Papiro de Ebers A Medicina Egipcia
Papiro de Ebers A Medicina Egipcia
Papiro de Ebers A Medicina Egipcia
A Medicina em História
A Medicina egípcia
provinham do reino mineral, vegetal, animal ou de substancias Um dos quatro vasos chamados “canópicos”, nos quais eram depositadas
as císceras do morto, depois de embalsamadas (XXVI Dinastia, 663-
provindas de combinações das três origens. Encontram- 525 AC – expostos no Museu Egípcio, Turim).
se, nesse papiro, diversos remédios contra o cancro, as
doenças de pele, as perturbações ginecológicas e até, ditou a receita não foi exacto. "A erva se-nutet
mesmo, para tratamento das sequelas do abortamento. (desconhecida pelos historiadores e botânicos) é
Uma vez por outra a tradução dos textos esbarra trepadeira, como a planta gadet (também desconhecida)
com a intransponível dificuldade de se desconhecerem e tem flores semelhantes às do lótus", diz um dos textos.
os termos técnicos de zoologia e botânica da antiga Mesmo para os que conhecessem a planta gadet, a
língua egípcia. Outras vezes, o próprio médico que descrição pareceria muito vaga.
Mas, noutros preceitos, a terapêutica é eficaz e racional, como nos A avaliação da própria competência por parte do médico ("é um
casos em que o médico recomenda inalações de vapor: "Pega em mal que posso curar"), bem como sua confissão de incapacidade
sete pedras e fá-las aquecer ao fogo; pega numa e lança sobre ela um nos casos irremediáveis, aparece repetidamente, como que a dar
pouco do medicamento; fecha-a num vaso novo, com o fundo furado. ênfase a um princípio ético a ser observado pelo médico.
No furo. aplica um tubo, do qual aproximarás tua boca, de modo a
inspirar o vapor que sai. Repete a operação com todas as outras pedras." Porém, não nos esqueçamos que, não obstante as surpresas neles contidas,
os documentos que descrevem actividades médicas no antigo Egipto
Existe, por exemplo, o conselho de dar sementes de papoila ao lacten- também indicam a superficialidade de certos conhecimentos relativos à
te nervoso e com insónias, que revela conhecimento empírico exacto anatomia e à fisiologia humanas. O vocabulário relativo à anatomia externa
e profundo. Mesmo hoje, para lactentes inquietos e que apresentem era vasto e particularizado, mas o que se referia a órgãos internos era
sintomas de cólicas intestinais, são, por vezes, recomendados medi- desproporcionalmente limitado.A representação hieroglífica de órgãos
camentos derivados da papaverina, substancia extraída da papoila e internos humanos quase sempre é a de órgãos de animais. Da anatomia
dotada de propriedades calmantes e antiespasmódicas. interna, o médico egípcio conhecia apenas os ossos, alguns órgãos
fundamentais como o coração, o fígado, o estômago, os pulmões, os
Outro conselho digno de menção e também para as mães da época: intestinos e a bexiga. Mas não distinguia músculos de nervos, nem artérias
untar o bebé com gordura de gato para que os ratos não o molestem de veias, embora soubesse que o sistema vascular é governado pelo
durante o sono. Embora não se revele muito pratico, para o observador coração. Contrastando com a natureza rudimentar desses conhecimentos,
moderno, o preceito talvez fosse importante numa região infestada o médico egípcio provavelmente possuía o conhecimento das proprie-
por ratos famintos e transmissores de moléstias. Quanto à eficácia dades medicinais de certas substâncias, especialmente vegetais, como dá
da gordura de gato, certamente o médico egípcio se fiava na proverbial a entender o conselho relativo às sementes de papoila. No entanto,
e milenar repulsa que o cheira de gato inspira aos ratos. devemos ser muito cautelosos quanto à eficácia desses tratamentos.
Um remédio que apresentava um uso muito divulgado era o mel, o Apesar da argúcia e da experiência da medicina egípcia, a terrível
qual era incluído na maior parte das preparações medicamentosas. desordem em que se dispõem os textos dos papiros de Ebers e Edwin-
O mel, para além das qualidades nutritivas, assegurava um meio fácil Smith dão a entender que os conhecimentos ainda estavam longe de
de administrar as ervas e outros preparados pelo seu agradável sabor. constituir um sistema científico.A existência de tratados práticos com
54 pouca explicação sobre a patologia subjacente ou com explicações
Há também indicadores da existência de uma proto-cirurgia no antigo de teor mágico (por exemplo, uma teoria primitiva do fluxo de
Egipto que incluía a analgesia e a sedação, a incisão, trepanação, a proto- humores, envolvendo o fluxo de diferentes entidades malignas) insere
cirurgia dos traumatismos e a antisepsis. Já no que respeita às
esta prática médica mais num sistema mágico e religioso do que num
observações empíricas referentes a doenças ou disfunções do sistema
sistema empírico, ainda que rudimentar. Nem mesmo a abundante
nervoso, muito embora poucas, parecem ser aprofundadas. Por exemplo,
farmacologia egípcia chegou a estruturar-se de modo sistemático, o
os tratamentos para as enxaquecas ocupam um longo capítulo do
que lhe teria dado melhores condições de desenvolvimento.
único papiro de Ebers completo e melhor preservado. A demência,
J.M.T
as convulsões e a tetania foram mencionadas ao de leve em diferentes
papiros. Com as descrições clínicas detalhadas dos traumatismos
cranianos e vertebrais apresentadas nos papiros de Edwin Smith, a
neurologia do Egipto faraónico atinge a sua maior importância. BIBLIOGRAFIA
Este papiro, oriundo séc. XVII AC, foi publicado em 1930, com tradução de Brunetta, J. (1998).Aspects of fertility in ancient Egypt. Em, Cruse, P. (Ed.), Proceedings of the
James Henry. Concebido na Idade das Pirâmides (3000-25000 anos AC), 7th Annual History of Medicine Days Conference, Mar. 26-27; Calgary AB. Calgary, p. 7-12.
para além de ser um documento sobre a ética médica daquele tempo, Corleto, L. (1993). Pharmacopoeia in ancient Egypt. Med Secoli., 5(1):1-18.
contém as menções mais antigas na literatura oriental sobre o cérebro, as
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meninges e os traumatismos cervico-basilares. Num estilo de simplicidade Neurol., 16-28;28(4):430-3.
cativante, clareza indiscutível e eficiência bastante razoável, o papiro de
Grimberg, C. (1963). Histoire universelle. 1. De l’aube des civilisations aux débuts de la
Edwìn-Smith enumera conselhos sobre ferimentos e fracturas dos mais Grèce antique. Col. Marabout Universitaire. Ver viers: Gérard & Cº.
variadosVejamos, por exemplo, as instruções para um ferimento na região Helgason, C. (1987). Commentary on the significance for modern neurology of the
temporal: cure-se um homem ferido na têmpora e com um ferimento não aberto; 17 th centur y B.C . Surgical Papyrus. Can J Neurol Sci., 14(4):560-3.
mas se atinge o osso, deverá ser examinada a própria ferida. E se for encontrado Robertson, C. (1998). The use of honey in ancient Egyptian medicine. Em, Cruse, P.
o osso temporal ileso, então pode-se dizer a respeito desse caso: tem uma ferida (Ed.), Proceedings of the 7th Annual History of Medicine Days Conference. Mar. 26-27;
Calgary AB. Calgary, p. 21-4.
na têmpora, é um mal que posso curar. Fá-lo, no primeiro dia com carne fresca,
depois trata-o com um unguento e mel, até à cura completa." Sullivan, R. (1998). Proto-surgery in ancient Egypt. Acta Medica, 41(3):109-20.