Plano Trabalho Ufrrj
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PROJETO DE EXTENSÃO
Outubro de 2013
1. Objetivos
A preocupação em criar interesse pela atividade jornalística, num curso de
Comunicação Social, passa, hoje, no nosso entender, pela atualização do conceito de
jornalismo frente às alterações trazidas pela conexão dos dispositivos moveis em rede.
Por isso o objetivo principal deste projeto é preparar uma nova geração de
telespectadores mais críticos, e, ao mesmo tempo, criar uma espécie de laboratório para
os alunos de Jornalismo da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Pretendemos
investigar se um novo modelo de jornalismo está se configurando a partir destas
prerrogativas, além de problematizar o lugar do repórter e do pensamento clássico em
comunicação neste contexto. E o mais importante: refletir sobre as implicações disso em
termos de ética e do ponto de vista da estética. Por fim: entender as implicações de tudo
isso na reformulação dos valores-notícia, a partir das Teorias do Jornalismo.
Na extensão, o objetivo é fazer isso a partir de oficinas práticas com
adolescentes, em escolas públicas. A ideia é produzir narrativas audiovisuais
jornalísticas com o uso de telefones celulares. O material será postados em um canal ou
transmitidos, em alguns casos, em livre streaming. Além do exercício de cidadania e da
formação do olhar, o projeto de um outro objetivo importante: fomentar a produção de
narrativas que tenham relação direta com a comunidade retratada.
O entorno da UFRRJ é formado por um número grande de comunidades que
estão na região metropolitana do Rio de Janeiro, a segunda maior cidade do Brasil e
uma das mais visitadas por turistas de todo mundo. Por isso mesmo, pouco da cobertura
jornalística dos grandes meios de comunicação narra a vida de quem vive por ali. E
menos ainda de quem dedica tempo e estudo do campus da universidade. O uso de
telefones celulares e outros dispositivos móveis tem a tarefa de chamar a atenção para o
funcionamento dos meios de comunicação, uma maneira de prepará-los para sociedade
onde cresce cada vez mais a mediação cultural por objetos técnicos. E de como estes
meios técnicos podem abrir espaço para narrar este mundo.
2. Justificativa
As manifestações que tomaram as ruas do Brasil no mês de junho de 2013
deixaram à mostra muitos pontos-chaves para entender o momento em que vivemos.
Um deles é a fragilidade da cobertura midiática com fonte privilegiada de informação.
O telefone celular, em rede, colocou em xeque o direcionamento editorial de grandes
empresas de comunicação. O esforço para controlar o inesperado é uma das premissas
do jornalismo. Há um padrão de comportamento, um procedimento em torno do fato.
Mesmo que ele seja inesperado, logo é enquadrado e ganha a forma do jornal. No caso
do repórter de televisão, o formato do telejornal. O que acontece é que este controle
parece estar falhando, em alguns momentos. Vídeos disponibilizados na internet, que
muitas vezes mostram o fato de maneira mais contundente que as reportagens, ou sob
outro ponto de vista, são exemplos claros disso.
No mundo em que vivemos, cria-se a partir daí a ideia de que é o homem, por
meio de estratégias culturais, quem domina a natureza, sempre imprevisível.
Movimento que se repete no ofício do repórter. Ele acaba o tempo todo enquadrando o
acontecimento para que caiba no espaço e no tempo d o telejornal. E ainda para que
caiba no repertório de quem assiste. Este controle, que definia o repórter
ontologicamente, parece não existir mais da mesma maneira. Ou melhor: parece estar à
mostra, agora, de maneira mais clara, o fato de que este controle é uma criação, uma
invenção. Consideramos apenas um dos possíveis motivos: os telefones celulares
conectados em rede. Qual é o resultado do embate entre estes novos coletivos de
produção narrativa audiovisual? De um lado, os repórteres de televisão. Do outro, ou de
vários outros, cidadãos e organizações que produzem imagens, via telefone celular,
smartphone e tablet, e as disponibilizam na internet. Tudo isto muda substancialmente
a maneira de se fazer jornalismo. E abre brechas para a visibilidade de outras
realidades, como é o caso, como já argumentamos, das experiências e percepções
possíveis numa realidade da região do entorno do campus da UFRRJ em Seropédica,
área que esta situada na região metropolitana do Rio de Janeiro, mas que não tem
visibilidade compatível com sua importância.
A proposta é inspirada pela nossa experiência profissional no trabalho do dia-a-
dia numa redação de telejornal. A proliferação das imagens feitas com telefone celular é
fato irreversível e aparece hoje como uma das maiores contribuições no fechamento das
edições. Mesmo em redes de televisão com muitas equipes, não é possível mapear,
durante todo o dia, as imensas redes que são as cidades nas quais vivem a maior parte
dos brasileiros. Temos então um cenário no qual se torna necessário refletir sobre as
implicações das imagens produzidas por cidadãos comuns por meio de dispositivos
móveis que facilitam o registro de fatos do dia-a-dia, aos quais o repórter nem sempre
tem acesso. A proposta de unir a teoria com a prática, em oficinas comunitárias, podem
ajudar na definição de um novo estatuto para profissão, num momento em que tanto se
fala em crise do jornalismo, numa realidade em que as redações estão cada vez menores
e os blogs e as redes sociais cada vez mais presentes como marcadores de opinião. Estas
mudanças precisam ecoar no ambiente da Universidade. Por fim, é preciso pensar
também que a capacitação de cidadãos comuns para produção destas narrativas reforça
o sentido da democracia.
3. Técnicas de produção
4. Revisão de literatura
Ela usa o ciborgue como metáfora do sujeito fora da ditadura da essência, por
isso mesmo, fora dos padrões de normalização. Haraway argumenta, assim, em favor do
ciborgue como um tipo de ficção que mapeia a realidade social e corporal. Mas que
funciona, ainda, como recurso imaginativo que pode sugerir alguns acoplamentos.
Acoplamentos metafóricos, mas também aqueles, nos quais, de fato, homens e
máquinas constituem redes, numa simbiose protética que dispensa qualquer holismo
orgânico para imprimir a noção de totalidade, alargando a visão de humanidade para
além da pele. “Não está claro quem faz e quem é feito na relação entre o humano e a
máquina. Não está claro o que é mente e o que é corpo em máquinas que funcionam de
acordo com práticas de codificação. (...) Não existe, em nosso conhecimento formal,
nenhuma separação fundamental, ontológica, entre máquinas e organismo, entre técnico
e orgânico” (HARAWAY, 2000, p.91). A afirmativa da feminista, que escreveu o
Manifesto Ciborgue no século passado, parece cada vez mais verdadeira, à medida que
avançamos pelo mundo da digitalização de imagens e dos dispositivos móveis.
Apesar das tentativas incessantes de purificação, há cada vez mais híbridos,
sobre os quais nada sabemos e os quais não conseguimos controlar, para usar a
afirmativa de Latour, quando propõe emendas na constituição da Modernidade, com o
objetivo de reabilitar a categoria dos quase-objetos, uma espécie detrickster, necessário,
mas até agora negado, o que tem causado muitos problemas. “Estes novos não-humanos
possuem propriedades miraculosas, uma vez que são ao mesmo tempo sociais e não-
sociais, produtores de naturezas e construtores de sujeitos” (LATOUR, 1994, p.110). A
separação agora borrada entre sujeito e objeto é apenas uma das subversões do modelo
moderno ocidental. Na imprensa, esta linha tênue está cada vez mais fraca à medida que
o advento de novas tecnologias da comunicação aproximam o consumidor de
informações do produtor. A informática traz a possibilidade de transformar todo tipo de
informação em códigos numéricos que são recebidos e decodificados por um mesmo
aparelho: o computador. Todos recebemos, mas também produzimos material,
participando da sedimentação desta informação de maneira colaborativa, num
movimento em rede que aponta para a horizontalidade da informação, de maneira que
subverte hierarquias. O fenômeno chamado de Convergência Midiática,em suma,
aponta para o fim da linha que separa emissor de receptor no processo comunicativo.
André Lemos (2008, p.50) divide o fenômeno em três categorias. A primeira
chamada de convergência de mídias de funções massivas compreende ações como a
criação de websites por empresas de comunicação, para difundir conteúdos que
produzem em seus veículos de massa. A segunda, a convergência de mídias de função
pós-massiva, engloba a reapropriação, a citação e o entrecruza mento de informações
de redes sociais, blogs e outras formas de expressão na Internet. A terceira, que nos
interessa aqui, é a convergência mista, na qual mídias de funções massivas e pós-
massivas se entrecruzam. Com o exemplo, podemos trabalhar com a prática do uso de
imagens feitas com dispositivos móveis, disponibilizadas posteriormente na web, e
usada, em seguida, em reportagens de televisão. Um exemplo é a matéria veiculada
pelo Jornal Nacional no dia 01 de janeiro de 20121. A Polícia Militar do Estado de São
Paulo entrou na reitoria d a USP na tentativa de retirar estudantes que estavam
acampados no local, em protesto. Durante a ação, um estudante negro foi abordado de
maneira considerada agressiva e racista. Tudo foi registrado por um dos alunos, que
usou um telefone celular para isso. As imagens, que mostram boa parte da ação dos
militares, foram colocadas no site Youtube. Eles aparecem exigindo que o estudante
mostre a carteira de identificação da USP. Mas eles pedem isso somente a ele. Quando
questionado, um dos policiais coloca uma das mãos sobre a sua identificação, por isso
não é possível ver o nome dele.
No dia seguinte, o material foi exibido pelo Jornal nacional. Mas ele não foi ao
ar como estava no YouTube. O material foi editado, com a ajuda da narração de um
repórter, que conduzia a história. Em alguns trechos, a reportagem deixa o telespectador
entreouvir o áudio original, com a fala dos envolvidos. A reportagem começa com as
imagens feitas com o telefone celular. São usados um minuto e 14 segundos do material
disponibilizado na internet, no início do videoteipe, que tem duração de três minutos e 7
segundos. A partir da passagem do repórter, o relato toma um rumo que se aproxima de
uma reportagem considerada convencional no telejornalismo, no modelo consagrado
nos manuais de redação: sonoras com os envolvidos n o caso, com uma organização de
direitos humanos e com representantes da universidade, além de imagens do campus da
USP.
O exemplo é um entre muitos e chama a atenção para uso de imagens de pessoas
comuns, que flagram situações como estas e postam n a internet ou enviam diretamente
às redações por e-mail ou via aplicativos específicos, disponibilizados pelas próprias
emissoras. O fato, categoria nobre do jornalismo, passa a ser registrado não mais pelo
repórter, que agora parece estar ganhando outro lugar no processo de produção da
notícia. O processo vem acontecendo de tal maneira, que há organizações que já fazem
frente aos grandes conglomerados de comunicação, obrigando-os a repensar os
1
Disponível no link: www.globo.com/jornalnacional/noticia/2012/01/sp-policia-afasta-sargento-acusado-
de-agredir-estudante-da-usp.html
direcionamentos, a cobertura e a lógica da apuração. Um exemplo forte é a Rede
N.I.N.J.A., sigla em português para Narrativas Independentes Jornalismo e Ação, grupo
responsável pela POSTV, um canal de mídia digital independente. O grupo nasceu há
cerca de uma no e meio e está ligado ao movimento acional Circuito Fora do Eixo. Nas
recentes manifestações que tomaram conta do Brasil, em junho de 2013, o canal do
grupo, na internet, teve picos de audiência de 120mil espectadores (LANZAROTTI,
2013, p.1). A POSTV transmitiu, ao vivo, as manifestações, via streaming, pela internet,
com a ajuda dos chamados ninjas, voluntários, que usaram telefones celulares
conectados à rede mundial de computadores via tecnologia sem fio 3G ou wi-fi.
2
Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2013/07/passeata-termina-em-confronto-e-
pm-e-criticada-por-prender-integrante-do-midia-ninja.html
utilizando-se de tecnologias móveis como plataforma (SILVA,
2008, p.2-3).
Ele usa como exemplos transmissões, via telefone celular, na Rede Bandeirantes,
de São Paulo. E vê nisso uma aproximação da mídia massiva com as ferramentas de mídia
pós-massiva, no sentido estabelecer diálogos com as modalidades emergentes de
jornalismo digital. O telefone celular aparece como ferramenta-chave neste processo,
como um dispositivo híbrido, que pelo fato de oferecer mobilidade, cumpre bem a função
de acoplamento. Mas, além de uma mudança estética, também traz outras implicações
em termos éticos, já que mexe com os valores-notícia, na corrida pela instantaneidade.
E nos traz de volta a assertiva de Donna Haraway (2000, p.44), para quem “é
precisamente a ubiqüidade e a invisibilidade dos ciborgues que faz com que essas
minúsculas e leves máquinas sejam tão mortais. Eles são – tanto política, quanto
materialmente – difíceis de ver”. Completando esta perspectiva, para Janice Caiafa
(2011, p.138), “os circuitos mundiais de comunicação por computador preenchem hoje
em algum grau essa função de controle. Funcionam tipicamente ao ar livre, têm uma
enorme abrangência e penetração molecular”. Esta realidade nos coloca na encruzilhada
de um novo modelo de produção jornalística audiovisual, que precisa ser pensado. Está
colocada a possibilidade de modelos mais participativos a partir da construção coletiva.
Mas há outros aspectos a serem investigados.
O conceito de sociedade disciplinar, de Michel Foucault, nos ajuda a entender
o modus operandi da modernidade por meio da padronização dos comportamentos
sociais, em busca da diminuição dos riscos e das in certezas, suprimindo as diferenças,
numa ação empreendida pelos instrumentos criados para isso. O controle seria
exercido então pelo próprio Estado e pelas suas instituições co-irmãs: a Escola, a
Igreja, a Cadeia e os Hospitais (FOUCAULT, 2000), a partir do propalado modelo do
panóptico, uma estrutura na qual, a partir de uma torre central, é possível observar o
que acontece em todas as celas à volta. A marca deste modelo de organização seria o
poder coercitivo, numa proposta ligada à necessidade modernista de um a purificação
(LATOUR, 1994) incessante, baseada na separação fundante entre natureza e cultura,
a partir do modelo filosófico aristotélico. Um observatório privilegia do de tudo isto
seriam os discursos.
Gilles Deleuze (1992, p.215) atualiza o conceito de disciplina a partir da
propalada crise da Modernidade e de suas instituições, mostrada a todo tempo com as
reformas da escola, dos hospitais e até mesmo dos regimes de trabalho. O que poderia,
a princípio, parecer liberdade, na verdade institui-se como nova forma de opressão. O
regime disciplinar é trocado, assim, por outro tipo de exercício do poder, num
contexto que ele chama de sociedade do controle. Nesta lógica, o poder passa e ser
exercido de maneira mais sutil, porém não menos castradora.
5. Cronograma
O cronograma apresenta uma proposta de execução do trabalho nos 12 primeiros
meses de atividade. Estimamos que este seja o tempo necessário para consolidação das
ações, que a partir de então, continuam a ser realizadas sistematicamente.
6. Referências bibliográficas
DELEUZE, Gilles. Conversações : 1972 – 1990. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992.
LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1994.
SILVA, Fernando Firmino da. Jornalismo livre streaming: tempo real, mobilidade e
espaço urbano. Anais do VI Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo:
São Paulo, 2008.