Como Eduardo Bolsonaro Acabou Virando Quase Tudo o Que Não Era PDF
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vultos da República
A VIAGEM DO VAGÃO
Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
THAIS BILENKY
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
Eduardo, com seus livros: “Se você ficar lendo só as grandes imprensas, você vai ter uma visão de mundo. Se conseguir sair
disso e ler autores como Olavo, vai descobrir outro mundo” CRÉDITO: DIEGO BRESANI_2020
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
“A
i, meu Deus! Eu escondo esse álbum dele! Deus me livre!”
Heloísa Wolf Bolsonaro, mulher de Eduardo, o filho Zero Três
do presidente da República, está zangada com o marido. Ele
acaba de pegar o book de fotos que fez quando tentou ser modelo na
adolescência para mostrá-las à piauí. “Tu vai vazar?”, ela questiona,
insistindo que não quer ver as imagens publicadas na imprensa. Nelas,
Eduardo aparece com a pele bronzeada e o cabelo loiro em formato
tigela, à la Nick Carter, o integrante bonitinho dos Backstreet Boys. Em
uma das fotos, está apenas de sunga vermelha, recostado em uma mureta
com as pernas cruzadas, em pose insinuante. “Coisa brega!”, reclama
Heloísa. Eduardo olha para o seu segurança e dá um sorrisinho, como
quem se diverte com o incômodo da mulher. Conta que nunca mostrou à
imprensa o álbum de modelo. “Não me chama de homofóbico, mas nessa
época sempre tinham uns caras que queriam ou me comer ou dar para
mim”, diz ele. Vigilante, Heloísa observa: “Essa tua frasezinha foi
anotada, Eduardo.”
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
F
azia três dias que Eduardo Bolsonaro e mais cinco colegas da
Câmara estavam em visita oficial a Israel. Na primeira sexta-feira de
dezembro de 2019, resolveram fazer turismo em Jerusalém.
Eduardo apareceu bem-humorado no salão do café da manhã. Brincou
que o fantasma do Partido dos Trabalhadores estava no seu encalço
porque o número do seu quarto no hotel era o 513 – o PT é identificado
eleitoralmente pelo número 13. Contou que, na porta do quarto, ao lado
do 513, ainda havia uma estrela vermelha. Depois do café, enquanto os
deputados caminhavam pelas ruas de pedra da parte antiga de
Jerusalém, Eduardo apontou o número 13 de uma casa e insistiu na
piada: “Olha aí. Estão me perseguindo.”
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“Vai, Léo, igual uma criança!”, disparou Eduardo para o deputado Léo
Moraes, do Podemos de Rondônia, que fazia graça, pondo e tirando o
boné, enquanto tirava fotos em um mirante em frente ao Muro das
Lamentações, o principal monumento judaico de Jerusalém. O guia
informou que o grupo estava em um ponto privado que oferece uma
vista privilegiada do conjunto do Muro e da Cúpula da Rocha, o sagrado
domo dourado dos muçulmanos. Eduardo sacou o celular e tirou fotos.
Era quase meio-dia, mas a temperatura não passava de 10ºC, e a garoa
começara a se espalhar pelo local.
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E
duardo Bolsonaro desembarcou em Tel Aviv no dia 4 de dezembro,
na condição de presidente da Comissão de Relações Exteriores e de
Defesa Nacional da Câmara. Encabeçava uma missão de duas
semanas pelo Oriente Médio, que custou 175 mil reais aos cofres
públicos. A viagem começou com uma agenda ambiciosa e terminou com
um saldo controverso. O ponto alto dos compromissos era uma reunião
com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. O encontro foi
desmarcado na última hora. Netanyahu, acossado por uma grave crise
política e investigações de corrupção, preferiu encontrar-se com o
secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, em Portugal. O
outro compromisso relevante era uma conversa com o presidente de
Israel, Reuven Rivlin, que deveria ocorrer na residência presidencial.
Também não aconteceu.
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Sem cumprir uma agenda relevante, Eduardo deixou Israel, visitou três
países árabes e, antes de voltar para o Brasil, fez uma nova escala de
algumas poucas horas em Jerusalém. O objetivo era inaugurar o escritório
da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos
(Apex-Brasil) na cidade. O escritório foi o recurso que o governo de
Bolsonaro encontrou para compensar a promessa até agora não cumprida
de transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém.
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Z
ero Três tornou-se uma espécie de “diplomata” da família Bolsonaro
movido mais pelo prazer que tem de viajar do que propriamente
pelo apetite intelectual por política externa. Tudo começou em 2012,
quando o então deputado estadual Flavio Bolsonaro, seu irmão mais
velho, começou a assistir a vídeos de um polemista que dizia devotar sua
existência à luta contra a conspiração comunista mundial. Era Olavo de
Carvalho, que hoje vive em Richmond, no estado norte-americano da
Virgínia. Flavio gostou do que viu e, meses depois, decidiu homenagear o
novo ídolo com a Medalha Tiradentes, a maior honraria da Assembleia
do Rio de Janeiro. Ainda em 2012, tomou um avião para os Estados
Unidos para entregar a comenda em mãos. No encontro, transmitido ao
vivo pela internet e presenciado apenas por Roxane, mulher de Carvalho,
Flavio explicou que tomara a iniciativa de condecorar o polemista para
ajudar na divulgação de suas ideias. “Isso faz parte de um processo de
amadurecimento político, de as pessoas começarem a enxergar coisas que
não vão conseguir enxergar nunca se se basearem apenas em jornais,
revistas e periódicos dominados”, disse Flavio. O vídeo foi visto 60 mil
vezes no YouTube.
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Faltando ainda quase dois anos para a eleição presidencial, o clã começou
a achar que uma viagem de Bolsonaro aos Estados Unidos ajudaria a
promover sua candidatura e reduzir o descrédito que enfrentava no
Brasil. Flavio telefonou para o americano-brasileiro Gerald Brant, diretor
de um fundo de investimentos, e lhe pediu que montasse uma agenda
para o pai, a ser cumprida no final de 2017. Na contramão de seus pares
no mercado financeiro, Brant era um entusiasta do candidato e se animou
com a tarefa.
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Eduardo opinou que o pai deveria confrontar os opositores, mas foi voto
vencido. Bolsonaro cancelou a programação.
D
epois da vitória de Bolsonaro, os salões de Washington finalmente
se abriram para a família, e quem estava lá, para receber os
holofotes, era Eduardo Bolsonaro. Na viagem, acompanhado do
olavíssimo Filipe Martins, ele foi recebido por Rudolph Giuliani, ex-
prefeito de Nova York e conselheiro de Trump. Esteve com Jared
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À
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O
primeiro problema que Eduardo trouxe ao governo por suas
conexões estourou logo nas semanas de transição. E o problema
tinha dois nomes: Steve Bannon e Filipe Martins. A ala mais
tradicional da equipe do novo governo, que defendia uma abordagem
pragmática das questões de política externa, estava alarmada com
Martins. Ele tinha uma postura tão radical que recebeu o apelido de
Robespirralho – uma mistura de pirralho com Robespierre, o líder da fase
mais violenta da Revolução Francesa, o Terror.
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E
m seu apartamento em Brasília, além de exibir as fotos do book de
modelo, Eduardo decide mostrar alguns de seus livros. Ele informa
que sua referência intelectual é Roger Scruton, o filósofo
conservador britânico que morreu em janeiro passado. “Ele tem vários
livros, não li todos, obviamente”, diz. Mas leu qual? “Estou para ler”,
responde. “Vou começar o branquinho dele. Da capa branquinha.” Ele
pega o livro sobre a mesa de centro da sala para lembrar o título e mostra
a edição em inglês. Chama-se Conservatism: An Invitation to the Great
Tradition (Conservadorismo: Um Convite à Grande Tradição, mesmo
título da tradução brasileira).
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Entre seus livros preferidos, está O Mínimo que Você Precisa Saber para
Não Ser um Idiota, uma coletânea de artigos de Olavo de Carvalho. Ele
mostra o volume e se deixa fotografar com ele. “No final, como diz o
título, você realmente consegue ter uma bagagem que te torna apto a
debater vários temas”, diz.
Eduardo, entretanto, não parece ser um homem tão ligado a livros como
é a redes sociais, de onde extrai a maioria de suas referências. Indagado
sobre o que encontrou de mais relevante em O Mínimo…, ele titubeia, e
Heloísa, sua mulher, intervém: “O próprio título.” Ele ri brevemente e
volta para o mundo da internet: “É que Olavo abre seus olhos. Se você
ficar lendo só as grandes imprensas, você vai ter uma visão de mundo. Se
você conseguir sair disso e ler autores como Olavo, e começar a entrar no
mundo da internet, onde vários perfis têm muito mais curtidas e retuítes
do que jornalistas com grande aparato por trás deles, você vai descobrir
outro mundo.” Scruton também lhe chegou pelo YouTube. “Tem alguns
vídeos muito bons. O que mais repercutiu depois da morte dele foi o que
fala da importância da beleza. Ele critica muito as obras de arte nos
Estados Unidos, o pessoal colocando coisas nojentas, sujeira…”
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O
interior do apartamento de Heloísa e Eduardo em Brasília já
ganhou as redes sociais, desde que ela postou um vídeo no
Instagram mostrando como estava ficando a decoração. Nas
paredes, há uma foto de Jair Bolsonaro, com a faixa presidencial, e um
retrato a óleo de Eduardo, obra de Silvio Zatti, um artista que mais
comumente pinta rosas de cores coruscantes e cavalos brancos galopando
ao léu. São muitas as referências a armas. Nas paredes, os enfeites bélicos
trazem frases em inglês. Um diz: “Você não gosta de armas? Então não
compra uma. Fácil.” Outro, com dois revólveres entrecruzados, avisa:
“Aqui não telefonamos para o 911”, o número de emergência nos Estados
Unidos. Em uma foto, feita em Gramado (RS), o casal aparece vestindo
roupas de época: ela está de pé, com chapéu e vestido longo bufante; ele
está sentado, de boina, camisa xadrez e suspensório; ambos seguram uma
espingarda comprida e gasta. Na prateleira de bebidas, há uma garrafa
da tequila Hijos de Villa em formato de revólver. A bebida sai pelo cano.
A cachorra, uma vira-lata cor de caramelo que usa três presilhas na
cabeça, chama-se Beretta, uma marca italiana de armas.
Na única vez conhecida em que ele poderia ter usado uma arma, as
coisas não deram muito certo – a exemplo, aliás, do que aconteceu com
seu pai, que foi assaltado quando passeava de moto no Rio de Janeiro, em
1995, e o ladrão levou-lhe o veículo e até a arma que Bolsonaro usava,
uma pistola Glock, calibre .380. O caso de Eduardo, testemunhado por
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
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uda, como Eduardo Bolsonaro era chamado na infância e
adolescência, cresceu na Tijuca, na Zona Norte do Rio de Janeiro.
Embora o bairro fosse longe da praia, ele vivia pegando onda.
Subiu numa prancha de body-board aos 12 anos, inspirado por Flavio, o
primogênito. Um ano depois, interrompeu a prática do novo hobby para
ser submetido a uma cirurgia para corrigir uma ginecomastia, que é o
crescimento excessivo das mamas em homens. Sofreu na mão dos colegas
de escola. Seu apelido virou Buba, o nome de uma personagem
intersexual na novela Renascer, exibida pela Rede Globo, em 1993.
“Falavam que eu tinha vagina e pênis”, diz. “Eu dava risada. Às vezes
caía na porrada.”
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
Um amigo próximo desses tempos, que pediu anonimato para falar com
mais liberdade, descreve Eduardo como “um cara gente boa, meio
bobalhão, meio retardado”. Suas intervenções pareciam “meio lesadas”, o
que rendeu ao futuro deputado um novo apelido – Loide, em referência
ao personagem do filme Debi & Loide – Dois Idiotas em Apuros, de 1994.
Eduardo integrava a equipe de futebol, era assíduo nos Jogos Jurídicos,
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
Aos 20 anos, no início do curso de direito, passou dois meses das férias
trabalhando no interior do Maine, estado norte-americano na fronteira
com o Canadá. A empresa de intercâmbio arranjou como hospedagem
uma casa compartilhada com oito brasileiros e catorze peruanos. Todos
trabalhavam em restaurantes fast-food, onde Eduardo preparava
hambúrgueres. Ele falava mais espanhol do que inglês, mas gostou tanto
da experiência que a estendeu por mais dois meses, desta vez em um
lugar menos monótono. Conseguiu um emprego em uma estação de
esqui no estado do Colorado. Trabalhava em uma lanchonete no alto da
montanha. “Pelo menos uma vez por dia você fazia snow-board (surfe na
neve)”, contou.
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
O
que mais intriga amigos de juventude e colegas de faculdade é a
metamorfose do Vagão. Ouvidos pela piauí, eles contam que
Eduardo era um sujeito boa-praça, agradável e cordato, que nunca
defendeu posições extremistas. Seus professores da UFRJ dizem que não
conseguem reconhecer o jovem estudante no deputado. “Quando leio nos
jornais e nas redes sociais as falas dele, é como se fosse um personagem
que eu não conheço, porque o Eduardo Bolsonaro aluno era normal,
gentil, educado”, diz a professora Vanessa Berner, titular de direito
constitucional na universidade.
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
Em 2019, fez reverberar nas redes uma acusação de que Geraldo Prado, o
“autor alumiado” de outrora, recebera dinheiro do Primeiro Comando da
Capital (PCC), a maior facção criminosa do país. Logo Eduardo, que, no
auge da campanha pró-impeachment, fez um discurso dizendo o
seguinte: “Voto no Marcola, mas não voto na Dilma. Pelo menos o
Marcola tem palavra.” Marcola era – e ainda é – o chefão do PCC. Prado,
em resposta à acusação do ex-aluno, de quem disse não ter nenhuma
lembrança, afirmou: “Nunca fui contratado ou recebi pagamentos de
nenhuma organização criminosa.”
Para Eduardo, é natural que sua visão de mundo tenha mudado tão
radicalmente em tão pouco tempo. “Poxa, vai comparar agora, eu com 35
anos, em segundo mandato? A minha preocupação era passar de ano, ir
nos Jogos Jurídicos e estudar para concurso.” Sua amizade com a turma
da faculdade continuou nos anos seguintes à formatura. Uns dez amigos
mais próximos mantinham contato com ele em um grupo de WhatsApp,
mas não o pouparam de críticas, quando, já deputado federal, ergueu
bandeiras que eles jamais esperavam vê-lo erguer. Na votação do
impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em abril de 2016, o tempo
fechou. Os amigos da UFRJ ouviram Jair Bolsonaro homenagear o
torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra em seu discurso e notaram que
Eduardo, posicionado atrás do pai, repetia em voz baixa o nome de Ustra
e depois provocou quem o vaiava fazendo um gesto que sugeria que os
opositores eram ladrões. A turma da faculdade expulsou-o do grupo.
C
omo deputado, as posições de Eduardo também sofrem guinadas.
Em 2017, por exemplo, ele era contra a reforma da Previdência
proposta pelo então presidente Michel Temer. Chegou a postar um
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
vídeo nas redes sociais dizendo que a Previdência não era deficitária –
aliás, seguindo posição do seu pai. Quando o governo de Bolsonaro
propôs uma reforma previdenciária até mais profunda, Eduardo apoiou-
a integralmente. No início de sua vida parlamentar, apresentou um
projeto para acabar com a prerrogativa do presidente da República de
indicar ministros do Supremo Tribunal Federal. Depois da eleição de seu
pai, abandonou o projeto.
C
om o diploma de bacharel em direito nas mãos, Eduardo precisava
sepultar a fama de Vagão. Queria ficar longe das ondas e das festas
cariocas. Confinou-se no apartamento do pai em Brasília para
estudar e prestar concursos. Em 2010, a Polícia Federal abriu um processo
de seleção para preencher duzentas vagas de agente e quatrocentas de
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
A
grande guinada de sua vida veio em 2014. Até então, Eduardo
conseguira evitar as urnas. Quatro anos antes, o pai ensaiou lançá-lo
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A
15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
para deputado federal pelo PP, mas as coisas acabaram não dando certo,
para alívio do rapaz. Da segunda vez, porém, Bolsonaro foi enfático: ele
deveria se candidatar. Eduardo aceitou a incumbência. Bolsonaro
calculou que poderia expandir sua base eleitoral se Eduardo fosse
candidato em São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, onde o filho
havia morado por cerca de quatro anos. Obediente, ele abriu mão do
surfe e começou a campanha.
Eduardo foi carregado nas costas por Bolsonaro. Com sua sexta reeleição
como deputado federal pelo Rio de Janeiro praticamente garantida,
Bolsonaro dedicou-se a viajar para cidades paulistas apresentando o
filho. Estava nas rápidas aparições em programas de tevê de Eduardo,
estava nos santinhos, estava nos panfletos e estava nas ruas, anunciando
os eventos da candidatura do filho em suas redes sociais.
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
“Se for ao Rio Grande do Sul me acompanhar, vai ver como eu sou
querido lá. Tudo fruto de um trabalho”, diz Eduardo. “A gente trabalha
24 horas por dia. Mas tudo está justificado, pelo amor de Deus. Não fiz
nenhuma viagem que não a trabalho.” Eduardo viajou até quando não
devia. Em fevereiro de 2017, Bolsonaro estava no plenário da Câmara e
trocava mensagens de WhatsApp com o filho, que se encontrava na
Austrália. Era dia de eleição para a presidência da Câmara. Bolsonaro era
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
A
o encerrar um mandato em que faltou a 9% das sessões plenárias,
30% das sessões em comissões e gastou 1,5 milhão de reais dos
cofres públicos com a cota parlamentar, Eduardo concorreu à
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
C
omo o pai, Zero Três aprendeu a falar em público como se fala em
um botequim. Como o pai, coleciona uma sucessão de
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C
15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
Hoje, avaliando as duas declarações, ele afirma que sua diatribe contra
uma radicalização da esqueda era mera “conjectura” e não deixa de
lembrar que recebeu “muito apoio” na internet. “Não apoio para se ter
um AI-5, mas de pessoas que entenderam o que eu falei e tiveram
honestidade intelectual.” Sobre o fechamento do STF, diz que respondia a
uma hipótese esdrúxula – a improvável impugnação da candidatura
presidencial do seu pai – e que fizera só uma brincadeira. E completa com
uma declaração dissonante: “Eu não acredito no uso da força.”
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15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
dizer, mas é uma acusação grave.” Fez mais do que repetir uma calúnia
alheia: difundiu-a em suas redes sociais, com apoio declarado do pai, que
também cerrou fileiras na difamação contra a repórter. As milícias
digitais do bolsonarismo entraram em ação e orquestraram uma das
maiores campanhas de difamação contra uma jornalista já realizadas no
Brasil. No dia em que um grupo de deputadas promoveu um ato de
repúdio às declarações de pai e filho, Eduardo subiu à tribuna da
Câmara. “Em nome das mulheres, uma banana”, disse, ao fazer o gesto
correspondente. “Não vão nos calar”, proclamou, quando começou a
ouvir as deputadas gritando “fascista, fascista”. Virou-se para elas e disse:
“Pode gritar à vontade, mas só raspa o sovaco, senão dá um mau cheiro
do caramba.”
https://piaui.folha.uol.com.br/materia/viagem-do-vagao/# 30/33
15/03/2020 Como Eduardo Bolsonaro acabou virando quase tudo o que não era
E
duardo Bolsonaro opera em três níveis. Em público, ele é o
provocador das redes sociais, um político voluntarista cujo
comportamento tem sido cada vez mais incendiário – o que lhe
rende crescente popularidade nas redes sociais. Tanto é que até superou o
irmão Carlos no Twitter. Só neste ano, de acordo com um levantamento
da consultoria Arquimedes, Eduardo fez mil publicações a mais que o
irmão na rede, e cada postagem teve 11% a mais de retuítes do que as de
Carlos. No terreno privado, Eduardo é o oposto. É simpático e gentil,
cativa seus interlocutores. O terceiro nível em que atua é o do operador
das sombras. Nesta função, empenha-se em prestigiar os aliados com
cargos no governo, detonar quem não lhe parece suficientemente fiel e
azeitar a engrenagem do “gabinete do ódio”, cuja missão é garantir e
ampliar o espaço ideológico da ultradireita.
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