Pe. Leão Dehon - Manual Social Cristão

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MANUAL SOCIAL CRISTÃO

REDIGIDO PELA

COMISSÃO DE ESTUDOS SOCIAIS DA DIOCESE DE SOISSONS

SOB A PRESIDÊNCIA

DO SENHOR CÓNEGO DEHON

E PUBLICADO COM A APROVAÇÃO DE

SUA GRANDEZA O BISPO DE SOISSONS

QUINTA EDIÇÃO REFUNDIDA E BASTANTE AUMENTADA

PARIS,
5, RUA BAYARD, 5
CARTA DO CARDEAL RAMPOLLA

Roma, 06 de Julho de 1895

1 Meu honrado Senhor,

Apresentei ao Santo Padre o exemplar do Manual social cristão que me haveis enviado
com esse fim; estou contente de vos poder dizer que Sua Santidade aceitou a homenagem com
agrado e que vos concede de coração a bênção apostólica.

Agradeço-vos, da minha parte, o exemplar que me haveis oferecido e exprimo-vos os


sentimentos de estima sincera pelos quais sou

vosso muito afeiçoado servidor

Assinatura: Cardeal Mariano RAMPOLLA

APROVAÇÃO DE MONSENHOR O BISPO DE SOISSONS


Soissons, a 16 de Julho de 1894

2 Meu caro e Rev. P. Dehon,

Reenvio-vos o vosso manuscrito.


Li-o por inteiro, com a pena na mão.
Nele fiz algumas correções de somenos importância.
Felicito-vos com todo o coração por este trabalho, que supõe longas e aplicadas leituras
sobre quanto respeita a questão social.
Constituirá um reportório útil de informações para todos os que se ocupam desta
importante questão e que se empenham a defender a verdade contra as doutrinas socialistas que
se espalham nos nossos campos.
Tudo está condensado neste trabalho sob o ponto de vista teórico e científico. Os que
quiserem aprofundar estes assuntos poderão fazê-lo facilmente graças às indicações sobre
autores importantes que vós nomeais.
Não tenho mais do que um desejo a formular: é o de que, a este manual de obras sociais,
ou antes, de ciência social, venha ajuntar-se cedo um pequeno manual prático, um vade-mécum,
uma espécie de pequeno catecismo que possa ser posto em todas as mãos, e que dê, clara e
seguramente, as indicações práticas para que se possa fundar obras sociais, em especial nas
pequenas paróquias do campo.1
Agradeço-vos, caríssimo cónego, por este inteligente trabalho, e peço a Deus que abençoe
o seu autor.
Muito afetuosamente vosso, em Nosso Senhor.

† João-Baptista, bispo de Soissons

_______________________________
1 Foi dada satisfação a este desejo do bispo de Soissons através da segunda parte do Manual.

CARTA DE SUA EMINÊNCIA O CARDEAL LANGÉNIEUX


ARCEBISPO DE REIMS
ARCEBISPADO
DE
REIMS Reims, a 02 de Agosto de 1894

3 Rev. Sr. Padre,

Tendes feito, sobre a questão social, um trabalho dos mais conscienciosos e dos mais úteis.
Depois de terdes recordado os princípios gerais que dominam o sujeito, e terdes indicado
os remédios, as verdadeiras soluções, a primeira das quais vos parece ser, e com razão, a ação
beneficente da Igreja. O exposto fica assim completo; e recomenda-se-lhe, de mais a mais, por
causa da clareza do método e da rara precisão dos termos. Estou persuadido que, depois de se
vos ter lido, ir-se-á ter, acerca dos problemas agitados hoje em dia, noções mais exatas e mais
conformes aos ensinamentos de Leão XIII, de que haveis feito a teia de fundo do vosso trabalho.
Por conseguinte, não hesito a ajuntar aos meus sinceros parabéns, redobrados votos a fim
de que este Manual tenha a maior difusão.
Queira receber, reverendíssimo padre, a certeza dos meus melhores sentimentos em Nosso
Senhor.

† Cardeal Benoit-Marie Langénieux,


Arcebispo de Reims

CARTA DO SENHOR LÉON HARMEL

Val-des-Bois, a 10 de Agosto de 1894


4 Meu Reverendo Padre,

É com jubiloso reconhecimento que saúdo o aparecimento do vosso livro, uma vez que me
parece ser ele capaz de popularizar o ensino do nosso Padre muito amado, Leão XIII.
Na nossa audiência do 24 de Maio último, pedimos ao Soberano Pontífice a sua bênção
particular para o vosso trabalho. Sua Santidade acedeu com paternal bondade. Ficou combinado
que as provas seriam entregues ao Rev. Mestre geral dos Dominicanos.
Cumpri com esta ordem a 12 de Junho. As provas foram-nas devolvidas com uma carta
datada de Roma a 09 de Julho, dizendo-nos que a obra tinha sido estudada minuciosamente por
uma Comissão de examinadores. As correções foram raras e de somenos importância. Nela
fizestes obra de preceito e ganhamos a confiança de poder apresentar ao público um livro
reconhecido irreprovável pelos teólogos mais eminentes da Ordem de São Domingos.
Sabemos que é uma obra coletiva, na qual o nosso leal amigo, o Marquês de la Tour du
Pin, tem o lugar que lhe dá a sua grande inteligência e a sua profunda ciência social. A carta
aprovadora do eminente Cardeal Langénieux, que mereceu o honroso título de cardeal dos
operários, e a carta elogiosa do bispo de Soissons, são a legítima recompensa pelo vosso labor.
Não poderemos mais desejar senão uma coisa: que este ótimo livrinho, tão claro, tão nítido
e tao autêntico, se espalhe por toda a parte para a difusão fecunda dos ensinamentos pontifícios.
Leão XIII iluminou o mundo com uma luz de tal forma viva que ainda maravilha certos espíritos,
habituados ao crepúsculo de meias-verdades. Tendes trabalhado a dissipar as últimas nuvens ao
expor os princípios gerais da vida social cristã.
Tendes figurado o atual mal-estar social e investigado as suas causas. Tendes refutado as
ilusões socialistas. Tendes exposto, de modo prático e completo, os verdadeiros remédios: a ação
da Igreja, a do Estado, a dos patrões e a das corporações.
Tenha a bondade de receber, meu Reverendo Padre, a expressão da minha afetuosa
dedicação.

LÉON HARMEL.

5 Recebemos ainda os encorajamentos mais benevolentes de sua eminência o cardeal de


Malines, do bispo de Liège, de suas excelências os bispos de Saint-Dié, Nevers, Langres, Blois,
Agen, Vannes, Séez, Evreux, Luçon, La Rochelle, Limoges, Le Puy, Bayeux, Saint-Brieuc, Don,
Orléans, Moulins, Angoulême, Coutances, Digne, Bayonne, Châlons e Nîmes. Não os citaremos
pois sairia um volume.
O Manual tornou-se um clássico em vários seminários.
De Roma, recebemos as mais vivas felicitações do Mestre geral dos Domínicos, o mui Rev
Padre Frühwirth, do jornal o Observador Romano e dos principais dinamizadores de obras
sociais, nomeadamente o Marquês Crispolti e o conde Vespignani.

__________________________________________

[Nota do Tradutor: As referências bíblicas da presente obra como de todas aquelas traduzidas das
Obras Sociais do Padre Dehon pelo mesmo tradutor foram deixadas como no original em francês.]

Bibliografia geral
REVISTAS
A Associação católica, in-8º, 262, avenida Saint-Germain, Paris – 20 francos.
O século XX, revista mensal in-12º, 39, rua Sainte, Marselha – 10 francos
A democracia cristã, revista mensal, 25, rua Nicolas Leblanc, Lille – 6 francos.
A reforma social, revista bimensal, 54, rua de Seine, Paris – 20 francos.
As questões atuais, revista hebdomadária, 5, rua Bayard, Paris – 6 francos.
A sociologia católica, revista mensal, Montpellier – 6 francos.
A Justiça social, jornal hebdomadário, 12, rua Littré, Paris – 6 francos.

LIVROS
OBRA DOS CÍRCULOS, Questões sociais e operárias, in-8º, 262, avenida Saint-Germain, Paris.
Gabriel ARDANT, A questão agrária, in-8º, ed. Retaux-Bray, 82, rua Bonaparte, Paris. – Papas
e camponeses, in-12º, ed. Gaume et Cie, 3, rua de l’Abbaye, Paris. – O pároco do campo, in-12º,
5, rua Bayard, Paris.
Conde DE MUN, Discursos, in-8º, ed. Poussielgue, 15, rua Cassette, Paris.
Abbé MARTINET, Obras completas, ed. Roger e Chemoviz, 7, rua dos Grands-Augustins, Paris.
LE PLAY, Obras completas, ed. Mame, Tours.
CH. PERRIN, Obras completas, ed. Lecoffre, Paris.
Léon HARMEL, Manual de uma corporação, 262, avenida Saint-Germain, Paris. – Catecismo do
patrão, 262, Avenida Saint-Germain, Paris. – Discursos e Cartas, 262, boulevard Saint-Germain,
Paris.
G. ROMAIN, A Igreja e a liberdade, ed. Bloud e Barral, 4 rua Madame, Paris. – A Idade Média,
in-8º, ed. Bloud e Barral, 4 rua Madame, Paris.
G. PREVOST, A Igreja e os campos na Idade Média, in-8º, H. Champion, 9, cais Voltaire, Paris.
Abbé BABEAU, a aldeia sob o antigo regime, in-12º, ed. Perrin, 35, cais dos Grands-Augustins,
Paris. – O burguês de outrora, in-8º, ed. Firmin-Didot, 56, rua Jacob, Paris.
FELIX SARDA Y SALVANI, O liberalismo é um pecado, in-12º, ed. Retaux-Bray, 82, rua
Bonaparte, Paris.
Dr STOECKL, Doutrina filosófica de São Tomás de Aquino, in-12º, Roger e Chernoviz, 7, rua dos
Grands-Augustins, Paris.
Paul ALLARD, Os escravos cristãos, in-12º, Didier, 35, cais dos Grands-Augustins, Paris.
Jean JANSSEN, A Alemanha e a reforma, 3 vol. In-8º, Plon e Nourrit, 10, rua Garancière, Paris.
Rev. Padre FÈLIX, A economia social perante o cristianismo, in-12º, J. Albanel, 15, rua de
Tournon, Paris.
J. GUIBERT, O Educador apóstolo, in-8º, Poussielgue, 15, rua Cassette, Paris.
Abbé J. CHAPELLE, Manual das Obras, in-8º, C. Paux, Mende.
GARNIER, Curso de pastoral, 1, rua Feydeau, Paris.

NOTA2
6 Para aqueles que começam a estudar os estudos sociais, os autores seguintes são os mais
próprios a introduzi-los nestes estudos de uma maneira progressiva:
1 O Papa, os católicos e a questão social, por L. GREGOIRE, ed. Perrin, cais dos Grands-
Augustins, Paris.
2 Comentário da Encíclica, pelo cónego PERRIOT, em Langres.
3 Comentário da Encíclica, pelo Padre De PASCAL, ed. Lethielleux.
4 Discursos de Monsenhor Ketteler, publicados por DECURTINS, Picard.
5 A questão operária, pelo padre FERET, ed. Lethielleux.
6 Tratado de economia social por OTT, ed. Fischbacher.
7 A nossa obra social, pelo padre NAUDET, ed. Tolra, 112, rua de Rennes, Paris.

____________________________________________

[2 Neste volume, a Encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII é citada frequentemente: por
vezes simplesmente como sendo a Encíclica, outras vezes como a Encíclica sobre a condição dos
operários e às vezes como a Encíclica de 1891.]

INTRODUÇÃO

A questão social
I
7 «Não há qualquer questão social», dizia Gambetta, aliás de acordo com um demasiado
grande número de homens políticos e de economistas.
Mais clarividente e corajosa, a Igreja tinha reconhecido o mal, desde há muito tempo.
Desde 1848, o ilustre Ketteler, morto como bispo de Maiência, denunciava a injustiça social de
que sofria a Europa e proponha os autênticos remédios.
Leigos, padres e bispos devotados haviam estudado a questão desde há quarenta anos.
Depois Leão XIII falou. A Encíclica sobre a condição dos operários descreve o mal social, e faz
evidenciar as suas causas profundas para as quais propõe os remédios.
A palavra do Papa inspirou este Manual.
A primeira parte é inteiramente teórica e trata da economia social. A segunda parte tratará
das obras sociais.

II
8 O fato que primeiramente dá na vista sobre o sujeito da condição dos operários, é o de
estarem, na maioria, diz Leão XIII, «num estado de infortúnio e de miséria imerecida». Apesar de
um certo progresso exterior, o operário é, em variadíssimos lugares, menos feliz que outrora; suas
necessidades aumentaram mais que seus recursos, se porventura estes não diminuíram.
Ao mesmo tempo, os operários veem acumular-se nas mãos de poucos uma imensa
quantidade de riqueza, e Leão XIII não hesita em colocar entre os males atuais «o monopólio do
trabalho e dos valores do comércio que passaram a ser reserva de um pequeno número de ricos,
que assim impõem um jugo quase servil a uma infinita multidão de proletários».3

9 Ora, estas riquezas «jamais parecem corresponder aos serviços prestados… nem parecem
proporcionais de maneira nenhuma ao custo envolvido…E menos ainda parecem proporcionais
aos méritos ou às virtudes dos homens».4 Enfim, também não correspondem ao valor social das
funções exercidas. Que valor tem para a sociedade o trabalho do agiota, do financeiro judeu, que
arruínam todos os produtores, ou o do jovem senhorio, que dissipa no ócio as suas forças e a sua
fortuna?
Esta desproporção traz a miséria com o seu cortejo inevitável: a ignorância, o vício, as
tentações do crime, as doenças.
Portanto, as coisas correm mal.
______________________________________
3 Encíclica Rerum Novarum.
4 GIDE, Princípios de economia política, 3ª edição, página 438.
III
10 Mas, as riquezas não são coisas que escapam à ação humana à semelhança da chuva e dos
raios do sol. O dinheiro circula passando pelas mãos dos homens, e estes têm uma consciência
moral regida por leis superiores; a ação das riquezas exerce-se pela influência de instituições
fundadas pelos homens.
Deste modo, intervém aqui a ação das pessoas. Se as coisas correrem mal, é geralmente
porque as pessoas andam mal. Suponde que, todos esses homens que ganham, acumulam e
distribuem as riquezas, cada um deles satisfizesse os seus deveres de justiça e de caridade a respeito
dos outros, então as coisas correriam tão bem quanto possível. Suponde ao contrário, que estes
mesmos homens violam os seus deveres em relação a seus semelhantes e que as leis públicas
favoreçam essas violações ou tornem quase impossível a justiça social, então as coisas irão de mal
a pior.
A questão das riquezas por consequência está dependente de uma questão moral.

IV

A questão social será ela solúvel?


11 Políticos e sábios de renome declararam a questão insolúvel. «A sociedade atual, disse
Thiers, fundada nas bases mais justas, não poderá ser amelhorada».5
O senhor Paul Leroy-Beaulieu diz por sua vez: «As leis que presidem ao capital, ao salário,
à repartição das riquezas, são tão boas como inelutáveis. Elas provocam a elevação gradual do
nível humano».
Uma teoria destas é sobremaneira cómoda, uma vez que dá aos que a admitem, ipso facto,
o direito de não fazerem nada; dispensando-os de uma responsabilidade grave e custosa.
Não! Estas leis não são inelutáveis; há, na moral cristã, uma força que pode obviar aos seus
maus efeitos, e a mesma vontade livre que estabeleceu más instituições pode também, por meio de
leis opostas, repor a ordem, a paz e o entendimento fraterno nas relações dos homens entre eles.

12 Pensava de igual modo o Cardeal Pecci, arcebispo de Perugia, quando rebarbarizava «o


colossal abuso da pobreza e da fraqueza», «a horrível existência das crianças na fábrica», quando
indicava a necessidade «de uma legislação que metesse um travão neste tráfego sem
humanidade».6
O que tinha pregado o Cardeal Pecci, Leão XIII o proclamou como Sumo Pontífice, urbi
et orbi. Ele declara, no princípio da encíclica, que deseja «pôr em evidência os princípios de uma
solução conforme à justiça e à equidade».
___________________________________________
5 THIERS, citado por L. GREGOIRE, O Papa, os católicos e a questão social, p.3
6 A Igreja e a civilização. Cartas pastorais do Cardeal PECCI, página 20.

PRIMEIRA PARTE

Economia Social7
PRIMEIRO CAPÍTULO :
PRINCÍPIOS GERAIS
13 São as ideias que diferenciam as épocas dos homens. As ideias cristãs transformaram o
mundo pagão. O retorno às ideias pagãs, na altura da Renascença, preparou a Revolução de 1789,
o liberalismo económico e a sua influência antissocial. Precisa-se, por conseguinte, de remontar às
fontes das ideias dos primórdios, das verdades cristãs, as únicas capazes de restaurar a moral.

§ 1. – A pessoa humana
14 A sociedade compõe-se de famílias, e a família, de indivíduos; estes portanto são os
últimos elementos cujo agrupamento constitui o corpo social. Mas, contrariamente, ao que
acontece alhures, aqui os elementos possuem e conservam, independentemente do corpo que
compõem mas mantendo nele, um valor próprio, um valor pessoal. Pessoal, é o termo exato, pois
que estes homens, que o corpo social reúne, são pessoas com toda a propriedade; cada um deles
tem a sua própria dignidade irredutível, os deveres e direitos. Qualquer que seja a classe a que
pertença, todo o homem está dotado, quer de um corpo vivo, quer duma alma inteligente, livre e
imortal, que só Deus criou. Vinda de Deus, esta alma deve servi-lo e voltar para Ele. Viva ela num
corpo de um operário mineiro, no fundo de uma galeria negra de hulha, ou no corpo de um opulento
financeiro, entre os brilhantes excessos do luxo, isso na verdade pouco importa: na realidade,
ambos têm o mesmo valor. Ambos têm uma igual dignidade pessoal, uma igual responsabilidade
moral, um mesmo destino eterno, e a existência foi dada aos dois para que tendessem, por meio da
verdade, da moralidade e da religião, à vida imortal.

15 Por esta razão, todo o homem merece o respeito e a justiça, todo o homem tem o direito
essencial a que encontre neste mundo as condições que alimentem a sua vida intelectual e moral e
a sua religião. Ele tem direito ao pão quotidiano para ele e para os seus; ele tem o direito,
igualmente e com mais instância, a um tratamento humano – a uma parte suficiente na instrução e
na liberdade, a uma larga faculdade de orar e de servir a Deus.
Esta verdade parece-nos banal: queira Deus que o fosse! Oxalá que a Igreja não tenha de
ripostar ao desdém dos que assim a consideram, como a certos patrões que transformaram o
operário numa máquina e às teorias que corroboram a sua conduta. Ultimamente ainda, o senhor
Yves Guyot proclamava que a ciência económica é e deve permanecer imoral. Equivale a exprimir
dum modo brutal que o trabalhador não passa de um instrumento, que não tem direito ao respeito
nem à justiça. Logo, torna-se evidente que a tese cristã sobre a dignidade do homem,
___________________________________________
7
A segunda parte é essencialmente prática. Ela trata das obras sociais.

consoante for admitida ou rejeitada, abre à economia social duas vias simplesmente opostas: uma
é a via da justiça e da caridade, é a mesma que a Igreja indica e que conduz à ordem e à paz; a
outra, é a via da exploração desumana e impiedosa, que leva ao socialismo e à guerra das classes.
Quanto a nós, concluímos com a Igreja, que sempre e por todo o lado, o homem guarda a
sua dignidade humana e cristã, que é injusto fazer abstenção dos seus direitos sagrados, para nada
ver nele senão o trabalho mecânico; a ciência económica por conseguinte, longe de poder ser
imoral, deve tratar o homem tal como homem e como cristão.

§ 2. – A família
16 O homem é essencialmente um ser social; a sua natureza e a vontade de Deus destinam-
no a viver e a trabalhar em sociedade. Ora, a primeira sociedade que reúne os homens entre eles,
é a família.
«A família, diz com propriedade um filósofo cristão, é uma obra da natureza, uma
instituição divina, um viveiro da moral, a intermediária entre as antigas e as novas gerações, a
base dos Estados e da humanidade; todo o ordenamento se apoia sobre ela».8
A família tem a sua finalidade específica, o seu destino providencial. É apenas nela que o
homem, a mulher e a criança encontram simultaneamente a satisfação das suas diferentes
necessidades, a sua parte de felicidade, e as condições normais da sua dignidade e do seu destino.
Por causa disso, a religião sempre acompanhou, com bênçãos e cuidados, o matrimónio e
a família. Jesus Cristo fez do contracto matrimonial um sacramento e promoveu a família para
uma maior nobreza e santidade.
Constituída assim na natureza e na graça, a família estrutura-se em corpo inviolável e
sagrado, possuindo direitos imprescindíveis; direitos estes que o poder humano não pode criá-los,
mas que os deve reconhecer e proteger.9 Enquanto a família se funde com outras famílias, no
organismo social, ela permanece, pela sua própria natureza, uma unidade perfeita; ela conserva
uma vida própria, uma história especial, com leis divinas e eternas, lei de estabilidade, lei de
autoridade, lei de amor.10

17 «A família, compreendida deste modo, é a locomotiva da sociedade humana. Que é uma


nação, a não ser uma família aumentada, uma federação de famílias? E como guardarão a sua
consistência os grupos fictícios, se as unidades naturais de que foram formados tivessem perdido
a sua? Ah! Não estão enganados sobre isso, os tais homens de extermínio, cujos atentados
selvagens fazem terror ao mundo, cujas ameaças pesam qual pesadelo sobre o final de um século
que se acreditava tão forte! Eles sabem que para destruir a ordem social, não é ao governo que
se deve atacar; os governos, são substituídos; é a família que se deve dissolver, pois que uma vez
destruída, ela já não mais se refaz. “Ora, a família, dizem eles, e cito aqui as suas idênticas
palavras, a família é a nossa inimiga, porque ela é a mãe da propriedade e da autoridade”. Eles
deveriam acrescentar: porque ela é a mãe da justiça e do amor.
________________________________________
8
F. WALTER, citado por Meyer, página 55.
9
Encíclica.
10
Cf. Monsenhor D’HULST, Primeira Conferência, 1894.

18 Também depois de um século imbuído de ideias revolucionárias, qual é o pior mal da


classe operária? É o da fragilização do laço familiar. Que, em primeiro lugar, as classes superiores
deem o exemplo de uma vida sóbria e pura; depois, que se inclinem para os deserdados para lhes
ensinar a respeitar neles mesmos a imagem de Deus, a amar nos seus lares a verdadeira garantia
da sua dignidade e da sua independência!
A este mundo que hesita, desconcertado, entre tantas doutrinas paradoxais, mostremos
magnífico espetáculo seguinte: um grupo compacto de famílias fiéis à lei da estabilidade, à lei da
autoridade, à lei do amor. Que, ao vê-las, sejamos forçados a exclamar: se todas as famílias fossem
decalcadas sobre este modelo, a sociedade ficaria salva!».11
§ 3. – A sociedade- O Estado
19 I. Necessidade. – Os homens, não só devem viver em família, mas também se unirem
numa sociedade mais vasta, que se chama tribo, cidade, nação. A própria natureza do homem faz
da sua tendência social uma necessidade e uma lei. Considerai, com efeito, as faculdades do
homem, vereis que todas, para adquirirem a sua maturidade, exigem o benefício da vida social. Já
para o conveniente cuidado da sua vida corporal, são-lhe precisos mil objetos necessários ou úteis;
daí derivam os diversos ofícios e as trocas por consequência. Quanto mais vede, a nível superior,
a vida intelectual, na sua dupla florescência, a ciência e a arte: para que possam nascer, crescer,
desenvolver-se, estas duas flores mergulham as suas raízes no terreno social e pedem emprestado
à atmosfera social o ar que elas respiram.

20 Mais necessária e formosa, e até mais geral, é a vida moral, já que reina em toda a
consciência humana, e que prepara a vida imortal, a vida em Deus, à qual todo o homem está
destinado! Ora, é na vida social que se conservam os dados fundamentais da moral; é aí que
encontram as suas principais aplicações.
Toda a vida moral, na verdade, repousa sobre uma tradição religiosa tão antiga como o
homem; ela é dominada pelo fato da humanidade estar vocacionada a um estado sobrenatural e a
um fim sobrenatural. Ora, este fato e esta tradição não podem ser conhecidas nem transmitidas
senão pela sociedade e pela educação que dá.

21 Para atingir este fim, o homem carece da força que lhe advém do meio e da educação, do
exemplo e do relacionamento mútuos; precisa ainda para o seu corpo e sua alma da ajuda e da
caridade fraternas. É em sociedade com seus semelhantes que pode praticar a virtude e a dedicação,
que se lhe impõem, a fim de que possa cumprir o seu destino.
Finalmente, não será justo que os homens, filhos do mesmo Deus, se unam para prestar a
seu Pai e Mestre os deveres de religião que lhe são devidos?

22 II. Falsa nação. – A sociedade, tendo sido querida pela natureza e por Deus, não é, por
conseguinte, uma obra puramente humana. Ela não brotou de uma livre convenção, como o
quereria Jean-Jacques Rousseau no seu Contrato social.
Suponde que esta origem esteja posta na sociedade, por quê então este contrato o iria
prender à geração futura? O que alguns fizeram, outros poderão desfazê-lo e sapar um edifício
__________________________________________
11
Cf. Monsenhor D’HULST, Primeira Conferência, 1894.

que repousa sobre princípios de convenção. Abre-se assim a porta às extravagâncias sociais, à
anarquia.
A parte do homem na organização social, consiste na construção do organismo que lhe é
necessário, e na determinação do sujeito que deverá exercer este poder cujos direitos e deveres são
traçados por Deus e pela natureza

23 Uma consequência oposta, provinda do erro de Rousseau, é a tirania.


Se a sociedade não tiver outro princípio que não for o de um contracto livre, o Estado, uma
vez constituído, é a única fonte do direito: ele não reconhece nenhum direito anterior ou superior
ao seu. O indivíduo nada pode opor-lhe, nem a sua consciência, nem o seu destino celeste. A
família não tem outra lei nem outra constituição a não ser aquela que recebe do Estado. A religião
perde qualquer direito divino. O que agrada ao Estado ordenar, é quanto basta para constituir o
direito. Desde então, o arbitrário sancionado pelo número, sustentado pela força, eis a lei.

24 III. Outro erro. – Rejeitou-se a crença tradicional da decadência da natureza humana;


fechou-se os olhos ao fato patente da sua maior inclinação para o mal do que para o bem,
proclamou-se o homem capaz, pelas suas próprias forças, de atingir à virtude mais consomada.
Inútil, portanto, a moral cristã e o seu conjunto de práticas religiosas, força e salvaguarda
contra as paixões! Pueril o arsenal das ameaças contra o vício e as recompensas para a virtude!
«Quereis que se encerrem as prisões? Fundai escolas!» (Victor Hugo). «A experiência
prova, diz tristemente, o senhor Francis Charmes, que a instrução não basta…».12 Acaso não se
tinha a experiência de seis mil anos e a tradição religiosa da humanidade para se confirmar a
doutrina da Igreja?
Se o homem pode e deve cumprir com todo o seu dever, só o consegue lutando a vida
inteira, e não apenas pelas suas forças exclusivas, mas pedindo à graça divina o alimento e o
socorro.
É o homem enquanto tal, com a sua propensão para o mal, que o Estado deve governar.
Crer e agir de modo diferente, é cair na utopia com suas ilusões e desastres.

25 IV. Verdadeira noção do Estado. – A sociedade está destinada a viver sob a direção de
um poder central, o Estado. Este tem o direito ao respeito, à obediência.
O Estado deve ao indivíduo, à família, aos governos diversos consagrados pela história e
pela experiência, uma proteção respeitosa e eficaz, uma salvaguarda. Não é dele que obtêm a sua
existência ou suas leis essenciais.
O Estado não se deve substituir a eles, tratando-os como suas criaturas, mas deve agregá-
los num corpo organizado, assegurar o seu interesse particular, e fazê-los concorrer para o bem
comum.
O Estado nada pode contra os direitos essenciais do indivíduo e da família.

26 Esta noção do Estado supõe a submissão do homem e do poder, a Deus. Ela tem por
princípio a dependência do homem a respeito do seu Criador.
O Estado tem uma segunda função, que é a de trabalhar, de uma maneira ativa e inteligente,
ao bem dos seus sujeitos com uma dupla ação: fazer de suplência ao que não pode ser
_____________________________________________
12
21 de Fevereiro de 1894. Jornal dos debates.
feito pelos particulares, e, naquilo que eles podem, ajudá-los a fazer melhor e a progredir.
«Si quid deest supplere, diz São Tomás, si quid melius fieri potest, studet perficere».13

27 V. A sociedade é um organismo. – Se, ao indivíduo, à família, ao Estado, ajuntarmos os


grupos profissionais, religiosos, científicos, reconhecer-se-á que este conjunto não é um
mecanismo mas um organismo, no qual cada órgão tem a sua própria atividade e função.
Indivíduos, famílias, profissões, grupos diversos, são, cada um deles, órgãos vivos e
autónomos.
Sob a direção do Estado, a atividade específica de cada um dá proveito aos órgãos colaterais
e ao corpo por inteiro.
Mas aí, como na família, a hierarquia é uma lei fundamental, donde uma certa desigualdade
entre os membros.
O pai, a mãe, o filho, que têm uma igual dignidade diante de Deus e perante a justiça eterna,
têm uma ordem distinta e funções diferentes. Assim, os cidadãos, iguais diante da lei eterna, devem
ocupar na escala social, posições mais ou menos altas.

28 Haverá sempre entre os homens desigualdades morais e desigualdades físicas; tente-se o


que se poder, mas o nivelamento material seria sempre incompleto. Mas a igualdade social deve
ser restabelecida pelas trocas naturais e ordenadas, conforme às regras do direito e da caridade,
trocas que entrelaçam os grandes com os pequenos e fazem de ambos um conjunto completo.
É através de equivalentes morais e religiosos, cujas vantagens se estendem muito para além
da terra, que a sociedade pode realizar uma igualdade ideal.
A miséria, sem compensação, sem consolação, sem apoio, sem bens morais que possam
servir de compensação, eis o que a sociedade tem por fim de impedir. Quanto à pobreza
propriamente dita, isto é, a participação mais ou menos desfavorável nos bens exteriores, pretender
suprimi-la, é dar um testemunho de pobreza de espírito e fazer uma viagem aos países das
utopias.14

29 VI. O Estado cristão. – Os princípios de uma filosofia sã, que a razão faz descobrir,
fornecem a justa e racional conceção do Estado. Mas a esses princípios naturais, o Evangelho veio
a acrescentar uma conceção ainda mais clara e fecunda.
Os homens, esclarecidos pelo cristianismo, conhecem melhor a sua dignidade, os seus
direitos, têm maior sede de justiça e liberdade; têm igualmente uma maior carência de honra e de
virtude. O ideal dos cristãos é tanto mais claro quão elevado. Logo, não se deixam governar mais
pelos únicos meios que haviam bastado ao paganismo. Ao novo estado do espírito, criado pelo
Evangelho, deve-se aplicar princípios novos.
Para o Estado, como para a família, e o mesmo para o indivíduo, existe um direito cristão.
É este preciso direito cristão que Leão XIII proclamou na encíclica Immortale Dei, sobre a
constituição cristã dos Estados. A encíclica deve estar presente no espírito de todos os homens que
se empenham em reconstituir sobre bases verdadeiras uma sociedade dividida.
____________________________________________
13
De regimine principum, liber primus, caput XV.
14
MEYER, obra citada, páginas 62, 63.

§ 4. – A religião

30 I. Os seus benefícios – A natureza do homem e o seu destino, os interesses da família e os


do Estado são tais que não é possível de os separar da ideia de Deus ou da religião. O seu
esquecimento provoca todas as desordens; ela é necessária à prosperidade, mesmo aquela material
da vida presente. Pela religião, a vida individual e a vida social, se orientam no seu verdadeiro
senso, quer dizer, para Deus.
A intervenção divina na missão de Jesus Cristo, na Incarnação do Filho de Deus, introduziu
no mundo um elemento sobrenatural de que o povo cristão não pode fazer abstração. Da religião
derivam sobre a humanidade energias divinas carregadas dos maiores benefícios para as famílias
e para os povos.
A sociedade, para atingir a sua perfeição, tem necessidade de liberdade, de justiça e de
dedicação, enquanto as paixões humanas estão sempre prontas a criar o egoísmo, a injustiça e o
despotismo. Unicamente a religião permitiu ao homem a plenitude da liberdade; ela apenas
assegura nas relações públicas e privadas os benefícios da justiça; só ela inspira ao coração humano
os contínuos altruísmos e os heroísmos secretos, mesmo quando não houver nenhuma esperança
de recompensa humana.

31 II. Os seus direitos. – O lugar da religião na sociedade deve ser o de um órgão principal e
não o de um órgão secundário.
Pela autoridade de Cristo, a religião revestiu na Igreja as formas de uma sociedade perfeita,
ela recebeu na Igreja direitos superiores a todos os poderes humanos. Por conseguinte a Igreja
católica é quem, ao longo dos séculos, representa e incarna, por assim dizer, o papel da religião e
dos seus direitos.
Quer-se ver, por sua vez, qual o papel imenso e beneficente da Igreja? Que se releia a
primeira parte da encíclica sobre a condição dos operários.

§ 5. – A associação
32 I. Ela é de direito natural. – è o que ensina magistralmente a nossa encíclica com provas
e explicações irrefutáveis: «…Pelo fato das sociedades privadas não terem existência senão no
seio da sociedade civil, na qual são como qualquer uma das suas partes, não se deduz, só falando
em geral e apenas considerando a sua natureza, que esteja no poder do Estado o negar-lhes a
existência. O direito à existência foi-lhes concedido pela própria natureza e a sociedade civil foi
instituída para proteger o direito natural, não para o destruir».
As leis mais funestas que provavelmente a Revolução legou à França são as que suprimem
ou entravam a liberdade de se associar. Assim a multidão, desagregada, pulverizada, ficou entregue
ao enorme poderio do Estado sem contrapeso.
No entanto é bom e necessário que, para gerir os seus assuntos comuns, os homens se
unissem, pusessem em comum as suas forças intelectuais, morais, tanto quanto pecuniárias.
Suavizada, contrabalançada pelos grupos organizados, a potência central pode exercer
melhor a sua missão, protegida de si mesmo contra as suas tendências totalitárias.

33 II. A prática do direito de associação. – A multidão sofre de individualismo, de


isolamento. Mas o povo francês, na sua massificação, não conhece ou não toma o remédio, pois
tem muito pouco desenvolvido o espírito de associação. Conquanto este espírito se desenvolve nos
centros industriais, quanto é defeituoso! O operário da fábrica conhece a greve, mas não conhece
jamais a verdadeira associação, permanente, refletida, sábia e fecunda. A população agrícola tem
necessidade que se lhe eduque a respeito deste ponto.
Este deficit de espírito coletivo provém sem dúvida do egoísmo humano, mas o sofismo,
espalhado pelos filósofos do século passado, falseou as ideias e os sentimentos. Esses foram
apoiados pelos poderes públicos, que tudo fizeram para demover a associação no povo.
Isso foi, para o povo francês, uma causa incontornável de inferioridade.
34 III. Que fazer? – Deve-se ensinar ao povo os meios de associação. Primeiramente, precisa-
se de iluminá-lo sobre um ponto tão grave dos seus interesses. Por meio de conferências, pelo
jornal, por livros, urge devolver ao povo o sentido da associação, dar-lhes a entender as vantagens
e a necessidade.
Logo que possível, usar largamente as liberdades concedidas pela lei. O seu uso
possibilitará reais vantagens do ponto de vista económico e moral; irá despertar melhor do que
qualquer lição o espírito de associação. Enfim, trata-se do melhor meio de conquistar a liberdade
completa que se deve reclamar.
Leão XIII convida-nos a restaurar para o bem, o espírito de associação que muitos outros
já exploram para o mal. Quantos homens enérgicos trabalham para agruparem o povo em vista a
um fim injusto ou a uma causa ímpia! Por quê não se veria cristãos em maior número, até mesmo
com maior energia, a moverem as multidões para que se unam pelos seus legítimos interesses?

§ 6. – A propriedade
35 I. O direito de propriedade privada. – O direito de propriedade privada é seguramente
uma das bases necessárias a toda sociedade civilizada. Para afirmar que este direito procede da
natureza humana, a filosofia e a Igreja, a experiência e a razão, estão de acordo. Mas hoje, como
quer que este direito seja contestado pelas utopias comunistas, nasce a necessidade de ser mais do
que nunca ensinada e defendida.
Numerosos e decisivos são os argumentos que demonstram a necessidade e a legitimidade
da propriedade. Lembremo-los brevemente:
1º. «O homem, como ser racional, é um ser previdente. Ora, a previdência exige que ele
se subvencione, não só às necessidades presentes, mas às necessidades futuras; pelo que não se
poderá fazer sem a posse estável das coisas produtivas. Se as necessidades do homem cessassem
uma vez satisfeitas, esta tomada de posse não estaria certamente no desígnio da natureza. Mas o
homem é assim feito: tem carências que repontam cada dia. Para que fique protegido contra os
efeitos deste constante regresso, é razoável que ele procure apropriar-se, não apenas dos frutos
da terra, mas também do fundamento pelo qual recolhe os ditos frutos. A estabilidade da
necessidade conduz à estabilidade da possessão. Esta razão toma um valor ainda maior, se for
considerado, já não o homem isolado, mas o homem doméstico com a obrigação do pai prover ao
futuro de seus filhos».15
_________________________________________
15
LIBERATORE, Princípios de economia política, página 165.

36 «A natureza impõe ao pai de família o sagrado dever de alimentar e manter os seus filhos.
Ela até vai mais longe: como os filhos refletem a fisionomia do seu pai e são uma espécie de
prolongamento da sua pessoa, a natureza lhe inspira de se preocupar com o futuro deles e de lhes
criar um património que os ajude a se defenderem de todas as surpresas da má sorte durante a
perigosa travessia da vida. Mas este património, poderá ele acaso criar sem a aquisição e a posse
de bens permanentes e produtivos para que possa transmiti-los por via da herança?».16

37 2º. «Aliás, o trabalho é eminentemente pessoal ao homem. São as próprias faculdades


postas em ação. Se estas faculdades se exercerem sobre um objeto que não pertença a ninguém,
este objeto móvel ou imóvel, matéria ou propriedade agrária, agora aperfeiçoada e transformada,
estará inseparável do trabalho ao qual deve a sua transformação e pertencerá com toda a justiça
ao trabalhador qual equivalente do seu trabalho».
Se o trabalho tiver por objetivo um objeto pertencente a outrem, e se este objeto for
aperfeiçoado e transformado a pedido expresso do seu proprietário, o trabalhador será
recompensado do seu trabalho por um salário.
Nisto se vê mais uma das origens do direito de propriedade.

38 3º. A estas provas da legitimidade da propriedade, tiradas da previdência e do trabalho,


acrescentemos as razões que São Tomás deduz das condições da vida humana. Ele expõe três
delas:
1) «Primeiramente, a propriedade é o único meio de obter uma boa gestão dos bens
terrenos; pois que todo o homem administra o que lhe pertence, a si próprio, melhor do que o que
possui em comum com outros. Não será um fato constatável neste último caso, que cada um foge
ao trabalho e em geral reenvia para os outros o que é ordenado a todos? É o que se nota muitas
vezes nas casas onde se encontram muitos servidores».
Suponde que os bens terrestres sejam de todos, em geral, e de ninguém em particular. Quem
portanto quererá trabalhar para o seu vizinho e passar por um sofrimento cujo fruto não gozará?
Vereis rapidamente perecer toda a iniciativa, todo o esforço, e com esses, toda a propriedade e
todo o progresso.

39 2) Em segundo lugar, «se se quiser ver reinar nas coisas humanas a ordem necessária à sua
boa gestão, é preciso que o cuidado de cada coisa em particular volte a pertencer de direito aos
indivíduos; pois, se cada um devesse velar por tudo, seguir-se-ia uma confusão geral».
De fato, a diversidade das profissões exige uma organização. Ora, «o elemento essencial
desta organização geral do trabalho é a propriedade repartida por famílias (o património), que
determina, em geral, a vocação dos membros de cada família e impede as repentinas flutuações,
a brusca passagem de grandes massas de homens dum trabalho e de um género de vida a um
outro. Que confusão insanável no trabalho, se contínuas partilhas viessem quebrar este laço
poderoso da ordem social».17
_________________________________________
16
Encíclica Rerum Novarum.
17
KETTELER, Obras escolhidas, página 12.

40 3) «Finalmente e em terceiro lugar, só o direito de propriedade pode manter a paz entre os


homens e ensinar a cada um a se contentar com a sua parte. Não será um dado da experiência
quotidiana que a posse de uma coisa em comum leva a muitas e frequentes querelas»?
«Se, já, há irmãos que não chegam a entenderem-se quando querem partilhar a herança
paterna; se as pessoas de uma mesma casa se zangam, quando não têm para se partilhar mais do
que o ar desta casa e a água duma mesma fonte, que será então da humanidade quando toda a
propriedade e todo o trabalho deverão ser partilhados cada dia? Toda a humanidade seria
dilacerada por querelas e por ódios».18

41 Por conseguinte, sendo assim, e consideradas as condições reais nas quais o homem
decaído deve viver, seja como indivíduo, seja como chefe de família, seja como membro do corpo
social, a propriedade aparece sempre como o meio eficaz que possibilita a cada um e a todos a
subsistência e a paz. Eis porque Deus quis a propriedade. Daí deriva que, em todas as nações
civilizadas, o direito de propriedade teve e terá sempre o poder das leis divinas e humanas para o
proteger. Igualmente nos nossos dias, essas leis estão unidas para continuar a defender, ao mesmo
tempo, a sociedade, a civilização e a religião.

42 II. O uso da propriedade. – É a partir da finalidade e das condições normais da vida social
que surge o direito de propriedade. Não será, desde então, quiçá evidente, que este direito tenha
como consequência certos deveres: aqueles provindos da necessidade de dar a todo o homem o
meio suficiente para viver? Desembaraçado, se ficar destes deveres como de um entrave
atrapalhador, o direito de propriedade tornar-se-á depressa abusivo, odioso, e longe de servir à
sociedade, vai preparar-lhe terríveis solavancos.
Também a Igreja nunca separou os dois aspetos da propriedade. Ela que, melhor que
ninguém, patrocina a cada um o seu direito e, mais alto que qualquer um, prega a todos o seu dever.

43 São Tomás, na sua Suma Teológica, formulou com uma admirável precisão o ensino da
Igreja. Leão XIII, na encíclica, o reproduz palavra por palavra. «Sobre o uso das riquezas, diz, eis
o ensino de uma excelência e de uma importância extrema que a filosofia pode esboçar, mas que
pertencia à Igreja de no-lo dar na sua perfeição e de o fazer descer do conhecimento à prática. O
fundamento desta doutrina está na distinção entre a justa posse das riquezas e o seu legítimo uso.
A propriedade privada, já vimos anteriormente é para o homem de direito natural, o exercício
deste direito é coisa não só permitida, sobretudo para quem vive na sociedade, mas também
absolutamente necessária. Entretanto, se alguém pedir em quê deve consistir o uso dos bens, a
Igreja responde sem hesitação: “A este respeito, o homem não deve reter as coisas exteriores
como privadas, mas bens comuns, de tal sorte que condivida facilmente com outros nas suas
necessidades. É por esta razão que o apóstolo disse: «Divitibus hujus saeculi praecipe… facile
tribuere, communicare, “ordena aos ricos deste mundo… de dar facilmente, de comunicar as suas
riquezas”».19

44 «Ninguém é obrigado, certamente, a aliviar o próximo ao tomar do seu necessário ou o


________________________________________________
18
KETTELER, ibidem, página 13.
19
São Tomás, II a, II ae, quaestio 66, articulum 2.

da sua família, nem mesmo cortar nada do que as conveniências ou comodidades impõem à sua
pessoa: ninguém, com efeito, deve viver contrariamente ao que for conveniente. Mas desde que se
atendeu suficientemente à necessidade e ao decoro, é dever de verter o supérfluo no seio dos
pobres. È um dever, não de estrita justiça, salvo em caso de extrema necessidade, mas da caridade
cristã; um dever, por consequência, que não será prosseguido nem cumprido apenas pelas vias da
justiça humana. Mas, para além dos julgamentos do homem e das suas leis, há a lei e o julgamento
de Jesus Cristo, nosso Deus, que nos persuade por muitos modos a dar habitualmente uma esmola;
é mais feliz, diz, quem dá do que aquele que recebe, e o Senhor irá considerar feita ou recusada a
esmola, como se fosse para si mesmo, aquela que se tiver feito ou recusado aos pobres. Cada vez
que derdes a esmola a um destes meus irmãos mais pequenos que vedes, é a mim que o tendes
dado».
45 Vede como a Igreja julga o direito e o uso da propriedade. É o esquecimento da sua
doutrina que deixou os ricos fazer dos seus bens um uso egoísta e antissocial e que suscitou no
coração dos infelizes o ódio e a inveja. Mas o esquecimento do dever traz hoje a sua pena, produziu
o desabamento do direito. Quer-se dar a este sólido direito, o respeito que merece? Que se o torne,
então, como outrora, útil e beneficente para cumprir o dever com generosidade. Que os possuidores
olhem para os seus bens, não como um quinhão sortudo de que possam gozar em egoístas, mas
como um depósito que Deus lhes confiou para adquirirem méritos ao socorrerem o próximo.
Esta foi sempre a doutrina da Igreja. Os oradores cristãos do século XVII exprimiram-no
como os Padres dos primeiros séculos. O que a corte do grande rei teve de escutar com atenção,
não teremos nós o direito de o repetir neste tempo, sem que logo nos alcunhem de socialistas?

46 Para nos justificar, deixemos que nos falem por um instante Bossuet e Bourdaloue.
«Sabei, dizia Bossuet, que se fordes os verdadeiros proprietários segundo a justiça dos
homens, não vos deveis considerar senão dispensadores diante da justiça de Deus, que vos pedirá
contas disso. Não vos persuadais que Ele abandonou o cuidado dos pobres. Mesmo se os virdes
destituídos de todas as coisas, guardai-vos de crer que tenham perdido esse direito natural que
têm de tomar à massa comum o que lhes é necessário. Não, não, ó ricos do século, não é só para
vós que Deus faz levantar o sol, e humecta a terra, nem que dá no seu seio uma tão grande
diversidade de sementes para proveito. Os pobres têm nisso a sua parte tal como vós. Confesso
que Deus não lhes deu alguma base fundiária, mas destinou-lhes a subsistência sobre os bens que
vos pertencem, na medida em que sois ricos… Ele quis que tivésseis a honra de fazer viver o vosso
semelhante…»

47 Bourdaloue não é menos explícito. Ele proclama que «a esmola não é somente um
conselho, mas um preceito. Ela não é uma obra resultante duma insistente rogação, mas uma
obrigação estreita e rigorosa e uma lei severa que não respeita menos no nosso destino eterno».
O século XVII não tinha esta classe de proletários que a indústria produziu. É a forma atual
do pauperismo, e a primeira esmola que lhe é devida, é o justo salário, o salário próprio a fazer
subsistir o operário nas condições normais.

§ 7. – O trabalho
48 I. A sua necessidade. – O trabalho é o único meio pelo qual o homem pode prover às
necessidades da sua vida. A terra contém em potência o de quê satisfazer as necessidades sem
cessar renascentes, mas as suas riquezas não podem ser exploradas a não ser pelo trabalho. Cultura
da terra, criação da indústria, a pesca, a caça ou a colheita, trata-se sempre de trabalho.20
As riquezas naturais enquanto tais: Matérias-primas, fontes, florestas, pradarias, pedreiras,
minas, força motriz, cursos de água, não se tornam úteis que não seja pelo trabalho que as descobre
e explora.
Sem trabalho, as coisas úteis ou agradáveis ou não existiriam ou de nada serviriam.

49 II. O trabalho cristão. – Desde o pecado original, o trabalho tomou o carácter de uma
expiação, mas ganhou então um novo valor. Se é uma punição, tornou-se numa reparação, um
remédio, e um preservativo do pecado, tão meritório quão salutar.
Ao se entregar até aos trinta anos aos labores de um trabalho manual e durante três anos
aos da pregação, o Homem-Deus deu ao trabalho uma verdadeira dignidade. Que seja
simplesmente manual, intelectual ou artístico, desde que seja santificado, conduz o homem a Deus,
é sempre respeitável ou meritório.
«Se existir (entre os homens) diz Leão XIII, quem prometa ao pobre uma vida exempta de
sofrimentos e de penas, toda feita de repouso e de perpétuas jubilações, esse certamente engana
o povo e lhe arma ratoeiras onde se escondem de futuro, maiores calamidades que as do tempo
presente».

50 III. O Trabalho social. – Profissões.21 – Nunca é possível que cada indivíduo se baste a si
mesmo e possa satisfazer tudo o que reclama a sua natureza de homem. Para as suas necessidades
físicas, quantos objetos precisos à alimentação, ao trajar, ao alojamento! Para suas carências
morais, poderá ele tirar da sua própria lavra, a instrução, a educação, os socorros espirituais e
divinos? Na vida social, não será preciso velar pela segurança interior e exterior do país, pela
urdidura das leis, pela manutenção da justiça, e pelos interesses gerais da nação?
Os trabalhos, portanto, devem ser partilhados e repartidos. Nesta infinita variedade de
ocupações, cada um encontra as aptidões que possui, ao exercer as que lhe dão maior prazer e
utilidade.

51 Daí nasceram as profissões.


Sob o reino de Cristo, não mais há função servil, todas as profissões honestas são honrosas;
no entanto, elas conservam a sua hierarquia social: as profissões liberais e as profissões
económicas; estas têm por objeto a criação dos produtos materiais, suas trocas e seu transporte.
As diversas profissões trocam serviços reciprocamente. Quem negará a feliz influência da
religião e da moral, ensinadas pelo sacerdote, sobre o trabalho e a riqueza? Quem negará a ação
salutar exercida pelo poder público, pela ciência, pelas artes e a medicina?

52 Assim aparece o laço social pelo qual Deus reúne os homens numa vasta família na qual
se trocam os trabalhos e os benefícios. Todas as profissões são úteis, mas a sua utilidade é
___________________________________________
20
GIDE, Princípios de economia política, página 119.
21
OTT, Tratado de economia social, 1, página 31.

proporcional às necessidades a que respondem. Onde as necessidades forem maiores que a


produção, o número dos produtores pode crescer sem perigo: é o que se passa na França com a
cultura do trigo. Mas quantas necessidades há, para as quais basta um número restrito de
empregados! Se este limite for ultrapassado, torna-se numa despesa inútil e funesta de força
humana e de dinheiro, enormes despesas sem proveito: funcionários sem trabalho,22 advogados
sem causas, pequenos comerciantes que se arruínam por causa duma clientela diminuta, mestres e
mestras sem alunos, desclassificados de toda a espécie, presa fácil para a miséria e o vício.

53 IV. A divisão do trabalho. – Além desta divisão geral do trabalho em profissões, há uma
outra divisão que tem lugar na própria oficina. Desta feita para a confeção de armas de fogo, os
operários de Liège, segundo os seus sindicatos, estão divididos em vinte e uma categorias que
constituem outros tantos ofícios distintos (Bien du peuple, 3 de Março de 1894). As vantagens de
uma tal divisão são : a redução do trabalho a movimentos muito simples, por vezes mecânicos, a
facilidade de adaptar a tarefa às aptidões do operário, a destreza deste, a economia de tempo feita
pela não mudança de ocupação, a facilidade de aprendizagem.
No entanto, resulta desta divisão tão económica o abrutecimento moral e físico do operário.
Este trabalho, reduzido a alguns movimentos simples, apaga a iniciativa, deforma o corpo e torna
difíceis as suas funções. A raça torna-se bastarda.

54 O patrão não tem mais a preocupação do trabalho. Pouco lhe importa o homem, centenares
de outros podem substituí-lo.
O operário, incapaz de fazer qualquer outra coisa salvo o próprio detalhe particular de que
se habituou, fica à mercê do desemprego ou de um despedimento.
Eis os meios de remediar estes inconvenientes:
1º. A de que o operário tenha uma parte mais justa nos lucros do seu trabalho e uma
compensação equilibrada segundo os seus riscos. A sua participação nos benefícios parece ser a
única a poder resolver esta dificuldade.
2º. Que a jornada de trabalho seja limitada, a fim de deixar ao operário o meio de se ocupar
de uma maneira mais normal do seu corpo e do seu espírito.
3º. É desejável que a aprendizagem ultrapasse as subdivisões muito especializadas de um
dado trabalho, e que o operário domine a sua inteira profissão e até mesmo as noções gerais das
profissões similares.

55 V. A organização do trabalho. – O trabalho concorre de um modo imediato à conservação


da família e da sociedade. Da sua boa ou má organização derivam ou a fartura e a paz, ou o
sofrimento e a perturbação. Trata-se de um órgão essencial da vida do povo. Ao se abordar, não
importa qual questão do problema social, no fim ver-se-á sempre despontar, qual causa do mal ou
invés como remédio, a boa ou a má organização do trabalho.
Um elemento tão essencial poderá ser ele abandonado aos caprichos individuais? O
trabalho poderá ser abandonado às variações das paixões humanas, aos cálculos do egoísmo? È do
trabalho que depende, para a maioria dos homens, o que lhes cabe de justiça e de liberdade. Deixai
agir o interesse, sem consciência nem travão, e terão, como resultado, a injustiça e a escravatura.
O erro, tão grande como funesto, da Revolução e do liberalismo foi o de deixar o trabalho
________________________________________
22
GIDE, opus citatum, página 128.

desagregado, desorganizado, pasto para a exploração e para a concorrência. Deve-se-lhe dar uma
organização sábia, baseada sobre os verdadeiros princípios da justiça e da religião, ao mesmo
tempo que sobre as novas condições criadas pelas máquinas e pela ciência.

§ 8. – A remuneração do trabalho – O salário


56 I. O trabalho não é somente um dever para o homem, também é o meio que lhe deve
fornecer a sua subsistência, a restauração das suas forças e os recursos para educar os seus filhos.
Ora, o salário tornou-se, desde o começo da industrialização, na forma mais comum da
remuneração do trabalho. Por conseguinte, é necessário que o trabalhador encontre no seu salário
as vantagens que acabamos de enumerar. Está nisso o princípio fundamental que a encíclica põe
em relevo para, de seguida, deduzir a verdadeira teoria do salário.

57 II. Não. Diz o Santo Padre, a fixação do salário não depende unicamente de um contrato
livre passado entre o patrão e o operário.
O trabalho tem um duplo caráter. Ele é pessoal, porque a força física é propriedade daquele
que a exerce; mas ele também é necessário, porque o homem tem necessidade do fruto do seu
trabalho para conservar a sua existência. É a lei da natureza: «Tu comerás o teu pão com o suor do
teu rosto» [Gn.3,19].
Estes dois caracteres são inseparáveis, Se o trabalho fosse puramente pessoal e livre, o
trabalhador poderia, à sua vontade, estipular um salário insuficiente. Mas o operário encontra-se
em face de um dever ao qual não pode se subtrair: ele deve conservar a sua vida, e é pelo seu
salário que ele deve encontrar o que lhe é necessário para a sua subsistência. Toda a convenção
contrária fere a equidade natural (encíclica, edição de Liège, página 28).
Estes princípios contradizem formalmente as teorias da economia liberal, que muitos
católicos tinham aceitado com ânimo leve.

58 III. Mas exigirá a justiça que o salário baste não só à subsistência pessoal do operário, mas
ainda à da sua esposa e de seus filhos?
Uma dúvida ficou de pé, uma vez que a encíclica afirma somente que o salário deve bastar
para fazer subsistir o operário sóbrio e honesto.
Os partidários da negativa objetam que o operário, pai de família, não trabalha mais do que
o celibatário. Eles acrescentam dizendo que o salário jamais poderá ser proporcional às
necessidades de uma família numerosa.
Apesar destas objeções, a tese não dá espaço a dúvidas: o salário normal deve bastar, nas
condições ordinárias, para fazer subsistir o operário e a sua família.
Se a justiça comutativa não o exigir em virtude do contrato, restam outros deveres que
procedem da equidade natural. Não se pode agir de forma que o operário não se possa casar ou
não possa sustentar a própria família.

59 Se a encíclica não toca senão no operário, é porque ela considera-o in concreto, nas
condições normais da sua existência, com sua mulher e seus filhos. O Santo Padre indica-o bem
através duma outra passagem da encíclica em que diz: «o operário, que receberá um salário
bastante amplo para satisfazer facilmente às suas necessidades e às da sua família, deverá
comportar-se com parcimónia».
O celibatário e o pai de uma família numerosa estão fora das condições normais e
ordinárias. O primeiro deve economizar o excedente do seu salário para fundar uma família. O
segundo deve procurar nas instituições corporativas e caritativas o que o salário não chega a lhe
dar.
Também nada impede que se considere o trabalho da mulher; mas, numa sociedade bem
organizada, o lugar da mulher é o seu lar, e os seus ganhos são mínimos.

60 Esta tese é a mesma dos mestres mais autorizados.


«O trabalho para o operário, diz o Pade Liberatore, é virtualmente o que é necessário para
o seu sustento e da sua família. Se portanto ele proporcionar ao patrão o aproveitar-se deste
trabalho, então o patrão deve-lhe dar uma retribuição equivalente, a fim de manter a igualdade
na permuta, isto é, na justiça: “Justitia aequalitatem importat” (São Tomás, Suma teológica).
Para dar satisfação às necessidades e aos deveres normais e ordinários, acrescenta o
Padre Liberatore, a sociedade deve oferecer um meio ordinário e normal. Ora, de uma parte, é
normal que um operário tenha uma família e, de outra parte, o meio normal que Deus lhe dá, é o
trabalho. Logo, é preciso que a remuneração do trabalho baste às necessidades da família».23

61 Este sentimento é idêntico ao do Cardeal Manning, ao do Cardeal Gibbons, ao de


Monsenhor Ireland; é o mesmo propósito emitido pelo congresso católico de Génova sob proposta
de Monsenhor Nicotera, núncio em Haia.24
__________________________________________________
23
LIBERATORE, Princípios de economia política, página 250 e seguintes.
24
Esta controvérsia foi aberta nestes últimos tempos. Objetou-se acerca dos velhos teólogos que não
dão ao justo salário exceto a estimativa comum, e em especial Suarez, que declara que o justo salário
nem sempre bastará às necessidades da família.
Responderemos primeiramente que temos sempre feito a mesma restrição de Suarez. Há casos em que
o justo salário não bastará para a família, por exemplo, se a família do operário for excessivamente
numerosa ou se tal indústria, estando em dificuldades, o patrão não pode pagar mais, ou se tal operário
não pode fornecer senão um trabalho de medíocre valor.
Pelo que se refere à regra dos velhos teólogos, nós apreciamos a explicação que disso dá Monsenhor
t’Serclaes, eminente reitor do Colégio belga de Roma. Esta estimativa comum não deve ser confundida
com o salário corrente, que pode ser muito injusto em certas circunstâncias. Esta avaliação comum deve
ser a de gente prudente e timorata. Não se fazem regras de moral com o sufrágio universal. É assim que
a Igreja o entende, quando ela fala sobre estimativa comum para questões de justiça. Frequentemente
até ela o diz expressamente, por exemplo nas respostas das Congregações romanas relativamente às
taxas de juro.
Pois bem! A estimativa comum dos salários, assim compreendida, será conforme ao que chamamos
salário normal. Ela levará em conta a família.
Que diz, com efeito, o operário que pede um salário? Ele diz: «Eu não estou sozinho, tenho necessidade
de fazer viver a minha mulher e os meus filhos». O patrão sábio e timorato leva em conta esta
consideração e o salário comum entre pessoas honestas estabelece-se sobre esta base, exceto em casos
excecionais que toda a gente admite (Ver a carta de Monsenhor t’Serclaes, no Bem público de Gand, de
20 de Janeiro de 1895).

62 Se uma resposta do Cardeal Zigliara pareceu contradizer esta solução, já que não exigia
para o salário senão os alimentos do trabalhador, é porque ele tomava o termo alimentos no sentido
canónico para tudo quanto é devido ao trem de vida de um homem nas condições normais da sua
existência e com os encargos de uma família. Esta interpretação está autorizada pela resposta do
Reverendo Padre Eschbach, que se tinha informado sobre a intenção do Santo Padre.

63 IV. Mas, dir-se-á, esta teoria do salário, unida à daquela que deseja reduzir o trabalho das
mulheres, exigiria um aumento sensível dos salários da indústria. Ora, no regime atual de
concorrência ilimitada, este aumento é impossível. O patrão que o aplicasse cavaria cedo a sua
ruína.
Isso precisamente só prova que o regime atual é mau, injusto, antissocial, e é por isso que
Leão XIII pede que se reaja contra este regime iníquo, para o fazer substituir por um outro mais
conforme à justiça.
Os eternos princípios não devem ceder perante os fatos. A verdade arrastará os espíritos e
produzirá, com o concurso da Providência, a reforma dos costumes sociais.
Uma sociedade cristã deve ser organizada de modo a que o homem que trabalhe não seja,
senão o mais raramente possível, obrigado a recorrer à caridade. Deve haver instituições, e reservas
nas diversas profissões, para ajudar as famílias numerosas e os inválidos do trabalho. Esta ajuda
fornecida para superar os infortúnios da existência do operário honesto que fez quanto podia,
reclama um caráter especial, verdadeiramente distinto da esmola concedida aos miseráveis.

§ 9. – O capital
64 I. O capital é o fruto da poupança. É constituído por uma porção da riqueza não consumida.
Todavia, os economistas não dão este nome a não ser à poupança considerada destinada à
produção de uma nova riqueza.
O capital não é necessariamente uma soma de dinheiro. Consiste nas diversíssimas coisas
que têm uma utilidade ou um valor e que estão destinadas a produzir uma nova riqueza. Tais podem
ser as sementes para a agricultura, as matérias-primas para as manufaturas, os meios de transporte,
as máquinas, etc.; tudo o que pode reduzir-se a duas grandes categorias: os instrumentos e as
provisões.
Um comerciante, um artesão, um cultivador e não possuem ordinariamente sob a forma de
dinheiro a não ser uma pequena parte do valor que compõe o seu capital.

65 II. O capital será um agente produtor?


Os elementos necessários à produção são três: a terra, o trabalho, o capital.
O trabalho é seguramente um agente produtor; é o dinheiro por excelência, o agente
universal.
A terra será ela um agente produtor? Sem dúvida alguma. A sua produtividade natural é
explorada e melhorada pelo trabalho.
Mas o capital, quer dizer, o instrumento de trabalho criado pelo homem, será um agente
produtor?
Para falar com propriedade, não. O instrumento não age por si mesmo. O homem, para
produzir, serve-se do instrumento, mas o instrumento não produz.
O capital no entanto ajuda à produtividade. O instrumento de trabalho é necessário
frequentemente, e sempre útil. Toda a empresa importante exige dinheiro avançado, máquinas, um
capital em suma, sem o qual a empresa não poderia começar nem perseverar. Deste modo, o capital
é uma condição necessária, um meio frequentemente indispensável. Pode-se lhe dar o nome de
auxiliar da produção.

§ 10. – A renda
66 O trabalho, a terra, os capitais concorrem, cada à sua maneira, para a criação dos produtos.
Trata-se de saber se devem e como devem ser partilhados os produtos ou o preço destes produtos.
Uma primeira parte destina-se por direito a remunerar o trabalho, é o salário do operário
ou os emolumentos do empregado.
Uma outra parte deverá ser feita ao que possui a terra sem que ele próprio a cultive?

67 A renda – é o nome consagrado, - paga pelo caseiro que trabalha, ao proprietário que não
trabalha, será ela legítima?
A teologia não a põe em dúvida. Um homem pode apropriar-se de um campo. Ele se
apropria simultaneamente das forças naturais e produtivas desse campo. Portanto é a ele que
pertence igualmente a porção do produto correspondente a estas forças produtivas. E então, desde
que alugue este campo, ele pode receber essa porção, seja em produtos naturais, seja em dinheiro,
como preço de aluguer.
Como direito, a renda portanto é legítima, mas de fato quão facilmente pode penetrar a
injustiça aí no contrato que estipula o quantitativo da renda! Como é fácil ao proprietário impor ao
trabalhador que labora a sua terra condições onerosas e sem proporção com a parte legítima que
lhe compete!

68 Os princípios de justiça, relembrados por Leão XIII aos patrões, conservam a sua força a
respeito dos proprietários agrários.
A injustiça, sempre gritante, torna-se num mal ainda maior quando uma renda exagerada
vai alimentar homens cheios de saúde e que não prestam ao seu semelhante qualquer serviço. A
terra não é objeto de propriedade senão para um maior bem social; o trabalho é uma função social:
para viver da sua própria terra e do trabalho de outrem, e para justificar isso aos olhos dos que
padecem, é absolutamente desejável, senão fundamental, que se pague a sua parte de serviços ao
país, diferentemente do que pela ociosidade e pelo prazer. É o esquecimento destes princípios que
fornece tantos pretextos aos inimigos da propriedade.
Os abusos a que se expõe o contrato de trabalho na quinta indicam suficientemente que, se
o contrato for justo em si, está longe de ser o melhor. Quanto mais imparcial seria o contrato de
associação entre o proprietário do solo e o cultivador, que, desde então, correriam as mesmas
oportunidades e riscos idênticos, e se encontrariam colocados nas condições mais próximas da
igualdade!

§ 11. – O lucro, o interesse, a usura


69 O capital terá ele quiçá uma parte a retirar sobre o preço dos produtos? Com efeito,
concede-se-lhe uma, sob o nome de lucro ou de benefício se o capital é explorado pelo seu
possuidor; de interesse, se o capital é emprestado. Segundo o direito, esta parte exigida pelo capital
será ela legítima?
1.O lucro. – Falamos de benefício limpo, do lucro que fica além da remoção de todas as
despesas justificadas. Pois o capital em jogo tem direito, antes de mais, a uma prima de segurança,
que garanta o seu possuidor contra os riscos que corre, depois à amortização do próprio capital, se
for transformado em instrumentos de trabalho que se fanam com o tempo. Da mesma feita o
empresário que dá a uma obra o seu tempo, a sua inteligência, que suporta todas as preocupações,
tem direito a uma justa remuneração que o faça viver segundo a sua condição, a ele e à sua família.
Mas se, uma vez feita toda a subtração, do interesse, da amortização e dos salários, ficar algum
lucro, a quem pertencerá este lucro?
Se for por inteiro ao empresário, a justiça não será violada? Seria difícil afirmá-lo, pois
parece conforme à estrita justiça que o benefício pertença àquele que, a seus próprios riscos e
perigos, investiu numa obra honesta a sua fortuna e o seu labor, e que pagou a seus colaboradores,
o salário aprazado.

70 Todavia, não seria ainda melhor e mais conforme à equidade que, no lucro limpo, houvesse
uma parte para o trabalhador? Sem dúvida, ele já recebeu, supomos, o salário apropriado, que lhe
cabe por direito. Mas, será que ele também não terá arriscado a sua própria vida? Nem terá ele
usado as suas próprias forças e cooperado pelo seu trabalho para os lucros obtidos? Portanto, ficaria
bem que ele fosse admitido, segundo uma parte proporcional, à partilha destes lucros.
É o que já se pratica nalgumas fábricas nas quais os operários participam na prosperidade
dos negócios e recebem uma parte nos benefícios. A parte que respeitaria aos operários poderia
aliás não ser distribuída individualmente mas ser consagrada com vantagem ao serviço dos
interesses gerais, tais como caixas de seguros, de socorro mútuo, etc. Quão eficaz seria este modo
de agir para reintroduzir a paz nas relações entre o capital e o trabalho!

71 II. O interesse, a usura. – Mas uma parte do produto deverá voltar ao capital, esse que só
foi emprestado? Por outras palavras, o dinheiro poderá pretender, com justiça, um interesse?
1. Numa tese absoluta, o empréstimo propriamente dito, o mutuum, se não intervier alguma
circunstância que mude a sua natureza, é essencialmente gratuito. Tal é o caráter do empréstimo
propriamente dito, feito ao pobre angustiado, o de ser um serviço gratuito. Exigir um interesse para
um serviço que deve ser gratuito, é o mesmo que violar a natureza do contrato, é cometer usura,
cem vezes condenada pela Igreja.25
2. Mas haverá circunstâncias extrínsecas que modifiquem as condições do contrato do
empréstimo?
A Igreja sempre admitiu como possível o fato de que títulos particulares, que não são
intrínsecos ao empréstimo, dão um direito legítimo a receber um certo interesse. Assim, a perda
_______________________________________________
25
Nós não damos senão este motivo da gratuidade essencial ao contrato do empréstimo. Outras fazem
valer também a esterilidade do dinheiro, que é improdutivo por si mesmo. Cf. GURY-BALLERINI, De
Mutuo.

sofrida (damnum emergens), a falta de ganho, como se costuma dizer no estilo comercial (lucrum
cessans), o risco particular ao qual fica exposto o capital (periculum sortis), podem dar direito a
quem empresta de reclamar uma justa indemnização, que nada tem a ver com um interesse recebido
em virtude do próprio empréstimo (De Pascal, Filosofia moral e social, página 588).
Estes diversos títulos podem ser encontrados em todas as épocas da história.

72 3. Mas haverá, no nosso tempo, condições particulares que modifiquem ainda mais o
empréstimo de capitais?
O estado atual da indústria e do comércio não terá dado ao dinheiro um tal emprego que o
dinheiro adquiriu uma espécie de força produtiva, e que assim dá direito, como a terra, à receção
de um ganho?
O Padre Lehmkuhl crê em tal,26 o Padre Liberatore ensina-o positivamente em relação aos
capitais emprestados a uma empresa comercial ou industrial. «Se o capital, falando com rigor, não
é um agente de produção, é contudo um elemento e um meio de produção digno, a este título, de
retribuição».27
73 4. Mas se o interesse adquiriu, na sequência das circunstâncias, uma certa legitimidade, a
teologia e a razão estão longe de justificar toda a espécie de interesse. A taxa pode ultrapassar
facilmente o limite da justiça e se tornar uma verdadeira usura. Se os capitalistas aproveitarem o
atrapalho dos empresários para aumentar as suas exigências, o empréstimo fere manifestamente a
equidade.

74 5. Que se passará com os capitais que não fazem senão circular os capitais da banca? Eles
exigem um interesse que, em qualquer hipótese, nunca cessa, e que faz montar peculiarmente o
preço das coisas. Neste caso, quão ameaçadora é a injustiça!
Graças ao tráfego do dinheiro, quantos homens vivem e se enriquecem sem nenhum
trabalho útil e às custas dos trabalhadores! Quantas empresas sérias levadas à ruína, fortunas
individuais afundadas, quintas agrícolas abandonadas, como consequência do comércio imoral dos
capitalistas!
«Quando o tráfego cujo dinheiro é o objeto, diz Monsenhor Lachat, terá adquirido o seu
completo desenvolvimento, exercido todas as suas influências, produzido os seus derradeiros
frutos, iremos lamentar talvez, mas demasiado tarde, de que um dique mais inflexível não tenha
sido oposto ao que se há-de ver, não sem razão, como as primeiras invasões de uma agiotagem
que acaba sempre por arruinar as sociedades, com o pretexto de multiplicar as riquezas».28
___________________________________________
26
Théologia moralis, I, página 696 e seguintes.
27
LIBERATORE, obra citada, página 245. – Devemos aliás considerar a questão como estando aberta. A
Santa Sé indica-a suficientemente nas suas recentes decisões, nomeadamente num decreto do Santo-Ofício
do 31 de Agosto de 1830 e noutros decretos e respostas que se referem a isso, nos quais declara que os que
emprestam à taxa legal ou que emprestam a juro aos comerciantes não devem ser inquietados, conquanto
estejam dispostos a se submeterem a qualquer decisão definitiva que for formulada pela Santa Sé. (Santo-
Ofício, 18 de Agosto de 1830. – Sacra Poenitentiaria de 14 de Agosto de 1831, etc.). Cf. GURY-
BALLERINI, tomo I, página 725 e seguintes.
28
Citado pelo Padre De Pascal, opus citatum, página 597.

Aliás, o capitalismo já se destrói a si mesmo: o interesse desceu de 5% a 2,5%, não será


pois uma homenagem dada aos direitos do trabalho?
Portanto não se pode senão apressar, com todo o desejo, o regresso a um estado económico
melhor, em que as prescrições da Igreja encontrarão a sua benfazeja aplicação.

§ 12. - Bibliografia
75
A Encíclica sobre a condição dos operários.

T. MEYER, S.J.: A questão operária e os princípios fundamentais da sociologia cristã, traduzida


pelo Dr Fritsch, (ed. Lethielleux, rua Cassette).
De PASCAL, Filosofia moral e social, ed. Lethielleux. – O poder social e a ordem económica,
apêndice ao terceiro volume da Filosofia escolástica de Élie Blanc, (Paris, Vic e Amar).
LIBERATORE,S.J. Princípios de economia política, traduzido por Sylvestre de Sacy, (Oudin, 10,
rua de Mézières, Paris).
Monsenhor DOUTRELOUX,29 bispo de Liège Carta pastoral sobre a questão operária, (ed.
Dessain, Liège).

76 Sobre a propriedade, consultar

A Encíclica
KETTELLER, obra citada : Primeiro sermão.
SÃO TOMÁS, Suma Teológica, IIa, IIae, quaestio 66, ad 2.
BOURDALOUE, Dois sermões sobre a esmola.

77 Sobre o interesse e a renda :

OTT, obra citada, primeiro volume, página 370 e seguintes, página 406 e seguintes.
LEHMKUHL, S.J., Teologia moral, Volume I, página 681 e seguintes.
CARRIÈRE, Tratado da justiça.
SÃO TOMÁS, Suma Teológica, II parte: as questões relativas à justiça.
JOSEPH BURG, Sobre a vida social, política e religiosa das nações modernas, ed. Sutter, Rixheim
(Alsácia).

________________________________________
29
O bispo de Liège.

CAPÍTULO II

ESTADO LAMENTÁVEL DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

78 As nações, como os indivíduos, às vezes cansam-se de serem sábios. Elas abandonam a


religião e os bons costumes dos antepassados.
As nações cristãs, e a França em particular, estavam fatigadas da direção materna e tutelar
da Igreja. Elas voltaram-se para o paganismo. Quiseram fazer um novo ensaio dos seus princípios
e dos seus costumes. Vejamos até aonde é que elas chegaram, tanto sob o ponto de vista moral do
que sob o ponto de vista material. Constataremos um mal-estar social universal na família, nos
costumes, nas relações sociais, e será fácil de comparar estas consequências funestas com a sua
causa, que é a violação dos princípios enumerados no primeiro capítulo.
A. NA FAMÍLIA

§ 1. – O despovoamento
79 «Crescei e multiplicai-vos» [cf. Gn 1,22]. É a lei da natureza e é a lei divina. O homem
gosta de se ver rodeado de numerosos rebentos. É a sua força, a sua consolação e a sua honra.
Mas o egoísmo contemporâneo, o amor do luxo e o sensualismo mudou tudo isso. Eis, com
efeito, o fato brutal. Trata-se do quadro oficial do acréscimo da população na Europa em 1891:

Rússia 800.000
Alemanha 675.000
Inglaterra 368.000
Itália 270.000
Holanda 60.000
França 10.500

E ainda, estes 10.500 são estrangeiros emigrados em França. Na realidade, os decessos, em


1891, ultrapassaram os nascimentos em 10.505. Em 1892, o deficit é de 20.041.
A raça francesa está a decrescer, enquanto o crescimento em 1881 ainda era de 108.000
por ano.
O cômpito anual dos nascimentos ainda era em 1881 de 937.000. Em 1886, não era mais
que 880.000. Esse caiu em 1891 para 838.000. É uma diminuição de 100.000 em nove anos.

80 Em 1892, a população do departamento do Aisne diminuiu de 1.438 habitantes, e a maioria


dos nossos departamentos são parecidos, salvo nalgumas regiões que ficaram mais católicas.
Se o movimento demográfico continuar nas mesmas condições, daqui a cinquenta anos os
Estados Unidos contarão 200 milhões de habitantes, a Rússia 160 milhões, a Alemanha 90 milhões,
a Grã-Bretanha 65 milhões e a França 40 ao máximo! Ela ficará como afundada no meio deste
imenso desenvolvimento dos seres humanos.
Sobre 1.000 famílias, 200 em França e 324 em Paris não têm filhos; 338 em França e 200
em Paris têm três filhos ou mais. Portanto é apenas um terço das famílias na França e um quinto
em Paris que fornecem o contingente normal à população. Estes números são fornecidos pelo Sr.
Levasseur, do Instituto.
A comparação da taxa da natalidade nas diferentes nações da Europa não é menos
espantosa. A Rússia está em primeiro lugar com 50 nascimentos por ano sobre 1.000 habitantes.
A França está no vigésimo nono e último lugar entre todas as nações grandes e pequenas, com 27
nascimentos sobre 1.000 habitantes.

81 As causas desta paragem no crescimento da população são, em primeiro lugar: o cálculo


oposto ao dever; a imoralidade, que está na proporção do enfraquecimento dos princípios
religiosos e da instabilidade das famílias, a prostituição provocante nas cidades; a promiscuidade
que nasce dos alojamentos restritos e da mistura de sexos nas fábricas.
Deve-se ter a coragem de retirar o aparelho que cobre esta praga e de confessar outras
causas, tais como: as desordens contra natura que crescem à medida que a infidelidade regressa, a
incúria dos primeiros professores da infância, indiferentes à moral, em particular desde as leis
escolares; a precocidade culpável como consequência da nevralgia dos temperamentos atuais; o
internamento da juventude nas casernas; os obstáculos trazidos ao matrimónio dos operários pela
complicação das formalidades a cumprir; os atrasos forçados do casamento no exército e ainda
entre os funcionários, os industriais, os empregados administrativos ou civis, os agentes do Estado,
por causa de esperarem uma promoção ou uma situação estável. Enfim, a insuficiência do leite
maternal para muitas crianças cujas mães não podem alimentar, e a falta de consciência entre a
maioria das amas não cristãs; as estatísticas socialistas acrescentam, com provas irrefutáveis, a
mortalidade precoce dos operários em muitas indústrias e, em particular, entre os descendentes dos
operários urbanos.

82 Calámo-nos sobre outras causas que derivam duma certa clínica. «Vitio parentum rara
juventus» (Horácio [Carmina, I,2,23]).
Os médicos também indicam um recuo na aptidão da raça, que degenerou a respeito da
natalidade. Como não ver nisso uma punição divina? Há em França 2 milhões de famílias sem
filhos!
Para sermos verdadeiros, digamos ainda que a natalidade começa a diminuir em todas as
nações da Europa.

§ 2. – O divórcio
83 Como solução ao despovoamento, os judeus impuseram-nos a lei do divórcio. Supõe uma
regressão no tempo em dois mil anos.
Ora, eis a escala tão tristemente progressiva destes atentados à família cristã.
Divórcios :
Em 1886 2.950
Em 1887 3.636
Em 1888 4.708
Em 1889 4.786
Em 1890 5.437
Em 1891 5.752
Em 1892 5.772

Donde os milhares de crianças escandalizadas, desorientadas, e frequentemente


abandonadas.
Deve-se notar que os divórcios são ainda muito raros nos departamentos mais católicos.
Na Bretanha, na Lozère, praticamente não existem. O nosso departamento do Aisne tem
numa proporção de 8 para 1000 casais.30 Em 1884, os casamentos ainda eram 289.000 em França,
e em 1890 eles desceram para 269.000.
Será que se deve à lei sobre o divórcio ou à moral laica a causa deste recuo?

§ 3. – Os nascimentos ilegítimos
84 O seu número está sempre a aumentar.
Em Paris, em 1893, no mês de Janeiro constata-se: 4.772 nascimentos, dos quais 1.249
ilegítimos.
Ultrapassa um quarto.
Em Fevereiro: 4.972 nascimentos, sendo 1.433 ilegítimos.
É quase um terço.
A proporção é idêntica para todas as nossas cidades; em 1892 o departamento do Aisne
contava 1.388 deles. Em Saint-Quentin, em Novembro de 1892, depara-se 56 nascimentos
legítimos e 22 ilegítimos; em Dezembro, 67 nascimentos legítimos e 34 ilegítimos.
Na Bélgica: Bruxelas tem 38% de nascimentos ilegítimos, Liège 33%, Antuérpia 22%.
Berlim e Londres também estão doentes.
Quão desesperante este estado social! Não vai ser a desconsideração lançada sobre a
família pelo divórcio que irá remediar o fato.

§ 4. – Os infanticídios
85 Eis agora um género de crime que atinge um desenvolvimento, sem exemplo até ao
presente, sobre uma terra cristã e fazendo regredir-nos até ao nível dos costumes bárbaros: o
infanticídio.
Numa relação para a Academia, o senhor doutor Brouardel afirma que fez, quanto a ele só,
326 autópsias por motivo de infanticídios presumíveis. Segundo diversos detalhes de estatística
médica, o eminente doutor acrescenta: «A frequência dos infanticídios em França está sempre a
aumentar».
Reparai que, sob este ponto, a província não cede nenhum ponto à capital. Ninguém ignora
que não há praticamente sessões de tribunal em que não figurem no rol diversos casos de
infanticídios. E em que condições de barbárie ou de cinismo foram realizados, na maior parte dos
casos, estas malfeitorias que encontram facilmente júris demasiado indulgentes!
_______________________________________________
30
Na Inglaterra, nota-se um divórcio em 577 matrimónios; na Rússia, um em cada 450, na Áustria, um
em cada 169; em França, um em cada 62 e na Dinamarca, um em cada 36. – Para as grandes cidades,
Berlim tem o record: um divórcio em cada 17 matrimónios!!!

A diversidade das práticas abortivas e a sua vulgarização conservam um lugar cimeiro nas
causas do despovoamento; sua frequência é tal que, muitas vezes, os Parqués tiveram de renunciar
ao uso dos resultados dos seus inquéritos, e muitas destas práticas escapam a qualquer repressão
humana.

§ 5. – Os menores abandonados
86 Outro sinal do progresso.
Estas informações encontram-se num projeto de lei elaborado pelo Conselho superior da
Instrução pública.
O número dos menores que a caridade oficial deve tomar encargo em Paris anda à volta de
50.000!
Nesse cômpito, as crianças abandonadas ocupam um lugar muito considerável. Durante o
ano de 1880, o número de admissões elevou-se a 3.547. E este número cresce continuamente.
Não estão incluídos nestes números senão os do departamento do Sena. A que terrificante
total não se chegaria, se ao mesmo, fossem associados os dados dos outros departamentos?
Em Saint-Quentin, a sede do Patronato de São José recusava cerca de dois meninos
abandonados em cada semana, sendo embora dignos de tratamento.

§ 6. – A criminalidade infantil
87 Eis mais um sintoma do progresso, triste mais que todos, é o número sempre crescente de
criminosos e até de assassinos mal saídos da meninice.
Dez anos atrás, as estatísticas davam 16.000 criminosos com idade inferior a vinte anos em
cada ano. Em 1892, passaram a ser 41.000.
De 1889 a 1891, houve que prender em Paris 40.000 rapazes e 13.000 moças abaixo dos
dezasseis anos por motivos de prostituição. Não terão estes fatos a sua eloquência? Que neles se
veja os frutos da laicização do ensino e da ausência da religião no seio da família.
Entre os crimes cometidos em França em 1889 por menores, conta-se:

30 assassinatos
39 morticínios
3 parricidas
3 envenenamentos
33 infanticídios
4.213 golpes e ferimentos
25 incêndios
153 violações
11.852 delitos diversos
Total: 17.000 crimes e delitos

Aí ficam os frutos da famosa lei escolar. E estes números mostram o balanço da sua
bancarrota. O assentimento sobre o caso traz cada dia os desabafos dos filósofos, de intelectuais,
dos jornalistas que estão longe de serem clericais. Mas, ai de nós! O consórcio maçónico da
Câmara resiste bem e a França deixa-se abusar.

§ 7. – Os suicídios de menores
88 Nestes últimos anos, o aumento dos suicídios segue uma progressão contínua e rápida.
De 7.572 em 1884, eles elevaram-se a 8.451 em 1888. Somente Paris conta 60 por mês.
Entre estes 8.451 suicidados, em 1888, havia 1.788 mulheres; e, quão mais triste é de
constatar, 65 destas infelizes ainda não tinham atingido a idade de dezasseis anos, e 383 apenas
tinham entre dezasseis e vinte e um anos. Em todo o conjunto, pode-se contar um quarto de suicidas
de crianças e adolescentes. Cada dia os jornais nos reportam algum suicídio de alunos de internato
ou simplesmente de estudantes.
Vê-se nisso um novo fenómeno. Outrora, os suicidas na infância eram deveras uma
exceção. Tal exemplifica o tremendo vazio que deixa, nas almas, a ausência do pensamento cristão
do sacrifício. Apenas a religião católica é quem dá um sentido ao sofrimento, à provação moral,
ao insucesso, à humilhação imerecida, aos golpes do coração. Só ela pode, pela oração e pela graça
dos sacramentos, elevar as almas que o mundo deixaria simplesmente na ignomínia e no
abatimento.
B. NOS COSTUMES (NA MORAL)

§ 8. – Licença na imprensa, crimes e escândalos


89 Por quanto se trata da decadência dos costumes, assinalemos brevemente a licenciosidade
da imprensa, a multiplicação dos crimes e dos suicidas e os tráfegos imorais aos quais muitos se
entregam, inclusive nas altas camadas da sociedade.
Por meio do livro ou do jornal, é vilipendiado tudo o que é respeitável; os princípios da
ordem e da paz social são batidos em brecha; as más paixões são excitadas a bel-prazer.
Se uma boa parte da imprensa é a este ponto corruptora, será caso para se espantar que
vários dos seus representantes vaiam encher as células de Mazas, por terem nivelado os seus atos
pela perversão do seu espírito?

90 Que progressos medonhos outrossim na criminalidade geral! Em 1880, os crimes


processados em França já atingiam o número de 167.000. Eles subiram para 700.000 em 1892.
Os suicídios têm igualmente uma contínua e rápida progressão. De 7.500 em 1884,
elevaram-se quase a 9.000 em 1892. Por conseguinte eles contabilizam-se hoje em mais 1.500 por
ano do que há dez anos atrás. E o aumento refere-se essencialmente ao suicídio de crianças. É o
fruto da educação sem Deus.
Por quanto se trata de tráfegos imorais, isso é que é! Tudo foi metido em leilão nestes
últimos anos, as condecorações, os votos na Câmara, as eleições, as proteções administrativas.
Cada dia, novos escândalos se descobrem nos grandes negócios e na vida pública. Eles têm a sua
rubrica nos jornais e aí formam um capítulo à parte. A tal ponto que se chegou a perguntar se não
valeria mais, para a honra da França, esconder o mal que de o castigar.

§ 9. – O permissivismo nas ruas


91 È preciso que o mal seja bem grande para que uma liga, pouco suspeita de clericalismo e
de timidez, se tivesse formado para tentar pôr remédio nisso.
Promoveu-se um congresso no qual se ouviu o senhor Jules Simon, o senhor Gréard, o
senhor Mézières, o senhor Frédéric Passy. Eles protestam contra as provocações a que se entrega
a prostituição nas ruas e contra a difusão dos livros e revistas escandalosas.
Sessenta Conselhos gerais aderiram a esta liga.
Para que se tivesse chegado a tanto, bem espantoso deve ser o mal!
Assinalemos também o constante desafio lançado ao pudor pela arte contemporânea que
arrasta até ao excesso a intemperança pagã da Renascença.

§ 10. – O alcoolismo
92 Em 1870, consumia-se em França, 600.000 hectolitros de álcool, ou seja 1,50 litro por
habitante. Em 1890, é 1.700.000 hectolitros, ou seja 4,50 litros por habitante. E que álcool! Ainda
apenas se tinha entregado em 1885, 23.240 hectolitros de aguardente para o consumo. Trata-se de
um verdadeiro envenenamento. Todos os outros álcoois, sobretudo no estado de purificação
incompleta, contêm perigosos venenos. Há atualmente 442.000 débitos de bebidas em França, das
quais 27.000 exclusivas a Paris.
Cabe 1 débito por 87 habitantes, mais 50.000 no total do que em 1870.31 Em 1885, bebia-
se em França, 57.000 hectolitros de absinto. Em 1892, bebeu-se 129.000; o consumo mais do que
dobrou em sete anos.
Resulta destes hábitos um temperamento irascível e frequentemente desequilibrado para as
crianças; aliás, só acaba a sua influência na descendência dos alcoólicos, na maior parte dos casos,
à quarta geração.
Há a notar que a elevação dos impostos sobre o álcool acaba por provocar no operário a
obtenção de bebidas ainda piores, por falta de vigilância e de repressão eficazes. O único meio
legal que produza efeitos sérios, é o aumento notável das patentes. Esta medida conduz brevemente
ao encerramento de grande número de débitos.32

NAS RELAÇÕES SOCIAIS

§ 11. – O pauperismo
93 Ao adicionarmos nas estatísticas os suicídios, as crianças mortas de atrepsia, os pobres e
os velhos mortos de miséria ou de inanição, chega-se à conclusão que a miséria física e moral retira
à França 100.000 dos seus cidadãos cada ano.
O orçamento da Assistência pública em Paris deve subvencionar às necessidades de 44.000
crianças assistidas; 367.000 pobres socorridos ao domicílio; 154.000 os mantidos nos hospitais e
hospícios.
A proporção é idêntica em todas as grandes cidades. A miséria não é maior nos campos.
_______________________________________________
31
Nos povoados mineiros, na Bélgica, há um débito de álcool por quatro adultos! Um débito por três casa
operárias! Lens tem 160 casas operárias e 110 débit. Toda a região de Mons encontra-se no mesmo
estado.
32
Um estudo muito interessante e profundamente sugestivo sobre o alcoolismo foi publicado pela Semana
religiosa de Cambrai no seu suplemento : O Domingo.

Um grande número dos filhos de operários morre nos primeiros dias depois do seu
nascimento. As mães são obrigadas, por necessidade, de ficarem na oficina até à altura do parto e
de retomar o trabalho poucos dias depois.

94 Com certeza, «haverá sempre pobres» [cf. Jn 12,8]: a previdência organizada e a caridade
espontânea estão aí para adoçar a situação dos indivíduos incapazes de trabalhar, mas, no seio de
uma civilização brilhante, a existência de classes inteiras, às quais faltam habitualmente os meios
suficientes para subsistirem, cifra-se num estado contra natura, gerado pela economia liberal e
pelos princípios sociais da Revolução.
Um dos fins da sociedade é precisamente o de ajudar os membros da família humana por
meio duma boa organização social, a escapar aos tentáculos da miséria.
A terra é bastante rica para nos alimentar a todos, e até mesmo para nos fazer viver numa
fartura moderada. Não há um só homem de bom senso que possa crer que a miséria da maioria da
população seja uma lei natural.
E no entanto…
§ 12. – O capitalismo
95 Capitalista! Hoje este termo é grandemente usado pejorativamente. Ele precisa de ser
explicado.
Não havia capitalistas na Idade Média. Havia ricos senhores feudais, que tinham recebido,
no momento da conquista, boas terras como recompensa da sua bravura. Havia ricos comerciantes
em Veneza, em Génova, em Bruges, em Antuérpia, que tinham feito bons lucros sobre as
mercadorias importadas do Levante. As profissões não aportavam enormes fortunas. Elas davam
simplesmente a viver com honra e burguesmente.

96 Entre os senhores feudais e os grandes comerciantes, havia bons e maus ricos. Tal
dependia muito do exemplo que descia do alto, do rei e dos membros da Igreja. Quando um São
Francisco, um São Bernardo, um São Luís passavam, tudo corria pelo melhor e o bem tomava a
dianteira. Depois do grande cisma do Ocidente e a guerra dos Cem anos, o mal chegou ao cúmulo.
A Europa estava madura para a heresia protestante, doença mundial que tem as suas fases, o
racionalismo, a revolução, o liberalismo, o socialismo; doenças de que Cristo nos oferece a cura,
se nós quisermos escutar o seu Vigário sobre a terra.
Mas voltemos ao capitalismo. Compreende-se por tal o emprego de fundos, adquiridos pela
poupança ou por investimentos vantajosos sem trabalho pessoal.
O capitalismo começou pelo aluguer das terras a seguir à abolição da servidão. A Igreja,
as corporações, os senhores feudais não tendo mais servos para cultivar as suas terras, alugaram-
nas por meio de contratos e mais frequentemente pela partilha dos frutos a meias.
Porque não? O proprietário dizia ao trabalhador: «Tenho terras e vós tendes braços e o
saber profissional, unamos estes fatores e partilharemos os produtos».
Da partilha a meias ao simples aluguer, a passagem não é injusta. O proprietário disse ao
agricultor: «Ao nosso contrato de associação, acrescentemos um contrato de segurança. Atribuí
a mim uma entrada fixa, baseada sobre a média da partilha. Se os anos forem bons, fareis bons
lucros; se forem duros, comereis um pouco da vossa poupança». E este contrato misto passou a
ser costume.

97 Ao capital agrário ajuntou-se a seguir o capital dinheiro. O proprietário disse: «Já que
posso alugar as minhas terras num contrato, por quê não poderia também alugar, ou colocar a
minha poupança, o meu dinheiro, no comerciante e no industrial? Ele vai pô-lo em valor e dar-
me uma parte do lucro, num interesse que é meu e seu». E esta parte do lucro cedo se tornou,
sempre pelo princípio do seguro, um lucro anual fixo.
A Igreja hesitou longamente a sancionar este novo contrato. Ele era tão parecido com o
empréstimo usurário que fazia o mau rico ao pobre na penúria, ao pedir-lhe mais do que o que lhe
houvera emprestado!

98 Contudo, a nova corrente triunfou, e o investimento de capital, a interesse, tornou-se


universal. Sobre a questão teórica, há ainda duas escolas em teologia. Uns, os modernos, com
Liberatore, Ballerini, Lehmkuhl, julgam que a tal respeito se trata de um contrato perfeitamente
legítimo e completamente diferente do empréstimo usurário e opressivo ao pobre: O empréstimo
moderno, dizem, não é um mutuum, é uma colocação, uma locação, um contrato sui generis.
Outros sustêm que o regime atual é apenas tolerado pela Igreja, que o dinheiro é essencialmente
improdutivo, e que um futuro melhor trará outros costumes comerciais e industriais. Uns e outros
se apoiam sobre São Tomás e a teologia clássica, que interpretam diferentemente.
Permitido ou tolerado, o fato existe, e eis que muitos dos capitalistas vivem das rendas do
seu dinheiro colocado, sem trabalho pessoal.

99 Não desagrade embora aos mais rígidos da extrema-direita e da extrema-esquerda,


teólogos rigoristas ou socialistas marxistas, temos a temeridade de pensar que tal não é
absolutamente injusto. O capital colocado presta serviços que merecem ser recompensados. Ele
tem essa tarefa útil na sociedade. A grande carta económica de Leão XIII não o condena. A
encíclica diz que o capital e o trabalho devem entender-se e se harmonizar, não diz portanto que o
capital deve abdicar.
Mas para que o capital não excite a inveja e o desprezo, faz-se mister duas coisas: a
primeira, que seja adquirido legitimamente, a segunda, que os seus lucros sejam empregues de
modo nobre e legítimo.

100 O capital é adquirido legitimamente, quando um industrial na sua fábrica toma a parte do
leão, quando não dá aos trabalhadores senão um magro salário, sem nenhuma parte dos benefícios
e sem alguma instituição moral ou económica? Nós não o pensamos.
Será legitimamente adquirido o capital que é fruto da especulação, do golpe de bolsa, do
açambarcamento ou de qualquer outro agir da usura moderna? Ninguém o irá sustentar.
Acaso serão empregados nobremente, os lucros do folgazão cético e debuxado que encena
os romances de Zola nos bairros mais corrompidos da Babilónia parisiense?

101 São empregues cristãmente os lucros do filho-de-papá estroina ou, antes de tudo,
simplesmente amigo do prazer; destes jovens que estigmatizava o Padre Olivier num discurso que
fez sensação; destes jovens que excelem na arte do baile, que sabem esporear um cavalo, que
sabem assobiar para ajuntar os cães, que não falham nem a um steeple-case nem a um rallye-
paper, e que não antolham para a sua vida outra finalidade mais séria que isso?
Serão porventura empregues cristãmente os lucros do rendeiro que vive placidamente no
seu egoísmo, com algumas práticas religiosas, se quiserdes, mas sem obras, sem ação social cristã,
sem estudos sérios, sem uma piedade esclarecida e ativa para com a classe dos que sofrem? Ainda
não.
São todas estas formas do capital mal adquirido, e de lucros mal empregues que desonraram
o capital e feito gritar “abaixo” ao capitalismo.
Para escapar às intenções da inveja, tão natural ao homem, o capital deveria ser
absolutamente justo e cristão na sua origem e no seu emprego.

§ 13. – O mal-estar na indústria


102 A grande indústria é instável por natureza. Ela tem anos de prosperidade, depois aparecem
novas invenções, uma deslocação de mercados, a sobreprodução, a subida dos direitos
alfandegários nas fronteiras, etc., e o estado de crise sucede à prosperidade.
Esta instabilidade instaura situações delicadas nas quais seria preciso um grande fundo de
justiça, de moderação, de paciência, de caridade. Estamos bem longe disso!
O operário tem frequentemente justos motivos de descontentamento: diminuição dos
salários, exagero do trabalho, direção tirânica, etc., etc.
Cabecilhas, políticos ou ideológicos, sabem explorar estas dificuldades e sublevar as
multidões para proveito da sua popularidade.
Daí um estado habitual de antagonismo, reuniões tumultuosas, impulsivas quarentenas,
greves e ameaças.

103 Do lado dos patrões, constatamos um mal-estar correspondente: a exagerada desconfiança,


movimentos bruscos, recusa em ouvir as queixas, múltiplas retenções, diminuições de salários às
vezes não justificados, despedimentos tomados levianamente.
Neste estado de guerra, a concorrência dos patrões estrangeiros e mesmo dos operários
estrangeiros vem complicar a situação.
A verdade é que existe de ambos os lados uma carência de moral que impede a
compreensão. A intervenção da força nada resolve. Diante do rigor das leis ou da violência das
greves, restará ao patrão o último recurso de fechar a sua fábrica.
Aí jaz um impasse no qual se jogam as forças vivas da sociedade.

§ 14. – O esmagamento do pequeno comércio


e da pequena indústria
104 Os grandes armazéns e as sociedades anónimas fazem desaparecer o pequeno comércio e
a pequena indústria.
Uma infinidade de casais, nos quais se gozava da paz e de um modesto bem-estar, através
dum trabalho moderado, é desertada: vai-se viver nas fábricas tão malsãs para a alma como para o
corpo, ou nos carrocéis do grande comércio, com a perspetiva do esgotamento, as veladas
sustentadas pelo álcool, o ar sem oxigénio e a tuberculose para dizer tudo.
O seguinte quadro dá uma ideia desta migração.
Contava-se para 10.000 habitantes:

[Trabalho] Em 1880 Em 1885


Padeiros 28 13
Carniceiros 19 11
Alfaiates 92 39
Sapateiros 151 40
Merceeiros 63 20

105 O maquinismo, como foi mostrado na Conferência de Berlim em 1890, tendo metido em
ação a enorme força de 50 milhões de cavalos-vapor, deixou sem trabalho milhões de operários.
O pequeno artesanato ficou assim destruído, e populações inteiras encontraram-se abandonadas às
especulações da indústria, sem regra nem travão. A livre concorrência pressionada pelo apetite do
lucro pôs-se a produzir com uma rapidez vertiginosa, a produzir cada vez mais cada dia para
ultrapassar em quantidade e a mais baixo preço o produto do vizinho ou da véspera.
Findou-se de filar, de tricotar, de enfeitar, de tecer no domicílio, e a família operária foi
deslocada; os artesãos, agrupados até aos nossos dias com os membros do mesmo casal à volta dos
seus ofícios, foram transferidos e aglomerados em bandos consideráveis, à mercê do número mais
do que dos contramestres, diretores e patrões.
106 Antes do mais, o operário pode ganhar o triplo ou o dobro do que ganhava em sua casa;
ele vendeu a sua casinha, os seus pedaços de terra, e veio residir na cidade, onde perdeu a calma
da existência e a segurança moral. Cedo a instabilidade do comércio ou da moda forçou a diminuir
os salários, enquanto tinham sido já contraído novos hábitos de despesas e de consumo.
Bastantes vezes, as flutuações da oferta e da procura, o afrouxamento dos negócios ou o
desemprego, metem uma boa porção de gente honesta ao relento, e assim famílias inteiras que
haviam deixado o campo por um salário mais elevado, se encontram expostas a uma miséria negra
e imerecida.

§ 15. – A decadência da pequena propriedade


107 Mas porquê haviam eles abandonado o campo?
A população agrícola representa 60% da população total do país; ela vivia sobretudo do
trigo; ora, há sobreprodução no estrangeiro: a Rússia, a América, a Hungria, a Índia, podem, à
vontade dos especuladores, nos inundar com os seus produtos, e nestes países as despesas de
exploração são mínimas em comparação das nossas. O magro hindu trabalha a 0 francos (?) 10
horas por dia, enquanto o nosso trabalhador precisa de 2 francos e meio ou 3 francos. A aceleração
das vias de comunicação trouxe a concorrência entre os produtos; a entrada na produção das terras
do Novo Mundo e a facilidade de importar os produtos de todos os países nos portos da Europa,
como de os distribuir no interior por vias navegáveis ou férreas, levaram à redução da renda e do
valor das terras no nosso país. Acrescentai a tal fato o de, após a supressão dos pequenos ofícios,
muita gente arremediada ter dificuldade em viver no campo.

108 A partilha forçada conduz ao unicismo da família ou à licitação do pequeno domínio que
nenhum dos descendentes pode comprar; eles devem procurar a fortuna alhures, e assim as raças
fortes dos nossos camponeses se extinguem ou caiem no proletariado.
«No espaço de oito anos, diz o senhor Urbain Guérin, no seu livro Sobre a evolução social,
8.658.546 atos de venda foram feitos para um número de hectares tendo ultrapassado 15.716.000,
seja mais de um terço do que a superfície agrária da França». Esta mobilização do solo e das
famílias destrói as tradições e a influência dos anciãos.

109 Avalia-se a dois mil milhões os bens do clero que o Estado se apropriou, aos quais se deve
acrescentar outros 15 mil milhões pelos bens confiscados às corporações de ensino ou beneficência
e às comunas. Estes bens eram uma reserva agregada por séculos de trabalho e de caridade para a
utilidade do povo.
A venda dos terrenos comunais, a supressão dos direitos de uso contribuíram a tornar a
existência mais difícil no campo, e assim a pressionar as gentes para as cidades onde os ciúmes
são excitados pela proximidade do luxo e da miséria.
Todas as leis e medidas fiscais que favoreceriam a pequena propriedade, o pequeno
domínio familiar, o home-stead, seriam medidas de salvação para a raça, para os costumes, para a
paz social; mas os nossos legisladores terão eles tempo de se ocuparem de coisas tão práticas?

§ 16. – A crise agrícola


110 Os factos. – A agricultura está na desventura, é um dado. Os quinteiros mais favorecidos
mal podem pagar aos seus proprietários. Muitos se arruínam. Quase todos recorrem aos
empréstimos e às hipotecas. As próprias terras perderam uma parte do seu valor. O trabalho dos
campos não é mais considerado, uma vez que é fracamente remunerador.
Compreende-se a gravidade desta crise ao se considerar que a cultura agrícola ocupa em
França 19 milhões de habitantes. Ela fornece-nos quase todos os géneros alimentares, o trigo, o
vinho, as batatas, os animais de abate, etc. Ela fornece à indústria a maioria das suas matérias-
primas, o linho, o chanfre, a lã, a soja, a beterraba, etc. Também é a classe agrícola que fornece
mais impostos e mais soldados. É no seu meio que se conserva o melhor da raça, como sejam os
costumes e tradições nacionais. Portanto, nada é mais grave para a pátria do que uma crise que
ameaça lançar no desânimo e na miséria uma parte tão importante da população.

111 Pois bem! Esta crise é mordente e é mais do que tempo procurar os seus remédios, se os
houver.
O desastre das vinhas neste século foi único na história. A filoxera passou, precedida e
acompanhada por outros flagelos, arrasando as propriedades, como os povos bárbaros haviam
passado, ceifando as antigas sociedades.
As vinhas refazem-se, mas a crise não acabou. As nações vizinhas, a Espanha, a Itália, a
Suíça, a Baviera, aumentaram os seus vinhais e aprenderam a arte de bem fabricar o vinho. As
nossas fronteiras fecharam-se pela rutura dos tratados de comércio. A indústria dos vinhos que não
o são realmente cresceu prodigiosamente. Os álcoois de beterraba, de grãos, de farináceos
suplantaram o álcool de vinho. Os belos tempos da vinha voltarão porventura?

112 O Norte é a região dos cereais, das beterrabas, das plantas oleaginosas e dos têxteis. Onde
é que agora estamos? Um estudo consciencioso, publicado recentemente por um agricultor do
Aisne, estabelece os seguintes dados:
O século XVIII tinha deixado a indústria rural completamente esgotada pelo período
revolucionário.
No primeiro quarto do século seguinte, a agricultura começa a se levantar com o
restabelecimento da ordem sob Napoleão, da paz sob a Restauração, e com o desenvolvimento do
movimento comercial.
O segundo quartel do século constata um avanço sensível do progresso agrícola sob a
influência de uma paz prolongada e de um começo de difusão dos conhecimentos científicos
aplicados às indústrias agrícolas e a outras.
O terceiro período (1850-1876) é marcado por um desenvolvimento da prosperidade
agrícola e industrial sem precedentes na nossa história.

113 Mas depois de 1876, e mais exatamente desde 1880, a situação inverte-se e dá-se uma
crise, cuja intensidade rapidamente crescente, atinge o paroxismo em 1883, e que, em poucos anos,
reconduziu a agricultura nacional a uma situação quase tão precária e tão desagradável como a do
fim do século anterior.
Estas mudanças de situação coincidiram com variações correspondentes no curso dos
produtos agrícolas, nos preços do aluguer, no valor venal das terras e na taxa dos salários.
Na região a norte de Paris, de 1800 a 1825, o valor da propriedade rural oscilava entre 600
e 800 francos por hectare; o preço de arrendamento era de 50 a 60 francos.
Estes preços começaram a elevar-se no segundo período, à volta de 1830. Eles progrediram
rapidamente até atingirem e ultrapassarem, antes de 1870 os índices de 90 a 100 francos de aluguer
e de 3.000 a 4.000 francos quanto ao valor venal por hectare.
114 Mas, por influência da crise de 1880 e dos anos seguintes, estes preços caíram
rapidamente, e a depreciação atingiu 40% dos preços anteriores.
O valor dos principais artigos acompanhava o mesmo movimento. Desta feita, o trigo valia
em média 18 francos ao hectolitro no primeiro período; no segundo, mais ou menos 20 francos;
no terceiro, à volta de 22 francos e meio. Desde 1882, ele flutua entre 15 e 16 francos.
A lã valia em média 1 franco e 70 ao quilo no começo do século. Ela subiu até 2 francos e
25. Ela recaiu a 1 franco 30.
A cabeça de gado bovino pronta para abate vendia-se em média de 0 francos 40 a 0 francos
50 por quilo; no terceiro período, ela atingiu 0 francos 80 a 1 franco; desde então, ela oscila em
sentido descendente entre 0 francos 75 e 0 francos 85.
Para as oleaginosas, os têxteis, a crise é ainda mais grave. A nossa região teve de renunciar
às suas culturas outrora bastante remuneradoras.

115 Mas à medida que os produtos diminuíam de valor, os encargos aumentavam.


A mão-de-obra diária, na aldeia, era cotada no começo do século, de 0 francos 80 a 1
franco; no segundo quartel do século, ela estava a 1 franco 24 a 1 franco 50; no terceiro, ela atinge
até 2 francos 25.
O preço dos trabalhos especializados subiu em igual proporção se não mesmo ainda mais.

116 Para os impostos, o acréscimo não é menos sensível.


No princípio do século, a carga fiscal por hectare mal chega a 5 francos; no segundo
período, ela ergue-se a 8 francos; no terceiro atinge 10 e 11 francos e naquele atual, ela vai de 13
a 15 francos conforme os impostos variáveis que são impostos às comunas.
Diminuição dos produtos, agravamento do fisco, eis o balanço da situação agrícola. Daí,
as quintas incultas, a pequena propriedade esmagada, as rendas agrárias diminuídas de metade, as
grandes explorações estão de regresso.

117 As causas desta situação. – Temos indicado algumas delas ao traçar o quadro que
precedeu. Existem outras, como as intempéries, as doenças das plantas e outros flagelos
desastrosos, que fazem parte dos segredos da Providência. Para esconjurar estas causas do seu
infortúnio, o cristão sabe o que tem de fazer. Ele deve observar o Decálogo e rezar.
Outras causas, pelo contrário, poderiam ter sido afastadas pela organização corporativa e
pelas leis.
A falta de crédito e o isolamento são irremediáveis sem as associações. O lavrador não tem
os recursos necessários para obter os instrumentos de que necessita, ou para se lançar nos trabalhos
que exige uma apropriada valorização da sua cultura. O seu isolamento fragiliza-o perante os
especuladores e os intermediários no que se refere às operações de compra e venda. Isto é o
resultado do individualismo gerado pela Revolução.

118 Os impostos também pesam muito fortemente sobre o cultivador. Ele paga até 27% do seu
lucro; o industrial não paga senão 13% e o proprietário dos valores mobiliários 4% somente. (Ver
o discurso dos senhores Méline e de Ramel na Câmara, na sessão de 20 de Janeiro de 1894).
A agricultura também sofre das tarifas alfandegárias ditas de penetração, que permitem a
certos produtos estrangeiros virem até nós fazer-nos uma concorrência ruinosa.
A partilha forçada das pequenas heranças, e os direitos exorbitantes de transferência,
Também são obstáculos à prosperidade da agricultura.
Deve-se ainda assinalar a especulação e a agiotagem da bolsa de comércio sobre os diversos
produtos agrícolas, e a depreciação do dinheiro que permite aos produtos da Índia inglesa de nos
chegar a um preço tal, que os nossos produtores não podem descer sem se arruinarem.

§ 17. – A especulação e a agiotagem


119 Trata-se aqui de roubo e de imoralidade à grande.
Que dizer então do escândalo do Panamá, que ameaça deixar o seu nome a este século?
Potes de vinho sem número, compras de votos e de consciências, concussão, escroqueria e o resto.
Recorda-se a bancarrota da União geral em 1882, escândalo montado por uma maquinação
política. Em Lião, contaram-se 60 suicidas, e viu-se saltar o inteiro Parqué dos cambistas.
E a bancarrota do cobre em Paris em 1880. A Sociedade dos metais, ajudada pela Casa do
leilão entregou-se ao açambarcamento do cobre. As outras minas, tendo aumentado habilmente a
sua produção, o cobre baixou. A Casa do Leilão viu as suas ações caírem de 1.000 francos a 100
francos e arruinou os seus acionários.

120 É por milhares de milhões que se deve enumerar as quantias retiradas à poupança francesa
pelos golpes de bolsa, pela propaganda mentirosa e pelo charlatanismo financeiro que faz viver a
imprensa. Um estudo sério provou que, desde há quinze anos, as bancarrotas e os falhanços de
toda a espécie fizeram perder mais de 12 mil milhões à França.
O que resulta deste deslocamento de fortunas em proveito da habilidade e da má-fé é uma
profunda perturbação na consciência do povo, que vê com muita frequência este bem adquirido de
modo péssimo reverter em proveito do vício.
Ao mesmo tempo, as famílias tradicionais, onde a honra era apanágio próprio, iam
descaindo até perderem a sua influência.

121 Quantas medidas a tomar contra o açambarcamento, a rapina, a usura!


Será que teremos a energia de suprimir o jogo das diferenças e os mercados a prazo na
bolsa? É duvidoso: somos muito dependentes da banca judia que disso tira os seus proveitos.
Donde virá que o trigo esteja barato e que o pão seja relativamente caro? Que a beterraba
não atinja um preço remunerador e que o açúcar conserve o seu preço elevado? Que haja bastantes
vezes uma disparidade tão considerável entre o valor do animal no estábulo e a carne no mercado
e no açougue? Por quê se passa o mesmo com muitas mercadorias?
É que, entre o produtor e os consumidores, há não apenas os intermediários mas também
os especuladores, o que provoca o encarecimento da vida e o desprezo do trabalho.
O produtor sai prejudicado e o consumidor se lamenta.
Muitas fortunas constituíram-se deste modo pela especulação, à custa do trabalho e da vida
do povo.

122 O mercado a prazo sobre as mercadorias pode ter alguma utilidade. O fabricante que vende
os seus produtos de avanço pode-se basear sobre esta venda para determinar a quantidade de
matéria-prima que deverá comprar e a atividade que deverá dar à sua fabricação.
Mas, com mais frequência, estes mercados não têm outro resultado senão favorecerem a
especulação e a agiotagem.
A especulação tem sempre qualquer coisa de aleatório. Ela é imoral. O especulador compra
e vende previamente, conforme as previsões. Ele vive sem cessar na angústia e corre incessantes
riscos. A especulação está de todas as maneiras fora das condições do trabalho normal que deve
ser retribuído equitativamente, sem lucros excessivos e sem percas ruinosas.
A agiotagem não é senão um jogo simples, uma venda fictícia. Não há na agiotagem
qualquer venda real, nem qualquer entrega a prazo fixo. A conta regula-se simplesmente pelo
pagamento de uma diferença, que é paga pelo vendedor, se houver alta, e pelo comprador se houver
baixa.
A especulação e a agiotagem lançam a perturbação sobre os mercados. Eles põem em
perigo as fortunas privadas e prejudicam os consumidores ao provocarem a alta das mercadorias.

123 Tomemos por exemplo o mercado das lãs em Roubaix.


A imprensa de Roubaix foi obrigada a confessar que o jogo fez desviar o mercado a prazo
da finalidade da sua criação. Sob a influência da especulação e da agiotagem, cada vez mais
crescentes, os preços, desde há vários anos, estão sujeitos a uma dança de Saint-Guy; a
especulação, ou previsão judiciosa, já nem se torna mais possível, o jogo domina tudo. Cita-se
umas certas pessoas que, nalguns meses, obtiveram benefícios de 300.000 francos sem nem sequer
terem feito qualquer compra ou venda reais.
O mais frequente, a agiotagem conduz ao açambarcamento e ao monopólio.
Formam-se primeiramente sindicatos opostos: um empurra para a alta, e outro pressiona
para a baixa. Depois eles não tardam a se dizer que fariam melhor se entender do que a se combater.
Então formam uma liga, que se chama Consortium, e se acordam para se tornarem senhores do
mercado pelo açambarcamento e para, a seguir, levantarem os preços à sua vontade. Eles esmagam
deste modo tanto os produtores como os consumidores, para único proveito do consortium dos
especuladores.

124 O remédio para esta desordem económica é a supressão ou a regulamentação do mercado


a prazo. Se se deixar subsistir este mercado, será preciso que a caixa de liquidação tenha por missão
o obstaculizar as operações fictícias e o jogo, ao não admitir como clientes senão os industriais,
vigiando as operações, e limitando o seu crédito.
Estes regulamentos não podem ser estabelecidos e mantidos seriamente que não seja pelas
corporações e pelas câmaras de trabalho.

§ 18. – A crise dos câmbios


125 É uma questão bastante interessante, muito importante, mas um pouco difícil a apanhá-la.
Antigamente, todas as nações admitiam a prata como moeda de câmbio internacional. As
nações do Ocidente acrescentavam a isso o ouro, e os dois metais estavam numa relação constante
de valor de 1 para 15,5. Um grama de ouro valia 3 francos 10 de prata. Chamava-se a este regime
o de bimetalismo.
Desde há quase oitenta anos, alguns Estados não mais quiseram aceitar senão o ouro como
moeda de câmbio internacional. Estes Estados guardam no interior certamente prata em dinheiro,
mas apenas como moeda complementar.
126 Foi a Inglaterra que começou em 1816. Ela detinha então quase todo o ouro da Europa,
graça ao seu comércio, a suas colónias, e também porque as nações continentais estavam
arruinadas pela guerra.
Ela encontrou vantagem em especular sobre o ouro, de o monopolizar tanto quanto possível
e de o ajuntar. Ela exigiu ouro para as mercadorias que exportava, ela exigiu-o igualmente para os
interesses dos empréstimos àqueles a quem tinha emprestado. As outras nações, para pagar-lhe em
ouro, tiveram de o comprar a ela mesma de modo muito caro, dando-lhe muito da sua prata e de
seus produtos. Caiu em proveito do comércio inglês e dos bancos ingleses, que estão em parte nas
mãos dos judeus.
A prata, o trigo, a seda da India, da China e do Japão, afluíram a baixo preço à Inglaterra,
tendo estes países necessidade do ouro da Inglaterra para lhe pagar o que lhe compravam.
Outras nações, os Estados Unidos, a Alemanha e a União das nações latinas imitaram a
Inglaterra. Adotaram o monometalismo e suprimido a prata como moeda internacional.

127 Mas as consequências desta medida pesam ainda agora sobre as diversas classes da
sociedade, nas nações ocidentais. Os nossos agricultores e os nossos industriais ficaram
esmagados, os nossos modestos rendeiros estão a perder; apenas os grandes financeiros e o
comércio de importação encontram vantagem.
A prata perdeu metade do valor em relação ao ouro. A prata, não tendo mais valor
internacional, tornou-se menos preciosa e procurada. Daí que o preço do câmbio se tornou mais
oneroso para as nações que não têm senão prata.
Coitadas destas nações se tiverem pagamentos a fazer em ouro aos países com moeda de
ouro! Neste caso, se tiverem produtos naturais abundantes, elas irão dar-lhes pesadamente. Se elas
não tiverem, irão anular os seus compromissos e não pagarão.

128 Assim a Índia, a China, o Japão, países com moeda de prata, dão o seu trigo e a sua soja de
modo barato para buscarem um pouco de ouro. E este trigo e esta seda acabam por pesar nos nossos
mercados. Os nossos agricultores e produtores de cereais ficam esmagados pela concorrência. O
trigo da India vale 10 francos nos nossos portos, quando o nosso custa 20 francos a produzir. A
seda da Ásia sucedeu inteiramente à nossa. A nossa indústria ainda consumia 35% de seda francesa
em 1872, e agora não ultrapassa 1%.

129 Os nossos industriais ficam esmagados, uma vez que os países com moeda de prata, ao
notarem ser demasiado oneroso comprar a preço de ouro os nossos produtos industriais, arranjam-
se e despacham-se sem nós. A Índia e o Japão cobrem-se de fábricas. Para breve estes países
bastarão a suas necessidades e, para mais, eles nos tirarão o mercado da China ao vender-lhe menos
caro e ao contentarem-se da sua moeda de prata.
Os nossos pequenos investidores também sofrem, porque colocaram os seus capitais em
pequenos Estados, como Portugal e a Grécia, que prometiam boas rendas. Mas estes países,
esmagados pelo curso do câmbio, não pagam mais os seus interesses.
Apenas, o comércio de exportação faz bons lucros, tal como a alta finança, que especula
sobre os câmbios e sobre os empréstimos. E, regra geral, este comércio e esta Banca estão nas
mãos dos judeus.

130 O remédio seria de restabelecer o bimetalismo. Mas a alta finança é poderosa e muito
escutada. Para nos fazer pacientar, ela nos diz que o ouro abunda nas minas sul-africanas e que
brevemente haverá o bastante para que todos os países se sintam à vontade. Ela não acrescenta que
este novo ouro vai ainda bater às suas mãos porque se apodera das minas.
É necessário que os nossos agricultores, os nossos industriais e o próprio povo façam ouvir
bem alto os seus lamentos, para que esta crise seja esconjurada, e estas especulações interrompidas
com a reabilitação da prata.
A prata não se curva nem aos mesmos riscos, nem às mesmas especulações. A maioria das
nações tem minas de prata. A sua extração é mais lenta e mais custosa. Há câmbio de labor entre
o produtor da prata e o produtor das mercadorias. A prata não se presta ao açambarcamento.
Sublevemos a opinião pela imprensa e pela propaganda eleitoral para que as nações, através
de um acordo, restabeleçam a proporção constante da prata e do ouro.

Consultar: A crise dos câmbios, por Edmond Théry, e diversos artigos da Associação católica e da
Sociologia católica.
§ 19. – Os balanços operários
131 Foram feitos estudos sobre os balanços económicos das classes operárias. A Bélgica, sobre
este assunto, fez um inquérito oficial. Na França, o estudo continua nos congressos católicos.
Compreende-se que os resultados são muito variáveis.
As entradas numa família normal de cinco pessoas variam, hoje, de 1.100 francos a 1.400
francos, e seria 1.600 francos que se precisaria.33 1.100 francos! Com a despesa do aluguer, tal
________________________________________________
33
A caixa de família, organizada pelo senhor Harmel na sua fábrica de Val-des-Bois, fixou o mínimo
necessário em 219 francos por ano (365 x 0 francos 60) por membro de família, incluindo nisso as

dá 0 francos 50 por dia e por cabeça. Quanto basta para não morrer. Como o operário poderá
sobreviver? Como poderá ter uma figura decente? Já não há mais disponibilidade para que tome a
sua pequena parte das alegrias da terra, nem que faça reservas para o desemprego, a doença, a
educação dos filhos, a velhice.
Leão XIII terá errado ao afirmar que muitos operários estão num estado de miséria
imerecida?

§ 20. – As operárias da agulha


132 Nada há mais penoso que ver os trabalhos feitos à agulha, nas casas de confeção ou nos
armazéns de toilettes. O trabalho é sempre tão apressado, e o salário frequentemente tão pequeno!
As jornadas de trabalho durante 15, 18 e mesmo 20 horas não são raras aí, e o Domingo
não é respeitado.
Infelizmente, a velada no armazém é seguida com frequência de uma velada posterior em
casa.
O reverendo Padre Du Lac, numa reunião de senhoras em Paris, citava esta carta que não
é de forma nenhuma excecional:
«Escrevo-vos às duas horas da madrugada. Vós me repreendeis, mas não tendes razão.
Eu sou obrigada a velar em casa do meu patrão. Mas, além do mais, como tenho muitos irmãos e
irmãs menores, eu me impus fazer à noite uma camisa de homem, antes de me deitar. A sua paga
todavia não é cara: uma camisa de homem, para os grandes armazéns, é de 0 francos 50».
133 A mulher valorosa continuava:
«Não creiam que estas veladas me façam mal; pelo contrário, creio que tenho delas
necessidade, tanto estou acostumado a elas!».
Ela fazia por ter tão pouca necessidade, que cedo teve de entrar no hospital com uma
doença de peito.
Deve-se também fazer ler às mulheres que mandam outras trabalhar, para lhes recomendar
o célebre Canto da camisa, do poeta inglês Thomas Hood. Este canto estrondeou na Inglaterra
como um grito de revolta. Dir-se-ia dele que foi escrito com lágrimas. O senhor de Haussonville
dele reportou um longo fragmento no seu estudo interessante sobre a vida e os prazeres em Paris.
Mas ele não é suficientemente conhecido e nunca o será demais. Eis pois o refrão e quatro estrofes
traduzidas literalmente:

O CANTO DA CAMISA
134 Os dedos cansados e usados
As pálpebras pesadas e vermelhas,
_______________________________________________

crianças. O senhor Harmel estima que as vantagens do campo, por meio das hortas, da criação de
animais domésticos, por cauda da modicidade dos alojamentos e a simplicidade de vida, não
podem ser avaluados em menos de 0 francos 25 por cabeça e por dia, em relação à cidade. O
mínimo necessário para a cidade seria portanto de 310 francos 25 por pessoa (365 x 0 francos 85),
ou seja para os cinco membros de uma família: 1551 francos 25 por ano.
Uma mulher, cujos trapos indignos
Contrastavam com a sua face,
Estava assentada, enfiando a agulha com o fio.
Cosendo, cosendo, cosendo sem parar,
Na miséria, na fome e à pressa;
E, com sua voz de intonação dolorosa,
Ela cantava o Canto da camisa.

I Coser, coser, coser,


Enquanto o galo canta no fundo;
Coser, coser, e ainda coser,
Até que a alba brilhe na janela!
Oh que é ser escrava,
Como entre os bárbaros turcos,
Onde as mulheres não têm alma para salvar
Como se tal fosse o trabalho de um cristão!

II Trabalha, trabalha, trabalha,


Até que tenhas vertigens na cabeça!
Trabalha, trabalha, trabalha,
Até que fiques com os olhos pesados e turvos!
Faz as costuras, as pregas e os punhos,
Até que, ao chegares aos botões,
Caias cheia de sono
E continues a coser sonhando!

III Ó homens, que tendes queridas irmãs,


Homens, que tendes mães e esposas,
não é tela a que usais,
mas a vida de humanas criaturas!
Cose, cose, cose sem parar!
Na pobreza, na fome e na pressa,
Coses com um fio duplo
Um lençol ao mesmo tempo que uma camisa.

(…)

IV Oh, durante uma hora curta, apenas uma,


Ter uma paragem, por breve que seja;
Não um prazer feliz para amar ou esperar,
Mas somente um tempo de repouso para a dor!
Chorar um pouco, tal me aliviaria o coração;
Mas debaixo das minhas pálpebras, careço
Que sequem as lágrimas amargas,
Pois que cada choro faz parar a minha agulha e o meu fio.

Os dedos cansados e usados


Os olhos pesados e vermelhos,
Uma mulher coberta de trapos, cuja indignidade
Contrastava com a sua face,
Estava assentada a enfiar a agulha e o fio,
Cosendo, cosendo sem parar
Na miséria, na fome e à pressa;
E sempre com voz dolorosa.

- Queira Deus que a sua intonação possa ter


Tocado a orelha do rico! –
Ela cantava este Canto da camisa.

E não se trata de imaginação, mas de realismo.


CAPÍTULO III
A GÉNESE DO MAL-ESTAR SOCIAL:
FALSAS NOÇÕES DA SOCIEDADE,
DO TRABALHO E DA PROPRIEDADE
135 O mal social, no seu conjunto, provém da violação de todos os princípios enumerados no
primeiro capítulo, mas assinalaremos aqui de modo especial as consequências funestas das noções
erradas que tiveram curso acerca da sociedade, do trabalho e da propriedade.

§ 1. – O mal-estar social provém antes de tudo de uma falsa


conceção da sociedade
136 I. A sociedade não é uma invenção do livre arbítrio dos homens, como se pretendeu, mas
uma condição natural da sua existência. Esta condição repousa sobre bases imutáveis: a religião,
a família, o trabalho e a propriedade.
«Deus, que deu leis à república das abelhas, não as terá traçado para a sociedade dos
homens?».
Laços do homem com Deus, com seus pais, com seus semelhantes, com toda a criação,
tudo isso está no plano do Criador, na fórmula do Decálogo, no espírito do Evangelho, na doutrina
da Igreja.
Estes laços tutelares esperam o homem antes da sua nascença, o sustêm por toda a vida até
às portas da eternidade.
A teia destes laços nasce sem dúvida da ordem natural, mas ela não se impõe fisicamente
ao homem, criatura consciente e livre, como fazem as leis da natureza para o resto da criação. Esta
teia forma um conjunto que corresponde à conceção cristã da sociedade. Não foi concretizada,
aliás, senão nas sociedades cristãs. A história nos conta o que as sociedades pagãs haviam feito da
família e dos trabalhadores.

137 II. Uma vez que é a partir da conceção cristã da sociedade que depende a solidez da rede
de laços que lhe corresponde, está claro que uma outra conceção ao substituir-se a essa deverá,
antes de mais, relaxar e, a seguir, tirar estes laços, se acaso não os substituir por outros.
Só que acontece isto: uma falsa conceção da sociedade não pode gerar senão laços
artificiais. E os mesmos não podem nada que não seja atrapalhar, ferir e, finalmente, tornarem-se
insuportáveis. Semelhante à criança que caminha com moletas na condição que estejam bem
colocadas para suster os seus passos. Se elas lhe faltarem, ela estrebucha; mas se, por tolice ou
malícia, as amarrassem às pernas em vez de as deixar sob os braços, seria ainda pior, a sua queda
seria violenta e ela não poderia mais caminhar.

§ 2. – A conceção antissocial, que se substituiu à conceção cristã, é o


individualismo ou o liberalismo económico.
138 I. Nesta nova conceção, nem a humanidade nem o homem adulto têm necessidade de
moletas
O homem nasce bom; somente a antiga conceção social o enganou; regressado ao estado
de liberdade, ele reencontrará a plenitude das suas faculdades.
Ele irá aplicar todas as suas faculdades à satisfação das suas carências e dos seus desejos
sem outro limite do que a saciedade.
Ele não conhecerá outras leis que as da natureza; e estas, é ele mesmo que as determina
cientificamente.
Se, em consequência desta determinação científica, convém a um certo número de homens
adotar regulamentos sociais no interesse do seu maior bem-estar, a pluralidade das vozes decidirá
sobre isso; e o que terá decidido a maioria irá chamar-se vontade do povo.
Na vontade do povo reside a justiça absoluta, uma vez que não há na humanidade qualquer
germe de malícia. Na vontade do povo reside também a soberania absoluta, já que não há outra
origem para o direito a não ser o bem-querer dos indivíduos que o compõem.

139 II. Esta doutrina filosófica da perfeição natural do homem, e por consequência do seu
direito a uma liberdade absoluta num estado de igualdade social absoluta, criou logicamente outras
doutrinas que se aceita como dogmas:
Aquela da liberdade de consciência, ou da libertação de qualquer dever social em relação
a Deus; a ideia de Deus não aparece mais no sistema senão como uma hipótese arbitrária e
supérflua.
A da liberdade do trabalho, isto é, da liceidade de todas as convenções entre empregadores
e empregados, os interesses terão de se harmonizar no melhor dos casos pela lei da oferta e da
procura.
A da liberdade de todas as outras transações, em virtude do mesmo princípio: liberdade do
comércio, liberdade do lucro, liberdade de todas as especulações.

140 Em suma, liberdade de se enriquecer por todos os meios, liberdade de se empobrecer por
todas as imprevidências.
Pelo contrário, proscrição de todas as liberdades mais sagradas, a liberdade das vocações,
a liberdade da educação, a liberdade do testamento, a liberdade de associação.
O Estado resta a única forma de grupo permitido aos cidadãos; ele proíbe qualquer outro
que tenderia a proteger os seus interesses particulares, e não intervém em favor de nenhum destes.
A sua missão é puramente uma ação de polícia para a manutenção da ordem pública, sob a
cobertura do qual cada cidadão sustém à sua custa a luta pela vida, sem mais inquietar outros nem
nada pretender.
Tal é o corpo de doutrina do individualismo.

§ 3. – As doutrinas do individualismo foram introduzidas na vida


social pela Franco-maçonaria, sob a cobertura da Revolução.
141 A doutrina do individualismo, em que o homem se toma como seu próprio fim e onde a
humanidade, ao glorificar-se a si própria, se liberta de todo o dever em relação ao Criador, também
é tão antiga como o mundo, pois que é a mesma que o anjo rebelde sugeria ao primeiro homem.
Ela transmitiu-se através das idades, nas civilizações pagãs, porque é filha do orgulho e
que o homem não procura convenientemente nos benefícios de Deus senão os meios de se libertar
da sua lei.
Ela explodiu, logo a seguir ao Renascimento, na Reforma, que se fez no nome da liberdade
do exame.
Ela inspirou a franco-maçonaria. Esta sociedade, nascida no começo do século passado, na
Escócia, num solo onde a Reforma havia inspirado mais do que alhures o ódio à Igreja, grassava
uma filosofia inspirada do orgulho farisaico e do materialismo das seitas do Oriente, ao mesmo
tempo que as suas práticas eram emprestadas às idolatrias mais grosseiras nas quais tinham caído
os judeus. Ela todavia misturava à sua linguagem uma vaga homenagem ao ser supremo, Deus
impessoal cujos mandamentos se confundiam com os da natureza e, a seus costumes, uma pueril
falsificação da cavalaria; para poder enganar no seu próprio seio, ela se travestia dos ornamentos
exteriores do que iria encarniçar-se a destruir: a sociedade cristã.

142 II. Quando a Franco-maçonaria ganhara na Europa inteira as classes dirigentes e lhes
inspirara um grande desdenho da arraia-miúda que não admitia nas suas fileiras, ela concentrou os
seus esforços sobre a França, que então mantinha incontestavelmente a cabeça da civilização.
Aproveitando da queda de um regime político que tinha minado e ao mesmo tempo corrompido,
ela fez brilhar aos povos, como um novo evangelho, através da proclamação dos direitos do
homem, o que ainda agora se chama os grandes princípios e que Le Play lhe deu o nome com mais
propriedade: os falsos dogmas de 1789.
Assim como tinha inspirado os cadernos dos bailios, 34 ela organizou as eleições, governou
as assembleias, impôs ao Estado a sua divisa: «Liberdade, Igualdade, Fraternidade», e perseguiu
com visceral violência todos os restos de autonomia, todos os vestígios de solidariedade, todas as
liberdades públicas ou privadas que o antigo regime ainda não tinha abolido: as corporações com
suas Caixas de socorro mútuo, as comunidades religiosas com seus bens, todas as fundações em
favor dos pobres. Tudo o que formava o seu património foi confiscado sob o pretexto da seguinte
declaração: a nação assumia o encargo de fornecer trabalho aos cidadãos válidos e o alimento aos
indigentes.
O século passou, a Franco-maçonaria manteve-se no poder, as suas doutrinas são invocadas
como dogmas mais ou menos por todos os partidos. Mas as suas promessas ficaram vãs, porque
estão em contradição com os seus princípios.

§ 4. – Como é que o liberalismo económico concorreu, com o


individualismo ímpio e revolucionário, a desorganizar a sociedade,
ao preconizar uma falsa noção do trabalho
143 «Deixai fazer, deixai passar, dizia a Escola de Manchester. Retirai todo o entrave ao
comércio, todo o limite ao trabalho. A lei da oferta e da procura e o livre-câmbio bastarão a tudo.
Se o equilíbrio for perturbado num momento, ele se restabelecerá. O operário infeliz irá procurar
ao longe salários mais vantajosos, ou então ele vai-se defender pela greve».
___________________________________________
34
Muitos destes cadernos permaneceram impetrados do espírito cristão, mas a maior parte deles continha
os germes do espírito revolucionário, inspirado pelos franco-mações.

A maior parte dos nossos economistas ainda está trancada nisso.


É uma ilusão deplorável que concorreu, junto com a propaganda revolucionária, a
desorganizar a sociedade.
O operário, privado das associações que o sustentavam e das leis que o protegiam, ficou
sem defesa. A lei inelutável da concorrência conduz sempre à produção cada vez mais barata e ao
abaixamento dos salários.
O operário, paciente, presta-se a tudo para poder viver e para dar um pouco de pão aos seus
filhos. As jornadas se alongam, as noites recebem o seu prolongamento, as mulheres e as crianças
trabalham, e o pão é sempre raro em casa. Então, o operário se amargura e apresta-se a aceitar
todas as más doutrinas. É neste pé que estamos.

144 Que se não diga que o operário tem a greve para fazer levantar o preço do trabalho. O
operário não tem os recursos para esperar. De fato, sobre cem greves, não há senão cinco ou seis
que concorrem para benefício do operário.
Também se diz que o trabalho é livre, que o operário pode ir procurar alhures. Não, o
operário não pode procurar facilmente alhures. Há poucas fábricas idênticas. O operário não pode
transportar por todo o lado o seu modesto lar como o árabe transporta a sua tenda até à pastagem
vizinha. E depois, aliás, que iria encontrar?
É a própria conceção do sistema que está errada. O trabalho não é uma mercadoria, um
valor regido pelas leis económicas; é um ato humano e social, que tem consequências morais para
o indivíduo, para a família e para a sociedade.

145 «Ah, desabafava o eminente Cardeal Manning, se a finalidade da vida é a de multiplicar


os metros de fazenda e de algodão; se a glória de uma nação é a de produzir estes artigos na
maior quantidade e ao preço mais baixo, passa-se … em frente na via em que seguimos!
Pelo contrário, se a paz e a honra do casal, se a educação dos filhos, os deveres da esposa
e de mãe estiverem inscritos numa lei natural identicamente importante como qualquer lei
económica; se todas estas coisas são tão sagradas como tudo o que se vende no mercado, então
deve-se agir em consequência.
Se, em certos casos, a não regulamentação do trabalho conduz à destruição da vida
doméstica, ao abandono dos filhos; se ela transforma as mulheres e as mães em máquinas vivas,
os pais e esposos (que se nos perdoe estes epítetos) em bestas de carga, que se levantam antes do
sol e retornam a casa de tarde, esgotados de fatiga, e já sem força para mais nada do que tomar
um bocado de pão e de se jogarem sobre um leito para dormir, então a vida familiar deixou de
existir, e já não podemos continuar neste passo».
E como alguns acusavam o cardeal de socialismo, ele respondia: «Não; ajudar os operários
e os indigentes, meter ao seu serviço o concurso da Igreja, as forças do Estado e o apoio das
associações para impedir o que é contra a lei natural e cristã, não é fazer socialismo, é cumprir
um dever».

§ 5. – Como é que os princípios da sociedade moderna não podem


produzir salvo o arbitrário nas leis, a instabilidade nas instituições,
o egoísmo nos costumes
146 I. O princípio da soberania do povo é tão tirânico quanto o das monarquias absolutas, pois
enquanto estas exageravam o direito divino para se subtrair a qualquer controle, o princípio da
soberania do povo exclui a ideia de Deus e não reconhece nenhum limite. O primeiro doutor da
Escola, J.-J. Rousseau, proclamou-o e ninguém mais depois pode contestá-lo. Ora a soberania do
povo não pode na realidade ser exercida senão por uma fração que se assenhoreia da maioria e
trata necessariamente como inimiga toda a minoria dissidente. À volta duma metade dos cidadãos
que assim fica reduzida ao estatuto de vencida num país conquistado, de emigrantes no seu próprio
país. Até mesmo entre a maioria, todo o cidadão na posse teórica da soberania, vive na realidade
num estado jurídico pouco diferente do da escravatura, pois nada o garante que aquilo que hoje
declara como seu direito não será considerado ultrapassado pelos seus próprios mandatários
amanhã, e que, por isso mesmo, será imediatamente declarado suspeito já que vai ser considerado
descontente e rebelde, porque não poderá deixar de o ser no seu foro interior.

147 II. Que a instabilidade das instituições seja uma consequência inseparável do dogma da
soberania do povo, isso é automático, a mobilidade natural do povo, não sendo contida por nada
desde que se sinta o senhor de tudo. Não é apenas a sua instabilidade, mas o que se refere à sua
caducidade mais propriamente, pois toda a antiga instituição tem contra si o espírito de novidade
que este regime exalta além medida, enquanto enfraquece o espírito da tradição.

148 III. Mas que o egoísmo dos costumes seja uma outra consequência das mesmas doutrinas
sociais ou, antes, antissociais, exige ser considerado devidamente.
A liberdade, tal como é compreendida na prática da Escola, consiste em não ter, a respeito
de ninguém, deveres de subordinação; a igualdade, a não se ater na mesma a nenhum respeito, a
nenhuma deferência, a qualquer sujeição. Onde estaria portanto o laço social nesta conceção? Nem
sequer na família em que o filho se torna depressa igual ao pai – e será ventura quando ele não se
crê superior a ele, pela simples razão que está melhor metido «no movimento (da moda)».
Resta sem dúvida o terceiro termo da fórmula «Fraternidade». Mas, para que se note que
conteúdo possa ter, deve-se considerar a sua origem. Já não é mais por termos um Pai comum «que
está nos céus» a razão por sermos irmãos nesta nova doutrina, mas por uma simples similitude de
natureza, e porque todos nós descendemos dos macacos.

§ 6. – Por qual razão, sob a influência do individualismo, a luta


substituiu a concórdia entre os homens, e o povo foi conduzido, por
uma reação exagerada, a desejar o coletivismo
149 I. «O homem é um lobo para o homem» (Homo homini lupus [cf. Plautus, Asinaria, a. II,
sec. IV, v. 495]).
Esta palavra é a de um dos doutores da Escola: ela não deixa de ser simplória para ser
justificada na sua conceção social.
O homem tem necessidades, paixões, erros. Se não for levado, na sociedade moderna, a
invocar nenhum socorro, a não encontrar nenhum moderador, a se guiar por nenhum farol, até o
quê não o levará a sua necessidade? Até onde não o conduzirá a sua paixão? Até onde não lhe
desencaminhará o seu erro?
Na sociedade moderna, nenhuma lei protege a fraqueza nas lutas da concorrência; nenhuma
instituição intervém como moderadora nas questões vitais do nível do salário e do custo de vida;
nenhuma põe um travão à cupidez do especulador. Desde então, o homem sem proteção entra em
luta pela vida contra os outros homens, e a máxima evangélica: «Amai-vos uns aos outros» [cf. Jn
15,17], torna-se impossível, enquanto triunfa a fórmula satânica: «Destruí-vos uns aos outros».

150 II. Se estas palavras parecerem excessivas, que se queira dar um golpe de vista à sua volta,
contar as oficinas desaparecidas, e pergunta a si próprio se poderiam não terem desaparecido.
A coisa é tão comum que até já não se presta mais atenção: vêem-se aldeias agrícolas cair
em ruínas, e diz-se que é o atrativo dos bons salários na indústria e os fáceis prazeres da cidade
que as fazem abandonar. Ninguém ousa dizer que as pessoas já não encontravam mais nelas com
que viver, por falta de proteção dos seus meios de existência, das suas indústrias domésticas, das
suas pequenas propriedades.

151 III. Foram o individualismo revolucionário e o livre-pensamento que destruíram, há cem


anos, as grandes instituições que a solidariedade cristã havia criado. Foram eles que destruíram o
património coletivo dos trabalhadores e levado à confiscação das riquezas das ordens religiosas,
que eram o património coletivo dos pobres.
É do individualismo e do livre-pensamento que deriva, como uma reação e como uma
consequência fatal, a propaganda coletivista de hoje.

152 O povo, tendo uma tendência natural para a associação e uma real necessidade de proteção
nas lutas pela vida, e não mais encontrando o socorro das corporações e das fundações religiosas
de outrora, aceita as utopias do socialismo coletivista, que lhe promete esta assistência e o
benefício duma união. Notemos, de passagem, que esta fonte manifesta do perigo coletivista já
indica o remédio sobre o qual voltaremos diversas vezes.
Para desenraizar o coletivismo, é preciso cortar a raiz do mal, isto é, atacar o individualismo
económico e o livre-pensamento. Deve-se restaurar, sob uma forma apropriada às circunstâncias
atuais, a solidariedade cristã, arruinada pelo liberalismo revolucionário. Deve-se reconstruir os
patrimónios coletivos pela associação, pela mutualidade, pela cooperação, pelas caixas de
poupança, de seguros, de reforma, etc., em suma, pela aplicação, no domínio social, do grande
preceito da caridade cristã, em vez do princípio egoísta da economia liberal.

§ 7. – A falsa noção da sociedade produziu a falsa noção da


propriedade
153 O liberalismo, ou antes o individualismo, já que é o termo que convém à falsa noção da
sociedade, devia originar falsas noções sobre todas as instituições que estão na base da ordem
social. Ele transformou a religião numa opinião pessoal, e da sua prática um assunto de ordem
exclusivamente privada, sem relação com a vida pública. Ele fez da família uma sociedade
passageira, de natureza animal, sem relação igualmente com a vida social; o Estado usurpa a
autoridade do pai de família, e dá rebeldia ao cidadão desde que seja adulto. Ele transforma o
trabalho numa espécie de escravatura, cujas condições são dependentes e impostas à pobreza pelos
detentores da riqueza, sem outras regras de direito que as que nascem da força. Ele fez, por fim,
da propriedade, uma potência sem condições, um poderio sem travões, uma fonte de direitos sem
deveres.

154 A doutrina do individualismo portanto é responsável, além do desprezo pela religião, pela
família e pelo trabalho, por esta maneira típica de desprezo pela pobreza que se origina na avarícia,
e se traduz por esta definição pagã da propriedade: o direito de excluir qualquer que seja da
disposição e do uso de um bem; enquanto a sua definição cristã consiste no direito de administrar
e de despender com vista ao bem comum: «Potestas procurandi ac dispensandi» (São Tomás).35

§ 8. – A falsa noção de propriedade falseou a repartição dos bens


155 Nos séculos cristãos, a repartição dos bens tinha respeitado o grande princípio que «o uso
dos bens é comum a todos numa certa medida». Os ricos não podiam livrar-se de todo o dever
social; os pobres não podiam perder todo o direito.
A propriedade rural apresentava-se como copropriedade quanto ao fundo e quanto aos
rendimentos; ela não podia mudar de natureza ou de mãos sem o consentimento dos diversos que
tinham direito e que detinham, uns o domínio direto, os outros o domínio útil; os seus frutos eram
também objeto duma partilha, na qual a parte referente ao cultivador era superior àquela que hoje
lhe deixa o senhorio da quinta ou a exploração de que é um simples salariado.
De mais a mais, uma parte bastante notória, por vezes até a mais considerável dos bens de
raiz estava substrata à apropriação individual e formava os bens apodados de «mainmorte», que
eram a dotação do culto, do ensino, da assistência pública ou formavam benefícios perpétuos em
favor desta ou daquela condição de pessoas, de tal modo que não havia ninguém de tal forma
deserdado que não tivesse recurso sobre uma qualquer porção da propriedade pública ou privada.

156 A Igreja retirava em favor dos pobres o dízimo sobre todas as rendas; ela participava em
favor das obras pias em todas as heranças; as corporações de artesãos tinham a sua «Caixa» para
seguros eventuais, os seus hospitais, as suas escolas; as comunidades rurais tinham os seus bens,
os seus direitos, os seus usos, tais quais a colheita, a desflorestação, a pastagem pobre; enfim, como
traço essencial, os bens móveis, o dinheiro, que não podiam ser capitalizados, de modo que toda a
gente encontrava de quê viver sobre os «bens do bom Deus».
Nos tempos atuais, tudo isso desapareceu: o que nada possui em nome próprio, nada pode
pretender, e é levado a pensar como a presente apropriação dos bens não passa duma monstruosa
exação.
Afirma-se claramente, na defesa deste regime, que é inerente ao progresso económico; mas
então a franquia da propriedade, na medida em que era vantajosa ao possuidor do fundo, não
deveria dar o direito a uma justa indemnização para proveito dos utilizadores?

157 O Estado substituiu todos os que tinham direito pela elevação dos impostos e das taxas
sucessórias, mas nada lhes foi restituído. E deste modo não fez mais do que consagrar a espoliação,
quando não foi ele mesmo que a perpetrou, como acontecera desde o começo da Revolução.
___________________________________________
35
IIa, IIae, quaestio 66, ad 2.

Ele é obrigado ainda hoje à restituição, não global certamente, mas sucessiva e
indeterminada, ao favorecer sobretudo a reconstituição dos bens corporativos.
Os particulares, de seu lado, devem ser chamados a esta lei fundamental, cujo supérfluo
não é a dotação dos seus prazeres, mas o bem dos pobres.
Mas não basta assinalar apenas os pecados por omissão respeitantes à propriedade, tal
como é atualmente estabelecida e exercida; deve-se passar agora a esses pecados de ação, e ver
como, depois de ter abandonado os pobres, ela os abusa.

§ 9. – A falsa noção da propriedade engendrou a usura


158 A propriedade, desquitada de todo o dever, conserva o que, em termos modernos, se chama
disponibilidades. Desde o momento em que não pensa mais ser seu dever de as empregar em
serviços gratuitos, é natural que procure investimentos remuneradores, e que meça o valor dos seus
serviços, menos sobre o que estes lhe custam e sobre o que rendem do que sobre a necessidade dos
outros quando são obrigados pelo aperto de os buscar.
É o princípio da usura. Ele torna a pobreza tributária da riqueza, ao passo que é esta que
recebeu da Providência o encargo de repartir os seus dons.
A usura é exercida primeiramente pela contribuição dita de consumo e pela garantia
hipotecária, depois pelo rédito excessivo imposto à terra assim retida; a seguir, pelo contrato dos
capitais a uma taxa excessiva, ao passo que o contrato de trabalho se traduzia em salários
insuficientes.36
Isso é fácil demonstrar nas estatísticas das primeiras empresas industriais: quando os
capitais se decuplicaram, os salários nem mesmo chegaram a duplicar, enquanto o valor do
dinheiro havia caído ainda mais.

§ 10. – A usura produziu a proletarização das classes inferiores


159 As classes inferiores, isto é, as que, vivendo de um trabalho diário pouco remunerado, têm
direito à dedicação das classes superiores, encontraram-se sob o regime da usura, não só
abandonadas a elas mesmas, mas exploradas pelos possuidores de capital e, como dissemos,
tributários destes.
O resultado desta exploração foi a proletarização, ou seja, a perca de uma existência
afiançada, como a posse de uma habitação, de um ofício e de seus instrumentos; numa palavra, de
um estado. Também o regime, dito da liberdade do trabalho e do comércio, foi justamente
estigmatizado nos termos seguintes por Leão XIII:
_______________________________________________
36
Pelo empréstimo ao consumo empresta-se a um homem que está na necessidade e que vai consumir o
que se lhe empresta, exceto a dar-lhe mais tarde o equivalente. Este empréstimo deveria ser gratuito.
Existia nos séculos cristãos. Tornou-se usurário, quando os que emprestavam estipularam juros e
exigiram garantias hipotecárias.

O empréstimo para produção é feito a um produtor, comerciante, industrial ou agricultor que produzirá
frutos consoante a quantia emprestada. É mais uma colocação de dinheiro do que um empréstimo. Neste
caso o juro é ao menos tolerado, senão mesmo inteiramente justificado pela Igreja.

«Uma usura voraz veio-se ajuntar ainda ao mal. Condenado por diversas vezes pelo
julgamento da Igreja, ela não cessou de ser praticada sob uma outra forma por homens ávidos de
ganho e de uma insaciável cupidez. A tudo isso, deve-se acrescentar o monopólio do trabalho e
dos valores, que se tornou propriedade de um pequeno número de ricos e de opulentos que impõem
assim um jugo quase servil à infinita multidão dos proletários».37

§ 11. – A usura provoca o afastamento das famílias guardas das


tradições, para proveito dalguns especuladores
160 Partindo desta falsa noção da propriedade, as classes superiores, sem se entregarem
diretamente à especulação usurária, não temeram de participar nos seus proveitos por meio dos
capitais que pudessem fornecer-lhe. De quê uma primeira causa de desconsideração.
Depois elas abandonaram-se ao ócio, resultante destas rendas cuja aquisição não exigia
qualquer trabalho; e não pensaram mais em se distinguir das classes inferiores senão pelo luxo e
pelo bem-estar.
A riqueza, desde então, nunca se lhes apresentou como um resultado de nobres labores,
nem como um atributo do poder adquirido. Ela deixou de inspirar o respeito.

161 Não restando numa fonte de liberalidade, inerente à sua natureza, ela cessou de atrair um
reconhecimento.
Ela tornou-se num deleite de ordem inferior, que já não mais pode inspirar senão o desprezo
por esses que não sentem a necessidade, e a inveja da parte dos que sofrem mediocridade ou que
suportam a pobreza. Ao mesmo tempo que ela criava o afastamento entre ricos e pobres, a
propriedade assim concebida levava a um nivelamento antissocial entre os usurários de profissão
e os seus associados inconscientes.
Os judeus tomavam por direito o primeiro lugar numa sociedade plutocrática; a sua
clientela benévola não mais pensava no que a deveria distinguir deles; depois de os ter rebocado,
caía por sua vez a seu reboque, até ao ponto de perder o direito à existência. Está nisso o «propter
vitam vivendi perdere causas» [Juvenalis, Satirae, III, 8, 84].
§ 12. – A democracia socialista torna-se necessariamente
o ideal do povo
162 Nestas condições de abaixamento moral das classes superiores, a desigualdade das
condições não pode mais aparecer como o produto da remuneração equitativa dos diversos serviços
sociais, mas como o da força ou da manha ao serviço da cupidez.
O povo não pode conceber uma ideia justa sobre isso pois que de tudo não capta outra
utilidade que a de estimular o trabalho de uns em proveito da ociosidade de outros. Ele já não se
satisfaz mais do sofismo «que se não houvesse ricos, não haveria trabalho para os pobres»; estes,
com efeito, encarregar-se-iam com muito gosto do consumo que parece ser a única função
daqueles.
____________________________________________
37
Encíclica Rerum Novarum.

163 Desde que as classes altas não são mais que classes ricas, e que os ricos não mais aparecem
senão como parasitas, a sua supressão reveste aparências de justiça social, e torna-se o ideal da
democracia. A igualdade política não lhe aparece mais, como o último termo da evolução moderna,
mas simplesmente como o meio de realizar a igualdade económica. Aliás, será esta mais que aquela
contra natura e de direito?
A noção da hierarquia das classes sociais correspondente à ordem dos serviços tendo
desaparecido com o fato descrito, não virá a ser substituído pelas classes que se elevam à riqueza
senão por aquela da exploração das massas que formam as bases da pirâmide social.
Então ao esmagamento real ou aparente da maioria, corresponde a sublevação geral dos
espíritos.

§ 13. – A anarquia aparece ao povo o meio mais seguro


de realizar este ideal
164 O programa tipicamente igualitário da democracia social sendo adotado pelas massas
encontra pelo menos imensas resistências na sociedade moderna, não só porque é contra a natureza,
mas porque meteria confusão no jogo dos interesses mais numerosos.
Os seus adeptos, quando são pessoas de sentido antiquado ou que estão à vontade para
esperar, consideram-no de boa vontade como o de uma evolução histórica que se produzirá e
prosseguirá fatalmente pelo excesso próprio do sistema inverso.
Este sistema, com efeito, que chamam de capitalismo, e que repousa sobre a usura, deve
trazer o monopólio das riquezas para um número de mãos sempre decrescente; de tal forma que
necessariamente, estas riquezas tendam a confundir-se com a riqueza pública, seja porque os reis
do capital se apoderam do Estado, seja pelo fato de que qualquer operação, facilitada pelo seu
pequeno número, os faça cair no poder do Estado.

165 Porém os espíritos mais teimosos ou os apetites mais vorazes não compreendem nada desta
evolução legal, sobre esta lenta transformação. É pela violência que eles estão prontos a exigir o
que chamam a justiça; e enquanto esperam possuir a força, procedem pelo terror.
Chamamo-los «anarquistas». Eles não são outros do que aqueles mesmos que empregaram
idênticos meios para o estabelecimento de uma ordem social que não cumpriu as suas promessas.
Não é portanto sem causas que se sente a ameaça de uma revolução social.

§ 14. – Como é que tal deve acabar


166 I. A substituição de uma moral mais fácil à moral cristã originou em todas as classes a
sede de prazeres, e desenvolvido este género de necessidades numa proporção mais forte que o de
crescimento dos meios de bem-estar. Mesmo sem desordem, o arranjo das pessoas humildes corre
para a ruína; não mais se pode fixar o balanço nos casais, menos ainda a poupança, porque não se
quer viver mais segundo a própria condição. O luxo, que antes não era mais que a úlcera da riqueza,
tornou-se a lepra da pobreza; o crescimento aparente das comodidades das classes médias é uma
ilusão que não produz entre elas senão um avanço para o proletariado onde se engolfam todos os
desgraçados. E nunca houve tantos destes infelizes senão desde quando se disse que não havia
mais classes.
Com a religião desapareceu a modéstia entre as mulheres, a sobriedade entre os homens, a
disciplina na família. Quando cada um ganha pelo seu lado, cada um pretende o que ganhou para
o dissipar. E quando não há ninguém mais a ganhar a não ser um, cada um mesmo assim quer viver
à custa deste. Quantas pobres mães estão neste pé, em condições piores que uma besta de carga,
que, embora batida, é ao menos alimentada!
Mas, que não se fale mais da religião cristã desaparecida. Que a última palavra seja para
aquela da humanidade que a substituíra. Depois de ter mostrado onde ela nascera, quais os males
que causou, vejamos onde ela irá levar a sociedade moderna e como o seu reino acabará fatalmente.
Numa palavra, vejamos o que há no dilema: Cristo ou Revolução.

167 II. Esta doutrina social, esta religião da humanidade proclamada pela F…M… [Franco-
Maçonaria] repousa, em resumo, sobre três princípios:
A perfeição natural do homem.
A liberdade absoluta que é a sua consequência lógica.
Enfim a igualdade social absoluta de todos estes indivíduos igualmente bons e igualmente
livres.
Ora, o sistema aguenta-se perfeitamente, uma vez admitido o primeiro princípio. Direi
mais, ele se impõe, e é legítimo de impor as leis socias que disso derivam, mesmo pela força, aos
recalcitrantes.
É assim que a proclamação destes princípios em 1789 implicava fatalmente a sua aplicação
violenta pelo regime de terror. Este regime não foi, como se diz frequentemente para que não se a
veja mais de perto, a de uma série de excessos opostos à generosidade de 1789, mas uma
necessidade sangrenta, para fazer passar o novo direito, que repugnava à natureza, para os fatos
que tiveram de se sujeitar a ele.
Eis assim o sistema, de uma extrema simplicidade; a maioria dos cidadãos quer que a
sociedade se apresente como o descrito; a minoria não a concebe desse modo. Faz-se desaparecer
os oponentes, e todos ficam contentes, até que se aperceba que o resultado não sai perfeito. Os
descontentes chamam-se então de anarquistas e aplicam o mesmo princípio por novos processos:
a luta estabelece-se entre a bomba e a guilhotina.
É a terceira fase, lógica e fatal, da Revolução.
§ 15. – Como é que o abandono do Decálogo e do Evangelho resume
todas as causas do mal social

168 O Decálogo é a carta divina da vida social. Os dez mandamentos de Deus são a ordem
paternal e preventiva cuja observância nos asseguraria sempre a felicidade.
Deus tinha-nos ordenado: «Fazei isso e sereis felizes». A experiência dos séculos justificou
a sua palavra. A escola económica mais prática, a escola do senhor Le Play, que não se baseou
senão na observação e na comparação dos fatos, constatou que o bem-estar social cresce com a
observação do Decálogo e decresce com o seu abandono.
A causa principal da nossa crise social, portanto é a de que os mandamentos de Deus não
são mais cumpridos e que já não se os leva mais em conta na direção da sociedade civil. Deste
modo os operários que trabalham contra a religião trabalham diretamente contra os seus interesses.

169 A primeira causa de todas as desordens sociais, é o egoísmo. Jamais o teríamos visto
infiltrar-se entre nós, se o primeiro mandamento de Deus tivesse sido observado. Este mandamento
recorda-nos que temos um Pai comum que está no céu, e a sua consequência lógica é que devemos
amar os nossos irmãos. Nosso Senhor Jesus Cristo não terá ele dito: Estes dois mandamentos do
amor de Deus e do amor ao próximo estão de tal maneira unidos, que não formam senão um só.
O egoísmo e a indiferença paralisam a ação para o bem. Trata-se de um mal geral na França.
Tirante uma elite bem restrita, já nada mais há que fique senão o amor pelo bem-estar ou pelo
prazer, os únicos capazes por um esforço. A grande massa do país, penetrada pelo desânimo e pela
indiferença, aniquilada pelo seu desejo imoderado de divertimento, submetida ao egoísmo
universal, deixa-se viver sem reagir contra a decadência social que se precipita.

170 O país carece de homens vigorosos e fortes. A humanidade faz apelo a reformadores
esclarecidos. Mas seria preciso, para tal, trabalhar, se sacrificar e esquecer um pouco os prazeres
imediatos, enquanto a lassidão è tão natural ao coração do homem satisfeito! As almas efeminadas
dobram-se sobre si mesmas. O entretenimento e o orgulho asfixiam a dedicação e não deixam
subsistir nos nossos corações, desde que não nos piquem diretamente ou não nos elevem acima
dos outros, senão indiferença e desprezo.
O prazer, o bem-estar obtido sem custo, a vida fácil adquirida sem trabalho real, passa por
ser o ideal da moda. Todas as classes da sociedade foram atingidas por este mal devastador. E se
por vezes vemos a classe operária agir com energia e concorrer às eleições com um certo fervor, é
porque espera, como resultado da escolha de mandatários imbuídos das suas ideias de prazer
ilimitado, chegar a obtê-lo às custas do Bem público e até da vitalidade nacional. 38

171 Os operários lamentam-se com razão que se abusa das suas forças e que se arruína a sua
vida de família ao recusar-se-lhes o repouso do Domingo. Para os perseverar desta adversidade,
basta respeitar o terceiro mandamento de Deus.
As desordens que se encontram nas famílias ou entre patrões e operários seriam evitadas
pelo cumprimento do quarto mandamento. Este prescreve o respeito, a mútua ajuda e a deferência
na família e nas suas extensões, na vida doméstica e na fábrica como na oficina.
Os excessos do trabalho impostos ao operário, e em especial às mulheres e às crianças, são
condenados pelo quinto mandamento, exatamente como os assassínios, os suicídios, as querelas e
os duelos.
O sexto dever-nos-ia prevenir contra o deboche, a imoralidade da oficina, os atentados e as
seduções que aí se cometem, e contra o mal desastroso que produz a depopulação do nosso país.
O sétimo não nos informa somente sobre os direitos da propriedade, mas também sobre os
seus deveres e os seus encargos. Bem visto, ele não exigiria apenas o respeito pela propriedade,
mas também o seu bom uso, conforme aos princípios de justiça e de caridade.

172 Mas, ai de nós! Os que dirigem a sociedade estão de tal modo distantes de lhe tentar dar o
benefício do cumprimento do Decálogo que, pelo contrário, eles não se preocupam senão em
____________________________________________
38
Esta praga social da indiferença e do egoísmo está descrita profusamente num livro excelente do senhor
Borin-Fournet, advogado: A sociedade moderna e a questão social, editora Guillaumin, rua Richelieu, em
Paris.

afirmar o seu desprezo e violação.


Acrescentemos enfim que o Decálogo não deve ser hoje mais aceite fora do Evangelho. Os
israelitas, que haviam recebido a antiga lei de Deus, não souberam observá-la. Os seus
descendentes substituíram a observação das leis sobre a justiça pela prática da usura em todas as
suas formas.
Cristo veio renovar a promulgação da lei. Ele recomendou procurar a justiça antes do mais.
Ele levou a lei até à sua perfeição ao ensinar-nos a caridade, o serviço e a humildade, e ao oferecer-
nos as graças sobrenaturais necessárias para que pratiquemos estas virtudes. É debaixo da direção
de Cristo e da sua Igreja que a sociedade poderá regressar à prática do Decálogo, e, por esse meio,
à restauração social.
CAPÍTULO IV
ACERCA DE DOIS AGENTES PODEROSOS DO MAL-ESTAR SOCIAL:
A FRANCO-MAÇONARIA E O JUDAÍSMO
173 Quando se produz uma desordem moral, há como ponto de partida qualquer princípio falso
de que é a consequência.
Quando se passa com um estado social absolutamente desordenado, como aquele que
acabámos de descrever, torna-se manifesto que numerosos princípios fundamentais foram
desprezados e violados, e pode-se supor que agentes poderosos e organizados puseram em ação
estes princípios falsos ou invertidos para satisfazer os seus interesses ou as suas paixões.
Mencionámos no começo deste volume os princípios religiosos, morais e sociais, cujo
esquecimento causou o estado lamentável da sociedade atual.
Acabamos de mostrar como três noções fundamentais em economia social, a noção da
sociedade, a do trabalho, e a da propriedade, foram desnaturadas desde há um século, e vimos qual
desordem delas resultou.
Mas quais poderão ser os poderosos agentes que concorreram para propagandear estes
falsos princípios e estas falsas noções e a provocar-lhes consequências assim tão ruinosas?
Há dois sobretudo, a Franco-maçonaria e o judaísmo, que agem com tanta hipocrisia quanta
a energia e tenacidade. Vamos tentar de os desmascarar.

A. FRANCO-MAÇÕES E LUCIFERINOS

§ 1. – Donde vem a Franco-maçonaria?


174 O princípio da Franco-maçonaria é velho como o mundo, é a luta permanente do mal
contra o bem.
Monsenhor Fava chega a remontar a atual organização à heresia Socina. Trata-se de uma
renovação da heresia ariana.
Lélius Socin e o seu sobrinho Fausto negavam o dogma da Trindade e o da divindade de
Jesus Cristo. A seita nasceu em Vicência em 1546. Lélius Socin, expulso de Vicência levou as
suas ideias à Polónia. A seita tornou-se uma potência. Socin estava em relação com os chefes da
Reforma e em especial com Melâncton.
Perseguidos mais tarde na Polónia, os socinas tornados franco-mações, levaram as suas
doutrinas à Inglaterra e à Escócia, onde Cromwell favoreceu-os. É a partir da Escócia que entraram
em França, na qual foi fundada a primeira loja em 1725.
Os socinas tinham tomado o nome e as insígnias dos mações, para significar que queriam
construir uma nova sociedade.

175 Outros historiadores fizeram remontar a Franco-maçonaria às confrarias dos “Hóspedes


do Bom Deus” (Logeurs du bon Dieu), que haviam construído as nossas catedrais e as nossas
igrejas da Idade média, e que teriam degenerado, como consequência das suas riquezas e pela
adjunção de membros estranhos ao mundo do trabalho.
Monsenhor Meurin, numa obra magistral, aparecida em 1893, tratou desta questão histórica
em toda a sua amplidão. Ele estudou os símbolos maçónicos, os degraus do rito escocês, os
emblemas e as decorações usadas nas lojas, e encontrou a sua chave. Todos estes mistérios foram
decalcados sobre os da Cabala judia. Esta cabala era uma seita judia que tinha aceite uma mistura
de doutrinas pagãs durante o cativeiro em Babilónia. O inspirador da Cabala, como das religiões
pagãs é Satanás, e o seu fim é o de se fazer adorar em vez de Deus.

176 Monsenhor Meurin mostra-nos a analogia das doutrinas da Cabala com as antigas
teogonias pagãs da Índia, da Pérsia, da Assíria, do Egipto e da Grécia.
Ele encontra a mesma mão e a mesma inspiração na filosofia hermética e nas seitas dos
primeiros séculos cristãos, o gnosticismo, os ofitas e o maniqueísmo.
Satã é o inspirador de todas as seitas, como tinha sido a do paganismo, e os judeus da
Cabala davam-lhe o seu concurso. A sua doutrina era um vago panteísmo misturado de dualismo.
Eles admitiam, como os Persas, dois princípios emanados do Grande Todo. Ahriman e Ormuzd
tinham-se tornado Jeová e Lucifer. Mas, para eles, é Lucifer que é o Deus bom, enquanto Jeová é
um deus cruel e perseguidor.
Os Templários destituídos tinham adotado as mesmas doutrinas. Eles se uniam às seitas
cabalísticas.

177 Hoje é a Franco-maçonaria o instrumento de Satã sob a direção da Cabala judia.


Sem dúvida alguma, a maioria dos franco-mações ignoram os mistérios íntimos da sua seita
e o seu fim satânico. No entanto, o véu rasga-se, revelações chegam-nos de toda a parte acerca dos
segredos mais íntimos da seita judaico-maçónica.
Por cima das lojas ordinárias, há a alta Maçonaria que já existia há muito tempo com outros
nomes: gnósticos, martinistas, ocultistas, e que recebeu desde alguns anos uma organização
poderosa, sob o nome misterioso de Paladismo.
O Paladismo tem os seus três grandes centros, dogmático, administrativo e político, em
Charleston, em Berlim e em Roma.
As lojas paladistas são chamadas triângulos. Setenta e sete províncias triangulares são
presididas cada uma por um mago eleito.
O Paladismo presta um culto a Lucifer e dirige a ação política e social das lojas na guerra
que fazem ao catolicismo.
178 Os franco-mações italianos, aliás, já desde há vinte anos, não mais se preocupam por
glorificar Satã, aclamá-lo em público e arvorar o seu estandarte.
Em Turim, em 1882, cantou-se no teatro, perante uma populaça digna de semelhante
espetáculo, o hino a Satanás do poeta Josué Carducci, de que citaremos o princípio e o fim:

Para ti, príncipe do Ser,


Dirigem-se os meus versos inflamados.
Invoco-te, ó Satã, ó rei deste banquete.
Eis que está a passar, ó povo, Satã o grande.
Ele passa, benfeitor, de lugar para lugar,
No seu carro de fogo.
………………………………………
Saudações, ó Satã, ó rebelião!
Força vingativa da razão!
Para ti o sacrifício do nosso incenso e dos nossos votos.
Tu venceste o Jeová dos padres.

179 Em Palermo, viu-se o liceu, mestres e alunos, receber em triunfo o poeta Rapisardi, que
cantou a vitória de Satã e blasfemou contra Cristo e a Virgem Maria.
O estandarte de Satã foi arvorado em Génova, nas festas de 20 de Setembro de 1884, e em
Roma nas de 20 de Setembro de 1891.
Em 1884, o professor Mannarelli, encarregado de fazer o discurso de abertura na
Universidade de Roma, tomou por tema: «O elogio de Satã e a sua influência salutar na história,
desde a revolta de Adão até à entrada em Roma dos Piemonteses».

180 Estas apologias de Satã encontraram eco em toda a Europa. Uma conferência pública, dada
em Bruxelas, no dia 30 de Junho de 1876, pelo grupo do livre-pensamento, tinha por fim justificar
Satã da longa calúnia dos séculos.
Na França, o franco-mação Renan também deu uma incensadela a Satanás no Jornal dos
Debates:
«Satã, escrevia, é sem contradição o que mais fez ganhar ao progresso das luzes e da
civilização universal. Milton compreendeu este pobre caluniado. O seu século, tão fecundo como
o nosso em reabilitações de todo o género, não podia falhar em justificações que desculpassem
um revolucionário infeliz cuja necessidade de agir o fez lançar-se nas empresas arriscadas».
Digamos brevemente agora a finalidade da maçonaria, a sua organização, os seus quadros,
os seus feitos principais e a sua incessante e completa ação desmoralizante.

§ 2. – Qual o escopo da Franco-Maçonaria?


181 Ela se apresenta como uma simples sociedade de assistência mútua. Isto, é para a galeria.
Com efeito, ela é um grupo político, religioso e social poderoso.
A clientela banal das lojas nisso vê sobretudo um «negócio» com o prazer maligno de
ridicularizar a Igreja. «Sustentemo-nos uns aos outros nos negócios, ocupemos pela nossa
entreajuda os postos e empregos do Estado e livremo-nos do jugo dos abades». Tal é a mentalidade
interna do vulgare pecus das lojas.
Os altos graus, os iniciados, têm outro modo de ver. Esses são iluminados, sectários.
Professam umas teses, uma doutrina, uma teologia. São os inimigos do nosso Deus, revoltados
contra Jeová que acusam de rigor e de crueldade, discípulos, amigos e aficionados defensores de
Satã, que olham como um grande perseguido.

182 Os judeus na Maçonaria como por toda a parte, têm mais um fim em vista. Eles se servem
da maçonaria, como do mais, para preparar o seu domínio universal. Para eles, o «Templo de
Salomão» a construir, é o seu futuro império, será a nova Jerusalém (Conferir os Arquivos
israelitas de 1861).
Os judeus mudaram o sentido das profecias messiânicas. Não mais é um homem, um
salvador que esperam, é o triunfo da raça. Eles aspiram à república universal, na qual terão o poder,
os empregos e sobretudo a fortuna. E, então, conforme o dizem ingenuamente, «Os cristãos
comerão, quando eles bem o quiserem».
Acontece muitas vezes manifestarem esta esperança de domínio universal que os endurece.
Eis aqui um exemplo entre cem. Já em 1860, um israelita escrevia na Volksblatt (Jornal socialista
alemão): «Não compreendeis o verdadeiro sentido da promessa do Senhor Deus Sabaoth ao nosso
pai Abraão, que um dia todas as nações da terra seriam assujeitadas a Israel? Credes que Deus
entendia por tal uma monarquia universal com reis judeus? Oh não! Deus dispersou os judeus
sobre toda a face da terra, a fim de que se tornassem um fermento no meio de todas as raças e que,
por fim, estendessem, por eleição, o seu domínio sobre elas».

§ 3. – Qual será a organização da Franco-maçonaria? Quais são os


seus quadros?
183 Há em França vários ritos de franco-mações. O rito de misraim conta 500 membros; o rito
francês do Grande Oriente de Paris, 18.000.
É este último que possui de fato a principal influência e a direção decisiva na Franco-
maçonaria da França.
O Grande Oriente conta atualmente 302 lojas. Quase todas as cidades da França têm uma
ou várias. Paris tem 54 com o rito francês (num total de 90); Bordeaux tem 13, Lião, 8; Marselha,
5; Ruão, 5; Tolosa, 5; Saint-Etienne, 2; Lille, 2; etc.
O poder central é exercido pelo Conselho da Ordem. Ele tem o seu órgão oficial: o Boletim
do Grande Oriente. É verdadeiramente um estado dentro do Estado.
Leão XIII, na sua encíclica de 1884, constatou o poder espantoso da franco-maçonaria. Ela
invadiu, diz, todos os estratos da hierarquia social, e começa a tomar nos Estados modernos uma
potência que equivale à soberania.
Com efeito ela detém os ministérios de todas as nações da Europa, salvo da Bélgica.
No encontro de 1886, no Grande Oriente de Paris, os franco-mações proclamaram o próprio
poderio nestes termos: «Desde há um século, nada se fez no mundo senão pela franco-maçonaria».

§ 4. – Os seus feitos importantes


184 Ela conduz a Europa e particularmente a França desde há um século. Ela nela reina, vai
fazer em breve vinte anos, com indubitável soberania. O governo não está nem no Eliseu, nem no
Palácio-Bourbon, mas está estabelecido na rua Cadet.
O fato é manifesto, e os franco-mações, tanto como as autoridades católicas, o proclamam.
Os seus jornais e revistas, gabam-se do fato e rejubilam.
«A Franco-maçonaria, dizia A República maçónica do 30 de Abril de 1882, deve ser a
dona e não a serva dos partidos políticos». «Nós temos organizado no seio do Parlamento um
verdadeiro sindicato de franco-mações, dizia o Jornal oficial da Franco-maçonaria em 1888, com
vista a obter intervenções extremamente eficazes junto dos poderes públicos».
«A Franco-maçonaria, dizia o presidente do grande encontro de 1891, é digna de estar à
frente do progresso. Ela é digna de dirigir a República. Diz-se tal e é verdadeiro» (Boletim do
Grande Oriente, página 281).
«Nada tem sido empreendido na França sem que nisso se encontre a ação velada da
Maçonaria, dizia o Presidente do encontro de 1890». Acrescentava-se: «Se quisermos organizar-
nos, daqui a dez anos, a Maçonaria terá alcançado o repto, e ninguém mais operará em França
fora de nós».

185 Monsenhor Freppel tinha portanto toda a razão em dizer: «A luta atual é entre o
cristianismo e a Franco-Maçonaria, que reina e governa e cujo programa foi aplicado ponto por
ponto desde há quinze anos». (Alocução ao seu clero, 1º de Janeiro de 1891).
O Sr. arcebispo de Aix pôde escrever ao senhor ministro dos Cultos:
«A Franco-maçonaria, esta filha primogénita de Satã, governa e comanda; é mil vezes
cego voluntariamente quem não o vê» (8 de Outubro de 1891).
Sua Eminência o cardeal arcebispo de Paris não era menos explícito na sua carta à qual
aderiu todo o episcopado francês. «A luta atual, disse, não é entre partidos políticos, mas entre a
França cristã, que revindica a liberdade da sua fé, e as seitas maçónicas».
As diversas revoluções que agitaram a Europa desde há um século foram a obra da Franco-
maçonaria.

186 Os Franco-mações tinham preparado a Revolução de 1789, e quando ela aconteceu,


encontramo-los nos bancos da Constituinte, da Legislativa e da Convenção.
«Os três quartos da Assembleia nacional pertenciam à Franco-maçonaria, lemos nas
Revelações de um rosa-cruz, e não se pode citar um só da Convenção que não devesse o seu
mandato à sua qualidade de adepto».
«Foi a Maçonaria que fez a Revolução de 1789», dizia o presidente do grande convénio
de 1891. Encontramos a mesma mão nas revoluções de 1830, de 1848 e de 1870. Sobre onze
membros do governo provisório do 4 de Setembro, dez pertenciam à seita.

187 As eleições de 1871 puseram-nos de lado. Eles trabalharam para reconquistar o poder. E
conseguiram-no por meio da eleição do franco-mação Grévy. Desde então, todos os ministérios,
debaixo do Sr Grévy e do Sr Carnot, eram compostos quase unicamente de franco-mações.
Na Instrução pública, os ministros que se sucederam, os Sr. Ferry, Paul Bert, Bourgeois e
Dupuy eram franco-mações. Todos os ministros das Finanças desde 1880, eram franco-mações.
Eles confessam no seu Jornal oficial que detinham todas as nossas instituições públicas
(Ano de 1886, página 545).
Pelas eleições, eles são mestres do país. Cada loja é um comité eleitoral permanente.
Escolhe-se nela os candidatos, impõe-se-lhes pela imprensa e pelas reuniões públicas.
188 Devemos-lhes todas as leis antissociais votadas desde há vinte anos. Eles impuseram ao
governo a expulsão dos religiosos, a lei escolar, a lei militar, o direito de propaganda e todas as
medidas de perseguição.
Eles se gabam aliás: «Foi no seio da Franco-maçonaria, dizia o Franco-mação Lepelletier
que se elaboram a maior parte das grandes reformas sociais; a instrução laica e obrigatória foi
estudada, preparada, e por assim dizer, decretada nas lojas» (Na Palavra de ordem, Maio 1885).
Todas as leis deste género preparam-se nas lojas. Um ministro ou um deputado recebe a
missão de as apresentar. Os jornais da seita preparam a opinião. Desde então, a discussão nas
Câmaras não é senão para a galeria, a maioria maçónica vota sempre segundo a ordem recebida
do Grande Oriente.
Os membros do parlamento que pertencem à ordem maçónica são convocados, quando
houver oportunidade, ao Grande Oriente, e aí é-lhes indicado o que devem exigir do governo.

189 Atualmente, o Parlamento conta 220 franco-mações e 100 dos outros membros são mais
ou menos submetidos à influência da seita. E como nós somos fracos e divididos na luta contra
eles!
A sua obra social é aliás puramente destrutiva. Eles não estão de acordo senão para a
perseguição religiosa, para a monopolização dos lugares e para a pilhagem das finanças. Eles não
souberam fazer nada para a organização económica da sociedade e para a promoção do povo.
A ação da franco-maçonaria é incessante. Eles detêm quase toda a imprensa e a
administração. Ela invade os tribunais; ela reina na universidade. No convénio de 1894, sobre 330
membros eleitos, havia 117 empregados do Estado: professores das faculdades e dos liceus,
mestres, empregados dos ministérios e das comunicações, dos caminho-de-ferro e da assistência
pública.

§ 5. – Que remédios temos para este imenso perigo social?


190 Temos primeiramente os remédios espirituais, a oração e o apostolado. Precisa-se, a
seguir, de uma ação constante e organizada. É necessário uma campanha incessante na imprensa.
Leão XIII disse-nos: Para vencer a Franco-maçonaria, deve-se desmascará-la. Dever-se-ia fazer
um conluio e uma campanha de influência para desalojar os franco-mações de todos os postos em
que se instalaram para nos oprimir. Todas as associações católicas deveriam ajuntar ao seu
programa: «Conhecer os franco-mações, buscar as suas listas e empregar todos os meios para lhes
retirar o poder de prejudicar».

§ 6. – Obras a consultar sobre a Franco-maçonaria


191 Monsenhor FAVA, O Segredo da Franco-maçonaria, editorial Oudin, rua Bonaparte,
Paris.
Padre DESCHAMPS, As sociedades secretas.
A.RICAUD, As lojas das mulheres.
ANDRIEUX, Memórias de um prefeito de polícia. – A Franco-maçonaria e o Panamá. –
A Perseguição desde há quinze anos. – A conjuração franco-maçónica, e outras brochuras de
propaganda, 5, rua Bayard, Paris.
DE SAINT_ALBIN, Os Franco-mações.
Monsenhor DELAMAIRE, Os Franco-mações, eis o inimigo, 5, rua Bayard, Paris.
Ver também CLAUDIO JANET e as obras alemãs de
PACHTLER, A Guerra surda e ECKERT, O Templo de Salomão.

B. A INVASÃO JUDAICA
192 Os judeus estão a ponto de realizarem a conquista da Europa. Eles intencionam tal feito e
contam consegui-lo em breve.
Como afirmamos anteriormente por acidente, eles esperam agora a realização das
promessas do Antigo Testamento através do seu domínio universal sobre os Estados republicanos
nos quais ocupam as mais altas magistraturas.

§ 1. – As suas crenças
193 Eles ainda não ousariam desvelar abertamente o seu plano na imprensa europeia: seria
temerário. Contudo, o seu pensamento não deixa margem a dúvidas; ele se revela cada dia pelos
atos deles e algumas vezes até por um programa definido.
Nada de mais claro e de mais sugestivo que o discurso-programa de um grande rabino
publicado pelo jornal O cidadão, de Marselha, no seu número de 6 Novembro de 1884. Citemos
alguns trechos do mesmo.
«O Sinédrio proclamou frequentemente e pregou a luta impiedosa contra os nossos
inimigos os cristãos. Mas jamais nos séculos precedentes os nossos antepassados tinham
conseguido concentrar em suas mãos tanto ouro e por conseguinte tanta potência como nos legou
o século XIX. Poderemos pois nos felicitar, sem ilusão temerária, de atingir proximamente o nosso
fim.
Somos por maioria senhores da Bolsa em todas as praças. Portanto temos de tornar ainda
mais acessíveis os empréstimos que nos convém fazer, a fim de tomar como garantia os capitais
que fornecemos aos diversos países, a exploração dos seus caminhos-de-ferro, das suas minas,
das suas florestas, dos seus altos-fornos e das fábricas, tal como de outros imóveis, até mesmo
dos respetivos impostos.39

194 Cada guerra, cada revolução reaproxima-nos do momento em que atingiremos o fim
supremo para o qual tendemos.
O comércio e a especulação nunca devem fugir das nossas mãos de israelitas… Seremos
os despenseiros dos cereais para todos.40
Os israelitas também devem aspirar pelo nível de legisladores, com vista a trabalhar à
abrogação das leis feitas pelos goïms (os cristãos).
Quanto às ciências, medicina e filosofia, devem igualmente fazer parte do nosso domínio.
Um médico é iniciado aos segredos de família, ele tem nas suas mãos a saúde e a vida dos nossos
inimigos mortais.
Nós vamos ditar ao mundo o que deverá crer, o que deverá honrar, o que deverá
amaldiçoar.
__________________________________________________
39
Os nossos operários socialistas, que reclamam a socialização dos instrumentos de trabalho, minas,
caminhos-de-ferro e fábricas, nunca se duvidam que esta ideia lhes é insuflada pelos judeus para apressar
o seu domínio financeiro.
40
Eis a razão pela qual eles acapararam, em Marselha, no Havre, em Antuérpia, em Hamburgo, todo o
comércio grossista dos cereais.

A cegueira das massas, a sua propensão a se entregar à eloquência tão vácua quão
sonora, dela faz uma presa fácil e um instrumento de popularidade e de crédito…
Sendo a Igreja cristã um dos nossos mais perigosos inimigos, devemos trabalhar com
perseverança a diminuir a sua influência. Por conseguinte, devemos propagar entre os cristãos
as ideias do livre-pensamento e do ceticismo e favorecer as divisões. Logicamente, é preciso
começar por depreciar os ministros desta religião; provoquemos dúvidas sobre a sua conduta
privada e, pelo ridículo e pela ironia, levaremos a melhor sobre a consideração pelo estado e pela
vestimenta.

195 A ideia de progresso tem por consequência a igualdade de todas as religiões, a qual
conduz à supressão, nos programas de estudos, de certas lições da religião cristã. Os israelitas,
pela sua aptidão e sua ciência, obterão facilmente cátedras de ensino. A educação religiosa
recuará para as famílias onde diminuirá e desaparecerá.
Se o ouro é o primeiro poder do mundo, o segundo, é incomparavelmente a imprensa.
Como não poderemos realizar os nossos projetos sem o socorro da imprensa, é necessário
que os nossos presidam à direção de todos os jornais quotidianos em cada país.
É necessário, tanto quanto possível, manipular o proletariado. Por este meio, revoltaremos
as massas quando quisermos; nós as iremos empurrar para as revoltas, as revoluções, e cada uma
destas catástrofes fará avançar de um passo os nossos interesses íntimos e fará que nos
aproximemos rapidamente do nosso fim: o de reinar sobre a terra, como tal foi prometido ao nosso
pai Abraão».
Estas páginas precisam de serem meditadas detidamente, pois que são a chave de toda a
história contemporânea.

196 Quantos instrumentos inconscientes da fortuna judaica! Quantos ilusionados, de que se


riem os judeus, no meio das multidões que acreditam nos jornais e nos discursos dos clubes!
Na Argélia, onde se sentem já patrões, os judeus nos seus jornais, deixam facilmente passar
à socapa e já se gabam pelo triunfo próximo. Um dos seus órgãos, que traz o tranquilizador nome
de Haschophet (o Juiz), andava ultimamente num dos seus dias de expansão. Ele publicou um
artigo sobre A agonia do universo romano. Sobre um versículo de Isaías (Is 1,26), que considera
uma profecia do novo domínio de Israel, deu azo às versões seguintes:
«Vai fazer em breve 19 séculos de existência aventureira, o cristianismo está, enfim, perto
de chegar ao seu fim; e brevemente, não mais se há-de recordar dele que não seja para descrever
à posterioridade o estado horrível em que as nações se encontravam sob o jugo do papado desde
há dois mil anos.
Em vão, a tiara debate-se contra o espectro da revolução judaica de 1793; em vão ela
pretende livrar-se dos braços de ferro do colosso semítico que a estrangula; todos os seus esforços
saem frustrados! O catolicismo papal morre à medida que o judaísmo penetra todas as camadas
da sociedade e anima os povos com um sopro de vida».
Mas estas ameaças não serão inconcebíveis? Será o Judaísmo verdadeiramente poderoso?

§ 2. – O seu poderio
197 Sim, os judeus são poderosos, e se Deus não nos vier em ajuda, eles ocuparão para breve
as primeiras magistraturas de todos os Estados da Europa. Eles reinarão e nós os serviremos.
Eles enchem os bancos e o comércio grossista. Eles entregam-se ao assalto da
administração. Eles tendem sem falhas para as altas esferas.
Eles detêm a imprensa. Todos os jornais estão entre as suas mãos, exceto os três ou quatro
jornais católicos. Citemos, para apoiar esta asserção, alguns dos seus redatores:
A República francesa: Reinach. – A Lanterna : Mayer. – O Gaulês: Arthur Mayer,
Ferdinand Bloch. – A Nação: Camille Dreyfus, Paul Dreyfus, Bernheim – O Eco de Paris: Valentin
Simond, Henri Baüer. – Paris: Strauss, Klotz. – O Fígaro: Wolff, Millaud, Emile Berr, Rosenthal
(Jacques Saint-Cère). – Gil Blas : Abraham Dreyfus. – O Jornal : Bernheim. – O Acontecimento :
Schwob, Lazare Cerfbeer. – O Século XIX : Strauss. – A imprensa pequena : Crémieux. – A
relembrança : Hément. – O Radical : Victor Simond, Hirsch. – O Tempo : Hément. – Voltaire :
Klotz. – A Palavra verdadeira : Singer, etc., etc. – A Autoridade, Os Debates, A Revista dos dois
mundos não estão exemptos.

198 Eles têm influência por meio da imprensa; e têm o poder pela administração e a
magistratura; e a riqueza pela banca e pelo comércio.
Se quiserdes fazer uma ideia do seu progresso em Paris, comparai os anuários de 1869 e
de 1893. Eles têm agora a maioria no Tribunal do Comércio do Sena.
Entre os abonados do telefone de Paris, um terço são judeus. Há 102 banqueiros judeus em
Paris: 55 Lévy, 20 Bloch, 26 Dreyfus, um grande número de Cahen, de Kahn, de Weil, Deutsch,
Isaac, Israel, Nahmais, Nathan, etc.
Em todas as nossas grandes cidades, a invasão progride rapidamente. Nantes, Bordeaux,
Toulouse, Nancy, Verdun, Reims, Lille, Valenciennes, Saint-Quentin estão verdadeiramente
infestadas de judeus.

199 Na Argélia estão bastante mais à frente. Eles detêm um grande número de
municipalidades. Em Orão, segundo o jornal A Estrela africana a indústria e o comércio estão
quase inteiramente nas mãos dos judeus. No comércio da moda, contam-se 41 judeus e 7 cristãos;
nos móveis, 13 judeus e 7 cristãos; nos tecidos indígenas, 12 judeus e nem um cristão; no comércio
de cereais, 17 judeus e 13 cristãos, etc. O resto virá por sua vez.
A sua tática é semelhante em toda a Europa. Aliás é a palavra de ordem do seu Sinédrio
secreto. Eles andam à procura da fortuna, da influência e do poder.
Eles acapararam o nível superior da Franco-maçonaria e mesmo do socialismo. Os
mentores mais em voga do socialismo são judeus. Judeus milionários, Singer, Aron, e Friedloender
estão à cabeça do socialismo alemão.
200 Na Áustria, os judeus dirigem todos os grandes jornais, exceto dois. Eles detêm os bancos.
Eles apropriam-se de todas as grandes propriedades. Eles possuem inclusive patronatos
eclesiásticos e nomeiam 60 párocos.
Em Viena, sobre 6.400 estudantes, conta-se 2.500 judeus. Na faculdade de medicina, são
mais de 50%. A proporção é a mesma na universidade de Budapeste.
Na Hungria, não há mais do que trinta anos que os judeus podem adquirir propriedades e
já possuem 30% do solo húngaro. Sobre 3.000 grandes proprietários agrários, há mais de 1.000
judeus. Eles não ultrapassam 3% no país, mas são 30% na universidade.

201 Em Berlim, o tribunal de recurso conta 36 judeus sobre 54 advogados. O tribunal de


primeira instância conta 200 advogados judeus contra 150 cristãos. Sobre os 150 notários de
Berlim, há 54 judeus. Sobre 87.000 negociantes, há 41.000 judeus.
A população geral de Berlim não tem mais que 8% de judeus, mas eles são 70% no tribunal,
60% na medicina, 48% no comércio, e 36% na magistratura … à espera de melhor.
Pelo contrário, sobre 108.000 pessoas de serviço, domésticos, porteiros, empregados, etc.
não há em Berlim senão 319 judeus: o mesmo que três em cada mil. A conclusão salta aos olhos:
Israel comanda e não se põe ao serviço dos outros.
A proporção dos judeus nos empregos que dão influência é a mesma no ducado de Bade e
no Wurtemberg; ela é ainda maior em Portugal e nos principados danubianos.
Eles também estão à frente do comércio de exportação e de importação de Hamburgo, de
Antuérpia, do Havre. Eles são os donos do mercado dos cereais.
Quem não se apercebe da influência que possam ter sobre os destinos das nações, em
especial em caso de guerra!

§ 3. – Os seus princípios e as suas doutrinas


202 Mas quais são os princípios e as doutrinas que favorecem assim o desenvolvimento do seu
poder? Ei-los. Primeiramente, eles têm uma confiança indesmentível no sucesso final. Como não
compreenderam nada nem sobre a redenção de Cristo nem sobre o reino espiritual do Messias, eles
esperam sempre o triunfo temporal da sua raça. Eles esperam ainda com toda a força da sua fé e
toda a tenacidade do seu caráter, e por isso trabalham com uma constância que dois mil anos de
luta não mais fizeram que solidificar.
O seu ardor e perseverança são tanto maiores quanto guardam no coração um rancor
profundo por Cristo e pelos cristãos. Para eles, Cristo e os discípulos são usurpadores que
retardaram, vai fazer em breve dois mil anos, o triunfo do judeu. É o principal obstáculo ao reino
de Israel, logo é com obstinação que se dedicam a arruiná-lo e a fazer perdê-lo.
Mas o que multiplica as suas forças, é que, para eles, todos os meios são bons quando se
trata de prejudicar os cristãos.

203 Se eles seguissem os preceitos da Bíblia, os judeus observariam as leis da justiça e da caridade,
mas quase todos, e nomeadamente os da Europa, adotaram desde o século segundo da era cristã,
uma recolha de pretendidas tradições, o Talmude, que tem autoridade no meio deles a par da
Sagrada Escritura. E este Talmude ensina-os que não têm outros deveres em relação aos cristãos
que de os enganar, de os arruinar e de os destruir. Eis algumas das suas máximas e das suas
prescrições:
1. Deus deu todo o poder aos judeus sobre os bens e o sangue de todos os povos.
2. É permitido mentir aos que não são judeus, se houver interesse nisso.
3. O não judeu que roube a um israelita, merece a morte, mas é permitido a um judeu
prejudicar os cristãos.
4. O bem do cristão é para o judeu como um bem abandonado, o judeu tem o direito de tomar
conta dele.
5. Pode-se enganar um estrangeiro e usar de usura a seu respeito.
6. Se os judeus governam um país, eles devem fazer ganhar aos judeus todos os seus processos
contra os estrangeiros, Se os judeus não forem os donos do país, devem subornar os
estrangeiros, para que o judeu ganhe a sua causa.
7. O judeu não é obrigado a respeitar as mulheres cristãs.
É sempre uma boa obra tentar dar a morte a um nazareno.
Tal é o espírito do Judaísmo, tais são as verdadeiras tendências dos judeus. Todos os judeus
da Europa são talmudistas. Eles leem o Talmude na sinagoga. Somente um certo número de judeus
no Oriente ainda se reserva ao único texto da Bíblia e que se chamam os caraítas.

§ 4. – Os diques invertidos
204 A Europa cristã é punida por se ter subtraído à direção do papado.
A Igreja nunca mudou de opinião sobre a questão judia. Ela sempre quis que os judeus
fossem respeitados nas suas pessoas e que o seu culto fosse tolerado; mas também sempre quis
que fossem conservados na submissão e no isolamento, para os impedir de prejudicar os cristãos.
Tanto que a Igreja foi escutada, eles permaneceram impotentes. Todos os povos que desprezaram
estas sábias prescrições não tardaram a se ressentirem delas.
O príncipe-arcebispo de Olmutz, de família judia convertida, consultado recentemente
sobre a questão, respondeu com conhecimento de causa que para esconjurar o perigo judeu, teria
bastado respeitar-se as regras do direito canónico.
Os concílios de Toledo e de Paris, nos séculos Vº e VIº insistiam sobre a proibição de
confiar aos judeus qualquer cargo público, civil ou militar. Proibiam também aos judeus de
empregar servos cristãos.
O Concílio de Mâcon (581) impedia aos judeus todas as funções judiciárias.
Outros concílios barraram aos cristãos de obter recurso aos serviços dos judeus como médicos ou
como servos.
O IVº Concílio de Laterão proíbe aos judeus de exigir interesses exagerados, com risco de se verem
privados de todas as relações com os cristãos. Ele também pediu que se lhes impusesse por toda a parte
um sinal distintivo sobre as suas roupas. Tornara-se necessário para precaver os cristãos das suas fraudes
e das suas exações.

205 Quando as populações se esqueciam destas prescrições, caíam sob o jugo dos judeus, e
recorriam, para se livrarem deles, a violências deploráveis que a Igreja condenava.
O papa Clemente VIII deplorava que toda a gente tivesse que sofrer das suas usuras, dos
seus monopólios, das suas fraudes. «Eles reduziram à mendicidade, dizia, uma multidão de
infelizes, principalmente lavradores, os simples e os pobres». Tanto é verdade que a história
recomeça sempre de novo!
Hoje a usura mudou de nome, chama-se alta-finança, a especulação, a sociedade
fraudulenta, o jogo da bolsa, o açambarcamento, a chantagem, o monopólio. O resultado é sempre
o mesmo.
Quando os papas foram compassivos com os judeus, como foi Pio IX, ao livrá-los do
ghetto, eles pagaram com ingratidão. O ghetto acolhia triunfalmente os piemonteses em 1870. Os
judeus entregaram-se a mil excessos contra a Roma católica. Eles hoje são os donos de Roma e da
Itália. Eles detêm toda a imprensa, a banca, e o comércio por grosso.
As leis canónicas eram diques opostos à onda agressiva dos judeus. Os diques tendo sido
rompidos, a cheia sobe e as sociedades cristãs são invadidas e submergidas.

§ 5. – O remédio
206 Os princípios do Direito canónico são perpétuos. A sua aplicação será necessária enquanto
os judeus forem judeus. É preciso voltar ao assunto ao menos quanto ao espírito que os inspirava.
Deve-se cortar com novas leis a enchente que cresce. Os judeus procuram sem cessar o de se
tornarem senhores das mesmas fortalezas para dominarem a sociedade: a banca, o comércio, a
magistratura, o tribunal, a medicina. Eles acrescentaram a tudo isso, uma nova força que é a
imprensa, e também um instrumento complacente, a Franco-maçonaria.
Que novos diques se deve opor à sua invasão? A Rússia limitou os seus estudantes nas
Universidades de Estado. É muito legítimo, porque o seu patriotismo é sempre pelo menos
duvidoso. Portanto é justo que se não lhes abra as portas às funções sociais.

207 A Prússia não os admite no número dos oficiais do exército. Não é uma lei, mas um
costume cem vezes justificado.
Na França, um projeto de lei propõe de não admitir aos cargos públicos os cidadãos que
não seriam naturalizados ao menos desde há três gerações. Isso dificilmente vai passar por causa
da influência dos judeus na Câmara e na imprensa. No entanto, isso teria ao menos a vantagem de
excluir dos empregos públicos os judeus cosmopolitas, que não têm outro objetivo senão fazer
fortuna por todos os meios possíveis, até mesmo pela traição, a chantagem, e a corrupção.
Ter-se-ão de impor outras medidas se não quisermos tornar-nos seus escravos.
Que Deus nos esclareça e nos ajude!

§ 6. – Obras a consultar
208 O padre LEMANN, O ingresso dos judeus na sociedade cristã.
DRUMONT, A França judia. – O Perigo judeu-maçónico. Na livraria antissemita, 14,
Avenida Montmartre, Paris.
VIAL, O Judeu-Rei, Ed. Lethielleux, 10, rua Cassette, Paris.
CAPÍTULO V
OS FALSOS REMÉDIOS : O SOCIALISMO E A ANARQUIA

§ 1. – A história do socialismo
209 As descrições de sociedades ideias, feitas por Platão na sua República, por Thomas More
na sua Utopia, por Campanella na sua Cidade do Sol, e por outros ainda, não foram mais do que
prelúdios da doutrina socialista.
A antiguidade e, mesmo em tempos cristãos, tinha ouvido certas utopias cuja pretensão era
a de eliminar desta terra todos os males e de restaurar nelas a idade de ouro. Tratava-se de
devaneios individuais que não influenciavam a vida dos povos.
O verdadeiro iniciador de todas as doutrinas socialistas, como de todas as doutrinas
revolucionárias, foi Jean-Jacques Rousseau. Os seus escritos estão repletos das duas ideias que
fazem parte de qualquer socialismo: a igualdade radical dos homens e o direito que sempre têm de
fazer voltar as sociedades, afastadas e corrompidas pelas suas instituições, às verdadeiras
condições da natureza humana, a qual não pode deixar de ser essencialmente boa e correta.

210 Mas é apenas no século XIX que os apóstolos do socialismo começaram a seduzir em
massa. Saint-Simon e Fourrier foram os seus primeiros cabecilhas na França, e Robert Owen na
Inglaterra. Os seus primeiros escritos surgiram em 1817, mas as novas ideias não tomaram uma
grande vulgarização senão depois de 1830.
Com diversos cambiantes, todos exigiam a emancipação da razão humana, a supressão dos
dogmas religiosos, a supressão da propriedade privada, a educação igual para todos, a emancipação
da mulher, a organização de oficinas corporativas nas quais os adolescentes entrariam, seguindo
os seus gostos e as suas aptidões.
O jornal O Globo deu a sua publicidade às novas ideias. Michel Chevalier, Binder,
Enfantin, formaram uma primeira coroa de discípulos para estes novos apóstolos. Depois deles
vieram Leroux, Raspail, Pecqueur, Louis Blanc e Comte.
Proudhon merece uma menção à parte. É um discípulo de Hegel. Ele instruiu Blanqui. Ele
é panteísta e frequentemente indefinido como Hegel. Equivale a uma penitência lê-lo. Todavia as
suas deduções são suficientemente claras: para ele a propriedade é o mesmo que rapina; Deus,
equivale ao mal; o poder, é tirania. Esse é o último conceito da doutrina socialista. Proudhon é o
pai dos anarquistas.
211 O período imperial em França não oferecia um terreno favorável ao socialismo. Ele então
estendeu as raízes na Alemanha, na Itália e na Rússia, e nos deu Karl Marx, Lassale, Bakounine e
Mazzini. Este propagou principalmente a revolução política.
Marx deu no seu livro intitulado O Capital uma síntese de todas as revindicações
socialistas. Já não é mais um iluminado, um doutrinário, como Saint-Simon e Fourrier; a sua
doutrina é simples e brutal. Ele aconselha aos proletários: «Vós sois a maioria e por conseguinte a
força. Vós sois os explorados e já não o quereis ser mais, eis o que é de vossa justiça e direito. Ide
pois ao assalto do poder, seja pelo voto, seja pela revolução».
Todas estas diversas escolas continuam a desenvolver-se. Diremos mais à frente a sua
situação atual.

§ 2. – O que não é realmente


212 O socialismo gaba-se ou cai na ilusão. Ele pretende o monopólio da piedade pelos infelizes
e do zelo pelas reformas sociais. Todos os seus livros, programas e discursos começam por isso
mesmo.
Perdão senhores socialistas! Sede mais justos, se faz favor. Sede ao menos mais modestos.
Nós queremos acreditar na vossa boa-fé: tendes piedade dos proletários, os amais, quereis as
reformas sociais que lhes garantam uma parte melhor no banquete da vida. Está muito bem, mas
não podeis pretender ao monopólio destas boas disposições. Elas são uma moeda corrente na
sociedade atual. Quase toda a gente confessa que há alguma coisa para fazer, e todos os partidos
estão à procura dos melhores remédios.
Não pensais igualmente que os cristãos poderiam revindicar, antes de vós, um brevete de
invenção? O evangelho não será ele mesmo, o próprio código da piedade e da emancipação social?
O nosso chefe supremo, Jesus Cristo, formulou antes de vós a sua compaixão pelas multidões:
«Misereor super turbam» [Mc 8,2]. Ele chamou a si todos os deserdados e fez-se o seu protetor.
Ele recomendou-os ao zelo dos seus discípulos.

213 A Igreja católica não esperou por vós para ir em socorro dos proletários. Ela os retirou da
escravatura, da barbárie, da servidão. É um fato histórico. Não é nada na conta? Ela os tinha
cercado de instituições protetoras: corporações, caixas de socorro, de assistência e de seguros de
todos os tipos. Ela os tinha assim conduzido a uma situação de honra, de prosperidade, de vida
livre, esclarecida e artística, que teve o seu apogeu no século XIII, e que vemos diminuir a cada
vitória da ideia pagã na vida social.
Um pouco de lealdade, se faz favor. Tendes piedade dos trabalhadores infelizes? Nós
também. Nós cuidamos deles antes de vós, e o nosso passado mostra que sabemos cuidar deles
eficazmente.
Não digais: o socialismo é a piedade do pobre. Dizei, se quiserdes: o socialismo, também
ele, tem piedade pelo pobre. Fica bem e não iremos contestar a vossa boa-fé.

214 Não digais também: O socialismo, é a reforma social. Alguns dentre vós são muito
sumários e pouco tranquilizadores nos seus projetos de reformas. Eles dizem: Destruamos, antes
do mais, a organização social atual e veremos a seguir. Era o epigrafo de Proudhon: «Destruam et
aedificabo». É a mesma doutrina de Karl Marx.
Outros, os possibilistas sobretudo, têm longos programas onde se encontram boas coisas,
por exemplo: a organização de uma assistência eficaz para os inválidos do trabalho, a
regulamentação do repouso hebdomadário, do trabalho das mulheres e crianças, etc., etc. Mas tudo
isso, não é socialismo. Encontramos o mesmo também nos programas católicos, e as corporações
antigas já o haviam realizado.

§ 3. – O que ele é
215 Ele é uma doutrina filosófica bastante mal definida, tendo por autor alguns iluminados ou
certos revolucionários mais do que pensadores. No fundo trata-se de materialismo prático, tingido
às vezes de panteísmo, como em Proudhon.
Consiste sempre na negação de um Deus pessoal e criador, que é o primeiro princípio da
filosofia moral; a negação da família, que é o primeiro elemento social; a negação da propriedade
que é o primeiro princípio económico; a negação da queda original que é um dos primeiros dados
da vida moral; e mesmo, entre os logicistas da anarquia, a negação da ordem, que é o primeiro
princípio político.
As quatro federações socialistas, reunidas em congresso na Casa do Povo em Paris, em
Novembro último declararam-no. Elas conduzem em conjunto o combate contra as coisas do
passado, isto é, contra a religião, a propriedade e a ordem social. Elas se gloriam dos velhos avós
de Junho de 1848 e de Março de 1871. O seu fim é a substituição da propriedade privada pela
propriedade coletiva. Se elas se contentam por enquanto em pedir a retoma pelo Estado das minas,
dos bancos, dos caminho-de-ferro, etc., são medidas transitórias, de que suportarão à espera por
mais.

216 Quando o socialismo mostra uma pata de veludo, como acontece agora na Alemanha,
desconfiemos das unhas escondidas. Frederico Engels, no seu recente livro sobre a evolução do
socialismo através das utopias até à ciência, mostra-nos um socialismo adoçado, mitigado,
adaptado. Trazem belas palavras para seduzir os simples. Por baixo há caudilhos que escondem o
seu jogo, como também na franco-maçonaria há as lojas onde não faltam os ingénuos e as lojas
dos bastidores que realmente dirigem; como há igualmente na política os oportunistas hipócritas
ou indolentes, e os radicais que não escondem as suas doutrinas.
O socialismo é um sistema de economia social que quer reduzir todos os instrumentos de
trabalho numa propriedade comum e organizar a produção coletiva e a repartição das riquezas
económicas pelo Estado e pela comuna.
Ou ele é isso, ou então não é nada. Se ele não tiver em vista senão algumas reformas
económicas, deixa de ser socialismo.

§ 4. – As suas variedades
217 Elas são numerosas e irão atingir, se Deus lhes der vida, o número das espécies de rosas
nos jardins ou o das seitas do protestantismo.
Conta-se cinco grupos principais:
1º O Partido operário. – Trata-se de socialismo de Estado. Ele tem por evangelistas Guesde
e Marx. Ele enviou ao Parlamento os senhores Lafargue, Thivrier, Ferroul e Jourde. Ele pede o
retorno à nação do solo, dos instrumentos e da matéria do trabalho.
2º Os possibilistas. – O seu evangelista foi Benoît Malon. São os oportunistas do
socialismo. Eles dominavam na Bolsa do trabalho antes que fechasse. Brousse e Joffrin são os seus
apóstolos. Eles enviaram o senhor Lavy á Câmara. Eles têm como órgão, o jornal A Federação.
Mais prudentes que os primeiros, eles querem-nos conduzir docemente ao comunismo. Eles são
políticos e conhecem o provérbio italiano: «Chi va piano, va securo».41

218 3º O Partido socialista revolucionário. – Allemane é o chefe deste grupo, e o senhor


Dumay, o seu deputado. Os outros seriam igualmente revolucionários, se vissem oportunidade de
sucesso, mas eles se contentam de pensá-lo ao passo que estes o dizem com voz alta.
4º Os independentes. – Eles têm por órgão O Povo e por representantes na Câmara os
senhores Basly, Boyer, Couturier, Jaurès, Lachèze, Lamendin e Millerand. Sem doutrinas bem
____________________________________________

[41 Chi va piano, va sano e va lontano – quem vai devagar, vai seguro e vai longe).

definidas, esses tais pensam sobretudo a governar, e julgam que o socialismo é uma etiqueta
vantajosa.
5º Os Clássicos. – Esses estão unidos aos antepassados de Junho de 1848 e de Março de
1871. Eles descendem de Blanqui e da Comuna. Eles tomam a palavra de ordem do Comité
revolucionário central. Eles estão representados pelo senhor Baudin na Câmara, e pelos senhores
Vaillant e Chauvière no Conselho municipal de Paris.

§ 5. – Do socialismo à anarquia
219 A anarquia é um florescimento do socialismo.
A palavra anarquia é devido a Proudhon. Para ele, era um estado social no qual a ordem
resultava das relações económicas livres dos indivíduos sem autoridade política.
Bakounine, «o segundo pai da anarquia», considera a coisa duma maneira mais radical.
Nunca esperando converter o mundo atual segundo o belo sonho de Proudhon, ele declarou que
seria preciso destrui-lo.
Elisée Reclus e Kropotkine foram os seus primeiros adeptos. Foi em Genebra que eles
colocaram as bases da associação oculta que hoje nos estrangula bem mais poderosamente do que
aquilo que podemos pensar.

220 Bakounine deu os princípios da seita no seu Catecismo revolucionário.


«O revolucionário, diz, é um homem devotado. Ele não deve ter nem interesses pessoais,
nem negócios, nem sentimentos, nem propriedade. Ele deve deixar-se absorver por um único
interesse : a Revolução; ele não tem senão uma ciência, e uma finalidade: a destruição. Para tal,
ele estuda a mecânica, a física, a química e por vezes a medicina (sem dúvida sobre o capítulo das
intoxicações…). Ele despreza e odeia a moral atual. Entre ele e a sociedade dá-se uma luta de
morte.
Ele deve viver no seio da sociedade, fingindo ser o que não é. Ele deve penetrar por toda
a parte, na classe elevada como no povo. Ele tem à mão revolucionários do segundo e terceiro
graus, não completamente iniciados, e dos quais deve tirar toda a vantagem possível…»
O primeiro órgão da anarquia foi O Revoltado, dirigido por Elisée Reclus e Bakounine e
redigido por Jean Grave.
221 Mas estamos longe destes começos modestos. Hoje há mais de sessenta jornais anarquistas
em todas as línguas, embora as leis recentes lhes tivessem metido em surdina.
O Pai Peinard atingiu a tiragem de 15.000, dos quais 6.000 em Paris.
Se for forçado, o jornal torna-se secreto, é escrito à mão, e é enviado como carta postal.
A propaganda é incessante e a organização é poderosa. Um conselho supremo de cem
membros dá a impulsão debaixo do nome de Irmãos internacionais. Este comité central tem à sua
cabeça dois cônsules. Até 1876, eram Bakounine e Elisée Reclus. Depois da morte de
Bakounine, são Elisée Reclus e Kropotkine. No segundo grau, há os Irmãos nacionais, que são o
conselho de direção de cada nação. Por debaixo destes, conta-se a inumerável multidão dos
aderentes da aliança democrática.

222 A seita tem a sua biblioteca, as suas revistas. Ela tem o seu canto de guerra, de que se
apresenta aqui uma estrofe:

Guerra ao capital que nos rouba!


Guerra à mina onde espichamos!
Guerra à toga que nos julga!
Guerra à bandeira a quem servimos!
Precisa-se, debaixo dos escombras das ruínas,
Que rebente um dia novo;
Cabe a nós fazer o nivelamento
Com as nossas caixas de sardinha!
Às armas cidadãos! De pé, ó povo andrajoso!
E que a dinamite arme os nossos batalhões!

223 A anarquia domina e inspira o socialismo. Ela pretende servir-se dele como de uma etapa.
O programa dos socialistas foi redigido por Bakounine em pessoa, com o concurso de Karl Marx,
Tolain, Fribourg, Camélinat, Malon, Beslay e Corbon (todos igualmente franco-mações), no
congresso de Berna (1865), de Bruxelas (1868), de Basileia (1869). Este programa compreende a
abolição dos cultos, a abolição da herança e da propriedade privada, a educação comum… Enfim,
estes programas reconhecem «que todos os Estados políticos e autoritários, se reduzem cada vez
mais a simples funções administrativas, devem desaparecer na união universal das associações,
tanto agrícolas que industriais».
É a forma anódina da anarquia.
E o meio prático para os anarquistas, é a Propaganda pelo fato consumado. No entanto há
neste momento uma mudança de tática. Tinha-se esperado que os atentados individuais
aterrorizassem os burgueses e faria com que largassem as rédeas do poder. Reconheceu-se que tal
não levava a nada. Então, regressa-se ao sistema de Blanqui: propagandear por todos os meios as
ideias revolucionárias, para preparar revoluções em massa; agitar sempre e aproveitar todas as
circunstâncias para renovar os belos dias da Comuna.

224 Então, ver-se-ão prodígios. Nós teremos programas de governo como o da comuna de Lião
em 1871, de que vai aqui um sumário:
«Artigo Primeiro – o Estado é abolido e o povo ganha a plenitude dos seus direitos.
Artigo 2 – Os tribunais criminais e civis são substituídos pela justiça do povo.
Artigo 3. – Levantar-se-á um imposto progressivo; os ricaços que abandonaram a cidade
são pressionados a ela regressarem sob pena de morte.
Artigo 4. – Todos os oficiais do exército são destituídos.
Artigo 5. – Publicar-se-á os nomes de todos os funcionários que serviram a reação.
Mataremos tantos quantos se puder».
Enquanto se espera, a arma quotidiana é o jornal, a conferência, a reunião secreta, a ideia,
a sugestão repetidamente indicada.

225 O triunfo está garantido de antemão. Um jornal que não é socialista, O Povo, de Bruxelas,
descreve deste modo o futuro da burguesia:
«Virá um dia que num qualquer museu da história natural, ir-se-á mostrar o último
burguês como hoje se exibe os aztecas. Quando a humanidade chegar a conhecer um pouco de
justiça social, o último dos capitalistas há-de aparecer às gerações futuras como o testemunha de
uma época desaparecida, uma espécie de monstro fenomenal entregue à frenologia e submetido
à auscultação. Perante a jaula onde ele persistirá a cruzar os braços por atavismo, a multidão irá
trocar exclamações estupefactas:
É espantoso, dir-se-ia que são homens como nós! Terá sido possível que animais dessa
categoria tenham vivido durante séculos sem nada fazerem, sem se preocuparem pela sua
dignidade, deixando-se alimentar, vestir, calçar, alojar-se, cobrir a cabeça, desalterar-se por
meio de operários infelizes – seus irmãos por natureza – que frequentemente nem tinham uma
camisa sobre o dorso nem um bocado de pão no ventre… Ui! Que terríveis brutos!...».
Tudo isso é muito sugestivo e nem está mal dito.
Pelo nosso lado, não louvaremos certos burgueses que levam uma vida inútil e egoísta, mas
pensamos que devemos convertê-los pela propaganda das ideias cristãs, de justiça social, de dever
e de solidariedade, antes do que pela dinamite e pelo fuzil.

§ 6. – Refutação racional do socialismo


226 O socialismo vai contra os direitos mais sagrados. Ele destrói a religião, a família, a
propriedade, a liberdade individual.
Que fazeis da religião, ó senhores socialistas?
O homem, tanto como o céu e a terra, as plantas e os animais, foi criado desde o nada por
um Deus pessoal. Deus criou o homem inteligente e livre, para ser conhecido, amado e glorificado
por ele. Ele também o criou para o fazer feliz, e submeteu a matéria para o seu serviço, como
complemento divino, a fim de que lhe fornecesse os meios de existência e de atingir o seu fim.
Sabemos que substituís este primeiro princípio pela teoria da evolução.
Realmente é coisa cómoda demais. Mas, dizei-me, se a matéria se presta assim a todos os
modos de evolução e se acomoda a todas as necessidades, a todas as tendências dos seres vivos,
porque então as nossas casas, as nossas roupas, tudo o que serve ao nosso uso não se produz por
si mesmo? Tal vai vir sem dúvida!
O homem é por sua natureza e pela vontade divina, destinado a viver e trabalhar em
sociedade. Convenhamos. A sociedade, baseada sobre um fundamento moral e religioso, é uma
exigência da lei natural que o cristianismo renovou e santificou.
Mas esta vida social é posterior à vida individual e à vida de família. Ela pode e deve ajudá-
los, protegê-los, mas não poderá destruí-los. As famílias viveram longamente antes dos grupos
nacionais. O homem individual e a família tinham recebido da natureza o direito de viver e de
proteger a sua existência antes que o Estado fosse formado. Eles tinham portanto direitos e deveres
anteriores aos do Estado. O Estado existe para proteger a liberdade individual e a família.

227 E a propriedade privada? Ela também é de direito natural. Faz parte do fim instintivo do
trabalhador o de guardar a posse na sua pessoa, a posse estável e permanente dos frutos do seu
trabalho. Para ter a garantia de conservar as suas poupanças, ele concretiza-as num terreno. Este
objeto concreto não é mais do que o salário transformado, a legítima remuneração do trabalho. O
homem não vive o dia-a-dia, como o animal, mas deseja prover ao seu futuro, e, de algum modo,
se torna providência para si mesmo. Por isso é que a natureza pôs à sua disposição um elemento
estável e permanente que se chama a propriedade.
Objetar-me-eis em vão que Deus deu a terra ao usufruto do género humano por inteiro.
Verdade é que Deus confiou ao solo recursos para a todos nos alimentar. Mas a terra, embora
dividida naturalmente em propriedades privadas, não deixa de servir à utilidade de todos. Todos
se alimentam dos seus frutos, graças às trocas, à remuneração do trabalho, e, se for necessário,
graças à caridade pública e privada.
E a herança? Também ela não é um produto da invenção humana. Ela está na natureza, nos
instintos legítimos do homem. Ela é necessária também para estimular ao trabalho os homens que
desejam sobreviver numa nova geração que irá gozar os frutos dos seus labores.

§7. – Refutação pelo absurdo


228 Não vedes até aonde nos levaria o vosso regime socialista?
Encarregaríeis o Estado de regular a produção e a distribuição das riquezas. Por qual meio,
antes do mais, a sociedade atual seria satisfeita do princípio ao fim?
Faríeis a seguir uma vasta máquina organizada cientificamente para nós. O primeiro efeito
seria o de criar uma aristocracia burocrática, destinada a distribuir os víveres e o trabalho.
Os judeus ficariam á frente, seguramente, e no fim de contas, seria exatamente o
aniquilamento da democracia e da liberdade.
Significa igualmente que toda a gente ficará empregada, ou mais precisamente,
pensionária, prisioneira e forçada, debaixo do cassetete dos comissários do coletivismo: qualquer
coisa parecida à organização do trabalho dos hebreus sob a vergasta dos egípcios.

229 O Estado ensinará ; mas que moral, se faz favor ? A de Epicúrio ou de Diógenes?
O Estado será encarregado exclusivamente da assistência pública. Seria ótimo. Podemos
até fazer uma ideia. Haverá nuvens de agentes e de enfermeiras.
Os recursos destinados aos doentes, aos pobres e aos anciãos serão canalizados pelo serviço
e pela administração.
Perante o perigo, em tempo da cólera, o pessoal positivista recusará o serviço. Procurar-se-
á dedicações religiosas, mas será demasiado tarde: a fonte estará esgotada.
E em que resultará a escolha das vocações e das suas capacidades? Quem distribuirá os
produtos segundo as necessidades e os méritos? E as invejas? E as discórdias? E os ódios que irão
surgir ?
Meu Deus ! Que campos de concentração!
O coletivismo não vê que vai criar uma oligarquia mais opressiva, mais oriental e mais
despótica do que qualquer regime capitalista?
230 Um eminente pensador, que, mais tarde, infelizmente, se desencaminhou, Lamenais, tinha
definido bem, desde o começo do movimento socialista, esta nova doutrina e as suas
consequências.
Dizia ele: «Quereis que vos diga o que penso dos sistemas socialistas que existem no nosso
tempo? Nas doutrinas que se produziram até hoje, não conheço uma só, que mais ou menos
diretamente não chegue a esta conclusão, que a apropriação pessoal é a causa do mal a que se
tenta remediar; que por consequência, a propriedade deve cessar de ser individual, que ela deve
ser concentrada exclusivamente nas mãos do Estado, que, possuidor exclusivo dos instrumentos
do trabalho, irá organizar o mesmo trabalho, atribuindo a cada um a função especial e
rigorosamente obrigatória para ele, para a qual julgará apropriada, e distribuirá, segundo certas
regras, sobre as quais, se diferenciam de alhures, o fruto do labor comum.
Para mim é claro que a realização de um sistema semelhante conduziria os povos a uma
tal servidão que o mundo ainda não viu; reduziria o homem a não ser senão uma máquina, um
puro instrumento; o faria abaixar mais que o negro, de que o cultivador dispõe à sua vontade;
menos que animal. Não creio que ideias mais desastradamente falsas quão extravagantes e as
mais degradantes, tenham entrado no espírito humano, e não merecessem estas qualificações que,
a meus olhos pelo menos, são perfeitamente justas, nem outras poderia haver mais radicalmente
impraticáveis».

§ 8. - Propósitos cínicos
231 O socialismo tem as suas horas de sinceridade. Ele às vezes deixa-nos ver o fim para que
nos leva. Não seria apenas o regime concentracionário. Seria igualmente o reino da união livre,
parecido ao dos quakers, ou melhor, como o dos animais. Seria o regresso às práticas mais bárbaras
do paganismo, como a imolação dos velhos e dos seres fracos e sofredores para os eliminar da
sociedade.
Lede, antes, o senhor Lafargue, no seu livro: O direito à preguiça. Ele se indigna: «Os
índios do Brasil matam os seus doentes e seus velhos. Todos os povos primitivos deram aos seus,
estas provas de afeição. Na Suécia, conservava-se até ainda recentemente malhos que serviam
para livrar os pais das tristezas da velhice. Quão degenerados são os nossos proletários
modernos!».
Dá na mesma, prefiro a doçura e a caridade cristãs, e a esperança do céu depois das misérias
desta vida.

§ 9. – Uma palavra aos moderados


232 Para vós, que não chegueis aos extremos, quereis somente, segundo dizeis, dar novos
recursos às mãos do Estado, transferindo para ele as minas, os bancos, os caminho-de-ferro, para
que ele organize a assistência sob todas as suas formas.
Se não se tratar senão dalguns monopólios a mais, não sois grandes inventores. O Estado
já possui e não poucos: os tabacos, os fósforos, a pólvora, os correios e telecomunicações, etc.
As coisas marcharão melhor? Os fósforos serão melhores? O orçamento será melhor
equilibrado? Passai ao Estado algumas centenas de milhões a mais, e logo irá ele criar novas
sinecuras, escolas sem alunos, e vai reter-vos mais tempo na caserna, eis quanto tereis ganho.
O que se deve fazer é o de não aumentar o orçamento, e dispensar as despesas inúteis.
E para as caixas de socorro e de assistência, as corporações livres são mais seguras que o
Estado, que, num dia de guerra ou de crise social, irá gastar todos os capitais acumulados.

§ 10. – As tentativas
233 Não considereis como um ensaio prático de socialismo o Familistério de Guise. Trata-se
duma sociedade cooperativa de produção e consumo, não é o socialismo comunal, menos ainda o
socialismo de Estado. É uma opção de operários: necessita-se de três anos de estágio e a admissão
por um comité para poder habitar o familistério. Logo, aí se nos depara uma seleção. Como a
indústria ligada à construção civil é próspera, fica-se aí bastante feliz. Seria preciso ver o que
produziria a menor crise industrial. Quanto à moralidade, os fundadores, não deram exemplo a seu
respeito.

234 Não se trata de socialismo as comunidades dos Irmãos Morávios. Visitámos a de Zeist na
Holanda. Refere-se esta a uma pequena república governada por anciãos ou chefes eclesiásticos,
que regulam todos os atos da vida civil. Eles presidem à educação física e moral das crianças.
Infligem penitências, pronunciam a exclusão da comunidade e marcam o lugar de cada um nas
diversas classes que compõem uma cidade. É uma espécie de convento de gente casada dentro do
qual a disciplina mostra-se férrea por causa da tenacidade que certas obstinações heréticas dão
origem. Mas precisa-se de conhecer estas comunidades para que se perceba que não constituem o
ideal para o mundo. Esta gente valente traz no rosto uma tristeza resignada, um ar de puritanos,
que lhes faz meter dó.

235 Mas aqui vai a história de uma tentativa verdadeira.


Victor Considérant, morto em Dezembro de 1893, foi um dos principais adeptos do
Fourierismo. A ideia então era nova e teve sucesso entre os indolentes da época. Os capitais
afluíam para fundar a sociedade ideal que permitiria a idade de oiro.
O novo apóstolo, Victor Considérant, algo comprometido nos motins de 1848, julgou
prudente meter o oceano entre ele e a justiça e de ir tentar os seus ensaios na América. Ele partiu
para o Texas, transportando a caixa e conduzindo uma colónia absolutamente resolvida a tentar
aplicar as melhores teorias coletivistas.
No ultramar, Considérant encontrou o bispo missionário da região, mais rico de dedicação
do que de dinheiro. Levado por um sentimento humanitário, ele expôs ao missionário o seu método
valioso. O bispo escutou-o pacientemente e lhe disse: «Meu amigo, alguns meses mais à frente,
todo o vosso edifício social vai tombar; falta-vos o cimento adequado, a caridade cristã… Quando
os vossos colonos quiserem ferir-vos vinde refugiar-vos na minha casa, eu vos espero».
Considérant ficou estupefacto de semelhante pobreza de espírito.
Alguns dias depois, Considérant, abatido, perseguido, extenuado pelos seus colonos,
encontrava um refúgio em casa do bispo missionário.
Ele regressou à Europa e o resto da colónia viveu miseravelmente e pereceu nas savanas.
Considérant não recomeçou.

§ 11. – Outros exemplos igualmente concludentes


236 Acaba-se de fazer na Inglaterra, em Bradford, uma experiência verdadeiramente curiosa.
Uma associação operária recebeu a oferta de uma manufatura bem aparelhada e de um
crédito de 125.000 francos. A abdicação era consentida por um ano, sem imposto nem contrato. A
única condição pedida pelo doador, o senhor Priestley, era que a empresa fosse levada segundo os
princípios socialistas. Por outro lado, ele se comprometia, no fim de um ano, se a empresa tivesse
êxito e se os operários tivessem ganho mais dinheiro do que ganhavam sob os comandos do patrão,
em abandonar aos membros do sindicato a sua manufatura, a troco de uma modesta renda e a
continuar a lhe abrir um crédito de 125.000 francos junto dos seus banqueiros.
A associação operária a quem esta oferta foi feita refletiu durante quatro meses sobre o
acolhimento que convinha reservá-lo. Depois deste prazo, os socialistas de Yorkshire tiveram de
confessar que se sentiam incapazes de gerir e de explorar a manufatura posta maliciosamente à sua
disposição por um capitalista. Ao se servirem desta expressão os socialistas ingleses quiseram
dizer sem dúvida que se está a agir de um modo pérfido ao pô-los em estado de provação, como
se as suas teorias tivessem algum valor económico.

237 O senhor Thiers na sua obra Sobre a Propriedade, nos relembra uma experiência do
mesmo género, levada mais longe que a de Bradford.
Era em 1848. Um industrial de Paris, cujos operários tinham acolhido com entusiasmo as
doutrinas coletivistas de Louis Blanc, resolveu pôr o seu pessoal em estado de fazer um ensaio
prático do sistema.
Tendo reunido os seus operários, ele propôs ceder-lhes as suas oficinas sem qualquer
indemnização, prometendo além disso de comprar os seus produtos ao preço corrente.
Os operários aceitaram. Eles puseram á cabeça de cada oficina um presidente eleito e à cabeça das
oficinas reunidos um presidente geral.
A classificação dos salários foi mantida; somente levou-se de 2 francos e 50 para 3 francos
o salário dos mais deserdados, os homens mais mortificados, e suprimiu-se o trabalho por medida
de que alguns bons operários aproveitavam.
Eis como o senhor Thiers descreve os resultados da experiência depois de uma experiência
de três meses: «O tumulto era quotidiano nas oficinas. Permitiam-se ausências, quando convinha
tomar parte em tal ou tal manifestação de rua. Trabalhava-se pouco, mesmo quando presentes;
os inspetores das oficinas, encarregados de manter a ordem e de velar pelo trabalho, tinham sido
substituídos até mesmo duas ou três vezes numa quinzena.
Se se tivesse trabalhado como antes, durante os três meses que perdurou este regime,
dever-se-ia obter 367.000 francos de mão-de-obra. Todavia não se ganhou senão 197.000,
embora os preços da execução tivessem sido elevados de 1%».

238 É que o trabalho foi menos ativo e as horas de presença menos numerosas. Deste modo os
bons trabalhadores estavam resolvidos a deixarem o estabelecimento, se não se pusesse um termo
a este ensaio depois de três meses.
Eis o que o coletivismo produziu numa fábrica colocada em condições inesperadas de uma
fácil e frutuosa exploração: sem capital de investimento básico, escoamento seguro para toda a
produção.
Estes dois exemplos, verdade se diga, não se referem ao socialismo puro, mas apenas a
experiências de cooperação com organização socialista.
Só o segundo ensaio é que foi tentado, mas logo se viu qual o seu fim.
Não é que lamentemos as associações cooperativas de produção. Pessoas conceituadas
veem nisso o remédio ou um dos remédios para a nossa situação social.
239 Mas o exemplo citado prova claramente que se estas associações se organizarem no
espírito do socialismo, com eleições repetidas, na independência dos trabalhadores, e com a
ausência de respeito e de autoridade, elas acabarão, finalmente, por chegar à ruína e à dissolução.
A associação de produção exige homens virtuosos, como condição de prosperidade.
Precisa-se nela de certos princípios de justiça e caridade, de moderação do espírito e de hábitos de
respeito que não se podem encontrar senão na vida cristã.
Com efeito, se algumas sociedades cooperativas de produção conseguiram sucesso, é

porque na realidade uma autoridade patronal tinha sido nela instituída pelos associados.42

§ 12. – Conclusão: por quê não posso ser socialista


240 Esta página é retirada em parte da profissão de fé de um candidato às últimas eleições
legislativas.
O socialista quer-me alojar numa casa construída com os frutos do meu trabalho, casa a
que ele vai administrar e… da qual ele vai expulsar-me quando lhe apetecer.
Quanto a mim, quero habitar numa moradia donde ninguém me possa expulsar.
O socialista quer obrigar-me a participar da repartição de beneficência universal,
alimentada com o meu trabalho, repartição que ele vai administrar e à qual ele vai admitir-me…
se for da sua vontade.
Quanto a mim, não quero ser reduzido a estender a mão à repartição da beneficência.

241 O socialista quer obrigar-me a meter os meus filhos em escolas pagas com o meu dinheiro
e o meu trabalho, e onde irá instruir e educar os meus filhos… à sua imagem.
Quanto a mim, quero escolher a escola dos meus filhos como me agrada, embora deva
pagá-la.
O socialista quer obrigar-me a passar a velhice e a morrer num hospício construído e
entretido com o meu dinheiro, onde os seus amigos se aproveitarão às minhas custas, e onde me
admitirão… se eu com os meus filhos votarem por ele.
Quanto a mim, quero passar a minha velhice na minha família e morrer em paz em minha
casa…
E aí estão apenas as pretensões do socialismo moderado!
O verdadeiro socialista quer dar-me a vocação e a carreira que lhe agradar.
Ele quer fazer-me trabalhar e medir a quantia do meu pão.
Ele quer retirar de mim o meu Deus, a minha família e a minha liberdade.
Ele quer jogar-me à água e ao forno crematório para desembaraçar a sociedade quando
ficar velho e não serei mais apto a trabalhar.
Obrigado. Prefiro a minha liberdade, a minha casa, a minha família, a minha fé e as minhas
experiências.
Eis porque não posso e não quero ser socialista.
__________________________________________
42
STANLEY JEVONS, Economia política, capítulo IX. – LÉON FAUCHER, Estudos sobre a
Inglaterra, tomo II, página 449.

§ 13. – Bibliografia
242 Cônego WINTERER, O perigo social, 1880. – Três anos da história do socialismo. – O
socialismo internacional de 1885 a 1890, Lecoffre. – O socialismo contemporâneo, Palmé.
Rev Padre FELIX, O socialismo diante da sociedade 1878. – Socialismo e cristianismo. – O
charlatanismo social, Roger e Chernoviz.
Rev Padre DE PASCAL, O movimento social. – O coletivismo e seus doutores. – O poder social
e a ordem económica, Vic e Amat.
Rev Padre DE BOYLÈVE, A questão operária. – Problemas religiosos e sociais, Haton, Palmé.
Padre MERIC, Os erros sociais do tempo presente.
Padre BLANC, A questão social: princípios necessários e reformas urgentes.
Padre MARTINET, A questão social, a respeito dos fatos reais, 1851.
BENOÎT MALON, (autor socialista), História do socialismo, 1883.
BENOÎT MALON, O socialismo integral, 1890.
CAPÍTULO VI
OS VERDADEIROS REMÉDIOS: A AÇÃO DA IGREJA
243 Nós resumimos em quatro fontes os remédios que devem restabelecer a paz social e
promover a condição dos operários.
Cremos ser exatos e completos.
Os estudos sociais multiplicam-se. São propostas panaceias ao infinito, mas todas se
referem à ação da Igreja, à do Estado, à dos patrões e à das corporações.
Apoiamo-nos aliás sobre as melhores sumidades. Leão XIII, na sua encíclica, indica como
remédios ao mal social: o ensino e a ação da Igreja, a parte do Estado, os deveres dos patrões, o
papel das associações.
O cardeal Manning indicava os mesmos princípios de salvação nacional: a união da Igreja
e do povo, a intervenção dos poderes públicos, a concórdia entre o capital e o trabalho, a
necessidade absoluta de associações privadas.
São princípios que iremos expor.

§ 1. – O princípio geral
244 A Igreja católica, ela só, pode dar o remédio à sociedade atual. Apenas ela pode reconciliar
o rico e o pobre, porque só ela possui plenamente os princípios de justiça e caridade que a filosofia
humana não fez senão sobrevoar com muita obscuridade e divergência de vistas.
Ora a ação da Igreja, identifica-se com a ação do sacerdote, seu representante autorizado,
seu porta-voz, seu braço e seu coração, e ministro dos sacramentos que conferem a graça divina.
O padre, em nome da Igreja, diz ao operário: «Cumpri o vosso trabalho de modo fiel,
respeitai toda a autoridade, evitai toda a violência nas vossas revindicações».
Ele também diz aos que empregam os trabalhadores: «Respeitai neles a sua dignidade de
homens e de cristãos. Tende como uma vergonha e uma barbárie o abusar dos operários como se
fossem máquinas para enriquecer. Levai em conta as suas necessidades religiosas e espirituais,
dai-lhe o tempo conveniente para isso. Afastai deles as causas de corrupção e de pecado. Não lhe
imporeis um trabalho acima das suas forças, nem contrariamente às exigências da idade e do sexo.
Dai-lhes um justo salário, a fim de que possam governar-se. Não especuleis sobre a sua pobreza».

245 O padre diz aos ricos: «Só Deus tem o direito da propriedade absoluta. Sois
administradores. Depois de terdes tomado sobre os vossos rendimentos o de que viver como
convém, deveis dar esmola generosa. É preciso que todos os homens vivam dos produtos da
terra».43
Ele diz aos pobres: «A vossa situação foi honrada pelo Filho de Deus. Sede doces e
pacientes, santificai as vossas provações. No céu, sereis recompensados».
Ele diz a uns e outros: «Permanecei unidos na caridade. Sois todos irmãos. Tendes o mesmo
Deus criador, o mesmo Redentor, a mesma natureza, a mesma graça, a mesma herança
_____________________________________________
43
Ver Monsenhor KETTELER comentando São Tomás, no seu sermão sobre a Teoria católica do direito
de propriedade.

celeste. Que grandes estas razões para que vivais de forma pacífica e fraterna!».

§ 2. – O fato histórico
246 Terá a Igreja os meios práticos, eficazes, de realizar um tal ideal?
Sim, ela esclarece as inteligências ao mostrar-lhes onde está o dever. Ela age sobre os
corações pelos seus conselhos e a sua influência sobrenatural.
A história está aí a provar. A sociedade humana foi renovada completamente pelas
instituições cristãs. O progresso mais extraordinário substituiu o mais vergonhoso declínio. A ação
do padre provocou a civilização cristã, com a sua prosperidade, o seu brilho, as suas obras,
particularmente nos séculos XII e XIII e até mesmo no século XVII.
Os mesmos princípios produzirão os mesmos efeitos. A Igreja ama o operário, a criança, o
velho. Ela vai ao socorro de todos os infortúnios e todos os sofrimentos. A história da caridade, é
a história da Igreja.
A beneficência administrativa não pode substituir a caridade cristã, ensinada e
propagandeada pelo padre, porque a caridade cristã dá tudo e se dá a si mesma com inteira
gratuidade. Ora, um tal sentimento não pode vir senão do Coração de Jesus Cristo; e afastar-se do
sacerdote e da Igreja não é logicamente aproximar-se deste Divino Coração. (Leão XIII, na
encíclica sobre a condição dos operários).

§ 3. – O ensino e a ação da Igreja é a salvação


247 A sociedade sofre porque ela se afastou da religião e por conseguinte do padre.
O galicanismo de Filipe o Belo e o cesarismo dos legistas vieram entravar a ação sacerdotal,
e a sociedade francesa passou pelas crises dolorosas dos séculos XIV e XV.
O galicanismo de Luís XIV restringia a ação política e social do padre. O liberalismo,
resultado do galicanismo, fez afastar cada vez mais o padre da vida civil, e a sociedade, sem
bússola, afundou-se no final do século XVIII. É preciso que o padre reentre na vida social para a
cristianizar de novo e lhe infundir a justiça e a caridade. É a salvação.

248 «Que os ministros sagrados, diz Leão XIII na encíclica, desenvolvam todas as forças da
sua alma e todas as indústrias do seu zelo, e que, sob a autoridade dos seus bispos, não cessem
de inculcar aos homens de todas as classes as regras evangélicas da vida cristã; que trabalhem
com todo o seu poder para a salvação dos povos».
«São aos vossos padres, dizia ainda Leão XIII numa audiência a Monsenhor o bispo de
Liège, a quem deveis exortar a irem ao povo. Eles não devem ficar encerrados nas suas igrejas e
nos seus presbitérios. Deve-se animá-los com o espírito apostólico, com o espírito que animava
São Francisco Xavier, que ia por todo o lado para a todos pregar a doutrina cristã».

249 «O padre, diz o bispo de Liège, a seguir a Leão XIII, deve ter o seu lugar nas associações
profissionais. Ele deve arrojar-se a ser o iniciador, o diretor, o divulgador. Ele deve até contribuir
com o concurso dos seus conhecimentos, do seu coração, da sua dedicação, da sua influência e
da sua ação para o prosseguimento do bem temporal destas sociedades. As obras antigas já não
bastam. Elas não atingem os operários das cidades e das fábricas. È ocupando-se dos seus
interesses pelas corporações, que o padre terá acesso junto deles.
Vamos, não nos deixemos parar por uma falsa prudência ou uma timidez desastrosa. Se
um padre vê suas ovelhas a se perder ou expostas a se perder no socialismo, não deve tranquilizar
facilmente a sua consciência e ficar inativo. O bom pastor não se esconde quando vem o lobo.
Que meta mãos à obra, Deus há-de abençoá-lo e lhe dará frequentemente um sucesso
inesperado».
A ação do padre é a salvação, e a condição da paz social e da civilização cristã.

§ 4. – Um chamamento supremo
250 O perigo social é imenso, toda a gente o reconhece. E todos os que levam a sério a salvação
das nações fazem apelo ao padre para rogar-lhe de tomar em mãos o leme e de os guiar nas
manobras que devem conduzir o navio social, batido pela tempestade, a bom porto.
É o papa, são os bispos, são os moralistas, são os homens de obras sociais que dizem ao
padre: lançai-vos na ação debaixo da conduta dos pontífices.
«Que cada um, diz Leão XIII, se lance na tarefa que lhe incumbe, e tal sem esperas, com
receio de que diferindo o remédio, se torne incurável um mal já de si tão grave… Que os ministros
sagrados desenvolvam todas as forças da sua alma e todas as indústrias do seu zelo; e que, sob a
autoridade dos bispos, trabalhem com todo o seu poder para a salvação dos povos» (Encíclica
sobre a condição dos operários).

251 O episcopado é unânime. Os concílios provinciais acentuam cada vez mais as suas
prescrições. Eles satisfazem-se primeiramente de aconselhar as obras operárias. O concílio
plenário de Baltimore, como conclusão final, ordena que por toda a parte os párocos fundem
associações operárias.
Desde a encíclica de 1891, todos os bispos falaram. Todos recomendam ao seu clero a
aplicação da encíclica como um meio supremo de salvação. Vários instituíram nos seus seminários
cursos e conferências de estudos sociais. Alguns indicam aos seus padres as fontes que devem
consultar para se iniciarem a estas obras de salvação.

252 Nestes últimos dias, o bispo de Liège endereçava ao seu clero a sua magnífica carta, que
é um tratado completo sobre esta matéria. Ele exorta, pressiona, sacode os mornos, dirige os
homens de boa vontade. Não quer que a encíclica se torne letra morta. Ele mostra a magnitude do
perigo, a insuficiência das obras antigas, a necessidade das associações profissionais nas quais o
padre deve ter uma parte ativa. Para dar armas completas aos seus padres, ele acrescenta à sua
carta vários documentos que completam a encíclica: as cartas de Leão XIII ao senhor de Mun, ao
senhor Decurtins, aos bispos alemães, e os seus discursos aos operários franceses peregrinos.
Os moralistas dão eco ao ensino do Papa e dos bispos. «As novas condições da sociedade,
diz o teólogo Lehmkuhl, impõem deveres novos aos pastores das almas. Estes faltam aos seus
deveres, nos dias de hoje, se não fundarem associações e especialmente associações de operários,
nas quais o bem espiritual se une à prossecução de um bem temporal».

§ 5. – As Fontes
253 Mas, dir-nos-ão os homens de boa vontade, que devemos fazer? Como poderemos tomar
parte nisso?
Deixamos aos mestres o cuidado de o dizer. Indiquemos somente uma pequena biblioteca,
cuja despesa total não ultrapassará 5 francos.
1 A encíclica Sobre a condição dos operários, 5, rua Bayard, Paris.
2 A Carta Pastoral, de Monsenhor DOUTRELOUX com os seus documentos anexos,
editorial Dessain, em Malines.
3 O Clero e o Povo católico por LEHMKHUL, editorial Lethielleux, rua Cassette.
4 Motu próprio de PIO X sobre a democracia cristã.
5 O padre e a situação atual da Igreja, editorial de São Paulo, rua Cassette.
6 O renovamento da paróquia, ibidem.
7 Três dias de estudos sacerdotais sobre as questões operárias e sociais, sob a presidência
do senhor cónego DIDIOT, em Limé (Aisne), Imprensa de “la Croix”.
8 O Pároco do campo por um homem de obras, 5, rua Bayard, Paris.
9 O Pastor segundo o Coração de Jesus no tempo presente, obra de São Paulo. Este
opúsculo que surgiu primeiramente na revista “O Reino do Coração de Jesus”, publicado em Saint-
Quentin, pareceu ao bispo de Liège apropriado a esclarecer o clero sobre as condições do
apostolado no tempo presente que distribuiu a todo o seu clero com a sua carta pastoral e os
documentos pontificais.
10 As reflexões do bispo de Montpellier ao seu clero e um discurso de Monsenhor Ireland,
editorial São Paulo.
11 O Padre, por um pároco de Lião, 5, rua Bayard, Paris.

§ 6. – As obras – sua necessidade


254 As obras a serem empreendidas, serão indicadas pelos documentos.
Porém nunca deixaríamos de repetir que as obras antigas já não bastam. Tal salta aos olhos.
Elas deixam-nos ir à deriva e estamos à beira do abismo.
Contudo não deveríamos omiti-las. O ministério sacerdotal ordinário: pregação, catecismo,
administração dos sacramentos, é sempre a base fundamental do apostolado. Deve-se acrescentar
a isso as missões, o apostolado ao domicílio, as pias associações, e tal ainda não basta. Deve-se
acrescentar ainda as obras do ensino: escolas, bibliotecas, jornais, círculos e padroados, e mesmo
assim é insuficiente. Deve-se adicionar também as obras de caridade: conferências de São Vicente
de Paulo, dom paroquial de roupas, Obra de São Regis, etc.
Todas estas obras são admiráveis e necessárias, mas elas não podem esconjurar o perigo
social.
255 Certo é, segundo Leão XIII, e toda a gente concorda nisso, que os operários, como
resultado duma pseudorreforma do século XVIII, estão em condições de sofrimento imerecido.
Eles sentem a necessidade de se unirem em associações profissionais que os protegem. Se não nos
apressarmos em ir ter com eles pelas associações católicas, eles deixar-se-ão seduzir pelas ilusões
socialistas, e as nações cristãs vão correr para cataclismos espantosos.

§ 7. – Conclusão – O que o padre deve ser


256 Vós sois o sal da terra.
Vós sois a luz do mundo.
Vós sois os incendiários do fogo sagrado. Este século tem suas grandezas; ele pode gloriar-
se dos seus progressos industriais e científicos.
No entanto ele acaba, de acordo geral, na apatia dos costumes e dos caracteres, no
obscurecimento da verdade e das doutrinas e no arrefecimento da caridade.
Os seus costumes são influenciados pelo teatro, pela evasão, pelo romance e todas as
manifestações da vaidade e da sensualidade.
A verdade? Quem ainda a conhece? Este fim de século diria o mesmo que Pilatos : «Que é
a verdade?» [Jn 18,38]. Nunca houve tamanha confusão de doutrinas na ordem social, na ordem
política, na ordem moral, na ordem religiosa.
E a caridade esfriou-se de tal modo que as diversas classes sociais se desprezam e se odeiam
e que a guerra social está às nossas portas.

257 Oh, como temos necessidade do padre, do autêntico padre santo, para que seja o sal desta
terra sensaborona, a luz deste mundo entenebrado, e o lar que irá reaquecer os corações
enregelados!
O padre é o sal da terra pela sua vida de oração e de sacrifício. Ele entende que se deve
dedicar à oração e à reparação com tanta maior instância quanto piores são os tempos, mais
numerosos os pecados do povo e mais difíceis de vencer os obstáculos ao bem. É sobretudo aos
padres a quem Deus dá esta missão.
Os ditos pensamentos são desenvolvidos de modo admirável no opúsculo: O padre e a
situação atual da Igreja.
Se o padre é a luz que espalha sobre o mundo o esplendor da doutrina revelada, ele deve
ser, em particular, no fim deste século, o arauto da doutrina social. Apenas a Igreja como já
mostramos, possui os elementos de solução sobre a questão social pelos seus ensinamentos
precisos sobre a justiça e pelas lições e os exemplos da sua caridade. É necessário que o padre se
apresse a espalhar esta luz.
A sociedade caminha para a sua ruína por tê-lo posto, ao padre, debaixo do alqueire.
Enfim, só a Igreja pode apaziguar os ódios sociais e reconciliar todas as classes. Só ela
possui a fonte da caridade cristã que não se pode adquirir a não ser no Sagrado Coração de Jesus
Cristo.

258 O padre portanto deve ser primeiramente o homem da oração e do sacrifício, para
apaziguar a justiça divina irritada pelo declínio da moral.
Ele deve ser o homem dos estudos e das obras sociais, para levar a luz ao meio destas
trevas, onde se confrontam, quer os homens de boa vontade, quer os criminosos que desejam pescar
em águas turvas.
Enfim, ele deve ser o discípulo e o apóstolo do Coração de Jesus. Faz falta a estes tempos
de divisão e de ódio, um novo remédio. Nosso Senhor, foi Ele mesmo que no-lo disse. Estas almas
frias têm necessidade de serem reaquecidas por um fogo ardente.

259 O Coração de Jesus, manifestado pelas suas palavras, pela sua vida, pelos seus benefícios,
é um tema infinito de meditações ardentes e de pregações entusiasmantes.
Ah! Se o povo, desmistificado, soubesse o que deve a Jesus Cristo e o que Jesus Cristo
quereria lhe propor, através do reino do seu Evangelho, de autêntica liberdade, de dignidade, de
respeito, de abundância e de alegria pura! O povo no fundo é bom, mas é enganado. Cabe ao padre,
ao apóstolo imbuído da caridade de Cristo, de fazer passar as suas férvidas convicções ao coração
do operário, para que as massas venham a seguir o Salvador.
CAPÍTULO VII
OS VERDADEIROS REMÉDIOS – A ACÇÃO DO ESTADO

260 Nem a dedicação da Igreja nem a boa vontade dos particulares serão suficientes a prover
a felicidade das classes deserdadas.
Como o nota Jules Simon, «pertence à caridade o socorrer a miséria, mas pertence a uma
boa organização social o prevê-la».
A justiça é a base das relações sociais, e o seu objeto é o direito próprio de cada um. Estes
direitos, que se não podem violar sem crime de lesa humanidade, quem os protegerá senão a lei?
Direito à existência; direito a uma justa remuneração do trabalho; direito a não ser
esmagado por um trabalho excessivo; direito às alegrias de um casal; direito a que a criança e a
mulher não sejam devoradas por um labor homicida; direito enfim à liberdade do dever e da
consciência: aí estão vários direitos que não se podem substituir por uma qualquer caridade, mas
aos quais se reclama imperiosamente respeito e garantia.
Estes justos direitos dos trabalhadores, já os ouvimos a serem reivindicados pelos mestres
da ciência social cristã, pelos Ketteler, os Manning, os Gibbons, os Decurtins, os de Mun e, por
cima de todos, por Leão XIII.

261 Ora o Estado, como observa o Reverendo Padre De Pascal, é, por vocação essencial, quem
mantém o direito e o guarda da justiça. Os seus deveres abraçam o respeito da religião, a proteção
da família, a proteção dos fracos. Ele deve tender, segundo os termos da encíclica, a «uma
organização social da que derive, espontaneamente e sem esforço, a prosperidade tanto pública
como privada». É preciso que uma legislação do trabalho, referindo-se em especial sobre os pontos
de que estivemos a tratar, e que também são apontados pela encíclica, venha a garantir tanto os
direitos do trabalho, tanto os da propriedade.

§ 1. – O Repouso do Domingo
262 A impiedade pública é o maior de todos os males e a fonte de todos os outros. O Estado
deve recordar-se, antes do mais, que os operários têm uma alma. Ele deve proteger a sua vida
moral e religiosa. Deve assegurar-lhe a liberdade do Domingo para que possam cumprir os seus
deveres para com Deus.
A história, como a razão, proclama que a religião é a fonte da civilização e que, sem ela,
todos os povos acabam na decadência material e moral.
A conferência internacional de Berlim reconheceu a necessidade do repouso
hebdomadário. A nossa lei de 2 de Novembro de 1892 sobre o trabalho nas fábricas não ousou
fixar o repouso do Domingo. O livre-pensamento francês é fanático, ou antes, os judeus nos
governam de um modo oculto.
A América da liberdade no entanto observa o Domingo, e os judeus americanos
transferiram de bom grado o Sabat para o dia seguinte. Nós chegaremos a isso. Sem o recurso da
lei, o operário não será suficientemente forte para salvaguardar o Domingo, e estará, tal como o
escravo, continuamente curvado sobre o trabalho, igual a um animal sem razão.

§ 2. – Liberdade do ensino
263 Trata-se da verdadeira liberdade o que aqui falamos, e não de uma liberdade fictícia como
a das leis atuais.
Os cristãos têm direito de serem cristãos, e este direito é lesado se a fé for combatida no
nome do Estado por homens encarregados de distribuir a ciência por conta do orçamento.
Há opressão das consciências, se existir um ensino oficial materialista e positivista. O
direito de professar a religião comporta o de ter professores cristãos tão favorecidos quais os do
Estado, quaisquer que sejam.

264 A educação é dever e direito da família. É às famílias de um município o direito de


determinarem qual escola querem ter.
A repartição dos subsídios na proporção dos alunos é apenas conforme à justiça
distributiva. É assim que se entende na Inglaterra.
Na França, o operário cristão paga duas escolas em vez de uma: a escola oficial pelo
imposto e a escola livre pela sua quotização. É absurdo, e iníquo, e contudo isso dura neste país,
que se diz e se crê livre.
O ensino deve ser livre em todos os degraus. Deve ser livre nos seus programas e na
camaradagem dos graus.
A liberdade do ensino comporta a personalidade civil das corporações dos professores e o
respeito das fundações em favor de todo o ensino respeitável.

§ 3. – A diminuição dos encargos militares


265 Esta diminuição aliviaria muito o jugo que pesa sobre o operário ao permitir ao Estado
ajudar e encorajar as instituições em seu favor.
Por que razão reter durante três anos sob as bandeiras homens que se poderia formar num
ofício por dois ou três anos? Os nossos vizinhos têm o voluntariado e o serviço de dois anos e não
se encontram pior por isso.
Por que motivo reter no exército durante um ano, homens que não terão, em tempo de
guerra, senão serviços especiais, como os estudantes de teologia e medicina?
«É preciso, dizia com razão Monsenhor d’Hulst nas suas conferências quaresmais, que os
encargos de uma paz armada não forcem um imposto demasiado pesado sobre a riqueza geral…,
que o princípio da arbitragem se substitua cada vez mais à razão do mais forte, e faça devolver
às pacíficas conquistas da civilização os recursos que hoje absorve por toda a parte a preparação
contínua para a guerra».
§ 4. – O respeito das imunidades eclesiásticas
266 A liberdade da Igreja é a primeira condição da prosperidade social do povo cristão. Onde
a Igreja é oprimida, o povo que trabalha é o primeiro a sofrer material e moralmente com isso.
A liberdade de culto, da palavra, das associações, a liberdade de possuir, consistem em
direitos sagrados de que a Igreja deve fazer uso para o maior bem dos operários.
As pretensas conquistas da sociedade laica são outras tantas usurpações sobre a liberdade
de consciência, sobre a influência legítima e a ação necessária da Igreja.
Se a Igreja não for mais escutada, quem há de ensinar aos ricos a justiça e a caridade?
Quem pregará aos pobres o respeito e a sabedoria?
O principal remédio às misérias contemporâneas é a restauração dos costumes cristãos. Aí
está o objetivo da Igreja, mas é preciso que ela possa trabalhar nisso de modo livre e, por
consequência, é preciso que seja garantida a sua liberdade, e esta protegida pela lei.

267 A questão operária é, antes de tudo, uma questão de justiça. Só a Igreja tem autoridade
requerida para pregar esta justiça aos governantes, às classes responsáveis, aos patrões, aos
capitalistas. O Evangelho apenas suprimiu a escravatura.
Prejudicar o recrutamento e a formação do clero, enviando o clero para as casernas, é o
mesmo que ferir o operário nos seus protetores naturais.
Nas associações religiosas o operário também recruta os seus melhores amigos. Têm da
sua parte, aliás, o direito natural, uma vez que são essencialmente associações honestas e legítimas.
O Estado não tem qualquer direito contra elas. O seu dever é de as proteger.

§ 5. – A reforma do imposto
268 A França tem o triste privilégio de ser a nação mais pesadamente atingida pelos impostos.
O conjunto dos impostos equivale, na Bélgica a 6% do balanço nacional. Em Inglaterra
eleva-se a 8%. Na França, em média é de 13 a 14%. E para a classe operária levanta-se a 20%.44
Temos um orçamento de três milhares e meio de milhões. O de Inglaterra não é senão de
dois mil milhões e meio; o da Prússia de dois mil milhões, inclusive a sua parte nas despesas
federais; o da Áustria também é de dois mil milhões; o da Itália de mil e 600 milhões. Portanto
somos o povo mais carregado de impostos.

269 Também somos o povo mais endividado. A nossa dívida pública eleva-se a 38 mil milhões.
A de Inglaterra é apenas de 20 mil milhões. A Áustria e a Itália devem cada uma 12 mil milhões.
A Prússia não deve senão 9 mil milhões.
A França assinalou-se, sobretudo após 1876 pela sua imprevidência, seus desperdícios e
suas loucuras. Ela ainda tinha uma boa situação financeira em 1876: orçamentos equilibrados que
não ultrapassavam dois mil milhões, uma amortização anual da dívida, e a esperança de conversões
vantajosas das nossas dívidas para as aligeirarem. Mas desde então!!!
A dívida pública francesa, em 1872 não ultrapassava os 23 mil milhões. Hoje,
aproximamo-nos dos 40 mil milhões, quantitativo semelhante ao que produziu a bancarrota de
1793. Verdade é que o dinheiro hoje, é mais comum, e poderemos ir até um pouco mais além.

270 Graças às rendas concedidas às vítimas do 2 de Dezembro e a outros eleitores não menos
interessantes, nós pagamos, para as pensões, 102 milhões a mais por ano do que em 1874.
De 1876 a 1885, as verbas com os funcionários aumentaram de 122 milhões, e tal continua
sem parar. Graças também à guerra feita aos religiosos e religiosas, a instrução pública custa-nos
igualmente 100 milhões a mais por ano do que em 1877. Será de admirar que, depois
___________________________________________
44
Estes números são do senhor Cavaignac e do senhor Leroy-Beaulieu.

de tanto desperdício e um tão grande aumento dos encargos, as nossas populações sintam um tão
grande mal-estar, que não terão dentro em pouco mais nada a invejar à pobre Itália?
A primeira reforma a operar, em matéria de finanças, seria portanto de pôr um termo a
todos os desperdícios e de reagir contra eles. Para o que se refere à reforma especial sobre os
impostos, ela deve visar sobretudo o imposto cadastral, os direitos de mutação, e os impostos sobre
o consumo.

271 O imposto sobre os imóveis. – O nosso imposto cadastral está mal repartido. Ele varia
segundo os departamentos, na proporção de 1 a 5. A revisão cadastral deveria cumprir-se em cada
dez anos. Ele também é muito pesado. A terra é sacrificada. Com os cêntimos adicionais, o imposto
cadastral sobe a 365 milhões de francos. Ora, o orçamento não exige, pelas patentes na indústria e
no comércio senão 159 milhões por ano, para um capital e receitas mais consideráveis que as da
terra.
As terras pagam um imposto que ultrapassa frequentemente o quarto do rendimento
cadastral. Ora, o rendimento cadastral é hoje, em certas regiões, duplo ou triplo do rendimento
real. Segue-se que o imposto, em vez de ser o quarto do rendimento do solo, atinge, em certas
regiões, a metade ou os três quartos. Caminhamos a grandes passos para a prosperidade italiana
ou para a do felá do Egipto que paga aos ingleses 80% do seu rendimento.

272 Os direitos de mutação. – O imposto sobre as mutações das propriedades é exagerado. O


orçamento pede-lhe 700 milhões. A Inglaterra não lhe exige senão 300 milhões.
Os direitos de selo e de registo custam por cabeça:

Na Alemanha 1 franco e 50
Na Áustria 3 francos e 50
Na Inglaterra 8 francos e 20
Na França 17 francos e 50

Os direitos de mutação, com os honorários dos oficiais ministeriais, sobem entre nós a 10
ou 12%. É uma verdadeira confiscação. Assim, a terra fica quase imobilizada. Ninguém pode
comprar propriedades para as melhorar e tornar a vendê-las como na América, elas ficam entre as
mãos dos incapazes. Seria preciso que este direito não ultrapassasse 1%. Acontece ser apenas de
0,50% na Inglaterra. Ao reduzir muito este direito, ter-se-ia vendas frequentes e o fisco recuperaria
com isso.
Várias mutações sucessivas arruínam as famílias melhor estabelecidas. Trata-se de uma
destruição constante da pequena propriedade e um obstáculo imoral à aquisição da propriedade
pelo trabalhador.
273 As vendas judiciais originam uma verdadeira extorsão fiscal. É o imposto progressivo ao
inverso. As despesas de liquidação e de venda de uma herança pequena de 300 francos custam até
112% do capital.
Deste modo, se comprais, em venda judiciária, uma casinha de 300 francos, tereis além
disso ainda 340 francos de imposto. Para cima de 1.000 francos, as despesas não ultrapassam 12%.
Não será isto uma monstruosidade?
Os direitos de hipoteca também são um mau imposto, que é deitado sobre o pobre no exato
momento em que se endivida.

274 Os impostos indiretos ou de consumo. – Estes impostos têm isto de particularmente odioso:
o de pesarem sobre o operário, sobre os pobres, sobre as famílias numerosas, tanto e mais que
sobre o rico.
O senhor Leroy-Beaulieu, que não é suspeito de parcialidade para o povo, procurou saber
o que pagava de impostos uma família de operários parisienses composta de três pessoas. Ele
chegou a reconhecer que uma família operária, nestas condições, paga à volta de 370 francos de
impostos. O rendimento desta família pode ser estimado em 1.800 francos. Portanto trata-se de
uma proporção de 20% de impostos. Fazendo o mesmo cálculo para uma família de operários
rurais, encontra-se resultados análogos. Uma família vivendo sobre o salário médio dos nossos
campos, que é de 800 francos mais ou menos, paga 160 francos de impostos. É a mesma proporção.
A carga dos impostos é bem menos pesada para os cidadãos remediados, que têm
rendimentos bem mais consideráveis e que não pagam ao Estado senão 14% destes rendimentos.

275 O orçamento é, com efeito, de três mil milhões e meio, e o conjunto dos rendimentos da
França é de cerca de 25 mil milhões. A proporção é de 14%.
Estes números foram dados à Câmara pelo senhor Cavaignac e não foram contestados por
ninguém. Os operários portanto estão sobrecarregados dum modo iníquo pelo nosso sistema de
impostos.
Não será igualmente iníquo e vergonhoso o fazer pagar ao povo, pelas autorizações, pelas
fantasias das municipalidades, como liceus e colégios de moças, que não servem senão para a
burguesia e aos funcionários, quando todo o socorro é recusado aos filhos dos operários se
frequentarem escolas das Congregações religiosas?
Um sistema no qual, por uma garrafa de vinho de 0 francos e 45, o operário deve pagar 0
francos e 30 ao imposto e à concessão, não será ele antissocial e anti-humanitário?

276 A reforma. – Há por conseguinte imensos desperdícios a suprimir. Também há impostos


mal fundados que será preciso diminuir ou deslocar. Mas para quê os substituir? Será preciso
estabelecer um imposto sobre os rendimentos? Este imposto deverá ser ele progressivo?
Digamos primeiramente que o projeto de um imposto único sobre o rendimento,
substituindo todos os outros, é uma utopia socialista.
Os rendimentos esconder-se-iam e iriam abrigar-se no estrangeiro. O que não poderia ser
dissimulado seria esmagado para fazer face às despesas do Estado. Não seria mais 14% que se
deveria pedir aos rendimentos, mas 50 ou 60%.
Mas, não poder-se-ia criar um imposto moderado sobre os rendimentos para substituir
muitas taxas injustas? É esse a opinião de muitos ajuizados e certamente iremos aí chegar algum
dia.
277 As outras nações da Europa já têm este imposto. O difícil é o de estabelecer a base do
imposto. Pedir-se-á a cada um para declarar o quantitativo do seu rendimento? A administração
irá estabelecê-la oficialmente por um inquérito? O rendimento será fixado por uma presunção
tirada do valor locativo do domicílio de cada um? Esta última modalidade é a preferida por muitos
por ser a menos inquisitorial, contudo não seria fortemente inexata?
Este imposto sobre o rendimento será progressivo? Por exemplo, um duplo rendimento
pagará três ou quatro vezes mais do que um rendimento modesto? Este ponto ainda é mais
discutível. O que legitimaria uma certa progressão dos impostos sobre o rendimento é sobretudo a
oportunidade de reparar a injustiça dos impostos indiretos, os quais pesam muito fortemente sobre
os pequenos rendimentos.
Mas, neste tempo no qual passa um sopro de socialismo, a progressão não seria uma arma
perigosa?
A conclusão deste parágrafo, como dos outros, é que se deve reformar as leis ao mesmo
tempo que os costumes.

§ 6. – A agiotagem e a usura
278 Todo o açambarcamento é uma usura e uma usura voraz, e as nossas leis não o previram.
Uniões sindicais de patrões, como os cartéis alemães e os trust americanos podem
organizar, quando quiserem, açambarcamentos tão funestos aos trabalhadores como prejudiciais
aos próprios consumadores.
Estas uniões, que não são paralisadas por nenhuma organização profissional geral, podem
determinar segundo a sua vontade as taxas dos salários, tanto quanto o preço dos produtos.
Um exemplo evidente de açambarcamento, e que ainda hoje se exerce impunemente, é o
dos engenhos de açúcar. Eles não deixam outros se estabelecer ou então os esmagam prontamente
pela concorrência. Eles também são donos do mercado. Podem comprar barato o açúcar bruto e
vender a um preço usurário o açúcar refinado.

279 Recorda-se o açambarcamento do cobre, que fez cair o tribunal das contas em 1880. O
açambarcamento exerce-se sobre o trigo nos nossos grandes portos de comércio, sobre as lãs em
Londres e em certos centros industriais. Alguns grandes bancos judeus tendem a se meter na posse
de quase todas as ações das minas de ouro, e será o mais horrível açambarcamento conhecido da
história. Eles serão os donos do mercado do ouro e, consequentemente, do comércio universal de
que o ouro é o instrumento necessário.
O Programa dos católicos alemães pede com razão que a Bolsa seja reconduzida às suas
funções normais, e que o jogo das diferenças e o mercado a prazo sejam interditos.
Os jogos dos cursos e outros jogos análogos são profundamente imorais.

280 As emissões de ações e o lançamento de novos negócios exigiriam o controle do Estado.


Os empréstimos do Estado tomam proporções tais que a sua amortização será impossível.
É um capital mal fundado e destinado a se afundar. Os rendimentos do futuro ficam, por
conseguinte, comprometidos dum modo iníquo para soldar despesas cuja maior parte não
encontraria justificação.
Os rendimentos baseados sobre o empréstimo comercial ou industrial devem ser mantidos
num justo limite. A lei e os tribunais devem prever e reprimir as diversas formas sob as quais a
usura se esconde.
O rendimento imobiliário reveste um caráter de injustiça e de usura quando as idas à praça,
devido às dívidas, forem originadas por acidentes, penúria, intempéries. Aqui, apenas a arbitragem
profissional, poderia retificar os contratos usurários.

§ 7. – Os pequenos domínios rurais


281 O pequeno domínio rural e os instrumentos de trabalho devem ser intocáveis, se se quiser
conservar a raça dos nossos camponeses. A agricultura não será ela a reserva do nosso sangue mais
puro e a melhor das nossas forças?
Não se pode objetar que os que emprestaram foram lesados. É da competência de cada um
de se precaver sobre o crédito que pode conceder ao seu devedor.
Há já na lei, exceções semelhantes em favor das rendas sobre o Estado e de certos
procedimentos, em favor das provisões alimentares atribuídas por justiça ou instituídas a título
gratuito; em favor do material necessário aos arguidos e aos seus filhos, suas roupas, livros,
instrumentos e máquinas numa certa medida; e mesmo de uma vaca ou três cordeiros ou três
cabras, à escolha do preso, com o seu alimento por um mês. (Código de instrução, artigos 581,
582, 592).
A antiga legislação ainda era mais favorável. A ordenação de 1667 reservava os cavalos,
bois, e animais de lavoura, as charruas e instrumentos de cultura. Estes objetos não podiam ser
apreendidos senão para o pagamento das quintas.

282 O fisco poderá lamentar-se se não puder exercer os seus direitos pela apreensão; mas, de
outro lado, se a população diminui, se as casas não são mais habitadas, e se a produção e o
movimento dos negócios estão a decrescer, o fisco irá sofrer muitas outras desvantagens.
Para que as famílias sejam prósperas, numerosas, segundo a moral, económicas e fortes, é
preciso que persistam sobre o solo que as viu nascer.
Não será acaso cruel retirar o campo, que o alimenta, a um casal que se encaminha para a
terceira idade? E é a isso o que dá cabo, cada dia, a rapacidade do Estado e as artimanhas do
homem de negócios.

283 A lei deve ter a preocupação de favorecer a formação e a conservação do pequeno domínio
rural até à estimativa de uma propriedade suficiente para alimentar a família que o cultive e absorva
a sua atividade.
O chefe de família deve ter o direito de escolher um sucessor para si entre os seus filhos
para o domínio familiar. A igualdade pode ser restabelecida por uma compensação pagável por
anuidades e proporcional ao produto das colheitas. O herdeiro legal poderia ceder os seus direitos
a um ou outro dos seus irmãos. A alienação a estrangeiros deveria ser autorizada em conselho de
família reunida diante do juiz da paz.
Esta preocupação de fixar a família, para a tornar moral e próspera, existe na Alemanha,
na Áustria, na Inglaterra, na China e nos Estados Unidos. Ela está a ser requerida na Itália e na
Bélgica. O problema foi colocado ao Parlamento francês, e ninguém o expôs melhor e resolveu
que o Sr. Padre Lemire, seja no seu projeto de lei, seja na exposição dos motivos que apresentou
sobre o assunto.

§ 8. – A liberdade de testar
284 Um grande número de gente inteligente, e à cabeça deles o Le Play e seus discípulos,
pedem que o pai de família tenha a inteira liberdade para testar e designar o seu sucessor. Pela
razão óbvia, que o proprietário, o industrial e todo o homem que tem uma situação independente,
sentem o forte instinto de gerar filhos, e é também seu desejo sobreviver e se perpetuar depois de
si com idêntica categoria e na mesma situação.
A febre da justiça igualitária, que distingue a raça francesa, não permite atingir resultados
imediatos e consideráveis desta liberdade, mas não é menos verdade que a força e a prosperidade
de uma nação dependem do número e da solidez dos estabelecimentos estáveis e das famílias
patriarcais, fundadas duma maneira durável, que conta no seu seio.

285 Esta liberdade também é o único meio de assegurar a expansão colonial.


Sob pretexto de fazer parar o exercício do direito de primogenitura, que não está presente
de forma alguma no direito de testar, a Franco-maçonaria chegou a destruir o lar da família e a
dispersá-la.
Um pai conhece as aptidões e os gostos dos seus filhos.
A quem tiver, como ele, o gosto de ser agricultor, industrial, ele deixa o seu campo ou a
sua fábrica. – Se tiver vários filhos tendo as mesmas aptidões, deixa-lhes, sem partilhas entre eles.
– Ele dá àquele que corre o mundo o seu dinheiro líquido, ou então encarrega os que conservam o
fundo paterno de lhe pôr ao serviço uma renda. Os interesses de cada um são respeitados, mas tal
não dissolve a família.

§ 9. – A diminuição das despesas da justiça.


286 A diminuição das despesas com a justiça, sobretudo no que concerne aos menores, às
pessoas pouco abastadas, impõe-se à equidade. Por pouco que surja uma complicação numa
pequena sucessão, acontece a ruína.
Já houve uma manifesta boa vontade da parte do legislador neste sentido, mas ela não
aproveitou senão aos manipuladores do papel carimbado. As despesas excessivas da liquidação
judiciária continuam a devorar as pequenas heranças, como temos visto mais alto a propósito dos
impostos.

287 As despesas enormes da retenção dos bens imobiliários apreendidos fazem aumentar, dum
modo verdadeiramente desproporcionado, o quantitativo da dívida anterior.
Se em razão do mesmo for preciso, que o Estado tome para si as cargas dos oficiais
ministeriais, pode fazê-lo gradualmente. A Alemanha assim fez na Alsácia: ela adquiriu um a um
os gabinetes do notário por ocasião da morte ou da demissão dos seus titulares, sobre a base de
uma proporção fixada intermédia entre os rendimentos do gabinete e o seu preço. Os novos
notários são empregados do Estado que têm um ordenado fixo e que, por conseguinte, não têm
interesse em sobrecarregar os direitos.

§ 10. – Apreensões e cessações de salário


288 Certos funcionários, certos empregados, são protegidos pela lei contra as suas próprias
atividades e as manobras pouco escrupulosas das gentes cúpidas.45 Por quê os operários, ainda
mais expostos e mais imprevidentes, não obteriam a mesma proteção? Por quê o seu salário não
seria declarado em parte inacessível e intangível?
______________________________________________
45
Os tratamentos dos funcionários públicos e empregados civis e os dos oficiais não são apreensíveis
senão por uma quinta parte, ao menos enquanto não se elevarem para além de uma quantia determinada
pela lei (Código de instrução art.580).

Na Bélgica, uma lei de 1887 não deixa senão o quinto do salário à livre disposição do
operário e põe para o resto uma interdição a qualquer renúncia. Esta limitação, sem dúvida, não
deve ser exagerada, mas coloca o operário na incapacidade de se deixar levar, eles e os seus, pela
miséria por fraqueza, e os persevera do ódio que nasce do sofrimento.

§ 11. – A representação do trabalho


e dos interesses profissionais
289 O mundo do trabalho é a maioria da nação e esta parte tão considerável do povo não é
ordinariamente consultada nem escutada pelo governo e seus negócios.
O comércio e a indústria têm ao menos câmaras consultivas de quem por vezes o governo
deseja tomar conselho.
Quereríamos uma representação mais completa e mais séria dos interesses. Seria preciso
em cada departamento, uma câmara ou um conselho de trabalho, ao lado do conselho da indústria,
do comércio, da agricultura, das profissões liberais e, nos departamentos marítimos, na marinha.
O conselho do trabalho ir-se-ia compor de patrões e de operários eleitos pelos corpos dos
estados. Deveriam ser consultados por todas as leis que respeitam ao trabalho, como cada um dos
outros conselhos departamentais deveria ser consultado pelas leis especiais que os concernem.

290 Quereríamos ainda mais. As câmaras consultivas departamentais não são suficientes.
As nossas assembleias legislativas deveriam ser eleitas, mesmo elas, sobre a base da
representação dos interesses. Dever-se-ia começar pelo Senado. Teríamos assim ao menos uma
Câmara competente sobre tudo o que toca aos interesses vitais da nação. Os conselhos
departamentais eleitos pelos corpos de estados seriam a base da eleição dos senadores.
Não se trata de utopias. É uma reforma pedida por toda a parte. A Bélgica já tem os seus
conselhos do trabalho bem organizados e verdadeiramente ativos.
Cada centro industrial tem um conselho da indústria e do trabalho, composto num igual
número de patrões e de operários. Até aqui, a tarefa destes conselhos foi apenas consultivo: nos
conflitos entre empregadores e empregados, eles forma árbitros úteis; o governo consulta-os sobre
os projetos de regulamentação do trabalho antes de os submeter ao Parlamento.

291 São instrumentos de propostas excelentes; deram já informações precisas e muito úteis
sobre a situação dos operários. Os democratas cristãos reclamam o benefício de instituições
análogas para a agricultura, e é muito provável que o governo admitirá esta medida.
Por cima destes conselhos provinciais, há o conselho superior do trabalho, composto por
um terço de patrões, um terço de operários e um terço de sociólogos. Este conselho acaba de
preparar um projeto de elei sobre os regulamentos das oficinas que será votado pelas Câmaras,
sem mudança. Portanto é um verdadeiro parlamento do trabalho. É uma realização bastante
aproximada da representação profissional.
292 Esta mesma ideia da representação dos interesses no Parlamento faz o seu caminho na
Bélgica. Ela tinha os seus partidários numerosos aquando da revisão da Constituição. Mas a
maioria recuou diante das dificuldades da organização. Não se estava pronto para esta reforma um
pouco complexa, mas que teria sido tão fecunda, e estacionou-se na adoção do voto plural.
Em todo o caso, o sufrágio universal, tal que praticamos em França, é condenado por toda
a parte pelos homens sérios, é um caos do qual podem sair todas as surpresas e todas as ruínas.
Não favorece ninguém exceto os políticos. O mundo do trabalho está nele representado por
advogados ou por jornalistas. As leis são feitas por homens somenos competentes.

§12. – Comissões mistas de patrões e de operários para a supervisão


das fábricas e oficinas, e conselhos de fábrica.
293 Estas comissões funcionariam, mais eficazmente que os inspetores assalariados que se
experimentou e que não deram grandes resultados. Colocar operários e patrões frente a frente para
se entenderem sobre os interesses comuns é exatamente o melhor meio de impedir as desconfianças
e o antagonismo. Por outras palavras, o patrão não está senão fracamente informado pelos seus
contramestres, e os operários acusam o patrão de erros que não estão de modo nenhum nas suas
intenções.
Nestas comissões, os patrões aproveitariam do espírito prático e positivo dos operários, e
estes aprenderiam a respeitar a inteligência dos patrões e a ter em conta as dificuldades com as
quais estes devem ter em conta.
O controlo das comissões deveria compreender também as condições da higiene do
trabalho, especialmente nas indústrias perigosas para a saúde.
As comissões mistas estabelecidas por um grupo de sindicatos ou por um centro industrial,
serão completadas utilmente pelos conselhos de fábrica, especiais a cada fábrica.
Estes conselhos compostos de contramestres e de operários, estarão em relações regulares
com o patrão. Pelo seu concurso, os diferendos podem ser parados no seu princípio, antes que se
tornem acrimoniosos.
Uma tal organização permitiria aos operários uma verdadeira emancipação, que os faria
escapar aos cabecilhas.

§ 13. – O máximo da jornada de trabalho


294 Esta determinação, que os socialistas, seguindo princípios utópicos, fixaram em oito horas,
deve fazer o objeto de uma lei, por causa dos verdadeiros abusos que existem em certos lugares,
abusos que exasperam os operários honestos e que servem de pretexto aos agitadores.
A justiça e a humanidade proíbem de exigir do operário um trabalho excessivo que
embrutece o seu espírito, que fatiga demasiado o seu corpo, que ultrapassa os limites naturais das
suas forças.
O trabalho não é o único dever do homem, pois ele tem ainda os deveres de família, de
religião, de sociedade. Não é por conseguinte permitido de aumentar o trabalho fora de proporção,
já que não restaria mais tempo suficiente ao homem, nem inteligência e força para cumprir com
outros deveres.
295 De estudos conscienciosos sobre esta questão, sobressai que se pode tomar por base um
máximo de onze horas, salvo modificações relativas à profissão.
As horas de trabalho devem ser reguladas, conforme à sua natureza, segundo as
circunstâncias de tempo e de lugar. Uma coisa é o trabalho nas minas, outra o dos campos, o das
fábricas sob pressão contínua.
A solução dos problemas que esta diferença gera, consiste em permitir aos conselhos de
arbitragem de cada indústria o fixar um limite especial.

§ 14. – Revisão das leis


sobre o trabalho das mulheres e das crianças
296 Esta revisão seria a primeira obra da representação do trabalho. Estas leis não são
frequentemente suscetíveis de aplicação. Um parlamento, composto de membros ilustrados nas
Letras, de advogados, de políticos, não pode ter qualidade para se pronunciar sobre questões tão
especiais. Os projetos que lhes foi submetido são reelaborados sob o império das preocupações
eleitorais e saem das suas mãos desfigurados e ineficazes.
A infância não pode fazer parte da fábrica, antes que a idade tenha feito desenvolver
suficientemente as suas forças físicas, intelectuais e morais. Em geral, todo o trabalho industrial
deve ser interdito às crianças abaixo dos catorze anos.

297 O trabalho das mulheres deve ser igualmente regulado de forma a salvaguardar a sua saúde
e moralidade.
O trabalho das mulheres, tal como o das crianças, exige condições especiais de isolamento
e de vigilância.
É preciso que a mulher conserve o tempo suficiente para se ocupar da sua família e, por
conseguinte, trabalhe em sua casa o maior tempo possível.
Os católicos alemães pedem, com razão que a lei suprima gradualmente o trabalho das
mulheres nas usinas.
O trabalho de noite arruína a saúde da mulher e a retém longe do seu lar de tarde e de
manhã, nos momentos exatos em que melhor pode cumprir a sua tarefa de esposa e de mãe. A lei
que proíbe o trabalho de noite às moças menores deve estender-se às moças mais velhas e às
mulheres casadas.
Para vários destes pontos, é necessária a conformidade internacional devido à concorrência
e aos mercados.

§ 15. – A personalidade civil dos sindicatos


298 É uma consequência do direito natural dos homens à associação.
Teme-se o poderio dos sindicatos. Não serão para temer, se forem morais e honestos. A
quem a falta se eles o não forem, a não ser dos sectários que tudo fizeram para reduzir a liberdade
religiosa e entravar a ação da Igreja e o seu ensino? Se continuarmos nesta via, a igualdade política
irá trazer fatalmente a igualdade económica, uma vez que a moral cristã não esteja presente para
fazer abortar as invejas, para apregoar o respeito pelos direitos e pela justiça.
A personalidade civil dos sindicatos deve-lhes certificar o direito de possuir imóveis, de
receber dons e legados, de se contrapor na justiça, de tomar parte nos concursos públicos. Se o
fundo de propriedade comum não for livre nem suficientemente sólido, não se poderá fazer dele a
base das instituições de caridade que fariam a vitalidade das associações cristãs.

299 Os sindicatos têm o direito, pelo menos, aos mesmos privilégios que as sociedades
anónimas, que não representam senão o dinheiro sem responsabilidade, ao passo que o trabalho é
moral por ele mesmo e representa a vida do povo e o sustento das famílias operárias. É o direito à
existência confrontado muitas vezes com o direito ao divertimento.
Não é possível que um pai de família pague ao mesmo tempo contribuições às caixas de
segurança, de reforma, de poupança, de cooperação, de sindicato. Deve-se simplificar para ele o
acesso à propriedade comum, por fazer falta a propriedade privada.
Como o nota Monsenhor Ketteler, a religião cristã é tão fecunda em meios que, com a
liberdade ela não tardaria a reconstituir o património das corporações confiscado pela Revolução
com detrimento do povo.

§ 16. – O mínimo dos salários


300 Esta determinação deve-se fazer para os trabalhos públicos. Será uma indicação e como
que uma base para as convenções privadas relativas a trabalhos análogos.
O Estado patrão, mais que qualquer outro, deve fornecer um salário suficiente para manter
o operário sóbrio e moral.
A Bélgica entrou nesta via. Os bispos insistiram junto das fábricas-da-igreja para que estas
instituições tomem as medidas necessárias para impedir o salário, de um trabalho atribuído
publicamente, de se sujar ao ficar abaixo da média dos salários convenientes da região.
Este exemplo ganha aos poucos as administrações provinciais e comunais, os
estabelecimentos religiosos e de beneficência. Ao especificar deste modo o mínimo do salário no
caderno dos encargos, impedir-se-á os empresários pouco escrupulosos de especular sobre o
abatimento dos salários.

§ 17. - O contrato de trabalho


301 A lei deve-se preocupar com o contrato de trabalho para o fazer observar no que concerne
ao justo salário, nas garantias contra o despedimento arbitrário, nos regulamentos das oficinas.
Uma lei sobre o contrato de trabalho deve prover a que o justo salário seja assegurado ao
trabalhador, mas não o pode determinar por si mesma. Ela depende de demasiadas circunstâncias,
quase infinitas na variedade
Mas a lei pode instituir que as reclamações dos operários poderiam ser reconduzidas aos
conselhos de arbitragem, compostas de patrões e operários que se determinaria segundo as
necessidades da região, das circunstâncias e das dificuldades do momento.

302 As garantias contra o despedimento arbitrário não podem existir tanto que a lei condenará
o recurso ao patrão na fábrica e o recurso contra este num conselho de arbítrio.
Os regulamentos das oficinas, as regras de trabalho são variáveis, mas devem derivar de
corpos profissionais, que os controlam, no interesse da segurança e da lealdade do ofício.
A lei deve fixar também ou, antes, reenviar ao encargo das câmaras do trabalho a
preocupação de fixar o máximo dos contributos que podem ser feitos para as diversas instituições
de reforma ou de seguros, e o máximo ao qual poderão atingir as multas.
§ 18. – As reformas e seguros
303 A lei deve exigir da parte dos patrões a fundação de caixas de socorro em caso de doença,
de acidentes ou de velhice, e regular o seu funcionamento de maneira a garantir os patrões contra
as exigências exageradas e os operários contra as resistências egoístas.
A carga sobre a doença deve ser suportada ordinariamente pelo operário, e pelo patrão
quando for uma consequência evidente das más condições do trabalho.
A carga da velhice incumbe ao operário como homem e obriga à previdência, uma vez que
envelhecer é uma lei da natureza. Como o operário frequentemente não pode constituir uma reserva
por causa dos seus muitos encargos e também devido à sua fraqueza natural ou de suas aptidões,
o patrão, ao serviço de quem ele envelhece, é obrigado a se preocupar com ele. A lei deve fixar
um mínimo de contribuição para cada uma das duas partes.
O Sindicato de Fourmis apresentou este desiderato ao congresso operário de Reims.
Que todos os estabelecimentos garantem a seus operários um seguro contra todos os riscos
que podem sobrevir durante a sua permanência na oficina.
A Justiça social quer que certas classes não sejam condenadas a caírem ao encargo da
caridade pública, enquanto o seu trabalho aproveitar às empresas privadas. O proletariado
industrial deve ser imposto à carga da indústria.

§ 19. – As Convenções internacionais


304 As aspirações por uma proteção eficaz dos trabalhadores são sensivelmente as mesmas
entre as nações europeias. Ir-se-ão tomar medidas por toda a parte.
Por isso mesmo, impõem-se convenções internacionais. Com efeito, a indústria estaria
numa situação de inferioridade relativa, no país que lhe imporia sacrifícios em favor dos operários,
enquanto ao lado, seriam ao mesmo tempo explorados impunemente.
A livre concorrência atual é um estado bárbaro em que os pobres operários pagam quase
todas as despesas. Eles são esmagados impiedosamente para sustentar uma concorrência esgotante.
Sobre tudo quanto concerne à ação do Estado, deve-se ler o que a encíclica diz a esse
respeito (edição de Liège, capítulo IV, página 20-31).
CAPÍTULO VIII
OS VERDADEIROS REMÉDIOS : A AÇÃO DOS INTERESSADOS
PATRÕES E OPERÁRIOS
305 A encíclica Rerum Novarum, ao abordar a solução da questão social, nos recorda os
deveres dos donos e dos patrões, ao mesmo tempo que os dos operários.46
Vamos assinalar de começo e de forma sumária, os deveres dos operários.
1.Eles devem a seus patrões uma obediência respeitosa nas relações profissionais e
consideração pela sua autoridade.
2.Eles devem fornecer fielmente todo o trabalho pelo qual se responsabilizaram por um
contrato concluído livremente e conforme à equidade.
3.As suas revindicações devem ser exemptas de violência e nunca revestir a forma de
sedições.
Os princípios dos quais derivam os deveres do patrão são a autoridade patronal e o contrato
de trabalho. O patrão exerce uma autoridade social que tem certa analogia com a do pai de família.
Ele pode e deve velar por todos os interesses daqueles que as circunstâncias providenciais e um
contrato livre colocaram debaixo da sua direção.
Estes deveres dos patrões podem referir-se a três sujeitos: concernem ou a vida física, ou a
vida moral, ou os interesses temporais do operário.

§ 1. – Os deveres dos patrões relativamente à vida física do operário


306 Trata-se aqui da aplicação literal do Vº mandamento de Deus : «Nunca praticarás
homicídio». Não é necessário que se faça ilusão, nem tentar esconder um mal que tem tão dolorosas
consequências. O patrão que não vela pela segurança e pela salubridade da oficina, o patrão que
faz trabalhar crianças exageradamente ou em idade muito infantil antes do seu completo
desenvolvimento físico, o patrão que emprega as mulheres e as moças em trabalhos para além das
suas forças, o que guarda as mães de família na oficina nos dias que precedem o parto ou nos do
aleitamento, assim como aquele que exige dos operários excessivas horas de trabalho, sem trevas
e sem repouso hebdomadário, um trabalho que se prolonga pela noite sem necessidade; estes
patrões pecam manifestamente contra o Vº mandamento do Decálogo. Eles violam ao mesmo
tempo os preceitos da lei natural e os da religião revelada.

307 Daí derivam todos os deveres do patrão relativamente às horas do trabalho, ao repouso
hebdomadário, ao trabalho das crianças, das mulheres e especialmente das mães de família. Ele
deve prover isso através de um regulamento prudente e justo.
Também é evidente que o patrão deve velar pela salubridade da oficina e que deve tomar
todos os meios para prever os acidentes que podem pôr em perigo a vida e saúde dos operários.
Quantos, infelizmente, se iludem! Que crime em relação aos operários, às famílias e à
pátria, o reduzir tanta saúde robusta à anemia e à tísica por causa de trabalhos arrasadores e sem
treva, na atmosfera malsã das fábricas!
Nas nossas cidades, as famílias de operários morrem de tuberculose à segunda geração.
__________________________________________
46
Encíclicas de Leão XIII, 7 volumes a 1 franco, Paris, rua Bayard.

§ 2. – Os deveres dos patrões relativamente à vida moral dos


operários
308 Estes deveres são às vezes negativos, outras vezes positivos.
Primeiramente, o patrão não pode permitir que as suas oficinas sejam um centro de
corrupção, uma ocasião de escândalo. Respeita ainda ao Vº mandamento do Decálogo. Ele não
pode ir contra a vida moral dos operários, tal como contra a sua vida física. Ele não pode matar
mais a sua alma do que o seu corpo. Ele não pode pô-los na impossibilidade de cumprirem seus
deveres religiosos.
Daí derivam os deveres relativos à escolha e classificação dos operários, à escolha das
autoridades secundárias, à disciplina da oficina, à proteção da mulher e da criança.

309 O primeiro dever é relativo à escolha do pessoal. Um pai de família deverá abandonar à
sorte a sobrevivência da sua família?
O patrão deve conhecer o seu pessoal e excluir os maus elementos, sobretudo os
corruptores.
O patrão deve escolher com cuidado as autoridades secundárias da oficina, os diretores e
contramestres. Ele deve escolher os mais honestos e mais dignos. Ele deve-lhes impor a
imparcialidade e a vigilância. Ele deve exigir deles o bom espírito e o bom exemplo. Com efeito,
eles são um dos meios mais poderosos de conservação ou de perdição da vida moral na oficina.

310 Constatou-se em geral uma profunda degradação da mulher nas oficinas modernas. É que
os patrões deixaram reinar a promiscuidade dos sexos e a impunidade da sedução. Para remediar
o fato, os patrões devem tomar medidas ao mesmo tempo de preservação, de vigilância e de
repressão. Eles perseverarão os operários ao lhes proporcionarem horas diferentes de entrada e de
saída, oficinas especiais, e ao evitar o trabalho da noite das mulheres. Eles irão proceder à
vigilância ao instituírem nas oficinas conselheiras ou delegadas encarregadas de proteger a virtude
das suas colegas. Eles irão reprimir o mal pela punição severa dos atos e dos discursos licenciosos
e pela expulsão dos sedutores.

311 Em relação ao aprendiz, o dever do patrão é o de confiá-lo a mestres operários de uma


moralidade e de uma técnica comprovadas, de o pôr ao abrigo, quanto possível, do vício e da
corrupção, e de o proteger contra todos os abusos da autoridade da parte daqueles que os praticam.
O patrão deve, enfim, proibir a blasfémia e a impiedade, os maus livros e maus jornais, as
conversas imorais e ímpias. Ele não pode permitir o que contradiz aos direitos de Deus e o que
tende a viciar o espírito e a corromper o coração dos operários.

312 Mas ainda não é tudo. Aos deveres negativos acresce-se os deveres positivos. O patrão
não deve apenas proscrever o mal, deve igualmente proteger e favorecer o bem.
O patrão cumpre em relação aos seus operários deveres análogos aos de pai para com seus
filhos, na medida da autoridade com que Deus lhes deu.
Ele é responsável por caridade a corrigir os seus erros e de os reconduzir à fé e às práticas
religiosas. Ele tem o direito e o dever de exigir dos seus empregados e dos seus operários a
observação dos preceitos divinos e da Igreja. Este dever combina com a qualidade de pai. O patrão
deve-o cumprir com sabedoria e prudência, procurar as circunstâncias favoráveis e as esperar, se
necessário, sem nunca perder de vista a finalidade a atingir.

313 A santificação do Domingo e as associações são os meios mais favoráveis para chegar ao
resultado desejado.
O patrão deve facilitar a seus operários o cumprimento dos seus deveres religiosos e para
tal ele deve entender-se com os ministros da Igreja para escolher os meios mais favoráveis.
O cumprimento destes deveres não será possível a não ser que o patrão se interesse pelos
seus operários e ganhe a sua afeição por causa da sua benevolência.
Finalmente, o patrão deve saber que, sem o exemplo, todos os seus esforços seriam inúteis.
É preciso que os operários possam reconhecer nele o seu modelo sob o ponto de vista moral e
religioso.

§ 3. – Os deveres dos patrões relativamente aos interesses temporais


dos operários
314 Estes deveres referem-se ao salário e á assistência.
O salário é a justa retribuição acordada ao operário em troca do seu trabalho.
O operário deve conservar a sua existência e assegurar a subsistência da sua família. Ele
para isso não tem mais do que o seu salário: este portanto deve ser suficiente. O trabalho não é
uma mercadoria que possa sofrer todas as flutuações da oferta e da procura. É um ato humano, ao
qual deve corresponder um salário suficiente para a subsistência da família.
Não há mais dúvidas atualmente, depois das demonstrações indiscutíveis do Cardeal
Manning, de Monsenhor Nicotera, do Conselho de estudos da Obra dos Círculos e de tantos
outros.47

315 Não é necessário chamar a este salário de familiar, pois que é o salário normal. Deve ser
suficiente à vida ordinária de uma família de operários, segundo a média comum e segundo os
países.
O estado atual de concorrência desenfreada e de sobreprodução ilimitada é um estado de
crise.
O mínimo de salário ou de salário normal não pode ser determinado a não ser com a ajuda
das corporações para cada região.
Pode sofrer exceções em casos de trabalho defeituoso e para os operários que não têm
saúde, nem a capacidade normal.
A justiça e o interesse social exigem que o salário normal seja determinado progressiva e
prudentemente. Ele poderá começar com os trabalhos do Estado e das comunas. Disto depende o
futuro da sociedade que ameaça deteriorar-se perecendo, ou se afundar pela revolta daqueles que
sofrem injustamente.
_____________________________________________
47
Leão XIII e as condições do trabalho, carta pastoral do cardeal MANNING. O mínimo do salário e a
encíclica Rerum Novarum. Relação de Monsenhor NICOTERA no congresso de Génova. A associação
católica, a 15 de Dezembro de 1893.
316 O patrão e os contramestres devendo julgar sobre o trabalho e a estabelecer multas com
frequência, a pronunciar o despedimento de um mau operário, devem eles próprios conhecer o
trabalho. Devem nele ter metido as mãos e já o ter exercido. Doutro modo os operários serão
lesados muitas vezes e o seu mau humor recairá sobre o patrão. O operário despreza o patrão que
não conhece o trabalho e se revolta contra o contramestre incapaz de instruir um bom operário.
O patrão fará bem em se preocupar também da maneira do salário ter sido empregue ou da
sua dissipação, origem ordinária do pauperismo. Ele pode usar todos os meios que a sua autoridade
lhe atribui, para que o salário seja empregue na subsistência do operário e na manutenção da
família, e, quanto ao excesso, vertido à poupança. Por consequência ele deve escolher o dia e o
modo do pagamento mais favoráveis.
Para ajudar o operário a utilizar o seu salário, o patrão pode recorrer às instituições
económicas que fizeram as suas provas tais quais: as caixas de reforma, os seguros de vida, as
caixas corporativas, etc.

317 Além disso, o patrão tem um dever especial de assistência caritativa para com os seus
operários, pois ele deve agir para com eles como um bom pai de família e tomar cuidado deles
moral e materialmente.
Ele está particularmente azado a cumprir este dever quando a perda de saúde, os acidentes,
a morte de um pai ou de uma mãe de família tornam insuficientes os recursos de uma família de
operários.
O patrão está obrigado a vir em ajuda dos seus operários nas suas necessidades normais
tanto como em seu acréscimo de bens; mas nos casos de necessidades extremas, ele deveria mesmo
chegar a impor-se privações.

§ 4. – Os deveres dos patrões no exterior da exploração


318 Os deveres do patrão estendem-se para além da fábrica. Ele não pode deixar de se
interessar da família dos seus operários, nem da sua conduta fora da exploração.
Não se veja nisso uma servidão para o operário, tal como a vigilância de um pai de família
não é uma servidão nem uma humilhação para a criança.
Todavia, estes deveres relativos à vida exterior do operário são menos rigorosos, porque a
autoridade do patrão exerce-se aí de forma menos completa e com menos facilidade.
O patrão zeloso e devotado deve-se interessar pela educação e vigilância das crianças.
Ele tem de fazer um esforço em precaver os seus operários e de os proteger contra as
influências funestas dos cabecilhas, dos políticos, dos viciados pelo cabaret, e dos inimigos de toda
a espécie que vivem às custas do operário.
Ele deve ocupar-se dos alojamentos dos seus operários, estar seguro se são suficientes e se
as condições da higiene e da moralidade estão nelas salvaguardadas.
Ele deve prover a que o operário tenha acesso à igreja, à escola, às associações religiosas
e corporativas.
O chefe de uma fábrica isolada deveria portanto impor sacrifícios para fundar, ao lado da
fábrica, uma capela e escolas.

§ 5. – Os meios de ação
319 O principal meio de ação é o ministério sacerdotal. O patrão deve entender-se sobre o
assunto com a autoridade eclesiástica.
Ele deve pôr os seus operários no ponto em que possam receber a instrução religiosa e
cumprirem seus deveres de cristãos.
Se a fábrica for importante e se a organização do trabalho não puder concordar com a vida
paroquial, o patrão deverá encontrar uma capela para os seus operários.
O patrão está obrigado, sob pena de pecado, de pôr à disponibilidade dos seus operários as
facilidades necessárias para cumprirem os seus deveres de cristãos.
Ele está encarregado de se ocupar das escolas cuja influência é tão grande sobre a família
do operário. Ele deve desviar os seus operários de enviarem seus filhos a escolas neutras ou hostis
à religião. Se não houver boas escolas ao alcance da sua fábrica ou da sua exploração rural, ele
deve fazer sacrifícios para fundar alguma.
.
320 As associações são um meio de ação essencial. Elas não devem ser obrigatórias entretanto.
Elas procedem da caridade mais do que da justiça. E a caridade atrai, não constringe. O operário
obrigado a entrar nas associações seria para elas um dissolvente e causa de mal-estar.
As associações devem-se governar a si próprias. É uma condição necessária para nelas
fazer reinar a iniciativa e o espírito de apostolado.
A associação operária alia-se praticamente à autoridade da Igreja e do patrão pelo direito
de presença, até com a presença de fato, do padre e do chefe da família operária no seio do conselho
operário.
A associação mais necessária é a associação religiosa. Ela preparará almas de elite, e
suscitará dedicações.
Associações diversas devem agrupar as crianças, os jovens, os homens, as moças, as mães
de família.

321 Nas grandes fábricas isoladas e dotadas de uma capela, as associações são exclusivas à
fábrica. Alhures, as associações são paroquiais, e os patrões velam para que todo o seu pessoal
delas faça parte.
Fora das associações religiosas, que têm o seu centro na igreja, há associações moralizantes
e as associações económicas.
As primeiras compreendem as conferências operárias de São Vicente de Paulo, os
patronatos, os círculos: falaremos delas no capítulo das obras. Pode-se acrescentar a essas os
delegados da fábrica e do bairro. Uma brochura especial, que se encontra na Obra dos Círculos
(262, avenida Saint-Germain), explica o seu funcionamento.
Entre as associações económicas, citaremos as Sociedades de socorro mútuo; as Caixas de
poupança, de previdência, de reforma, os bancos populares, as caixas de empréstimo; as sociedades
cooperativas, os economatos, etc.
Falaremos igualmente no capítulo sobre as Obras e naquele da Cooperação (2ª parte).
CAPITULO IX
OS VERDADEIROS REMÉDIOS :
A AÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES PROFISSIONAIS

§ 1. – Notas históricas
322 Corporação ! Este único nome evoca um glorioso longínquo, a Idade Média, totalmente
florida das suas admiráveis «corporações operárias».
Nas mil dificuldades da vida, os trabalhadores nelas encontrarão sempre uma força e um
sustentáculo. Frequentemente, também aí encontrarão a glória. Todas as obras-primas da Idade
Média e da primeira renascença são os frutos das corporações.
As corporações não eram apenas grupos profissionais, eram instituições sociais. Era a base
da organização comunal. As corporações tinham feito promover trabalhadores a um nível social
elevado nas nossas cidades. Não eram despromovidos abaixo da burguesia a um nível social
inferior, eles mesmos eram a burguesia. Longe de se envergonharem do seu trabalho, eles
orgulhavam-se de tal. E disso faziam um ponto de honra profissional deveras singular. Quem quer
que fosse, pela sua conduta ou pelas suas relações, sujasse o nobre brasão do ofício, saía
severamente excluído dele. As honrosas insígnias da profissão eram exibidas com orgulho nas
bandeiras, e por toda a parte, nos pacíficos cortejos ou nas expedições militares, viam-se os
estandartes dos «ofícios» flutuar altivamente ao lado dos dísticos que levavam os símbolos
heráldicos da cavalaria (Cf. G. Kurth, As corporações operárias na Idade-Média).

323 A sua prosperidade fez perder as corporações. Nos séculos XVII e XVIII, admitiram
membros estranhos ao ofício e introduziram-se abusos.
A Revolução, nisso como em muito outro campo, em vez de reformar, destruiu. Mas a hora
histórica tocou. Por todo o lado na Europa, os operários pedem a liberdade de se unirem, e os
católicos reclamam corporações adaptadas aos tempos presentes. Na Alemanha, na Itália, na
Bélgica, na França, os votos são os mesmos.
A encíclica sobre a condição dos operários deu ainda mais força a este movimento de
evolução. Reclamamos todas as corporações como um meio de assegurar ao povo o exercício dos
seus direitos essenciais, desprezados pelo regime individualista.
A organização profissional dar-nos-á o meio de garantir ao operário a dignidade e a justa
medida do seu trabalho, de determinar em cada profissão industrial ou agrícola a taxa do justo
salário, de garantir indemnizações às vítimas de acidentes, de doenças, ou de desemprego, de criar
uma caixa de reforma para a velhice e, enfim, de prover a representação pública do trabalho nos
corpos eleitos da nação (Discurso do senhor de Mun em Saint-Etienne).

§ 2. – Princípios gerais
324 Depois do relaxamento dos laços religiosos e dos da família, o dos laços profissionais veio
contribuir, como se viu, para o mal social. O restabelecimento destes liames é portanto um remédio
indicado.
A associação profissional é de direito natural. Foi um ato absolutamente tirânico o do
decreto da Convenção que deu a sentença de morte contra os cidadãos que tentariam restabelecer
a associação profissional sob o título de «um pretenso direito comum».
Que se tome nota deste texto histórico: Resulta de toda a doutrina económica da Escola,
que pretende não haver interesses comuns aos membros da mesma profissão, e que faz, por
conseguinte, da concorrência sem fim, do combate sem trevas, a única lei da existência para os
que pertencem às profissões manuais.

325 Todos os homens que vivem na mesma condição social, todos os patrões de uma mesma
indústria, por exemplo, ou todos os artesãos de um mesmo ofício têm efetivamente interesses
idênticos; todos os que exercem a mesma profissão, fosse embora em condições sociais diversas,
como os patrões e os operários de uma mesma indústria, têm interesses conexos. É pois natural
que eles se associem para reforçar os interesses conexos.
A associação é assim simples ou complexa, segundo se referir unicamente a condições
idênticas, como o faria uma associação de operários do mesmo ofício, ou então se ela se referir a
interesses complexos, como os dos patrões e dos operários da mesma profissão. Os interesses dos
patrões e dos operários não são todos idênticos, pois que uns tirariam proveito do abaixamento dos
salários, e os outros da sua subida. Mas estão conexos, pois o estabelecimento dos salários depende
da prosperidade da profissão, isto é, das condições mais ou menos avantajadas que ela encontra
para a penetração dos seus produtos e para o seu escoamento.

326 Quando a associação for simples, quer dizer, quando ela não abarca senão um dos
elementos da profissão, constitui um sindicato simples; quando é complexa, isto é, quando ela
reúne todas as condições diversas da profissão, tais que o operário e o patrão, o proprietário e o
lavrador, ela é um sindicato misto e toma assim o caráter corporativo.
O exercício destas duas formas de associações é hoje determinado pela lei do 21 de Março
de 1884, que, depois de um século, devolveu o direito de associação às profissões manuais, sob
certas condições restritivas.

327 Entre as principais restrições está a interdição das associações receberem membros
estranhos à profissão; a de possuir imóveis que se tornariam bens de mainmorte; a de ter um caráter
religioso ou político e de tender a interesses não estritamente profissionais. Enfim, os sindicatos
não se devem meter no comércio. Todavia a jurisprudência ainda não fixou a medida na qual os
sindicatos podem agir como Sociedade de consumo, quer dizer, satisfazer às encomendas dos seus
membros, sem delas tirar lucro, em vez de se contentar em agrupá-los, mas ela lhes proíbe de fazer
atividades como sociedade corporativa propriamente dita.
Finalmente a lei autoriza os sindicatos a formar entre eles uniões sindicais, mas não
reconhece a estas uniões nem o direito de possuir, em qualquer medida que seja, nem a de disputar
em justiça. Pode-se dizer por isso que ela tolera as associações mais do que as admite, pois que
não lhes reconhece a personalidade civil.

328 Tal qual é, e apesar destas restrições serem pela maioria desconhecidas no antigo regime
das corporações, o novo regime pode ainda dar bons frutos, se for aplicado num espírito de justiça
e de concórdia.
Os sindicatos mistos dão por si mesmo um testemunho da concórdia entre os patrões e os
operários, pois que uns e outros aceitam de neles se reunir, sem se confundir, para regular em
conjunto as questões de interesse comum.
Aí onde ambas as classes estiverem por demais divididas para poderem concorrer a esta
forma complexa de associação, as associações simples, sejam patronais, sejam operárias, ainda
podem se entender, conservando cada um a sua autonomia respetiva, para formarem, metade por
metade, a constituição dos conselhos de arbitragem e de conciliação permanentes. Os associados
comprometem-se então a não recorrerem, em caso de desacordo, à jurisdição profissional ou
comum, senão depois de terem deferido os seus litígios para o conselho.
Esta instituição funciona muito proveitosamente em Inglaterra, na indústria pesada, e
começa a se estabelecer na França nas mesmas condições.
Aliás não está apenas nisso uma vantagem exclusiva dos sindicatos mistos, que são a
verdadeira base do regime corporativo.

329 A constituição de um sindicato, qualquer que seja a sua constituição, deve, para produzir
bons efeitos, responder a certas condições: a solidez na direção, que se pode garantir pelas
disposições estatuárias que temperam o seu princípio eleitoral, tais como a renovação parcial do
gabinete e a reserva para este do direito de apresentação; a repartição dos encargos sindicais entre
a maioria dos associados, a fim de os interessar mais na gestão de interesses comuns: a garantia
que nenhum destes interesses será subtraído à decisão e ao controle do conjunto dos associados; a
manutenção do número dos associados nos limites que lhes permitem de se conhecerem entre si e
de poderem aceitar uma certa solidariedade, sem a qual não há uma real associação. Para além
destes limites, é à união sindical a quem se deve recorrer, mau grado a sua inabilidade em gerir
instituições económicas, a fim de representar, ao menos regionalmente, os interesses da profissão,
que é um dos grandes benefícios do regime corporativo.
Para além destas condições gerais, que são a consequência da lei, há condições especiais
para cada natureza profissional.

§ 3. – A corporação na indústria pesada


330 Na grande indústria, a finalidade do regime sindical é o de regular, de comum acordo,
tudo o que, no contrato de trabalho, interessa às duas partes: ao patrão e ao operário. Este
regulamento sindical não é um atentado à liberdade deste contrato, mas uma transformação do seu
caráter individual em acordo coletivo. Ele pode referir-se, no todo ou em parte, aos seguintes
pontos: taxa dos salários, duração e condições do trabalho, higiene e boa apresentação das oficinas,
regulamentos da fábrica, admissão e despedimento, socorro em casos de encargos de família
anormais ou de doença, indemnizações em casos de acidente, pensão ou reforma. Todos estes
complementos do salário podem ser procurados pelo regime sindical, segundo convenções que
devem variar com a indústria, seja pelo sistema das caixas particulares, alimentadas por
contribuições fixas e primas de participação na prosperidade da indústria e garantias pelo capital
do estabelecimento, seja pelo recurso a seguros apresentando idêntica garantia.
Todas estas questões, caídas hoje no domínio da legislação, serão reguladas melhor no
regime sindical que no do individualismo.48
Enfim, a questão das crises de sobreprodução, que causam as alternativas de trabalho
excessivo e de desemprego, poderá ao menos ser atenuado nas suas dificuldades e nas suas
_________________________________________
48
Se os patrões tivessem só eles a iniciativa destas instituições, apenas alguns teriam tido a generosidade
de as estabelecer. Com o desenvolvimento das corporações, elas ir-se-ão impor por toda a parte.
consequências terríveis pelo jogo das uniões sindicais, tal como já acontece em certas indústrias.49

§ 4. – A corporação nas artes e ofícios


331 Nas artes e ofícios, antigamente governadas pelo regime corporativo, as principais
disposições deste regime podem ainda ser restabelecidas na medida em que se sente a sua
necessidade, pelo regulamento da aprendizagem, pelo valor do trabalho através da encomenda, das
condições de execução, pelo investimento; pelas instituições de socorro mútuo, e mesmo por
empréstimos, que facilitariam ao bom operário de se estabelecer por conta própria.
A entrega de brevetes de capacidade, que iriam assegurar ao operário uma certa ascensão
na profissão e mesmo na sociedade, e de outro lado, a garantia da honorabilidade e a perfeição da
casa, que valeriam ao patrão estas mesmas vantagens, seriam compreendidas no papel das antigas
corporações (jurandes), e responderiam a uma das precisões mais elevadas da natureza humana e
da sociedade. A clientela não encontraria menos benefício nesta garantia da lealdade dos produtos
e da honra profissional.

332 Tudo isso desapareceu, e é uma das causas que fizeram refluir esta clientela para os
grandes armazéns.
Estes, ao comprarem por grandes quantidades, oferecem tais vantagens aos produtores que
obtêm descontos consideráveis e monopolizam o mercado a tal ponto as casas em que ainda se
trabalha sobre encomendas são obrigadas a se fornecerem neles as matérias-primas.
O sindicato poria fim a estes açambarcamentos, ao agrupar as encomendas e ao reter a
clientela por preços que seriam igualmente diminuídos.
As uniões sindicais facilitariam ainda mais esta ação, ao oferecer, pela concórdia dos
diversos sindicatos, as mesmas facilidades de exposição e de venda que os grandes armazéns.
O regime sindical, numa palavra, manteria e mesmo levantaria as condições de uma mão
de obra de elite, que é a honra da profissão, e que sucumbe por toda a parte, menos contra a
concorrência da máquina que não pode a substituir que contra a da confeção de pacotilha.

§ 5. – A corporação na agricultura
333 Na agricultura, «a grande abandonada» sob o regime atual do individualismo, o sindicato
se propaga rapidamente entre os pequenos cultivadores e nas regiões de rendas a meio em que o
proprietário toma a iniciativa sobre ela. Responde à grande necessidade de solidariedade que têm
as populações rurais para ficarem agarradas ao solo. Ele fornece-os, sobre a base de um simples
crédito pessoal e gratuito, todas as vantagens tão caras a adquirir do crédito
_____________________________________________

49
Na indústria dos lanifícios, por exemplo, para impedir a superprodução num tempo de crise, as uniões
sindicais do Norte, entenderam-se para moderar o trabalho e o restringi-lo a um número de horas
determinado para cada semana. Sem esta medida, os preços teriam ainda descido mais e vários
estabelecimentos seriam encerrados, lançando para a rua muitas centenas de trabalhadores.

real, pela facilitação das compras, das vendas e de todas as transações.50


A propagação dos bons métodos de cultura, que variam sem cessar com a criação de novos
instrumentos, novos fertilizantes e novas necessidades, não é um dos menores benefícios dos
sindicatos. A maior parte dos seguros encontram neles uma excelente base de mutualidade.51

334 A transformação dos contratos de trabalho, que deve caminhar a par com as novas formas
da cultura, não saberia ser feita em melhores condições do que aquelas cujo estudo se elabora no
sindicato.
Enfim, as uniões sindicais, que se formam entre as associações locais ou cantonais de uma
mesma província, já fizeram as suas provas como órgãos representativos da agricultura, que
reclamava em vão ser dotada nisso pelos poderes públicos. Em suma, o regime sindical não foi
uma revolução, mas bem uma revelação para as populações agrícolas, que pareciam não formar
na sociedade política senão um quarto estado tão negligenciável como negligenciado.

§ 6. – A corporação nas profissões liberais


335 As profissões liberais não têm menos necessidade que as profissões manuais do
restabelecimento dos laços profissionais. Mas a lei sobre a organização dos sindicatos ainda não
se aplica senão a estas profissões manuais, sobre as quais acaba-se de descrever o jogo. Aliás,
várias de entre as profissões liberais conservaram uma organização corporativa mais ou menos
completa, tal como nos advogados e em certos empregados públicos. Outros tendem a tomá-lo,
em favor duma jurisprudência servil. Outras profissões, enfim, são formadas num corpo sobre um
outro princípio diferente do da associação, mas estão mesmo assim subtraídos em parte à ação
dissolvente do individualismo: assim o exército, a magistratura, o clero. – Os dois primeiros destes
corpos conservaram os seus tribunais próprios, o que é um dos privilégios mais essenciais na
organização profissional.
Enfim o princípio da associação deve obter o reconhecimento do seu direito imprescritível
em todas as ordens da atividade que não constituem profissões propriamente ditas, mas unem os
homens num fim eminentemente social; assim, entre os religiosos, entre as sociedades de
beneficência, de ensino…, pois, em todas as condições, o progresso da civilização não pode
manter-se e prosseguir que não seja pela associação.

§ 7. – O património corporativo
336 A propriedade coletiva, sindical ou corporativa, pouco importa o nome que se lhe der, é
indispensável ao funcionamento e ao desenvolvimento das associações.
É graças aos recursos acumulados durante séculos que as corporações de outrora tinham-
se tornado suficientemente poderosas para garantir a honra e a lealdade dos ofícios, para
__________________________________________
50
O cultivador, bastante conhecido dos seus camaradas de sindicato, obtém facilmente, devido ao
concurso do sindicato, um crédito pessoal gratuito ou pouco oneroso, crédito que seria comprado muito
caro à banca onde se lhe iria pedir garantias e altos juros.
51
Os seguros mútuos, facilitados pelas uniões sindicais, são mais vantajosos que os seguros das grandes
companhias, que procuram sobretudo benefícios para os seus acionários.
desenvolver os progressos da profissão, para formar e proteger os aprendizes, para pôr os seus
membros e famílias, as suas viúvas, seus órfãos, ao abrigo de todos os acidentes, de todas as
misérias da vida; e a certos momentos da nossa história, na jornada de Bouvines por exemplo, para
fornecer ao rei homens de armas e dinheiro.

337 Um dos grandes erros do fim do século passado foi o de suprimir e proibir a propriedade
coletiva, para não deixar subsistir senão a propriedade individual; e como qualquer erro provoca
novo erro, os socialistas vieram depois, a negarem a legitimidade da propriedade privada, a
defenderem a sua supressão e a substituírem pela propriedade coletiva.
A verdade, porém, está na coexistência destas duas espécies de propriedades, tão legítimas,
tão sagradas, tão necessárias, tanto uma quanto à outra.
A propriedade coletiva, bem longe de ameaçar a propriedade individual, fortifica-a e a
salvaguarda.

338 Para quem nada possui, a propriedade coletiva é consolação por não ser um proprietário e
ao mesmo tempo um estímulo para que venha a sê-lo, e, enquanto espera que lhe seja facilitado o
acesso à propriedade, ela lhe vai possibilitando certas vantagens, ao dar-lhe o direito ao usufruto
de certos objetos, ao uso de certas coisas, ao proporcionar-lhe certos socorros médicos ou outros,
não a título de esmola, mas como comparticipação na propriedade coletiva.
Nunca é demais comprometer os sindicatos a jamais perderem de vista a necessidade de
constituírem um património, que lhes seja indispensável para se desenvolverem, para aumentarem
o número e a importância dos seus serviços, e sobretudo para fundarem instituições de assistência
e de previdência, que devem ser o objeto constante das suas preocupações e dos seus esforços.

§ 8. - Conclusão
339 Em suma, o sindicato, isto é, a associação profissional espontânea como ponto de partida,
a organização corporativa como ponto de chegada, eis aí as vias da reorganização social. Resta a
compreender como é que o ponto de partida se conexa com o ponto de chegada.
A inquirição sobre os sindicatos pelos poderes públicos é o primeiro passo nesta dinâmica.
O segundo seria o estabelecimento, por via administrativa, de colégios profissionais52 cujos
membros seriam chamados ao voto sobre todas as disposições especiais pedidas pelos sindicatos
e julgadas aceitáveis pelo poder.
O terceiro e último passo seria dado pela constituição, sobre esta dupla base do sindicato e
do colégio profissional, de corpos representativos, semelhantes às câmaras de comércio atuais,
encarregadas de compor permanentemente ou em épocas determinadas, dos cadernos das
profissões respetivas, como diziam os nossos pais.

340 Uma tal organização do Estado tornaria o regime representativo uma realidade ao pôr-lhe
as bases sobre o regime corporativo, e seria o melhor fundamento do que se chamava
_________________________________________
52
Trata-se aqui de corporações de estados agrupando os sindicatos livres da mesma profissão como foi
estabelecido na Alemanha.

outrora as liberdades públicas e que se chama atualmente a democracia.


Não estaria longe dessa realidade o obter uma organização do Parlamento ou do Senado
que fosse baseada sobre a representação profissional. É uma ideia que ganha ascendente e talvez
fosse o remédio para a incoerência e para a esterilidade dos nossos parlamentos, composto em
geral de políticos bolhosos e incompetentes.
Sem dúvida, unicamente o fato de uma boa constituição orgânica não bastaria à melhoria
e à grandeza moral de uma nação. Mas podemos dizer qual será a sua condição: «Mens sana in
corpore sano» [Juvenalis Satirae, X, 356].

APÊNDICE
DA PRIMEIRA PARTE
PROGRAMA DAS REFORMAS SOCIAIS CRISTÃS
ADOPTADAS PELA
OBRA DOS CÍRCULOS CATÓLICOS DE OPERÁRIOS

341 I. – Os nossos estudos levaram-nos à conclusão que, como resultado do relaxamento e da


dissolução dos laços sociais, a justiça cristã encontra-se banida da sociedade, e a caridade está nela
reduzida à impotência.
Temos atribuído este fenómeno às falsas doutrinas de que a Revolução se reclamou e fomos
confirmados neste julgamento em diversas circunstâncias pela dição do próprio Sumo Pontífice.
O Papa encorajou-nos a procurar, no restabelecimento dos laços corporativos, os meios
mais eficazes para assegurar aos trabalhadores um justo salário e uma existência conforme à
dignidade humana.
Devemos portanto dirigir todas as nossas iniciativas individuais e orientar todas as nossas
revindicações públicas para esta reforma fundamental, a reorganização corporativa da sociedade.
Dizemos da sociedade, e não de tal e tal dos seus elementos, exclusivamente, pois o respeito igual
pelo direito de cada um, como a harmonia entre todos, não saberiam encontrar uma garantia
melhor.
Prosseguindo sempre neste fim, devemos trazer soluções mais prontas, conquanto menos
completas, aos males mais urgentes, tais quais a impiedade pública, a desorganização da família e
a miséria imerecida, tão frequente nas classes populares.

342 II. – Por conseguinte, vamos inscrever, e logo antes, estas questões vitais no nosso
programa, e trabalharemos a restabelecer a religião, ao reclamar a liberdade da Igreja no seu
estabelecimento, no seu recrutamento, no seu ensino.
III. – No que se refere à família, reclamaremos contra as afrontas feitas à indissolubilidade
do matrimónio, à integridade e à estabilidade do lar doméstico, aos direitos do pai de família.
IV. – No que respeita à sociedade civil, continuaremos com a organização das profissões
em corpos autónomos. Manteremos o espírito e as formas corporativas nas profissões que as
conservaram; introduziremos nas que ainda isso não aconteceu, pelo desenvolvimento do
movimento sindical.

343 V. – Reconheceremos aos sindicatos profissionais, qualquer que seja a condição dos seus
membros nas profissões, as seguintes faculdades:
a.– O direito de propriedade tão extenso quanto o exigem as necessidades da associação;
b.– O direito de jurisdição profissional sobre os seus membros;
c.- O direito de representação junto aos poderes públicos;
De mais a mais, para aqueles sindicatos que apresentam o caráter corporativo, isto é, que
reúnem sem confusões os diversos elementos da profissão (sindicatos de patrões e de operários,
de proprietários e de agricultores).
d.- O estabelecimento de conselhos de conciliação e de arbitragem para prevenir os
conflitos e os resolver.
e.- A preparação dos regulamentos da profissão para os submeter ao referendo profissional
e à homologação dos poderes públicos.
344 VI. – Para a indústria em particular, estes regulamentos devem certificar, de acordo com
a legislação: a proteção da mulher e da criança.
A limitação das horas de trabalho, segundo as condições da profissão.
A interdição do trabalho ao Domingo nas fábricas e oficinas.
VII. – Na agricultura, esforçar-nos-emos por promover Sociedades de consumo e de
produção, de previdência e de crédito, sobre as bases da mutualidade e da solidariedade, em criar
a assistência no campo pelo estabelecimento do património dos pobres e de usos para seu proveito.
VIII. – Este regime corporativo deve estabelecer o salário sobre bases suficientes para o
sustento de uma família média, e ao funcionamento de caixas de socorro para subvencionar aos
encargos resultantes nomeadamente dos acidentes, da doença, e da velhice, etc.
IX. – Não poderia manter-se sem uma especial proteção contra a concorrência estrangeira,
e sem um acordo internacional sobre a legislação do trabalho e do crédito.

345 X. – Declaramos, ao terminar, que nenhuma reforma económica poderia ter sucesso fora
daquela que é a especulação usurária, ou seja, um roubo característico, já que consiste em se
apropriar legalmente dos benefícios do trabalho de outrem.
Invocaremos, por consequência, contra as novas formas do flagelo da usura, o concurso de
todas as forças sociais:
a.– A Igreja, pelas suas condenações renovadas na encíclica pontifícia sobre a condição
dos operários.
b.– A lei, por sua severidade cujo princípio está ainda inscrito no Código penal.
c.- Os poderes públicos, pelas suas medidas fiscais.
d.– Os costumes, enfim, que devem preservar os membros da sociedade cristã do contato
dos usurários de todas as espécies.

SEGUNDA PARTE
Obras sociais
CAPÍTULO PRELIMINAR :
DEVE-SE IR AO POVO

I
346 Deve-se ir ao povo! É urgente!
O mote é de Leão XIII. Impõe-se-nos quer pela autoridade de quem o pronunciou, quer
pela verdade intrínseca ao mesmo.
Deve-se ir ao povo, uma vez que ele se desencaminha, porque se engana, porque é
enganado, induzido ao erro por homens iludidos ou perversos que lhe inspiram as doutrinas mais
funestas.
Deve-se ir ao povo, pois que é infeliz, sem apoio, já não mais tendo as suas velhas
corporações.

347 Como se deverá ir ter com ele? Pela palavra e pelas obras, pela palavra individual e pela
palavra pública, pelas associações religiosas e profissionais. Deve-se ir ao seu lar e à sua oficina.
Deve-se chamá-lo a reuniões e agrupá-lo em associações para o instruir e o consolar, para o assistir
nos seus sofrimentos e o soerguer nos seus abatimentos, para escutar as suas queixas e os seus
desejos, para o dirigir em suas revindicações, para o reconduzir a Cristo, seu amigo, seu irmão,
seu defensor e o seu salvador.

348 Sois sacerdotes? Escutai o Santo Padre: «São os vossos padres sobretudo, dizia ele ao
bispo de Liége,53 que é preciso exortar a ir ao povo; eles não podem ficar fechados nas suas
igrejas e nos seus presbitérios, deve-se animá-los com o espírito apostólico, com idêntico espírito
que animava um São Francisco Xavier, que ia, de cá para lá, por toda a parte, para pregar a
doutrina cristã a todos».
Mas isso não é tudo. Não basta levar ao povo a palavra que instrui e que consola, deve-se
também ocupar de seus interesses temporais e o ajudar a organizar instituições que supram as
corporações desaparecidas.
«A Igreja, diz-vos Leão XIII na encíclica, não se deixa absorver de tal maneira pelo
cuidado das almas que negligencie o que se refere à vida terrestre e mortal. Pelo que respeita em
especial aos trabalhadores, ela faz todos os seus esforços para os arrancar da miséria e lhes
proporcionar uma sorte melhor».
«Estamos ainda persuadidos, diz novamente, que se deve, com medidas prontas e eficazes,
ir em ajuda dos homens das classes inferiores, visto que estão na maioria numa situação de
infortúnio e de miséria imerecida».

349 Mas como remediar ao mal? «Por todas as obras próprias a aligeirar a indigência, diz
________________________________________________
53
Ver a Carta Pastoral, de Monsenhor Doutreloux, sobre a condição dos operários, página 31.

Leão XIII, mas sobretudo pelas corporações».


É um pensamento bem enraizado em Leão XIII. Já na encíclica Humanum genus, tinha
dito: «Para a salvação do povo, desejamos ardentemente ver restabelecer-se corporações
apropriadas ao tempo presente e destinadas a proteger, sob a tutela da religião, os interesses do
trabalho e da moral do trabalhador».
No seu discurso à peregrinação dos operários franceses em 1889, dizia: «O que pedimos é
que se dê nova unidade ao edifício social destruído, ao regressar às doutrinas e ao espírito do
cristianismo, ao fazer reviver, pelo menos no que respeita à substância, em sua virtude benéfica e
múltipla e sob tais formas quais podem permitir as novas condições dos tempos, estas corporações
de artes e ofícios que, outrora, informados pelo pensamento cristão, e inspirando-se da solicitude
materna da Igreja, proviam às necessidades materiais e religiosas dos operários, facilitavam-lhes
o trabalho, tomavam cuidado das suas poupanças, defendiam os seus direitos e apoiavam, na
medida requerida, as suas legítimas revindicações».

350 E Leão XIII não se satisfaz em indicar a via, mas quer que se vá depressa e estimula a
nossa apatia: «Que por toda a parte se atue, diz aos operários franceses em 1891, sem nunca mais
perder um tempo precioso em discussões estéreis».
«Que cada um, diz na encíclica Rerum novarum, se ponha ao trabalho que lhe incumbe e
tal sem espera: ao diferir o remédio, o mal ficaria incurável». - «Que os ministros sagrados
desenvolvam todas as forças da sua alma e todas as indústrias do seu zelo».

351 A estes conselhos, a estas ordens tão formais e tão pressurosas do Papa, poderíamos ajuntar
cem comentários episcopais. É inútil. Escutemos apenas o Cardeal Langénieux fazer, como ele
mesmo o diz, «o processo ao amorfismo, à lassidão, ao desencorajamento».54
«Pois então! diz ele, é quando, conforme a opinião geral, que as almas se perdem em
massa; quando elas são varridas por todos os quadrantes de ventos doutrinais; quando os
costumes perigam; quando a religião é vilipendiada e perseguida; quando a Igreja luta pelas suas
mais santas liberdades; é quando o inimigo se desmascara e nos declara que entre ele e nós, é
uma questão de vida ou de morte; é quando sentimos a nossa influência baixar e os nossos
vacilarem; é quando debaixo dos nossos olhos se perdem e se afastam gerações inteiras, que não
haveria nada para fazer?
Não, meus senhores, eu me recuso a ver nisso a última palavra da nossa situação.
Infelizmente, não há senão demasiado para fazer!
Longe de nós estas apreensões que ultrajam a nossa fé e paralisam a nossa ação!...

352 Não esperemos quais as circunstâncias mais favoráveis, os melhores dias, os tempos mais
oportunos…
Padres e leigos devotados, façamos obras. A salvação é a este preço.
O padre que tem o encargo das almas não mais se pode contentar de exercer o seu
ministério ordinário à sua volta, ele deve entregar-se ao apostolado no senso mais rigoroso da
palavra. E o apostolado no ministério, é na maior parte, o que se chama as obras, quer dizer, esta
forma especial de ação exigida pela natureza das coisas, e mais adaptada às dificuldades dos
tempos… As obras, é o esforço desesperado do pastor que faz apelo a todos os recursos do seu
zelo e da sua inteligência para sair, apesar de tudo, do círculo de impotência onde se o quer
____________________________________________
54
Discurso na Assembleia diocesana de Charleville, a 6 de Agosto de 1889.

fechar, para rasgar novas vias do lado das almas à medida que se fecham as antigas, para lutar
frente a frente contra o mal. Esconjurar todos os deveres, fazer parar todos os golpes atacantes,
e pensar todas as feridas recebidas».
353 Aí está, com certeza, o que são palavras generosas e valentes.
O bispo de Liège não deixa dormir de forma nenhuma os que ele chama «preguiçosos e
medrosos».55
«Se há homens de iniciativa muito precipitada, diz, há-os muito mais do que se deixam
dominar seja apela apatia, seja pelos temores exagerados e por terrores imaginários: não há mais
nada para fazer, é irrealizável, dizem esses tais. Um padre que vê as suas ovelhas se perder não
deve facilmente tranquilizar a sua consciência com semelhantes motivos…».
Portanto, estamos entendidos, é preciso ir ao povo através das vias que nos abrem as novas
obras. Deus o quer!

II
354 Por isso a ação católica, deverá ela ser hoje diferente do que era para as gerações
anteriores? Sem qualquer dúvida. – A doutrina da Igreja portanto teria variado? De forma
nenhuma, mas foram as circunstâncias que ficaram completamente mudadas.
Esta necessidade de uma nova ação para questionar as novas carências constitui o pano de
fundo da encíclica. Também é o ensino dos nossos bispos que faz ecoar aquele do Papa.

355 Escutai ainda o cardeal Langénieux: «A nossa geração viu se operar, sob a influência de
causas múltiplas, uma repentina transformação, que modificou as condições da vida nas nossas
sociedades modernas.
Os esforços da impiedade introduziram nas massas populares um enfraquecimento geral
da fé. A indústria subtraiu o operário ao seu lar familiar para o atrair à fábrica e à oficina, que
se tornaram muito frequentemente centros de irreligião e de imoralidade, de modo que, hoje
efetivamente, uma parte considerável das populações está fora da ação do padre.
O ministério pastoral, encontrando-se em face de novos elementos, deve dobrar-se
evidentemente às necessidades do momento e responder às exigências dos tempos, como o fizera
em todas as épocas da história desde há dezoito séculos; daí as nossas obras que dão à atividade
do sacerdote um caráter mais apostólico e permitindo aos leigos de lhe trazer um concurso cada
vez mais útil e por vezes indispensável.

356 Anteriormente o ministério sacerdotal exercia-se em condições normais; o espírito de


religião estava vivo no seio das populações; até mesmo a indiferença lhe era simpática; vinha-se
à igreja e o padre, respeitado, exercia na paz um ministério que podia realmente se chamar
pastoral.
Completamente diferente é a situação de hoje. O padre perdeu a sua influência. Ele tornou-
se suspeito, em particular nos centros populosos onde a sua ação pessoal não chega a ter acesso,
nem que fosse pela única razão indireta, das relações puramente sociais.
________________________________________
55
Carta pastoral já citada, página 28.

Logo pois a necessidade para padres e leigos cristãos de criar novas obras que respondem
às carências atuais das almas e da sociedade».
357 O que afirmam bispos, teólogos e moralistas o repetem : «As mudanças sobrevindas na
situação social e nas disposições dos homens, diz o padre Lehmkuhl, um dos moralistas mais
autorizados, arrastam necessariamente uma mudança de processos no cuidado das almas.
Seria para um pastor, esquecer inteiramente o seu dever o não estabelecer e desenvolver
vigorosamente associações na sua paróquia…».56

358 Duas brochuras de direção sacerdotal foram aprovadas por todos os nossos bispos e
distribuídas nos nossos retiros diocesanos. Elas têm por títulos: o padre e a situação atual da
Igreja. – O padre segundo o Coração de Jesus no tempo presente. Ambas nos dizem que o
«ministério ordinário do padre não mais pode ser suficiente neste tempo». Ambas enumeram os
novos deveres de ministério pastoral que são: «A criação de associações cristãs, as relações
efetivas com os fiéis, e o cuidado particular dos homens e dos jovens».
Que contraste com os nossos velhos diretórios e manuais de obras!
Tomai, por exemplo, um excelente manual de obras rurais publicado em 1865. Ele chega
ao ponto de elevar em princípio que nada há a fazer, ou quase nada, em favor dos homens. Ele
não propõe senão obras para mulheres e moças e, no máximo, pequenas patronagens em favor dos
rapazinhos. «Não façamos ilusão, afirma, nas paróquias medíocres, a massa da geração adulta
regressará à religião? Talvez não colheremos nela senão algumas espigas. Mais uma razão para
que nos ocupemos da geração infantil e da geração moribunda, quer dizer, das crianças e dos
doentes. Não há outro caminho: é a regra, é a lei». E o piedoso manual acrescentava: «Foi assim
que Nosso Senhor fez».
Aí está até aonde chegou a ilusão dos padres piedosos.
Eles viram aumentar o mal. E assistiram à apostasia de um povo inteiro, e fizeram…
associações de moças.
E, além disso, acreditaram ter lido no Evangelho que Nosso Senhor fizera igual a eles!

359 O livro inteiro está imbuído desse espírito.


«As crianças, os velhos, os pobres, os doentes, os aflitos, diz, eis os cinco dedos do
apostolado no campo». E o livro não fala mais senão deles.
«Para os outros, afirma, os pais, mães, rapazes, jovens em geral, entregues aos negócios,
às preocupações interesseiras, ao prazer, não há a mesma facilidade, os mesmos meios de entrar
em relação com eles, sobretudo se não vierem à igreja. Com estes, contentemo-nos de esperar».
E o prefácio nos informa que o livro está a tornar-se o manual dos seminários e dos jovens
padres, que as edições se esgotam rapidamente. E diretores de seminários escrevem que estão
encantados do aparecimento deste volume, que o propagam e que esta é exata direção que se deve
dar ao ministério pastoral.

360 Há com certeza, no fim do livro, uma monografia de associação laica e apostólica.
Apressei-me a lê-la e encontrei que a associação modelo se compunha de três senhoras e de cinco
moças, e que o regulamento as comprometia a reunirem-se ou a se escreverem ao menos
____________________________________________
56
O Clero e o povo católico, página 22.

três vezes no ano, para se darem a conhecer o que tinham feito e observado…
Tal é o espírito que reinou em muitas dioceses, desde 1825 ou 1830 até aos nossos dias. E
tudo foi organizado sobre esse tom e sobre essa nota: ofícios, pregações e associações.
E agora como se espantar que o povo tenha acabado por dizer que a religião é feita para as
mulheres e para as crianças!

361 Esta geração pusilânime mudou-nos Cristo. Já não é mais o Cristo dos operários,
«pauperes evangelizatur» [Mt 11,5], o mesmo Cristo que exercia o seu apostolado incessante junto
dos pescadores, dos publicanos, dos homens do mundo, «non veni vocare justos, sed peccatores»
[Lc 5,32]. O Lião de Judá foi metamorfoseado numa ovelha medrosa. O nosso Cristo, cujo
apostolado poderoso e forte inspirou os Paulo, os Xavier, todos os conquistadores de almas,
transfigurou-se num homem tímido e fraco que não se dirige senão às crianças e aos doentes.
Sabe-se até aonde nos levou um meio-século desta deplorável ilusão.
A reação já começou. A Obra dos Círculos, fundada por valentes graduados, não contribuiu
com pouco para isso.

362 E Leão XIII, abarcando, com seu olhar elevado e profundo, o mal e o remédio, traçou
magistralmente a via na sua grande encíclica: «Que os ministros sagrados, diz, desenvolvam todas
as forças da sua alma e todas as indústrias do seu zelo para inculcar nos homens de todas as
classes as regras evangélicas da vida cristã». E ele mesmo nos mostra o que a sociedade pode
esperar da Igreja: a promoção dos operários e o ensino das regras da justiça e da caridade que
devem presidir à reforma das leis e à organização profissional.

363 Na sequência do Papa, a teologia pastoral diz-nos presentemente: É preciso ocupar-se


principalmente dos homens. Deve-se conformar o exercício do cargo pastoral às suas carências,
nas paróquias. Deve-se ir à sua procura e os levar a ter relações pessoais com o pastor. Devemos
facilitar-lhes a receção dos sacramentos, tomando o seu tempo e ajustando-a às circunstâncias em
que lhes seja mais cómodo.
«E nas outras funções sacerdotais que visam a paróquia inteira, deve-se prestar atenção aos
gostos e às necessidades dos homens. Nas devoções, na pregação, no ensino, o cuidado com os
homens deve ser, senão exclusivo, ao menos predominante».
Todas estas palavras são de Lehmkuhl. Estão exatamente a contrapé do que lemos
anteriormente. Tudo se fará mas… existem hábitos adquiridos e enraizados, há uma longa rotina
e preconceitos. Não se está mais habituado e desconhece-se o modo.
Possa este pequeno manual ajudar-nos algo nesse sentido!

III
364 Portanto é preciso fazer obras novas e obras de homens, mas quais?
Entre estas obras, diz-nos Leão XIII: «O primeiro lugar pertence às corporações que
abraçam em si, mais ou menos todas as obras»
«É com alegria, acrescenta, que vemos se formarem por toda a parte Sociedades deste
género, sejam mistas, sejam compostas apenas dos operários… Elas devem fornecer a cada um
dos seus membros os meios mais apropriados a que atinjam o seu fim, que consiste no maior
aumento possível dos bens do corpo, do espírito e da fortuna… sem esquecer o fim principal que
é o aperfeiçoamento moral e religioso».

365 Como então? O padre vai-se ocupar de coisas temporais? Ir-se-á ele agregar a associações
que têm por fim interesses materiais?
Sim, ele deve fazê-lo, com a ajuda de leigos devotados se os encontrar, e o seu zelo
suscitará alguns. O seu ministério não atinge o maior número daqueles que têm necessidade disso.
«O meio de fazer regressar estas almas ao cuidado da sua salvação, nota Monsenhor o bispo de
Liège, era difícil de encontrar, mas existia, e Leão XIII nos indicou. A sorte material desta
multidão deve ser melhorada, ela o sente, e o reclama, a justiça e a caridade o comandam. Ora,
o padre é o defensor da justiça e o ministro da caridade. Que ele tome a peito esta causa, que tem
a missão divina de proteger; que preste o socorro da sua palavra, da sua ação, da sua influência:
as relações que nascerão, entre ele e os operários, não irão contribuir apenas aos interesses dos
trabalhadores e ao seu bem-estar temporal, mas também para sua vantagem espiritual e para a
salvação das suas almas. Sim, é a via a seguir para salvar estes infelizes irmãos e suas famílias,
para os impedir de se deixarem arregimentar nas fileiras dos inimigos da sociedade e da religião».

366 Mas enfim, como organizar estas corporações e que obras acrescentar-lhes?
Como organizá-las? Infelizmente! Só da maneira como permite a lei francesa, com a dose
discreta de espírito religioso que as nossas leis laicistas fazem coar, até que chegue o tempo de
partirmos as cadeias da nossa triste escravatura.
Portanto, faremos sindicatos provisoriamente que ficarão a ser embriões de corporações.
Para honrar a palavra do Papa, meteremos à cabeceira do Manual, o Guia prático dos
sindicatos.
As outras obras sociais serão, em geral, os frutos e a coroa dos sindicatos. Assim, as caixas
de crédito agrícola, as caixas de família ou de socorro mútuo, os círculos e os patronatos rurais, os
círculos de estudo e as conferências, os secretariados do povo, etc. Em tudo isso há matéria para
alguns capítulos muito úteis.

367 As escolas livres também são uma obra nova, necessitada pela apostasia do Estado. Ela
tem o seu lugar marcado no Manual.
É preciso um apontamento breve sobre algumas obras antigas às quais podemos dar um
jeito mais apostólico.
A Boa Imprensa é uma obra social e moderna. Já é uma obra conhecida, bastará dá-la a
recordar brevemente.
Cremos útil, enfim, de relembrar o método pelo qual se opera numa obra tão antiga de
apostolado e recomendada pelos antigos cânones da Igreja, e que consiste na visita anual à
paróquia. Esta visita bem conduzida irá preparar as associações e fornecer os elementos para elas.

368 Tal é o nosso belo programa. Depois de o ter exposto, damos a conclusão com Paulo
apóstolo (epístola a Tito) e com o cardeal Langénieux que o comenta, ao exortar «os padres e os
leigos a começarem e a excitarem-se com uma santa emulação sobre esta forma apostólica do
ministério discant nostri bonis operibus praeesse; que ousem mesmo assim, pelo estudo dos meios
práticos, em criar e dirigir estas obras que visam diretamente as necessidades atuais das almas e
da sociedade, ad usos necessarios. Então os pastores não mais se consumirão num ministério
infrutuoso por não estar esclarecido e que nunca age em condições eficazes, ut non sint
infructuosi. Os leigos cristãos também aprenderão em nunca se aniquilarem no desânimo, ao se
fecharem no círculo egoísta das obrigações domésticas, e tornar-se-ão auxiliares poderosos de
seus pastores, para o maior bem da pátria cristã e da Igreja».
PRIMEIRO CAPÍTULO
A CORPORAÇÃO E A OBRA DOS CÍRCULOS
369 Aqui está ainda uma vista geral e um capítulo preliminar.
Não consiste contudo num despropósito neste Manual prático.
Há qualquer coisa que domina as obras, é o espírito de que são animadas, é o fim geral que
elas têm em vista.
Temos de reconstruir um regime corporativo.
As corporações são órgãos naturais da vida social. Elas têm o seu lugar marcado nas
famílias e nas sociedades superiores, cidades, províncias e reinos.
Elas congregam homens que têm um mesmo interesse profissional. O seu fim direto é
temporal. Numa sociedade cristã, são animadas de uma vida religiosa através das confrarias às
quais estão aliadas.
Conhecemos as corporações do passado, a sua magnífica organização, os imensos
benefícios que tributaram à sociedade, depois as suas imperfeições, os seus abusos e o seu
afundamento no cataclismo revolucionário.

370 Mas não se pode violentar por mais tempo a natureza. Ela reclama os seus direitos. As
corporações faltam-nos, sentimos isso e queremos que elas renasçam.
Sentíamos desde o começo deste século que o mundo do trabalho estava no mal-estar. O
mal cresceu. Fomos apanhados de surpresa sobre o enfraquecimento da nação na ocasião da guerra
e da fermentação anárquica que aconteceu durante a Comuna. Procurámos o remédio.
Os fundadores da Obra dos Círculos, com uma clarividência que lhes presta honra,
disseram-nos: «O que falta é a vida corporativa, com todo o concurso moral e material que essa
contribui para o mundo do trabalho». E acrescentavam: «Mas as corporações estão proscritas
pela lei; precisa-se pois de contornar a dificuldade e fazer com que o espírito corporativo reentre
nos costumes, fundando as associações que se puder fundar».
Uma única forma de associação era possível, o círculo. Eles compuseram a esse respeito
uma Instrução sobre a Obra, tratado encantador. E fizeram dele, como afirma com razão a nova
Instrução sobre a Obra, uma das formas modernas mais perfeitas da antiga confraria. Mas, além
disso, fizeram do círculo, um centro de propaganda da ideia corporativa, ao indicarem sempre a
corporação como a forma lógica do desenvolvimento completo da obra. Eles sempre nos indicaram
o círculo como o ponto de partida e a corporação como o ponto da chegada.

371 E estas ideias abriram tão bem o seu caminho, que se impuseram aos poderes públicos, e
o Estado deu-nos a lei de 1884, que permitia um ensaio sobre as corporações com o nome de
sindicatos profissionais.
Bem mais, a autoridade suprema da Igreja veio encorajar e sancionar este apostolado. Na
encíclica Rerum Novarum, Leão XIII diz-nos: «As Sociedades de socorro mútuo, as obras de
previdência e de patronado são excelentes, elas concorrem para aliviar a indigência e a
reaproximar as classes sociais; mas o primeiro lugar pertence às corporações operárias, que, nelas,
abraçam mais ou menos todas as obras!...».

372 Mas qual será a forma definitiva das corporações no futuro? Ninguém poderá dizê-lo. Leão
XIII disse-nos: «Nós não cremos que se possa dar regras seguras e precisas para determiná-las
em detalhe».
Que fazer então? Deve-se agir, avançando em todas as aberturas que nos estão acessíveis
para nos aproximarmos do ideal corporativo, cujos principais elementos são a associação
autónoma e livre, agrupando pessoas com a mesma profissão, com vista a salvaguardar a honra do
ofício e os interesses profissionais, com o direito de propriedade e de jurisdição e de adjunção de
um liame religioso e de instituições de socorro e de previdência, e a participação à vida social e
política por uma representação pública.
A nova corporação irá preencher todas estas condições? Não está certo. Várias destas
funções poderão ser preenchidas por um organismo mais largo imposto pelo Estado. A jurisdição
profissional, as instituições de socorro e de reforma poderão ter quadros diferentes dos da
corporação.
Podemos afirmar que o nosso mundo económico está à procura de uma nova organização.
Que resultará disso exatamente? Quem poderia dizê-lo ?
Tudo deveria ser feito através das corporações. O Estado não deveria intervir senão para
encorajar e proteger. A sua mão pesada poderia deitar tudo a perder ao introduzir nos melhores
pratos um condimento envenenado de política, de parcialidade, de centralização exagerada, de
administração custosa e de tirania.
Ajamos por nós mesmos e o mais cedo possível.

373 É bom o plano da Obra dos Círculos. Quando mal os círculos eram possíveis, ela deu-nos
uma magnífica florescência de círculos. Agora, ela faz a sua evolução.
As últimas modificações à Instrução sobre a Obra dizem-nos que é preciso ouvir o nome
da obra, no sentido lauto, e que se poderia chamar igualmente a Obra das associações católicas
operárias.
Elas acrescem que o novo florescimento das obras económicas, sindicatos, caixas rurais,
caixas de família, etc., responde perfeitamente ao fim primitivo da Obra dos Círculos; que os
sindicatos, em particular, se forem animados do espírito cristão, realizam superiormente a forma
da Obra.

374 A Obra dos círculos, todavia, não mais nos diz nos tempos de hoje: «Façais círculos a
qualquer preço». Ela diz-nos pelo contrário: «Aproveitai largamente das facilidades que vos são
concedidas pela lei de 1884. Façais sindicatos. Animai-os do espírito cristão pela confraria.
Aumentai-as com as obras anexas, caixa de crédito, caixa de socorro e de reforma, etc., e tereis
dado um grande passo para a promoção do regime corporativo».
Portanto podemos apelidar a nós mesmos, neste manual, os verdadeiros discípulos da Obra
dos círculos.

375 Nós nos apoiamos sobre as mesmas bases que são a afirmação católica, a participação dos
operários ao governo interno das obras e a dedicação da classe dirigente para com os trabalhadores.
A vantagem de um comité, que se considera essencial na Obra dos círculos, é, segundo o
ponto de vista prático, o de buscar a continuidade para uma empresa pessoal, e, sob o ponto de
vista teórico, o de dar às classes superiores o seu lugar na sociedade cristã pondo-as ao serviço das
classes populares.
Contudo diremos de boa mente sobre as nossas obras corporativas o que diz a
administração do La Croix sobre a sua obra de boa imprensa: «Temos por Comité até mesmo um
homem só, que queira se dedicar à obra, à espera de melhor».
Se encontrarmos um pároco ou um leigo cristão que queira fundar uma obra económica e
corporativa, não lhe diremos: «É preciso esperar absolutamente que tenhais um comité».
Antes, lhe diremos: «Se estiverdes sós para começar, começai só, mas desde que possais,
devereis recrutar alguns homens devotados para convosco formar um comité de patronado sobre a
vossa obra».
376 Diremos portanto a todos os homens de boa vontade: «Ligai-vos à Obra dos Círculos, que
é, em França, a fonte de todas as obras corporativas. Aproveitai o seu laço religioso, dos favores
espirituais de que a Santa Sé lhe cumulou, das suas luzes, dos seus documentos, dos seus
congressos. Dirigi-vos desde o começo ao seu secretariado, 262, avenida Saint-Germain, em Paris,
para ser agregado à obra».
Nós não queremos ver neste manual de obras sociais senão um suplemento ou um
complemento ao manual da Obra dos Círculos.
Desenvolveremos particularmente neste manual a questão dos sindicatos rurais ou
agrícolas, por ser a obra urgente para a qual devemos empregar todos os esforços para impedirmos
a proliferação do socialismo pelo campo. Este género de sindicatos, aliás, é o mais fácil e o que
produz de seguida uma organização corporativa mais ou menos completa.

377 Descreveremos nas monografias, as corporações da usina do Val-des-Bois e de Lille.


Quanto às corporações de artes e ofícios, o problema está menos fronteiro. Façamos
sindicatos cristãos de artes e ofícios, mas os não-cristãos farão também, e provavelmente o Estado
agrupará uns e outros em corpos de profissões, de tal modo que uma parte das funções corporativas,
como a jurisdição profissional, o arbítrio, as instituições de previdência e a representação pública
serão talvez repletas pelo corpo do ofício, enquanto que o concurso moral e religioso, o socorro
mútuo, a união familial e outros benefícios mais íntimos seriam fornecidos pelo sindicato livre e
cristão. É ao menos o que parece mais provável no estado atual das coisas.

CAPÍTULO II
A RESPEITO DA VISITA ANUAL À PARÓQUIA
DO SEU PASTOR57
378 Não se trata nisso de uma associação, mas de uma obra pessoal, tão antiga como o
apostolado, e prescrita pelos cânones da Igreja. Ela tem o seu lugar neste manual, por ser um meio
ordinário e natural de preparar as associações.
«O bom pastor conhece as suas ovelhas» [cf. Jn.10,14]. É a regra dada pelo Pastor supremo
no Evangelho.
Se o pastor não conhece as suas ovelhas, como poderá ele as amar? Como poderá tomar
cuidado delas? E como as poderá conhecer senão as visitar?
A visita anual da paróquia foi sempre considerada pela Igreja como obrigatória. Muitos
concílios regionais prescreveram-na. Ela, aliás, é a única maneira de conservar com regularidade
«O Livros das almas». Ora, este «Livro das almas» foi posto no Ritual romano ao mesmo pé do
que os registos de batismo, casamentos e óbitos. Ele deve ser conservado em cada paróquia.

379 Os padres que todos consideramos como modelos, o padre Holzhauser, o padre Vuarin de
Genebra, e os outros mantinham este «Livros das almas» com um cuidado extremo.
Os estatutos de certas dioceses pedem somente que a visita seja feita ao menos todos os
dois ou três anos. Sem dúvida que é uma concessão baseada sobre o pequeno número de padres e
a sua excessiva ocupação.
Certos estatutos também pedem que o «Livro das almas» contenha notas detalhadas sobre
cada família. Isto não nos parece conveniente. Os escritos podem sempre se tornar indiscretos. É
preciso escrever simples boletins de família com as datas do batismo, da primeira comunhão, da
confirmação, de matrimónio. Para o resto, a memória irá remediar. Se esta visita foi sempre útil e
mesmo necessária, ela o é cada vez mais.

380 Antigos manuais das Obras e, em particular, o da Obra dos campos, falaram bastante do
assunto. Eles indicam alguns dos frutos que se poderá esperar desta visita. Vamos assinalá-los e
completá-los.
1º. Antes de mais é o autêntico meio de conhecer todos os seus paroquianos, católicos e
indiferentes, pais e filhos, velhos, enfermos, domésticos. – E se estamos encarregados de todas
estas almas, não deveremos conhecê-las com suas próprias carências e dar-lhes os socorros
diversos que esperam do nosso ministério?
Alguns objetarão que a sua paróquia não é grande, que já conhecem as suas ovelhas, que
as veem na igreja, que as encontram com frequência.
Responder-lhes-emos que a vista dos paroquianos na igreja e o seu casual encontro na rua
não têm os mesmos efeitos que uma visita domiciliária. Uma visita do pastor e uma conversa
paternal exprimem uma atenção do coração que honra a família visitada e lhe deixa a impressão
de deveres recíprocos a cumprir.
_______________________________________________
57
Este capítulo destina-se em particular ao clero das paróquias.

381 2º. É um meio de agradar. – Cada um é honrado de ter recebido a visita do seu pároco. É
preciso para tanto, claro está, ver toda a gente, mostrar-se bom e afável para com todos e em cada
casa informar-se sobre cada um.
Vários paroquianos, infelizmente, não terão outra relação com o padre durante o ano, e a
recordação duma visita caridosa poderá constituir nos últimos momentos da sua vida o motivo
determinante para que chamem um padre que será o instrumento da sua salvação.
382 3º. É um meio de fazer descobertas úteis. – Descobertas de misérias a socorrer,
insuficiência de leitos, indigentes, velhos, enfermos, para os assinalar às obras de caridade. –
Descoberta de misérias espirituais: uniões ilegítimas que não esperam senão um bom conselho ou
a procura de motivos para se regularizarem, primeiras comunhões e confirmações em atraso;
crianças sem frequentar as escolas e o catecismo. – Descobertas de virtudes escondidas, de almas
generosas, de corações apostólicos, que não esperam senão secundar o bem pela prece, pelas
associações e pelas obras.

383 4º. Meio de provocar obras de misericórdia. – Não é preciso pedir para as suas próprias
obras na visita anual. Esta visita deve ser completamente sem interesse. Mas não será fácil
interessar algumas famílias abastadas aos sofrimentos das famílias pobres? O relato discreto das
misérias que se testemunhou irá suscitar socorros. Ter-se-á prestado por esse meio um duplo
serviço ao ajudar o pobre e ao dar ao rico a ocasião de fazer uma obra meritória.

384 5º. É um meio de chamar à igreja. – Não é o caso de que se proceda com repreensões e
praticar muitas vezes o «compelle intrare» [Lc.14,23]. Precisa-se nestas visitas muito tato e
prudência. Em certos lugares de fé, pode-se ainda falar com autoridade e recordar firmemente a
cada um o seu dever. Mas mais frequentemente na França é preciso contentar-se com uma visita
cortês e isso será suficiente por vezes para fazer voltar alguns paroquianos à igreja. Uma visita não
provocará uma outra?
É sem dúvida supérfluo lembrar de passagem que os pequenos presentes entretêm a
amizade e que se ganha os pais ao interessar-se pelos seus filhos. È fácil ser generoso com pouco
dispêndio. Encontra-se na Casa da Boa Imprensa, 5, rua Bayard em Paris, Vidas de santos
ilustrados a um ou dois cêntimos cada uma, e com bonitas imagens apropriadas para crianças.

385 6º É a maneira de preparar as obras sociais. – Pode-se encontrar nesta visita os elementos
das associações e preparar o seu agrupamento. É a melhor forma de estudar o terreno, de sondar
prudentemente as boas vontades e de fazer desejar as obras.
Ao contar o que se faz noutras partes, ao deplorar o isolamento dos agricultores, as
dificuldades do crédito, as vantagens que se poderia tirar das novas obras, prepara-se os espíritos
para a fundação destas obras e conduz-se os paroquianos a que eles mesmos peçam, o que com
frequência é a condição do sucesso.

386 7º. Também é um meio de espalhar a boa imprensa. – Digamos simplesmente aqui o que
vimos à nossa volta. Num cantão vizinho, todos os párocos, estimulados pelo arcipreste, fizeram
a visita à sua paróquia. Eles disseram a cada família: gostaríamos de ver na vossa casa a Vida dos
Santos, que é uma publicação hebdomadária ilustrada que vos daria interesse tal como vos iria
edificar. Vós podereis obtê-la de modo barato tal como uma folha mais ou menos parecida, as
Conversas ao Domingo exposição popular das verdades da religião. – Em todas as moradas onde
se sabia ler, aceitou-se com alegria. Desde então, os embrulhos postais chegam às paróquias, à
beira do caminho-de-ferro, e daí distribuídos cada Sábado em todas as paróquias do cantão.
Muitos padres perguntam-se como poderão espalhar as assinaturas ao Lacroix, eis um meio
seguro e fácil.
387 Certos párocos se dispensam do dever da visita, ao se desculparem pela grande quantidade
da população da sua paróquia. Por conseguinte, bastará cumprir com os deveres fáceis e omitir os
que mais nos custam?
Estas paróquias demasiado populosas são uma das grandes chagas do nosso tempo. É uma
das consequências mais funestas da Concordata, que não nos permite, ao menos na sua
interpretação oficial, de fundar paróquias sem o acordo do Estado.

388 As antigas prescrições canónicas não admitiam paróquias de mais de 6.000 almas,
precisamente por causa do dever primordial que tem o pastor de conhecer as suas ovelhas.
Hoje, temos, em Paris, paróquias de 90.000 almas. É completamente insensato.
Nesta situação absolutamente intolerável das nossas cidades, será preciso que o pastor
renuncie a conhecer as suas ovelhas? De modo nenhum. Pensamos que ele, pelo contrário, deveria
renunciar ao seu cargo, pois que não se pode ser um bom pastor sem conhecer as suas ovelhas.
Portanto que fará? Ele irá fazer o que já se faz em excelentes dioceses onde o zelo inteligente dos
pastores conservou a fé: ele irá partilhar com os seus vigários as ruas e os bairros da sua paróquia
e fazer visitar pelos seus auxiliares os que ele mesmo não puder visitar.

389 Mas não saberíamos melhor descrever este desenvolvimento da ação pastoral do que fez
um recente livro: A paróquia de São Paterno, no passado e no presente, pelo senhor padre Surcin,
na editora Herluison, em Orleães.
Peçamos-lhe emprestada esta página.
«Numa paróquia que tem a extensão e a população da de São Paterno,58 é impossível a
um padre de se meter em relação direta com os seus paroquianos, e de se transportar
instantaneamente a todos os pontos em que se fazem sentir as necessidades religiosas. Os
paroquianos não conhecem o seu clero, o clero não conhece o seu povo, e esta ignorância mútua
do padre e do povo é um obstáculo para todo o bem. O pároco de São Paterno portanto pensou
dividir a paróquia e confiar a cada cura uma seção determinada, e já desde há seis anos esta
organização funciona e produziu os melhores resultados.

390 Esta divisão por bairros tem a grande vantagem de dar aos paroquianos um padre que os
conheça e que os visite, que seja deles conhecido e que esteja especialmente à sua disposição para
os seus doentes, para o consolo dos pobres, para a educação cristã das crianças, para todas as
carências religiosas em suma.
O cura do bairro tem a vigilância e a administração religiosa do bairro que lhe foi
confiado. Ele ocupa-se das crianças, do batismo dos neonatos, do recrutamento das escolas
cristãs, dos catecismos para pequenos e grandes. Ele se esforça tanto quanto possível para que
cumprem o seu dever pascal.
Ele procura descobrir os enfermos e os visita, de modo a não os deixar no isolamento e
____________________________________________
58
O bairro São Paterno, outrora arredores de Orleães, atualmente está dentro da cidade.

no distanciamento das práticas religiosas. Todas as vezes que se vem procurar um padre, sem o
designar pelo nome, é o vigário do bairro que se dirige junto ao doente.
Ele descobre os pobres envergonhados e os alivia, de acordo com o pároco, com as
religiosas, as senhoras benfeitoras e as obras caritativas da paróquia.
391 Ele trabalha para o recrutamento das associações paroquiais. Faz entrar os homens
cristãos na Confraria do SSmo Sacramento, as mulheres na Associação das mães cristãs.
Ele visita o seu bairro, o mais frequentemente possível, e tem um registo que contém os
nomes, a rua e o número de todos os fiéis confiados a seu zelo.
Ele rodeia-se dalguns leigos cristãos e apóstolos, que o ajudam com seus conselhos, seus
empreendimentos, sua cooperação. Numa palavra, ele pertence inteiramente aos habitantes do
seu bairro e tem sem cessar os olhos abertos e a mão estendida para os acudir nas suas carências
espirituais e materiais.
Está claro que esta divisão da paróquia nada tem de absoluto nem de matemático e que,
quer o pároco quer os curas, ficam à disposição de todos os fiéis, qualquer que seja o bairro onde
vivam».

392 Acrescentemos, como último conselho, que a visita deve ser uma visita substancial, uma
visita de um quarto de hora ao menos. É a de um pai que visita os seus filhos.
O mês de Janeiro é um tempo favorável, mas a visita pode repartir-se sobre várias semanas,
sobre vários meses, segundo a importância da população.

CAPÍTULO III
POR ONDE SE DEVE COMEÇAR E COMO PROCEDER ?
393 É a primeira questão que se põe a todo o homem investido de uma autoridade moral ou
positiva sobre outros de que desejaria fazer emprego para o bem.
Pároco na sua paróquia; cura sob as ordens de um pároco; católico colocado num lugar de
honra entre os homens; chefe de indústria empregando numerosos operários; proprietário ou
senhor agrário à cabeça de uma exploração agrícola: qualquer que, levado pelo desejo de preparar
a renovação moral e religiosa do nosso infeliz país, quer utilizar em proveito de Deus, da Igreja e
da França, a influência que a Providência lhe pôs nas mãos, encontra-se a mais das vezes em
combate com as incertezas e as hesitações do começo.
Por onde começar?
Responderemos: Por vós mesmos.
Antes de tudo, padre ou leigo piedoso, é bem necessário acostumar-se ao pensamento que
não sois feitos apenas para a câmara nem para a sacristia; que sois, vós mesmos, o sal da sociedade
e a luz da vida social; que deveis ir aos homens, tanto ou mais que às mulheres e às crianças; que
é injuriar Cristo agir diferentemente; que o vosso mestre, enfim, e o vosso modelo reuniu apóstolos
e discípulos e não limitou a sua ação ao apostolado das crianças.

394 Bem compenetrados deste pensamento básico, não vos deveis deixar levar pelos tímidos.
Não vos esqueçais que viveis no meio de um mundo no qual a verdadeira inteligência do
apostolado é abocanhada desde há duzentos anos. O jansenismo passou por aí, depois o
galicanismo, a revolução, o liberalismo e o racionalismo.
Todas estas negações da ação social cristã acumularam-se. A nossa sociedade está
completamente mergulhada nelas. A atmosfera das almas está assim totalmente saturada delas. O
erro esconde-se atrás dos nomes de prudência, de reserva, de moderação, de impossibilidade.
Certos castelos tremerão ao ouvirem os vossos sonhos de apostolado popular.
Se fordes padres, alguns confrades mais velhos, que não conheceram senão os velhos
métodos, olhar-vos-ão como utopistas. Leigos piedosos, e outros devotos irão gemer acerca da
vossa temeridade. Todas estas boas gentes não vêm com prazer os indiferentes nos dizer que a
religião é boa para os velhos, para as mulheres e as crianças, mas tudo fazem, sem se questionar,
para que tal se diga.

395 Jamais concebem eles que o padre possa sair para outra coisa do que para visitar doentes
e para conduzir comboios mortuários, e espantam-se que o povo compare o padre a um pássaro
fúnebre.
Ide aos vivos, ide aos homens, ide ao povo, e não mais sereis comparados com o triste
pássaro dos funerais.
O nosso século tem sede de ação religiosa. A doença aguda da sociedade presente é a
ausência da vida religiosa, é a ausência do padre. Não escutais os seus médicos diagnosticar o seu
mal? Os filósofos, os pensadores, os economistas no-lo dizem. Ouvistes Le Play, Littré, J. Simon,
Brunetière. A sociedade morre por carência de religião. É o grito de todos os homens inteligentes
à vista da atual desordem moral. É o Canossa da filosofia racionalista, da política perseguidora, e
da economia social separada.
O povo vê o mal e procura a solução, cabe a vós de a oferecer. Depois de estardes bem
convencidos e aparelhados na resolução de passar à ação, qual método seguireis?
Isso torna-se mais fácil.
396 Não percais de vista os modelos, Cristo e os apóstolos. Cristo ia aos homens sem parar e
sem repouso. Ele escolhia alguns deles, formava doze apóstolos, depois setenta e dois discípulos.
Esses tornavam-se seus auxiliares. Ele dava-lhes uma palavra de ordem: Ide e ensinai.
Eles partiram e procuraram auditores em grupo ou individualmente. A palavra era a sua
única arma. Eles pregaram a doutrina e se ocuparam das obras, das necessidades do povo e da
organização social. São Paulo procurava em todas as cidades opulentas da Grécia recursos para as
comunidades cristãs da Palestina.
A nossa missão está largamente traçada nisso: ir aos homens, sobretudo aos que não vêm
ter connosco, falar-lhes, agrupá-los, e utilizar esta nova forma da palavra, o jornal, que um São
Paulo, sem dúvida, não teria faltado empregá-la, se a tivesse conhecido no seu tempo, e enfim
fazer com que nos ocupemos dos interesses económicos e sociais do povo.

397 Aí está a teoria, mas avancemos. Que faremos no detalhe da prática?


Espalharemos o bom jornal; uniremos homens, para fazê-los ouvir conferências; conduzi-
los-emos aos estudos sociais, às obras económicas e enfim às obras de piedade.
Tudo isso far-se-á, no campo, em proporções modestas, aos poucos.
Os exemplos arrastam mais que as teorias. Lede, no fim do volume, o método que fez
sucesso nas pequenas paróquias do Alto Marne e de Saône-e-Loire, e façais o mesmo que lá se
fez.
O La Croix do Domingo será suficiente para preparar as vias para a campanha. Acerca do
modo de o espalhar, lede o capítulo sobre a boa imprensa e aquele sobre a visita pastoral.

398 De seguida, formai pacientemente um grupo de homens de boa vontade que se tornarão
vossos auxiliares.
Rezai e fazei rezar, e o Salvador não recusará fornecer-vos um pequeno colégio apostólico.
As nossas monografias vos dizem como se forma estes primeiros grupos. Com estes
primeiros grupos, vós podereis tudo, e as obras sociais, sindicatos e caixas de crédito se
organizarão facilmente, tal como um fruto maduro cai simplesmente da árvore que lhe forneceu a
seiva.
A Confraria de Nossa Senhora dos Campos reunirá os seus associados e conduzi-los-á à
igreja. As obras de piedade serão a coroa das obras económicas. Portanto, ponde-vos a mexer sem
tardança.

399 Ainda ontem, lemos uma carta calorosa do bispo de Périgueux aos seus diocesanos, sobre
a necessidade urgente das obras rurais em favor das populações agrícolas.
Todos os nossos bispos pensam como ele.
«Sim, diz Monsenhor Dabert, há reformas a fazer para melhorar a sorte dos trabalhadores,
façamo-las.
Criemos sindicatos agrícolas sobre bases de honestidade e justiça.
Criemos instituições económicas, caixas rurais, caixas de família, economatos domésticos,
seguros contra acidentes de trabalho, caixas de reforma, etc.
Numa palavra, concluía o bispo de Périgueux, todos os que, a um título ou a um degrau
qualquer, têm uma parte de influência no campo devem-se devotar hoje aos interesses materiais
dos nossos operários dos campos.
E o clero, trabalhando principalmente pela conversão e pela santificação das almas, não
deve ficar estranho a estas obras de reformas sociais.
Ele não fará mais do que seguir os exemplos do Salvador».

400 Resumindo, diríamos a um pároco da zona rural:


Começai por convencer-vos da necessidade de agir e de ir aos homens. Para tal, bastar-
vos-á, se quiserdes, ler a encíclica Rerum novarum.
Ponde-vos logo de seguida a espalhar o La Croix por todos os meios possíveis. No tempo
que é o nosso, a boa imprensa é a obra das obras.
Ao mesmo tempo, formai três ou quatro homens de boa vontade. Não vos canseis: «Insta
opportune importune» [2 Tm 4,2], até que os tendes levado a decidir serem vossos auxiliares nas
obras sociais.
Então, começai com eles um sindicato. Este se desenvolverá. O sindicato fará tudo o resto.
Ele fundará a caixa de crédito e a caixa de família. E terá um lugar de reunião análogo à de um
círculo. A elite dos seus membros formará mais tarde uma fraternidade de Ordem-Terceira.
O sindicato irá anexar a si um patronato.
As mães e as moças também hão-de querer associações, se porventura ainda não as tiverem,
e a paróquia reencontrará gradualmente toda a vida corporativa cristã das épocas melhores.

CAPÍTULO IV
OS SINDICATOS AGRÍCOLAS
401 O fim que se propõe ao recomendar, sob o título de obras sociais cristãs, o sindicato
agrícola é este:
Tornar-se útil aos camponeses, desenvolvendo entre eles por meio da associação o
sentimento da fraternidade cristã e do dever social que lhe está anexo, de tal modo que eles gozem
ao mesmo tempo dos proveitos materiais e morais, e que, ao cumprirem melhor a lei social, eles
possam aprender a compreendê-la e a amá-la no seu divino Autor.
O sindicato agrícola não pode ser constituído, como qualquer associação a não ser por uma
seleção, pois elementos heterogéneos, quer moralmente, quer de fato, não saberiam entrar numa
associação profissional. Ora, esta seleção é por si um meio poderoso de encorajar a honestidade e
de modificar o que deve ser modificado.

402 O sindicato agrícola não saberia prosperar sem uma direção esclarecida e devotada que o
penetre do seu espírito. Ele dá, por este meio, lugar às autoridades sociais e nomeadamente ao
padre que, mesmo sem se tornar um membro ativo, não é menos o promotor e o conselheiro natural.
A objeção contra a utilidade moral do sindicato e a possibilidade de nele o padre fazer
aceitar a sua influência cai perante as considerações precedentes, e não saberíamos estar
suficientemente convencidos antes de começar a entreprender esta obra. Pois, se a apresentarmos
debaixo desta luz, ela pode reunir todos os homens de boa vontade por quem é realizada, e produzir
frutos excelentes de concórdia, de moralidade e de renovação religiosa.

403 Se, pelo contrário, concebermos o sindicato agrícola simplesmente sob o ponto de vista
das vantagens económicas, como uma sociedade de consumo, aberta a qualquer pretendente, não
só se falseia o espírito e as disposições da lei civil, como se passa de lado à lei moral.
Bem compreendida, ao invés, os sindicatos agrícolas são escolas de moralidade, onde se
formam cidadãos para a vida pública ao mesmo tempo que se retém os camponeses na vida rural
promovendo-a, de forma a ser mais considerada e mais remuneradora.
Aliás, sem nada sair dos seus estatutos de caráter estritamente profissional, os sindicatos
agrícolas podem inscrever, nos seus regulamentos internos, algumas práticas religiosas e tomar
sobre o terreno político o papel de uma representação profissional. Nem aqui está o menos
interessante dos pontos de vista onde nos posicionamos para que se fomente o seu aparecimento.

404 Favorecidos por estas considerações preliminares, mas essenciais, entraremos nas
indicações práticas para a fundação de um sindicato agrícola.
Seguiremos passo a passo o excelente pequeno manual do senhor De Gailhard-Bancel e o
do senhor Fontan, resumindo-os.
Daremos a seguir o texto da lei de 1884 e um projeto de estatutos e de regulamento interno.

405 I.O que é um sindicato agrícola? – Um sindicato agrícola é uma associação formada por
proprietários, cultivadores, quinteiros, jornaleiros; numa palavra, todos esses que exercem a
profissão agrícola ou que se referem ao solo por certo laço, para a defesa de seus interesses
profissionais e económicos.
Trata-se, sob um nome novo e uma forma renovada, da antiga corporação, adaptada às
populações rurais; é o único modo de exercer legalmente o direito de associação, suprimido em
1791, e restituído parcialmente pela lei de 21 de Março de 1884.

406 A associação é de direito natural como a propriedade; ela é o complemento necessário do


indivíduo, que, isolado, sem outro recurso a não ser os seus braços, é impotente para satisfazer
todas as suas carências, a salvaguardar os seus direitos, a fazer frente a todas as eventualidades da
vida; ela também é o complemento da família que deve proteger igualmente e apoiar nos momentos
difíceis.
Esta missão, as corporações haviam já cumprido outrora: transformadas, renovadas,
adaptadas às novas condições do nosso tempo, elas poderão cumpri-la ainda agora nos nossos
tempos.
Não há pois que hesitar; deve-se reagir contra o espírito do individualismo e do egoísmo
que invadiu a nossa sociedade, é preciso formar associações profissionais, sindicatos. A
experiência está patente para provar que é viável e que mesmo até é fácil, com um bocadinho de
dedicação e de perseverança.

407 II. Como se pode fundar um sindicato? Reuniões preparatórias e depósito dos estatutos.
– Para fundar um sindicato agrícola, deve-se primeiramente obter alguns homens de boa vontade,
ativos, dedicados, que serão os fundadores da associação. Na zona campestre, este primeiro grupo
é fácil de ser formado; de inverno em particular, o cultivador está sempre disponível a responder
a uma convocação.
É sobretudo o pároco, a mais das vezes, que terá a iniciativa desta fundação; e é
perfeitamente justo pois que tal importa tanto ao bem moral como ao bem material das populações
agrícolas.
Expõe-se nestas reuniões a necessidade, os benefícios da associação, os serviços que um
sindicato pode prestar, sob o ponto de vista dos interesses agrícolas, económicos e morais; dá-se a
conhecer o que se tem feito alhures; dá-se a conhecer espécies de estatutos, discute-se sobre eles,
procura-se o que poderá ser feito mais facilmente e de modo mais útil na região onde se encontra.
Os fundadores têm toda a liberdade de se reunirem sem serem expostos às penalidades dos
artigos 291 e seguintes do Código penal.

408 Quando se chegou a acordo sobre os termos dos estatutos, designa-se os que serão
encarregados de administrar a associação. A sua primeira ação deverá ser a de depositar na Câmara
municipal dois exemplares dos estatutos e a lista dos administradores escolhidos. Estes
documentos serão assinados pelo presidente e pelo secretário do sindicato. A data deve ser escrita
de forma exata.
O depósito fica comprovado por um recibo do Presidente da Câmara. Os documentos
depositados e o recibo serão notados sobre papel à disposição.
Uma vez cumpridas estas formalidades, o sindicato fica fundado, sem que seja necessário
pedir qualquer autorização. Se o Presidente da Câmara recusar receber o depósito destes
documentos ou entregar o recibo, tornar-se-ia necessário fazê-lo sob pressão do guarda e fazer
constatar ao mesmo tempo a sua recusa.

409 III. Acerca da administração e sobre os estatutos. – A administração é confiada a um


conselho sindical que compreende um presidente, um vice-presidente, um secretário, um
tesoureiro, e muitas vezes, três outros membros. È conveniente que os diversos membros do
sindicato estejam representados nele.
O conselho é eleito numa assembleia geral. Ele nomeia diretamente o seu gabinete.
O sindicato é representado naturalmente pelo presidente nos atos da vida civil.
Parece preferível que o pároco seja apenas membro consultivo do conselho. Se houver
outros membros consultivos, eles formam um comité consultivo ou de arbitragem, que assiste ao
conselho com suas luzes e que joga o papel de árbitro quando o conselho estiver dividido sobre
uma questão.
Os estatutos oficiais podem ser bastante sucintos. Ajunta-se-lhes de ordinário um
regulamento interno mais detalhado, que não precisa ser deposto.
Os estatutos contêm as disposições relativas à constituição do sindicato, à sua composição,
ao seu objetivo, à sua administração, às suas reuniões, ao seu património, e à sua dissolução.
O regulamento interno concerne o espírito do sindicato, as suas festas, os pormenores da
sua administração, e o emprego dos seus recursos.

410 IV. A qual circunscrição convém indicar a um sindicato agrícola? – não é possível dar a
esta questão uma resposta precisa. A extensão a dar a um sindicato depende das circunstâncias,
dos recursos, das necessidades das populações. A lei deixa toda amplitude a este respeito.
Pode-se estabelecer um sindicato num departamento, num distrito, num cantão, num grupo
de comunas, num vale, numa comuna. Contudo, sob o ponto de vista social, para fazer do sindicato
uma grande família na qual toda a gente se conhece e se sente unida pelo laço duma estreita e
cordial solidariedade., é preferível fundar sindicatos numa circunscrição restrita, sindicatos
comunais ou quando muito cantonais.
Sob o ponto de vista económico, para anexar facilmente ao sindicato instituições de
assistência e de previdência, caixas de família, sociedades de socorro, caixas rurais de crédito,
lugares de reunião, etc., não é necessário que os sindicatos sejam muito extensos.

411 V. Quem pode fazer parte de um sindicato agrícola? – Nos termos do artigo 2 da lei de 21
de Março de 1884, podem fazer parte de um sindicato todas as pessoas exercendo a mesma
profissão, trabalhos similares ou profissões conexas concorrendo ao estabelecimento de
determinados produtos.
Por conseguinte, sob o ponto de vista agrícola, todas as pessoas que cultivam a terra ou
recolhem diretamente os seus produtos, o proprietário grande ou pequeno, explorando ou não o
seu domínio, o quinteiro, o meeiro, «o homem que cuida da mais modesta horta», o viticultor, o
horticultor, o cultivador de viveiros, o jardineiro-floricultor, o silvicultor, o que cuida do gado,
pertencem à mesma profissão e podem entrar no mesmo sindicato.
Nas profissões similares da agricultura podemos classificar as indústrias diretamente
conexas à terra, como as usinas de açúcar, as destilarias, as empresas de fabricação de queijo; e
nas profissões anexas, as dos veterinários, professores de agricultura, construtores de instrumentos
agrícolas, comerciantes de adubos, ferreiros de selas, de carroças de lavoura, ferro-velho. Não se
deve todavia estender demais o número das profissões similares ou conexas, tanto mais que na
zona rural, é muito pequeno o número dos que nada possuem de terreno a algum título.
As mulheres, os menores, os estrangeiros podem fazer parte de um sindicato agrícola.
Entretanto a lei exige que os administradores do sindicato sejam franceses e gozem dos seus
direitos civis.
Está claro que os simples jornaleiros podem tomar parte deles. A sua presença faz dos
nossos sindicatos rurais sindicatos mistos, compostos de patrões e operários.
Podemos instituir que haverá sempre um ou mais jornaleiros no conselho sindical e que
eles serão eleitos pelos seus pares.
Os patrões e os jornaleiros podem formar seções diferentes e pagar cotizações
proporcionadas, estes usufruindo apenas dos socorros da caixa de família ou de outras obras de
assistência.
412 VI Que género de operações pode fazer um sindicato agrícola? – O campo aberto à sua
atividade é muito extenso. O sindicato pode cumprir todos os atos, fundar todas as instituições
tendo por objeto os interesses profissionais e económicos dos seus membros. Não há mais do que
o embaraço da escolha entre as diversas obras de que se pode ocupar.
Por qual é preferível principiar?
A este respeito, nada se pode dizer de absoluto. Num tal país, será uma coisa que correrá
melhor; alhures, será uma outra. Cada sindicato irá avaliar.
Vamos enumerar os diversos serviços que os sindicatos agrícolas prestam mais
frequentemente sob o ponto de vista profissional, económico, moral e social.

A. Serviços profissionais
413 O ensino agrícola. – Um sindicato agrícola pode estudar teórica e praticamente todas as
questões que interessam à agricultura e vulgarizar o emprego dos melhores métodos. Ele pode
organizar cursos ou pedir conferências a homens competentes. E pode publicar ou receber um
boletim especial.

Campos de experimentação. – Vários sindicatos organizaram campos de experimentação, nos


quais são ensaiadas novas variedades de cereais, de batatas, etc., modernos instrumentos,
diferentes espécies de fertilizantes.

B. Serviços económicos
414 Compra de matérias-primas e objetos úteis à agricultura. – Não basta dar a conhecer os
bons métodos, mas deve-se facilitar a sua aplicação. Todos os sindicatos fizeram o esforço de
possibilitar aos seus membros, a melhores condições de preço e de qualidade, os artigos de que
poderiam ter necessidade no exercício das suas funções; instrumentos agrícolas, sementes, adubos,
etc. Alguns sindicatos apenas serviram de intermediário para estas compras; outros fundaram
diretamente armazéns nos quais os seus membros vêm se abastecer.
Estas operações não obrigam de forma nenhuma os sindicatos à posse de patente.
Alguns sindicatos ocuparam-se também na venda dos produtos, mas esta operação pareceu
em geral mais complicada.

415 Instituições de assistência e de previdência. – A lei de 1884 dá aos sindicatos o direito de


estabelecer sociedades corporativas, caixas de socorro mútuo e de reforma.
Um sindicato pode fundar uma sociedade de socorro mútuo para os seus membros sem ter
que pedir nenhuma autorização. Só é preciso que a administração e a caixa da sociedade de socorro
mútuo sejam distintas das do sindicato. De mais a mais, qualquer pessoa que se retire de um
sindicato conserva o direito de ser membro das sociedades de socorro e de pensão para o ativo das
quais contribuiu pelas suas contribuições.
Uma forma popular de uma sociedade de socorro mútuo é a caixa de família, na qual
participa a família inteira, até as crianças.

416 Seguros, - Quanto aos seguros, os sindicatos agrícolas também podem prestar reais
serviços aos seus societários que desejam assegurar-se contra a geada, os acidentes, o incêndio.
Os sindicatos poderão informar os seus membros sobre o valor das diversas sociedades que
solicitam os seus seguros, e, se necessário, servir de intermediário junto deles.
Bom número de companhias de seguros está disposta a considerar os sindicatos como
agentes e a fazer-lhes beneficiar com importantes descontos.
Alguns sindicatos organizaram por si caixas de seguros ou de socorro mútuo contra a
mortalidade do gado.

417 Sociedades de crédito mútuo. – Uma das obras mais úteis que os sindicatos ainda podem
estabelecer são as sociedades de crédito, que proporcionam aos seus membros o meio de encontrar
dinheiro a uma taxa moderada, quando terão necessidade dele para um emprego profissional, qual
a compra de sementes, de adubos, de gado. Indicamos num capítulo diverso o funcionamento das
caixas de crédito segundo o sistema de Durand-Raffeisen.

418 Lugar de encontro, bar. – Um local de reunião é um acessório muito útil para o
funcionamento de um sindicato. Nada impede os sindicatos de o organizarem, para utilidade e
complacência dos seus membros.
Será aí que serão afixados todos os avisos, que se farão todas as encomendas e a limpeza
das contas, onde se fará a inscrição para o emprego dos diversos instrumentos, emprestados ou
alugados pelo sindicato, onde se pedirá e receberá uma grande quantidade de informações úteis.
Sem contar com o fato de aí se poder encontrar consumos sadios a um preço vantajoso e a se tomar
repouso nos dias de festa após os trabalhos da semana.

C. Serviços morais e sociais


419 Arbitragem, paz social. – Sob o ponto de vista moral e social, os sindicatos também
prestaram numerosos serviços às populações rurais. Contribuíram a resolver pacificamente, pela
sua arbitragem, muitas dificuldades, muitos litígios, que, sem a sua intervenção, ter-se-iam
agravado e feito surgir esses processos que lançam o mal-estar nas famílias e as arruínam.
Desde que ricos e pobres, grandes e pequenos proprietários, quinteiros, meeiros, operários,
se encontraram nos sindicatos, bastantes preconceitos desapareceram, muitas invejas se
extinguiram, bastantes amizades se formaram entre pessoas que outrora mal se conheciam, e que
não tinham senão pouca, ou mesmo nenhuma simpatia umas pelas outras.
Os sindicatos são o dique mais sólido a que se oponha ao socialismo que ameaça invadir
tudo, e de tudo destruir, e a sua ação, sob o ponto de vista social, pode ser dos mais eficazes e dos
mais profundos.

420 VII. O património dos sindicatos. A sua necessidade. – Os sindicatos nunca devem perder
de vista a necessidade de constituir para si um património, que lhe é indispensável para se
desenvolver, para aumentar o número e a importância dos seus serviços e sobretudo para fundar
instituições de assistência e de previdência, que devem ser o objeto constante das suas
preocupações e de seus esforços.

421 A sua natureza. – A lei de 21 de Março de 1884 dá aos sindicatos o direito de possuir;
mas, tão grandes são ainda as prevenções contra a propriedade coletiva, que o legislador não lhes
permitiu «de adquirir outros imóveis além daqueles que lhes servem para as suas reuniões, às
suas bibliotecas, e a cursos de instrução profissional» (art.6).
Resulta deste artigo que os sindicatos podem possuir campos de experimentação e imóveis
necessários para o seu funcionamento, tais como gabinetes, armazéns, entrepostos.
Pelo contrário, eles podem, sem qualquer limitação, possuir bens móveis e valores
mobiliários de qualquer espécie, rendas, obrigações, máquinas e instrumentos agrícolas, etc.

422 Formação do património sindical. – O património dos sindicatos pode formar-se:


1º. Pelas cotizações dos membros e pelos direitos de entrada. O artigo 6 da lei de 21 de
Março de 1884 diz formalmente que os sindicatos podem empregar as somas derivadas das quotas.
Eles não estão obrigados de os empregar para cobrir os seus gastos gerais, aos quais podem fazer
face por um ligeiro aumento do preço das mercadorias que proporcionam a seus membros.
2º. Por aquisições a título oneroso. Os sindicatos, tendo personalidade civil, podem
comprar, vender, cumprir todos os atos legais, conforme à lei de 1884.
3º. Por aquisições a título gratuito. Parece, segundo a lei, que os sindicatos possam receber
liberalidades testamentárias.
No entanto, isto é contestado por uma circular ministerial, e os tribunais não permitem que
se indique esta fonte de aquisição nos estatutos.
Os sindicatos podem receber dons ou subvenções dos particulares, do Estado, dos
departamentos e das comunas.
Eles também têm a faculdade de agregar, sob títulos deixados à sua escolha, membros
honorários, doadores, benfeitores, etc. membros que versam anualmente uma cotização mais
elevada que a dos outros membros, ou que fazem dom à sociedade de uma soma, já oferecida.
Todavia, os benfeitores não podem ser ao mesmo tempo membros ativos do sindicato a
não ser que eles cumpram as condições profissionais requeridas pela lei, senão serão apenas
benfeitores, estranhos à associação.

423 VIII. Os sindicatos e a representação da agricultura. – Os sindicatos também podem


defender e servir os interesses gerais da agricultura. De todas as profissões, a agricultura é a única
que não tem representação legal. Os industriais e os comerciantes têm câmaras de comércio. As
profissões liberais, os notários, advogados, juízes têm as suas câmaras ou conselhos. A agricultura
não está representada. Ela vai encontrar nos sindicatos uma representação livre, autorizada,
íntegra, competente, pronta a falar em seu nome e a levar aos poderes públicos as suas
revindicações todas as vezes que os interesses agrícolas estiverem em jogo.
Já por diversas vezes, os sindicatos levantaram a voz em nome dos cultivadores. Puderam
obter alguma proteção para os produtos agrícolas e alguma suavização para o imposto. Mas a sua
ação será tanto mais poderosa e eficaz, quanto forem mais florescentes e mais se multiplicarem.

424 IX. As uniões de sindicatos. – A associação multiplica a força dos indivíduos. As uniões,
as federações multiplicam a força dos sindicatos.
A experiência disso já foi feita; e embora o legislador tenha recusado personalidade civil
às uniões e as tenha assim privado de um poderoso meio de ação, elas nem por isso deixaram de
prestar imensos serviços aos sindicatos.
É por causa das suas uniões, segundo os departamentos ou regiões, que os sindicatos
agrícolas puderam disponibilizar aos seus membros até ao presente a maior parte das vantagens
que enumerámos: alcançar mercados lucrativos, fundar cooperativas, publicar boletins e
almanaques espantosamente baratos.
È graças à União central dos agricultores de França, cuja sede está em Paris, que os
delegados dos sindicatos puderam, por várias vezes, ter sucesso junto dos poderes públicos, fazer-
lhes ouvir os seus anseios, as vontades dos agricultores e cumprir assim a sua missão de
representantes da agricultura.

425 X. Conclusão. – A agricultura é a maior força moral, material e social do país; a


prosperidade da pátria está intimamente ligada à sua prosperidade.
Logo, é o mesmo que trabalhar pela pátria quando se trabalha para a promoção da
agricultura; e o melhor meio de trabalhar nela, pensamos já o ter demonstrado, é o de agrupar,
associar os agricultores, multiplicar os sindicatos.
Graças a eles. A terra tornar-se-á mais rica e mais fecunda; a profissão agrícola irá tomar
de novo o lugar honorífico entre as profissões; os jovens que tendem a abandoná-la aprenderão a
honrá-la e a amá-la.
Eles ser-lhe-ão novamente fiéis e ver-se-á multiplicar e prosperar estas fortes e numerosas
famílias rurais, que contribuem para a nação com os melhores cidadãos e ao exército com seus
mais valentes soldados.

APÊNDICE I
LEI DE 21 DE MARÇO DE 1884
SOBRE OS SINDICATOS PROFISSIONAIS
426 Artigo 1º - São abolidas as leis dos 14 e 17 de Junho de 1791 e o artigo 416 do Código
penal. Os artigos 291, 292, 293, 294 do Código penal e a lei de 10 de Abril de 1834 (sobre as
associações ou reuniões ilícitas) não se aplicam aos sindicatos profissionais.
Artigo 2. – Os sindicatos ou associações profissionais, mesmo com mais de 20 pessoas
exercendo a mesma profissão, ou ofícios semelhantes ou profissões conexas, concorrendo para o
estabelecimento de produtos determinados, poderão constituir-se livremente sem a autorização do
governo.
Artigo 3. – Os sindicatos profissionais têm por objeto exclusivo o estudo e a defesa dos
interesses económicos, industriais, comerciais e agrícolas.

427 Artigo 4. – Os fundadores de qualquer sindicato profissional deverão depor os seus


estatutos e os nomes daqueles que, a qualquer título, ficarão encarregados da administração e da
direção. Este depósito terá lugar na Casa Municipal da localidade onde o sindicato estiver
estabelecido, e em Paris, na Prefeitura do Sena.
Este depósito será renovado a cada mudança da direção ou dos estatutos.
A comunicação dos estatutos deverá ser dada pelo presidente da Câmara ou pelo prefeito
do Sena ao procurador da República.
Os membros de qualquer sindicato profissional encarregados da administração ou da
direção deste sindicato deverão ser franceses e gozar dos seus direitos civis.

428 Artigo 5. – Os sindicatos profissionais, constituídos regularmente segundo as prescrições


da presente lei, poderão concertar-se livremente para o estudo e a defesa dos seus interesses
económicos, industriais, comerciais e agrícolas.
Estas uniões deverão dar a conhecer, conforme ao segundo parágrafo do artigo 4, os nomes
dos sindicatos que as compõem.
Elas não poderão possuir nenhum imóvel nem pleitear nos tribunais.

429 Artigo 6. – Os sindicatos profissionais dos patrões ou dos operários terão o direito de
caucionar na justiça. Eles poderão empregar as somas provenientes das cotizações.
Todavia, não poderão adquirir outros imóveis exceto aqueles que serão necessários às suas
reuniões, às suas bibliotecas, e a cursos de instrução profissional.
Eles poderão sem autorização, mas na conformidade a outras disposições da lei, constituir
entre os seus membros caixas especiais de socorro mútuo e de reformas.
Eles poderão criar e administrar livremente agências de informação para as ofertas e
procuras do trabalho.
Poderão ser consultados sobre todos os diferendos e todas as questões relacionadas com a
sua especialidade. Nos assuntos contenciosos, as opiniões dos sindicatos ficarão à disposição das
partes, que poderão tomar a sua comunicação e a copiar.

430 Artigo 7. – Todo o membro de um sindicato profissional pode retirar-se em qualquer


momento da associação, não obstante toda a cláusula contrária, mas sem prejuízo do direito que
tem o sindicato de reclamar a quotização do ano corrente.
Toda a pessoa que se retira de um sindicato conserva o direito de ser membro das
sociedades de socorro mútuo e de pensões de reforma para a velhice, ao ativo das quais contribuiu
por quotizações ou pagamentos de fundos.

431 Artigo 8. – Quando os bens terão sido adquiridos contrariamente às disposições do artigo
6, a nulidade da aquisição ou da liberalidade poderá ser pedida pelo procurador da República ou
pelos interessados. No caso da aquisição a título oneroso, os imóveis serão vendidos, e o preço
será deposto na caixa da associação. No caso de liberalidade, os bens serão devolvidos aos
deponentes ou a seus herdeiros ou a quem tiver direito.
432 Artigo 9. – As infrações às disposições dos artigos 2, 3, 4, 5 e 6 da presente lei serão
lançadas contra os diretores ou administradores dos sindicatos e punidas de uma multa de 16 a 200
francos. Os tribunais poderão, além disso, segundo diligência do procurador da República,
pronunciar a dissolução do sindicato e a nulidade das aquisições de imóveis, feitas violando as
disposições do artigo 6.
No caso de falsa declaração relativa aos estatutos e aos nomes e qualidades dos
administradores ou diretores a multa poderá subir a 500 francos.

433 Artigo 10. – A presente lei aplica-se à Argélia.


Ela também se aplica às colónias da Martinique, de Guadaloupe e da Reunião. Todavia, os
trabalhadores estrangeiros e contratados sob o título de imigrantes não poderão fazer parte dos
sindicatos.

APÊNDICE II
PROJETOS DE ESTATUTOS
PARA UM SINDICATO AGRÍCOLA COMUNAL
Estatutos do sindicato agrícola e hortícola da comuna de X…

PRIMEIRO TÍTULO
Constituição e objeto do Sindicato.
434 Primeiro artigo. – Uma associação sindical é formada entre os proprietários, cultivadores,
quinteiros, domésticos, jornaleiros e trabalhadores de cultura ou de profissões conexas,
domiciliados na comuna ou possuindo propriedades nela, e aderindo aos estatutos presentes.
Artigo 2. – Ela toma o nome de sindicato agrícola e hortícola da comuna de X…, e se
coloca sobre o padroado de Santo…, cuja festa será celebrada cada ano no dia fixo pelo conselho.
Artigo 3. – Ela é regida pela lei e 21 de Março de 1884, sobre os sindicatos profissionais,
e começa a existir desde o dia do depósito legal dos seus estatutos.

435 Artigo 4. – A associação tem por objetivo a união fraterna dos seus membros, o estudo e a
defesa dos interesses agrícolas.
Artigo 5. – ela tem por fim especial:
1º De trabalhar à melhoria moral do pessoal agrícola;
2º De servir de intermediário para a compra de mercadorias úteis à agricultura
(instrumentos, adubos, sementes, etc.);
3º Procurar mercado ao produto do trabalho dos sindicalizados;
4º De organizar instituições de previdência, de crédito e de assistência mútua;
5º Fornecer árbitros e especialistas para a solução das questões litigiosas;
6º De procurar o ensino dos melhores métodos de cultura.

TÍTULO II
A Composição do sindicato
436 Artigo 6. – O número dos membros da associação é ilimitado. Para fazer parte do sindicato,
é preciso ser apresentado por dois membros e admitido pelo conselho.
Artigo 7. – Ninguém pode fazer parte do sindicato se não gozar de uma reputação
irreprovável sob o ponto de vista moral e de probidade.
Artigo 8. – O sindicato compreende membros titulares e associados.59
________________________________________________
59
Este artigo e o seguinte serão suprimidos se não houver membros operários.

Artigo 9. – Os membros titulares (proprietários, quinteiros e patrões) pagam uma cotização


dupla e não têm direito aos auxílios da caixa de família.
Artigo 10. – O sindicato pode ter membros honorários ou subescritores que o ajudem pelas
suas cotizações anuais, mas esses não podem tomar parte na administração do sindicato nem nas
suas reuniões.
Artigo 11. – Todo o membro do sindicato é livre de se retirar dele, notificando a sua
demissão ao presidente.
Artigo 12. – Ele perde então os seus direitos ao património corporativo, mas deve pagar a
cotização do ano corrente. Ele conserva o benefício da segunda alínea do artigo 7 da lei de 21 de
Março de 1884.

TÍTULO III
A Administração
437 Artigo 13. – O sindicato é administrado por um conselho sindical composto de : um
presidente, um ou dois vice-presidentes, um tesoureiro e dois outros membros.
Artigo 14. – O conselho sindical é eleito em assembleia geral todos os três anos. Os seus
membros podem ser eleitos de novo e suas funções são gratuitas. À terceira vez, a maioria relativa
é suficiente. Ele próprio nomeia no seu seio o gabinete, isto é, o presidente, os vice-presidentes, o
secretário e o tesoureiro.
Artigo 15. – O conselho reúne-se regularmente todos os meses, mas o presidente pode
convoca-lo de modo extraordinário.
Ele estatua sobre os pedidos de admissão; ele convoca as reuniões gerais; ele toma todas
as medidas apropriadas para assegurar as vantagens morais e materiais do sindicato.

438 Artigo 16. – O conselho pode, por razões graves de que ele só é juiz, pronunciar a exclusão
de um membro. Pelo fato desta exclusão, o membro que foi objeto disso, é comparado ao membro
que se demitiu (art.12).
Artigo 17. – O conselho designa cada ano 3 ou 5 pessoas que formam um conselho de
arbitragem diante do qual são apresentados as divergências que surgem na profissão. Estas pessoas
podem ser tomadas fora do sindicato.
Artigo 18. – O presidente tem voz preponderante em caso de partilha. Ele representa o
sindicato em todas as relações oficiais. Ele assina os processos verbais e os atos diversos do
sindicato. Também é encarregado de pleitear na justiça, se acontecer. Todo o ato referente ao
sindicato deve trazer a assinatura do presidente e de um outro membro do conselho de
administração. O conselho da administração pode nomear, debaixo da sua responsabilidade, um
gerente, mesmo não sindicalizado.

439 Artigo 19. – O conselho provê a instalação dos locais do sindicato. Ele pode neles
organizar conferências e uma biblioteca.
Artigo 20. – Os recursos compõem-se das cotizações dos associados, das subscrições dos
benfeitores e dos membros honorários, e de uma retenção sobre os lucros das operações sindicais.
Artigo 21. – A cotização é de…, ela é paga nos três primeiros meses do ano (ou por
mensalidades).
Artigo 22. – O conselho da administração faz o balanço e completa as contas a 31 de
Dezembro de cada ano. Balanço e contas devem estar à disposição de todo o sindicalizado, na sede
do sindicato, desde a data do primeiro de Fevereiro.
Artigo 23. – As despesas compreendem os custos da correspondência, de publicidade, de
armazenagem, de análise, etc. O acréscimo constitui um fundo de reserva que poderá ser empregue
pelos interesses gerais da associação e para dotar a caixa de socorro ou de família, ou ser deposto
na Caixa rural.

440 Artigo 24. – A assembleia geral anual far-se-á ao Domingo… de Fevereiro. Nela dar-se-á
a relação através do gabinete das operações do ano e da situação financeira do sindicato.
A assembleia geral é convocada por cartas pessoais aos membros da sociedade ao menos
oito dias antes da reunião.
Uma assembleia geral extraordinária pode ser reunida todas as vezes que o conselho o julga
necessário.

TÍTULO IV
Disposições gerais
441 Artigo 25. – O sindicato poderá estar unido, por simples decisão do conselho de
administração, a um ou a vários sindicatos para formar uma união, tal como a uma ou várias uniões
de sindicatos. Ele dá, pelos presentes estatutos, pleno poder ao seu conselho de administração para
concluir todas as tentativas necessárias com esse fim.
Artigo 26. – O presente regulamento poderá ser modificado, se houver de quê; mas toda a
modificação deverá ser votada primeiramente pelo conselho e depois por dois terços da assembleia
geral.
Artigo 27. – A sede social está em X…
Artigo 28. – Os estatutos foram depostos na Câmara de X… no dia…
Artigo 29. – A dissolução poderá ser votada nas mesmas condições que a revisão dos
estatutos.
Artigo 30. – Em caso de dissolução, a assembleia geral reunida para este efeito decidirá o
emprego dos fundos podendo ficar na caixa em favor de uma obra de assistência ou de interesse
agrícola, sem que a repartição nunca possa ser feita entre os sindicalizados.

Feito em……………………. No dia………………

Mil oitocentos……………………………

O Presidente,

O Secretário,

APÊNDICE III
PROJETO DE REGULAMENTO INTERNO60
442 Artigo primeiro – Admissão: Para além das condições profissionais ordinárias, para ser
admitido deve-se:
Ser respeitoso pelas convicções religiosas.
Ter publicamente uma vida boa e bons costumes.
Não ter sido culpado por nenhuma condenação judiciária e reprovada pela consciência
pública.
Ficam excluídos por consequência os que vivem em concubinato e outros desregramentos
públicos.
Artigo 2 – Obrigações morais: o sindicato, querendo contribuir ao bem moral dos seus
membros, que aliás é a garantia do seu bem-estar material, exige aos seus filiados respeitar as leis
da Igreja sobre a observância do Domingo e evitar a blasfémia.
Eles não tomarão parte em nenhuma reunião ou sociedade antirreligiosa.
Os patrões, longe de entravar a prática religiosa dos seus subordinados, a favorecerão.
Artigo 3 – Festas e cerimónias: Os associados assistirão em massa à sua festa patronal e à
missa anual que será dita pelos seus defuntos.
Eles tomarão parte às festas das corporações: Santo Elói e São João Baptista para os
agricultores, São Nicolau e Santa Catarina para a juventude.
(Certos sindicatos têm uma missa especial no primeiro Domingo de cada mês).

443 Artigo 4. – Obras e instituições conexas: O conselho sindical organizará uma caixa de
família, uma caixa de socorro para os velhos, um gabinete de informações jurídicas e outras, e
conferências instrutivas.
Artigo 5. – Coletas das cotizações: Serão designados dezenas para facilitar a coleta das
cotizações. Serão encarregados também de visitar os doentes e de lhes entregar cartões-de-consulta
para os médicos.
Artigo 6. – Multas: para forçar a observância dos estatutos, o conselho pode impor multas
variando de 0 francos 50 até 1 franco.
Artigo 7 – Local do sindicato: O conselho determina os dias e as horas de abertura do local
sindical. Também regulamenta o uso de livros e jornais.
Artigo 8 – Funerais: O sindicato por completo assiste aos funerais dos seus membros. A
sua bandeira é levada nessa ocasião.
Artigo 9. – O conselho de arbitragem: Os membros do gabinete, com o pároco da paróquia,
formam um conselho consultivo e de arbitragem. As suas decisões servem de lei nos diferendos
que se elevam entre os associados sobre questões profissionais.
Em certas paróquias, o conselho de patrocinato e de arbitragem é tomado por inteiro fora
do sindicato. Compõe-se do pároco e de algumas autoridades que concorreram para a fundação do
sindicato.

__________________________________________
60
É impossível prever tudo e regular tudo nos estatutos ; por isso os sindicatos podem para o seu bom
funcionamento completar os estatutos por regulamentos internos de que não é necessário depor na
Câmara municipal.

Publicações a consultar sobre os sindicatos


444 Pequeno Manual prático dos Sindicatos agrícolas, pelo Sr. DE GAILHARD-BANCEL,
editora Maison de la Bonne Presse, 5, rua Bayard, 1 franco.
Manual dos sindicatos profissionais agrícolas, pelo Sr. J. BOULLAIRE, editora Marescq,
20, rua Soufflot, Paris, 3 francos.
Boletim do Sindicato central dos agricultores de França, 19, rua Louis-le-Grand, Paris.
Aparece duas vezes por mês. Um ano: 4 francos. Para os membros dos sindicatos unidos: 2 francos.
Monografia da União do Sudeste dos sindicatos agrícolas, por CLAUDE SYLVESTRE.
Nos gabinetes da União do Sudeste, 9, rua do Garet, Lião, 3 francos.
Relatório do Congresso dos sindicatos agrícolas, passado em Lião, em Agosto de 1894.
Nos mesmos gabinetes, 3 francos 50.
As máquinas agrícolas ao alcance de todos por meio do sindicato da indústria agrícola,
pelo Sr. Padre FONTAN, livraria católica, 19, praça Marcadieu, Tarbes, 0 francos 45.
Manual prático para uso dos fundadores e administradores das caixas rurais, por L.
DURAND, 1 franco 30, 5, Paris, rua Bayard, e o Boletim mensal da União das Caixas rurais, 2
francos por ano, 97, avenida de Sax, em Lião.

CAPÍTULO V
A BOA IMPRENSA
445 A sua importância – Atualmente é a obra das obras. Querer-se-á compreender isso por
toda a parte?
Pio IX e Leão XIII disseram-no suficientemente. Já não se contam mais os seus
encorajamentos aos jornais católicos e especialmente ao jornal popular La Croix e a seus comités
de propaganda.
Para os párocos sobretudo é a obra reservada por Deus para o tempo presente.
Quaisquer que sejam as obras que se façam, não se pode salvar a França a não ser libertá-
la desde as raízes, de um mal destrutor de todas as boas obras.

446 Este mal é a imprensa ímpia e mesmo a imprensa indiferente, transportada até aos
humildes casebres e em todas as aglomerações operárias. Esta calúnia quotidiana, este ateísmo
prático, ajudados pelo romance sensual ou obsceno, reduzem a nada tudo quanto se faz na escola,
no patronato, no círculo, na igreja, ou nas boas conferências vespertinas.
Nenhuma destas obras excelentes teve fruto perdurável enquanto não tivesse afastado este
flagelo.
Não há mais nada, exceto raras ilhotas, aqui ou acolá, que não seja inundado e, perante este
dilúvio, há plácidos conservadores que se resignam dizendo: «Não há mais nada a fazer. O mundo
está perdido!»
Conquanto se protestasse e se lhes dissesse que a difusão de um bom jornal popular, tendo
condições de preço abordável sem que outros possam igualar, poderia fazer estancar este dilúvio.
Pode-se prova-lo com exemplos fornecidos pelo jornal La Croix. Muitos ainda não se aperceberam
disso, mas com a graça de Deus acabarão por tal aceitar.

447 Se quisermos conhecer o meio de adquirir uma verdadeira influência social, que se vá à
escola dos judeus, eles dão-se a conhecer por isso.
Pois bem! Quando Crémineux fundou a Aliança israelita para protagonizar o judaísmo no
mundo, qual foi o meio de que se serviu?
«Não temos necessidade, dizia ele a seus correligionários, senão de uma só arma, que é
todo-poderosa. Quando a tivermos, o mundo pertencer-nos-á».
Que arma seria esta?
«Não é o dinheiro, nem os encargos, nem a consideração pública. Colocai isso tudo no
segundo plano, dizia-lhes, mas antes do mais, apropriai-vos da imprensa! A imprensa, é tudo.
Tendo a imprensa, também teremos o resto».

448 A Aliança israelita aceitou o programa de Crémineux. Ela colocou a conquista da imprensa
como primeiro escopo das suas preocupações. Ela gastou nisso o seu dinheiro e o seu esforço.
Ela conquistou a imprensa, e com a imprensa, ela obteve tudo o resto: o dinheiro, as
colocações, a consideração, a influência.
Ela pôde assim dar a preponderância ao judaísmo na França, pois a França que temos diante
de nós, esta França que nos faz saltar lágrimas dos olhos e encrespar os nervos, é a França
subjugada aos judeus. É a França tal como a tornou a imprensa judaica.

449 É a Aliança israelita de Crémineux que nos conduziu à situação em que nos encontramos.
Tornámo-nos os vassalos dos judeus. E se alguns senhores da Idade Média haviam esquecido as
nobres tradições da feudalidade, todavia jamais eles trataram seus homens fiéis com tamanha
tirania e desprezo, como aquelas que experimentamos com o judeu.
Partamos à escola deste vencedor, que destruiu toda a ordem social cristã, que destruiu toda
a energia do caráter francês, que descristianizou, humilhou, subjugou a França. Examinemos a sua
arma, estudemos a sua tática. A exemplo seu, ponhamos a imprensa na primeira linha dos nossos
meios de ação. Todas as obras avançarão quando tivermos a imprensa. Sem a imprensa, todas as
obras perecerão.

450 II. Objeções. – Havia montões delas. Elas desaparecem uma por uma. «É impossível,
dizia-se, tal não terá sucesso, não compete aos padres ocuparem-se dos jornais». E parando frente
a estas dificuldades imaginárias, deixava-se o mal agravar, a fé se perder e a pátria correr para
abismos.
Não, não é impossível. Nem é mesmo difícil. Contudo é preciso incomodar-se um pouco
para que se faça propaganda. Que lassidão seria deter-se diante destes pequenos sacrifícios, quando
se trata dum bem tão grande a ter de ser feito!
Já passou o tempo em que se queria acantonar o padre e os piedosos fiéis na sacristia. A
unidade da fé foi perdida. A França é atualmente um campo de missão, no qual se deve combater
com todas as armas que estão em nosso poder.
Aliás, a imprensa católica já não mais se opõe à forma do governo, o clero das paróquias
pode mesmo fazer propaganda por ele. Ela não é mais do que um meio de apostolado.

451 III. Principais jornais. – A qual publicação dar a preferência para combater a má
imprensa? Como publicação popular, La Croix está, sem contestação, no primeiro lugar. Esse
jornal não custa mais do que 1 ou 2 cêntimos, consoante a grandeza do formato (pequeno ou
grande).
Ele não está enfeudado a qualquer partido.
Ele é francamente e acima de tudo católico.
Ele jamais publicou um folhetim que não pudesse ser lido até pelas crianças.
Está muito bem informado e a sua redação é interessante.
Ele arvora no cabeçalho o crucifixo, razão pela qual os que o recebem fazem, por isso
mesmo, profissão de fé.
Ele conquistou solidamente o seu lugar. O La Croix quotidiano extrai atualmente perto de
200.000 exemplares.

452 Ao lado do La Croix quotidiano, há o La Croix du Dimanche, com a companhia do


Laboureur, La Croix des Marins, le Pèlerin, la Vie des Saints e as Causeries du Dimanche, etc.,
etc.
O La Croix du Dimanche (A cruz do Domingo) tem uma tiragem atual de 520.000; la Vie
des Saints (a Vida dos santos) de 300.000 exemplares, as Causeries du Dimanche (Conversas ao
Domingo) de 125.000, le Pèlerin (o Peregrino) de 280.000.
O La Croix quotidiano convém às cidades e vilas, o La Coix du Dimanche às aglomerações
rurais e operárias.
Também há os La Croix regionais, que completam o La Croix de Paris e que dão as notícias
locais.

453 IV. O método. – Precisa-se primeiramente, claro está, de uma pessoa de boa vontade – um
homem ativo ou uma senhora devotada – ou então um pequeno comité.
Consegue-se depois facilmente um ou vários distribuidores, pagando-lhes, ao dar-lhes por
exemplo 1 cêntimo por número vendido e, por vezes, uma pequena compensação por cada nova
assinatura.
Em muitas localidades. Cavaleiros do La Croix e Pagens de Cristo fazem propaganda e
distribuição por puro voluntarismo.
Pode-se dar a conhecer o jornal por meio de publicidades que se encontram nos gabinetes
do La Croix. Elas são aliciantes, sugestivas. Pedir um montão dessas na reserva.

454 Podemos, para começar, distribuir alguns números gratuitamente. A administração do La


Croix ajudar-vos-á, ao vos enviar de graça seis expedições consecutivas do La Croix quotidiano,
ou três envios hebdomadários do La Croix du Dimanche ou do Pèlerin.
Depois da distribuição dos reclames e dos números especiais, é preciso ir buscar as
assinaturas. Um distribuidor pode fazê-lo. Conhecemos até alguns cantões nos quais os párocos
fizeram diretamente a visita da sua paróquia para recomendar a assinatura do La Vie des saints,
das Causeries, do La Croix du Dimanche ou do Pèlerin. Eles obtiveram um êxito completo.
A assinatura por semanas ou por mês é o melhor sistema; a venda por número tem pouco
êxito.

455 Em certas regiões, La Croix du Dimanche, com seus anexos: Vie des Saints, Causeries e
La Croix local, são vendidos à porta da igreja na saída da missa.
Como princípio de propaganda a experiência ensina que se poderá começar com vantagem
pelo Pèlerin que dá uma poderosa mão à difusão do La Croix e das outras publicações, tanto pela
facilidade com que se o vende como pelos benefícios que dele se podem retirar para a propaganda.
Podemos fazê-lo conhecer por meio de folhetos que a Casa da Boa Imprensa põe à disposição dos
comités; como para o Lacroix du Dimanhe, os três primeiros envios do Pèlerin são dados
gratuitamente.

456 Le Pèlerin, pelo mínimo de 10 exemplares expedidos pelos correios numa só e mesma
direção, fica a 4 cêntimos e meio o exemplar, o que não deixa senão meio cêntimo por exemplar
se for vendido a 0 francos 05 pelos comités. Mas a partir de 10 exemplares, o Pèlerin fica a 2
cêntimos e meio, mais o porte. Ora, este que é de 0 francos 02 por exemplar pelos Correios, não
ultrapassa o 0 francos 60 para um pacote postal de 3 quilos, que pode conter até 100 exemplares
do Pèlerin. De modo que 100 números custam:
2 francos 50 + 0 francos 60 = 3 francos 10
E podem ser vendidos no baixo preço de 5 francos, seja uma diferença de perto de 2 francos
que pode prover às despesas de distribuição e de propaganda. A venda do Pèlerin faz-se
primeiramente à saída da Missa, e no domicílio depois.
O Pèlerin, ilustrado em cores, obtém um sucesso sempre crescente, graças às suas
atualidades religiosas, humorísticas e satíricas.

457 V. A obra na zona rural. – Será ela possível?


Evidentemente que sim, já que ela acontece.
Em todos os centros servidos por uma estação, a propaganda pode ser feita como na cidade.
O pacote postal permite dar o jornal de manhã bem cedo e muito barato.
Basta encontrar uma pessoa que consinta a se ocupar da obra e um distribuidor.
Deve-se atingir um nível de 100 abonados (o pacote postal de 3 quilos contem 100 Croix
de grande formato; se se receber o La Croix de pequeno formato, o pacote postal contém 200); de
outro modo, as despesas do envio aumentariam de modo notável o preço do jornal.
Com o sistema do pacote postal, pode-se vender o La Croix quotidienne de pequeno
formato a 0 francos 15 cada semana. Pode-se até no campo dar o La Croix du Dimanche no
pequeno formato com a Vida dos Santos ou as Causeries por 0 francos 15 por mês, o Pèlerin por
0 francos 20 por mês.

458 Para que se possa obter este resultado, agrupa-se, se for preciso, duas ou três povoações
mais próximas, para ter os 100 ou 200 clientes. O comité mais próximo de uma estação recebe o
pacote postal; os outros enviam alguém a buscar nele os números que lhes dizem respeito.
Se não houver mais que 10 ou mesmo 50 assinaturas, as despesas do porte aumentariam o
preço da expedição do jornal, mas apesar disso o La Croix ainda seria menos caro que os outros
jornais.
Uma vez que os maus jornais chegam até mesmo nas locandas mais recuadas, então por
que não se deveria fazer outro tanto com os bons jornais?
Desde que os jornais chegaram aos povoados, uma criança pode distribuí-los por um pouco
de dinheiro.
Está claro que em cada aldeia, precisa-se de uma pessoa que se encarregue de modo
especial da propaganda e que recolha as assinaturas.

459 VI. Comités e propaganda. – A administração do La Croix gosta de se ocupar com os


comités de propaganda. Verdade é que não é difícil; ela considera Comité até mesmo uma única
pessoa que se responsabilize pela difusão do jornal.
Os comités recebem, por intermédio de 1 franco 50 por ano, a Croisade de la Presse,
publicação hebdomadária, que dá os detalhes da vida da obra; os que desejam, além disso, estar ao
corrente de tudo o que concerne à imprensa em geral tem, por 3 francos anuais, uma revista de
imprensa muito interessante: a Chronique de la Bonne Presse.
Os comités, para eles apenas, podem ter o La Croix de pequeno formato a 1 cêntimo desde
10 números e o La Croix de grande formato a 2 cêntimos o número, a partir de 5 números, o Pèlerin
a 2 cêntimos e meio a partir de 10 números.
Da mesma feita, têm a Vie des Saints e as Causeries du Dimanche a 1 meio cêntimo, desde
50 exemplares.

460 Para tudo o que diz respeito a propaganda, é favor de se endereçar ao Secretariado-geral
da Boa Imprensa, 5, rua Bayard, em Paris.
A Obra da Boa Imprensa prossegue um fim sobrenatural: a glória de Deus e a salvação das
almas. Ela não resiste que não seja por meios sobrenaturais. Eis por que os comités aderem a esta
imensa coalizão de preces que se denomina a Liga da Ave-maria. Eles rezam, pedem orações e
comunhões.
Mandam dizer uma Missa mensal para a obra do La Croix.
Para iniciar os novos zeladores pela propaganda, há fascículos gratuitos.
Alarguemos o nosso zelo para além da nossa paróquia. Segundo o exemplo que já nos foi
dado. Provoquemos reuniões por cada cantão.
Os comités cantonais enviam delegados às paróquias para ganharem amigos para a obra e
fornecer-lhes informações e documentos. Estes, um por vez, vão fazer apostolado nas moradias,
apresentar o bom jornal e pedir a assinatura.

461 Quem serão estes apóstolos?


Párocos e curas fizeram, de sua própria pessoa, propaganda por domicílio sobre as
Causeries du Dimanche e o Pèlerin.
Em Lille, em Saint-Chamond, no Creusot, são feitos por operários.
Em Paris, em Lião, em Saint-Etienne, acontece por jovens da burguesia ou por círculos
católicos.
Alhures, dá-se com mulheres e crianças.
Os Chevaliers de la Croix (Cavaleiros da cruz) e os Pages du Christ (pagens de Cristo)
multiplicam-se e fazem prodígios um pouco por toda a parte. Os começos podem ser difíceis.
Deve-se perseverar e continuar a propaganda. O sucesso acabará sempre por vir.

462 VII. Assinaturas. – Será pelo preço mais baixo que havemos de suplantar os outros jornais.
No povoado mais pequeno, pode-se encontrar 10 que assinam o La Croix no pequeno
formato.
Dez números em conjunto expedidos pelos Correios custam 0 francos 10 na compra e 0
francos 20 de porte, seja 0 francos 30. Tal vem a perfazer 8 francos 10 mensais (27 números). –
Pode-se neste caso, pedir a cada cliente 0 francos 20 por semana, ou 1 franco por mês. Dez
assinaturas a 1 franco por mês dão 10 francos. Fica um excesso por conseguinte para o distribuidor
ou para a difusão de outra publicação, do Lacroix local, por exemplo.
O envio por encomenda postal é mais proveitoso, seja para o La Croix quotidiano, seja para
o La Croix du Dimanche.
Uma expedição por pacote postal de 3 quilos só custa 0 francos 60 na estação; e pode conter
100 La Croix no formato grande ou 100 Pèlerins, 200 Croix no formato pequeno, ou então 150
Vidas dos santos ou Causeries du Dimanche com iguais números de La Croix no formato pequeno.
Um pacote de 5 quilos custa 0 francos 80 na estação, pode conter 170 Croix no formato
grande ou 340 Croix no formato menor, ou então 250 Vidas dos Santos ou Causeries du Dimanche
com o mesmo número de Croix no formato mais pequeno.
Um pacote de 10 quilos, custando 1 franco 25 na estação, pode conter 340 La Croix no
formato maior ou 340 Pèlerins, 680 Croix de formato pequeno e, noutro caso, 500 Causeries du
Dimanche ou Vidas de santos com igual quantidade do La Croix no formato mais pequeno.

463 VIII. A Venda de mão em mão e venda sobre a via pública. – A lei liberta aos passadores
de mão em mão e aos distribuidores da autorização prévia; ela os obriga apenas a uma simples
declaração na Câmara dos seus nomes, prenomes, profissão, domicílio, idade e lugar de nascença.
Desde esta declaração, é-lhes entregue gratuitamente um recibo, para ser apresentado em qualquer
requisição.
A distribuição e o passe sucessivo acidentais (por prospeto ou por números padrões) estão
livres completamente; estão exemptos até mesmo da formalidade da declaração.
Nem é mesmo necessário que o passador seja francês e goze dos seus direitos civis e
políticos.

464 IX. Os resultados. – Quais são os resultados obtidos sob o ponto de vista do bem social ?
Certo está que um jornal não muda as ideias num só dia. É um trabalho tanto mais
prolongado quanto encontra obstáculos mais numerosos e sérios. É preciso tempo para soerguer
as ideias de um povo que perdeu a fé, que é doutrinado pelos políticos, desmoralizado pela má
imprensa, que é vítima da escola sem Deus e das utopias socialistas.
Como quer que seja, é uma constatação geral, e uma graça de Deus, ter o La Croix quebrado
em muita gente os laços da vergonhosa escravatura que os subjugava ao respeito humano.
Habituou-se a olhar para o crucifixo e a tê-lo entre as mãos.

465 Com o La Croix, o Evangelho também regressa às casas dos católicos que não mais o
conheciam.
Se se perguntar aos padres qual o proveito que dele tiraram, um dirá que subiu o número
de homens na Missa; outro que há mais comunhões pela Páscoa; um outro que foi a origem das
obras paroquiais, sindicato, caixa de família, etc.; outro ainda que os passadores de maus jornais
renunciaram a vir até ele.
Seria preciso vários volumes para explicar todo o bem realizado. Ponhamo-nos em ação.
Temos na Boa Imprensa um dos meios mais eficazes para restaurar o reino de Deus nas almas e
na sociedade.

466 Outras publicações. – As publicações da Boa Imprensa formam um verdadeiro arsenal.


Não podemos mostrar aqui senão uma enumeração sumária das principais.
O Croisade de la Presse (Cruzada da Imprensa), hebdomadário, indica os melhores
métodos para lutar contra a invasão da má imprensa pela difusão da boa imprensa e expõe os
resultados obtidos. Orgão da propaganda.
O Petit Journal bleu (O pequeno jornal azul) ou o Ligue de l’Ave Maria (Liga da Avé
Maria) mensal, excita à oração e às obras do apostolado para a salvação da França.
O Questions actuelles (questões atuais), preciosa revista documentária, muito estimada
pelos estudiosos, conferencistas, jornalistas. Cada semana uma expedição compacta de 32 páginas,
5 belos volumes por ano.
O Cosmos, hebdomadário ilustrado, o mais antigo e um dos mais estimados jornais
científicos.
O Contemporains (Contemporâneos) publica semanalmente, numa edição ilustrada de 16
páginas em formato grande, a biografia de um personagem célebre. Revisão católica de toda a
história moderna.

467 O Bulletin des Congrégations é indispensável aos religiosos perseguidos e a todos os seus
defensores.
O Echos d’Orient (Ecos do Oriente), revista sábia sobre todas as graves questões do
Oriente.
O Echos de Notre-Dame-de-France à Jérusalem (os ecos de Nossa Senhora de França em
Jerusalém), mensário ilustrado, jornal dos peregrinos na Terra santa, os antigos, novos e futuros.
O Le Mois (O Mês), revista literária e pitoresca, imprimida com grande luxo, 160 páginas,
a mais completa e variada das revistas.
O Le Noël (o Natal), hebdomadário, jornal católico para crianças, muito ilustrado com arte,
dá o retrato dos seus abonados.
As Conferências, bimensais, necessárias aos conferencistas, relatam conferências com ou
sem projeções, cópias e a crónica do movimento das conferências.
A ação católica mensal, oferta gratuitamente aos abonados das Conferências e da Crónica
da boa imprensa.
Citemos ainda o La Croix illustrée, Rome, o Laboureur-Revue, a franc-maçonnerie
démasquée, o Fascinateur, etc.
Toda a pessoa responsável de obras fará bem consultar o Catálogo geral da Boa imprensa
e o Manual de propaganda, enviados grátis aos que pedirem, 5, rua Bayard, Paris, VIIIº.
CAPÍTULO VI
AS CAIXAS RURAIS DE CRÉDITO
468 O que é. – A caixa rural é uma associação mútua dos cultivadores e artesãos de uma
comuna, para encontrarem crédito. O seu fim é o de emprestar a uma taxa razoável dinheiro ao
agricultor ou artesão que tenha necessidade dele, para criar, engordar gado, semear terras, comprar
utensílios, etc. A caixa rural quer ajudar o trabalhador, encorajar e proteger o agricultor.
As caixas rurais já prestaram os maiores serviços no estrangeiro. Na Alemanha são
chamadas as Caixas de Raiffeisen, nome do seu primeiro organizador. Desde longos anos,
funcionam na Alemanha, na Áustria, na Itália, na Rússia, etc. Existem vários milhares delas. Elas
tiveram êxito por toda a parte e nenhuma fez perder um cêntimo aos seus credores nem aos seus
associados. Todas facilitaram aos seus membros o exercício da profissão agrícola, fornecendo-lhes
os modestos capitais necessários a uma boa cultivação e livrando-os dos usurários.

469 Em França, desde há muito tempo, a opinião pública preocupava-se com isso. Julgava-se,
como sempre, numa grande administração do Estado. Uma nova lei chegou mesmo a propor uma
organização que ficaria sem dúvida no papel. Mas um advogado católico de Lião introduziu no
nosso meio as Caixas de Raiffeison, ainda melhorando mais o seu regulamento. Fundam-se várias
caixas rurais entre nós, e chamamo-las Caixas Durand. Já temos 600 delas desde há cinco anos.
Elas obtêm sucesso por todo o lado.61

470 II. O seu sucesso. – É admirável e a imprensa o constata. Os bispos encorajam-nas; o


Soberano Pontífice aconselhou-as e louvou-as.
Leão XIII, tendo conhecimento do que acontecia na diocese de Tarbes, quis enviar uma
bênção especial ao padre Fontan, «que se ocupa com zelo admirável e pleno sucesso da Obra das
caixas rurais».
Ele pediu ao bispo de Tarbes de comunicar à sua diocese esta prova da benevolência
pontifícia que lhe envia o Santo Padre, para o fortificar e encorajar nesta obra tão
maravilhosamente apropriada às necessidades da nossa época.
O senhor bispo de Tarbes, protetor do padre Fontan, acaba de lhe dar um auxiliar para esta
propaganda na pessoa do padre Laforgue.

471 O senhor bispo de Digne, que reunia em Dezembro de 1894, no Seminário maior, os padres
capazes de preparar o movimento das caixas rurais na sua diocese, dizia:
«O nosso mundo operário, para nós, são estes pequenos agricultores para quem devemos
tornar, tanto quanto possível, a agricultura florescente, segundo uma expressão do Santo Padre.
Devemos por conseguinte ocupar-nos das Caixas rurais. Cabe aos padres diocesanos de as
estabelecer em seu redor! Eles participarão desta maneira plenamente nas vistas do seu bispo».
Um jornal da rua dizia na mesma época: «O crédito agrícola, tal qual nasce de si mesmo,
com as 200 caixas rurais fundadas num ano pelo senhor Louis Durand de Lião, são camponeses
que se coligam para terem dinheiro de modo acessível tal como os temos visto se coligarem no
sindicato e na cooperativa para terem mercadorias mais baratas.
____________________________________________
61
Elas são normalmente agregadas à União das caixas rurais, 97, avenida de Saxe, em Lião. O senhor
Louis Durand, diretor.

472 Sindicato, cooperativa, crédito mútuo, tais são as três etapas deste grande movimento
rural que temos tentado analisar.
Comprar menos caro, vender melhor, encontrar fundos de prossecução para melhorar as
suas culturas. Eis quanto pedem os agricultores.
Eles não sonham com o paraíso terrestre anárquico de que o senhor Elisée Reclus compõe,
neste comenos, a geografia, nem a terra prometida pelo senhor Jaurès aos socialistas, mas eles
pedem estas três coisas que acabamos de dizer; e tal, nem o senhor Reclus, nem o senhor Jaurès
lhes deram. Mas outros ergueram-se e meteram-se no trabalho, cômpito rude sem dúvida e obra
de dedicação, mas que produziu mais fruto que a vã retórica dos oradores do quarto Estado».
Uma obra que consegue semelhantes acordos, do alto ao baixo da escala social, desde o
Papa até à imprensa mundana, passando por bispos e economistas, não pode deixar de ser uma
obra de salvação.

473 III. A sua utilidade. – Estas Caixas rurais portanto serão úteis? – Evidentemente. O
camponês tem necessidade de capitais para trabalhar, seja para se entregar a uma cultura intensa e
produtiva, seja até para as necessidades ordinárias; compra de utensílios, de gado, de sementes e
de adubos.
Outrora ele pedia emprestado ao seu vizinho, mas este não é rico e, se tiver reservas, ele se
deixa atrair mais facilmente pelos negócios industriais.
Também há a banca da cidade próxima, mas a banca não conhece o agricultor, nem aprecia
fazer estes empréstimos mínimos que imobilizam os seus capitais durante períodos longos. A
banca prefere os negócios correntes, a três meses ou mais de prazo. Ela vive das suas comissões,
aliás a banca, com suas despesas de comissão e de renovação, chega mesmo a pedir de 8 a 10% de
juro.

474 Há o judeu e o usurário que fazem a sua obra nefasta nos campos, bem mais do que se
poderia pensar. Para a ruína dos nossos pequenos agricultores.
Tentou-se bancos agrícolas, os bancos Schulze na Alemanha, os bancos Luzzatti na Itália.
Ainda não consta serem salvação. Os bancos têm acionários que querem dividendos e
administradores que custam caro. Sobre 1.000 bancos deste género na Alemanha, 200 caíram em
falência ou foram liquidados em dez anos.
Um banco do Estado também custará demasiado caro.
A solução é a caixa rural de crédito mútuo.

475 IV. A sua constituição. – É muito simples. Alguns agricultores honestos e cristãos
conhecem-se entre eles, unem-se e formam uma pequena sociedade de crédito mútuo.
É bastante legal. Tal se chama em França sociedades com nome coletivo de capital variável.
Elas são arregimentadas pelo título 3 da lei de 24 Julho de 1867.
Deve-se começar somente com três membros, pois que a lei exige idêntico número de
cópias seladas do ato fundador da sociedade quantos os membros da sociedade. Portanto começa-
se com três. Estes três assinam o ato constitutivo da sociedade sobre as suas três cópias. Os outros
membros da sociedade aderem de seguida à sociedade, ficam enregistados sobre o registro das
entradas e saídas, e isso sem custar nada.
Deveríamos aqui dar o modelo dos estatutos e o do registro, muito simples de o conservar.
Mas tal encontra-se explicado numa brochura excelente do senhor Durand, intitulada: Manual
prático para uso dos fundadores e dos administradores das caixas rurais. Tal custa em francos,
um franco e 30, quer seja na Casa da Boa imprensa, 5, rua Bayard, Paris, quer seja no próprio
autor, em Lião, 97, avenida de Saxe. Esta brochura é indispensável para os fundadores e os
administradores.

476 V. Responsabilidade dos membros da sociedade. – No Direito, todos os associados são


solidários e responsáveis dos empréstimos que pediram. Mas que não se tenha medo, a
responsabilidade é, na realidade, sem inconvenientes e nenhum membro nunca perdeu nada.
Com efeito, os membros da sociedade conhecem-se entre si. Eles pertencem todos à mesma
comuna. Eles foram escolhidos e não se recrutam senão no meio de pessoas honestas. Eles não
emprestam, senão de modo prudente, apenas aos associados e com um fim determinado. Nunca se
empresta para exclusivo consumo privado. Os empréstimos que se fazem ajudam à produção
através da compra de instrumentos, de adubos, de gado, de sementes, etc.
A caixa aliás cedo cria uma reserva, como veremos de seguida, e se houver qualquer dano,
logo ficaria coberto.

477 VI. Funcionamento. – A caixa não tem capitais à partida. Quando ela julgar facultar um
empréstimo oportuno, ela própria pede emprestado para depois emprestar. Ela encontra fundos
facilmente a uma taxa moderada de 3%, 3,5 ou ao máximo de 4% pois que oferece a maior garantia
por causa da solidariedade dos membros. Ela empresta a 4 ou 4,5. Torna-se vantajoso para quem
empresta e a caixa encontra nisso um pequeno proveito que constitui a sua reserva.
A reserva iria prover as percas que poderiam sobrevir. Ela também pode ser empregue,
numa certa medida, em instituições de beneficência, ou servir a retribuir um contabilista se acaso
os montantes da caixa se tornarem importantes.
O que pede emprestado deve sempre apresentar uma caução solúvel.
As épocas de reembolso são fixadas de forma a deixar ao que pede emprestado o tempo
necessário para retirar dos seus fundos o benefício de que está à espera.

478 VII. A administração. – Ela é fácil. Para fazer funcionar uma caixa rural, não é necessário
estar ao corrente dos negócios da banca: alguns homens, que conhecem bem a sua comuna,
pertencendo à classe agrícola e sabendo fazer as quatro contas da aritmética, podem administrar
bem uma caixa rural, desde que queiram dedicar a ela alguns momentos por semana.
Os estatutos explicam as funções, aliás muito fáceis, do conselho de administração, do
conselho de vigilância, do diretor e do contabilista.
Um dos principais deveres do conselho da administração é o de guiar o membro da
sociedade no emprego dos fundos que ele pede emprestado, de modo a que possa tirar o maior
proveito possível.

479 Encontrar-se-á no gabinete da União das caixas rurais em Lião, 97, avenida de Saxe, os
estatutos já imprimidos em papel selado e os registos necessários. Estes documentos custam à volta
de 18 francos. O senhor Durand responde com uma ética, uma exatidão e uma precisão
encantadoras a todas as perguntas de informação que lhe são dirigidas; É justo ajuntar ao pedido
um selo de 0 francos e 15 para a resposta. Não saberíamos recomendar em demasia, aos fundadores
das caixas rurais, a filiação de cada caixa à União das caixas rurais. Eles encontrarão aí preciosas
indicações. A filiação é gratuita; recebe-se um boletim mensal pelo preço de 2 francos anuais, que
dá informações indispensáveis, ao mesmo tempo que relata os progressos desta obra ainda muito
pouco conhecida.

480 Aconselhamos a que se procure a pequena brochura do senhor padre Quillet, pároco de
Burcy, por Epeugney (Doubs). A conferência na aldeia – Caixas rurais. – Com o preço em francos:
cada exemplar, 0 francos 30. Ela é perfeita para fazer compreender aos cultivadores modestos e
aos artesãos a finalidade da caixa rural, o seu funcionamento e suas vantagens. Também nela está
a refutação a todas as objeções que poderiam ser feitas sobre o assunto.
Assinalamos aos nossos leitores uma instrutiva e maravilhosa brochura que acaba de
publicar um dos nossos amigos, grande propagandista das caixas rurais no Pas-de-Calais e no
Norte. É vivo, claro e preciso. O estilo deste escrito, cheio de entusiasmo, absolutamente fruto da
experiência, mostra de modo excelente as diversas aplicações e os resultados que produz
necessariamente, quase como se diga fatalmente, a criação de uma caixa rural. Monografia de uma
caixa rural, por um oficial superior de cavalaria. – Imprensa moderna de Arras, 7, praça Wetz de
Amain, Arras; o preço não vem indicado, mas certamente é pouco elevado com vista a servir de
propaganda.

481 VIII. O Lado moral da obra. – Esta obra ocupa-se dos sofrimentos dos agricultores e os
alivia. Portanto trata-se de uma obra moral e caritativa.
O espaço rural se despovoa. Os agricultores abandonam os lugares onde nasceram; e se
afastam da igreja, na qual fizeram a primeira comunhão. Eles dirigem-se para as cidades; que
encontrarão aí? A incredulidade a a tentação dos prazeres perniciosos. Se assim abandonam o
campo é porque sofrem, é porque já não ganham mais de que viver. Retê-los no campo por meio
de obras apropriadas às suas necessidades, não será a obra das obras, para que conservem a fé,
bons costumes e saúde robusta, para o futuro da raça e da pátria.
Os sindicatos exercerão uma forte influência, mas as caixas não são menos necessárias.
Demais a mais, a caixa rural favorece a honestidade dos costumes e a regularidade do
comportamento. Nas comunas rurais, sabe-se que não se aceita nas caixas de crédito exceto pessoas
de confiança. É um título de honra tomar parte nelas. Elas são uma escola de honra, de probidade
e de bom comportamento. Aí aonde funcionam, operaram numerosas conversões.

482 As caixas de crédito põem também os trabalhadores do campo em relação com o padre, já
que normalmente o padre faz parte delas. É seu dever. Ele deve contribuir, para uma obra tão útil,
com o concurso da sua inteligência e do seu zelo. Quase todas as fundações das caixas rurais
devem-se aos párocos. Não há nenhum inconveniente para elas a que o pároco seja secretário
contabilista. A este título, não faz parte dos administradores, e para cada pedido, pode sempre
referi-lo ao diretor; pois não tem a responsabilidade sobre as decisões tomadas. Não pode ser
acusado de se aproveitar do dinheiro em caixa por causa do controle periódico da administração;
a contabilidade é conhecida e controlado por todos os membros. Ele tem o cômpito de guardar os
documentos, mas não é verdade que muitas vezes é o único que, numa pequena comuna, possa
fazê-lo com facilidade? Pelo contrário, esta situação permite-lhe contatar todos os membros da
sociedade, de dar um aviso a um, um conselho a outro, sem ser suspeitado por ninguém. Não será
acaso a missão do ministro de Jesus ir ao encontro de todos os que sofrem para os aliviar?

Nota – acrescentamos no fim do volume (página 291 e seguintes) o que concerne às formalidades
administrativas relativas aos sindicatos e aos sindicatos agrícolas.

CAPÍTULO VII
OS CÍRCULOS RURAIS
483 Vamos aqui descrever a ação da Obra dos Círculos no campo. Mas, para ser exato, não
aconselharíamos neste caso a adotar o círculo como forma preferida para fundar uma obra social
numa paróquia rural. Porquê haveríamos de adotar uma forma para uma obra social quando essa
depende da boa vontade dos prefeitos e sujeita muitas vezes a restrições tirânicas, enquanto temos
a lei de 1884 que nos autoriza a fundar sindicatos com uma liberdade maior?
Pensamos, por conseguinte, que não se deve fundar círculos propriamente ditos no campo
à semelhança do que se faz nos povoados onde se quer reunir numa mesma associação homens de
profissões diferentes, que não poderiam estar agrupados num mesmo sindicato.

484 Mas nas aldeias onde toda a gente pertence mais ou menos à profissão agrícola e às
profissões conexas, não é um círculo que se deve fundar, mas um sindicato agrícola e hortícola, e
deve-se dar a este sindicato um lugar de reunião onde encontrará todas as vantagens e a vida de
um círculo sem estar submetido a todos os escaninhos administrativos dos círculos.
O capítulo presente, portanto, há-de servir para os aglomerados maiores onde se vai impor
um círculo. Quanto às aldeias, encontrar-se-á nelas apenas as indicações para organizar o lugar de
reunião do seu sindicato, e inspirar-se-ão do espírito eminentemente social que originou o
regulamento dos círculos para organizar a vida interna do seu sindicato e das obras conexas.
È sobre a forma de círculos que o espírito de associação, longo tempo reprimido, pode
retomar na França o seu primeiro desenvolvimento.

485 O artigo 291 do Código penal coloca os círculos debaixo da inteira dependência da
administração. Ele está assim expresso: «Nenhuma associação com mais de vinte pessoas, cuja
finalidade será de reunir todos os dias ou em certos dias marcados, para se ocuparem de objetos
religiosos, literários, políticos ou outros, não poderá se formar a não ser com o acordo do governo
e sob as condições que agradará à autoridade pública impor à sociedade».
Uma administração favorável às coisas religiosas, depois da guerra, deixou espaço aos
círculos católicos de operários para um certo florescimento. Atualmente o favor foi retomado,
deixa-se vivê-los, mas devem, seguramente, conformar-se com as exigências da lei. Há por
conseguinte para a fundação de um círculo prescrições legais a observar e regras administrativas
para seguir; vamos examiná-las primeiramente e diremos depois o que carateriza o círculo como
obra social de regeneração.

486 O círculo sob o ponto de vista administrativo. – A primeira formalidade a preencher para
abrir um círculo é portanto obter a autorização do governo representado pelos prefeitos. Para tanto,
deve-se endereçar ao prefeito do departamento um pedido sobre papel selado a 0 francos 60,
assinado por três ou quatro pessoas, apor nele os estatutos da associação sobre papel selado 62 e
uma cópia dos mesmos estatutos sobre papel normal, e acrescentar a lista dos membros do gabinete
em papel normal.
A prefeitura não irá autorizar a abertura de um círculo senão depois de ter tomado a
_______________________________________________________
62
A importância do carimbo sobre o qual se copia os estatutos, depende do seu comprimento. Se forem
muito sucintos, que convém mais, uma folha de 0 francos 60 basta.

opinião do presidente da Câmara da localidade na qual o círculo deve estabelecer-se. Ganhar-se-á


tempo solicitando previamente a opinião da autoridade municipal, e ajuntando-a a outras peças,
para entregar o conjunto à prefeitura.

487 O prefeito pode retirar sempre a sua autorização.


O documento do prefeito que autoriza a fundação de um círculo estipula ordinariamente
que a lista dos membros do gabinete seja enviada cada ano à prefeitura no decorrer do mês de
Janeiro.
Para além desta autorização que não respeita senão a associação, o Código penal exige uma
outra, a do presidente da Câmara da comuna antes que se possa começar as reuniões. O artigo 294
está, com efeito, assim formulado: «Qualquer indivíduo que, sem a permissão da autoridade
municipal, terá concordado ou consentido o uso da sua casa ou do seu apartamento na totalidade
ou em parte, para a reunião dos membros de uma associação mesmo autorizada ou para o
exercício de um culto, será punido com uma multa de 16 francos a 200 francos».
Estas diferentes autorizações devem ser conservadas nos arquivos da associação.
Importa não se afastar destas prescrições, pois, em caso de infração à lei, expõe-se ao
encerramento do círculo e a diversas penalidades.
488 O imposto sobre as cotizações é determinado pelo montante da cotização e o número de
membros inscritos; um registo completo é por isso necessário para estabelecer o número exato dos
membros que frequentam o círculo e que pagam a sua quota. O serviço das contribuições tem o
direito de controlar a declaração que se fez, ao verificar o registo das cotizações.
O local do círculo é ordinariamente a propriedade dos administradores do círculo, ou é
alugado por eles. São os locatários ou proprietários que devem velar a que não se passe nada de
contrário às leis, aos estatutos ou às condições da autorização.
É um lugar privado; no entanto pode haver nele um pequeno bar, para uso dos membros
do círculo sem que a gerência nada tenha a controlar. Mas, para isso, deve-se velar a que o bar seja
para uso exclusivo dos membros do círculo e que não seja aberto a qualquer forasteiro como se
fosse uma taberna.

489 Quanto às representações ou soirées teatrais, às quais são convidadas outras pessoas além
dos membros da sociedade, elas devem guardar um caráter puramente privado. Elas devem ser
dadas num lugar fechado no qual ninguém é admitido senão através de convites escritos ou
pessoais.
Quando a entrada das representações for a pagar, os gabinetes de beneficência reclamam a
taxa dita do direito dos pobres. Alguns autores pretendem que esta taxa é devida somente para as
representações que são ao mesmo tempo públicas e pagantes, mas é uma interpretação contestada.
Antes de representar as peças ou trechos que não caíram no domínio público, importa
regular a questão dos direitos de autor, de outro modo fica-se exposto à alçada judiciária. 63 A
sociedade das pessoas de Letras tem, em todas as cidades maiores, representantes com todo o poder
para regular este pagamento dos direitos de autor.
_________________________________________________
63
O artigo 428 do Código penal, e lei de 14 de Julho de 1800.

490 Para que as lotarias e as tombolas não caiam debaixo da lei do 21 de Maio de 1830, é
necessário que aconteçam numa reunião privada, e que os bilhetes não sejam vendidos fora da
reunião na qual a lotaria for sorteada.
Os estatutos mais simples são os melhores. Eis um modelo que se pode adotar:
I. Uma sociedade é instituída em X…, para agrupar homens e jovens, sob o nome de
Círculo de São José (ou outro).
II. O fim da sociedade é de preservar os seus membros das más companhias.
III. Na sociedade, encontrar-se-á jogos e recreios honestos.
IV. Não se tolerará aí nem os jogos de azar, nem o abuso de consumos, nem as discussões
políticas.
V. A entrada nas reuniões ordinárias está vedada ao público.
VI. A direção da sociedade pertence a um comité, composto dos senhores X…, Y…, Z…
Está claro que se tem, além disto, um regulamento interno privado, mais detalhado e
baseado principalmente na experiência.

491 II.O círculo sob o ponto de vista social. – O círculo não é apenas um local mais ou menos
bem mobilado e confortável, provido de recreios diversos e agradáveis, de bebidas variadas, de
livros interessantes e instrutivos, mas deve ser sobretudo uma associação ao lado de uma capela
nas cidades, junto à igreja paroquial no campo, e, por toda a parte onde seja possível, o círculo
favorecerá as associações profissionais.
Encontrar-se-á na Instrução sobre a Obra dos Círculos católicos de operários (no
secretariado da Obra, 262, avenida Saint-Germain, em Paris), todas as informações necessárias
para a organização e a direção dos círculos. Aqui não podemos senão indicá-los nos seus traços
mais fundamentais.

492 A obra dirige-se antes do mais à classe dirigente e lhe dá a missão de criar e manter, na
classe operária, associações católicas. Ela propõe-se o restabelecimento do reino social de Jesus
Cristo, e ela instaura no círculo um poderoso centro de apostolado.
A vida interna do círculo tem por finalidade formar homens de elite, e sua ação se propõe
um triplo resultado a desenvolver:
1.O espírito religioso;
2.A ideia de responsabilidade pessoal e o espírito de iniciativa;
3.O espírito de associação.
A afirmação católica é manifestada pelo nome de círculos católicos de operários e pela
instituição de um capelão; deve-se chegar a desenvolver nos membros do círculo, não só a fé,
como também o exercício das leis da Igreja.

493 Os membros operários do círculo participam no seu governo, ao nomearem, de acordo


com o comité representado pelo diretor, um conselho encarregado de administrar os interesses
materiais do círculo. Esta responsabilidade no governo material da associação conduz
necessariamente o membro da sociedade a desejar que a sociedade prospere e lhe inspira o desejo
de recrutamento de novos membros, e o apostolado do operário para com o operário é dos mais
eficazes. Almas generosas encontram-se com frequência nas classes operárias, pois o hábito do
sacrifício faz aproximar de Deus. É assim que grande número de círculos pode exercer uma real
influência sobre as fábricas e os bairros vizinhos, pela formação de delegados de fábrica e de
bairro, que são apóstolos ao serviço da população operária. O zelo, aliás, tem mil ocasiões de se
exercer na vida interna do círculo. A ideia de responsabilidade e o espírito de iniciativa
desenvolver-se-ão aí pelas diversas dignidades de que poderão ser investidos os membros mais
devotados

494 Enfim, o espírito da associação é mantida e salvaguardada pela instituição da obra, que
não está em oposição com a família, nem com a paróquia. O livrete-diploma, remetido apenas aos
mais dignos, dá acesso em todas as associações da obra a quem for o seu portador. Ele é a prova
da mesma fé religiosa. Ele é a marca do laço religioso e moral que une todos os membros da Obra.
Ao lado do Círculo, podem funcionar certas instituições de piedade ou económicas, que
associam a família inteira à vida do círculo e aos benefícios resultantes da associação, como as
visitas aos doentes, as Sociedades de São Vicente de Paulo, as caixas de família, as caixas de
socorro mútuo, etc.
Outros círculos, independentes da grande instituição de que acabamos de fazer o rascunho
nas linhas fundamentais, podem não ser mais que reuniões de lazer honesto, os círculos da Obra
porém têm eminentemente o caráter social. Este se manifesta pela dedicação da classe dirigente,
pelo apostolado recíproco dos operários e a parte que eles tomam na administração do círculo, e
pela solidariedade que une todos os círculos de França e cujo signo é o livrete-diploma.
495 Não saberíamos contudo recomendar demasiadamente a todos os círculos que se
fundariam, de entrar no quadro da Obra para participarem na restauração da vida social cristã.
Encontra-se no secretariado da Obra dos Círculos, 262, avenida Saint-Germain, em Paris, uma
brochura especial sobre a Obra no campo.
È o pároco que tem a parte mais ativa na fundação do círculo rural. O comité é aí muito
pouco numeroso e mais difícil de recrutar, mas formar-se-á aos poucos.
O círculo rural não se abre ordinariamente senão ao Domingo, num local bem modesto,
dividido em dois compartimentos: um seve de oratório, de biblioteca, de sala de estudo; o outro de
sala de recreio. Alguns móveis, mesas, cadeiras ou bancos, um crucifixo, imagens do Sagrado
Coração, da Virgem Maria, de São José, compõem o mobiliário, com o material do jogo, preferido
no povoado, jogos de bilhas ou de «damas», tiro ao arco, etc.

496 As reuniões têm lugar a seguir às Vésperas; elas são curtas na sua parte essencial, orações,
bons conselhos, leituras interessantes. A maioria dos membros da sociedade regressa depois à vida
familiar; alguns restam para seguirem um curso de canto ou se entregarem aos jogos em uso.
As reuniões mensais tomam maior importância. Elas reúnem todos os membros da obra,
os internos como os associados, jovens e pais de família, e assim se faz uma conferência.

497 O círculo tem um oratório, mas a sua capela é a igreja paroquial. Um lugar especial pode
estar nela reservada aos membros da sociedade. Frequentemente trata-se do coro, e tomam parte
ativa no canto litúrgico.
Uma festa patronal, algumas outras festas durante o ano, segundo os usos locais e uma
peregrinação regional, são suficientes para manter os laços da associação e assegurar a sua
continuidade.
O círculo rural normalmente é o suporte das obras paroquiais. Ele fica anexo ao patronato,
e funda as obras económicas, os sindicatos, as caixas de família, e as caixas de crédito. Com a
associação conexa das mães cristãs, constitui uma espécie de corporação paroquial.
CAPÍTULO VIII
OS ECONOMATOS E AS COOPERATIVAS
498 Há várias formas de economatos. Por vezes, trata-se de uma verdadeira empresa
comercial, feita por um patrão ou por uma sociedade, com seus riscos e sua fortuna. Embora
semelhante empresa possa ter intenções benevolentes para com os operários, não consiste numa
obra propriamente dita. Trata-se de um negócio, pelo que não convém deter-se com isso neste
volume.
Noutras vezes, ele toma a forma de sociedade cooperativa de consumo. Estas cooperativas
multiplicam-se. Conta-se um milhar na França, 1.500 na Inglaterra, 1.200 na Alemanha. Muitas
destas sociedades, em França, não têm a intenção que não seja uma venda barata, não tiram
nenhum benefício e não têm qualquer fim moral direto. Não as poderemos olhar como sendo obras.

499 O sistema inglês, dito sistema de Rochdale, consiste em vender mais ou menos ao preço
ordinário do retalho, de modo a fazer lucros que podem ser empregues de modos muito diversos e
serem úteis. Todas as sociedades inglesas e alemãs e algumas francesas adotaram este sistema que
parece ser o melhor. O lucro médio é de 13,50% na Inglaterra e de 9% na Alemanha.
O mais frequente, o benefício destas cooperativas será distribuído aos participantes no fim
do ano. Neste caso, mais uma vez, não se trata de uma obra mas de um negócio.

500 Mas por vezes uma parte do benefício é afeto a instituições de educação ou de previdência.
Então somente a sociedade cooperativa pode ser considerada como obra. Assim acontece
frequentemente na Inglaterra onde as sociedades cooperativas consagram à educação e à
assistência dos seus membros a enorme soma de 1.450.000 francos por ano. Sobre este total,
350.000 francos são empregues na educação dos membros sob a forma de círculos, conferências,
cursos regulares, salas de leitura, etc.
Ainda não existe quase nada de semelhante por enquanto em França. Cita-se contudo, em
Lião, uma sociedade que tem 5.000 francos na reserva para uma caixa de reforma.

501 Os nossos sindicatos agrícolas fazem geralmente a cooperação sob duas formas diferentes.
Ou eles constituem um armazém e compram algumas mercadorias, que revendem barato e sem
lucro aos seus membros, ou então eles se contentam de pedir a alguns fornecedores preços
reduzidos em favor do sindicato.
Poderemos compromete-los, em caso semelhante, a reservar uma parte dos benefícios para
dotar as suas obras de assistência e de previdência. Então os seus economatos e cooperativas serão
verdadeiramente obras.

502 Há outra forma de economato recomendado pelo senhor padre Garnier, que oferece
verdadeiramente uma utilidade moral ao mesmo tempo que vantagens económicas. É uma obra.
Eis a sua descrição e o seu funcionamento.
O economato tem por finalidade o de possibilitar a todos uma redução dos preços normais,
ao suprimir as contas a crédito, sempre tão desastrosas para os operários, e ajudá-los a pagar as
suas dívidas. Para tal basta:
1º De obter de certos fornecedores reduções de preço, por meio de pronto pagamento.
2º De se dirigir a estes fornecedores, cuja lista foi publicada.
3º De pagar em espécies as compras para as quais se quer aproveitar do economato.
4º De reclamar aos fornecedores, pagando-lhes, amostras que mostram o valor do que se
compra.

503 Eis agora o funcionamento do economato : os fornecedores encheram-se no tesoureiro de


amostras que representam um valor, ou de bilhetes marcados no carimbo da associação.
Quando os compradores vão ter com eles, ao mesmo tempo que eles pagam de imediato,
estes recebem o valor da sua aquisição em amostras ou num bilhete sobre o qual o fornecedor
inscreve a soma. Eles guardam estas amostras ou bilhetes até ao fim do trimestre.
Todos os três meses, o tesoureiro vai receber a prima aos fornecedores, e a distribui aos
compradores à vista das suas amostras ou bilhetes e na proporção das compras.

504 O tesoureiro guarda, para as despesas da administração, e em favor da caixa de família ou


de uma outra obra.
Aos operários, o quarto da sua prima.
Às outras pessoas, a metade.
Assim, no trimestre, se tiverdes nas vossas diferentes amostras adicionadas, 20 francos de
prima, alcançareis 15 francos se fordes operário, e 10 apenas se não o fordes.
Vê-se o imenso benefício que pode resultar da prática para as obras operárias, sem falar
das vantagens que decorrem para os operários do pronto pagamento.
Por vezes, a comissão que dirige o economato faz um avanço aos operários que têm dívidas,
a fim de lhes permitir de pagar de imediato, pois ela recebe as suas amostras no seu lugar, para se
reembolsar por este avanço.
505 Eis um exemplo bastante curioso de um economato sob a forma de cooperativa, que
ocasionou um grande bem moral. Nós pediremos emprestado a monografia à Crónica dos Comités
do Sudeste.
Trata-se de um economato criado sobre o fundo da madeira para os madeireiros, por um
padre.
Passou-se num lugarejo, situado a poucos quilómetros de uma pequena cidade, mas sobre
um planalto elevado, frio, pouco fértil, enquadrado entre duas florestas.
Os habitantes são pouco numerosos, de 5 a 600, sem muita cultura intelectual e menos
ainda moral; eles estavam até 1890 dependentes dalguns mercadores que abusavam deles. Sem
padeiros, sem carniceiros; ao invés, oito donos de cabaret e quatro merceeiros vendedores de
bebidas.
O dono de cabaret era o rei do povoado, intermediário para tudo e subjugando toda a gente
por meio do crédito. Resultados: endividamento, bebedeiras, luxúria, etc., desordem sempre a
aumentar.

506 O novo pároco, em 1891, julgou que seria preciso preocupar-se dos interesses materiais
tanto quanto dos espirituais. Mas ele não tinha nada. Um comité, na cidadezinha vizinha,
conseguiu ajuntar 1.500 francos; confiou-os ao pároco que pôs 500 francos em circulação e 1.000
de reserva. Era em Agosto de 1891.
Compra-se um pouco de mercearia por grosso na cidade, algumas porções de lardo nas
charcutarias e alguns barris de vinho a proprietários. Mas como organizar tudo isso? O primeiro
armazém foi aberto na casa de um carvoeiro: ele encarregava-se do transporte e a sua mulher
vendia, em paga de uma pequeno benefício, variando entre 40 a 50 francos por mês. Para a
instalação, bastaram umas tábuas e uma balança.

507 Logo, os clientes afluíram, pois que se vendia quase ao preço do custo.
Os donos do cabaret, perturbados na sua exploração, protestaram energicamente. Ameaças,
insultos, acusações na subprefeitura, ao bispo, petições, denúncias sobre o pároco, não faltou nada.
Mas um inquérito demonstrou a regularidade perfeita das operações: o pároco limitava-se a
guardar as contas, o economato não obtinha nenhum benefício, operando, como intermediário
gratuito, à maneira de um sindicato.
Os senhores credores viram-se na cruel necessidade de abaixar os seus preços de judeus.
Em Dezembro de 1891, o economato abriu um segundo armazém e, espraiando as suas
operações, pode, dirigindo-se cada vez mais aos produtores diretos, obter reduções ainda mais
fortes. Depois ele meteu-se com a padaria comprando trigo, fazendo-o moer, e confiando a cinco
dos seus clientes, por meio de 4 francos para 125 quilos de pão.

508 O abaixamento de preços de venda foi em média de 10%. Cinquenta famílias, seja a
metade da população, fazem manutenção no economato.
Em 1892, o economato comprou por 45.323 francos. Vendeu por 52.341 francos. A
diferença, seja 7.018 francos, foi assim empregue: mobília e despesas gerais, 5.688 francos; percas,
120 francos; contributos à associação dos pais de família, 200 francos; em reserva, 1.010 francos.
Em 1893 começou a repartição dos benefícios por mês.
Os resultados morais foram considerados. O reino dos donos de cabaret-merceeiros acabou.
Os chefes de família deixaram de ir até eles ou então muito menos. Os bailes tornaram-se raros.
Os habitantes, tendo visto o padre interessar-se do seu bem-estar material, perderam uma parte dos
seus preconceitos e começam a tomar de novo o caminho da igreja.

509 Aí está um grande exemplo. Os cultivadores, tal como os operários, têm cada vez mais
necessidade de serem defendidos contra a exploração escandalosa do negociante que, demasiadas
vezes, o oprime, o empeçonha, e demais a mais faz dele seu escravo político.
Não é que se possa imitar o caso por todo o lado. Esta forma de economato, é a luta violenta
contra as potências da paróquia.64 Se se julgar necessário, se não houver outro meio de conseguir
salvar as almas, e melhorar a sorte dos paroquianos, deve-se empreender isso com coragem.
Se esta luta não se impuser, a outra forma de economato, que consiste somente a pedir um
desconto aos fornecedores que se paga de imediato, é de todas as maneiras inofensivo e não pode
suscitar qualquer conflito.

______________________________________

[64 Quer dizer, as «más potências» que se encontram na paróquia (nota do editor)].

CAPÍTULO IX
AS CAIXAS DE FAMÍLIA
510 Aí está uma obra simples e fácil.
Trata-se de uma associação cujos membros têm por fim se agregarem mutuamente nas
doenças e nas diversas necessidades da vida. No fundo é uma sociedade de socorros mútuos com
formas muito simples e uma grande liberdade de aparência.
Podemos estabelecê-la por toda a parte, no campo como na cidade, sem qualquer
autorização nem declaração, em virtude da lei de 15 de Julho de 1850.
Um procurador meticuloso tinha contestado a sua legalidade: o Tribunal de primeira
instância de Paris, no seu decreto de 7 de Dezembro de 1882, reconheceu o direito absoluto que as
sociedades de socorros mútuos têm de administrar livremente, sem qualquer intervenção do
Estado.

511 Trata-se de obras da boa fraternidade cristã. O senhor padre Garnier levou-as a sério, e
teve êxito; elas multiplicam-se por toda a parte onde podem fazer ouvir a sua palavra quente.
Nestas aglomerações, preferencialmente urbanas mais do que rurais, dos arredores de Paris,
era o modo melhor de ter associações rapidamente e de reunir gente valente a quem se possa falar.
Evidentemente não é uma obra corporativa completa. O socorro mútuo não é senão uma
das funções da vida corporativa. No organismo da corporação moderna, o sindicato é a obra-prima
para os interesses temporais e a confraria para os interesses espirituais. A ambas estas associações
fundamentais vem ajuntar-se com utilidade a caixa de crédito, a caixa de família, o economato, os
seguros e outros ainda.
512 Nós pensamos que no campo, depois de ter semeado durante algum tempo o bom jornal,
será preciso ir direito ao sindicato. O resto virá facilmente quando o sindicato tiver começado com
o concurso do padre.
Mas não pretendemos dar com isto uma lição absoluta. Na região de Lião e nos Pireneus,
fundaram-se muitas caixas de crédito, que são prévios e preparam os sindicatos. Nos arredores de
Paris, são as caixas de família que estão na voga. Louvamos de boamente todos os que fazem
qualquer coisa, e não lamentamos a não ser os que nada fazem.

513 A caixa de família será às vezes uma obra subsistente por ela mesma, outras vezes uma
obra anexa a um sindicato.
Ela compreende ordinariamente famílias inteiras, homens, mulheres e crianças.
Ela tem seus membros participantes e seus membros honorários. Estes pagam uma
cotização e não recebem nenhum socorro.
A caixa possibilita a seus membros visitas gratuitas do médico e uma redução sobre o preço
dos medicamentos. Ela faz mais se os seus recursos permitirem.
Ela tem a sua festa anual. Ela ora pelos seus associados defuntos.
Mais ainda, para sermos úteis aos homens de boa vontade, nós propomos-lhes um
regulamento sumário, que modificarão como acharem por bem.

514 I. A Constituição. – Uma caixa de família está estabelecida na paróquia de X… (no campo
pode-se reunir duas paróquias).
Ela admite homens, mulheres e as crianças. Os seus membros estão inscritos ao mesmo
tempo numa confraria (ordinariamente Notre-Dame des Champs).
Os primeiros subscritores são admitidos de pleno direito. Os outros devem ser assistidos
por dois membros e admitidos pelo gabinete (comité).

515 II A administração. – A caixa é administrada por um gabinete composto de cinco


membros.
O gabinete nomeia no seu seio um presidente, um vice-presidente, um secretário e um
tesoureiro.
O gabinete reúne-se todos os quinze dias. Ele estatui sobre os pedidos que lhe são dirigidos,
regula o emprego dos fundos e decide todas as questões que se referem aos benefícios da caixa.
Uma assembleia geral é realizada cada ano no mês de Janeiro. Ela pede o relatório da gestão
anual e aprova-a, se for o caso. Ela reelege o gabinete (pode-se fixar a reeleição todos os três anos).
Zeladores são designados para cada rua ou cada bairro. Eles recebem as cotizações, visitam
os doentes e remetem-lhes os bons de visita e de farmácia.

516 III. Cotizações. – A caixa tem membros participantes e membros honorários.


Os membros honorários dão pelo menos 6 francos por ano.
Os membros participantes dão 0 francos 50 por mês.
Toda a contribuição torna-se benefício definitivo da Caixa e não pode ser restituído.

517 IV. Participação. – Os membros não podem participar nos socorros senão depois de três
meses da sua inscrição.
Os socorros compreendem a visita gratuita do médico, um desconto sobre os remédios, e
se o estado da caixa comportar, uma indemnização facultativa pela doença.
Esta indemnização não é um direito absoluto. Ela é fornecida pelo gabinete. Este tem conta
das suas reservas e das necessidades da família a socorrer.
No começo de cada ano, o gabinete estabelece as bases do socorro que poderá dar e
submete as suas resoluções à assembleia geral.
Não podem participar dos socorros aqueles cuja cotização estiver atrasada mais do que um
mês.

518 V. Formalidades a preencher em caso de doença. – O enfermo deve fazer prevenir o seu
visitador de bairro, que lhe entrega um talão de visita e uma senha de farmácia sobre a qual o
médico escreverá a sua receita.
O gabinete velará a que os médicos e farmacêuticos não lhes causem despesas exageradas.
No fim de cada mês, o tesoureiro centraliza os recibos e dá contas ao gabinete.
Uma tarifa é composta com os farmacêuticos e fica convencionado que eles não entreguem
artigos de luxo ou de fantasia.

519 VI. Secretariado. – Um registo está destinado a inscrever os membros honorários, com o
número da sua subscrição. Em cada contribuição, é-lhes entregue um recibo destacado de um bloco
básico.
Um outro registo recebe os nomes dos membros participantes.
Todos estes têm um cartão ou um livrete com o nome do seu vigilante. (Pode-se encontrar
todos os impressos úteis no comité da União nacional, 1, rua Feydeau, em Paris).

520 VII. Festas e cerimónias religiosas. – A caixa de família tem a sua festa anual, que
coincide ordinariamente com a assembleia geral.
A festa celebra-se de preferência ao Domingo e todos os associados são convidados à
Missa.
Quando algum membro falece, todos os associados são convidados a assistir aos funerais.
A carta com o convite recorda que o defunto pertencia à caixa de família.
Certas caixas de família adotaram a Missa do primeiro Domingo de cada mês.
CAPÍTULO X
O SECRETARIADO DO POVO
521 Trata-se de uma obra sui generis. Ela presta serviços relevantes nas cidades. Ela
apresentará proporções bem mais modestas no campo. Ela pode passar como um anexo do
sindicato agrícola ou do círculo rural. Ela também poderá funcionar à parte.
Em suma, refere-se a um gabinete de informações e de ajuda mútua. Esta obra põe-se ao
serviço dos operários e dos pobres. Ela põe-se mesmo à frente dos seus pedidos e procura as suas
carências.
Ela tem delegados de ruas, de bairros ou de oficinas. São homens de boa vontade que se
informam das necessidades e das misérias escondidas e transmitem as informações ao comité ou
secretariado.
Eles indicam aos interessados o lugar e a hora em que encontrarão as informações e a ajuda
necessária. Se for preciso, irão dar-lhes um bilhete para se apresentarem.
No campo, o secretariado do povo não terá qualquer importância exceto se acaso se apoiar
sobre as obras de uma cidade vizinha.

522 Os serviços que o secretariado pode prestar classificam-se em quatro categorias principais:
1. Escrever cartas;
2. Dar informações para colocar os órfãos ou os anciãos, facilitar os matrimónios religiosos,
a obtenção de socorros, etc.;
3. Descobrir as misérias escondidas e indicar as misérias simuladas;
4. Dar consultas jurídicas, financeiras, médicas, militares, ou arbitrar diferendos por
arbitragens amigáveis.
Na cidade, algumas senhoras se encarregam das três primeiras categorias de serviço. Para a
quarta, faz-se recurso a homens especiais.
523 Para o campo, estas espécies de serviços são prestados pelo pároco, pelo presidente da
câmara, pelo professor. Se houver um círculo ou um sindicato, o seu gabinete organizará um
modesto secretariado do povo.
Ele terá a lista de todas as obras das cidades vizinhas às quais se pode recorrer. As
irmãzinhas dos Pobres, os hospícios, orfanatos, institutos de surdos-mudos, etc.
Ele irá pôr-se em relação com as obras da cidade e encontrará aí homens de negócios
cristãos aos quais poderá se endereçar para questões de processos, de assistência judiciária, etc.
O secretariado do povo não presta apenas serviços temporais, mas exerce os seus membros
no apostolado, faz cair preconceitos e outorga aos leigos cristãos um crédito e uma influência
social de que aproveita a boa causa.

Nota. – Nada será de mais útil, para organizar bem esta obra, que o relatório do Sr. Padre Lecomte, de
Reims, sobre o Secretariado do povo. Encontra-se tal na Casa editora do arcebispo, em Reims.
CAPÍTULO XI
CÍRCULOS CRISTÃOS DE ESTUDOS SOCIAIS E CONGRESSOS
OPERÁRIOS
524 I. Origem. – Os círculos cristãos de estudos sociais foram fundados em Reims por
operários que a leitura da encíclica de Leão XIII sobre a condição dos operários tinha feito
regressar dos afastamentos do socialismo. Eles quiseram meter ao serviço da verdade cristã o
método que propaga o erro, e o zelo que distingue os operários pelos interesses da sua classe.
Como existem operários de boa-fé que, sem serem socialistas, frequentam as reuniões onde
se apregoa o socialismo, levados pelo desejo de apoiar o seu partido, assim também operários
afastados da prática religiosa quererão estudar as soluções da Igreja ao problema social, e examinar
que contributo a religião pode dar às suas revindicações legítimas; assim é bom que encontrem
reuniões onde poderão se informar sobre as nossas doutrinas sociais e o nosso programa.

525 II. Finalidade. – Os círculos cristãos de estudos sociais têm como finalidade:
1º.Pôr os seus membros ao corrente das questões que interessam ao operário;
2º.De os perseverar dos erros espalhados por aqueles que exploram o génio do operário ao
excitá-los contra a sociedade;
3º.De reconduzir ao justo lugar as recriminações violentas que impedem os operários de
serem escutados e, de as formular em propostas aceitáveis à justiça cristã.
4º.De procurar os meios de dar sucesso a estas recriminações e de promover os verdadeiros
interesses dos operários, sob o aspeto religioso, moral, intelectual e material;
5º.E para este fim, de organizar congressos de operários cristãos;
6º.De fundar instituições para o bem-estar dos trabalhadores.

526 III. Organização. – Nunca há hierarquia ; todos os membros presentes no círculo são
iguais. O gabinete nunca é permanente. Em cada sessão designa-se um presidente provisório que,
no entanto, pode ser mantido por três reuniões.
Apenas os operários fazem parte do círculo; falando a mesma língua, não temendo de serem
acusados aos contramestres ou patrões, expõem as suas dificuldades quando se encontram sós na
presença do padre. Contudo, admitem a título de membros consultivos os patrões ou outras pessoas
competentes e influentes, mas só os operários deliberam e tomam resoluções definitivas.
Um secretário escolhido para três meses é a forma de base para preparar as reuniões.

527 Um padre assiste regularmente às reuniões do Círculo como conselheiro. É ele que
representa o ensino da Igreja de que os operários gostariam de conhecer.
Este papel do padre escutado com cortesia e deferência permite abrir as portas do círculo
de estudos a todos os operários franco-mações, radicais, socialistas, ateus, coletivistas, desde que
se mostrem educados e de boa-fé, desejosos de conhecer as doutrinas sociais da Igreja católica e
que o tom da discussão permaneça calmo e amigável.
Todavia, esta organização, que foi imitada das reuniões socialistas para melhor as
combater, não é absoluta. Ela pode variar segundo os meios. Pode-se pretender uma melhor e mais
estável. Torna-se evidente, que ao se tratar de um círculo de estudos agrícolas, é preferível dar
mais estabilidade às funções.

528 IV. Preparação das sessões. – Uma comissão de iniciativa ocupa-se previamente do
estudo das questões a examinar e compõe o programa das sessões.
Esta comissão compõe-se do relator da questão a tratar na reunião seguinte;
Do presidente e dos vice-presidentes;
Do secretário e vice-secretários;
Do padre diretor.
Um membro da comissão de iniciativa que, durante dois meses, faltou às reuniões sem
motivos sérios é considerado como demissionário. Ele ainda poderá assistir às reuniões como
simples membro do círculo.
A comissão de iniciativa corresponde-se com os outros centros de estudos.

529 V. Ordem das sessões. –


1º.Nomeação do gabinete se não tiver sido nomeado numa reunião precedente. O primeiro
presidente ou o mais antigo da reunião conserva primeiramente a presidência do gabinete. Os
nomes a submeter aos votos deveriam ter sido previstos na comissão de iniciativa; para que haja a
sua eleição, deve ter os dois terços do sufrágio. (No caso de voto contrário, o mais antigo na reunião
ou o último presidente permanece no gabinete).
2º.Oração: O Pai-nosso; invocação três vezes repetida: Nossa Senhora da oficina, orai por
nós; ou Nossa Senhora do Trabalho, ou Nossa Senhora dos campos…
3º.Leitura de uma passagem do Evangelho, seguida de algumas reflexões pelo padre
diretor.
4º. Processo verbal da reunião precedente e observações.
5º.Estudo de uma questão religiosa, moral, social ou económica por escrito e discussão da
questão tratada, ou então leitura de um sujeito referente à condição dos operários e observações
sobre os pontos incompreendidos.
6º.Avisos do secretário ou do padre diretor.
7º.Oração, como de começo.

530 VI. Condições de admissão


1º.Os membros da sociedade de um círculo católico são admitidos às reuniões mediante a
apresentação do seu cartão, e devido a uma carta de convite privado.
2º.Basta, depois de ter tomado conhecimento do regulamento, de ser apresentado por dois
membros e de se fazer inscrever pelo secretário; de ser eleitor, e de costumes sãos.
A admissão definitiva é proposta pelo presidente na reunião seguinte.
3º.Cada membro pode convidar a vir às reuniões os operários que pensará serem suscetíveis
de se tornarem membros ativos. Deve-se dirigir preferencialmente aos operários inteligentes,
capazes de dar informações úteis sobre a sua profissão e a sua situação.
4º.Os contramestres e empregados, contabilistas e vigias e todos os intermediários entre o
patrão e o operário não são admitidos senão a título consultivo, não votam sobre as questões.

531 VII. Papel do padre diretor. – O padre deve ser a alma escondida que dá a vida e o espírito
ao círculo. Ele vela de perto a que os funcionários e dignitários cumprem o seu papel, a que o
regulamento seja observado, porém não intervém diretamente. Ele não atua com autoridade
imperiosa senão quando a fé ou a moral estejam em causa, e mesmo assim deve recorrer nesse
caso à autoridade do gabinete e do presidente. Ele aplica-se a dar uma ideia exata e justa da doutrina
social da Igreja, deixa livre os pontos discutíveis, e toma nota dos preconceitos dos operários cujo
espírito ulcerado e amargurado pelo sofrimento ou excitado pelo meio, não suportaria contradição:
ele deixa passar os erros de menor importância a fim de ser escutado sobre os pontos principais
nos quais repoisam a fé autentica e a religião, a moral e a honra cristã.

532 VIII. As funções dos dignitários. – O presidente dirige a oração, apela a questão na ordem
do dia, mantém a ordem e a disciplina, impede os tagarelas de invadir a discussão, estimula os
taciturnos para que digam a sua opinião; ele age de acordo com o secretário.
Ele abre e fecha a sessão.
O secretário é o ponto de apoio do operário para a organização do círculo de estudos, é o
secretário que se precisa procurar e formar primeiramente para esta obra. Ele deve saber ler em
público, redigir uma carta e mesmo uma relação, ter o desejo de se instruir, ser apto a exercer uma
influência sobre os operários.
Ele é eleito por três meses, e ao sair ele é vice-secretário.
Ele é proposto pela comissão e eleito pelo presidente.
Ele conserva os processos verbais e relatórios adotados nas reuniões e assina-os com o
presidente da sessão; um vice-secretário transcreve-os.
Ele mantém-se ao corrente das matérias tratadas nos outros círculos de estudos.
Ele ajuda à preparação e aos trabalhos dos congressos cristãos.

533 IX. Os congressos de estudos sociais. – Estes congressos são uma necessidade dos nossos
dias. Para além de eles porem uma enorme resistência contra o socialismo, ao agrupar os operários
que o ateísmo revolucionário ainda não perverteu, dão uma espécie de consagração social aos
círculos de estudos. Nunca se deve esquecer, com efeito, que os congressos são como uma
federação de círculos, já que os seus membros são compostos dos delegados de cada círculo; que
as relações lidas na sessão são as mesmas dos membros dos círculos, e que enfim os votos emitidos
não passam de um eco dos votos dos círculos. Que os congressos se generalizem e então as
revindicações operárias alcançarão uma força com a qual o governo será obrigado a contar mais
cedo ou mais tarde. Não será possível esperar que saia destas reuniões pacíficas, no futuro a
representação dos interesses, e consequentemente, a modificação quase completa do nosso regime
de trabalho atual?
O Santo Padre encoraja estes congressos. Ele felicitou o senhor Harmel pela sua
organização.

534 X. Círculos de estudos sociais de agricultores. – Nas paróquias rurais, os círculos de


estudos reunirão mais agricultores do que operários. Está claro que terão um caráter diferente uns
dos outros. Os sujeitos de estudo serão diferentes. O gabinete será o do sindicato ou da corporação
paroquial. As informações fornecidas pela monografia das obras de uma paróquia do Alto-Marne,
no fim deste volume, serão suficientes para ajudar à sua organização.

535 XI. Círculos de estudos sociais de padres. – Estas reuniões têm uma importância capital.
Pode-se esperar delas um bem imenso. Sem elas, o movimento social cristão levará um tempo
infinito a se propagar. Não indicaremos qualquer regulamento fixo para estas reuniões. Elas
surgirão das circunstâncias e ir-se-ão inspirar nelas.
O seu programa pode resumir-se em três palavras:
1) O perigo é grande;
2) Deve-se agir;
3) Como nos comportaremos a esse respeito?
4) Este manual pode fornecer um tema de estudos indefinido.

536 Os exemplos encorajam mais facilmente que a teoria. Exempla trahunt. Citemos portanto
alguns precedentes:
No Val-des-Bois, cada mês há uma reunião de estudos dos padres do Vale da Suippe. Lê-
se um relatório escrito e conversa-se sobre uma obra prática. A reunião não tardou a produzir
algumas obras.
Pequenos grupos de leigos cristãos foram iniciados nas paróquias. Depois de alguns meses,
os párocos assíduos às reuniões chegaram a acordo entre eles para cada um trazer consigo dois ou
três lavradores.
Nestas reuniões mais numerosas, debateu-se acerca dos sindicatos agrícolas.

537 Lançou-se as bases de um sindicato regional que se subdividirá em vários sindicatos


paroquiais.
Fez-se outro tanto em P… (Saône-et-Loire), como indica a monografia que está no fim
deste manual.
Estas reuniões mistas não se fazem senão duas ou três vezes. Basta isso para preparar os
sindicatos. Depois, os padres retomam as suas reuniões mais particularizadas.
Eis aí exemplos que se devem imitar por todo o lado. Os regulamentos precisos hão-de vir
mais tarde, se houver de quê. «Jesus coepit facere et docere» [Ac.1,1].
CAPÍTULO XII
A ORDEM TERCEIRA DE SÃO FRANCISCO
538 A Ordem Terceira deve ser um dos instrumentos da renovação social cristã.
Uma fraternidade da Ordem-Terceira, aí aonde poderá estabelecer-se no seu verdadeiro
espírito, no espírito do Santo Fundador, será a fonte natural de todas as obras sociais: a boa
imprensa, o sindicato, a caixa de crédito, a caixa de família, etc.
Mas para tal, que a Ordem Terceira, como o clero, saia da sacristia.

539 São Francisco não quis somente fazer uma associação de piedade. Ele considerou o seu
século, gangrenado pelo luxo dos grandes, pela miséria dos trabalhadores, pela luta de classes, a
desunião e o despertar dos costumes pagãos. Ele quis fazer uma obra democrática, uma obra social,
uma obra de pacificação, de vida cristã, de união e de assistência mútua. Ele transformou a
sociedade e nos deu o maior século da história.
Leão XIII tem a intuição das grandes coisas. Ele vê que a situação social atual tem
analogias com o do século XII, ele nos move a recorrer ao mesmo remédio, a Ordem Terceira.

540 A Ordem-terceira deve reunir as diversas classes da sociedade, patrões e operários, ricos
e pobres debaixo da mesma regra de vida, que tem por base a simplicidade, a modéstia e a caridade.
Que melhor cimentação poder-se-ia encontrar para a união entre as classes?
Já em si mesmo, a Ordem Terceira é uma obra social, porque faz a união e reprime os
abusos da riqueza.
Mas além disso é o melhor instrumento para fundar e sustentar as obras sociais modernas.

541 Feliz o padre que possui uma fraternidade da Ordem Terceira! Os seus bons terciários
fundarão quanto ele desejar, um comité da boa imprensa, um sindicato, uma caixa de crédito, um
círculo, um patronato; pode-se pedir tudo a homens desinteressados, que compreenderam Jesus
Cristo e apreciado a sua doutrina de abnegação e de dedicação. Sem dúvida, muitas paróquias não
podem produzir subitamente uma fraternidade. Os homens não têm nela mais qualquer prática
religiosa, não se poderá constituir imediatamente irmãos terciários. Aí, vai-se começar com uma
associação mais fácil e mais abrangente, como a Liga da Ave Maria ou a Confraria de Nossa
Senhora dos Campos. Mas é excelente tender por toda a parte a formar uma fraternidade.
542 Onde a Ordem Terceira não terá sido a base das obras, ela será a coroa; se não tiver ajudado
a começa-las, ela servirá para as conservar, introduzindo nelas o espírito de dedicação e de
abnegação.
Os religiosos da grande Ordem, Franciscanos e Capuchinhos, compreenderam as intenções
de Leão XIII, e vão de congresso em congresso, sondando este novo campo que se lhe abriu, e
estudando as diversas formas desta ação social, que irão inculcar na Ordem Terceira.
Desde há um ano, já os vimos no Val-des-Bois, em Paray, em Novara, formulando e
acentuando o programa da sua entrada em liça para a renovação social das nações cristãs.

543 Eis o resumo dos votos que emitiram na sua reunião de Paray-le-Monial. Diz respeito a
um programa completo inspirado pelo Sagrado Coração de Jesus.
1º. «A Ordem terceira franciscana deve agrupar os homens de elite de todas as classes,
que se fazem notar pela sua fé integra e pela sua submissão completa ao Soberano Pontífice, em
todas as matérias nas quais ela crê dever intervir».
Este primeiro voto indica a necessidade deste enquadramento e o espírito das fraternidades.
O Santo Padre falou, que se aja! A Ordem terceira não é uma obra ultrapassada. Ela hoje tem a
mesma oportunidade que no século XII. Leão XIII rejuvenesceu a sua forma e as suas regras.
Devemos procurar nela o contrapeso às seitas maçónicas. Mas as fraternidades não terão
verdadeiramente uma tarefa eficaz a não ser que se mostrem dóceis aos ensinamentos da Santa Sé
e às diretivas que ela nos dá, enquanto se fazem apóstolos ardentes e devotados do mesmo.

544 2º. «Os terciários, tendo como finalidade o cumprimento integral dos deveres da vida
cristã, não se devem cingir aos deveres íntimos da piedade e da vida interior, mas devem-se
aplicar também aos deveres importantes da vida pública e social. Aí também devem dar o exemplo
e trabalhar para fazer reinar Jesus Cristo, para fazer prevalecer na sociedade os princípios
cristãos e a influência social da Igreja».
Qual é com efeito o fim da Ordem Terceira? É o de agrupar os homens de boa vontade para
proporcionar-lhes cumprir com mais facilidade todos os deveres da vida cristã.

545 Estes deveres são múltiplos. Há os da vida privada e os da vida pública. O Evangelho diz-
nos: «Levai uma vida simples e modesta, praticai a penitência e a caridade». Mas será tudo? Não.
Ele também nos diz que Cristo é o rei das nações, que os povos serão felizes se honrarem a Deus
e se observarem as suas leis. Ele ainda nos diz que a justiça e a caridade devem regular todas as
relações sociais e que o mau rico não tem lugar no céu.
Os terciários, levados pela corrente que dominava desde há duzentos anos, confinaram-se
nas práticas da vida devota íntima e privada.
Seria fazer diminuir Jesus Cristo, seria ir sem contestação contra o espírito de São
Francisco. Leão XIII recorda-lhes.

546 3º. «Se o socialismo se tornou no perigo iminente da nossa sociedade, o capitalismo, isto
é, o predomínio injusto do capital e os abusos que dele resultaram são as verdadeiras causas da
desordem social atual. O congresso pede portanto que os terciários trabalhem, pelo ensino oral e
escrito e pelo exemplo a reformar as ideias falsas e as práticas viciosas aceites na generalidade
acerca destas matérias».
Alguns irão encontrar isso exagerado, mas não é nada. Leão XIII não é menos formal que
o congresso de Paray. «A classe trabalhadora, diz-nos ele, está geralmente num estado de miséria
imerecida». E a miséria é péssima conselheira.
Os terciários devem ser iniciados às questões sociais e a tornarem-se os apóstolos ardentes
das reformas sociais.
Os três votos seguintes não são mais que o desenvolvimento disto; nós os citaremos sem
longos comentários.

547 4º. «Que os diretores das Fraternidades estudem em detalhe para cada profissão, a
prática da justiça e da equidade, e se apliquem a ensinar nas reuniões da Ordem Terceira as
regras de probidade especiais para cada estado».
Um bom tratado de teologia sobre a justiça e os contras, o de Carrière por exemplo, fornece
a base destes estudos. Deve-se acrescentar a esse alguns volumes modernos sobre a justiça social,
que temos citado.

548 5º. «Que os terciários tomem a iniciativa e se façam os auxiliares ativos de reuniões de
estudos organizados para procurar as instituições que podem assegurar a observação das regras
da justiça no comércio e na indústria».

549 6º. «O congresso pede aos padres, membros da Ordem Terceira, de se aplicarem
especialmente a estudar as regras da justiça e da equidade privada a fim de instruir os fiéis de
uma maneira exata, precisa e prática, como também de procurar as condições do
restabelecimento da justiça social».
Ele exprime o desejo que estes assuntos corram parelhas com os sujeitos de piedade, nos
encontros das fraternidades sacerdotais.

550 7º. «Este congresso compromete os terciários a se inspirarem no espírito de São


Francisco, que se pôs ao serviço dos mais pequenos, ocupando-se de todas as suas carências e
trabalhando para os libertar de todas as opressões. Com este fim, os Terciários devem fundar ou
ajudar, na medida do possível, as instituições apropriadas para organizar de modo equitativo e
cristão o trabalho, a prever ou socorrer as diversas misérias que derivam da doença, do
desemprego, da velhice ou da morte».
Aí está o que é prático. Já não se trata de um cristianismo crispado, apenas aconselhado às
senhoras e crianças; trata-se de cristianismo autêntico e completo, com toda a beneficente
influência social que lhe convém.

551 8º. «O Congresso insiste sobre o espírito de associação a desenvolver entre os Terciários,
a fim de que os laços de solidariedade que devem uni-los sejam estreitados sobre o terreno social
e económico, tanto como sobre o terreno sobrenatural e religioso».
Este voto resume os precedentes e os confirma.
Se estes votos se realizarem, hoje como no século XIII, a Ordem Terceira renovará a
sociedade cristã.
Não poderá, aliás haver, para os padres e para os verdadeiros católicos argumento mais
perentório do que a insistência espantosa de Leão XIII. Ele recomendou à Igreja a Ordem Terceira
de São Francisco por meio de quatro atos solenes: a encíclica do 17 de Setembro de 1882, na qual
recomenda a Ordem Terceira como remédio para os males presentes; a Bula de 30 de Maio de
1883, na qual modifica a regra da Ordem Terceira para a tornar mais acessível à maioria; a
encíclica de 8 de Maio de 1884, sobre a Franco-maçonaria na qual opõe a Ordem Terceira à
associação subversiva dos franco-mações; a encíclica para o jubileu de 1886, na qual recomenda
uma nova vez a Ordem terceira como associação de penitência.

552 Por meio de várias cartas menos solenes e diversas alocuções, o Santo Padre insistiu sobre
as mesmas ideias. Numa audiência a 18 de Dezembro de 1884, indicava a Ordem Terceira como
o remédio que deve soerguer e salvar a sociedade. Numa outra audiência, à qual assistia o bispo
de Marselha, dizia: «Repeti por todo o lado que é por meio da Ordem Terceira que eu quero
levantar a França… estive verdadeiramente inspirado ao recomendá-la».
Depois disso tudo, poderemos acaso hesitar?

Volumes práticos sobre a ordem terceira,


necessários a todos os padres
553 A Ordem Terceira de São Francisco e o clero secular: 0 francos 25, Paris, Livraria São
Paulo, 6, rua Cassette.
A Ordem Terceira de São Francisco, por Monsenhor DE SEGUR, edição nova, 0 francos
40, Paris, na editorial Tolra, rua de Rennes.
Manual da Ordem Terceira: o dos Franciscanos da observância encontra-se na sua casa de
Bordeaux, 34, rua de Teste; o dos Capuchinhos, em Lião, na editora Delhomme e Briguet; a dos
Recoletos, na editora Valin, em Caen.
Leão XIII e a Ordem Terceira, pelo Padre NORBERT, casa editora franciscana, 16, rua de
Clamart, em Vanves.
CAPÍTULO XIII
PATRONATOS E CÍRCULOS DE JOVENS

554 Os patronatos entram no quadro das obras sociais. «Esta obra não deve ser encarada como
uma obra de detalhe, como uma unidade independente: ela tem o seu lugar marcado na estrutura
do edifício social cristão, como uma peça da estrutura do teto no conjunto geral da construção».
(Manual dos patronatos, pelo padre LE CONTE, vigário geral de Châlons).
Esta obra há-de ser, quer um ponto de partida, quer uma consequência do estabelecimento
de um sindicato ou de uma corporação numa paróquia.
Se se começar pelas crianças, os jovens do patronato vão aumentar. Eles terão tomado
gosto à vida da associação e quererão continuar. Homens virão ajuntar-se a eles, o círculo de
operários e o sindicato acabarão por se impor.
Se se começar pelos homens e se forem agrupados num sindicato, eles irão ter o seu lugar
de reunião, que cedo será o equivalente de um círculo. As crianças hão-de querer ter o seu próprio,
e o patronato nascerá do sindicato. São obras conexas.

555 Inútil deter-se longamente sobre a utilidade dos patronatos. Sem o patronato, o adolescente
não tem senão a rua ou o cabaret que o receba antes da idade, ou as sociedades de ginástica, de tiro
ou de música, que são patronatos leigos estabelecidos para gravitar na órbitra das lojas.
A casa paterna não basta mais para essa idade que reclama movimento, jogos, e camaradas.
Abri por conseguinte aos aprendizes e jovens operários, ao Domingo, aos alunos das
escolas à quinta-feira, um patronato onde encontrarão divertimentos honestos com algumas
práticas religiosas, sob os olhos do padre ao qual ficarão aficionados durante toda a vida.

556 I. Fundação. – Felizes as dioceses que têm um conselho central ativo e bem organizado!
Em Châlons, por exemplo, o conselho diocesano das obras está sempre pronto a ajudar à
fundação dos patronatos. Os párocos encontram nele uma direção, recursos, jogos, livros,
recompensas.
Aí, de um dia para outro, uma obra rural pode possuir toda a mobília que lhe é necessária.
Um patronato exige sempre alguns recursos. Para que se os encontre, o pároco, que funda
uma obra, deverá esforçar-se sempre de ter um comité local. Nunca há uma paróquia sem que se
possa encontrar alguns benfeitores que fornecerão uma subscrição anual. Quando não houver um
comité local ou para substituir a sua incapacidade, ir-se-á recorrer ao conselho diocesano, se
houver.
557 Poderá sempre dirigir-se também ás seguintes obras, em Paris:
1º. A obra de São Francisco de Sales, 11 bis, passagem da Visitação.
2º. A obra dos campos, 11, rua Bellechasse;
3º. A obra de Nossa Senhora da Salvação, 129, rua da Universidade;
4º. A Comissão dos patronatos, 7, rua Cöetlogon.
Esta última, forma um ofício central e gratuito de informações para a fundação e o
desenvolvimento dos patronatos, a aquisição de jogos, de peças, de tudo o que puder ser útil nestas
obras.
Ela tem por órgão um boletim mensal que fornece informações úteis. Assinatura, 2 francos
50 por ano.

558 II. Organização. – Aqui há que considerar o pessoal, o local e os meios de ação.
Poderá acontecer que apenas o pároco seja, ele só, todo o pessoal dirigente. Outras vezes,
ele terá uma pequena conferência de São Vicente de Paulo, para o ajudar, ou ao menos um ou dois
homens zelosos. Se começar só, os mais velhos e mais fiéis dos seus alunos tornar-se-ão depressa
os seus auxiliares.
O pessoal dirigido compreenderá em breve duas secções: a dos jovens recrutados nos
catecismos e a dos adolescentes que formam um pequeno círculo.

559 Quanto ao local, o presbitério será frequentemente o único recurso, mas parece cada vez
mais necessário que as paróquias tenham um local para as obras. O círculo, o sindicato, têm
necessidade de serem contados entre elas. As monografias de obras rurais apresentadas no fim do
volume mostram que este local é necessário. Ela não compreenderá muitas vezes senão uma ou
duas salas com um pátio.
Frequentemente converteu-se em local de reunião uma dependência do presbitério,
depósito, hangar, cave, ou um alojamento vizinho.

560 Pelo que respeita aos meios de ação, é preciso fazer de maneira a dar a estas obras um
caráter verdadeiramente social. Deve-se fazer delas um organismo vivo e dar-lhe um conselho e
dignitários que se formam ao apostolado exercendo-o. É assim que se prepara auxiliares para as
obras sociais propriamente ditas.
Não nos podemos distender aqui sobre outros meios de ação em uso nos patronatos,
práticas de piedade, cantos, recompensas, recreios teatrais, etc. Tudo isso é conhecido e descrito
abundantemente em todos os manuais do patronato.
Recomendamos o Manual do senhor padre Le Conte, 0 francos 50, na direção do próprio
autor, em Châlons, e os documentos da Comissão dos patronatos, rua de Vaugirard, 74, em Paris.

561 III. Condições legais. – Importa saber que os patronatos não estão submetidos a qualquer
autorização administrativa. Eles não caiem sob o artigo do Código penal que pune toda a
associação não autorizada com mais de vinte pessoas.
Decisões administrativas e judiciárias muito recentes estabelecem formalmente esta
jurisprudência.
Um presidente da Câmara muito zeloso, no Oise, tinha experimentado proibir as reuniões
do patronato. O seu ofício, mesmo aprovado pelo prefeito, foi anulado por um decreto do Conselho
de Estado do 11 de Fevereiro de 1892.
562 No Aude, um pároco que tinha fundado um patronato foi perseguido pelo delito de
associação ilícita. O tribunal de Narbona, no 11 de Janeiro de 1892, o livrou e declarou que uma
reunião de jovens reunidos para se entregarem, sob a direção de um pároco, a exercícios literários
ou corporais não constituía uma associação ilícita e que não caía debaixo das disposições do artigo
29 do Código penal da lei do 10 de Abril de 1834.
O tribunal de Montpellier confirmou, a 27 de Fevereiro de 1892, o julgamento do tribunal
de Narbona.
Para as manifestações teatrais e as lotarias, conferir o que foi dito mais acima no capítulo
dos círculos rurais.

563 IV. A Congregação. – Quando o patronato tiver alguma importância e contiver uma elite
de alguns jovens piedosos, faz-se desta elite uma congregação à Santa Virgem. A Congregação
está para o patronato como a Ordem Terceira está para o círculo ou o sindicato, analogamente os
doze apóstolos para os setenta e dois discípulos.
A Congregação tem um duplo fim, a piedade e o apostolado. Ela tem as suas reuniões
especiais, o seu regulamento, o seu conselho. As Congregações têm algumas práticas de piedade
determinadas: uma dezena do terço cada dia, a santa comunhão todos os oito ou quinze dias.
Aconselha-se aos jovens piedosos de fazerem uma leitura piedosa e uma visita ao
Santíssimo Sacramento.
Ao Domingo, na sua reunião especial, eles rezam em conjunto, e o padre diretor dá-lhes
uma palestra sobre a piedade ou o apostolado.

564 Eles dão o exemplo na paróquia quanto à assistência aos ofícios. Eles são os primeiros
auxiliares das obras, para a propaganda do La Croix, para a propagação da fé e da Santa Infância,
etc.
Existem muitos bons manuais para a direção das congregações. Encontra-se manuais para
os homens e para as crianças no gabinete do Mensageiro do Sagrado Coração de Jesus, em
Tournai (Bélgica). Geralmente, os manuais não insistem suficientemente sobre a prática do
apostolado.

565 Num documento da União das associações, rua de Verneuil, 32, sobre as associações de
piedade, encontra-se excelentes conselhos para que se promova, nas obras, o espírito de
apostolado. Propõe-se o exame de consciência seguinte, que os membros das congregações podem
fazer em particular, ou mesmo em comum sem nomear a pessoa que têm em vista:
Tendes determinado no vosso espírito uma pessoa para a ganhar para o bem? Tendes orado
e feito orar especialmente por ela? Tendes-lhe dado livros ou jornais para ler? Podereis ajudar a
decidi-la a participar nos ofícios religiosos, a fazer a desobriga pascal, a comungar em tal festa?
Credes que, uma vez ganha, ela poderá exercer por sua vez o apostolado?
A piedade e o apostolado devem estar no mesmo pé de igualdade nas congregações.

566 V. Resultados. – Certas dioceses já têm um bom número destas obras e as paróquias
retiram delas um grande fruto.
A diocese de Cambrai conta com 140 patronatos rurais; a de Arras, 50; a de Nancy, 30. Em
Châlons, a última relação de 24 Julho de 1892 assinalava 55. A maior parte das dioceses contam
alguns e o seu número aumenta cada ano.
Deram-se em todos os congressos de obras, monografias de patronatos; inútil de recomeçar
aqui.
Mas o que importa reter ao terminar, é a de que um patronato não deve ser uma obra única,
nem mesmo a obra principal duma paróquia.
A obra principal é a dos homens. A obra das crianças não pode ser senão uma transição ou
um complemento. Os que se contentariam com uma obra para crianças ficariam na rotina de um
apostolado fraco e tímido que fez dizer que a religião era boa para as mulheres e para as crianças.

567 Nas monografias citadas no Manual do senhor Le Conte, vejo diversos patronatos que se
julgam felizes de terem conservado os jovens até aos dezasseis ou dezassete anos. É melhor que
nada, mas não consiste em tal as obras verdadeiramente sociais.
Vejo que à Mohon (Ardenas), o pároco começou a obra com jovens de vinte a vinte e cinco
anos. Eles tornaram-se apóstolos. Espalharam o La Croix. E multiplicaram-se. Fundaram a
Confraria de Nossa Senhora da Fábrica. Eles são atualmente 80 a 100, nos dias de comunhão. Eles
afirmam de modo claro a sua fé cristã e contribuem largamente à transformação da paróquia.
Bravo! Aí está uma obra verdadeiramente social, mas já não se trata de um patronato. Pode-se ter
as duas.

568 Vejo que em Bouxières-aux-Dames (Meurthe-et-Moselle), o patronato das crianças


cresceu para o dobro. O seu Salão de 14 metros de comprimento foi cortada por um separador
móbil que se abre para as grandes festas. De um lado, fica o patronato com 40 crianças; do outro,
o círculo com 15 jovens dos quinze aos vinte e cinco anos e 12 pais de família. Muito bem; há aí
ao menos as bases de uma obra completa. Que se lhe acrescente o sindicato e o crédito agrícola, e
a vida corporativa renascerá na pequena paróquia.

Volumes úteis aos diretores dos patronatos


569 Manual do patronato, no secretariado da Sociedade de São Vicente de Paulo, rua de
Fürstenberg, Paris.
Instruções sobre os patronatos, pelo padre COMBE, editorial Pamiers, em Carcassone.
Avisos e conselhos aos aprendizes, por Monsenhor de SEGUR, 0 francos 30, editorial
Tolra.
O jovem operário cristão: pequenas direções espirituais, por Monsenhor De SEGUR,
editorial Tolra.
Conselhos à juventude cristã pelo padre JAUD, no autor, Châlons (Vendée).
Cenas e diálogos populares, para festas e noitadas, 0 francos 60, editorial Poussielgue, rua
Cassette, Paris.
Documentos gratuitos sobre os patronatos, no Gabinete central das obras, 32, rua de
Verneuil, Paris.
CAPÍTULO XIV
A ARQUICONFRARIA DAS MÃES CRISTÃS
570 As associações das mães cristãs estão afiliadas à Obra de Nossa Senhora de Sião, em Paris,
rua de Sèvres.
Estabelecidas por párocos zelosos ou por missionários, estas reuniões mantêm-se tão
longamente quanto se prolongarem as influências capazes de manter o zelo e a piedade.
Os seus membros assistem a uma missa mensal na qual se dá uma instrução; comunga-se
então e reza-se pelos membros da família.
Trata-se de um núcleo de pessoas piedosas, tendo tempo livre, e as mães de família
operárias ficam de fora.
As reuniões das mães cristãs serão mais seguidas, mais vivazes, se forem fundadas e
dirigidas principalmente em vista de serem úteis às mulheres dos operários.

571 I. Necessidade e vantagens. – A mãe, tendo uma grande influência no lar, obter-se-á por
meio dela a manutenção da vida cristã em toda a família. Deus formou o coração da mãe
expressamente para fixar o coração do homem no dever e inspirar às crianças a piedade e o amor
do bem. A associação cristã contribui maravilhosamente a sobrenaturalizar estas disposições, e o
resultado é imediatamente tangível: paz na família, submissão das crianças, economia nas
miudezas domésticas.
Se a associação tem como objetivo principal o apadrinhar as famílias e de as santificar,
constituirá um campo aberto por natureza para o exercício dos deveres do patronato, para o
apostolado mútuo da caridade.

572 II. Fundação. – Para fundar uma associação de mães cristãs, procurar-se-á, em primeiro
lugar, auxiliares cuja dedicação e inteligência possam ultrapassar as dificuldades.
Se houver várias senhoras de uma condição influente, elas podem ser agrupadas sob o nome
de senhoras patronas, que se ocuparão, uma dos pobres, outra dos doentes, outras dos menores no
catecismo, e mesmo do patronato dos rapazinhos, mas sobretudo da associação das mães cristãs
como dignitários

573 O nome de Damas da Caridade, o de Damas da Providência ou de Damas do Sagrado


Coração ou de Nossa Senhora da Salvação, ou simplesmente o vocábulo do patrão da paróquia
serão preferíveis frequentemente. Se forem bastante numerosas, poder-se-ia procurar nelas os
elementos de um comité para as obras paroquiais.
Uma segunda secção compreendendo as mulheres da classe operária tomará o nome de
Santa Ana ou de Nossa Senhora dos Campos. Esta divisão não calharia bem nas pequenas
localidades
Uma ligeira quotização pode ser fixada.
574 III. Reuniões mensais. – Cada mês, na correnteza da semana, no dia da festa marcada no
hábito da arquiconfraria ou então no dia mais cómodo que o segue, há uma reunião na igreja ou
numa capela, nas horas em que nem a família nem os filhos sofrem com esta ausência.
Os sujeitos a tratar nestas reuniões são principalmente: os deveres de estado, a educação
cristã das crianças, a influência da religião na família, a vantagem das associações, a ventura que
resulta em favor da mãe se houver prática religiosa na família.
575 IV. O centro de caridade. – Um centro de serviço é um laço exterior de caridade entre os
membros da arquiconfraria das mães cristãs. Ele tomará o nome de Santa Ana ou da Providência.
É um ponto de encontro para as mulheres de empregados ou de operários que quiserem empregar
algumas horas por semana ao vestiário da associação. Reúne-se um dia por semana e trabalha-se
para os pobres, para as crianças; prepara-se adereços, roupas, vestimentas. Em muitas famílias de
poucos membros, as mulheres podem dar várias horas por semana. È um modo de as iniciar à
dedicação. Para que os deveres do patronato cristão se possam exercer de modo eficaz e sem que
se resume numa parada, são necessários laços pessoais. A caridade exercida em comum prepara
os corações para a confiança, para a estima e para a afeição.

576 Os associados que o podem, são por conseguinte convidados a virem uma vez por semana
ao centro ou a enviar para aí uma das suas filhas.
O trabalho é santificado pela recitação do terço e pelos colóquios edificantes preparados
por uma leitura escolhida especialmente em vista da reunião.
É no centro que as conselheiras encarregadas dos doentes fazem o seu relato e que os
socorros são decididos.
Uma reunião geral mensal faz-se no centro; a reunião na igreja está consagrada à piedade.
Nas pequenas paróquias onde os trabalhos são exclusivamente agrícolas, poder-se-á avaliar
os interesses da obra na própria igreja, a fim de não multiplicar as reuniões.

577 V. Tarefa do Conselho. – A direção compõe-se do padre diretor e de uma senhora


presidente.
Quanto menos o padre for obrigado a entrar no governo direto, tanto mais ele renunciar à
obra a própria iniciativa, mais ela tem a oportunidade de se desenvolver e de procurar o bem; ele
deixará portanto a sua ação e a sua influência integradas e veladas no conselho pois só este tem a
responsabilidade das medidas tomadas e aplicadas.
A direção é assistida por conselheiras que cumprem as funções de vice-presidente,
secretária, tesoureira. Por vezes mulheres valentes, de modesta condição, mas inteligentes e
zelosas, introduzidas no conselho, irão pressionar as senhoras a avançarem e as obrigarão a abraçar
o partido da piedade com a receção frequente dos sacramentos.

578 A presidente mantém-se em relações constantes com as conselheiras.


A vice-presidente transmite a cada conselheira os cartões individuais destinados a convocar
as associadas. Estes cartões trazem o nome de cada uma dos membros da sociedade, as datas e as
horas das reuniões.
Uma senhora que, sem razão válida e sem desculpas, faltasse três vezes de seguida às
reuniões do mês é considerada ter renunciado à arquiconfraria.
Eis um modelo da convocação:
PARÓQUIA
DE
XXX ASSOCIAÇÃO DAS MÃES CRISTÃS
A senhora………… está convidada a estar presente na reunião mensal, Terça às três
horas, e à Missa mensal, quinta às 7 horas da manhã.

Este anúncio é necessário par que triunfe por cima do esquecimento e da negligência.

579 A reunião do gabinete acontece uma vez por mês:


A secretária convoca as conselheiras, faz os processos verbais nos quais indica o número
das presenças e das ausências. Ela guarda os livros necessários à associação.
Pode-se dividir a arquiconfraria por quinzenas para o rosário vivo e dividir a seguir cada
quinzena em três sessões; as comunicações tornar-se-ão deste modo muito fáceis.

580 VI. Os socorros mútuos. - Uma tesoureira guarda a caixa que é alimentada pelas quotas
ou pelos peditórios das reuniões; ela toma nota das despesas e faz as compras decididas pelo
conselho.
Uma conselheira enfermeira está encarregada de todos os enfermos e cada conselheira
visita os doentes da sua secção. As conselheiras presentes no centro de caridade ocupam-se dos
socorros urgentes para distribuir pelos doentes, pelas viúvas e jovens mães.

581 A caixa da associação forma uma Caixa de família onde o Conselho pode ir abastecer-se
para ajudar os membros participantes. Não é uma esmola, pois que se trata de um fundo comum;
nem também é um direito estrito, já que o Conselho decide se convém conceder um socorro.
Constitui da parte das colegas membros da associação uma ajuda benevolente que nada tem de
humilhante nem de administrativo.
Segundo os recursos, quando uma mulher da associação vivendo do seu trabalho ficar
doente, encarrega-se no seu lugar, uma pessoa de fazer a cozinha da família, o trabalho de casa e
as lavagens.

582 VII. Cuidados pelas mães jovens. – Quando uma criança nasce na associação, se houver
de quê, dá-se como presente um pequeno enxoval de fraldas preparadas no centro de caridade.
Vela-se também para que as prescrições do médico sejam seguidas e nomeadamente a que
a jovem mãe não se meta na vida ativa antes do décimo dia.
Uma mulher lavadeira faz o serviço de casa até que a mãe possa retomar o trabalho.
Seria mesmo para desejar que a associação pudesse oferecer às famílias de operários uma
verba para partos, equivalente a todas as despesas.
Veja o Manual da Corporação cristã, pelo senhor Léon Harmel.
______________________________________________

N.B. – Instituições análogas, profissionais ou caritativas são necessárias hoje para permitir às mulheres
dos operários de triunfar do espeito humano. Com este complemento material, os operários obrigarão as
suas esposas a serem assíduas às reuniões das mães cristãs.

CAPÍTULO XV
AS CONFRARIAS E CONGREGAÇÕES
DA SANTÍSSIMA VIRGEM
583 Debaixo do nome de congregações da Santíssima Virgem, existe nos colégios e em bom
número de paróquias, associações de piedade que fazem um grande bem.
Para prosseguir com a primeira intenção da sua instituição, estas congregações devem
agregar a si as obras de caridade corporal e ter, ao menos, a sua caixa para o serviço dos pobres.
O Padre Acquaviva, ajudado por dezassete consultores, compôs as regras da congregação
primaz (prima-primaria), as quais de acordo com a bula Omnipotentis Dei de Gregório XIII,
devem ser observadas sem exceção por todas as congregações que lhe estão adjuntas.
Estas regras, em virtude dos poderes confiados aos generais da Companhia de Jesus,
sofreram diferentes modificações.

584 As que estão atualmente em vigor foram aprovadas pelo Revmo Padre Beckx, geral da
Companhia, e publicadas em Roma em 1855, sob o título: Leges et statuta sodalitatum Beatae
Mariae Virginis quae Primariae conjunta sunt.
Estas regras aplicam-se às congregações de ambos os sexos. Para a afiliação, cada um
deverá dirigir-se ao Provincial da Companhia de Jesus. Consiste na via mais simples e mais fácil
para obter, para uma qualquer associação, a vantagem das indulgências e a canonicidade.

585 Como condições:


1º. É preciso que o ordinário tenha previamente reconhecido e aprovado a congregação que
se queira fazer afiliar. A cópia do arranjo é requerida.
2º. Deve-se submeter ao ordinário o regulamento da congregação. Assim, a associação terá
um diretor espiritual, um prefeito, assistentes, um secretário e outros dignitários a compor o
conselho.
Contudo a eleição e a nomeação dos dignitários, tão importantes para o bem e os progressos
da associação, não são indispensáveis para o ganho das indulgências.
3º. O requerimento deve indicar a classe das pessoas que compõem a congregação e o
vocábulo ou a festa titular: pois que é preciso que a congregação seja consagrada a honrar um
mistério ou um título da Santa Virgem.
Ela pode ao menos ter um patrono ou título secundário: os santos Anjos, São José, o orago
da paróquia.
4º. A congregação deve ter sido estabelecida e ter funcionado algum tempo (três meses por
exemplo) antes que se peça o diploma.
A associação das filhas de Maria
586 Entre as confrarias em honra da Santíssima Virgem, não há nenhuma tão popular do que
a que reúne jovens; estas reuniões todavia estão cheias de dificuldades.
Nas paróquias que têm uma obra debaixo da direção das Filhas da Caridade, a associação
toma o título de Filhas de Maria Imaculada e a capela das religiosas é a capela da associação;
alhures ela pode-se contentar com o regulamento das congregações ordinárias.
Encontrar-se-ão todas as informações práticas no Manual das Filhas de Maria Imaculada
para o uso das reuniões externas dirigidas pelas Filhas da Caridade, Paris, D. Dumoulin e Cª, 5,
rua dos Grands Augustins.

I.FINALIDADE E VANTAGENS
587 1. Preservação individual. – Constatou-se que, por toda a parte onde domina o culto da
SSma Virgem, os costumes são honestos e puros. Consagrar jovens à Mãe de Deus, é o mesmo
que assegurar a sua virtude para a salvaguardar, a sua fé pela piedade, e as melhores qualidades de
coração por um modelo que é igualmente eficaz.
2. Conservação da fé na paróquia. – Frequentemente uma paróquia onde a fé se conservou
forma um contraste chocante com a infidelidade das paróquias circunvizinhas. Quando se examina
a conduta pastoral, apercebe-se que na paróquia fiel, há exercícios públicos em honra de Maria.
Esta prática teve o mesmo efeito de um sacramental.
Para estabelecer estes exercícios: Vésperas da Santa Virgem ou Terço, e para os conservar,
as reanimar ou os repor em honra, o melhor meio é uma confraria de jovens.
3. Desenvolvimento da piedade. – Resulta desta associação o mútuo exercício do bom
exemplo, das graças mais abundantes que constitui a comunidade de oração e de boas obras, um
apostolado recíproco, relações mais íntimos de caridade, um verdadeiro apoio moral nas penas e
nas dificuldades.
O porte de medalha é um memorial dos compromissos tomados e a sua virtude miraculosa
é uma armadura tutelar.
Enfim as indulgências numerosas da associação são um encorajamento para a comunhão e
para a oração.

II.FORMAÇÃO

588 Na ocasião de uma missão ou de um retiro, ou simplesmente na conclusão do tempo pascal,


reúne-se a elite das jovens suscetíveis de serem agrupadas. Fala-se-lhes da finalidade e das
vantagens da reunião das Filhas de Maria para as suas famílias e para si próprias.
Ainda será melhor se a primeira escolha para esta convocação for feita pela futura diretora,
ou por uma jovem influente que seria indicada com naturalidade como devendo ser a presidente,
e se a iniciativa for confiada a um pregador missionário de passagem.
Poder-se-ia começar por receber como Filha de Maria uma jovem de boa vontade que
procuraria ganhar para si outras à medida que surgissem por lhes inspirar uma confiança razoável.

III. COMPOSIÇÃO DA CONGREGAÇÃO


589 A congregação compõe-se das Filhas de Maria propriamente ditas, que formam o corpo
da associação, de aspirantes, que não são admitidas senão depois de um tempo de provação mais
ou menos longo, a fim de se constatar se elas têm as qualidades requeridas.
As aspirantes têm a maior parte dos privilégios das Filhas de Maria, elas tomam parte da
reunião mensal. Depois de três meses de postulado e de boa conduta, a aspirante é apresentada ao
conselho. Se for recusada, a admissão será adiada; vela-se todavia a não desencorajar a boa
vontade, sem contudo comprometer o espírito da associação.

IV. FUNÇÕES DO CONSELHO


590 O conselho está encarregado da direção.
Compõe-se:
1.Do padre diretor
2.De uma religiosa ou de uma senhora ou moça influente fazendo função de diretora;
3.De uma presidente; assistida de uma ou várias vice-presidentes;
4.De conselheiras eleitas;

591 A direção compreende:


1.A ordem e o tempo das sessões;
2.Os assuntos submetidos ao conselho;
3.A receção das aspirantes e das congregacionistas;
4.A preparação das festas;
5.O estudo dos meios de zelo na congregação e em redor de si;
6.A manutenção da edificação entre os membros e os meios para o conseguir;
7.A repartição dos fundos da caixa de família entre os membros participantes.

592 N.B. – Para outras regras indicadas no Manual das Congregações, ou no Manual das
Filhas de Maria Imaculada, como não são diretivas, são deixadas por isso à prudência e à
sabedoria do padre diretor e da diretora que, eles apenas, podem julgar da sua oportunidade. Pode-
se primeiramente redigir um simples diretório segundo as regras do Padre Beckx ou conforme os
pormenores do Manual em uso nas Filhas de Caridade. Mais tarde ir-se-á retirar dele um
regulamento especial para a obra local.

V. O ESPÍRITO DA ASSOCIAÇÃO
593 1. As Filhas de Maria tomam a peito não frequentar bailes, teatros e outras reuniões
perigosas, de evitar leituras imorais, como romances, folhetins, etc. Elas levam a sério o honrar a
sua divina Mãe pela sua modéstia, sua piedade, sua caridade e a sua dedicação. Elas velam a que
se conservem dignas de progredir sob a bandeira tutelar da SSma Virgem.
2. Para ter mais eficácia, a associação das Filhas de Maria considera-se como instituída em
favor das moças operárias e das que usam da maior simplicidade no género de vida e no aspeto
exterior.

594 3.A diretora deve ter, independentemente do padre, a sua iniciativa formal no governo da
associação.
4.As conselheiras devem ser verdadeiras auxiliares em tudo o que se faz; o talento da
direção é de as mobilizar para o apostolado, pelo interesse das reuniões e o entusiasmo nos jogos,
pelos artifícios da caridade, etc.
Dever-se-á tentar provocar os empenhos, ao utilizar as boas vontades e todas as aptidões e,
sobretudo, ao desenvolver o espírito do apostolado mútuo, que se deve exercer dentro da
associação, seja no exterior, na família sobretudo em relação às moças de humilde condição
suscetíveis de serem atraídas e ganhas.

VI. AS REUNIÕES
595 A reunião começa por uma leitura espiritual. A diretora faz uma curta exortação sobre as
matérias que favorecem o progresso espiritual das Filhas de Maria.
Todos os meses, o padre diretor vem presidir e faz uma alocução; esta reunião mensal é
obrigatória a menos que haja impedimentos graves que a diretora deverá conferir.

VII. OS RECREIOS
596 Todos os Domingos há recreio em comum e jogos, que, para serem dinâmicos, devem ser
preparados por uma comissão e uma conselheira, mestra dos jogos.
Um diretório constituído desde o primeiro ano, conservado e melhorado pela experiência,
prevê as festas e os passeios e varia os divertimentos e as diversões que afastam dos prazeres
perigosos do exterior.

VIII. CAIXA DE FAMÍLIA OU DE POUPANÇA


597 Em certas obras, ajuntou-se à Associação das Filhas de Maria uma caixa de família
alimentada por um peditório mensal, ou uma quotização que faz dela uma sociedade de socorro
mútuo; ou então há uma caixa de poupança que prepara o dote para o casamento. Esta ajuda
material, numa forma ou numa outra, é indispensável neste tempo qual força contra o respeito
humano, como encorajamento às famílias operárias e como exercício do dever para as jovens
remediadas.

IX. O CASAMENTO
598 Importa afirmar que as associações tendem às uniões cristãs. Seria vantajoso, onde for
possível, fornecer um pequeno dote de 50 francos ou de 100 francos às filhas dos operários.
Ao menos dar-se-ia uma solenidade especial aos matrimónios das Filhas de Maria. Por
exemplo, a bandeira da Santa Virgem é levada à frente da Filha de Maria pelas conselheiras que a
conservam junto delas, durante a cerimónia. As outras suas companheiras assistem à Missa, desde
que possam. A desposada traz a fita azul e a medalha sobre o seu vestido de núpcias; depois da
Missa, ela vai ao altar da Santa Virgem sobre o qual depõe a sua fita. A medalha é-lhe deixada
como recordação. Oferece-se-lhe um colar de prata e um estojo de subsídios paroquiais, dons da
associação, etc.

X. ENFERMIDADES E ÓBITOS
599 Quando uma Filha de Maria cai doente, a diretora, a presidente e uma conselheira chamada
enfermeira se conluiem para a visitar ou a fazer visitar por outros, rodeiam-na de cuidados
afetuosos e provêm, tanto quanto possível, às suas carências materiais e espirituais.
Se for o caso, elas predispõem-na a receber os sacramentos da Igreja.
Se um decesso acontecer, não só a bandeira da Virgem SSma é levada no enterro, como se
pratica em muitos lugares pelas moças, mas as Filhas de Maria fazem tudo quanto está ao seu
alcance para dar brilho à cerimónia.
Nas reuniões posteriores, recita-se o De profundis pela defunta e a associação faz celebrar
na sua intenção o santo sacrifício da Missa.

Associação dos Santos Anjos


600 A experiência demonstrou a necessidade de um lugar especial para a reunião das mocinhas
entre os onze e os quinze anos cuja turbulência fatiga as maiores.
Será bom que elas tenham a sua diretora especial.
Uma conselheira das Filhas de Maria foi-lhe entregue como presidente e esta rodeia-se de
dignitárias, tomadas entre as suas jovens protegidas.
CAPÍTULO XVI
RECORDAÇÃO DALGUMAS OBRAS ANTERIORES QUE NÃO
FORAM ESTUDADAS DE MODO PARTICULAR NESTE MANUAL
A. Obras de ação geral
601 1º. A União das obras operárias. – Esta obra geral tem o seu gabinete central em Paris,
32, rua de Verneuil. Pode-se corresponder sempre com o seu secretário. Ela possui o seu boletim
mensal. Ela muda os seus grandes encontros anuais, desde há vinte anos, de província em
província. Ela suscitou milhares de obras: teve a honra de ter sido presidida por Monsenhor de
Ségur e por Monsenhor Gay. Suscitou e fundou por todo o lado gabinetes diocesanos de obras e
de conferências de obras nos Seminários maiores. Ela busca, por alguns cêntimos, informações
sobre todas as obras a fundar, modelos de estatutos e de regulamentos. É a mina mais rica para os
dirigentes de obras.

602 2º.A União nacional e a ação social católica. – É a obra do senhor padre Garnier. Ela tem
a sua sede, 1, rua Feydeau, em Paris. Tem por órgão Le Peuple Français.
Encontra-se no secretariado da União nacional documentos de todo o género sobre o
método do infatigável apóstolo e sobre as obras que ele recomenda.

603 3º. A Associação católica da juventude francesa. – O seu fim é a formação de grupos de
estudo e de ação entre os jovens. Todas as nossas cidades já responderam ao apelo da obra. Ela
tem o seu órgão, a Revista da juventude católica. O seu secretariado é o mesmo que o da Obra dos
Círculos, 262, avenida Saint-Germain, em Paris.

604 4º. O Ofício central das instituições caritativas. – Encontra-se nele um gabinete de
informações muito precioso. Nele estão todas as indicações de que se precisa sobre as obras
caritativas da França e mesmo do estrangeiro.
O seu gabinete está em Paris, 175, avenida Saint-Germain.

605 5º. A Obra de São Francisco de Sales. – Ela tem como finalidade a conservação e a
propagação da fé no interior.
Ela dá o seu concurso por meio de subvenções, livros e objetos de piedade às missões dos
campos, às escolas livres, às obras de apadrinhamento.
A sua sede está em Paris, 11 bis, passagem da Visitação.

606 6º. A Obra dos campos. – Ela sustenta igualmente as escolas e os patronatos, favorece as
missões e as bibliotecas paroquiais. Ela foi fundada por uma padre santo, o Rev. Padre Vandel. O
seu manual ainda está entre os melhores para os campos, embora convém ser completado para as
obras dos homens e para as obras sociais.
A sua direção: 35, rua de Sèvres.
7º. A Associação de Nossa Senhora da Salvação. – Ela se ocupa também de sustentar as
obras operárias. Ela tem a sua sede em Paris, 129, rua da Universidade, como a obra das
Peregrinações nacionais. E também tem diretores diocesanos.

B. Obras de piedade e de apostolado


607 1º. Obras de apostolado geral. – Não fazemos mais do que nomear de passagem as grandes
obras da Propagação da Fé, da Santa Infância e das Escolas do Oriente. Elas têm em cada diocese
um diretor particular.

608 2º. As Ordens Terceiras. – Temos dado uma informação especial sobre a Ordem-Terceira
franciscana. Encontra-se nela a regra nos editores Delhomme em Briguet, em Lião.
As fraternidades da Ordem Terceira estão conexas a um ramo ou a outro da Ordem
franciscana.
A Ordem Terceira dominicana está unida à Ordem de São Domingos. Para que se possa
fazer parte dela, pode-se dirigir a 222, bairro Saint-Honoré, Paris.

609 3º. A Confraria do Santo Rosário. – É a mais antiga das confrarias em honra da Santa
Virgem. Ela conheceu, como a Ordem Terceira de São Francisco, um papel social imenso, e pode
conservá-lo ainda hoje. Em muitos países, na Espanha, na Itália, na América do Sul, ela tinha ou
ainda tem fundos capitais, valores, uma caixa de família, um conselho de administração, um altar
particular ou uma capela. Ela preenche o escopo que têm as nossas obras modernas: possibilitar às
famílias socorros temporais ao mesmo tempo que vantagens espirituais. Esqueceu-se na França
este papel das nossas antigas confrarias.
Para a organização das confrarias do rosário, poderemos endereçar-nos aos conventos dos
reverendos padres dominicanos.

610 4º. As Confrarias do Santíssimo Sacramento. – Todas as que foram erigidas


canonicamente pelos bispos participam às indulgências e privilégios da arquiconfraria romana da
Minerva. Estes favores são indicados nos repositórios das indulgências.

611 5º. O Apostolado da Oração e a Comunhão Reparadora. – Esta obra está muito espalhada.
Ela tomou no Canadá uma forma social e militante que se poderia imitar. Ela tem, entre os nossos
irmãos da Nova França, as suas reuniões mensais de homens, as suas procissões, a sua bandeira.
Ela reúne os homens debaixo da égide do Sagrado Coração.
A respetiva direção encontra-se em Tournai, 65.

612 6º. As Confrarias de Nossa Senhora da Fábrica e de Nossa Senhora do Campo. – Estas
confrarias se adaptam a todos os grupos de operários. Elas formam o laço religioso dos sindicatos
e das corporações. Têm boletins periódicos muito úteis para as obras sociais.
Endereçar-se, para a primeira, ao pároco de Saint-Rémi, em Reims; para a segunda, ao
senhor arcipreste de Séez (Orne).

C. As Obras de Caridade e de apadrinhamento


613 1º. As Conferências de São Vicente de Paulo. – A Bélgica fundou duzentas delas nos
___________________________________________
65
Encontra-se lá igualmente um excelente manual dos padres e dos professores para a comunhão mensal
e reparadora das crianças.

últimos anos. Imitemo-la. Recrutemos sobretudo os jovens.


Podemos nos endereçar para os regulamentos e informações ao conselho diocesano, ou em
Paris, ao conselho central, rua de Fürstengerg, 6. Encontra-se aí documentos para as obras dos
campos como para os das cidades.

614 2º. Os orfanatos. – Sentimo-nos muitas vezes embaraçados para colocar os órfãos. A obra
de adoção, rua Casimir-Delavigne, 9, em Paris, dará as informações necessárias.
A Sociedade de apadrinhamento dos orfanatos agrícolas é: 2, rua Casimir-Périer, em Paris.

615 3º. A Sociedade de São Francisco Régis, para a revalidação das uniões ilegítimas. – Esta
obra é mais necessária do que nunca no nosso tempo onde reina a epidemia do divórcio e das
uniões livres. Esta associação facilita o matrimónio religiosos dos indigentes e a legitimação dos
filhos.
O seu centro situa-se em Paris, 13, rua Madame.

616 4º. As obras dos soldados. – Muitas paróquias tomaram o bom costume de celebrar uma
missa de despedida para os jovens chamados ao serviço militar. É uma boa ocasião de lhes
distribuir manuais do soldado cristão. Podemos encontrá-los em casa do capelão do forte de
Vincennes, por meio de 0 francos 35.
Encontra-se no Gabinete central da União das obras (32, rua de Verneuil) a lista dos
eclesiásticos aos quais podemos recomendar os militares. Faz-se bem em dar aos circunscritos aos
quais nos interessamos uma carta de recomendação para o capelão voluntário da guarnição para a
qual foi afetado.
CAPÍTULO XVII
AS ESCOLAS CRISTÃS LIVRES

§ 1. – Sobre o estabelecimento das escolas cristãs


617 A escola católica é considerada como a primeira das obras em todos os países em que a
Igreja goza da liberdade.
Na Inglaterra, nos Estados Unidos, para fundar uma nova missão, abre-se primeiramente
uma escola que, ao Domingo, serve de igreja.
Um padre que tem o encargo das almas terá, como sua primeira preocupação, a sua escola
privada, se a Providência puser entre as suas mãos os fundos necessários.

***

618 Os católicos zelosos que, pela sua instrução e seus conhecimentos, podem secundar a ação
do padre na abertura de uma escola cristã, dever-se-ão pôr, tal como ele, em relação o mais cedo
possível com o senhor secretário da Sociedade geral da educação e do ensino, 35, rua de Grenelle,
Paris.
Eles encontrarão todas as informações desejáveis numa brochura editada por esta
sociedade: Comentário da lei de 30 de Outubro de 1886, sobre a organização do ensino primário
e dos regulamentos orgânicos do 18 de Janeiro de 1887.
As leis sobre o ensino tendo por fim disfarçado o combater a influência da Igreja
enfraquecendo-a, será bom, para abrir e dirigir uma escola privada, de percorrer o Boletim da
Sociedade geral da educação e do ensino. Poder-se-á premunir, desta feita, contra os enredos da
lei, conhecer-se-á o terreno que permanece livre e as garantias numerosas que ainda não foram
retiradas. Nas dúvidas ou dificuldades pode-se recorrer gratuitamente ao secretariado da mesma
sociedade; mas estas consultas, prestadas por homens afastados das circunstâncias complexas,
donde derivam muitas vezes os entraves, não dispensam de estudar a lei e suas aplicações. Deve-
se sobretudo buscar informações junto de homens experientes que souberam contornar os
obstáculos em obras semelhantes.

619 A Lei distingue:


1.As escolas maternas e as classes infantis;
2.As escolas primárias elementares;
3.As escolas primárias superiores;
4.As escolas de trabalhos manuais e de aprendizes.
(Lei de 30 de Outubro de 1887, artigo 1º).

620 As escolas fundadas e mantidas por associações e particulares são denominadas escolas
privadas (idem, artigo 2.).
Ninguém poderá ser diretor ou adjunto encarregado de classe numa escola pública ou
privada, se não for francês e se não preenche, além disso, as condições de capacidade fixadas pela
lei de 16 de Junho de 1881…
Todavia, os estrangeiros cumprindo as duas ordens de condições pré-citadas e admitidos a
gozar direitos civis na França, podem ensinar nas escolas privadas, por meio duma autorização
dada pelo ministro, depois da opinião do Conselho departamental (idem, artigo 4).
São incapazes de gerir uma escola pública ou privada, ou de serem nelas empregados, os
que estiveram sujeitos a uma condenação judiciária por crime ou delito contrário à probidade ou
as costumes (idem, artigo 5).

621 O ensino é dado por professores nas escolas ou classes de rapazes, por professoras nas
escolas de moças, nas escolas maternas, nas escolas ou classes infantis e nas escolas mistas (idem,
artigo 6).
Ninguém pode ensinar numa escola primária, em qualquer degrau que seja, antes da idade
de dezoito anos para os professores e dezassete anos para as professoras.
Ninguém pode dirigir uma escola antes da idade de vinte e um anos.
Ninguém pode dirigir uma escola primária ou uma escola que receba alunos internos, antes
da idade de vinte e cinco anos completos. (idem, artigo 7).

§ 2. – Acerca da inspeção
622 «A inspeção dos estabelecimentos de instrução primária públicos ou privados é exercida:
1.Pelos inspetores gerais da Instrução pública;
2.Pelos reitores e inspetores da Academia;
3.pelos inspetores do Ensino Primário;
4.Pelos membros do Conselho departamental designados para este efeito;
Todavia, as escolas privadas não poderão ser inspecionadas pelos professores e
professoras públicos que fazem parte do Conselho departamental.
5.Pelo presidente da câmara e pelos delegados cantonais».
Uma circular ministerial de 25 de Março de 1887 decide que os conselhos departamentais
podem autorizar os delegados cantonais a visitar não apenas certas escolas determinadas, mas
ainda todas as escolas do seu cantão. A mesma circular recorda que estes delegados não têm de se
ocupar do ensino propriamente dito.
6.«Nas escolas maternas, simultaneamente com as autoridades pré-citadas, pelas
inspetoras gerais e pelas inspetoras departamentais das escolas maternas», somente nas escolas
desta categoria.

623 7. «Pelos médicos inspetores comunais ou departamentais», mas somente sob o ponto de
vista médico.
«A inspeção das escolas privadas sobre a moralidade, a higiene, a salubridade, e sobre a
execução das obrigações impostas a estas escolas pela lei de 28 de Março de 1882. Ela não pode
aplicar-se sobre o ensino senão para verificar se não for contrário à moral, à Constituição e às
leis» (idem, artigo 9).
O artigo 10 da lei do 28 de Março de 1882 pré-citada, exprime-se deste modo:
Quando uma criança falta casualmente à escola, os pais ou as pessoas responsáveis devem
fazer conhecer ao diretor ou à diretora os motivos da sua ausência.
Os diretores e diretoras devem ter um registo de chamada que constate, para cada classe, a
ausência dos alunos inscritos. No fim de cada mês, eles dirigem ao presidente da câmara e ao
inspetor primário um extrato deste registo com a indicação do número das ausências e os motivos
invocados. Os motivos de ausência serão submetidos a uma comissão escolar. Os únicos motivos
reputados legítimos são os seguintes: doença da criança, decesso de um membro da família,
impedimentos resultantes da dificuldade acidental das comunicações. As outras circunstâncias
excecionalmente invocadas serão igualmente apreciadas pela comissão.

624 «Todas as classes de moças, nos internatos como nos externatos primários públicos e
privados, dirigidas seja por professoras leigas, seja por associações religiosas monásticas de
clausura ou não enclausuradas, ficam submetidas, quanto à inspeção e à vigilância do ensino, às
autoridades instituídas pela lei.
Em todos os internatos de moças dirigidos por professoras leigas ou por associações
religiosas enclausuradas ou não enclausuradas, a inspeção dos locais afetos às pensionárias e
sobre o regime interno do pensionato, fica confiado a senhoras delegadas pelo ministro da
Instrução pública».
Resulta dos termos da lei que as inspetoras não podem visitar senão os locais destinados às
pensionistas e não terão investigações a exercer a não ser sobre o regime interno do pensionato
sem ter com que se ocupar dos locais ou do regime da comunidade.

625 Os artigos 142 e 143 do decreto do 18 de Janeiro de 1887 precisaram esta regra. A inspeção
das senhoras inspetoras respeita exclusivamente as condições higiénicas nas quais o pensionato
está estabelecido. Elas não têm o direito de investigar se os dormitórios recebem crianças em
número superior que o fixo pelo Conselho departamental.
Não pode depender do prefeito, do inspetor da Academia ou de uma autoridade diferente
da do diretor, de deixar penetrar na escola privada pessoas estrangeiras à inspeção legal.
Os prefeitos e subprefeitos, até eles não têm o direito de entrar aí. Pelo contrário, as pessoas
que o diretor da escola privada irá admitir, ministros do culto, fundadores ou benfeitores do
estabelecimento, inspetores livres, etc., poderão, se ele os convida, tornar-se testemunhas do seu
ensino, interrogar as crianças etc.
Nas escolas privadas, os livros, os métodos, as matérias e os resultados do ensino escapam
à inspeção.
O artigo 167 do decreto do 18 de Janeiro de 1887 confere às pessoas encarregadas da
inspeção nas escolas privadas o direito que lhes apresentem os livros e os cadernos dos alunos.

626 Contudo, o artigo 35 da mesma lei exprime-se assim:


«Os diretores e diretoras das escolas primárias privadas estão livres completamente na
escolha dos métodos, dos programas e dos livros, reserva feita para os livros que terão sido
interditos pelo Conselho superior da Instrução pública, na execução do artigo 5 da lei de 27 de
Fevereiro de 1880».
Este artigo intitula-se: o conselho dá a sua opinião:
…Sobre os regulamentos relativos à vigilância das escolas livres.
Sobre os livros do ensino, de leitura e de preços que devem ser interditos nas escolas livres
como contrários à moral, à Constituição, e às leis, etc., etc.
§3. – Admissão das crianças de ambos os sexos e das crianças menores
de seis anos de idade nas escolas primárias. – Formalidades de
abertura para as classes infantis. – Os jardins infantis.
627 «Nenhuma escola privada não tem poder, sem autorização do Conselho departamental,
de receber crianças dos dois sexos, se existir no mesmo lugar uma escola pública ou privada
especial para moças» (idem, artigo 36).
Esta autorização portanto não é necessária, se a localidade não possui escola especial para
moças; esta solução difere nitidamente dos termos da lei.
«Nenhuma escola privada pode receber crianças debaixo de seis anos, se existir na
comuna uma escola materna pública ou uma classe infantil pública, a menos que não tenha uma
classe infantil» (idem, artigo 36).
As classes infantis são classes intermediárias entre a escola materna e a escola primária
(artigo 7 da lei de 16 de Junho de 1881). Elas requerem o brevet elementar.
As escolas maternas (salas de asilo), publicas ou privadas, são estabelecimentos de
educação na quais as crianças dos dois sexos recebem os cuidados que reclama o seu
desenvolvimento físico, intelectual, e moral. As crianças podem ser nelas admitidas desde a idade
de dois anos feitos e ficar aí até a que tenham atingido a idade dos sete anos (Decreto do 2 de
Agosto de 1881).

628 O artigo 6 do decreto do 18 de Janeiro d 1887, que exige das diretoras das escolas maternas
o certificado de aptidão pedagógico, não é aplicável senão às professoras públicas.
O direito de receber crianças abaixo de seis anos pertence às escolas privadas, se não
houver na comuna escola materna ou classe infantil, e tal, mesmo que as escolas livres não tenham
classe infantil especial, ou que tenham necessidade de pedir qualquer autorização.
È de notar que, neste caso, e quando se trata de escolas privadas, a lei não fixa a idade
mínima da entrada das crianças.
As escolas maternas ou infantis privadas podem receber alunos de ambos os sexos sem
autorização do Conselho departamental, pois as escolas maternas e as classes infantis são, pela sua
própria natureza, nos termos do artigo 7 da lei de 16 de Junho de 1881, destinadas a receber
meninas e meninos.

629 Nos termos dos artigos 6 e 15, o ensino não pode ser dado nas classes infantis senão por
professoras.
Pode-se sempre, sem alguma formalidade de declaração ou autorização, abrir um jardim
infantil, isto é, reunir crianças dos dois sexos, com menos de seis anos de idade. Como foi
declarado na Câmara dos deputados (sessão do 15 de Março de 1884), «os jardins infantis não
estão compreendidos na lei, a lei não tem nada a ver com isso…».
Nestes estabelecimentos, as crianças não podem receber o ensino de nenhuma das matérias
compreendidas no programa da instrução primária; é o privilégio das classes infantis, cuja abertura
especial está submetida às condições das escolas privadas desde o 1º de Janeiro de 1888.
Se existir já uma escola materna tendo uma diretora munida com um certificado de aptidão
às salas da mesma, anterior à lei do 30 de Outubro de 1886, e se existir igualmente uma escola
privada, estas escolas podem ajuntar-lhes uma classe infantil, sem pedir qualquer autorização e
sem ter de fazer nenhuma declaração. Basta informar o inspetor da Academia no caso do acréscimo
de uma classe infantil a uma escola privada. O artigo 36, longe de impor qualquer formalidade
prévia, reserva à escola privada já existente a sua liberdade plena e inteira e lhe permite de receber
alunos dos dois sexos abaixo dos seis anos, em concorrência com as escolas infantis públicas.

§ 4 . – Formalidades para a abertura das escolas privadas


630 «Qualquer professor que quer abrir uma escola privada deve previamente declarar a sua
intenção ao presidente da Câmara comunal onde quiser estabelecer, e lhe designar o local.
O presidente remete imediatamente ao requerente um recibo da declaração e faz afixar
essa à porta da Câmara durante um mês.
Se o presidente julga que o local não é conveniente por razões provindas dos bons
costumes ou da higiene, ele forma, em oito dias, oposição à abertura da escola e informa disso ao
requerente.
As mesmas declarações devem ser feitas em caso de mudança do local da escola, ou em
caso de admissão de alunos internos» (Lei do 30 de Outubro de 1886, artigo 37).
O requerente dirige as mesmas declarações ao prefeito, ao inspetor da Academia e ao
procurador da República; ele acrescenta a isso, para o inspetor da Academia, o seu atestado de
nascimento, os seus diplomas, o extrato do seu certificado criminal, a indicação dos lugares onde
residiu, e as profissões que exerceu durante os dez anos precedentes, o plano dos locais afetos ao
estabelecimento, e se pertencer a uma associação, uma cópia dos estatutos desta associação.

631 O inspetor da Academia, seja de ofício, seja sobre a denúncia do procurador da República,
pode formar oposição à abertura de uma escola privada no interesse dos bons costumes ou da
higiene.
«Quando se tratar de um professor público revocado e querendo se estabelecer como
professor privado na comuna onde exercia, a oposição pode ser feita no interesse da ordem
pública.
Por falta de oposição, a escola é aberta ao findar um mês, sem outra formalidade». (idem,
artigo 38).

632 Segundo a nova lei, o presidente da Câmara pode exigir a declaração dos lugares onde o
requerente residiu, ou as profissões que exerceu; o presidente não pode fazer mais do que uma
oposição puramente material, fundada sobre as condições do local proposto.
O presidente da Câmara portanto deve:
1. Dar ao requerente um recibo da sua declaração.
2. Fazer afixar à porta da Câmara esta declaração e manter a sua afixação durante um mês.
3. Pode formar, se tiver de quê, oposição à abertura da escola. Esta oposição não se pode
apoiar sobre outros motivos a não ser nos dos bons costumes e da higiene.
O presidente da Câmara tem um prazo de oito dias para formar esta oposição. Ele usa do
direito de oposição sem ter, como outrora, de consultar o prefeito.

633 Para todas as peças a enviar, o requerente fará bem, se as confiar ao Correio ou ao guichet
de um gabinete, em exigir um recibo constatando a exatidão do extrato. A abertura das escolas
privadas foi retardada pelo desaparecimento de peças das quais se deve pedir a duplicata.
Os diplomas, que se ajuntam para o inspetor da Academia, são brevets necessários,
segundo a natureza da escola que se intenciona abrir. O extrato do registo criminal deve ser pedido
ao juiz do tribunal civil da circunscrição no qual nasceu o requerente. – O pedido deve ser feito
sobre papel selado. O direito de selo é de 3 francos 65. – O extrato do registo criminal é entregue
pelo ministro da justiça aos requerentes nascidos na Alsácia-Lorena ou nas colónias. Neste caso,
o pedido é transmitido pelo juiz do tribunal da circunscrição no qual o requerente tem o seu
domicílio.
No caso de mudança no local da escola, não há nenhuma declaração a fazer.

634 Mas no caso de mudança do local, quando houver transladação da escola para um novo
local, o artigo 37 prescreve uma simples declaração ao presidente da Câmara que é o juiz do local;
o professor não se vê obrigado a fornecer outras peças que o concernem pessoalmente, pois que
permanece o que era.
Os locais de uma escola livre não têm necessidade de serem conformes às indicações dadas
pelos atos e regulamentos administrativos quanto às condições materiais da instalação. No entanto
será bom que ofereçam condições análogas.
A cópia dos estatutos da associação à qual pertence o professor reduz-se a uma indicação
com reenvio aos estatutos e menção da data do reconhecimento quando se trata de membros de
congregações reconhecidas pelo Estado.

635 Quanto aos membros das outras associações, eles não devem comunicar exceto a parte dos
seus estatutos que toca ao exercício da profissão de professores e não a que se refere mais
intimamente às condições da vida religiosa.
Para não causar embaraço à administração civil, os professores das congregações não
reconhecidas poderiam conservar-se no direito comum individual sem mencionar a sua situação
religiosa, que é puramente do domínio da consciência; respeita à prudência dos superiores a
decisão sobre o assunto, de acordo com a autoridade episcopal.

§ 5. – Sobre a oposição de abertura a uma escola privada


636 «As oposições à abertura de uma escola privada são julgadas contraditoriamente pelo
Conselho departamental num prazo de um mês.
Pode ser introduzido um apelo acerca da decisão do Conselho departamental nos dez dias
a partir da notificação desta decisão. O apelo é recebido pelo inspetor da Academia; ele fica
submetido ao Conselho superior da Instrução pública na sua próxima sessão, e julgado
contraditoriamente no prazo mais breve possível.
O professor interpelativo pode fazer-se assistir ou representar por um conselho diante do
Conselho departamental e diante do Conselho superior.
Em nenhum caso, a abertura não poderá ter lugar antes da decisão do apelo» (idem, artigo
39).

637 O prefeito, informado da oposição feita pelo presidente da Câmara ou pelo inspetor da
Academia, designa um relator escolhido entre os membros do conselho e, oito dias antes da sessão,
convida o professor declarando a comparecer ou a se fazer representar diante do conselho.
O conselho, antes de estatuir, ouve o interessado, o seu conselho ou o seu representante,
ouve as testemunhas e consulta as peças produzidas. Ele delibera fora da presença do professor.
O professor, depois de ter obtido o desimpedimento da oposição, poderá abrir a sua escola
nesse mesmo dia, e a conservar aberta tanto quanto não houver apelo; mas, o apelo uma vez
formulado, ele deveria dar férias aos alunos e esperar que o Conselho superior tenha decidido.
§ 6. – Encerramento das escolas e interdição aos professores
privados
638 «Quem quer que seja que tivesse aberto ou dirigido uma escola, sem preencher as
condições prescritas pelos artigos 4, 7 e 8, ou sem ter feito as declarações exigidas pelos artigos
37 e 38, ou antes da expiração do prazo especificado no artigo 38, último parágrafo, ou enfim,
em oposição às prescrições do artigo 36, será conduzido diante do tribunal correcional do lugar
do delito e condenado a uma multa de 100 a 1.000 francos.
A escola será fechada.
Em caso de recomeço, o delinquente será condenado à prisão de seis dias a um mês, e a
uma multa de 500 a 2.000 francos.
As mesmas penas serão pronunciadas contra o que, no caso de oposição formada à
abertura da sua escola, a terá aberto antes que tenha sido estatuído sobre esta oposição, ou apesar
da decisão do Conselho departamental que terá acolhido a oposição, ou antes da decisão de apelo.
O artigo 463 do Código postal poderá ser aplicado».

639 A enumeração dos casos de encerramento pode ser assim formulada completamente:
1º.A abertura de uma escola por um professor não francês, não tendo sido autorizado
devidamente.
2º.A abertura por um professor sem brevet e não preenchendo as condições de capacidade
fixadas pela lei de 16 de Junho de 1881;
3º.A abertura por um professor empregando adjuntos sem terem estas mesmas condições;
Os auxiliares contudo estão autorizados pela lei, isto é «jovens que se preparam ao brevet de
capacidade, mas que não dão aulas ou que não a fazem senão ao lado do professor e debaixo da
sua vigilância e, por assim dizer, como se fossem repetidores» (Tribunal de Nîmes).
4º.A abertura de uma escola na qual o ensino seria dado por professores não tendo a idade
requerida;
5º A abertura das escolas, classes ou cursos de adultos ou de aprendizes, se esta abertura
não for precedida pelas formalidades prescritas;

640 6º.A abertura de uma escola antes do cumprimento das condições incluídas nos artigos 37
e 38;
7º.A abertura de uma escola antes da expiração do prazo de um mês;
8º.A abertura de uma escola tomando o título de escola primária superior, sem que o diretor
seja provido do brevet necessário;
9º.A abertura de uma escola recebendo alunos dos dois sexos, no caso onde o município
possuir uma escola pública ou privada especial para meninas;
10º.A admissão de crianças abaixo dos seis anos numa escola não provida de uma classe
infantil, se existir numa comuna uma escola materna púbica ou uma classe infantil pública;
11º.A abertura de uma escola apesar da oposição formada pelas autoridades competentes;
12º.A abertura de uma escola antes do desimpedimento desta oposição e antes da decisão
sobre o apelo.

641 O artigo 463 do Código penal exprime-se assim:


«Em todos os casos onde a pena da prisão e a da multa forem pronunciadas pelo Código
penal, se as circunstâncias parecerem atenuantes, os tribunais correcionais estão autorizados,
mesmo no caso de reincidência, a reduzir… a prisão para abaixo de seis dias e a multa mesmo as
maiores de 16 francos. Também poderão pronunciar separadamente uma ou outra destas penas e
até substituir por uma multa em vez da prisão, sem que em nenhum dos casos ela possa estar por
baixo das penas de simples inspeção».

§ 7. – Outras sanções legais


642 «Qualquer professor privado poderá, na sequência da acusação do inspetor da Academia,
ser compelido por causa de falta grave no exercício das suas funções, de mau comportamento ou
de imoralidade, diante do Conselho departamental, e ser censurado ou interdito de exercício da
sua profissão, seja na comuna onde ele exerce, seja no departamento segundo a gravidade da
falta cometida.
Ele pode mesmo ser golpeado de interdição por um tempo limitado ou de interdição
absoluta pelo conselho departamental, na mesma forma e segundo o mesmo processo que o
professor público.
O professor golpeado de interdição pode fazer apelo diante do Conselho superior na
mesma forma e segundo o mesmo processo que o professor público.
Este apelo não será suspensivo» (artigo 41).
Fácil é de ver o que esta formulação vaga deixa para o arbitrário.

643 As penas que o Conselho departamental pode pronunciar são as seguintes:


1º. A censura;
2º. A interdição de ensinar na Comuna ;
3º. A interdição de ensinar no departamento;
4º. A interdição durante certo tempo e para uma duração que não pode exceder cinco anos
(artigo 31);
5º. A interdição absoluta.

644 Quais as medidas a tomar em caso de interdição pronunciada contra um professor privado?
Parece que ele pode ser entregue às férias provisórias produzidas pela interdição por meio
da designação imediata de um novo professor que cumpra as condições legais, o qual entrará
oficialmente em função no período de um mês. Isso resulta da combinação das diversas leis do
ensino. Na prática, o inspetor autoriza oficiosamente o novo titular a continuar o ensino sem
interrupção.
O diretor deverá portanto avisar o inspetor da escolha que terá feito e justificar quanto à
capacidade do professor de que está em causa. O inculpado tem o direito de fazer apelo diante do
Conselho superior da instrução pública, mas este apelo não é suspensivo.

§ 8. - Bibliografia
645 1º. Publicações da Sociedade geral da educação e do ensino
Comentário da lei de 28 de Março de 1882.
Comentário da lei do 30 de Outubro de 1886.
As Comissões escolares.
Sobre a constituição das sociedades em vista do estabelecimento de escolas livres.
A retribuição escolar nas escolas cristãs livres.

646 2º. Vidas dos santos:


Vida do Bem-aventurado Jean-Baptiste de la Salle.
Vida do venerável Champagnat, fundador dos pequenos Irmãos de Maria.
Vida de São José de Calasanz, pelo padre Timon David.
Obras do mesmo autor, entre outras: Método para a direção das obras de juventude.
A leitura destas três vidas demostrará que não basta, para formar cristãos, de ter aberto
escolas e de as ter provido de professores cristãos, mas que se exige uma ação sacerdotal contínua
e sobrenatural para fecundar os seus esforços.
CAPÍTULO XVIII
O EXEMPLO DA AÇÃO PATRONAL CRISTÃ NA FÁBRICA
JUNTO À CIDADE, TÊXTIL DO SENHOR VRAU, EM LILLE.

647 Esta fábrica considerável ocupa 540 pessoas, das quais 400 mulheres ou moças. As obras
começaram em 1876. Os patrões P. Vrau e Féron Vrau, cujo zelo faz a edificação do centro
industrial de Lille, chamaram as Irmãs da Providência para organizarem obras na fábrica. Eles
obtiveram inicialmente duas irmãs, depois quatro; seis religiosas emprestam-lhes agora o seu
concurso. Elas têm a sua instalação e o seu oratório junto das oficinas. A sua presença foi
facilmente aceite. Elas passam o seu dia nas oficinas. Elas vigiam, fazem as contas do trabalho,
inscrevem os pedidos de entrada; elas se interessam às ausências, aos doentes, uma delas dá aulas
às moças.
Os operários da fábrica recrutam-se nos círculos e nos patronatos. O conjunto forma um
meio cristão excecional.
Os operários e operárias entram e saem por passagens diferentes e com um quarto de hora
de intervalo.

648 A casa Vrau forma, com cinco outras, uma espécie de federação que constitui a
Corporação cristã de São Nicolau.
A casa tem um conselho patronal composto dos patrões, de suas esposas, dos cinco
principais empregados e de um capelão. Estuda-se nele, em todas as reuniões mensais, tudo o que
pode ser empreendido no interesse moral ou material dos operários.
A casa tem igualmente um conselho interno para os operários e um outro para as operárias.
Um patrão e o capelão assistem às suas reuniões. Eles se compõem de vigilantes das oficinas e dos
delegados eleitos pelos seus camaradas. São os intermediários entre o conselho patronal e o
pessoal.

649 Não podemos citar senão rapidamente as obras de piedade e de moralização, e as


instituições económicas fundadas sucessivamente pela casa Vrau.
As oficinas têm emblemas religiosos. Reza-se aí antes e depois do trabalho.
Uma capela, fundada em 1886, na casa das irmãs, serve para a catequese, para as confissões
do sábado, para missa e comunhão durante a semana, mas sempre com a maior liberdade.
A confraria de Nossa-Senhora da Usina tomou posse de toda a casa: as operárias trazem a
sua fita e a medalha para a fábrica.
Os retiros anuais reanimam as boas vontades.
O jornal La Croix tem cem assinaturas na fábrica.

650 As moças frequentam o patronato paroquial ao Domingo. As marcas da sua frequência


nele que elas trazem consigo dão-lhes direito a uma distribuição de prémios duas vezes por ano.
As jovens operárias frequentam o patronato ou o círculo, segundo a idade respetiva.
As instituições económicas são livres. Elas compreendem uma caixa de socorro mútuo,
uma caixa de assistência, um economato popular, uma caixa de empréstimos e uma caixa de
poupança.
Não é tudo, mas basta para indicar quanto a vida corporativa cristã é poderosa na casa
Vrau. Também parece um oásis onde a religião concorre para o bem comum, para a paz social e,
por acréscimo, para a prosperidade material.
CAPÍTULO XIX
EXEMPLO DE AÇÃO PATRONAL NA FÁBRICA, NO CAMPO, NA
TÊXTIL DOS SENHORES HARMEL NO VAL-DES-BOIS
651 I. Histórico. – As obras do Val-des-Bois datam de 1861. Até então, nem sequer um
operário cumpria seus deveres religiosos.
Começou-se por uma modesta escola das Filhas da Caridade.
Foi preciso dois anos para conseguir arrancar duas moças às seduções das festas profanas
do Domingo e agrupá-las debaixo da bandeira das Filhas de Maria.
Em 1863, três Irmãos das Escolas cristãs começaram a escola para rapazes. Em 1867, eles
podiam com uma quinzena de jovens e alguns pais de família, organizar o Círculo de São José.
O apostolado das obras desenvolvia-se. Algumas conversões introduziam nas famílias
contentamentos antes inconcebíveis. A associação de Santa Ana começou a agrupar as mães de
família em 1868. Tratou-se de um grande progresso. A paz do lar, a economia doméstica, a
educação dos filhos receberam desse fato um acréscimo maravilhoso.

652 Tinha sido inaugurado um modesto oratório em 1862. Mais tarde ele foi substituído por
uma bela capela ogival.
Desde 1870, as diversas associações reuniram-se num todo que se chama a corporação
cristã. A sua união está fortalecida por instituições económicas que o conselho corporativo
governa.
A prática cristã, desconhecida na fábrica antes das obras, tornou-se na regra geral. Os três
quartos dos trabalhadores da fábrica fazem parte das associações. Na capela da fábrica, há 1.300
comunhões e contudo a liberdade sobre este ponto é absoluta.
A população operária do Val tomou uma fisionomia de honestidade, de doçura, de bom-
tom, que não se encontra em nenhuma outra parte.

653 II. Pessoal. – Os patrões vivem no meio da sua população operária. Eles convidam os
conselheiros à sua mesa em diversas circunstâncias.
Em 1893, o Bom Pai recebia a jantar, durante a semana de tarde, sucessivamente, 28
secções que incluem todos os homens da fábrica.
Conforme a tradição constante na família, o futuro patrão faz a sua aprendizagem na
fábrica e passa em cada um dos serviços sucessivamente.
Ele não abandona um posto senão quando pôde substituir completamente o operário ou o
contramestre por conta do qual trabalha, durante uma ou duas semanas de férias dadas ao titular.

654 Os contramestres e os empregados são escolhidos, tanto quanto possível, nas famílias dos antigos
operários, que assim têm em perspetiva uma certa ascensão profissional.
A autoridade dos contramestres é limitada. Eles não podem empregar, nem despedir, e as multas
que infligem não se tornam definitivas senão depois de um patrão ter aposto a sua assinatura.
As reprimendas parecem preferíveis e não têm o aspeto odioso da retenção sobre o salário.
Também a soma das multas contribuídas cada ano à Sociedade de Socorro mútuo nunca
ultrapassa 20 francos.
O recurso ao patrão está ao alcance de todos sem distinção.
655 O pessoal dos operários da fábrica compreende 610 pessoas, dos quais 400 homens e
rapazes e 210 mulheres e moças.
As escolas nas mãos dos Irmãos das Escolas cristãs e das Irmãs Sevas do Coração de Jesus
(de Saint-Quentin) recebem 355 crianças.
Uma companhia de veteranos foi formada pelos operários que haviam trabalhado mais de
vinte e cinco anos na fábrica. Ela tem o seu conselho, as suas insígnias, as suas festas. Ela
compreende 50 membros. Um deles traz uma decoração da Santa Sé, 8 trazem a decoração tricolor
da medalha de honra do ministério, vários outros receberam diplomas de Reims ou de Paris.
Doze operários têm mais de quarenta anos de serviço na fábrica; 30 têm mais de trinta anos.
A população operária do Val já deu à Igreja padres, religiosos e religiosas. No mês de
Março de 1895, ela contava 14 alunos eclesiásticos.

656 III. Associações fundamentais. – A população operária está repartida como se segue nas
associações:

São Luís de Gonzaga, de 6 a 13 anos 93


Pequeno Círculo, de 13 a 16 anos 34
Homens acima dos 16 anos (Círculo) 313
440
Santa Filomena, meninas de 6 a 11 anos 55
Santos Anjos, de 11 a 15 anos 51
Filhas de Maria, dos 15 ao Matrimónio 132
Santa Ana, mulheres casadas 231
469

Estas associações têm, cada uma, o seu governo autónomo por meio de conselhos
nomeados pelos seus pares. Um certo número de homens não pertence às associações, as quais não
atingem também todas as mulheres nem todas as jovens. O recrutamento faz-se pelo apostolado
mútuo na maior liberdade.

657 IV. Higiene e trabalho. – Os ambientes das fábricas debaixo do teto são altos de 6 metros.
Eles são espaçosos e largamente iluminados.
A aeração é produzida por ventiladores e cada um destes muda 10.000 metros cúbicos de
ar por hora.
Sinais dispostos em cada sala permitem a paragem imediata dos motores em caso de perigo.
As máquinas não começam a trabalhar antes que dois avisos sucessivos tenham prevenido os
trabalhadores. Minuciosas precauções são tomadas para se a evitar quando estiver a correr a
limpeza, etc.
O trabalho começa às 6 horas menos um quarto para terminar às 6 da tarde, com um quarto
de hora de paragem às 8h 30 e uma hora ao meio-dia.

658 V. Salários – A média dos salários dos tecelões ultrapassa 5 francos 50; a média para as
operárias ultrapassa 2 francos.
A fábrica dá trabalho a todos os membros da mesma família, de que resulta uma vantagem
moral para o pai e os filhos, o de viverem juntos na fábrica, e uma vantagem material, a de
acumular salários. Deste patrão, certas famílias recebem cada ano mais de cinco mil francos por
causa do número dos seus membros cujo trabalho está assegurado.
O trabalho não foi interrompido nem durante os motins de 1848, nem durante a guerra de
1870-71.
Nunca conheceu greves.

659 VI. Os subsídios além salário. – Os operários são alojados em casas cómodas e
independentes, cujo aluguer anual varia entre 78 a 110 francos consoante os grupos. O tipo da
cidade Jeanne d’Arc por 110 francos é assim composto: um grande espaço em baixo, para lixívia
e para cave; dois quartos no primeiro andar com sótão por cima; jardim à frente de cada moradia,
cercado de barreiras, com retretes e locais de despejo e para colocação de alguns animais
domésticos; mais longe, uma horta mais extensa.
Em caso de doença, a Sociedade de socorro mútuo dá o direito aos tratamentos do médico
e aos medicamentos para toda a família e a uma indemnização de 1 franco 50 por dia para o
trabalhador. As despesas do funeral estão a cargo da sociedade.
Freiras vigilantes dos doentes fazem curativos ao domicílio; geram uma farmácia para a
fábrica. O médico dá consultas todos os dias, anunciadas nos ambientes da fábrica e fora deles por
sinais convencionais.
Quando a velhice altera as forças e impede continuar o trabalho habitual, encontra-se na
fábrica um trabalho mais ligeiro que permite aos trabalhadores idosos continuarem a ganhar
honradamente a sua vida.
Quando houver incapacidade completa, a Caixa de previdência, formada exclusivamente
pelos patrões, fornece uma pensão tendo em vista as necessidades.

660 VII. Frutificação do salário pela Sociedade cooperativa e suas prerrogativas. – Uma
sociedade cooperativa entrega o pão e as roupas. Ela ganha à volta de 80.000 francos no negócio
por ano, e no último trimestre deu mais de 3.000 francos de lucro, cuja oitava parte somente
pertence aos acionistas e as sete de cada 8 partes aos cooperadores, isto é, aos compradores.
Descontos são feitos sobre outras mercadorias por certos fornecedores, conforme os
contratos feitos com eles.
O benefício corporativo é um dividendo ordinariamente de 5% sobre as compras à
sociedade corporativa. Esse é colocado obrigatoriamente na Caixa de poupança, até que o chefe
de família atinja a idade de cinquenta anos, salvo por decesso ou despedimento da fábrica, nos
quais casos é reembolsado.
Neste sentido, 189 copões representam 15.330 francos.

661 VIII. Salário familiar: Caixa de família. – O salário deve nutrir a família. Ora, há
circunstâncias que se torna necessário um suplemento, seja por motivo do número das crianças em
baixa idade, seja por consequência da morte do chefe de família ou por qualquer outro motivo.
Para chegar a manter o salário familial, os patrões fundaram uma caixa de família, que
fornece os suplementos.
Seria necessário primeiramente determinar a soma necessária à vida.
Na situação particular de instalação no campo, com as hortas e outras vantagens, os patrões
pensaram poder fixar o mínimo indispensável de 4 francos 20 por semana e por cabeça, fazendo
nisso incluir os bebés.
Os patrões apenas, quer dizer, numa palavra, a empresa, tomam este encargo para facilitar
a vida de numerosas famílias.
662 IX. A poupança. – Para facilitar e encorajar a poupança, recebe-se nos gabinetes, durante
o pagamento, as pequenas quantias que o operário queira deixar. Estas quantias incluem um juro
até 5% dentro de certa soma, fixada pelos regulamentos.
As moças que fazem parte da Associação das Filhas de Maria recebem como dote, para
além dos seus depósitos, uma soma igual até ao nível de 100 francos.
A poupança seguiu os progressos morais e religiosos da população. Ela era quase nula no
começo da associação em 1861. Agora ela atingiu uma média de 62.000 francos por ano.
Um inquérito feito permite afirmar seguramente que o conjunto dos 50 operários da
Companhia dos veteranos não possui menos de 225.000 francos em casas, terras, investimentos,
bens móveis e depósitos na caixa de poupança.
É interessante saber que as 42 famílias veteranas tiveram em conjunto 145 filhos.

663 X. A organização operária. – O sindicato misto foi estabelecido em 1885 segundo a lei.
O conselho sindical operário é nomeado por camaradas. Ele tem as reuniões cada semana,
às Terças. O conselho patronal tem as reuniões Segunda-feira. Cada mês há uma reunião do
conselho inteiro.
O conselho da fábrica funciona desde 1885. É composto de um operário de cada secção,
designado pelo conselho sindical operário entre os antigos. Nas suas reuniões quinzenais, ele
estuda com um patrão a higiene e as medidas sanitárias, as precauções para impedir os acidentes,
a formação dos aprendizes, a questão de produção, dos salários e das primas, as queixas que podem
fazer os operários por um motivo qualquer.
Este conselho é um auxiliar precioso para ajudar o patrão no governo da sua fábrica, e um
instrumento moral muito útil para manter o bom espírito, que é facilmente alterado por pequenas
incompreensões, quando não forem liquidadas imediatamente.

664 As conselheiras da oficina cumprem as mesmas funções para as oficinas das senhoras de
que são delegadas.
Sob o ponto de vista religioso, a capela, servida por dois capelães, torna a prática cristã
fácil para todos. Os membros da Ordem Terceira e das associações de piedade exercem o
apostolado à sua volta.
Toda a ação moral está baseada sobre a iniciativa pessoal e a dedicação dos melhores, cuja
influência é o fruto do sacrifício e dos serviços prestados. È o que mantém na população inteira
um espírito de família e de liberdade que é característica particular do Val-des-Bois.

CAPÍTULO XX
EXEMPLO DA AÇÃO PATRONAL
NUMA EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA
665 A comuna de V…, circunscrição de S…, conta 210 habitantes. É um povoado de grande
cultivação. A maioria dos operários vive aí dos trabalhos que lhes proporcionam a larga quinta.
Uns encontram nela trabalho para todo o ano, são os carreteiros, os guardas de bois, os batedores
e os jornaleiros. Os outros não estão ocupados melas exceto de 15 de Maio a 15 de Novembro, isto
é, durante a limpeza e arranque das beterrabas, e nas colheitas. Estes têm um ofício qualquer de
que vivem durante o inverno: vários cortam pedra nas pedreiras para a cidade próxima.

666 Duas gerações de patrões cristãos mantiveram neste povo o bom espírito e o amor ao
trabalho. Aí não se encontra mendigos. O último recenseamento constatou um acréscimo de
população da ordem de 32 habitantes. Conta-se aí 54 nascimentos para 35 óbitos. O alcoolismo e
o deboche são quase desconhecidos no local. O repouso do Domingo é respeitado na quinta. A
imprensa parisiense não está presente em V… senão por 5 números quotidianos do Petit Journal.
O La Croix do departamento envia para aí 30 números cada Domingo. Também é verdade que os
patrões se encarregam da metade dos custos da assinatura.

667 A exploração de V… dá aos trabalhadores salários remuneradores, que se encontram ainda


acrescidos por diversas instituições económicas.
Os trabalhadores são alojados em casas sadias e limpas pertencendo ao dono da quinta. Os
que não são alojados recebem uma indemnização de alojamento.
Uma gratificação favorece a permanência dos trabalhadores na exploração. Eles recebem
a este título 25 francos no primeiro ano, 50 francos no segundo, 75 francos no terceiro e 100 francos
para os anos que se seguem.
Cada família trabalhadora tem o uso de uma pequena horta de 3 ou 4 ares, que lhe permite
a cultura das batatas e de alguns cereais ou forragens necessárias para o alimento de um porco e
de algumas aves e coelhos.
Este campo é trabalhado e as colheitas são proventos, na maior parte das vezes, junto com
os animais e os instrumentos do patrão.

668 O trabalhador não se alimenta na exploração, mas tem direito cada dia à refeição do meio-
dia, à quantidade de caldo necessário para ele e sua família, por vezes numerosa.
Através de uma convenção entre o patrão e o padeiro, os trabalhadores pagam o seu pão a
0 francos 03 a menos ao quilo do que no curso corrente.
O patrão faz vir o carvão por vagões e entrega aos trabalhadores ao preço do grosso, o que
lhes possibilita uma melhoria de 10 francos por 1.000 quilos.
Os dias de doença, devidamente constatada, são pagos ao trabalhador sem retenção.
Graças a estas diversas vantagens, o salário de uma família do trabalhador varia entre 1.700
a 2.000 francos. Também os operários permanecem por muito tempo em V… e vários são
laureados pelo Comité agrícola.
Os patrões estão em boas relações com o presbitério. Dão o exemplo de prática religiosa.
Interessam-se pelas crianças, pelo catecismo, pelas escolas. Visitam os doentes.
Apesar disso, nem tudo é perfeito em V… A prática religiosa ainda deixa muito a desejar.
Fazem falta as associações. Os patrões reconheceram-no. Eles intentam organizá-las e reuni-las
em corporação.
CAPÍTULO XXI
MONOGRAFIA: CONFRARIA, SINDICATO
E CAIXA DE CRÉDITO
NUMA PARÓQUIA RURAL DE SAÔNE-ET-LOIRE
669 Em P…, graças ao zelo ardente do pároco, as obras sociais já tomaram um
desenvolvimento quase completo.
Temos correspondido com o pároco de P… Nós lhe pedimos a exposição do seu método e
das suas obras. Ele correspondeu ao nosso desejo. Vamos dar extratos das suas cartas. Os nossos
leitores não perderão com isso. Sente-se bater, sob este estilo quente quão simples, um coração de
apóstolo.
«Principiei, diz-nos, em Tournus, a me ocupar de um Círculo católico, fundado pelo
concurso de uma dezena de cantores, que tinha cultivado durante dois longos Invernos.
Em P… fiz o mesmo. Para que se possa fazer um bem sólido e sério, deve-se progredir aos
poucos. Quer-se às vezes correr, faz-se pressão, depois desencoraja-se, ou então ajunta-se
multidões que, ao desabarem, vos esmagam.
É tão simples e natural para um padre fazer entrar na cabeça de 5 ou seis fiéis as ideias
que ele mesmo tem e com estes homens formados lentamente, exercer uma ação eficaz.
Por que é que se não toma por modelo a Nosso Senhor Jesus Cristo? É tão simples e tão
fácil ter em mão uns tantos prosélitos. Nunca faltam os males aos quais é preciso remediar, nem
os meios para os curar. O indispensável é ter uma ideia e 3 ou 4 homens para a fazer valer».

670 Vê-se já por este preâmbulo que o pároco de P… é um discípulo do Padre Garnier. Ele
conhece o seu método e o aplica.
Justamente, ele acabava de fazer uma narração das suas obras para o padre Garnier. Ele a
copiara simplesmente. Trata-se de um documento muito interessante porque nos mostra o método
do padre Garnier, aplicado por um apóstolo que sabe tirar do mesmo uma grande vantagem. O
pároco de P… e o padre Garnier perdoar-nos-ão o fato de entregar ao público a carta que revela o
seu zelo. É para o bem geral. Ei-la aqui:

Carta para o senhor padre Garnier


7 de Junho de 1893

671 «Senhor padre,


Haveis-me honrado por me pedirdes uma monografia das obras de P…: Comité, reuniões,
missa mensal, etc.
Para mim é um dever responder ao vosso desejo, pois é graças às vossas lições que começo
a recolher alguns frutos que serão a consolação de qualquer padre que seguir as vossas
instruções. Sei que queríeis ter cem vozes para dar um pouco de confiança ao clero paroquial
desencorajado. Desejo a todos os que vos leem ou vos ouvem de tentarem fazer a experiência de
modo esforçado.

672 Eis que há dezassete anos que fui nomeado pároco da paróquia onde ainda me encontro
e que não conta 800 almas. A situação não era brilhante. Tive durante cinco meses, de celebrar
apenas Missas breves, por falta de tenor, 8 ou 10 homens em média assistiam com umas sessenta
mulheres. Na Páscoa, o pároco deveria considerar-se feliz ao dar a santa comunhão a 6 ou 7
homens. A gente não se inibia de fazer prestações públicas ao Domingo; por exemplo, no dia de
Pentecostes, via-se mais de 20 carroças transportando terra. Enfim, o conselho municipal pagava
ao tenor para que não cantasse na igreja.
673 Era preciso saber se orientar. Durante três anos, solicitei alguns homens para que me
prestassem o seu concurso, seja para o canto, seja para uma ação social qualquer. Quis ter
homens de confiança, para me ajudarem, primeiramente a suportar a minha triste situação, e a
seguir para puder superá-la. Como pensava, um padre que não deseja bandear-se com o mal e
cruzar os braços, deve começar por aí. A nossa ação direta sobre o conjunto será sempre
entravada e contrabalançada por mil preconceitos e sentimentos de desconfiança. Não podemos
ter melhor mestre que Nosso Senhor Jesus Cristo, de quem retraçais o método exato nos vossos
opúsculos.
Estes homens foram duros a impedir-me a paz. Eles me respondiam como acontece por
todo o lado. «Não há nada a fazer; desde há muito que se conhece o povoado». Não me cansava
de lhes repetir: “é impossível que 3 ou 4 homens com convicção, que têm a verdade e o bom senso
do seu lado, não consigam ganhar terreno se se entenderem entre si”.

674 Enfim, tinha conseguido agrupar 4 ou 5 para exercícios de canto, e 8 a 10 para reuniões
familiares na véspera do Domingo no presbitério, quando li no La Croix de Paris (jornal modesto
mas que muito contribuiu para os destinos da França) a explicação pormenorizada do vosso
método. Era precisamente o que procurava. Feliz com esta descoberta, comuniquei aos meus
homens, em duas tardes, nos intervalos dos cantos, esta bela teoria, pedindo-lhes que me
dissessem o que pensavam. Um pouco por favor, eles responderam-me que se poderia
experimentar.
Estávamos no Outono de 1890. Tratava-se de operar um primeiro grupo de todos os
homens que dariam os seus nomes a uma liga de oração, na qual se pediria uma simples Ave-
Maria por dia. Os meus apóstolos noviços propuseram-no na sua vizinhança, e numa quinzena
recrutaram 30 aderentes. Tinha-lhes custado, e felicitei-os pelo resultado. Tratava-se depois de
ganhar vantagem a partir deste primeiro grupo. Organizou-se uma conferência onde todos foram
convidados. Temia-se um insucesso completo. Eles vieram quase todos. O comité ou o conselho
foi organizado e composto por 8 homens de boa vontade.

675 Encorajados por este primeiro sucesso, continuaram a sua propaganda com mais energia.
Tiveram de lutar bastante. Era preciso levantar a sua moral de tempos a tempos. Enfim, cinco
conferências foram dadas neste mesmo Inverno. O número dos auditores ia sempre crescente. Há
quinta já eram 70.
Os sujeitos tratados nestas conferências foram: a decadência moral, material e religiosa
da França, segundo as estatísticas; depois a necessidade, para as pessoas honestas, de se
ocuparem dos interesses públicos, uma sociedade dirigida por sectários ímpios e franco-mações
não pode prosperar.
Tínhamos anunciado para o Inverno seguinte, a fundação de uma confraria de assistência
mútua. Havia necessariamente uma seleção a fazer entre o primeiro grupo, onde se tinha reunido
no fim do Inverno 80 membros. Admitir-se-ia na conferência todos os membros que aceitariam
assistir à missa mensal, e a confraria devia servir de base a um sindicato agrícola, a um banco
popular. Quereríamos formar uma associação sem nela introduzir elementos de dissolução pela
divergência de sentimentos. Duas coisas foram-me de grande ajuda, a vossa passagem em
Tournus e o concurso do meu castelão, excelente cristão.

676 Durante o Inverno seguinte houve a retomada das reuniões e das conferências. Devo dizer
que no fim do primeiro Inverno, ao sair da última conferência, um dos assistentes disse-me:
«Senhor padre, estávamos contentes de nos reunirmos neste Inverno, será preciso esperar até ao
próximo Inverno sem se ver? Que se comece um círculo como em Tournus!». Vários membros
eram da mesma opinião. Procura-se e encontra-se um lugar semelhante ao das conferências.
Pôde-se buscar algumas cadeiras, tábuas, e o círculo funcionou sem falar de si. Deu-se
informações sobre os regulamentos dos círculos católicos de operários, dos quais se fez o melhor
seguimento possível, e para a Festa de Natal, 19 membros foram recebidos segundo as formas.
Doze de entre eles tinham comungado na Missa do galo.

677 Na última festa de Natal, recebemos 10 novos membros. Na Primavera do ano 1892, a
confraria era fundada, sob o nome de Santo Isidro, com 32 membros; e pouco depois organizámos
o banco popular e o sindicato, dos quais só os membros da confraria podem aproveitar. Estas
duas instituições começam a ser apreciadas a sério.
Graças a este movimento, existe um regresso notável, embora ainda não generalizado, às
práticas religiosas. O cultivador e o trabalhador não têm falta de bom senso, quando vêm um
padre se devotar aos seus interesses, e seus preconceitos contra a religião caiem por si. A
frequente relação com o padre depressa faz o resto e provoca conversões sólidas. Os membros do
conselho seriam até mais severos do que eu para a admissão de novos membros e para a
observância dos regulamentos religiosos.

678 Em suma, já por dois anos tive a satisfação de ver uma trintena de homens se aproximar
da santa mesa. A assistência à missa aumentou para um quarto do conjunto, e para os homens
triplicou. Todos os meses, temos a nossa missa mensal: 40 homens, ao menos participam nela.
Depois da missa, há a reunião do sindicato para tratar das compras e das vendas.
A confraria e, por consequência, o sindicato e a banca popular contam atualmente uma
cinquentena de membros. Cada conselho se reúne uma vez por mês.
Há cinco ou seis anos, tínhamos podido, graças a certas diligências e solicitações
pessoais, obter extraordinariamente 20 homens na procissão do Corpus-Christi. Este ano, contou-
se com mais de 60. É encorajador e tal nos dá ânimo e energia. O sujeito está em andamento
atualmente, o mais difícil está feito.

679 Devo acrescentar que, no princípio, tive muita dificuldade a formar os conselhos de cada
associação e a fazer aceitar a sua autoridade. Parecia que não se quisesse suportar a direção dos
seus iguais. Pouco a pouco, pela nossa organização, voltou-se aos princípios da hierarquia e da
autoridade, aceitando uma direção paternal em vista do bem. Os pais de família, ao se
concertarem, serão mais fortes para fazerem respeitar a sua autoridade e cumprirem os deveres
preparando um grande número de reformas. Mas é preciso fazer passar o tempo e não fazer força
sobre ninguém.
Ah! Se todos os padres quisessem experimentar! Há em França 40.000 padres. Como as
seitas maçónicas ficariam depressa esmagadas!
Vai-se chegar aí, tenho confiança. O clero começa a compreender. Vós ajudais de modo
poderoso a vulgarizar estas ideias. Rezo a Deus para que abençoe os vossos esforços».
A esta exposição do senhor padre de P…, parece-nos útil, para a edificação dos nossos
leitores, de também ajuntar algumas informações sobre a confraria, o sindicato e a banca popular
que ele fundou. Demos em primeiro lugar os regulamentos da Confraria de Santo Isidoro.

Confraria de Santo Isidoro - Regulamento


680 Nós, os lavradores, cultivadores de P…, querendo imitar o exemplo que nos deram os
séculos cristãos, reunimo-nos em confraria, para nos entreajudar, para honrar a útil e nobre
profissão dos nossos pais, para manter a religião católica que, para a infelicidade dos tempos, está
ameaçada e atacada por toda a parte neste país da França e enfim para nos conformar ao desejo do
nosso Santo-Padre o Papa que recomenda estas associações. Adotámos as regras seguintes: 66
Artigo 1º. – O número dos confrades de Santo Isidro é ilimitado. Cada um pode ser aí
admitido, se respeitar as condições seguintes.
Artigo 2. – Todo o candidato deve oferecer a garantia de uma probidade reconhecida e da
estima geral.
Artigo 3. – Não será admitido se qualquer acusação grave e justificada pesa sobre ele.
Artigo 4. – Se a acusação fundada for posterior à admissão, será excluído.

681 Artigo 5. – Os confrades comprometem-se a viver como bons cristãos e a participar na


Missa aos Domingos e festas; a não trabalhar ao Domingo, salvo em caso de força maior; a se
abster de toda a blasfémia e de juramento, e a velar a que os seus filhos e servos observem este
preceito.
Farão, ao menos à noitinha, a oração em comum na família.
Artigo 6. – Os confrades prestarão serviço uns aos outros em toda a ocasião. Eles visitar-
se-ão na doença. Se um deles tiver um dos seus animais domésticos doente, um confrade prestar-
lhe-á um equipamento, se for possível. Não será pago nenhum salário por este concurso fraterno.
Artigo 7. – Na ocasião do funeral dum confrade, todos participarão dele, sob pena de 0
francos 50 de multa, a menos de haver desculpa válida. Durante o ano serão celebradas duas missas
pelo defunto, pagas pela confraria.

682 Artigo 8. – A confraria reunir-se-á em assembleia geral todos os anos, no Domingo que
precede a Festa de Santo Isidro.
A essa reunião, depois da oração e da chamada dos nomes, ouvir-se-á o relatório da
contabilidade pelo tesoureiro e as observações do presidente, e votar-se-á, por meio de boletim
secreto, para a admissão de novos candidatos. O direito fixo de admissão é de 3 francos 50, a
cotização anual de 1 franco 20.
Os confrades gozam de um desconto de 2/5 sobre as suas despesas no médico e no
farmacêutico a saber 1/5 concedido pelos médicos e farmacêuticos e 1/5 pago pela confraria.
A assembleia geral reelege o gabinete que compreende um presidente, um secretário e um
tesoureiro. Eles são reelegíveis.
______________________________________
66
Abreviámos um pouco.

O presidente está encarregado de manter o regulamento. Ele recebe as reclamações e dá-as


a conhecer na assembleia geral.
O secretário convoca às reuniões, aos enterros, à Missa da Festa patronal e ao banquete,
que deverá fazer preparar.
O tesoureiro recebe as quotas, provê às despesas e apresenta as suas contas à assembleia.
O lucro é emprestado por um ano e em leilão a um confrade que fornece caução consentida pela
assembleia.
683 Artigo 9. – Todos os anos, no dia de Santo Isidro, será celebrada uma Missa solene com
bênção do pão e todos os confrades participarão nela sob pena de multa de 0 francos 50.
Artigo 10. – Um banquete em comum reuni-los-á a todos nesse dia.
Artigo 11. – À confraria ficará anexa um seguro mútuo para proteção da mortalidade no
gado.
Artigo 12. – Também se vai ajuntar a essas, uma caixa de crédito e um sindicato, e todas
as instituições que serão julgadas apropriadas.

Algumas notas sobre o sindicato de P…


684 Ele foi fundado em Outubro de 1892, depois de vários meses de negociações com a
prefeitura (este inconveniente pode ser evitado com estatutos bem redigidos).
Um sindicato, tentado antes em P…, sem base cristã, tinha dado à costa.
O sindicato fez durante dezoito meses, negócios montando a 5.350 francos, dos quais 3.000
francos nos últimos seis meses. As compras em comum consistiram em algodão do Egipto, carvão,
adubo, milho, petróleo, arroz, sebo e sabão. Além disso, para as farinhas e o vinho, os membros
do sindicato dirigiram-se diretamente a fornecedores que tinham consentido uma redução em seu
favor.

Notas sobre o banco popular


685 A banca de P… não adotou o regulamento dos bancos Durand-Raffeisen, porque a
solidariedade atemorizava os seus membros. Ela recebe depósitos ou ações de 50 francos a 3
francos 50%; e faz empréstimos por frações de 50 francos a 4%. Ela emprestou 1.000 francos em
dois anos.
Deve-se ainda assinalar a radiação destas obras de P… Elas tornam-se um modelo, um
encorajamento, um estimulante para os povoados circundantes.
Esta paróquia torna-se um centro de ação. No mês de Novembro último, uma conferência
reunia aí 80 pessoas das paróquias vizinhas. Expunha-se-lhes as vantagens dos sindicatos cristãos
e a sua diferença dos outros, que têm uma grande má fama. Os sindicatos, animados do espírito
socialista, são um agrupamento de forças brutais: eles pressionam os operários à revolta, à
insubordinação, à greve. Constituiu-se igualmente sindicatos de negócios. Eles elanguesceram
longamente por falta de dedicação e porque não tinham por base um princípio poderoso como o
da fraternidade cristã.

686 Nós queremos sindicatos cristãos que sejam corporações de hoje e que façam como uma
só família moral de uma inteira população, pela similitude de interesses, pela dedicação dos mais
inteligentes e dos mais afortunados, e pelos bons processos, pela deferência da parte dos mais
modestos.
O progresso, como número, será mais lento nestas condições, com um regulamento
inspirado pelo pensamento cristão, mas o sindicato será mais estável, e depois de um período de
formação mais longo e mais penível, o progresso tornar-se-á mais rápido.
Cada grupo paroquial presente à conferência de P… comprometeu-se a se reunir uma ou
duas vezes por ano, a se pôr ao corrente da organização das obras, a recrutar aderentes.
Uma segunda conferência acabará por levar à decisão os habitantes e cedo o sindicato de
P… será o pai de outros dez.
CAPÍTULO XXII
MONOGRAFIA: SINDICATO E OBRAS CONEXAS
NUMA PARÓQUIA RURAL DO ALTO-MARNE

687 O pároco de A… está encarregado de duas paróquias rurais, que contam no conjunto 260
habitantes e de um lugarejo de 80 habitantes afastado de 1.500 metros.
Os começos do seu ministério foram bastante mortificantes. Prevenidos contra a sua
atividade, que temiam, os presidentes de ambas as comunas, tendo sabido da sua nomeação,
haviam feito diligências para o afastar; as mulheres tê-lo-iam recebido de preferência com
vergastas do que com flores.
Não obstante ele instalou-se, mas fez-se um vazio à sua volta. As poucas pessoas da
localidade que passavam por católicas, em vez de lhe vir em ajuda, causaram-lhe pelo contrário
desgostos, porque ele não queria sujeitar-se às suas diretivas. Quanto aos professores, ao médico,
ao veterinário, ao juiz, eram-lhe abertamente hostis.

688 Não podendo abordar diretamente a população, ele serviu-se do jornal La Croix, ao qual
acrescentou o Laboureur, a Vida dos Santos e alguns Pèlerins. Ele conseguiu apaziguar, deste
modo, um pouco de cada vez, os sentimentos de hostilidade e as pessoas começaram a aproximar-
se dele.
O catecismo era pouco seguido. Isso advinha de que era dado a horas não convenientes;
agora, já não se tem a deplorar qualquer ausência.
O pároco de A… insiste sobre a necessidade de uma sala de obras. Deveria haver tal um
pouco por todo o lado, já que é uma condição quase indispensável do bem que se poderá
empreender. Para se a encontrar, ele serviu-se de um hangar do presbitério, com a permissão do
presidente da câmara. Ele o transformou, pondo-se pessoalmente no trabalho, pois manuseia
alternadamente a plaina e a Suma teológica de São Tomás.
Ele pôs-lhe modestamente o nome de «sala de catecismo», a fim de não fazer sombra à
administração estatal.

689 Ele aí reúne as crianças às Quintas, e ocupa-as com lições de História santa, de canto, de
cerimónias, de leitura de latim, alternando-as com os jogos. Prepara-se outrossim certas cenas
dramáticas.
O ascendente que ele exercia sobre as crianças valeu-lhe em breve a confiança das pessoas
mais velhas. Ele julgou, então, poder ir em ajuda dos jovens domésticos das quintas. Estes jovens
infelizes passavam as noites frequentemente a fazer barulho nas ruas; os patrões julgavam que o
seu lugar fosse no estábulo e não no cabaret. Ele conseguiu atrair alguns que reuniu três vezes,
depois quatro vezes por semana. Assim, ele os impediu de gastar inutilmente o seu dinheiro.
A sala era o local designado com naturalidade para os receber. Ela é aquecida, iluminada,
contém uma biblioteca e jogos.

690 Durante algum tempo, estes jovens foram o objeto de certas altercações, mas pouco a
pouco a calma se restabeleceu. Cada tardinha acabava com uma oração breve pelas almas do
purgatório. Várias vezes no ano representava-se algumas peças de teatro que obtinham o maior
sucesso.
Em várias ocasiões, homens atraídos pela curiosidade, vinham às reuniões mudar de ares.
O pároco aproveitou esse fato para arriscar a fundação de um sindicato. Ele anunciou uma
conferência que seria dada por um padre, muito em voga. Vieram pessoas numerosas a essa. Todo
o auditório foi atingido e cativado e o sindicato acabou por ser fundado.
No ano passado, depois do congresso do Val-des-Bois, ele criou um círculo de estudos
sociais. O anúncio foi feito na igreja no dia de Todos-os-Santos. Na semana que se seguiu, oito
homens vieram inscrever-se. Desde então o seu número aumentou.
691 O pároco preparava do próprio punho as questões ou convidava conferencistas da cidade.
O programa destes modestos economistas de aldeia poderia servir de modelo a reuniões
mais doutas.
Eis os sujeitos que foram tratados:
Sobre a propriedade: a sua verdadeira noção.
Propriedade privada e socialismo.
Sobre o direito à herança.
A home-stead e a estabilidade do pequeno domínio rural.
Os Papas e os camponeses.
A renda agrária e as relações do proprietário e do cultivador.
O salário e as questões que se lhe referem.
As relações dos donos e dos domésticos.
O estado atual da agricultura, os seus padecimentos.
Estudo da instalação de uma casa de lavrador: planos e orçamentos.
Noções de química agrícola.
Os impostos que pesam sobre a agricultura: impostos diretos, direitos de mutação.
O absenteísmo.
Sobre a representação da agricultura.
Acerca do comércio e dos privilégios de que goza: as tarifas de penetração.
A agiotagem, a especulação sobre os produtos agrícolas.
O judaísmo.
As leis eleitorais, as leis escolares.
O ensino profissional: escolas familiares, escolas agrícolas, etc…

692 Apesar do sindicato, mau grado o círculo de estudos, o pároco ainda não tinha conquistado
plenamente a confiança dos seus paroquianos. O estabelecimento de uma caixa rural fez cair as
últimas barreiras. O pároco tinha-lhes provado que conhecia os seus interesses, que adivinhava as
suas dívidas. Ele fez-lhes compreender que não poderia ajudar-lhes convenientemente se eles não
lhe fornecessem as informações de que precisava, para lhes ensinar a gerir bem as suas contas. Ele
deu-lhes o modelo de um quadro de receitas e de despesas, que lhes deixou para que se ocupassem
em preenchê-lo. Na semana seguinte, foi-lhe entregue sem a menor hesitação.
O funcionamento da caixa rural tornava-se fácil. Ela dá bons resultados. Os que a geram
ganham uma influência eminente na paróquia de que se tornam os apóstolos.

693 Uma confraria de Nossa Senhora dos Campos cimenta as associações. Ela tem 100
aderentes na pequena paróquia.
O sindicato organizou uma cooperativa e já faz, desde há um ano, 120.000 francos de
negócios.
Que magníficos resultados! Não serão eles bem encorajadores para os homens de boa
vontade?
Para ser leal, deve-se acrescentar que as obras ainda não converteram toda a pequena
paróquia. Conta-se nela todavia alguns homens a mais que anteriormente na comunhão pascal.
Sobre 250 habitantes, a metade dos homens, seja à volta de 80, vão à missa, 45 cumprem
o dever pascal. Uma dúzia comunga pelo Natal; alguns fazem a adoração perpétua, na Assunção e
na Festa de Todos-os-Santos.
694 Ao nos entregar estes números, o pároco acrescentava: «Bendigo a Deus por este
resultado, embora seja incompleto. Não creio me enganar se pensar que, sem as obras, teria
perdido um terço dos meus fiéis à missa e aos deveres pascais, desde há dez anos. È o que
aconteceu em muitas paróquias da região. As práticas cristãs diminuíram. Organizou-se uma
oposição surda e hipócrita. A influência maçónica faz-se sentir através da política e da imprensa
até à zona rural. Ao respeito religioso que envolvia o sacerdote sucedeu um sorriso de compaixão.
A minha situação, graças às obras, é bem melhor. Não me resta apenas algumas ovelhas tímidas,
alguns velhos inativos. Tenho um grupo de homens em toda a força do termo e trabalho a fim de
lhes tornar capazes de formar uma comuna cristã.

695 Eu estudo com eles as questões da agricultura e da administração comunal. Ponho à sua
disposição manuais do presidente da câmara, do secretário da comuna, do veterinário, do
trabalhador, do jardineiro, etc. É preciso que sejam suficientes quanto possível e que sejam aptos
a tudo o que a divina Providência deles pode pedir.
Com isso, não faço uma obra estranha ao nosso ministério, pois é preparar o reino social
de Jesus Cristo e é a missão do padre».

Eis aí o ministério como o entende Leão XIII e como sempre o entendeu a Igreja antes do
galicanismo. É assim que se deve agir por todo o lado.
Que Deus nos venha em ajuda! Com o concurso das associações e a prática da verdadeira
pastoral cristã, cedo restabeleceremos o reino de Jesus Cristo na nossa cara pátria.

APÊNDICE I
FORMALIDADES ADMINISTRATIVAS
RESPEITANTES AOS SINDICATOS

696 Quando o presidente da Câmara der o recibo do depósito dos dois exemplares dos
estatutos, ele pode fazê-lo da seguinte forma:
Eu que assinei no fim, presidente da Câmara da Comuna de……….declaro ter recebido o
depósito dos dois exemplares dos estatutos do sindicato…………. de ………tendo a sua sede na
minha comuna.
Em razão do qual entreguei este recibo.
Feito em………. No dia …… do mês de ….. 189..

(Sêlo da Câmara)
O PRESIDENTE DA CÂMARA
Assinatura:

Depois, conforme à circular do ministro do Interior de 25 de Agosto de 1884, o presidente


da câmara é obrigado a ter na Câmara um registo especial onde será mencionado, na respetiva
data, o depósito dos estatutos do sindicato, os nomes dos administradores, a entrega do recibo. Este
registo dará reparo do cumprimento das formalidades; e permitirá arremediar a possível perda do
recibo do depósito.
A seguir, o presidente da Câmara (artigo 4 da lei de 21 de Março de 1884, circular
ministerial do 25 de Agosto de 1884) deve enviar um exemplar dos estatutos ao procurador da
República da sua circunscrição e o outro ao prefeito ou subprefeito. No caso de mudança nos
estatutos ou na administração do sindicato, um novo depósito dos estatutos é obrigatório (Lei de
21 de Março de 1884, artigo 4).

APÊNDICE II
ACERCA DOS SINDICATOS DA INDÚSTRIA AGRÍCOLA
697 Se bem que os estatutos dados na página 189 possam ser adotados, seja por um sindicato
agrícola e hortícola simples, seja por um sindicato ao qual seria anexada uma caixa rural ou uma
instituição para a compra comum e o aluguer aos membros da sociedade de máquinas agrícolas,
cremos útil de dar aqui o modelo do estatuto de um sindicato agrícola que encontramos numa
brochura interessante: As máquinas agrícolas ao alcance de todos, do senhor padre Fontan.
Com efeito, para que um sindicato profissional seja verdadeiramente útil, é preciso que os
associados encontrem nele todas as facilidades possíveis.
Para que serviria a segurança na qualidade e o preço acessível dos adubos, os utensílios,
matérias-primas, etc., se o sindicalizado não puder encontrar um meio económico de encontrar o
dinheiro necessário? É o papel que desempenha a caixa rural e operária.

698 De mais a mais, certos instrumentos são custosos, não são de um uso contínuo e podem
servir a vários cultivadores. A associação, para ser completa e eficaz, deve pois procurá-los para
depois os alugar aos seus membros. É então que esta associação, anexa ao sindicato, intervém com
utilidade.
Nalgumas localidades, irá preferir-se fundar primeiramente uma caixa rural, para chegar a
seguir, ao sindicato; alhures, ao contrário, o sindicato conduzirá à fundação da caixa rural. Um não
caminha sem a outra; e pouco importa de começar um em vez do outro, desde que resulte bem.
Cada um, tendo em conta a situação e o espírito local, irá agir segundo as circunstâncias e conforme
o que for melhor aos interessados ou à urgência das necessidades. Todavia os fundadores dos
sindicatos que quereriam anexar ao seu sindicato comunal uma caixa rural farão bem completar,
um com o outro, os dois modelos dos estatutos que damos e nos quais tentou-se prever todas as
dificuldades que se poderiam apresentar.

PROJETOS DE ESTATUTOS DO SINDICATO DE INDÚSTRIA AGRÍCOLA


DA COMUNA DE………………

Organização do Sindicato
699 Artigo primeiro. – Ele é formado, pelos sobescritos e os que irão aderir aos presentes
estatutos, uma associação profissional agrícola ou sindicato, que será regido pela lei do 21 de
Março de 1884 e pelas disposições seguintes:
Artigo 2. – A associação toma o nome de Sindicato da indústria agrícola, a sua sede está
sitiada em…….., a sua duração é ilimitada, tal como o número dos seus membros. Ela principiará
no dia do depósito legal dos estatutos.

Finalidade do Sindicato
Artigo 3. – O sindicato tem por finalidade a compra de máquinas agrícolas para o uso
exclusivo de seus membros.

Composição do sindicato
700 Artigo 4. – Apenas podem fazer parte do sindicato da comuna de…………. as pessoas
maiores em posse dos seus direitos cívicos, que podem justificar do ponto da sua qualidade de
membro de sindicato agrícola dos Pireneus cuja sede está em Tarbes, praça Marcadieu, nº 19 e
21.67
Artigo 5. – Os novos membros devem ser agregados pelo conselho de administração e
aceitar todas as obrigações resultantes dos presentes estatutos.
Artigo 6. – Perde-se a qualidade de sindicalizado por óbito, demissão, exclusão, e pela
cessação das condições requeridas para estar sindicalizado. O conselho de administração pode, por
razões graves de que só ele é juiz, pronunciar a exclusão de um membro.
Compra e aluguer das máquinas
701 Artigo 7. – Os capitais necessários para a compra das máquinas são pedidos por
empréstimo pelo sindicato à caixa rural de …………, da qual deve ser membro. O conselho de
administração é, por conseguinte, autorizado a pedir a admissão do sindicato à caixa rural da tal
comuna.
Artigo 8. – Os sindicalizados comprometem-se a dar à caixa rural o seu acordo solidário,
garantindo o reembolso das somas que o sindicato pediria emprestado à caixa rural nos limites
estabelecidos pela assembleia geral.
Artigo 9. – Cada membro do sindicato que alugará as máquinas pagará ao sindicato uma
quantia representando as despesas de aluguer conforme uma tabela que será estabelecida cada ano
pelo conselho da administração.

702 Artigo 10.- As receitas brutas do sindicato serão empregues:


1º.No pagamento da prima de seguros contra incêndios e acidentes, se calhar bem;
2º.No pagamento das reparações e despesas da manutenção das máquinas;
3º.No ordenado dos empregados e operários do sindicato;
4º.No pagamento dos lucros, dos empréstimos e na amortização destes empréstimos.

703 Artigo 11. – Os excessos das receitas, quando os empréstimos terão sido amortizados,
serão empregues para constituir um fundo de reserva que permitirá ao sindicato de aumentar o
número das suas máquinas e de as substituir quando ficarem fora de uso. Este fundo de reserva
será depositado na caixa rural à medida que for realizado.
Artigo 12. – Os membros excluídos ou demissionários não podem intervir de maneira
nenhuma na administração do sindicato, fazer imprimir os selos, nem proceder a quaisquer outras
medidas, seja lá de que natureza for. Perderam todo o direito sobre o património do sindicato, e
não podem reclamar nenhuma parte das reservas ou do material das máquinas pertencentes à
associação sindical.

A administração do sindicato
704 Artigo 13. – O sindicato é administrado por um conselho administrativo de…….. membros
eleitos pela assembleia geral por nove anos. Ele é renovável num terço, todos os três anos. Os
membros são sempre reelegíveis e suas funções são inteiramente gratuitas.
___________________________________________________
67
Esta última condição é particular ao sindicato de que fala o senhor Fontan. O importante é que o membro
da sociedade se encontre bem nas condições profissionais queridas pela lei.

(Coloca-se neste lugar a lista dos administradores do sindicato).


Os administradores são todos franceses e gozam dos seus direitos civis.
Artigo 14. – O conselho de administração elege no seu seio um presidente, um secretário e
um tesoureiro. Todo o ato respeitante ao sindicato deve trazer a assinatura do presidente e de um
outro membro do conselho de administração. O conselho de administração pode nomear debaixo
da sua responsabilidade um gerente, mesmo sem ser membro do sindicato.
705 Artigo 15. – O conselho de administração tem todos os poderes que não sejam reservados
à assembleia geral pelos estatutos: ele pode pedir emprestado por conta do sindicato, nos limites
fixados pela assembleia geral. Ele passa os contratos de seguro, estabelece o regulamento interior
do sindicato, nomeia e destitui os empregados, determina os seus salários, fixa o preço do aluguer
das máquinas, compra o material, vigia a manutenção e as reparações, determina a ordem na qual
serão atendidos os membros do sindicato, recebe as suas reclamações, pode transigir, atribuir
indemnizações, comprometer-se, etc., etc.
Artigo 16. – O conselho de administração monta o balanço e apronta as contas do sindicato
a 31 de Dezembro de cada ano. Balanço e contas devem estar à disposição de todo os membros do
sindicato na sede do Sindicato desde o primeiro de Fevereiro.

706 Artigo 17. – A assembleia geral ordinária do sindicato deve acontecer no segundo
Domingo de Fevereiro de cada ano. Ela examinará as contas do ano transato e fixará o máximo de
empréstimos que o conselho de administração será autorizado a contratar durante o exercício
seguinte. A assembleia geral é convocada por…………… (escrever aqui a maneira como será
dado o seu anúncio), ao menos oito dias antes da reunião.
Uma assembleia geral extraordinária pode ser reunida todas as vezes que o conselho de
administração o julgar necessário.
Artigo 18. – A assembleia geral delibera validamente não importa quantos forem os
membros presentes, salvo o caso em que ela tiver de deliberar sobre alguma modificação dos
estatutos ou a sua dissolução. Nesses casos, ela não pode deliberar salvo se a maioria dos membros
estiverem presentes, senão terá de ser convocada uma segunda assembleia geral, que delibere
validamente quaisquer que forem os membros presentes.
A assembleia geral, em nenhum caso, poderá modificar os artigos 19, 20 e 21 dos estatutos
presentes.

Dissolução do sindicato
707 Artigo 19. – Em caso de dissolução do sindicato, o material será vendido, e o preço será
vertido, tal como o fundo de reserva, à caixa rural da comuna de……….., que formara uma reserva
especial cujos lucros serão adquiridos pela dita caixa, e que será empregada na fundação de um
sindicato análogo, desde que se fará sentir a sua necessidade. Em nenhum caso todavia estes fundos
poderão ser repartidos entre os membros do sindicato.
Artigo 20. – Em caso de dissolução da caixa rural, antes da reconstituição de um novo
sindicato, a assembleia geral que pronunciará a dissolução da caixa decidirá validamente sobre a
atribuição desta reserva especial para uma obra de utilidade geral como da sua reserva própria.
Artigo 21. – Qualquer que seja a maioria que se pronuncie pela dissolução do sindicato,
um grupo de membros do sindicato de pelo menos quatro terá sempre o direito de declarar que
entende continuar o sindicato a seus riscos e perigos: neste caso, o fundo de reserva e o material
seriam abandonados a este grupo que continuaria o sindicato conforme aos estatutos presentes, os
outros sindicalizados guardariam só o direito de dar a sua demissão conforme às disposições dos
presentes estatutos.

Visto e certificado em………………… no……………….. (por extenso)

O presidente sindical O secretário


_______________________________________________

NOTA. – Encontrar-se-á diversos modelos de «regulamento interno», como a indicação das


formalidades a preencher para a inscrição do sindicato como membro da caixa rural na brochura
do senhor Fontan: as máquinas agrícolas à mão de todos.
QUADRO DOS ASSUNTOS
INTRODUÇÃO – A QUESTÃO SOCIAL

PRIMEIRA PARTE
ECONOMIA SOCIAL
PRIMEIRO CAPÍTULO - OS PRINCÍPIOS GERAIS
§ 01. – A pessoa humana
§ 02. – A família
§ 03. – A sociedade – O Estado
§ 04. – A religião
§ 05. – A associação
§ 06. – A propriedade
§ 07. – O trabalho
§ 08. – A remuneração do trabalho. – O salário
§ 09. – O capital
§ 10. – a renda
§ 11. – O lucro, o interesse, a usura
§ 12. – Bibliografia

CAPÍTULO II – O ESTADO LAMENTÁVEL DA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

A. Na família
§ 01. – A depopulação
§ 02. – O divórcio
§ 03. – Os nascimentos ilegítimos
§ 04. – Os infanticídios
§ 05. – As crianças abandonadas
§ 06. – A criminalidade infantil
§ 07. – Os suicídios de crianças.

B. Nos costumes

§ 08. - Libertinagem da imprensa, crimes e escândalos


§ 09. - O desregramento nas ruas
§ 10. - O alcoolismo

C. Nas relações sociais


§ 11. – O pauperismo
§ 12. – O capitalismo
§ 13. – O mal-estar na indústria
§ 14. – O esmagamento do pequeno comércio e da pequena indústria
§ 15. – A decadência da pequena propriedade
§ 16. – A crise agrícola
§ 17. – A especulação e a agiotagem
§ 18. – A crise dos câmbios
§ 19. – Os orçamentos operários
§ 20. – As operárias da agulha (bordadeiras)
CAPÍTULO TERCEIRO – A GÉNESE DO MAL-ESTAR SOCIAL:
FALSA NOÇÃO DA SOCIEDADE, DO TRABALHO E DA PROPRIEDADE

§ 01. – O mal-estar social provém de uma falsa conceção da sociedade, que relaxou os laços.
§ 02. – Esta conceção antissocial chama-se individualismo ou liberalismo.
§ 03. – Ela foi introduzida pela franco-maçonaria nas leis, nas instituições e nos costumes
§ 04. – Como o liberalismo económico concorreu com o individualismo ímpio e revolucionário a
desorganizar a sociedade ao introduzir nela uma falsa noção do trabalho.
§ 05. – A razão pela qual os princípios da sociedade moderna não podem produzir senão o
arbitrário nas leis, a instabilidade nas instituições, o egoísmo nos costumes.
§ 06. – O motivo por que, sob a influência do individualismo, a luta substituiu a concórdia entre
os homens.
§ 07. – A falsa noção da sociedade provocou uma falsa noção de propriedade.
§ 08. – A falsa noção da propriedade falsificou a repartição dos bens.
§ 09. – A falsa noção de propriedade engendrou a usura.
§ 10. – A usura produziu a proletarização das classes inferiores.
§ 11. – A usura leva ao desaparecimento das famílias, guardiãs das tradições, para proveito de
alguns especuladores.
§ 12. – A democracia socialista torna-se necessariamente o ideal do povo.
§ 13. – A anarquia parece ao povo como o meio mais seguro para realizar este ideal.
§ 14. – Como isso vai acabar.
§ 15. – Como o abandono do Decálogo e do Evangelho resume a causa do mal social.

CAPÍTULO IV – ACERCA DOS DOIS PODEROSOS AGENTES DO MAL-ESTAR


SOCIAL: A FRANCO-MAÇONARIA E O JUDAÍSMO

A. Franco-mações e luciferianos
§ 01. – Donde se origina a franco-maçonaria?
§ 02. – Qual a sua finalidade?
§ 03. – Qual a sua organização?
§ 04. – Os seus feitos principais
§ 05. – Que remédio há para este imenso perigo social?
§ 06. – Livros para consulta

B. A invasão judia
§ 01. – As suas crenças
§ 02. –O seu poderio
§ 03. – Seus princípios e suas doutrinas
§ 04. – Os diques transtornados
§ 05. – O remédio
§ 06. – Livros para consulta

CAPÍTULO V – OS FALSOS REMÉDIOS: O SOCIALISMO E A ANARQUIA


§ 01. – História do socialismo
§ 02. – O que ele não é
§ 03. – O que é
§ 04. – As suas variedades
§ 05. – Do socialismo à anarquia
§ 06. – Refutação racional do socialismo
§ 07. – Refutação pelo absurdo
§ 08. - Confissões cínicas
§ 09. - Uma palavra aos moderados
§ 10. - As experimentações
§ 11. – Outros exemplos também conclusivos
§ 12. – Conclusão : Por quê não sou socialista
§ 13. – Bibliografia

CAPÍTULO VI – OS VERDADEIROS REMÉDIOS DA AÇÃO DA IGREJA


§ 01. – Princípio geral
§ 02. – O fato histórico
§ 03. – O ensino e a ação da Igreja é a salvação
§ 04. – Um apelo supremo
§ 05. – As fontes
§ 06. – As obras – Sua necessidade
§ 07. – Conclusão. – O que o padre deve ser

CAPÍTULO VII – OS VERDADEIROS REMÉDIOS DA AÇÃO DO ESTADO


§ 01. – O repouso do Domingo
§ 02. – Liberdade de ensino
§ 03. – Diminuição das despesas militares
§ 04. – Respeito pelas imunidades religiosas
§ 05. – Reforma do imposto
§ 06. – A agiotagem e a usura
§ 07. – Os pequenos domínios rurais
§ 08. - A liberdade de testar
§ 09. - Diminuição das despesas da Justiça
§ 10. - Captura e secessão do salário
§ 11. – A representação do trabalho
§ 12. – Comissões mistas de patrões e operários e os conselhos da fábrica
§ 13. – O tempo máximo de uma jornada de trabalho
§ 14. – Revisão sobre as leis do trabalho noturno, sobre o trabalho das mulheres e das crianças.
§ 15. – A personalidade civil dos sindicatos
§ 16. – O mínimo dos salários
§ 17. – O contrato de trabalho
§ 18. – As reformas e os seguros
§ 19. – Convenções internacionais.
CAPÍTULO VIII – OS VERDADEIROS REMÉDIOS
III. A AÇÃO DOS INTERESSADOS, PATRÕES E OPERÁRIOS

§ 01. – Deveres dos patrões relativamente à vida física do operário


§ 02. – Deveres dos patrões relativamente à vida moral do operário
§ 03. – Deveres dos patrões relativamente aos interesses temporais do operário
§ 04. – Deveres dos patrões no exterior da exploração
§ 05. – Os meios de ação

CAPÍTULO IX – OS VERDADEIROS REMÉDIOS:


IV.A AÇÃO DAS ASSOCIAÇÕES PROFISSIONAIS

§ 01. – Noções históricas


§ 02. – Princípios gerais
§ 03. – A corporação na grande indústria
§ 04. – A corporação nas artes e ofícios
§ 05. – A corporação na agricultura
§ 06. – A corporação nas profissões liberais
§ 07. – O património corporativo
§ 08. - Conclusão

APÊNDICE: PROGRAMA SOCIAL DA OBRA DOS CÍRCULOS CATÓLICOS DE


OPERÁRIOS

SEGUNDA PARTE
OBRAS SOCIAIS

CAPÍTULO PRELIMINAR – DEVE-SE IR AO POVO

PRIMEIRO CAPÍTULO – A CORPORAÇÃO E A OBRA DOS CÍRCULOS


CAPÍTULO II – A VISITA ANUAL À PARÓQUIA PELO SEU PASTOR

CAPÍTULO III – POR ONDE SE DEVE COMEÇAR E COMO PROCEDER

CAPÍTULO IV – OS SINDICATOS AGRÍCOLAS


I. O que é um sindicato agrícola?
II. Como se pode fundá-lo?
III. Administração e estatutos
IV. Que circunscrição convém de lhe indicar?
V. Quem poderá fazer parte dele?
VI. Que espécie de operação poderá fazer?
VII. Património dos sindicatos
VIII. Os sindicatos e a representação da agricultura
IX. A união dos sindicatos
X. Conclusão

APÊNDICE I. A Lei do 21 de Março de 1884 sobre os sindicatos profissionais

APÊNDICE II. Projetos de estatutos

APÊNDICE III. Projeto do regulamento interno

PUBLICAÇÕES PARA CONSULTAR

CAPÍTULO VI – AS CAIXAS RURAIS DE CRÉDITO


I. O que é
II. O seu sucesso
III. A sua utilidade
IV. A sua constituição
V. Responsabilidades dos membros da associação
VI. Funcionamento
VII. Administração
VIII. Aspetos morais da obra

CAPÍTULO VII – OS CÍRCULOS RURAIS


I. O círculo sob o ponto de vista administrativo
II. O círculo sob o ponto de vista social

CAPÍTULO VIII – OS ECONOMATOS E AS COOPERATIVAS

CAPÍTULO IX – AS CAIXAS DE FAMÍLIA


I. Constituição
II. Administração
III. Cotizações
IV. Participação
V. Formalidade a preencher em casos de enfermidade
VI. Secretariado
VII. Festas e cerimónias religiosas

CAPÍTULO X – O SECRETARIADO DO POVO

CAPÍTULO XI – OS CÍRCULOS CRISTÃOS DE ESTUDOS SOCIAIS E CONGRESSOS


OPERÁRIOS

VI. Condição para a admissão


VII. Papel do padre diretor
VIII. Funções dos dignitários
IX. Os congressos de estudos sociais
X. Círculos de estudos sociais de agricultores
XI. Círculos de estudos sociais de padres

CAPÍTULO XII – A ORDEM TERCEIRA DE SÃO FRANCISCO

CAPÍTULO XIII – OS PATRONATOS E OS CÍRCULOS DOS JOVENS


I. Fundação
II. Organizações
III. Condições legais
IV. A congregação
V. Resultados
Livros úteis aos diretores dos patronatos

CAPÍTULO XIV – ARQUICONFRARIA DAS MÃES CRISTÃS


I. Necessidade e vantagens
II. Fundação
III. Reuniões mensais
IV. Centro de caridade
V. Papel do Conselho
VI. Socorros mútuos

CAPÍTULO XV – AS CONFRARIAS E CONGREGAÇÕES DA SANTA VIRGEM

I. Finalidade e vantagens
II. Formação
III. Composição da congregação
IV. Função do conselho
V. Espírito de associação
VI. Reuniões
VII. Recreio
VIII. Caixas de família ou de poupança
IX. Matrimónios
X. Doenças e óbitos

CAPÍTULO XVI – RECORDAÇÕES DALGUMAS OBRAS ANTIGAS, QUE NÃO SÃO


ESTUDADAS ESPECIALMENTE NESTE MANUAL

A. Obras de ação geral


§ 01. – A união das obras operárias
§ 02. – A união nacional e a ação social católica
§ 03. – A associação católica da juventude francesa
§ 04. – O ofício central das instituições caritativas
§ 05. – A obra de São Francisco de Sales
§ 06. – A obra do campo
§ 07. – A associação de Nossa Senhora da salvação

B. Obras de piedade e de apostolado


§ 01. – Obras de apostolado geral
§ 02. – As Ordens Terceiras
§ 03. – A Confraria do Santo Rosário
§ 04. – As Confrarias do Santíssimo Sacramento
§ 05. – O Apostolado da Oração e da Comunhão reparadora
§ 06. – As confrarias de Nossa Senhora da Fábrica e de Nossa Senhora dos Campos

C. Obras de caridade e de apadrinhamento


§ 01. – As conferências de São Vicente de Paulo
§ 02. – Os orfanatos
§ 03. – A Sociedade de São Francisco Régis para a revalidação das uniões ilegítimas
§ 04. – A obra dos soldados

CAPÍTULO XVII – AS ESCOLAS CRISTÃS LIVRES


§ 01. – Estabelecimento das escolas cristãs
§ 02. – Inspeção
§ 03. – Escolas mistas e jardins-de-infância
§ 04. – Formalidades exigidas para a abertura das escolas privadas
§ 05. – Sobre a oposição à abertura de uma escola privada
§ 06. – Encerramento das escolas privadas e interdições dos professores
§ 07. – Outras sanções legais
§ 08. - Bibliografia

CAPÍTULO XVIII – UM EXEMPLO DA AÇÃO PATRONAL CRISTÃ NA FÁBRICA


JUNTO À CIDADE – TÊXTIL DO SENHOR VRAU EM LILLE

CAPÍTULO XIX – EXEMPLO DE AÇÃO PATRONAL NUMA FABRICA NO CAMPO. –


O TÊXTIL DO SENHOR HARMEL NO VAL-DES-BOIS

I. Histórico
II. Pessoal
III. Associações fundamentais
IV. Higiene e trabalho
V. Salários
VI. Os acréscimos ao salário
VII. Frutificação do salário pela sociedade cooperativa
VIII. Salário familiar, caixa de família
IX. Poupança
X. Organização operária

CAPÍTULO XX – EXEMPLO DE AÇÃO PATRONAL NUMA EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA

CAPÍTULO XXI – MONOGRAFIA, CONFRARIA, SINDICATO, CAIXA DE CRÉDITO


NUMA PARÓQUIA RURAL DE SAÔNE-ET-LOIRE

CAPÍTULO XXII – MONOGRAFIA, SINDICATO E ALGUMAS OBRAS CONEXAS


NUMA PARÓQUIA RURAL DO ALTO-MARNE

APÊNDICE I. – Formalidades administrativas que dizem respeito aos sindicatos

APÊNDICE II. – Os sindicatos da indústria agrícola

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