Análise Físico-Químicas Do Mel de Abelha Paraíba

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1166 Rural, Santa Maria, v35, n.5, p.

1166-1171, set-out,Rodrigues
Ciência 2005 et al.
ISSN 0103-8478

Análise físico-química dos méis das abelhas Apis mellifera e Melipona scutellaris
produzidos em duas regiões no Estado da Paraíba

Physical-Chemical analysis of honeybee Apis mellifera and Melipona scutellaris on


two regions at Paraiba State, Brazil

Adriana Evangelista-Rodrigues1 Eva Mônica.Sarmento da Silva2


Ennio Marcello Fernandes Beserra2 Marcelo Luis Rodrigues3

RESUMO ABSTRACT

O mel de abelhas é um produto muito apreciado, no The honeybee is a product very appreciated,
entanto, de fácil adulteração com açúcares ou xaropes. Desta however, of easy adulteration with sugars or boiled musts. Then,
forma, é necessário que haja algumas análises para a it is necessary that it has some analyses for the determination its
determinação da sua qualidade para que seja comercializado. quality for commercialization. The objective of this work was the
Este trabalho teve como objetivo fazer a análise físico-química physical-chemical analysis of honeybee Apis mellifera and
dos méis de abelha Apis mellifera. e Melipona scutellaris para Melipona scutellaris to Brejo and Cariri (Paraíba State) Brazil.
a comparação entre as espécies e entre as localidades do Brejo e With the gotten results, it was observed that the honeybee M.
do Cariri (regiões do Estado da Paraíba). Observou-se que o scutellaris presents a bigger water text (25.25% humidity) when
mel de abelha nativa apresenta um maior teor de água (umidade compared with the honeybee A. mellifera (18.76%), making
de 25,25%) quando comparado com o mel de abelha africanizada difficult its storage, with lower time of shelf life. It had, as reply
(18,76%), dificultando o seu armazenamento, pois o alto teor de to the hidroximetilfurfural analyses, higher value for the honey
água do produto diminui a sua vida útil de prateleira. Para as produced in the Cariri when compared with the honey produced
análises de hidroximetilfurfural, o valor mais alto foi para o mel in the Brejo, what it can be explained by the difference
produzido na região do Cariri, quando comparado com o mel temperature, of being higher in the Cariri. For the pH values
produzido na região do Brejo, o que pode ser explicado pela was made as to the significance of the differences between the
diferença de temperatura, sendo mais alta no Cariri. Para os honeys was gotten, with the honey of the Cariri presenting lower
valores de pH, obteve-se diferença significativa entre os méis, value (3.8). For Total Acidity, the honeybee A. mellifera of the
com o mel do Cariri apresentando valor mais baixo (3,8). Para Brejo presented 41.6 meq/kg of honey, while the native honey
Acidez Total, o mel de abelha africanizada do Brejo Paraibano presented 28.3 meq/kg of honey. For the too much studied
apresentou 41,6 meq/kg de mel, enquanto o mel de abelha nativa parameters it didn’t have significant difference between the group.
apresentou 28,3 meq/kg de mel. Para os demais parâmetros As conclusion the analytical results on the honeys produced
estudados, não houve diferença significativa entre os indicate a good level of quality both A.mellifera and M.
tratamentos. Conclui-se que os méis produzidos pelas abelhas scutellaris. The parameters indicatiing a shelf life of the product
africanizadas (A. mellifera) e pela abelha nativa Melipona were most satisfactory.
scutellaris na Estação Experimental do Cariri e da Chã-de-
Jardim pertencentes ao CCA/UFPB apresentam valores Key words: apiculture, beehive products, stingless bees.
diferentes dos padrões da Regulamento Técnico de Identidade
e Qualidade do Mel (Ministério da Agricultura e do
Abastecimento) para alguns parâmetros, o que pode dificultar INTRODUÇÃO
o seu armazenamento por um longo período.

Palavras-chave: apicultura, produtos apícolas, abelha sem A criação racional de abelhas constitui-se
ferrão. de uma atividade em que se consegue obter bons

1
Departamento de Zootecnia, Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Centro Universitário, 58397-
000, Areia, PB, Brasil. Autor para correspondência. E-mail [email protected]
2
Curso de Zootecnia, UFPB, Areia, PB, Brasil.
3
Programa de Pós-graduação em Zootecnia, UFPB, Areia, PB, Brasil.
Ciência Rural, v. 35, n. 5, set-out, 2005.
Recebido para publicação 09.02.04 Aprovado em 20.04.05
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resultados econômicos, ecológicos e sociais. Essa Paraíba, coordenadas: 7°29’34” latitude sul e 36°41’53”
atividade, desenvolvida ao longo do tempo por longitude oeste, temp.médias anuais em torno de 26°C,
pequenos e médios produtores, vem despertando o pluviometria 395mm nos últimos 10 anos, umidade
interesse de muitos criadores e instituições do Brasil. 68%), mel de Apis mellifera obtido na região do Brejo
Na criação de abelhas, existem duas grandes linhas de Paraibano (município de Areia com coordenadas
estudo: a Apicultura e a Meliponicultura. Dentro da 6°58’12” latitude sul e 35°42’15” latitude oeste, altitude
Apicultura, o conhecimento sobre o mel já vem sendo 600m, temperaturas anuais máxima de 26°C e mínima
estudado em várias regiões do Brasil, no entanto na 18°C, com precipitação anual entre 800 e 1600mm.) e
Meliponicultura, esses estudos são mais recentes, mel de M. scutellaris (abelha Uruçu) obtido na região
sendo desenvolvidos com as abelhas regionais. do Brejo Paraibano. Todos os méis utilizados foram
O Brasil possui reservas florais que podem poliflorais, designados pela flora predominante sendo
proporcionar milhares de toneladas de mel, de primeira assim nomeados: T1: mel de abelha A. mellifera do
qualidade, aceito pelo mercado mais exigente do município de São João do Cariri – florada predominante
mundo (WIESE, 1993). O estado da Paraíba se - algaroba), T2: mel de abelha Apis mellifera
apresenta com uma gama de possibilidades para estudo proveniente do município de Areia – florada
dos Meliponíneos, tendo em vista a grande diversidade predominante - silvestre) e T3: mel de abelha M.
de espécies nativas presentes neste estado. scutellaris proveniente do município de Areia – florada
Diversos parâmetros físico-químicos e predominante - silvestre). O mel oriundo do Cariri
químicos vêm sendo utilizados na caracterização do Paraibano foi retirado de colmeias de A. mellifera
mel. Trata-se de um alimento complexo do ponto de localizadas na Estação Experimental de São João do
vista biológico e também analítico, visto sua Cariri, pertencente à UFPB, onde a flora predominante
composição variada em função de sua origem floral e é a algaroba. Os méis de A. mellifera. e M. scutellaris,
geográfica, assim como pelas condições climáticas oriundos do Brejo Paraibano, foram obtidos de um
(BASTOS, 1994). apiário e de um meliponário, respectivamente,
O mel de abelha nativa (Meliponinae) é localizados na Estação Experimental Chã de Jardim,
pouco conhecido em termos de composição, muitas pertencente à UFPB, tendo como vegetação
vezes, sendo associado às características do mel das predominante a Mata Atlântica , capoeiras e vegetação
abelhas africanizadas. Assim, necessário se faz estudar de campo, caracterizando-o como mel silvestre. Para a
esse produto, porque como se sabe, os hábitos das extração do mel produzido pelas abelhas africanizadas,
abelhas nativas se diferenciam das abelhas utilizou-se o método padrão através de centrifugação
africanizadas, podendo alterar também a composição dos quadros da melgueira, e a retirada do mel das
do produto (NOGUEIRA-NETO, 1997). colméias das abelhas nativas foi feita com uma seringa
O presente trabalho objetivou determinar descartável, adaptando-se na ponta um pedaço de
a composição físico-química de 3 tipos de méis, sendo canudo, funcionando como uma bomba de sucção.
o mel de A. mellifera obtido em 2 regiões distintas As análises físico-químicas desenvolvidas
(Cariri e Brejo Paraibano) e o mel de abelha nativa estão de acordo com VILHENA & ALMEIDA-
Melipona scutellaris, obtido na região do Brejo MURADIAN (1999) e são descritas a seguir:
Paraibano visando a comparação das características
entre os méis das diferentes espécies de abelhas como a) Umidade
também a comparação entre as distintas regiões. Pela Instrução Normativa nº 11 de 20 de
outubro de 2000 do Ministério da Agricultura e
MATERIAL E MÉTODOS Abastecimento (Regulamento Técnico de Identidade
e Qualidade do Mel (Ministério da Agricultura e do
O experimento foi realizado na Abastecimento), o teor máximo de umidade permitido
Universidade Federal da Paraíba, utilizando-se o para méis de flores ou de melato é de 20%. O princípio
Laboratório de Química e Bioquímica do deste método consiste na determinação do índice de
Departamento de Ciências Fundamentais e Sociais e refração do mel a 200C, que é convertido para o
o Módulo de Apicultura e Sericicultura do Centro de conteúdo de umidade através de uma tabela de
Ciências Agrárias. Foram analisados três tipos de méis referência, a qual fornece a concentração como uma
de origens diferentes: mel de A. mellifera obtido na função do índice de refração. Para esta determinação,
região do Cariri Paraibano (município de São João pesaram-se 5g de mel de cada amostra e colocaram-se
do Cariri, microregião do Cariri Oriental, altitude 520m, no refratômetro anotando-se o valor dado chamado
geograficamente na porção Centro-Sul do Estado da de índice de refração. Com o índice de refração

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auxiliado pelas Tabela de Chataway, calculou-se a Para o cálculo da acidez lactônica, após a
umidade do mel . solução alcançar o pH de 8,5 imediatamente pipetaram-
se 10mL de hidróxido de sódio 0,05N e utilizando
b) Hidroximetilfurfural (HMF) ácido clorídrico (HCl) 0,05N, fez-se uma titulação de
A análise deste composto é feita no mel para retorno até pH 8,3 com a ajuda de uma bureta.
se verificar a adulteração com açúcar comercial, Acidez lactônica = (10,00 - mL de HCl
estocagem inadequada ou superaquecimento. Nesta 0,05N utilizados na bureta) x 50
determinação, pesaram-se 5g de cada amostra em Acidez total = acidez livre + acidez
béquer identificado, adicionaram-se 25mL de água e lactônica
transferiram-se para um balão de 50mL. Posteriormente,
adicionou-se 0,50mL da solução de Carrez 1{15g de e) Sólidos insolúveis em água
K4Fe(CN)6.3H2O em 100mL de H2O} e misturou-se; o Para esta determinação, pesaram-se 20g de
mesmo foi feito com a solução de Carrez 2{30g de cada repetição dos 3 tratamentos utilizados e diluiu-
Zn(Oac)2.2H2O} e completou-se o volume com água se com a mínima quantidade de água a 80°C
destilada. Filtrou-se com papel de filtro as amostras e transferindo-se para os cadinhos de vidro
descartaram-se os primeiros 10mL. Pipetaram-se 5mL previamente tarados. Após este procedimento, lavou-
do filtrado em dois tubos de ensaio, adicionando-se, se com água destilada à 80ºC até a amostra ficar livre
no primeiro, 5mL de H2O, e no segundo, 5mL de dos açúcares. Colocaram-se os cadinhos em uma
NaHSO3 como referência. Mediu-se a absorbância da estufa a 135°C durante 1 hora e efetuou-se a pesagem
amostra, utilizando um espectrofotômetro nos logo que esfriaram. Para o cálculo, utilizou-se a
comprimentos de onda de 284 e 336nm. Para o cálculo fórmula:
da quantidade de HMF, utilizou-se a fórmula: % de Sólidos. Insolúveis em água = diferença de peso
MgHMF/100g de mel = (A284-A336) x 14,97 x 5 / peso da no cadinho / peso total da amostra utilizada
amostra,
Sendo: Fator = 14,97 = (126/16,830) (1000/10) (100/ Análise estatística dos dados
5)onde: 126= Peso molecular do HMF; 16,830 = Para a análise estatística dos dados,
Absortividade molecular do HMF a 284nm; consideraram-se, como tratamentos, os 3 méis de
1000 = mg/g; 10 = centilitros/L; 100 = porcentagem diferentes origens, tendo 10 repetições de cada
de HMF; 5 = peso teórico da amostra tratamento, aplicando-se o Delineamento Inteiramente
Casualizado, com o teste de médias pelo teste Tukey
c) Cinzas a 5% de probalidade, pelo programa ASSISTAT 2000
Para a análise de cinzas das amostras, (CCT/UFPB).
pesaram-se 10g de cada amostra de mel liquefeito e
transferaram-se para os cadinhos de porcelana RESULTADOS E DISCUSSÃO
previamente tarados. As amostras foram aquecidas no
bico de bunsen até ficarem carbonizadas. Em seguida, Com os dados obtidos para cada parâmetro,
as amostras foram para a mufla à 600°C onde após efetuar-se a análise estatística, construiu-se a
permanecaram por 5 horas. O cálculo foi feito por: tabela 1, com os valores das médias para os respectivos
parâmetros analisados e a tabela 2 com os valores
médios, por tratamento, para os parâmetros umidade,
diferença de peso no cadinho
% de min erais = hidroximetilfurfural, pH, acidez, cinzas e sólidos
peso total da amostra utilizada insolúveis, dos méis colhidos de colméias de abelhas
A. mellifera e M. scutellaris.
d) Acidez total Pelos valores obtidos no experimento, para
A acidez total das amostras de méis é umidade, verifica-se que, pelo Regulamento Técnico
conseguida através da determinação da acidez livre e de Identidade e Qualidade do Mel (Ministério da
acidez lactônica. O teor de acidez livre foi obtido pelo Agricultura e do Abastecimento), para o mel de A.
método titulométrico que se fundamenta na mellifera. (abelha africanizada), os dois tratamentos
neutralização por solução de NaOH 0,05N até a (T1 e T2) enquadram-se nos padrões de qualidade
solução atingir um pH de 8,5. Em seguida, aplicou-se exigidos pelo mercado consumidor, enquanto que, se
a fórmula abaixo descrita: for utilizada a mesma norma para o mel de abelha M.
Acidez livre = (mL de NaOH 0,05N scutellaris (uruçu), verifica-se que não se enquadra
utilizados na bureta - mL branco) x 50 dentro das exigências do mercado consumidor, quando

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Tabela 1 - Valores médios dos parâmetros determinados nas poderia ser armazenado por mais tempo, diminuindo
amostras dos três tipos diferentes de méis, T1(mel o seu risco de fermentação.
produzido na região do Cariri Paraibano por abelhas
Apis mellifera.) T2 (mel produzido na região do TERRAB et al. (2002), determinando o
Brejo Paraibano por abelhas Apis mellifera.) e T3 conteúdo de água em méis uniflorais, obtiveram
(mel produzido na região do Brejo Paraibano por valores de 16,8 a 17,3%. Os méis multiflorais
abelhas Melipona scutellaris).
apresentaram valores que variaram de 17,59 a 20,3%.
Pelos resultados (Tabela 1), observa-se que,
Umidade HMF Acidez Cinzas Sól. Insol.
Amostras
% Mg/g
pH
milleq/kg % % para HMF, houve diferença significativa entre os méis,
com o mel da abelha africanizada do Cariri
T1 18,06b 23,90a 3,85c 41,66a 0,17a 0,01a
apresentando valor superior (23,90mg/g mel) ao mel
T2 18,76b 20,70b 4,61b 35,00ab 0,20a 0,01a
T3 25,26a 18,92b 4,66a 28,33b 0,17a 0,01a
da região do Brejo produzido pela abelha africanizada
(20,70mg/g mel) e pela abelha nativa (18,92mg/g mel).
Médias seguidas pela mesma letra não diferem estatisticamente Observa-se então que, tanto o local de origem como a
entre si, pelo teste de Tuckey a 5% de probabilidade. espécie produtora do mel, podem causar diferenças,
embora os três tratamentos estão com valores dentro
nos referimos ao Regulamento de Identidade e dos padrões exigidos pelo Regulamento Técnico de
Qualidade do Mel, editado como norma para a Identidade e Qualidade do Mel (Ministério da
comercialização do produto pelo Ministério da Agricultura e do Abastecimento) (Instrução Normativa
Agricultura e do Abastecimento. Este regulamento foi nº 11 de 20/10/00). Sabe-se que a Legislação foi
editado para a padronização do mel de abelha A. redigida para o mel de abelha africanizada mas, neste
mellifera, no entanto, como mostra o presente item, o mel de abelha nativa também pode se enquadrar,
trabalho, provavelmente para a padronização do mel tendo em vista que o HMF apresentou valores abaixo
das abelhas nativas, talvez haja a necessidade de se de 40 mg/g de mel. O valor de 23,00 mg/ g de mel
editarem novos regulamentos, tendo em vista a encontrado no mel oriundo do Cariri, pode ser
diferença, por exemplo, de umidade apresentada aqui explicado pela diferença de temperatura entre o Cariri
pelo mel de abelha Urucu. Esta diferença deve-se, e o Brejo, apresentando aquela localidade uma
provavelmente, às diferentes plantas visitadas, o que temperatura ambiente maior (média 26°C), o que pode
já foi verificado por SILVA (2000), que observou que influenciar o mel ainda no favo.
em plantas em que a Apis se faz presente na coleta de Para os valores de pH, os dados (Tabela 1)
néctar, a Melipona não foi encontrada. AZEREDO et mostram que houve diferença significativa entre os
al ( 2003) analisando as propriedades físico-químicas tratamentos, com o mel oriundo da região de São João
dos méis brasileiros produzidos por abelhas do Cariri apresentando valor menor (3,85) de pH do
africanizadas encontraram uma variação de 18,59 a que os demais tratamentos. SOUZA (2003),
19,58% no teor de água em suas amostras, trabalhando com diferentes méis e origens, encontrou
corroborando com o presente trabalho, podendo haver para o pH do mel de algaroba o valor de 5,26 e para o
também diferença na manipulação do produto pelas mel de flores silvestres o valor de 3,65. CRANE (1983)
abelhas dentro da colméia. cita que o valor de pH pode estar diretamente
Como o mel é proveniente do néctar, pode- relacionado com a composição florística nas áreas de
se sugerir que o néctar coletado pela abelha nativa coleta, uma vez que o pH do mel poderá ser
talvez tenha em sua composição um teor maior de influenciado pelo pH do néctar, além das diferenças
água. Outro ponto a ser discutido é o manejo utilizado na composição do solo ou a associação de espécies
para opercular o mel, ou seja, a abelha africanizada vegetais para a composição final do mel, que também
de uma maneira geral, só opercula o mel quando este estariam contribuindo para a variação de pH. Observa-
já se encontra em ponto de coleta (17% -18% de se que houve diferença significativa entre os méis das
umidade). Para a abelha nativa, vê-se através deste diferentes espécies de abelhas (africanizadas e nativas)
experimento, que o mel é operculado com um alto mesmo quando produzidos na mesma localidade, fator
valor de umidade, o que ativará a fermentação caso que poderia ser explicado pelas substâncias
haja condições próprias para isso, diminuindo o seu mandibulares que são acrescidas ao néctar, durante o
período de prateleira, visto que esta abelha operculou transporte do mesmo até a colmeia.
os potes de mel com esses apresentando umidade em Pelas médias dos valores (Tabela 1),
torno de 24%. Com relação à abelha africanizada, observa -se que houve diferença significativa entre
COUTO (1996) defende como valor máximo de os valores de acidez, tendo o mel de abelha
umidade 18% e dentro desta linha, o mel do Cariri africanizada oriundo da região do Cariri Paraibano o

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Tabela 2 - Valores médios, por tratamento, para os parâmetros umidade, hidroximetilfurfural, pH, acidez, cinzas e sólidos insolúveis, dos
méis coletados em colméias de abelhas Apis mellifera e Melipona scutellaris

Amostras
Umidade (%) Hidroximetilfurfural (Mg/g) pH Acidez (Mileq/kg) Cinzas (%) Sólidos insolúveis (%)
(tratamento e repetição)
t1a1 18,0 25,2 4,6 35 0,01 0,0013
t1a2 18,4 23,8 4,6 45 0,02 0,0014
t1a3 17,8 22,7 4,6 45 0,01 0,0016
t2a1 18,8 19,8 4,7 35 0,02 0,0100
t2a2 18,6 22,2 4,7 35 0,01 0,0192
t2a3 18,9 20,1 4,7 35 0,03 0,0141
t3a1 24,8 18,9 3,8 30 0,02 0,0136
t3a2 24,4 18,7 3,9 30 0,01 0,0145
t3a3 26,6 19,1 3,8 25 0,02 0,0073

*t1a1 = tratamento 1 e repetição 1; t1a2 = tratamento 1 e repetição 2; t1a3 = tratamento 1 e repetição 3; t2a1= tratamento 2 e repetição 1;
t2a2 = tratamento 2 e repetição 2; t2a3 = tratamento 2 e repetição 3; t3a1 = tratamento 3 e repetição 1; t3a2 = tratamento 3 e repetição 2 e
t3a3 = tratamento 3 e repetição 3.

valor mais alto (41,66meq/kg) e o mel de abelha nativa valores médios de acidez entre o mel de abelha
oriundo da região do Brejo apresentando o valor mais africanizada e o mel de abelha nativa, com esta última
baixo (28,33meq/kg). Observando-se os dados tendo valor menor de acidez (28,33meq/kg) do que o
anteriores de pH, vê-se a afirmativa da influência do mel de abelha africanizada, tanto oriundo do Brejo
mesmo sobre a acidez, pois o valor médio de pH para o (35,00meq/kg) como do Cariri (41,66meq/kg). Como
mel de abelha africanizada oriundo do Cariri é 3,85 e o a acidez influencia diretamente o sabor do mel, pode-
valor para o mel de abelha nativa oriundo do Brejo é se explicar aqui a notável preferência do consumidor
4,66. Para SOUZA (2003), o valor médio para o teor de pelo sabor do mel de abelha nativa nas regiões citadas.
acidez do mel de algaroba foi de 20,15 e o de flores Na tabela 1, verifica-se que não houve
silvestres foi de 38,95 milleq./Kg, confirmando a relação diferença significativa entre os valores para o
entre os valores de pH e a acidez do mel. parâmetro Cinzas. Pelo Regulamento Técnico de
A origem da acidez do mel deve-se à Identidade e Qualidade do Mel (Ministério da
variação dos ácidos orgânicos causada pelas diferentes Agricultura e do Abastecimento), permite-se até 0,6%
fontes de néctar (ROOT 1985), pela ação da enzima de cinzas na amostra de mel, qualificando-o ainda
glicose-oxidase que origina o ácido glucônico como mel para consumo. Desta forma, todas as
(WHITE Jr, 1989; HORN, 1996) pela ação das amostras ficaram dentro do permitido, qualificando
bactérias durante a maturação do mel (RUIZ- também neste parâmetro os diferentes méis estudados.
ARGUESSO & RODRIGUES-NAVARRO, citados O teor de mineral no mel está diretamente
por WHITE Jr, 1989) e ainda a quantidade de minerais relacionado com o tipo de solo (FIGUEIREDO, 1991
presentes no mel (WHITE Jr, 1989). Pelo citado por NORONHA, 1997) e verifica-se neste
Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade do trabalho que, apesar do mel ser oriundo de distintas
Mel (Ministério da Agricultura e do Abastecimento) regiões climáticas (Brejo e Cariri), deve haver, pelos
(Instrução Normativa nº11 de 20/10/00 do Ministério resultados aqui obtidos, uma semelhança de solos, no
da Agricultura e do Abastecimento) o valor de acidez que diz respeito à mineralização do mesmo. Arruda et
não deve ultrapassar 40 miliequivalentes de acidez/ al (2002) obtiveram o valor médio de 0,19% para
kg de mel, e notando-se os dados apresentados, apenas análise do conteúdo mineral de vinte e uma amostras
o mel de abelha africanizada da região do Cariri não de méis (A. mellifera) provenientes dos Estados do
se enquadraria nas normas de qualidade para o Ceará, Piauí, Bahia e Paraíba. Resultados semelhantes
mercado consumidor. Conquanto que, o mel de abelha foram encontrados para os méis aqui estudados.
nativa, apesar da legislação não ser diretamente válido Observando-se os resultados para o
para esta situação, ele se enquadra perfeitamente, parâmetro sólidos insolúveis na tabela 1, percebe-se
podendo-se utilizar esta legislação, variando-se apenas que não houve diferença significativa para as amostras,
alguns itens que são específicos do mel de abelha ficando dentro dos padrões exigidos pela legislação
nativa, como por exemplo, o caso da umidade. Um item (máximo de 0,1%), estando com seus valores bastante
interessante para se discutir é a diferença entre os abaixo do limite, o que qualifica os três tipos de méis

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Análise físico-química dos méis das abelhas Apis mellifera e Melipona scutellaris produzidos em duas regiões... 1171

para o mercado consumidor. Souza (2003), trabalhando BASTOS, D.H.M. Açúcares do mel: aspectos analíticos.
com tipos de méis poliflorais do estado da Paraíba, Revista de Farmácia e Biologia, v.12, n.1, p.151-157,
1994.
também obteve em suas amostras valores semelhantes
para sólidos insolúveis, estando todas as amostras BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
com valores inferiores a 0,1%. Instrução Normativa 11, de 20 de outubro de 2000,
Regulamento Técnico de identidade e qualidade do mel.
Diante do exposto, confirma-se que as Disponível na internet http://www.agricultura.gov.br/sda/dipoa/
características dos méis variam de acordo com sua anexo_intrnorm11.htm.
origem, tipo de solo e vegetação visitada pelas abelhas
COUTO, R.H.N. Apicultura: manejo e produtos.
produtoras. Conclui-se que os méis de A. mellifera, Jaboticabal : FUNEP, 1996. 154p.
produzido na região do Brejo Paraibano e na região
do Cariri Paraibano, apresentam semelhanças em sua CRANE, E. O livro do mel. São Paulo : Nobel, 1983. 225p.
composição, diferenciando-se do mel da abelha nativa. HORN, H. Intensive proctical cours on honey analysis.
Os méis de abelhas nativas e africanizadas, mesmo 1996. 43p. Dissertação (Mestrado em Entomologia) -
sendo produzidos em uma mesma região, apresentam FFCLRP/USP.
diferenças significativas em sua composição. A
NOGUEIRA-NETO, P. Vida e criação de abelhas
umidade do mel produzido pela abelha M. scutellaris indígenas sem ferrão. São Paulo : Nogueirapis, 1997. 445p.
na região do Brejo Paraibano apresenta valor maior
do que o mel da abelha A. mellifera produzido na NORONHA, P.R.G. Caracterização de méis cearenses
produzidos por abelhas africanizadas: parâmetros
mesma região, sendo superior inclusive ao valor químicos, composição botânica e calorimetria. 1997. 146f.
estipulado pelo Regulamento Técnico de Identidade Dissertação (Mestrado em Zootecnia) - Universidade Federal
e Qualidade do Mel (Ministério da Agricultura e do do Ceará.
Abastecimento); os méis produzidos pelas abelhas SILVA, R.A. Fenologia e forrageamento pelos Apidae
africanizadas nas Estações Experimentais de São João em plantas do módulo de apicultura do CCA/UFPB/
do Cariri e da Chã-de-Jardim apresentaram valores Campus III -Areia (Microrregião do Brejo Paraibano).
diferentes aos do Regulamento Técnico de Identidade 2000. 50f. Monografia (Graduação em Zootecnia) - CCA,
Universidade Federal da Paraíba.
e Qualidade do Mel (Ministério da Agricultura e do
Abastecimento) para alguns parâmetros, o que pode SOUZA, C.C. de. Caracterização físico-química, química
dificultar o seu armazenamento por um longo período. e análise de sabor de méis poliflorais. 2003. 110f.
Dissertação (Mestrado em Tecnologia de Alimentos) -
Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos,
REFERÊNCIAS Universidade Federal da Paraíba.

ARRUDA, C.M.F. Características físico-químicas de VILHENA, F.; ALMEIDA-MURADIAN, L.B. Manual de


amostras de méis de Apis mellifera. 1758 análises físico-químicas do mel. São Paulo-SP :
(Hymenoptera:Apidae) de diferentes estados do APACAME, 1999. 16p.
Nordeste Brasileiro. 2002. 125f. Tese (Doutorado em
Agronomia) - Escola Superior de Agricultura “Luiz de WHITE Jr. J.W. La miel. In: DADANT, H. La colmena y
Queiroz”- Universidade de São Paulo. la abeja mellifera. Montevideo : Hemisfério Sul, 1989.
Cap.1, p.21-35.
AZEREDO, L.C. et al. Protein contents and physicochemical
properties in honey samples of Apis mellifera of different WIESE,H. Nova apicultura. Guaíba-RS : Agropecuária, 1993.
origins. Food Chemistry, v.80, p.249-254, 2003. 493p.

Ciência Rural, v.35 n. 5, set-out, 2005.

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