Natureza Da Morfologia
Natureza Da Morfologia
Natureza Da Morfologia
Recife
2019
DANIELA PAULA DE LIMA NUNES MALTA
Recife
2019
Ao meu esposo, Benedito.
Aos meus filhos Ana Clara e Brenno, por quem vivo.
A minha irmã Poliana, por em muitos momentos, ter sido também minha mãe.
Aos meus pais pelo exemplo.
A minha orientadora, Cláudia Roberta, que me apoiaram em todos os momentos, e
foram fundamentais para a realização deste sonho.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, por sua infinita bondade e por ter me permitido realizar tão
grandioso sonho. Sem Sua presença viva em mim e sua eterna misericórdia, nada disso seria
possível.
A minha mãe, Célia, e a meu pai, Luiz, por todo o investimento em meus estudos, por
toda a paciência nos momentos mais difíceis, pelo apoio incondicional e pelo amor
tão puro, que fizeram de mim um ser humano digno e responsável, capaz de enfrentar
todos os obstáculos da vida.Vocês são a razão da minha existência e a motivação para que eu
seja cada vez melhor.
A minha irmã, companheira de todos os momentos, que sempre me incentivou e me
deu forças para trilhar o meu caminho e me mostrou como a amizade e o amor fraterno são
fundamentais para superar todas as dificuldades. Para mim, um exemplo de bondade.
Agradeço por estar ao meu lado sempre.
A meu esposo, Benedito, por ter sonhado comigo o meu sonho, desde 2006 e a cada
passo até o dia de hoje, nas derrotas e nas vitórias. Companheiro leal e imprescindível, que
neste momento vivencia comigo a realização de tão incrível conquista.Obrigada pela
paciência e compreensão,apesar de todo o estresse que a esposa não sabe disfarçar.
Aos meus filhos, Ana Clara e Brenno, pelo carinho e ternura com os quais
alimentavam minha luta diária durante esse processo do Mestrado. Entendendo minha
ausência na certeza de que esse sonho foi compartilhado.
A minha orientadora, Cláudia Roberta Tavares Silva, por ter me apresentado ao
mundo da pesquisa científica e pelo apoio desde o convite para o grupo de iniciação até o dia
de hoje. Obrigada por ter me incentivado a tentar novamente, pois sem as suas palavras
eu teria permanecido na zona de conforto e não teria chegado até aqui. Obrigada por cada
palavra de encorajamento durante a pesada tarefa de redigir a dissertação. Obrigada por
ter me proporcionado a experiência da pesquisa de campo, que abriu meus horizontes e me
permitiu não só muitos momentos de aprendizado. Você é um exemplo de profissional e
de ser humano a ser seguido e eu agradeço a Deus por ter me concedido a honra de ter te
conhecido e de poder trabalhar ao seu lado.
A UNILAB, por abrir as portas para este estudo, proporcinou a coleta do corpus aqui
utilizado e uma infinidade de descobertas e novos conhecimentos sobre a realidade desta
IES.
Aos professores da Pós-graduação em Letras, da graduação, da escola e da vida.
Aprendi muito com cada um de vocês.
A Thayse Paraíso, presente que a vida acadêmica me proporcionou. Obrigada pela
amizade sincera, que já ultrapassou os limites da amizade, e por suas palavras de
incentivo.
As amigas queridas da escola Auda Souza, Cristina Xavier, Elisa Pereira, Irleide
Quixabeira, Adriana Pessoa, por me compreenderem sempre e por me ensinarem diariamente
o valor da amizade.
Ao amigo Inaldo Rocha, pela colaboração nos ajustes da ABNT na dissertação, com o
qual aprendo muito e que também me mostra a importância da amizade.
Aos professores Silvana Araújo e Adeilson Sedrins, por terem aceitado fazer parte da
banca examinadora e contribuir com suas valiosas considerações para este trabalho.
A todos os meus amigos que me incentivaram a continuar e foram pacientes em meus
momentos de afastamento para me dedicar à dissertação.
Em especial, agradeço a Jakson Silva, gestor da Escola Methódio de Godoy Lima, pela
compreensão das ausências no período de curso das disciplinas do Mestrado e pelas suas
palavras de incentivo.
De modo mais geral, não deixa de ser razoável presumir que a
linguagem se pode aproximar de um sistema ‘perfeito’ (...). Se essa
intuição for acertada, faz sentido leva -la até aos seus limites para ver
o que se pode descobrir sobre esta curiosa e cada vez mais misteriosa
componente da mente humana.
(Chomsky, 1999, p 504)
Este trabalho tem objetivo principal realizar um estudo contrastivo entre as variedades
africanas do português (o português de Angola, de Guiné-Bissau e de São Tomé e Príncipe),
centrando a atenção na natureza da morfologia de flexão verbal e suas possíveis implicações
para o Parâmetro do Sujeito Nulo, tomando por base redações produzidas por alunos africanos
como requisito para ingresso na Universidade Internacional da Lusofonia Afro-brasileira –
UNILAB, localizada em Redenção, no Ceará. Procuramos alcançar, à luz da Teoria gerativa,
os seguintes objetivos: (i) verificar, nos dados escritos de alunos africanos que ainda não
ingressaram na UNILAB, o comportamento dos sujeitos nulos e plenos, tomando por base se
sua distribuição ocorre nos mesmos contextos verificados no Português Europeu; (ii)
descrever o paradigma pronominal nominativo e de flexão verbal nos dados escritos, levando
em conta os padrões de concordância encontrados em cada variedade, e (iii) analisar, a partir
dos dados escritos, se o tipo de sistema de sujeito nulo (ROBERTS; HOLMBERG, 2009) é
comum a todas as variedades africanas do português, tomando por base o modelo de
Princípios e Parâmetros (CHOMSKY, 1981, 1986, entre outros). Os corpora deste trabalho
foram constituídos por dados extraídos de 300 produções escritas, sendo 100 de cada país. Os
resultados quantitativos foram obtidos após rodada dos dados no programa computacional
GOLDVARB X e revelam que o português de Angola e o Português de São Tomé e Príncipe
têm comportamentos semelhantes, apresentando incidência de sujeito nulo, preferencialmente,
em 1ª pessoa e 3ª pessoa do singular e do plural, pois os resultados no PA e no PST sugerem
estar entre o PB e o PE. Ao passo que o PGB está pautado na influência da língua Crioulo,
com maior incidência de sujeitos plenos. Ainda, os dados das variantes africanas do português
em estudo nos mostram que a regra de concordância verbal, é variável. Portanto, qualquer
proposta de análise que tente dar conta da concordância nestas variedades do português
precisa considerar a questão intensa situação de contato linguístico presente nessas
sociedades.
This work has as main objective to perform a contrastive study among the African
varieties of Portuguese (the Portuguese of Angola, Guiné-Bissau and São Tomé and Príncipe),
focusing attention on the nature of the verbal inflection morphology and its possible
implications for the Parameter based on essays produced by African students as a requirement
for admission to the International University of Afro-Brazilian Lusophony - UNILAB, located
in Redenção, Ceará. In the light of the generative theory, we seek to achieve the following
objectives: (i) to verify, in the written data of African students who have not yet joined
UNILAB, the behavior of null and full subjects, based on whether their distribution occurs in
the same verified contexts in European Portuguese; (ii) describe the nomadic pronominal and
verbal inflection paradigm in the written data, taking into account the patterns of agreement
found in each variety, and (iii) analyze, from the written data, whether the type of null subject
system (ROBERTS , Holmgberg, 2009) is common to all African varieties of Portuguese,
based on the Principles and Parameters model (Chomsky, 1981, 1986, among others). The
corpora of this work were constituted by data extracted from 300 written productions, being
100 of each country. The quantitative results were obtained after a round of data in the
GOLDVARB X computational program and reveal that the Portuguese of Angola and the
Portuguese of São Tomé and Príncipe have similar behaviors, presenting an incidence of null
subject, preferably, in the 1st person and 3rd person singular and of plural, since the results in
the AP and the PST suggest to be between PB and PE. While the PGB is based on the
influence of the Creole language, with a higher incidence of full subjects. Still, the data of the
African variants of the Portuguese in study show us that the rule of verbal agreement is
variable. Therefore, any proposal of analysis that tries to account for the agreement in these
varieties of Portuguese needs to consider the intense situation of linguistic contact present in
these societies.
Tabela 1 – Língua(s) mais usada(s) e língua oficial em cinco países africanos lusófonos.......40
Tabela 2 – Paradigma flexional do Inglês...............................................................................116
Tabela 3 – Sujeitos expressos no PPA – Pessoa do discurso..................................................137
Tabela 4 – Ocorrências de sujeitos nulos e sujeitos plenos considerando as pessoas
do discurso............................................................................................................140
Tabela 5 – Padrão flexional do verbo comer em quimbundo.................................................142
Tabela 6 – Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo o
tipo de verbo no corpus do PA..............................................................................148
Tabela 7 – Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa do plural conforme
posição do sujeito x tipo de verbo no corpus de PA.............................................149
Tabela 8 – Distribuição dos dados com e sem marcade P6 no corpus do PA........................151
Tabela 9 – Aplicação da marca de P6 segundo a posição do sujeito no corpus do PA..........151
Tabela 10 – Aplicação da marca de P6 segundo paralelismo clausal do corpus do PA.........153
Tabela 11 – Aplicação da marca de P6 segundo a animacidade no corpus do PA.................154
Tabela 12 – Aplicação da marca plural no verbo relacionado à P6 tomando por
base a variável sexo no corpus do PA.................................................................156
Tabela 13 – Sujeitos nulos no corpus do PST, tomando por base a referência
semântica.............................................................................................................161
Tabela 14 – Sujeitos nulos e sujeitos plenos nos dados de pesquisa......................................161
Tabela 15 – Sujeitos no PST – Pessoa do discurso.................................................................162
Tabela 16 – Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa do plural
segundo tipo de verbo.........................................................................................173
Tabela 17 – Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural conforme
posição do sujeito x tipo de verbo no corpus de PST.........................................173
Tabela 18 – Distribuição dos dados com e sem marca de P6 no PST....................................174
Tabela 19 – Distribuição dos dados com e sem marca de P6 no corpus do PST...................175
Tabela 20 – Aplicação da marca de P6 segundo sexo no corpus PST....................................176
Tabela 21 – Aplicação da marca de P6 segundo a animacidade no corpus do PST...............177
Tabela 22 – Apllicação da marca de P6 segundo o paralelismo oracional no
corpora de PST....................................................................................................178
Tabela 23 – Sujeitos nulos e sujeitos plenos nos dados escritos do PGB...............................180
Tabela 24 – Ocorrências de sujeitos nulos e sujeitos plenos a partir das referências
semânticas do sujeito..........................................................................................184
Tabela 25 – Sujeitos plenos no PGB, tomando por base a pessoa do discurso......................185
Tabela 26 – Distribuição de sujeitos de referência definida plenos e nulos da P6,
a partir do corpus da pesquisa.............................................................................187
Tabela 27 – Distribuição de sujeitos de referência indefinida plenos e nulos da P6,
a partir do corpus da pesquisa.............................................................................188
Tabela 28 – Concordância verbal com sujeitos plenos em P6 no PGB..................................191
Tabela 29 – Aplicação da marca de plural com P6 segundo a animacidade do
sujeito no corpus do PGB...................................................................................192
Tabela 30 – Aplicação da marca de sujeito nulo e sujeito pleno segundo
animacidade do sujeito no corpus do PGB.........................................................193
Tabela 31 – Aplicação da marca de sujeito nulo e sujeito pleno segundo
animacidade do sujeito no corpus do PA.............................................................193
Tabela 32 – Aplicação da marca de sujeito nulo e sujeito pleno segundo
animacidade do sujeito no corpus do PST...........................................................194
Tabela 33 – Aplicação da marca de plural em P6 segundo o paralelismo
oracional no corpus do PGB................................................................................194
Tabela 34 – Distribuição dos dados sem marca de plural em P6, segundo
o tipo de verbo no corpus do PGB.......................................................................195
Tabela 35 – Aplicação da marca de plural em P6 segundo sexo no corpus do PGB.............195
LISTA DE SIGLAS
AGR Concordância
CV Concordância verbal
GU Gramática universal
L1 Primeira língua
L2 Segunda língua
LE Língua estrangeira
LM Língua materna
PA Português Angolano
PB Português Brasileiro
PE Português Europeu
PGB Português de Guiné-Bissau
PST Português de São Tomé
PSN Parâmetro do sujeito nulo
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................18
1.1 OBJETIVOS.......................................................................................................................24
1.1.1 Geral................................................................................................................................24
1.1.2 Específicos.......................................................................................................................25
1.2 HIPÓTESE..........................................................................................................................25
1.3 ESTRUTURA DA DISSERTAÇÃO..................................................................................25
2 QUADRO GERAL DO ESTUDO......................................................................................27
2.1 PALAVRAS INICIAIS.......................................................................................................27
2.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO.....................................................50
2.2.1 O português de Angola..................................................................................................50
2.2.2 O português de Guiné Bissau........................................................................................55
2.2.3 O português de São Tomé.............................................................................................63
3. QUADRO TEÓRICO-METODOLÓGICO.....................................................................73
3.1 TEORIA GERATIVA: A BASE DA PESQUISA.............................................................73
3.1.1 Aquisição da linguagem sob enfoque da Teoria Gerativa..........................................87
3.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA...........................................106
3.2.1 Métodos Utilizados.......................................................................................................107
3.2.2 Coleta dos dados e população investigada.................................................................107
3.2.3 Constituição dos corpora.............................................................................................111
3.2.4 As variáveis...................................................................................................................113
3.2.4.1 Variáveis dependentes.................................................................................................113
3.2.4.2 Variáveis independentes.............................................................................................117
3.3 TRATAMENTO QUANTITATIVO DOS DADOS........................................................130
3.4 ENQUADRAMENTO DOS FATORES: DO GERATIVISMO À
SOCIOLINGUÍSTICA QUANTITATIVA......................................................................131
4 ENQUADRAMENTO LINGUÍSTICO DOS RESULTADOS......................................133
4.1 OCORRÊNCIA DE SUJEITOS NULOS E PLENOS EM DADOS
DE ESCRITA DAS VARIEDADES AFRICANAS DO PORTUGUÊS
EM ESTUDO....................................................................................................................133
4.1.1 Ocorrência de sujeitos nulos e plenos PA..................................................................133
4.1.2 Ocorrência de sujeitos nulos e plenos PST................................................................158
4.1.3 Ocorrência de sujeitos nulos e plenos PGB...............................................................179
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................198
REFERÊNCIAS.................................................................................................................202
18
1 INTRODUÇÃO
O autor ainda afirma que em todos esses contextos, salvo Portugal e Brasil, ela é
língua minoritária. Quanto às comunidades de imigrantes e das comunidades remanescentes,
seu futuro é incerto. Poderá continuar sendo falada ou, em caso contrário e sob pressão das
línguas majoritárias, tenderá progressivamente a desaparecer a partir da terceira geração.
No entanto, em contextos que o português é língua oficial, porém não hegemônica,
prevê-se que ampliará sua presença, seja como língua materna, seja como segunda língua.
Essa ampliação vai depender de vários fatores, como a própria dinâmica social, como por
exemplo o aumento da urbanização e do alcance dos meios de comunicação social; políticas
governamentais e do jogo dos valores sociolinguísticos que afetam o uso e o sentido social do
português e das demais línguas nacionais em sociedades multiétnicas e multilíngues.
Silva, Sene e Araújo (2018), no mesmo sentido, asseveram que o português é ainda
visto como a língua que representa o prestígio social e que pode atribuir um lugar mais
elevado na escala social, mesmo em um país com a realidade multilíngue, como é o caso de
Angola.
Multilinguismo e o Multiculturalismo no continente africano requerem menção,
20
Roberts (2016) dialogam ao postularem que não há apenas uma simples oposição binária
entre línguas de sujeito nulo X línguas de sujeito pleno, mas sim uma gama de possibilidades
de sistemas que vão desde a inexistência de flexão verbal e permissividade de sujeitos nulos
(como o chinês, por exemplo), até línguas que não admitem nem mesmo sujeitos expletivos
nulos (como o inglês). Ao passo que mais línguas vão sendo estudadas – assim como
variedades dialetais de uma mesma língua – mais descritivo se torna o quadro de propriedades
que se pode relacionar ao parâmetro do sujeito. Destarte, trabalhos de sintaxe comparativa
entre variedades de uma mesma língua também podem trazer um novo olhar à teoria e,
sobretudo, aprofundar nos mecanismos de mudança e variação que a sintaxe das línguas
naturais pode sofrer ao longo de sua história.
Assim, um dos grandes desafios presentes nos países africanos de língua oficial
portuguesa é justamente garantir que o estatuto de língua oficial do português não redunde no
silenciamento e no desaparecimento das línguas nacionais, o que exige que ele partilhe com
estas seu espaço na educação, na comunicação oficial e nos demais contextos públicos e
privados. E isso pressupõe que se abandone criticamente o “jacobinismo linguístico”, ou
melhor, o pressuposto de que só o monolinguismo garante unidade nacional (FARACO,
2016).
Para tanto, o copora da pesquisa constitui-se de redações extraídas de dados escritos
provenientes de processos seletivos para ingresso de alunos oriundos de países africanos de
Língua Portuguesa na UNILAB, em Redenção-CE, com entrada no período de 2013 a 2018.
A Universidade de Integração Internacional da Lusofina Afro-brasileira é voltada aos países
da África, sobretudo aos PALOP, mas inclui também Timor-Leste e Macau. Seu projeto
político-pedagógico é ousado assim como o da Unila e o da Uniam, visando a integração
internacional. No contexto a que se presta esta pesquisa, é oportuno contextualizar o refrido
estudo a partir da seguintes observações:
a. Dentro do contexto de pesquisas linguísticas no Brasil há uma lacuna com
relação aos estudos sobre as variantes africanas do português, sobretudo de viés
gerativista;
b. A compreensão dos estudos sócio-histórico-linguísticos centra-se em poderar
acerca das diferenças entre o Português Brasileiro e o Português Europeu. Assim,
com intuito de se construir um continuum entre essas interfaces variacionistas;
c. Atender a demanda de estudos de natureza estrutural e ao mesmo tempo social
demanda uma urgência, pois as variantes africanas do português têm sido
frequentemente colocadas ao contato do Português Brasileiro, já que temos
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Portanto, a lusofonia pode ser vista ainda como promoção da língua e de suas
expressões culturais, conjunto entedido como um “sistema de comunicação linguístico-
cultural no âmbito da língua portuguêsa em todas as suas manifestações culturais e em todas
as suas variantes linguísticas” (BASTOS, 2008, p.09).
Em contrapartida, fatores de organização geolinguística se deram a fim de consolidar
os passos acerca das políticas linguísticas de reconhecimento futuro das variedades africanas
do português, como os PALOP - Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa - foi criado,
23
em 1979, pelos governantes de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé
e Príncipe, após a independência da África portuguesa; a criação da Comunidade dos Países
de Língua Portuguesa – CPLP - em 17 de julho de 1996 por Angola, Brasil, Cabo Verde,
guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe; e por fim, no ano de 2002, após
conquistar a independência, Timor-Leste foi acolhido como país integrante.
No mesmo contexto da progressiva promoção do multilinguismo e da diversidade
linguística, o Conselho da Europa aprovou, em 1992, a Carta Europeia das Línguas
Minoritárias ou Regionais (subsequente incorporada, em 2000 pela União Europeia) que
define as diretrizes para a preservação das aproximadamente sessenta línguas regionais ou
minoritárias do continente europeu.
Por outro lado, em 1996, com o patrocínio da UNESCO, foi proclamada a Declaração
Universal dos Direitos Linguísticos que baliza o necessário reconhecimento da “igualdade do
estatuto de todas as línguas, sublinhando-se o papel insubstituível destas na identidade
individual e coletiva das comunidades (CASANOVA, 2006, p. 139).
Os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa apresentam um mosaico linguístico
bem expressivo. Em que além das línguas bantu, khoisan e dos crioulos apresentam o
português como a língua de prestígio resultado das políticas e planejamento linguístico
outorgado pelo sistema colonial, visto que a colonização portuguesa “criou, assim, um
africano de tipo novo. Destribalizado, não sabendo, por vezes, falar a língua local, impelido
para as estruturas organizacionais europeias e, enfim, urbanizado, o assimilado desempenha,
plenamente, o seu papel de pilar da colonização” (JORGE, 2006, p.10). Consequentemente a
colonização inventou um africano linguisticamente diferente de tal forma que este foi
perdendo a sua própria identidade.
Este estudo insere-se no âmbito da sintaxe comparativa (RIZZI, 1988; ROBERTS,
1996; HAEGEMAN, 1997), tendo como meta comparar variedades africanas do português, a
saber: o português de Angola (PA), de Guiné-Bissau (PGB) e de São Tomé e Príncipe (PSP),
centrando a atenção na natureza da morfologia de flexão verbal e o parâmetro do sujeito nulo.
É notória a escassez de estudos no âmbito da sintaxe das variedades africanas do português
situado, sobretudo, no campo da sintaxe comparativa. Dessa forma, a breve descrição de
algumas estruturas linguísticas e a comparação com as línguas crioulas e bantu com que estas
variedades estão em contato mostram que a complementaridade entre a mudança induzida por
contato de línguas e a mudança interna guiada por princípios gerais da gramática devem
continuar a fazer parte do programa de investigação linguística sobre as variedades africanas
do português. Por fim, a variação de uma língua não se dá aleatoriamente, porque é motivada
24
1.1 OBJETIVOS
1.1.1 Geral
1.1.2 Específicos
Verificar, nos dados escritos de alunos africanos que ainda não ingressaram na
UNILAB, o comportamento dos sujeitos nulos e plenos, tomando por base se sua
distribuição ocorre nos mesmos contextos verificados no PE;
Descrever o paradigma pronominal nominativo e de flexão verbal nos dados
escritos, levando em conta os padrões de concordância encontrados em cada
variedade;
Analisar, a partir dos dados escritos, se o tipo de sistema de sujeito nulo
(ROBERTS; HOLMBERG 2009) é comum a todas as variedades africanas do
português, tomando por base o modelo de Princípios e Parâmetros (CHOMSKY
1981 e seguintes).
1.2 HIPÓTESE
Em linhas gerais, a hipótese norteadora desta pesquisa é que, por se tratar de falantes
que ainda não possuem nível superior, é possível que, em sua escrita, encontremos maior
influência de suas línguas maternas (L1) mais do que do PE, sua segunda língua (L2), no
sentido de haver maior ausência de concordância verbal em decorrência de uma morfologia
de flexão verbal mais fraca, o que ocasiona, consequentemente, maior uso de sujeitos plenos.
As línguas na África foram (são) muitas vezes identificadas, de forma genérica, como
dialetos, talvez em razão de se julgar que sejam faladas por pequenos grupos de indivíduos,
por não serem escritas ou até por preconceito. É com a intenção de dissipar qualquer mal-
entendido que o uso da designação “línguas” possa ainda provocar, e para que não se julgue
impossível estudar esses “falares” porque eles não dispõem de escrita – são “ágrafos” – que
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buscamos esclarecer logo de início, mesmo que de forma sucinta, a compreensão que se tem
hoje dos conceitos língua, dialeto, oralidade e escrita, tendo como referência o continente
africano.
Tais conceitos são abordados por Petter (2015) para fim de contextualização e
alinhamento teórico quanto aos estudos linguísticos africanos. Já que o número de línguas
apontadas na África não é fixo, sendo assim há línguas que estão sendo “descobertas” pela
descrição em curso e outras que estão desaparecendo, em consequência de reduzido número
de falantes. Assim, seguem os conceitos adotados pela autora que são caros à presente
pesquisa:
que a escrita é uma representação da língua falada. Para Petter (2015), a escrita
é a fotografia do saber, mas não o saber em si. A autora postula que a oralidade
permite o que a cultura escrita não mais permite: uma inscrição direta do ato de
fala no tecido relacional do grupo e da dinâmica do universo cultural e social
(PETTER, 2015, p.17).
entre 1884 e 1885, responsável pela ocupação em África pelo Reino Unido, Bélgica, França,
Itália, Alemanha, Portugal e Espanha. Apenas Etiópia e Libéria permaneceram independentes
politicamente. Foram séculos de exploração encerrados apenas após o fim da Segunda Guerra
Mundial, que fez surgir movimentos nacionalistas e lutas pelas independências. No entanto,
como ressalta Silva (2010) que após as independências, as línguas europeias ganharam um
novo significado no continente negro, pois ao mesmo tempo em que os governos locais
decidiram utilizá-las, em muitos casos a reconstruíram, mantendo no seu uso a memória das
línguas originárias de África. Para ilustrar, o autor prossegue e explica que os idiomas não são
tão europeus como se pode imaginar, já que com o passar do tempo sofreram muitas
influências locais.
Estas influências formaram novas línguas, como o crioulo da República de Maurício
e de Cabo Verde e o pidgin da Nigéria, e também novas formas de falar, utilizando as línguas
locais como base e estrutura, como o português em Angola e o francês do Congo. Para
explicar melhor a realidade linguística do continente, seu multilinguismo e a convivência
entre línguas africanas e europeias em cada país, a pesquisadora Petter (2006) elucida que
foram associadas às línguas diferentes funções e estatutos, sendo divididas em oficiais,
nacionais e veiculares. Segundo a professora de Linguística da Universidade de São Paulo, a
Língua Oficial é normalmente a falada na escola, no trabalho, na administração e na mídia.
Em muitos países, a língua oficial é a língua europeia.
Diante dessa realidade linguística, faz-se necessário atentarmos para os seguintes
conceitos acerca do que seja multilíngue e plurilíngue. Multilinguismo, de acordo com o
Quadro Europeu Comum de Referência para as línguas, um contexto onde várias línguas
coabitam ou coexistem – “ uma sociedade multilíngue pode ser maioritariamente formada de
indivíduos monolíngues que ignoram a língua do outro”, enquanto que uma sociedade
plurilíngue é “composta maioritariamente de indivíduos capazes de se exprimir a diversos
níveis de competência em várias línguas” (CECRL, 2000, p. 11).
No caso da escola angolana, por exemplo, no meio urbano, coexistem várias línguas,
entre elas, o português – como língua oficial - e as línguas nacionais (ou línguas bantu) –
Umbundu, ngangela, nyannika-humbi e suas variantes, tal inserção se deve a reforma
educacional e o acréscimo do ensino dessas línguas no contexto escolar assegurado pela Lei
nº 13/2001, sendo tais línguas adotadas como línguas maternas de vários alunos, mas que não
encontram força de expressão, pelo menos no meio formal. Vale afirmar que, atualmente, na
Guiné-Bissau, o crioulo é língua nacional, pois serve como meio que facilita a comunicação
entre diferentes grupos étnicos do país. São casos raros pessoas em que não tenham
31
multilinguismo está presente em praticamente todos os países do mundo, seja ele oficialmente
reconhecido ou não”. (ROMAINE, 2006, p. 388).
Não há dúvidas de que falar de multilinguismo significa, ainda, igualmente falar de
multiculturalismo, pois a língua veicula a cultura e com ela, o modo de estar, de pensar, de
agir, de raciocinar, etc. O conceito de multilinguismo não pode ser visto apenas como o caso
de coexistência de línguas. Calvet (2001) alega que não existem países monolingues. Podem
existir várias formas de uma mesma língua. O autor acrescenta ainda que o plurilinguismo é a
forma mais corrente e que há duas formas de o conceber: seja como fenômeno individual (um
indivíduo plurilingue, que manipula várias línguas, vive entre várias línguas, porque nasceu
no seio de um casal bilingue, ou porque viajou ou estudou muito) seja como fenômeno
coletivo (uma comunidade plurilingue, na qual coexistem várias línguas).
Fontão (2011) atesta que o plurilinguismo admite uma dimensão intercultural que, na
prática, se traduz pela interação e/ou mediação sócio comunicativa. Desse modo, a educação
em matéria de línguas constitui-se, sobretudo, como um espaço privilegiado de objetivos
políticos consignados para a cidadania democrática.
Dessa forma,
ainda os “dialetos”, que seriam “variedades regionais”, ou seja, “formas não padrão de uma
língua, utilizada em uma localidade com poucos locutores”.
Nos países africanos que têm o Português como língua oficial existem crioulos como
língua materna em Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe. Os estudos realizados
sobre os crioulos mostram que existe um contínuo entre o crioulo mais superficial e o crioulo
fundo (mais afastado da compreensão de quem fala português) e que, em certas
circunstâncias, se nota um processo de descrioulização enquanto que, por razões e em
circunstâncias opostas, se reconhece uma recrioulização (cf. MATEUS, 2002; PRINCE, 2003;
BORGES, 2015; CARVALHO, 2016; FREITAS, 2016; BANDEIRA, 2017).
Notamos ainda, como se trata de um fenômeno sociolinguístico, a crioulização é
consequência de um determinado tipo de compromisso alcançado por grupos pertencentes a
comunidades de fala não somente diferentes, mas econômica, social e politicamente desiguais
— o que pressupõe uma interdependência e um relativo equilíbrio de forças entre as partes
envolvidas. Ela implica mudanças linguísticas, fluxos lexicais, trocas e empréstimos, mas não
é um mero sincretismo ou mistura de elementos da linguagem, não é uma língua misturada e
desestruturada, de acordo com estudos sobre tal conceituação. Assim sendo, Trajano Filho
(2003, p.03) postula que a crioulização “é uma nova língua, cuja estrutura é mais complexa do
que o pidgin que deu origem a ela (o léxico é expandido, a sintaxe complexificada com o
surgimento de artigos, preposições, partículas marcadoras de tempo, aspecto e modo verbal)”.
Isso se deve juntamente com as mudanças linguísticas que resultam numa língua crioula, a
crioulização também implica invariavelmente um processo de mudança cultural resultante de
um intricado fluxo de valores, práticas, saberes, crenças e símbolos que dão luz a uma
entidade social terceira: uma unidade internamente heterogênea que emerge do compromisso
social e linguístico alcançado pelas sociedades que participaram do encontro original.
Enquanto que Rocha e Nascimento (2018) asseveram que os estudos sugerem a relação entre
a colonização de terras, o multilinguismo e a crioulogênese. Na era colonial, o convívio entre
colonizadores e subjugados e a diversidade linguístico-cultural em um mesmo território
compunham uma realidade heterogênea prejudicial para a eleição de um falar oficial. Ao
idioma dos europeus (variedade de superstrato ou dominante) costumava-se atribuir um maior
prestígio. Representando um alvo de difícil acesso, ele coexistia com as línguas nativas
mutuamente ininteligíveis dos povos dominados (variedades marginalizadas ou de substrato),
e da necessidade de comunicação imediata surgia um vernáculo, que migrava de segunda
língua para primeira, ao se efetivar como língua materna das gerações descendentes.
Das interações intensas entre portugueses e escravos africanos, nasce um ambiente
34
“propício à crioulização” tal como descreve Tjerk Hagemeijer (2009, p. 2). Emerge uma
necessidade premente de comunicação que implica uma aproximação, por parte dos escravos,
ao código linguístico utilizado pelos povoadores portugueses (GONÇALVES, 2016). O termo
“crioulo”, na sua aceção linguística, designa a língua resultante da fusão entre línguas
europeias, as lexificadoras ou de superstrato, e as africanas, também chamadas línguas de
substrato. Num primeiro momento, surge um pidgin, ou seja, um sistema linguístico
rudimentar, uma linguagem subsidiária de recurso, extremamente simplificada, capaz de
assegurar a comunicação mais básica entre as duas partes (GONÇALVES & HAGEMEIJER,
2015). Trata-se de um registo linguístico que se foi complexificando à medida que os seus
utilizadores iam experimentando a combinação de estruturas gramaticais e de uma base
lexical até então desconhecidas.
Na realização dessa nova forma de comunicar, o recurso sistemático às suas línguas
maternas seria, certamente, uma mais-valia para facilitar a fluência do discurso. Hagemeijer
explica o processo de crioulização de forma bastante esclarecedora:
Por outro lado, a Transmissão Linguística Irregular (TLI) apresenta condições para
que outros conceitos se constituam. Sendo assim, a formulação do conceito de TLI projeta, há
quase vinte anos, “estender o escopo das mudanças que afetam a estrutura gramatical da
língua em situação de contato massivo, para além da pidginização e da crioulização típicas”
(LUCCHESI, 2015, p.95). Desta forma, Lucchesi (2015) propõe-nos uma concepção atenta
desses conceitos, quando assevera que:
[...] as situações mais radicais de contato linguístico maciço e abrupto dão ensejo à
formação, em curto período de tempo, de uma língua nova, distinta em sua estrutura
gramatical de todas as outras que concorreram para sua formação (língua pidgin ou
língua crioula), não obstante seu léxico seja majoritariamente proveniente de apenas
uma das línguas em contato e alguns mecanismos de sua gramática possam ter sido
transferidos da gramática das outras línguas [...] Nesta perspectiva, o processo de
formação de uma variedade linguística em situação de contato é concebido como
variável em seus resultados, em função da gradação nos valores de certas variáveis
sociais que o estruturam, de modo que seu resultado não pode ser um pidgin
ou um crioulo, mas apenas uma variedade da língua que prevalece na
situação de contato.(LUCCHESI, 2015, p. 95)
Como pontua o autor, o processo de transmissão linguística irregular traz seus reflexos
35
De outra forma, há considerar que uma classificação rigorosa das línguas africanas
requer procedimentos que demonstrem que as formas, o vocabulário e as estruturas
linguísticas propostas como elementos de comparação são não apenas representativos, mas
fazem parte do patrimônio original das línguas comparadas. A semelhança não deve ser,
portanto, resultado de empréstimos ou de contatos antigos ou recentes (KI-ZERBO, 2010)
Para melhor compreensão do panorama linguístico na África, o mapa 1 de
distribuição linguística (ferramenta fundamental para contextualização desta pesquisa) é a
imagem fiel da representação dos grupos linguísticos da circunscrição e da extensão regional
das línguas nacionais convencionadas pelo quantitativo de variações conforme o tronco
linguístico ao qual se refere:
36
O referido mapa 1 se organiza por meio das línguas do continente africano faladas e
seus respectivos dialetos, como pode-se verificar na parte superior temos o crioulo com 86
37
variações, subdividas em sete bases: a inglesa (31) e seu desdobramento kilo (04), a Congo
(02), a Árabe (03), a Francesa (12), Ngbandi (02), Swahli (01) e a Portuguesa (13). Ainda,
encontra-se as línguas da base Nilo-saariano, que conta com 204 dialetos, subdividido em:
Songai (08), Sudanês-central (65), Kamuz (06), Maban (09),Berta (01), Fur (03), Kunama
(não há registro), Sudanês-Meridional (05) e Saariano (09). De forma ascendente, encontra-se
a língua africana de base afro-asiática (375), como: Chádico (195), Semítica (77), Berbere
(26), Omótica (28), Cusítica (47) e Egípcia (1), esta última extinta. À esquerda do centro do
mapa, encontra-se o maior número de línguas sendo de base “Néger-congo”, que conta com o
registro de 1514 variações, sendo decomposto em 5 sub-bases: Atlântico Congo (1418) e seus
desdobramento “Atlântica” (64), Ijóide (10), Volta-congo (1344), Cordofá (24) e Mande (71).
Assim, dando continuação à compreensão do mapa 01, constata-se a base “Benue Congo”
com o total de 961 línguas, ramificam-se em: Kwa (80), Kru (39), Dagon (10), Bantóide
(681), Bantu (513), Norte (254), Gur (96) e Adamaya Ubangi (158). Já as línguas de base
“Cóisan” computam o geral de 27 línguas, distribuídas em dois grupos; o primeiro Sandawe
(não há registros) e segundo o Sul-africano com o quantitativo de 25 linguas. Esta base, por
sua vez, se subdivide em duas: sendo uma a Central com 13 línguas, ramificadas em “Xoe”
(08) e “Nama” (03); enquanto que a outra “Sul” conta com 06 línguas, combinadas em “Hua”
com 02 línguas e “Kiwi”, 04 línguas.
Aponta-se ainda que há a necessidade de compreensão desse mosaico linguístico
africano na composição das diversas línguas faladas e escritas. Dessa forma, não se pode
negar que a África é riquíssima de línguas culturais. Já que se falam no continente mais de mil
idiomas. Mas de dois mil, segundo alguns estudiosos (cf. CASTRO, 1983;1998; MAHO,
2003; PETTER, 2011; LIMA E CARMO, 2014; BORGES, 2015). Algumas dessas línguas,
como o hauçá e o suaíli, são faladas por dezenas de milhões de pessoas e numa área
geográfica bem extensa. Outra por uns poucos milhares. Numa área onde predomina
determinado idioma, pode haver pequenos bolsões de outro. Ou de outros. Muitas vezes dois
grupos vizinhos se expressam em línguas inteiramente diferentes. E podem ter valores e
maneiras de viver também distintos. Ou ainda, ao mesmo tempo, semelhantes e diferentes.
Geralmente as línguas africanas são agrupadas em quatro famílias: 1- A família afro-
asiática; 2- Niegro-Kordofiana; 3- Nilo-Saariana; 4- Pretende abranger os povos não
negróides – os pigmeus e os do grupo Cóisan (khoi-Khoi e san, mais conhecidos como
bosquímanos e hotentotes).
Apesar de quase todos os países incorporarem um grande número de grupos falantes
de diversas línguas, como é o caso da África, em muitos casos, apenas uma ou duas línguas
38
são reconhecidas como oficiais. O fato de serem reconhecidas como oficiais implica que serão
línguas ensinadas na escola, nas instituições oficiais e nas instituições legitimadoras, como a
mídia. Isso porque, no geral, os grupos politicamente mais poderosos de qualquer sociedade
conseguem impor suas línguas aos grupos menos poderosos. Convenciona-se chamar de
minorias linguísticas os grupos menos poderosos.
No que diz respeito ao uso do termo minorias linguísticas como comunidades
linguísticas em um estado-nação, os estudiosos classificam dois tipos de configuração
populacional: as que são indígenas, também chamadas de autóctones, e as não-indígenas, que
são aquelas formadas por imigrantes ou migrantes.
O mapa abaixo mostra os Grupos Linguísticos da África atualmente:
Tabela 1 – Língua(s) mais usada(s) e língua oficial em cinco países africanos lusófonos
Além disso, Lucchesi e Baxter (2009, p. 112) asseveram que, quando o processo TLI
resulta numa língua crioula, há uma tendência de a estrutura gramatical passar por uma
organização em que se observam os seguintes fatores:
(i) focalização do constituinte através do seu deslocamento para o início da
oração;
(ii) sistema de artigos baseado na distinção entre os níveis de referencialidade
‘específico/não-específico’, marcados, respectivamente, pela presença/ausência do artigo;
(iii) sistema analítico, em que partículas independentes marcam as categorias verbais
de tempo, modo e aspecto;
(iv) orações relativas com cópia pronominal;
(v) estruturas de negação dupla;
(vi) uso de um mesmo verbo para indicar ‘posse’ e ‘existência’;
(vii) ausência de cópula em predicados que envolvem adjetivos;
(viii) uso de adjetivos que funcionam como verbos;
(ix) ordem invariável para as orações afirmativas, imperativas e interrogativas;
(x) forma bimorfêmica analítica assumida pelas palavras interrogativas;
(xi) escassez de construções passivas.
Quando, porém, a referida transmissão de tipo leve acontece, resultando numa
variedade da língua lexificadora, observamos as seguintes características:
(i) eliminação de certos dispositivos gramaticais mais abstratos e de uso restrito da
língua alvo;
(ii) recomposição da estrutura gramatical da língua alvo, eliminando a variação ou
reduzindo-a a uma pequena escala;
(iii) manutenção da variação no esquema presença/ausência do dispositivo gramatical
da língua alvo;
(iv) alteração nas frequências de uso relativamente à marcação de determinados
parâmetros sintáticos;
(v) manutenção da variação no uso do dispositivo gramatical dentro de um esquema
de variável ternária – com a variante da língua alvo, uma variante oriunda de um processo
original de reestruturação da gramática e a variante zero. (LUCCHESI e BAXTER, 2009, p.
43
112).
Dessa forma, as variedades africanas do português revelam influências diretas do
social sobre o linguístico, fazendo com que se descortine na constituição do português
angolano, cabo-verdiano, guineense, moçambicano e santomenses não apenas o seu caráter
heterogêneo e variável, mas também polarizado.
Na verdade, para traçar a história da presença da Língua Portuguesa na África, não é
preciso retornar ao tempo dos descobrimentos. Perpétua Gonçalves utiliza do seguinte
argumento de que:
S
Total da
População 22.416.881 hab. 17.429.637 hab. 1.515.224 hab. 494.040 163.784 hab.
(2010) hab.
Fontes: Ngunga e Faquir (2011); Pereira (2006); Kukanda (2000), CPLP (2013), Abdula (2003).
Podemos afirma que o Brasil é um país plurilíngue. Sua língua oficial é o português,
no entanto essa convive com mais de 200 idiomas, sendo que, aproximadamente, 180 são
provenientes de comunidades indígenas e cerca de 30 são faladas em comunidades imigrantes
(SAVEDRA, 2010). Ainda, de acordo com Cavet (2007), no Brasil, a implantação da primeira
Política Linguística para o país é ordenada dos gabinetes portugueses em Lisboa, mais
especificamente, pelo Marquês de Pombal quando, por desentendimentos políticos com os
Jesuítas e ignorando a imensa população que, no Braisl, falava a Língua Geral, proibiu-a de
ser usada, implantando a Lìngua Portuguesa como única para o Brasil-colônia.
No caso do português, língua em questão nesta pesquisa, o círculo interno corresponde
a Portugal e Brasil, o círculo externo aos países em que é língua oficial, no entanto não
majoritária como L1; e o círculo em expansão, aos países que reconhecem a relevância
internacional do português e o ensinam como língua estrageira.
Em contrapartida, nos países em que o português é língua oficial, porém não
hegemônica, já que funciona basicamente como L2; há um crescimento no número de falantes
que tem como L2, contudo há também um crescimento daqueles segmentos populacionais
como que, nesses contextos, embora minoritários, a têm como L1.
Para o objetivo que estabelecemos neste trabalho, apresentamos adiante, algumas
conclusões a que chegaram estudiosos que analisaram as consequências do contato entre
línguas na estrutura da língua portuguesa em Angola, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe.
Mas, antes disso, faremos uma breve exposição sobre algumas pesquisas sobre a referida
45
temática.
Quanto a diversidade linguística com que convive a variedade do português em países
africanos, Okoudowa (2015) aponta dois casos referentes à convivência das línguas bantas em
Angola:
O primeiro caso é o da convivência das línguas nos sujeitos falantes. Isto é,
raramente se encontra africanos monoglotas. O sujeito pode até não falar uma
outra língua além da sua língua materna. Mas, geralmente, entende alguma
coisa da língua oficial ou a do vizinho, já que convivem e circulam no mesmo
espaço ou território.
Já no segundo caso é o da convivência, da realidade fora do sujeito. Isto é, na
sociedade. As sociedades africanas são multilíngues. Ou seja, além das línguas
nativas, há as línguas européias trazidas pelos colonizadores. O que gera uma
troca muito dinâmica. No caso de Angola, dessas 10 línguas, a que mais
contribuiu com empréstimos na língua oficial é o Kimbundu, língua banta do
grupo H. (OKOUDOWA, 2015, p.13)
1
A situação do português em São Tomé e Príncipe é complexa, como é complexa a situação
linguística neste país. Comecemos por apontar as línguas crioulas:
(a). Línguas Crioulas Faladas no País – cf. Antunes (2007, p.56,57); Santos e Silveira (2012, p.79):
1. Sãotomeense (ou Forro); 2. Principense (ou Lung’iê); 3. Angolar (ou Lungwa Angola); 4. Caboverdiano (ou
Crioulo de Cabo Verde)
(b) Variedades de Português Atestadas no País
A situação do português falado em São Tomé pode ser, até então, descrita em quatro variedades:
1. português dos tongas – português com substrato Níger-Congo (ver Figueiredo 2010, p. 31).
OBS: segundo o Professor Gabriel Antunes, em comunicação pessoal, o português dos tongas não é mais falado
no país.
2. português de Almoxarife – português com substrato crioulo (santomeense) (ver Figueiredo
2010: 59)
3. português vernacular de São Tomé (PVS) – que se contrapõe ao português normatizado
(europeizado) das escolas (cf. SANTOS; SILVEIRA, 2012, p. 70; Figueiredo, 2010, pp. 108-112)
4. português falado pelos caboverdianos
5. português falado na ilha de Príncipe – [...] Baxter (2002, 2004, 2009), para o português dos
tongas [...] Figueiredo (2008, 2009a, 2009b, 2010a, 2010b, 2012), para o português reestruturado da comunidade
crioula e bilíngue [...] de Almoxarife [...] – Figueiredo & Oliveira (2013).
47
28/10/1982, cf. LOPES FILHO, 2015, p. 93), que “teria ‘nascido’ na ‘Guiné’ e depois levado
para as ilhas de Cabo Verde” (CARREIRA, 1984, p. 15).
Para Carreira (1984) o que pode ser chamado de “crioulo”, como:
Assim, Mota (2015, p.20) divide em três grupos de possibilidade que a morfologia de
cada língua tem de marcar especificamente marcadores de flexão de concordância, a título de
exemplo:
muitas línguas apresentam médio e forte sincretismo nos paradigmas verbais e
realização obrigatória, ou quase, do sujeito (CYOUW, 2008), como acontece
claramente em PB, contrastando com o PE e com variedades da África e é
discutido em Duarte e Varejão (2013);
a morfologia de concordância é o “pré-requisito” para a concordância sintática,
mas a morfologia de alvo (o verbo) pode não ter possibilidade de realizar
traços de concordância, em algumas línguas (CORBETT, 2006, p.78);
nas línguas bantas, existem prefixos nominais (marcação do valor de número à
esquerda) e prefixos verbais (marcação à esquerda) no infinitivo – mas
geralmente ausentes nas restantes formas verbais; nos crioulos atlânticos, o
verbo não possui categorias de flexão.
Por ora se faz necessário atentar para a conjuntura dessas variedades africanas do
português com base em estudos que descrevem o perfil sintático destas sob o viés
sociolinguístico e gerativista, já que “[...] os dados de norma urbana culta em Angola e Cabo
Verde dão indícios de esta ser mais próxima da do PE do que a brasileira [...]” (MOTA,
MIGUEL & MENDES, 2012, p.168). Uma vez que resultado obtido em Teixeira (2012,
p.153), constata-se que a concordância não foi drasticamente enfraquecida se comparada a do
PB, por exemplo: “[...] o uso do sujeito ‘a gente’ de referência definida [...] não é expressivo e
o pronome ‘nós’ resiste a ser realizado foneticamente”. Portanto, o perfil do Português de
Angola traz preferência por sujeitos nulos como o PE (OLIVEIRA & SANTOS, 2007).
(1) a. “eu vive p’a Luanda// vim votar aqui [-] assim vou voltar já //[...]” (ADRIANO,
2014, p.225)
b. “(/ganha muito mais importância as decisões que hoje tomaremos // [...]
49
[...] embora seja, de fato, a escolaridade o fator que faz as tendências relativas ao
fenômeno (variável da concordância verbal), está a maior ou menor utilização da
língua crioula. Só declararam que usam frequentemente o crioulo informantes que
cursaram até o ensino fundamental, nível de escolaridade em que se registra maior
cancelamento da marca de número. De fato, o prestígio que recebe o Português em
50
terras sãotomenses e o maior ou menor propósito de dominar essa língua, o que pode
se tornar possível graças ao acesso à escolaridade, trazem por consequência o maior
ou menor domínio das regras canônicas de concordância. (BRANDÃO e VIEIRA,
2010, p.1055)
“Os costumes de uma nação têm uma incidência sobre a sua língua e, por outro lado,
é a língua que faz a nação […] A colonização, que é uma forma de conquista,
transporta um idioma para meios diferentes, o que implica modificações nesse
idioma.” Ferdinand Saussure
Posto que o português seja a língua oficial de Angola, dados de recenseamentos (cf.
CENSO, 2010; INE, 2014) e de estudos já realizados sobre o português angolano (PA) (cf.
MINGAS, 2000; MIGUEL, 2003; CHAVAGNE, 2005; LIPSKI, 2008; PETTER, 2008;
INVERNO, 2008, 2009, 2011; FIGUEIREDO & OLIVEIRA, 2013; NZAU et al. 2013;
NEGRÃO &VIOTTI, 2014; GASPAR, 2015; FARIAS & ARAÚJO, 2016; VERÍSSIMO,
2018) demonstram que ele coexiste com uma grande diversidade de variedades nacionais.
Essas línguas, todas da família bantu, são as línguas maternas para muitos habitantes das
áreas rurais de Angola, especialmente aqueles acima dos 60 anos de idade.
Segundo Santos e Oliveira (2007, p. 12), pro na posição de sujeito ocorre com
sujeitos argumentais e expletivos em produções espontâneas e serve como evidência de que o
PA é língua de sujeito nulo à semelhança do PE, pois essa categoria vazia ocorre em orações
52
raiz e encaixada com todas as pessoas do paradigma. Ao lado desses sujeitos também se
observa sujeitos realizados foneticamente:
(3) a. Por acaso eu não acho. Eu acho que matemática quando bem entendida, ela é
boa.
b. Quer dizer ele é um jogador, pro consegue, pro consegue de mudar o
resultado em vinte e quatro segundos.
c. Uma coisa muito curiosa, eu sei que tu vieste de Cabinda.
d. Foi muito fácil pro adaptares a viver aqui?
(OLIVEIRA; SANTOS, 2007, p. 14)
Semelhanças PA, PB
2sg – VOCÊ 1pl – A GENTE
Semelhanças PA, PE
2sg – TU
(OLVEIRA e SANTOS, 2007, p.93)
português falado na África. Bem como, sujeitos plenos de primeira pessoa não são comuns no
PE, sobretudo, quando se trata da primeira pessoa tanto no singular como no plural. Ademais,
o trabalho dos autores supracitados afirma que o PA encontra-se mais próximo à variante PE,
no tocante ao PSN, ou mais próximo à variante PB. Dessa forma, Oliveira e Santos (Op. cit.),
sintetizam o Parâmetro do Sujeito Nulo (PSN) em PE e PB: Língua portuguesa e o Parâmetro
do Sujeito Nulo Variante PE – posição de sujeito preferencialmente nulo; Variante PB –
posição de sujeito preferencialmente preenchido nos contextos em que o sujeito é mais
referencial (cf. CYRINO, DUARTE e KATO, 2000).
Teixeira (2008) constata que, diferentemente do PE, cuja norma é seguida pelo PA na
sua variedade culta, o pronome você está sendo usado para o tratamento íntimo ou universal
no português falado por angolanos, não-escolarizados e por falantes nativos das línguas
nacionais. Foi esse achado que motivou o estudo da representação do sujeito, a partir de uma
amostra que reúne falantes nativos e não-nativos do português, com o objetivo de testar a
hipótese da ação das novas formas pronominais no processo de variação no uso do sujeito
pronominal. Logo, a autora assume que tal inovação é fruto do contato da língua portuguesa
com as línguas africanas tanto em Angola como no Brasil, em tempos pretéritos.
Já em estudos apresentados sobre “A representação do sujeito pronominal no
português popular angolano” por Teixeira (2012), cuja pesquisa revelou que o estatuto do
parâmetro do sujeito nulo no português vernacular angolano que, diferentemente da norma
culta, tipicamente europeia, apresentaria uma preferência pelo sujeito expresso. Sendo assim,
a hipótese de ser o Português Popular Angolano (PPA) muito semelhante ao português falado
no Brasil no século XIX, com base em fatos linguísticos e sócio-históricos – respectivamente,
o uso considerável do você como pronome íntimo ou, digamos, neutro, por representantes da
classe baixa angolana (TEIXEIRA, 2008), e o contato linguístico do português com línguas
africanas, o que ensejou, tal qual aconteceu no Brasil, a aquisição imperfeita da língua do
colonizador pela grande massa analfabeta da sociedade.
Diante disso, Teixeira (Op. cit) aponta para a confirmação da hipótese segundo a qual
o enfraquecimento da concordância é realmente a causa da preferência pelo sujeito expresso:
a. tanto no Brasil como em Angola o português se formou sobre a influência de
línguas africanas cujos falantes tiveram de aprender o português sem nenhuma instrução
formal e já na idade adulta;
b. esse português reestruturado guarda marcas da sintaxe das línguas africanas tais
como a ausência de concordância de número e de pessoa, do parâmetro pro-drop marcado
negativamente;
54
movimentações das populações para os grandes centros urbanos são os principais factos na
origem do papel de língua veicular da LP. Em estudo sobre o padrão de concordância verbal
em Angola, Adriano (2014) constata que concordância verbal é, claramente, uma área
tendencialmente crítica, cujos desvios nem sempre são sentidos como sendo anómalos. Há
desvios, contudo, que só foram registrados em pessoas com pouca ou nenhuma escolarização.
Exemplifica o autor a partir do corpus:
(4) a. acreditamos que esses dez anos de paz trouxe a esperança de vida a todos os
jovens e a todos os Angolanos //
(5) a. *as situações de dificuldade que os nossos amigos associados vão viver /
estando nós presentes / fará com que o nosso background […] desenvolva // [RH, Bué
Pausado, 20.06.2012]
(6) a. *apelo a todos [-] Angolanos para que possa exercer este direito de cidadania /
para que possa votar de coração limpo e porque a democracia é consolidada com momentos
como estes / de eleições periódicas.
(ADRIANAO, 2014, p.217)
Em que língua escrever As declarações de amor? Em que língua cantar As histórias que ouvi
contar? [...] Falarei em crioulo? Falarei em crioulo!
(SEMEDO, 1996, p. 11)
Ao que parece, a palavra Guiné viria do nome de uma aldeia fundada pelos anos
1040, nas margens do Alto-Niger. Pela sua situação geográfica, essa aldeia tornou-se a
encruzilhada das caravanas que faziam o comércio do Sudão e da África meridional com os
Mandingas e os Árabes do Norte. Daí a sua prosperidade e a sua reputação que, graças aos
mercadores árabes, atingiram os países europeus. No decorrer dos séculos, a palavra Guiné
teve várias grafias. Guiynea, Guinanha, Guinee, Jenni, Genni, Djenni, entre outros.
Não há dúvidas que os africanos têm sua história linguística associada a imposição
do Português Europeu, que em contato com as línguas locais resultou no crioulo. Conceitua
Couto (2009, p.01) “são línguas mistas que surgiram durante o processo de exploração pelas
56
Temos que ter um sentido real da nossa cultura. Português (língua) é uma das
melhores coisas que os tugas nos deixaram, porque é a língua não é prova de nada,
mas senão um instrumento para os homens se relacionarem uns com os outros, é um
instrumento para os homens se relacionarem uns com os outros, é um instrumento,
um meio para falar, para exprimir as realidades da vida e do mundo (CABRAL,
1976 apud CANIATO, 2002, p.134)
Fica claro, então, que a República da Guiné-Bissau é um país plurilíngue, mas com
níveis de uso bastante diversificado, tendo em vista que as línguas nativas não possuem uma
codificação, permanecendo em sua modalidade oral. O mesmo ocorre com o crioulo
guineense, que, segundo explica Candé, “apesar da sua expansão e do seu papel na
comunicação oral, o crioulo ainda não tem uma grafia normativa, existindo apenas algumas
propostas apresentadas” (CANDÉ, 2008, p. 18).
Conforme descrito pelos dados do “Observatório da Língua Portuguesa” (2016), o
PGB é atualmente falado por cerca de 1,5 milhões de guineenses, ou seja, cerca de 57% da
população. Além disso, Guiné-Bissau apresenta um intenso contexto de multilinguismo, pois
mais de 20 línguas étnicas são encontradas, assumem grande protagonismo no convívio e na
comunicação do dia a dia dentro das famílias e na sociedade em geral (COUTO; EMBALÓ,
2010).
Ao contrário das línguas étnicas de existência linear, línguas crioulas também
destacam-se no cenário linguístico de ilhas africanas colonizadas por portugueses, por
exemplo. É certo que de todas as línguas crioulas que surgiram no mundo, os crioulos
africanos são os mais antigos que se conhecem (cf. DIAS, 2002; EMBALÓ, 2009; CASTRO,
2013, CASSAMA, 2014; BARBOSA, 2015; CARIOCA, 2015), e, ao mesmo tempo são os
que se caracterizam pela grande viabilidade em relação aos outros, na medida em que
59
coexistem não só com o Português, mas também com diversas línguas africanas, das quais
recebem constantes influências.
O produto da ‘convivência’ da língua portuguesa com as línguas oeste africanas,
desde os primórdios da presença lusitana em África no século XV. Durante muito tempo, o
kriol foi falado essencialmente nos centros urbanos guineenses e muito pouco utilizado nas
zonas rurais. Estigmatizado, como vimos, pelo poder colonial, ele conseguiu, no entanto
constituir-se como um elemento de resistência e responder ‘presente’ ao apelo do movimento
nacionalista para a independência. Soma a isso, a luta de libertação, servindo-se do kriol nas
campanhas de mobilização, foi incontestavelmente a que mais contribuiu para a expansão e
generalização deste sobre todo o território nacional, levando-o aos mais recônditos lugares
onde até então ainda não tinha chegado. (EMBALÓ, 2009)
Desta maneira, ao servir de língua de comunicação entre os diversos grupos
populacionais no processo independentista, o kriol tornou-se num elemento congregante da
diversidade étnica nacional. A utilização de uma língua comum, outra que não a do
colonizador e ao mesmo tempo símbolo de resistência cultural, contribuiu, juntamente com o
objetivo da luta pela libertação do jugo colonial, para a criação de uma unidade nacional.
Em Guiné-Bissau, o crioulo, língua materna ou língua segunda da grande parte da
população, convive com mais de vinte línguas dos grupos Oeste-Atlântico e Mande. Esse
crioulo é resultado do contato entre colonizadores portugueses e as populações locais falantes
de várias línguas étnicas trazidas de diversos lugares através do processo da escravização que
se concentrou na costa ocidental. Nesse contato, verificam-se situações de bilinguismo, isto é,
naquelas em que uma sociedade ou um indivíduo utiliza, conforme os interlocutores ou as
circunstâncias, duas ou mais línguas (BARBOSA, 1967).
É importante dizer que, em Guiné-Bissau, o conjunto majoritário de pessoas
(crianças e adolescentes) chega à escola falando crioulo. No entanto, embora a maioria das
proposições técnico-educacionais em Guiné-Bissau aponte que a implantação da língua
crioula na escola primária seja uma “ponte” para se chegar à língua alvo, como se almeja,
“[...] o português continua sendo a língua do ensino da primeira à 11a classe” (cf. COUTO;
EMBALÓ, 2010, p. 40).
Desse modo, a Língua Portuguesa representa assim algo sinônimo à “língua
estrangeira”, - segunda língua -, (até a terceira e/ou quarta língua na maioria dos casos para os
guineenses) devido ao seu distanciamento com realidade do sujeito guineense e do país. Esse
distanciamento podeser observado com maior evidência no processo de ensino/aprendizagem.
60
considerados como três dialetos de uma mesma língua, com base no fato de que a fonologia
dos três é idêntica, exceto algumas variantes alofônicas o que para a sociolinguística
variacionista, e para a fonologia, não seria nenhum problema. Porém, os linguistas já admitem
que a distinção entre língua e dialeto é meramente política de salientar que estas línguas não
estão ainda codificadas e, por conseguinte, não são ensinadas. Como essas línguas convivem
em um pequeno território, necessariamente há um contato relativamente intenso entre seus
falantes.
Oliveira, Baio e Injaí (2013), revisitando o contínuo proposto por Couto e Embaló
(2010), ampliam essa proposta inserindo o português falado no Brasil a partir de suas
variedades: a vernacular (PVB) e a padrão (PB):
Por outro lado, Couto e Embaló (2010) apresentam uma série de peculiaridades do
PGB que o difere das demais variedades de português. Entre elas, a drástica divergência
rítmica da frase da variedade guineense de português em relação às variedades lusitana e
brasileira. De acordo com os autores, “[o] português guineense, isto é, o português acrioulado,
é falado com o ritmo do crioulo que, por sua vez provém do ritmo das línguas africanas”
(COUTO; EMBALÓ, 2010, p. 52). Entretanto, o compêndio dos referidos autores, dedicado
ao estudo da língua, literatura e cultura de Guiné-Bissau, não contempla maiores informações
a respeito da divergência rítmica entre as variedades de português mencionadas, detendo-se a
concluir que há uma grande quantidade de especificidades no PGB que ainda aguarda um
estudo mais aprofundado. Assim, uma investigação acurada sobre o ritmo do PGB se faz
necessária.
Os trabalhos que versão sobre a morfologia de flexão verbal em Guiné-Bissau, como
atesta Romão (2012 apud SANTOS, 2015) apresentam os casos de ausência de concordância
verificados no PGB que têm sido atribuídos à transferência da língua materna dos falantes, a
saber: o crioulo guineenses cuja forma verbal carece dos morfemas número-pessoais e modo-
temporais.
Os exemplos (9), (10) e (11) pertence ao corpora de nossa pesquisa:
Nas cidades, a língua que se ouve nas ruas é quase sempre o crioulo,
em também só se fala crioulo, com poucas exceções. Assim, nos
bairros populares, onde se concentram falantes de uma mesma etnia,
2
Numeração adotada na organização do corpus da pesquisa.
63
Para Couto e Embaló (2010) e Fonseca (2012) o português é visto como idioma de
prestígio associado à elite, a pessoas com certo grau de instrução ou que vivem no exterior,
Além disso, com o desenvolvimentos das relações internacionais do país, tem havido uma
intensificação por parte dos membros do PALOP, por meio de programas de cooperação para
lusofonia, a título de exemplo podemos citar o caso da UNILAB, com isso o idioma tem
recebido mais destaque. De forma geral, os guineenses consideram o acesso ao português
como uma forma de garantia de ascensão social e de desenvolvimento para o país.
Por fim, há de considerar que a investigação científica a respeito das variedades do
português africano como um fenômeno pós-colonial que se encontra em expansão nos centros
universitários devido a uma conjuntura favoravelmente presente nas últimas décadas. Com o
fim dos conflitos armados, o Português Europeu como língua oficial possuía status de língua
privilegiada. Apesar desse período conturbado, a estabilidade encontrada continua
favorecendo o português como principal língua da educação, da administração, dos meios de
comunicação e da ascensão socioeconômica, ou seja, “a língua alta” (HAGEMEIJER, 2017).
No entanto, após levantamento criterioso da revisão bibliográfica, constamos ausência de
estudos sobre o Parâmetro do Sjeito Nulo (PSN) no PGB, tanto em amostra de falas
expontâneas, como em dados de escrita. Por isso urge a demanda para trabalhos que possam
documentar e investigar a evolução do PSN na variedade africana do português guineense, de
modo a contribui para debates sobre a relevância do PGB ampliando o seu continuum
linguístico. Para que possamos completar o ciclo que começa e termina naqueles falantes
anônimos que são a legítima fonte do conhecimento produzido.
De acordo com dados linguísticos (RGPH 1981; 1991; 2001), o português é falado
por mais de 95% na ilha de São Tomé, sendo usada como L1 por mais de 50% da população
em detrimento do santomé, língua crioula dessa ilha.
Ademais, Gonçalves (2010), apresentando os dados do Instituto Nacional de
Estatística de São Tomé e Príncipe, comenta que, apesar de ser o menor país da África, com
uma extensão territorial de cerca de 17 km² e um reduzido número de apenas 151.912
64
habitantes, as ilhas que formam o arquipélago de São Tomé e Príncipe possuem uma ampla
diversidade linguística. Além da língua oficial, o português, são igualmente faladas três
línguas crioulas autóctones, aparentadas: o Santome – forro ou santomense - (língua de São
Tomé); o Angolar (língua dos Angolares), e o Lung‘ie (língua da ilha), falado na ilha do
Príncipe. Conforme destaca Hagemeijer (2009, p. 02),
Após sua descoberta em meados do século XV, dois fatos históricos contribuíram
para a formação do atual quadro linguístico de São Tomé: o povoamento e o ciclo
do açúcar, no século XVI, e o ciclo do café e do cacau, nos séculos XIX e XX. Na
fase do povoamento, a sociedade são tomense começou a ser formada a partir dos
colonizadores portugueses e escravos africanos oriundos do antigo Reino de Benim,
a região do delta do Níger (atual Nigéria), onde se falava e se fala o Edo – uma
língua do grupo Edóide -, do Congo e de Angola, onde predominavam as línguas do
grupo Bantu.
[e]mbora seja, de fato, a escolaridade o fator que faz mudar as tendências relativas
ao fenômeno (variável da concordância verbal), está a maior ou menor utilização da
língua crioula. Só declararam que usam frequentemente o crioulo informantes que
67
português em contato com os crioulos autóctones, bem como a influência destes no português
(cf. AFONSO, 2008; LIMA AFONSO, 2009; D’APRESENTAÇÃO, 2013).
A presente pesquisa, portanto, tem como objetivo desenvolver uma análise
contrastiva entre variedades africanas do português, a saber: PA, PGB e PST, centrando a
atenção na natureza da morfologia de flexão verbal e suas possíveis implicações para o
Parâmetro do Sujeito Nulo (PSN), tomando por base textos escritos (em particular, redações)
produzidos por alunos africanos como requisito para seu ingresso na Universidade de
Integração Internacional da Lusofonia Brasileira (UNILAB), localizada em Redenção, no
Ceará.
Como a presente pesquisa versa sobre o parâmetro do sujeito nulo e a morfologia de
flexão verbal presentes em variedades africanas do português – PA, PGB e PST - torna
imprescindível nos debruçarmos em estudos sobre as variedades do PB e PE, já que a
literatura sobre tal temática ainda é escassa. Dessa forma, partimos desses paradigmas para
que possamos realizar uma análise pontual acerca dos constituintes gramaticais que compõem
a natureza de nosso objeto de estudo.
Ao tratar da concordância sujeito-verbo, a expressão “o oposto do avesso” traduz a
lendária assimetria entre o português europeu e o português brasileiro: neste, a concordância
verbal chegou aos limites da simplificação (DUARTE, 1993; LOPES; MACHADO, 2005);
naquele, mantém-se um conjunto de regras em causa categórica (GALVES, 1993, 2001;
DUARTE, 1993, 1995).
A partir de questões relacionadas à concordância verbal, no Português Brasileiro,
verificamos que tal questão pode ser relacionada a uma não flexão de morfologia verbal
presentes num paradigma pronominal já enfraquecido.
Diante do exposto, partimos do entendimento de Galves (1993) em que a flexão no
português do Brasil não apresenta a oposição 1ª, 2ª e 3ª pessoas, mas somente oposição
binária, pessoa x não pessoa, articulada a uma oposição singular x plural. A não oposição de
pessoas “[...] corresponde a uma concordância fraca morfologicamente (ausência de 2ª
pessoa) e semanticamente – possibilidade de interpretar a 3ª pessoa do singular como
indeterminada” (GALVES, 1993, p.395).
Somado a isso, Duarte, Kato e Barbosa (2001, p.406) também constataram a não
aplicação da regra de concordância no português europeu. As autoras afirmam que: “[...]
quanto à concordância com o argumento interno plural ou composto, o default nas receitas
portuguesas é usar concordância, mas encontraram-se casos sem concordância”.
69
Mas não é só no vernáculo brasileiro que a saliência fônica da desinência verbal afeta
positiva e negativamente a norma-padrão. Os resultados da análise da concordância verbal no
português arcaico, em um corpus constituído por documentos notariais do noroeste de
Portugal e da região de Lisboa mostraram que “[...] as oposições mais salientes não deixaram
dúvidas quanto à posição dos notários em estabelecer a diferença entre singular e plural, [mas]
o mesmo não se pode afirmar quando se trata de contextos menos salientes”. (SOUZA, 2007,
p.08).
Apesar de o português europeu não padrão também exibir para a concordância
sujeito e verbo alguma variação, as imagens da “variedade de além-mar” estão vinculadas a
uma língua de concordância forte (CARRILHO, 2007; GALVES, 1993, 2001). O predomínio
da opção pelo sujeito nulo atesta que o português europeu ainda mantém uma morfologia
verbal rica (DUARTE, 1995).
É consensual que a concordância entre o sujeito e o verbo em frases finitas é uma
relação fundamental no português europeu e que a variação (excluídos os casos de
concordância lógica e as construções com sujeitos complexos ou coordenados) está
circunscrita a contextos em que o constituinte (sujeito) se encontra em posição pós-verbal,
“[...] variação que não enfraquece a uniformidade da relação de concordância”.(CARRILHO,
2007, p.02).
Investiga-se, a partir do corpus adotado, o comportamento dos sujeitos nulos,
tomando por base se sua distribuição ocorre nos mesmos contextos verificados no Português
Europeu (PE). Para tanto, será analisado o paradigma pronominal nominativo e de flexão
verbal nesses dados, levando em conta os padrões de concordância encontrados em cada
variedade. Por conseguinte, será possível verificar o tipo de sistema de sujeito nulo, tomando
por base a proposta de Roberts e Holmberg (2009), tomando por base o modelo de Princípios
e Parâmetros (CHOMSKY, 1981, 1986 e seguintes). A partir desse modelo, assume-se que a
Gramática Universal (GU) é composta por um conjunto de propriedades gramaticais
compartilhadas por todas as línguas naturais (os princípios) e de parâmetros, cujos valores
(+/-) são definidos como opções dentro da própria GU e dão conta das diferenças entre as
línguas. A seleção de um desses valores, tomando por base o input, culminará na aquisição de
uma gramática nuclear (em outras palavras, de uma gramática internalizada) de determinada
língua que se distinguirá de outras gramáticas particulares.
Ao longo dos anos, diversas investigações têm centrado a atenção no PSN nas
línguas românicas, por exemplo. Os trabalhos de Gonçalves (1994) e Teixeira (2008) para o
PA, e os de Rizzi (1988) e Martins (2009) para o italiano, evidenciam que são línguas de
70
sujeito nulo consistente, ao passo que o PB, uma língua de sujeito nulo parcial
(HOLMBERG; NAYUDU; SHEEHAN 2009; KATO; DUARTE 2014), em virtude de seus
sujeitos nulos estarem submetidos a algumas restrições não observadas no PE Conforme
observam Kato e Duarte (2014, p. 8-10), além de outras restrições, sujeitos nulos em PB
ocorrem em sentenças encaixadas (cf. (15a)) e encontram-se em variação com sujeitos
pronominais (cf. (15b)):
(16) a. “eu vive p‟a Luanda // vim votar aqui [-] Kaxito // assim vou voltar já //
[…]” (ADRIANO, 2014, p. 225) (Angola)
b. . “tu passas e vê o lixo” (BACELAR DO NASCIMENTO et al., 2008, p. 382)
(Guiné- Bissau)
c. “É os meus pai que me deu essa ideia. [OSVALH1]” (FIGUEIREDO, 2010, p.
96) (São Tomé e Príncipe)
(17) “A República Popular de Angola cresceu muito em vários aspectos nos últimos tempos”.
[PA02M]
(18) “As riquezas do país devem ser distribuídas equitativamente para solucionar o impasse
da distribuição das riquezas pela transparência”. [PA44F]
(19) “O país enfrenta grande crise económica e cambial, cuja fonte desta mesma situação que
71
Não podemos deixar de citar o trabalho pioneiro de Almeida (2005), umas das
primeiras pesquisadoras a trabalhar com o fenômeno do PSN e a morfologia verbal na
perspectiva dos estudos contrastivos em variedades rurais. A autora traz uma análise de cunho
gerativista e varaicionista sobre o português popular em comunidades rurais da Bahia,
demonstrando com isso que o PB não se encontra esgotado, apesar de vários estudos
atestados. Quanto ao sujeito nulo, a autora pontuou questões pertinentes acerca das
características nessa variedade da língua ao compará-la com o trabalho de Duarte (1995), tais
como:
a) Na 3ª pessoa do singular, a preferência é pelo sujeito nulo, mesmo quando são
retiradas as coordenadas não-iniciais. Essa preferência é bem maior se o sujeito for
[- animado];
b) Plenos quase categórico na 2ª pessoa (do singular e do plural), talvez motivados,
entre outros aspectos, pelo processo de desambiguização entre 2ª e a 3ª pessoa;
c) Pequeno número de nulos de 1ª pessoa do singular, que sobem quando a
morfologia apresentada pelo verbo é especificada;
d) Nulos de 1ª pessoa do plural identificados pela concordância;
e) Nulos, com um percentual pequeno, de 1ª, 2ª e 3ª pessoas do plural quando há
descompasso entre os traços do sujeito e do verbo, o que demonstra que existe a
identificação da CV através de algum tipo de correferência com elementos de outra
oração;
f) resquícios de nulos em orações principais, completivas e relativas, nas quais o
referente está numa sentença mais alta e não na imediatamente precedente.
(ALMEIDA, 2005, p. 199)
A autora enfatiza quanto a análise da faixa etária que mostra uma estabilização do
fenômeno, pois há um equilíbrio nos percentuais de CVS usadas pelos mais velhos (29%) e
pelos mais jovens (35%), sugerindo o uso de uma mesma gramática. Isso se confirma pela
distribuição de sujeitos duplos, além da ordem VS que ocorre de forma similar pelas gerações
distintas, isto é, basicamente com verbos intransitivos. Acrescenta, ainda, que não parece
haver uma única forma de identificação da categoria vazia em posição de sujeito, como
atestado por outros estudos, aparentando identificação através da ligação da categoria vazia
com um elemento da sentença anterior ou do discurso com 90%. Em suma, tais constatações
72
3 QUADRO TEÓRICO-METODOLÓGICO
Uma das razões para estudar a linguagem (exatamente a razão gerativista) – e para
mim, pessoalmente, a mais premente delas – é a possibilidade instigante de ver a
linguagem como um “espelho do espírito”, como diz a expressão tradicional.
(CHOMSKY, 1980, p.18)
Tendo como base a abordagem inatista da linguagem, a Teoria Gerativa proposta por
Chomsky (1981, 1986, entre outros) fundamenta-se na ideia de que existe um órgão
responsável pela linguagem na mente-cérebro do indivíduo, a saber: a Faculdade da
Linguagem (FL) que lhe permite não só produzir, mas também compreender sentenças numa
dada língua. Essa faculdade é definida como “uma componente particular da mente humana”
(CHOMSKY, 1986, p.22)
Na FL apresenta um dispositivo de aquisição da linguagem (denominado de
Gramática Universal, GU) através do qual a criança, quando exposta ao input (dados
linguísticos primários), é capaz de adquirir a gramática de uma língua particular, ou seja, a
competência linguística, objeto de estudo da Teoria Gerativa. Essa competência também
entendida como a língua-I(nterna) distingue-se da língua-E(xterna): aquela diz ao
conhecimento gramatical inconsciente adquirido pelo falante, ao passo que esta liga-se ao
desempenho, ou seja, ao uso que se faz desse conhecimento em diferentes contextos
comunicativos. Visando a compreender a língua-I, Chomsky (1986, p.23) formula três
questões centrais:
(i) O que constitui o conhecimento da língua? (NATUREZA)
(ii) Como é adquirido o conhecimento da língua? (ORIGEM)
(iii) Como é usado o conhecimento da língua? (USO)
todos os indivíduos, sendo os princípios as leis gerais válidas para todas as línguas naturais,
enquanto os parâmetros, as propriedades que diferenciam uma língua da outra (MIOTO et al,
2013).
O processo de aquisição da linguagem se dá por um processo de estímulo e resposta
obtendo-se como resultado reforço positivo ou negativo, sendo a linguagem considerada fator
externo ao indivíduo. Esta concepção baseia-se na ideia de que a criança herda a capacidade
de pronunciar e de repetir sons vocais a partir dos diferentes estímulos que recebe de seu meio
linguístico (CHOMSKY, 1986). Dessa forma, o input é necessário para pôr em marcha o
processo de aquisição de uma língua.
Chomsky utiliza uma metáfora já antiga, porém bastante bonita: se você plantar uma
margarida, é preciso que ela receba água e sol e que a terra tenha nutrientes suficientes para
que ela se desenvolva; no entanto o que que vai nascer ali, de acordo com o código genético
da semente que você plantou, é uma margarida, não uma rosa. Não adianta você tratar a muda
de margarida como se fosse de rosa (regando com água bem fria, por exemplo), pois isso não
vai fazer com que nasça ali uma rosa. Sem as condições mínimas, não vai nascer nada ali; mas
se nascer, pode apostar que é margarida! Ou seja, não é porque a linguagem é inata que ela
vai se desenvolver e se tornar uma margarida, assim também a linguagem precisa de um input
para se desenvolver na criança. Apenas a parte inata não é suficiente. Ela é a condição
necessária, mas não suficiente para que a aquisição ocorra (GROLLA & FIGUEIREDO
SILVA, 2014). Em suma, Chomsky é contrário ao pensamento behaviorista no sentido de que
não se adquire uma língua por estímulo-resposta, pois a linguagem humana é constituída de
uma propriedade fundamental: a criatividade.
Ademais, como descrito por Pietta e Casagrande (2016), para uma abordagem como a
gerativista, então, o que todos esses aspectos relativos ao conhecimento que a criança tem
sobre a linguagem e os aspectos que envolvem o processo de aquisição (sua rapidez, sua
uniformidade, sua universalidade) é o fato de que toda criança nasce com uma capacidade
para adquirir uma língua (parte do conhecimento linguístico é geneticamente determinada).
Centrando nossa atenção neste momento nos parâmetros da GU, é proposto pelo
Princípio do Subconjunto, segundo o qual o valor negativo de um parâmetro é um
subconjunto do valor positivo. Por exemplo, uma língua como o inglês que obriga seus
sujeitos serem realizados foneticamente (sujeitos plenos), marca negativamente o Parâmetro
do Sujeito Nulo [língua - pro-drop], enquanto uma língua que o marca positivamente [ língua
+ pro-drop], como o italiano e o espanhol, aceita duas realizações: o sujeito pode não ser
realizado foneticamente (sujeito nulo representado pela categoria vazia pro) ou pleno; neste
75
último caso, estão submetidos a restrições, tais como contextos de ênfase ou de foco
contrastivo (RAPOSO, 1992). Dessa distinção entre as línguas, é proposto o Parâmetro do
Sujeito Nulo (PSN).
Em outras palavras, todas as línguas obedecem a certos princípios universais e
constitutivos, mas elas podem variar com relação a alguns parâmetros; essa explicação dá
conta de maneira elegante, a um só tempo, dos aspectos linguísticos universais e da variação
entre as línguas.
Figura 1 – Princípio do Subconjunto
3
Formas verbais sem sujeito expresso são formas diplomáticas de tratamento, que permitem evitar
elegantemente a dificuldade social das formas nominais. Conhece-se este fenómeno pela expressão inglesa
prodrop, construção que deixa cair (drop) o pronome (pro), evitando assim ter de tomar decisões difíceis entre
uma panóplia de formas de tratamento» (Discursar em Português... e não só, Isabel Casanova. Lisboa: Plátano
Editora, 2011, pp. 82-83). A seguir, os exemplos: “Sabe onde fica a catedral? Quer vir comigo? Pode sair”.
76
(4) a. Ecco la ragazzai [chei mi domando [chi crede [che ___i possa SV]]]
b. This is the girl [who I wonder that [who thinks [that she may SV]]]
nulo] vs. Língua [-sujeito nulo], sendo exemplos prototípicos o italiano e o inglês,
respectivamente. Entretanto, Rizzi (1982, p.144) já alertava para o fato de o que se
considerava um único parâmetro da Gramática Universal (GU) deveria ser decomposto em
dois subparâmetros, representados numa hierarquia como em (6):
Apesar de autônomos, esses dois “subparâmetros” guardam entre sim uma relação
inerente. Caso uma língua responde positivamente à primeira propriedade, o mesmo ocorre
em relação à segunda; de outra maneira a resposta for ao contrário, no caso negativa, a
segunda propriedade não emerge (CYRINO e MORAIS, 2018).
Notamos em (7) que um parâmetro que distingue línguas que exibem sujeito nulo
(SN) de língua que não exibem sujeitos nulos (italiano vs. inglês, por exemplo). Por
conseguinte, outro que distingue entre as línguas que permitem sujeitos nulos referenciais e
não referenciais e aquelas que permitam apenas nulos não referenciais (italiano vs. Alemão,
por exemplo). Já se anunciavam aí pelo menos três tipos de línguas em relação ao PSN.
Conforme Rizzi (1988), em línguas como o italiano, a realização fonética do sujeito
se torna redundante, visto que a desinência já se encarrega da distinção entre as pessoas
verbais, o que ocasiona uma falta de necessidade do pronome. Por outro lado, sabe-se que no
78
inglês a realização fonética do pronome é fundamental para que se realize a distinção entre as
pessoas verbais, pois as desinências nesta língua não são suficientes para distingui-las, não
havendo, assim, um acúmulo de informações desnecessárias. Desse modo, segundo o autor,
numa língua como o italiano, o preenchimento do sujeito pronominal aconteceria somente
para expressar ênfase ou contraste, já que nesses casos não há outra opção senão o
preenchimento mesmo.
Observamos o seguinte paradigma do italiano extraído de Rizzi (1988, p. 4-5):
Ainda a partir de um dos trabalhos seminais sobre pronomes nulos, Rizzi (1986,
p.540), depreende-se que pro está sujeito às seguintes condições:
• Línguas que não permitem pro-drop - pro não é licenciado – Inglês, Francês;
b) dois tipos de pro expletivo são licenciados, mas pro referencial não é – Islandês;
79
Ainda sobre a proposta de Rizzi (1982), o autor pensa que a omissão do sujeito está
relacionada com a flexão verbal. Segundo ele, a flexão verbal das línguas de sujeito nulo pode
ter dois traços: [pronominal] e [referencial]. Línguas em que flexão verbal tem os traços
[+pronominal] e [+referencial] podem ter sujeito nulo nas frases finitas (línguas de sujeito
nulo românicas). Línguas que têm uma flexão verbal [-pronominal] e [-referencial] não
podem ter sujeito nulo (o inglês). Línguas que têm uma flexão [+pronominal] e [-referencial]
só podem ter sujeito nulo expletivo. Rizzi 1986 defende que pro tem de ser licenciado e
identificado. Segundo ele, nas línguas de pro-drop, a flexão e o V podem reger pro. Ademais,
pro está licenciado. Além disso, os traços-φ da flexão verbal vão recuperar pro como um
pronome definido. Por isso, pro está também identificado. Desta maneira, podemos ver que o
sujeito nulo está intimamente relacionado com a concordância verbal rica (RIZZI, 1982;1986)
Cheng-Teh James Huang explicita em seus pressupostos, com base nos dados da
língua chinesa, que a presença de argumentos nulos no chinês está diretamente atrelada a
outro parâmetro que diferencia línguas orientadas para a sentença e línguas orientadas para o
discurso, argumento ponderado em princípio pelos estudos apresentados por Tsao (1977).
Ainda sobre esse viés, Tavares Silva (2004), mencionando Cheng-Teh James Huang (1989, p.
187) observa, ao analisar uma frase como Zhangsan shuo [e hen xihuam Lisi]. (“Zhangsan
disse que (ele) gostou de Lizi”), a autora postula que o sujeito nulo da oração subordinada
representado por e pode referir-se ou ao sujeito da oração matriz Zhangsan, ou ainda, pode ser
80
controlado por este último sujeito que está numa posição mais alta na estrutura frásica, ou
pode referir-se a alguma outra pessoa cuja referência já é dada no domínio do discurso que
seria correspondente a um tópico do discurso.
Jaegli e Safir (1989), por sua vez, propõem que o sujeito nulo é licenciado pela
uniformidade morfológica dos paradigmas verbais. Sendo assim, tanto em línguas cujo
paradigma flexional do verbo apresenta formas compostas somente pelo radical do verbo
(chamadas pelos autores “não-derivadas”) quanto em línguas cujo paradigma exibe
desinências de tempo, modo, número e pessoa (“derivadas”), sujeitos nulos podem ser
produzidos. No primeiro caso, o sujeito é identificado pelo tópico do discurso (ex.: o chinês);
já no segundo, é identificado pela morfologia verbal (ex.: o italiano).
Revisitando a proposta de Jaeggli e Safir (1989) e Roberts (1993) argumenta que um
paradigma morfologicamente uniforme não é condição para o licenciamento e identificação
do sujeito nulo. Um paradigma pode licenciar e identificar o sujeito nulo caso seja formal e
funcionalmente rico, no tocante à morfologia de flexão verbal. Para tanto, o paradigma deve
conter apenas uma forma zero e um sincretismo, como é o caso do português europeu:
No âmbito da teoria de Princípios e Parâmetros, concebe-se que o PE é uma língua
tipicamente de sujeito nulo, pois apresenta propriedades sintáticas de línguas pro-drop,
conforme indicam os exemplos a seguir:
No quadro 4 demonstra uma desinência verbal de número e pessoa para cada pessoa
do discurso, nas três conjugações verbais, o que claramente denota o PE como uma língua
nitidamente de concordância forte. Portanto, é exatamente essa sua característica que nos
permite conferir ao PE o estatuto de língua de sujeito nulo, já que “o conteúdo do sujeito é
recuperável a partir do conteúdo morfológico das terminações verbais” (RAPOSO,1992,
p.478). Todavia, diferentemente do PE, pesquisas recentes da sociolinguística paramétrica
vêm mostrando que, a partir da segunda metade do século XIX, a concordância número-
pessoal no PB começa a enfraquecer-se, como é possível verificar no quadro abaixo de Duarte
(1993, p.109):
Como descrito por Tavares Silva (2004), a proposta de Charlotte Galves (2001) parte
da concepção postulada por Roberts (1993), na qual o autor estabelece distinção entre a
riqueza da forma e funcional de AGR4. Assim, Galves (op. cit.) formula uma explicação
alternativa para caracterizar essa riqueza, implementando a proposta de Roberts quanto “a
existência de duas noções de pessoa na Gramática Universal: pessoa semântica e pessoa
sintática” (GALVES, 2001, p. 104).
Dessa forma, vale salientar que Tavares Silva (2004) nos alerta sobre a posição
assumida pela proposta da autora que afirma ser na gramática de uma língua particular em que
há pessoa semântica quando para cada pessoa do discurso há um morfema que a especifique
gramaticalmente ou no singular ou no plural, na proporção que que a existência da pessoa
sintática decorre do fato de ser só possível estabelecer combinação entre trações binários
relativos à pessoa e ao número que serão marcados positivos e negativos (TAVARES SILVA,
p.245-246). Conforme apresentado em (18):
Portanto, em sua análise, Galves (op. Cit.) não estabelece distinção entre PB1 e PB2.
O paradigma analisado pela autora assemelha-se ao paradigma de PB1 analisado nesta
dissertação, a única distinção reside no fato de a autora não incluir a forma pronominal a
gente neste paradigma de flexão verbal.
[-pessoa, -número] –a
4
Abreviação do inglês “agreement”, remete a concordância.
85
[-pessoa, +número] – m
[-pessoa, -número]
5
Embora na Teoria se considere que, quando um parâmetro tem uma dada marcação, outros parâmetros são
marcados em conseqüência, ou seja, dificilmente uma língua terá apenas um parâmetro diferente de outra.
87
6
Tudo aquilo que a criança ouve, no caso de línguas orais faladas, ou vê, no caso de línguas de sinais. Mais
especificamente, são os dados linguísticos produzidos no ambiente em que a criança vive, dirigidos ou não a ela.
89
órgãos – é algo que acontece a uma criança, e não o que a criança efetivamente faz”
(CHOMSKY, 2005, p.35). Não haveria realmente uma diferença entre as línguas, ou seja, há
uma base, uma gramática universal que é ativada segundo a geografia a qual pertencemos. Por
exemplo, ao nascer no Brasil, a criança consequentemente ativará os princípios, ou, nas
palavras de Chomsky (2005), “interruptores” da língua portuguesa, ao mesmo tempo em que,
supõe-se que, se a mesma criança tivera nascido na Itália, ela acionaria o sistema linguístico
italiano. Assim sendo, “as linguagens são produtos do mesmo molde, variação de um mesmo
tema [...] com diferenças apenas marginais” (CHOMSKY, 2005, p. 35).
Segundo Kail (2013), os estudos comparativos entre as línguas, especialmente
reformuladas pelas contribuições da tipologia (WATSON, 10191; PALOV, 1927; SKINER,
1957; CHOMSKY, 1957, 1981, 1986; PIAGET, 1959; LEMOS, 1982; KAPLAN, 1985;
AUGUSTO, 1995; GROLLA, 2006; QUADROS & FINGER, 2007), constituem um
instrumento indispensável para a determinação da natureza e das restrições específicas
impostas pelas línguas ao processo de aquisição da linguagem.
Para diversos autores a conceituação de Língua Materna ou L1, Língua Estrangeira ou
L2 nos aparenta uma certa obviedade. No entanto, quando se trata da aplicação de tais
conceitos se faz necessária à compreensão distinta desses termos:
A Língua Materna ou a Primeira Língua (L1) não é, necessariamente, a língua da mãe,
nem a primeira língua que se aprende. Normalmente, é a língua que aprendemos primeiro e
em casa através do pais, e também é frequentemente a língua da comunidade. Entretanto,
muitos outros aspectos linguísticos e não-linguísticos estão ligados à definição. A língua dos
pais pode não ser a língua da comunidade, e, ao aprender as duas, o indivíduo passa a ter mais
de uma L1 (caso de bilinguismo). Uma criança pode, portanto, adquirir uma língua que não é
falada em casa, e ambas valem como L1(SPINASSÉ, 2006).
Sapinassé (2006, p.04) considera importante “a justaposição do conceito de LM com o
ator identitário. O autor explica que a aquisição da LM não implica apenas o desenvolvimento
de competências linguísticas mas igualmente de valores pessoais e sociais”. Também
Spinassé adverte que a LM não é necessariamente a língua da mãe ou primeira língua que se
aprende, sendo muitos os aspetos linguísticos e não linguísticos ligados ao conceito. O autor
acaba por sintetizar os critérios que definem LM:
De uma forma geral, contudo, a caracterização de uma Língua Materna como tal só
se dá se combinarmos vários fatores e todos eles forem levados em consideração: a
língua da mãe, a língua do pai, a língua dos outros familiares, a língua da
comunidade, a língua adquirida por primeiro, a língua com a qual se estabelece uma
relação afetiva, a língua do dia-a-dia, a língua predominante na sociedade, a de
90
melhor status para o indivíduo, a que ele melhor domina, língua com a qual ele se
sente mais à vontade [...] Todos esses são aspetos decisivos para definir uma L1
como tal. (SAPINASSÉ, 2006, p. 05)
No que se refere à segunda língua (L2) e à língua estrangeira (LE), Littlewood (1999,
p. 02) observa que “a segunda língua tem uma função social dentro da comunidade onde ela é
aprendida, e a língua estrangeira é aprendida primeiramente para um contato fora da própria
comunidade”. Nesse sentido, ele discorre sobre esses conceitos:
a) língua estrangeira (LE): é o termo usado por alguns pesquisadores para a
aprendizagem de outra língua que não é falada geralmente fora da sala de aula, ou seja, não é
falada no país onde se estuda essa língua (ex.: a língua inglesa ensinada no Brasil);
b) segunda língua (L2): pode se referir à aquisição da língua que é falada no país por
um estudante estrangeiro ou se referir a uma segunda ou terceira língua que coexiste com
outra língua também nativa do mesmo país. Em Moçambique, por exemplo, as línguas bantu
em geral são a L1 e o português, a L2.
No âmbito da L2, a palavra “aquisição” é muitas vezes compreendida
equivocadamente como “aprendizagem”, chegando a ser empregada como sinônimo.
Conforme Lawler e Selinker (1971), Corder (1967) e Krashen (1981), a diferença entre
aquisição e aprendizagem reside no fato de, na primeira, estarem ativados mecanismos
cognitivos automáticos, possibilitando um processo rápido, espontâneo e subconsciente,
enquanto, na segunda, estão ativados mecanismos de resolução de problemas, sendo um
processo consciente. Sim-Sim (1998, p. 28) argumenta que “[...] ao falarmos da aquisição da
linguagem estamos a referir-nos ao processo de apropriação subconsciente de um sistema
linguístico, via exposição, sem que para tal seja necessário um mecanismo formal de ensino,
que cabe à aprendizagem.”.
Em sua proposta, Krashen (1981) levanta alguns aspectos para explicar a dicotomia
aquisição versus aprendizagem:
ordem de aquisição para a L1, ou seja, na aquisição de L2, a ordem natural é diferente
da observada na aquisição da mesma língua por falantes nativos.
A hipótese do input: a produção oral, a fluência na fala é algo que não pode ser
ensinado. O indivíduo deve estar preparado, apto para falar; e esta aptidão varia de
indivíduo para indivíduo. Ou o indivíduo se sente apto para falar ou irá repetir
mecanicamente frases e expressões que lhe são apresentadas, sem se comunicar. Nos
primeiros estágios, a incorreção estará presente, porém, quanto maior e mais adequado
for o input fornecido ao indivíduo, melhor sua produção linguística.
A hipótese do monitor: a aquisição e a aprendizagem são usadas de maneiras bem
específicas. Normalmente, a aquisição faz com que o indivíduo se comunique de
maneira espontânea. Por outro lado, a aprendizagem tem uma função, monitor ou
editor. Essa hipótese afirma que a aprendizagem formal não tem efeito sobre a
aquisição a não ser pelo fato de servir como um fiscal, um monitor de produção
linguística do indivíduo, levando-o a se corrigir sempre que achar necessário para
conseguir o máximo de correção possível.
Filtro afetivo: é um bloqueio mental que impede os indivíduos de utilizarem
totalmente o input compreensível que eles recebem para a aquisição da língua. Ele
será alto se os indivíduos estiverem desmotivados e não tiverem autoconfiança, ou se
estiverem ansiosos, vale salientar que isso diz respeito à L2. Nesse caso, o input
recebido não penetrará no dispositivo da aquisição da língua.
uma boa pronúncia ou com o desenvolvimento lexical. Alguns podem ter por objetivo serem
confundidos com um nativo. Outros orgulham-se de se mostrarem estrangeiros.
5. Fossilização - Este é um fenômeno típico da aprendizagem de língua estrangeira
na fase adulta. É sabido que aprendizes adultos atingem um determinado grau de
desenvolvimento na L2 – bem inferior ao nível atingido pelo nativo - e depois permanecem
estáveis neste nível, sem prosseguir no desenvolvimento da aprendizagem da língua.
6. Intuições indeterminadas - Vários estudos demonstram que mesmo os mais
competentes aprendizes de L2 não conseguem fazer julgamentos de gramaticalidade com
clareza. Este caráter opaco das intuições sobre gramaticalidade entre falantes não nativos foi
chamado de indeterminado (BLEY-VROMAN, 1989, p.47).
7. Importância da instrução Crianças em fase de desenvolvimento da linguagem não
necessitam de instrução formal para aprender sua língua. No entanto, há consenso quanto à
influência positiva da instrução formal na aprendizagem de L2 entre adultos.
8. Papel dos fatores afetivos O sucesso da aprendizagem da língua materna entre
crianças parece não ser afetado por fatores como personalidade, socialização, motivação e
atitude. A aprendizagem de uma língua estrangeira por adultos, pelo contrário, parece ser
altamente influenciada por tais fatores, ditos afetivos.
Vale ressaltar que, para o fenômeno da interlíngua, que se caracteriza pela
interferência da LM, as formas da LM inevitavelmente aparecem nas variedades usadas pelo
aprendiz. A ocorrência e a persistência de interlíngua são significativamente maiores em
adultos do que em crianças. Como aponta Harpaz (2003), aquele que aprende uma segunda
língua, além de ter que executar sequências de operações mentais (estruturar a ideia) e
motoras (articular sons) novas, precisa também evitar os velhos usos da língua materna. As
operações relativas à língua mãe estão profundamente enraizadas pela prática constante,
sendo por isso muito difícil de ser evitada. Por esta razão, adultos aprendizes de línguas
estrangeiras acham muito difícil não cair nas formas da LM, tanto nas operações motoras de
pronúncia quanto nas operações mentais de estruturação das ideias em frases. Para uma
criança, esse problema é muito menor porque seus hábitos linguísticos não se encontram tão
desenvolvidos e enraizados.
No que se refere à aquisição da LM no âmbito da Teoria Gerativa, a GU não seria
“aprendível”, pois essa aquisição não é algo que as crianças façam conscientemente, mas que
lhes acontece (POLLOCK, 1997). No tocante ao input, portanto, é essencial que no input haja
informações que sirvam de “gatilho” para que essas crianças fixem os valores paramétricos de
sua L1.
95
Em síntese, Chomsky (op. cit.) postula que o verdadeiro objeto de estudo da teoria
gramatical deve ser a língua-I, aquela que está internalizada pelo falante e que subjaz a toda
produção linguística dele; a língua-E (que é afinal o que é o português, o inglês ou turco) são
manifestações sociais, quando muito, da língua- I e não possuem o mesmo estatuto teórico. O
input é da ordem da língua-E, porém o que a criança está desenvolvendo dentro de si é a
língua-I. Assim sendo, não é esperada nenhuma relação muito estreita entre input e aquisição.
Portanto, cabe à criança, no período da aquisição, a tarefa de fixar os parâmetros da
gramática- núcleo de sua língua materna, a partir da exposição aos dados do “input”
linguístico, conhecidos como Dados linguísticos primário. Nesses termos, a tarefa do linguista
consiste em identificar os princípios invariáveis da gramática universal, ao lado dos princípios
abertos a uma fixação paramétrica. Como definir os parâmetros de variação sintática? Parte-se
da ideia de que eles estejam restritos a dois valores: um positivo e outro negativo. Todavia,
dada a sua natureza altamente abstrata, a fixação de um ou outro valor cria efeitos gramaticais
que atingem as diversas áreas da gramática, levando às diferenças que as línguas apresentam.
O input é suficientemente robusto para permitir a interferência não-ambígua de
informações linguísticas. Isto permitiria à criança chegar à Língua-I alvo através de
estratégias indutivas, baseadas em mecanismos de aprendizagem gerais, tal como ocorre
talvez, na aprendizagem de Matemática. É interessante observar que, mesmo nesta
perspectiva indutiva, somos obrigados a admitir que haja algo particular biologicamente
distinto em relação aos humanos, dado não termos indivíduos de outras espécies capazes de
aprender Matemática. (FARIA, 2008, p. 173).
Nessa linha, Goodluck (1991) afirma que um dos fatos que sustenta este caráter
biológico e inato é a constatação de propriedades exibidas no desenvolvimento da linguagem,
que seriam semelhantes às vistas em comportamentos biologicamente dados. Três exemplos
seriam: (1) haveria uma progressão ordenada de estágios, semelhante ao que ocorre com a
capacidade de andar do homem e a de voar do pássaro; (2) haveria um período crítico, após o
qual a aquisição seria extremamente prejudicada (normalmente, a dificuldade para aquisição
98
de uma segunda língua aumenta com a idade), e; (3) o desenvolvimento seria, em certo grau,
independente de estímulos externos, como se fosse programado biologicamente. Porém, ainda
assim, a criança deve ser exposta à língua, para ter um desenvolvimento normal.
Para retomar essa concepção de fixar parâmetros da gramática-núcleo, utilizaremos
uma metáfora de autoria da professora Drª Ruth E. Vasconcellos Lopes, escrita em sua tese
em 1999:
O problema com que a criança se defronta para fixar o valor de um parâmetro é
similar ao que nós temos quando compramos um aparelho eletroeletrônico (um
secador de cabelo ou um micro-ondas) e vamos liga-lo na tomada. Normalmente
tem uma chavinha no aparelho: de um lado dela está escrito “220V”, do outro está
escrito “110V”. Pode ser que a chavinha venha posicionada no meio, isto é, nenhum
dos dois valores está acionado, mas daí se a gente ligar não acontece nada, o
aparelho não funciona. Temos então que escolher uma das duas opções para poder
usar o aparelho. Qual é a voltagem na sua região? Alguém que mora na região é que
deve informar isso a você, porque só olhando para tomada você não vai saber. Se na
sua região a voltagem é 220V, escolhendo a posição 110V seguramente você vai
queimar o aparelho (o caso contrário, isto é, ligar 220V na tomada 110V talvez não
estrague o aparelho, mas é provável que ele simplesmente não funcione) (LOPES,
1999, p. 20).
com os dados linguísticos primários; gerando, dessa forma, uma língua – I a partir de dados
da língua-E.
Kato (1999, p.06), ao estudar o conceito de parâmetros, afirma que tal conceito foi
introduzido para responder ao problema lógico da aquisição, contudo considera que a variação
entre as línguas é uma função do léxico nos leva à estaca inicial, já que as línguas, nesse caso
poderiam variar de forma infinita e as crianças teria um espaço finito pata definirem sua
gramática. Em outras palavras todas as línguas obedecem a certos princípios universais e
constitutivos, mas elas podem variar com relação a alguns parâmetros; essa explicação dá
conta de maneira elegante, a um só tempo, dos aspectos linguísticas universais e da variação
entre as línguas. Daí decorre a assunção de que uma criança é capaz de adquirir qualquer
língua natural a que estiver exposta durante os seus primeiros anos de vida.
Há de se considerar que partindo da concepção de que todas as frases,
indistintamente da língua, requerem um sujeito, contudo esse sujeito não necessariamente tem
que estar explicito, sendo esse parâmetro ou valor que deve ser fixado. A criança, dependendo
do sistema linguístico em que se encontra, decidirá se o sujeito deve ou não constar
obrigatoriamente na frase realizada.
Entretanto, muitas perguntas sobre a problemática dos parâmetros ainda esperam por
uma explicação, tais como: quantos são os valores dos parâmetros? no estado inicial da GU,
um dado parâmetro já tem uma marcação especifica ou não tem marcação alguma? é possível
haver reparametrização? o que desencadearia a parametrização? (SANTOS, 2002)
Buscando desvendar como se dá à atribuição dos valores aos parâmetros temos três
hipóteses que se propõem da conta de tal questão. A primeira afirma que no começo do
processo os parâmetros não estão completamente presentes e só com o prosseguimento da
aquisição da linguagem é que esses surgem, crendo também que os mesmos são organizados
geneticamente, de modo a ocorrerem em determinadas etapas do amadurecimento do
indivíduo, cujos fatores motivadores de tal processo são responsáveis pela transcrição da
gramática universal para a gramática da língua nativa.
A segunda hipótese divide-se em duas perspectivas, a da competência plena/total o
entendimento que se teve é que todos os princípios estão presentes no começo do processo,
caso não ocorra à delimitação logo, o motivo pode ser um problema de memória, por
exemplo, na referida delimitação. Já a hipótese de aprendizagem lexical explica, segundo
Pinker (1984), que os princípios estejam completamente presentes, a evolução sintática
depende da interiorização de partes morfológicas e lexicais novas, o que pressupõe a interação
com o meio que rodeia o indivíduo.
100
também nessa língua, a distinção [+/-] tempo se dê após a aquisição de concordância sujeito-
verbo.
Além disso, como vimos anteriormente, não há como retroceder, a partir de dados
positivos, em gramáticas super-especificadas. Embora Lebeaux (1987) trabalhe com a
hipótese maturacionista, um modelo de aprendizagem também cabe na hipótese continuísta,
que passamos a discutir.
Já a hipótese continuísta parte do pressuposto basilar de que “as regras gramaticais as
crianças devem ser extraídas dos mesmos tipos básicos de regras compostos de símbolos
primitivos da mesma classe, como as regras atribuídas aos adultos (PINKER, 1984, p.7, apud
MEISEL, 1997, p.23).
Dessa forma, a hipótese da continuidade admite duas versões: a hipótese forte e a
fraca. De acordo com a primeira, desde o início do desenvolvimento prevê-se que todos os
princípios da GU estão à disposição da criança e que as estruturas de sua gramática, em todos
os estágios, pertencem apenas às estruturas da língua-alvo7, isto é, a representação da criança
não viola nem os princípios, nem os parâmetros do sistema alvo, contudo isso não implica ser
idêntica ao alvo. Esta concepção implica quase um conhecimento teleológico de Ss por parte
da criança adquirindo uma língua. Talvez por isso não tenha encontrado muitos adeptos.
Entretanto, não deixa de ser interessante por aproximar-se bastante da definição de Língua-I
como efetivamente individual, embora não se possa garantir, com ela, que a criança não esteja
implementando uma mudança não motivada no sistema. Algum tipo de restrição é necessário.
(LOPES, 1999, p. 68).
No dizer de Kato (1995, p.70) a visão dos continuístas, a aparente fase léxico-
temático oculta categorias funcionais, visíveis em certas regularidades na produção da
criança. Assim, no francês, o verbo sobe para categoria I (flexão) quando a sentença é finita e
permanece em VP quando o modo é infinitivo. A diferença da posição da negação seria uma
pista para dizer se há ou não a categoria I na gramática da criança. A alternância entre “pas
manger” e “mange pas” na fala da criança é indício da presença de I na estrutura.
Sendo assim, a hipótese da competência plena procura mostrar o quanto da gramática
do adulto já se verifica na gramática infantil desde os primeiros estágios. Seriam casos como
os apontados acima, mas não só. Há inúmeras evidências indiretas que asseguram a hipótese.
A despeito do aparente paradoxo, Lopes (1999) nos alerta que as hipóteses
continuístas parecem ser mais plausíveis como tentarei demonstrar rapidamente. Em primeiro
7
É passagem de uma segunda língua (lingua-fonte) para a primeira língua (língua-alvo).
103
Além disso, a rapidez e a criatividade com que ela constrói a sua gramática não
podem ser explicadas com base apenas no input a que tem acesso. Todas essas características
são, portanto, consistentes com a visão de que os mecanismos responsáveis pela construção de
gramáticas são inatos (XAVIER, 2006, p.02).
Em aquisição de L2, os aprendizes se deparam com uma tarefa similar a das crianças
aprendendo sua L1, a saber, a necessidade de chegar a um sistema gramatical a partir do input
104
de uma língua L. Sendo assim, os aprendizes têm diante de si, ao menos potencialmente, o
mesmo problema lógico de aquisição de L2. Contudo, os estudiosos de L2 defendem que há
propriedades complexas e sutis que são subdeterminadas pelo input de L2 (SCHWARTZ &
SPROUSE, 2000; WHITE, 1985, 1989 entre outros). Em outras palavras, o aparecimento de
propriedades abstratas, sobre as quais o aprendiz não recebeu instrução formal, pode ser um
indicativo de que há princípios da GU norteando ou restringindo as possíveis gramáticas de
L2, ou interlíngua.
Contudo, Bley-Vroman (1990) e Schachter (1990, 1988) postulam que os aprendizes
de L2 já têm uma forma de representação de língua, através da gramática da língua materna.
Sendo assim, talvez não haja problema de subdeterminação se aprendizes de L2 demonstram
algum tipo de conhecimento relevante, talvez eles estejam se pautando em conhecimento da
gramática de L1 ao invés de diretamente da GU.
Dessa forma, a melhor forma de investigar se princípios da GU estão em operação na
gramática de interlíngua é através de demonstração de conhecimento de estruturas sutis e
abstratas que não poderiam ter sido aprendidas somente através do input ordenado e evidência
negativa (tão características em L2) e que não vêm da gramática da L1. Subdeterminação,
então, diz respeito tanto ao input de L2 como à gramática de L1. Assim, faz sentido descartar
a possibilidade de desenvolvimento de L2 somente com base em instrução. Por esse motivo,
os pesquisadores de aquisição em L2 tentam identificar situações que envolvem pobreza de
estímulo de L2, em que a disponibilidade de input e o conhecimento gramatical existente não
dão conta de explicar a aquisição, a menos que se assuma que as gramáticas de interlíngua são
restringidas pela GU (SCHWARTZ & SPROUSE, 2000; WHITE,1989, 1990, 2003).
Em consonância com Hyams (1986), os estudos Ellis (2003) consideram a gramática
da interlíngua como espécie de refixação de parâmetros que na L2 têm um valor diferente dos
da L1. White (2003) ainda destaca a necessidade de observar aos que consideram as
gramáticas de interlíngua como gramáticas “selvagens”, em virtude que, conforme esta
autora, nelas a parecem manifestação de um conhecimento abstrato, sutil e complexo da L2.
Para White (1985; 1986), a pesquisa está calcada nos resultados de pesquisas
realizadas com falantes do francês e do espanhol que aprendiam inglês, verificou que no
processo de aquisição/ aprendizagem de uma L2 os falantes costumam transferir os valores
paramétricos da L1. O objetivo da mencionada pesquisa era o de verificar se, em relação aos
mecanismos de preenchimento do sujeito, os falantes do espanhol, língua de sujeito nulo, e os
falantes do francês, língua de sujeito pleno, apresentavam o mesmo comportamento. Os
resultados demonstraram que ao menos nas fases iniciais do processo, os falantes do espanhol
105
[...] deve ter se configurado com enorme grau de variabilidade, com diferentes
possibilidades de interlíngua, assim como também com diferentes níveis de uso e
especialização comunicativa. É possível que além das óbvias marcas lexicais
contribuídas ao português, provenientes desses dois grupos linguísticos tenham
ficado traços sintáticos, semântico e fonológicos desenvolvidos ao longo do
contínuo interlinguístico.
L2, como no caso de Guiné Bissau e Santomé; como também L1 no que se refere à Angola,
temos de levar em conta o processo de aquisição dessa L2 e a sua relação com a língua
materna desses falantes. Não podemos esquecer de que estamos falando de pessoas adultas,
que já passaram pelo processo de aquisição inicial de língua materna e que, agora, encontram-
se em um processo diferente, o de atrito linguístico, por estarem imersas em um contexto
linguístico diferente, em que a L2 é predominante em relação a L1, sendo submetidas a inputs
de uma língua diferente de sua língua materna e por terem pouco contato com a L1 em relação
à L2
Ademais, nossa pesquisa está focada na investigação do atrito de L1 em um ambiente
de L2. Buscamos identificar as interferências que, na nossa investigação sobre o parâmetro do
sujeito nulo nas variedades africanas do português angolano, guineense e santomense, nada
mais é do que uma consequência do atrito, do contato linguístico, que tem como consequência
a ampliação paramétrica.
[…] a metodologia é uma condição necessária para que o trabalho científico tenha
rumo, direção e que possa ser analisado de uma forma crítica por outros
pesquisadores. Sendo um conjunto de passos a percorrer e dos meios que conduzem
aos resultados, é assim o modo como se organiza um trabalho em função dos
objetivos que se pretendem atingir, isto é, um processo racional para se chegar ao
conhecimento ou à demonstração da verdade e onde a sua ordem de assuntos tenha
uma sequência lógica. (REIS, 2010, p.57)
8
Variável é a característica de interesse que é medida em cada elemento da amostra ou população. Como o nome
diz, seus valores variam de elemento para elemento. As variáveis podem ter valores numéricos ou não
numéricos.
107
Quadro 9 – Temas propostos para as redações aplicadas em Guiné Bissau (2013 – 2016)
Ano Temas
2013 A língua portuguesa na Guiné Bissau
2014 Independência da Guiné Bissau
2015 O crioulo na Guiné Bissau
2016 A violência na Guiné Bissau
Fonte: A autora desta pesquisa.
Quadro 10 – Temas propostos para as redações aplicadas em São Tomé e Príncipe (2013 –
2016)
Ano Temas
2013 O Turismo em São Tomé e Príncipe
2014 Estudar no Brasil
2015 O pós-independência de São Tomé e Príncipe
2016 A violência doméstica em São Tomé e Príncipe
Fonte: A autora desta pesquisa.
Enquanto pesquisa que envolve a utilização de dados escritos9, sem contato direto
com os informantes, pode ocorrer um possível vazamento das informações e/ou
extraviamento dos textos. No entanto, foram tomadas todas as medidas cautelares conforme
orientação do manual do pesquisador do Conselho de Ética - UFPE, já que haverá sigilo
quanto à identificação das redações, estando todas armazenadas em pastas de arquivo em
computador pessoal sob a responsabilidade da pesquisadora.
Os corpora da pesquisa são compostos por 300 redações dos vestibularesda presença
versus ausência de sujeitos nulos em contextos frásicos finitos, visando a uma análise
linguístico-quantitativa. No total, do corpus extraído de 100 redações da variedade africana do
PA, sendo 50 de sexo masculino e 50 do sexo feminino, perfazendo um total de 3.753
ocorrências, sendo 51,3% de sujeitos nulos e 48,7% de sujeitos plenos11 (sujeitos expresso
equivale a 37% na posição posposta e 80% posição anteposta ao verbo). Já no PGB obtivemos
um total 2.875 ocorrências, sendo 49,1% de sujeitos nulos e 51, 9% de sujeitos plenos.
Quanto à São Tomé e Príncipe, constatou-se 4.164 ocorrências distribuídas em 43,5% em
sujeitos nulos e 56,5% sujeitos plenos. Observamos que os dados extraídos com sujeitos nulos
e plenos nas três variedades não-europeias analisadas:
1. PGB
a) sujeito nulo:
b) sujeito pleno:
(23) “Eu vejo a língua portuguesa pouco falada pelos guineenses” [PGB30F]
9
“O interesse pela língua escrita de séculos passados é um corolário natural da conjugação, implicada no
próprio paradigma sociolingüístico, entre sincronia e diacronia”.(PAIVA & SCHERRE, 1999, p. 208).
10
Corpus linguístico é o conjunto de textos escritos e registros orais em uma determinada língua e que serve
como base de análise. Corpora (plural de corpus).
11
Também chamado de sujeito explícito.
112
2. PST:
a)Sujeito nulo:
b) sujeito pleno:
3. PA:
a) sujeito nulo:
(26) “Nos últimos tempos têm enfrentado um período muito difícil com a baixa
do preço do barril no mercado internacional” [PA07M]
b) sujeito pleno:
Para análise empírica deste estudo, estipulamos as variáveis que que foram usadas para
codificarmos as incidências de sujeitos plenos e nulos. Dessa forma, a variável é binária,
sendo constituída pelas variantes presença de marca de plural (variante padrão) e ausência de
marca de plural (variante não padrão). Os exemplos de (28) a (33), levando em consideração
os dados extraídos do corpora.
113
Consideramos dados referentes aos três países com realidades linguísticas peculiares,
como também inseridos num pólo multilinguístico e multicultural. A análise da variação da
concordância P6 foi realizada em razão de haver uma expressiva quantidade de estudos
realizados com essa pessoa gramatical no PB, de modo que, por meio deste estudo, propomos
ampliar a discussão com resultados concernerntes ao PA, ao PST e ao PGB.
3.2.4 As variáveis
Ressaltamos que, com base em Duarte (1995) para analisarmos os dados a partir do
que já foi verificado sobre o PB, selecionamos as variáveis que foram usadas para
codificarmos as incidências de sujeitos plenos e nulos. Elaborados os corpora, foram
selecionadas as seguintes variáveis com seus respectivos fatores (que se encontram
antecedidos de um código necessário ao tratamento quantitativo):
A. Sujeito Nulo
O sujeito nulo não pronominal proposta de Duarte (1995) a partir dos estudos de
Figueiredo Silva 12(1994) - com base nas evidências da necessidade de um referente explícito
para a identificação do sujeito nulo referencial e da sensibilidade dessa categoria aos efeitos
das “ilhas” sintáticas, sua proposta leva em conta dois tipos de sujeito nulos: o tipo “variável”
e o do tipo “anafórico” (DUARTE, 1995, p.127). Quanto o caso dos primeiros, podem incidir
em setnenças raízes e em encaixadas (com o referente no contexto anterior). Os exemplos a
seguir (36) e (37) ilustram essa ocorrência:
Para Figueiredo Silva (Op. cit) o sujeito nulo do tipo “anafórico, para quem o nódulo de
AGR é nminal, devrá ser ligado como qualquer anáfora (uma categoria [+N] em posição A na
estrutura S). Este princípio explicaria a um só tempo a agramaticalidade de
12
FIGUEIREDO SILVA, M.C. A Posição do Sujeito no Português do Brasil: Frases Finitas e Infinitivas.
Campinas. Ed. Unicamp, 1996.
115
(39) a. A Maria, olha pro chão toda vez que CV fala com o José14.
b. A Maria não sabe se CV vai sair.
pois o Agr0 encaixado pode perfeitamente ocupar a posição vazia em CP e, de lá, alcançar o
Agr0 da raiz.
Vale salientarmos que os trabalhos de Duarte (1993, 1995) a respeito do preenchimento
da posição de sujeito em sentenças produzidas por brasileiros e portugueses, apresentam, em
termos quantitativos, que as frequências de sujeitos nulos são opostas nas duas variedades do
português: no PE, o índice gira em torno dos 70%, enquanto no PB, em 25%. Assim, segundo
a autora, a marcação positiva para o princípio “evite pronome” parece não estar mais em
funcionamento na gramática dos brasileiros. Devido o enfraquecimento do paradigma
flexional . Quanto aos estudos sobre as variedades africanas do português, espera-se encontrar
a ocorrência do fenômeno do sujeito nulo pronominal, sendo fenômeno comum em 3ª pessoas
gramaticais, de acordo com o PB. (cf. PISSURNO, 2017; SOUZA, 2010; SILVA, 2007;
DUARTE, 1995). A autora justifica, ainda, que trata-se de um tipo de categoria é facilmente
identificável tanto a partir de um referente externo, que levará o sujeito a ser referencial
especí, quanto na ausência do referente, levando a interpretação indeterminada. Assim, ao
trabalharmos com a morfologia de –número e –pessoa em contextos em que o sujeito é de 3ª
pessoa do singular e do plural, pois em contextos de referência semântica verificamos que o
número de nulos é maior (ALMEIDA, 2005)
C. Sujeito pleno
(40) a. “Um universitário deve ser consciente na escola do curso para seu contributo”. (PA)
b. A criação de parceria com a UNICEF formou profissionais capacitados no âmbito da
13
Figueiredo Silva (Op. cit.).
14
Figueiredo Silva (Op. cit.)
116
saúde” (PST)
c. “O país está a sofrer a queda no ensino básico” (PGB)
As línguas de sujeito pleno, como já diz o nome, são aquelas em que os falantes
necessitam obrigatoriamente preencher todos os sujeitos pronominais, independentemente das
condições em que apareçam ou do tipo de verbo que acompanha. Isso ocorre devido ao
paradigma flexional pouco diversificado que essas línguas possuem, o que impede a
identificação dos sujeitos através das desinências verbais. Observe-se este paradigma do
inglês:
Como é possível observar, o Inglês possui apenas duas formas para marcar a relação
entre o sujeito e o verbo, variando apenas na terceira pessoa do singular. Dessa forma, seria
impossível para o falante identificar em uma sentença como: “__ Love chocolate15” qual seria
15
O sujeito nulo é obrigatório no contexto de oração imperativa, como o PE e o italiano (cf.(i.a)) e (cf.(i.b)). Já
em línguas não pro-drop Gonçalves (1994) faz uma ressalva acerca dos casos em que há m acento enfático sobre
o sujeito (cf.( i.c)) e ((i.d)). Enquanto que no contexto de oração declarativa é agramatical.
“Fica quieto”
“Fica Tranquilo!”
“Fica quieto!”
e. Fica calmo!
o sujeito da sentença. Para ele, a sentença seria agramatical, já que, mesmo se, com algum
esforço o falante conseguisse compreender seu significado dentro de um contexto, ela não
faria parte da gramática de sua língua. Esse tipo de língua opõe-se, assim, às línguas de sujeito
nulo, especificamente, as que identificam o nulo através das desinências.
Linguísticas
1. Posição do sujeito
Cabe salientarmos que a posição do sujeito é obrigatória em orações finitas nas línguas
naturauis, sendo, sob a perspectiva da gramática gerativa, um princípio linguístico
presente em todas as línguas, ao contrário do que é enunciado nas gramáticas normativas
de que há oração sem sujeito, quando construída por verbos meterológicos e impessoais.
A. Sujeito pré-verbal
B. Sujeito pós-verbal16
(42) a. “Existe uma classe com distribuição per capita não equitativa”. (PA)
b. Somos nós vítimas de muitos agressores”. (PST)
2. Tipo de verbo
C. Verbo intransitivo17
16
Não houve ocorrência no PGB.
118
D. Verbo transitivo18
(44) a. “A exploração de petróleo tem o setor produção no próprio Estado”. (PA)
b. “O investimento aumentará o setor turístico com inovações na infraestrutura”.
(PST)
c. “A Guiné-Bissau precisa de Republica Federativa do Brasil para pedir ensino de
qualidade”. (PGB)
E. Verbo inacusativo19
(45) a. “O preço do Petróleo não caiu com a crise económica de Angola”. (PA)
b. “Todo agressor chega de repente”. (PST)
c. “O Português como língua materna realmente chegou”.( (PGB)
17
“Verbos intrasitivos são classificados pelo fato de possuírem sujeito profundo, ou seja, de selecionarem
argumento externo, e de não selecionar argumento interno” (CIRÍACO, 2004, p.01).
18
Os exemplos clássicos de verbos transitivos envolvem os verbos de ação usados na voz ativa. O agente ocupa
o especificador de SV e o paciente ocupa o complemento de V, como exemplificado em (ii).
(ii) Lá nós comemos um quindim por quinze cruzeiros também... (CYRINO et. all., 2006, p.09)
19
Verbos inacusativos têm apenas um argumento que possui propriedades de objeto e que, portanto, ocupa a
posição de argumento interno na estrutura profunda, embora possa ser alçado para a posição de sujeito, segundo
uma abordagem gerativista
20
Verbo que une o sujeito ao nome predicativo do sujeito” (ex.: a casa é grande; ele está cansado). = CÓPULA.
Acesso em: https://dicionario.priberam.org/verbo%20copulativo [consultado em 29-01-2019].
119
(PGB)
3. Tipo de oração
G. Oração encaixada
(47) a. “Alves da Rocha, que é diretor do CEIC, afirmaque Angola está a entrar num
perído de desaceleração estrutural”. (PA)
b. “Contudo podemos dizer que São Tomé foi e está sendo um país de guerriljheiros
para o bem estar de todos”. (PST)
c. “A situação da mulher que se agrava na Guiné é devido ao fracsso da educação na
família” (PGB)
H. Outras orações
(48) a. “Para que Angola supera esta crise é necessário vigilância do produto petrolífero”.
(PA)
b. “Todo aquele que bate por falta de controle do alccol”. (PST)
c. “Na verdade hoje na Guiné as populações preocupa mais da língua francesa por
causa do mercado guineense”. (PGB)
L. [+ duplicação]
(49) a. “A mulher de Angola ela ganhou o mercado econômico com a Língua
Portuguesa”. (PA)
b. “O santomense ele sabe o português para uma educação de melhoria”. (PST)
c. Não houve ocorrência. (PGB)
M. [- duplicação]
(50) a. “Angola desenvolveu bastante no grupo G20”. (PA)
b. “O turismo tornou-se importante para a economia santomente. (PST)
c. “O meio incentivo na área comercial da Guiné possa aderir a outros países”. (PGB)
(53) a. “Agora nós vamos olhar Angola como um país para viver e desenvolver”. (PA)
b. “Actualmente nós apostamos no turismo de muitas belezas naturais” (PST)
c. “Nós não devemos valorizar a outra língua estrageiraa não ser a do nosso país”.
(PGB)
T. Sujeito indeterminado
21
(sem ocorrências).
22
Não houve ocorrência no PA, PST e PGB da locução pronominal “a gente”.
23
(Sem ocorrências).
121
Com base nos estudos sobre a possibilidade de indeterminar o sujeito (cf. MIGUEL,
2006; CAVALCANTE, 1999; CUNHA, 1993; MILANEZ, 1982), muitas análises foram
empreendidas a partir do que seria a indeterminação do sujeito, e muitos foram os
esclarecimentos proporcionados. Porém poucas foram as alterações nas gramáticas
normativas: a possibilidade de pronomes como a gente, você, nós ou eles mostram a
indeterminação apenas em notas de rodapé, como se essas estratégias fossem menos legítimas
do que as estratégias padrão.
Em seu estudo no ano de 2006, sobre a indeterminação do sujeito, Miguel (2006) faz a
seguinte consideração:
Nesta categoria estão inseridos todos os tipos de Sujeitos subentendidos que são
comumente considerados nas descrições extraídas do corpora das variedades africanas
do português:
(56) a. Você24, numa visão mas ampla, fará o futuro de Angola com a Educação certa.
(PA)
b. Vocês25 esperam uma educação de Angola com independência e crescimento
de alfabetismo”. (PA)
Extralinguísticas
1. .Sexo/Gênero
Masculino
Feminino
24
“Você” é um pronome com referência de segunda pessoa, embora a especificação gramatical seja de terceira
pessoa. No exemplo extraído do corpus este uso de você é indeterminado. Portanto, vai ao encontro do que diz
Duarte (1995). Cabe salientar que não houve ocorrência do pronome “você” no corpora do PST e do PGB.
25
Ibidem 22
123
Quanto a São Tomé e Príncipe, conta com uma população estimada em cerca de
187.356 mil habitantes, segundo o último senso realizado pelo INE (2012). A população é
considerada bastante jovem, como na maioria dos países Africanos, sendo 44,7% da
população constituída por pessoas com idades compreendidas entre os 0 e os 14 anos de
idade, 52,2% da população são pessoas com idades compreendidas entre os 15 e os 64 anos
idades e apenas 3,2% da população correspondem a pessoas com mais de 65 anos e outros.
Estima-se que a força de trabalho é de 52 mil pessoas ativas. Somado a isso, as tendências
registradas desde 2005, pelo PNUD, ao nível do desenvolvimento humano, demonstram que o
país, embora posicionado no 144° lugar do ranking mundial (índice 0,509), se encontra acima
da linha dos países com baixo desenvolvimento humano, nomeadamente, da linha dos países
da África Subsariana. Quanto à população feminina, o percentual de analfabetismo é de
26,3% contra 42,1% dos homens. No entanto, são os homens que compõem o cenário de
formação na educação superior (INE, 2014).
No tocante à Guiné-Bissau, partimos dos dados extraídos do recenseamento geral da
população e habitação da Guiné-Bissau a nível nacional. A taxa de analfabetismo da
população de 15+ anos, de acordo com os dados apurados do censo, é calculada em 49,8%.
Esses dados mostram que 5 em cada 10 guineenses são analfabetos. A população feminina
apresenta uma taxa que se situa na ordem dos 63,1% contra 34,8% dos homens. Vale ressaltar
que a taxa de analfabetismo da camada feminina é superior a da masculina. Há também uma
elevada taxa de analfabetismo a nível da camada feminina a partir da faixa etária de 20-24
anos. Essa variação ocasionou uma diferença de 14,7 pontos percentuais entre as faixas etárias
de 15-19 e 20-24 anos. À medida que se ascende à faixa etária superior subsequente, ou seja,
de 25-29 anos, esse aumento é mais intenso, tendo uma diferença na proporção de 15 pontos
percentuais aproximadamente. Na camada masculina, percebe-se uma ascensão dessa taxa,
mas, já nas faixas etárias de 55-59 a 60 e mais anos, há um aumento de 20 pontos percentuais
(RGPH, 2014).
Contrariamente a Angola, o país em que houve maior entrada de mulheres para
ingresso no ensino superior pela UNILAB desde 2010 tem sido a Guiné Bissau. Já, para São
tomé e Príncipe, o número de homens tem sido expressivo desde 2013, o que preenche 75%
das entradas, conforme dados dessa Instituição de Ensino Superior. Assim, esperamos
verificar se o nível de escolarização26, no caso de estudantes que terminaram o ensino médio,
26
A variável escolarização não foi adotada por esta pesquisa, já que todos os textos que compõem o corpora
foram produzidos por pessoas com Ensino Médio completo. Impossibilitando contrastá-los.
125
possui influência nas marcações do uso de sujeitos nulos e plenos entre homens e mulheres no
contexto ora investigado.
2. País
Guiné-Bissau
A Guiné-Bissau tem mais de vinte grupos étnicos entre os quais se destacam balanta,
fula, manjaco, mandinga, pepel, mancanha, beafada, bijago, felupe, nalu, tanda, cocoli e
susso. Dessa forma, o país apresenta uma vasta diversidade linguística e cultural. O crioulo
não é língua de nenhuma etnia, mas sim de todos os povos, criada durante o período da
colonização e escravização colonial. Muitas características culturais são aparentemente
comuns em certas etnias, (por exemplo, a forma de se vestir entre fulas, mandingas beafadas e
sussos; as práticas de agricultura entre balantas, felupes e nalus; a forma de extração de vinho
27
Disponível em: https://observatoriodaafrica.wordpress.com/2017/02/07/reforma-do-judiciario-de-guine-
bissau-e-urgente-liga-dos-direitos-humanos/ Acesso em 12DEZ2018.
126
entre manjacos, mancanhas, balantas e pepeis; o jeito de pescar entre bijagos e pepeis), mas
muitas outras características se diferem – a língua é uma delas (COUTO, 1994; NAMONE,
2014).
Silva e Sampa (2017) apontam dados expresivos com relação à realidade de
proficiência em português dos guineenses com base nos dados o relatório do Ministério de
Educação de Portugal, publicado no Diário de Notícias (19/06/2017),
Ademais, Cá (2015) mostra que há 44,31% de pessoas que falam o crioulo. Esta é
uma prova contundente da importância do crioulo no contexto guineense. Um dos insucessos
do português (11,08%) de falantes como segunda língua prova que a política linguística deve
mudar a sua visão com relação ao crioulo. Dessa forma, o crioulo começou apenas como uma
língua de comunicação entre europeus e africanos e tornou-se uma língua nacional e um
símbolo de união da população guineense. Uma vez que a inexistência de uma política
educativa que alie de forma construtiva a presença das línguas maternas africanas e do crioulo
com a língua portuguesa, aliada à situação de diglossia reinante na Guiné-Bissau, são fatores
inibidores do processo de desenvolvimento da qualidade e do sucesso do sistema de ensino,
com repercussões na sociedade guineense e no próprio crescimento do país (BARBOSA,
2015). Cabe ressaltar que o crioulo conheceu sua expansão durante a luta pela independência,
depois se espalhou pelos diferentes grupos étnicos e adquirindo, portanto, o estatuto de língua
da unidade nacional, como também passou a ser utilizado na rádio nacional em músicas ou
em mensagens de sensibilização sobre a guerra. Ainda assim, não podemos deixar de
mencionar que o ensino das línguas maternas é uma das recomendações específicas da
UNESCO, conforme se pode ler na Declaração Universal dos Direitos Linguísticos. Isso
incide num desafio a ser enfrentado por qualquer país onde há Bilinguismo.
127
Angola
Com uma população residente de 24 383 301 e uma extensão de 246,700 Km2,
Angola é, pela sua extensão, o segundo maior país de língua oficial portuguesa. Não obstante,
só na primeira década do século XXI, foi possível começar a conhecer a realidade
sociolinguística do país e as complexas questões de política e planeamento linguístico que
esta coloca. Sendo certo que ainda muito nos falta conhecer, existe hoje um conhecimento
acumulado que permite começar a traçar um perfil sociolinguístico geral do país,
compreender a sócio-história que o explica, conhecer melhor a estrutura da variedade do
28
Disponível em: www.mapsofworld.com.br Acesso em 12 DEZ. 2018.
128
29
"Pretoguês" forma pejorativa com que os colonizadores portugueses denominavam a linguagem híbrida
português/quimbundo utilizada pela população angolana, expressão dos bilíngues coloniais, a qual constituía
motivo de freqüente menosprezo destes e, portanto, uma das fontes alimentadoras do racismo do colonizador em
relação ao colonizado." Disponível em: https://diariodeumamulhernegra.blogs.sapo.pt/o-que-e-pretogues-129909
Acesso em 24 jan. 2019.
129
30
Disponível em: http://exameinformatica.sapo.pt/noticias/mercados/2015-05-22-Sao-Tome-e-Principe-quer-
resgatar-dominio-de-topo-.st Acesso em 12 DEZ. 2018.
130
O que levantamos como hipótese, a partir da variável país, é que por se tratar de
realiadades linguísticas distintas, as variedades africanas do português em estudo nos remetem
a um passado de contato linguístico, pois tendem a manter as características menos marcadas
da língua, portanto para eles o sujeito nulo é a característica menos marcada.
Selecionadas as variáveis, foi feita a codificação dos dados para que seu tratamento
quantitativo fosse possível através de sua rodada no programa computacional GodVarbX
(Cf. SANKOFF; TAGLIAMONTE; SMITH, 2005), a fim de obtermos os resultados
percentuais e os pesos relativos que revelaram quais fatores favorecem o uso de sujeitos
nulos no PA, no PGB e no PST. A rodada dos dados foi realizada de modo separado para
que não houvesse interferência quanto ao resultado da escrutinação. Além disso, tal decisão
está centrada nas particularidades linguísticas que compõem cada variedade africana
131
extralinguísticas, focando geralmente os fatores de forma particular, eles mantêm, entre si,
uma relação delicada e direta, o que reclama que sejam observados, também, a partir das
interações que estabelecem uns com os outros. Isto é possível, como já mencionamos, através
da observação criteriosa dos chamados cruzamentos entre eles, estabelecidos pelos aportes
teóricos adotados para este estudo. Logo, conhecê-los, reforçamos, é tarefa relevante para a
compreensão dos mecanismos linguísticos, sempre com base no uso real.
133
Em outras palavras, as mudanças acontecem em teias e ecoam umas nas outras. Tal
eco sintático de um processo de mudança a outro – e que não necessariamente forma
uma linha reta – é teoricamente previsível a partir de um paradigma sintático fort
para a análise linguística: o modelo chomskyano (TARALLO, 1993, p. 74)
Nesta seção, serão analisadas, de acordo com os resultados quantitativos obtidos nas
rodadas do programa GOLDVARB X, as ocorrências de sujeitos nulos e plenos. Dessa forma,
as variáveis selecionadas pelo programa como relevantes ao condicionamento do fenômeno
serão exploradas. Essas variáveis são aquelas que o programa GOLDVARB X selecionou em
praticamente todas as rodadas realizadas, na seguinte ordem: variável depende sujeito nulo e,
sujeito pleno juntamente com as variáveis independentes, conforme elencadas anteriormente
no capítulo 3.
Nas próximas seções, os resultados obtidos serão apresentados em forma de tabelas,
seguidas, quando necessário, de gráficos que representem a sistematização dos grupos de
fatores, visando proporcionar maiores reflexões sobre a caracterização do objeto em estudo.
1.925,2/3.753 1.827,7/3.753
51,3% 48,7%
O resultado acima, ao que tudo indica, corrobora nossa hipótese inicial de que o PA
aparenta ser uma língua de sujeito nulo prototípica e que se aproxima mais do Português
Europeu (cf. VERÍSSIMO, 2017; KAPETULA, 2016; TEIXEIRA, 2008, 2012). Vale
salientar que estamos considerando que a língua-alvo31 dos angolanos é o PE. Para Gonçalves
(1994) o PE mantém um paradigma de morfemas verbais rico, uma concordância verbal forte,
como também uma língua de prestígio social. Assim, estamos partindo da premissa de que a
31
Língua estrangeira que alguém pretende aprender.
135
gramática à qual os vestibulandos foram expostos é a gramática do PE; logo, no que tange à
teoria gerativa, sendo o PE uma língua pro-drop prototípica (BARBOSA, 1996; BARBOSA,
DUARTE & KATO, 2001; DUARTE, 2000). Caso o output32 que pode ser percebido difere
das formas mostradas no PE, temos em mente que houve uma reanálise sintática por parte
do(a) aluno(a) e uma nova gramática surgiu a partir de então. Salientamos que a diferença
percentual entre sujeitos nulos e sujeitos plenos é de apenas 2,6 pontos, denotando uma
pequena diferença entre os fatores da varável dependente em estudo. De mais a mais,
esperávamos que a taxa de sujeitos nulos fosse mais baixa.
Vale ressaltar que há restrição dos sujeitos nulos em alguns contextos específicos
(desambiguação, ênfase e contraste) não foram observados nos nossos dados com frequência,
ao contrário do que seria esperado em uma língua de sujeito nulo. Nesse sentido, a língua
escrita do PA extraída das redações mostra um uso expressivo de sujeitos plenos pré-verbais.
Assim, algumas questões se colocam, a saber:
b) Será que esses contextos assemelham-se aos que são encontrados nas outras
variedades africanas do português, a saber Guiné Bissau e São Tomé?;
d) Será que a morfologia de flexão verbal nos dados analisados é rica no PA? Se sim,
o que justificaria então o percentual de 48,7% para sujeitos plenos nesses dados?
32
Manifestação do conhecimento linguístico construído, ou seja, um produto do input.
136
(4) Eh pá me CHMAM de chefe, portanto, de princípio pro SOU uma pessoa muito
animadora talvez pro DIGAMOS ASSIM NÉ? E QUANDO pro cheguei aqui
portanto EU sai do Tchivinguiro para aqui é pá pro DIGO bem melhor chefe
porque de princípio os outros de chefe. Chefe, chefe, pronto ELES também
agora me metereram o nome de chefe33. (SANTOS; OLIVEIRA, 2007, p. 12)
33
A numeração deste exemplo segue a do original.
137
P2 48/70 68 54
P3 102/134 76 63
P4 21/48 43 27
TOTAL 278/433
(2) “Nós percebemos que a república popular de Angola é uma das maiores potências em
África” [PA2M]
(3) “Nós sabemos que a união entre os países africanos faz a força” [PA3M]
(4) “Desta forma, nós já não vamos parar de defender a zona petrolífera” [PA17F]
(5) “Nosso governo funciona de maneira eficaz, por isso nós temos muito orgulho”
[PA9M]
(8) “Diante de tudo, pro perdi a crença na mudança económica de Angola”. [PA35F]
(13) “Ela está se tornando uma realidade para muitos angolanos com a construção de
condomínios” [PA50M]
(14) “Elas têm sido um dilema para sociedade angola, para mulher ainda enfrentar
retrocessos” [PA41F]
(16) “Nos dias de hoje, não pro usa o bom senso na educação angolana”. [PA41F]
Nesse tipo de referência, não há dúvidas quanto à sua refrência genérica. Neves
(2000 apud ASSUNÇÃO, 2012, p.80) afirma que construções de sujeito indeterminado são do
tipo maximamente genéricas, pois tratam-se de construções de 3ª pessoa do singular seguido
da partícula –SE ou construções de 3ª pessoa do plural -m. Seguem abaixo alguns exemplos
encontrados na amostra analisada, que confirmam a semântica de indeterminação do sujeito
em 3ª pessoa do plural:
(22) “Pode-se apostar mais no sector da exportação para evitar a crise económica”
[PA26M]
(23) “Enfrenta-se uma grave crise económica dos produtos básicos de consumo por causa
das exportações” [PA28F]
Podemos inferir a partir dos dados tabulados (cf. Tab. 4) que o sujeito nulo é uma
ocorrência de todas as pessoas do discurso, contrariamente de PE que o sujeito nulo é opção
141
Para Montalbetti (1986), numa língua de sujeito nulo, como é o caso do PE, é possível
alternar pronomes foneticamente nulos com pronomes foneticamente realizados. O estatuto
nulo ou lexical das formas pronominais pode condicionar interpretações distintas, mesmo que
desempenhem a mesma função sintática de sujeito. Dessa forma, no corpus do PA os
resultados apresentados no quadro 13 ratifica, mais uma vez, a aproximação com o PE. Isso
porque numa língua pro-drop o sujeito pleno não é uma opção em orações encaixadas. No
entanto, Duarte (1995) atesta que para o PE, caso as orações encaixadas estejam numa
configuração de correferência com o sujeito da sentença raiz, o mesmo ocorrendo em relação
a raiz se ela seguir a subordinada. Como podemos verificar em (24) a (27) a seguir:
(24) [17]34 Então tu acreditas que pro ainda tenhas esses pruridos, tu também? (GL5)
(25) “Angola, nos últimos anos, ela apresentou níveis de crescimento económico” [PA28M]
(26) “Angola ela continua a liderar este título de grande exploradora petrolífera mais elevada”
[PA33M]
(27) “A crise económica ela é devido o desequilíbrio de recursos naturais, porque somente
ele o petróleo pode salvar essa nação de crise” [PA18F]
34
A numeração entre os colchetes segue o original.
35
Idem a nota 35.
36
Para Duarte (1995) as construções com duplicação do sujeito conhecidas como deslocamento à esquerda ou à
dierita são construções atípicas em línguas pro-drop, e , embora a ocorrência de DE inclua necessariamente o uso
do pronome, não se encaixando, pois, dentro do conceito sociolinguístico de regra variável, seu exame é
fundamental para confirmação para atestar que estamos de fato nos afastando do grupo das línguas pro-drop.
145
c. “eu, anteriormente, eu antes de, antes de entrar para a igreja, eu era uma pessoa que
não tinha luzes [...]” [ANG16]
(29) “os professores eles declaram ou estão para declarar uma nova greve.” (SANTOS 2010,
p. 104)
146
Sobre a variável tipo de verbo, observamos agora, a partir do quadro 10, os tipos de
verbos analisados, totalizando 56% de verbos transitivos; 38% de verbos copulativos; 4% de
verbos intransitivos e 2% de inacusativos. Em seguida, relacionamos a ocorrência verbal com
a ocorrência de inversão verbo-sujeito, por tipo de verbo (cf. quadro 14). A seguir,
observamos que, das inversões ocorridas,
Verbos intransitivos 8%
Verbos inacusativos 6%
[...] a época em que a ordem VS passa a não ser mais produtiva com verbos
transitivos (fins do século XVIII e início do século XIX) coincide, de certa forma,
com a época em que a posição pré-verabl do sujeito começa a ser preenchida, mais
frequentemente, por sujeitos realizados foneticamente. Da mesma forma, o último
período, que corresponde à segunda metade so século XX em que é verificada a alta
restrição da ordem VS aos contextos com verbos inacusativos corresponde também
147
Quanto ao quadro 13, percebemos que a ordem VS, conforme vários trabalhos
atestados inseridos na literatura gerativista, a maioria das ocorrências com sujeitos posposto
incide, no PB atual, em contruções com verbos monoargumentais (cf. PONTES, 1987;
OLIVEIRA, 1989, ALMEIDA, 2005). Isso também é verificado no PA com base nas
referências percentuais acima (ver quadro 13) em os verbos intransitivos e inacusativos
representam 58% de inversão VS. Assim, Figueiredo Silva (1996)37 alerta para o fato de que
alguns verbos intransitivos aceitam a inversão outros não aceitam, denotando uma maior
restrição ainda no uso dessa ordem, como exposto em (30):
37
A referida autora, também, alerta para o fato de que no PB alguns transitivos se comportam como ergativos.
38
Segue a numeração do texto de origem.
148
SN V – anteposição
(31) “Eles serão importantes para Angola após a formação superior de qualidade”
[PA31M]
V SN – posposição
Tabela 6 – Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural segundo o tipo de
verbo no corpus do PA
A alta incidência de verbos transitivos é contrariada pelo peso relativo de (.60) das
ocorrências de verbos intransitivos/incausativos. O que denota a não marcação de CV na 3ª
pessoa do plural no corpus do PA.
(33) “Então ainda existe coisas difíceis na vida vida de Angola”. [PA02M]
(34) “Existe alguns angolanos sem orgulho de um país”.[PA05M]
(35) “É verdade que existe vários problemas na educação bilíngue de Luanda”.[PA012M]
(36) “Mas ainda existe pessoas sem amor a nação de Angola”.[PA13F]
(37) “e as mulheres domésticas já era vítimas de tudo”.[PA17F]
(38) “Seus sonhos é sua luta de nação e país de Angola”[PA29F]
(39) “As escolas começa a greve e tudo para”.[PA50M]
(40) “Eles querem uma universidade de melhoria profissional.[PA48M]
149
Tabela 7 – Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa do plural conforme posição
do sujeito x tipo de verbo no corpus de PA
39
A variável de saliência fônica poderá ser trabalhada em um momento posterior quando nos determos a atenção
exclusivamente a um estudo detalhado do fenômeno da concordância verbal nos dados.
150
De mais a mais, podemos assumir que o tipo de verbo seja relevante e mostre uma
atuação correlacionada à da posição, esta última tem efeito superior sobre os resultados
obtidos. Por essa razão, esta foi a primeira variável linguística (e sempre) selecionada
enquanto o tipo de verbo foi a última (quando foi selecionada), o que demosntra seu papel
secundário em relação às outras variáveis.
Em linhas gerais, os resultados apresentados no quadro, a seguir, evidenciam a forte
preferência pela variante padrão de concordância verbal com a terceira pessoa do plural na
variedade angolana, revelando, consoante Labov (2003), o comportamento de uma regra
semicategórica (96,8% ou 96, 7%): dos 2.256 dados obtidos, 2.281 apresentam essa variantes
151
(41) “tinha angolano que saiu os brasileiro para ganhara a vida na universidade”. [PA08M]
(42) “Às vezes, vinha vários estrageiro conforme eles iam chegando para Luanda”. [PA19F]
(43) “As cidades começam a mudar um pouco mais aceleradas e começam a surgir de certa
maneira focos de criminalidade e a violência cresce”. [PA47F]
(45) “Para os estudantes angolanos que vai fazer um futuro no Brasil ao se formar com
qualidade.” [PA03M]
(46) “Para nós é normal as violências que está no interior de Angola” [PA37M]
(48) “Os casamentos aqui não dura até por que os que casa oficialmente no ano próximo já
divorciou”40 [PA50F]
A respeito dos exemplos destacados, fazemos duas observações relevantes sobre esse
condicionamento:
(i) apenas dois desses dados (45 e 46) não são construídos com verbos representativos do
grau 1 de saliência, ou seja, a maioria dos casos de ausência de marcas de plural em
sujeitos representados pelo pronome que são, coincidentemente, verbos de baixa
saliência fônica, que por si só, já são favorecedores da não marcação.
(ii) apenas um foi produzido pelos dados de escrita, podemos ver que o pronome relativo
pode atuar, no conjunto de fatores, para a ausência de concordância. No caso desse
dado, é mais uma ocorrência de ausência de marca de número (47).
Para Scherre (1998) o paralelismo como uma tendência geral de formas gramaticais
particulares ocorrerem juntas, criando uma harmonia discursiva formal, tornando mais coeso
o discurso. Talvez isto ocorra, até mesmo, por um princípio mental associativo que associe
marca formal de plural com marca formal de plural e/ou forma singular com forma singular.
Comparando os resultados que outros autores sociolinguistas encontraram em suas pesquisas
(cf. CAMACHO, 2016; OLIVEIRA, 2009) podemos afirmar que há, no momento, uma
40
No caso do verbo “divorciou”, o que está em jogo é o distanciamento do sujeito anteposto em relação a esse
verbo.
153
(51) “Os jovens vivem ali em busca de boas oportunidade, vêm dos vários distritos e
são meninos de famílias muito carentes” [PA13M]
41
No controle dessa variável, foram consideradas as 294 ocorrências com sujeito nulo e as 20 ocorrências com
sujeito/SN posposto ao verbo.
154
(52) “Pois as mulher daqui deixa a possibilidade de estudar fora do país”. [PA31F]
Com base na figura 6, acima, é possível visualizar que os itens mais específicos e mais
referenciais estão na parte periférica à direita. Logo, o preenchimento da posição de sujeito
ocorreria, inicialmente, com as 1ª e 2ª pessoas. Enquanto que na 3ª pessoa, por conter os
traços [+ específico] e [+ referencial], além dos traços [+ humano] e [- humano], poderia
apresentar resistência ao preenchimento. Dessa forma, em relação à 3ª pessoa, Silva (2006)
postula que:
42
[26] a. ___ não pode fumar aqui.
b. A gente não pode fumar aqui.
c. Você não pode fumar aqui. (KATO & DUARTE, 2014)
Kato e Duarte (2014 apud Holmberg at all, 2009) alega que em (26) encontramos construções próprias das
línguas de sujeito nulo parciais mas não de línguas de NS consistentes, como o italiano e o espenhol, que exigem
o clítico se.
156
pesquisa, a autora destaca que a taxa de sujeitos nulos com traço [- animado] é de 44% com
P6 na fala carioca, isto é, menos da metade do que foi visto nos dados com o PE. Isso posto,
os resultados apresentados nesta pesquisa denotam que o sujeito nulo do PA mostra um
comportamento que parece estar no meio do caminho entre o PB e o PE. Isso se deve ao fato
da P6 no PA apresentar o percentual de 75,7% de marcação [-animado], resultado superior
tanto ao PB, ao passo que nossos resultados possuem percentuais abaixo do resultado do PE
de acordo com os estudos de Duarte (1995).
Corroborando os dados apresentados por Duarte (1995) ao postular que no PE os
sujeitos com traço [-animado] apresentam uma taxa de nulos de 93%, posto que o contexto
ofereça restrições à recuperação desse sujeito no discurso, como por exemplo, a interpolação
de elementos que acabem por gerar um distanciamento desse sujeito com orações posteriores.
A autora atesta, ainda, que o traço [-animado] e as sentenças encaixadas nas quais o sujeito é
correferente ao sujeito da sentença matriz seriam de fato as maiores características dos
sujeitos nulos nas línguas do tipo do italiano e, resultando assim em índices tão altos de não
realizações pronominais.
Nessa mesma pesquisa, Duarte destaca que a taxa de sujeitos nulos com traço [-
animado] é de 44% na fala carioca, isto é, menos da metade do que foi visto nos dados com o
PE. Mais uma vez, os dados analisados no presente estudo denotam que o sujeito nulo do PA
mostra um comportamento que parece estar no meio do caminho entre o PB e o PE.
Para finalizar a discussão dos dados, foi investigada a variável Sexo para examinar se,
no contexto de monitoramento da escrita a que foram submetidos os alunos angolanos, eram
as mulheres que apresentavam comportamento linguístico mais favorecedor ao uso da
variante padrão relacionada à concordância verbal com P6. Tomando por base os pesos
relativos apresentados no quadro, a seguir, o sexo feminino usa mais essa variante do que o
sexo masculino, corroborando o resultado de outras pesquisas (cf. SOARES, 2012; VIEIRA
& BAZENGA, 2015; PEREIRA & ARAÚJO, 2016; PISSURNO, 2017):
43
Esse fato confirma uma questão própria dos estudos sociolinguísticos levantada por Labov (1972) a de que as
mulheres lideram processo de mudança se forem em direção a uma variante de pretígio.
157
44
A título de exemplo, citamos o trabalho de Cavalcante (2003) que apresenta menores índices de sujeitos nulos
entre as pessoas que possuem nível universitário. Entre os não muito escolarizados parece haver também
estabilidade de fenômeno.
158
No entanto, vale ressaltar que as angolanas usaram mais essa variante do que os
angolanos.
Resta saber quais são os resultados obtidos nas outras variedades africanas do
português aqui investigadas. Para tanto, seguem, nas próximas subseções, a apresentação e a
discussão desses resultados.
Tomando por base as variáveis linguísticas selecionadas para este estudo, observemos
algumas ocorrências de sujeitos nulos e plenos no corpus do PST:
Quadro 17 - Distribuição dos dados com e sem sujeito expresso no português de São Tomé e
Príncipe
Sujeito nulo Sujeito pleno
1.391,78/2.626 1.234,22/2.626
53% 47%
Fonte: A autora desta pesquisa.
Observemos alguns exemplos extraídos do referido corpus que contêm sujeitos plenos
e nulos no PST:
(54) “Nós devemos valorizar o trabalho dos professores nas universidades estrageiras”.
[PST03M]
160
(55) “Nós gostamos da ilha devido o seu verde, a sua natureza, e a gastronomia sem falar
na humildade das pessoas”. [PST04F]
(56) “Nós conquistamos nossa liberdade para não ser maltratados”. [PST32F]
(58) “Eu posso ingressar num outro país de uma outra cultura conhecendo melhorando os
conhecimentos” [PST49F]
(59) “Eu espero cursar da melhor forma possível a minha formação” [PST50M]
(64) “Eles devem ver a educação como um presente que a vida nos oferece” [PST05M]
(66) “Eles olham para São Tomé com medidas de futuro e melhoria de melhoria de
condições de vida do nosso povo são tomense”. [PST34M]
(67) “Eles tem motivo para festejar o nosso bom clima de paz. [PST28F]
(68) “Eles acredita na dedicação da força de vontade dos alunos estrageiros. [PST47F]
Tabela 13 – Sujeitos nulos no corpus do PST tomando por base a referência semântica
Tomando por base o número de ocorrências, vejamos a tabela 16, em que são
apresentados os resultados percentuais de sujeitos nulos e plenos:
53% 47%
1.391,78/4.164 1.234,22/41.164
DUARTE, 2009; MOURÃO, 2015). Sendo assim, diferentemente do PA (cf. NEGRÃO &
VIOTTI, 2014; UNDOLO, 2014; TEIXEIRA, 2008; 2012; MOTA, 2015; OLIVEIRA, 2016).
Quanto a posição de sujeito, que seria uma das variáveis destacada pelo programa, só
verificamos a presença de sujeito anteposto ao verbo no PA, assim dispensando uma análise
devido a ausência do referido critério. Isso pode ser explicado devido o contexto monitorado
da produção do gênero redação escolar. No entanto, percebemos que sujeitos em posição
anterior ao verbo, no contexto de dados escritos, em raros casos desfavorecem a não marcação
de plural como no PST, trazendo apenas 2 ocorrências.
Seguem abaixo os exemplos que ilustram estruturas que foram produtivas no corpus
do PST:
b. “São Tomé são uma ilha pequena com grandes melhorias sociais e política”.
[PST31M]
P1 302/579 52 .37
P2 - - -
P3 488/690 70 .66
P4 31/108 29 .43
P5 - - -
P6 955,88/1039 92 .85
TOTAL 1.776,88/2.416 - -
Nesse sentido, nos chamou a atenção dos resultados do sujeito no PST na terceira
pessoa (70%), pois pensávamos que por se tratar de uma escrita do gênero redação, essa
marca semântica poderia ser consistente. Já que, em primeiro plano, a forma de
163
(i) a influência das línguas de substrato africano (GUY, 1981) que propõe que essa
variação é decorrente de um ou mais substratos;
(ii) a deriva românica (NARO, 1981; SCHERRE, 1988) que defende a mudança
linguística relacionada à fenômenos históricos internos da própria língua;
(i) quando o sujeito não foi realizado a aplicação da CV foi favorecida com um PR.
Prevalecendo uma lógica funcional, pois o morfema de número e pessoa supriria a
ausência de informação com o sujeito nulo. Analogamente, em nosso corpora
pudemos constatar a mesma ocorrência, mesmo se tratando de dados escritos do
PST;
(ii) na saliência fônica, foi possível verificar que os níveis 2 (fala/falamos), 4
(vai/vamos) e 5 (é/somos) são os que favorecem a concordância verbal, e,
portanto, os verbos mais salientes favorecem a CV. Sendo os verbos no crioulo
uniformes, o falante tende a marcar a diferenciação que é mais perceptível. Como
nossa pesquisa parte de um corpus com dados escritos não verificamos tal
ocorrência;
(iii) em contraste com o desempenho das mulheres, os homens tendem a empregar
mais a regra de CV-P4. Esse fato é explicado porque os homens mantêm mais
contatos fora da comunidade do que as mulheres. No caso de Almoxarife, o
contato com o exército colonial e o trabalho nas grandes roças pode ter
influenciado a aquisição de marcas do padrão da língua alvo (LA). Em
contrapartida, nossa pesquisa parte de sujeitos letrados com nível de escolaridade
165
Quando falamos da influência das línguas crioulas em São Tomé e Príncipe, mais
precisamente no PST, sabemos que o santome é o crioulo que mais influenciou a formação da
gramática dessa variedade do português, pois a língua crioula sempre foi de maior alcance no
país. O léxico do santome é, em sua maioria, de base lexical portuguesa, no entanto suas
características morfossintáticas também estabelecem relações com as línguas africanas faladas
pelos ancestrais escravos transplantados (HAGEMEIJER, 2009). No caso concreto da
estrutura verbal do santome, não há marcação de pessoa ou número no verbo, exemplos (127)
e (128).
(127) Ê saya kanwa pê matu. (Santome) Ele puxar canoa pôr mato. (PA)
Santome Português
N’ sebê Eu sei OU eu soube
Portanto, não podemos esquecer que na constituição do corpus não foi possível a
identificação dos autores das redações quanto ao uso da L1 e da L2, como também se
pertencem a zona rural ou zona urbana de São Tomé. Além disso, também não foi possível a
identificação da faixa etária destes autores.
167
(139) “Contudo, ele deve estar apto, quer em conhecimento escolar, quer em condições
financeira, porque o dinheiro é inerente ao estudante”. [PST01M]
(141) “Mas com os quadros formados nas diferentes vertentes da saúde, fruto da cooperação
com o Brasil e contando com todo seu apoio, estaríamos em melhor posição de combate aos
flagelos que afeta a saúde da nacção”. [PST23M]
(142) “Quanto ao futuro ao meu futuro, o tempo dirá tudo, mas espero cursar da melhor
forma possível a minha formação, estando apto para o futuro que me espera”. [PST29F]
168
(143) “Logo, vê-se que a cooperação entre Brasil e São Tomé contribuiu para um grande
crescimento do meu país”. [PST30F]
(145) “Por isso, todos devem contribuir para o melhoramento do turismo em São Tomé e
Príncipe e investir mais”. [PST44F]
Tavares Silva (2011) alega que ao comparar as orações coordenadas com as do inglês,
do francês e do PB, a autora percebe que elas se comportam de forma similar ao PE no caso
de existir a categoria vazia. Todavia, discordará do PE (Cf. CARVALHO, 2013; RUBIO,
2015) em caso que o sujeito realizado foneticamente na oração coordenada possibilite a
leitura co-referente ou disjunta, a saber:
(147) Inglês
a’. John saw Peter at the cinema but he didn’t talk to him.
“O João viu o Pedro no cinema, mas ele não falou com ele”.
(148) Francês
“O João viu o Pedro no cinema, mas ele não falou com ele”.
a'. O João viu o Pedro no cinema, mas ele não falou com ele
(150) “São essas características que um estudante deve ter, ao ingressar-se numa universidade
no exterior, a fim de ter um bom êxito no seu curso e progredir como estudante”. {PST29M]
(151) “Turismo tem um grande impacto na vida de São Tomé e Príncipe quando todos nós
santomenses devemos assegurá-lo porque o mesmo está garantido o nosso futuro e
desenvolvimento mundial e principalmente preservar”. [PST33M]
(152) “Os lugares históricos devendo estar reabilitados para que os turistas se sinta num lugar
que teve as suas marcas para chegar a onde chegou”. [PST44M]
(153) “Com isso São Tomé e Príncipe recebido mais números de visitantes que contribuirá
para a divulgação das ilhas”. [PST47M]
(154) “Em São tomé o turismo estando na fase do seu desenvolvimento, visto que é
necessário muitas melhorias”. [PST50 F]
170
(155) “Consoante a classificação de São Tomé e Príncipe como um destino para as férias foi
merecimento visto que foi vista toda as qualidades para uma féria tranquila”. [PST12F]
(156) “É com isto que faz com que São Tomé e Príncipe sendo um país de sonho
maravilhoso”. [PST39F]
Partindo das estruturas subordinadas finitas, a partir das quais realizamos um análise
descritiva do PST, elecamos as seguintes conclusões:
(157) “São Tomé e Príncipe, as ilhas, ela mostra recorrente a violência doméstica em
contextos rurais” [PST09F]
(158) “São Tomé ele ainda vai vencer essa vergonha de violência com as mulheres”
[PST34M]
(159) “O turismo ele é a única alegria das ilhas porque mostra as belezas diversas de nosso
povo”. [PST42M]
(160) a. “até dizem que a casca é, é veneno mas, eu eu creio que a forma de contaminação,
porque não sei” .
Ainda sobre descrição dos contextos com duplos sujeitos, os estudos de Tavares
Silva (2013); Tavares Silva e Ziober (2014) alegam que em PB predominam duplos sujeitos
com traço de 3ª pessoa, ao contrário de crioulos de base lexical português, como é o caso do
Caboverdiano e do São Tomé cuja predominância é da 1ª pessoa do singular. No entanto, já as
construções (157), (158) e (159) se mostram contrárias a afirmação, seguindo o indicativo do
PB ao realizar duplos sujeitos em 3ª pessoa.
Verbos intransitivos 2%
Verbos inacusativos 1%
Berlinck (1989), em seu estudo sobre a ordem do sujeito para sua amostra sincrônica,
atesta que o tipo de verbo predicador é um dos importantes condicionadores da ordem VS,
sendo que se trata de um fator de natureza formal, pois, conforme afirma a autora, “os
resultados gerais mostram que o encaminhamento da diminuição de freqüência de V SN
atingiu antes e com mais intensidade os contextos ‘mais transitivos’ ” (BERLINCK, 1989, p.
101). Segundo a autora,
O que importa para CV é a condição de tópico de SN, sendo a regra, nesse caso, de
aplicação obrigatória. Não havendo tópico – entendido como uma construção
sintática – a tendência verificada no português é a de não se efetuar a concordância)
embora nesse caso ela possa ser considerada de aplicação optativa com o SN que
segue o verbo, o que explica a ocorrência alternada das formas verbais de singular e
173
Tabela 16 – Distribuição dos dados sem marca verbal de 3ª pessoa do plural segundo tipo de
verbo
Tipo de verbo Ocorrências Percentual Peso relativo
Tabela 17 – Cruzamento de dados sem marca verbal de 3ª pessoa plural conforme posição do
sujeito x tipo de verbo no corpus de PST
174
O corpus do PST desta pesquisa atesta, como resultado geral, forte preferência na
variedade santomense, revelando, consoante Labov (2003), o comportamento de uma regra
semicategórica (92%)m, na qual dos 1.039 dados obtidos 955,88 deles são de concordância
expressa dialogando com as constações previstas por Vieira (2012), Vieira e Bazenga
(2013;2015), além de Vieira e Silva (2017), como se vê na tabela a seguir:
estudada. Dessa forma, reconhecemos tal relevância, porém nosso corpora foi extraído de
redações produzidas por alunos com ensino médio completo para ingresso na UNILAB,
portanto dispensado tal critério para o referido estudo.
Em relação à variável sexo (cf. tabela 22), verifica-se que as mulheres são, de fato,
as maiores favorecedoras das marcas (.65), o que se correlaciona com o pressuposto laboviano
de que elas tenderiam a ser as propulsoras das variantes de maior prestígio. Enquanto os
homens, por sua vez, revelam um comportamento de maior uso da variante sem marcas de
número (.40 para a concordância).
A partir dos dados tabulados, esse resultado reforça os relatos apresentados por Vieira
e Bazenga (2015), atestando as tendências ora encontradas em relação ao sexo do informante:
Por fim, Vieira e Silva (2017) alegam que os aspectos equivalentes da concordância
verbal no PB e no PST contemporâneos. Não obstante, os contextos de contato dessa
variedade africana possam favorecer aspectos peculiares da brasileira, que não convive
atualmente com línguas crioulas ou africanas, tais semelhanças possivelmente uma variação
relativa do português não lusitano, independentemente das situações de comunicação in loco.
Destarte, os resultados como os apresentados na presente pesquisa podem fundamentar,
afinal, da existência de um continuum afro-brasileiro nas variedades do português (PETTER,
2009;2015)
177
A variável país foi adotada pelo estudo, de modo a contribuir para um debate acerca
da ideia de um continuum afro-brasileiro que vem sendo modernamente desenvolvida
sobretudo nos trabalhos de Petter (2007, 2015). Além disso, corroboramos com Brandão
(2016, p. 69-70) nas motivações que levaram à escolha do Português de São Tomé e Príncipe:
(a) dentre os países africanos que têm o Português como língua oficial, é a
única variedade falada como L1 ou L2 pela maioria da população – 98, 4%, em
20125 – sendo, hoje, a L1 da maior parte dela; (b) em São Tomé e Príncipe,
coexistem, além de quatro crioulos de base portuguesa – o Forro (ou Santomé)
e o Angolar, na Ilha de São Tomé; o Lung’ie (ou Principense) na Ilha do
Príncipe e o Fa d’ambô (ou Anobonense), da Ilha de Ano Bom (província da
Guiné Equatorial) –, também o português dos Tongas, o Cabo-verdeano
(crioulo de base portuguesa, nativo de Cabo Verde) e “resquícios de línguas do
grupo Bantu” (HAGEMEIJER, 2009, p.1). (c) os quatro primeiros crioulos
citados, que, segundo Hagemeijer (2009, p. 4), hoje “línguas distintas, tiveram
uma história comum”, partilham, como informa Ferraz (1976, p. 9), uma série
de características e têm como substrato línguas maternas também comuns às
dos africanos trazidos para o Brasil para servirem de escravos, o que amplia o
interesse em observá-las em contraste com o PB; (d) o Forro, em especial –
usado, segundo o censo de 2001, por 72,4% da população mas reduzido, hoje,
segundo o Censo de 2012, a apenas 36,3% de falantes – é considerado pelos
habitantes da ilha de São Tomé como a “língua nacional”, embora, por ser
estigmatizado, nem todos o dominem ou o utilizem nas situações
intercomunicativas cotidianas; (e) nas escolas, a norma de referência é o
Português Europeu, conquanto, pelo que se observa, inclusive na fala de
professores nativos, de maior nível de escolaridade, ela nem sempre seja
observada no que respeita aos planos sintático, morfossintático e fonológico,
conforme consta da observação de Hagemeijer (2009, p. 19) acima citada.
(162) “ mesmo depois com essas dificuldades todas, mesmo assim eu consegui, as
dificuldades nunca acaba”. [PST26F]
(i) das variáveis extralinguísticas: os indivíduos por possuírem ensino médio quanto ao
nível de escolaridade (porém não levantado pela pesquisa por apresentar apenas uma
polarização) e as mulheres;
Assim sendo, os fatores sociais, ao que tudo indica, mostram-se altamente relevantes
para a caracterização das variedades africanas do Português, sobretudo as exploradas na
presente pesquisa (PA, PST e PGB), especialmente ao elevado prestígio associado ao uso de
Português, como postulam Vieira e Brandão (2012) a respeito do PST:
[...] ao que tudo indica, o valor social que se atribui à não concordância seria
compatível com um estereótipo (nos termos de Labov (1972)) ou, na melhor das
hipóteses, com um marcador. Por essa razão, o fenômeno variável funciona como
nítido identificador do perfil social do usuário da língua. No PST – que configura
um caso de variedade do português em formação, com normas objetivas ainda não
totalmente definidas e assumidas pelos diferentes grupos de falantes –, sabe-se que
dominar a concordância segundo a norma culta que lhe serve de modelo, a do
180
Guiné-Bissau, como outros países africanos, possui várias línguas que convivem lado
a lado com a dos colonizadores. Após a independência de Guiné, em 1973, o português
tornou-se a língua oficial do país. Porém, antes de o português ser adotado como oficial, já
havia mais de duas dezenas de línguas étnicas distribuídas em diversos grupos étnicos (cf.
AUGEL, 2007; FONSECA, 2012; COSTA, 2014; SEMEDO, 2014; BARBOSA, 2015), além
do crioulo guineense que é falado por 90% dos guineenses.
A literatura acadêmica atesta que, por não ser ainda a língua materna de parte
significativa da população, o português falado em Guiné-Bissau apresenta certas
especificidades gramaticais que, de acordo com Couto e Embaló (2010), decorrem do quadro
multilíngue de Guiné-Bissau: a interação de diversas línguas no país resulta em uma escala de
variabilidade linguística denominada continuum guineense, que vai desde as línguas nativas
até o português lusitano, passando pelas variedades do crioulo basiletal (kriol fundu) e
acroletal (kriol lebi) e do português acrioulado, que, para os autores, é o português, de fato,
falado em Guiné-Bissau.
Ao contrário do crioulo, de cujo estudo alguns autores se têm ocupado (COUTO,
2009, 2015; EMBALÓ, 2008; BARBOSA, 2015; AUGET, 2017), não existem muitas
pesquisas sobre o PGB, sobretudo, na modalidade escrita. Sendo assim, acreditamos na
relevância atribuída à urgência em investigações sob os vieses do Gerativismo e da
Sociolinguística das variedades africanas do português para descrição das diferentes normas
da Língua Portuguesa, mas especialmente da abordagem do PSN, além da questão da intensa
situação de contato linguístico presente nessas sociedades.
Tomando por base o corpus da pesquisa do PGB, foram contabilizadas 4.136
ocorrências: 3.308,8 de sujeitos plenos e 827,2 de sujeitos nulos. Das 1389,6 ocorrências de
sujeitos pronominais, 248,16 são sujeitos nulos. Com o sujeito de referência arbitrária, o
percentual de plenos também foi expressivo 80% quando comparados aos 20% nulos. Tal
questão decorre ainda da influência do crioulo guineense, ou seja, uma língua de sujeito não-
pro-drop.
181
20% 80%
827,2 3.308,8
Vejamos alguns exemplos extraídos do corpus do PGB que contêm sujeitos plenos e
nulo, tomando por base a referência semântica do sujeito.
(83) “Nós temos que falar dentro da nossa casa, rua, instituição dos Estados e privadas a
língua oficial português” [PGB13M]
(86) “Eu venho através esta escrita demonstrar minha satisfação pela cooperação solidária do
Brasil com os guineenses”. [PGB47F]
(87) “Se nós vêemos muitas pessoas falarem português nas escolas”. [PGB49F]
(92) “ pro Fica em termos de oralidade sem ajudar a quem não vai pra escola”. [PGB01M]
(93) “Eles até entendem o crioulo bem”. [PGB09M]
Sobre a referência semântica de sujeitos nulos e plenos, observamos que a maior parte
está relacionada à terceira pessoa do singular, bem como do plural. Esse resultado nos parece
natural, uma vez que os dados foram coletados por meio de textos escritos em que cada
183
candidato dissertava acerca de sua visão de mundo sobre assuntos da realidade de seu país, ou
seja, o enfoque era o referente, predominando, portanto, a função referencial da linguagem.
Além disso, voltamos ratificar por ser o gênero “redação escolar” e por sabermos que
a escrita em contexto de um exame vestibular pressupõe um grau mais monitorado de uso da
língua, era de se esperar também as estratégias de indeterminação de sujeito através do uso da
terceira pessoa do discurso que criam um efeito de objetividade, impessoalidade ao texto,
como já descrito na subseção sobre o PA:
Vale referir ainda que construções com verbo na terceira pessoa do singular seguido
do clítico “se” ocorrem apenas 3 vezes nos dados do PGB, ao passo que no PA houve várias
ocorrências e no PST não houve. Essa diferença nos chama a atenção quanto ao uso em
contextos formais deste fenômeno, para melhor compreensão partiremos do estudo de Duarte,
Kato e Barbosa (2003) que abarca estratégias de indeterminação no PB e no PE na escrita,
pois, conforme as autoras, “sabiadamente mais conservadora que a fala” (DUARTE; KATO;
BARBOSA, 2003, p.405). Para análise dos dados de fala as autoras verfificaram que, devido à
incidência de perda do sujeito nulo no PB, consequentemente afeta a indeterminação, “o PB
preenche mais o sujeito, fazendo grande uso de construções pessoais com “você” e “a gente”
(DUARTE; KATO; BARBOSA, 2003, p.406), mas também nos casos de sujeito
indeterminado. Esse fenômeno se aproxima dos resultados verificados no PA quanto a
incidência do pronome pessoal “você(s)”, apesar de tratar de dados de escrita.
Quanto ao PE, as pesquisadoras verificaram que a estratégia com o “se” foi a
preferida, com 38% das ocorrências, ao passo que o uso de “você” houve apenas 6%. Por
outro lado, no PB, a forma pronominal “você” foi preferencial, já que contabilizou 44% dos
empregos, seguida de sujeito nulo (17%), na pessoa do plural (16%) e a locução pronominal
“a gente” (13%). Enquanto as formas “se” (8%) e “nós” (2%) ficaram restritas à fala de
informantes mais velhos com maior escolaridade45.
Outro ponto a ressaltar, quanto a análise da língua escrita, de acordo com as autoras
nas sentenças finitas do PE, o “se” foi a mais favorecida (83%), seguido de “nós” (16%) e a
45
Apesar de não adotarmos as variáveis idade e escolaridade, percebemos um releção positiva quanto a
escolarização, pois os estudantes que produziram as redações possuem ensino médio completo, denotando
indiretamente o fator de “maior escolaridade”.
184
gente foi a menos empregada (1%). O emprego de “nós” foi “sempre expresso” (DUARTE;
KATO; BARBOSA, 2003, p. 406). Já no PB, “você”, “se” e “a gente”quase iguais com o
resultado geral das ocorrências (96%) e que o emprego destas formas foi majoritariamente
expresso. Isso pode denotar que a partir do fenômeno de indeterminação do sujeito há uma
aproximação do PA ao PB, no entanto o PST se distancia do PB e se aproxima do PE,
podendo ser justificado pelo mesmo nível de escolaridade dos estudantes e por se tratar de
dados da língua escrita. Já as ocorrências em PGB foram inferiores a 1% dos dados, não
significativos nesta ótica, mantendo mesmo que em percentuais baixos aproximação com o
PE.
A seguir, é apresentado um quadro que revela o percentual de sujeitos nulos,
tomando por base a referência semântica das pessoas do discurso encontradas no corpus do
PGB:
Tabela 24 – Ocorrências de sujeitos nulos e sujeitos plenos a partir das referências semânticas
do sujeito
Pessoa do discurso Ocorrências Percentual/ PR
Suj. nulo Suj.Pleno Suj. nulo Suj.Pleno
Conforme a Tabela 25, podemos notar a expressão inegável dos sujeitos plenos no
PGB, já que a maior incidência está registrada na P4 (89%) e na P6 (78%). Já no PST na
terceira pessoa singular com percentual de 41% e na terceira do plural 8%, para a 1ª pessoa do
singular teremos pouco menos da metade (48%) encotrada no PGB e na 1ª pessoa do plural o
185
resultado segue o entendimento anterior com 46%. Isso pode implicar o distanciamento entre
essas variantes. Ao nos debruçarmos nos dados do PA e PST encontraremos mais uma vez
uma a aproximação entre os contextos produtivos de P4 e P6. Os resultados concernentes a
incidência de sujeitos nulos de terceira pessoa são mais frequentes nas três variantes africanas
do português em estudo (cf. CARVALHO; TAVARES SILVA; ZIOBER, 2017) , também
apontamos que o PGB está mais próximo do PB devido a consistência de sujeitos plenos.
Apesar da pequena diferença entre os resultados de sujeitos nulos no PA e no PST
apresentarem superior ao dos sujeitos plenos, mostrando assim que estas variantes africanas
caminham ao encontro no PE (língua de sujeito nulo consistente46).
Portanto, a análise contrastiva entre a variedade angolana, a são-tomense e guineense
do português aqui realizada revelou diferenças em relação ao fenômeno do sujeito nulo, ao
constatar, aparentemente, que todas as três variedades apresentam um “meio termo”, em ora
se aproximam do PE, ora do PB. Tal oscilação mostra-se altamente relevante para a
caracterização do PSN nas variedades africanas do Português, especialmente, pois incide na
questão da intensa situação de contato linguístico presente nessas variedades.
TOTAL 1.145/1.470 - -
46
Barbosa (1996).
186
plural), assim se distinguindo do PGB. Dessa forma, o contraste entre as variedades denota,
pode ser explicado com base no “estatuto da língua portuguesa em cada país ou região que faz
parte da sociedade lusófona é diferenciado por conta das políticas linguísticas de difusão do
português” (CARIOCA, 2015, p.133).
Esperávamos que a taxa de sujeitos nulos com a terceira pessoa fosse mais produtiva
no PGB, já que no PST e no PA são. Assim, indo na direção do que se tem verificado no PE,
a língua oficial dos três países africanos em análise. Segundo Duarte (1995), o referente da
categoria vazia em posição sujeito pode ser retomado no discurso anterior, enquanto as
demais pessoas são dêiticas, como mostram a seguir:
(100) [5]47 acho um acto de egoísmo ter filhos [...] porque nós não lhes perguntamos
eles querem nascer. (GL5)
(101) [6] Bem, o homem não teve culpa. Atravessa-lhe um homem à frente do carro,
ele parou de repente. Eu vou atrás dele. (IK4)
(102) [7] ... ele quer pescar tudo, quer sempre arranjar taças. E pro tem lido sorte com
isso porque pro já teve três e eu inda tive uma, que foi nesse concurso. A certa altura uma
onda, era um dia de, de chuva e ele apanhou um banho terrível, ficou todo molhado e não
conseguia sair lá de cima, não é? (GK1)
47
A numeração entre colchetes (5-7) segue a numeração dos exemplos encontrada no original (DUARTE, 1995,
p.10).
48
Na escrita, a indeterminação do sujeito se faz em geral com o sujeito nulo de terceira pessoa do plural ou com
o verbo de terceira pessoa do singular seguido do clítico -se (cf. VITÓRIO, 2015)
187
resultados desta pesquisa e o que dizem os estudos, é que na escrita, temos um impasse entre
o que se fala e o que se aprende na escola, o que nos remete a reflexão de Duarte (2013, p. 15)
de que a escrita brasileira “é uma mistura de traços da gramática lusitana [...] somada a traços
do português brasileiro que se implementam aos poucos na escrita, substituindo ou
competindo com formas conservadoras”. Isso também pode ser visto como incidência nas
variantes afriacanas do português em estudo, pois percebemos duas gramáticas: uma
gramática da fala que seleciona o fenômeno e outra da escrita que o elege.
A tabela a seguir sintetiza a distribuição de sujeitos de referência definida plena e
nula para as três variedades africanas:
PA 637/1.180 495/1.180
54% 42%
PST 534/955 420/955
56% 44%
PA 171/306 135/306
56% 44%
PST 58/112 54/112
52% 46%
PGB49 29/29 0/29
100% -
49
Tal resultado requer um estudo de orientação sociolinguística posteriormente, necessitando de uma
escrutinação a partir fatores, como: o tempo verbal, a forma verbal, condicionamentos sociais e linguísticos
(faixa etária e português como L1 ou L2) – ver Duarte (1995).
189
(102) “O reitor disse aos jovens que pro estava contente com um novo começo para
UNILAB”. [PGB39M]
(103) “Os números da população da Guiné dizem que pro são tão elevado para renda
per capita”[PGB08M].
Conforme o quadro 20, podemos notar que os dados que favorecem a incidência de
orações encaixadas são de peso relativo (.54), ao passo que as outras orações apresentam o
desfavorecimento (.32). O tipo de oração, outro fator selecionado, não se mostrou relevante,
pois há um equilíbrio no resultado que favorece tal variável, sendo o PA com pesos relativos:
orações encaixadas (.64) e outras orações (.40). Assim respectivamente, no PST tivemos paras
orações encaixadas peso (.52) e para incidência de outras orações (.35).
Visando ampliar a discussão sobre a produção de sujeitos nulos nos dados escritos do
PGB, centrando nossa atenção na concordância verbal relacionada à P6, haja vista que muitos
estudos apontam que a morfologia de flexão verbal rica pode favorecer o uso desses sujeitos,
tal como observado em línguas como o italiano, o espanhol e o PE (CALAZANS,2018;
BAZENGA, 2015; RUBIO, 2015, 2012; GAMEIRO, 2009)
Romão (2012 apud SANTOS, 2015) verifica, em seu estudo sobre a concordância
verbal no PGB a partir de dados extraídos de textos dissertativos produzidos por alunos
guineenses de graduação da USP, que os casos de ausência de concordância (cf.(188))
observados nesses textos decorrem da influência da língua materna dos falantes, o crioulo
guineense, cuja forma verbal carece dos morfemas número-pessoais e modo-temporais
(CASTRO, 2013), tal como observado para outros crioulos de base lexical portuguesa
(HAGEMEIJER, 2007; MAURER, 2013; CARDOSO, 2015; TIMBANE, 2018):
b. os tuinambás...tinha ido.
c. os franceis fui
Os resultados percentuais, por sua vez, revelam que a concordância verbal com
sujeitos plenos em P6 ocorre em 86% no corpus, o que implica considerar que é um
percentual muito próximo ao que verificam Brandão e Vieira (2012a) para o PB cuja regra é
variável. Assim, pela correlação estabelecida entre esse resultado e a grande produção de
sujeitos plenos na terceira pessoa, portanto esperaríamos mais sujeitos nulos com essa pessoa.
No entanto, parece que há uma forte influência do crioulo guineense, uma língua não-pro-
drop.
50
O conceito de ‘regra variável’ é utilizado para substituir a noção de regra opcional do Estruturalismo, na
medida em que não pressupõe variação livre, mas, sim, sistemática.
192
Tabela 34 – Distribuição dos dados sem marca de plural em P6, segundo o tipo de verbo no
corpus do PGB
Tipo de verbo Ocorrências Percentual Peso relativo
O resultado acima pode ser explicado pelo que defende Romaine (1999) ao observar
que as mulheres possuem mais consciência da pressão exercida pelas normais locais em
relaçãoao uso da gramática padrão e também do status a ser ascendido na sociedade
guineense. Gomes (2016) reflete sobre as funções exercidas pela mulher guineense
A maior parte das funções exercidas pelas mulheres correspondia aos trabalhos
socialmente considerados como tipicamente “femininos” no quadro da divisão
sexual do trabalho. Todavia, houve um esforço notável no sentido de integrar as
mulheres nas estruturas políticas já numa fase mais avançada do processo. A
formação política e técnica das meninas era uma das formas consideradas
importantes para alcançar tal objetivo. Esse objectivo foi, em certa medida,
conseguido. A partir de 1972, algumas mulheres passaram a fazer parte dos órgãos
políticos do PAIGC e dos tribunais populares como membros de júri.(GOMES,
2016, p.82)
Como podemos notar a mulher guineense está inserida num contexto tenso de luta de
sexo, como também em conquista de postos para ocupações de trabalho, delegando-as a
exercer o direito igualitário dentro da sociedade. Cabe ressaltar que mesmo após a luta pela
emacipação, a mulher continua vítima de um cenário de violência doméstica resultante de
práticas desumanas como casamentos forçados e práticas de estupros (ROQUE, 2011). Sua
condição subjulgada favorece a busca pela escolarização como forma emancipatória, talvez
seja por isso que poucas delas chegam ao ensino superior. Por isso, que primar pela forma
padrão da língua seria uma forma de a mulher ascender na sociedade guineense.
Em linhas gerais, sintetizamos aqui alguns fatos que parecem apontar para a
confirmação da hipótese segundo a qual sujeitos plenos tendem a ocorrer mais no PGB pela
possível influência do crioulo guineense que é a língua materna dos falantes:
O português até hoje não é praticamente falado como língua vernácula na Guiné-
Bissau. Ele só é adquirido como língua primeira, materna, por uma insignificante
franja de filhos de guineenses que, tendo estudado em Portugal ou no Brasil,
adotaram-no como língua de comunicação familiar, ou por filhos de casais mistos de
guineenses com falantes de português de outras nacionalidades. É também o caso de
filhos de portugueses residentes na Guiné-Bissau ou, então, de filhos de outros
estrangeiros que por um motivo ou outro falem português em casa.
b) A regra de concordância verbal nos dados escritos do PGB é variável, assim como o
PST. Já o PA por apresentar a CV semicategórica assemelha-se ao PE (BRANDÃO;
VIEIRA, 2012a);
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Levando em conta que este estudo contemplou uma análise contrastiva entre três
variedades africanas do português, a saber: o PA, o PST e o PGB, fez-se necessário o
conhecimento da realidade linguística de cada país, que difere, e muito, do Brasil e de
Portugal. A situação multilíngue dos países africanos em análise implica considerar que as
variedades africanas do português convivem simultaneamente com as línguas étnicas, como é
o caso de Angola, Guiné-Bissau e São Tomé iniciado desde o processo de colonização,
valendo referir que o português em São Tomé tem muito mais status de uma L1 (PEGADO,
2018; GONÇALVES, 2012, 2015; ARAÚJO, 2011, 2013; BRANCO, 2012), ao contrário do
que se observa nos outros dois países em que é considerada uma L2 (ZAU, 2011;
HAGEMEIJER, 2014, BACHMAN, 2014; MANUEL, 2015; GASPAR, 2015; COSTA,
2016)
É certo que independente de seu status como L1 e L2, os dados escritos do PA (3.753
ocorrências) e do PST (4.164 ocorrências) apresentam um comportamento similar: sujeitos
nulos são mais fequentes que os plenos, embora essa frequência esteja abaixo do que é
observado na variedade europeia do português. No caso do PGB (2.875 ocorrêncais),
distancia-se do PA e do PST, pois sujeitos plenos são mais frequentes, aproximando-se muito
mais do PB quando observada a pesquisa de Duarte (1995, 2000). Os resultados
quantittaitovos mostram que o PA tem 48.7% de sujeitos plenos e 51, 3% de sujeito nulo; o
PST, 53% de sujeitos nulos e 47% plenos, em por fim o PGB apresenta um resultado muito
diferente das demais variedades, pois nos mostra 20% de nulos contra 80% de sujeitos plenos,
o que implica dizer que o PGB se afasta muito do que se tem observado para a variedade
europeia do português em que sujeitos nulos são bastante produtivos (LUEGI, 2014;
CAVALCANTE, 2014; CARNEIRO, 2016; CARVALHO, 2017). Para o PGB, parece haver
evidências fortes da influência do crioulo guineense sobre os dados. Isso se deve ao fraco
domínio do português na educação, já que:
os alunos não percebem a língua portuguesa. Leem mas não compreendem o texto,
alguns alunos não escrevem o português correto. Como é que um estudante que não
escreve e nem fala correto à língua portuguesa pode compreender e interpretar um
texto nesta língua? Às vezes compreendem melhor quando a explicação é na língua
crioula, eu já tive essa experiência. Por vezes [...] é preciso desenhar bem as coisas
para fazer alguns alunos compreender em língua portuguesa (BARRETO, 2012, p.
26).
199
igualitário entre homens e mulheres no contexto social e político dessas culturas. Em São
Tomé apesar de assemelhar-se à concepção igualitária de gêneros, os dados ainda ressaltam
maiores índices de escolarização entre os homens.
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