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Menon Platao Geometria

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Teoria, prática e expressão matemática: um tributo a José Sousa Ramos Colégio do Espírito Santo, Universidade de Évora - 15 de Janeiro de 2011.

Elementos para a análise da geometria (advertência)


no Ménon de Platão Este nosso trabalho não se desenvolve de forma linear, prossegue por segmentos que devem ser lidos
separadamente, mas de forma ordenada…
… por Noémio Ramos Pressupõe uma primeira leitura (as necessárias) do Ménon de Platão para se ficar a conhecer a totalidade dessa obra,
e depois, a leitura da nossa análise do texto de Platão, que apresentamos aqui à esquerda, que também deve ser
acompanhada pelo texto de Platão conforme as cotas assinaladas. E, por último, o texto que se segue impresso mais à
70 a Apresenta-se o que estará em discussão… direita, acompanhado pelo texto das restantes colunas à esquerda quando fizer referência às questões aí tratadas e, pela
A virtude (1) será coisa que se ensina (?) ou (2) coisa que se possa adquirir pelo observação e experimentção, dos ficheiros (em referência) com as questões geométricas pelo programa Geogebra
exercício de uma actividade (?), ou, se em caso algúm (3) será coisa que se (www.geogebra.org). Contudo, este nosso trabalho trata apenas de um tema secundário ao tema do Ménon (a virtude),
manifesta no Homem por sua natureza ou de alguma outra maneira? limita-se assim à geometria / aritmética , que serve a Sócrates como paradigma (e o melhor paradigma ) para o
b Lugar e Tempo da acção… Contexto histórico social e político. desenvolvimento da questão principal desta obra de Platão, a dialéctica (a Sabedoria primeira ) no estudo da virtude,
c significando esta, a excelência do comportamento do indivíduo perante os seus pares, a sociedade e o Estado.
x
x
71 a Sócrates sabe que nada sabe, nem sabe o que possa ser a virtude. Acesso ao programa de geometria... http://www.geogebra.org/
DOMÍNIO b Como é que não sabendo o que uma coisa é, se poderá saber que
SENSÍVEL tipo de coisa é?
desejo c Em Julho de 2008 publicámos as conclusões dos nossos primeiros estudos sobre
d Górgias dará lições sobre a questão da virtude, e é mestre de Ménon… Tese de Menón as obras de Platão, em Gil Vicente e Platão, Arte e Dialéctica, onde apresentámos um
conhecer e Um e outro perfilham a opinião geral (da maioria) - senso comum . resumo com um quadro que expressa a figura (em A República ) da linha dividida na
pelo sensível 72 a Uma multiplicidade na unidade , o aspecto plural da Virtude, haverá várias
vertical , que constitui uma representação esquemática da Teoria do Conhecimento de
virtudes? Conforme o ser e actividade humana?
Platão.[1] Uma teoria que o autor desenvolve senão em toda a sua obra, na maior parte
b Desmontagem analítica da tese primária e sensível.
Correcção da Tese dos seus textos, onde os seus diálogos (que considerámos serem textos didácticos
c
d Análise das caracteristicas comuns na diversidade sensível. para uso na Academia ) constituem uma formulação e expressão da prática teórica que
e Saúde, tamanho e força , apresentam o carácter da virtude. Fortaleza levou o filósofo à análise e construção conceptual daquele esquema da linha dividida
73 a … E estas caracteristicas encontram-se na diversidade dos seres humanos. na vertical .
b As virtudes estão no modo de actuar, nas acções humanas. Justiça No estudo que publicámos fizemos uma análise sumária do Fedro , do Hípias
c Prudência (Maior e Menor ) bem como uma análise completa do Íon , e demonstrámos como
d A unidade na multiplicidade do fenómeno (virtude). Platão desenvolve os seus diálogos seguindo o percurso da sua linha , desde o seu
e …. A Caracteristica da redondez numa figura - figura geométrica .
ponto inferior ao seu ponto mais alto, cumprindo os patamares da linha dividida .[2] E
qualitativa 74 a Coragem, Sabedoria,
Pluralidade de caracteristicas na unidade da virtude. (junta aTemperança ). no Ménon , o paradigma de construção do texto é o mesmo, não porque o autor se
quantitativa Grandeza de alma
figura
apegue a uma formulação rígida, mas porque pretende exprimir a natureza do
(análise): em
desenvolvimento humano do conhecimento e do saber no indivíduo e na sociedade.
geométrica A Início das questões da Matemática (geometria) analogia à virtude

no ideal, b A analogia com a geometria: "o que é a figura?" - Será a redondez a figura? Nos termos de uma “geometria secreta” (Jay Kennedy) da acção dramática do
círculo Devo então perguntar: "a redondez é a figura ou uma figura?" ...análise: base na diálogo, parece-nos que este texto de Platão se encontra dividido por uma divisão
para definir c Mas há outras figuras… Podemos até nomear quais! Do mesmo modo se pode observação sensível progressiva da sua linha de desenvolvimento, determinada pela média e extrema
superfície responder quanto à Cor: o que é a Cor? razão , conhecida por proporção de ouro , (a mesma proporção que encontramos no
unidade na d Na Unidade há uma Multiplicidade, e chamamos a muitas coisas por um só Partenon), os momentos temáticos mais importantes, do ponto de vista do tema, a
(uma medida ) seja
multiplicidade nome, mesmo que (semelhantes ou) contrárias umas com as outras. E todas
na quantidade virtude, encontram-se organizados nos segmentos resultantes, assim a divisão do
elas são figuras… Em nada o redondo é mais figura que o recto!
ΦΦ (tamanho) seja na tempo do diálogo tem a ver directamente com a geometria, tal como as analogias que
(círculo) e e O redondo e o recto… O redondo não é absolutamente mais figura servem de paradigma à análise (exame) da virtude.
qualidade (forma)
(quadrado) que o recto, nem este mais figura que aquele!

...para a análise da geometria no Ménon de Platão Noémio Ramos - 1 / 7


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a "bitola" 75 a O discurso visa definir a figura (a essencial, plana, a mais simples) pela Considerando o indivíduo inseparável da sociedade, Platão considera que o
(quali/quanti) delimitação de uma superfície - que é dada pela mudança de cor para além de desenvolver do conhecimento humano (indivíduo e sociedade) apresenta quatro
uma área, - definindo-a (apoiando-se na definição de cor que dará mais adiante). …em analogia com a
motivação da grandes momentos, iniciando-se pelo (1) domínio sensível, que corresponde à
Seja, sobre a figura, procuro, no redondo e no recto, e nas outras coisas a que virtude
questão aquisição de conhecimentos captados do mundo envolvente, incluindo tudo o que se
geometria chamamos figuras, aquilo que é o mesmo em todas elas . aprende sem se ser ensinado.
b Neste texto, a mais correcta definição de figura (a seguir completada com a Num segundo momento engloba a assimilação das tradições, as mitologias, os
figura plana …pela análise do
definição de cor): a figura é o único ser que acompanha sempre a cor. contos, tudo aquilo que é transmitido pela sociedade que envolve o indivíduo, o saber
conhecimento
c Perante a dúvida de Ménon (definir figura pela cor), sem definir a cor. Sócrates instituído e a cultura de uma sociedade, constitui o (2) domínio da crença (e opinião),
sensível
reafirma a sua resposta. o homem faz fé (acredita) no saber que lhe é transmitido. Neste domínio formam-se as
d Caberia ao interlocutor refutar… Contudo, num processo dialéctico (como no ...prepara a opiniões e o senso-comum , logo se instituem os mitos e, segundo a alegoria criada na
caso) é necessário não só responder com a verdade, mas também por meio introdução do saber
República, é neste domínio que se constitui a maioria na Caverna.
de coisas que o interlocutor admita que sabe (como verdade). habitual
sentido e Nestas circunstâncias Sócrates condescende e prepara uma definição de figura Com o advento da reflexão consciente surge o terceiro momento, o inteligível, (3)
comum mais evidente, nada de complicado... o domínio do racional, do entendimento, da lógica-matemática e da ciência. No
geometria, 76 a Sublinha a geometria, alerta o leitor para a diferença nas definições, a anterior desenvolvimento deste momento deve haver aprendizagem orientada pela reflexão, é
superfície, e na "superfície" e a seguinte pelos limites (término) de um "sólido". Onde o
onde pode intervir o ensino, onde se estabelecem (ou convencionam) princípios ,
sólido sólido termina … A figura é o limite do sólido.
argumentos e se constroem emaranhados de raciocínios baseados em hipóteses ,
b Platão introduz a seguir a questão da definição de Cor, exigência de Ménon que …por quem sabe .
concepções mais vastas (como a sua república ) que Platão apelida de sonhos da
pede uma definição de Cor. A resposta de Sócrates faz fé no saber …um Saber com
transmitido, será a de quem sabe, segundo diz, à maneira de Górgias… base nas "crenças". razão .
c Segundo Empédocles há certas emanações dos seres, que se relacionam com Por último, a clarividência, o (4) domínio da dialéctica, a (a) Sabedoria
os seus poros, adaptando-se-lhes, ou lhes são maiores ou menores. (sabedoria primeira ), do (b) Belo (o Belo realizado pelo homem, a Arte) e do (c)
(define) cor d supremo Bem (que Platão define como a Justiça distributiva ), que deverá ser atingido
…sem o pôr em
pela figura Sabendo-se que há algo a que chamamos visão e atendendo a estes por tomada de consciência (iluminação, clarividência) após percorrer todos os
causa,… fazendo fé
presupostos, (como diz Pindaro) atende ao que digo : A cor é uma emanação domínios anteriores, esgotando as hipóteses semelhantes ou contraditórias do racional.
no Saber
de figuras de dimensão proporcionada à visão e como tal perceptível.
o saber com e Menón (acha excelente) está de acordo com este saber habitual. Sócrates Os quatro domínios são representados na linha dividida na vertical, progredindo
base no ironiza, considerando ser trágico o estar de acordp com este tipo de saber, pelo do sensível, o primeiro em baixo, ascendendo ao segundo, a crença, constituindo estes
…saber habitual,
conhecimento que também podia, a partir desta definição, dizer algo a propósito dos outros dois, a parte mais curta da linha. o mundo sensível, ao qual se segue o inteligível, com
sensível sentidos (do som, do odor…). E Menón concorda. Embora a Ménon lhe agrade
aquilo em que se
acredita . a razão (lógica-matemática) na noética inferior e, por fim, a noética superior a
mais esta que a primeira definição de figura, Sócrates protesta reafirmando: a
sabedoria primeira (a dialéctica). Contudo, como Platão demonstra nas suas obras,
outra sim, a primeira (75b), é a melhor...
estes compartimentos (as divisões da linha) não são estanques, a cada passo são
Seguindo os paradigmas (figura geométrica) analisar a virtude solicitados os precedentes.
77 a Respeitando na integra a unidade na multiplicidade, o que é a virtude? Os ...assim como na Para alcançar o domínio da dialéctica é imprescindível assegurar uma verdadeira
paradigmas já foram dados por Sócrates. O "discurso" é de Ménon. geometria progressão, uma ascensão na linha dividida na vertical , retornando ao início sempre
vivência da b A virtude, diz o poeta, é desejar as coisas belas e ser capaz de as alcançar. ...desejo que necessário e, obrigatoriamente, após o esgotar de todas as hipóteses do domínio
realidade c O que é belo é bom, e o oposto é mau. Pretende-se verificar se alguém pode ...pela leitura do racional, analisando de novo o assunto tratado, voltando a percorrer a linha desde o
social desejar coisas más. status social
Desejam coisas más acreditando que as coisas más trazem proveito.
seu nível mais baixo, o instinto, o sentido afectivo, o desejo, o sensível, etc..
no domínio d …por hábito.
sensível e Ou desejam acreditando que as coisas más são boas. … crer em algo. Assim se desenvolve o texto do Ménon e, nele, a geometria serve como modelo
78 a para a investigação do tema em causa, a virtude. Na geometria se encontram os
Pois, concluindo, ninguém quer as coisas más!
b Querendo todos as coisas boas (o bem), se alguém pode ser melhor que outro é …análise pela paradigmas do exame (análise) nos domínios da aparência sensível, da crença e do
por as poder alcançar e o outro não. observação sensível racional, incluindo a excelência do racional.

...para a análise da geometria no Ménon de Platão Noémio Ramos - 2 / 7


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c Assim, a virtude seria o poder de conseguir as coisas boas. E as coisas boas da realidade social
são: saúde, riqueza (ouro, prata), liderança, coisas deste tipo.
d Contudo, conseguir tais objectivos com justiça, prudência, piedade ou outra
parte qualquer da virtude.
e Senão, não será virtude alcançar as coisas boas. E não procurar conseguir, …a Justiça
conceito de quando não for justo, nem para si nem para outrem, é também virtude. Assim (distributiva)
justiça da conseguir tais bens em nada será mais virtude, como não o conseguir . constitui a parte mais
República Mas, segundo parece, aquilo que se fizer com justiça será virtude... O que se importante da
fizer sem todas as coisas desse tipo (justiça distributiva) será vício. virtude.
virtude - 79 a Todavia, Ménon conduziu Sócrates apenas às partes da virtude… Não foi capaz
figura (e não de seguir os paradigmas dados (da geometria), reduzindo virtude a uma das
uma figura ) suas partes: conseguir objectivos bons com justiça.
b Considerar a virtude no seu todo uno, e não apenas nas suas partes. Pela descrição que Platão faz da linha dividida na República , as suas divisões correspondem, com certeza, à
c divisão pela média e extrema razão . Assim a representamos na imagem.
Será possível saber o que é uma parte da virtude sem saber o que ela é?
d Sobre a figura rejeitámos uma resposta por meio de coisas não antes De salientar que o domínio do racional (da lógica-matemática e ciências) ocupa a
figura - cor examinadas. Então, antes de responder por meio das suas partes há que saber parte central da linha, constituindo o núcleo da consciência humana e, por isso é
o que é a virtude na sua unidade. importante sublinhar a mitologia que envolve o domínio da crença entre os gregos
e Pois, retornando ao início: Que afirmas ser a virtude Ménon?
(Sócrates), o mito de Er (República ), a teoria da reminiscência ou da rememoração
80 a ...retorno ao início: o que é a virtude? (Fenon , Menon , etc.) e, sobre isso, devemos deixar umas curtas linhas.
Ménon conclui que já nada sabe sobre a virtude… Está entorpecido!
b Foi atingido o ponto em que se estará apto a aprender algo. Aquilo que se etiquetou de inconsciente, subconsciente, assim como os instintos e
c restantes manifestações das vivências do homem, não evocáveis à sua consciência,
início do d Procurar o que a virtude possa ser. Procurar sem se saber o que ela é. ...limites das "formas incluindo aquelas em que o ser humano mais se assemelha aos animais, bem como o
DOMÍNIO da Procurar de que tipo é uma coisa, entre as coisas que se não conhecem. aparentes" (domínio desenvolvimento natural (aprendizagem) do homem em família e na sociedade, o seu
CRENÇA Como saber que se encontrou aquilo que não se conhece? do sensilvel)
macrocosmo do comportamento da vida humana e social , foi explicado, por parte dos
e Sócrates ironiza levando a questão ao limite. …no início
Palavras sábias dos sacerdotes e sacerdotizas, e também Pindaro e muitos gregos, através daquela mitologia (rememoração), que Sócrates adopta – pelas obras
...recorrendo 81 a …o instinto, desejo,
ao mito outros, todos os que são divinos entre os poetas… a mitologia na
de Platão – em diversos dos seus diálogos. Estas formas mitológicas de “explicação”
Fé b …dizem que a alma do homem é imortal, e que ora chega ao fim ora nasce de …os poetas. foram progressivamente substituídas por explicações mais recentes e mais elaboradas
mitologia, novo… (Expõe a seguir parte de um poema de Pindaro que reconta algo como o e, em determinado ponto da História humana, alcançaram o domínio do racional
crença "mito de Er", o finalizar do Livro X da República de Platão). passando a explicações científicas.
c Sendo a alma imortal, terá já nascido muitas vezes, não há o que não tenha …início da exposição Contudo, não esquecendo que tais “explicações” (as mitologias) correspondem
aprendido, portanto, será sempre possível à alma recordar aquelas coisas que já sobre o domínio da exactamente à mesma realidade humana e social que as nossas explicações científicas,
antes terá conhecido. Assim se uma pessoa for corajosa e não se cansar de crença devemos observar, portanto, os textos mitológicos (na sua letra) pela realidade que
procurar pode descobrir todas as coisas.
eles pretendem explicar (o seu sentido) figurando as suas manifestações, sem nos
d Pois, o procurar e o aprender são, na sua totalidade, uma rememoração. …uma reflexão
fixarmos nas formas mitológicas cristalizadas, mas antes, naquilo (o significado real )
e Ménon pergunta: podes ensinar-me como é isso?
que elas pretendem representar.
No Ménon Platão oferece-nos de modo exemplar, rigorosamente objectivo , uma
B Episódio com o servo de Ménon (geometria e aritmética) relação biunívoca entre a mitologia (rememoração) e a realidade que ela pretende
82 a representar: o episódio com o servo de Ménon, e mais, exactamente no momento do
Φ
sensível e b
Isso não é fácil… Mas, chama-me um dos teus muitos servidores Ménon.
Ele é grego, e fala grego? (Sim, nascido na casa). Verifica então, se sou eu
… conhecimento:
… do sensível ao
diálogo da passagem da crença ao racional. Onde, o momento do racional serve a
Sócrates para mostrar a realidade da crença, isto é, demonstrar ao leitor o sentido mais
RACIONAL que lhe ensino, ou se é ele que vai rememorando. racional, reflexão. exacto do mito da rememoração.
...para a análise da geometria no Ménon de Platão Noémio Ramos - 3 / 7
Teoria, prática e expressão matemática: um tributo a José Sousa Ramos Colégio do Espírito Santo, Universidade de Évora - 15 de Janeiro de 2011.

c O servo reconhece o que é uma superfície quadrada e que pode ter qualquer Sócrates inicia a “explicação” da rememoração com a chamada do servo de
tamanho [carácter quantitativo pela superfície da figura]. Que o Ménon, mas logo pergunta: Ele é grego? E fala grego? E a resposta confirma ser ele
quadrado tem todos os lados iguais. Que as linhas que atravessam pelo meio … o racional... um jovem nascido na casa. Ficou assim confirmada a sua vivência cultural , a
cabe saber, [têm de ser as diagonais, iguais, para definir a figura como um Como num sonho
aquisição da linguagem e a assimilação dos comportamentos e conhecimentos
figura recta, quadrado] são iguais [portanto, quatro ângulos rectos]. Que a …rememorando
práticos, da vida em sociedade e do exercício de alguma actividade. Tudo aquilo que
com ângulos figura pode ter qualquer tamanho, a sua "medida" depende da escala (bitola) (reflectindo) no que
rectos já sabe pelo domínio
se aprende por natureza , sem necessidade de ensino, o que inclui a fala, as estruturas
utilizada (pé, ...). Se este lado for de dois pés e este de dois [traça então as
sensível. da linguagem, o saber enumerar e resolver algumas operações rudimentares, entre
medianas, usando o ponto médio, o centro da figura]... Examina então,
outras coisas, mas não inclui aquilo que necessita ser ensinado, a leitura e escrita, a
se este fosse de dois e por este de um só pé... (etc.)
geometria e aritmética, etc..
d Que domina a aritmética elementar, o cálculo... …unodidensional Com o trazer à consciência do jovem os conhecimentos assimilados pela sua
e E que, claramente, pensa que sabe calcular o dobro da superfície do quadrado. vivência cultural prática ("vida anterior da alma "), Platão coloca Sócrates a
ainda da
Sócrates pretende demonstrar a Ménon que o jovem, após se aperceber do seu demonstrar que o jovem nunca tinha tido consciência daquele saber, e que,
crença, ao
erro, sabendo que não sabe, estará então capaz de procurar saber, confrontado com essa consciência, fica (inconscientemente) confiante no seu saber. Há
RACIONAL
rememorando (reflectindo).
então que demonstrar que afinal ele não sabe, e que precisa ter consciência que não
83 a Prosseguindo com o suposto saber do servo, monstrar a evidência do erro
sabe, para assim criar o desejo, o interesse por querer vir a saber e, desse modo, ficar
pelo traçado geométrico da sua suposta sabedoria.
b Constatação de que a suposição do servo quadruplica a superfície. apto a aprender.
c A partir do dobro do lado não se obtem uma superfície com o dobro, mas com o A “explicação” decorre com a duplicação da superfície de um quadrado, problema
quadruplo. E a superfície que se pretende há de estar entre a do quadrado inicial que aborda, em parte o “método de demonstração ” do que chamamos “teorema de
e aquela que se obteve com a duplicação do seu lado. Pitágoras”. Na tradução, ou melhor, nas observações à tradução, temos encontrado
d Entre o lado do quadrado de dois pés e o lado daquele de quatro pés, há de …encaminhando
imprecisões que, do ponto de vista de Platão, seriam erros de palmatória, porque
estar a medida do lado do quadrado com o dobro da superfície do primeiro e para a experiência
ninguém entraria na sua Academia sem saber a geometria.
metade da do segundo.
e Entre dois e quatro, o servo propõe três, servindo de motivo para realizar o …demonstrando que No texto referenciado (82c) colocámos entre parentesis recto as observações criticas às traduções que,
traçado experimental. Concluíndo: três vezes três pés, são nove pés… Mas não sabe, neste ponto, não referem as diagonais iguais . Pelo programa de geometria que referenciámos,
pretende-se uma superfície com oito pés, duplicando a de quatro inicial. evidenciando o erro apresentamos os desenhos e o processo que conduz à demonstração final.
84 a A Menon se constata que: o seu servo admite que não sabe, sabe que não sabe A demonstração implicou quadruplicar a área dada de início, para, de seguida,
após a sua caminhada pela rememoração (reflectindo). considerar a metade do total, obtendo a duplicação da área da primeira figura. Isto é, o
b Pensava que sabia, e agora, sabe que não sabe. E toda esta caminhada não processo intuitivo determina a metade, passa por traçar no quadrado as diagonais e
lhe causou qualquer dano, antes lhe foi proveitosa, descobrindo de que maneira medianas e, a partir destas, dos pontos médios dos lados inscrever um quadrado no
são as coisas que tratamos. primeiro, onde as medianas do primeiro são as diagonais do segundo.
c Acreditando saber, como antes, ele não procuraria aprender o que estava Esta questão merece um parêntesis na análise do Ménon para atendermos à
convencido que sabia. Concluíndo que não sabe, anseia por saber... demonstração prática (na aritmética) do Teorema de Pitágoras , que mesmo antes
d "Verifica então Ménon como conduzo o trabalho de rememoração do teu servo, daquele tempo serial usual: (a – b)*(a – b)+ 4ab = (a + b)*(a + b). ... Com o
ele próprio há de responder às minhas interrogações"… - Sócrates completa o programa geogebra apresentamos o seu (na antiguidade) uso prático.
esquema geométrico com o quadrado (uma quadricula) de dezasseis pés [onde
o quadrado inicial (de quatro pés) há de estar no canto inferior
esquerdo com as diagonais traçadas].
e Constata então que tem quatro superfícies iguais à primeira. Sendo o todo,
completo, uma superfície quatro vezes maior que a primeira. Traçando a
diagonal maior, pergunta Sócrates: e esta que vai de canto a canto, não é
uma linha que corta em dois cada uma das superfícies? (Sim)

...para a análise da geometria no Ménon de Platão Noémio Ramos - 4 / 7


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85 a E estas quatro, não são linhas iguais, que circunscrevem esta superfície? - A segunda questão da geometria, que deve servir de paradigma para o exame da
Sócrates traça o quadrado (inscrito no de dessazeis pés) composto pelas virtude, prende-se com a questão de examinar que tipo de coisa é aquilo que não
diagonais dos quatro quadrados de quatro pés, sublinhando o quadrado de sabemos ainda o que é , e pela sequência do diálogo, sabemos que o problema
quatro pés (no interior) que ele circunscreve. geométrico em causa se relaciona com elementos anteriores do diálogo: o redondo e o
Na incompreensão inicial do servo, Sócrates leva-o a comparar quantos
recto, superfície, figura (geométrica e plana), o desenho realizado em toda a sua
trinângulos ficaram formados pela diagonal no quadrado inicial (4 pés), e,
construção, quadrados inscritos e circunscritos, medidas comparadas das
quantos desses triângulos estão no quadrado traçado pelas diagonais dos
quadrados iguais ao primeiro. (2 e 4 respectivamente, o dobro). superfícies...
b Concluíndo, a superfície obtida tem o dobro da primeira, tem oito pés. E o lado Contudo há agora uma diferença substancial, na colocação do problema, Sócrates
desse quadrado é a linha que vai de canto a canto do primeiro quadrado, a que já não se está a dirigir ao servo, mas a Ménon, dirige-se a quem sabe geometria, para
os sofistas chamam diagonal. procurar definir que tipo de coisa será aquilo que não sabem ainda o que é. Seguindo o
c Assim, naquele que não sabe, mesmo sobre coisas que considera que não exposto, Sócrates ao referir: a partir de uma hipótese como fazem os geómetras,
sabe, existem opiniões verdadeiras sobre algo que não sabe. Como num
parece-nos evidente que se refere a um (trisecção do ângulo, quadratura do círculo e
sonho (reflectindo), essas opiniões acabam por emergir… E uma aprendizagem
duplicaçãodo cubo) dos três grandes problemas gregos da geometria, a quadratura
é possível se alguém souber colocar ao educando, repetidamente e de diversas
maneiras, questões deste género. do círculo: a questão é a de saber que tipo de coisa é a relação entre a linha do
d O saber que o servo tem agora sempre o teve, não foi ensinado. Mas se o círculo [perímetro] e o seu diâmetro, que nem sabemos ainda definir o que possa ser.
½ adquiriu em algum momento não foi na vida actual
e Como ninguém lhe ensinou na vida actual, noutra vida terá aprendido. Assim expomos o nosso parecer
86 a Em tempo (vida) anterior seria ou não um ser humano, tanto como ser humano No caso não se trata de realizar ou pretender resolver o problema, mas de o saber
ou como outro ser, deve haver nele opiniões verdadeiras, que despertadas pelas colocar como hipótese, como fazem os geómetras, o que Platão coloca aqui de forma
interrogações se evidenciam como saber. surpreendente.
b Ora, se a verdade das coisas está sempre na nossa alma, a alma deve ser Sócrates refere-se a inscrever esta superfície aqui , refere-se a inscrever uma
imortal, de modo que o que acontece não saber no momento - aquilo que não determinada área num círculo que desenha no momento e, as superfícies em causa no
fecha o somos capazes de evocar em lembrança - tomando coragem e procurando seu desenho eram as superfícies dos quadrados, uma delas o quádruplo (4x) e uma
DOMÍNIO da rememorar (reflectindo) será possível de se alcançar. Contudo, Sócrates afirma outra com dobro (2x) e, inscrita nesta, outra (1x = 4pés) igual à primeira. Como
CRENÇA que alguns outros pontos deste argumento não afirmaria com tanta
sabemos, as superfícies dos círculos inscritos e circunscritos a estes quadrados têm,
convicção, mas acredito sim, que é preciso procurar as coisas que não se
entre si mesmas, as mesmas relações de grandeza que as superfícies dos quadrados têm
sabem.
entre si (4x, 2x, 1x).
c Acreditando que é preciso procurar saber o que não se sabe ainda, seriamos Então Platão terá colocado Sócrates a desenhar um círculo sobre os quadrados,
melhores do que se acreditássemos que as coisas que não conhecemos, nem mas não um círculo inscrito ou circunscrito, mas antes de tal dimensão, entre um e
são possíveis de encontrar nem é preciso procurar. Sobre isto lutaria muito, outro (sobreposto), referindo: neste círculo aqui .
tanto por palavras quanto por (acções) obras.
…retorno ao início (70a): sobre a virtude Comparando então a questão: como no triângulo .
d A virtude é coisa que se ensina ou não, ou coisa que advém por natureza, ou de ...noética inferior A formulação da hipótese passa pelo triângulo rectângulo isósceles, com mais
impõe-se o que maneira afinal se forma no carácter do homem. Sócrates acede a examinar rigor, cria uma analogia com as “lunelas de Hipocrates”, cuja demonstração
RACIONAL estas questões antes de se voltar a questionar sobre o que é a virtude, pedindo (elementar) era conhecida, onde cada lunela tem exactamente a mesma superfície do
Sócrates a direcção do diálogo a Ménon. triângulo rectângulo isósceles “inscrito”. Qualquer que seja o valor atribuído ao
Parece então que é preciso examinar que tipo de coisa é aquilo número pi demonstra-se que as superfícies são iguais, o rigor e exactidão da
que não sabemos ainda o que é. geometria eleva-se ao número.

...para a análise da geometria no Ménon de Platão Noémio Ramos - 5 / 7


Teoria, prática e expressão matemática: um tributo a José Sousa Ramos Colégio do Espírito Santo, Universidade de Évora - 15 de Janeiro de 2011.

e "Consente então que se examine a partir de uma hipótese… Por “a partir de ...a demonstração A soma das áreas das duas (quatro) lunelas é igual à área do quadrado dado pelos
o melhor uma hipótese” quero dizer a maneira como os geómetras frequentemente geométrica como dois (quatro) triângulos. Em cada lunela “inscrita” (superfície sobreposta) ao triângulo,
exemplo da exemplo da
conduzem as suas investigações. Quando alguém lhes pergunta, por exemplo há espaço (área de superfície) em falta e espaço excedente de uma figura em relação à
excelência do excelência do
sobre uma superfície, se é possível esta superfície aqui ser inscrita outra, mas, a área de superfície em falta é exactamente igual à área da superfície em
RACIONAL racional
como [o] triângulo neste círculo aqui,... excedente, as duas superfícies, lunela e triângulo “inscrito”, são iguais.

C Se é, ou não, possível a quadratura do círculo … Assim se coloca a hipótese: se esta superfície (do quadrado) for tal que ,
aplicando-a alguém sobre uma dada linha do círculo (sobre o perímetro do círculo
87 a ... um geómetra diria: “Ainda não sei se isso é assim, mas creio ter
desenhado) ela (a superfície do quadrado) fique em falta (da área em que o círculo a
para essa questão como que uma hipótese útil, qual seja: se esta
excede) de uma superfície tal como aquela que foi aplicada (como aquela em que a
superfície for tal que, aplicando-a alguém sobre uma dada linha do
…como paradigma área da superfície do quadrado excede a do círculo, pois a superfície aplicada é a do
círculo, ela fique em falta de uma superfície tal como for aquela que
para uma análise quadrado). Isto é, em que o défice numa superfície seja igual ao excedente na outra.
foi aplicada, parece-me resultar uma certa consequência, e, por
racional sobre a Podemos perceber que este problema modelo é, deveras, uma questão de
outro lado, outra <consequência>, se é impossível que <a virtude. examinar que tipo de coisa é aquilo que não sabemos ainda o que é , assim, parece-
superfície> seja passível disso. Fazendo então uma hipótese, estou
me resultar uma certa consequência, e, por outro lado, outra <consequência>, se é
disposto a dizer-te o que resulta a propósito da sua inscrição no
impossível que <a superfície> seja passível disso .
círculo: se é possível ou não.”
… fim das questões da Matemática (geometria e aritmética) (Em termos correntes, podemos dizer que Sócrates pretende prencher o vazio no
interior do perímetro do círculo [a linha do círculo] com a superfície do quadrado,
b Assim também, sobre a virtude, já que não sabemos nós o que é nem como é,
havendo assim, áreas da superfície em falta e em excedente.)
façamos uma hipótese e examinemos se é coisa que se ensina …
c Coloca-se então a hipótese: a virtude é coisa que se ensina. Ou melhor: não é
evidente a todos que nada se ensina ao homem a não ser a ciência? (Parece-me
que sim!) Se é uma ciência é evidente que pode ser ensinada.
d
e
88 a
b
c
d
e
89 a
b Com esta questão a servir de paradigma para o estudo da virtude, tomada como a
c excelência do comportamento do indivíduo perante os seus pares, a sociedade e o
d
Estado, se apresenta neste diálogo de Platão o momento da excelência do racional no
e Se a virtude fosse uma ciência haveria mestres, mas apesar de bem procurar Confronto com a
ΦΦ nunca consegui encontrar tais mestres. E procuro juntamente com muitos outros, realidade de facto -
processo de desenvolvimento dialéctico da investigação sobre a virtude.
experientes nessa questão. Mas…,eis que vem Anito… Início da dialéctica
90 a Anito - Filho de pai rico e sábio ( o pai, Homem virtuoso ) Notas:
b [0] Neste nosso estudo utilizámos a tradução do Mênon (a partir do grego) de
c Maura Iglésias do Núcleo de Estudos de Filosofia Antiga, do Departamento de
d
Filosofia – PUC – Rio (Rio de Janeiro), Edições Loyola, São Paulo, Brasil 2001. A
e
91 a autora teve o cuidado de traduzir à letra as partes do texto que têm suscitado mais
b dúvidas aos tradutores, o que nos permitiu este trabalho de análise.
c
...para a análise da geometria no Ménon de Platão Noémio Ramos - 6 / 7
Teoria, prática e expressão matemática: um tributo a José Sousa Ramos Colégio do Espírito Santo, Universidade de Évora - 15 de Janeiro de 2011.

d [1] Em 2010, Jay B. Kennedy da Universidade de Manchester, publicou os seus


e estudos da obra de Platão, onde afirma ter descoberto os “segredos ocultos” nas
92 a
obras. Na verdade todas as obras de Platão envolvem um “sentido oculto” , a
b
c hiponóia , que o leitor deve alcançar numa leitura aprofundada das obras.
d Esta ideia, além de estar bem expressa nos textos gregos coetâneos de Platão e
e posteriores, corresponde a uma tradição que não data apenas dos tempos da Academia
93 a Ponto alto do conflito com Anito o conflito
de Atenas, mas que inclui as obras de Homero, e que tem sido sempre confirmada
b limites do racional
pelos mais atentos estudiosos, como Vasco de Magalhães-Vilhena expõe em Platão e
c
noética superior a Lenda Socrática (ed. Gulbenkian).
d a dialéctica Contudo por “sentido oculto” não podemos entender a hipótese avançada por Jay
e Kennedy (uma ideia em tudo semelhante à ideia da “geometria secreta dos pintores ”)
94 a
que considera que as ideias nos textos obedecem a uma espécie de cabala de medidas
b
c harmónicas relacionadas com as notas musicais.
d Para nós toda a composição pode ser analisada em de termos forma aparente , e é
e Fim do diálogo com Anito sempre possível encontrarmos uma geometria aproximada das formas. No caso de um
95 a texto, a sua leitura desenvolve-se no tempo, e portanto a “geometria” das formas
b
aparentes tem de ser experimentada seguindo uma linha , que Jay Kennedy
c
d considerou ser, nas suas análises, as divisões da harmonia musical e da proporção de
e ouro e, assim, considerar que as ideias importantes para Platão têm de estar no lugar
96 a das divisões harmónicas…
b Nós pensamos que essa “geometria secreta” , quando e se existe uma harmonia
c linear coordenada com as ideias expostas, corresponde, como a “geometria secreta”
d A opinição correcta e a ciência Tese de Platão
vista na pintura, a uma consequência do aperfeiçoamento da forma do texto à beleza
e
97 a
da acção dramática , ao drama, harmonia e ritmo do desenvolvimento do diálogo,
b constituindo assim um ponto de chegada e não um ponto de partida do autor.
c Opinião verdadeira fruto da Dialéctica
d [2] Por serem textos didácticos, tiveram os cuidados e o aperfeiçoamento
e constante do autor, ao longo da sua vida, como é referido no Fedro - também
98 a
Magalhães-Vilhena o observou - e por essa razão, os diálogos apresentam “sentidos
b
c ocultos” , que os educandos mais aptos devem atingir em graus diferentes, servindo
d O homem não é virtuoso por natureza assim os seus textos como meio didáctico no ensino, de regulação da aprendizagem e
e de avaliação.
99 a
b
c Conforme Platão expressa no Fedro: os discursos elaborados cuidadosamente e
d constantemente reescritos, serão simples para as almas simples, e complexos, plenos
e
das mais variadas harmonias, para as almas mais complexas .
100 a
b
c

...para a análise da geometria no Ménon de Platão Noémio Ramos - 7 / 7

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