Língua Portuguesa: Leitura, Produção de Texto E Literatura Infantil

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LÍNGUA PORTUGUESA:

LEITURA, PRODUÇÃO
DE TEXTO E
LITERATURA INFANTIL

Professora Dra. Ivone Pingoello


Professor Me. João Carlos Dias Furtado

GRADUAÇÃO

Unicesumar
Reitor
Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor Executivo de EAD
William Victor Kendrick de Matos Silva
Pró-Reitor de Ensino de EAD
Janes Fidélis Tomelin
Presidente da Mantenedora
Cláudio Ferdinandi

NEAD - Núcleo de Educação a Distância


Diretoria Executiva
Chrystiano Mincoff
James Prestes
Tiago Stachon
Diretoria de Graduação e Pós-graduação
Kátia Coelho
Diretoria de Permanência
Leonardo Spaine
Diretoria de Design Educacional
Débora Leite
Head de Produção de Conteúdos
Celso Luiz Braga de Souza Filho
Head de Curadoria e Inovação
Jorge Luiz Vargas Prudencio de Barros Pires
Gerência de Produção de Conteúdo
Diogo Ribeiro Garcia
Gerência de Projetos Especiais
Daniel Fuverki Hey
Gerência de Processos Acadêmicos
Taessa Penha Shiraishi Vieira
Gerência de Curadoria
Giovana Costa Alfredo
Supervisão do Núcleo de Produção
de Materiais
Nádila Toledo
Supervisão Operacional de Ensino
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Luiz Arthur Sanglard
Distância; PINGOELLO, Ivone; FURTADO, João Carlos Dias.
Coordenador de Conteúdo
Marcia Maria Previato de Souza
Língua Portuguesa: Leitura, Produção de Texto e Literatura
Infantil. Ivone Pingoello; João Carlos Dias Furtado. Designer Educacional
Maringá-Pr.: UniCesumar, 2018. Amanda Peçanha Dos Santos
208 p. Iconografia
“Graduação - EaD”. Isabela Soares Silva
Projeto Gráfico
1. Língua Portuguesa. 2. Leitura. 3. Produção de Texto 4 Literatu- Jaime de Marchi Junior
ra Infantil. EaD. I. Título. José Jhonny Coelho
Arte Capa
ISBN 978-85-8084-555-6 André Morais de Freitas
CDD - 22 ed. 469
CIP - NBR 12899 - AACR/2 Editoração
Robson Yuiti Saito
Ilustração
Marcelo Goto
Ficha catalográfica elaborada pelo bibliotecário
João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828 Revisão Textual
Cintia Prezoto Ferreira
Impresso por:
Viver e trabalhar em uma sociedade global é um
grande desafio para todos os cidadãos. A busca
por tecnologia, informação, conhecimento de
qualidade, novas habilidades para liderança e so-
lução de problemas com eficiência tornou-se uma
questão de sobrevivência no mundo do trabalho.
Cada um de nós tem uma grande responsabilida-
de: as escolhas que fizermos por nós e pelos nos-
sos farão grande diferença no futuro.
Com essa visão, o Centro Universitário Cesumar
assume o compromisso de democratizar o conhe-
cimento por meio de alta tecnologia e contribuir
para o futuro dos brasileiros.
No cumprimento de sua missão – “promover a
educação de qualidade nas diferentes áreas do
conhecimento, formando profissionais cidadãos
que contribuam para o desenvolvimento de uma
sociedade justa e solidária” –, o Centro Universi-
tário Cesumar busca a integração do ensino-pes-
quisa-extensão com as demandas institucionais
e sociais; a realização de uma prática acadêmica
que contribua para o desenvolvimento da consci-
ência social e política e, por fim, a democratização
do conhecimento acadêmico com a articulação e
a integração com a sociedade.
Diante disso, o Centro Universitário Cesumar al-
meja ser reconhecido como uma instituição uni-
versitária de referência regional e nacional pela
qualidade e compromisso do corpo docente;
aquisição de competências institucionais para
o desenvolvimento de linhas de pesquisa; con-
solidação da extensão universitária; qualidade
da oferta dos ensinos presencial e a distância;
bem-estar e satisfação da comunidade interna;
qualidade da gestão acadêmica e administrati-
va; compromisso social de inclusão; processos de
cooperação e parceria com o mundo do trabalho,
como também pelo compromisso e relaciona-
mento permanente com os egressos, incentivan-
do a educação continuada.
Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está
iniciando um processo de transformação, pois quando
investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou
profissional, nos transformamos e, consequentemente,
Pró-Reitor de
Ensino de EAD
transformamos também a sociedade na qual estamos
inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportu-
nidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de
alcançar um nível de desenvolvimento compatível com
os desafios que surgem no mundo contemporâneo.
O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de
Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo
Diretoria de Graduação
e Pós-graduação este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens
se educam juntos, na transformação do mundo”.
Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica
e encontram-se integrados à proposta pedagógica, con-
tribuindo no processo educacional, complementando
sua formação profissional, desenvolvendo competên-
cias e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em
situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado
de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal
objetivo “provocar uma aproximação entre você e o
conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento
da autonomia em busca dos conhecimentos necessá-
rios para a sua formação pessoal e profissional.
Portanto, nossa distância nesse processo de cresci-
mento e construção do conhecimento deve ser apenas
geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos
que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou
seja, acesse regularmente o AVA – Ambiente Virtual de
Aprendizagem, interaja nos fóruns e enquetes, assista
às aulas ao vivo e participe das discussões. Além dis-
so, lembre-se que existe uma equipe de professores
e tutores que se encontra disponível para sanar suas
dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendiza-
gem, possibilitando-lhe trilhar com tranquilidade e
segurança sua trajetória acadêmica.
AUTORES

Professora Dra. Ivone Pingoello


Doutora em Educação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita
Filho (2012), possui mestrado em Educação pela Universidade Estadual
Paulista Júlio de Mesquita Filho (2009), graduação em Pedagogia pela
UniCesumar (2013) e graduação em Letras pela Universidade Paranaense
(2005). Atua como professora Universitária, pesquisadora e palestrante sobre
os temas Violência Escolar e Bullying.

Para informações mais detalhadas sobre sua atuação profissional, pesquisas


e publicações, acesse seu currículo, disponível no endereço a seguir: <http://
buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4744310Z5>.

Professor Me. João Carlos Dias Furtado


Mestre em Letras com ênfase em literatura pela Universidade Estadual de
Maringá (2011) e graduado em Letras Português/Inglês pela Universidade
Estadual de Maringá (2007) e Doutorado do Programa de Pós graduação em
Letras da Universidade Estadual de Maringá. Atualmente trabalha no Centro
Universitário Cesumar (Unicesumar), nos cursos de Letras e Pedagogia, e no
Colégio Marista de Maringá.

Para informações mais detalhadas sobre sua atuação profissional, pesquisas


e publicações, acesse seu currículo, disponível no endereço a seguir: <http://
buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4127815Y2>.
APRESENTAÇÃO

LÍNGUA PORTUGUESA: LEITURA, PRODUÇÃO


DE TEXTO E LITERATURA INFANTIL

SEJA BEM-VINDO(A)!
Caro(a) aluno(a), é com imensa satisfação que esse livro foi preparado para você, pois
participar do seu sucesso estudantil é o grande prêmio de todo docente. Sendo assim,
nós, João Carlos Dias Furtado e Ivone Pingoello, queremos contribuir efetivamente para
a sua formação acadêmica e pessoal.
Este livro foi constituído visando uma formação teórica e promovendo reflexões sobre
a prática que auxiliará o seu trabalho com a Língua Portuguesa, com todas as suas nu-
ances de leitura, produção e interpretação, como também na sua formação como pes-
quisador.
O domínio da língua materna é fundamental para todo cidadão exercer o seu papel ple-
no e alcançar seus objetivos pessoais e profissionais, pois conseguir estabelecer uma co-
municação eficiente e adequada nos mais diversos meios comunicativos é fundamental
para aproximar a pessoa de seu objetivo, de seu sonho; por isso, o ensino da língua
no contexto escolar deve valorizar e promover o enaltecimento de um aluno que saiba
manipulá-la eficientemente e seja um pesquisador constante em sua vida profissional.
A primeira Unidade apresenta a Língua Portuguesa como objeto de estudo, discutindo
suas funções, as diferenças entre a língua escrita e a oralidade, entendendo as concep-
ções de linguagem, a formação gramatical e as diferentes gramáticas possíveis de serem
praticadas. O objetivo dessa unidade é apresentar a língua como um organismo vivo em
constante transformação e o modo como podemos ensiná-la diante das possibilidades
gramaticais existentes.
A segunda Unidade introduz a importância da leitura na formação do aluno, resgatando
as funções da leitura e destacando quais competências precisam ser desenvolvidas em
sala de aula para conseguirmos formar um leitor crítico, que saiba, também, ler as novas
mídias, imagens e o mundo ao seu redor. O objetivo dessa unidade é resgatar a impor-
tância de um bom trabalho de leitura no processo de formação educacional como base
formadora de um indivíduo consciente de seu papel no mundo.
A terceira Unidade discute a produção textual, a necessidade de instrumentalizar os alu-
nos para produzirem bons textos (articulando a coerência e a coesão) e a importância
de trabalhar com os gêneros textuais. O objetivo dessa unidade é valorizar a produção
textual como importante meio de expressão individual e coletiva no ambiente profis-
sional e pessoal.
APRESENTAÇÃO

A quarta Unidade enfatiza a produção textual no ambiente acadêmico, pois discute


e apresenta aspectos importantes do texto dissertativo, do relatório de estágio, de
como fazer uma revisão de texto, promovendo uma formação orientada para esse
nível de ensino. O objetivo dessa unidade é fomentar e qualificar a escrita no ensino
superior, formando e orientando uma produção acadêmica de qualidade.
A quinta Unidade apresenta um breve histórico da Literatura Infantil, discutindo a
importância da literatura voltada para crianças na escola e as funções que ela exerce
na formação do aluno-cidadão. O objetivo dessa unidade é compreender o valor
que a literatura promove na aquisição linguística, cultural, estética, crítica e ideoló-
gica do aluno.
As cinco unidades deste livro incitam reflexões, discussões e o debate de teorias e
práticas que estimulam a sua formação acadêmica de qualidade; por isso, as unida-
des desenvolvem progressivamente o estudo de tópicos que se complementam e
promovem uma discussão ampla e orientada para a sua práxis.
Portanto, este livro apresenta a língua materna e suas especificidades para a forma-
ção de um profissional capaz de articular esse conhecimento para a formação de
outros alunos, pois esse é o objetivo principal desta disciplina.
Bons estudos.
09
SUMÁRIO

UNIDADE I

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA

15 Introdução

16 A Língua Materna Como Objeto de Estudo

20 Os Fundamentos Linguísticos da Comunicação

28 Oralidade Versus Escrita

35 A Gramática

39 Concepções de Linguagem

42 Considerações Finais

51 Referências

53 Gabarito

UNIDADE II

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO

57 Introdução

58 Fundamentos Teóricos da Leitura

65 As Etapas dos Procedimentos de Leitura

72 As Competências Críticas de Leitura

83 Considerações Finais

89 Referências

90 Gabarito
10
SUMÁRIO

UNIDADE III

A PRODUÇÃO TEXTUAL

93 Introdução

94 Leitura e Formação do Leitor

97 A Influência da Leitura na Produção de Texto

99 Elementos Fundamentais para uma boa Produção de Texto

109 Características de Textos Narrativos 

114 Características de Textos Descritivos 

116 A Produção Textual na Internet

120 Considerações Finais

127 Referências

128 Gabarito

UNIDADE IV

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL

131 Introdução

132 As Especificidades e a Estrutura do Texto Dissertativo

144 A Linguagem Dissertativa 

151 Tópicos de Revisão Textual

155 Considerações Finais

160 Referências

161 Gabarito
11
SUMÁRIO

UNIDADE V

LITERATURA INFANTIL

165 Introdução

166 A Criança tem Direito à Literatura

170 Funções da Literatura

173 Características Essenciais da Literatura Infantil

179 Breve História da Literatura Infantil

191 Literatura Infantil: Formação Linguística e Cultural

197 Considerações Finais

205 Referências

207 Gabarito

209 CONCLUSÃO
Professora Dra. Ivone Pingoello
Professor Me. João Carlos Dias Furtado

I
OS NÍVEIS E FUNÇÕES

UNIDADE
DA LINGUAGEM ORAL E
ESCRITA

Objetivos de Aprendizagem
■■ Conceituar linguística, língua, linguagem e fala.
■■ Conceituar os elementos linguísticos da comunicação.
■■ Verificar as especificidades da comunicação oral e escrita.
■■ Compreender as concepções de linguagem existentes.
■■ Compreender a importância e a função da gramática na estruturação
da língua.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ A língua materna como objeto de estudo
■■ Os fundamentos linguísticos da comunicação
■■ Oralidade versus Escrita
■■ A gramática
■■ Concepções de linguagem
15

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), nesta unidade, adentraremos no estudo da língua materna, sua


função, suas particularidades e diferenças entre o seu uso na escrita e na oralidade
e discutiremos a sua importância para todo o processo de ensino-aprendizagem.
A importância do conhecimento da nossa língua é primordial para o desen-
volvimento de um bom trabalho educacional e formativo, possibilitando o
desenvolvimento de habilidades e o conhecimento que auxiliarão na nossa vida
pessoal e profissional.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A realidade do século XXI exige um cidadão, um profissional apto a desen-


volver seu papel com desenvoltura e excelência, promovendo uma interação
linguística e social que permita a execução de sua função; por isso, o domínio
e o uso da polissemia, da conotação e das variantes linguísticas é fundamental.
Sendo assim, nesta primeira unidade, estudaremos a importância da língua
materna como objeto de estudo e uso social, as suas funções e a relevância em sua
diversidade e variedade. Entenderemos quais são as concepções de linguagem e
como isso pode favorecer o ensino da língua materna e a sua formação gramatical.
Faremos uma breve passagem pela história evolutiva da linguagem, da gra-
mática e das necessidades pedagógicas de ensino que devem ser refletidas para
tratá-la em sala de aula.
Historicamente, o ensino escolar da língua portuguesa tem priorizado as
regras gramaticais marcadas pela ideia do certo e do errado, desconsiderando
as variações linguísticas, a ação comunicativa e o perfil sociocultural dos alunos
e desprezando seus conhecimentos prévios em relação à língua.
Hoje sabemos que essa não deve ser a realidade do processo de ensino e
aprendizagem na sala de aula, pois a língua, viva e orgânica, deve ser trabalhada
de forma a demonstrar as potencialidades e os caminhos que podem ser cons-
truídos pelos alunos em sua caminhada estudantil. Essa é a nossa função.
Bons Estudos!

Introdução
16 UNIDADE I

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A LÍNGUA MATERNA COMO OBJETO DE ESTUDO

A cultura de um povo/nação é construída ao longo de sua história e suas expe-


riências, isso envolve uma grande quantidade de eventos, fatos, habilidades
desenvolvidas e evolução. A língua materna está dentro dessa evolução pela
qual o ser humano passou e ainda passa, pois é a partir da utilização da lingua-
gem elaborada que o desenvolvimento humano ocorre de forma exponencial.
A partir disso, não podemos separar a língua/linguagem humana de sua cul-
tura, ou seja, aquela tem um papel fundamental na formatação da cultura humana
e há uma interação constante entre elas. Segundo Antunes (2009, p. 21), “dessa
forma, todas as questões que envolvem o uso da língua não são apenas questões
linguísticas, são também questões políticas, históricas, sociais e culturais”.
A linguagem é a essência da ação humana e perpassa toda a história evolutiva
do ser humano, em graus mais e menos desenvolvidos. A comunicação efetiva-
-se por meio da linguagem e esta é o campo de estudos da linguística que, como
ciência, baseia-se em estudos teóricos e empíricos para fundamentar a tese de
que toda e qualquer manifestação linguística é passível de descrição e explica-
ção dentro de um quadro científico específico.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


17

A Linguística, enquanto ciência, surgiu no início do século XX com os estudos


de Ferdinand de Saussure, estabelecendo dicotomias muito adequadas ao con-
texto histórico e científico da época, o positivismo. Essas dicotomias conceituadas
por ele foram denominadas posteriormente como: língua versus fala; sincronia
versus diacronia; significado versus significante e sintagma versus paradigma.
Como um processo natural na ciência, Saussure traz em seus estudos aponta-
mentos feitos por Humboldt; e, posteriormente, estudiosos, como Bakhtin, Chomsky
e Labov, contribuíram discordando ou continuando os estudos de Saussure.
Esses estudos avançaram e adentraram as universidades brasileiras no meio
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

do século XX. Ferdinand de Saussure, com o Curso de Linguística Geral, é con-


siderado um marco inicial na era da ciência da linguagem, pois ele consegue
conduzir a Linguística ao status de ciência; segundo Lemos (2002), Saussure não
tratou a Linguística apenas como uma composição de outros estudos científicos,
mas ordenou estudos da língua e linguagem a partir de suas relações, evidente-
mente com certas limitações que foram discutidas por outros estudiosos.
Segundo Saussure (2006), a ciência que estuda a língua passou por três fases
sucessivas até o reconhecimento do seu objeto específico de estudo. Conforme
esclarece o autor, os primeiros estudos foram designados de Gramática, inau-
gurados pelos Gregos e tendo continuidade com os franceses, e constituíam-se
nos estudos das regras normativas da língua e as formulações de regras para
distinguir-se o certo do errado. Em seguida, surge a Filologia, movimento
instaurado a partir de 1777 por Friedrich August Wolf, que se ocupava com a
história literária, com os costumes, as instituições e se apegava mais à língua
escrita do que à falada.
Os estudos filológicos continuam e criam um corpus de análise que fomenta
o desenvolvimento da linguagem e todas as suas nuances. Sendo assim, na ter-
ceira fase de evolução dos estudos da língua, observou-se que elas poderiam
ser comparadas entre si e surgiu, em 1816, a partir da filologia comparada, a
Gramática Comparada, que se ocupa em estudar as origens das línguas, com-
parando-as em sua evolução como a relação entre o sânscrito, o germânico, o
grego, o latim, dentre outras (SAUSSURE, 2006).
Câmara Jr. (1975) considera esses estudos como pré-linguísticos, pois ainda
não têm caráter científico, mas contribuirão para o desenvolvimento da ciência

A Língua Materna Como Objeto de Estudo


18 UNIDADE I

linguística. Para o autor, o cerne dos estudos linguísticos consiste no estudo his-
tórico e descritivo.
No século XIX, já havia uma grande euforia nos estudos da linguagem, apre-
sentando a comparação entre as línguas e suas origens, os estudos fonéticos e
os princípios universais na gramática, mas quem chancela o caráter científico
desses estudos é Saussure, discutindo a língua como um conjunto de relações
que constitui um sistema que é mais relevante do que seus próprios elementos.
Assim, no século XX, Saussure dedica-se ao estudo da língua imanente,
estabelecendo a dicotomia de sistemas Langue (língua) e Parole (fala), embora

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
direcione seus estudos para a língua.
Consoante Faraco (2004, p. 64), “Saussure tinha descoberto na língua uma
construção legitimamente estrutural”, pois trabalhou com o sentido sincrônico
da língua em oposição aos estudos comparatistas diacrônicos e estabeleceu que
o significante e o significado são arbitrários em todas as línguas, desfazendo
qualquer conceito que juntava o sinal gráfico/som ao sentido da palavra em si.
Apesar de não deixar um modelo acabado e/ou pronto de análise linguís-
tica, a proposta estruturalista dele modificou o olhar para os estudos linguísticos,
tornando-se a base da ciência da língua. Esse novo paradigma difundiu-se na
Europa e na América em diversas correntes importantes de estudos, como a Escola
Linguística de Praga (Wilhem Mathesius, Roman Jakobson, Troubetzkoy), o estru-
turalismo que deu origem à glossemática de Louis Hjelmslev, o funcionalismo de
André Martinet e as pesquisas nos Estados Unidos (Franz Boas e Edward Sapir).
Nesse breve panorama, observamos que os direcionamentos saussurianos foram
tão amplos que são poucas, hoje, “as teorias linguísticas que podem declarar-se
autenticamente não saussureanas”, afirma Faraco (2004, p. 68).
Já na segunda metade do século XX, por volta dos anos de 1970, diversos
estudos de base saussuriana entremeiam-se pelas lacunas deixadas pela teoria
estruturalista, propondo um estudo da linguagem e do pensamento, o lado psi-
cológico da comunicação, tendo como base o fato de que “a língua foi criada
somente quando o pensamento humano excogitou empregar os sons vocais com
propósito comunicativo”, conforme afirma Câmara Jr. (1975, p. 59).
Um olhar para os fenômenos da comunicação com o entendimento de que
as estruturas linguísticas não explicariam tudo, recorrendo à base da psicologia

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


19

e aos estudos cognitivos: essa vertente chamou a atenção de diversos estudiosos


que enveredaram suas pesquisas por esse caminho, como um grande expoente
da Escola de Praga, Roman Jakobson, que ampliou a discussão sobre as funções
da comunicação, atentando para as relações internas e externas da comunicação
e para a intenção do discurso; evidentemente, ele não conseguiu resolver todos
os aspectos da comunicação, mas apontou para avanços significativos nessa dire-
ção que se denominou Funcionalismo.
Outra vertente que surge dos estudos
estruturalistas de Saussure é a Sociolinguística,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

que pretende verificar os fenômenos da lín- Professor


Educação

gua em seu contexto social, sua valorização e


segregação, suas variedades e um olhar dire-
cionado aos falantes.
Estudiosos como Hugo Schuchardt e Lição

Émile Benveniste indicam a importância de


não separar a língua, o indivíduo e seu con-
texto social, pois “é dentro da e pela língua, Aprendiz

que indivíduo e sociedade se determinam


mutuamente” (ALKMIM, 2001, p. 26). Ciência

Treinamento
Esses estudos abriram diversas oportu-
nidades de pesquisa e desenvolvimento da
Sociolinguística com diferentes enfoques na EDUCAÇÃO INFOGRÁFICA

relação da língua e da sociedade.

“Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coi-
sa. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre.”
(Paulo Freire)

A Língua Materna Como Objeto de Estudo


20 UNIDADE I

COMUNICAÇÃO

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
OS FUNDAMENTOS LINGUÍSTICOS DA
COMUNICAÇÃO

Como vimos anteriormente, a Linguística moderna inicia-se com os estudos


de Saussure; são os conceitos apresentados por ele que constituem o direciona-
mento científico do estudo da linguagem humana, tema que sempre encantou e
inquietou muitos estudiosos.
Você já deve ter percebido que a linguagem e o discurso envolvem uma gama
de variáveis (poder, grupos sociais, cultura, momentos históricos) que influen-
ciaram e continuam influenciando no desenvolvimento e complexidade que o
uso da língua materna envolve. Se estudamos a língua morta de uma sentença
desconexa com a realidade, tudo pode parecer perene e objetivo, mas sabemos
que a linguagem envolve diretamente um caráter social, por isso entendemos
que a língua está em constante mudança e transformação.
Um exemplo disso é que não usamos a mesma linguagem ou as mesmas expres-
sões e gírias ou o vocabulário que os nossos avós, e nos distanciamos, também, da
linguagem de nossos pais, por motivos cronológicos e pela busca de autoafirmação,

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


21

buscando uma identidade social; ou seja, há uma coexistência entre o momento


histórico, o grupo social, o poder econômico e a linguagem que usamos.
É quase impossível citar uma variável social que, ao surgir, não produza
um efeito sistemático sobre o comportamento linguístico: idade, sexo,
classe, casta, país de origem, geração, região, escolaridade; pressuposi-
ções cognitivo-culturais; bilinguismo, e assim por diante (GOFFMAN,
2002, p. 13-14).

Outro bom exemplo disso é quando pensamos na diversidade de palavras que


existem para denominarem uma mesma situação, pessoa ou objeto. Imaginemos
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

alguém que não gosta de gastar seu dinheiro. Podemos chamá-lo de muquirana,
sovina, mão de figa, avarento, fominha, muximba, mão fechada, e tantas outras
possibilidades. Isso indica o quanto a língua é viva, rica e molda-se à necessi-
dade do falante/escritor.
Esse exemplo demonstra um caráter fundamental das línguas nacionais: a
arbitrariedade, isto é, a relação do signo (palavra) e significante (objeto/sen-
tido) é construída social e historicamente, dado que não há uma naturalidade
entre ambos, pois se assim houvesse, todos os objetos teriam o mesmo nome
nas mais diversas línguas maternas existentes.
Como verificamos isso? Fácil! Pensemos no signo “cadeira” e no seu signifi-
cante (objeto/conceito do objeto); se a relação entre eles fosse natural, em todas
as línguas aquele objeto de sentar e com um encosto chamaria “cadeira”, mas
sabemos que não é assim, por exemplo, em inglês chama-se “chair”, em espa-
nhol “silla”, em francês “chaise” etc.
A arbitrariedade está em não haver relação entre a palavra, que seria o signo,
e a imagem, que seria o significado. Para que houvesse relação, o objeto deveria
ser designado por uma palavra que remeteria à sua função; a cadeira se chama-
ria “sentador”, por exemplo, nome que remete à função da cadeira, de ser um
objeto para sentar. Conseguimos entender que a palavra carro designa o objeto
que já conhecemos por compartilharmos do significado estabelecido socialmente.
Portanto, as grafias convencionais não representam o objeto, não há nenhum
laço natural entre a grafia e o objeto designado.

Os Fundamentos Linguísticos da Comunicação


22 UNIDADE I

“É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal


maneira que num dado momento a tua fala seja a tua prática.”
(Paulo Freire)

Percebemos assim que o signo e o significante são construções sociais e histó-


ricas para relacionar um conceito (matéria) a um nome que seja comum a um
grupo de falantes; portanto, o vocabulário de uma língua nacional vai sendo

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
construído de forma arbitrária ao longo de sua formação histórica, com diver-
sas influências culturais, sociais e regionais.
Como surgiu a Língua Portuguesa, então? Ela tem sua origem no Latim que,
adotado pelo Império Romano e com a sua expansão por quase toda a Europa,
sofreu a influência de diversos povos conquistados. Constituiu-se, assim, o Latim
erudito, usado por um grupo seleto para documentos oficiais e literários, e o Latim
Vulgar, que transforma-se em outras línguas chamadas neolatinas (com origem
do Latim). Exemplos vivos de línguas neolatinas são o português, o espanhol, o
francês, o italiano e o romeno. Ora, as línguas não existem sem as pessoas que as
falam, e a história de uma língua é a história de seus falantes (CALVET, 2002, p. 11).
Ficaram claras as mudanças e transformações que ocorreram nas línguas
nacionais? Outro bom exemplo é a diferença de pronúncia (sotaque) e expressão
gramatical entre os países que falam a “mesma” Língua Portuguesa, diferença clara
entre o sotaque de Portugal e do Brasil. Porém, nem precisamos ir tão distante
assim, pois é fácil notar essas diferenças entre os usos da língua materna entre
as regiões do nosso próprio país. Por isso, criamos a nossa identidade cultural
e pessoal diante da interação linguística, vendo, ouvindo, falando e escrevendo
em língua portuguesa; conforme Bakhtin (2010), adquirimos os conceitos da
língua mediante a interação verbal quando ouvimos enunciados concretos e os
reproduzimos com os indivíduos que nos cercam.
São 249 milhões de falantes nativos da língua portuguesa e 20 milhões de
pessoas que têm o idioma como segunda língua, compreendidos pelas comu-
nidades de Macau (China) e Goa (Índia) e por oito países: Angola, Brasil, Cabo
Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


23

Você sabia que Brasil e Portugal não são os únicos países que usam a Língua
Portuguesa? Realmente, o grupo de países que falam português é grande.
Quer saber um pouco mais? Existe o site dessa comunidade de países que
usam a mesma língua. Nesse site você encontrará informações e curiosida-
des sobre todos os integrantes. Para saber mais, acesse o link disponível em:
<www.cplp.org>.
Fonte: os autores.
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A Língua Portuguesa hoje é a 6ª língua mais falada no mundo, isso nos dá uma
dimensão de sua importância e do peso cultural e comercial que ela adquiriu ao
longo de sua história e formação.
Diante disso, surge uma pergunta: posso entender Língua como um sinô-
nimo de Linguagem?
Para nós, ela [língua] não se confunde com a linguagem; é somente
uma parte determinada, essencial dela, indubitavelmente. É, ao mesmo
tempo, um produto social da faculdade de linguagem e um conjunto
de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social para permitir
o exercício dessa faculdade nos indivíduos (SAUSSURE, 2006, p.17).

A partir do pensamento de Saussure, entendemos que a Língua e Linguagem não


são a mesma coisa, mas que a Língua é algo construído (“conjunto de conven-
ções necessárias”) para que faça parte de um domínio maior (Saussure chama
isso acima de faculdade, no sentido de capa-
cidade, aptidão natural), que é a linguagem.
Assim, entendemos que a Linguagem é
a faculdade comunicativa, ou seja, a capa-
cidade, possibilidade de comunicar-se,
enquanto a Língua é a “ferramenta” que per-
mite exercer tal faculdade. A Linguagem é
algo natural ao ser humano, é uma capaci-
dade com a qual nascemos; contudo, a Língua
é adquirida, convencionada (arbitrária) e pre-
cisamos assimilá-la.

Os Fundamentos Linguísticos da Comunicação


24 UNIDADE I

Podemos, agora, fazer a seguinte síntese sobre Língua e Linguagem:


■■ A língua é um conjunto de grafias combinadas entre si que representam a
linguagem verbal utilizada por um grupo de indivíduos constituintes de
uma comunidade. Diante da heterogeneidade da linguagem, é a língua
que será capaz de fornecer um ponto de apoio satisfatório para seu usuá-
rio, ou seja, a língua é um conjunto de convenção necessária que permite
o uso e organização da linguagem.
■■ A linguagem é o uso de procedimentos variáveis que possibilitam a comu-
nicação humana, faculdade inerente ao homem de comunicar-se utilizando
a fala. Esta abrange a comunicação linguística em toda a sua totalidade,

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é individual, intencional, espontânea e depende das estruturas psicofísi-
cas do indivíduo para se realizar.

Conseguimos identificar a relação e as diferenças entre o que é Língua e Linguagem,


algo que parece tão natural e tão corriqueiro em nosso dia a dia, mas que repre-
senta uma sofisticação da comunicação humana que se estabelece todos os dias
com diferentes pessoas em diversos lugares.
E diante desse poder comunicativo da linguagem é que notamos que a lín-
gua, como base de comunicação, pode ser utilizada na forma escrita, oral, braile e
libras. Evidentemente, cada forma de utilizar a língua exige uma certa habilidade
que influencia diretamente na potencialidade de seu discurso; por exemplo, na
língua escrita, o uso das normas gramaticais, da pontuação adequada, da organi-
zação das ideias de forma coerente nos parágrafos possibilita uma comunicação
eficiente, pois é pouco provável que um texto cheio de erros ortográficos e inco-
erente possa comunicar algo a alguém de forma clara.
O mesmo ocorre com a língua oral (fala), algumas habilidades são necessárias
para estabelecer um boa comunicação, pois aqui a proximidade entre locutor e
interlocutor possibilitam uma forma de interação que extrapola a língua escrita,
pois a expressão facial e a entonação vocal influenciam diretamente na eficiên-
cia comunicativa. Podemos perceber relações de semelhança e diferença entre
o uso da língua escrita e oral que promovem, em seus contexto,s particularida-
des que formam uma linguagem própria.
A língua escrita pode ser dividida em literária e não literária. A primeira é
conhecida como linguagem conotativa, figurada, em que não há compromisso

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


25

com a verdade, podendo ser fictícia ou misturar fatos reais com a ficção, há liber-
dade de uso de formas não convencionais da escrita em nome da estilística. A
segunda se refere à linguagem utilizada com o objetivo de informar, registrar,
argumentar ou relatar fatos verídicos, é definida como linguagem denotativa,
pois tem compromisso com a verdade.
Na comunicação oral, não são observadas a rigor as formalidades das nor-
mas culta da língua, o falante não necessita ir à escola para aprender a utilizar a
língua falada, ele aprende no meio em que vive, sob a influência de seus fami-
liares e amigos, por meio de veículos de comunicação etc. Em situação de uso
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da língua falada, emissor e receptor estão presentes, a recepção da mensagem


é imediata e o receptor pode intervir no discurso do emissor. Este pode perce-
ber na reação do receptor o efeito de sua mensagem. Na língua falada, pode-se
empregar gestos, expressões faciais, gírias, entonações mais acentuadas nas par-
tes mais importantes do discurso, e podemos repetir palavras ou frases que não
foram bem entendidas pelo emissor.
Encontrar variações no uso da língua é comum e é um processo natural.
Quem ainda se dirige a um amigo com o pronome de tratamento “Vossa Mercê”?
Acredito que ninguém, mas e o pronome “você”? Acredito que muitos. Assim, se
olharmos atentamente para as mudanças na língua ao longo da história, veremos
que Vossa Mercê transformou-se em vossemecê que virou vosmecê e que virou
você e, que se formos pensar muito bem, hoje em dia já está ultrapassado, pois
muitos já falam há um bom tempo “cê” (“cê vai lá em casa?”, “cê gosta disso?”), e
nada impede que futuramente ele se transforme e vc por causa do uso em massa
das novas mídias e redes sociais.
A partir disso, muitas vezes surgem dúvidas: não existe uma língua correta,
tudo pode mudar, tudo é possível, tudo está correto? E aí não conseguimos nos
posicionar, por isso precisamos ter alguns conceitos bem claros, principalmente
como educadores.
Primeiramente, já notamos que a língua é um organismo em constante trans-
formação, por isso tende a alterar-se conforme o tempo passa, especialmente na
oralidade, onde as mudanças são mais rápidas e dinâmicas; já na escrita, elas ten-
dem a ocorrer menos.

Os Fundamentos Linguísticos da Comunicação


26 UNIDADE I

É importante lembrar que, no campo artístico/literário, as inovações esté-


ticas, o uso das figuras de linguagem e a conotação sempre têm uma liberdade
maior de criação e invenção que o uso ordinário da língua.
Portanto, não temos uma língua única, estanque e perfeita que é a correta, exis-
tem as variedades linguísticas, que devem estar adequadas à situação comunicativa
na qual o falante e/ou escritor for usá-la. Vamos refletir sobre isso com alguns exem-
plos: não é adequado o uso informal e com vícios de linguagem na aprendizagem
escolar, da mesma forma que dois amigos conversando podem usar uma lingua-
gem informal, ou um casal de namorados pode usar apelidos, palavras carinhosas

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entre si em um jantar. Da mesma forma que seria estranho ir de terno à praia, é
estranho usar uma linguagem chula em uma apresentação formal de trabalho.
Numa comunidade linguística, possibilidade de representação de de-
terminados elementos linguísticos (fonéticos, morfológicos, sintáticos
etc.) por diferentes modos de expressão. A sociolinguística se carac-
teriza pelo reconhecimento da variação linguística como constitutiva
das línguas humanas e por assumir essa heterogeneidade natural como
objeto de estudo (CALVET, 2002, p. 156).

Percebemos que todas as línguas nacionais têm uma liberdade de uso, de varia-
ções enormes, mas isso não quer dizer que não haja um norma, há sim, pois é a
partir da norma culta da língua que surgem as variantes (variação linguística),
e é por isso que o falante/escritor deve dominar a norma culta e suas variantes
e não somente uma variação linguística, pois se assim ocorrer, seria como se a
pessoa só tivesse um tipo de roupa para ir trabalhar, ir a uma celebração reli-
giosa, ir à praia, praticar um esporte. Isso indica a necessidade de estudarmos
profundamente a nossa língua materna.
As variações linguísticas podem ser classificadas da seguinte forma:
■■ Variação geográfica ou diatópica: características de falas regionais, expressões
próprias de determinados lugares, diferenciação entre o urbano e o rural.
■■ Variação social ou diastrática: características relacionadas à posição que
o falante ocupa em suas relações que demonstram escolaridade, classe
social e/ou gênero.
■■ Variação estilística ou diafásica: características relacionadas à circunstân-
cia comunicativa: espaço da comunicação, assunto abordado, tipo de texto.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


27

Podemos nos deparar em nosso dia a dia com vários níveis de linguagem e
temos a capacidade de nos adaptarmos a todas elas, conforme nossa necessi-
dade e conhecimento. Não podemos dizer que ora erramos ou ora acertamos, o
que ocorre é o uso adequado ou inadequado em certas ocasiões.
Os grupos sociais diferenciam-se por vários aspectos, entre eles a vestimenta,
local de moradia, de trabalho, gosto musical, religioso e político e não poderia ser
diferente com a língua falada por esses grupos, cada qual utiliza códigos linguís-
ticos que os identifica com o grupo ao qual pertencem. Lembrando que códigos
linguísticos são as expressões da comunicação verbal utilizada pelos falantes.
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A variação é constitutiva das línguas humanas, ocorrendo em todos


os níveis. Ela sempre existiu e sempre existirá, independentemente de
qualquer ação normativa. Assim, quando se fala em “Língua Portugue-
sa” está se falando de uma unidade que se constitui de muitas varieda-
des (BRASIL, SEF, 1998, p. 24).

Dessa forma, um advogado em serviço adotará o linguajar típico da área do direito,


mas este mesmo advogado em um momento de lazer e descontração poderá uti-
lizar outro linguajar, o linguajar coloquial. O que se percebe é que o falante é
capaz de adaptar seu linguajar às exigências sociais do seu meio. Por exemplo,
não falamos com uma criança como falamos com um adulto, não falamos com
nosso chefe como falamos com nossos colegas de trabalho, quando estamos reu-
nidos em família, ficamos despreocupados com a estética da nossa fala. Isso se
deve ao fato de que sempre que falamos queremos obter uma resposta, por isso
nosso discurso tende a se adaptar ao emissor; levamos em consideração a forma
como nossa fala será absorvida pelo destinatário, qual o grau de conhecimento
que ele possui da situação, suas opiniões, preconceitos, ponto de vista, simpatia
ou antipatia (BAKHTIN, 2010). Sendo assim, não se pode falar em linguagem
correta ou errada, mas sim adequada ao ambiente social em que a linguagem
está sendo produzida, à relação entre emissor e receptor, ao grau de intimidade
entre ambos. Nas relações familiares, as conversas são desprovidas das convenções
sociais, há uma confiança profunda no poder de compreensão do destinatário,
e o falante se despe de toda convenção social. Já nas relações formais, fora do
âmbito de amizade, do grau familiar, a convenções são mantidas e a confiança
quanto à compreensão do outro é duvidosa (BAKHTIN, 2010).

Os Fundamentos Linguísticos da Comunicação


28 UNIDADE I

Embora no Brasil haja relativa unidade lingüística e apenas uma língua


nacional, notam-se diferenças de pronúncia, de emprego de palavras,
de morfologia e de construções sintáticas, as quais não somente iden-
tificam os falantes de comunidades lingüísticas em diferentes regiões,
como ainda se multiplicam em uma mesma comunidade de fala. Não
existem, portanto, variedades fixas [...] (BRASIL, SEF, 1998, p. 24).

Isso demonstra que a língua é viva, pertence ao falante e devemos respeitar o


modo de falar de cada um. É nesse contexto que um futuro professor pode ques-
tionar: se temos que respeitar esses modos diferentes de falar, o que fazer quando
um aluno diz “pobrema” ao invés de dizer “problema”; “a gente vamos” ao invés

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de “a gente vai” ou “nós vamos”?
Devemos nos atentar para o fato de que o linguajar da criança é reflexo do
linguajar da família, do ambiente em que vive, portanto, em uma situação como
essa, não se recomenda chamar a atenção do aluno na frente de todos, expondo-o
à humilhação e indiretamente expondo alguém da família da qual ele copiou o
termo errado; agindo dessa forma, estaremos fazendo com que o aluno passe a
ter vergonha daquele que lhe ensinou a falar errado, que pode ser o pai, a mãe
ou os avós. O correto é o professor ensinar à toda a turma de forma que o aluno
perceba os erros cometidos sem ser citado.

ORALIDADE VERSUS ESCRITA

A escrita e a oralidade são práticas sociais muito comuns na história da huma-


nidade, cada uma com sua particularidade, mas ambas com funções de grande
importância para a nossa sociedade.
A escrita tornou-se mais do que uma tecnologia, um conhecimento, tornou-
-se um bem cultural que foi e ainda é construído, e que é indispensável para a
vida em qualquer ambiente rural ou urbano, pois permeia as mais diversas rela-
ções: trabalho (documentos, relatórios), namoro (bilhetes, cartas, dedicatórias),
profissional (contrato), pessoal (leitura, bilhete) etc.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


29
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A fala é naturalmente aprendida no dia a dia de qualquer criança de forma natu-


ral; passa por um processo formativo, mas não tão incisivo quanto a escrita. A fala
também é um instrumento comunicativo de prestígio na sociedade moderna, pois
atinge um objetivo poderoso na comunicação de massa por meio das mídias tradi-
cionais (televisão, rádio) e das novas mídias (internet, aplicativos de smartphone).
Notamos que tanto a escrita quanto a fala nascem da necessidade de comu-
nicar-se com outrem. Esse princípio básico de comunicação (locutor/enunciador
e um interlocutor/receptor) faz com que a comunicação se torne uma necessi-
dade social, e por isso entendemos a importância que cada vez mais a escrita e
a fala assumem nos tempos contemporâneos.

“Se a educação sozinha não pode transformar a sociedade, tampouco sem


ela a sociedade muda.”
(Paulo Freire)

Oralidade Versus Escrita


30 UNIDADE I

Diante dessa necessidade de comunicação (oral ou escrita) é que entendemos


o caráter coletivo da comunicação, isto é, a fala e a escrita são individuais, mas
só tornam-se comunicação pelo processo de interação com o outro; consoante
Bakhtin (2010), só existe o Eu porque existe o outro, esse confronto é que deli-
mita a fala e/ou escrita individual. Para o autor, esse é o caráter dialógico da
língua/comunicação.
Um bom exemplo disso é um discurso político que tem um comunicador,
uma intenção comunicativa, tem um horizonte de expectativa e um ouvinte/lei-
tor idealizado, há uma interdependência dos indivíduos no discurso mesmo que

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pessoalmente essas pessoas nunca conversem ou sejam amigas.
Outro exemplo é quando o filho pede algo aos pais, também há um comu-
nicador com sua intenção comunicativa bem clara, um horizonte de expectativa
(conseguir o que foi pedido) e os ouvintes (seus pais). Imagine, hipoteticamente,
que essa pessoa não tenha pais; o seu discurso não se configura como uma comu-
nicação, por isso Bakhtin (2010) reforça a ideia de que as palavras, o texto e o
discurso estão impregnados de significado e são dependentes do outro para faze-
rem sentido ou serem eficazes.
Um grande estudioso da comunicação, das unidades linguísticas e das fun-
ções da linguagem foi Roman Jakobson (1896 - 1982), que participou do Círculo
Linguístico de Praga (grupo de estudos que desenvolveu métodos de análise estru-
turalista e semiótica) que também contou com diversos estudiosos de renome,
como: Vilém Mathesius, Nikolai Trubetzkoy, Sergei Karcevskiy, René Wellek,
Jan Mukařovský, entre outros.
A pesquisa de Jakobson aprofundou o estudo sobre a finalidade da língua,
as funções que a linguagem pode proporcionar e o entendimento da relação
entre o falante e o ouvinte. Como base para a criação de sua teoria, Jakobson
toma o modelo Karl Buhler como princípio de estudo, pois este já definia três
funções básicas da linguagem: função expressiva; função conativa e função de
representação.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


31

Partindo disso, ele cria sua teoria sobre a comunicação com seis elemen-
tos constituintes:
1. Remetente/codificador: emissário da mensagem;
2. Mensagem: objeto da comunicação, conteúdo, assunto;
3. Referente/Contexto: é aquilo (objeto ou situação) a que mensagem se
refere;
4. Código: conjunto de signos comum ao emissor e ao receptor;
5. Canal de comunicação: meio pelo qual a mensagem é transmitida;
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6. Destinatário/decodificador: receptor da mensagem.

Para que possamos entender claramente esses elementos, imaginemos a seguinte


situação comunicativa: você manda uma mensagem para um amigo, por meio de
um aplicativo de mensagens, convidando-o para uma festa. Nesse contexto hipo-
tético, classificamos a situação, segundo o modelo de Jakobson, da seguinte forma:
1. Remetente: você;
2. Mensagem: conteúdo da mensagem enviada (texto);
3. Referente: a festa;
4. Código: língua portuguesa;
5. Canal de comunicação: aplicativo de mensagens;
6. Destinatário: o seu amigo.

Jakobson foi além de uma simples classificação comunicativa, ele atribuiu a cada
uma das citadas acima uma função comunicativa que estabelece sentido em seu
uso, assim, o remetente corresponde à função emotiva; a mensagem corresponde
à função poética; o referente à função referencial; o código à função metalinguís-
tica; o canal de comunicação à função fática e o destinatário à função conativa.

Oralidade Versus Escrita


32 UNIDADE I

Para Jakobson (2005), essas funções da linguagem não se anulam, mas sim
há uma predominância de uma sobre a outra, dependendo da situação comuni-
cativa, de forma que, em uma situação comunicativa, quando a função conativa
prevalece, as outras fazem um papel secundário; isso ocorre devido à dinami-
cidade da língua.
A diversidade reside não no monopólio de alguma dessas diversas fun-
ções, mas numa diferente ordem hierárquica de funções. A estrutura
verbal de uma mensagem depende basicamente da função predomi-
nante (JAKOBSON, 2005, p. 157).

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A partir disso, é necessário entendermos as particularidades de cada uma des-
sas funções. Segundo Jakobson (2005), elas são:
■■ Função emotiva: expressa as emoções e sentimentos de quem fala, na
primeira pessoa do discurso. Comum em textos opinativos, frases com
interjeições e poesias subjetivas;
■■ Função conativa: centrada no destinatário, por isso tem um aspecto de
persuasão, convencimento. Comum em textos publicitários;
■■ Função referencial: tem o seu objetivo em descrever/apresentar o objeto
ou situação tratada na mensagem, há predominância do discurso em ter-
ceira pessoa impessoal. Comum em textos científicos e descritivos;
■■ Função poética: tem como objetivo a construção do texto da mensagem,
pois utiliza a linguagem de forma a combinar imagens, sons e ritmos que
produzam uma mensagem mais elaborada. Comum em textos literários
e publicitários;
■■ Função fática: tem como objetivo estabelecer comunicação, prolongan-
do-a, focando-se no canal. Comum em cumprimentos e despedidas;
■■ Função metalinguística: tem como objetivo o próprio código, verificar
o êxito da própria comunicação. Comum quando a comunicação volta-
-se para explicar um termo ou expressão usada na própria comunicação.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


33

O modelo de Jakobson pode ser esquematizado na figura a seguir:


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Figura 1 - Modelo de comunicação de Jakobson


Fonte: Alves (2014, on-line)1.

Naturalmente, a teoria/modelo de comunicação de Jakobson não consegue abar-


car todas as possibilidades comunicativas ou encaixar-se com perfeição em todos
os momentos comunicativos, pois, como já discutimos, a linguagem é dinâmica e
está em constante transformação. Sendo assim, surgiram e surgirão situações em
que esse modelo não será aplicado com exatidão; contudo, é uma ótima orienta-
ção teórica para entendermos e trabalharmos a escrita e a oralidade no ambiente
escolar, especialmente nas práticas orais na escola, que muitas vezes são subju-
gadas ou esquecidas, sendo tratadas com menor importância.
Ensinar língua oral não significa trabalhar a capacidade de falar em ge-
ral. Significa desenvolver o domínio dos gêneros que apoiam a apren-
dizagem escolar da língua portuguesa e de outras áreas (exposição, re-
latório de experiência, entrevista, debate, etc.) e, também, os gêneros da
vida pública no sentido mais amplo do termo (debate, teatro, palestra,
entrevista, etc.) (BRASIL, 1998, p. 67-68).

Assim, é necessário entender que as práticas de comunicação oral e escrita têm


suas particularidades, mas ambas são importantes para a formação desse edu-
cando e na construção de um cidadão que saiba se expressar adequadamente
na forma escrita e oral.

Oralidade Versus Escrita


34 UNIDADE I

Segundo Fávero et al. (2005, p. 74), podemos observar traços distintivos entre a
fala e a escrita organizados no quadro a seguir:
Quadro 1 – Fala X Escrita

FALA ESCRITA
O texto mostra todo seu proces- O texto tende a esconder o seu processo de
so de criação criação, mostrando apenas o resultado
Interação face a face Interação a distância (espaço-temporal)
Planejamento simultâneo ou
Planejamento anterior à produção
quase simultâneo à produção

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Criação coletiva: administrada
Criação individual
passo a passo
Impossibilidade de apagamento Possibilidade de revisão
Sem condições de consulta a
Livre consulta
outros textos
Reformulação pode ser promovi-
A reformulação é promovida apenas pelo
da tanto pelo falante como pelo
escritor
interlocutor
O falante pode processar o texto,
redirecionando-o a partir das O escritor pode processar o texto a partir das
reações do possíveis reações do leitor
interlocutor
Fonte: Fávero et al. (2005, p. 74).

A partir desse quadro explicativo, entendemos a importância da comunicação


por meio da escrita e da oralidade e que não há um meio melhor do que o outro,
mas sim possibilidades discursivas que se adaptam a contextos comunicativos
distintos, que podem ser potencializados de acordo com a escolha correta do
tipo de discurso utilizado e da forma de expressá-lo.
Notadamente, as novas mídias e recursos tecnológicos impõem-nos e, certa-
mente, imporão novas práticas discursivas utilizando o texto escrito e a oralidade,
por isso a escola e seus educadores devem estar atentos às possibilidades comu-
nicativas e suas adequações.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A GRAMÁTICA

Quando nascemos e logo nos primeiros anos de vida, quando começamos a falar,
construímos uma fala baseada em uma lógica comunicativa; mesmo que não
saibamos o que é gramática, sujeito, verbo ou análise sintática, conseguimos esta-
belecer uma comunicação eficiente com os pais e/ou responsáveis. Sendo assim,
notamos que as regras gramaticais surgem da análise de como o ser humano uti-
liza a língua; por isso, a gramática não pode ser uma camisa de força, mas sim
um instrumento que nos auxilie na nossa formação como comunicadores.
Ao olharmos para a história da evolução dos estudos gramaticais, notamos
que os primeiros estudos e os primeiros manuais voltaram-se para estudar um
certo padrão, um certo uso e desconsiderar as outras variáveis, por isso surge o
conceito de “certo” e “errado”.
A origem da gramática tradicional data do século II a. C. e foi descrita pela
primeira vez por Dionísio da Trácia, com o objetivo de oferecer os padrões linguís-
ticos para as obras de escritores consagrados, limitando-se à língua literária grega.
Foi organizada para transmitir o patrimônio literário grego e serviu de modelo
para a tradição gramatical ocidental com o apoio das línguas grega e latina, sendo
aplicada, posteriormente, à descrição de diversas línguas (CHAPANSKI, 2003).

A Gramática
36 UNIDADE I

A gramática tradicional sempre trabalhou com a organização de uma lín-


gua padrão, denominada como norma culta, que estabeleceu o modelo “certo”
de usá-la e apontou as variantes informais como um uso “errado” da língua, e
isso perdurou durante muito tempo nos estudos da linguagem, começando a ser
questionado apenas com o surgimento da ciência Linguística, como vimos nesta
mesma unidade. É nesse contexto que o ensino tradicional baseou o estudo da
língua materna, como uma memorização e aplicação das regras “corretas”; o que
não se encaixava na norma culta era visto como “errado”.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
“A teoria sem a prática vira ‘verbalismo’, assim como a prática sem teoria, vira
ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se a práxis,
a ação criadora e modificadora da realidade.”
(Paulo Freire)

De acordo com Travaglia (2006), há três concepções gramaticais que podem ser
trabalhadas, discutidas e utilizadas para a formação linguística do aluno, que são:
Gramática Normativa, Descritiva e Internalizada.
As principais características dessas gramáticas são:
■■ A Gramática normativa estabelece as regras e normas a serem seguidas
pelos falantes da língua e considera erro o que foge a essas regras. É divi-
dida em três partes: a fonética, que estuda os sons da fala; a morfologia,
que estuda as classes gramaticais, e a sintaxe, que estuda a função que as
palavras desempenham dentro da oração, como a concordância, a regên-
cia e a disposição da palavra na frase. Para que se possa compreender o
uso dos pronomes relativos, a colocação pronominal e as várias relações
de concordância, por exemplo, dentro da frase e esta dentro do período, é
importante realizarmos uma análise sintática, que é a parte da gramática
normativa que se preocupa com a organização das palavras na sentença.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


37

■■ A Gramática descritiva se ocupa com a descrição da forma e do funcio-


namento da língua, refere-se à formação do discurso concreto utilizado
pelos falantes dentro das regras gramaticais estabelecidas. Sua função
é investigar, descrever e registrar as variedades da língua, em um dado
momento de sua existência, estudando os seus mecanismos e construindo
hipóteses que expliquem seu funcionamento. Não leva em conta o con-
ceito de certo ou errado, mas o que funciona como meio de comunicação,
e considera que existe apenas o adequado e o inadequado ao contexto.
■■ A Gramática internalizada ocorre por meio da internalização do conjunto
de regras normativas de uso da língua pelos seus usuários. De acordo com
Luft (2008), essa internalização ocorre na medida em que se convive com
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

falantes da mesma língua, e é denominada pelo autor de saber linguístico.


Para Travaglia, “não há erro linguístico nessa concepção de gramática, mas
sim o uso inapropriado de interação de situações comunicativas por não
atender às normas sociais de uso da língua” (TRAVAGLIA, 2006, p. 29).

Só existe um tipo de gramática? Devemos ser escravos da gramática? Só


podemos escrever ou falar de um forma? Essa reflexão é fundamental para
adotarmos uma postura adequada em sala de aula em relação ao ensino da
língua materna, por isso leia o artigo de Eunice de Campos: “Reflexões sobre
o ensino de gramática” e esclareça alguns pontos fundamentais para a nossa
prática docente. Para saber mais, acesse o link disponível em: <http://www.
diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/1155-4.pdf>.
Fonte: os autores.

Evidentemente, as possibilidades de trabalho com a gramática não podem nos


levar a deixar de lado o ensino da norma culta; esta é a função da escola, pro-
mover o ensino da norma padrão da língua materna, mas isso não quer dizer
que devemos impor o ensino como um conjunto de regras e que os alunos serão
avaliados como “certos” ou “errados”, por isso o entendimento de que a língua é
dinâmica e está em constante mutação deve permear todas as propostas didáti-
cas de ensino do professor.

A Gramática
38 UNIDADE I

Diante desse entendimento, conseguimos enxergar possibilidades de ensino


que promovam a inclusão e o aprimoramento por parte dos estudantes no uso
da linguagem, tanto nas variantes que ele domina quanto na aprendizagem das
variantes que ele não conhece, inclusive no aprimoramento do norma culta,
fazendo disso um processo natural de estudo de sua língua e o tornando um
manipulador eficiente dela. Segundo Bechara (2002, p. 13), “A língua não se
‘impõe’ ao indivíduo (embora isso frequentemente se costuma dizer): o indiví-
duo ‘dispõe’ dela para manifestar sua liberdade de expressão”.
Entendemos que as diferentes possibilidades de usar a língua materna

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demonstram as diferenças culturais, sociais e históricas na formação de uma
sociedade que optou conscientemente ou não por usar uma construção linguís-
tica para se comunicar; por isso excluir as variedade linguísticas da sala de aula
é excluir a diversidade cultural da sala de aula. Essa exclusão ou segregação lin-
guística e cultural demonstra a distância que a escola está da sociedade.
Dessa forma, todas as questões que envolvem o uso da língua não são
apenas questões linguísticas; são também questões políticas, históricas,
sociais e culturais. Não podem, portanto, ser resolvidas somente com
um livro de gramática ou à luz do que prescrevem os comandos de
alguns manuais de redação (ANTUNES, 2009, p. 21).

Entendemos assim que a língua materna também faz parte da formação pessoal
e cultural do aluno que vai, aos poucos, construindo a sua identidade e inserin-
do-se na sociedade com seus posicionamentos. Isso evidencia que é por meio
do uso da língua que o sujeito constrói sua identidade social, recebe e transmite
informações, ideias, culturas e conceitos; portanto, limitar o conhecimento da
língua seria o mesmo que limitar o campo de atuação do sujeito. Dessa forma,
entendemos que todos devem ter acesso a todas as informações que contribuam
com o desenvolvimento pleno das competências linguísticas adequadas para cada
ocasião, incluindo as variantes da linguagem escrita e a norma culta presentes
em situações que envolvem o aspecto profissional e social.
A língua é, assim, um grande ponto de encontro; de cada um de nós,
com nossos antepassados, com aqueles que, de qualquer forma, fize-
ram e fazem a nossa história. Nossa língua está embutida na trajetória
de nossa memória coletiva. Daí, o apego que sentimos à nossa língua,
ao jeito de falar de nosso grupo. Esse apego é uma forma de selarmos
nossa adesão a esse grupo (ANTUNES, 2009, p. 23).

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


39

Dessa maneira, entendemos a relevância de apresentar na sala de aula o valor


de nossa língua materna como nossa identidade cultural e, principalmente, de
demonstrar a sua relevância na formação de nossa identidade, por isso trabalhar
a língua deve ser um, experiência na qual o aluno se sinta inserido e entenda as
possibilidades existentes de uso da língua, tanto da norma culta quanto das diver-
sas variáveis existentes na própria língua. Portanto, o ensino de língua materna
não pode restringir-se ao ensino de regras que conduzam ao pensamento limitado
do “certo” e do “errado”, mas sim a uma reflexão maior sobre as possibilidades
de domínio das variantes linguísticas. Consoante Antunes (2009, p. 31), “a lín-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

gua portuguesa falada no Brasil precisa ter como foco de sua legitimidade as
manifestações da plural e mestiça cultura brasileira”, demonstrando a inclusão
e a diversidade que a língua portuguesa produziu e produzirá.

CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM

Notamos ao longo desta unidade que a língua tem um caráter dinâmico, está em
constante transformação e que historicamente teve um papel importante na for-
mação e construção das sociedades em que o homem viveu.
Muitos estudiosos apresentaram suas teses sobre o desenvolvimento da língua e
sua influência da formação escolar e de seus paradigmas. Contudo, Bakhtin postulou
a concepção dialógica da linguagem, entendendo que a língua se constitui na interde-
pendência da comunicação com o outro, isto é, ela não existe em um sistema isolado.

“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a


sua própria produção ou a sua construção.”
(Paulo Freire)

Concepções de Linguagem
40 UNIDADE I

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
As concepções bakhtinianas inserem-se dentro de um contexto de ensino-apren-
dizado e ainda hoje são pontos fundamentais para a reflexão da prática docente.
As concepções são: linguagem como expressão do pensamento; linguagem como
instrumento de comunicação; e linguagem como forma de interação. Sobre isso,
Travaglia ressalta que
[...] o modo como se concebe a natureza fundamental da língua altera
em muito o como se estrutura o trabalho com a língua em termos de
ensino. A concepção de linguagem é tão importante quanto a postura
que se tem relativamente à educação (TRAVAGLIA, 2006, p. 21).

Entendemos assim a importância de saber claramente as concepções de Bakhtin,


pois a forma como encaramos a língua definirá os caminhos que nós, professo-
res, optaremos para o ensino de língua materna.
Veremos, a seguir, as características principais das três concepções baseadas
na leitura que Travaglia (2006) fez das propostas bakhtinianas:
1. Linguagem como expressão do pensamento: está ligada diretamente à
noção da gramática tradicional e entende que o ato de escrita não sofre
nenhuma influência das circunstâncias sociais e históricas em que o
autor está inserido. Entendendo que a norma culta é a forma de “tradu-

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


41

zir” o que o ser humano está pensando, assim o conhecimento pleno da


gramática tradicional permite uma expressão e comunicação eficiente.
2. Linguagem como instrumento de comunicação: entende que a língua é
um conjunto de códigos que, combinados da forma correta, permitem
uma comunicação objetiva e eficiente. Assim, se o emissor e o receptor
dominarem o mesmo código, a comunicação ocorrerá satisfatoriamente.
Essa concepção vincula-se a uma visão gramatical tradicional por apre-
sentar a língua como uma ferramenta isolada do seu contexto social e
real de uso. Esse modelo entendia que a repetição de modelos prontos
de comunicação seriam suficientes para estabelecer a aprendizagem da
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

língua e seus elementos comunicativos.


3. Linguagem como forma de interação: entende que a língua se materializa
no processo comunicativo de forma dinâmica e ininterrupta, considerando
o contexto histórico, político e social como parte essencial do discurso
e com interferência direta na comunicação. Essa concepção não aceitou
que a língua é a expressão do que o ser humano pensa ou, ainda, que ela
é um conjunto fechado de regras comunicativas, mas apoiou-se no con-
ceito de que a língua constitui-se nas condições do ato comunicativo,
que é sempre diferente e dinâmico, mesmo que seja repetido diversas
vezes. Segundo Bakhtin (2010, p. 271), “a compreensão de uma fala de
um enunciado é sempre acompanhada de uma atitude responsiva ativa.”

O entendimento dessas concepções é fundamental para que possamos atualizar


e/ou repensar nossas práticas docentes no ensino de língua materna, pois não
podemos promover um ensino puramente gramatical entendendo que o sim-
ples domínio da regra possibilitará uma formação linguística adequada a esse
aluno do século XXI; por isso, no processo de ensino-aprendizagem, a adoção
da terceira concepção de Bakhtin deve ser constante e permear todo o nosso
planejamento escolar, possibilitando entender a língua e todas as suas perspec-
tivas na sua forma real de interação e não em contextos idealizados ou irreais.
Portanto, a língua como um organismo vivo e dinâmico deve estar presente
na sala de aula, nos planejamentos e nas práticas escolares, incluindo as diver-
sas variedades linguísticas e culturais para formar linguisticamente o aluno para
a pluralidade da língua materna.

Concepções de Linguagem
42 UNIDADE I

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O uso da linguagem elaborada articula uma série de habilidades que diferenciam


o ser humano dos demais animais, sendo um ponto crucial na evolução humana
e no desenvolvimento da capacidade de interagir, comunicar-se, transformar,
produzir e singularizar-se. É o uso dessa linguagem elaborada que perpetua a
espécie humana, seus hábitos, culturas e seus descendentes.
Estudamos, nesta unidade, a importância do uso da linguagem de forma
adequada ao meio em que se está inserido, ao propósito comunicativo e à pos-

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sibilidade de utilizar diversos recursos da linguagem para atingir seu objetivo.
A materialização do som da fala, dos gestos, a entonação vocal e a expres-
sividade facial e corporal constituem partes fundamentais da linguagem que
estudamos, embora evidentemente demos destaque para o estudo da lingua-
gem escrita e falada.
Entendemos as diferenças entre a língua escrita e a oral, os recursos que cada
uma dispõe para sua utilidade e vimos que a linguagem se articula necessaria-
mente na comunicação; por isso, entender os fundamentos da comunicação é
necessário e importante para uma boa aprendizagem.
Discutimos, também, a origem, formação e importância da gramática no
contexto escolar, refletindo sobre o seu uso e a necessidade de estar atento para
a linguagem que extrapola os limites gramaticais que engessam a língua.
Estudamos as concepções de linguagem e entendemos como o ensino da lín-
gua materna pode privilegiar certos aspectos e nuances que valorizam a gramática,
a oralidade e as transformações da linguagem e como isso deve ser trabalhado
para valorizar a formação de um aluno que saiba explorar a sua potencialidade
linguística.
A aquisição da linguagem não é um fim, é um começo de evolutivas etapas
de conhecimento e interação que vão se aprimorando nos níveis subsequentes de
estudos e aperfeiçoamentos. Nesta etapa de nosso trabalho, nosso objetivo foi con-
tribuir com esse aprimoramento e fomentar a percepção da comunicação como
um ato social ao alcance de todos e capaz de transformação e ascensão social.

OS NÍVEIS E FUNÇÕES DA LINGUAGEM ORAL E ESCRITA


43

1. O desenvolvimento de uma linguagem elaborada por parte do ser humano foi


fundamental para a sua evolução histórica, cognitiva e social. Sabemos que os
conceitos de Língua e Linguagem não são sinônimos, por isso, assinale (V) para
as assertivas verdadeiras e (F) para as falsas.
( ) A língua é um conjunto de símbolos e sinais que se organizam naturalmente
no uso da língua.
( ) A língua é um conjunto de grafias que combinadas entre si reproduzem a
língua.
( ) A linguagem abrange a comunicação linguística em sua totalidade.
( ) A linguagem são as variadas possibilidades de comunicação humana.
a) V V F V.
b) F V V V.
c) F V V F.
d) V V V F.
e) V V F F.

2. A língua portuguesa, como todas as outras línguas vivas, tem variantes linguísti-
cas que demonstram as diferentes construções sociais, históricas e regionais que
a língua sofre. Sobre isso, é correto afirmar:
I- As variações linguísticas são deformações da norma culta.
II- As variações linguísticas são ampliações do uso da língua.
III- A linguagem informal ou regional não pode ser considerada uma variante.
IV- As variações linguísticas fazem parte do patrimônio cultural de um país.
a) Apenas a alternativa I.
b) As alternativas I e II.
c) As alternativas II e IV.
d) As alternativas III e IV.
e) As alternativas I, III e IV.
44

3. Um dos grandes estudiosos da comunicação humana é Jakobson, não só na aná-


lise e funcionamento da língua, como também na comunicação. Sobre o modelo
de comunicação e as funções da linguagem de Jakobson, é correto afirmar:
a) O emissor corresponde à função conativa por apresentar uma apelo emocio-
nal em sua mensagem.
b) O código corresponde à função poética da língua por demonstrar uma neces-
sidade explícita de desenvolver uma linguagem rebuscada.
c) A mensagem corresponde à função metalinguística pela necessidade de dei-
xar o canal comunicativo sempre “alerta”, em contato.
d) O receptor corresponde à função referencial da linguagem por apresentar um
conteúdo de extrema importância para a comunicação.
e) O canal corresponde à função fática da comunicação por pretender manter
contato com o destinatário.

4. Estudamos, nesta unidade, que a gramática não pode servir para nos “escravizar”,
mas que ela deve apresentar a língua em funcionamento e analisar as poten-
cialidades que podemos realizar ao utilizar a língua materna. Explique como a
gramática pode ser utilizada na prática escolar.

5. Bakhtin foi um dos grandes estudiosos da linguagem e possui grande impor-


tância na formação escolar. As suas três concepções de língua demonstram a
dificuldade histórica que o ensino de língua materna sofreu e ainda sofre em
alguns casos. Explique qual das três concepções de língua deve ser utilizada
em sala de aula para promover uma melhor aprendizagem.
45

Leia um trecho do artigo intitulado “Educação e Desenvolvimento Econômico no Brasil”,


de Lúcia Bruno, que discute a relação entre o valor educativo e o desenvolvimento do
mercado, da economia e do conhecimento.
Para analisar o valor de uso e o valor de troca da educação escolar e sua incidência no
desenvolvimento econômico, vou abordá-la a partir da questão da qualificação, da qual
constitui um dos elementos centrais. Há ainda muita discussão acerca do que seja qua-
lificação, talvez pela dificuldade em estabelecer um sentido único a ela quando as for-
mas de exploração do trabalho são muito distintas entre si, como ocorre no capitalismo
contemporâneo. Em um artigo publicado em 1996, intitulado “Educação, qualificação e
desenvolvimento econômico”, apresentei uma formulação de qualificação, mais como
recurso heurístico do que propriamente um conceito fechado. Considerei, então, qua-
lificação como uma estrutura cujos elementos, além de mutáveis historicamente, se
apresentam hierarquizados entre si a partir de uma determinada lógica, que por sua vez
é dada pelas relações sociais de produção vigentes em processos de trabalho que são
distintos entre si, do ponto de vista das formas de exploração. Historicamente a quali-
ficação no capitalismo diz respeito à capacidade do trabalhador de realizar as tarefas
requeridas pela tecnologia utilizada. Essa perspectiva pressupõe dois componentes bá-
sicos: um muscular e outro intelectual, que têm sido combinados de diferentes formas
nas sucessivas fases do capitalismo.
Em termos históricos e em linhas muito gerais,
[...] desde que o capitalismo começou a se desenvolver em vastas regiões
do mundo, a capacidade de trabalho do proletariado foi se caracterizando
pela seguinte sucessão de etapas: inicialmente a qualificação dizia respeito
à capacidade de realizar operações que requeriam grande esforço físico e
habilidades manuais sempre mais aprimoradas. Depois, progressivamente,
enquanto era obtido esse crescente adestramento muscular e manual, fo-
ram sendo desenvolvidos os componentes intelectuais da qualificação dos
trabalhadores. O período que estamos vivendo se caracteriza exatamente
pela predominância dos componentes intelectuais da capacidade de traba-
lho, especialmente daquela em processo de formação. Trata-se, pelos menos
nos setores mais dinâmicos do capitalismo, de explorar não mais as mãos
dos trabalhadores, mas seu cérebro (BRUNO, 1996, p. 92).
O que vem sendo valorizado pelas empresas que operam com tecnologias intensivas
em conhecimento envolve pelo menos os seguintes elementos: escolaridade crescente;
conhecimento tácito relacionado com a experiência subjetiva do trabalhador no exer-
cício de sua função; capacidade de tomar decisões e prevenir desajustes operacionais;
capacidade de comunicação que permita o estabelecimento de referências comuns e
proposição de ações conjuntas entre trabalhadores que desempenham funções dis-
tintas e com diferentes graus de complexidade; habilidade manual que permita a uti-
lização eficiente de equipamentos de alta precisão técnica; capacidade de inovação no
âmbito das atividades desempenhadas; capacidade de selecionar e relacionar informa-
46

ções variadas; capacidade de assimilação de códigos e normas disciplinares e de com-


portamento, articulando, ainda, aspectos de personalidade e atributos relacionados à
condição étnico-cultural, de gênero e geracional.
Esses elementos existem sempre articulados entre si e hierarquizados a partir de situa-
ções concretas, conferindo diferentes conteúdos à qualificação, consoante o processo
de trabalho em questão, as condições conjunturais da economia, as estratégias patro-
nais de utilização da força de trabalho e o nível de desenvolvimento das lutas dos tra-
balhadores.
Essa compreensão do que seja qualificação no capitalismo nos permite estudá-la nas
mais diferentes situações, pois a cada hierarquização apresentada por seus elementos
constitutivos temos uma dada configuração dos processos de exploração da capacida-
de de trabalho e uma dada valorização de alguns de seus elementos em detrimento de
outros.
Isso situa a qualificação como algo decorrente diretamente das relações sociais de pro-
dução na sua contraditoriedade, isto é, a qualificação é aberta aos conflitos sociais. Na
realidade, há sempre uma luta entre o trabalhador e a racionalidade que lhe é imposta
por meio dos métodos de trabalho, da tecnologia empregada, da disciplina, da avalia-
ção de seu desempenho, na medida em que se objetiva impedi-lo de usar sua capacida-
de de trabalho em benefício próprio.
Da mesma forma que o valor de uso e o valor de troca não são meras nomenclaturas,
mas expressam posições de classe no interior da relação de exploração, a qualificação
tem de ser vista desses dois pontos de vista.
Ser qualificado é, na perspectiva do capital, possuir algum tipo de capacidade de tra-
balho passível de ser utilizada na produção de valor, de mais-valia. Essa capacidade é,
no capitalismo, uma mercadoria produzida socialmente por trabalhadores, como já foi
referido anteriormente.
Uma mercadoria tem valor de uso porque tem um valor ao ser utilizada; ela satisfaz
alguma necessidade socialmente dada. Possui também valor de troca quando não é
imediatamente útil a quem a possui.
Fonte: Bruno(2011, online)2.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Ensino de Gramática. Opressão? Liberdade?


Autor: Evanildo Bechara
Editora: Ática
Sinopse: na escola antiga, o professor tratava a norma culta
como o único uso válido da língua portuguesa. Hoje, em nome da
liberdade, privilegia-se o ensino da forma coloquial. Nessa obra,
o professor Evanildo Bechara, membro da Academia Brasileira de
Letras, defende a ideia de que, na verdade, existe opressão nas duas
situações, visto que apresentar apenas uma dessas modalidades
aos estudantes é privá-los da liberdade de escolher qual o
registro mais adequado às diversas situações comunicativas que
vivenciam. O autor mostra como o aprendizado da gramática é
importante para que o falante domine as diversas possibilidades
da língua. Ensino da gramática – Opressão? Liberdade? auxilia o
professor de português a transformar o aluno em um poliglota
em sua língua, capaz de compreender diferentes linguagens e de
produzir discursos variados.

Linguística Textual e ensino de Língua Portuguesa


Autor: Albertina Rossi
Editora: Intersaberes
Sinopse: estudos indicam que, para que o aluno desenvolva de
maneira efetiva as habilidades de ouvir, falar, ler e escrever, os
professores devem realizar um trabalho com os gêneros textuais,
os quais contemplam os princípios da linguística relativos à
descrição da linguagem verbal humana em situações reais de
comunicação. Considerando isso, a presente obra propõe uma
reflexão sobre tópicos que vão desde as teorias de aquisição
da língua escrita até a prática e produção de textos na escola.
O objetivo é contribuir para o aperfeiçoamento do ensino e da
aprendizagem da língua materna – neste caso, o português
utilizado no Brasil.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

Linguagem e escola: uma perspectiva social


Magda Soares
Editora: Contexto
Sinopse: esse livro pretende analisar as relações entre
linguagem e escola, tendo como principal foco de interesse a
contribuição dessa análise para a compreensão do problema
da educação das camadas populares no Brasil.

O clube do Imperador (2002)


Sinopse: William Hundert (Kevin Kline) é um professor da
St. Benedict’s, uma escola preparatória para rapazes muito
exclusiva que recebe como alunos a nata da sociedade
americana. Lá Hundert dá lições de moral para serem
aprendidas por meio do estudo de filósofos gregos e romanos.
Hundert está apaixonado por falar para os seus alunos que
“o caráter de um homem é o seu destino” e se esforça para
impressioná-los sobre a importância de uma atitude correta.
Repentinamente algo perturba essa rotina com a chegada de
Sedgewick Bell (Emile Hirsch), o filho de um influente senador.
Sedgewick entra em choque com as posições de Hundert,
questionando a importância daquilo que é ensinado. Porém,
apesar dessa rebeldia, Hundert considera Sedgewick bem
inteligente e acha que pode colocá-lo no caminho certo,
chegando mesmo a colocá-lo na final do Senhor Julio Cesar,
um concurso sobre Roma Antiga. Contudo Sedgewick trai
essa confiança fazendo cábulas.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Half Nelson (2006)


Sinopse: Dan Dunne (Ryan Gosling) trabalha como professor
em uma escola secundária, localizada na vizinhança pobre
do Brooklyn. Desiludido com a realidade, ele não cumpre
o currículo padrão da escola e tenta, de alguma forma,
incentivar seus alunos a estudar os direitos alcançados com
a Guerra Civil americana. Para tanto, Dan tenta ensiná-los a
pensar por si próprios, incentivando a troca de trabalhos
entre eles. Porém, fora de sala, Dan recorre às drogas para
superar a desilusão. Um dia ele é pego, logo após uma aula,
por uma de suas alunas, Drey (Shareeka Epps). Apesar da
diferença de idade e das condições sociais, eles aos poucos
tornam-se bons amigos.

A chegada (2016)
Sinopse: naves alienígenas chegaram às principais cidades do
mundo. Com a intenção de se comunicar com os visitantes, uma
linguista e um militar são chamados para decifrar as estranhas
mensagens dos visitantes.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

O documentário “Quando sinto que já sei” registra práticas educacionais inovadoras que
estão ocorrendo pelo Brasil. A obra reúne depoimentos de pais, alunos, educadores e
profissionais de diversas áreas sobre a necessidade de mudanças no tradicional modelo
de escola.
Acesse o link disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=HX6P6P3x1Qg>.

A diversidade de textos que circulam no caminho diário dos alunos permite que eles
tenham ainda mais possibilidades de conhecer sobre a língua portuguesa. No primeiro
episódio da série é abordada uma das principais preocupações dos estudos linguísticos
da atualidade: a necessidade de extrapolar o ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa
baseado apenas no texto verbal escrito.
Acesse o link disponível em: <http://tvescola.mec.gov.br/tve/video/
perspectivas-lingua-portuguesa-oralidade-e-escrita>.

No segundo episódio, a série mostra perspectivas no ensino da gramática e como o domínio


dela é indispensável para a construção de um ser pensante. Analisando a diversidade
da língua e as formas diferentes do falar, o espectador é convidado para entender que,
quando se trata de comunicação, não existe certo e errado em termos linguísticos.
Acesse o link disponível em: <http://tvescola.mec.gov.br/tve/video/
perspectivas-lingua-portuguesa-cultura-e-variacao-linguistica>.
51
REFERÊNCIAS

ALKMIN, T. Sociolinguística. In: MUSSALIN, F.; BENTES, A. C. Introdução à linguística


1. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
ANTUNES, I. Língua, texto e ensino: outra escola possível. São Paulo: Parábola Edi-
torial, 2009.
BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 5. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010.
BECHARA, E. Ensino de gramática: Opressão? Liberdade?. 11. ed. São Paulo: Ática,
2002.
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros Curriculares Nacio-
nais: Língua Portuguesa. Brasília: Secretaria de Educação Fundamental, 1998.
CALVET, L. -J. Sociolinguística, uma introdução crítica. Trad. Marcos Marcionilo.
São Paulo: Parábola, 2002.
CÂMARA JR, J. M. História da linguística. Petrópolis: Vozes, 1975.
CHAPANSKI, G. Uma tradução da Tékhne Grammatiké de Dionísio Trácio, para o
português. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Letras. Curi-
tiba: UFPR, 2003.
FARACO, C. A. Estudos Pré-saussureanos. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. Introdução
à linguística: fundamentos epistemológicos. São Paulo: Cortez, 2004.
FÁVERO, L. L.; ANDRADE, M. L. C. V. O.; AQUINO, Z. G. O. Oralidade e escrita: perspec-
tivas para o ensino de língua materna. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2005.
FREIRE, P. Educação e mudança. 12. ed. Tradução de Moacir Gadotti e Lilian Lopes
Martin. São Paulo: Paz e Terra, 1979.
______. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 2000.
GERALDI, J. W. (Org.). O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2006.
GOFFMAN, E. A situação negligenciada. In: RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. (Orgs.). So-
ciolinguística Interacional. São Paulo: Edições Loyola, 2002.
JAKOBSON, R. Linguística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 2005.
KOCH, I.; TRAVAGLIA, L. C. A coerência textual. 17. ed. São Paulo: Contexto, 2008.
LEMOS, M. T. A. Língua que me falta: uma análise dos Estudos em aquisição da
linguagem. Campinas: Mercado das Letras, 2002.
LUFT, C. P. Língua e liberdade por uma nova concepção de língua materna. 8. ed.
São Paulo: Ática, 2008.
POSSENTI, S. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: Mercado das
Letras, 1996.
REFERÊNCIAS

SAUSSURE, F. Curso de Linguística Geral. Org. Charles Bally, Albert Sechehaye. Col.
Albert Riedlinger. Trad. Antônio Chelini, João Paulo Paes, Izidoro Blikstein. São Paulo:
Editora Cultrix, 2006.
TRAVAGLIA, C. L. Gramática e Interação: uma proposta para o ensino de gramática.
11. ed. São Paulo: Cortez, 2006.

Referência On-line

1
Em: <https://ensaiosenotas.com/2014/11/16/funcoes-da-linguagem-e-a-constru-
cao-do-sentido-para-jakobson/>. Acesso em: 29 jul. 2017.
2
Em: <http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v16n48/v16n48a02.pdf>. Acesso em: 30
out. 2017.
53
GABARITO

1) B.
2) C.
3) E.
4) A gramática em sala de aula não pode ser utilizada como uma forma de “pren-
der” o aluno dentro de um universo de regras, por isso atentar para as variantes
linguísticas e a norma culta é uma prática necessária, potencializando a apren-
dizagem do aluno, podendo basear-se nas gramáticas tradicional, descritiva e
internalizada de modo que estimulem a prática linguística real.
5) A concepção que favorece a aprendizagem de língua materna é a terceira (lín-
gua como forma de interação), pois entende-se nessa concepção que a língua
é um organismo vivo em constante transformação, assim os alunos percebem a
importância de dominar as variáveis linguísticas para se tornarem exímios co-
municadores.
Professora Dra. Ivone Pingoello
Professor Me. João Carlos Dias furtado

II
CONCEPÇÕES DE LEITURA:

UNIDADE
DA DECODIFICAÇÃO AO
LETRAMENTO

Objetivos de Aprendizagem
■■ Compreender os processos sociais da leitura.
■■ Aperfeiçoar os procedimentos de leitura.
■■ Ampliar as competências críticas de leitura.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Fundamentos teóricos da leitura
■■ As etapas dos procedimentos de leitura
■■ As competências críticas de leitura
57

INTRODUÇÃO

Caro(a) aluno(a), nesta unidade, iremos analisar especificamente o processo de


leitura e suas funções sociais. O objetivo é que você aperfeiçoe suas habilida-
des leitoras e concretize o letramento acadêmico em sua formação profissional.
Para isso, vamos trabalhar os conceitos de alfabetização funcional, os pro-
cessos e técnicas que possibilitam o monitoramento da leitura rumo à aquisição
da proficiência leitora, além de refletirmos sobre a leitura midiática, leitura dos
hipertextos e das imagens.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Todos esses campos do conhecimento fazem parte da nova concepção comu-


nicativa que exige a leitura dinâmica e que está em constantes adaptações e
reformulações a partir dos novos elementos inseridos nos discursos textuais
contemporâneos.
A comunicação é uma produção cultural que tem dominado o mercado glo-
balizado e caracteriza-se na contemporaneidade pelo uso intensivo de meios
tecnológicos de transmissão de informações. Nesse campo, a leitura é a parte
estruturada a partir de diferentes funções: cognitiva, ideológica, informativa, de
entretenimento, de interação social e construção do conhecimento. Cumprindo
eficientemente essas funções, a leitura atinge seus objetivos, penetrando e inter-
ferindo na ação humana.
Portanto, assumimos o pensamento de que a leitura é parte integrante da
formação de identidades, crenças, conceitos e concepções e que, por seu vínculo
com o mercado consumidor, deve receber especial atenção dos profissionais que
almejam trabalhar com a educação, visto que a ela promove a liberdade que, por
sua vez, é a ação opositora da alienação.
A alienação se combate com informações e o caminho é a proficiência leitora,
emancipada, autônoma e crítica. É o que propomos nesta unidade: a ampliação
de sua autonomia leitora. Bons estudos! Boas leituras!

Introdução
58 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA LEITURA

Agora vamos tratar das questões relacionadas às funções sociais da leitura e,


para isso, solicito que:
Observe o ambiente em que você está, analise as composições das ruas de
cidades pelas quais você transita, pense nos comércios e lugares que frequenta.
Agora reflita: há algum desses ambientes ou lugares em que a escrita não esteja
presente? Quantas vezes por dia é solicitado a você um tipo de leitura nos ambien-
tes que frequenta?
As respostas evidenciam que vivemos em uma sociedade grafocêntrica, que
tem na escrita e na leitura a base principal de transmissão de informações. Os
suportes de transmissão de informações se modernizaram; analisando as memó-
rias que temos de tempos passados, percebemos que houve grandes evoluções nos
processos de leitura e escrita. Também são perceptíveis os novos questionamen-
tos pelos quais passam as escolas públicas brasileiras, a exigência de abandonar
os velhos paradigmas de ensino, a codificação e decodificação das letras do alfa-
beto, o ensino tradicional de memorização e repetição mecânica dos textos lidos.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


59

Essas metodologias não atendem mais às demandas sociais que exigem o


letramento, a fluência leitora e compreensiva dos mais diversos gêneros discur-
sivos, de fazer da leitura e escrita um instrumento de interação e transformação
da prática social.
A proposta desta aula consiste em promover a reflexão sobre a leitura como
componente cultural de formação de identidades sociais, um campo de possibi-
lidades de participação ativa na construção de nossa própria história.
Para isso, é necessária a compreensão da construção social das dicotomias
alfabetizado e analfabeto. Ser leitor no Brasil do século XVII era privilégio da
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

elite e dos religiosos, qualidade que marcava a separação de classes sociais. O


termo “analfabeto” surge no Brasil no final do século XIX quando se estabe-
lece a proibição do voto do sujeito analfabeto por ocasião da reforma eleitoral
de 1882; o analfabeto passa a ser um indivíduo visível aos olhos da sociedade,
que usa essa característica para selecionar e excluir. Em períodos anteriores, nos
séculos XVI e XVII, a qualidade de leitor distinguia os hereges dos cristãos, os
bárbaros dos civilizados e, no século XX, a oposição é marcada entre ignorante
e educado (SILVA, 2015).
A história revela que a exclusão social, pobreza, inabilidade para lutar por
seus direitos e ausência do sentimento de poder para participar da vida política
do país estão estritamente relacionadas com a falta de proficiência em leitura e
com os poucos anos de escolarização.
No primeiro censo nacional realizado no ano de 1872, o índice de alfabeti-
zados era de 17,7%, considerando pessoas de cinco anos de idade ou mais. Até
o ano de 1960, a população de analfabetos no Brasil era de 46,7%, que foi caindo
progressivamente até atingir os 8% dos tempos atuais (SILVA, 2015).
No século XX, amplia-se o conceito de leitura e a escrita ganha novos supor-
tes de produção. Surge, no Brasil dos anos de 1980, o termo letramento como
tradução da palavra inglesa literacy. Para Soares (2002), o conceito de alfabe-
tização sofreu ampliações, além de entendida como uma técnica por envolver
procedimentos específicos de ensino e aprendizagem, passou também a ter signi-
ficado social por oferecer possibilidades de interações sociais que proporcionam
a autonomia do sujeito alfabetizado. Para os que não dominam essa prática, o
letramento, cunha-se os termos analfabetos funcionais ou iletrados.

Fundamentos Teóricos da Leitura


60 UNIDADE II

As práticas letradas são indissociáveis da alfabetização, ambas fazem parte


do processo de desenvolvimento do conhecimento e se desenvolvem em variados
espaços sociais, mantendo relação direta com o mundo do trabalho. No contexto
dessa relação letramento-mundo do trabalho, o INAF – Indicador Nacional de
Alfabetismo Funcional – realiza pesquisas com a finalidade de verificar as con-
dições de alfabetismo da população de jovens e adultos brasileiros.
Na nova proposta do INAF (LIMA; RIBEIRO; CATELLI JUNIOR; 2016),
foram categorizados cinco níveis distintos de escala de alfabetismo, que passa a
se organizar em cinco grupos: Analfabeto, Rudimentar, Elementar, Intermediário

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
e Proficiente. As categorias Analfabeto e Rudimentar se referem ao grupo dos
Analfabetos Funcionais, que é a classificação dada às pessoas que conseguem codi-
ficar e decodificar as letras do alfabeto e construir leituras e escritas apenas para
fins funcionais com caráter instrumental; as categorias Elementar, Intermediário
e Proficiente referem-se ao grupo do Alfabetismo Funcional, que é a classificação
dada às pessoas que conseguem ir além da decodificação e codificação.
No quadro a seguir, produzido pelo INAF, destacamos as conceituações de
cada nível:
Quadro 1 – Níveis de proficiência linguística

• Analfabeto: corresponde à condição dos que não conseguem realizar tarefas simples que
envolvem a leitura de palavras e frases, ainda que uma parcela destes consiga ler números
familiares (números de telefone, preços, etc.).
• Rudimentar: localiza uma ou mais informações explícitas, expressas de forma literal, em
textos muito simples (calendários, tabelas simples, cartazes informativos) compostos
de sentenças ou palavras que exploram situações familiares do cotidiano doméstico.
Compara, lê e escreve números familiares (horários, preços, cédulas/moedas, telefone),
identificando o maior/menor valor. Resolve problemas simples do cotidiano envolvendo
operações matemáticas elementares (com ou sem uso da calculadora) ou estabelecendo
relações entre grandezas e unidades de medida. Reconhece sinais de pontuação (vírgula,
exclamação, interrogação, etc.) pelo nome ou função.
• Elementar: seleciona uma ou mais unidades de informação, observando certas condi-
ções, em textos diversos de extensão média, realizando pequenas inferências. Resolve
problemas envolvendo operações básicas com números da ordem do milhar, que exigem
certo grau de planejamento e controle (total de uma compra, troco, valor de prestações
sem juros). Compara ou relaciona informações numéricas ou textuais expressas em gráfi-
cos ou tabelas simples, envolvendo situações de contexto cotidiano doméstico ou social.
Reconhece o significado de representação gráfica de direção e/ou sentido de uma gran-
deza (valores negativos, valores anteriores ou abaixo daquele tomado como referência).

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


61

• Intermediário: localiza informação expressa de forma literal em textos diversos (jorna-


lístico e/ou científico), realizando pequenas inferências. Resolve problemas envolvendo
operações matemáticas mais complexas (cálculo de porcentagens e proporções) da or-
dem dos milhões, que exigem critérios de seleção de informações, elaboração e controle
em situações diversas (valor total de compras, cálculos de juros simples, medidas de área
e escalas); interpreta e elabora sínteses de textos diversos (narrativos, jornalísticos, cientí-
ficos), relacionando regras com casos particulares a partir do reconhecimento de evidên-
cias e argumentos e confrontando a moral da história com sua própria opinião ou senso
comum. Reconhece o efeito de sentido ou estético de escolhas lexicais ou sintáticas, de
figuras de linguagem ou sinais de pontuação.
• Proficiente: elabora textos de maior complexidade (mensagem, descrição, exposição ou
argumentação) com base em elementos de um contexto dado e opina sobre o posiciona-
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mento ou estilo do autor do texto. Interpreta tabelas e gráficos envolvendo mais de duas
variáveis, compreendendo elementos que caracterizam certos modos de representação
de informação quantitativa (escolha do intervalo, escala, sistema de medidas ou padrões
de comparação) reconhecendo efeitos de sentido (ênfases, distorções, tendências, pro-
jeções). Resolve situações-problema relativos a tarefas de contextos diversos, que envol-
vem diversas etapas de planejamento, controle e elaboração, que exigem retomada de
resultados parciais e o uso de inferências.
Fonte: Lima, Ribeiro e Catelli Jr. (2016, p. 5).

O INAF apresenta o resultado de pesquisa realizada no ano de 2015 com 2.002


pessoas, entre jovens, adultos e idosos com idade entre 15 e 64 anos, residen-
tes tanto de zonas rurais quanto urbanas. Dentre a população pesquisada, 27%
foram classificadas como Analfabetas Funcionais, 4% corresponde ao grupo de
pessoas consideradas Analfabetas; 42% dos entrevistados foram classificados no
grupo Elementar, 23% estavam no grupo Intermediário e 8% dos responden-
tes demonstraram possuir proficiência no uso da leitura e da escrita, num total
de 73% de pessoas classificadas no grupo dos Alfabetizados Funcionais (LIMA;
RIBEIRO; CATELLI JR.; 2016).

Fundamentos Teóricos da Leitura


62 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Em relação à situação de trabalho, 47% dos entrevistados classificados como
Analfabetos estavam trabalhando; da mesma forma, 60% do grupo Rudimentar,
62% do grupo Elementar, 68% do grupo Intermediário e 75% do grupo Proficiente
estavam trabalhando no momento da realização da pesquisa (LIMA; RIBEIRO;
CATELLI JR.; 2016).
Os autores Lima, Ribeiro e Catelli Jr. (2016) observam que é na pequena par-
cela da população entrevistada que apresentou o nível de proficiência em leitura
e escrita (8%) que se encontra o maior percentual de pessoas que estavam tra-
balhando. Se observarmos os números, percebe-se que o percentual de pessoas
com trabalho vai aumentando gradativamente à medida que aumentam as habi-
lidades e competências no uso da leitura e da escrita.
Os dados apresentados pelo INAF revelam que as ocupações profissionais
nas quais se identifica a maior presença de pessoas na condição Proficiente são,
também, as que apresentam maior escolaridade. Isto é, a proficiência em leitura
e escrita está diretamente relacionada com o nível mais alto de formação, no
caso, a formação no Ensino Superior (LIMA; RIBEIRO; CATELLI JR., 2016).

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


63

Portanto, a formação em curso de Ensino Superior promove a evolução da


capacidade leitora, ampliando o campo das relações sociais, das oportunidades
de trabalho, da construção de relações de sentidos entre o lido e o praticado,
refletido, compreendido e aplicado em ações diárias. Essa evolução não ocorre
a olhos nus, nem é perceptível sem que ocorra uma autoavaliação, ou seja, só
percebemos que evoluímos quando nos auto avaliamos. Essa autoavaliação é
importante para percebermos que evoluímos constantemente quando não desis-
timos de estudar, ler e compartilhar ideias.
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A que grupo de leitores você pertence? Você se considera proficiente em


leitura? O que falta para melhorar? Qual a importância da leitura para a sua
vida acadêmica e profissional?

Nesse exato momento está acontecendo em sua vida o processo de formação e/


ou aperfeiçoamento para a proficiência em leitura, você está inserido no con-
texto do letramento acadêmico. No conceito de Fischer (2008), letramento
acadêmico é a fluência individual e autônoma de formas de pensar, ser, fazer,
ler e escrever, agir e interagir, acreditar, valorizar, sentir, usar recursos e ferra-
mentas tecnológicas. Estando numa sociedade grafocêntrica, não se separa o
ler do ver, do descrever, do explicar e dos valores construídos, das ideologias,
conhecimento e poder.
Para o letramento acadêmico é necessário a independência na pesquisa, na
construção de ideias, de produção de trabalhos, autoconfiança e responsabilidade.
É a partir dos contatos com leituras diversificadas que se constroem identidades,
posicionamentos ideológicos, significados culturais e estruturas de poder que vão
refletir na atuação profissional, no mundo do trabalho e nas realizações pessoais.
Letramento acadêmico é desenvolver conhecimentos relevantes para a área acadê-
mica, incluindo linguagem adequada, que vão possibilitar a transformação social.

Fundamentos Teóricos da Leitura


64 UNIDADE II

Nos cursos de EAD, o engajamento em práticas de letramento acadêmico


ocorre por meio das leituras solicitadas, leituras dos livros, das páginas indicadas
pelos tutores no portal Moodle, leituras complementares, realizando as atividades
propostas, mantendo contato com tutores, acessando os links para tirar dúvidas
e utilizando integralmente a relação entre letramento e tecnologias.
Os recursos tecnológicos possibilitam trabalhar com multiletramentos, que
significam possibilidades de leituras visuais, digitais e sonoros ao mesmo tempo
e em um mesmo ambiente, substituindo os suportes materiais, como cadernos,
folhas, canetas, entre outros. É a cultura digital revolucionando as formas tradi-

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cionais de leitura, escrita, aprendizagem e interação social.
As participações nos fóruns são momentos importantes de materialização
de ideias e organização do pensamento a partir de leituras realizadas; cada pos-
tagem alinha-se aos demais comentários, formando o elo de pensamento:
O objetivo do fórum, dessa forma, assemelha-se ao que Lévy (2004,
2009) chama de inteligência coletiva: capacidade de um coletivo de se
engajar numa cooperação intelectual para criar, inovar e inventar, e tem
como fundamento e objetivo o reconhecimento e enriquecimento mú-
tuo das pessoas (PINTO; FISCHER, 2014, p. 21).

Para Fischer (2008), ser letrado representa ter a capacidade de realizar práti-
cas sociais num contexto de poder e ideologia, de se manifestar, agir em prol da
defesa de ideologias próprias. Isso significa que tornar-se letrado é poder cons-
truir identidade própria. Para a autora, as práticas de leitura e escrita integram as
experiências de vida do sujeito e interferem nos modos de dar sentido às expe-
riências sociais.
Nos sentidos dados por Pinto e Fischer (2014), o letramento empodera o
sujeito nas questões sociais, culturais e econômicas, empoderamento que pode
ser demonstrado nas atuações acadêmicas, profissionais e nas realizações pes-
soais. As autoras ressaltam que as práticas de letramento não se findam com os
estudos acadêmicos, ninguém fica ou está letrado, mas se mantém em constante
processo de letramento. Assim, não se transmite o letramento, mas se promove
o processo de sua construção que é individual, considerando as experiências
letradas de cada sujeito.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


65

O termo empoderamento foi incluído em documento da Organização das


Nações Unidas – ONU – para a década da Alfabetização 2003/2012. A UNES-
CO (2003) colocou a alfabetização no contexto da Educação para Todos, lan-
çou o slogan “Alfabetização como Liberdade” e registrou o termo empode-
ramento afirmando que, por meio da alfabetização, os sem-poder podem se
empoderar, libertando-se da ignorância, ficando livres para ação, escolhas e
participação na construção de sua própria história de vida.
Quando as pessoas não são letradas, suas inabilidades de entender os di-
reitos jurídicos prejudicam o poder de invocá-los; isso pode ser uma defi-
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ciência severa para aqueles/as cujos direitos são violados. Para Paulo Freire
(2005), a democratização da cultura escrita e da leitura favorece a reflexão e
o clarear das consciências, promovendo a humanização com consequente
compreensão dos direitos que possuem, promovendo a busca desses direi-
tos antes desconhecidos.
Fonte: os autores.

AS ETAPAS DOS PROCEDIMENTOS DE LEITURA

Na base da construção do conhecimento acadêmico e profissional está o pro-


cesso de leitura, que deve atingir o nível de proficiência, ou seja, o domínio das
técnicas de interpretação e compreensão textual que fazem parte do letramento
acadêmico. É possível melhorarmos nossas leituras a partir do desenvolvimento
de técnicas específicas e monitoramento constante das evoluções atingidas a cada
nova leitura. Nesse contexto, elencamos algumas considerações que podem auxi-
liar na promoção da leitura proficiente.
Cabral (1986) descreve quatro etapas as que promover uma leitura com pro-
ficiência, são elas: decodificação, compreensão, interpretação e retenção.
Decodificação: é a fase inicial da leitura, é a decifração do código lin-
guístico, é a junção das letras, de seus respectivos sons e a atribuição de
significados.
Compreensão: é a segunda fase da leitura, na qual ocorre a assimilação
das informações contidas no texto, sendo necessário ao leitor ter co-
nhecimento sobre o assunto abordado para que possa atribuir sentido
ao texto lido. É a análise dos dados textuais.

As Etapas dos Procedimentos de Leitura


66 UNIDADE II

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Interpretação: é a capacidade de análise crítica frente ao texto e só ocor-
re depois da compreensão. Sem compreensão não ocorre a interpreta-
ção. Nessa etapa, recupera-se todas as informações e conhecimentos
prévios sobre o assunto, estabelece-se a intertextualidade entre os tex-
tos, questiona-se, julga-se e tira-se conclusões a respeito do texto lido.
Retenção: é a última fase da leitura, na qual o/a leitor/a é capaz de ar-
mazenar na memória as informações mais importantes expostas no
texto. Cabem então analogias, comparações, reconhecimento do sen-
tido de linguagens figuradas e das ideias subjacentes.

É imprescindível considerar cada uma das etapas de leitura para o processo de


autoavaliação, haja vista que o desempenho nessas etapas depende do nível de
suas leituras. A leitura é a realização da escrita que, por sua vez, é a materiali-
zação da fala num processo cognitivo que envolve aptidões auditivas e visuais;
portanto, envolve uma habilidade mental complexa. É pelo exercício da habili-
dade cognitiva que você conseguirá desenvolver a capacidade de compreensão e
produção textual necessária para transitar pelos diferentes setores sociais e exer-
cer com propriedade a cidadania.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


67

Kleiman (2000) cita três níveis de conhecimentos essenciais para que a


compreensão das leituras realizadas possa ocorrer: conhecimento linguístico,
conhecimento textual e conhecimento de mundo.
O conhecimento linguístico refere-se ao conhecimento da linguagem utili-
zada pelo/a autor/a do texto, do vocabulário, da língua. Se não há domínio da
língua, não há compreensão textual.
O conhecimento textual é adquirido ao longo da aprendizagem de leitura
quando se entra em contato com diferentes gêneros textuais. Ao definirmos o
gênero textual, sabemos antecipadamente qual a intenção do/a autor/a, se é a de
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informar, de divertir, de contar uma história, entre outras intenções.


O conhecimento de mundo é o que nos permite fazer inferências, o que faze-
mos quando nossa percepção é ativada por meio da nossa memória de situações
ou leituras anteriores vivenciadas; esse é o processo pelo qual estabelecemos rela-
ções entre os elementos já conhecidos e os citados pelo/a autor/a.
O processo de evolução do aprendizado da leitura começa na alfabetização
e não tem fim, ela evolui acompanhando a evolução do sujeito e da sociedade
como um todo. Dessa forma, temos vários grupos de leitores/as, cada qual em
seu momento específico de evolução leitora.
Na construção do conhecimento por meio da leitura, faz-se necessário o
contato com variados gêneros textuais, que consistem na variedade de tipologias
textuais discursivas e que podem ser divididos para fins de análise em unidade de
estilo, de composição e de tema. Os tipos textuais podem ser agrupados em cinco:
Narração: narração de fatos reais ou fictícios. Exemplos: conto, romance,
novela, fábula. Possuem personagens, enredo, espaço e ambiente.
Descrição: retrata verbalmente ambientes, objetos e pessoas. Descreve carac-
terísticas, enumera e compara.
Dissertação: expõe ideias, argumenta, debate conceitos, propõe reflexões,
teses e antíteses. Exemplos: artigos científicos, trabalhos de conclusão de curso etc.
Injunção: instrui, orienta e ensina a manusear. Exemplos: receitas, manu-
ais, bulas e regulamentos.
Exposição: expõe fatos, publica notícias e acontecimentos. É de ordem impes-
soal. Exemplo: notícias jornalísticas.

As Etapas dos Procedimentos de Leitura


68 UNIDADE II

Os tipos textuais são categorizações de textos conforme sua composição lin-


guística e definem as funções sociais do texto; os tipos textuais orientam a escolha
do que ler conforme o objetivo de leitura. Gêneros textuais estão relacionados
com as diferentes formas de comunicação; em um mesmo tipo textual podem
aparecer vários gêneros textuais, por exemplo, no gênero carta pode haver des-
crição, narração e argumentação; no gênero manual de instrução pode haver
trechos descritivos, dissertativos e injuntivos. Num mesmo tipo de texto podem
coexistir diferentes gêneros textuais.
Os gêneros textuais abrangem um ilimitado conjunto de variações e que

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estão sempre em evolução por ocasião da evolução das novas tecnologias e das
mídias de comunicação e informação.
Desta forma, o sentido do texto tanto pode variar conforme variam os tipos e
o contexto de sua publicação como também podem variar de leitor/a para leitor/a
e varia, também, a percepção do/a leitor/a no campo de evolução das habilida-
des leitoras. Evoluímos lendo, e lendo evoluímos.
Na evolução leitora, ampliam-se os processos de inferência. Para entender
melhor o que é a inferência, leia a piada no quadro a seguir:
Quadro 2 – Três sujeitos discutiam quem tinha a profissão mais antiga

- Não que eu queira contar vantagem… - Disse o marceneiro. - Mas os meus


antepassados construíram a Arca de Noé!
- Isso não é nada! - Respondeu o jardineiro. - Foram os meus antepassados que
plantaram o Jardim do Éden!
- Tudo bem! - Disse o eletricista. - Mas quando Deus disse “Haja luz”, quem vocês
acham que tinha puxado a fiação?
Fonte: Hartmann e Santarosa (2009, p. 71).

Hartmann e Santarosa (2009) esclarecem que a piada só faz sentido se sabe-


mos o que fazem um marceneiro, um jardineiro e um eletricista para entender
as ações mencionadas na piada e, para que o humor seja atingido, é necessário
que se tenha conhecimento das histórias narradas na Bíblia e a frase “Haja luz”.
Sem esses conhecimentos a piada não seria engraçada, assim como outros gêne-
ros textuais também não teriam sentido sem um conhecimento prévio sobre o
assunto tratado no texto.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


69

A cada nível alcançado ocorre uma mudança de comportamento, um avanço


na capacidade intelectual e cognitiva. Tais mudanças ocorrem à medida que se
atingem níveis mais elevados de compreensão de mundo proporcionados pela
postura ativa diante das práticas sociais, entre elas a leitura.
É lendo que se aprende a ler e a cada leitura novas etapas de desenvolvimento
vão surgindo, dependendo da posição assumida pelo/a leitor/a. Mortimer e Van
Doren (2010) acreditam que há duas posições que podem ser assumidas, são elas:
Leitura passiva: caracterizada pela mera recepção de informação desa-
companhada da reflexão. É a leitura mecânica, objetivando apenas a prova, a
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apresentação de um trabalho, ocasionando uma memorização superficial. É


quando sentimos sono ao ler ou quando fechamos o livro por achá-lo desinte-
ressante, quando, na verdade, o desinteresse pode ser fruto da nossa passividade.
Leitura ativa: é determinada pelo grau de atividade por parte do/a leitor/a,
sua presença dialógica num esforço constante em compreender a mensagem,
é um/a leitor/a atento que volta a ler parágrafos que não ficaram claros, bus-
cando o entrelaçamento das ideias do/a autor/a. A capacidade de compreensão
leitora depende do grau de atividade cognitiva do/a leitor/a. Ao primeiro obs-
táculo, se abandonada a leitura, a possibilidade de se atingir um grau maior de
compreensão é abandonada também. Ao passo que, diante de uma dificuldade
em se compreender o texto, recorre-se a releituras, busca de informações com-
plementares, como o contexto do/a autor/a, a época em que o texto foi escrito;
a possibilidade de se atingir um grau maior de compreensão leitora aumenta.
Mortimer e Van Doren (2010) citam quatro níveis de leitura, os quais são:
Leitura Elementar - É o princípio elementar da decodificação da escrita ofe-
recido nas primeiras séries do Ensino Fundamental. A pergunta norteadora é:
“O que a frase diz”.
Leitura Averiguativa - Pré-leitura ou garimpagem: é a busca de textos par-
tindo de interesse próprio, é a garimpagem que se faz em livrarias, bibliotecas
ou estantes virtuais; achando um texto com um título promissor, parte-se para a
averiguação se o conteúdo vai ao encontro do que se busca lendo o sumário ou
o resumo. A pergunta norteadora é: “Este texto é sobre o quê?”.

As Etapas dos Procedimentos de Leitura


70 UNIDADE II

A leitura averiguativa consiste em uma pré-leitura para a confirmação ou


refutação de um texto dentro do que se procura e dessa forma é uma atividade
rápida que disponibiliza de pouco tempo, pois pode estar sendo feita em uma
livraria, por exemplo.
Para uma boa garimpagem, Mortimer e Van Doren (2010) dão algumas
sugestões:
–– Cuidado com os títulos comerciais que visam somente a venda e são fra-
cos em conteúdos.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
–– Verifique o nome do/a autor/a: é de alguém conhecido/a, já citado/a em
outros textos?
–– O livro foi publicado em uma única edição e há muitos anos? Sinal de
que não houve muita procura por ele.
–– O livro foi editado várias vezes? Significa que superou as expectativas de
vendas.
–– Todo livro possui uma ficha catalográfica com anotações dos tópicos abor-
dados, são as palavras-chave, lendo-as, você terá uma noção dos temas
abordados.
–– No sumário ou índice de livros, você pode perceber os tópicos, os subtítu-
los que indicam de que forma e quais os pontos que são tratados no livro.
–– Confira a bibliografia consultada pelo/a autor/a, nesta parte você poderá
ter uma noção das bases do texto, da confiabilidade dos dados apresenta-
dos quando se utiliza de autores renomados e respeitados dentro do tema
abordado. Esse item também pode ser utilizado por você para novas con-
sultas, novas garimpagens, cada referência citada pode ser buscada por
você como nova fonte de informação.

Antes de decidir sobre a leitura total do texto, passe os olhos sobre alguns pará-
grafos, leia partes da introdução e partes das considerações finais, desta forma
você terá uma ideia se é o que realmente procura.
Após essa averiguação e o texto sendo descartado de sua leitura, não significa que
você perdeu tempo, pelo contrário, você ganhou conhecimento. O texto pode não lhe
ser útil neste momento, mas poderá o ser num momento futuro. O ideal seria você
anotar o título e o assunto tratado para uma consulta futura, caso venha a precisar.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


71

Leitura Analítica - É a leitura ativa por excelência. Busca-se a análise para


subsidiar a compreensão. Quando a leitura é de entretenimento ou apenas busca
de uma informação em específico, a análise não é obrigatória.
A análise para fins de construção da compreensão segue algumas etapas,
as quais são:
g. Análise Textual – Busca informações sobre o/a autor/a, sua posição meto-
dológica e teórica, informações sobre o vocabulário, sobre a data de
publicação, o contexto em que foi publicado. As questões feitas nessa
análise são objetivas, fornecem o mapa esquemático do texto e a visão
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

total da unidade.
h. Análise Temática - A partir dos dados sobre o/a autor/a, principalmente
sua linha teórica, busca-se entender a mensagem que o/a autor/a quer
transmitir sem que sejam feitas interferências pessoais por parte do/a
leitor/a. As questões formuladas nessa parte da análise fornecem o con-
teúdo, o que o/a autor/a quis dizer.
i. Análise Interpretativa – Amparados pelos dados fornecidos pelas duas
fases primeiras de análises, chegamos à interpretação leitora, construímos
nossa própria visão do texto, momento de desenvolvimento intelectual
do/a leitor/a.

Leitura Comparativa – Leitura exigida normalmente em teses e dissertações,


trabalhos acadêmicos e científicos. A partir da escolha de um tema central, bus-
cam-se livros que tratem do tema proporcionando uma dialogicidade entre os/
as autores/as na busca da afirmação ou refutação de uma ideia.
Sendo o texto uma construção cultural da atividade humana, ambos, lei-
tor/a e autor/a, participam do processo de construção do sentido do texto. O
significado posto pelo/a autor/a não é garantia de que o/a leitor/a compreen-
derá da forma desejada. Ao compreender um texto, o/a leitor/a estabelece novos
sentidos, os quais nem sempre são compatíveis com o sentido desejado pelo/a
autor/a. Portanto, a leitura é sempre uma ação criativa e não reprodutora e deve
conduzir à autonomia de pensamento, pois é diálogo, interação, construção de
sentidos. Não se deve conceber a leitura como uma imposição do/a autor/a, mas
como sobreposição de visões de mundo.

As Etapas dos Procedimentos de Leitura


72 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
AS COMPETÊNCIAS CRÍTICAS DE LEITURA

Quem não sabe pensar, acredita no que pensa. Mas, quem sabe pensar,
questiona o que pensa.
(Pedro Demo)

Parafraseando Demo, podemos dizer: “Quem não é letrado, acredita no que lê.
Mas quem é letrado, questiona o que lê”.
Essa é a base principal da leitura crítica: questionar tudo o que lê, manter uma
postura analítica, avaliativa, reflexiva e questionadora. É não aceitar um texto
como imposição de ideias, ter a capacidade de desvendar os sentidos explícitos
e implícitos no texto, cogitar a dúvida e dinamizar conflitos.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


73

A leitura crítica não aceita a posição passiva, codificadora e superficial de


um texto, ela exige a posição ativa de um leitor cujas ideias se sobrepõem às do/a
autor/a. Ler criticamente implica estabelecer conexões entre o discurso escrito
e as práticas sociais.
Adquirir a capacidade de ler criticamente é emancipar-se, tornar-se inde-
pendente, não manipulável, é sair da situação de condescendente e ter domínio
sobre as próprias ideias.
Ser crítico é ter a capacidade de ponderar tudo o que se lê diante de tudo
que se conhece. Dessa forma, não devemos nos deixar influenciar por um reno-
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mado/a autor/a e aceitar como lei o que escreve apenas por ser um/a autor/a
reconhecido nacional e internacionalmente, da mesma forma que não devemos
rejeitar tudo partindo da concepção errônea de que ser crítico é rejeitar tudo e
ficarmos apenas com a nossa verdade. Todas as verdades são transitórias, tudo
tem que ser ponderado e relativizado.
Entre as leituras em relação às quais mais necessitamos ser críticos estão as
leituras propostas pela mídia, tanto no que diz respeito aos textos escritos como
os textos orais, vinculados aos veículos de propagação de informações de massa,
como rádios, redes de televisões, jornais impressos e on-line, revistas impres-
sas e on-line. Esses veículos possuem o poder de decidir o que iremos saber e o
que não devemos saber e, ainda, de que forma a informação será transmitida.
Nesse contexto, é válido retomarmos o pensamento de Bakhtin (2010),
quando o autor afirma que todo ato comunicativo é intencional e carregado de
ideologia e podemos perceber que com os textos midiáticos isso não é diferente.
A mídia jornalística e de entretenimento são produtos de empresas privadas e
como tal estão associadas à ideologia da empresa à qual pertencem. As empresas
de mídia jornalísticas afirmam que são meios independentes de transmissão de
informação, mas isso não ocorre, porque tais empresas são mantidas por grandes
patrocinadores que fazem usos desses meios para divulgar seus produtos e mar-
cas, além de propagandas políticas, conforme esclarecem Hartmann e Santarosa
(2009). Conforme ressaltam os autores, o vínculo com os meios de produção
privada de mercadorias e com interesses de grupos financeiros e políticos “deixa
claro que a objetividade e a imparcialidade são impossíveis em qualquer meio
de comunicação” (HARTMANN; SANTAROSA, 2009, p. 143).

As Competências Críticas de Leitura


74 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Hartmann e Santarosa (2009) citam Santos (2001) para esclarecer que os meios
de comunicação valem-se de seu poder para difundir suas ideologias hegemô-
nicas. Para Santos (2001), a globalização promoveu o fortalecimento de várias
empresas em nível mundial, entre elas estão as empresas jornalísticas que, con-
forme declara o autor, não são mais que sete em todo o mundo, e direcionam as
perspectivas de notícias nas agências menores. O que significa que as agências
menores são meras reprodutoras das notícias veiculadas nas grandes agências,
detentoras do poder de difundir apenas as notícias que vão gerar retorno finan-
ceiro, tanto nas vendas dos jornais como na garantia de permanência de seus
patrocinadores.
A seguir, reproduzimos um texto jornalístico utilizado por Hartmann e
Santarosa (2009) para expor a linguagem utilizada nos textos jornalísticos:

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


75

Governo nega que ampliação do Bolsa Família tenha caráter eleitoreiro

A menos de sete meses das eleições municipais, o governo federal decidiu


estender o pagamento do programa Bolsa Família para jovens de 16 e 17 anos.
A partir desta segunda-feira, as famílias que já possuem crianças e jovens
inscritos no programa poderão ampliar o benefício caso os filhos já tenham
completado 15 anos - idade fixada como limite, em 2003, para o pagamento
do Bolsa Família.
A secretária nacional de Renda e Cidadania do Ministério do Desenvolvimento
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Social, Rosani Cunha, negou que a extensão do programa tenha fins eleitorei-
ros, mesmo atingindo jovens já autorizados pela Legislação Eleitoral a votarem.
“Estamos falando de uma modalidade dentro do programa. A compreensão
do governo é a de que não faremos um novo benefício, mas um ajuste em um pro-
grama que já existia. Não é a ampliação do Bolsa Família, mas o seu aperfeiçoamento.
Além disso, a extensão foi aprovada pelo Congresso no ano passado”, afirmou.
Segundo a secretária, o pagamento continuará sendo repassado à mãe
(ou chefe da família) responsável pelo jovem. “Quem melhor consegue deci-
dir onde adotar esse dinheiro é a própria família, preferencialmente a mãe. A
decisão foi muito mais para guardar coerência com o Bolsa Família que qual-
quer outra coisa”, disse a secretária ao ser questionada sobre o suposto viés
eleitoreiro da extensão.
Cunha afirmou que o principal objetivo da mudança é garantir que jovens até
17 anos permaneçam na escola, uma vez que grande parte abandonava os estudos
ao completar 15 anos com o fim do pagamento do Bolsa Família. Dados da Pnad
(Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) revelam, porém, que os beneficiá-
rios do programa têm uma freqüência escolar 1,6% maior que os não beneficiários.
“A faixa etária de 15 a 17 anos é crítica para o sistema educacional. Perder
esses 1,6% seria muito. Para nós, é um índice importante, em um país em que
1% para a educação pública é muita gente”, minimizou o secretário de Educação
Continuada e Alfabetização do Ministério da Educação, André Lázaro.

As Competências Críticas de Leitura


76 UNIDADE II

[...]
(Texto de Gabriela Guerreiro, citado por Hartmann e Santarosa, 2009, p.
144-145)
Para efeito de comparação, Hartmann e Santarosa (2009) refizeram a mesma
reportagem com os dados básicos necessários para seu entendimento, cuja repro-
dução apresentamos a seguir:

Governo estende benefício do Bolsa Família para aluno de até 17 anos

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Ontem, 17-03, em Brasília, o governo federal decidiu estender o pagamento do
programa Bolsa Família para jovens de 16 a 17 anos. Desde ontem as famílias que
possuem crianças e jovens inscritos no programa poderão ampliar o benefício
caso os filhos já tenham completado 15 anos – idade fixa como limite em 2003,
para o pagamento do Bolsa Família. Segundo a secretária nacional de Renda e
Cidadania do Ministério do Desenvolvimento Social, Rosani Cunha, o objetivo
da mudança é garantir que jovens de até 17 anos permaneçam nas escolas, uma
vez que grande parte abandonava os estudos ao completar 15 anos, com o fim
do pagamento do Bolsa Família.
O segundo texto foi feito por Hartmann e Santarosa (2009, p. 147) com os mes-
mos dados informados no primeiro texto e deixa clara a diferença de objetivos. No
segundo texto há apenas informações objetivas, sem valorização negativa ou posi-
tiva, caberia ao/à leitor/a julgar o fato no âmbito assistencialista, social ou político. O
risco que se corre ao publicar uma notícia dessa é o fato de o/a leitor/a (leia-se elei-
tor/a) estar livre para interpretar, podendo passar despercebido a possível ilicitude
do governo, interpretação desejada pelo jornal, ou interpretar como um ato de bon-
dade do governo, fato que culminará num possível voto de confiança para o governo.
É um risco que um jornal, caso seja anti-governista, não pode correr e já
no enunciado da reportagem lança em debate a negação do governo do uso do
Bolsa Família com a finalidade eleitoreira. Ninguém nega algo de que não tenha
sido acusado, e quando nega levanta hipóteses sobre a veracidade da acusação
(HARTMANN; SANTAROSA, 2009). Dessa forma, o objetivo do primeiro texto
é o de levantar a hipótese de uso do programa Bolsa Família para fins eleitoreiros.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


77

Hartmann e Santarosa (2009) afirmam que não existe jornalismo neutro e


cabe ao/à leitor/a observar não só a informação transmitida, mas o modo como a
informação está sendo transmitida. Nessa análise, os números são os dados mais
susceptíveis de serem usados a favor ou contra a situação que se deseja lançar.
Hartmann e Santarosa (2009) citam o exemplo da inflação: caso ela suba meio
por cento, dependendo do veículo de transmissão, a notícia pode sair desta forma:
A inflação já subiu meio por cento.
E em outro jornal, a mesma notícia pode ser dada de outra forma:
A inflação subiu meio por cento como previsto pelo governo.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Na primeira frase a ordem é alertar o/a leitor/a de que a inflação está subindo;
na segunda frase a ordem é informar que está tudo sob controle. Manipulações
como essas podem ser facilmente verificadas em épocas de eleições.
Devemos, portanto, ler criticamente todo e qualquer texto publicado nas
mídias de massa, inclusive entrevistas, reportagens, crônicas, artigos de opi-
nião, todos, sem exceção, podem trazer a marca ideológica de quem o escreveu,
de quem pagou para escrever, de quem tem interesse e ganhará dinheiro com a
reportagem ou com a entrevista.
É nesse contexto que o atributo acadêmico passa pela promoção da habili-
tação em ler textos sincréticos e não sincréticos, entender os sentidos explícitos
e os implícitos nos discursos midiáticos, saber interpretar a mensagem não só
pela decodificação das palavras, mas também pela leitura do contexto, do veí-
culo utilizado, razão pela qual as atividades de leitura não devem ser restringidas
a um único veículo, mas à pluralidade dos meios utilizados que se configuram
nos princípios do letramento digital.
Para isso, é necessário formar opiniões críticas a partir de análises de textos
midiáticos com o objetivo de compreender a força midiática disseminadora de
ideologias, construtora/destruidora de identidades; desenvolver as potenciali-
dades identificadoras das marcas discursivas nos diferentes modos de retratar
os mesmos fatos, desvelar a intenção por trás da escolha intencional de verbos
que retratam ações e moldam opiniões, analisar o dito e o não dito.
Diante de conflitos interpretativos, podemos fazer alguns questionamentos
para aguçar o faro crítico. Sugerimos que você pergunte:

As Competências Críticas de Leitura


78 UNIDADE II

O que o/a autor/a está tentando provar?


Sobre quem ele/a está falando?
Ele/a está ressaltando os aspectos positivos ou negativos?
Em que provas ele/a está se baseando?
As provas são confiáveis?
Qual é a relação que o/a autor/a tem com o sujeito referido no texto ou o
fato relatado?
Mesmo diante do que acredita que seja a verdade, questione, pois todas
as verdades podem ser abaladas quando entram em conflito com uma mente

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
questionadora.
Quanto maior o contato com a leitura, maior será a capacidade reflexiva
sobre os textos, pois há a possibilidade de comparação das ideias propostas por
cada autor/a. Nesse contexto, os hipertextos podem contribuir com a interati-
vidade textual.

OS HIPERTEXTOS E OS HIPERLEITORES

Como já visto, a linguagem tende a se moldar às necessidades de seus locutores,


os níveis linguísticos variam conforme variam os contextos onde são emprega-
dos. Dessa forma, há um novo contexto no qual a linguagem escrita procura se
moldar à nova ferramenta de transmissão: o computador e a internet.
Podemos dizer que o computador revolucionou o uso da linguagem, criou
novos linguajares - como o “internetês”, por exemplo - ampliou e agilizou os
meios de se comunicar, criou um novo perfil de analfabetismo: o virtual; e criou
um novo perfil de letramento: o digital.
As formas de apresentação textual ganharam novas estruturas e com elas
surgem os hipertextos, que se referem ao procedimento de escrita e leitura em
que se podem incluir links que, quando clicamos sobre eles, abre-se uma nova
janela e o texto citado pelo/a autor/a surge na tela. Seria como se no texto esti-
vessem acoplados todos os textos citados na referência. Obviamente isso não
seria possível na produção impressa, mas é plenamente possível na produção
de hipertextos publicados em páginas da internet.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


79

Para Nojosa (2007), o hipertexto representa um conjunto de amarras inter-


ligadas por conexões significativas que incluem palavras, imagens, gráficos,
sequências sonoras etc. Para o autor, o surgimento do hipertexto criou um espaço
dialógico por meio do qual as partes não se perdem no todo, ocorre uma dinâ-
mica de leitura onde não há um centro regulador, mas uma nova organização
de leitura sobre a qual o/a receptor/a pode ter a percepção da complexidade das
informações do mundo contemporâneo.
A dificuldade encontrada por um/a leitor/a desavisado está em se depa-
rar com uma variedade maior de informações, correndo o risco de se perder
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entre tantas delas. O/A leitor/a, mais do que nunca, tem que ter um obje-
tivo claro de leitura, ter a capacidade de filtrar o que lhe interessa e avaliar as
informações. Nesse tipo de leitura, outras habilidades têm que estar presen-
tes, como o domínio dos recursos digitais e o reconhecimento de ícones. O
hipertexto também pode nos remeter a links que constam imagens que o/a
autor/a acredita ser importante para a compreensão do texto. Dessa forma, o
acesso à imagem referida pelo/a autor/a se amplia e se transforma em instru-
mento essencial para manter a atenção do/a leitor/a, para vender, transmitir
mensagens, entreter etc.
Imagem é a voz do momento! O instrumento principal de comunicação
da mídia é a imagem, por ser uma mensagem agradável aos olhos e de rápida
absorção.

LEITURA DE IMAGEM

Para Costa Val (2006), pode-se definir como


texto todo conjunto de signos linguísticos de
qualquer extensão, dotado de unidade socio-
comunicativa. Portanto, podemos definir que
texto é toda ação comunicativa tomada cons-
cientemente no ato de situações concretas de
interações sociais processadas por meio de
estratégias e operações de ordem cognitivas.

As Competências Críticas de Leitura


80 UNIDADE II

Nesse contexto, podemos afirmar que uma placa de trânsito representa um


texto, o semáforo representa um texto, o slogan de uma empresa representa um
texto, livros, revistas, noticiários, novelas e demais manifestações verbais e não
verbais representam texto. Isso porque todos transmitem uma mensagem, todos
são ações comunicativas que promovem a interação entre o produtor e o recep-
tor da mensagem.
A imagem tem uma linguagem mundial, pode ser interpretada em todos os
países, porém a interpretação pode variar conforme variam o conhecimento das
pessoas que leem a imagem. Pelo seu poder comunicativo, a imagem é amplamente

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explorada pelos meios de comunicação, os quais também podem manipular o
foco desejado e publicar apenas o que lhes convêm. Portanto, a imagem pode
ter várias funções conforme o interesse de quem a utiliza.
Podemos fazer dois tipos de leitura de imagem, a leitura denotativa e a leitura
conotativa. Na leitura denotativa, elencamos os elementos que compõem a ima-
gem, podemos enumerá-los e/ou descrevê-los como a quantia de objetos, de seres
que aparecem na figura, e as cores utilizadas. A leitura conotativa é a interpreta-
ção das possíveis mensagens que a imagem pode transmitir, a interpretação das
feições dos sujeitos retratados, a disposição dos objetos, o significado das cores.
Para ler uma imagem, devemos mobilizar nossa percepção tanto denotativa
como conotativa, buscando identificar o que a imagem representa, o tema ou
assunto exposto nela; identificar os elementos que a compõem, como objetos,
pessoas, animais etc.; e a interpretação do que a imagem significa.
As imagens podem trazer mensagens que nos remetem a diferentes mun-
dos, como, por exemplo:
–– À cultura e às civilizações passadas, como os quadros clássicos históricos.
Há valores ultrapassados ou atuais que podem ser percebidos nas roupas
ou no posicionamento dos corpos expostos nos quadros.
–– Valores comerciais, como as imagens publicitárias.
–– Situações sociais de diferentes regiões, como a riqueza e pobreza, por
exemplo.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


81

A imagem possui várias funções. Dentre elas, citamos as seguintes:


Imagem informativa ou representativa - transmite informações tanto reais
como fictícias, como as fotos jornalísticas, as pinturas ou as imagens de
ficção, como os seres encantados, as pinturas que retratam fatos históri-
cos, placas com ícones representativos etc.
Imagem explicativa - tem por objetivo explicar a realidade por meio de
dados, como as ilustrações dos textos, as tabelas e diagramas.
Imagem argumentativa - objetiva influenciar, persuadir e convencer o lei-
tor, como as imagens publicitárias tanto comerciais como políticas.
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Imagem crítica - promove a conscientização sobre determinados proble-


mas, procura denunciar fatos e situações por meio de fotos, desenhos,
caricaturas, como as charges, as tirinhas, as fotos de guerras e de descasos
com o meio ambiente.
Imagem estética - privilegia o belo, são as fotos artísticas, de moda e beleza.
Imagem simbólica - representam símbolos, como marcas de carro, tênis,
bandeiras e placas de trânsito.
Imagem narrativa - são as imagens postas em sequência que sugerem histó-
rias, cenas ou ações, como as histórias em quadrinhos e novelas de revistas.
Imagem expressiva - revela sentimentos e emoções focando as expres-
sões faciais.
Imagem lúdica - tem a função de entretenimento, de diversão, humor,
como os desenhos infantis.

Como já dito anteriormente, nenhum texto está isento da ideologia do/a autor/a,
nem mesmo a imagem que é considerada um texto visual a ser decodificado;
portanto, por trás de toda imagem há uma intenção, e o desafio do/a leitor/a é
descobrir sobre qual intenção se ampara o/a autor/a da imagem, se é a de entre-
ter, divertir, emocionar, informar ou persuadir. Dessa forma, também na imagem
carecemos de usar nossa leitura crítica, principalmente em se tratando de ima-
gens jornalísticas e publicitárias.

As Competências Críticas de Leitura


82 UNIDADE II

Perguntas também podem ser feitas na tentativa de ler as mensagens expos-


tas na imagem, como:
A imagem foi retirada do contexto?
Houve tratamento na imagem na tentativa de maquiar a realidade?
Qual o objetivo de expor a imagem?
A imagem foi produzida por quem, para quem e para quê?
Qual a função pretendida pelo/a autor/a da imagem?

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

CONCEPÇÕES DE LEITURA: DA DECODIFICAÇÃO AO LETRAMENTO


83

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vimos, nesta unidade, que a leitura ou falta dela marca os sujeitos históricos.
Numa sociedade grafocêntrica, a leitura é passaporte para ocupações profissio-
nais e o letramento representa a possibilidade de melhorar o nível profissional.
Para além do mundo do trabalho, o mundo da leitura nos torna constru-
tores de nossa própria história, nos oferece chances de construirmos opiniões
próprias, formularmos conceitos, ideias, visões de mundo livre das ideologias
alheias, da alienação, e de construirmos identidade própria.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

As práticas de letramento são indissociáveis das práticas sociais, haja vista que
estas são permeadas por imagens, textos, outdoors, placas, livros, jornais e todas
as mídias comunicativas que vendem sonhos pelo preço de mercado e que esta-
mos sujeitos a pagar, caso não tenhamos noções de juízo de valor.
Por isso afirmamos que o letramento é um processo contínuo de aprendiza-
gem da leitura, está construída nas práticas sociais que respondem às demandas
da realidade social, pois a cada instante a mídia inventa novas demandas. Somos
todos leitores em processo contínuo de formação, continuamente aumentando
as habilidades linguísticas, as noções e percepções textuais, ampliando o voca-
bulário e as possibilidades de leituras de mundo e, principalmente, aumentando
nossas defesas contra a alienação.
A ampliação das habilidades leitoras decorrerão das estratégias de leitura,
dos questionamentos perante à dialogicidade estabelecida entre leitor/a e texto.
A interação com o/a autor/a, mediante a palavra escrita, deve ocorrer continu-
amente até que se esgotem os questionamentos necessários para estabelecer a
compreensão e interpretação textual. E lembre-se, somente a prática o/a levará
a eficiência. Aprimorar e disciplinar as leituras o/a conduzirá à autonomia lei-
tora, fundamental para seu sucesso pessoal e profissional, fundamental para o
empoderamento!

Considerações Finais
84

1. Leia um jornal de sua região, anote quantas reportagens há no jornal que falem
bem ou que falem mal de algum governo municipal de sua região e formule
considerações sobre a reportagem: O jornal é a favor, contra ou mantém uma
postura apartidária em relação ao partido do governo citado?
2. Faz parte do processo de formação a autoavaliação de nossa evolução leitora e
isso só é possível se temos bem definido o conceito e a importância do letramen-
to acadêmico em nossas práticas sociais. Dessa forma, solicitamos a você que
defina o que é letramento acadêmico e qual a importância desse processo
em sua vida acadêmica e profissional.
3. Estudamos as quatro etapas que podem promover a leitura com proficiência
propostas por Cabral (1986), as quais são: decodificação, compreensão, interpre-
tação e retenção. Solicitamos a você que conceitue decodificação, compreen-
são e interpretação.
4. Pesquise imagens em jornais e escolha uma para análise. Analise-a quanto ao
que é retratado: ou as pessoas, ou os objetos, o ambiente, a mensagem que a
imagem quer transmitir. Descreva a análise e escreva sua impressão sobre a
imagem/mensagem.
5. A leitura potencializa nossa capacidade de comunicação. Assim, podemos afir-
mar que o hábito de ler amplia nosso vocabulário e subsidia nossos argumentos,
ampliando nosso poder de discussão. Tendo como base esse princípio, assinale
a alternativa que contempla essa evolução:
a. ( ) A prática da leitura não influencia a produção de textos.
b. ( ) Ler e escrever são práticas distintas e desconexas.
c. ( ) A escrita independe de leitura e de organização de pensamento.
d. ( ) Leituras e produção textual promovem o letramento.
e. ( ) Todas as alternativas estão corretas.
85

Como leitura complementar, sugerimos a leitura do artigo intitulado “Fichamento como


método de documentação e estudo”, da professora e pesquisadora Marivalde Moacir Fran-
celin.
O artigo discute três formas básicas que podem auxiliar no estudo do texto acadêmico:
fichamento, resumo e resenha. Essa discussão auxilia na compreensão e ampliação das
práticas de escrita de textos acadêmicos.
Em síntese, podemos dizer que o fichamento é um método de pesquisa pessoal, portanto
pode ser realizado de várias maneiras como, veremos mais adiante. Sua função é de orga-
nizar ideias por meio do material consultado para a realização de uma pesquisa. Não há
limite para se fazer fichamentos, mas isso depende de coerência. Não se pode fichar tudo
sobre um assunto e, geralmente, não usamos todo o material que levantamos e fichamos,
mas teremos uma fonte de informação organizada para consultas posteriores.
Os resumos já seguem, por exemplo, parâmetros pré-estabelecidos, como as normas
da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). A função do resumo, muitas vezes,
é de divulgação, ou seja, não serve apenas como método pessoal de pesquisa. Vocês
verão muitos resumos e resenhas publicados mas, dificilmente, verão um fichamento
em alguma publicação.
Um resumo tem extensão limitada e não comporta, como em resenhas e fichamentos,
citações e comentários, muito menos menciona outras obras. Geralmente, os resumos
trazem informações sobre o conteúdo de uma obra. Tais informações devem ser cla-
ras e objetivas, representando o tema da obra, a metodologia utilizada, as hipóteses
levantadas, metodologias e conclusões. Em fichamentos e resenhas estes itens não são
obrigatórios, a não ser que sejam a temática da pesquisa empreendida e/ou da obra que
está sendo analisada.
Outra coisa importante sobre os resumos está no fato de existirem vários tipos deles,
mas não estamos falando apenas de resumos críticos, informativos e descritivos como
as normas sugerem. Estamos falando de resumos acadêmicos e resumos documentá-
rios. Qual é a diferença entre eles?
Os resumos acadêmicos são feitos como atividades de análise de textos para as discipli-
nas de graduação. Possuem linguagem menos formal e objetiva e não se baseiam, ne-
cessariamente, em normas. Os resumos acadêmicos são aqueles que os professores re-
quisitam como atividade de análise de textos. Assim como na linguagem, também não
há uma formatação para o texto do resumo acadêmico e nem mesmo critérios quanto
à sua extensão. Eles podem ser apresentados em espaços duplos, com parágrafos e em
mais de uma página, desde que mantenham as informações essenciais do documento.
A resenha comporta alguns elementos do fichamento e do resumo. Sendo um texto
informativo e crítico ao mesmo tempo, a resenha, invariavelmente, pode intercalar co-
mentários e citações (diretas e indiretas), fazer referências a outros textos, constituindo
já um exercício de produção textual. As resenhas não possuem número máximo de pá-
86

ginas, mas devem respeitar alguns limites para não serem confundidas com um ensaio,
um artigo ou um resumo.
Não vamos nos estender muito nestas observações, mas é importante ter em mente
que:
1. O fichamento é o primeiro passo na realização de uma pesquisa, portanto, quase sem-
pre fazemos fichamentos, independentemente do tipo da pesquisa.
2. O resumo é uma atividade, um exercício de raciocínio que visa entendimento e sínte-
se de uma obra a partir de regras pré-estabelecidas ou não.
3. Já a resenha é uma atividade de análise e síntese que permite maior elasticidade na
abordagem, porém, exige, além das características já mencionadas, um certo domínio
sobre assunto tratado na obra que está sendo resenhada. A resenha é, portanto, uma
atividade mais complexa, porém torna-se mais fácil quando o hábito de fazer fichamen-
tos e resumos são familiares ao pesquisador.
Quando professores e professoras pedem para seus estudantes fazerem um fichamen-
to, resumo ou resenha, geralmente se referem aos tipos bibliográficos ou de conteúdo.
Cabe ao aluno ou aluna seguir as instruções dadas por cada instrutor(a).
Fonte: Francilin ([2017], on-line)1.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Práticas de leitura para o letramento no ensino superior


Schirley Horácio de Góis Hartmann e Sebastião Donizete
Santarosa
Editora: Ibpex
Sinopse: livro oferece reflexões sobre o processo de letramento
que se inicia, na visão dos autores, antes da alfabetização e se
estende por toda a vida num processo contínuo de ampliação
de domínios variados de conhecimentos de gêneros textuais.
O objetivo do livro é promover a compreensão de que a
leitura promove a transformação por meio das práticas sociais
entendidas como letramento. A proposta é a construção da
autonomia do estudante universitário, a fim de torná-lo um leitor
crítico.
Comentário: o livro pode ser acessado na Biblioteca Virtual
Pearson da UniCesumar.

O clube de leitura de Jane Austen (2007)


Sinopse: o filme retrata a vida de um grupo de mulheres que
fazem parte de um clube do livro sobre as obras de Jane Austen.
Nas reuniões do grupo são discutidas as leituras e lições aprendidas
na tentativa de resolver problemas pessoais de relacionamentos.

O contador de histórias (2009)


Sinopse: o filme conta a vida real de um pedagogo que foi
criado na FEBEM desde os seis anos de idade; aos 13 anos ele
conhece a pedagoga francesa Margherit Duvas, que muda sua
vida radicalmente.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

O QEdu é um portal no qual você irá encontrar informações sobre a qualidade do


aprendizado em cada escola, município e estado do Brasil. Assim, você poderá fazer
avaliações sobre o letramento nas escolas brasileiras.
Acesse o link disponível em: <http://www.qedu.org.br/>.

O link a seguir oferece acesso às entrevistas de Roxane Rojo, gravadas em maio de 2013,
no Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec),
em São Paulo (SP). Roxane apresenta suas concepções sobre alfabetização, letramento
e multiletramentos.
Acesse o link disponível em: <http://www.plataformadoletramento.org.br/em-revista-
entrevista-detalhe/246/roxane-rojo-alfabetizacao-e-multiletramentos.html>.
89
REFERÊNCIAS

BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 5. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010.
CABRAL, L. S. Processos psicolingüísticos de leitura e a criança. Letras de Hoje, v. 19,
n. 1, p. 7-20, Porto Alegre, 1986.
COSTA VAL, M. G. Redação e Textualidade. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
DEMO, P. A educação do futuro e o futuro da educação. Campinas: Autores Asso-
ciados, 2005.
FISCHER, A. Letramento Acadêmico: uma perspectiva portuguesa. Acta Scientia-
rum: Language and Culture, Maringá, v. 30, n. 2, p. 177-187, jul./dez. 2008.
FRANCELIN, M. M. Fichamento como método de documentação e estudo. Tópicos
de Fundamentos e Formação em Biblioteconomia e Ciência da Informação. In: SIL-
VA, J. F. M.; PALETTA, F. C. (Orgs.). Tópicos para o ensino da biblioteconomia. São
Paulo: ECA-USP, 2016, p. 121-139. Disponível em: <http://www3.eca.usp.br/sites/de-
fault/files/form/biblioteca/acervo/textos/002746699.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2017.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.
HARTMANN, S. H. G.; SANTAROSA, S. D. Práticas de leitura para o letramento no
ensino superior. Curitiba: Ibpex, 2009.
KLEIMAN, A. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 7. ed. Campinas: Pontes, 2000.
LIMA, A.; RIBEIRO, V. M.; CATELLI JR, R. Indicador de Alfabetismo Funcional – INAF.
Estudo especial sobre alfabetismo e mundo do trabalho. São Paulo: Instituto
Paulo Montenegro Ação Educativa, 2016.
MORTIMER, A.; VAN DOREN, C. Como Ler Livros: O Guia Clássico para a Leitura Inte-
ligente. São Paulo: É Realizações, 2010.
NOJOSA, U. N. Da rigidez do texto à fluidez do hipertexto. In: FERRARI, P. (org.). Hi-
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PINTO, C. M.; FISCHER, A. O discurso sobre leitura e escrita de um estudante EaD em
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nível em: <http://pt.scribd.com/doc/23574491/SANTOS-Milton-Por-uma-outra-glo-
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Campinas: Editora Unicamp, 2015.
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
UNESCO. Alfabetização como Liberdade. Brasília: UNESCO, MEC, 2003. Disponível
em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ue000001.pdf>. Acesso
em: 07 jan. 2017.
GABARITO

1) A resposta é livre e depende de pesquisa pessoal realizada em jornais regionais.


2) Letramento acadêmico é a autonomia nas formas de pensar, ser, fazer, ler e es-
crever agir e interagir, acreditar, valorizar, sentir, usar recursos e ferramentas tec-
nológicas. É conquistar a independência na pesquisa, na construção de ideias,
na produção de trabalhos, favorecendo a autoconfiança e aumentando a auto-
estima. A importância do letramento acadêmico é a promoção de identidades
próprias, posicionamentos ideológicos, constituição de significados culturais e
estruturas de poder que vão refletir na atuação profissional, no mundo do traba-
lho e nas realizações pessoais. Ser letrado/a é ser empoderado, é ter o poder de
participação na construção da história coletiva, de se manifestar, agir em prol da
defesa de ideologias próprias e de defender direitos.
3) Na decodificação deciframos os códigos linguísticos, ou seja, juntamos as letras
e formamos palavras com significados; a compreensão é a junção dos significa-
dos de cada palavra que vão atribuir sentido ao texto; a interpretação é a junção
do todo significante textual com o conhecimento de mundo que temos e que
favorece a retenção das informações.
4) A resposta é pessoal, de acordo com a imagem que foi escolhida para análise.
5) D.
Professora Dra. Ivone Pingoello
Professor Me. João Carlos Dias Furtado

III
UNIDADE
A PRODUÇÃO TEXTUAL

Objetivos de Aprendizagem
■■ Entender a importância da leitura na formação de um cidadão
crítico.
■■ Entender a importância da produção textual como instrumento
comunicativo.
■■ Reconhecer a importância dos elementos de coesão e coerência dos
textos produzidos.
■■ Compreender os processos de construção de textos narrativos e
descritivos.
■■ Entender o contexto comunicativo da internet: práticas de produção
escrita.
■■ Compreender a importância do desenvolvimento integral das
práticas de leitura, escrita e análise linguística.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ Leitura e formação do leitor.
■■ A influência da leitura na produção de texto
■■ Elementos fundamentais para uma boa produção de texto
■■ Características de textos narrativos
■■ Características de textos descritivos
■■ A produção textual na internet
93

INTRODUÇÃO

O universo do conhecimento nos diversos segmentos do Ensino Básico e Superior


exige uma postura acadêmica do aluno que perpassa diretamente pelo uso ade-
quado da linguagem nesse contexto. Ao ingressarmos na escola, na maioria das
vezes, não estamos preparados para entender os requisitos linguísticos básicos
de uma vida e produção acadêmica.
A escrita, que é uma habilidade tão comum e tão utilizada por nós em nosso
dia a dia, esbarra, muitas vezes, em uma certa dificuldade de entender que cada
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

situação comunicativa exige um nível linguístico, por isso devemos perceber que
o processo educativo não foge a essa prática, ou seja, devemos utilizar uma lin-
guagem adequada ao ambiente acadêmico que é regido pela norma culta.
Quando adentramos no Ensino Fundamental, depois Médio e Superior, ini-
ciamos uma nova etapa educacional que tem seus desafios e exigências, assim, a
produção textual oral e escrita deve estar coerente com essas exigências.
Nessa Unidade III, estudaremos a importância de uma formação sólida nas
práticas de leitura e escrita que colaboram para a construção de um cidadão crí-
tico e consciente de seu papel social e político, por isso ser um bom leitor, fazer
uma leitura crítica, saber expressar-se oralmente e de forma escrita são requisi-
tos que o século XXI exige cada vez mais no âmbito profissional e pessoal.
Portanto, quando se fala em produção textual, fala-se sobre a capacidade de
participar do mundo letrado, de não ficar às margens da sociedade como mero
espectador do conhecimento quando se tem meios de expressar o próprio conhe-
cimento, contribuindo culturalmente com essa construção.
O uso adequado da linguagem em sua produção textual demonstra a capa-
cidade cognitiva e social do escritor de ler a realidade à sua volta e potencializar
sua comunicação.
Bons estudos!

INTRODUÇÃO
94 UNIDADE III

LEITURA E FORMAÇÃO DO LEITOR

Iniciamos esta unidade com uma pergunta pessoal: sou um bom leitor? Evidente
que para alguns a resposta será rápida e objetiva, sim ou não, e para outros será
necessário uma reflexão maior que alcance suas lembranças e conhecimentos
pessoais. Diante disso, destacamos a importância de sermos leitores, leitores de
jornais, revistas, gibis, poesia, narrativas de mistério, romances românticos, publi-
cidade, bula de remédio, manual de instrução e tantos outros textos possíveis.
Ser um leitor significa ler, evidentemente conforme criamos o nosso senso

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
crítico apurado, as nossas leituras ganham em qualidade e há uma seleção natu-
ral do que lemos e por que lemos, mas, no processo de formação de um leitor,
é necessário que sejamos expostos a uma grande diversidade e quantidade de
gêneros textuais que nos permitam formar o nosso gosto particular, senso crí-
tico e entender a dimensão estética das obras literárias.
A leitura é o processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de com-
preensão e interpretação do texto, a partir de seus objetivos, de seu
conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre
a linguagem etc. [...] (BRASIL, 1998, p. 69-70).

Estudamos, na unidade anterior, as etapas e níveis


de leitura que devemos alcançar, pois, muitas
vezes, nos consideramos leitores compe-
tentes, mas não conseguimos depurar e
interpretar com qualidade um texto sim-
ples. Isso ocorre porque no processo de
formação de um leitor, os conhecimentos
se somam e não podem ser particulari-
zados, não posso entender que apenas a
decodificação de palavras sem o conhecimento
temático sobre o que o texto trata me dará uma noção com-
pleta de seu sentido, que não preciso saber a norma culta para
ler, que conhecimentos das áreas de física, química e biolo-
gia não são importantes para ler ou que o processo de leitura
está isolado da escrita e da fala.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
95

Assim, verificamos que a prática da leitura é uma habilidade complexa que exige
uma série de conhecimentos que se somam ao longo de nossa trajetória e são adqui-
ridos e fortalecidos com hábitos cotidianos.
A leitura, embora ação corriqueira nos dias de hoje, sobretudo nas regi-
ões urbanas, não é natural. Não lemos como comemos, respiramos ou
dormimos. Para tanto, precisamos aprender o código escrito, socialmen-
te aceito e a ter domínio sobre ele em todas as suas modalidades, quer
práticas (como propagandas, receitas, notícias, informações, anotações)
quer estéticas (como narrativas e poemas) (AGUIAR, 1996, p. 48).

Sendo assim, a prática da leitura não só é um ato pessoal, mas também de cons-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

trução social e ordinário, pois se concretiza na cultura letrada de uma sociedade


que expressa a sua racionalidade, opinião e posição social por meio do processo
de leitura e, também, da produção de texto.
Nesse contexto, o ato de leitura promove um ato dinâmico de interação do lei-
tor com o escritor, o produtor do livro (mercado editorial), com a sociedade e outros
leitores que enriquecem o seu universo cultural e científico por meio de variadas lei-
turas que compõem, gradativamente, o seu repertório de leituras e conhecimentos.
Não tinha percebido a importância da leitura? Não! Tenho certeza que agora a
sua consciência como leitor aumentou um pouco mais e isso nos posiciona, como
professores, em uma campanha que começa com nós mesmos, a campanha de fazer
do Brasil um país leitor, temos a obrigação de sermos bons leitores e formarmos bons
leitores dos mais variados gêneros textuais e literários.
Uma pesquisa realizada pelo IBOPE em
2016, sob encomenda do Instituto Pró-Livro
(IPL), ouviu cinco mil pessoas nas cinco regi-
ões do Brasil, e o resultado demonstra que
temos uma dificuldade em formar um país
de leitores. A pesquisa revela que para 56%
da população brasileira a leitura é um hábito,
índice que parece satisfatório, mas que na
comparação histórica demonstra uma evo-
lução pequena ou inexistente, pois em 2007
eram 55% e, em 2011, 50%.

Leitura e Formação do Leitor


96 UNIDADE III

Ficou curioso com esses números? Ainda não conseguimos formar um país
de leitores e isso é um dos objetivos que a escola, junto à sociedade, deve
alcançar. O Jornal Estadão fez uma reportagem com o objetivo de entender
melhor esses números que indicam essa triste realidade nacional. Para sa-
ber mais, acesse o link disponível em: <http://cultura.estadao.com.br/blogs/
babel/44-da-populacao-brasileira-nao-le-e-30-nunca-comprou-um-livro-
-aponta-pesquisa-retratos-da-leitura/>.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Fonte: os autores.

Os dados indicam que o brasileiro lê 4,96 livros por ano, o que não dá um livro
por bimestre. Desse número, 0,94 são leituras indicadas pela escola e 2,88 são
escolhas próprias; também do número total, 2,43 foram os livros lidos na ínte-
gra e 2,53 foram lidos parcialmente.
Esse cenário demonstra a importância da escola na formação de bons leitores
que tornar-se-ão cidadãos críticos e conscientes de seu papel na nossa sociedade.
Por isso, a prática da leitura na escola impulsiona outras práticas imprescindí-
veis na sociedade atual, como a escrita.
Um bom leitor forma, ao longo de sua vida, um repertório de leitura que
auxilia e o promove a ser um bom produtor de texto, bom comunicador e com
habilidade suficiente para exercer e apresentar seu ponto de vista e posicionar-
-se de acordo com suas crenças.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
97
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A INFLUÊNCIA DA LEITURA NA PRODUÇÃO DE TEXTO

Ao entendermos que a língua é um espaço de interação em um processo dinâ-


mico e em constante transformação, fica evidente a necessidade de uma prática
escolar que promova a interação entre os processos de leitura, produção de texto
e análise linguística.
Não há como pensarmos no desenvolvimento linguístico de um aluno sem
entendermos que há uma íntima relação entre esses processos, assim, é funda-
mental que a prática de produção textual seja acompanhada por um bom trabalho
de leitura e o entendimento da estrutura da língua (análise linguística). Por isso,
ser um bom leitor e entender o funcionamento estrutural da língua possibilitam
que eu escreva um bom texto.
Podemos entender o ato da leitura, segundo os PCNs, como:
Não se trata de extrair informação, decodificando letra por letra, pala-
vra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica estratégias de
seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possí-
vel proficiências (BRASIL, 1998, p. 69).

Diante disso, proporcionar aos alunos uma boa experiência de leitura que os
possibilite se tornarem bons leitores é fundamental para o desenvolvimento da
habilidade de produção de texto e análise linguística.

A Influência da Leitura na Produção de Texto


98 UNIDADE III

A habilidade de escrita também exige um bom conhecimento de como a


língua materna se estrutura e explora o repertório de leitura do aluno, pois enten-
de-se que seja necessário que
os alunos desenvolvam uma competência discursiva marcada por um
bom domínio da modalidade escrita e por uma visão de que a produ-
ção de um texto é um trabalho que exige a superação de jogos de pala-
vras ou frases soltas (CITELLI; BONATELLI, 2001, p. 122).

A escola é um espaço fundamental para o fomento e um trabalho sistemati-


zado para o desenvolvimento da análise linguística, leitura e escrita, por isso

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
o professor deve estimular desde sempre o entendimento da linguagem e suas
possibilidades de uso e manipulação para que assim o aluno seja formado inte-
gralmente e consiga autonomia para se manifestar, pois escrever um texto não
é somente juntar frases ou palavras soltas.
O produto da atividade discursiva oral ou escrita que forma um todo
significativo, qualquer que seja sua extensão, é o texto, uma seqüência
verbal constituída por um conjunto de relações que se estabelecem a
partir da coesão e da coerência. Em outras palavras, um texto só é um
texto quando pode ser compreendido como unidade significativa glo-
bal. Caso contrário, não passa de um amontoado aleatório de enuncia-
dos (BRASIL, 1998, p. 21).

Portanto, para o aluno se tornar um bom produtor de texto que “forma um todo
significativo”, é necessário que ele seja um bom leitor e tenha um bom domínio
do funcionamento da língua.

Você tem ideia de como abordar gêneros textuais em sala de aula? Não?
Então leia a reportagem “Como usar gêneros textuais para ensinar leitura e
produção de texto”, da revista Nova Escola, e descubra práticas que podem
estimular a formação linguística integral do aluno. Para saber mais, acesse o
link disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/2588/como-usar-
-os-generos-para-ensinar-leitura-e-producao-de-textos>.
Fonte: os autores.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
99

Dessa forma, temos, na prática de leitura, no estudo do funcionamento da lín-


gua, habilidades pessoais e sociais que proporcionam uma produção textual mais
coerente e com maior qualidade, pois são práticas que se completam na forma-
ção cognitiva dos alunos.

“A leitura do mundo precede a leitura da palavra”.


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

(Paulo Freire)

ELEMENTOS FUNDAMENTAIS PARA UMA BOA


PRODUÇÃO DE TEXTO

O mundo do texto escrito é um universo repleto de possibilidades, estruturas e


recursos, por isso, entender e dominá-lo é fundamental para a sua inserção no
mercado de trabalho e para a sua vida pessoal.
A escola é um dos ambientes em que o uso da escrita é fundamental e lá
deve-se estudar e formar os alunos para serem bons produtores de textos, assim,
ela não pode se eximir de seu papel fundamental que é instrumentalizar os alu-
nos a se tornarem habilidosos comunicadores.
Segundo Sercundes (2011), há três pro-
cessos em que a escrita insere-se no contexto
escolar como concepções de produção de
texto:
1. Escrita como um dom: entende-se
que o aluno já domina todo o pro-
cesso de escrita e não há um trabalho
prévio e sistêmico sobre a escrita que
será feita; o professor lança um tema,
um assunto, e o aluno produz. Essa
concepção é falha na formação do
aluno em não apresentar uma orien-

Elementos Fundamentais para uma boa Produção de Texto


100 UNIDADE III

tação de leitura, análise linguística, estrutura e gênero textual e é muito


pouco usada nos dias de hoje.
2. Escrita como consequência: nessa concepção, a escrita é uma consequ-
ência de um saber ou senso comum, pouco aprofundado, como escrever
após assistir um filme, ou uma viagem, a rotina dos alunos. Aqui tam-
bém o trabalho com a leitura, análise linguística, estrutura e os gêneros
textuais são preteridos, pois há um pretexto (filme, música, história etc.)
que norteia a produção textual.
3. Escrita como trabalho: entende-se, nessa concepção, que a produção de
texto é uma extensão do conhecimento e trabalho feitos em sala de aula

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
junto ao professor, assim, a escrita é uma construção e não meramente
uma produção ocasional. O filme, a pesquisa ou a música pode ser uma
das etapas de formação para uma produção de texto que envolve a leitura,
análise linguística, estrutura, gênero textual e a possibilidade de reescrita
e aquisição do conhecimento.

A concepção que deve estar presente na escola é a Escrita como trabalho, pois
visa um trabalho completo e interativo do aluno com o professor, com a temá-
tica discutida e todo processo formativo.
Por isso a produção de texto não pode ser feita de qualquer jeito, assim, ao
produzirmos um texto, é importante refletir sobre questões, como: qual gênero
textual usarei? Qual linguagem estará adequada àquele gênero? Quem é o meu
público-alvo? Em qual contexto sociointerativo está inserido o meu texto?
Pois a decisão do como escrever, a linguagem a ser usada, o tema a ser abor-
dado depende muito da destinação do texto. Será um texto destinado ao público
infantil, adulto, ou será um trabalho de conclusão de curso, uma dissertação ou
tese? Qual o gênero a ser trabalhado? Esses são os primeiros direcionamentos a
serem seguidos na definição da estrutura do texto.
Os PCNs (1998) apontam para alguns aspectos fundamentais que o aluno
deve se atentar ao produzir um texto.
■■ finalidade;
■■ especificidade do gênero;
■■ lugares preferenciais de circulação;
■■ interlocutor eleito;

A PRODUÇÃO TEXTUAL
101

Utilização de procedimentos diferenciados para a elaboração do texto:


■■ estabelecimento de tema;
■■ levantamento de idéias e dados;
■■ planejamento;
■■ rascunho;
■■ revisão (com intervenção do professor);
■■ versão final.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Utilização de mecanismos discursivos e lingüísticos de coerência e coesão textuais,


conforme o gênero e os propósitos do texto, desenvolvendo diferentes critérios:
■■ de manutenção da continuidade do tema e ordenação de suas partes
(BRASIL, 1998, p. 58).

Costa Val (2006) considera texto como toda a unidade linguística comunicativa
básica, entendendo-se como texto tanto a comunicação oral como a escrita, pois
ambos não são fragmentos comunicativos, mas textos dotados de significados
que são produzidos pela textualidade composta por elementos responsáveis pelo
processo sociocomunicativo do texto. Tais elementos, segundo Costa Val (2006)
e Koch e Travaglia (2007), são: intencionalidade, informatividade, aceitabilidade,
situacionalidade, intertextualidade e coerência e coesão.
A intencionalidade citada por Costa Val (2006) e Koch e Travaglia (2007)
refere-se à produção textual coerente e coesa com objetivos definidos pelos auto-
res que podem informar, divertir, impressionar, alertar, convencer, pedir, criticar,
elogiar etc. A aceitabilidade se refere, primeiro, à expectativa do produtor da
aceitação de seu produto e, depois, ao receptor, ao nível de aproveitamento, utili-
dade, relevância e aquisição de novos conhecimentos por meio da leitura; fatores
que envolvem a capacidade do texto em cumprir com seus objetivos. Por esse
motivo, a produção de um texto deve ser pensada como um todo; não haverá
aceitação se o texto for incoerente ou estiver fora dos padrões textuais aceitáveis.
A situacionalidade compreende a adequação do texto à situação socioco-
municativa, são os elementos responsáveis pela relevância e pertinência do texto
quanto ao contexto em que está inserido. O contexto orienta tanto a produção

Elementos Fundamentais para uma boa Produção de Texto


102 UNIDADE III

como a recepção textual, é elemento definidor da coerência; neste caso, a autora


cita as placas de trânsito, que são muito mais coerentes que longos textos expos-
tos na rodovia para informar ou advertir os motoristas (COSTA VAL, 2006;
KOCH; TRAVAGLIA, 2007) .
Quanto à informatividade, o texto deve apresentar dados suficientes para
sua compreensão, nem demais, nem de menos. O texto não pode trazer somente
dados novos, inusitados, o que impossibilitaria a compreensão do leitor; há a
necessidade de integração entre o dado e o novo para a contextualização da infor-
mação nova (COSTA VAL, 2006; KOCH, TRAVAGLIA, 2007).

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A intertextualidade, para Costa Val (2006) e Koch e Travaglia (2007), refe-
re-se à dependência do conhecimento de outras unidades linguísticas para a
compreensão/produção de outros textos. Há uma colaboração contínua entre
os textos para que se possa atingir a aceitabilidade, promover a autenticidade,
aumentar a capacidade informativa. Portanto, podemos afirmar que em todo
texto está presente a intertextualidade.
Conforme Koch e Travaglia (2007), o conhecimento de mundo do leitor, o
conhecimento compartilhado que se refere ao conhecimento em comum entre
autor e receptor, a inferência que é o uso do conhecimento de mundo para a
compreensão textual e os fatores de contextualização, que são a âncora do texto
são elementos fundamentais na construção da coerência textual, e que devem
ser analisados pelo autor para que sua intencionalidade seja atingida.
A coerência e a coesão são citadas por Costa Val (2006) e por Koch e Travaglia
(2007) como elementos fundamentais na construção do sentido do texto, ele-
mentos que merecem destaque em nosso trabalho.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
103

Um texto é composto de diversos elementos que, bem-articulados, conse-


guem deixar o texto excelente, entre esses elementos, dois se destacam: co-
erência e coesão. Leia um pouco mais sobre isso na reportagem “A coesão e
a coerência: na interpretação e produção de textos em sala de aula”, do Por-
tal da Educação. Para saber mais, acesse o link disponível em: <https://www.
portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/educacao/a-coesao-e-a-coeren-
cia-na-interpretacao-e-producao-de-textos-em-sala-de-aula/52602>.
Fonte: os autores.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Quando o texto tem um sentido harmônico, conexo do início ao fim, quando


você lê e percebe uma comunicação entre as partes do todo, isso é denominado
coerência textual. A articulação das ideias, a organização dos argumentos, o bom
uso do gênero textual e a linguagem adequada à situação comunicativa são fru-
tos de um texto coerente.
Para Koch e Travaglia (2007), o texto pode apresentar coerência global e local.
A coerência quanto ao sentido global refere-se ao processo intertextual, ou seja, a
relação do texto com o contexto incluindo o conhecimento de mundo do leitor,
sua capacidade cognitiva de interpretabilidade de leitura; ocorre a incoerência
global quando não há relação intertextual, quando se perde a relação contex-
tual entre texto e leitor, texto e sentido. Nesse mesmo sentido, Pignatari (2010)
designa a coerência global de coerência externa. A coerência local ocorre quando
há relação intratextual, encadeamento das ideias, utilização de elementos coesivos
para a unificação de sentido; a incoerência local ocorre quando esses elementos
são negligenciados, quando as partes do todo se perdem, formando fragmentos
isolados. Para coerência local, Pignatari (2010) utiliza o termo coerência interna.
[...] a coerência não está no texto, não nos é possível apontá-la, desta-
cá-la, sublinhá-la ou coisa que o valha, mas somos nós, leitores, em um
efetivo processo de interação com o autor e o texto, baseados nas pistas
que nos são dadas e nos conhecimentos que possuímos, que construí-
mos a coerência (KOCH & ELIAS, 2008, p. 184).

Elementos Fundamentais para uma boa Produção de Texto


104 UNIDADE III

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Para Fiorin e Savioli (2007), coerência é “um conjunto harmônico, em que todas as
partes se encaixam de maneira complementar de modo que não haja nada destoante,
nada ilógico, nada contraditório, nada desconexo” (FIORIN; SAVIOLI, 2007, p. 261).
A coerência passa despercebida de nossas leituras, ao passo que a incoerência
é facilmente percebida. A coerência permite que nossa leitura flua normalmente
sem interrupções; a incoerência causa bloqueios, paradas na leitura na tentativa
de decifrar o que está escrito.
Nos primeiros textos escritos pelas crianças, a ideia de coerência já está
presente. Quando ela escreve, por exemplo: “O meu boi roxo come barbante”,
a coerência está presente, mesmo que cause estranheza aos olhos do professor;
percebe-se que a frase contém o sujeito boi, o adjetivo do sujeito roxo, a ação
cometida pelo sujeito representada pelo verbo comer e o objeto direto represen-
tado pelo barbante. Não se pode confundir criatividade, imaginação, ficção, com
falta de coerência. Independentemente da cor do boi e o que ele come, a frase
tem sentido, logo, tem coerência. Portanto, só se pode dizer que um texto é inco-
erente se ele não apresenta construção de sentido, se não houver nele elementos
estruturais que apontem um fato, uma mensagem, uma ideia ou informação.
Podemos dizer, também, que é incoerente um texto que apresente ideias
contraditórias; como exemplo, podemos citar a seguinte frase: “O herói salvou

A PRODUÇÃO TEXTUAL
105

a vítima fatal”. Nesse caso falta a compreensão do significado da palavra fatal; se


é fatal, não tem mais como salvar.
Portanto, o grau de conhecimento que se possui da língua pode ocasionar
deformidade na produção da escrita, assim como também o conhecimento de
mundo do leitor, pois a maior parte dos conhecimentos necessários à compre-
ensão textual não vem explícita no texto, mas na capacidade de inferência, do
conhecimento prévio sobre o assunto tratado. Assim, fica claro que é fundamen-
tal, ao produzir um texto, ter domínio sobre o assunto que será abordado (ter lido
diversos textos sobre o assunto, discutido com colegas, pesquisado contrapontos
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

do assunto), para que o texto não caia no senso comum e torne-se incoerente.
Os autores Koch & Elias (2008) e Costa Val (2006) apontam algumas estru-
turas fundamentais que devem ser observadas para a manutenção da coerência
textual, o que pode ser estruturado da seguinte forma:
■■ Repetição: deve haver um equilíbrio entre a repetição ou retomada de
aspectos importantes e progressão, remetendo a algo novo, uma infor-
mação nova. A repetição ou retomada do termo, citado por Koch e Elias
(2008), é um recurso adotado na progressão textual, porém deve ser visto
com cautela, pois repetição não significa repetir o tempo todo o termo
referenciado, mas sim retomar o essencial do que foi referido para pro-
gredir nas discussões.
■■ Progressão: no desenvolvimento do texto, pode-se perceber a progressão
do tema que pode ser feita de forma constante em enunciados sucessivos;
progressão linear é quando o assunto que se expõe no enunciado ante-
rior é o tema do enunciado seguinte; progressão com divisão do tema é
quando este é subdividido em partes e cada uma é trabalhada em enun-
ciados subsequentes. A progressão textual pode, ainda, ser realizada sob
tópicos, por exemplo, quando citamos a violência escolar como tema e
decide-se falar sobre todas as suas vertentes; cada tópico refere-se a uma
vertente ou, se o assunto tratado é a alfabetização, podemos discorrer
sobre a alfabetização de crianças, de adultos, os métodos de alfabetiza-
ção, os instrumentos utilizados para alfabetizar etc.
■■ Não contradição: refere-se tanto ao âmbito interno como ao âmbito
externo do texto. No âmbito interno, o texto não pode trazer afirma-
ções e negações sobre um mesmo ponto de vista. Não confundir a não

Elementos Fundamentais para uma boa Produção de Texto


106 UNIDADE III

contradição com oposições de ideias debatidas em um mesmo texto;


debates baseados em oposições de ideias são sempre interessantes para
qualquer texto. Podemos citar como exemplo de não contradição afirmar
que corrupção é crime e no mesmo texto alegar que a propina paga a um
policial rodoviário para fugir de uma multa é uma forma de resolver um
problema; oposição de ideias seria debater em um mesmo texto os prós e
os contras dentro de um mesmo tema. No âmbito externo, a não contra-
dição refere-se ao contexto situacional, como, por exemplo, escrever um
texto com linguagem científica quando destinado a crianças pequenas,
escrever um texto com linguagem infantil quando destinado ao jovem
adolescente, publicar um texto anedótico em uma revista científica, colo-

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car rótulos em língua estrangeira em produtos vendidos no Brasil. Essas
são ações que indicam contradição, e a não contradição seria a adequa-
ção do tema ao público e ao veículo de comunicação.
■■ Encadeamento: há duas formas citadas desse procedimento por Koch
& Elias (2008): o encadeamento por justaposição, quando os enunciados
são justapostos apenas com conexão semântica, sem a utilização de con-
junções (em alguns desses casos podemos utilizar letras do alfabeto ou
enumerar os tópicos para determinar as sequências em que serão apre-
sentados nos textos); e o encadeamento por conexão ocorre quando são
utilizados os conectivos, como os que já vimos anteriormente (mas, con-
tudo, entretanto, porém, segundo, conforme etc.).
■■ Articulação: refere-se à teia formada pelo texto, o encadeamento das
ideias, à ordem linear dessas ideias, é o processo de construção dos sub-
temas unidos ao tema principal.

Vimos que a coerência está ligada ao sentido global do texto, de uma parte dele,
entre os argumentos e a tese defendida. Assim, podemos afirmar que a coesão
é a articulação linguística (gramatical) entre as palavras, períodos e parágrafos
que mantém uma unidade entre as diversas partes que compõem o texto.
Costumou-se designar por coesão a forma como os elementos linguís-
ticos presentes na superfície textual se interligam, se interconectam,
por meio de recursos também linguísticos, de modo a formar um “te-
cido” (tessitura), uma unidade de nível superior à da frase, que dela se
difere qualitativamente (KOCH, 2007, p. 35).

A PRODUÇÃO TEXTUAL
107

Há algumas palavras que podem ser usadas como elementos coesivos de transição,
as mais comumente utilizadas são: além disso; de modo que; bem como; atualmente,
segundo, conforme, de acordo com. Há pronomes que são usados como elemen-
tos de coesão referencial, entre eles estão: meu, eu, tu, eles, este, aquele, algum,
nenhum. E também são utilizados os elementos de coesão por substituição, que
são as palavras utilizadas para substituir o nome evitando sua repetição no texto,
como, por exemplo, substituir o nome próprio por um nome comum, o nome da
pessoa pelo cargo que ela ocupa, pela posição na família (o pai, a mãe etc.). Para
entendermos melhor, vamos observar o exemplo dado por Pignatari (2010, p. 22):
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As mulheres acumulam hoje inúmeras funções, diferentemente das mulhe-


res de tempos passados, quando bastava às mulheres se ocuparem com os filhos
e com as organizações domésticas.

Exemplo de substituição:

As mulheres acumulam hoje inúmeras fun-


ções, diferentemente das de tempos passados,
quando bastava a elas se ocuparem com os
filhos e com a organização doméstica.
A coesão estrutura-se em um texto
como uma sequência de “ligações” linguís-
ticas (gramaticais) que articulam as ideias
do texto, assim ela atua nos níveis sintáti-
cos e semânticos dependendo sempre do
bom uso lexical e gramatical ao longo de
sua organização, proporcionando, especi-
ficamente no nível semântico, uma relação
íntima com a coerência do texto, pois são
processos interdependentes.
Segundo Antunes (2005, p. 51), a coesão
ocorre diante da relação textual significativa
entre alguns procedimentos e recursos:

Elementos Fundamentais para uma boa Produção de Texto


108 UNIDADE III

■■ Reiteração: retomada de elementos textuais (repetição e substituição)


ao longo do texto, criando um movimento de ida e volta aos elementos,
“como se um fio perpassasse do início ao fim”.
■■ Associação: é a relação entre as palavras pertencentes ao mesmo campo
semântico ao longo do texto, criando uma semântica afim.
■■ Conexão: é a relação específica que acontece entre as orações, períodos,
parágrafos e partes maiores do texto, por meio do uso de preposições,
conjunções e advérbios.

A coerência está para o conteúdo assim como a coesão está para a sintaxe. A

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função da coerência é a formação lógica textual, a função da coesão é a ligação
das partes constituintes do texto. Esclarecendo: sintaxe é a sequência ou ordem
das palavras nas frases e destas nos textos.
A coesão manifestada no nível microtextual refere-se aos modos como
os componentes do universo textual, isto é, as palavras que ouvimos ou
vemos estão ligadas entre si dentro de uma sequência. A coerência, por
sua vez, manifestada em grande parte macro textualmente, refere-se
aos modos como os componentes do universo textual, isto é, os concei-
tos e as relações subjacentes ao texto de superfície se unem numa con-
figuração de maneira reciprocamente acessível e relevante. (FÁVERO;
TRAVAGLIA, 2009, p. 10).

O conhecimento linguístico refere-se ao conhecimento da ortografia, da gra-


mática e do léxico da língua utilizada. A escrita correta, segundo Koch e Elias
(2008), é uma ação colaborativa e respeitosa do autor em relação ao leitor, evi-
tando problemas de comunicação com escritas incorretas.
A produção de texto sempre deve se basear no conhecimento já constituído
e relacioná-lo com a necessidade que o texto que será feito exige, estabelecendo,
assim, relações de intertextualidade que confirmam, suportam ou serão refuta-
das ao longo do texto; por isso, a produção deve iniciar com objetivos claros,
estudo prévio do assunto e do gênero textual.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
109
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CARACTERÍSTICAS DE TEXTOS NARRATIVOS

O ser humano, desde que soube utilizar a linguagem organizada para se comunicar,
desempenhou três funções básicas: narrar, descrever e dissertar. A primeira serve
para narrar fatos, eventos, situações; a segunda descreve seres animados e inani-
mados; e a terceira serve para se posicionar, convencer, persuadir (PIGNATARI,
2010). Se essas três funções básicas da linguagem oral são as mais utilizadas pelo
homem, passam a ser, também, as mais utilizadas na linguagem escrita.
Cada texto tem suas características próprias que exigem do produtor de texto
conhecimento da estrutura, linguagem adequada e contexto sociocomunicativo
de cada um deles. Dessa forma, cada texto contém uma particularidade que o
diferencia dos demais, ao mesmo tempo que segue uma regra global, como a
coerência e a coesão.

Características de Textos Narrativos


110 UNIDADE III

A narrativa sempre esteve no dia a dia de cada um de nós, desde a neces-


sidade de contar um fato banal que acontece conosco para um amigo ou um
parente até nas histórias ficcionais.
A narração sempre esteve presente na história da humanidade, as gravuras
nas pedras feitas pelos homens das cavernas são narrativas, os mitos da cria-
ção passaram de geração a geração por meio da narrativa, a Bíblia é um texto
narrativo. É o gênero mais presente nas atividades das séries iniciais do ensino
fundamental porque ele faz parte da literatura infantil, das fábulas, dos contos,
das aventuras dos heróis. É, também, o primeiro gênero textual produzido pelas

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crianças. Quando elas escrevem, elas querem narrar algo, contar algum fato das
suas vidas, contar uma história que viram acontecer ou viajar nas palavras e nar-
rar uma aventura ficcional.
O que é ficção? Imaginem um mundo sem a Cinderela, aquela imagem encan-
tada de seu rodopio dançando uma valsa com o príncipe encantado, vestindo
aquele vestido azul radiante ou as peripécias de Dom Quixote de La Mancha,
Zorro, do Tarzan ou o mundo mágico da Alice viajando pelo país das maravilhas,
as aventuras de Harry Potter e tantos outros personagens que só existem na ficção.
A ficção trabalha com o limiar da criação, da invenção na contação de histórias.

Você já ouviu falar sobre o gênero épico? Não? Será que ele tem alguma
relação com a narração?
Leia o artigo “Gênero épico ou narrativo”, do site Norma Culta - Língua Por-
tuguesa em bom português, e entenda um pouco mais sobre a evolução do
gênero épico. Para saber mais, acesse o link disponível em: <https://www.
normaculta.com.br/genero-epico-ou-narrativo/>.
Fonte: os autores.

O gênero narrativo parte das ações decorridas na evolução temporal e abarca


várias estruturas e estilos. Conforme esclarece Gancho (2004), podemos dizer que
há o gênero narrativo épico, estruturado sobre uma história; o gênero narrativo

A PRODUÇÃO TEXTUAL
111

lírico, pertencente à poesia lírica; e o gênero narrativo dramático, que envolve o


texto teatral. As narrativas ficcionais são mais difundidas na forma de roman-
ces, novelas, contos e crônicas.
Conforme Pignatari (2010), o texto narrativo também não é imparcial, o autor
argumenta por meio da exposição dos dados narrativos; o ambiente, espaço ou
personagem é descrito de forma subjetiva, expondo a opinião do autor. Pignatari
(2010) cita a situação em que o autor quer referenciar uma criança do sexo mas-
culino, a referência pode ser feita pelos termos menino, moleque, garoto, anjo ou
pestinha, esses dois últimos termos denotariam a intenção do autor em conven-
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cer o leitor de que se trata de um menino bom, com comportamento educado


ou um menino ruim, mal-educado.
É importante ressaltar que o texto narrativo também é utilizado fora do ambiente
literário e ficcional; normalmente encontramos narrativas em nosso cotidiano que
estão inseridas em jornais, charges, outdoors e outros meios de comunicação.
[...] a narrativa está presente em todos os tempos, em todos os lugares,
em todas as sociedades; a narrativa começa com a própria história da
humanidade; não há, nunca houve em lugar nenhum povo algum sem
narrativa; todas as classes, todos os grupos humanos têm as suas narrati-
vas, muitas vezes essas narrativas são apreciadas em comum por homens
de culturas diferentes, até mesmo opostas: a narrativa zomba da boa e
da má literatura: internacional, trans-histórica, transcultural, a narrativa
está sempre presente, como a vida (BARTHES, 2002, p. 103-104).

Um texto narrativo caracteriza-se por uma sequência de fatos interligados que


contam uma história de amor, de sofrimento, policial, de mistério e tantas outras
possibilidades. Nos dias atuais, os jogos eletrônicos também apresentam nar-
rativas complexas ao contar histórias de personagens que estão envolvidas em
uma trama eletrônica.
Para Gancho (2004), a narração consiste em representar coerentemente
uma sequência de acontecimentos reais ou supostamente sucedidos envoltos
nos seguintes elementos:
Personagem: pessoa ou pessoas que atuam na narrativa, pode(m) ser prin-
cipal(is) ou protagonista(s), que pode(m) ser representado(s) pelo herói ou
anti-herói e personagens secundários, típicos ou caricaturais que representam
os demais participantes da história, formando a âncora dos protagonistas. As

Características de Textos Narrativos


112 UNIDADE III

características principais dos personagens devem ser descritas, pois são fato-
res importantes na interpretação do texto.
Espaço: é o espaço físico onde se desenvolve a ação das personagens; sendo uma
narrativa longa, com várias páginas, a descrição do espaço poderia ser feita de
forma detalhada. Sendo uma narrativa curta, deve-se descrever o espaço com
informações suficientes para que o leitor saiba onde os fatos estão ocorrendo.
Ambiente: são as características sociais, econômicas, psicológicas e morais
em que vivem os personagens. Com poucas palavras, pode-se revelar se trata
de alguém com alto ou baixo poder aquisitivo, se o perfil da personagem é

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de alguém calmo, agressivo, se é um imoral ou um personagem moralista.
Tempo: sequência linear dos acontecimentos da narração, época em que se
passa a história ou duração dos fatos. Os fatos devem ser narrados na sequ-
ência em que aconteceram, caso haja referências passadas, o leitor deve ser
avisado de que o que se descreve faz parte da memória do narrador.
Enredo: são as ações que acontecem em torno dos personagens, pode ser cha-
mado de trama ou história. O enredo pode ser apresentado em quatro partes:
1. Apresentação: a exposição do tema central, que seria a introdução da his-
tória para o leitor se situar no tempo e no espaço. Na introdução, devem
ser respondidas as seguintes perguntas: quem? quando? onde? e o que? É
como se a introdução fosse a margem de um rio que se começa a conhecer.
2. Complicação: ou conflito, que seria um problema a ser resolvido, um
fato que incomoda ou um sonho a ser realizado. A pergunta que deve
ser respondida é o por quê, o como a descrição do problema enfrentado
ou dos mistérios a serem revelados. A complicação seria a corredeira do
rio, a aventura, a ação.
3. Clímax: que seria o ponto culminante da história, momento de maior
tensão, pode ser o momento em que o mistério é revelado, descoberto;
a solução é encontrada. Na corredeira do rio, o clímax seria a descida
da cachoeira.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
113

4. Desfecho: seria o final feliz ou não, o momento em que as coisas se aco-


modam, tudo volta ao normal, a aventura acabou, mas deixou uma marca,
uma moral ou um aprendizado. São as águas do rio que se encontram cal-
mas novamente, terminando um trajeto cheio de suspense e aventuras.

Esses são os elementos fundamentais que compõem uma narração, pois per-
meiam a estrutura e a organização de histórias contadas nos mais diversos temas.
Para Gancho (2004), há três elementos que normalmente são confundidos:
tema, assunto e mensagem. Para a autora, cada um desses elementos tem uma
constituição própria.
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■■ Temas: a história se desenvolve em torno dessa ideia, algo amplo e abstrato.


■■ Assunto: é a realização concreta do tema, ou seja, é como ele aparece
desenvolvido no enredo da história, são os fatos da história.
■■ Mensagem: é uma frase/período que permite você resumir/depreender
o sentido da história.

Esses elementos estão intimamente articulados na história narrada, embora pos-


sam ser separados para uma análise pormenorizada sobre determinado livro,
conto, romance etc.

Você já leu, ouviu ou contou uma fábula? Será que os animais podem nos
ensinar alguma coisa?
Esse tipo de narrativa remonta à Antiguidade grega com Esopo e perdura
até os dias atuais; sempre com suas características marcantes, é uma forma
de contar histórias.
Saiba um pouco mais sobre como os animais podem nos dar lições de moral
por meio da reportagem “Fábula: Animais dão lição de moral”, do portal UOL
Educação. Para saber mais, acesse o link disponível em: <https://educacao.
uol.com.br/disciplinas/portugues/fabula-animais-dao-licao-de-moral.htm>.
Fonte: os autores.

Características de Textos Narrativos


114 UNIDADE III

CARACTERÍSTICAS DE TEXTOS DESCRITIVOS

A descrição textual parte do princípio básico de que será um retrato fiel ou dis-
torcido, isto depende da intenção do texto, de uma imagem, uma realidade, uma
situação. Esse tipo de texto é encontrado comumente em textos narrativos, dis-
sertativos, jornalísticos e policiais. Naturalmente, uma boa descrição mexe com
a imaginação do ser humano, pois possibilita, por meio de uma série de deta-
lhes, a criação de uma imagem mental de determinada situação real ou ficcional.
Descrever não é fazer um texto “sem vida”, que nos conta somente os ele-

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mentos primordiais de uma cena, pois ao descrever podemos ir muito além da
descrição básica, dado que descrever é ter, também, a sensibilidade de perceber
as características próprias dos seres animados e inanimados por meio das indica-
ções dos aspectos mais característicos que os distinguem. Para descrever, o autor
pode utilizar os cinco sentidos: a audição, a visão, o tato, o olfato e o paladar.
Portanto, descrever não é só enumerar características, mas ressaltar os traços
mais salientes que podem determinar a impressão do leitor sobre o objeto des-
crito. Por exemplo, ao lermos a palavra cadeira, vem à nossa mente um objeto
que todos conhecemos; mas são todas iguais? A cadeira que eu imaginei é a
mesma cadeira que você imaginou? Com certeza não. E se descrevermos cadeira
em modelo padrão em madeira rústica de pinho? Assim conseguimos aproxi-
mar um pouco mais as nossas visões, ainda que não totalmente.
Notamos facilmente que uma boa descri-
ção parte dos elementos físicos e peculiares,
mas ela também aproveita os elementos psi-
cológicos e a atmosfera do ambiente para criar
esse retrato verbal. Ela pode fornecer cor, tex-
tura, função, local, clima, sensação, vegetação,
peso, altura e tantas outras características.
Por outro lado, se descrevermos uma
cadeira velha de madeira com assento e encosto
de palha, imaginamos um local rústico, mas
se descrevermos uma cadeira de madeira de
lei com assento e encosto em veludo, nossa

A PRODUÇÃO TEXTUAL
115

imaginação nos remete a um ambiente requintado, de luxo. Percebe-se que na


leitura de descrições não ficamos apenas com a imagem do objeto em si, mas com-
pletamos com imagens do contexto que estão na nossa mente, que seriam nossas
inferências. Quanto mais claras forem as descrições do autor, maior será a apro-
ximação da imagem que nos vem à mente com a imagem que o autor quer que
tenhamos, tanto do objeto como do contexto onde o objeto está inserido.
Segundo Álvarez (1998), o ato de descrever é a forma de expressão utili-
zada para expor qualidades, defeitos, sensações e sentimentos no universo real e
ficcional que podem ser confrontados com qualquer realidade e contexto sócio-
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-histórico. A descrição passa por três fases: a observação, a reflexão e a expressão.


Assim como existe a escrita literária e a não literária, o texto descritivo pode
seguir a mesma regra. Ele permite a ficção, descrição de objetos voadores, duen-
des, fadas e demais componentes desta, pode ser carregado de emoção, exagero
e destaque para as características que se quer ressaltar. Na descrição literária, a
descrição de um objeto pode estar vinculada à imagem pretendida pelo autor
do contexto em geral, como na descrição da cadeira, uma que nos remete a um
contexto pobre e outra que nos remete a um contexto requintado. Ao descre-
ver uma pessoa, o autor pode incluir adjetivos que levem o leitor a idealizar a
personagem como bela e meiga ou rude e agressiva, que seriam as descrições
psicológicas da narrativa literária.
No texto descritivo não literário, a ficção não é permitida, a linguagem é téc-
nica, científica, objetiva, cuidando com o uso de palavras ambíguas, que deem
dupla margem de sentido à descrição, podendo interferir no resultado final. O
texto descritivo não literário é utilizado para descrever aparelhos, manuais de
instruções, processos, relatórios e bula de medicamentos. A linguagem utili-
zada nesses tipos de textos é objetiva e nunca subjetiva, ou seja, o autor do texto
descritivo não literário deve ser imparcial, sua opinião e seus sentimentos não
devem fazer parte do texto. Se a descrição é sobre um fato presenciado, o relato
deve ficar em torno apenas do que se viu e não do que se imaginou; por exem-
plo, ao descrever um acidente de trabalho, a descrição deve ser sobre os fatos
observados e não sobre o que se supõe ter acontecido. Essa linguagem é a mesma
linguagem utilizada em relatórios de Trabalhos de Conclusão de Curso.

Características de Textos Descritivos


116 UNIDADE III

A PRODUÇÃO TEXTUAL NA INTERNET

Ao pensarmos no século XXI, a grande marca que representa esse momento é a


tecnologia e todas as suas implicações, mudanças de hábitos, novos instrumen-
tos comunicativos, novos programas uma nova dimensão temporal e espacial.
Diante disso, automaticamente surge a pergunta: isso pode ser usado em sala de
aula? Isso atrapalha ou ajuda?
Naturalmente, como todo instrumento que pode ser usado no contexto edu-
cacional, ele depende de como será inserido nas práticas pedagógicas de cada

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escola, como os professores usarão esses novos recursos, como isso estimulará o
aluno, mas o dilema é sempre muito grande. Será que isso ocorre somente agora?
Segundo Pinho (2003, p. 181), “a história é antiga e se repete por ocasião
do nascimento de cada nova mídia. O rádio, o cinema e a televisão, cada um no
seu tempo, surgiram com conteúdos que reproduziam as mídias que os prece-
deram”. Isso nos dá uma ideia de que o desafio é grande, mas não é limitador e
as mudanças não estão ocorrendo somente agora.

Será que a tecnologia acabará com o mundo no qual fomos formados? Os


livros, as revistas e os gibis sumirão? Os livros didáticos e os professores tam-
bém deixarão de existir?
São inúmeras mudanças, por isso inteirar-se dessa discussão é fundamental.
Leia a reportagem “Roger Chartier: ‘Os livros resistirão às tecnologias digi-
tais’”, da revista Nova Escola. Para saber mais, acesse o link disponível em:
<https://novaescola.org.br/conteudo/938/roger-chartier-os-livros-resistira-
o-as-tecnologias-digitais>.
Fonte: os autores.

Por isso, pensar no uso da internet na escola não é impossível ou ineficiente,


evidentemente tem seus desafios, porém, pode proporcionar a afirmação de prá-
ticas reais que os alunos já fazem e serem estimuladas na escola, conseguindo
unir a teoria à prática.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
117
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Consoante Xavier (2002), os seus usuários têm reconfigurado os processos grá-


ficos da escrita, utilizando-se de elementos antes estranhos à produção textual.
O autor afirma que o uso de formas gráficas diferentes na interação que ocorre
na internet não prejudica o aprendizado escolar, mas pode ser usado como con-
traponto, como ponto de comparação da lógica existente em cada novo código
utilizado. Além de não prejudicar, a interação virtual exige muita leitura, ela é a
habilidade mais exigida, os sites, os blogs e as páginas de interação estão reple-
tos de textos e utilizam a norma padrão de escrita. O que deve ser discutido é a
qualidade dos textos lidos, devemos aguçar o nosso faro crítico sobre a leitura.

A Produção Textual na Internet


118 UNIDADE III

A internet e suas ferramentas possibilitam o hipertexto e os hiperleitores.


Segundo Koch (2007, p. 25),
o termo hipertexto designa uma escritura não-sequencial e não-linear,
que se ramifica de modo a permitir ao leitor virtual o acesso pratica-
mente ilimitado a outros textos, na medida em que procede a escolhas
locais e sucessivas em tempo real.

As novas mídias propõem uma nova forma de se expressar e ler, pois o hiper-
texto produz uma falta de linearidade na forma de encontrar as informações
textuais; isso pode parecer um universo caótico, mas não é, pois há uma orga-

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nização espacial, cromática e sensorial que explora os recursos de outra forma,
possibilitando interações mais intensas e constantes. Furlanetto (2014) apresenta
uma comparação de uma notícia tradicional com uma feita nas novas mídias:
[...] o texto foge da linearidade convencional imposta pelo impresso e
seduz o leitor com a possibilidade de escolha na forma de ler o conteúdo,
ou seja, o texto digital deve informar no início os dados principais da no-
tícia de forma a conquistar o internauta, ou como vou denominá-lo para
facilitar e adequar à nova mídia: o interleitor, o que busca a informação
digital. Essa informação inicial transmite os dados básicos de uma notí-
cia: Quem, Como, Onde e assim sucessivamente fornecendo condições
de uma visão ampla do fato. Nos veículos impressos o lead inicia o texto e
na sequência o mesmo é trabalhado com informações adicionais lineares
em colunas e parágrafos. No meio digital o lead tem funcionado como
uma espécie de “vitrine” da matéria, ou seja, o interleitor lê o conteúdo
inicial e se gostar pode se aprofundar no assunto através de um hiperlink
disponível no texto (FURLANETTO, 2014, p. 2).

Xavier (2002) cita um exemplo de interação que pode ser benéfico à leitura e
produção de escrita na internet: é a criação de um site que se refere a um gênero
ficcional nascido na rede virtual, em que os participantes podem realizar modi-
ficações nas histórias e nos destinos dos personagens. Isto é, alguém posta uma
história que passa pelo crivo do site, esta é publicada e os demais participantes
podem interagir e dar novos rumos para o texto do autor. Acreditamos que essa
ideia pode ser utilizada de forma didática até mesmo pelas instituições escola-
res, pois é uma forma de incentivar a escrita.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
119

Depois de tanta discussão sobre o uso de tecnologia na escola, você ainda


está com dúvidas sobre como isso pode funcionar e quer um exemplo prá-
tico?
Leia a reportagem: “Revisão de textos no computador”, da revista Nova Es-
cola e descubra uma prática que pode ser aplicada da produção e revisão
de textos dentro da escola. Para saber mais, acesse o link disponível em:
<https://novaescola.org.br/conteudo/2618/revisao-de-textos-no-compu-
tador>.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Fonte: os autores.

Seria ledo engano pensarmos que a internet é um espaço totalmente livre; ele é
regido, primeiro, por regras sociais embasadas nos direitos e limites de liberdade de
expressão e, depois, não são todas as páginas que permitem grafias codificadas, se o
que você escreve não for entendido por quem lê, não haverá mensagem. Portanto,
mesmo diante da aparente liberdade de escrita, a produção textual posta na internet
ainda segue as normas básicas da linguagem. Por outro lado, a internet não é com-
posta apenas por sites de relacionamentos em que se pode escrever livremente, há
muitos locais de pesquisa, e se na busca a palavra for digitada errada, não se con-
segue encontrar o que se procura. Da mesma
forma, há páginas de publicações acadêmicas
e científicas que não admitem outra norma se
não a norma culta; há, também, a utilização
de palavras-chave nas buscas que direcionam
para as ideias centrais do texto, sobre os quais
deve-se ter conhecimento.
Percebe-se que para poder se aventurar
no mundo virtual, um vasto conhecimento
de leitura e escrita são necessários para uma
interação produtiva e significativa. Esse movi-
mento amplo, que é o âmago das interações
virtuais, não deve ser ignorado, deve ser refle-
tido, analisado e ponderado.

A Produção Textual na Internet


120 UNIDADE III

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Finalizamos esta unidade com a certeza de que a produção textual, oral e escrita
é fundamental para a formação crítica de todos os alunos em todos os níveis
educacionais.
Notamos a importância de tornar-se um bom leitor para construir um reper-
tório de leituras que forneça subsídios para a prática escrita, pois quanto maior
a consciência leitora e a compreensão global do mundo ao seu redor, maior o
conhecimento que serve de base para a produção de texto.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Estudamos que um bom texto apresenta ideias claras, articula-se coeren-
temente, desenvolve as ideias progressivamente e conduz o leitor por meio de
elementos coesivos e persuasivos para um sentido preciso e averiguado.
Por isso, para uma boa produção textual, é necessário que se delimite o tema,
que no desenvolvimento do tema as referenciações sejam retomadas, que se dê
continuidade às ideias propostas na introdução, que se organize temas que reque-
rem maiores explicações em tópicos textuais.
Um bom texto não pode ter lacunas, partes incoerentes, erros gramaticais,
uma desorganização das ideias e argumentos, pois a prática da escrita deve esta-
belecer uma comunicação eficiente e convincente com seu leitor e/ou interlocutor.
Independentemente do gênero textual, os elementos básicos da produção
textual são os mesmos eixos norteadores, pois o princípio da coerência, coesão,
adequação temática, do uso da linguagem adequada ao contexto e da clareza são
fundamentais em qualquer texto.
A sociedade atual exige de nós um nível comunicativo de qualidade; como
somos produtores ativos de diversos textos, devemos nos posicionar utilizando
os instrumentos primordiais desta sociedade, que são a leitura e a escrita.
Terminamos assim a unidade, entendendo a importância de ser um bom
leitor e escritor, e a sua função primordial na sociedade moderna que exige uma
comunicação pessoal e profissional apropriada e eficiente.

A PRODUÇÃO TEXTUAL
121

1. A leitura é uma atividade fundamental para a formação integral do aluno, pois é


uma prática que exige diversas habilidades. Sobre a importância da leitura, é
correto afirmar:
a) A leitura é uma prática exclusivamente individual e só beneficia o leitor.
b) A leitura fomenta um aluno crítico, favorece na produção textual e aperfeiçoa
habilidades linguísticas.
c) A leitura é uma prática que deve ser trabalhada somente no ambiente escolar.
d) A leitura é fundamental para a formação crítica do aluno, por isso deve ser
conduzida obrigatoriamente pelos pais.
e) O ato de leitura é importante, embora não se relacione a outras práticas da
linguagem.

2. A produção textual não deve ser um ato isolado na prática escolar, pois no co-
tidiano essa habilidade está ligada diretamente a outras práticas, como leitura,
interpretação e compreensão linguística. Sobre isso, é correto afirmar:
I- A produção de texto deve trabalhar próxima à realidade linguística de uso dos
alunos.
II- A produção de texto é a mais importante das habilidades que o aluno deve
adquirir no período escolar.
III- A produção de texto deve ser trabalhada intimamente junto à leitura e à aná-
lise linguística.
IV- As produções de texto escrita e oral são práticas fundamentais para a forma-
ção crítica do aluno.
a) Apenas a afirmativa I.
b) Apenas a afirmativa II.
c) Apenas as afirmativas I e II.
d) As afirmativas II, III e IV.
e) As afirmativas I, III e IV.
122

3. Um dos elementos fundamentais para que o texto tenha qualidade é a coerên-


cia, pois é a partir dela que há uma unidade geral no sentido do texto. Assinale
a única alternativa que não tem erro de coerência.
a) No verão fomos a Fortaleza (CE) e não pudemos aproveitar a praia devido à
quantidade de neve que caía lá.
b) Com a crescente derrubada de árvores, conseguimos ver o vigor e o cresci-
mento da mata nativa no Brasil.
c) O governo investe muitos recursos na educação pública, por isso temos os
melhores resultados escolares da América Latina.
d) O barulho era tanto que mal conseguimos ouvir o mico-leão-dourado cantar
na floresta.
e) A necessidade de melhor aplicar o dinheiro público faz com que a população
fique atenta à ação dos políticos.

4. Estudamos as características do texto descritivo, a partir disso, explique qual é a


função primordial de uma descrição.
5. A internet e as novas tecnologias são uma realidade constante em nosso dia a
dia, por isso a escola não pode se eximir de apresentar e trabalhar com essas
novas ferramentas. Qual é a importância da produção textual na internet?
123

Leia um trecho do artigo “Histórias infantis e aquisição de escrita”, de Vera Lucia Blanc
Simões, que discute a necessidade de ter um ambiente educacional nos anos iniciais
que estimule a leitura e a escrita.
“Vygotsky, entre outros estudiosos do assunto, buscando compreender a origem e o
desenvolvimento dos processos psicológicos do indivíduo (abordagem genética), pos-
tula um enfoque sociointeracionista para a questão, no qual um organismo não se de-
senvolve plenamente sem o suporte de outros de sua espécie, o que afirma que todo
conhecimento se constrói socialmente. Durante todo o percurso do desenvolvimento
das funções psicológicas, culturalmente organizadas, é justamente esse aspecto cultu-
ral, social, de interação com o outro, que desperta processos internos desse desenvol-
vimento. É o contato ativo do indivíduo com o meio, intermediado sempre pelos que o
cercam, que faz com que o conhecimento se construa. Especialmente em se tratando
da linguagem, o indivíduo tem papel constitutivo e construtivo nesse processo (ele não
é passivo: percebe, assimila, formula hipóteses, experimenta-as, e em seguida reelabo-
ra-as, interagindo com o meio). O que lhe proporciona, portanto, modos de perceber e
organizar o real é justamente o grupo social (a interação que ele faz com esse grupo).
É este que determina um sistema simbólico-lingüístico permeador desses modos de
representação da realidade. Ainda segundo o autor, o pensamento e a linguagem estão
intimamente relacionados na medida em que o pensamento surge pelas palavras. A
significação é a força motriz para essa relação: não é o conteúdo de uma palavra que
se modifica, mas a maneira pela qual a realidade é generalizada e refletida nela. E são
exatamente essas construções de significados que a criança vai desenvolvendo interna-
mente (como uma linguagem interna, seu modelo de produção do pensamento) que
partem da fala socializada, da fala dos outros que a cercam.
Foi sobretudo Bakhtin (1992) que, indo mais além, explicitou teoricamente essa posição
dialógica sobre a natureza da linguagem. Segundo ele, é o diálogo a unidade real da lín-
gua. Ao observar as situações de diálogo produzido interativamente, pode-se perceber
que a fala é “polifônica”, que existem numerosas vozes atuando: a voz interna, a voz do
outro, a própria voz...; vozes caracterizadas pelas convergências e divergências presen-
tes no discurso dialógico, que propiciam diversas mudanças de posição que o sujeito
pode fazer, apreendendo, assim, várias facetas da realidade em que vive e represen-
tando-a internamente de forma mais completa. Essa construção, portanto, baseia-se no
que ele chamou de uma interação socioverbal. A linguagem é a expressão e o produto
da interação social de quem fala com quem fala, acrescida do tópico do discurso.
[...] Foram os estudos sobre o que seria a psicogênese da linguagem escrita de Ferreiro
e Teberosky (1985) que lançaram uma nova luz sobre as tentativas de descrever as eta-
pas pelas quais a criança passa durante o processo da aquisição. Segundo as autoras, a
criança, durante o período de contato com os sinais gráficos, vai evoluindo gradativa-
mente. Essa evolução foi caracterizada em quatro grandes níveis: pré-silábico, silábico,
silábico-alfabético e alfabético.
124

No nível pré-silábico, observaram a presença de produções gráficas em que não existe


correspondência entre a grafia e o som. A criança nessa fase não demonstra preocu-
pação em diferenciar critérios para suas produções, que se constróem a partir de tra-
ços idênticos, garatujas ou grafismos primitivos. Não se percebe tampouco controle
da quantidade de letras utilizadas para representar o que se quer escrever. Portanto, a
criança não se utiliza de uma palavra escrita para simbolizar graficamente um objeto.
[...] Já o nível silábico se delimita quando a criança percebe que é possível representar
graficamente a linguagem oral. Ela faz então várias tentativas para estabelecer uma re-
lação entre a produção oral e a produção gráfica, entre o som e a grafia. E começa, com
essas tentativas, a relacionar o que escreve com as sílabas das palavras faladas que de-
seja representar. Entretanto, com seu conhecimento prévio sobre o material escrito, uti-
liza-se de letras que podem não representar os respectivos sons. Ela percebe nessa fase
que pode escrever tudo o que deseja, mesmo que aquilo que expressa graficamente
não possa ser decifrado por outras pessoas. Também nessa fase, pode aceitar relutante o
fato de escrever palavras menores com poucas letras ou ainda pode se usar, ao escrever
uma frase, uma letra somente para uma palavra inteira.
A criança passa, então, a conviver com esses dois tipos de correspondência entre a grafia
e o som, adentrando assim no nível silábico-alfabético. E começa também a experienciar
um conflito, já que é capaz agora de perceber que existe uma representação gráfica
correspondente a cada som (percebe a relação entre grafema e fonema). Ela vai refor-
mulando sua hipótese anterior, silábica, que lhe parece insuficiente, e vai alternando sua
produção entre essa e a alfabética propriamente dita.
[...] Para Mayrink-Sabinson (1995), o trabalho desenvolvido por Ferreiro e colaboradores
é centrado em um sujeito considerado idealizado e universal, e descreve as transforma-
ções efetuadas por ele. O sujeito age sobre as informações que recebe do ambiente e
produz a própria linguagem por meio de esquemas assimilados previamente construí-
dos, deixando de lado uma explicitação teórica sobre o contexto, com o qual os indiví-
duos agem continuamente e tem papel mediador e, portanto, constitutivo, em todo o
processo da aquisição da linguagem escrita. A autora desenvolveu um estudo calcado
em pesquisas sobre as relações entre mãe e criança pré-escolar durante o processo de
aquisição, no qual enfoca o papel do interlocutor adulto letrado em suas interpretações
das produções gráficas do sujeito.
Fonte: Simoes (2000, on-line).
MATERIAL COMPLEMENTAR

A escrita escolar: livro didático e ensino no Brasil (1970-1990)


Décio Gatti Junior
Editora: EDUSC
Sinopse: neste livro estão apresentados os resultados de uma investigação na área
da História das Disciplinas Escolares, na qual foi desenvolvido o olhar sócio-histórico,
concentrado no exame dos livros didáticos escritos e publicados no Brasil entre as
décadas de 1970 e 1990. A análise detém-se sobre duas fontes principais: obras didáticas
e depoimentos de autores e editores de livros didáticos de História.

Dificuldades de aprendizagem de A -Z
Corinne Smith e Lisa Strick
Editora: Penso
Sinopse: esse livro apresenta as descobertas mais importantes
acerca das funções cerebrais e do processamento da informação,
cobrindo todos os estágios do desenvolvimento. Explora os “mitos”
e as “lendas” que permeiam este tema. Recurso completo que
auxilia tanto na escola quanto em casa.

Dificuldades de Aprendizagem em Leitura e Escrita


Geraldo Peçanha de Almeida
Editora: WAK
Sinopse: esse livro é estruturado e formatado para atender
especificamente os alunos com características médias ou
acentuadas de aprendizagem na leitura e na escrita. Trata-se de
uma possibilidade fônica, ou seja, não é um método global de
alfabetização, porque ele não parte do texto e das ideias que são
apresentadas ali para posterior desmembramento e trabalho por
parte de alunos e professores. É um método pensado para atender
crianças e adultos que fogem ao padrão regular de aprendizagem.
Isso quer dizer que todas as atividades aqui propostas irão partir
de um princípio que deverá ser desencadeado e desenvolvido
gradativamente pelos professores.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

Programa de Intervenção com as Dificuldades


Ortográficas
Simone Aparecida Capellini, Maria Nobre Sampaio, Amparo
Ygual Fernández e José Francisco Cervera Mérida
Editora: Pulso
Sinopse: as estratégias apresentadas neste livro buscam
proporcionar a reflexão dos escolares acerca do nosso
sistema de escrita, de forma que o aprendizado, durante
o processo de intervenção, torne-se mais prazeroso e
sistemático, deixando de ser visto apenas como uma “prática
de decorar palavras”.

O Carteiro e o Poeta (1995)


Sinopse: um carteiro faz amizade com o poeta Pablo Neruda,
que vive exilado na costa italiana, e pede que ele o ajude a
conquistar sua amada, mas descobre que a poesia sempre
esteve dentro de si. Belíssimo filme de Michael Radford.

Escritores da liberdade (2007)


Sinopse: o filme foi baseado em fatos reais e relata a história
da professora Erin Gruwell, que percebe, no início de suas
atividades docentes, que a educação na escola na qual
lecionava não era como ela havia imaginado. Para superar os
problemas de sua turma, utilizou a estratégia da produção
escrita como forma de transformar a educação. Utilizou de
relatos de guerra para ensinar os valores da tolerância e da
disciplina.
127
REFERÊNCIAS

AGUIAR, V. T. O leitor competente à luz da teoria da literatura. Revista Tempo Brasi-


leiro, Rio de Janeiro, v. 124, n. 5/6, p. 23-34, jan./mar. 1996.
ÁLVAREZ, M. Tipos de escrito I: narración y descripción. Madrid: Arco, 1998.
ANTUNES, I. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial,
2005.
BARTHES, R. A aventura semiológica. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa/ Secretaria de
Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.
CITELLI, B. H. M.; BONATELLI, I. R. M. A escrita na sala de aula: vivências e possibilidades.
In: CHIAPPINI, L. (Coord.). Aprender e ensinar com textos. São Paulo: Cortez, 2001.
COSTA VAL, M. G. Texto e textualidade. In: ______. Redação e Textualidade. 3. ed.
São Paulo: Martins Fontes, 2006.
FÁVERO, L. L.; TRAVAGLIA, L. C. Coesão e coerência textuais. São Paulo: Ática, 2009.
FIORIN, J. L.; SAVIOLLI, S. P. Lições de texto: leitura e redação. São Paulo: Ática, 2007.
FREIRE, P. A importância do ato de ler. Col. Polêmicas do Nosso tempo. São Paulo:
Editora Cortez, 1985.
FURLANETTO, C. A Legibilidade textual na produção de conteúdo jornalístico na In-
ternet. In: INTERPROGRAMAS DE MESTRADO FACULDADE CÁSPER LÍBERO, 10,
São Paulo, 2014.
GANCHO, C. V. C. Como analisar narrativas. 8. ed. São Paulo: Ática, 2004.
KOCH, I. G. V. Hypertext and the construction of sense. Alfa, São Paulo, v. 51, n.
1, p. 23-38, 2007. Disponível em: <http://seer.fclar.unesp.br/alfa/article/viewFi-
le/1425/1126>. Acesso em: 01 ago. 2017.
KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos do texto. São Paulo: Con-
texto, 2008.
KOCH, I. V.; TRAVAGLIA, L. C. Texto e coerência. 11. ed. São Paulo: Cortez, 2007.
PIGNATARI, D. Informação, linguagem, comunicação. São Paulo: Ateliê, 2010.
PINHO, J. B. Jornalismo na Internet: planejamento e produção da informação on-
-line. São Paulo: Summus, 2003.
SERCUNDES, M. M. I. Ensinando a escrever: as práticas em sala de aula. In: GERALDI,
J. W.; CITELLI, B. (Coord.). Aprender e ensinar com textos de alunos. São Paulo:
Cortez, 2011.
SIMÕES. V. L. B. Histórias Infantis e Aquisição de Escrita. São Paulo Perspectiva, São
Paulo, v. 14, n. 1. jan./mar. 2000.
XAVIER, A. C. Letramento digital e ensino. 2002. Núcleo de Estudos de Hipertexto
e tecnologia Educacional - NEHTE. Disponível em: <http://www.ufpe.br/nehte/.../
Letramento%20digital%20e%20ensino.pdf>. Acesso em: 02 jun. 2017.
GABARITO

1) B.
2) D.
3) E.
4) A função básica de um texto descritivo é conseguir, por meio de palavras, pro-
porcionar uma imagem mental sobre o objeto ou cena abordada, apresentando
características básicas, e também valorizar a ambientação e apresentar a sines-
tesia do lugar.
5) A produção textual também pode acontecer na internet e isso não prejudica
o aprendizado escolar, pois esse novo ambiente proporciona novas interações,
exige uma grande habilidade de leitura, entendimento de adequação linguística
ao contexto no qual o texto será inserido e um olhar crítico sobre o conteúdo a
ser escrito.
Professora Dra. Ivone Pingoello
Professor Me. João Carlos Dias Furtado

ASPECTOS ACADÊMICOS DA

IV
UNIDADE
PRODUÇÃO TEXTUAL

Objetivos de Aprendizagem
■■ Identificar especificidades da produção textual científica acadêmica.
■■ Aperfeiçoar a produção textual acadêmica.
■■ Desenvolver habilidades sociais da comunicação escrita.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ As especificidades e a estrutura do texto dissertativo
■■ A linguagem dissertativa
■■ Tópicos de revisão textual
131

INTRODUÇÃO

A vida escolar, da educação infantil à graduação e pós-graduação, é permeada


por etapas de evolução dos processos de escrita. No decorrer da vida acadêmica,
a cada nova etapa de aprendizagem da escrita, novos conhecimentos são exigi-
dos e novas habilidades são necessárias para produzir cada vez mais e com maior
grau de eficiência.
Sabemos que nossa capacidade de escrita se inicia na alfabetização e vai
se aprimorando com o passar do tempo, num processo contínuo de evolução.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Para que esse pensamento se confirme, solicitamos a você que resgate algumas
de suas produções textuais do tempo do Ensino Fundamental e Médio e com-
pare com a sua escrita dos tempos atuais. Houve evoluções? Em quais aspectos
sua produção textual evoluiu? Os textos que você produziu nas séries do Ensino
Fundamental apresentam modificações em termos estruturais em relação aos
textos que produziu no Ensino Médio? Os textos que tem produzido na gradu-
ação são estruturados da mesma forma dos do Ensino Médio?
Com essa avaliação, pretende-se que você perceba em quais aspectos evo-
luiu, incluindo vocabulário, quantidade de informações no texto, estruturação
coerente, entre outros aspectos. Isso porque a proposta desta aula consiste em
oferecer novas oportunidades de evolução e/ou aperfeiçoamento de sua produção
textual. Aprender a escrever é um processo contínuo que se inicia na alfabeti-
zação e vai se aprimorando com o passar do tempo, conforme os processos de
ensino e de aprendizagem, contando com a dedicação e esforço do indivíduo.
Aprendizes seremos sempre; quanto mais se escreve, mais exigente se fica, e maior
será a percepção da estruturação textual e do repertório vocabular.
Nos cursos de graduação, a etapa que se inicia é o desenvolvimento mais
profundo do processo de leitura, cujo resultado deverá ser a produção de textos aca-
dêmicos de base científica. Nesse nível de produção textual há normas que devem
ser seguidas, principalmente no que se refere à linguagem utilizada, ao desenvolvi-
mento coerente e coeso dos textos. Com o objetivo de aperfeiçoar seu conhecimento
sobre produção textual, expomos nesta unidade as estruturas essenciais para a pro-
dução de textos dissertativos, a fim de contribuir com o desenvolvimento de sua
escrita acadêmica científica. Bons estudos e boas produções textuais!

Introdução
132 UNIDADE IV

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
AS ESPECIFICIDADES E A ESTRUTURA DO TEXTO
DISSERTATIVO

Dissertar implica organizar pensamentos, defender pontos de vista, descobrir


soluções e argumentar em favor de uma ideia tendo como base a fundamenta-
ção lógica e coerente. Por esse motivo, o texto dissertativo é muito apreciado
nas universidades e empresas para avaliar a capacidade cognitiva e intelectual
do indivíduo. Por meio do texto dissertativo, pode-se avaliar se o/a autor/a pos-
sui os conhecimentos linguístico, enciclopédico, de texto e interacional citados
por Koch e Elias (2010).
A finalidade da dissertação acadêmica, conforme esclarece Pignatari (2010),
é promover reflexões, discussões e busca de soluções para problemas sociais, e os
argumentos baseados em comprovações científicas são os meios utilizados para
esse fim. Tais argumentos partem da intertextualidade acadêmica, ou seja, há
uma discussão promovida entre o/a autor/a do texto e os demais autores/as dos
textos, que servem como suporte para a comprovação dos argumentos utilizados.

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


133

A intertextualidade nos textos acadêmicos refere-se à citação direta e in-


direta de outros textos que seguem as normas da Associação Brasileira de
Normas Técnicas – ABNT. Informe-se sobre essas normas, pois elas garan-
tem a legalidade do texto e evitam o plágio. Para saber mais, acesse o link
disponível em: <http://www.abntcatalogo.com.br/pub.aspx?ID=34>.
Fonte: os autores.

Os textos dissertativos acadêmicos possuem particularidades inerentes ao meio


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

acadêmico, como imparcialidade, visão objetiva, exposição de dados, amparo


em autores referentes da área, em análises científicas e exemplos concretos de
pesquisas já realizadas.
O passo inicial para a elaboração de um texto dissertativo é a escolha do
tema que delimita, define e direciona os argumentos que deverão ser utilizados
na elaboração do texto.

DELIMITAÇÃO DO TEMA OU ASSUNTO NO TEXTO


DISSERTATIVO

Nenhum tema é totalmente inédito e em todo tema há sempre um ângulo novo


a ser analisado e discutido, esse é o princípio da originalidade. Para cada tema
há inúmeras possibilidades de abordagem, e em cada abordagem cabem, ainda,
diferentes análises em áreas distintas de estudos; um único tema pode ser anali-
sado sob a ótica das ciências sociais, históricas e psicológicas, dentre outras áreas.
Antes de iniciar a escrita de um texto dissertativo acadêmico, é conveniente
projetar o que se vai escrever, ou seja, escolher um tema e organizar as ideias por
meio de um projeto de escrita ou ordená-las mentalmente caso se tenha pouco
tempo para desenvolver o texto final. Ao projetar, você deve considerar os seguin-
tes fatores que foram relacionados por Pignatari (2010): a dissertação deve ser
sobre um tema que mereça ser analisado; deve ser questionada a utilidade do
tema para a sociedade ou para uma determinada comunidade ou classe social e
refletir sobre o que se pensa ou o que se sabe sobre o assunto.

As Especificidades e a Estrutura do Texto Dissertativo


134 UNIDADE IV

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Uma forma de organizar melhor o pensamento é utilizar palavras-chave sobre
as quais estão norteadas às ideias centrais do texto. Observe o exemplo dado por
Pignatari (2010, p. 47):

Tema: A inclusão digital


Questão: Qual é a relação que se pode visualizar, no mercado de traba-
lho atual, entre a inclusão digital e a empregabilidade?
Palavras-chave: inclusão digital; empregabilidade.
Tese: A inclusão digital é hoje em dia uma condição essencial para a
empregabilidade.

Pignatari (2010) explica que tese é a ideia em torno da qual a dissertação será
trabalhada e que deve ser projetada antes da escrita para direcionar os argumen-
tos, portanto, conforme o exemplo exposto, a tese sobre a qual os argumentos
serão orientados é de que a inclusão digital é essencial para a empregabilidade.
Observa-se no modelo citado que o tema gira em torno da inclusão digital e
empregabilidade, portanto a organização do pensamento começa na análise do que

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


135

se sabe sobre inclusão digital e a sua relação com a empregabilidade. A partir disso,
inicia-se a produção dos argumentos que fazem parte de toda a estruturação dis-
sertativa constituída pela introdução, desenvolvimento e pelas considerações finais.

ELEMENTOS DA INTRODUÇÃO

A introdução do texto dissertativo se refere à apresentação do assunto a ser tra-


tado. É a exposição do tema que deve ser apresentado de forma resumida e objetiva
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

com a finalidade de situar o/a leitor/a sobre o caminho que o texto percorrerá.
Na introdução do texto dissertativo acadêmico deverá constar o tema, uma
explicação sucinta do assunto a ser tratado; os objetivos do trabalho (qual é
a finalidade do texto, o que você está propondo em termos de análise e refle-
xão); as justificativas (por que escolheu esse tema, qual a importância dele para
a sociedade); o problema, que é a questão que norteia o trabalho, e as possíveis
hipóteses levantadas para a sua solução.
A problematização tanto pode se referir a um problema a ser resolvido como
as relações a serem esclarecidas, suposições a serem confirmadas ou refutadas, per-
guntas a serem respondidas. Utilizando a violência escolar como tema e supondo
que a focalização será sobre a falta de preparo dos professores em enfrentar a
violência escolar, pode-se formular a seguinte pergunta: a falta de preparo dos
professores contribui para a manutenção da violência escolar? Ou: a formação
continuada abrangendo o tema violência escolar contribui com o decréscimo
desse problema na escola? A formulação de uma pergunta orienta os argumen-
tos, evitando perda de foco quando se busca a resposta.
Uma introdução mal formulada pode apresentar os seguintes problemas:
–– Não expõe com clareza o tema a ser debatido;
–– Cita argumentos que não serão debatidos no desenvolvimento;
–– Usa o senso comum para introduzir o assunto, como, por exemplo: “todos
nós sabemos que isso não dá certo” etc.

As Especificidades e a Estrutura do Texto Dissertativo


136 UNIDADE IV

ELEMENTOS DO DESENVOLVIMENTO

Os argumentos são a essência do texto dissertativo, é por meio deles que o/a
autor/a vai tentar convencer o/a leitor/a de suas ideias. Para tanto, Pignatari (2010)
sugere a utilização de argumentos que já são conhecidos e aceitos pelo/a leitor/a.
Podemos pegar como modelo o tema: a pena de morte deve ser legalizada
no Brasil?
O primeiro passo que o/a autor/a deve tomar é se posicionar: ser a favor,
contra ou demonstrar neutralidade. Se optar por ser contra, um dos argumen-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tos conhecidos e aceitos seria o de que sempre existe o risco de erro judiciário,
comum no Brasil, o que poderia levar à morte um inocente. Esse é um argu-
mento normalmente aceito e pode-se, por meio desse argumento, relatar erros
já ocorridos no judiciário, além das dificuldades econômicas pelas quais passam
as polícias civil e militar, que não conseguem dar conta de investigar de forma
satisfatória todos os casos em que caberia a pena de morte.
Se optar pelo sim, poderá desenvolver argumentos que demonstrem a rein-
cidência de criminosos que praticaram crimes hediondos, a demonstração por
meio de números estatísticos da diminuição da criminalidade em países que
aderem à pena de morte. Se optar pela neutralidade, você pode desenvolver argu-
mentos que demonstrem os dois lados da situação, os prós e os contras e deixar
que o/a leitor/a tome sua própria decisão.
Pignatari (2010) ressalta que, se não houver um argumento satisfatório, o
melhor a se fazer é repensar a tese, pois se não ocorre nenhum argumento plau-
sível no momento da escrita, é sinal de que a tese é frágil.
Da mesma forma que temos a tese na dissertação, que pressupõe uma ideia,
podemos ter, também, a antítese, que seria a tese contrária, a oposição de ideias.
Esse é um recurso utilizado para rebater uma ideia proposta sobre a qual pode
haver concordância ou discordância por parte do/a leitor/a. A introdução de uma
antítese não deve ocorrer de forma arbitrária, sem planejamento, há que se enca-
dear as ideias e utilizar conectivos, tais como: mas, porém, entretanto, contudo,
etc., que exercem a conectividade adversativa (PIGNATARI, 2010).
A inserção de uma antítese no texto dissertativo deve ser decidida antes de
sua produção; evite utilizar esse procedimento no improviso, pois a sua utilização

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


137

requer argumentos pró e contra que devem ser bem estabelecidos para não se
cair em contradição e produzir textos incoerentes.
Exemplos de temas que podem ser debatidos entre tese e antítese são alguns
dos alimentos que, se por um lado são saborosos, por outro podem engordar;
a pena de morte, que pode diminuir a violência nas ruas, mas por outro lado
pode ser fator de injustiça judiciária; o aborto, tema polêmico defendido por
uns e condenado por outros.
O desenvolvimento dos textos dissertativos demonstra todo o conhecimento
que o autor possui sobre o assunto, é a parte argumentativa em que as ideias
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

são desenvolvidas na tentativa de convencer o/a leitor/a. Porém, atenção! não


se trata do conhecimento do senso comum, obrigatoriamente o conhecimento
exposto deve ser de base científica, ou seja, resultado de pesquisas bibliográfi-
cas. É aquela parte do texto na qual consta:
Segundo Pignatari (2010), ...;
Conforme Koch e Elias (2010), ...;
Para Martins Junior (2009), ...;
Podemos perceber, por meio dos relatos de Fiorin e Savioli (2007) etc.

No desenvolvimento do texto acadêmico, o discurso que aparece não é o do/a alu-


no/a autor/a, mas o de outros autores/as que já publicaram textos sobre o mesmo
assunto, isso fornece uma base científica, é a contextualização e a intertextuali-
zação referenciadas por meio de citações. Há fatos que são aceitos como válidos
por consenso, por isso não carecem de citações de autores/as, como por exemplo:
–– Os investimentos na saúde e educação são indispensáveis para o desen-
volvimento do país.
–– A corrupção desvia dinheiro que deveria ir para os setores prioritários
para o bem-estar da sociedade, como a saúde e educação.

Os argumentos da dissertação acadêmica podem ser abordados conforme suas


causas e consequências, se será uma abordagem histórica ou se a abordagem será
comparativa, comparando-se teorias, metodologias ou outros meios disponíveis
para a exposição do tema ou se serão contrapostos os pontos negativos e posi-
tivos de uma mesma situação.

As Especificidades e a Estrutura do Texto Dissertativo


138 UNIDADE IV

O desenvolvimento deve conter os itens que foram citados na introdução, e


estes podem ficar estabelecidos por frases lançadas na introdução e posterior-
mente analisadas no desenvolvimento como, por exemplo:
Disposição na introdução - O aumento progressivo dos índices de violência
escolar tem mobilizado analistas e pesquisadores da área na busca de compreender
o fator histórico que envolve o problema como subsídio para o desenvolvimento
de procedimentos preventivos e interventivos.
Percebe-se que temos quatro temas a serem discutidos no desenvolvimento:
–– O aumento progressivo dos índices de violência escolar – No desenvol-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
vimento do texto esse item deve ser demonstrado a partir de índices
estatísticos que comprovem esta afirmativa.
–– Mobilização dos analistas e pesquisadores – Aqui cabe citar os pesquisa-
dores que estão se mobilizando.
–– O fator histórico envolvido no problema – A gênese do problema, a causa
possível ou as hipóteses da causa.
–– Desenvolvimento de procedimentos preventivos e interventivos – Descrição
de procedimentos que já foram usados, levantamento de hipóteses para
o controle do problema etc.

Em um texto curto, cada item pode ser trabalhado em um ou mais parágrafos;


em textos longos, como um TCC, os itens podem ser trabalhados em subtemas,
pode-se estabelecer subtítulos e desenvolver os argumentos relacionados ao sub-
título sem que se perca a relação ou conexão de sentido com o tema central, fator
necessário para a coerência textual. E para o encadeamento de cada subdivisão do
tema, lembre-se de usar os conectivos, responsáveis pelo fator coesão.
Eis alguns exemplos de expressões que podem ser usados como conectivos
no desenvolvimento do texto:

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


139

Quadro 1 – Expressões usadas como conectivos

Ainda que Do ponto de vista de Contudo


Ao contrário É claro que Em consequência
Apesar de tudo É o caso de Em comparação
Apesar disso Em vista disso No entanto
Assim como Embora Fica claro que
Como se vê Enfim Para tanto
De qualquer forma Entretanto Por conta disso
Dentro desse raciocínio Esses fatores Tal processo
Dessa perspectiva Exemplo disso é Tal situação
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Fonte: os autores.

Sendo o desenvolvimento a parte mais extensa do texto e a mais importante, deve-se


tomar alguns cuidados para não perder o foco dos argumentos e cair na incoerên-
cia, erro que pode ser evitado se seguidas as sugestões de Pignatari (2010, p. 21):
–– Não escreva se não tiver certeza.
–– É fundamental pesquisar antes de escrever.
–– É necessário analisar a lógica e a veracidade do que se escreve.
–– Não se deve chutar; inventar dados estatísticos é crime.
–– Não exagere ou generalize.
–– Para obter coesão, deve-se observar em outros textos como as relações
coesivas foram utilizadas.

Além da cautela com a coerência e coesão textual, devemos tomar alguns cuida-
dos com a orientação argumentativa, conforme sugerido por Pignatari (2010, p.
90), os quais exemplificamos para maior clareza.

As Especificidades e a Estrutura do Texto Dissertativo


140 UNIDADE IV

–– Mudar de assunto no desenvolvimento do texto.


Exemplo: expor na introdução que o tema abordado é a alfabetização e
desenvolver argumentos somente sobre o baixo salário dos professores.
–– Dar ênfase a ideias diferentes das que foram propostas na introdução.
Exemplo: o tema principal é a formação de professores e a ênfase no desen-
volvimento é dada sobre o comportamento dos alunos.
–– Utilizar argumentos que não têm relação direta com o tema proposto.
Exemplo: o tema proposto é o plano de carreira docente e os argumen-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tos são sobre a avaliação escolar.
–– Mencionar mais argumentos na introdução do que no desenvolvimento.
Exemplo: expor que vai ser desenvolvido os temas alfabetização e forma-
ção de professores e desenvolver apenas um item mencionado.
–– Utilizar dados do senso comum, opiniões pessoais sem credibilidade e
dados imprecisos sem comprovação.
Exemplo: afirmar que a única causa do baixo rendimento escolar dos alu-
nos é o desinteresse e indisciplina dos próprios alunos.

ELEMENTOS DA CONSIDERAÇÃO FINAL

Ao final das argumentações do desenvolvimento, inicia-se a parte das considerações


finais. Atualmente, há uma preferência em se usar o termo “Considerações finais” em
vez do termo “Conclusão”, tal preferência se deve ao fato de que nada está concluído,
nada está acabado, terminado; o que é tido como verdade hoje, amanhã pode não

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


141

ser mais em consequência de novas descobertas. Portanto, nada se conclui, porque


tudo está em um contínuo processo de transformação, o que se obtém são conside-
rações acerca do tema proposto naquele momento diante do objetivo do trabalho.
Essa etapa do trabalho é o momento de se expor, colocar seu ponto de vista,
sua opinião. Esse é o momento do texto acadêmico em que o/a aluno/a/autor/a
tem a liberdade de se expor, a indicação, inclusive, é de que não haja citação ou
referência a nenhum outro/a autor/a.
Nessa parte, deve-se apresentar uma síntese do que foi exposto no desenvol-
vimento do texto, confirmar as hipóteses levantadas e responder à pergunta feita
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

na introdução. Os argumentos finais devem ser coerentes com o texto desen-


volvido e com os dados científicos, confirmando a ideia exposta na introdução,
sugerindo soluções para o problema e sugestões para novas pesquisas.
É válida a utilização de conectivos conclusivos para iniciar a parte final do
texto, tais como: diante do exposto, consideramos que; pode-se deduzir que; por-
tanto; dessa forma, acreditamos que etc.
Também nas considerações finais há problemas que podem ser evitados com
um pouco de atenção por parte do autor, conforme sugere Pignatari (2010), os
quais são:
–– Finalizações simplistas demais ou generalizadas; as considerações devem
ser sobre o tema que foi delimitado e não sobre o que ocorre no mundo
todo.
–– Não sugerir soluções impossíveis, como mudar o mundo, mudar as pes-
soas etc.
–– Não usar frases de efeitos sem conteúdos, preocupando-se mais com a
estética e menos com a essência.
–– Citar conteúdos que não foram analisados no desenvolvimento do texto.

As Especificidades e a Estrutura do Texto Dissertativo


142 UNIDADE IV

No quadro a seguir, apresentamos uma síntese dos principais elementos que


devem constar no texto dissertativo:
Quadro 2 – Características do texto dissertativo

Elementos da Elementos do Elementos das


introdução desenvolvimento considerações finais
Exposição do assunto Exposição argumentativa. Exposição do resultado final.
a ser tratado. Análise do tema. Retomada da ideia central.
O tema. Divisão em subtemas ou subtí- Respostas às questões proble-
A ideia central do tulos. matizadoras.

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texto. Dados concretos (narração ou Confirmação ou refutação das
A problematização. descrição de fatos, dados estatís- hipóteses.
As hipóteses. ticos, citação de outros textos). Sugestões de soluções.
As palavras-chave. Posição argumentativa - Opinião própria coerente com
antítese, prós e contras, causa e os argumentos apresentados
consequência, análise histórica. no texto.
Fonte: os autores.

Nenhum escritor/a parte do nada na composição de um texto, tem-se sem-


pre como base a intertextualidade. Portanto, ao escrever um texto dissertativo,
observe como os outros/as autores/as escrevem, compare as técnicas utilizadas,
e utilize modelos para facilitar sua escrita. Utilizar modelos textuais para pro-
dução própria é um recurso aceitável; o que é inaceitável é o plágio, a cópia, que
é considerada crime passível de punição na esfera da lei. Portanto, os modelos
devem servir de parâmetros para a aprendizagem da escrita, de material de estu-
dos e de base para produções inéditas.
Expomos, a seguir um modelo de texto dissertativo de autoria de Roxane
Rojo (s/d) para que você possa compreender melhor os elementos discursivos
do texto dissertativo.
Textos multimodais
Um texto ou enunciado é um dito (ou cantado, escrito, ou mesmo pensado) con-
creto e único, “irrepetível”, que gera significação e se vale da língua/linguagem
para sua materialização, constituindo o discurso. Um texto é “irrepetível”, pois ain-
da que seja “o mesmo”, ou muito semelhante a um outro texto, estará enunciado
em um novo contexto, o que modifica suas relações de sentido.

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


143

Na era do impresso, reservou-se a palavra texto principalmente para referir os textos escri-
tos, impressos ou não; na vida contemporânea, em que os escritos e falas se misturam com
imagens estáticas (fotos, ilustrações, gráficos, infográficos) e em movimento (vídeos) e com
sons (sonoplastias, músicas), a palavra texto se estendeu a esses enunciados híbridos de
“novo” tipo, de tal modo que hoje falamos também em textos orais e em textos multimo-
dais, como as notícias televisivas e os vídeos de fãs no YouTube.
As mudanças relativas aos meios de comunicação e à circulação da informação, o surgimen-
to e ampliação contínuos de acesso às tecnologias digitais da comunicação e da informa-
ção provocaram a intensificação vertiginosa e a diversificação da circulação da informação
nos meios de comunicação analógicos e digitais, que, por isso mesmo, distanciam-se hoje
dos meios impressos, muito mais morosos e seletivos, implicando, segundo alguns autores,
como Chartier e Beaudouin, mudanças significativas nas maneiras de ler, de produzir e de
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

fazer circular textos nas sociedades.


Esses “novos escritos”, obviamente, dão lugar a novos gêneros discursivos, quase diaria-
mente: chats, páginas, tweets, posts, ezines, funclips etc. E isso se dá porque hoje dispomos
de novas tecnologias e ferramentas de “leitura-escrita”, que, convocando novos letramen-
tos, configuram os enunciados/textos em sua multissemiose (multiplicidade de semioses
ou linguagens), ou multimodalidade. São modos de significar e configurações que se va-
lem das possibilidades hipertextuais, multimidiáticas e hipermidiáticas do texto eletrônico
e que trazem novas feições para o ato de leitura: já não basta mais a leitura do texto verbal
escrito – é preciso colocá-lo em relação com um conjunto de signos de outras modalida-
des de linguagem (imagem estática, imagem em movimento, som, fala) que o cercam, ou
intercalam ou impregnam. Esses textos multissemióticos extrapolaram os limites dos am-
bientes digitais e invadiram, hoje, também os impressos (jornais, revistas, livros didáticos).
Isso se dá devido à linguagem digital que, indiferente, ou alheia, às múltiplas semioses
(linguagens), reconfigura todas essas modalidades de linguagem e mídias em um código
numérico binário. As mídias digitais facilitam a modificação e recombinação de conteú-
dos oriundos de quaisquer mídias, porque os processos de digitalização reduzem qualquer
conteúdo informativo, originado de qualquer mídia, codificado em qualquer linguagem, a
um código numérico/binário comum, o qual pode ser manipulado de forma automatizada.
Evidentemente, isso coloca novos desafios aos letramentos escolares.
(Roxane Rojo)
*Referências bibliográficas indicadas no texto:
BEAUDOUIN, V. De la publication à la conversation. Lecture et écriture électroniques. Rése-
aux, n. 119, p. 199-225, 2002/6. Disponível em: <http://www.cairn.info/article.php?ID_RE-
VUE=RES&ID_NUMPUBLIE=RES_116&ID_ARTICLE=RES_116_0199>. Acesso em: 26 mar.
2017.
CHARTIER, R. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: EDUNESP, 1998.

Observe que nos dois primeiros parágrafos a autora faz uma introdução explicando
os significados dos termos utilizados nos título, contextualizando a discussão. Na
sequência, a autora expõe, de forma argumentativa, as implicações do tema, as

As Especificidades e a Estrutura do Texto Dissertativo


144 UNIDADE IV

relações do tema com as situações atuais e utiliza duas referências para fortalecer
os argumentos (BEAUDOUIN, 2002; CHARTIER, 1998). No caso dessas duas
referências, a autora decidiu por não colocar o ano da publicação no corpo do
texto. Isso só ocorre quando há permissão do veículo ao qual a publicação está
vinculada; em outros casos, a regra é que a citação venha acompanhada do ano
de publicação. A finalização do texto é composta por um parágrafo com consi-
derações da autora e uma frase que aponta para novas pesquisas, para a busca
de soluções para atender o letramento escolar e o uso dos textos multimodais.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A LINGUAGEM DISSERTATIVA

Observe os dois tipos de frase:


A corrupção destrói o Brasil.
Eu culpo a corrupção pela destruição do Brasil.

Há uma diferença entre os dois enunciados. No primeiro enunciado,


a presença do autor é implícita. No segundo enunciado, o autor
fez questão de aparecer e afirmar sua posição, ele inseriu-se na
frase explicitamente. No primeiro caso, observamos o sen-
tido de objetividade, pois o que o autor quis enfatizar foi a
mensagem; no segundo caso, temos o sentido de subjetivi-
dade, pois o autor ressaltou sua opinião, seu ponto de vista.
Portanto, em um texto, a linguagem objetiva se refere
ao mundo exterior, e a linguagem subjetiva se refere ao
mundo interior, opinião pessoal do/a autor/a (FIORIN;
SAVIOLI, 2007).
A linguagem de um texto acadêmico deve ser cien-
tífica e impessoal, portanto, objetiva, e não se deve
usar gírias, jargões ou palavras indefinidas, como:

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


145

talvez, acho, alguma, coisa. Preste atenção aos verbos: sendo uma linguagem impes-
soal, o verbo deve acompanhar o pronome; observemos os exemplos citados por
Pignatari (2010, p. 108):
Quadro 3 – Diferença entre as linguagens

Linguagem pessoal Linguagem impessoal


Eu demonstrei que A pesquisa demonstra que
Eu constatei que Constatou-se que
Eu deduzo que Pode-se deduzir que
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Penso que a realidade pode ser A realidade pode ser transformada


transformada
Para mim, o fenômeno da globali- O fenômeno da globalização é irreversível
zação é irreversível
O texto que mencionei O texto mencionado
Fonte: adaptado de Pignatari (2010, p. 108).

Da mesma forma, os verbos utilizados na primeira pessoa podem ser modifica-


dos e usados na terceira pessoa do plural ou na forma impessoal, que indicam
que o fato é de conhecimento coletivo.

Exemplos:
a) Acreditamos que a violência escolar tem atingido índices alarmantes.
b) Acredita-se que a violência escolar tem atingido índices alarmantes.

a) Percebe-se que a seca no nordeste tem castigado os nordestinos.

b) Percebemos, por meio dos noticiários, que a seca no nordeste tem casti-
gado os nordestinos.
A linguagem que deve ser usada nos textos acadêmicos é científica, pois o que
se quer enfatizar são as ideias e não o/a autor/a. Por isso, não se deve usar voca-
bulários que denotem a emoção ou afetividade de quem escreve. O que deve
ficar em primeiro plano é sempre o assunto, o tema tratado, e não a emoção ou
opinião pessoal do/a autor/a. O que se propõe são reflexões em torno de uma
questão social e não ideias ou convicções subjetivas.

A Linguagem Dissertativa
146 UNIDADE IV

Outro elemento importante na linguagem dissertativa são os conectivos,


como temos afirmado ao longo desse trabalho. Por serem tão importantes e
muito utilizados, transcrevemos algumas sugestões feitas por Pignatari (2010)
para facilitar a busca de modelos no momento da escrita.
Quadro 4 – Conectivos

Causa/ moti-
Condição Continuidade Oposição
vo/ explicação
Se E Mas Mas
Caso Ainda Porém Porque

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Assim Todavia Visto que
Desse modo Contudo Dado que
Além disso Entretanto Pois
Outro fator a ser No entanto Já que
considerado
Consequência Conclusão Retificação ou
esclarecimentos
Assim Consequente- Por fim A propósito
mente Finalmente Aliás
Por isso Em síntese Assim
Portanto A saber
Para finalizar Isto é
Em suma Ou seja
Fonte: adaptado de Pignatari (2010, p. 24).

Sendo a linguagem objetiva preferível em textos acadêmicos científicos, a sub-


jetividade deve ser descartada, lembrando que entende-se por subjetividade a
expressão de opiniões pessoais, dessa forma, adjetivos e advérbios como: impor-
tantíssimo, felizmente, agradável, bonito, entre outros que denotam opinião
pessoal, devem ser descartados. Para que se possa corrigir esse tipo de erro, é
sempre recomendado fazer as seguintes perguntas para os advérbios e adjetivos:
Importantíssimo para quem? Nem todos vão compartilhar da mesma rela-
ção de importância, portanto se é importantíssimo para o/a autor/a, pode não
ser tão importante assim para o/a leitor/a, o que se configura em opinião pessoal.

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


147

Felizmente para quem? Todos compactuam da mesma felicidade? Nem sem-


pre! O que para um/a pode ser um ato ou resultado feliz, para outra pessoa pode
não ser. Novamente temos uma opinião pessoal ou restrita a um grupo parti-
cular de pessoas.
Agradável e bonito: o que é agradável para um é agradável para todos/as?
Temos os mesmos conceitos do que se pode considerar como bonito? Percebe-se
novamente que há opiniões pessoais nessas palavras, portanto, devem ser des-
cartadas de textos acadêmicos científicos.
Outro enfoque dado na linguagem dissertativa é à repetição de palavras, que
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deve ser evitada com o uso de sinônimos, pronomes ou outras palavras com o
mesmo valor semântico. Para clarificar esse tipo de problema e verificar como
ele pode ser resolvido, observe os modelos a seguir citados por Pignatari (2010,
p. 280).

Exemplo:
a) As mulheres que estão solitárias e que estão sem empregos podem aca-
bar deprimidas.

Substituindo fica desta forma:


b) As mulheres solitárias e desempregadas podem acabar deprimidas.

Exemplo:
a) O funcionário novo que escreveu o relatório que analisava o balanço patri-
monial foi promovido.

Substituindo fica desta forma:


b) O funcionário novo, autor do relatório sobre o balanço patrimonial, foi
promovido.

Exemplo:
a) O repórter que chegou ontem elaborou uma reportagem que condena
o aborto.

A Linguagem Dissertativa
148 UNIDADE IV

Substituindo fica assim:


b) O repórter que chegou ontem elaborou uma reportagem condenando o
aborto.

Use o dicionário para pesquisa de novas palavras; se perceber que uma palavra
foi repetida várias vezes no texto, busque novas palavras com o mesmo signifi-
cado no dicionário. Não use vocabulários de significados duvidosos, confirme
se o significado da palavra cabe exatamente na mensagem que se quer transmi-
tir. Há dicionários que os quais podem ser acessados nas páginas de pesquisas

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
na internet. Ao digitar um texto no computador, deixe aberto também o dicio-
nário on-line e recorra a ele em todas as dúvidas quanto ao vocabulário, quanto
à ortografia ou como opção de busca de substituições para evitar as repetições.
A seguir, mais alguns problemas que devem ser evitados na linguagem dis-
sertativa, sugeridos por Pignatari (2010):
–– Se usar expressões numerativas como “Em primeiro lugar”, não se esqueça
de dar a sequência; da mesma forma, se usar a expressão “por um lado”
lembre-se que existe a sequência “por outro lado”.
–– Cuidado com o uso dos pronomes possessivos (seu, sua, teu, tua), que
podem gerar frases de sentido duvidoso, como no exemplo citado por
Pignatari (2010, p. 112): “O acusado feriu a vítima com sua arma” (de
quem era a arma?).

Para corrigir esse tipo de situação, utilize o nome próprio ou mude as posições
das palavras, no caso do exemplo, a frase pode ser reescrita da seguinte forma:
“A vítima foi ferida com a arma do acusado” ou “O acusado feriu a vítima com
a arma dele”.
–– Evite jargões e ditados populares já muitos gastos pelo uso popular, como:
quem vê cara não vê coração; quem com ferro fere com ferro será ferido;
a esperança é a última que morre etc.
–– Não use palavras difíceis apenas por estética.
–– Não fique tentando rebuscar o texto com estruturas mirabolantes, a sim-
plicidade e a objetividade são qualidades em textos dissertativos.

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


149

Essas recomendações devem ser seguidas na elaboração do Trabalho de Conclusão


de Curso, que é um texto científico acadêmico; porém, para que seja reconhecido
como tal, como um texto científico bem-elaborado, ele deve atender a algu-
mas exigências que foram dispostas por Pignatari (2010) e por Martins Júnior
(2009), as quais são:
–– O texto deve ser redigido de forma precisa, clara e objetiva, com o uso da
norma padrão da língua.
–– Organização coerente e coesa dos dados.
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–– Fornecer meios de identificação das fontes utilizadas (as citações diretas e


indiretas e as referências no final do texto, conforme normas da ABNT).
–– Descrever objetivamente o desenvolvimento metodológico e os instru-
mentos utilizados nas coletas de dados.
–– O texto deve ser útil e relevante, contribuindo com a ampliação do conhe-
cimento sobre o tema analisado.

Estas exigências seguem os princípios da boa comunicação escrita acadêmica


ou científica, que são:
–– Clareza – exposição ordenada, objetiva e clara do assunto tratado.
–– Concisão – a objetividade encurta caminhos e facilita a leitura. Busque a
qualidade e não a quantidade.
–– Vocabulário – deve ser técnico, com o uso da norma culta.
–– Correção – erros gramaticais põem em dúvida a validade do estudo.
–– Encadeamento – o texto deve ser uma sequência lógica do assunto abor-
dado. Cada parágrafo ou capítulo deve ter uma relação harmônica com
o parágrafo ou capítulo que o antecede e o precede.
–– Consistência – escolha do tempo verbal e dos pronomes pessoais, per-
manecendo estável até o final do texto.
–– Original – mesmo que se use as ideias de outros autores, a exposição des-
sas ideias é que devem ser originais, lembrando que plágio é crime.

A Linguagem Dissertativa
150 UNIDADE IV

–– Ideologia – atenção para as ideias que se quer defender, cuidado com pala-
vras que denotam preconceito, racismo ou discriminação.
–– Crítico – o autor deve ser um crítico de seu próprio texto, não aderir a
modismos apenas porque o termo ficou bonito no texto. Todas as pala-
vras têm uma função comunicativa.
–– Citações – as citações de outros autores devem ser adequadas ao texto,
nem muito, nem pouco, o suficiente para a discussão das ideias. Citações
em excesso congestionam o texto, e a escassez de citações só é permitida
para quem já possui um vasto conhecimento na área.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
–– Regras – As regras para o texto, como fonte, espaçamento e referências
sempre estão disponíveis no site ou na biblioteca pertencente à instituição
em que o trabalho está sendo desenvolvido. Não havendo o acesso pela
internet, deve-se procurar a bibliotecária que irá providenciar as normas
para trabalhos acadêmicos. Para a correção final dessas regras, a biblio-
tecária também poderá auxiliar.

“Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coi-
sa. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre.”
(Paulo Freire)

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


151

TÓPICOS DE REVISÃO TEXTUAL

Não existe escritor/a perfeito/a, o que existe são técnicas de correção. Alguns
usam os trabalhos de profissionais revisores/as de textos, outros fazem suas pró-
prias revisões. O que não se admite é um texto ser finalizado ou publicado sem
a devida correção.
Ao final da escrita, leia e releia o texto na busca de erros, tanto de coerência
e coesão como erros de ortografia. O computador nos oferece alguns instrumen-
tos que facilitam as correções ortográficas, use-os e, caso seja necessário, recorra
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

a um/a amigo/a revisor/a de texto ou uma pessoa especializada que preste este
serviço mediante pagamento.
Todos nós estamos sujeitos a cometer erros no momento da
produção textual, isso porque nos prendemos à mensagem e
os erros gramaticais passam despercebidos. Para atenuar esse
problema, costuma-se sugerir aos escritores/as que deixem
seus textos “dormirem” por um período, que vai depender
da urgência de entrega do texto. Por isso se aconselha a escrita
bem antecipada à data de entrega. Esse período de afastamento
permite ao escritor/a se desvincular do texto como autor/a e ter
uma leitura crítica como leitor/a, conseguindo, dessa forma, obser-
var com mais clareza as partes que carecem de correções.
Nessa última correção também será possível distinguir o que é
importante e essencial para o texto do que é supérfluo e desnecessá-
rio. Nos textos atuais, dispensa-se as explicações que não contribuem
com o entendimento das mensagens e que geram leituras desinteressan-
tes, longas e cansativas.
Para que você tenha noção do que é corrigido em um texto, expomos
os procedimentos adotados nas correções de textos de concursos. A corre-
ção segue procedimentos sistematizados, conforme esclarece Pignatari (2010):
1- Adequação ao tema – avalia-se se o tema está adequado ao assunto
proposto na prova, o aprofundamento do assunto, o enfoque dado, a
originalidade do tema e a capacidade de reflexão.

Tópicos de Revisão Textual


152 UNIDADE IV

2- Adequação ao tipo de composição solicitada – avalia-se se foi atendida a


solicitação do enunciado da prova; se solicitado um texto narrativo, dis-
sertativo ou descritivo, deve-se apresentar um texto que corresponda às
características do texto solicitado; avalia-se a estrutura do texto, se a compo-
sição introdução, desenvolvimento e considerações finais está bem-definida.
3- Adequação ao nível de linguagem – verifica-se se há erros ortográficos
e gramaticais, se foi usado bom vocabulário, norma culta e domínio da
habilidade sintática e estilística.
4- Coesão – nesse quesito é observado o uso dos conectivos, a transição entre
um parágrafo e outro, entre um argumento e outro, o uso dos pronomes

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nas retomadas, o uso de sinônimos e se há repetições excessivas de termos.
5- Coerência interna e externa – nesse item é avaliada a harmonia do texto,
a progressão, a continuidade e informatividade; a interação e situacio-
nalidade textual, se há conexão entre os argumentos apresentados e a
realidade. Avalia-se os argumentos, se há contradições e incoerências.

Pignatari (2010, p. 96) apresenta um grande modelo utilizado nas correções de


textos para vestibulares. O modelo pode ser utilizado por você para a autocor-
reção de seus textos.
Quadro 5 – Quadro de correção

GRADE DE CORREÇÃO PARA TEXTOS DISSERTATIVOS


[O corretor assinala com um X a lacuna apropriada]
I. Quanto à adequação ao tema, o texto;
0,0 ( ) Não aborda o tema.
0,5 ( ) Explora a proposta, mas de modo superficial. Não desenvolve os argumentos
citados.
1,0 ( ) Enfoca parcialmente o tema (aprofunda-se em um argumento, mas não revela
visão ampla do tema).
1,5 ( ) Enfoca adequadamente o tema (desenvolve argumentos em profundidade e
focaliza a questão de diversos ângulos).
2,0 ( ) Apresenta contribuição pessoal e originalidade (inova com uma solução ou
abordagem inédita).
Comentários:_________________________________________________

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


153

II. Quanto à adequação ao tipo de composição, o texto:


0,0 ( ) Foge da modalidade proposta (faz narração ou descrição).
0,5 ( ) Mistura modalidades textuais.
1,0 ( ) Faz dissertação, porém com falhas de estrutura (como ausência de introdução,
desenvolvimento ou conclusão).
1,5 ( ) Faz dissertação, mas não emprega bem os recursos (por exemplo, emprega a
primeira pessoa).
2,0 ( ) Apresenta bom aproveitamento de todos os recursos do tipo de composição.
Comentários:__________________________________________________

III. Quanto ao nível da linguagem e à adequação gramatical, o texto apresenta:


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

0,0 ( ) Vocabulário precário e insuficiente (frases sem sentido ou sentido deturpado) e


erros gramaticais abundantes (mais de dez) e graves.

0,5 ( ) Vocabulário pobre e com muitas repetições, interferências da oralidade, gírias,


incorreções gramaticais (até dez erros).

1,0 ( ) Variedade do vocabulário, mas com falhas no uso correto das palavras e ade-
quação gramatical (até cinco erros).

1,5 ( ) Adequação gramatical (até três erros) e vocabular.

2,0 ( ) Variedade e adequação do vocabulário, uso pessoal do léxico (linguagem origi-


nal e viva, estilo marcante).

Comentários:__________________________________________________

Nesse item deve-se observar:


• Ortografia
• Concordância
• Acentuação
• Uso de conectivos
• Pontuação
• Adequação pronominal
• Regência
• Adequação verbal

Tópicos de Revisão Textual


154 UNIDADE IV

IV. Quanto à coesão, o texto:


0,0 ( ) É composto de frases soltas, não apresenta conjunções ou as utiliza de maneira
indevida, emprega incorretamente os pronomes.
0,5 ( ) Apresenta muitas falhas de encadeamento (repetição excessiva de itens, frases
incompletas, falta de paralelismo, “ondismo”, “queismo”).
1,0 ( ) Não apresenta deficiências graves, mas utiliza só as conjunções mais conhecidas
e poucos recursos pronominais.
1,5 ( ) Apresenta bom uso dos elementos coesivos (variedade).
2,0 ( ) Apresenta boa transição entre as frases e os parágrafos e flui naturalmente, sem
rupturas inesperadas.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Comentários:__________________________________________________

V. Quanto à coerência, o texto apresenta:


0,0 ( ) Desinformação grave (exageros, alegações genéricas, e imprecisas, dados fal-
sos), pouca relação entre as ideias e a realidade (texto “sem pé nem cabeça”).
0,5 ( ) Pouca coerência interna (divergências entre o todo e as partes), ideias contra-
ditórias, evasão, duplo sentido, redundância, quebra de relação entre pensamentos,
argumentos que não desenvolvem a tese.
1,0 ( ) Boa coerência interna mas pouca adequação à realidade (pequenos exageros e
imprecisões).
1,5 ( ) Coerência interna mas falta de progressão (redação circular, repetitiva).
2,0 ( ) Coerência absoluta (texto progressivo, informativo, com
posicionamento claro e convergência argumentativa).
Comentários:__________________________________________________
Total geral:__________
Fonte: Pignatari (2010, p. 96).

Naturalmente, esse quadro apresenta um visão técnica sobre os itens que devem
ser observados durante a correção de um texto, porém, com a experiência diá-
ria, cada corretor cria o seu “caminho de correção”; isso não quer dizer que será
melhor ou pior, mas sim que a apropriação dos conceitos e técnicas é executada
e desenvolvida por cada indivíduo em sua carreira docente.
Uma boa correção é fundamental para a exposição/publicação de qualquer
texto acadêmico, pois a linguagem acadêmica tem um padrão de escrita exigente.

ASPECTOS ACADÊMICOS DA PRODUÇÃO TEXTUAL


155

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Caro/a aluno/a, você está inserido em situações diversificadas de comunicação,


desempenhando papéis discursivos que vão caracterizando-o/a como aluno/a de
graduação. As solicitações de atividades acadêmicas diversas em que a leitura é
exigida como base de reflexões e a escrita como materialização da reflexão cons-
truída são necessárias para o seu processo de formação e letramento.
Assim, tudo que propomos, foi para o seu processo de evolução leitora com
consequente ampliação do processo de produção textual. O aperfeiçoamento vem da
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

prática, pois não se aperfeiçoa o que não se pratica. Portanto, mãos à obra! Escreva
e reescreva quantas vezes forem necessárias e finalize sua obra-prima.
Se sua dificuldade é argumentar, lembre-se que argumentar é inerente às
práticas humanas, portanto, argumentar não é algo novo, a dificuldade está em
se colocar no papel as ideias propostas. Porém, se você não praticar e buscar o
aperfeiçoamento, a dificuldade permanecerá.
Sabendo que a dissertação é dividida em partes que se entrelaçam, como intro-
dução, desenvolvimento e considerações finais, pode-se organizar o pensamento
também em partes sem perder a noção do todo. Desenvolver o texto partindo de
explicações sucintas sobre o tema, desenvolvendo argumentos mais aprofundados e
culminando com a exposição dos resultados, as considerações que se faz sobre o tema.
Erros podem acontecer e fazem parte de todo o processo de aprendizagem,
e para isso existem técnicas de correções. Utilize o quadro de correções sugerido
em nosso livro. O importante é saber que a produção de um texto exige conhe-
cimento linguístico, técnico e estrutural, pois assim é possível produzir um bom
texto para que atinja os seus objetivos.
Acredite em você, pois o que os outros pensam sobre você é o reflexo dos
seus próprios pensamentos. Assim, não desista ou deixe as dificuldades te ven-
cerem, estude, treine e saiba que seu sucesso e sua melhora na produção textual
serão notados rapidamente e a escrita de qualidade se tornará naturalmente algo
tranquilo para você.

Considerações Finais
156

1. As grandes empresas, as universidades e demais instituições de ensino preferen-


cialmente têm usado o texto dissertativo para avaliar seus candidatos, isto porque,
por meio deste instrumento, é possível avaliar as qualidades mais exigidas, tanto
na carreira acadêmica como na profissional. Disserte sobre essas qualidades,
quais são e porque elas são importantes no desenvolvimento acadêmico e
profissional.
2. Para a construção de um texto acadêmico, é necessário seguir algumas regras
básicas que organizam o texto. Também existem orientações que apontam quais
elementos são importantes na Introdução, no Desenvolvimento e nas Conside-
rações Finais do texto. A partir de seus estudos, descreva o que você deve
considerar em cada uma dessas partes do texto dissertativo.
3. A correção de textos dissertativos em concursos segue procedimentos sistema-
tizados e critérios pré-estabelecidos. Assinale a alternativa que corresponde a
esses critérios:
I- Adequação ao tema.
II- Adequação ao tipo de composição solicitada.
III- Avaliação da estrutura do texto: introdução, desenvolvimento e considera-
ções finais.
IV- Adequação ao nível de linguagem popular.
V- Coesão.
Assinale a alternativa correta:
a. ( ) Somente I e II estão corretas.
b. ( ) Somente I, II e III estão corretas.
c. ( ) Somente I, II e IV estão corretas.
d. ( ) Somente I, II, III e V estão corretas.
e. ( ) Todas estão corretas.
157

4. Para serem consideradas textos acadêmicos científicos, as composições devem


seguir algumas adequações normativas. Assinale a alternativa que apresenta
algumas dessas exigências:
I- A linguagem deve ser subjetiva e não objetiva.
II- A linguagem deve ser impessoal.
III- A ênfase é na opinião do autor, em suas emoções e sentimentos.
IV- Utiliza-se a norma culta, verbos concordando com a imparcialidade do/a au-
tor/a.
V- No texto científico, a ficção tem papel preponderante.
a. ( ) Somente I e II estão corretas.
b. ( ) Somente III e IV estão corretas.
c. ( ) Somente I, II e V estão corretas.
d. ( ) Somente II e IV estão corretas.
e. ( ) Todas estão corretas.

5. Segue um tema adaptado de redação proposta no Exame Nacional de Desem-


penho dos Estudantes, realizado em 2011. Elabore um texto conforme pede o
enunciado, buscando amparo nas sugestões expostas em nossos estudos, e em
seguida, realize a autocorreção ou troque o material com outro colega, de forma
que um corrija o texto do outro, utilizando-se da grade de correções para textos
dissertativos exposta no Quadro 5 (Quadro de correção).
Tema: redija um texto dissertativo acerca da importância de políticas e
programas educacionais para a erradicação do analfabetismo e para a em-
pregabilidade, considerando as disparidades sociais e as dificuldades de
obtenção de emprego provocadas pelo analfabetismo. Em seu texto, apre-
sente uma proposta para a superação do analfabetismo e para o aumento
da empregabilidade.
Referência: adaptado do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (2011).
158

O Artigo.
O artigo apresenta uma investigação científica em todas as suas fases fundamentais:
um problema digno de ser pesquisado, os objetivos, materiais e métodos de pesquisa,
a análise e as considerações sobre a investigação. É, então, um texto dissertativo que
busca apresentar à comunidade científica e leitora um estudo novo em dada área de
conhecimento.
Esse gênero pode ser de dois tipos principais. O artigo de divulgação, também chamado
de artigo original, é aquele que traz um tema novo ou uma metodologia nova, apresen-
tando essa novidade na forma de um estudo completo e que, assim, poderá ser repli-
cado (repetido) futuramente (inclusive pelo leitor, se for o caso). Ele pode ser teórico,
ou empírico (ou seja, baseado em dados coletados pelo autor ou autora). Já o artigo de
revisão trabalha com estudos já publicados, analisando e discutindo essas contribuições
anteriores sob uma nova ótica ou ponto de vista a ser considerado.
O artigo apresenta uma introdução que contextualiza a área temática e o problema es-
pecífico investigado. O problema é exposto acompanhado dos objetivos de sua investi-
gação. O texto também traz uma revisão de literatura e fundamentação teórica, as quais
podem vir em seções próprias ou diluídas na introdução. A seguir, o artigo descreve os
materiais e os métodos usados para conduzir a investigação do problema, e expõe os
resultados e sua devida discussão. Após isso, é apresentada a conclusão, que responde
diretamente ao problema investigado. A isso se segue a lista de referências bibliográfi-
cas e, se necessário, apêndices e anexos.
Observe que mesmo o artigo de revisão, descrito anteriormente, tem um problema cen-
tral de análise naquela dada literatura, bem como métodos específicos para a análise do
material (isto é, os estudos anteriores revisados) e respectivas conclusões sobre o que
for dissertado na análise.
Além da estrutura vista, é convenção incluir no artigo, após o título e identificação do
autor, um resumo com palavras-chave adequadas para a correta indexação do texto. O
resumo geralmente deve ser tanto em língua portuguesa quanto em uma língua es-
trangeira. Alguns periódicos solicitam o resumo em dois idiomas estrangeiros, outros
delimitam o número de palavras-chave em até 5 ou até 6, outros pedem tradução tam-
bém do título, entre outras variações. Assim, é sempre preciso verificar as diretrizes para
autores do periódico específico em questão.
Fonte: EA Escrita Academica (2017, on-line)1.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Como escrever trabalhos de conclusão de curso


Joaquim Martins Junior
Editora: Vozes
Sinopse: como escrever trabalhos de conclusão de curso
constitui um manual que mostra como planejar o Trabalho
de Conclusão de Curso, elaborar um projeto, desenvolver e
escrever o trabalho, desde a escolha do tema da pesquisa
e da elaboração do título, de todas as partes essenciais
do estudo, dos principais métodos de pesquisa, dos
instrumentos de coleta dos dados até as formas de citações e
de como escrever as referências dentro das normas da ABNT.

Acesse o link e assista ao vídeo para saber mais sobre o uso de pleonasmos, que
se referem à repetição de palavras do mesmo sentido em uma frase. O vídeo é
apresentado pelos atores Leandro Hassum e Marcius Melhem.
Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=7aE6IANa2MU&feature=related>.

Para se informar mais sobre as normas da escrita acadêmica e científica, consulte o


manual técnico da ABNT ou acesse o site para maiores informações. Disponível em:
<http://www.abnt.org.br/>.

Material Complementar
160
REFERÊNCIAS

ENADE. Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes. Pedagogia. Questão


discursiva 2, p. 8. Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, 2011. Dispo-
nível em: <http://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/provas/2011/
PEDAGOGIA.pdf>. Acesso em: 09 jan. 2017.
FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Para entender o texto: leitura e redação. 22. ed. São Paulo:
Editora Ática, 2007.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 43.
ed. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
PIGNATARI, N. Como escrever textos dissertativos. São Paulo: Ática, 2010.
KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e escrever: estratégias de produção textual. São Paulo:
Contexto, 2010.se ouviu
MARTINS JUNIOR, J. Como escrever trabalhos de conclusão de curso: instruções
para planejar e montar, desenvolver, concluir, redigir e apresentar trabalhos mono-
gráficos e artigos. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.
ROJO, R. Textos Multimodais. Glossário Ceale. Universidade Estadual de Campi-
nas-UNICAMP. Instituto de Estudos da Linguagem-IEL, s/d. Disponível em: <http://
www.ceale.fae.ufmg.br/app/webroot/glossarioceale/verbetes/textos-multimo-
dais>. Acesso em: 08 jan. 2017.

Referência On-line

1
Em: <http://www.escritaacademica.com/topicos/generos-academicos/o-artigo/>.
Acesso em: 10 nov. 2017.
161
REFERÊNCIAS
GABARITO

1) As qualidades que podem ser avaliadas em um texto dissertativo são a orga-


nização de pensamentos, a defesa de pontos de vista, os apontamentos de so-
luções, a capacidade argumentativa e de construção de fundamentação lógica
e coerente, além de possibilidade de avaliação dos conhecimentos linguístico,
enciclopédico, de texto e interacional do/a autor/a. São qualidades importantes
por serem essenciais à formação e atuação profissional, à manifestação e partici-
pação na vida social e política do país, além de possibilitarem a continuidade do
processo de letramento.
2) Elementos da introdução: exposição do assunto a ser tratado, o tema, a ideia
central do texto, a problematização, as hipóteses e palavras-chave; Elementos
do Desenvolvimento: exposição argumentativa, análise do tema, divisão em
subtemas ou subtítulos, dados concretos, posição argumentativa - antítese, prós
e contras, causa e consequência, análise histórica; Elementos das considerações
finais: exposição do resultado final, retomada da ideia central, repostas às ques-
tões problematizadoras, confirmação ou refutação das hipóteses, sugestões de
soluções, opinião própria coerente com os argumentos apresentados no texto.
3) Alternativa D.
4) Alternativa D.
5) A produção textual é individual e livre.
Professora Dra. Ivone Pingoello
Professor Me. João Carlos Dias Furtado

V
UNIDADE
LITERATURA INFANTIL

Objetivos de Aprendizagem
■■ Entender a literatura como direito fundamental da criança.
■■ Conhecer as funções da literatura.
■■ Conhecer a natureza da literatura infantil.
■■ Compreender a importância da literatura infantil na formação de
leitores.
■■ Discutir a literatura infantil como instrumento para a aquisição
da língua, da cultura, de noções estético-literárias e ideológico-
valorativas nela inscritas.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■■ A criança tem direito à literatura
■■ Funções da literatura
■■ Características essenciais da literatura infantil
■■ Breve história da literatura infantil
■■ Literatura infantil: formação linguística e cultural
165

INTRODUÇÃO

Quando criança, quem nunca sonhou em ser um super-herói, uma princesa,


fugir para um reino encantado, brincar nas nuvens, viajar pelo espaço, conver-
sar com animais, ter super poderes? Acredito que todos nós respondemos sim
para algumas, ou todas, essas perguntas, porque o universo da imaginação é tão
natural ao ser humano que, muitas vezes, “viajamos” sem sair do lugar e sem
distinguir realidade de sonho.
Pensando nisso, quem não gosta ou nunca gostou dos contos de fadas, quem
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

nunca viajou montado em um tapete voador, quem não desejou ter uma varinha
mágica para transformar o sonho em realidade? Desde os clássicos da literatura,
como Cinderela, A Bela Adormecida, A Bela e a Fera, aos contos de fadas mais
atuais, como Alice no país das maravilhas, Bruxa Onilda, Harry Potter, História
sem fim, entre outros, em que o sonho pede licença à realidade e foge para um
mundo encantado.
Nesta unidade, adentraremos no universo da Literatura Infantil, no mundo
mágico e encantado que envolve esse período de vida tão especial para a forma-
ção humana. Estudaremos uma breve história da literatura infantil no mundo e
no Brasil, veremos as funções que ela exerce em nossas vidas e a sua importân-
cia para formação cultural, histórica, linguística e artística.
Observaremos alguns autores e obras que marcaram a nossa história lite-
rária, qual a importância deles e de seus textos para a nossa formação cidadã e
como eles podem enriquecer a formação dos nossos alunos para que também
seja possibilitada uma aprendizagem ampla, profunda e significativa.
A literatura infantil está diretamente ligada ao desenvolvimento cognitivo e
intelectual da criança, por isso é função da escola oferecer os melhores textos e
autores para os nossos alunos. Assim, a literatura infantil auxilia nos processos
de aquisição da linguagem, em que o lúdico pode ser vinculado ao pedagógico
sem que um se sobressaia ao outro, mas sejam instrumentos que se completam
na busca da formação da autonomia da criança, de seu senso crítico, suas capa-
cidades de controle emocional e de desenvolvimento da inteligência.
Bons estudos!

Introdução
166 UNIDADE V

A CRIANÇA TEM DIREITO À LITERATURA

Normalmente, quando lemos a palavra direito, remetemos à ideia de leis e esta-


tutos. Aqui no Brasil, lembramos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
a advogados, juízes, direitos e deveres, e para muitos é a profissão que lhes dá o
sustento. Tantas ideias que estão no nosso imaginário, porém nessas lembranças
nem sempre refletimos sobre o nosso direito à arte, cultura e literatura. Assim,
surge a pergunta: nossos filhos e alunos têm direito à literatura de qualidade?
Antes de respondermos, devemos atentar para o significado da palavra

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
direito, segundo o dicionário Aurélio ([2017], on-line)1:
O que pode ser exigido em conformidade com as leis ou a justiça.
2- Faculdade, prerrogativa, poder legítimo.
3- Complexo de leis sociais.
4- Lado principal.
5- Que corresponde à distância mais curta entre dois pontos.
6- Sem curvas nem irregularidades.
7- Que fica à direita.
8- Que está de pé.
9- Justo, reto; acertado.
10- Que está bem, que está como é devido.
11- Em linha reta.
12- De forma direta; sem desvios.
13- De maneira considerada correta.
14- Imposto, taxa.
15- direito canônico: conjunto de leis que regula a dis-
ciplina eclesiástica.
16- direito autoral: o mesmo que direitos autorais.

LITERATURA INFANTIL
167

17- direito comum: conjunto de princípios e normas que se aplica à gene-


ralidade dos casos em sociedade, em coletividade.
18- direito das gentes: o mesmo que direito internacional público.
19- direito de autor: o mesmo que direitos de autor.
20- direito internacional privado: conjunto de princípios e normas que
regula os conflitos emergentes de relações jurídicas privadas inter-
nacionais.
21- direito internacional público: conjunto de princípios e normas que
regula as relações entre diferentes estados soberanos.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

22- direito natural: conjunto de princípios e normas considerados pri-


mordiais e baseados na natureza humana, considerados anteriores
à teoria jurídica.
23- direitos autorais: para um autor ou seu editor, direito exclusivo de
explorar durante muitos anos uma obra literária, artística ou científica.
24- direitos de autor: para um autor ou seu editor, direito exclusivo de
explorar durante muitos anos uma obra literária, artística ou científica.
25- montante que um autor recebe pela comercialização da sua obra.
26- direitos de cidade: o mesmo que foros de cidade.
27- direitos políticos: aqueles com que o cidadão intervém nos negó-
cios públicos.
Lendo com atenção as possibilidades de significado da palavra direito, verifica-
mos que duas coisas parecem encaixar com a discussão desta unidade: primeiro,
quando se afirma que direito é aquilo que pode “ser exigido”; e o tópico 22, intitu-
lado direito natural, que aborda o direito como “princípios e normas considerados
primordiais”. Com essas definições, voltamos à nossa pergunta e resposta: nossos
filhos e alunos têm direito à literatura de qualidade? A resposta, em sua maioria,
será Sim, mas realmente exigimos de nossos filhos e das escolas que eles tenham
acesso à literatura e, principalmente, literatura de qualidade? Realmente enten-
demos que a leitura literária na infância é um “princípio primordial”?

A Criança Tem Direito à Literatura


168 UNIDADE V

Se refletirmos bem, como pais e educadores, entendemos mais a expressão


direito à literatura como algo teórico do que prático, e isso é um sério problema.

“O desenvolvimento de interesses e hábitos permanentes de leitura é um


processo constante, que principia no lar, aperfeiçoa-se sistematicamente na
escola e continua pela vida afora através das influências da atmosfera cul-
tural geral e dos esforços conscientes da educação e bibliotecas públicas.”

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
(Richard Bamberger)

Você pode estar se perguntando: a literatura é uma necessidade tão vital quanto
moradia, alimentação, segurança e saúde? Bom, se pudermos verificar que a
literatura/arte é algo presente em toda a história da humanidade e está presente
todos os dias, podemos sim entendê-la como uma necessidade vital; assim, para
comprovar isso, Candido (2011, p. 176), afirma:
[...] a literatura aparece claramente como manifestação universal de to-
dos os homens em todos os tempos. Não há povo e não há homem que
possa viver sem ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em contato
com alguma espécie de fabulação. Assim como todos nós sonhamos
todas as noites, ninguém é capaz de passar as vinte e quatro horas sem
algum momento de entrega ao universo fabuloso.

Consoante o raciocínio do autor, verificamos que a literatura é tão fundamen-


tal, tão necessidade essencial quanto saúde, segurança, alimentação e moradia,
pois a história do ser humano é baseada na fruição imaginativa, isso faz parte
da nossa essência. Nesse sentido, o peso da expressão direito à literatura é res-
saltado, como vimos no dicionário Aurélio, como um “princípio primordial
baseado na natureza humana”. Candido (2011, p. 177) enfatiza isso ao afirmar:
Ora, se ninguém pode passar vinte e quatro horas sem mergulhar no
universo da ficção e da poesia, a literatura concebida no sentido amplo
a que me referi parece corresponder a uma necessidade universal, que
precisa ser satisfeita e cuja satisfação constitui um direito.

LITERATURA INFANTIL
169

Esse raciocínio foi também explorado artisticamente pela banda de rock nacional
Titãs com a música “Comida”, lançada em 1987, no álbum “Jesus não tem den-
tes no país dos Banguelas” ([2017], on-line)2, e ela expõe os seguintes trechos:
A gente não quer só comida
A gente quer comida, diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída para qualquer parte
A gente não quer só comida
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A gente quer bebida, diversão, balé


A gente não quer só comida
A gente quer a vida como a vida quer.

Ratificando a noção de que todos nós temos o direito à literatura, isso não pode
ser um privilégio de poucos e proposto em dosagens pequenas, mas da mesma
forma que todos almejam uma boa moradia, uma ótima saúde e atendimento
médico, ter uma boa alimentação e segurança, devemos almejar de promover,
especialmente nas escolas e famílias, a leitura literária de qualidade para todos,
especialmente nos anos iniciais de formação linguística, cultural, social e cog-
nitiva dos seres humanos, a infância.
Ao observarmos artigos presentes no ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente) referentes à educação, entendemos a vital importância da litera-
tura a todos e em todos os níveis educacionais:
A criança e o adolescente têm direito à educação visando ao pleno desen-
volvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qua-
lificação para o trabalho [...]. É dever do Estado assegurar à criança e ao
adolescente: I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para
os que a ele não tiveram acesso na idade própria; V – acesso aos níveis mais
elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacida-
de de cada um [...] (BRASIL, ARTIGOS 53 E 54, 1990, p. 55-58 on-line).

Novamente lemos a palavra “direito”, e no ECA essa palavra aponta a seguri-


dade à educação e a um desenvolvimento pleno, sendo que já sabemos que a
literatura/arte faz parte das necessidades fundamentais do ser humano. Assim,
entendemos-a como elemento de formação e fortalecimento cultural e social ao

A Criança Tem Direito à Literatura


170 UNIDADE V

longo de toda a história humana, com propriedades específicas de cada região,


país e época, mas sempre com grande influência nas sociedades e suas crenças.
Por isso é que nas nossas sociedades a literatura tem sido um instrumento
poderoso de instrução e educação, entrando nos currículos, sendo pro-
posta a cada um como equipamento intelectual e afetivo. Os valores que
a sociedade preconiza, ou os que considera prejudiciais, estão presentes
nas diversas manifestações da ficção, da poesia e da ação dramática. A li-
teratura confirma e nega, propõe e denuncia, apoia e combate, oferecen-
do a possibilidade de vivermos dialeticamente os problemas. Por isso é
indispensável tanto a literatura sancionada quanto a literatura proscrita;
a que os poderes sugerem e a que nasce dos movimentos de negação do

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
estado de coisas predominantes (CANDIDO, 2011, p. 177-178).

Como a própria constituição brasileira de 1988 afirma que a educação para todos
é um dever do Estado, e posteriormente o ECA reafirma esse compromisso, enten-
demos que a escola deve promover aos alunos o seu direito à literatura, direito à
ficção, à cultura, à arte e ao lúdico para que eles possam ter sua formação ampla
e com todos os seus direitos assegurados.

FUNÇÕES DA LITERATURA

Discutimos no tópico anterior o direito à literatura que as crianças têm; não só


elas, mas sim todos nós temos, porém restringiremos a elas devido ao nosso
tema do universo infantil. Sabemos que é nosso dever, como profissionais da
educação, promover a leitura literária na escola e fora dela, pois isso é direito de
nossos alunos e nosso direito também.
Agora podemos discutir com mais intensidade a seguinte pergunta: qual o
papel da literatura em nossa sociedade? Qual a função da literatura em nosso dia
a dia? Possivelmente uma resposta rápida seria: entreter, o que não está errado,
mas será que ela serve somente para entreter? A resposta é não, e como crian-
ças curiosas não nos cansamos de perguntar, por que não?

LITERATURA INFANTIL
171
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

“Ler é interpretar uma percepção sob as influências de um determinado


contexto. Esse processo leva o indivíduo a uma compreensão particular da
realidade.”
(Renata Junqueira de Souza)

Segundo Candido (1972), a literatura tem uma força humanizadora por apresentar
problemas sociais, pessoais, ter uma atuação social e psíquica, indagar a realidade
e seus costumes, aproximar de outros mundos e realidades, isto é, ela promove no
leitor um encontro consigo mesmo e com o outro, atuando diretamente na essên-
cia humana: seus sentimentos, vivências, sonhos, desejos, frustrações e vitórias.
Os contos de fadas oferecem figuras nas quais a criança pode externalizar
o que se passa na sua mente, de modo controlável. Os contos de fada mos-
tram à criança de que modo ela pode personificar seus desejos destrutivos
numa figura, obter satisfações desejadas de outra, identificar-se com uma
terceira, ter ligações ideais com uma quarta e daí por diante, como requei-
ram suas necessidades momentâneas (BETTELHEIM, 1978, p. 82).

Funções da Literatura
172 UNIDADE V

É mediante esse conceito da força humanizadora da literatura que Candido deli-


neia três funções: função psicológica, função formadora e função social. Assim,
verificaremos a definição dessas três funções:
■■ Função psicológica: é baseada na necessidade universal de ficção e fan-
tasia, “e isto ocorre no primitivo e no civilizado, na criança e no adulto,
no instruído e no analfabeto”, afirma Candido (1972, p. 83). Essa neces-
sidade é clara nas sociedades primitivas e seus desenhos rupestres, nos
mitos e lendas das sociedades não letradas, nas piadas simples e nos mais
complexos romances, assim a literatura cumpre essa função, pois “é uma

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
das modalidades que funcionam como resposta a essa necessidade uni-
versal”, afirma Candido (1972, p. 83).
■■ Função formativa: é entendida no processo histórico de que os países
civilizados basearam sua instrução nas letras, mas a literatura deve formar
os alunos, crianças, jovens, adultos e velhos do ponto de vista moraliza-
dor e pedagogizante? A resposta é simples: não, pois ela “pode formar;
mas não segundo a pedagogia oficial [...]”, definida normalmente “[...]
conforme os interesses dos grupos dominantes”, diz Candido (1972, p.
4). Por isso, muitas vezes a literatura é “expurgada” da sala de aula, pois é
difícil acomodá-la ideologicamente, a sua riqueza pode levar à perversão
e subversão e muitos educadores preferem obras infantis moralizantes,
segundo as convenções da época, do que uma obra com valor literário e
artístico elevado. Assim, o autor entende que “a literatura atua (forma-
tivamente), como a vida, ensina na medida em que atua com toda a sua
gama”, ensina para o bem e para o mal e ele continua reforçando a ideia
de que “é artificial querer que ela funcione como manuais de virtude e
boa conduta”, afirma Candido (1972, p. 84).
■■ Função social: é fundamentada na ideia de que a literatura nos propor-
ciona conhecer o mundo e a nós mesmos. Candido (1972, p. 86) diz que
“a obra significa um tipo de elaboração das sugestões da personalidade e
do mundo que possui autonomia de significado”, isso não ajuda a enten-
der que a “autonomia” da obra não a desliga do mundo real, de inspirações
reais, nem tão pouco a torna um simples relato da realidade corrente, pois
a ficção atua livremente sobre ela, por isso “o leitor se sente participante
de uma humanidade que é a sua, e deste modo, pronto para incorporar
à sua experiência humana mais profunda”, afirma Candido (1972, p. 90).

LITERATURA INFANTIL
173

Após estudarmos essas três funções da literatura, fica mais clara a expressão usada
pelo autor: “força humanizadora da literatura”, pois a literatura é um dos meios
de nos aproximarmos mais de nós e dos outros; podemos, assim, nos defrontar
com nossos medos, amores, sonhos, tristezas, alegrias etc.
Ler sempre representou uma das ligações mais significativas do ser hu-
mano com o mundo. Lendo reflete-se e presentifica-se na história. O
homem, permanentemente, realizou uma leitura do mundo. Em pa-
redes de cavernas ou reconhecendo-se capaz de representação. Certa-
mente, ler é engajamento existencial (CAVALCANTI, 2002, p. 13).
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Essa humanização se torna ainda mais relevante à medida que imaginamos a


formação das crianças que estão experimentando suas primeiras sensações, temo-
res, dúvidas e afirmações, ou seja, estão humanizando-se, por isso a literatura
de boa qualidade deve estar presente em toda formação escolar, principalmente
nos anos inciais.

CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS DA LITERATURA


INFANTIL

Quando pensamos na literatura infantil, normalmente a entendemos como


uma coisa menor, mais simples que a literatura feita para adultos. Será que isso
é verdade? A resposta, por mais que ainda possa espantar alguém, é não, pois “a
literatura infantil e a literatura para o público adulto apresentam a mesma essên-
cia, as diferenças estão na natureza do leitor/receptor, ou seja, a criança”, afirma
Coelho (2000, p. 27-31). Isso deixa claro que a literatura infantil não é algo feito
de qualquer jeito e com menor valor artístico e/ou cultural, a autora afirma que
“a literatura infantil é, antes de tudo, literatura [...]”.

Características Essenciais da Literatura Infantil


174 UNIDADE V

Assim, toda teoria literária usada para análise de textos adultos também serve
para a literatura infantil; é evidente que cada nicho literário tem suas particulari-
dades, mas são literatura, isto é, cada gênero literário se utiliza de uma linguagem
que se particulariza diante de seu contexto; as histórias em quadrinho, a poesia, a
narrativas longas, os contos e tantas outras formas articulam-se em seus objetivos
artísticos por meio de uma linguagem que será avaliada como de boa ou má qua-
lidade e não simplesmente como infantil e simplória ou para adultos.
Esclarecido isso, podemos expor algumas das características mais comuns
na literatura infantil:

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
■■ o conteúdo deve ser acessível;
■■ ausência de temas adultos;
■■ narrativas relativamente curtas;
■■ presença de estímulos visuais;
■■ linguagem adequada à faixa etária;
■■ apresentando um fato ou uma história de maneira clara;
■■ possuem mais diálogos e diferentes acontecimentos;
■■ poucas descrições;
■■ as crianças são os principais persona-
gens da história;
■■ características melódicas (ritmo, rimas);
■■ brincadeiras fônicas e vocabulares;
■■ jogo lúdico, sensorial e sinestésico;
■■ junção entre as linguagens (letras, dese-
nhos e outros estímulos).

LITERATURA INFANTIL
175

Segundo Sosa (1978), são quatro os elementos necessários para atender às expectati-
vas da criança: o caráter imaginoso, o dramatismo, a técnica do desenvolvimento e a
linguagem. A imaginação é fonte primária do texto infantil, o dramatismo se refere à
tensão e aos conflitos, e a técnica de desenvolvimento e de linguagem se diferencia da
literatura voltada para o público adulto para se adaptar ao nível intelectivo da criança.
As obras direcionadas às crianças não podem ser consideradas inferiores
tematicamente e artisticamente, pois elas constituem uma criação que utilizará
valores estéticos para proporcionar uma experiência qualitativa.
O leitor criança se sente estimulado a continuar uma obra quando encontra
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

nela o caráter imaginoso dado pelos mitos, aparições da antiguidade, monstros


ou realidades dos tempos modernos expostos em qualquer das formas expres-
sivas: lenda, conto, fábula, quadrinhos etc. Essa diversidade é que privilegia a
“força humanizadora”, como debatemos. Conforme Sosa (1978, p. 19), “o espí-
rito da criança precisa do drama, da movimentação das personagens, da soma
das experiências populares e tudo isso dito por meio das mais elevadas formas de
expressão e com inegável elevação de pensamento”. Nesse sentido, a obra literá-
ria de qualidade promove o diálogo entre a realidade e o sonho, entre a fantasia
e o cotidiano, uma experiência enriquecedora para esse jovem leitor.
Notamos facilmente que nem sempre a literatura direcionada à criança
valorizava essencialmente o universo infantil, seu domínio linguístico, suas expe-
riências, mas sim era intitulada às crianças e realmente direcionada para um
campo semântico e de cognição adulto; assim, o texto precisava passar, neces-
sariamente, pelo filtro interpretativo do leitor adulto antes de chegar à criança.
Veja a diferença entres os seguintes poemas: um escrito por Olavo Bilac e outro
por Vinícius de Moraes, ambos com o título “A casa”.

Características Essenciais da Literatura Infantil


176 UNIDADE V

Quadro 1 – Exemplos dos poemas A casa

A casa A casa

Olavo Bilac Vinícius de Moraes

Vê como as aves têm, debaixo d’asa Era uma casa


O filho implume, no calor do ninho!... Muito engraçada
Deves amar, criança, a tua casa! Não tinha teto
Ama o calor do maternal carinho! Não tinha nada
Dentro da casa em que nasceste és tudo... Ninguém podia

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Como tudo é feliz, no fim do dia, Entrar nela não
Quando voltas das aulas e do estudo! Porque na casa
Volta, quando tu voltas, a alegria! Não tinha chão
Aqui deves entrar como num templo, Ninguém podia
Com a alma pura, e o coração sem susto: Dormir na rede
Aqui recebes da Virtude o exemplo, Porque na casa
Aqui aprendes a ser meigo e justo. Não tinha parede
Ama esta casa! Pede a Deus que a guarde, Ninguém podia
Pede a Deus que a proteja eternamente! Fazer pipi
Porque talvez, em lágrimas, mais tarde, Porque penico
Te vejas, triste, desta casa ausente... Não tinha ali
E, já homem, já velho e fatigado, Mas era feita
Te lembrarás da casa que perdeste, Com muito esmero
E hás de chorar, lembrando o teu passado... Na rua dos Bobos
_ Ama, criança, a casa em que nasceste! Número Zero

Poema publicado em Poesias Infantis. Poema publicado no livro A Arca


Rio de Janeiro: Francisco Alves. 1929. de Noé. São Paulo: Companhia das
Letras, 1991.
Fonte: os autores.

Verificamos um tom moralista e pedagogizante no poema de Bilac, que vem


acompanhado por uma linguagem mais apropriada a jovens e adultos, enquanto
no poema de Moraes explora-se o universo da fantasia em uma linguagem meló-
dica e acessível ao leitor infantil.

LITERATURA INFANTIL
177

Você conhece esse livro “Poesias Infantis”, de Olavo Bilac? Não? Então acesse
o site e leia na íntegra todos os poemas publicados no livro disponivel em:
<http://www.literaturabrasileira.ufsc.br/_documents/poesias_infantis_de_
olavo_bilac-1.htm>. Porém, leia atentamente o tópico “Ao leitor” e descubra
as indagações e reflexões que o autor faz sobre a dificuldade em escrever
para o público infantil; o interessante é que ao final o próprio autor pede
desculpas se ele não conseguiu atingir o seu objetivo.
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Vimos anteriormente, em um de seus poemas, que mostra uma preocupa-


ção moral e uma linguagem inacessível; será que os outros poemas seguem
essa mesma linha de criação? Confira isso lendo diretamente todos os seus
poemas.
Fonte: os autores.

Nem sempre a literatura infantil valorizou efetivamente as crianças e seu uni-


verso ficcional. Nelly Novaes Coelho (2000), estudiosa da literatura infantil
brasileira, assinala um conjunto de características estilísticas e estruturais da
literatura infantil, as quais são:

Sequência narrativa
■■ Propõe problemas a serem solucionados de maneiras diferentes.
■■ Coparticipação nas soluções.
■■ Não apresenta respostas prontas.

Personagens
■■ Individualidades que se incorporam no grupo-personagem.
■■ Valorização de grupos, patotas, a personagem-coletiva.
■■ Espírito comunitário - individualidade do herói está pouco presente.
■■ Personagem questionadora que põe em xeque as estruturas prontas, um
convite à reflexão.

Características Essenciais da Literatura Infantil


178 UNIDADE V

Voz narradora
■■ Mais consciente da presença de um leitor possível.
■■ Tom mais familiar e até de diálogo.
■■ Não trata o leitor como receptor da mensagem, pois não há passividade.

Espaço
■■ Preocupação crescente em mostrar as relações existentes no espaço, a fim
de conduzir à reflexão.

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Nacionalismo
■■ Busca das origens para definir a brasilidade em suas multiplicidades
culturais.
■■ Delimitar uma nova maneira de ser no mundo, a brasileira.

Exemplaridade
■■ Deixa de ser usada somente com intenção pedagógica e passa a revelar a
ambiguidade natural do ser humano.
■■ Tende a ser uma maneira de propor problemas a serem resolvidos e esti-
mular a optar conscientemente nos momentos de agir.

Essas características da literatura infantil foram e estão sendo construídas den-


tro de um processo histórico de emancipação e valorização do papel da criança
na sociedade, na família e na escola, promovendo a sua inserção de forma signi-
ficativa e real, deixando de ser um apêndice nesses ambientes e na ficção.

LITERATURA INFANTIL
179
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BREVE HISTÓRIA DA LITERATURA INFANTIL

A origem dos primeiros escritos para as crianças encontra-se na Novelística Popular


Medieval, que teve suas origens na Índia, com narrativas oriundas de séculos a.C.,
difundidas pelo mundo pela tradição oral. O “Livro dos Cinco Ensinamentos”,
datado dos séculos V e VI a.C., é o registro de produção literária infantil mais antiga.
Escrito em sânscrito e dotado de conteúdos religiosos e políticos, era usado para
ensinamentos de moral, política e religião pelas fábulas e narrativas. Com origens
no Oriente, as narrativas foram reinventadas na Grécia por Esopo (séc. VI a.C.),
e no século seguinte foram enriquecidas estilisticamente pelo escravo romano
Fedro (século I a.C.), as quais só ganharam popularidade no século X. Comênio,
um educador tcheco, lançou em 1658, com propósito lúdico e pedagógico, o pri-
meiro livro infantil ilustrado “O Mundo em Quatro Quadros”.

Breve História da Literatura Infantil


180 UNIDADE V

Porém, a Literatura Infantil foi constituída como gênero durante o século


XVII, época em que as mudanças na estrutura da sociedade desencadearam o
início da ascensão da família burguesa. Dessa forma, emerge a necessidade de
organização da escola e a Literatura Infantil se converte em instrumento pedagó-
gico. No final do século XVII, na França, foram produzidas as primeiras obras para
crianças: As Fábulas (1668) de La Fontaine; os Contos da Mãe Gansa (1691/1697)
de Charles Perrault; os Contos de Fadas (1696/1699) de Mme. D’Aulnoy e Telêmaco
(1699) de Fénelon (COELHO, 2000). Esse século passado é conhecido como o
século do ensaio para o surgimento da literatura infantil.

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A França do século XVII foi, então, o berço dessa literatura voltada às crian-
ças, um exemplo disso é Charles Perrault, que escreveu muitas das histórias que
você leu na sua infância e, possivelmente leu e/ou lerá para seus filhos e alunos.
Vamos conferir? Quem nunca leu: A Bela Adormecida no Bosque, Chapeuzinho
Vermelho, O Barba Azul, O Gato de Botas, As Fadas, Cinderela (também conhe-
cida como Borralheira ou Gata Borralheira ou Sapatinho de vidro), Henrique do
Topete e O Pequeno Polegar? Todas essas histórias estão inseridas no livro “Os con-
tos da Mamãe Gansa”.
Charles Perrault era um católico convicto, funcionário da corte de Luís XIV,
e seus escritos para o público infantil possuíam cunho pedagógico e moralizante
para serem incutidos nos pequenos leitores. Perrault recolheu histórias populares
e deu a elas tratamento literário; assim, elas passaram a fazer parte dos contos de
fadas de cunho popular não endereçados à burguesia (COELHO, 2000).
Perrault realizou a literalização dos contos folclóricos, de tradição popular
e oral adulta, transformando em contos de fadas que passaram a ser adotados e
consolidados como literatura infantil, ajustados ao gosto e ao propósito da classe
aristocrática da corte francesa. Esses acontecimentos reforçam as afirmações de
Lajolo & Zilberman (1999, p. 32), de que a literatura tem seus fundamentos na ora-
lidade e se encontra profundamente ligada às raízes da literatura popular, confiando
que as crianças gostariam de ler nos livros as histórias que as babás, ex-escravas e as
mães lhes contavam. Muitas das narrativas publicadas por Perrault foram repagi-
nadas mais de um século depois pelos irmãos Grimm (Jacob e Wilhelm Grimm),
estudiosos do folclore alemão que viajaram em 1800 por toda a Alemanha, pre-
ocupados em fixar as narrativas orais de seu país. O interesse deles também não

LITERATURA INFANTIL
181

era as crianças, mas, em 1815, demonstraram preocupação com o estilo, a sensi-


bilidade, a ingenuidade, a fantasia e o poético (COELHO, 2000).
Se foi e é um bom leitor, provavelmente conhece os alemães Jacob e Wilhelm?
Não? Jacob e Wilhelm Grimm, popularmente conhecidos como os Irmãos Grimm,
desenvolveram pesquisas e estudos linguísticos coletados por meio da memória
popular, pela tradição oral, narrativas, lendas e sagas germânicas. Como estudio-
sos da língua alemã, desenvolveram dois objetivos pela coleta das histórias orais:
o levantamento de elementos linguísticos para a fundamentação dos estudos filo-
lógicos da língua alemã e a fixação dos textos literários folclóricos germânicos.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Especificamente em 1812, os irmãos Grimm fundiram o universo popular ao


infantil e dedicaram às crianças por sua temática mágica a publicação de “Histórias
das Crianças e do Lar”, com 51 narrativas. Seus contos agradavam tanto os adul-
tos como as crianças, pois continham o fantástico, a fantasia e o mítico. A mais
famosa obra dos irmãos foi “Contos de Fadas para Crianças e Adultos”, publicada
entre 1812 e 1822, em que constavam os contos: A Bela Adormecida, Os Músicos
de Bremen, Os Sete Anões e a Branca de Neve, O Chapeuzinho Vermelho, A Gata
Borralheira, As Aventuras do Irmão Folgazão, O Corvo, Frederico e Catarina, O
Ganso de Ouro, A Alfaiate Valente, O Lobo e as Sete Cabras, O Enigma, O Pequeno
Polegar, Joãozinho e Maria, entre outros. Os textos percorreram mundo afora e
ganharam novas versões e traduções que fascinavam pessoas de diferentes lín-
guas e culturas. Eram dotados de mensagens positivas que contribuíam para
uma fixação da ética e da moral pela estética literária.
Em publicações como “O menino pastor e O pequeno polegar”, os Grimm
retrataram a criança com suas características típicas, como a perspicácia, sua
sabedoria nata, sua vontade em sair pelo mundo vivendo suas próprias experiên-
cias e aventuras e depois voltar como num renascimento. Os irmãos retrataram a
criança ativa, incansável, usando todas as suas energias para descobrir o mundo
exterior e depois se voltando para si, num processo de autoconhecimento.
Em “Joãozinho e Mariazinha”, retrataram problemas de carência vividos
pelas crianças, a pobreza, falta de comida, de afetividade, a mãe falecida e a cria-
ção pela madrasta, que os abandona na floresta. Lá eles enfrentaram o mundo
desconhecido e conseguiram resolver os problemas pensando e agindo juntos
(ABRAMOVICH, 2004).

Breve História da Literatura Infantil


182 UNIDADE V

Você não conhece todas as histórias escritas pelos Irmãos Grimm? Não deixe
de ler, aventurar-se e estudar as suas narrativas, pois todas as suas publicações
estão traduzidas e disponíveis gratuitamente no site disponível em: <http://
www.grimmstories.com/pt/grimm_contos/index?page=1>. Boa Leitura!
Fonte: os autores.

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Somente no século XVIII é que as características peculiares às crianças passam a
ser percebidas como seres potenciais que poderão servir no futuro para a manuten-
ção do status quo. Sua educação começa a ser mais elaborada e fundamentada na
preparação para o egresso na vida adulta. Consolidam-se as instituições burguesas
com a industrialização, o que fez com que os livros infantis fossem produzidos em
maior escala. Esse século é conhecido como o século do aparecimento da Literatura
Infantil. Os livros publicados nessa época agradaram adultos e crianças e alguns
títulos se imortalizaram, como Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, publicado em
1719 e Viagens de Guliver, de Jonathan Swift, publicado em 1726.
O século XIX é conhecido como o século do desenvolvimento da literatura
infantil; o campo é fértil para a produção literária, isso porque a criança passou
a receber atenção especial para seu crescimento físico, psicológico e cognitivo,
surgindo, então, novos conceitos de vida, educação e cultura, abrindo novos
caminhos na área pedagógica e literária (LAJOLO; ZILBERMAN, 1999).
O grande destaque desse século é Hans Christian Andersen, pois seus tex-
tos transbordavam emoções, lirismos e fantasias em seus contos que encantam
até os dias atuais. Dentre suas criações consta o Soldadinho de chumbo, O pati-
nho feio, A pequena Sereia, A roupa nova do Rei, dentre outros. Sua obra foi tão
marcante que o dia de seu nascimento (02 de abril de 1805) é consagrado hoje
como o Dia Internacional do Livro Infantil.

LITERATURA INFANTIL
183

Christian Andersen nasceu a 2 de Abril de 1805, em Odense, na Dinamarca,


no seio de uma família humilde. Depois da morte do pai, que lhe costumava
contar histórias com a ajuda de um teatro de fantoches, mudou-se para Co-
penhaga. Nunca casou nem teve filhos e, em 1835, publicou os dois primei-
ros dos 156 contos que haveria de escrever, inspirado no mundo de fadas e
duendes e na tradição popular dinamarquesa. Morreu em Copenhague no
dia 4 de Agosto de 1875.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Para saber mais, acesse o link disponível em: <http://guida.querido.net/an-


dersen/index.html>.

Além dos Irmãos Grimm e Hans Christian Andersen, despontaram autores e obras
que se tornaram best-sellers, como: Lewis Carroll - Alice no País das Maravilhas;
Collodi – Pinóquio; Jules Verne - A Volta ao Mundo em 80 Dias, entre outros.
Tais autores muito contribuíram com a produção literária destinada ao público
infantil na Europa e no mundo.
Mesmo com uma evolução da literatura infantil e um novo olhar dos escrito-
res para esse público, muitos textos no século XIX e XX estavam direcionados à
infância associando a literatura infantil a um instrumento pedagógico institucional
escolar, que os educadores e pedagogos utilizavam com objetivo utilitário-pe-
dagógico, esquecendo-se, na maioria das vezes, do caráter lúdico, sensorial,
artístico e cultural da obra.
Foi nesse contexto que a escola se constituiu em reprodutora da sociedade
burguesa, segundo Zilberman (2003), negando o social e introduzindo precei-
tos normativos excludentes, taxando a visão burguesa da realidade como sendo
a de maior valor.

Breve História da Literatura Infantil


184 UNIDADE V

No fim do século XIX e início do XX ocorre a consolidação da literatura


infantil e a sua presença na escola; naturalmente o contexto da criança, família
e sociedade eram diferentes dos século XVII, XVIII e início do XIX, pois havia
grandes transformações que responsabilizavam a escola e a família pelos cuidados
totais às crianças. Segundo Coelho (2000), é nesse momento que a criança passa
a ter valor e a ser levada em consideração no processo e nas interações sociais.
O século XX é grande momento da expansão da literatura infantil promovida
por novos autores, uma nova visão de mundo e da infância, pelos grandes avan-
ços da imprensa e maior acesso às produções literárias promovido pela ascensão

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
da burguesia. Há, nesse século, um novo grupo de ávidos e jovens leitores que
exigem boa literatura, por isso este é considerado o grande momento de conso-
lidação e crescimento do mercado editorial para crianças e jovens.

A LITERATURA INFANTIL NO BRASIL

O universo das letras inicia realmente quando o Brasil era um colônia, mas por
força do destino, e a ameaça de Napoleão de invadir Portugal de D. João VI, a
família real vem à Colônia (1808) e eleva o Brasil a Reino Unido de Portugal, Brasil
e Algarves, estabelecendo-se no Rio de Janeiro, que passou a sediar uma corte
europeia e a ter condições de igualdade com as cidades da metrópole.
Nesse momento, algumas inovações e modernizações ocorreram no Brasil,
advindas das necessidades e aparatos das corte portuguesa, uma delas é a imprensa
nacional, uma das providências para a modernização da
colônia que passava a ter status de sede real, dando
início, assim, à produção de escritos impressos em
terras brasileiras. Isso proporcionou que algu-
mas obras literárias voltadas para as crianças
começassem a ser publicadas. Em 1818,
foram “As aventuras pasmosas do Barão de
Munkausen”, seguidas da coletânea de José
Saturnino da Costa Pereira, “Leitura para
meninos”, contendo uma coleção de histórias

LITERATURA INFANTIL
185

morais relativas aos defeitos ordinários às idades tenras, e um diálogo sobre geo-
grafia, cronologia, história de Portugal e história natural. Em 1848, “Aventuras
do Münchausen” foi reeditada com uma alteração gráfica.
Naturalmente, o Reino Unido do Brasil era recheado por uma população
analfabeta e a tradição das histórias orais era intensamente presenciada e era mar-
cada por histórias místicas, folclore das culturas indígenas, africanas e europeias,
que também ocupavam o lugar da literatura escrita, até porque a leitura não fazia
parte da realidade social brasileira. O universo infantil das classes mais abasta-
das era permeado pelas leituras vozeadas de suas amas e babás. No decorrer do
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

século XIX, com a expansão da educação formal, ocorreu a produção e confi-


guração de uma literatura infantil verdadeiramente direcionada para o jovem
público brasileiro. Começaram a surgir algumas publicações, em sua maioria,
traduções e adaptações de obras estrangeiras.
No fim do século XIX, o Brasil, já independente, passa por várias transfor-
mações: em 1888 ocorre a abolição da escravatura e, em 1889, a Proclamação da
República. Esta tinha como princípio a formação de uma sociedade participativa
da vida social com poder de argumentação de fala e escrita. Com a implantação
da República, preconizada pelo aparecimento de uma classe média urbana que
buscava mudanças sociais e políticas, foram surgindo os primeiros livros infan-
tis em atendimento às solicitações dessa classe emergente.
Para Zilberman (2003), devido à ausência de tradição nacional para escritos
literários destinados às crianças, foram encontradas quatro soluções para atender
às emergências sociais: traduzir obras estrangeiras; adaptar para as crianças obras
escritas originalmente para adultos; reciclar material escolar, pois os leitores eram
alunos que já estavam acostumados a usar o livro didático; e ainda, apelar para a
tradição popular. Segundo a mesma autora, Carlos Jansen e Figueiredo Pimentel
foram os pioneiros nas traduções e adaptações das obras estrangeiras para as crian-
ças e, como vimos, Olavo Bilac também participa dessa produção direcionada a elas.
No início do século XX, Bilac já era um escritor de prestígio no Brasil por
sua literatura adulta, contudo, decide adentrar na literatura infantil com contos
e poemas. Esses textos tiveram um tom moralizante e muito apropriado para a
escola da época, com um nacionalismo ufanista bem presente, como verifica-
mos em: “Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste! / Criança! Não verás

Breve História da Literatura Infantil


186 UNIDADE V

país nenhum como este!” (BILAC, 1929, on-line s.p)3. Foram leituras obrigató-
rias em várias gerações de crianças brasileiras.
A primeira publicação feita no Brasil com grande repercussão no meio esco-
lar foi “Livro do Povo“ de Antonio Marques Rodrigues, impresso pela Tipografia
do Frias, com primeira edição em 1861, com 208 páginas e uma tiragem de 4.000
exemplares. Nesse mesmo molde foram publicados: “Método Abílio”, por Abílio
César Borges; “O Livro do Nenê”, por Meneses Vieira; “Série Instrutiva”, por Hilário
Ribeiro; entre outros. Logo após esta fase, contos para a diversão da infância come-
çaram a ser escritos por autores nacionais, como os “Contos Infantis”, de Júlia Lopes

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de Almeida. “Contos da Carochinha” foi a primeira coletânea brasileira de literatura
infantil, com o intuito de traduzir, para a Língua Portuguesa, contos estrangeiros de
sucesso, uma iniciativa tomada por Alberto Figueiredo Pimentel, dotado de fama
pela sua busca de popularização da literatura no Brasil. Mais algumas obras e auto-
res: “Livro das Crianças”, de Zalina Rolim; “Leituras Infantis”, de Francisco Vianna;
“Era Uma Vez”, de Viriato Correia; “Biblioteca Infanto”, de Arnaldo Barreto.
Nos vinte primeiros anos do século XX, a literatura infantil esteve associada
intimamente aos interesses educacionais e do Estado, isto é, com fins didáticos.
Isso realmente muda com a obra “As Reinações de Narizinho”, 1931, de Monteiro
Lobato, livro que serve de mola propulsora para a futura série “Sítio do Picapau
Amarelo”, conhecida e reconhecida nacional e internacionalmente.
Muitos autores produziram boas obras para as crianças nos anos de 1930 a
1960, como: Érico Veríssimo, Luís Jardim, Lúcio Cardoso, Graciliano Ramos,
Guilherme de Almeida, Henriqueta Lisboa e Cecília Meireles.
Em 1959 a Câmara Brasileira do Livro (CBL) lança o prêmio Jabuti, ideali-
zado por Edgar Cavalheiro, tornando-se hoje o prêmio nacional mais importante
da literatura nacional. Nos anos vindouros, ocorreu uma expansão de instituições
e programas voltados para a ampliação da leitura e a discussão da literatura infan-
til: em 1966, a FNLE (Fundação do Livro Escolar), em 1968 a FNLIJ (Fundação
Nacional do Livro Infantil e Juvenil), em 1973 o CELIJ (Centro de Estudos de
Literatura Infantil e Juvenill), em 1979 a ABLIJ (Academia Brasileira de Literatura
Infantil e Juvenil) e também várias Associações de Professores de Língua e Literatura
(LAJOLO; ZILBERMAN, 1999). Instituições que impulsionaram as produções lite-
rárias de autores nacionais. Nesse período, há uma grande expansão do mercado

LITERATURA INFANTIL
187

editorial voltado a crianças e jovens, promovido por bons escritores, ilustradores


e um público leitor/consumidor dessas obras nacionais e internacionais.
Os anos 1970 foram considerados o boom da literatura infantil, atingindo
seu ápice nos anos 1980, quando ocorre uma produção em massa de literatura
infanto-juvenil, além de surgirem críticos destinados a avaliarem estas produções.
Nessa fase, ocorre a ampliação da classe média e aumenta o nível de escolari-
dade, fator que colabora com o aumento do público leitor.
As produções literárias infantis da década de 1970 carregavam uma proposta
estética e ideológica diferente. As ideias centrais das obras buscavam resgatar o
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

real de maneira crítica e criativa e desmistificada para a criança, com coerência


entre o tema, o estilo e as ações do personagem para passar a imagem de verossi-
milhança, ampla tendência neorealista na literatura brasileira. A literatura passou
a ser produzida com uma linguagem coloquial sem dificuldades de comunicação
e personagens com identificação próxima dos leitores (PONDÉ, 1985).
Nos últimos trinta anos do século XX, ocorreram os grandes debates, con-
gressos e estudos sobre a literatura infanto-juvenil, promovendo não só novos
autores, mas também novas críticas e a introdução dessa disciplina nos cursos
de licenciatura de Letras em todo o país, formando profissionais aptos a discu-
tir e trabalhar essas mudanças na escola brasileira.
Com a morte de Lobato, o período ficou conhecido como pós-lobatiano e
também como período de renovação; os autores desse período foram conside-
rados herdeiros de Lobato. Dentre os novos autores, destacam-se Ana Maria
Machado, Bartolomeu Campos de Queirós, Elvira Vigna, João Carlos Marinho,
Lygia Bojunga Nunes, Ruth Rocha, Ziraldo etc.
Nos anos 1980, 1990 e 2000 houve a consolidação de uma literatura infan-
til de qualidade. Marcado pelo pós-modernismo, esse período de transição da
política brasileira tem como características a heterogeneidade, pluralidade de
vozes, de estilos, de gêneros e de visões de mundo. Caracteriza-se pela temática
predominantemente urbana, com ênfase nos estilos pessoais e na exploração de
novas técnicas narrativas.
Nesse período, fim do século XX e início do XXI, duas escritoras brasileiras e
um ilustrador venceram do prêmio Hans Christian Andersen, em 1982. Ganhou
o prêmio a escritora Lygia Bojunga Nunes, com o livro A bolsa amarela; em 2000,

Breve História da Literatura Infantil


188 UNIDADE V

Ana Maria Machado com o livro Bisa Bia, Bisa Bel; em 2014, Roger Mello ganhou
como melhor ilustração infantil do ano, e já havia sido indicado ao prêmio duas
vezes. Outros autores também se tornaram grandes expoentes literários, como
Ziraldo (O menino maluquinho), Orígenes Lessa (Memórias de um cabo de vas-
soura), Ruth Rocha (Marcelo Marmelo Martelo), Chico Buarque (Chapeuzinho
Amarelo), Sylvia Orthof, Marina Colasanti, Roseana Murray e Pedro Bloch.

MONTEIRO LOBATO: A TRANSFORMAÇÃO DA LITERATURA

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
INFANTIL NO BRASIL

“[...] para ocorrer uma mudança de postura é necessário que haja compro-
misso em querer mudar.”
(Paulo Freire)

José Bento Monteiro Lobato, nascido na cidade de Taubaté, interior de São Paulo,
no dia 18 de abril de 1882, foi o autor que mais escreveu para crianças, sendo a
sua obra considerada a mais extensa da literatura infantil de que se tem notícia.
No período de 1925 a 1950, foram vendidos um milhão e meio de exemplares
de seus livros. Tantos personagens e histórias que ainda fazem parte do imagi-
nário de muitas crianças e adultos.
Um panorama resumido da vida de José Monteiro Lobato mostra um homem
nacionalista, militante convicto que queria melhorar o mundo a começar pelo
Brasil. Descobriu que já não era mais possível mudar os adultos e passa a escrever
para as crianças, as quais não precisam ser transformadas, mas formadas, livres
para pensar como numa frase das fábulas de Monteiro, descrita por Abramovich
(1983, p. 37), em que Emília diz para um cão: “ – Pois o segredo, meu filho, é um
só: liberdade. Aqui não há coleiras. A grande desgraça do mundo é a coleira. E
como há coleiras espalhadas pelo nosso mundo!”.

LITERATURA INFANTIL
189

Zilberman (2003) explica que essa forma de escrever na literatura infantil


pode ter sido usada como uma válvula de escape no período ditatorial por onde
os produtores culturais, escritores, ilustradores e artistas em geral tiveram con-
dições de manifestar ideias libertárias sem chamar tanto a atenção por se tratar
de literatura com pouca notoriedade social. Esse foi o instrumento utilizado por
Lobato e seus seguidores para incutir nas crianças o ideal de liberdade. Pioneiro
nas indústrias de ferro, na campanha do petróleo, no sistema de distribuição de
livros que montou pelo Brasil, pela criação de uma indústria gráfica e editoras,
Lobato não almejava ficar rico, mas sim tornar rico seu país, onde todos pudes-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

sem ter acesso aos bens de consumo. Conforme relato de Lajolo (2002), Lobato,
em 1930, declara à sua irmã que estava endividado e financeiramente depen-
dente dos lucros de suas produções literárias.
Em sua obra deu voz de liderança para as mulheres, o sítio do pica-pau ama-
relo era todo comandado por mulheres, reconhecendo seus atributos. Em 1933,
anuncia a Anísio Teixeira a produção de Emília no país da gramática. Ciente
da carência de livros didáticos para as crianças, em 1933 publica Aritmética de
Emília, Geografia de Dona Benta e Histórias das invenções.
Exímio tradutor e adaptador de clássicos da Literatura Infantil, em 1936
Lobato lança o livro D. Quixote das crianças, adaptando o clássico para a lei-
tura infantil, com linguagem inteligível para essa faixa etária. A história de Dom
Quixote é contada por meio das leituras de Dona Benta, que deixa claro para
as crianças as diferenças entre a obra original e a adaptação feita para elas e que
devem ler a história original na íntegra.
Sua forma de escrever foi inovadora para o padrão brasileiro e audaciosa,
porque continuou incorporando suas ideias nacionalistas antes reportadas nas
produções para adultos. A importância deste autor é tanta que a data de seu
nascimento, 18 de abril, é consagrada como o Dia Nacional do Livro Infantil.
Monteiro Lobato é reverenciado até hoje pela crítica especializada.
Um ponto muito importante é que a leitura dos livros de Lobato nas escolas
foi responsável pela descoberta do prazer em ler para muitos dos demais autores
renomados que temos hoje; segundo relato de Abramovich (1983), ela própria
e outros autores como Ruth Rocha tiveram seus gostos pela leitura e literatura
infantil despertados por Monteiro Lobato.

Breve História da Literatura Infantil


190 UNIDADE V

Monteiro Lobato introduziu, por meio dos seus personagens mirins, uma
literatura direcionada para o público infantil com cunho genuinamente brasileiro,
sem vestígios da literatura estrangeira presentes nas traduções que circulavam
nacionalmente. Publicou “Narizinho Arrebitado”, que mais tarde, pelo sucesso
alcançado, foi reeditado como “Reinações de Narizinho”. E a partir das suces-
sivas e bem acolhidas produções literárias, passou a editar as próprias obras
fundando a Editora Monteiro Lobato & Cia., Companhia Editora Nacional e a
Editora Brasiliense. Com o crescimento e enriquecimento do fabuloso mundo
de suas personagens, Lobato ganhou popularidade por inserir em sua obra

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
uma realidade comum e familiar à criança. A mais absoluta verossimilhança e
naturalidade passa a ser o elemento integrante do real, absorvendo com isso o
universo literário infantil com absoluta naturalidade, sem deixar de lado o fan-
tástico mundo da imaginação infantil. Sua obra preocupou-se em transmitir às
crianças o conhecimento da tradição, o conhecimento do acervo herdado e que
lhes caberia transformar e também questionar as verdades, os valores e não valo-
res sedimentados na sociedade.
As obras lobatianas são enriquecidas pelo folclore, pela exaltação do nacio-
nalismo e pelo engajamento social. Os personagens infantis em suas obras são
a grande metáfora encontrada pelo autor para ecoar a insatisfação do mundo
adulto e retratar com idealização o panorama nacional almejado. Isso evidenciou
o caráter nacionalista de sua obra, retratado nos personagens pela linguagem,
imagem, comportamento e relação com a natureza.
Monteiro Lobato foi o primeiro autor brasileiro a romper significativamente
com o didatismo que impregnava os livros para crianças. Ele inovou ao escrever
textos com os quais as crianças se identificavam, bem como ao inverter valo-
res em algumas de suas obras. Fez da literatura infantil o grande instrumento
para a educação, realizado pela voz dos seus personagens fantásticos perante os
problemas político-econômicos e sociais. São as principais preocupações nacio-
nais observadas em suas obras: petróleo, analfabetismo, exploração das riquezas
naturais, saneamento básico e influência estrangeira sobre a economia brasileira.
Conseguiu explorar esses problemas aproximando a criança dos problemas coti-
dianos por meio da literatura infantil. Em sua obra mais expressiva, o “Sítio do

LITERATURA INFANTIL
191

Pica-Pau Amarelo”, faz interagirem os personagens reais (Narizinho, Pedrinho,


Dona Benta, Tia Nastácia etc.) com personagens irreais (Emília, Visconde, Rabicó,
Saci etc.), de modo que os dois universos se fundem numa mesma verdade, den-
tro do universo do faz de conta lobatiano, perdurando no tempo e fazendo com
que várias gerações convivam no atemporal sítio da família.
No período compreendido entre 1920 e 1942, Monteiro Lobato publicou
outras obras: “O Saci” – “Fábulas” – “O Marquês de Rabicó” – “A Caçada da Onça”
– “A Cara de Coruja” – “Aventuras do Príncipe” – “O Noivado do Narizinho”
– “O Circo de Cavalinho” – “A Pena de Papagaio” – “O Pó de Pirlimpimpim” –
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“Viagem ao Céu” – “As Caçadas de Pedrinho” – “Emília no País da Gramática”


– “Geografia de Dona Benta” – “Memórias de Emília” – “O poço de Visconde”
– “O Pica-Pau Amarelo” – “A Chave do Tamanho”, e também realizou várias
adaptações de contos clássicos da literatura infantil mundial.

LITERATURA INFANTIL: FORMAÇÃO LINGUÍSTICA E


CULTURAL

A inserção da literatura de qualidade na escola não é apenas para preencher um


aspecto lúdico tão importante para as crianças e adultos, mas sim porque a sua
formação linguística e cultural também ocorre por meio dos livros, por isso não
devemos limitar a literatura a apenas um momento de descontração, passatempo
ou divertimento, evidente que a literatura é fruição e também vincula-se a um
código de linguagem e a uma expressão cultural.
A literatura não pode servir apenas para expor regras e preceitos morais,
como afirma Magalhães (1987), o que ocorria no século XIX e início do XX, pois
as publicações infantis eram vinculadas a uma moral pedagogizante, uma ação
educativa, isto é, não se tratava a criança como criança e sim com um adulto
em formação, ensinando regras, costumes, crenças e valores vigentes na época.

Literatura Infantil: Formação Linguística e Cultural


192 UNIDADE V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Nos dias atuais, a literatura infantil ampliou-se, ganhou novas vestimentas e conquis-
tou as telas dos cinemas com reproduções de clássicos reproduzidos em desenhos
animados. Abramovich (2004) critica a supressão de cenas dos contos de fadas
expostos na literatura infantil a fim de adaptá-los ao cinema ou para fins didáticos
escolares. Nesse contexto, a fala de Abramovich (2004) tem respaldo na afirmação
de Bakhtin (2010), quando ambos afirmam que fragmentos de textos ou a supres-
são de partes deles destitui a unidade de sentido própria do texto escrito. Segundo
Bakhtin (2010), quando se analisa uma oração isolada perde-se o todo, perde-se o
contexto, perde-se o sentido, pois nenhum enunciado tem sentido fora da cadeia
de comunicação em que a oração isolada é apenas um elo inalienável. A oração iso-
lada, conforme Bakhtin (2010), é desprovida de expressividade, pois uma oração
só atinge a entonação expressiva no todo do enunciado. Por isso, o que se reco-
menda é a não substituição da leitura pelos filmes que retratam de forma comercial
o enredo de um conto de fada. Segundo Abramovich (2004), se no conto há cenas
as quais a criança não conseguirá entender, então deve-se mudar de leitura e espe-
rar a fase da maturação da criança para recomendá-la.
Refletindo sobre o assunto, devemos censurar livros e filmes para as crian-
ças? A primeira lição histórica que devemos sempre ter em mente é que a censura
nunca foi um método eficaz de esconder, apagar ou suplantar determinados

LITERATURA INFANTIL
193

assuntos ou práticas. Por isso, devemos pensar sempre com muita parcimônia e
cautela nesse assunto, pois não deve haver tema ou situação que não possa ser
tratada com as crianças, mas sim o modo como isso é feito é que deve ser pen-
sado por nós educadores, assim invertemos a pergunta retirando o conceito da
censura e introduzindo a ideia da adequação: esse livro, essa temática, essa abor-
dagem está adequada a essa faixa etária?
Dessa forma, conseguimos promover na escola avanços significativos na forma-
ção integral desse aluno e não um aluno que nunca tratou sobre a morte, a tristeza,
o medo, o futuro, a frustração, o sonho, a família, a alegria e tantos outros assuntos
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importantes para formação de qualquer ser humano. Entendemos aqui que o pri-
mordial na escola é desenvolver e cultivar o gosto pela leitura para que chegue o
momento em que esse aluno caminhe com suas próprias pernas no mundo da ficção.
Desenvolver o gosto pela leitura é uma das tarefas da escola, que deve ser
criteriosa na aquisição de livros para sua biblioteca. Em visitas periódicas à biblio-
teca ou no cantinho de leitura na sala de aula, os alunos devem ser incentivados
a lerem livros variados, adequados à faixa etária, de culturas e opiniões diver-
sas, com visões de mundo diferentes. A cada avanço na leitura, novos desafios
devem ser propostos, leituras mais apuradas devem ser sugeridas, textos mais
longos, conteúdos mais explicativos.
Pode-se dizer que a literatura infantil é o resultado da interação entre inten-
ção pedagógica e intenção lúdica que, por sua vez, estimula a criatividade de uma
forma geral, promovendo a aprendizagem.
São três os aspectos que promovem interação entre o lúdico e o pedagógico,
conforme descreve Coelho (2000):
■■ Aspecto psicofísico - a literatura infantil estimula as funções motoras e
intelectuais das crianças, contribui com a formação da personalidade, do
desenvolvimento do imaginário e do espírito crítico infantil.
■■ Aspecto de natureza social - a criança adquire melhores condições de
formar sua identidade social, aperfeiçoar seu processo de sociabilidade e
estabelecer categorias de valor ligadas à ética.
■■ Aspecto linguístico - contribui para o desenvolvimento do vocabulário,
para a aquisição de estruturas linguísticas, para a distinção de registros
discursivos e desenvolvimento da escrita e da narratividade.

Literatura Infantil: Formação Linguística e Cultural


194 UNIDADE V

Consoante Coelho (2000), entendemos que a literatura não só tem a sua função
de fruição, de deleite, mas também de desenvolvimento cognitivo e aprendiza-
gem que, se bem aproveitado pela escola, pode promover um desenvolvimento
físico e motor com as brincadeiras de roda, a encenação das histórias; o enten-
dimento de seu contexto sociocultural com a identificação dos personagens,
suas ações, o ambiente das histórias e a comparação com a realidade dos pró-
prios alunos; e uma valorização dos aspectos linguísticos, variantes regionais,
sociais, confrontando a linguagem formal, informal, a licença poética dos livros.
Para que essa interação literatura-escola ocorra com sucesso é imprescin-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
dível que o profissional da educação tenha o conhecimento sobre as fases do
desenvolvimento infantil para que possa escolher obras que contemplem as poten-
cialidades de cada fase da criança. Segundo Oliveira (2005 on-line)4, o professor
deve estar atento para os seguintes estágios para escolher um livro literário ade-
quado à correta faixa etária da criança:

1 a 2 anos
■■ Prende-se ao movimento.
■■ Ao tom de voz, e não ao conteúdo do que é contado.
■■ Presta atenção ao movimento de fantoches e a objetos que conversam
com ela.
■■ Narrativas curtas.
■■ Muitas imagens, uma gravura em cada página.
■■ Enredo simples e vivo.
■■ Uso de livros-brinquedo, livros de pano, madeira e plástico .
■■ Nesta fase, há uma grande necessidade de pegar a história, segurar o fan-
toche, agarrar o livro etc.

2 a 3 anos
■■ Histórias rápidas.
■■ Pouco texto e poucos personagens.

LITERATURA INFANTIL
195

■■ Muito ritmo e entonação.


■■ Histórias de bichinhos, brinquedos e seres da natureza humanizados.
■■ Histórias com gravuras grandes e boas ilustrações.
■■ Os fantoches continuam sendo o material mais adequado.
■■ A música exerce um grande fascínio.
■■ A criança acredita que tudo ao seu redor tem vida e vivência, por isso, a
história transforma-se em algo real, como se estivesse acontecendo mesmo.

3 a 6 anos
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■■ Fase de “conte outra vez”.


■■ Narrativas curtas com a presença do humor.
■■ Certo clima de expectativa ou mistério.
■■ Discursos ligados à imaginação (fábulas, contos de fadas, lendas etc.).
■■ Predomínio da imagem (gravuras, ilustrações, desenhos etc.).
■■ O texto escrito deve ser breve e algo que possa ser lido e/ou dramatizado
pelo adulto.
■■ Imagens devem sugerir situação que seja significativa.
■■ Contador de histórias com roupas e objetos característicos.
■■ A criança acredita, realmente, que o contador de histórias se transfor-
mou no personagem.
■■ Variar o material que lhe é oferecido.

7 anos - leitor iniciante


■■ A imagem ainda predomina.
■■ A narrativa deve conter uma situação mais complexa.
■■ Personagens podem ser reais ou fictícios.
■■ O processo de julgamento está em pleno desenvolvimento na criança
(personagens bons ou maus, fortes ou fracos).

Literatura Infantil: Formação Linguística e Cultural


196 UNIDADE V

8 a 9 anos – o leitor em processo


■■ Presença das imagens em diálogos com o texto.
■■ A narrativa deve ter um conflito, um fato intrigante e bem-desenvolvido
ao longo da história.
■■ O humor, a fantasia ou o imaginário sempre exercem interesse na criança.

10 a 11 anos – o leitor fluente

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■■ Leitura acompanhada pela reflexão.
■■ Fase dos questionamentos.
■■ Atração por mitos, deuses, heróis, ficção científica ou policial.
■■ Livros de aventuras e ação constantes, livros de mistério, presença de
heróis e heroínas.
■■ A criança passa a se interessar por narrativas escritas, de extensão mediana
com um número menor de imagens.

12 a 13 – leitor crítico
■■ Livros que contenham textos mais longos.
■■ Motivos cotidianos.
■■ Diversidade de assuntos, própria da curiosidade do
pré-adolescente e do adolescente.
Diante do exposto, entendemos a necessi-
dade do professor saber adequar as histórias
que serão trabalhadas à faixa etária do aluno
para que isso favoreça a formação linguís-
tica e cultural dele, aliando assim uma
formação humanizadora, como
preconiza Candido (2011), a
uma prática pedagógica plu-
ral, ampla e reflexiva.

LITERATURA INFANTIL
197

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Chegamos ao final desta unidade e nessa viagem ao universo encantado, lúdico


e inventivo da criança, notamos a importância de proporcionar uma experiência
enriquecedora aos nossos alunos, mesmo que ainda conheçam bem as “letras”
e seus significados, pois a literatura é fonte de uma transformação e formação
silenciosa no aluno.
Entendemos que a literatura voltada à criança hoje não é mesma feita no
século XVII e XVIII, e felizmente notamos que ela evoluiu de preceitos moralistas
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

e doutrinas didáticas à narração de conflitos próprios das crianças que os auxilia-


ram e continuam auxiliando no enfrentamento de problemas reais. Entendemos
que o encantamento e o valor estético de uma obra infantil não está nas figuras
belas dos contos de fadas, nem nos monstros horripilantes, mas sim na identifi-
cação do leitor com uma personagem criança que vive conflitos próximos a ele,
que busca força, tem seus medos e desafios, tem coragem de lutar e vencer, isto
é, faz desse personagem alguém de “verdade” e não preso a modelos conserva-
dores ou moralizantes.
O estudo desta unidade deixou claro que a literatura infantil deve ser tra-
tada, na escola e fora dela, com toda a importância e responsabilidade que ela
merece, pois não se trata de puro divertimento, mas da promoção do raciocí-
nio, da aprendizagem cognitiva, emocional e intelectual.
A escola deve desenvolver e promover essa interação entre a ludicidade e o
pedagógico, entre o real e o imaginário, entre a brincadeira e a discussão séria,
entre o divertimento e a aprendizagem, pois isso pode ser explorado em todas
as etapas do desenvolvimento infantil. Por esse motivo, devemos nos atentar
para as necessidades de fantasia que as crianças têm, para as fases de desenvol-
vimento e as características dos livros adotados para que o trabalho pedagógico
consiga promover a formação de bons leitores e cidadãos críticos.
Entendemos, assim, a importância da escola realizar um bom trabalho de
leitura com as crianças, pois isso possibilita a formação de uma base cognitiva,
linguística, lúdica, lógica e cultural para a formação integral desse aluno.

Considerações Finais
198

1. A literatura é um importante instrumento na formação escolar, cultural e social do


aluno, por isso uma prática imprescindível à escola. Sobre isso, é correto afirmar:
I- A literatura cumpre somente uma função de fruição.
II- A literatura promove uma formação cultural.
III- A literatura deve ser uma prática que extrapole os muros da escola.
IV- A literatura só é importante nos anos iniciais da formação escolar.
a) Apenas a afirmativa I.
b) As afirmativas I e II.
c) As afirmativas II e III.
d) As afirmativas III e IV.
e) As afirmativas I, III e IV.

2. Segundo Candido (2011), a literatura tem uma “força humanizadora” e o autor


explica isso por meio de três funções da literatura. Sobre isso assinale (V) para
as assertivas verdadeiras e (F) para as falsas.
( ) As três funções expostas pelo autor são: psicológica, formativa e social.
( ) A função psicológica relaciona-se ao sentido histórico da obra.
( ) A função formativa vincula-se à obrigatoriedade da literatura de ensinar pre-
ceitos morais.
( ) A função social relaciona-se ao contexto social e histórico da obra literária.
a) V, V, F, F.
b) V, F, V, F.
c) V, F, F, V.
d) F, F, V, V.
e) F, V, V, F.
199

3. A literatura infantil não é menor ou tem menos valor estético do que a literatura
adulta, ideia que por muito tempo foi entendida como verdade. A partir disso,
assinale a alternativa verdadeira:
a) A poesia infantil apresenta menos musicalidade e figuras de linguagem que
a poesia adulta.
b) As narrativas infantis, por serem reduzidas, não têm a presença de um narra-
dor e uma cronologia linear.
c) Todos os personagens das histórias infantis precisam ser obrigatoriamente
crianças.
d) Os elementos básicos da narrativa infantil são comuns à narrativa adulta, pois
o que difere essencialmente é o público leitor.
e) O autor das obras infantis não precisa do mesmo esforço que tem ao fazer
uma narrativa para o público adulto.

4. A leitura literária na escola promove uma série de benefícios à formação do alu-


no se bem planejada e realizada. Cite e explique quais são os aspectos forma-
tivos descritos por Coelho (2000).

5. A literatura infantil nem sempre valorizou a autonomia, a criatividade ou fantasia


da criança, por muitos anos voltou-se a uma formação dogmática e pedagógica.
Um escritor que rompeu com esses valores no Brasil foi Monteiro Lobato. Cite e
explique duas características das obras de Lobato que rompem com o mo-
delo de então.
200

Monteiro Lobato é um marco na literatura infantil e na história do Brasil por seus feitos,
opiniões e obras escritas. Porém, quando abordamos a vertente escritor de Lobato, co-
nhecemos muito superficialmente as suas obras e, normalmente, não as lemos. Lem-
brando que somos professores e não podemos deixar Lobato de fora de nosso plane-
jamento, apresentarei trechos da reportagem da revista Nova Escola intitulada “Cinco
motivos para se ler Monteiro Lobato com os alunos”, de Camila Camilo.
“Se a leitura de Lobato foi tão importante para as crianças da primeira metade do século
20, ela ainda é atraente para a formação dos pequenos leitores. A seguir, veja cinco ra-
zões para apresentar as obras do escritor aos alunos:
1. As histórias são narradas como fábulas
Em Monteiro Lobato livro a livro, os pesquisadores Marisa Lajolo e João Luís Ceccantini
mostram uma carta que o escritor enviou a Godofredo Rangel em 1916. Nela, Lobato
manifesta a vontade de “vestir à nacional” as fábulas de Esopo e La Fontaine diante “da
atenção curiosa com que meus pequenos ouvem as fábulas que Purezinha lhes conta.
Guardam-nas na memória e vão recontá-las aos amigos”.
[...] Para ir além do formato tradicional, em suas histórias é possível conhecer os pontos
de vista de vários personagens a respeito de uma fábula contada por outro persona-
gem. Ele conta uma história dentro da história.

[...]

2. Há personagens femininos fortes e famílias como as de hoje


Quem lê Lobato logo percebe a força das figuras femininas como Dona Benta, Narizinho
e Emília. O núcleo familiar do Sítio é liderado por uma mulher, Dona Benta, que exerce
sua autoridade sem deixar de ser acessível. Os pais de Pedrinho quase não são citados e
nem Dona Benta, nem Tia Anastácia são casadas.
Se na época em que os livros foram escritos, a situação dos personagens do Sítio do Pica
Pau Amarelo parecia ‘avançada’, muitas famílias de hoje têm estruturas semelhantes. Ma-
ria Cristina Lopes, diretora do Museu Monteiro Lobato, em Taubaté, a 130 quilômetros
de São Paulo, diz que esta identificação é percebida na fala das crianças que visitam o
museu, em perguntas como “onde está a mãe da Narizinho?”. “Sob este aspecto, as obras
de Lobato são muito modernas e têm a ver com as famílias do presente”, conta a diretora.
201

3. As obras dão voz às crianças


Emília é uma boneca criativa e contestadora que, assim como as duas crianças do Sítio,
não é repreendida por dar sua opinião e sustentar atitudes participativas. O professor
José Gregorin Filho a compara a outro boneco famoso, o Pinóquio - com a diferença de
que este foi punido por seus atos. Gregorin conta, também, que alguns estudos indicam
que Emília era “uma espécie de voz do próprio Monteiro Lobato”.

4. Os livros contemplam conteúdos didáticos


Alguns títulos como Aritmética da Emília, Emília no país da Gramática e Histórias do
mundo para crianças tratam de temas que os alunos verão na escola. O livro de Lajolo
e Ceccantini destaca que a obra História do mundo para crianças - na qual Dona Benta
narra fatos históricos aos moradores do Sítio - tem a capacidade de proporcionar boas
oportunidades de reflexão e questionamento sobre a ordem mundial da época. [...].

5. Lobato enaltece e defende a natureza


[...] Se o fantástico para as crianças de ontem estava nas situações inusitadas vividas no
Sítio, hoje, o ambiente rural, diferente do urbano onde a maioria vive, é motivo para
encantamento. Além disso, a defesa e o enaltecimento de elementos da natureza são
recorrentes nas obras de Lobato.”
Fonte: Camilo (2012, on-line)5.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Literatura Infantil Brasileira: História e Histórias


Maria Lajolo e Regina Zilberman
Editora: Ática
Sinopse: a literatura infantil brasileira, ainda que relativamente
nova, atinge hoje em dia um estágio de maturidade, resultante
do surto de criação e dos estudos teóricos e críticos de que
vem sendo objeto. Essa situação é fruto de um percurso:
a história que acumulou ao longo do século XX, exigindo
maior pesquisa e interpretação. Essa foi a tarefa realizada
de modo completo e sistemático por Marisa Lajolo e Regina
Zilberman. Ao evitar uma visão da literatura infantil como um
setor à parte, as autoras examinam as relações dela com as
instituições sociais e com a história da literatura, desenhando
um panorama amplo da nossa cultura contemporânea. O livro
destina-se, assim, aos estudiosos dos livros para crianças e a
todos aqueles que desejam conhecer melhor o panorama da
literatura brasileira, do qual a literatura infantil faz parte.

Literatura Infantil
Marta Morais da Costa
Editora: IESDE
Sinopse: contar histórias, assim como ouvi-las, é uma
experiência humana insubstituível. Para isso, o exercício
de formação do leitor é fundamental desde a infância. Pelo
ensino a distância, você poderá fazer o curso de Literatura
Infantil, que abrirá novos horizontes profissionais para quem
deseja desenvolver diferentes técnicas para estimular crianças
a exercitar a leitura a partir da alfabetização, por meio da
abordagem de temas como o sentido do texto, as formas
narrativas, a contação de histórias, entre outros assuntos
relevantes. Neste curso online você pode estudar em casa
por um material de qualidade, obter o seu certificado e uma
melhor colocação profissional em pouco tempo.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Do mundo da leitura para a leitura do mundo


Marisa Lajolo
Editora: Ática
Sinopse: em Do mundo da leitura para a leitura do mundo,
a professora Marisa Lajolo realiza uma reflexão abrangente
e profunda sobre a leitura na escola e suas implicações na
realidade cultural brasileira. Na primeira parte, o volume aborda
o mundo da leitura na escola. Seus tópicos essenciais são o livro
didático, a literatura infantil e juvenil, as práticas escolares de
leitura, a formação e o preparo dos professores e o currículo.
Na segunda parte, a leitura do mundo ocupa o primeiro plano,
com a análise detalhada de textos literários que investigam a
leitura, o leitor e a escola. Entre esses textos, estão “Miss Dollar”,
de Machado de Assis, “As aventuras de Ngunga”, de Pepetela,
e D. Quixote das crianças, de Monteiro Lobato. Trata-se de
obra essencial e indispensável para professores, educadores,
editores, historiadores e bibliotecários.

O jardim secreto (1993)


Sinopse: o filme é uma adaptação do clássico conto de fadas de
Frances Hodgson Burnett, O Jardim Secreto. Mary Lennox é uma
órfã enviada para viver com seu tio em sua mansão, que é cheia
de segredos. Ela descobre um primo doente que ela nunca soube
que tinha e um jardim abandonado, o qual está determinada a
trazer de volta para a vida.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

A fantástica fábrica de chocolate (1971/2005)


Sinopse: baseado no conto de Roald Dahl, este cômico e
fantástico filme segue o jovem Charlie Bucket e seu avô Joe.
Eles se juntam a um pequeno grupo de ganhadores de uma
competição, os quais vão para um passeio na mágica e misteriosa
fábrica do excêntrico Willy Wonka. Ajudado por seus anões
trabalhadores, Wonka esconde uma surpresa para durante o
passeio.

Onde vivem os monstros (2009)


Sinopse: Max é um garoto que está fantasiado de lobo,
provocando malcriações com sua mãe por ciúme de um amigo
dela. Como castigo, ele é mandado para o quarto sem janta
e resolve fugir da casa, usando a imaginação para criar uma
misteriosa ilha. Lá, ele encontra vários monstros e diz que possui
superpoderes, o que o faz ser nomeado rei do grupo. Responsável
por evitar que a tristeza tome conta do lugar, ele passa a criar uma
série de jogos para mantê-los em constante diversão.

O menino e o mundo (2013)


Sinopse: um menino mora com os pais em uma pequena
cidade do campo. Diante da falta de trabalho, um dia, ele vê o
pai partindo para a cidade grande. Os dias que se seguem são
tristes e de memórias confusas para o garoto. Até que então
ele faz as malas, pega o trem e vai descobrir o novo mundo em
que seu pai mora. Para a sua surpresa, a criança encontra uma
sociedade marcada pela pobreza, exploração de trabalhadores
e falta de perspectivas.
205
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-lobato-com-os-alunos>. Acesso em: 13 nov. 2017.
207
GABARITO

1) C.
2) B.
3) D.
4) Os aspectos descritos por Coelho (2000) são: psicofísico, social e linguístico. O
primeiro auxilia na formação motora e cognitiva do aluno, o segundo na for-
mação identitária do aluno, e o terceiro no desenvolvimento do vocabulário e
manuseio da linguagem.
5) Monteiro Lobato é um divisor de águas na literatura infantil nacional, ele con-
seguiu incorporar as histórias clássicas e tradicionais à literatura infantil, consti-
tuindo um resgate cultural; introduziu personagens crianças/adolescentes que
falavam e agiam realmente como crianças/adolescentes, fazendo com que os
leitores se identificassem com eles; incorporou o folclore e as tradições nacionais
nas histórias, cultivando a nossa cultura; propôs a diversidade em suas obras,
contribuindo para uma ampla reflexão.
CONCLUSÃO

Encerramos esse ciclo de estudos! Temos a certeza de que esse livro auxiliou você
nessa caminhada de sua formação acadêmica, pois a necessidade de ler, discutir,
refletir e atualizar-se foi explorada neste material.
A nossa proposta nesse livro foi deixar clara a importância do domínio da língua
materna, sendo um competente usuário dela nas mais diferentes situações comuni-
cativas e como responsável pelo processo de ensino-aprendizagem de seus futuros
e/ou atuais alunos.
Ao longo das cinco unidades, estudamos as funções da Língua Portuguesa, seme-
lhanças e diferenças entre a escrita e a oralidade; adentramos na importância da
leitura e da formação de leitores críticos e antenados com as novas mídias; destaca-
mos a importância da produção textual com qualidade e dedicamos uma atenção
especial para a produção no Ensino Superior, além de adentramos no universo lite-
rário destinado às crianças e a sua formação linguística, cultural e valorativa.
Assim, compreendemos a importância da boa aprendizagem da língua materna
para a nossa vida pessoal e principalmente para a profissional, especialmente para
profissionais da área educativa.
Nós acreditamos em você, no seu potencial, em sua jornada estudantil e profissio-
nal, por isso valorizamos a discussão e reflexão de forma que você entendesse que
os temas abordados não foram esgotados em sua totalidade neste livro, mas dire-
cionados para a sua formação ampla e vislumbrando a sua continuidade acadêmica,
ressaltando uma formação contínua.
Estar motivado e entender como o processo educativo ocorre é primordial para con-
seguirmos consolidar a nossa formação e dominar cada vez mais os conhecimentos
e habilidades necessários para realizar um bom trabalho pedagógico com a língua
materna, envolvendo aspectos lúdicos, formativos, de pesquisa, de informação e de
reflexão.
Portanto, essa nossa caminhada se encerra aqui, mas a caminhada pelo universo do
conhecimento sempre será constante; desejamos, com isso, sucesso, e uma forma-
ção sólida e profícua, construindo um caminho profissional com muitas realizações.
Boa sorte!

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