MOREIRA, Erilka Macedo - Onheimorõ - O Judiciário Frente Aos Direitos Indígenas
MOREIRA, Erilka Macedo - Onheimorõ - O Judiciário Frente Aos Direitos Indígenas
MOREIRA, Erilka Macedo - Onheimorõ - O Judiciário Frente Aos Direitos Indígenas
FACULDADE DE DIREITO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
Brasília, 2014
Moreira, Erika Macedo.
Aos Povos Indígenas e aos Movimentos Sociais, pelo exercício da transformação na luta
contínua por justiça e soberania popular. A todas as pessoas e instituições que me
receberam durante o trabalho de campo no cone sul do Mato Grosso do Sul;
A profa. Ela Wiecko Volkmer de Castilho, pela amizade, carinho, atenção e acima de
tudo, pela oportunidade de realizar este trabalho sob sua orientação e aos companheiros/
as, que pela ação coletiva no âmbito do Moitará – Grupo de Pesquisa de Direitos
Étnicos disputam os significados atribuídos aos direitos indígenas, a partir da reflexão e
diálogo com a comunidade acadêmica. Em nome da Aninha, sob pena de esquecer
alguém, digo que este trabalho é nosso!;
Ao CNPq, que através do Edital Universal MCT/CNPq nº 14/2010 – faixa A, permitiu o
desenvolvimento da pesquisa de campo no cone sul do Mato Grosso do Sul. E ao
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada/ IPEA, que pela Diretoria de Estudos e
Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia, e, em parceria com Conselho de
Justiça Federal, oportunizou parte da pesquisa de campo no cone sul do Mato Grosso do
Sul, através da pesquisa Acesso à Justiça Federal: dez anos de Juizados Especiais;
A Federação dos Trabalhadores da Educação do Estado do Mato Grosso do Sul/
FETEMS, pela sensibilidade e acolhida durante parte do trabalho de campo;
A família Nasser Farah Serra Dourada, Renata, Marcel e Caio, pelo pouso certo e
contínuo ao longo das idas e vindas à Brasília;
As muitas mulheres maravilhosas, amigas e companheiras que todos os dias
compartilham os desafios de ser mulher nesta sociedade machista e patriarcal: Fernanda
Vieira, Mari Trotta, Aninha, Rani, Meiroca, Elenízia, Raquel, Maria José, Renatinha,
Célia, Rosana, Joana, Maíra e Naná, obrigada pelas múltiplas contribuições neste
trabalho e na vida;
Aos companheiros do Cerrado Assessoria Jurídica Popular, Dick, Shape, Marcel,
Cleuton, Junior Fidelis, amigos-irmãos de caminhada, em nome de todos e todas
advogados/as populares que estão pelo Brasil à fora incendiando corações e mentes pela
democratização da justiça;
A minha mãe de sangue, Julinha e minhas mães de adoção, Hildete e Ana Motta, pelo
exemplo de luta e amor incondicional, mesmo diante das ausências, em nome das
nossas famílias, Elvis, Juliana, Nicolas, Patrícia, Vitor, Rafael, Davi, Camila, Helena,
D. Adélia, Vovô. Ao meu pai, Zezinho, que marca meu jeito de ser, às vezes
fisicamente distante, mas sempre juntos!;
Ao Wilson Wood, pai, amigo e irmão, pelos sonhos compartilhados e construídos desde
a graduação;
A profa Simone Pinto, em nome dos diversos pesquisadores e interlocutores pelas
contribuições, debates, diálogos e desconstruções oportunizadas, em especial, na
disciplina de Estudos Multiculturais, no âmbito do Ceppac/ UnB;
A todos os técnicos administrativos e a coordenação da Pós Graduação em Direito da
Faculdade de Direito da UnB, em especial, a Lia, Walgmar, Helena, Eliseu, João,
Argemiro, Cristiano Paixão, Menelick, Claudia, Juliano, que com paciência, solicitude e
responsabilidade, conduzem o programa;
Aos professores, técnicos, egressos, estudantes, amigos do Câmpus da Cidade de Goiás/
UFG (agora Regional Goiás), em especial à equipe executiva da Pós-Graduação de
Direitos Sociais do Campo e do Observatório Fundiário Goiano (OFUNGO): Allan,
Rosana, Torres, Rani, Murilo, Cleuton, Meire, Juliano, Cláudio, Emília, Neto, Renato,
Pedro, Dagmar, Joao Vitor, Barbarela, Sinara, Jordana, Rani, Cássia, Lourentino,
Eunice e Thalita;
Aos irmãos e irmãs do Ilê Axé Fara Imora ti Odé e ao nosso babalorixá Marcos Torres ti
Odé, pela possibilidade de conhecer e vivenciar outras lógicas de relacionamento e
entendimento;
Aos irmãos e irmãs do Grupo Meninos de Angola, Leleca, Rafael, Pedro, Murilo,
Stênio, Kiaia, Cláudia e nosso mestre Chuluca, que nos ensina que ser angoleiro é muito
mais do que um rótulo;
Ao Cleuton, meu amor e minha vida, pelos anos compartilhados e as superações
vividas!
RESUMO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................... P. 10
ANEXOS
I – Dispositivos Constitucionais Relacionados aos Direitos Indígenas .................. P. 259
II – Representantes Legais MS, 2011 ..................................................................... P. 261
III – Síntese Quantitativa Categorias STF, 2013 .....................................................P. 263
IV – Síntese Quantitativa Categorias STJ, 2013...................................................... P. 265
V - Síntese Quantitativa Categorias TRF1, 2013...................................................... P.266
VI – Síntese Quantitativa Categorias TJ/MS, 2013 ................................................. P.272
ABREVIATURAS
TABELAS
GRÁFICO:
Organograma da Estrutura do Judiciário, 2013 ....................................................... p. 112
Subdivisão temáticas_STF ...................................................................................... p. 127
Subdivisão temáticas_STJ ....................................................................................... p. 128
Subdivisão Temática_TRF1 .................................................................................... p. 129
Demanda Regional TRF1_desenvolvimento .......................................................... p. 144
Tipos de Crimes_indígenas presos na Penintenciária Harry Amorin Costa ............ p. 207
Assassinatos Indígenas no Brasil_2012 ................................................................... p. 210
A morte de mais um líder de projeção nacional leva a nós, índios, a refletir
profundamente a nossa situação presente. É uma morte perigosa, a refletir e a analisar
e a tirar conclusões muito preciosas sobre a luta dos índios nos dias atuais. Porque o
índio, para muitos brasileiros, é objeto de chacota, de graça, de palhaçada. Para
outros, o índio é um beberrão, preguiçoso, maltrapilho, vagabundo, um ladrão que não
presta para nada. Para outros, minha gente, para os que estão no poder, para a gente
que tem interesse nas terras dos índios, para esses, o índio não é palhaço, não é peça
para chacota. Para esses, o índio é empecilho para o avanço de sua ganância.
Esperamos contar com a colaboração do povo brasileiro, do povo sofrido, como nós,
indígenas, para mudar essa situação.
Daniel Cabixi. Líder desaparecido no ato público de repúdio à morte de Marçal
Guarani, em Dourados (MS), em 03/12/1983.
INTRODUÇÃO
1
Segundo Kymlicka (1996), através das políticas assimilacionistas esperava-se que „o outro‟ abandonasse sua
cultura distintiva e fosse gradualmente incorporando a cultura. Já a teoria do mosaico étnico, buscava a integração das minorias
culturais sem justaposição. A teoria do melting-pot apregoava que todos tinham espaço, mesmo não se integrando.
11
busca pela manutenção dos valores e práticas vinculadas aos saberes tradicionais, ao
mesmo tempo em que os Povos Indígenas absorvem e incorporam os valores e práticas
das sociedades dominantes. No mesmo sentido, João Pacheco de Oliveira (2004) nos
remete ao conceito de “índios misturados”, a partir da narrativa do processo de
territorialização e dos fluxos culturais e migratórios estabelecidos no nordeste brasileiro:
“cada grupo étnico pensa a “mistura” e afirma-se como uma
coletividade precisamente quando dela se apropria segundo
interesses e crenças priorizados. A idéia de “mistura está
presente também entre os próprios índios, sendo acionada
muitas vezes para reforçar clivagens faccionais” (PACHECO
DE OLIVEIRA, 2004, p. 28).
2
Nesse sentido, defendemos que no âmbito da sistemática constitucional atual, o
conjunto normativo expresso na CF/88 sobre os direitos indígenas (vide ANEXO I), a
partir dos paradigmas da interculturalidade e da diversidade cultural, devem ser
interpretados, com vistas a ampliar e atualizar a dimensão comunitarista da CF/88,
reconhecendo o pluralismo normativo, apesar de não estabelecer expressamente o
pluralismo jurídico e a jurisdição especial indígena, conforme veremos adiante.
12
O título surgiu após o trabalho de campo no Cone Sul do Estado do Mato Grosso
do Sul, quando um advogado indígena, filho de pai Terena e mãe Guarani, nascido na
Reserva de Dourados, município de Dourados, compartilhava suas lembranças de
infância e explicava as múltiplas dimensões das interferências do Estado. Dizia ele, que
na língua guarani, um kaiowa falando, ele identificava o intermediário: “ONHEMOIRÕ
é uma palavra profunda, que quer dizer algo que se coloca entre mim e o que desejo,
entre mim e aquilo que eu desejo com a alma, almejo, como se fosse um espírito,
imaterial”. Assim, na perspectiva de Wilson Mattos, “o Estado atua como se fosse esta
interferência, atuando entre o desejo dele e o seu próprio eu” (MATTOS, 2011). A partir
dessas palavras, e considerando todo o material empírico da pesquisa, a proposta é
demonstrar como o judiciário brasileiro, considerando as diferentes instâncias
processuais, atua como esta zona de interferência, como ele recepciona ou considera os
direitos dos povos indígenas previstos na CF/88.
3 Para DUSSEL(1993), o „outro‟ não foi descoberto, e sim en-coberto, como o não europeu. Para CASTRO GOMES (2005), o
„outro‟ é fruto da invenção do europeu, devendo ser abordado enquanto processo de produção material e simbólica.
14
4
Compreendemos o conceito de acesso à justiça em sua dimensão alargada,
como nos ensina José Geraldo de Sousa Júnior (2008, 2009).
15
5
De acordo com Dallari (2010:8): “No judiciário o passado determina o presente,
influindo tanto na forma das solenidades, rituais e dos atos de ofício quanto no conteúdo
de grande número de decisões. Esse é um dos principais motivos pelos quais há
evidente descompasso entre o Poder Judiciário e as necessidades e exigências da
sociedade contemporânea”.
16
por outro lado, pela lógica interna das obras jurídicas que
delimitam em cada momento o espaço dos possíveis e, deste
modo, o universo das soluções propriamente jurídicas
(BOURDIEU, 2004, p. 211).
6
Nesse sentido, ao utilizarmos se por ventura o leitor se deparar com a palavra
evolução, esclarecemos de ante mão que trata-se uma menção ao processo histórico, que
pode ou não justificar um quadro evolutivo, mas não biologizante.
17
A sociologia nos ensina que a sociedade é uma abstração criada para fins
práticos de representação do espaço onde se realizam os processos de socialização e
concretização dos interesses e conteúdos das relações humanas.
merece atenção daqueles que pretendem falar de forma comparada sobre as bases
culturais do direito. Portanto, as sensibilidades jurídicas referem-se, assim, a capacidade
de compreender o saber local, “o complexo de caracterizações e suposições, estórias
sobre ocorrências reais, apresentadas através de imagens relacionadas a princípios
abstratos (GEERTZ, 1998, p. 325)”. Segundo o autor, as sensibilidades jurídicas
traduzem um conceito de justiça específico, um sentido de direito particular a cada
cultura, variando conforme o “saber local”. Tais sensibilidades são formadas pelo
agrupamento de uma série de eventos, métodos e formas de conceber as situações de
tomadas de decisão/ produção das leis, regulamentos, políticas, costumes, crenças,
sentimentos, símbolos, procedimento e conceitos metafísicos.
No entanto, o próprio autor alerta para o fato de que a identificação das TEaR
não permite uma avaliação sobre a legitimidade de um sistema jurídico/político. O seu
significado dependerá da amplitude das relações afetadas pelas respectivas tendências,
bem como de seu significado correspondente no contexto do sistema social específico
como um todo – o que impõe uma pesquisa mais ampla.
caminha as decisões, diante dos conflitos interculturais, de acordo com as três correntes
analíticas: liberalismo puro, interculturalismo radical e liberalismo intercultural
(MALDONADO, 2006).
sala de audiência, sempre havia também um servidor para contribuir na busca pelos
processos judiciais9.
9
Nesse sentido, vale destacar que o sistema eletrônico pode servir como poderoso
instrumento na identificação dos processos. Digo que pode servir, porque hoje não há
qualquer sensibilidade para identificar os conflitos que envolvem os índios. O filtro do
sistema – ou seja, as palavras chaves – estão organizados por eixos temáticos, que são
os crimes em espécie, p.e., violência doméstica, homicídio, etc, que permitem
identificar o quantitativo e a localização física do processo na vara específica. Outra
informação importante refere-se aos processos digitalizados e os que são
definitivamente virtuais. No caso dos processos na justiça federal, em Dourados,
consegui realizar a análise dos mesmos do quarto do hotel, me dirigindo ao fórum
apenas para conversar com a juíza e perceber um pouco a dinâmica de funcionamento
das varas. Cada qual com a sua sistemática de organização própria.
10
Já que além dos atores processuais, também mantive relação com outros informantes
como antropólogos, pesquisadores, assistentes sociais, além é claro, dos noticiários
televisivos, impressos e populacionais (mototaxistas, vendedores, comerciantes, etc).
28
11
Vale destacar que atualmente existem cerca de 15 mil índios em Campo Grande,
localizados nos bairros/ aldeias: Indo Brasil, Tiradentes, Tarcísio Amaral, Água Bonita,
e que a CUT vem desenvolvendo trabalho de organização deste coletivo.
12
Durante o período do doutoramento tive a oportunidade de participar de outro projeto,
vinculado ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada / IPEA e o Conselho da Justiça
Federal/ CJF, sobre Acesso à Justiça e os 10 anos dos Juizados Especiais Federais, nos
Juizados Especiais Federais em 10 municípios dos Estados do Paraná, São Paulo e Mato
Grosso do Sul, que também viabilizou uma ida a mais à campo, no mês de Março de
2012, além de um apanhado sobre a incidência da questão indígena nas comarcas
visitadas. Nesse sentido, as pesquisas de campo permitiram perceber que na dinâmica
interna de funcionamento das secretarias, embora a demanda esteja presente e seja
resgatada pela memória dos técnicos administrativos, não há qualquer procedimento de
diferenciação na organização e identificação dos processos que tenham indígenas como
partes processuais.
29
A primeira parte do trabalho está dividida em dois capítulos que procuram situar
o leitor nos marcos teórico-metodológicos do trabalho. O primeiro capítulo,
INVENÇÃO DE UM MODELO: INVASÃO E COLONIALIDADE NA FORMAÇÃO
POLÍTICO TERRITORIAL procura demonstrar, a partir do resgate histórico da relação
entre Estado e Povos Indígenas, como se desenvolveu a Usurpação das Terras e das
Gentes, nas palavras de Carlos Frederico Marés13. O objetivo é evidenciar como as
13
Durante Aula Inaugural da Turma de Pós-Graduação Lato Sensu Direitos Sociais do
Campo/ UFG – CCC, em 13 de Julho de 2013. Disponível em
http://www.youtube.com/watch?v=YZ82LkGQFgs.
30
pelos atores jurídicos que atuam diretamente nas demandas judiciais. Além de apontar
para outro conjunto de conflitos que não aparecem diretamente nas instâncias
superiores, uma vez que a dinâmica de funcionamento da Justiça Estadual apresenta
limites estruturais na relação com os Povos Indígenas.
14
Expressão utilizada para designar as políticas de segregação racial,
especialmente desenvolvidas após a abolição da escravatura.
33
15
Leslie Bethel (2004:131) sugere 5 milhões e indígenas na Bacia Amazônica.
16
Segundo pesquisadores estudiosos da área lingüística, “existiam no Brasil
em 1500 entre 1.200 e 1.500 línguas indígenas (…) Destas, somente 180 ainda
são faladas hoje e delas mais de 40 estão ameaçadas de extinção em curto
prazo por número reduzido de falantes, baixa transmissão às novas gerações e
poucos velhos que as dominam” (BANIWA, 2006, p. 117).
34
17
Neste sentido, importa destacar que o modelo português de colonização
difere do modelo espanhol, adotado no restante da América, conforme
podemos ver em Ribeiro, 1994.
35
18
Além das guerras que se desenvolviam na costa é importante mencionar que o
interior, “os sertões”, também sofriam toda má sorte das intervenções. De acordo com
Grünewald (1993:24), “o chamado “Sertão de Rodelas” era povoado de inúmeros povos
indígenas: Pancararu, Rodel, Tushá, Huanoi, Shocó, Cariri, e sofria repetidas invasões
da Casa da Torre”.
37
19
Batista (1992:41) aponta a presença dos curraleiros e dos missionários, como os dois
agentes constitutivos do conflito durante a conquista do sertão de São Francisco, no
interior da Bahia. Na p. 53 a autora traz tabela informativa sobre os 28 aldeamentos
existentes ao longo do Rio São Francisco, aos finais dos séculos XVII, XVIII e XIX.
20
“A insurreição dos bárbaros ocorreu entre Sento de Sé e o rio Verde, onde os
caboclos ribeirinhos tinham assassinado vaqueiros, queimados as casas, dispersado os
gados. O alarme da revolta estendia-se a Pernambuco e Ceará, descendo da Bahia e
girava pelo Sertão – e os moradores agrupados se defendiam por detrás dos caiçaras.
Em 1673, alguns grupos indígenas da margem esquerda do rio se amontinaram,
revoltados pelo processo desenvolvido pelos curraleiros, onde buscava-se obter
territórios e mão-de-obra escrava, as custas dos indígenas” (BATISTA, 1992, p. 58).
21
Segundo Calmon (apud BATISTA, 1992, p. 55), “a chamada Confederação do Cariri
a verdade nunca houve, pois o que assim se chamou, foi um momento de desassossego e
revolta isolada por que passou diversos grupos localizados na região sob o domínio da
Casa da Torre”.
38
Apesar dos prejuízos causados aos índios pela política de aldeamento, Almeida
(2010: 73), lança um outro olhar sobre as estratégias de sobrevivência e luta dos
indígenas diante da política colonial. Além de ter direito sobre o seu território, as
aldeias22 são vistas como espaço de sobrevivência e possibilidade de reelaboração de
sua cultura e identidade étnica23. Como os aldeamentos jesuíticos não supriam as
expectativas dos colonos particulares e dos administradores coloniais, como Mem de Sá
e Jerônimo Leitão, as expedições militares, através do recurso às guerras justas, além de
buscar derrotar os focos de resistência no litoral (em especial dos Tupinambás), visavam
resgatar e produzir novos escravos para trabalhar na economia açucareira (MONTEIRO,
2005, p. 107). Além de preparar para os hábitos da nova civilização, a evangelização,
através dos missionamentos, cumpria também o papel de controlar do mercado de mão
de obra indígena:
22
Importa re-lembrar que a definição do espaço e do território em „aldeias‟ é
ficção da política colonizadora. No caso do povo indígena guarani, sua
reivindicação é pelo tekoha: espaço de construção dos seus modos de vida. Um
outro exemplo é o caso dos Pankararu, em que sua territorialidade é formada a
partir de uma rede de relações dos grupos indígenas do Médio e Baixo São
Francisco (ARRUTI, 2004, p. 231).
23
Portanto, a identidade étnica é categoria que se entende a partir da análise
das estratégias de sobrevivência e reivindicação de direitos, onde as
adaptações sociopolíticas extrapolam os marcos tradicionais da eticidade, da
soberania, da nação e do Estado.
39
Esta situação se agrava ainda mais, quando em 1833, ocorre a junção da tutela
individual, relacionada ao trabalho, com a tutela coletiva, relacionada às terras, no
mesmo incumbente, o Juiz de Órfãos. Este passa a ser o administrador de todos os bens
pertencentes aos índios. Situação esta que perdura, em caráter de transitoriedade, até
1928, quase 100 anos depois, quando extinta pelo Decreto nº 5.484, de 27 de Julho. Vale
destacar que, com o regulamento das Missões, promulgado pelo Decreto nº 426, de 24
de Junho de 1845, a administração das aldeias ficou novamente a cargo dos diretores
dos índios, que serviam também como seus procuradores. Por sua vez, estes tiveram
seus poderes ampliados para também realizar o registro das terras dos aldeamentos. Este
regulamento estabelece diretrizes administrativas para o governo dos índios aldeados.
Prolonga o sistema de aldeamentos e explicitamente o entende como uma transição para
assimilação completa dos índios.
Para a autora, a palavra civilização está relacionada a uma ação autoritária, com
intencionalidade educadora, no sentido de uma transformação das bases da organização
social e cultural dos povos amazônicos. Desta forma, a construção da civilização está
24
Vale dizer que o juízo da incapacidade aparece também como resposta à
resistência cultural dos índios de manter seus hábitos, costumes e tradições,
apesar da ofensiva colonizadora e opressora.
42
organização das missões e catequese dos índios. Com o Ato Adicional de 1.834, Pedro I,
estendeu às Assembleias Legislativas Provinciais a competência para promover,
cumulativamente com a Assembleia e os Governos Gerais, a catequese e civilização dos
indígenas e o estabelecimento de colônias (Art. 11º, § 5º). Será a primeira constituição a
abordar a temática indígena e também a primeira a conceder às oligarquias locais a
prerrogativa de legislar sobre o tema. Os debates que se seguiram ao longo do Império
entre Senadores anti-indígenas e influentes políticos da época, procuravam enquadrar os
índios numa condição de inferioridade natural.
25
A defesa dos direitos indígenas pelos positivistas aparece em recortes de jornal dos
anos de 1908, quando se pretendia construir uma estrada de ferro e afetar o território
dos selvagens, ou quando reivindicam a demarcação das terras indígenas: “A primeira
medida consiste em demarcar honestamente as terras ocupadas pelos selvagens e de ora
avante respeitar as nações selvagens como a quaisquer outras independentes, visto que o
são perante a moral e a razão. Os povos americanos são meros uzurpadores, conforme
nobremente proclamou o velho José Bonifácio” (R. Teixeira Mendes, Em Defeza dos
Selvagens Brazileiros. Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brazil, 1910, pp. 13-14,
grifos do original). Em 1890, o Apostolado Positivista apresentou à Constituinte de uma
proposta que reconhecia expressamente a soberania indígena, in CARNEIRO DA
CUNHA, 1987, p. 71.
44
Com a virada do século, inicia uma nova fase na administração indigenista pelo
Governo central. No ano de 1906, a catequese e a civilização dos índios voltam ser de
responsabilidade do Estado, já que o Decreto nº 1.606, de 29 de Dezembro de 1906
estabelecia a competência desta ação ao Ministério dos Negócios, Agricultura, Indústria
e Comércio. Quatro anos depois, com o Decreto nº 8.072, de 20 de Junho de 1910, o
Governo cria o Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores
Nacionais – SPILTN (SPI). É importante destacar que a criação do órgão é uma resposta
do Governo à denúncia internacional de massacre de índios: “a denúncia foi feita em
Viana, diante do XVI Congresso de Americanistas” (CARNEIRO DA CUNHA, 1987,
p.79). Com a criação do SPI, pelo Decreto nº 8.072, de 20 de Junho de 1910, a questão
das terras indígenas passou a ser atribuição deste órgão, que foi fundado vinculado ao
Ministério da Agricultura, depois, remanejado para a pasta do Trabalho, Industria e
Comércio, e depois para o Ministério de Guerra, em 1934. Voltou ao Ministério da
Agricultura em 1939, onde permaneceu até sua extinção em 1966 (CARNEIRO DA
CUNHA, 1987, p. 80).
III – os silvícolas.
§ único – os silvícolas ficarão sujeitos a regime tutelar,
estabelecido em leis e regulamentos especiais, o qual cessará à
medida que se forem adaptando à civilização do país.
28 Nesse sentido, para as duas últimas dimensões vale destacar, respectivamente, os registros de Georg Simmel (1998) sobre o
papel e o impacto da formação das cidades a subjetividade; e, os estudos de Todorov (1988) sobre a importância da linguagem na
constituição das estratégias de dominação dos colonizadores frente aos impérios organizados que ocupavam.
29 Para Lander (2005), diante da re-estruturação produtiva do capital (estimulando e comercializando as diferenças), migramos do
poder disciplinar da era moderna, para o poder libidinoso, uma vez que a globalização traz novas formas de controle, poder e
autoridade, mas não permite que o Estado organize a vida social (disciplinando o tempo, o corpo e os valores). Ao contrário, ela
produz novos bens simbólicos, subjetividades próprias sem que haja necessariamente a idéia de oposição ao sistema.
51
tempo, não linear, como na idéia de progresso; e, nem cíclico, como da tradição. O
tempo arqueológico é pautado pela emergência de novas subjetividades culturais, não
ocidentais, que se orienta pela valorização das temporalidades promovidas pela
diversidade cultural.
30 Para Murilo de Carvalho, os direitos sociais de cidadania não foram resultados da luta política dos movimentos sociais
organizados. Era antes o resultado da “benevolência” do Estado.
31 Expressão utilizada por Wanderley Guilherme dos Santos para fazer menção ao status de cidadão atribuído à todos aqueles que
correspondessem as ocupações estabelecidas na lei. Assim, a carteira de trabalho, tornou-se o instrumento cívico para o cidadão
regulado.
54
direitos que já existiam antes mesmo da formação do Estado, ela é de pouca utilidade. É
preciso conceber uma cidadania diferenciada que não seja imposta, mas escolhida e que
não oblitere as aspirações dos Povos Indígenas. É preciso também aceitar que a
integração dos direitos próprios dos indígenas na arquitetura mesma do Estado pode
contribuir para o enriquecimento da cidadania não indígena. Para que isso aconteça, no
entanto, é necessário reverter a lógica colonialista do Estado e abrir os olhos para esse
processo que os movimentos indígenas da América Latina chamaram de descolonização
(MALDONADO-TORRES, 2007).
32
Para Aníbal Quijano (1992), a “colonialidade do poder” está na manutenção dos
elementos constitutivos do padrão mundial de poder capitalista, pautados nas relações
de dominação e classificação racial/étnica da população do mundo e que opera em cada
um dos planos, materiais e subjetivos, da existência social cotidiana.
57
Portanto, pensar a questão indígena hoje, e sua relação com o poder judiciário,
implica reconhecer que continuamos a reproduzir os mesmos valores e conceitos da
visão estereotipada e excludente da modernidade, para subverter o poder da
colonialidade e do imperialismo pondo em questão a realidade sociopolítica do
neocolonialismo, refletida nos modelos do Estado, da democracia e da cidadania, em
especial, na relação com os povos indígenas. Pressupõe também desmontar as outras
estruturas de poder e de controle das ideologias e das formas de conhecimento que
continuam produzindo desigualdade.
1.2. A questão agrária e a usurpação da terra/ território indígena
Sérgio Sauer, apoiado em José de Sousa Martins, aponta que a questão agrária
no Brasil remonta pelo menos ao século XIX com a abolição da escravatura e a criação
da Lei de Terras de 1850, devido ao disciplinamento legal que verdadeiramente instituiu
59
a propriedade privada da terra no país, impedindo “o acesso à terra àqueles que não
podiam comprar, forçando os pobres livres, inclusive os imigrantes europeus, a
trabalhar para os grandes proprietários (SAUER, 2010:45)”. Todavia, conforme se verá,
a questão da propriedade da terra no Brasil, portanto da questão agrária, retroage às
primeiras incursões do sistema colonialista na América, com todo o aparato bélico: lei,
armas e religião. Assim, quando se fala em questão agrária, é preciso atentar,
primeiramente, para um componente estrutural, como “conjunto de interpretações e
análises da realidade agrária que procura explicar como se organiza a posse, a
propriedade, o uso e a utilização das terras na sociedade brasileira (STÉDILE, 2005, p.
17-18)”. Conforme relata Mattos Neto (2006: 98):
Apesar da legislação colonial assegurar o domínio pleno dos índios sobre seus
territórios e sobre as terras que lhe são alocadas nos aldeamentos, conforme as Cartas
Régias de 30 de Julho de 1609 e de 10 de setembro de 1611, ou mesmo o Alvará de 1º
de Abril de 1680, que declara que as sesmarias concedidas pela Coroa Portuguesa não
podiam afetar os direitos originais dos índios sobre suas terras: “Primários e naturais
senhores” de suas terras eram enquanto tais isentos de qualquer foro ou qualquer tributo
sobre elas (CARNEIRO DA CUNHA, 1987, p. 58)”.
Mesmo com esta e tantas outras legislações que demonstram que a colônia
reconheceu a soberania e os direitos territoriais dos índios do Brasil, o que a
historiografia demonstra é que o esbulho das terras indígenas foi contínuo à base de
muito sangue.
A missão principal era a defesa da costa e a pesquisa de metais preciosos. A ele próprio
foram concedidas, diretamente pelo Rei D. João III, cem léguas e a seu irmão, Pedro
Lopes, cinqüenta. O Rei, aos 28 de fevereiro de 1532, encarregou seu capitão-mor de
dividir o litoral do Brasil, de Pernambuco ao Rio da Prata, em 12 partes, que se
chamaram capitanias hereditárias, medindo cada uma delas cinqüenta léguas de costa,
doadas aos capitães desbravadores. Estes eram portugueses, altos funcionários da corte,
homens de posses, que tinham influencia política e que dispunham de recursos para uma
aventura nada comum, ou seja, vir para um lugar distante e iniciar as atividades de
exploração em outra terra.
Já entre as primeiras concessões de D. João III aos donatários
das capitanias brasileiras figura a de poderem “cativar o gentio
que quisessem para o seu serviço”, e mesmo a de levarem alguns
para o Reino. “Reduzir” o gentio, tornou-se a palavra de ordem
dos colonos. Logo de início lograram atrair algumas tribos
menos hostis, que vieram quase espontaneamente colaborar
como eles na obra da colonização, engajando-se como
trabalhadores nos engenhos e nas fazendas. Mas, nem sempre
foi tão fácil a tarefa. Os processo brutais empregados pelos
portugueses para forçarem os indígenas ao trabalho (PRADO
JÚNIOR, 1977, p.24)
33
Não podemos deixar de considerar o impacto das ações de resistência indígena, “os
índios hostis desafiavam ou mesmo impediam a expansão das fronteiras portuguesas.
Foram eles os principais responsáveis pelo malogro da maioria das capitanias do Século
XVI (ALMEIDA, 2010, p. 45)”.
63
O último latifúndio típico a surgir no período sesmarial foi a fazenda de café, que
teve apoio do Governo para a sua constituição, inclusive a criação de várias sesmarias,
principalmente daquelas que não estavam exploradas. Nascia, portanto, a forma
“plantagem” de organização da produção escravista, cujas características Jacob
Gorender (1976) aponta: 1) Especialização na produção de gêneros comerciais
destinados ao mercado mundial; 2) Trabalho por equipes sob o comando unificado; 3)
Conjugação estreita e indispensável, no mesmo estabelecimento, do cultivo agrícola e
de um beneficiamento complexo do produto; e 4) Divisão do trabalho quantitativa e
qualitativa.
No entanto, neste ínterim, vale destacar que, quando o Ato Adicional de 1834
permitiu às Assembléias Provinciais legislarem, os povos indígenas perderam
sumariamente suas terras, que passaram aos domínios do poder político local. Nesse
sentido, Carneiro da Cunha demonstra que as terras indígenas sofreram um processo
contínuo de esbulho territorial, através de diversos mecanismos:1) deslocamento e
concentração de grupos indígenas, 2) formação de “hordas selvagens” em territórios
reduzidos para depois transformá-los em aldeamentos e destituídas de caráter
imemorial, 3) arrendamento ou aforamento de terra dentro dos aldeamentos, 4) pressão
sobre as câmaras municipais para obter os terrenos dos índios.
Maria Regina Celestino de Almeida (2010: 154 e ss) descreve a ação dos
estados, através de circulares aos Presidentes de Províncias, na busca por informações
que pudessem ser justificadoras da extinção de alguns aldeamentos, como as alterações
populacionais, nos ramos da agricultura, as medições das terras, a quantidade de índios
66
puros, o gozo de alguns direitos. Entre outros casos, ela narra a situação da aldeia de
São Lourenço, que além de extinta em 1866, teve os índios, que um ano após
reivindicavam as terras, declarados como inexistentes pelas autoridades locais:
Mesmo sem amparo legal, já que nem as terras dos “aldeamentos extintos”, nem
as terras imemoriais indígenas, podiam ser consideradas devolutas, uma vez que
pertencentes ao indigenato; criou-se uma situação de certa ambiguidade e contradição, e
para resolver a “confusão” criada e tentar frear a violência contra os aldeamentos,
alguns estados regulamentaram a questão reconhecendo títulos originários às terras
indígenas. De todo modo, a política do aldeamento, estimulada pela Lei de Terras (que
através do art.12 determinava que fossem reservadas terras devolutas para a colonização
dos índio), e, pelo Regimento das Missões de 1686 (que determinava que os
aldeamentos fossem constituídos nos próprios territórios dos índios); marcou o processo
de perda dos territórios dos índios.
34
De acordo com José Afonso da Silva (apud , TOURINHO NETO, 1993, p.
13)“O indigenato é a fonte primária e congênita da posse territorial; é um direito
congênito, enquanto a ocupação é título adquirido. O indigenato é legítimo por
si, não é um fato dependente de legitimação, ao passo que a ocupação, ao fato
posterior, depende de requisitos que a legitimem”.
68
império frustrou-se em todos os seus objetivos mais fundamentais. Por outro lado,
diante das terras indígenas, foram utilizadas todas as estratégias possíveis para burlar a
lei e tomar posse de suas terras. Posseiros e grileiros avançaram sobre as terras, sob o
argumento de que não havia mais indígenas, pois confinados em aldeamentos – que
depois foram extintos -, miscigenados e aculturados, eles já não eram mais índios.
Desta forma, a Lei de Terra e seu Regimento apresentavam também esta
perversidade: de um lado desenvolvia a política indigenista mediante os aldeamentos e
descimentos, estimulando a catequização e a conversão à civilização, de outro, retirava
seus direitos:
Com isto, grande parte dos conflitos surgidos logo depois da proclamação da
República tem origem na manutenção e aprofundamento deste sistema fundiário. O
Código Civil, elaborado no final do século XIX, mas somente aprovado em 1916, com
vigência a partir de 1917, é um bom exemplo das ideologias dominantes. A terra
continua sendo um importante fator de status e poder garantindo a formação de currais
eleitorais e a própria manutenção dos grupos dominantes no Governo.
Nesse sentido Fábio Konder Comparato (apud Moraes, 1987:50), leciona que:
Até o século XIX não havia um conceito unitário de
propriedade no Ocidente. Coexistiam várias situações ditas de
propriedade, de diversas naturezas e regimes diferentes: o
domínio sobre bens públicos, bens de Coroa ou bens
particulares; privilégios e regalias nobiliárquicas; créditos e
pretensões ligados à terra, como censos, foros e laudêmios (...).
70
35
Vale lembrar que a quebra da bolsa de valores produziu uma grande crise econômica,
especialmente para os produtores que abasteciam o mercado externo, produzindo uma
reestruturação do poder político-econômico no Brasil. Para Caio Prado Jr (1969: 18),
“muitos estabelecimentos agrícolas à agricultura comercial foram divididos e
subdivididos, passando a produzir basicamente gêneros alimentícios, através da
utilização quase que exclusivamente da força de trabalho familiar”.
71
contrariando a EC/69:
Art.4º – Incluem-se entre os bens da União (…)
IV – As terras ocupadas pelos Silvícolas;
Art.8 – Compete a União:
XIII – Legislar sobre: (…)
o) nacionalidade, cidadania e naturalização; incorporação de
silvícolas à comunhão nacional;
Art.198 – As terras habitadas pelos silvícolas são inalienáveis
nos termos que a lei federal determinar, a eles cabendo a sua
posse permanente e ficando reconhecido o seu direito ao
usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades
nelas existentes.
§ 1º – Ficam declarados a nulidade e extinção dos efeitos
jurídicos de qualquer natureza que tenham por objetivo o
domínio, a posse ou a ocupação de terras habitadas pelos
silvícolas;
§ 2º A nulidade e extinção de que trata o parágrafo anterior não
dão aos ocupantes direito de ação ou indenização contra a
União e a Fundação Nacional dos Índios. (Carneiro da Cunha,
1987:98).
36
Em 1983, Marçal de Souza foi assassinado. Depois de idas e vindas, duas
absolvições pelo Juri local, o processo foi declarado nulo pelo Supremo
Tribunal de Justiça em 2001, que reconheceu a Justiça Federal como
competente para cuidar do feito. No âmbito do RE 270379 / MS, relatado pelo
Min. Mauricio Correa, restou assim decidido: EMENTA: RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL. HOMICÍDIO
PRATICADO CONTRA INDÍGENA EM RAZÃO DE DISPUTA DE TERRAS.
COMPETÊNCIA: JUSTIÇA FEDERAL. 1. A Constituição Federal, em seu artigo
231, impõe à União o dever de preservar as populações indígenas, preservando,
sem ordem de preferência, mas na realidade existencial do conjunto, sua cultura,
sua terra, sua vida. 2. Sendo a vida do índio tutelada pela União, é competente a
Justiça Federal para processar e julgar crime praticado contra a vida do índio em
razão de disputa de terras, não estando a Justiça Estadual, na presente ordem
constitucional, legitimada a conhecer da ação penal proposta. 3. Delito praticado
na vigência da Emenda Constitucional nº 01/69. Denúncia validamente recebida
em setembro de 1988. Promulgação da Constituição Federal de 1988.
Incompetência superveniente da Justiça Estadual. Deslocamento do processo à
Justiça Federal. Recurso extraordinário conhecido e provido, para anular o
processo a partir do interrogatório, inclusive. No entanto, vale destacar que o
extinto Tribunal de Recursos, em 1985, havia determinado a competência da
justiça estadual
74
Para consolidar a UNI, houve uma reunião em Campo Grande, entre os dias 6 e
7 de Setembro de 1980. No mês de setembro de 1980, ocorria em Brasília a segunda
reunião de entidades de apoio aos povos indígenas, já que o governo tinha grande
interesse em mudar o Estatuto do Índio, introduzindo a figura da emancipação:
O indígena que tivesse prestado o serviço militar, que possuísse
título de eleitor, que tivesse capacidade para ganhar a vida, que
fosse alfabetizado e participasse da vida nacional, seria
emancipado, isto é, perderia a tutela e proteção do Estado
brasileiro. E o mais grave, suas terras seriam alienáveis, isto é,
poderiam ser vendidas (Prezia, 2006:65).
reconhece aos índios o direito de ser índio, onde a terra é elemento central na garantia e
reprodução do modo de vida da cultura indígena. Ela manterá a terra indígena como
propriedade da União, e tradicionalmente ocupada pelos índios, sob justificativa de que
sendo pertencente à União, evitaria o esbulho do patrimônio indígena. Muito embora,
durante os 25 anos de vigência da CF/88 tenhamos a continuidade dos esbulhos
territoriais em face dos indígenas, bem como da violência no campo.
Além desta esdrúxula ação, transita no Congresso a PEC 215, que busca instituir
uma nova etapa no processo demarcatório: estabelecer uma prerrogativa do Congresso
para criar e rever a demarcação de terras indígenas, quilombolas e áreas de proteção
37
A portaria está disponível em
http://www.cpisp.org.br/indios/html/legislacao/202/portaria-n-303-de-16-de-
julho-de-2012.aspx, visitada em 15 de Agosto de 2012. A FUNAI contestou a
portaria através de nota técnica: “entendemos que a medida restringe o
reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, especialmente os direitos
territoriais, consagrados pela Constituição Federal, ao adotar como parâmetro
decisão não definitiva do Supremo Tribunal Federal para uniformizar a atuação
das unidades da Advocacia-Geral da União”, disponível em http://site-
antigo.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3624.
38
“(...) 3. (...) Nesse sentido, as condições integram o objeto do que foi decidido e
fazem coisa julgada material. Isso significa que a sua incidência na Reserva da Raposa
Serra do Sol não poderá ser objeto de questionamento em eventuais novos processos
(Embargo de Declaração na Petição nº 3.388 – RR. Relator Ministro Roberto Barroso,
em 23/10/2013, disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia)”.
78
Constituição do Brasil
Artigo 231: São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças
* 1988
e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam,
83
Embora o autor reconheça que a Declaração serve como estímulo a uma nova
cultura política democrática e participativa, ele ressalta que sua efetivação está
relacionada aos processos políticos, nacionais e locais de cada país. Depois de discorrer
sobre vários exemplos em que a declaração foi utilizada para dirimir conflitos, no caso
do Brasil, afirma que “un prominente e poderoso miembro del congresso brasileño
88
Ainda que a CF/88 do Brasil esteja situada por Raquel Yrigoyen Fajardo (2010)
no primeiro ciclo das reformas constitucionais pluralistas, entendemos que por ser
instrumento formal de materialização de direitos, seu marco normativo dialoga com os
conteúdos expressos nos debates internacionais atuais, e por isto possuem plena
efetividade no sistema jurídico nacional, devendo ser interpretados enquanto conceitos
dinâmicos que reconhecem o valor da diversidade cultural e da busca pela emancipação
social. Especialmente porque influenciado pelos debates do GT da ONU sobre povos
indígenas, em funcionamento desde 1982, que culminaram também na revisão da
Convenção nº107 da OIT.
Mas esta não é uma peculiariedade brasileira! Segundo Beatriz Eugenia Sanchez
Botero (2001), analisando a realidade da Colômbia, é possível identificar dois grandes
momentos: de 1500 à 1990, um período de grande invisibilidade e manutenção do
paradigma da inferioridade e de 1990 aos dias de hoje, como um período de grande
visibilidade das relações interétnicas a luz da Constituição. Com isso, percebemos que o
panorama da realidade latino-americana, no âmbito do reconhecimento e das garantias
constitucionais às minorias étnicas (em especial no que se refere aos povos indígenas), é
pautado pelas mesmas estratégias: negar o reconhecimento, buscando o
desaparecimento, inserção da diversidade numa totalidade, buscando a
homogeneização, a incorporação por meio da subjugação (idéia de inferioridade), e, por
89
Períodos Características
Colonial: a) Paradigma da inferioridade dos povos indígenas, direito consuetudinário
Período da Tutela- enquanto sistema jurídico inferior/ primitivo (vigência do Pluralismo
Incapacidade Subordinado: governos indiretos, “usos e costumes” desde que não
(séculos XV à XVIII) violassem as leis divinas e naturais);
b) Povos submetidos ao controle da metrópole: legislação aplicada na
colônia, com base nas influências do direito canônico, romano e germânico,
constitui o monismo jurídico, formalista e dogmático. Regime jurídico
pautado pela Carta Manuelina.
Constitucionalismo a) Modelo liberal-assimilacionista: conversão dos índios em cidadãos,
Liberal: controle dos índios selvagens e das terras coletivas;
Guerras de b) Primeira Constituição no Brasil – Lei Fundamental de 1824: regime
Independência e monárquico, imperial e monista. Dualidade de modelo constitucional
Formação do Estado- (liberalismo e absolutismo) e instabilidade política, tendo em vista a
Nação (Século XIX) manutenção do Poder Moderador;
c) Constituição da República de 1891: consolidação do modelo positivista e
liberal. Separação de Poderes e compromissos absolutos com a Ordem e o
Progresso, após a instalação das crises – do trabalho escravo/ cativeiro da
terra e população rural, militar/ pós Guerra do Paraguai e Religiosa/ força
social do catolicismo associado a monarquia;
d) Ambas as Constituições, de caráter individual-conservador, não
expressaram diálogo com a vontade e participação popular. Manutenção do
controle político-econômico das oligarquias agroexportadoras – política do
café com leite/ sucessão alternada da Presidência da República.
Constitucionalismo a) Revolução de 30 e ruptura com o individualismo monista: reconhecimento
Social: da pluralidade de sujeitos, a partir da Constituição de 1934, com criação do
Século XX instrumento processual contra atos ilegais ou inconstitucionais, Mandado de
Segurança; incorporação dos direitos sociais e econômicos, de representação
política e classista de grupos sociais e órgãos de cooperação. O direito de
propriedade privada deixa de ser absoluto, não pode ser exercido contra o
interesse social ou coletivo; sujeição à desapropriação, etc.
b) As demais constituições brasileiras do período (1937, 1946, 1967 e 1969)
são de caráter autoritário e representam um recuo no reconhecimento da
diversidade. Apesar do caráter retórico, que oficializou uma legalidade
individualista, formalista e monista, houve o reconhecimento dos sujeitos e
direitos coletivos;
c) Em especial as Constituições Antidemocráticas de 1967 e 1969,
reproduziram interesses da aliança entre burguesia agrária/ industrial com a
tecnoburocracia civil e militar;
d) Com a redemocratização brasileira, a CF/88 reconhece o pluralismo
político (art.1°, V) e os “novos” direitos, resultantes das demandas coletivas
de grupos sociais específicos.
Constitucionalismo a) Dividido em três grandes ciclos: 1) Ciclo multicultural (1982-88):
Pluralista: reconhecimento da diversidade cultural e dos modos de vida próprios dos
Século XX/ XXI grupos sociais; 2) Ciclo pluricultural (1989-2005): reconhecimento expresso
do Estado pluricultural e do pluralismo jurídico; 3) Ciclo plurinacional
(2006-2009): Estado plurinacional.
b) Transfiguração: da tutela-incapacidade para a tutela-proteção.
Tabela: Paradigma Indígena no Constitucionalismo Brasileiro.
Sistematizada por: Erika Macedo Moreira.
Fontes: Raquel Yrigoyen Fajardo (2010), Paulo Bonavides Paes de Andrade (1990) e Antonio Carlos
Wolkmer (2010).
90
Tal mudança (ao menos do ponto de vista formal), na forma de se relacionar com
os indígenas implica o desenvolvimento de ações e políticas públicas que almejem
superar o racismo institucional40 expresso até mesmo nos órgãos responsáveis pela
proteção dos povos indígenas e o modelo autoritário de desenvolvimento que
40
O racismo institucional está relacionado ao conjunto mais vasto de ações do
Estado voltada a opressão sistematizada sobre um povo, com a destruição de
sua cultura, língua e modos de vida.
92
41
O Relatório Figueiredo, fruto de uma investigação da Comissão Parlamentar de
Inquérito, aponta para os inúmeros crimes cometidos pelo próprio Serviço de Proteção
ao Índio/SPI.
93
formação social.
A partir da República, o direito estatal, cada vez mais atrelado aos interesses da
burguesia liberal e dos proprietários de terra, foi constituindo um modelo institucional
de legalidade, de matriz individual e patrimonialista, distante das práticas informais de
resolução de conflitos. Nesse sentido, o reconhecimento dos “direitos
consuetudinários”, enquanto expressão da organização social dos povos originários,
passou a ser incompatível com a teoria e prática jurídica desenvolvida. E quando
reconhecido, sempre num plano de submissão e inferioridade.
Para Xavier Albó (2000:04), a partir de estudos realizados com povos indígenas
andinos, os direitos consuetudinários possuem algumas características comuns: 1)
acumulam uma larga tradição de práticas vivenciadas num determinado contexto
cultural; 2) se baseiam numa visão global, não secundarizada; 3) são administrados por
autoridades reconhecidas e controlados pela comunidade e sua assembléia; 4)
funcionam em níveis mais locais e diretos; 5) são fundamentalmente orais e muito
flexíveis no tempo e no espaço; 6) não são automaticamente eqüitativos; 7) estão
permanentemente abertos a influências alheias; 8) seu acesso e reconhecimento são
rápidos e de baixo custo; 9) quando há conflito interno, as regras acordadas dão
prioridade a manutenção da paz comunitária, mais do que o castigo enquanto tal; 10)
não havendo reconciliação, ou sendo delinqüentes externos, se prioriza a intimidação.
42
Os estudos de Sara Araujo (2008) apontam para o reconhecimento e
valorização das instâncias comunitárias na resolução de conflitos em
Moçambique, bem como vale destacar o trabalho de Daniel Schroeter Simião,
sobre as práticas extrajudiciais de mediação no Timor Leste (2005 e 2011).
99
“Os direitos culturais não são apenas os ligados ao respeito ao exercício de suas
tradições, festas, alimentação, mais do que isso é o Direito a que as informações sobre o
povo não sejam recobertas por um manto de preconceito, desprezo e mentiras (SOUZA
FILHO, 2012, p. 158)”.
2006, p.159).
43
Sobre a ampla trajetória das discussões no âmbito das Comissões da Câmara e do
Senado, ver QUINTANS, 2011.
44
O IDC é de competência do Procurador Geral da República, que suscita ao
STJ deslocamento de competência para a JF, tendo em vista a ausência de
condições para processamento e julgamento das ações penais no âmbito da
justiça estadual/ local. Atualmente foram apresentados apenas três IDC: o caso
do assassinato 1) da Irmã Doroty, no Pará, 2) do advogado Manoel Bezerra de
Mattos, na Paraíba/ Pernambuco, e, 3) de cerca de 40 processos relacionados
aos assassinatos de diferentes pessoas por grupo de extermínio dentro da
polícia militar de Goiás.
45
Além dos aspectos organizacionais atinentes à: previsão entre os direitos
fundamentais do princípio da duração razoável do processo; introdução de novas
diretrizes no Estatuto da Magistratura (como critérios claros para a promoção dos juízes
por merecimento e cursos de formação de magistrados); alterações na competência do
STF, STJ, TRFs e juízes federais; atribuição de autonomia funcional e administrativa as
defensorias públicas estaduais. Um conjunto de ações, que também atendem às
exigências do Banco Mundial (SOUSA SANTOS, 2007).
105
Na ANC, a criação de uma Justiça Agrária foi defendida pela CONTAG, mas
também por parlamentares ligados ao setor patronal no Pará, por diferentes motivos. Na
Constituinte do Estado do Pará de 1989, setores do Partido do Movimento Democrático
Brasileiro (PMDB) ligados aos proprietários de terra defenderam a criação das varas
agrárias:
46
Dentre os que declararam que a Justiça Agrária não é necessária ou que não acreditam
na justiça, o maior contingente relativo ficou na região Centro-Oeste (27,8%)
106
47
Na Justiça estadual, já possuem varas agrárias os Tribunais de Justiça de Alagoas
(TJAL), Amazonas (TJAM), Bahia (TJBA), Distrito Federal (TJDFT), Minas Gerais
(TJMG), Mato Grosso (TJMT), Pará (TJPA), Piauí (TJPI), Paraíba (TJPB), Rondônia
(TJRO) e Santa Catarina (TJSC). Na Justiça federal, instalaram varas agrárias as Seções
Judiciárias do Amazonas, Bahia, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará e
Rondônia, todas do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), e a Seção
Judiciária do Rio Grande do Sul, que integra o Tribunal Regional Federal da 4ª Região
107
Entre algumas medidas do CNJ, merece destaque aquelas relativas aos conflitos
fundiários. Através da Resolução nº 110/2010, criou o Fórum de Assuntos Fundiários,
com atribuições estabelecidas no art.2º:
49
Vale dizer que a administração da justiça iniciou no período colonial, quando
os juízes eram nomeados pelos donatários, que por sua vez constituíam
também autoridade máxima, com direito a receber pedidos de reexame das
decisões em grau de recurso. Com as ordenações Filipinas, a administração da
justiça passou a atuar em três instâncias: juízes locais, dois tribunais de justiça
– Tribunal de Relação do Rio de Janeiro e da Bahia, e, em última instância, o
Desembargo do Paço em Lisboa e a junta das Capitanias. Com a transferência
da corte portuguesa, o Tribunal da Relação do Rio de Janeiro é transformado
em Supremo Tribunal de Justiça, equiparado à Casa de Suplicação de Lisboa,
atuando com ampla jurisdição. Também foram criados mais dois Tribunais da
Relação – Maranhão e outro em Pernambuco. Instalou-se o Supremo Conselho
Militar e de Justiça, o Tribunal da Mesa do Desembargo do Paço e da
Consciência e Ordens; a Intendência Geral de Polícia e Juizados Privativos.
110
50
Vale dizer que a Constituição de 1824 regulamentou o Supremo Tribunal de
Justiça e determinou a criação de tribunais de segunda instância, nos moldes
dos tribunais de relação. Os juízes de direito eram nomeados pelo Imperador,
os juízes municipais escolhidos pelo Presidente da Província em lista tríplice
organizada pelas câmaras municipais e os juízes de paz eram eleitos. Embora
a Constituição de 1824 conferisse independência ao Judiciário, o mesmo
encontrava-se submisso ao Poder Moderador.
111
Desta complexa estrutura, vale dizer que ao STF, enquanto máxima instância do
judiciário, compete, precipuamente, a guarda da Constituição, conforme definido no art.
101 e 102 da Constituição Federal. É composto por onze Ministros, brasileiros natos
(art. 12, § 3º, IV, da CF/88), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65
anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101 da CF/88), e
nomeados pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria
absoluta do Senado Federal. O Presidente do Supremo Tribunal Federal é também o
Presidente do Conselho Nacional de Justiça (art. 103-B, inciso I, da CF/88, com a
redação dada pela EC nº 61/2009) e teve suas funções ampliadas com a criação do
mandado de injunção e do numero de agentes legitimados à propositura de ações de
inconstitucionalidade. Para Dallari (2010:114), a ampliação das competências está
diretamente relacionada à desproporcionalidade entre a quantidade de trabalho e a
manutenção do mesmo número de magistrados, apontando para a necessidade de uma
reforma, que considere, ou a retirada de atribuições. No entanto, o próprio autor alerta
que os membros do STF não se dispõem a aceitar nenhuma das duas hipóteses,
preferindo a criação de mecanismos processuais que reduzam a independência dos
juízes inferiores (como é o caso das Súmulas Vinculantes), com vistas a reduzir o
numero de recursos submetidos ao STF.
113
51
Nesse sentido, conferir Cittadino (2000:40), que narra o lobby do próprio STF
contrário a criação do Tribunal Constitucional, proposta pela Comissão Afonso Arinos.
Considerada “injustificável, pois sua competência ficaria estritamente limitada a temas
constitucionais, sem o tratamento das relevantes questões de direito federal”.
114
O STJ tem suas atribuições definidas no art 105 da CF/88. É composto por 33
ministros, nomeados pelo Presidente da República, após aprovação do Senado. Possui
jurisdição sobre todo o país. Está acima dos tribunais federais e dos tribunais dos
estados, com as atribuições principais de guardar a legislação federal e de julgar em
recurso especial as causas decididas em única e última instância pelos Tribunais
Regionais Federais ou pelos tribunais dos estados, dos territórios e do Distrito Federal52.
A Justiça Federal tem suas atribuições estabelecidas nos art. 106 a 110 da CF/88.
Em síntese, aos juízes federais compete processar e julgar todos os feitos em que a
União, autarquias, empresas públicas e fundações públicas e federais sejam autoras, rés
ou intervenientes, os processos criminais quando se tratar de crimes que o Brasil, por
convenção internacional, obrigou-se a coibir (art. 109, V) e as disputas sobre direitos
indígenas (art.109, XI).
52
Os membros do Supremo também se demonstraram contrários à criação do
STJ. “Desaprova (...) a Corte a idéia de se criar um Tribunal Superior de Justiça
(abaixo do Supremo Tribunal Federai), com competência para julgar recursos
extraordinários oriundos de todos os Tribunais Estaduais do País (CITTADINO,
2000, p. 62)”.
115
Esta ação aponta tanto para um processo de transformação dos atuais e futuros
quadros funcionais (magistrados, promotores, defensores, assessores, estagiários), que
permita a transformação da mentalidade jurídica com vistas a superar o monismo
jurídico e o paradigma da inferioridade indígena, que orienta a educação jurídica; como
também por meio da construção de uma estrutura judicial especializada no
enfrentamento dos conflitos agrários decorrentes da exploração e usurpação dos direitos
dos povos indígenas do Brasil.
Para Nancy Fraser (1997) a justiça passa pela articulação entre as políticas
culturais de reconhecimento e as políticas sociais de redistribuição, como caminho para
transformar as estruturas de produção e de tomada de decisões, pública ou privada, a
118
partir da cidadania ativa. Estas duas dimensões da justiça passam pela superação da
igualdade e da diferença como noções contrapostas (ao contrário, devem ser metas
estratégicas para exercício da autonomia), ao mesmo tempo em que significa também
teorizar as formas como a desigualdade econômica e a falta de respeito cultural se
encontram, para harmonizar teoria e prática.
O levantamento das decisões foi realizado pelo portal eletrônico dos respectivos
tribunais: STF, STJ, TRF1 e TJ/MS. O lapso temporal estabelecido para o levantamento
das decisões compreendeu o período de 1º de Novembro de 1988 à 1º de Janeiro de
2013. Não constitui pretensão deste trabalho o levantamento e análise de todas as
decisões, nem estabelecer com precisão numérica as demandas relacionadas aos direitos
indígenas que foram julgadas. Mesmo que fosse nossa pretensão, a ferramenta de busca
apresenta uma limitação funcional, não permitindo o alcance da totalidade das decisões:
primeiro, porque está restrita ao universo de acórdãos publicados na internet, segundo,
porque a seleção é realizada conforme sua ementa e indexação. De todo modo permite
ter uma dimensão quantitativa da forma como as informações processuais envolvendo
indígenas estão organizadas nos órgãos judiciais. Diante do alto quantitativo nas
categorias mais genéricas, “índio” e “indígena”, partimos para uma pesquisa
direcionada as categorias teóricas que norteiam o trabalho: pluralismo jurídico e
diversidade cultural. Num segundo momento, ampliamos para: cultura indígena,
direitos indígenas, e usos, costumes e tradições. A busca das categorias de análise foi
realizada de forma fechada e de forma aberta. Pesquisadas de forma aberta, as
expressões foram localizadas nas ementas das decisões de forma dispersa, no todo ou
em partes. Ou seja, o conteúdo que expressavam não necessariamente refletia o
significado da expressão e levou a um primeiro levantamento mais genérico e a uma
123
Deste modo, a partir da busca pelas expressões, de forma fechada, ou seja, entre
aspas, alcançamos o seguinte quadro inicial:
53
Estavam relacionadas à liberdade de imprensa, relações homoafetivas, ficha limpa,
fidelidade partidária, e, em especial, 1 nos chamou atenção por estar relacionada à
participação da sociedade civil na composição do Conselho Nacional do Ministério
Público (MS 26715 MC / DF - DISTRITO FEDERAL, MEDIDA CAUTELAR NO
MANDADO DE SEGURANÇA. Relator: Min. CELSO DE MELLO. Julgamento:
18/06/2007). Tema relacionado à democratização do Judiciário, trazido pela EC/45,
conforme visto em tópico anterior.
54
Uma ação, nº 0003149-34.2004.8.12.0008 de Embargos Infringentes, e 08 apelações:
0005345-95.2004.8.12.0001; 0001182-12.2004.8.12.0021; 0014778-26.2004.8.12.0001;
0015107-38.2004.8.12.0001; 0015130-81.2004.8.12.0001; 0004171-64.2003.8.12.0008;
0005173-69.2003.8.12.0008; 0014789-55.2004.8.12.0001.
55
Relacionada a conflitos territoriais das Comunidades Remanescentes de Quilombo.
SLAT 2009.01.00.031060-5
56
SS 2007.01.00.059365-7/ BA, SS 2007.01.00.003588-6/BA, SS 2007.01.00.059457-
3/ BA, SUEXSE 2007.01.00.003588-6/ BA, SUEXSE 2007.01.00.058763-6, SS
2007.01.00.058762-2/ BA
125
Após leitura “flutuante” das ementas das decisões (de diferentes modalidades/
acórdãos, questões de ordem, decisões da presidência e decisões monocráticas e
oriundas de diferentes instrumentos processuais, Habeas Corpus, Mandado de
Segurança, Ações Ordinárias, Demarcatórias, Possessórias, etc), partimos para a
sistematização dos dados. O inteiro teor das decisões foi trabalhado a partir da seleção
de alguns casos, conforme veremos mais adiante58.
Embora seja latente e expresso que a questão territorial constitui o carro chefe do
conjunto das decisões, a análise das ementas permitiu identificar casos em que
57
AC 2010.026428-9/0000-00 - Campo Grande/ MS.
58
Trabalhando com o método de análise de conteúdo proposto por Laurence
Bardin (2011), durante a pré-análise, primeiro momento de organização da
análise, seguido pela exploração do material e do tratamento dos dados e da
interpretação; a leitura flutuante “consiste em estabelecer o contato com os
documentos a analisar e em conhecer o texto deixando-se invadir por
impressões e orientações. Esta fase é chamada de leitura “flutuante” em
analogia com a atitude do psicanalista. Pouco a pouco, a leitura vai se tornando
mais precisa, em função de hipóteses emergentes, da projeção de teorias
adaptadas ao material e da possível aplicação de técnicas utilizadas sobre
materiais análogos (BARDIN, 2011, p. 126).”
126
G
ráfico: Subdivisão Temática_TRF1.
Sistematização: Erika Macedo Moreira.
Fonte: Síntese Quantitativa Categorias TRF1, 2013.
assentada pelo extinto Tribunal Federal de Recursos (criado pela Constituição de 1946 e
extinto pela CF/88) e pelo STJ, nos seus primeiros 06 anos de vida. Considerando a
extinção do órgão e a migração dos Ministros para o novo órgão 59, a súmula acaba por
refletir a forma de tratar da questão indígena, a partir do paradigma assimilacionista
vigente daquele tempo. Endossando o conjunto normativo e doutrinário do tempo
passado, que foi/ é muito utilizado para justificar as teses da imputabilidade, a partir do
mito da “integração à comunhão nacional”. Evidenciando a predominância da
competência da justiça estadual e manutenção da tutela-incapacidade como proteção da
União60.
59
De acordo com a exposição de “uma trajetória cidadã”, no informativo sobre
o histórico do STJ, “na primeira composição do STJ, em 1989, novos ministros
eram egressos dos TRF”. Disponível em
http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=698. Acesso
em: 03 de Outubro de 2013.
60
Nesse sentido, uma rápida pesquisa na jurisprudência do extinto TRF
(disponível na página eletrônica do STJ) demonstra a continuidade da forma de
pensar e julgar as ações penais. Foram 78 ocorrências para a palavra-chave
indígena e 86 para índio. Entre elas, o mesmo discurso: índio aculturado e
trabalhador. Majoritárias são as decisões relacionadas ao conflito de terra. Em
função da inexistência da alusão ao índio na constituição vigente daquele
tempo (artigo 125, inciso IV da Emenda Constitucional nº 1/69), “a solução
jurisprudencial focava exclusivamente o interesse da União, reconhecia-o, ou
não, fosse a terra da União, ou não (FONTELES, 1993, p. 203)”. Naquele
período reconhecia-se a competência da justiça federal, apenas em função de
conflito pela posse das terras e dentro da “reserva indígena”.
133
processo (...), trabalhar, muito pouco, não são chegado ao serviço”, “os índios assumem,
vira um capão desgraçado no ato, não cultivam” e “índio tem terra, mas não planta, é
mais fácil roubar, tomar de alguém que plantou e se dizer dono, depois que colhe
abandona toda a fazenda e vão invadir outra61”.
A denúncia foi feita com base no art. 20 da Lei 7.716/1990, que assim
estabelecia: “Praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação social ou por
publicação de qualquer natureza, a discriminação ou preconceito de raça, por religião,
etnia ou procedência nacional. Pena: reclusão de dois a cinco anos62”.
61
CF. notícias disponíveis em http://www.conjur.com.br/2008-dez-
16/racismo_existe_quando_vontade_discriminar,
http://osamigosdopresidentelula.blogspot.com.br/2006/03/esse-o-pfl-dos-bornhausens-
e-efrains.html, visitados em 16/10/2013.
62
Os artigos 1º e 20º da Lei 7.716/89 foram alterados pela Lei 9.459/ 97. Além da
legislação infraconstitucional, temos na CF/88 a garantia do Princípio da Dignidade
Pessoa Humana e compromisso de combater todas as formas de preconceito e racismo,
em todas as suas formas de manifestação. Em consonância também com a Convenção
Internacional sobre a Eliminação de Todas as formas de Discriminação Racial de 1965,
ratificada pelo Brasil em 1968.
135
valorativas da concepção de bem comum do Ministro Joaquim Barbosa. Vale dizer que
não foi localizada interposição de embargos de declaração ou outro instrumento
questionando a decisão da Corte.
Neste caso, embora a decisão tenha sido unânime, no sentido de não conhecer do
recurso e negar a competência da Justiça Federal, através do relatório e dos votos, foi
possível identificar alguns aspectos de disputas internas, entre etnias distintas, ameaças
e tentativas de expulsão de indígena da etnia Guarani, por índio da etnia Terena, da TI
Bororó, no município de Dourados.
(...)
Diante do exposto, há precedentes deste Tribunal que afirmam a
possibilidade de deslocamento de competência em casos onde
indígenas estejam envolvidos. Referidos precedentes indicam
que compete à Justiça Federal somente aqueles processos que
versarem sobre questões diretamente ligadas à cultura indígena e
aos direitos sobre suas terras ou ainda a interesses da União (...).
No caso concreto, considerando-se que a discussão envolve
suposta extorsão de grupo de silvícolas, em sua grande maioria
idosos, não vislumbro, ao menos em tese, violação de bem
jurídico penal que demande a incidência da jurisdição da Justiça
Federal (HC 91.313/ RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em
25.05.07).
Extorsão de grupo de silvícolas não atinge direito coletivo? Será que a ausência
dos recursos, certos e mensais, da aposentadoria de um ou mais membro, não gera
prejuízos à organização social? Será que os idosos das TI não representam uma
comunidade vulnerável a este tipo exploração? O que é direito individual e coletivo
neste caso?63
Assim, sejam demandas cíveis, sejam demandas criminais, sejam demandas
relacionadas a conflitos territoriais, estejam indígenas em ambos os lados da ação ou
apenas em um, tendo ocorrido dentro ou fora da TI; para demonstrar que os crimes não
mantêm conexão com a cultura e os direitos coletivos dos Povos Indígenas, as decisões
desenvolvem sua retórica jurídica baseando-se no discurso dos índios aculturados,
alfabetizados, que dominam a língua portuguesa, trabalham, são eleitores e usam calças
jeans.
(...)
Descabimento, portanto, da assistência pela FUNAI, no caso.
63
Cf. Moreira (2011), no município de Amambaí/ MS, chamou atenção o quantitativo
de audiência no fórum de justiça de ações de cancelamento de empréstimo e retirada de
seguro DPVAT decorrente de acidente de trânsito. Vale dizer que na entrada e saída da
cidade existem duas TI.
139
história da jurisprudência:
(...)
O texto constitucional é de abrangência alargada (...) Não há no
dispositivo, qualquer restrição (...) daí a competência a toda ação
sobre direitos indígenas (gênero) ao crivo da Justiça Federal.
(RE 179.485-2/94 – AM, Rel.: Min. Marco Aurélio, Julgamento
em: 06/12/1994)
(...)
fala-se aqui em disputa, e todo o processo judicial o é. Sobre
direitos indígenas, e todos os direitos estão sob esta rubrica. Um
caso que ocorreu atentado contra a vida, em área indígena, tendo
de um e outro lado da relação conflituosa, elementos da própria
comunidade. Penso que o constituinte desejou que a Justiça
Federal construa uma jurisprudência sobre situações dessa
índole. (HC 71.835-3/95 – MS, Rel.: Min. Francisco Rezek,
Julgamento em: 04/04/1995)
Deste conjunto, podemos perceber duas grandes temáticas de ações que geram
impacto nas comunidades indígenas: uma relacionada
à ação direta do Estado na imposição de um modelo de desenvolvimento, como na
construção de grandes empreendimentos, como as UHE, e outra, relacionada à ação
difusa de entes públicos, ou mesmo de proprietários ou empresas privadas, sobre as
comunidades indígenas, a partir da exploração das gentes e das fontes naturais.
Considerando que a construção da UHE Belo Monte ganhou destaque no conjunto das
ações, debruçaremos nosso olhar para este conjunto de decisões.
A construção da usina hidrelétrica (UHE) de Belo Monte, no estado do Pará,
remonta ao período desenvolvimentista da década de 1970, quando a bacia hidrográfica
da Amazônia representava 60% do potencial hidrelétrico do país. Com o processo de
resistência e luta dos povos indígenas e das populações tradicionais, o projeto não foi
implementado no período, sendo agora resgatado, com algumas alterações, no conjunto
das ações do Programa de Aceleração da Economia (PAC). Considerada estratégica pelo
setor elétrico do governo, já que busca integrar diferentes regiões hidrológicas por meio
da interligação com o sistema elétrico, o projeto alcança 11 municípios do Estado do
Pará, impactando direta e indiretamente povos indígenas, ribeirinhos, comunidades
extrativistas, dentre outros (SEVÁ, 2005, 2011).
O Congresso Nacional, mediante o Decreto-Legislativo nº 788/2005, autorizou a
construção do complexo hidroelétrico de Belo Monte, dando início as atividades de
liberação/ construção do empreendimento, tendo em vista que o aproveitamento dos
recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, podem ser executados, desde que
autorizados pelo Congresso Nacional e ouvidas as comunidades impactadas (art.231,
§3º da CF/88).
145
Desta forma, toda esta normatividade, para que não seja reduzida a retórica de
garantia da diversidade cultural (com real autonomia e autogoverno), aponta para uma
necessária transformação na concepção com que o Estado Brasileiro pensa seu modelo
de desenvolvimento. Muito embora o caso concreto, nos aponte para uma verdadeira
crise da democracia, das instituições, em que as ações do poder executivo revelem-se
extremamente autoritárias e irredutíveis na visão racista e preconceituosa do que seja
desenvolvimento. Infelizmente, observa-se uma continuidade nas estruturas políticas,
econômicas, sociais, culturais e jurídicas, em refletir o racismo institucionalizado
implícitos nos processos e modelos de desenvolvimento, que excluem a diversidade
cultural.
A batalha judicial inicia em 2001, quando a Eletronorte realiza um convênio com
a Fundação de Pesquisa do Estado do Pará, para realizar o procedimento de
licenciamento, no âmbito estadual, e o Ministério Público ingressa com a primeira Ação
Civil Pública (ACP 5867-7 de 2001) para discutir se a competência pelo licenciamento
se daria em âmbito estadual (local – Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Pará) ou
federal (IBAMA). A definição reflete também no estabelecimento da competência
jurisdicional para dirimir os conflitos: seria a justiça estadual, porque os danos seriam
locais, ou federal, porque os danos seriam regionais, alcançando também as
comunidades indígenas. Ademais, no âmbito federal, temos ainda uma outra discussão,
a matéria seria remetida para a vara única, que cuida da matéria ambiental e agrária, ou
estaria restrita ao juízo de Altamira, onde o processo se iniciou? Dentro desta temática
desdobraram-se uma série de ações, de conflito de competência, sendo, no entanto, certo
que restou assegurado o direito a oitiva prévia das comunidades indígenas. Foram 6
ações distintas:
Conflito de competência
origem: CC 0041323-34.2011.4.01.0000/PA
numeração única: CC 0041323-34.2011.4.01.0000/PA
órgão julgador: 3ª seção
data da decisão: 06/09/2011
Competência funcional do local do dano.
2."Deve prevalecer, no caso concreto, o caráter funcional da
competência do foro do local do dano, definido em lei, em
contraposição ao Provimento COGER n. 49/2010, pois,
'considerando que o Juiz Federal... tem competência territorial e
funcional sobre o local de qualquer dano' (STF, RE 228955/RS),
sua proximidade com o evento danoso é providência que
aumenta a eficiência da prestação jurisdicional." (CC 0019527-
148
Conflito de competência
origem: CC 0041327-71.2011.4.01.0000/PA
numeração única: CC 0041327-71.2011.4.01.0000/PA
órgão julgador: 3ª seção
data da decisão: 20/09/2011
Competência absoluta da vara agrária. Impossibilidade da
derrogação.
“6. É inegável, especialmente no caso de redistribuição de
processos, que há alguma perda no aspecto da celeridade e até
mesmo de qualidade da jurisdição, sobretudo quando maior for
o tempo de processamento da causa pelo juízo a que
originariamente distribuída a ação. 7. Entrementes, não se pode
admitir "flexibilização", seja por se tratar de competência
absoluta - portanto, inderrogável - seja porque na decisão do
Tribunal está implícito que foram sopesadas perdas de caráter
pontual e que a especialização da vara, ainda assim, mostrou-se
adequada à política de otimização da prestação jurisdicional,
fundamento do art. 96, inciso I, "a", da Constituição. 8. Conflito
de que se conhece para declarar competente o juízo federal da 9ª
Vara da Seção Judiciária do Estado do Pará, o suscitante”.
Conflito de competência
origem: CC 0041324-19.2011.4.01.0000/PA
numeração única: CC 0041328-56.2011.4.01.0000/PA
órgão julgador: 3ª seção
data da decisão: 29/11/2011
Conflito negativo de competência. Remete a portaria Presi/
Cenag nº 200/2010 e a Resolução do CJF nº 102/2010. Suposto
dano de natureza regional. A competência das varas
especializadas, determinada pelas leis de organização judiciária,
em razão de matéria, é de caráter absoluto, e a redistribuição não
viola o princípio do juiz natural. Juízo competente da 9ª vara
federal.
Conflito de competência
origem: CC 0041328-56.2011.4.01.0000/PA
numeração única: CC 0041328-56.2011.4.01.0000/PA
órgão julgador: 3ª seção
149
Conflito de competência
origem: CC 0061089-73.2011.4.01.0000/PA
numeração única: CC 0061089-73.2011.4.01.0000/PA
órgão julgador: 3ª seção
data da decisão: 27/03/2012
Conflito negativo de competência. Juízo da 9ª vara federal da
seção judiciária do Estado do Pará, especializado em matéria
ambiental e agrária.
Conflito de Competência
origem: 0006830-94.2012.01.0000/PA
numeração única:
órgão julgador: 3ª seção
data da decisão: 05/06/2012
Dano regional. Competência da 9ª vara da seção judiciária do
Estado do Pará.
Agravo de instrumento
origem: 2006.01.00.017736-8/PA
numeração única: 0017006-45.2006.4.01.0000
órgão julgador: 3ª seção do TRF1
data da decisão: 13/12/2006
Agravo parcialmente provido. Invalidade do decreto 788.
Momento da consulta aos índios é exclusiva do Congresso.
Permissão para realizar EIA e laudo antropológico que deverão
ser submetidos ao parlamento. (…) 6. A consulta se faz
diretamente à comunidade envolvida com o projeto da
construção. É do Congresso Nacional a competência exclusiva
para fazer a consulta, pois só ele tem o poder de autorizar a
obra. O § 3º do artigo 231 da CF/88 condiciona a autorização à
oitiva. 7. As alterações ecológicas, demográficas e econômicas
conhecidas decorrentes da exploração de recursos naturais da
terra indígena impõem o dever de ouvir as comunidades
afetadas nos termos do § 3º do art. 231 da CF/88. 8. Sendo a
oitiva das comunidades indígenas afetadas um antecedente
condicionante à autorização, é inválida a autorização para a
construção da UHE Belo Monte outorgada no Decreto
Legislativo 788/2005 do Congresso Nacional. 9. O impacto do
empreendimento deve ser analisado em laudo antropológico e
estudo de impacto ambiental prévios à autorização prevista no §
3º, do artigo 231 da CF/88. 10. Antes de autorizar a UHE de
Belo Monte o Congresso necessita de dados essenciais para
saber a extensão dos danos ambientais e sociais que ocorrerão e
as soluções para poder atenuar os problemas que uma
hidrelétrica no meio de um grande rio trará. 11. A audiência
pública prevista no artigo 3º da Resolução CONAMA não se
confunde com a consulta feita pelo Congresso Nacional nos
termos da Constituição. 12. A FUNAI, os índios, ribeirinhos,
comunidades urbanas, ambientalistas, religiosos etc, todos
podem ser ouvidos em audiência pública inserida no
procedimento de licenciamento ambiental. Tal audiência
realizada pelo IBAMA para colher subsídios tem natureza
técnica. A consulta realizada pelo Congresso às comunidades
indígenas afetadas por obras em suas terras tem por objetivo
subsidiar a decisão política. 13. Concluído o estudo de impacto
ambiental e o laudo antropológico, o Congresso consultará os
índios.
64
“Criado pela lei 4.348 de junho de 1964 com o intuito de controlar
151
Seguido o curso processual, o pedido formulado na ação civil pública foi julgado
improcedente em primeiro grau, decisão confirmada em sede de apelação:
Apelação Civel
origem: AC 2006. 39.03.000711-8/PA
numeração única: 0000709-88.2006.4.01.3903
órgão julgador: 5ª turma
data da decisão: 09/11/2011
(...)
a decisão paradigmática (SL125), em homenagem a ordem
pública e a economia pública, autorizou a atuação do IBAMA e
dos demais órgãos responsáveis pela continuidade do processo
de licenciamento ambiental da obra da UHE Belo Monte, não
obstante continuar existindo a pendência judicial. E tal decisão
vigora até o trânsito em julgado “da decisão de mérito na ação
principal.
65
Procuradores do MPF/PA (Ministério Público Federal no Pará) ingressaram
154
(...)
III - De outra banda, a proliferação abusiva dos incidentes
procedimentais de suspensão de segurança, como instrumento
fóssil dos tempos do regime de exceção, a cassar,
reiteradamente, as oportunas e precautivas decisões tomadas em
favor do meio ambiente equilibrado, neste país, atenta contra os
princípios regentes da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei
nº 6.938/81), sob o comando dirigente do princípio da proibição
do retrocesso ecológico, no que fora sempre prestigiado
internacionalmente pelo Projeto REDD PLUS (Protocolo de
Kyoto, COPs 15 e 16 - Copenhague e Cancún) com as garantias
fundamentais do progresso ecológico e do desenvolvimento
sustentável, consagradas nas convenções internacionais de
Estocolmo (1972) e do Rio de Janeiro (ECO-92 e Rio + 20),
agredindo, ainda, tais decisões abusivas, os acordos
internacionais, de que o Brasil é signatário, num esforço
mundialmente concentrado, para o combate às causas
determinantes do desequilíbrio climático e do processo
crescente e ameaçador da vida planetária pelo fenômeno trágico
do aquecimento global e do aumento incontrolável da pobreza e
da miséria em dimensão mundial. IV - Desde que autorizada a
examinar até mesmo o mérito da demanda sem que o mesmo
66
No TRF1 identificamos ainda outras decisões relacionadas as seguintes
ações: AC 0005891-81.2012.4.01.3600 / MT, AC 2000.01.00.036645-0 / PA,
AGRSLT 0018625-97.2012.4.01.0000 / MT; AGRAVO REGIMENTAL NA
SUSPENSAO DE LIMINAR OU ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, AG 0018341-
89.2012.4.01.0000 / MT, AG 1997.01.00.057974-0 / PA
156
(...)
o colonialismo interno corresponde a uma estrutura de relações
sociais de domínio e exploração entre grupos culturais
heterogêneos, diferentes (...) produto do encontro de duas raças
ou culturas ou civilizações, cuja gênese e evolução ocorreram
até um certo momento – a conquista ou a concessão – sem
contato entre si, e que se juntaram pela violência e pela
exploração, dando lugar a discriminações raciais e culturais (…)
A estrutura colonial e o colonialismo interno se diferenciam da
estrutura de classes porque não são apenas uma relação de
domínio e exploração dos trabalhadores pelos proprietários dos
bens de produção e seus colaboradores, mas uma relação de
domínio e exploração de uma população (com suas diferentes
classes, proprietários, trabalhadores) por outra população que
também tem diferentes classes (proprietários e trabalhadores).
Embora a materialidade da questão não tenha sido considerada (ou seja, o direito
de portar arma de fogo para realizar a caça, dentro da terra indígena), o direito à caça
como prática cultural, no âmbito dos direitos indígenas, foi reconhecida, e resultou na
determinação do processamento da ação no âmbito da Justiça Federal, afastando a
competência da Justiça Estadual.
No TRF1, identificamos duas decisões de direito previdenciário, envolvendo
meninas-mulheres indígenas. E outras duas decisões relacionadas ao respeito a
organização político-social. No caso do benefício do salário maternidade, a
problemática está relacionada ao requisito temporal estabelecido pela legislação
nacional que, reconhece os indígenas como seguradas especiais e define que as
mulheres acima de 16 anos poderão ser beneficiadas pelo salário maternidade. Os casos
abaixo, apresentam uma discussão sobre a possibilidade de acesso ao benefício no caso
do não cumprimento do requisito formal, da idade mínima:
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL
CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SALÁRIO-
MATERNIDADE. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL
COMO INDÍGENA. QUALIDADE DE SEGURADA
ESPECIAL. BENEFÍCIO DEVIDO A PARTIR DOS 14 ANOS
DE IDADE. CABIMENTO.
(...) 3. Para além de ser um direito social elencado (art. 6º) na
Constituição Federal, a proteção à maternidade se constitui em
168
maternidade a menores de 16 anos, uma vez que não cumpriam o requisito etário para
serem seguradas especiais.
Em Goiás, no município de Rubiataba, dois casos acerca da autonomia da
organização político-social da TI repercutiram no TRF1. Em ambos, as decisões
garantem o respeito da decisão interna da comunidade.
A primeira diz respeito a tentativa da FUNAI de retirar da TI, uma família
constituída por homem “branco” e índia Tapuia. A decisão mantêm a sentença de 1º
grau. O processo iniciou em 1993, e o assunto está relacionado a
esbulho/turbação/ameaça - posse - coisas - Direito Civil e outras matérias do Direito
Privado. A baixa definitiva do processo ocorreu apenas em 2013. A outra é sobre a
decisão da Comunidade de proibir uma família de utilizar parte da área da TI, em que a
FUNAI determinou a proibição de uso para qualquer fim, inclusive para moradia, da
área corresponde a 3 (três) alqueires da reserva indígena, objeto de conflito entre os
membros da comunidade.
(...)
Contudo, a sentença recorrida reconheceu que o ora apelado é
de fato casado com a Srª Jordina Vieira Ferraz (certidão às fls
36), descendente dos Índios Tapuia, desde 13 de abril de 1974,
com ela reside na reserva há mais de oito anos e tem filho, cuja
certidão de nascimento encontra-se acostada às fls. 37.
Reconheceu, ainda, que a prova testemunhal produzida nos
autos, demonstra que o mesmo foi aceito na reserva sem
resistência, pelo fato de ser casado com uma índia (fls. 106).
O ora apelado afirma que o seu sogro, o Sr. Jovêncio Vieira
Borges, autorizou-lhe edificar sua moradia nas terras em
comento onde, inclusive, tem algumas plantações, observando,
o douto Juízo a quo, que tendo sido o mesmo aceito
pacificamente na reserva, invasor ele não é.
Pois bem. Da análise dos fatos extrai-se que não trata os autos
de reintegração de posse, como quer parecer a FUNAI. O que
se observa é que o convívio do ora apelado com os índios
passou a extrapolar os procedimentos de convivência regular,
como consignado na sentença recorrida. Contudo, o próprio
Estatuto do Índio autoriza a aplicação de sanções penais ou
disciplinares, pelo grupo tribal, a seus membros. O Estatuto do
Índio (Lei nº 6.001/73), por sua vez, consigna que “serão
respeitados os usos, costumes e tradições das comunidades
indígenas e seus efeitos, nas relações de família, na ordem de
sucessão, no regime de propriedade e nos atos ou negócios
realizados entre índios, salvo se optarem pela aplicação do
direito comum” (art. 6º). Ainda, em seu art. 57, dispõe que
“será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo
171
4.1. Violência do Estado contra os Povos Indígenas do Cone Sul do Mato Grosso
do Sul: notas sobre a história da expropriação das Terras Indígenas.
O filme Ñande Guarani mostra o povo Guarani como um povo milenar que
habita a América do Sul, em regiões onde atualmente se localizam Bolívia, Paraguai e
Brasil67.
Costumava-se dizer que o Paraguai era a pátria dos Guarani. Mas a palavra
Paraguai, no século XVI, designava toda a bacia dos três grandes rios que convergem
para o estuário da Prata (LUGON, 2010:21).
Ao abordar a história colonial referente à população Guarani,
especialmente a partir dos Manuscritos da Coleção de Angelis
(1951), é possível identificar cinco grandes diferenciados
grupos ou subgrupos, com diferentes características, mas que
foram incluídos na categoria genérica dos “Guarani”. Assim,
com a chegada dos europeus, criam-se categorias identitárias
intimamente relacionadas ao mundo colonial. Segundo os
relatos acima referidos, os Cario estavam localizados nas
proximidades do Rio Paraguai, mais especificamente nas
imediações da atual cidade de Assunção (1537). Já os Paraná
67
O filme retrata o histórico dos povos na região os fluxos migratórios, demonstrando
como os problemas que os Guarani enfrentam em seu dia-a-dia são os mesmos em todos
os lugares em que vivem. A grande luta deles é pelo reconhecimento de seus direitos
enquanto sociedade culturalmente diferenciada, e seu maior desafio é a demarcação de
partes de suas terras usurpadas no processo de colonização da América do Sul.
174
68
O termo ñanderu designava as chefias de família extensa. Cabia-lhes atribuições nas
esferas política e religiosa. Atualmente, essa expressão inclui todas aquelas pessoas
iniciadas nas práticas rituais e dirigentes de grupos de reza. Estas podem, ainda, ser
denominadas, genericamente, de caciques ou rezadores, sendo estes os termos mais
recorrentes nas falas dos indígenas.
69
Inclusive com jurisdição própria, conforme lembra Libardo José Ariza (2009:
216), quando demonstra a vigência do pluralismo jurídico colonial, ao resgatar
a Lei nº 72 de 1892, que determinava a competência da jurisdição eclesiástica
para cuidar dos crimes cometidos pelos indígenas.
175
70
“Desde 1618, os paulistas, conhecidos como mamelucos, tinham realizado
pequenas expedições contra os guaranis. Em 1528 e nos anos seguintes o
fizeram com um verdadeiro exército (…), no total 15.000 guaranis tinham sido
acorrentados e escravizados. Foi então, decidido que os Padres Maceta e
Mansilla iriam ao Brasil para pedir justiça ao capitão-geral (LUGON, 2010, p. 35
e 36)”.
71
Título da 1a edição da obra no Brasil, em 1970. Através de sua narrativa
sobre os modos de vida, a agricultura, o artesanato, as artes, a botânica, o
comércio, a moeda, a propriedade, o trabalho e a divisão dos seus resultados,
o autor defende que a aproximação destes dos mundos gerou uma síntese
cultural muito avançada em relação ao projeto colonial.
176
72
Entre elas o autor destaca 07 reduções, atualmente em território brasileiro,
conhecidas pelo nome de: Sete Povos das Missões, São Borja, São Luiz, São
Lourenço, São João, São Nicolau, Santo Ângelo e São Miguel do Arcanjo
(LUGON, 2010, p. 194).
177
73
“Os Campos de Vacaria compreendem uma ampla região, a noroeste,
limitada pela Serra de Maracaju e banhada pelos rios Miranda, Aquidauana e
Nioaque; ao norte pelo Anhanduí e ao sul pelo rio Dourados, tendo ao centro os
rios Brilhante e Vacaria. A região é disputada por portugueses-brasileiros e
espanhóis- paraguaios durante séculos (veja Esselin, idem, capítulo 1). Uma
das vias de acesso para as expedições provenientes do lado português-
brasileiro é através dos rios Paraná, Ivinhema e Brilhante, enquanto a via de
acesso usada pelos espanhóis-paraguaios é o rio Paraguai (Guimarães 1992:
11, apud, VIETTA, 2007, p. 31)”.
178
toma posse de terras entre o rio Dourados e o arroio Estrela, onde monta uma fazenda
para a criação de gado, a fim de abastecer seus ranchos ervateiros (VIETTA, 2007, p.
47)”. Em 1882 consegue uma concessão imperial para explorar a extração de ervais, nas
“terras devolutas” mato grossenses, consolidando a Cia. Matte Laranjeira e iniciando o
processo de abuso do poder e violência na exploração das terras e das gentes (cf,
VIETTA, 2007; PACHECO, 2004; FERREIRA, 2007).
A Cia. Matte Laranjeira monopolizou extensos territórios. “Embora a
Companhia Matte Laranjeiras não fosse proprietária da terra, exerceu uma exploração
predatória da erva mate em territórios indígena, desarticulando inúmeras aldeias,
interferindo de forma incisiva no cotidiano indígena (PACHECO, 2004, p. 32)”. Vietta
ao abordar a exploração do trabalho a que os Kaiowá ficaram sujeitos, remete à
escravidão por dívida e a elaboração da erva:
Entre as formas utilizadas para aliciar a mão de obra está o
conchavo, promovido por recrutadores pagos pelo número de
pessoas que são capazes de atrair. De acordo com uma descrição
de Puiggari, o conchavador chega a um povoado, onde “avulte a
pobreza e a falta de recursos” e, articulado com o comissário de
polícia local, organiza um “jeroki macanudo”, cabendo a este
fazer os convites. O baile é farto e a cachaça “corre sem conta e
sem medida”. Durante a festa, o recrutador descreve os ervais
“com as mais belas cores”, destacando a possibilidade de “fazer
fortuna”, mas o argumento decisivo é o adiantamento concedido
ao futuro trabalhador. Ao amanhecer, todos os “homens
válidos”, que participam do baile, estão “engajados para os
ervais de Ponta Porã” (PUIGGARI 1933: 25 apud ARRUDA,
1989, p. 150- 151).
Além do controle direto dos ervais selvagens, através das milícias particulares, e
a constante ampliação das áreas concedidas, a Cia concede cessões para particulares, no
intuito de barrar invasões e consolidar o monopólio da produção. A região se torna
atrativa aos imigrantes (gaúchos, paulistas e riograndenses). Segundo Vietta (2007:50):
a renda obtida pela Matte Larangeira, em diversos anos supera
em cerca de seis vezes o orçamento total do estado (Arruda
1986: 200). Dentre todos os produtos exportados pelo Mato
Grosso entre 1901- 1911, a erva representa o de maior valor até
o ano de 1906, oscilando entre um mínimo de 44,4%, em 1905,
e um máximo de 63,2 %, em 1901.
empresa consegue manter o monopólio até a década de 1920, quando o governo inicia
um processo de concessões de doações de propriedades privadas e concessões de
exploração dos ervais.
Em 1910 com a criação do SPI, temos a concentração da população indígena,
através da expansão da política de confinamento nos aldeamentos e nas reservas,
enquanto as terras indígenas eram transformadas em terras devolutas. Através da
transcrição de trechos do Relatório Anual da 5a Inspeção do SPI, do ano de 1927,
percebe-se como foi desenvolvida a “cadeia dominial” das terras indígenas. Primeiro,
reconhecidas como Terras Devolutas, depois, requeridas e transformadas em terras
particulares:
Comprehende essa aldeia um total de cerca de duzentos índios,
que occupam terras devolutas do Estado e vivem de pequenas
lavouras e serviços de elaboração da herva matte, para os
hervateiros da região.
As terras devolutas por elles occupadas, constantes de matta de
cultura e algum campo, limitam-se ao: ao Nascente pelo rio
Yguatemy e terras de José Francisco Lopes; ao Norte pela
Estrada Nhuverá, que parte do patrimônio União; ao Poente pela
mesma estrada e terras de Fortunato A. Oliveira e ao Sul, pelo
córrego Lagoa, que é também, limite das terras de Fortunato A.
Oliveira.
74
Conforme vimos no item 2.2, o procedimento demarcatório está
regulamentado pela Lei nº1.775, de 1996 e compreende 6 fases: Identificação,
187
76
Trata-se de uma ação que visa anular ato administrativo, fundamentada em
vícios jurídicos: 1) falta de intimação, 2) omissão do levantamento fundiário, 3) erro
georeferenciado. A ação foi proposta em 20.07.2007, e desde 31/03/11, o processo está
parado, aguardando julgamento de agravo de instrumento no TRF3.
189
77
Ação cautelar nº 2001.60.00.0002031-2 – 2ª vara/JF, com pedido liminar para
garantir os trabalhos da FUNAI (18/05/2001) e Ação ordinária anulatória nº
2007.60.00.006004-0 (antecipação de tutela) – 4ª vara/ JF
78
O impedimento da entrada dos peritos e técnicos nomeados pela FUNAI nas fazendas
para realizar as perícias antropológicas, originou a assinatura de um Termo de
Ajustamento de Condutas (TAC), entre FUNAI e MPF para constituição dos grupos de
trabalho e finalização das perícias, necessária à produção de Relatório de Identificação e
Delimitação.
190
JARARÁ
Ação Ordinária (Naviraí), Dano Moral ou Material, Responsabilidade OR 200160000060164
Objetiva, Autor: Espólio de Miguel Subtil, Réu: União Federal e outro
Reintegração de Posse (Naviraí), Autor: Espólio de Miguel Subtil, Réu: OR 200160000018196
Funai e outro
LAGOA RICA PANAMBI
Ação Reivindicatória (Dourados), Autor:Vânia Berenice Xavier Guerra e OR 000007374
outros, Réu: União Federal e outro.
LARANJEIRA ÑANDERU
Reintegração de Posse (Dourados, 2ª Vara), Requerente: Júlio César OR 200860020012285
Cerveira e outros, Requerido: José Barbosa de Almeida (Representante da
Comunidade Indígena)
PASSO PIRAJU
Ação Civil Pública, Restituição de Área Indígena Autor: Ministério Público OR 199760000008641
Federal, Réu: João Jose Jallad (Dourados) e outros (Sentença já prolatada)
Ação Civil Pública, Autor: Ministério Público Federal, Réu: Sebastião OR 970000864979
Alves e outros. Distribuição por dependência ao processo nº 97.41-9 (Ação
Possessória)
Ação Cautelar Inominada Antecedente, Autor: João Jose Jallad e outros OR 9700008975
Réu: União Federal e outro (2ª Vara Dourados). Antecede os autos nº
199760000031481
Ação Declaratória Positiva de Domínio por parte dos autores, cumulada OR 199760000031481
com ação declaratória de nulidade do processo administrativo
FUNAI/BSB/1.303/95, Autor: João Jose Jallad e outros Réu: União Federal
e outro (2ª Vara Dourados)
TAKUARA
Interdito Proibitório/ Reintegração de Posse, Autor: Vanda Moraes Jacintho OR 200360020036048
da Silva e outros, Réu: Dirce Veron e outros.
Interdito Proibitório/ Reintegração de Posse, Autor: Vanda Moraes Jacintho OR 200360020007103
da Silva e outros, Réu: Comunidade Guarani Kaiowá e outros.
79
Não é possível consultar pela origem esse processo, embora a consulta
no TRF3, pelo número da AC remeta aquele número como origem.
193
Interdito Proibitório c/ pedido liminar, Autor: Jacintho Honório Silva Filho, OR 200760060009244
Réu: Município de Juti e outros.
Ação Civil Pública, Direitos Fundamentais Indígenas, Autor: Ministério OR 200360020002178
Público Federal, Réu: Cacilda Moraes Jacintho Ferraz e outros.
Mandado de Segurança, Anulação de Ato administrativo Impetrante: OR 200860060008116
Monica Jachinto de Biasi Impetrado: Município de Juti
Procedimento Ordinário, Autor: Monica Jachinto de Biasi, Réu: União OR 200560060008802
Federal e outros.
Reintegração de Posse, Autor: Monica Jachinto de Biasi, Réu: União OR 199960020010741
Federal e outro.
Reintegração de Posse, Autor: Monica Jachinto de Biasi, Réu: Índios da OR 200160020013143
etnia Guarani Kaiowá da Aldeia Tay Kue em Caarapó/MS (Naviraí).
Homicídio Doloso, Autor: Ministério Público Federal, Réu: Carlos Roberto OR 200360020003742
dos Santos, Estevão Romero e Jorge Cristaldo. DESAFORAMENTO:
200703000367260
Ação Civil Pública, (Dourados) Autor: Ministério Público Federal, Réu: OR 2009.60.06.000684-7
Jacintho Honório.
YVY KATU
Reintegração de Posse (Naviraí), Autor: José Maria Varago e outro, Reú: OR 200460020000022
FUNAI
Ação de Indenização por danos materiais (Naviraí) Autor: Pedro Fernandes OR 200460050009507
Neto, Reú: União Federal e Outro.
Ação Declaratória de Nulidade de Ato Administrativo e positiva de domínio OR 200560060011412
(Naviraí) Autor: Flavio Pascoa Teles de Menezes, Réu: FUNAI e outro.
80
Entrevista realizada no dia 26 de Setembro de 2011, na sede do MPF
em Dourados.
198
81
Entrevista realizada no dia 26 de Setembro de 2011, na sede da ODIN/
Dourados.
199
82
A promulgação do Decreto nº 7.056 no apagar das luzes de 2009, foi
posteriormente revogado em 2012, pelo Decreto nº 7.778.
202
próprios dos povos na escolha de como seguir reproduzindo seus modos de vida:
A vila olímpica é um monumento ao desrespeito aos povos
indígenas. Demonstração in concreto de como a questão
indígena é tratada, ou seja, são soluções que vem de fora para
dentro, sem que as comunidades sejam escutadas, como se elas
fossem um ser a ser pensado e não como um ser pensante, então
muita gente estuda, mas muito pouca gente escuta o que elas
pleiteiam, o que elas querem. A vila olímpica é uma solução que
veio de fora para dentro. Há ainda a possibilidade de ter tido
havido desvio de verbas. É uma casca, sem conteúdo, porque
ninguém sabe o que fazer com aquilo, porque como não foi
discutido com as comunidades... ta lá... fechado.... verificou-se
que, o antigo prefeito (que foi preso, cassado, juntamente com
11 vereadores, você deve ter ouvido falar nisso) foi quem
assumiu esse projeto. Mas a prefeitura atual não quer assumir a
manutenção, diz que não tem interesse, tem muita coisa na
cidade para fazer, sendo que oficialmente a vila veio como
projeto para o município. Na verdade a TI é um peso para
dourados, e o discurso é que o ideal é que a reserva virasse o 1º
município indígena do Brasil. Então você percebe que o discurso
é que os índios são um estorvo para o município, só trazem
problemas, drenam o dinheiro da prefeitura, que os índios são
absolutamente obstáculos ao desenvolvimento. Essa é a visão
corrente das autoridades, aí, vc imagina a visão do cidadão
comum, que é bombardeado pela mídia... Eu lembro uma vez
que eu tava conversando com o Homero, que trabalha com
escoteiros, e o fazendeiro, que chamou as crianças para ver um
trabalhador, muito empenhado nas suas funções, que “nem
parecia índio”. É mais ou menos aquele negócio de negro de
alma branca.
(...)
Em relação a organização social existe um ponto claro de
infecção. A entrada das escolas provocou reflexos que não são
pequenos. As crianças hoje falam um português muito melhor do
que falam os mais velhos. O português é que vai fazer com que
elas tenham contato com o mundo externo – prefeitura, MPF,
etc. fator de empoderamento. Com isso, os pais perderam o
controle e ascendência sobre os jovens. Os jovens ficam numa
situação extremamente complicada. Eles estão recebendo muito
mais influências externas, mas ao mesmo tempo, sofrem todas
as barreiras discriminatórias que vem pelo fenótipo. E é
extremamente complicado saber como eles reagem a isso. Tem
uma demonstração muito interessante que é o grupo de rapp
indígena, as letras são muito interessante, tentam espelhar as
discriminações que eles sofrem, e que muitas vezes
desembocam em violência. Eles estão numa zona cinzenta, em
lugar nenhum, nem aqui, nem lá. 90% da violência, causa de
álcool, desses 70% são jovens. Dourados talvez seja uma das
áreas mais difíceis de se entender, muitas variáveis que
aumentam a complexidade e provocam efeitos relevantes nas
204
83
Segundo Marco Antonio, tekoha é mais do que terra indígena ou organização social.
É uma vinculação da pessoa com aquele local. Local que antes habitávamos. Ligação
da pessoa com o local de origem. Enquanto os indígenas não retornarem aos seus
tekoha, não há como haver uma perpetuação de seus valores, usos e costumes.
84
Conceito utilizado por OLIVEIRA (2006), para designar a construção de direitos,
significados, práticas e concepções, constituídas a partir da relação conflituosa entre
culturas distintas, como na relação entre Estado e Povos Indígenas.
207
ao Sul com o Paraguai e o Paraná e a Leste com São Paulo, Minas Gerais e
Goiás.
urbanos.
Omissão/ morosidade 54 19
regularização de terras
86
Dados do Mapa da Violência 2011 do Ministério da Justiça revela ainda que a taxa de
suicídios em Mato Grosso do Sul teve um crescimento vertiginoso, puxada pelos casos
212
envolvendo indígenas. Dos cem casos registrados no Brasil no ano de 2008, cinqüenta e
quatro foram no Estado. A maior taxa de suicídios localiza-se em dois municípios
pertencentes à área de conflito indígena, Amambaí e Paranhos. A taxa de suicídios na
população em geral de Mato Grosso do Sul em dez anos cresceu 39,3%. O índice de
suicídios foi de 5,6 casos por cem mil habitantes em 1998 passando para 7,8 em 2008.
Quando a taxa é estratificada para a população jovem, o aumento chega a 95,3%.
87
Dados do Ministério do Trabalho e Emprego de 2007 apontam que boa parte dos
1.634 trabalhadores libertados das condições degradantes de trabalho em Mato Grosso
do Sul naquele ano pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel do Ministério do
Trabalho e Emprego são indígenas, como no caso da fazenda DEBRASA, unidade da
Companhia de Açúcar e Álcool, onde 1.011 indígenas estavam alojados em condições
precárias.
88
Nesse sentido, destaca-se a importância na realização de pesquisas empíricas, que
tenham como recorte entender as condições em que os indígenas estão submetidos no
sistema carcerário. Ou seja, em que medida os instrumentos de garantia da
interculturalidade estão sendo respeitados no curso processual da ação penal? Em que
medida as dinâmicas religiosas e culturais são respeitadas durante a execução penal?
Quais dimensões de dano para a comunidade indígena que o encarceramento produz?
Como a saúde alimentar e a integridade física dos indígenas é assegurada?
213
Nos municípios vistitados no cone sul do MS, existem ações criminais de toda
ordem. Desde a tentativa de homicídio ao homicídio consumado, passando pelos casos
de violência doméstica89, estupro de vulnerável, lesões corporais leves, pertubação da
ordem.
Denunciados pela própria comunidade, na busca de policiamento e paz social,
ou provocados pelos próprios agentes do Estado, vamos encontrar todo tipo de caso:
envolvendo índios em conflito com a sociedade nacional, ou índios contra índios,
motivados por disputa interna (política ou por terras), embriaguez, violenta paixão,
doença mental ou todo tipo de má sorte. Para o advogado Rogério Batalha, é preciso
dialogar com a antropologia para entender esse fenômeno:
A antropologia explica esse fenômeno da própria comunidade
buscar a polícia para resolver seus problemas internos, a partir
da situação de confinamento, porque antes, os índios, kaiowá,
guarani, resolviam seus problemas internos, a partir de uma
ampla noção de territorialidade, onde as situações de
tensionamento se resolviam com o afastamento temporário,
criando outras relações de poder com outros grupos, coisa que
hoje, pensando, p.e., a realidade de Dourados, 13 mil indígenas,
3.500 hectares, não existe nenhuma possibilidade de eles usaram
seus próprios mecanismos, tradicionais, e dado uma situação de
violência interna muito grande, principalmente envolvendo
jovens (....), organizados em gangues, chegando a um ponto que
não há mais condições. Amambaí, Dourados, Caarapó.
89
Para a defensora pública de Dourados, Dra. Inez, os casos de violência doméstica
reduziram muito, porque as medidas protetivas ficaram sem efeito, quando esbarram na
dimensão cultural: “P.ex., como faz com a casa? Normalmente há separação de corpos
e expulsão da mulher. O homem fica com tudo”.
214
vivência no fórum, nos espaços de audiência e da análise dos autos, bem como das
entrevistas: uma não aceitação dos instrumentos reconhecidos normativamente que
ajudariam nessa tradução cultural. Tanto o recurso aos antropólogos para verificar os
limites da culpabilidade, através do grau de conhecimento da lei e reprovação da
conduta na comunidade, bem como da possibilidade de outra medida interna
sancionatória; como a utilização de intérpretes nos atos processuais, em especial nos
interrogatórios.
Via de regra, os pedidos são negados, havendo uma predominância do discurso
assimilacionista, sob o argumento de que “a pessoa é integrada, fala o português,
trabalha em fazendas da região”. Conforme observamos pelo trecho da entrevista do
juiz Cesar de Souza Lima que expressa bem:
Para Wilson Mattos (2011) a estrutura do judiciário não está preparada para lidar
com toda essa diversidade, e por isso acaba reagindo de forma violenta:
90
Nesse sentido faço menção as decisões que atribuem penas mais altas a homicídios
provocados pelo uso do facão, do que as penas provocadas pelo uso da arma de fogo,
como se o facão não fosse o instrumento de trabalho, que no momento da ação estava
disponível e acessível ao trabalhador. E arma como se fosse o instrumento da morte
limpa. Sendo que muitas vezes esse argumento irá determinar a aplicação da Lei de
Crime Hediondos, afastando qualquer possibilidade de uso da legislação indígena
especial, como o art.56 do Estatuto do Índio.
220
Para Wilson Mattos (2011) se deve ao perfil dos profissionais que atuam na
esfera estadual: “Salvo Amambaí, que ta servindo interesses, no poder judiciário, o que
existe é uma rotatividade grande. E a gente sabe, se não tiver pedigri, não vai haver
222
Percebemos que a adoção por casal não indígena e a separação dos irmãos
consangüíneos, para além da definição do que seja situação de “risco social” para
indígenas desaldeados e a própria idéia de manter uma criança em situação de distância
familiar, abandono e violência, compõem a complexidade que caracteriza o
desenvolvimento dessa ação institucionalizada. Fico considerando a realidade das
aldeias, os desarranjos sociais, e só penso na narrativa do Cesar de Souza Lima sobre
uma situação que ele viveu quando
Além dos dados do relatório, vale destacar que para minha principal
interlocutora, há que se considerar ainda ausência de informações concretas sobre: 1) as
ações judiciais de perda do poder familiar para as crianças que iam aos “centrinhos”
criados para recuperar crianças desnutridas, 2) os municípios que não possuem casa de
acolhida e desenvolvem projetos sem qualquer documentação/ controle, como o família
acolhedora do município de Laguna Caarapã.
Segundo seu relato, confirmado pela Juíza, Larissa do Amaral (Justiça Estadual
de Ponta Porã), o município tem o Programa Família Acolhedora, aprovado pela
legislação municipal (Lei 274/ 2006), que determina o pagamento de um salário
mínimo por criança “acolhida/adotada”. O uso dessa terminologia é uma tentativa de
evidenciar a extravagância da situação, já que os dados indicam que a provisoriedade
estabelecida na lei, já perdura, em alguns casos, há quatro anos.
As informações preliminares indicam que 13 crianças indígenas estão nessa
situação, mas não existem relatórios da assistência social sobre as reais condições em
que estas crianças se encontram. Interessante observar que as famílias indígenas não
conseguem se cadastrar no Programa, sendo o Conselho Municipal responsável pela
sua gestão. Sequer aparecem nas estatísticas das crianças em abrigos. O que para Ruth
227
Gomes abre margem para todo o tipo de especulações, como o envolvimento nas redes
de trafico internacional, exploração sexual, trabalho infantil.
São três irmãos, desde outubro de 2007, cinco irmãos desde maio de 2010 e
outros cinco irmãos desde junho de 2008. Sendo que estes últimos estão separados em
duas famílias, sem convivência.
Em que pesem as informações do pastor de que “a FUNAI abriu mão da adoção
por família indígena pelas dificuldades encontradas, autorizando o fórum a colocar os
irmãos na fila da adoção (pg. 12)”, a conversa com a juíza de Ponta Porá, o juiz de
Amambaí, e outros interlocutores fazem menção ao aumento, nos últimos cinco anos,
de ações de guarda ficando nas comunidades, tendo em vista o auxílio concedido pelo
INSS.
Também é importante considerar as tentativas de articulação entre órgãos que
direta ou indiretamente, atuam no sistema de justiça. Conforme esclareceu a defensora
pública de Dourados, Ligiane Motoki, o fim da atuação judicial da FUNAI, nestes tipos
de conflito, já que a realidade da atuação da advocacia da FUNAI em Amambaí é uma
exceção, gerou um aumento significativo de ações na defensoria pública e uma
provocação do Conselho Superior da Defensoria Pública, para construir uma parceria
com a AGU e desenvolver estratégias comuns para diferentes problemas judiciais
envolvendo indígenas. No mesmo sentido, a coordenadora regional das defensorias
públicas, Inês Batisti Dantas Vieira, esclarece que é impossível ter um
tratamento igual no sistema de justiça, porque a expressão da cultura é muito
viva e impõe limites na condução de qualquer procedimento – desde a
intimação/ citação ao cumprimento de decisão.
91
Interessante que enquanto conversávamos dois grupos diferentes de
evangélicos foram procurar o pajé para solicitar a utilização do espaço coletivo,
administrado por ele, no mesmo dia. Isso revelou para mim, em que pese às
divisões entre católicos e neopentecostais, um poder de centralidade e
organização daquele coletivo.
92
O ogapsi é uma casa de reza, de arquitetura kaiowá, para realização de
rituais tradicionais religiosos.
229
Com isso percebemos que a feitiçaria é fator de medo entre os Kaiowá. E talvez
por isso as igrejas neopentecostais tenham conseguido, atrair tantos fiéis. Nos relatos foi
sugerido uma feitiçaria contra o pastor, que por ser um homem muito bom, não foi
alcançado pela maldição, que acabou atingindo as crianças e jovens.
230
Para o historiador José Carlos Sebe Bom Meihy, que publicou o livro Canto de
morte kayowá, com os suicídios os guaranis estão passando um recado. A obra de Sebe
remete a um aspecto também acentuado pelo padre Meliá: se a voz e a palavra são o
mesmo que a alma, é bastante significativo que os suicidas morram pela garganta (no
enforcamento) e pela boca (no envenenamento). Ninguém sabe com certeza por que
231
Para o Marco Antonio (2011), existem dois pesos e duas medidas no tratamento
das questões civis e penais:
Mas o caso que melhor reflete a dimensão cultural está relacionado às demandas
previdenciárias para crianças/mulheres que tem filho com menos de 14 anos de idade e
não são legalmente alcançadas pelo benefício do INSS. Estas demandas apareceram em
Dourados e estão sendo encaminhadas pela Defensoria Pública da União, que entre
procedimentos arquivados e em andamento registram cerca de 150 atendimentos nesse
perfil.
Desta forma, percebemos que o judiciário está desafiado a construir uma outra prática
para conseguir alcançar a dimensão de valorização da diversidade cultural, uma nova
sensibilidade jurídica, orientada para a superação do positivismo jurídico e efetivação
da descolonialidade e da interculturalidade enquanto pressupostos epistemológicos da
ação-reflexão jurídica.
235
236
À GUISA DE CONCLUSÃO
nulidade dos títulos inseridos na área demarcada em 1938. No TRF1, com efeito, a luta
de retomada dos territórios do povo Tupinambá, na Bahia marcou o conjunto das ações
analisadas.
Embora todas as ações relacionadas aos conflitos de terra envolvam uma
complexidade específica, a preponderância temática no quantitativo total das decisões,
revela a necessidade de se constituir uma estratégia jurídica de enfrentamento do
problema, que não passe pela pretensão de redução de sua complexidade, como temos
com a proposta de pagamento do valor da terra na indenização, negando todo o
indigenato e os direitos originários dos Povos Indígenas. É a defesa do indigenato como
direito congênito e primário, que garante o imediato domínio da terra (e não uma posse
a ser legitimada) e determina a ação enérgica do Estado no reconhecimento e
demarcação das TI. O executivo e o judiciário precisam assumir com prioridade o
enfrentamento da questão, como temos com as forças-tarefas interinstitucionais para
enfrentamento de questões que colocam a soberania, os direitos fundamentais e a
democracia em risco. As ações judiciais relacionadas à titulação das terras indígenas
devem ter prioridade de julgamento. Embora não constitua tema central da tese, há que
se destacar que a existência de trabalho escravo e de grupos armados nas fazendas
representa flagrante atentado à ordem constitucional e ao Estado Democrático de
Direito (CRFB, art. 5º, XLIV). No caso do estado do MS, a atuação do poder local,
diga-se, fazendeiros com bandos armados, e com anuência do governo (que há muito
declarou política anti-indígena), não respeita os limites mínimos de respeito à dignidade
da pessoa humana e a própria cidadania, como tivemos recentemente no caso dos leilões
de gado para recolher fundos para subsidiar o enfrentamento/ contratação de “vigilância
privada” contra as ocupações de terras. Ou mesmo as ações civis públicas, que pedem
acesso aos poços d‟água no interior das fazendas, bem como os incidentes recentes
(massacre no acampamento indígena Guaiviry, os assassinatos das lideranças, a
tentativa de genocídio no acampamento Apikay, o incêndio no ônibus com crianças
indígenas a caminho da escola, etc.), são exemplos bastante concretos do que dizemos,
e, com efeito, requerem uma ação enérgica do Estado Nacional, no combate destas
práticas.
Enquanto a questão não se define, os conflitos de terra e assassinato de indígenas
continuam. Ademais, tendo em vista que os conflitos fundiários são resultados de uma
prática estatal pautada pela lógica desenvolvimentista agro-exportadora, perpetuada
desde o período colonial, intensificada pela revolução verde e reproduzida, com
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249
LEGISLAÇÃO
ENTREVISTAS GRAVADAS
Art. 1.º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem
como fundamentos: I - a soberania;
Art. 3.º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV -
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação;
Art. 4.º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos
seguintes princípios: III - autodeterminação dos povos. Parágrafo único. A República
Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos
povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de
nações;
Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LV - aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Art. 20. São bens da União: XI - as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. § 2.º
A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras
terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do
território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei.
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XIV - populações indígenas;
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: XVI - autorizar, em terras
indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de
riquezas minerais;
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: XI - a disputa sobre direitos
indígenas;
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: V - defender judicialmente
os direitos e interesses das populações indígenas;
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo
este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado;
Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de
energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração
ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do
produto da lavra. § 1.º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos
potenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante
autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa
brasileira de capital nacional, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas
quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas.
Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a
assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais
e regionais. § 2.º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa,
assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e
processos próprios de aprendizagem.
Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às
fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das
manifestações culturais. § 1.º O Estado protegerá as manifestações das culturas
261
Campo Grande
AGU/ Funai Adriana Rocha
Tiago Figueiredo
MPF Emerson Kalif
Advogados Mario Morandi/ Rede Nacional de Advogados e
Advogadas Populares – RENAP
Rogerio Batalha Rocha/ Centro Indigenistra Missionário
– CIMI
Wilson Capistrano/ Advogado Indígena
José Campos/ MST
Defensoria Pública 1ª e 2ª instância totalizando 67. Tentativa de entrada
pela responsável pela violência doméstica.
DPU Lívea Cardoso Manrique de Andrade. Substituta:
Simone Castro Feres de Melo
MPE/MS s/ contato
Diretor do Fórum: JF e JE JF: juiz da 4ª vara – Pedro
JE: Luiz AntonioCavassa de Almeida
Ponta Porã
AGU/ Funai Rodrigo CollaresTejada
MPF Thiago dos Santos Luz
Advogados Rogerio Batalha Rocha/ Centro Indigenista Missionário
– CIMI
Defensoria Pública 5 membros. Entrada através do coordenador regional,
Pedro Paulo Gasparini.
DPU Não há
MPE s/ contato
Diretor do Fórum: JF e JE JF: Lisa Taubemblatt/ Substituta: Lidiane Maria Oliva
Cardoso
JE: Larissa Castilho da Silva Faria
Amambaí
AGU/ Funai Luiz Cesar Azambuja
MPF Thiago dos Santos Luz
Advogados Privados atuantes/ vários
Defensoria Pública 2 membros. Entrada através do coordenador regional,
Dr. Marcelo Marinho da Silva
MPE Ricardo Rotunno
Diretor do Fórum: JF e JE Não há JF
JE: Cesar de Souza Lima
Dourados
AGU/ Funai Alinne Melo
MPF Marco Antonio
Omero/ antropólogo
Advogados Wilson Mattos - advogado indígena, vinculado ao
ODIN/ CINEP
Defensoria Pública 16 membros. Entrada através da coordenadora regional:
Inês (violência doméstica) eLigiane (infância)
263
1. AC 2556 / MS Desenvolvimento
2. ACO 1191 / RR Desenvolvimento
3. ACO 1513 ED / MS Terra e Território
4. ACO 1551 / MS Desenvolvimento
5. ACO 312 / BA Terra e Território
6. ACO 328 / MT Terra e Território
7. ACO 497 / RR Terra e Território
8. ACO 558 MC / RO Terra e Território
9. ACO 577 / AM Terra e Território
10. ACO 876 MC-AgR / BA Desenvolvimento
11. ADI 3335 / DF Terra e Território
12. ADI 3573 / DF Desenvolvimento
13. ADI 3573 / DF Desenvolvimento
14. AI 318218 / DF Terra e Território
15. AI 318218 / DF Desenvolvimento
16. AI 348547 / SP Terra e Território
17. AI 496653 AgR / AP Penal
18. AI 530677 / TO Penal
19. AI 563403 / BA Penal
20. AI 674763 / SP Penal
21. AI 767462 / AC Desenvolvimento
22. AI 767696 / RS Terra e Território
23. AI 853522 / SC Penal
24. ARE 638256 / MS Terra e território
25. HC 108154 / DF Terra e Território
26. HC 110120 / DF Desenvolvimento
27. HC 71835 / MS Penal
28. HC 75404 / DF Penal
29. HC 79530 / PA Penal
30. HC 79530 / PA Penal
31. HC 80240 / RR Desenvolvimento
32. HC 81827 / MT Penal
33. HC 91121 / MS Penal
34. HC 91121 reconsideração / MS Penal
35. HC 91313 / RS Penal
36. MS 21892 / MS Terra e Território
37. MS 25483 / DF Terra e Território
38. MS 25483 MC / DF Terra e Território
39. MS 25550 MC / DF Terra e Território
40. MS 28541 / DF Terra e Território
41. MS 28574 / DF Terra e Território
42. MS 29293 MC / DF Terra e Território
43. Pet 1208 / MS Terra e Território
44. Pet 2604 / PA Desenvolvimento
45. Pet 3388 / RR - RORAIMA Terra e Território
46. Rcl 2833 MC / RR Terra e Território
47. RE 179485 / AM Penal
48. RE 183188 / MS Terra e Território
49. RE 263010 / MS Penal
50. RE 270379 / MS Penal
51. RE 273604 / SP Terra e Território
52. RE 282169 / MA Penal
53. RE 419528 / PR Penal
54. RE 429009 / SC Terra e Território
265
STJ
TRF1
1. AC 1997.01.00.013361-9 / BA Terra e Território
2. AC 1997.39.00.010636-7/ PA Terra e Território
3. AC 2000.01.00.006545-1/ BA Terra e Território
4. AC 2000.01.00.067080-0 / MT Terra e Território
5. AC 2000.01.00.067444-1/ GO Desenvolvimento
6. AC 2000.01.00.096900-1 / AC Desenvolvimento
7. AC 2000.01.99.087880-6 / RO Desenvolvimento
8. AC 2001.01.00.040380-5/ RR Terra e Território
9. AC 2002.33.01.001825-6 / BA Terra e Território
10. AC 2002.37.00.003918-2 / MA Terra e Território
11. AC 2002.41.00.004037-0 / RO Desenvolvimento
12. AC 2003.01.00.010055-0 / DF Terra e Território
13. AC 2003.32.00.004528-5 / AM Desenvolvimento
14. AC 2003.37.00.009953-4 / MA Terra e Território
15. AC 2005.01.00.012951-0 / AC Desenvolvimento
16. AC 2005.32.01.000046-5 / AM Terra e Território
17. AC 2005.37.00.002931-2/ MA Terra e Território
18. AC 2005.38.00.005481-5 / MG Usos, costumes e tradições
19. AC 2006.01.00.039892-1 / MT Terra e Território
20. AC 2006.33.11.001550-1 Terra e Território
21. AC 2008.01.00.008321-9/ MA Terra e Território
22. AC 2008.01.00.061985-9/ MT Terra e Território
23. AC 92.01.28092-0 / DF Terra e Território
24. AC 95.01.13345-1 / PA Desenvolvimento
25. AC 96.01.40078-8 / MA Terra e Território
26. AC2002.33.01.001103-0/ BA Penal
27. ACR 1997.42.00.001844-2 / RR Penal
28. ACR 1999.37.01.000848-0 / MA Penal
29. ACR 1999.37.01.001084-0 / MA Penal
30. ACR 2000.01.00.049688-4 / RR Penal
31. ACR 2003.33.00.017222-5/ BA Desenvolvimento
32. ACR 2003.37.00.001010-9 / MA Penal
33. AG 0064574-47.2012.4.01.0000/BA Terra e Território
34. AG 0002572-07.2013.4.01.0000/ AM Usos, costumes e tradições
35. AG 0010000-74.2012.4.01.0000/MT Terra e Território
36. AG 0017888-60.2013.4.01.0000/DF Terra e Território
37. AG 0018341-89.2012.4.01.0000 / MT Desenvolvimento
38. AG 0025127-18.2013.4.01.0000/PA Desenvolvimento
268
TJ/ MS
1. 2010.026428-9/0000-0 Apelação Desenvolvimento
Campo Grande
2. 0005359-30.2001.8.12.0019 Apelação Penal
Ponta Porã
Campo Grande
23. 0003754-88.2010.8.12.0001 Apelação Desenvolvimento
Campo Grande
24. 0000006-48.1997.8.12.0019 Apelação Penal
Ponta Porã
25. 0000557-52.2003.8.12.0040 Recurso em Sentido Penal
Estrito
Porto Murtinho
Sistematização: Erika Macedo Moreira.
Fonte: Sistema eletrônico de consulta a jurisprudência.