto um problema de dados importante e fazer o ajuste disto pode ter um
grande impacto (veja MPD-DNEAP de 2010, Secção 10.6). Por exemplo, como mostra o MPD-
DNEAP (op. cit. Tabela 10-4) a incidência da pobreza muda apreciavelmente depois de uma
inflação proporcional das despesas das famílias que vivem num domínio espacial, com um déficit
aparente de calorias. Embora este ajuste para a sub-notificação pareça ter apenas um impacto
limitado sobre a incidência nacional da pobreza em geral – menos de 3 pontos percentuais - tem
consequências importantes para a incidência da pobreza na Cidade de Maputo (em 2009: caiu de
36 para 22%) e na Província de Maputo (em 2009: de 63 para 31% na área urbana e de 77 para
66% nas zonas rurais).
Outro factor que entra em jogo é a componente não alimentar da linha de pobreza. Nas
avaliações da pobreza, esta componente tem sido estimada como a proporção média do
orçamento não alimentar dos agregados cuja despesa total está perto da linha de pobreza
alimentar. Porque a parte do orçamento não alimentar parece ser muito maior na área urbana, isso
pode amplificar qualquer distorção inicial urbana nas linhas de pobreza alimentar. Mais
importante, o principal elemento que poderia criar uma distorção na comparação entre as linhas
de pobreza urbana e rural é provavelmente o facto de que os itens que são essenciais para o
padrão de vida do agregado familiar são escondidos e praticamente impossível de incluir nas
estimativas de consumo. Exemplos são a disponibilidade e o uso de torneiras públicas, transportes
públicos, mercados regulamentados e as escolas e unidades de saúde de boa qualidade. Tais
produtos são consumidos muito mais pelos pobres urbanos e aumentam claramente o seu padrão
de vida, mas raramente são incluídos no seu consumo agregado. No caso de bens não-comerciais
fornecidos publicamente, um grande problema é que é um assunto complicado para se imputar
um valor ao acesso dos agregados familiares a determinados serviços e infra-estruturas físicas e
sociais. Também o uso de bens públicos pelos agregados familiares é difícil de medir e difícil de
atribuir um preço correcto. No caso de Moçambique, este "consumo de produtos fornecidos pelo
sector público a título gratuito ou o elemento subsidiado nesses bens" é reconhecido como uma
grande omissão da medida de consumo (MPF / IFPRI / PU, 2004, página 4). Claramente, isso
poderia criar uma distorção adicional e justificaria um aumento na medida do consumo dos
agregados urbanos ou, equivalentemente, um abaixamento da linha da pobreza urbana em relação
à rural.
19
3.2 Dois lados do espectro: linhas nacionais de pobreza versus linhas de contexto
específico
supor que pode comprar todos os itens contra os preços pr ( p1r ,..., pKr ) . Finalmente, vamos
deixar u ser um padrão mínimo de vida abaixo do qual os agregados familiares são considerados
pobres, um nível que deve naturalmente ser mantido fixo em todos os domínios e todos os
agregados familiares. Então, se se conhecesse u , poder-se-ia considerar os agregados no domínio
r e seleccionar aqueles com esse padrão de vida e ver o seu consumo qr que produz u(q r) u .
* *
Este consumo pode ser interpretado como o conjunto das necessidades básicas e, desde que todos
os produtos pudessem ser comprados no mercado ou, pelo menos, pudessem ser valorizados de
forma adequada, a linha de pobreza correspondente seria definida da seguinte forma:
6
A primeira avaliação da pobreza emprega 13 linhas diferentes de pobreza, com base nos preços locais e nos
padrões de consumo local observados no inquérito IAF 1996/97 (Niassa e Cabo Delgado, rural e urbano;
Nampula, rural e urbano; Sofala e Zambézia, rural e urbano; Manica e Tete, urbano e rural; Gaza e Inhambane,
rural e urbano, Província de Maputo, rural e urbano; Cidade de Maputo). Para a segunda avaliação, cada uma
destas linhas é ajustada de acordo com as mudanças dos preços locais e os padrões de consumo local observados
no inquérito subsequente IAF 2002/03, enquanto que a terceira avaliação emprega um outro conjunto de 13
linhas de pobreza estimadas usando o inquérito IOF 2008 / 09.
20
zr p qr *r p
k
q .
kr kr
*
(1)
imputados com precisão e que todas as quantidades consumidas qi são conhecidas também para
uma amostra i 1, 2 , ..., I de agregados familiares pobres e não pobres em todos os domínios.
Assim, as linhas de pobreza têm que ser construídas de uma forma ou outra de um
raciocínio à priori e, portanto, é difícil de evitar um certo grau de arbitrariedade. Para produtos
alimentares, um candidato óbvio seria o cabaz q que é tipicamente consumido nos segmentos
mais pobres da população e que é dimensionado para obter um determinado requisito de calorias.
Esta abordagem tem sido aplicada na maioria dos países em desenvolvimento e leva a linhas de
pobreza alimentar pr q que podem capturar as diferenças espaciais de preços, bem como a
para t1997,2003,2009 e uma parte 0 para responder às necessidades de consumo não
alimentares.
Alternativamente, como é prática corrente em Moçambique, pode-se optar por dietas
flexíveis que se ajustam ao domínio particular, em que o agregado familiar vive. Isto significa
que em cada local e a cada ano o cabaz alimentar pode ter uma composição diferente, ao mesmo
tempo, que também os preços e a alocação para bens não alimentares pode mudar com o tempo e
com o espaço. Para Moçambique, deixar qtsdenotar o cabaz mínimo de alimentos para os pobres
7
no domínio espacial específico s 1, 2 , ...,1 3
na altura do inquérito t1997,2003,2009 e com
7
OS 13 domínios espaciais definidos nas avaliações nacionais de pobreza são: 1=Niassa e Cabo Delgado, rural;
2=Niassa e Cabo Delgado, urbano; 3=Nampula, rural; 4=Nampula, urbano; 5=Sofala e Zambézia, rural;
6=Sofala e Zambézia, urbano; 7=Manica e Tete, rural; 8=Manica e Tete, urbano; 9=Gaza e Inhambane, rural;
10=Gaza e Inhambane, urbano; 11=Maputo Província, rural; 12= Maputo Províncias, urbano; 13=Maputo
cidade.
21
os preços correspondentes pts e com alocações não alimentares ts 0, as linhas de pobreza de
contexto específico ler-se-iam:
zts (1 ts ) pts qts . (3)
No caso de Moçambique, estas linhas de pobreza foram calculadas em duas etapas. O estágio
inicial é semelhante a (2), mas agora usando cabazes de consumo local, preços locais e alocações
locais para bens não alimentares. Numa segunda ronda de cálculos, a composição do cabaz obtido
na primeira fase é ajustado para garantir que o agregado familiar no ano t e no local s realmente
prefere o seu próprio cabaz ao cabaz de qualquer outro agregado, desde que seja capaz de
comprar esse cabaz. Tecnicamente, isto significa que cada cabaz na equação (3) deve satisfazer as
condições de "preferência reveladas": pts qts pts qts , onde t e s incluem todos os outros anos e
todas as outras províncias. Estas condições devem se manter, pois, se for o caso de
pts qts pts qts num dos outros anos, ou numa das outras províncias, o cabaz realmente escolhido qts
u(qts ) u(qts ) u −, então o cabaz escolhido não pode ser o cabaz que minimiza o custo para
atingir esse padrão de vida u . Referimos Arndt e Simler (2010) para uma descrição da estimação
de entropia, que considera este ajuste para "preferências reveladas", e foi aplicado aos dados de
Moçambique.
Deve-se notar que esta segunda etapa, o ajuste para "preferência revelada", é necessária
quando se utilizam cabazes das necessidades básicas de contexto específico, a fim de se
estabelecer a comparabilidade de padrões de vida entre os agregados familiares ao longo do
tempo e do espaço. Com a utilização de um cabaz fixo, esta comparabilidade é obtida pela
construção, porque todos têm o mesmo cabaz ao longo do tempo e do espaço, o que
presumivelmente reflecte as necessidades básicas de todos.
3.3 Prós e contras das linhas nacionais de pobreza versus linhas de contexto específico
22
Como já foi referido na introdução, as linhas de pobreza da equação (3) serão referidas como
"cabazes flexíveis ajustados", enquanto que a linha da equação (2) será chamada de "cabaz fixo
com preço fixo". Os prós e contras de optar por qualquer uma destas abordagens resultam
directamente das vantagens e desvantagens de especificidade, veja também a discussão na secção
3.1 acima. Refraseando, poderíamos dizer que a especificidade pode ser capaz de capturar hábitos
relevantes de consumo local, as condições do mercado local e as perspectivas relacionais locais,
mas poderia ser incapaz de capturar as limitações de dados relevantes, tais como a volatilidade
típica dos valores da unidade dos agregados familiares e a inevitável sub-notificação de consumo.
Nisto, uma linha nacional de pobreza poderia ter melhor desempenho.
Porque os "cabazes flexíveis ajustados" são baseados naquilo que os segmentos mais
pobres em cada província e em cada localidade urbana-rural na realidade consome, há um
problema de qualidade que vale a iteração. Por exemplo, se ao longo do tempo, devido a um
aumento do preço do trigo, um agregado familiar no limiar da pobreza, que inicialmente
consumia uma mistura de trigo e mandioca, é forçado a mudar inteiramente para a mandioca
menos nutritiva, pode-se querer concluir que ele caia na pobreza, mesmo que a quantidade total
de calorias permaneça a mesma. Quando o cabaz fixo da equação (2) é aplicado, esse aumento da
pobreza precisa de facto de ser observado. No entanto, o aumento da pobreza pode passar
despercebido quando, como na equação (3), a nova situação tem o seu próprio consumo de
subsistência caracterizado por menos calorias de alimentos mais gostosos e mais nutritivos.
Quando os pobres recorrem a alimentos baratos de alto teor calórico e de baixa qualidade, como é
frequentemente o caso, o uso de linhas de pobreza de contexto específico pode, assim, resultar
numa situação em que a pobreza não é afectada pelo aumento dos preços dos alimentos de melhor
qualidade que os pobres consomem, o que seria um resultado contra intuitivo.
Da mesma forma, quando são dados meios aos pobres nas áreas rurais e descartando os
diferenciais de preços, eles poderiam muito bem, querer trocar o seu cabaz mínimo com o cabaz
dos pobres urbanos por causa da melhor qualidade. Nesses aspectos, deve-se notar que a
diversidade e a qualidade de uma dieta não são questões de somenos importância. A literatura
recente descobriu que esses factores são importantes anunciadores de deficiência de micro
nutrientes (Moursi et al., 2010) e subnutrição infantil (Rah et al., 2010).
Naturalmente, a linha de pobreza da equação (2) com base no "cabaz fixo com preço fixo"
tem os seus próprios problemas, essencialmente porque é uma medida bastante grosseira para as
classificações da pobreza. Uma vez que esta abordagem está no outro lado do espectro da
especificidade, pode muito bem ser que seja o inverso, ou seja, que a linha de pobreza é muito
23
elevada na área rural e muito baixa na área urbana, onde o custo de vida é geralmente mais
elevado.
A construção de uma linha de pobreza nunca é uma tarefa fácil. Tendo em conta o “trade-
off” entre especificidade e robustez-consistência, e face às limitações relevantes de dados que
estão relacionados com as componentes não observadas e observáveis do padrão de vida e do
custo de vida, irá sempre envolver um julgamento cuidadoso (ver Asra e Santos Francisco , 2001,
entre outros). No entanto, nos casos em que dados complementares sobre várias dimensões da
pobreza estão disponíveis, a sondagem empírica sobre os benefícios potenciais que a escolha de
linhas de pobreza de contexto específico tem em relação à escolha de uma linha de pobreza mais
genérica, pode ajudar a fazer o “trade-off”. Na secção seguinte iremos abordar esta questão para o
caso de Moçambique, comparando os padrões de pobreza que foram revistos com algum detalhe
na Secção 2 e que emergem das linhas de pobreza local (3) com os padrões alternativos que irão
surgir quando se utiliza a linha de pobreza nacional (2) 8. Já é possível levantar o véu,
mencionando que todos os resultados parecem apontar na mesma direcção, ou seja, que a linha de
pobreza nacional parece ter um melhor desempenho do que as linhas locais: a dinâmica e os
padrões espaciais de pobreza serão mais como era de se esperar, e o relacionamento com outras
dimensões da pobreza será mais estreito.
"cabaz fixo com preço fixo" leva a mudanças marcantes nos padrões de pobreza em
Moçambique, e a maioria dessas mudanças são compreensíveis, acrescentando confiança e
consistência. Por exemplo, considerando a tendência nacional na Figura 1 e as tendências urbanas
e rurais na Figura 2, a dinâmica de redução da pobreza parece ser mais consistente com outras
fontes de dados, incluindo o crescimento macroeconómico e as disparidades rural-urbano. A
redução da pobreza no primeiro período de 1997 a 2003 é agora menos acentuada (de 70% para
61%, em comparação com uma redução de 69% para 54% para os "cabazes flexíveis ajustados"),
enquanto no período recente de 2003 a 2009 a pobreza continuou a declinar, embora a um ritmo
mais lento (de 61% para 57%, em comparação com uma paralisação para os " cabazes flexíveis
ajustados").
A dimensão rural-urbana da pobreza também muda drasticamente quando se substitui os
"cabazes fixos ajustados" de preços locais pelos "cabazes fixos com preço fixo". A pobreza é
agora muito mais prevalecente na população rural (65% em 2009, anteriormente de 57%),
enquanto a população urbana é menos pobre (39% em 2009, anteriormente 50%). Aqui também,
como a Figura 2 ilustra, a dinâmica mostra um padrão diferente. A pobreza urbana cai
gradualmente de 43% em 1997 para 40% em 2003, em oposição ao forte declínio de 61% para
51% nesse período, conforme relatado nas avaliações nacionais da pobreza. Da mesma forma, a
redução da pobreza rural de 77% em 1997 para 71% em 2003 é muito menos pronunciada
(anteriormente de 72% para 55%), enquanto que, ao contrário do subsequente aumento
mencionado no relatório de avaliação da pobreza (de 55% para 57%), o novo estudo sugere que a
pobreza rural continuou a diminuir progressivamente de 71% em 2003 para 65% em 2009. Pode-
se notar ainda que as evidências do TIA são muito menos positivas sobre o aumento da
produtividade rural, especialmente entre os pequenos agricultores (INE / TIA, 2009). Alguns
autores chegam a afirmar que a pobreza não está de forma alguma a ser reduzida (Cunguara e
Hanlon, 2010).
Olhando para a dinâmica a nível provincial, a consistência dos padrões de pobreza também
parece melhorar sensivelmente (ver os painéis inferiores da figura 3 com as barras vermelhas).
Por exemplo, utilizando linha de pobreza do "cabaz fixo com preço fixo ", a amplitude das
oscilações excessivas da pobreza, na província de Sofala é reduzida pela metade, enquanto que na
Zambézia, a oscilação para cima e para baixo de mais de 20 pontos percentuais agora se
transforma numa deterioração gradual. Também, a posição da cidade de Maputo e da província
de Maputo, como as partes do país onde a incidência da pobreza é relativamente a mais baixa, é
agora consistente ao longo dos anos. O tamanho do fosso rural-urbano e a posição de Maputo
como a área onde os indicadores de desenvolvimento são relativamente favoráveis são
confirmados por outros estudos, como Tvedten et al. (2009), que constatam taxas de mortalidade
25
infantil na Cidade de Maputo de menos de metade da área rural, e taxas de alfabetização das
mulheres que são quase o quadruplo.
4.2 A relação entre o estado da pobreza, malnutrição e outros indicadores é mais forte
Seguindo a metodologia do "cabaz fixo com preço fixo" parece que a classificação das
províncias em termos de pobreza de consumo (Figura 3, barras vermelhas) está mais de acordo
com a classificação em termos de malnutrição infantil (Figura 5). Além disso, a incidência da
pobreza está mais correlacionada com a malnutrição infantil do que no caso de "cabazes flexíveis
ajustados" – os coeficientes de correlação são mais de duas vezes mais elevados, ver as barras
vermelhas da Figura 6. Esta relação continua agora a ser significativa quando se considera grupos
populacionais a nível de distrito e provincial. Uma relação similar, mais forte, é encontrada em
relação tanto à parte dos alimentos no consumo total como em relação à quota de consumo
próprio no total de calorias, como mostrado pelas barras vermelhas da figura 7. Finalmente, a co-
variação entre bem-estar do agregado e bens do agregado parece ser mais robusta quando é usada
a linha de pobreza nacional, ver a Figura 8 (barras vermelhas).
Comparando as Figuras 1 e 4, uma outra constatação muito interessante emerge da
aplicação da linha nacional de pobreza. Parece que as tendências da pobreza correspondem
melhor às tendências da malnutrição infantil. Nomeadamente, a nível nacional, a redução da
pobreza e a insuficiência de peso têm andado de mãos dadas, com um aceno em 2003, que
reflecte uma desaceleração da rapidez no período de 1997 a 2003. A evolução ao longo das duas
linhas mostra um padrão similar e parece que a mesma congruência vale para vários outros
correlatos da pobreza. A este respeito, vale a pena ver o Índice de Desenvolvimento Humano, que
já foi mencionado na introdução. Como a prevalência da pobreza no âmbito da linha nacional de
pobreza, o IDH mostra pequenas melhorias, mas consistentes ao longo do tempo, tal como
ilustrado na Figura 9 (PNUD, 2010).
26
5 Discussão
de pobreza de contexto específico, a cura (ou seja, acrescentar especificidades ao custo de vida de
um agregado familiar) pode ser pior que a doença (isto é, aplicar o mesmo custo de vida para
agregados familiares cujo custo de vida real é diferente). Por outras palavras, há uma
possibilidade de que as linhas de pobreza de contexto específico possam aumentar o risco de
erros de classificação.
Uma das principais conclusões do relatório é que este é realmente o caso de Moçambique.
Conforme indicado na Secção 3.3, os resultados inesperados da aplicação de linhas de pobreza
baseadas em "cabazes flexíveis ajustados" poderiam ser parcialmente devidos à susceptibilidade
das linhas de pobreza a uma distorção urbana inerente e a características dos dados do inquérito.
Em particular, o uso de padrões de consumo localmente observados dos pobres e os preços
localmente imputados (valores da unidade dos agregados familiares) são susceptíveis de conduzir
a uma subestimação das linhas de pobreza rural e uma sobrestimação das urbanas. As linhas de
pobreza rural podem ser muito baixas, como resultado do facto de que os itens consumidos nos
cabazes observados não são homogéneos e consistem, por vezes de vários bens ("outros
vegetais", "carne" e "peixe fresco, refrigerado ou congelado"). Portanto, os preços relativamente
baixos na área rural são susceptíveis de reflectir não só condições de mercado, mas também uma
relativa baixa qualidade. Ao contrário, na medida em que os preços mais elevados nas áreas
urbanas reflectem uma maior qualidade, as linhas de pobreza alimentar urbana são provavelmente
demasiado altas. As linhas de pobreza de alimentos urbanos poderá também ser muito alta,
porque os pobres urbanos tendem a consumir mais refeições fora de casa em relação às quais é
mais provável que aconteça a sub-notificação, e que não estão no cabaz de alimentos. Para além
disso, a componente não alimentar da linha de pobreza é estimada como a proporção média do
orçamento não alimentar das famílias cuja despesa total está perto da linha de pobreza alimentar
e, porque esta parte do orçamento não alimentar parece ser muito maior nas áreas urbanas, isto
amplia a distorção urbana nas linhas de pobreza alimentar. Um último elemento que poderia
distorcer a comparação entre a pobreza urbana e rural são os itens que faltam, como os serviços
públicos, que estão todos mais disponíveis e são consumidos pelos pobres urbanos. Isso também
poderia criar uma distorção e justificaria uma redução da linha de pobreza urbana.
Naturalmente, a linha de pobreza com base no "cabaz fixo com preço fixo" pode ter os seus
próprios problemas. Uma vez que esta abordagem está no outro lado do espectro da
especificidade, pode muito bem ser que seja o inverso, ou seja, que a linha de pobreza é muito
elevada na área rural e muito baixa na área urbana, onde o custo de vida é geralmente mais
elevado. No entanto, o uso de uma linha nacional de pobreza é normal em muitos países (por
exemplo, Al-Hasan e Diao de 2007 para o Gana) e em praticamente todos os países, é utilizada
como referência. A nível internacional, o Banco Mundial recomenda a utilização de linhas de
28
pobreza absoluta, com uma paridade de poder de compra de US$ 1,25 (dólar) (PPP), enquanto
que muito antes da redução da pobreza ser oficialmente definida como o ODM número um,
muitos pactos e tratados internacionais estabeleciam metas semelhantes. Por exemplo, o artigo 25
da Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que "Toda pessoa tem direito a um padrão de
vida capaz de assegurar a saúde e o bem-estar próprio e de sua família, incluindo a alimentação,
vestuário, habitação, cuidados médicos e serviços sociais ". Neste contexto, pode-se dizer que a
busca e o debate público em torno do estabelecimento de uma linha de pobreza estão intimamente
relacionados com o desafio de dar o direito aos pobres a um apoio na renda e ao acesso aos
serviços públicos, de forma operacional e compreensiva.
Como maneira de avançar, parece que a busca por uma linha de pobreza, que seja mais
adequada para Moçambique tem de andar entre as linhas de pobreza de contexto específico e a
linha nacional de pobreza. No entanto, e apesar do inegável alcance e necessidade de avanço da
metodologia do "cabaz fixo com preço fixo", a análise empírica dos padrões de pobreza e a
dinâmica da pobreza neste relatório sugere que a linha única nacional de pobreza pode ser mais
adequada para a análise da pobreza em Moçambique do que as treze linhas de contexto
específico. Todos os resultados parecem apontar na mesma direcção, ou seja, que o uso de uma
única linha de pobreza tem melhor desempenho: a dinâmica e os padrões espaciais de pobreza são
mais como se poderia esperar, e a relação com a malnutrição e outros indicadores de bem-estar é
muito mais forte. Com isto, podemos iterar a importância da malnutrição infantil como uma
dimensão da pobreza que pode ter efeitos devastadores sobre o bem-estar. Por exemplo, um
estudo realizado por Black et al. (2008) constatou que o “odds ratio” para mortalidade por peso-
para-idade aumenta de um factor 9 quando se compara crianças com peso normal (pontuação Z
de - 1 ou superior) com os que sofrem de grave insuficiência de peso (pontuação Z- de -3 ou
inferior).
Figura 10: Ocorrência provincial do HIV/SIDA e a sua relação com a pobreza do consumo,
2009
30
inquéritos transversais podem ser usados para construir um pseudo-painel de agregados que
podem ser utilizados para tratar do provável impacto de políticas redistributivas e o
fortalecimento de redes de segurança e protecção social (Molini et al. 2010). Este ponto pode ser
mais elaborado, investigando uma tipologia dos agregados usando combinações de características
de pobreza que são mais prevalecentes, e estudando como o grupo mais pobre se pode beneficiar
de uma combinação de intervenções, digamos, em termos de acesso aos cuidados de saúde e
educação, a sua proximidade dos mercados e os aumentos da produtividade das suas culturas
(Arndt et al., 2010). Da mesma forma, a análise da pobreza com base nos vários inquéritos
recorrentes em Moçambique poderá beneficiar significativamente dos avanços na literatura de
efeitos-do-tratamento e sua aplicação a questões de avaliação de políticas (Heckman, 2008;
Florens et al, 2010).
6 Conclusão
As subsequentes avaliações nacionais da pobreza elaboram cada vez mais neste ponto e propõem
o uso de diferentes preços e de diferentes cabazes de consumo mínimo em cada ano e para cada
grupo de agregados familiares (rurais-urbanos e provinciais), ao mesmo tempo que ajustam mais
os cabazes em resposta à mudança de preços relativos. Em princípio, para dados de consumo e de
preços suficientemente precisos e exaustivos, e para similaridade suficiente dentro do grupo e
dissemelhança entre-grupo, isso pode levar a estimativas mais precisas da linha relevante de
pobreza e, portanto, da classificação da pobreza dos agregados familiares.
No entanto, a análise neste relatório sugeriu o contrário, no sentido de que as comparações
da pobreza em Moçambique são menos consistentes quando se usa linhas de pobreza de contexto
específico comparando com o uso de uma linha nacional de pobreza, como é prática comum. De
facto, pretende que a distorção urbana inerente no cálculo das linhas de contexto específico pode
ser a origem dos resultados inesperados. Isto é representado por meio de testes das linhas de
pobreza que são específicas para grupos da população e para anos de inquérito, contra a
alternativa de uma única linha de pobreza para todos os moçambicanos. Embora a alternativa seja
reconhecidamente, uma medida de pobreza bastante grosseira, é uma referência comum noutros
países e, mais importante, no caso de Moçambique parece ter um melhor desempenho no sentido
em que evolução de padrões de pobreza nacional, urbano-rural e provincial parece mais plausível
e também mais em linha com outros indicadores de pobreza como a malnutrição das crianças e a
falta de recursos. Argumentamos que isto pode ter implicações nas políticas, de forma mais
acentuada em relação à consistência das tendências da pobreza, a concentração da pobreza nas
zonas rurais, e a grosseira sobrestimativa da pobreza em Maputo.
Moçambique está em busca de perfis consistentes de pobreza, que sejam adequados para a
avaliação da sua estratégia de desenvolvimento, em particular em relação ao direccionamento dos
esforços de redução da pobreza desde o nível nacional até ao nível dos diversos grupos da
população, províncias e distritos. Os padrões de pobreza analisados neste estudo apoiam a idéia
de que Moçambique está gradualmente a mover-se em direcção às metas de redução da pobreza
dos ODM, apesar de evidências também indicarem que o ritmo a que isso acontece está a
abrandar.
Embora isto possa ser interpretado como um apoio ao modelo actual de desenvolvimento
de Moçambique, também há razões para acreditar que a redução da pobreza tem sido demasiado
lenta, especialmente porque o crescimento económico foi alto na última década. Com a economia
a crescer a cerca de 8 por cento ao ano durante o período de 1997 a 2009, a redução média anual
de incidência da pobreza de 1 ponto percentual parece pouca. A baixa elasticidade do crescimento
da redução da pobreza é preocupante e tem levado a uma certa controvérsia a respeito da eficácia
da sustentada assistência dos doadores e da acumulação de empréstimos do exterior que têm
33
Referências
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de Estatística e MEASURE DHS, ICF Macro.
35
ANEXO 1: Mapas
Incidência da pobreza nos distritos, 2008/09 (“Cabaz fixo com preço fixo”)
39
ANEXO 2: Tabelas
Tabela A2.1 Dimensão das amostras e população total (em milhões) para 1997/98, 2002/03 e
2008/09
1997/1998 2002/2003 2008/2009
# Tamanho Pop # Tamanho Pop # Tamanho Pop
Agreg agreg. Agreg agreg. Agreg agreg.
Nacional 8.250 6,2 17,484 8.700 6,2 18,302 10.832 6,0 21,537
Urbano 2.439 7,0 3,681 4.005 6,6 5,871 5.223 6,3 6,548
Rural 5.811 6,0 13,803 4.695 6,0 12,431 5.609 5,8 14,989
Niassa 657 5,8 0,873 816 6,2 0,929 814 5,4 1,276
Cabo 743 5,2 1,342 738 4,9 1,541 780 5,2 1,687
Delgado
Nampula 955 5,4 3,261 756 5,4 3,448 1.575 5,5 4,133
Zambezia 884 5,4 3,356 733 5,6 3,518 1.523 5,8 4,100
Tete 611 6,0 1,173 756 5,6 1,406 768 5,8 1,935
Manica 661 6,9 1,000 816 7,6 1,225 804 5,8 1,500
Sofala 762 6,8 1,766 795 7,3 1,532 851 6,9 1,750
Inhambane 729 7,3 1,281 753 6,5 1,345 803 6,5 1,319
Gaza 637 7,5 1,266 786 7,6 1,283 815 7,3 1,356
Maputo 718 7,1 0,999 828 6,4 1,022 900 6,1 1,358
Província
Maputo 893 7,6 1,1676 923 8,0 1,052 1,199 6,4 1,124
Cidade
Tabela A2.2 Tendências na incidência da pobreza (%): nacional, urbana-rural e por província
1997/1998 2002/2003 2008/2009
Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo
Nacional 69,4 70,3 54,1 61,2 54,7 57,5
Urbana 61,1 43,4 51,5 40,1 49,6 39,5
Rural 71,6 77,5 55,3 71,2 56,9 65,4
Niassa 70,7 79,9 52,1 58,6 31,9 40,6
Cabo Delgado 57,4 74,4 63,2 68,3 37,4 48,0
Nampula 68,9 86,5 52,6 75,4 54,7 70,2
Zambézia 68,0 72,8 44,6 71,8 70,5 81,1
Tete 82,2 83,7 59,8 69,2 42,0 39,0
Manica 62,2 62,6 43,6 47,5 55,1 51,4
Sofala 87,9 85,5 36,1 51,6 58,0 64,5
Inhambane 82,1 72,0 80,7 76,3 57,9 57,0
Gaza 64,2 48,8 60,1 52,9 62,5 61,2
Maputo Província 65,7 43,4 69,3 30,0 67,5 35,5
Maputo Cidade 47,5 20,9 53,6 12,0 36,2 10,1
41
Tabela A2.3 Prevalência de baixo peso em 2009 por situação de pobreza (%)
Pobre Não-pobre Todos
Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo
Nacional 20,1 21,1 17,6 15,8 19,1
Urbana 14,9 16,9 12,3 11,2 13,8
Rural 22,0 22,2 20,1 19,1 21,3
Niassa 18,6 17,2 19,0 20,2 18,9
Cabo Delgado 30,6 30,5 25,9 24,7 28,1
Nampula 23,0 24,1 22,6 18,9 22,9
Zambézia 20,1 19,8 15,2 13,1 18,9
Tete 27,8 27,7 25,4 25,5 26,5
Manica 25,3 25,6 16,4 16,7 21,7
Sofala 22,3 20,6 15,1 17,9 19,9
Inhambane 11,9 12,1 5,0 4,9 9,4
Gaza 11,4 11,6 9,5 9,2 10,7
Maputo Província 9,4 12,5 1,0 3,9 7,3
Maputo Cidade 9,5 16,2 6,7 6,7 7,9
Tabela A2.4 Prevalência de desnutrição crónica em 2009 por situação de pobreza (%)
Pobre Não-pobre Todos
Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo
Nacional 45,8 47,9 43,4 39,5 44,8
Urbana 38,7 43,0 30,4 28,5 35,2
Rural 48,4 49,3 49,2 47,3 48,7
Niassa 50,6 50,3 53,7 54,3 52,5
Cabo Delgado 54,7 53,9 49,4 48,9 51,8
Nampula 57,6 57,4 49,1 44,3 54,5
Zambézia 45,5 46,3 48,0 45,2 46,1
Tete 54,9 55,9 49,0 48,6 51,7
Manica 63,7 63,0 50,2 52,3 58,3
Sofala 36,9 37,8 33,7 31,0 35,8
Inhambane 36,9 37,2 32,8 32,4 35,4
Gaza 29,9 30,3 35,2 34,3 31,7
Maputo Província 22,6 28,4 9,0 13,3 19,2
Maputo City 27,4 33,7 20,3 21,8 23,5
42
Tabela A2.5 Prevalência de desnutrição aguda em 2009 (%) por situação de pobreza
Pobre Não-pobre Todos
Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo
Nacional 7,0 7,5 7,4 6,6 7,2
Urbana 7,6 8,1 6,6 6,3 7,1
Rural 6,8 7,4 7,8 6,7 7,2
Niassa 2,9 4,4 8,5 8,0 6,4
Cabo Delgado 9,4 10,2 6,8 5,0 8,0
Nampula 8,3 8,8 8,8 7,5 8,5
Zambézia 7,3 7,5 6,0 3,9 7,0
Tete 6,7 6,7 11,4 11,2 9,2
Manica 5,8 5,7 4,4 4,7 5,2
Sofala 13,0 12,3 10,5 11,9 12,2
Inhambane 2,9 3,0 2,6 2,5 2,8
Gaza 4,6 4,5 2,9 3,0 4,0
Maputo Província 4,6 4,8 5,8 4,9 4,9
Maputo Cidade 3,8 7,1 6,4 4,9 5,2
Tabela A2.6 Alimentação como parte do consumo total em 2009 (%) por situação de pobreza
Pobre Não-pobre Todos
Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo
Nacional 65 67 61 58 63
Urbano 57 60 44 45 51
Rural 68 69 70 69 69
Niassa 68 69 63 62 64
Cabo Delgado 67 67 69 69 68
Nampula 69 69 63 59 66
Zambézia 72 73 67 62 71
Tete 64 63 75 75 71
Manica 64 63 71 71 67
Sofala 64 66 61 57 63
Inhambane 59 59 55 55 58
Gaza 58 58 52 51 55
Maputo Província 52 54 37 43 47
Maputo Cidade 43 48 29 32 34
Tabela A2.7 Subsistência como parte do total do consumo alimentar em 2009 por (%) situação de
pobreza
Pobre Não-pobre Todos
Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo
Nacional 63 68 59 51 61
Urbana 28 34 21 18 24
Rural 76 77 78 77 77
Niassa 59 63 68 67 65
Cabo Delgado 81 81 67 64 72
Nampula 67 69 62 55 65
Zambézia 79 80 73 69 77
Tete 73 73 86 85 81
43
Manica 55 56 67 65 60
Sofala 54 56 45 39 50
Inhambane 72 72 61 60 67
Gaza 48 59 58 47 54
Maputo Província 24 31 8 12 19
Maputo Cidade 2 2 1 1 1
44
Tabela A2.8 Analfabetismo do chefe do agrg. fam. 2009 por (%) situação de pobreza
Pobre Não-pobre Todos
Flex. Aj. Fixo Flex. Aj. Fixo
Nacional 49,1 51,9 38,3 33,9 44,3
Urbano 34,6 38,6 16,2 16,7 25,3
Rural 54,8 55,4 49,7 47,1 52,6
Niassa 57,9 56,7 48,7 48,2 51,6
Cabo Delgado 66,3 68,7 57,7 53,6 61,0
Nampula 54,2 54,2 42,1 35,8 48,7
Zambézia 49,9 50,6 40,2 31,4 47,0
Tete 44,0 45,4 41,3 40,6 42,5
Manica 46,4 47,0 34,1 34,4 40,9
Sofala 47,1 47,7 36,0 33,0 42,5
Inhambane 50,3 50,7 30,6 30,3 42,0
Gaza 55,3 55,9 38,0 37,7 48,8
Maputo Província 35,2 43,7 14,6 20,1 28,4
Maputo Cidade 21,0 27,4 8,1 11,1 12,8
1 Principal constatação
Com base no teor calórico estimado do cabaz alimentar local e nos preços locais pagos
pelos alimentos, o inquérito indica que a incidência da pobreza é geralmente muito elevada e que
a dinâmica da pobreza (nacional e provincial) no período de 1997 a 2009 é por vezes,
surpreendente (Tabela 3-5). A dinâmica, como será indicado a seguir, é de certa forma
controversa.
a) Com base nos três inquéritos consecutivos IAF96, IAF02 e IOF08, o relatório conclui
que, entre 1996/97 e 2002/2003, a taxa nacional de pobreza caiu de 70 para 54%,
enquanto que entre 2002/2003 e 2008/2009, essa taxa manteve-se praticamente
inalterada, apesar do crescimento económico sustentado
b) O relatório indicou ainda que o nível de pobreza varia consideravelmente por região,
variando de 48 a 88% em 1996/97, de 36 para 81% em 2002/03 e 32-71% em 2008/09
c) A mudança da pobreza ao longo do tempo também mostra grande variação regional,
mostrando uma redução sustentada da pobreza em três províncias (71para 52 para 32%
no Niassa; de 82 para 60 para 42% em Tete; de 83-81 para 58% em Inhambane), a
estagnação em 2 províncias (Gaza e Maputo em cerca de 65%) e uma taxa de pobreza
que oscila para cima e para baixo nas restantes seis províncias (por exemplo de 68 para
45 para 70% na Zambézia e de 48 para 54 para 36 na cidade de Maputo)
O relatório contém muitos mais resultados que são pertinentes para a compreensão dos
padrões de pobreza e da dinâmica da pobreza em Moçambique. A maioria do trabalho diz
respeito a uma análise mais aprofundada da pobreza, dos dados do inquérito IOF08 para além da
secção de consumo alimentar e de uma vasta gama de outros dados do inquérito, bem como dados
sobre preços e contas nacionais.
O estudo inclui uma análise da pobreza com base na malnutrição infantil, acesso à saúde e
educação, qualidade da habitação, posse de bens duráveis e de bens agrícolas. Em particular, são
feitas as seguintes comparações:
i) Malnutrição infantil (IAF96; DHS03, MICS08; IOF08)
ii) Capital humano e acesso à saúde e educação (IAF02; IOF08)
iii) Habitação e bens duráveis (IAF02; IOF08)
iv) Tamanho das machambas, gado e produção agrícola (TIA02; TIA08; IOF08)
Na verdade, estes são todos aspectos vitais da pobreza. Um resultado negativo em cada um destes
campos pode ser visto tanto como uma causa da pobreza (por exemplo, a saúde e educação são
pré-requisitos para o emprego produtivo) como um efeito da pobreza (por exemplo, rendimentos
suficientes são um pré-requisito para a compra de bens duradouros e aumento do gado).
O relatório mostra que estes vários indicadores de pobreza mostram um progresso misto.
Por exemplo, melhorias na malnutrição infantil são observadas, mas são muito pequenas (Figura
3-11). Há um progresso considerável no acesso à educação (Figura 3-2 e 3-3), embora a queda
das taxas de retorno indiquem que há também preocupações com a qualidade (Tabela 12-5 a 12-
8). Em algumas partes do país, o acesso às unidades sanitárias e água potável também melhorou
(Figura 3-4 e 3-5), sendo que a qualidade da habitação e a posse de bens duráveis também
melhorou, especialmente no Sul (Tabela 8 - 1 e 8-2). Ao mesmo tempo, não há nenhum progresso
na agricultura, há uma crescente pressão demográfica, explorações agrícolas muito pequenas,
pouco uso de fertilizantes e redução significativa de pesticidas, irrigação e créditos (Quadro 12-
4).
A última contribuição distinta do relatório deve ser mencionada e diz respeito à macro-
análise (Capítulo 7). Para efeitos de simulação da economia, um modelo CGE foi utilizado. O
47
modelo é brevemente descrito na Secção 7.1, com alguns pressupostos adicionais dados no ponto
7.2.2. Possui detalhes de sectores (56 sectores) e três tipos de mão-de-obra, enquanto que o
capital e a terra agrícola são os dois factores adicionais de produção. O modelo CGE tem 2003
como ano-base e, com poucas excepções, os resultados da simulação estão bem de acordo com a
avaliação da pobreza com base nos IAF02 e IOF09.
Após a leitura do relatório, pode-se ficar com a impressão de que tanto o resultado
principal, bem como a sua interpretação exigiria uma análise mais aprofundada. Essa análise
adicional parece justificada, a fim de explicar os padrões de pobreza observados e a dinâmica da
pobreza em Moçambique, com mais confiança e mais consistência. A pesquisa teria de olhar para
dois aspectos importantes.
Em primeiro lugar, o resultado em si poderia ser em parte um artefacto de colheita de dados
e do processamento de dados.
48
iii) Seria interessante investigar as razões pelas quais o inquérito aos agregados
familiares parece ser um instrumento fraco para medir a desigualdade no país (secção
6.3).
5 Recomendações
sucessos em várias partes do país. Um caso em questão aqui é o crescimento da produtividade dos
pequenos agricultores, que é "o principal elemento em falta" e que poderia reflectir certas
tendências no processo de desenvolvimento actual.
Escusado será dizer que uma reavaliação dos padrões de pobreza nacional e a nível das
províncias, juntamente com uma maior atenção aos aspectos de economia política poderia ter
implicações importantes para a avaliação das estratégias de redução da pobreza.