Celebridades 7
Celebridades 7
NO SÉCULO XXI
VOLUME 2
Diversos perfis, diferentes apelos
Ana
Vera Cláudia Gruszynski
França
Bruno
Paula Guimarães Martins
Simões
Márcio
Denise Souza Gonçalves
Prado
(Organizadoras)
{ olhares
transversais
CELEBRIDADES
NO SÉCULO XXI
VOLUME 2
Diversos perfis, diferentes apelos
Vera França
Paula Simões
Denise Prado
(Organizadoras)
{ olhares
transversais
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
Reitora: Sandra Regina Goulart Almeida
Vice-Reitor: Alessandro Fernandes Moreira
CONSELHO CIENTÍFICO
www.seloppgcom.fafich.ufmg.br
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(eDOC BRASIL, Belo Horizonte/MG)
Celebridades no Século XXI [recurso eletrônico] : volume 2:
diversos perfis, diferentes apelos / Organizadoras Vera França,
C392 Paula Simões, Denise Prado. – Belo Horizonte, MG: PPGCOM,
2020.
Formato: PDF
Requisitos de sistema: Adobe Acrobat Reader
Modo de acesso: World Wide Web
Inclui bibliografia
ISBN 978-65-86963-06-9
COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO
Daniel Melo Ribeiro
DIAGRAMAÇÃO
Lucas Henrique Nigri Veloso
APOIO
Prefácio 11
Lígia Lana
Apresentação 17
Vera França, Paula Simões, Denise Prado
Dimensões conceituais 29
Capítulo 1 31
Perfis, atuação e formas de inserção dos famosos
Vera França, Paula Simões
Capítulo 2 59
A abordagem intertextual no estudo de celebridades: aspectos
teórico-metodológicos
Marcio Serelle
Capítulo 4 97
Tradição e modernidade: representações do vaqueiro na mídia
Lívia Barroso
Capítulo 5 117
Roteiro do ensaio audiovisual científico: mundo rural e o cultivo do
agropolítico no Brasil – a semente de Mato Grosso
Pedro Oliveira
Capítulo 7 157
Corpos visíveis e ativismo: o status quo de celebridades
na pauta do corpo feminino em Marie Claire
Michele Tavares
Capítulo 8 185
Youtubers mirins e as subjetividades infantis contemporâneas
Renata Tomaz
Capítulo 10 229
O Triunfo de Emicida – um rap em dois momentos
Denise Prado
Capítulo 11 249
Os escândalos políticos como propulsores da fama: a construção da
notoriedade de Sérgio Moro no contexto da Lava Jato
Terezinha Silva
Capítulo 12 279
Um JK para colecionadores: reflexões sobre publicações
jornalísticas de uma biografia célebre
Frederico Tavares
Capítulo 13 305
O Meia Hora e a presença de Anitta
Rodrigo Portari
Prefácio
Lígia Lana
mas profunda; não carente e vazia, mas com propósitos éticos e polí-
ticos.” (HOLMES; REDMOND, 2010, p. 3). O site da revista sugere que
os objetivos dos editores estão sendo alcançados: nos últimos dez anos,
foram lançados 35 números e, a cada dois anos, uma conferência inter-
nacional é organizada por eles.
A Rede Interinstitucional de Acontecimentos e Figuras Públicas
parece buscar um espaço epistemológico semelhante ao da Celebrity
Studies, com a vantagem de tornar oficial o vínculo entre pesquisadores
e projetos. Os resultados do trabalho da rede, materializados neste livro,
indicam preocupações e anseios muito relevantes para as ciências sociais
hoje. Trata-se, como já dito, de utilizar as celebridades como veículo para
a compreensão da sociedade e da cultura, através de uma metodologia
crítica. Nesse sentido, dois conceitos-operadores orientam os estudos da
Rede Interinstitucional de Acontecimentos e Figuras Públicas.
O primeiro é a noção de sucesso. A celebridade seria uma perso-
nificação da vida bem-sucedida, um modelo do “empreendedor de si”
(FOUCAULT, 2008). Na imagem da celebridade, valores de mercado
parecem orientar todos os níveis da existência; as celebridades sabem
usar seu capital humano, medida da possibilidade para obter sucesso
através da boa gestão de si mesmo (autogoverno). Há, nas narrativas
das celebridades, o imperativo de apresentar ao mundo uma identidade
vencedora, em constante aprimoramento, e um perfil de liderança, ainda
que a área original de atuação da celebridade dispense esses traços. As
celebridades levam muito a sério a imagem que constroem, pois ela é um
capital, negociado para a existência própria – celebridades são exemplos
dos indivíduos-empresas do neoliberalismo. O que mede o valor dessa
imagem não é a profundidade da mensagem que as celebridades trans-
mitem para o mundo, mas, sim, o lucro aferido com a exposição de si,
calculado pelo próprio impacto que possuem.
A abundância de narrativas de celebridades alude à tese de Pierre
Dardot e Christian Laval (2016) de que passamos por um momento
de fortalecimento da sociedade neoliberal. A crise econômica mundial
de 2008, ao contrário de debilitar o neoliberalismo, promoveu ainda
mais seu vigor. O neoliberalismo se consolida hoje como forma de
existência, já que a figura do empresário de si mesmo tem se tornado
14 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Referências
BOORSTIN, D. The image. A guide to pseudo-events in America. New
York, Vintage Books, 1992.
DARDOT, P.; LAVAL, C. A nova razão do mundo: ensaio sobre a
sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.
FOUCAULT, M. O nascimento da biopolítica. Curso dado no Collège de
France 1978-1979. São Paulo, Martins Fontes, 2008.
HEINICH, N. De la visibilité: Excellence et singularité en régime
médiatique. Paris: Editions Gallimard, 2012.
HOLMES, S.; REDMOND, S. A journal in Celebrity
Studies. Celebrity Journal, n.1, vol.1, p.1-10, 2010. DOI:
10.1080/19392390903519016
17
Apresentação
Vera França, Paula Simões, Denise Prado1
3 UFMG, UFOP, PUC Minas, Instituto Federal de Goiás, UFMT, UFF, UEMG, UFV, UNI-
FESSPA e UFSC.
APRESENTAÇÃO 21
4 https://grislab.com.br
22 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
2 Organização do livro
O livro foi constituído pelos trabalhos apresentados nos dois encon-
tros e revistos à luz das discussões ali empreendidas. Ele está organizado
em quatro partes:
Referências
BAUMAN, Zygmunt. Comunidade: a busca por segurança no mundo
atual. Rio de Janeiro: Zahar, 2003.
DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo. Ensaio
sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.
DRIESSENS, O. The celebrization of society and culture: Understanding
the structural dynamics of celebrity culture. International Journal of
Cultural Studies, UK, SAGE, n 16(6), p. 641-657, 2012.
28 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Dimensões Conceituais
30 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
31
Capítulo 1
Perfis, atuação e formas de inserção dos
famosos
Vera França, Paula Simões
tado pelos iníquos publicitários de uns meros dez anos para cá” (2012, p.
12). E sua história pontua alguns momentos decisivos: a Londres urbana
do século XVIII (combinando o consumismo, a indústria da moda e os
primeiros jornais), a Paris do século XIX (a cidade do espetáculo e do
culto da aparência), Nova York e Chicago na passagem dos séculos XIX
e XX (industrializando a fofoca e glamourizando o dinheiro).
Se a Modernidade introduziu um corte na história e na dinâmica da
fama, uma nova ruptura é introduzida com a invenção de novas técnicas
de comunicação e de registro da imagem, com o surgimento dos meios
de massa, no final do século XIX e início do século XX, e o advento
dos meios digitais, no final do século XX e início do século XXI. Smart
(2005) reitera esta ideia ao afirmar que houve uma significativa mudança
na maneira de ser conhecido a partir dos meios de comunicação no
século XX. “A fama ainda pode residir na grandeza de ação e realização,
mas ela também se tornou produto e criação da representação midiá-
tica” (SMART, 2005, p. 6). E, como destacaremos adiante, a internet e
a comunicação digital constituem um cenário de novas modificações.
Então, respondendo à pergunta: a criação e a presença de celebri-
dades é um fenômeno que acompanha a história da civilização ocidental,
porém ganha novas e decisivas configurações nos dois últimos séculos.
1998; TURNER, 2014). Esse olhar na figura dos famosos foi também
a ênfase de Morin (1989), que analisou as estrelas hollywoodianas,
destacando o interesse que elas despertam enquanto figuras distantes e
sobrenaturais, mas ao mesmo tempo próximas e humanas (o misto entre
humanas e divinas dos “olimpianos”).
Essas diferentes abordagens, no entanto, ainda estão voltadas e têm
como referência os meios de comunicação de massa e, sobretudo, as
grandes estrelas do cinema. Os mesmos aspectos e características pode-
riam ser dirigidos à mais nova geração de famosos – as webcelebridades?
Além disso, se o fenômeno sofre mutações (os famosos desde a antigui-
dade, o star system, agora as celebridades digitais), qual a melhor forma
de nomeá-lo? Como evoluiu a semântica do conceito celebridade?
8 Para Rojek, “glamour e notoriedade costumam ser vistos em termos polarizados. [...] O
glamour está associado a um reconhecimento público favorável. Notoriedade é reconheci-
mento público desfavorável” (ROJEK, 2008, p. 12).
9 A propósito de Elisabeth I (séc. XVIII), o autor registra: “a fama de uma das raríssimas
mulheres de renome histórico no período anterior à transformação da celebridade em as-
pecto da individualização da fama” (INGLIS, op. cit., p. 13). (grifos nossos).
40 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
10 Cabe registrar que o próprio estudo das celebridades é tratado com descaso por alguns
pesquisadores do próprio campo da Comunicação e das Ciências Sociais.
PERFIS, ATUAÇÃO E FORMAS DE INSERÇÃO DOS FAMOSOS 41
12 Ce n’et pas le saint qui est à l’origine de l’icône, mais l’image qui es cause de ce qui est
saint.
13 Para Weber, o carisma se refere a um conjunto de “dons específicos do corpo e do espí-
rito, dons esses considerados como sobrenaturais, não acessíveis a todos” (WEBER, 1982,
p. 171). O autor chama atenção mais para a dimensão individual do carisma, na medida
em que ressalta as qualidades internas (“do corpo e do espírito”) que o constituem. Para o
sociólogo, “o líder carismático ganha e mantém a autoridade exclusivamente provando sua
força de vida” (WEBER, 1982, p. 174). Essa abordagem clássica weberiana é situada por
Rojek (2008) como uma perspectiva subjetivista na análise das celebridades.
14 Em diálogo com conceito de carisma conforme apreendido por Geertz (1997).
46 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
15 Cf. Meyer; Gamson, 1995; Gamson, 1994; Kellner, 2010; Wheeler, 2013, 2014; Kamradt,
2019, entre outros.
PERFIS, ATUAÇÃO E FORMAS DE INSERÇÃO DOS FAMOSOS 49
16 O programa Ídolos era baseado no inglês Pop Idol, e estreou no Brasil em 2006 pela
emissora SBT. Em 2008 foi comprado pela Rede Record e esteve no ar até 2012 (estreando
sete temporadas no Brasil).
17 Pânico na TV foi um programa de televisão humorístico lançado pela RedeTV! em
2003, e durou até 2012 (quando a equipe foi contratada pela Rede Bandeirante e deu ori-
gem ao Pânico na Band, também já extinto).
50 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
18 De acordo com Lana, “a denominação ‘personagem pública’ reúne duas palavras que
têm por objetivo delimitar, por um lado, a dimensão pessoal/individual do conceito —
antes de mais nada, trata-se de uma pessoa específica —, e, por outro, a face publicizada
dessa personagem, construída em um espaço público genérico (nas biografias, no cinema,
na televisão, nas revistas, nos espetáculos, nos discursos políticos, nos perfis da internet),
disponível para o acesso de qualquer um” (LANA, 2012, p. 62).
PERFIS, ATUAÇÃO E FORMAS DE INSERÇÃO DOS FAMOSOS 51
Referências
ANDALÉCIO, M. L. Em busca da fama: performances e representações
no programa Ídolos. 2010, 126f, Dissertação (Mestrado em Comunicação
Social) — Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade
Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2010.
PERFIS, ATUAÇÃO E FORMAS DE INSERÇÃO DOS FAMOSOS 53
Capítulo 2
A abordagem intertextal no estudo de
celebridades:
aspectos teórico-metodológicos
Marcio Serelle
1 Introdução
Este artigo objetiva apresentar e mover, para nosso contexto, a abor-
dagem metodológica construída por Richard Dyer (1979), em sua obra
Stars, para a análise da imagem de uma celebridade. Como assinala
Edward Said (1983), a passagem de uma ideia para um novo ambiente
nunca se dá de forma completamente desimpedida. Um dos estágios
desse processo é aquele em que a ideia transplantada enfrenta as pres-
sões e dialoga com as demandas do novo contexto. Em nosso caso,
várias adaptações devem ser feitas, tendo em vista as diferenças entre
a cultura midiática analisada por Dyer na década de 1970 e a de hoje; a
qualidade da celebridade que o autor examinou — o estudo é circuns-
crito às estrelas do cinema mainstream – e as especificidades de nosso
meio cultural.
Outro objetivo deste texto é contribuir para a circulação do pensa-
mento de Richard Dyer em nosso meio. Bastante citado nos estudos
de celebridade em língua inglesa (ver, por exemplo, os trabalhos de
60 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
“eu” que nos fala diretamente e nos faculta seu ponto de vista por meio
de fotografias e vídeos. Mas esse “eu” da celebridade é ao mesmo tempo
uma personagem, não apenas na concepção de uma dramaturgia coti-
diana que diz respeito a todos nós, como em Goffman (2014). Nem,
ainda, somente pelo fato de ali tornar-se irremediavelmente um ser de
linguagem. Como propõe Paul de Man (1979), o discurso autobiográfico
é uma prosopopeia, ou seja, um ato de colocação de máscara.
Refiro-me, contudo, à instância de uma personagem modulada por
intermediários culturais e que se commoditiza e se torna marca. No
entanto, como propõe Banet-Weiser (2012), o binarismo entre auten-
ticidade e mercado não alcança, em termos explicativos, o modo como
o mundo material penetra hoje a vida dos sujeitos. Para Banet-Weiser,
a cultura das marcas é um logos que opera na vida cotidiana e aciona
práticas não somente econômicas, mas também políticas e culturais.
As mídias sociais são lugar privilegiado para se apreender como
sujeitos contemporâneos, célebres e anônimos, interpelados pela
ideologia neoliberal tornam-se, nos termos de Dardot e Laval (2016),
“empresas de si mesmo”: sujeitos que aplicam à própria vida vocabu-
lários e estratégias antes atinentes a corporações. Na racionalidade
neoliberal, “todas as [...] atividades [do sujeito] devem assemelhar-se a
uma produção, a um investimento, a um cálculo de custos. A economia
torna-se uma disciplina pessoal” (DARDOT; LAVAL, 2016, p. 331).
A categoria cultural das celebridades é definida pela commoditização.
Celebridades são um tipo de mercadoria e, como assinala Turner (2014,
p. 37), “podem desenvolver sua persona pública como um ativo comer-
cial”. De acordo com o autor, as celebridades são desenvolvidas para o
lucro financeiro, logo, a categoria afina-se como esse tipo de subjeti-
vação capitalista hoje generalizada como racionalidade.
4 Considerações finais
A abordagem intertextual foi desenvolvida como método para
análise da imagem da estrela de cinema, contudo ela pode se estendida
a outros tipos de celebridade – inclusive àquelas nomeadas pejorativa-
mente de celetoides, subcelebridades, microcelebridades ou ainda cele-
bridades ordinárias –, uma vez que todas elas se constituem por meio de
textos e interações midiáticas. Para isso, contudo, é necessário abranger,
nessa concepção de texto, novos conjuntos e espaços midiáticos.
Há, como vimos, a necessidade de ampliação das categorias. As
quatro categorias textuais apontadas por Dyer referem-se a âmbitos
midiáticos preponderantes na década de 1970. Um conjunto sensivel-
mente importante hoje é o de textos das mídias sociais digitais, em que a
própria celebridade ou um mediador cultural produz e coloca em circu-
lação suas representações. Esses textos estão inseridos em complexos
interativos com as audiências de uma forma também não prevista
antes da emergência das mídias sociais. A abordagem intertextual pode
considerar, ainda, portanto, o papel que essas audiências em interação
exercem na construção das imagens das celebridades, assim como na
atualização e no redirecionamento delas. Que demandas, por exemplo,
70 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Referências
BANET-WEISER, S. Authentic. New York: New York University Press,
2012.
CAVELL, S. The world viewed. London: Havard University Press, 1979.
DARDOT, P.; LAVAL, C. A nova razão do mundo. São Paulo: Boitempo,
2016.
DYER, R. Stars. London: British Film Institute, 1979.
DYER, R. The role of stereotypes. In: MARRIS, P.; THORNHAM,
A ABORDAGEM INTERTEXTUAL NO ESTUDO DE CELEBRIDADES: 71
ASPECTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
Capítulo 3
Personagens locais e celebridade
midiática: tipos sociais e valores nas
experiências do religioso e do rural
Ricardo Duarte
1 Introdução
Nos núcleos comunicacionais inerentes às experiências tradicionais
do religioso e do rural19 existem rituais específicos entre os sujeitos: no
22 Nos estudos sociológicos, temos as inquietações de autores como Celso Furtado, Sérgio
Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Euclides da Cunha e outros, na busca de esclarecer
a história, as épocas, explicar raízes ou perspectivas do país.
82 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Por vezes, agirá de forma teatral para dar uma determinada im-
pressão para obter dos 143 observadores respostas que lhe inte-
resse, mas outras vezes poderá também estar atuando sem ter
consciência disto. Muitas vezes não será ele que moldará seu
comportamento, e sim seu grupo social ou tradição na qual per-
tença (GOFFMAN, 2007, p. 67).
25 Vários são os autores que discutiram essa dicotomia rural-urbana. Citamos alguns des-
ses autores em outras oportunidades (SILVA, 2014b; SILVA, 2018).
26 Assim como o padre Cícero, personagem local que dos circuitos da vida se tornou santo
reverenciado no Brasil, o músico Luiz Gonzaga saiu de Exu/PE, onde já era famoso, para
se consagrar nacionalmente com canções e letras que diziam sobre essas tensões entre o
campo e a cidade, mais especialmente entre o sertanejo rústico nordestino fora de sua
casa, morando na grande cidade. Trechos da antológica Asa Branca falam do problema
das secas no nordeste, que braseiro, que fornaia, nem um pé de prantação. Por falta d´água
perdi meu gado, morreu de sede meu alazão. Assim como a asa branca, o homem sertanejo
rústico nordestino precisou bater asas do sertão: Entonce eu disse, adeus Rosinha. Guarda
contigo meu coração (Rosinha, então, podendo também estar representando uma das cha-
madas “viúvas da seca”).
PERSONAGENS LOCAIS E CELEBRIDADE MIDIÁTICA: 89
TIPOS SOCIAIS E VALORES NAS EXPERIÊNCIAS DO RELIGIOSO E DO RURAL
28 Para entender os casos e acessar uma descrição do perfil do padre Alessandro Campos,
confira o site Radar de Celebridades, GrisLab/UFMG: http://grislab.com.br/celebridades/
padre-alessandro-campos/
29 Nos limites deste texto, não vamos desenvolver a discussão sobre a presença da figura
do padre sertanejo entre fãs/fiéis do meio rural e as questões relativas ao local e a figura
pública nas mídias.
92 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
O corpo sempre foi uma preocupação das religiões, mas além da regu-
lação do corpo controla-se por vezes o que comer, o uso da maquiagem
e o que vestir. Como diz Martino (2013), o corpo nas religiões tem uma
dimensão política, já que as escolhas não são sempre realizadas pelo
dono do corpo. Tanto na missa quanto no palco, há um controle do que
se faz com o corpo e o que mostrar já direciona o olhar. Na missa, tem-se
um discurso religioso que direciona o olhar do fiel.
6 Considerações finais
Diversas questões estão postas para o debate. Abordamos a impor-
tância dos tipos clássicos, contemporâneos e os tipos midiáticos – que
dizem muito a respeito da nossa sociedade – usados nas estratégias de
produção e de visibilidade dos personagens locais e midiáticos. Apresen-
tamos os circuitos menores da vida e das mídias ao alcance das pessoas
comuns, que produzem um protagonismo interessante de ser observado
e que por vezes serve como colaborador da fama do personagem do
lugar. Procuramos discutir sobre dois tipos sociais nos núcleos de suas
experiências sociais (o padre/o religioso; o sertanejo rústico/o rural),
analisando tensões específicas nas esferas dessas experiências e possíveis
distensões produzidas pela figura pública do padre sertanejo nas mídias.
O personagem local marca o lugar, pois parece estar mais próximo
de um localismo nos núcleos da experiência de vida. Neste texto, nos
referimos aos locais das pequenas cidades do interior brasileiro, mas
existem também os famosos que marcam as localidades das periferias
das médias e grandes cidades. O padre e os sujeitos representantes do
sertanejo rústico nas cidadezinhas do interior ostentam aquilo que as
pessoas comuns sempre valorizaram nesses lugares. As relações sociais
mais próximas nessas localidades permitem ao personagem ajustar sua
imagem aos tipos sociais esperados pela sociedade. Por exemplo, espera-
-se uma atitude de uma professora, assim como se espera do prefeito, do
delegado, do médico, entre outros na mesma esfera da experiência.
As pequenas mídias locais permitiram um protagonismo das pessoas
comuns que por vezes elegem seus personagens locais. Eles estão juntos
compartilhando as experiências de superação, alegrias e satisfações
constituídas na história do lugar. Estamos falando de um personagem,
diríamos, mais orgânico, alinhado ao localismo e que, após sua morte
física, pode até trazer mais comoção, poder de afetação e convocação
entre os locais do que a morte da estrela de uma telenovela.
O padre-cowboy marca o nosso tempo. Um tempo em que as cele-
bridades se inspiram também nos valores envolvidos nos persona-
gens locais de referência que circulam pelos núcleos da experiência
das pessoas comuns. Os variados estilos são permitidos, assim como o
uso de traços dos tipos sociais das culturas brasileira e estrangeira. As
94 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
com sua figura e, ao mesmo tempo, dialoga com tipos sociais locais.
E essa existência anterior estaria na compreensão que temos da figura
pública do padre e do sujeito sertanejo rústico. Ambas as figuras locais
antecedem a compreensão do padre-cowboy.
Assim, traços do rural e do religioso estão no padre-cowboy, que
cumpre o papel de evocar uma atmosfera rural e os costumes religiosos,
na tentativa de aproximação e relação com pessoas desprendidas dessas
experiências; e, por que não, direcionar o olhar para uma conexão dos
locais com o mundo. Assim, canta-se e bate-se palmas com paixão para
as canções que lembram o passado rural da infância e da vivência das
coisas simples, assim como se juntam as mãos para orar com fervor por
um futuro de paz para o mundo em que vivemos. Tudo isso sob a batuta
do maestro do padre midiático no palco.
Referências
BRAGA, J. L. Circulação & circuitos: situações. IN: CASTRO, Paulo
César (Org.). A circulação discursiva: entre produção e reconhecimento.
Maceió: Edufal, 2017.
CANDIDO, A. Jagunços mineiros de Cláudio a Guimarães Rosa. In:
CANDIDO, Antonio. Vários escritos. 4.ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre
azul, 2004..
________. O homem dos avessos. In: CANDIDO, Antonio. Tese e
antítese. São Paulo: T. A. Queiroz, 2000.
ELIADE, M. O Sagrado e o Profano: a essência das Religiões. São Paulo:
Martins Fontes, 2008.
ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo:
Itaú Cultural, 2019. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.
br/. Acesso em: julho de 2019. Verbete da Enciclopédia.
FRANÇA, V. R. V. Celebridades: identificação, idealização ou consumo?
IN: FRANÇA, V.R.V.; FREIRE FILHO, J.; LANA, L; SIMÕES, P. (Orgs.)
Celebridades no século XXI: transformações no estatuto da fama. Porto
Alegre: Sulina, 2014.
GOFFMAN, E. A representação do eu na vida cotidiana. 14aed.,
Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
96 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Capítulo 4
Tradição e modernidade: representações
do vaqueiro na mídia
Lívia Barroso
1 Introdução
A figura do vaqueiro faz parte da formação social do sertão nordes-
tino desde o processo de colonização da região, sendo um dos prin-
cipais sujeitos que compõe o mundo rural. Para se falar a respeito do
sertão nordestino e sua realidade rural, é necessário fazer um esforço
de olhar o vaqueiro, assim como para as representações que esse sujeito
convoca, seja no imaginário popular, como herói, ou apenas como o
homem que cuida dos rebanhos de gado nas fazendas ou comunidades
rurais dos sertões. Sendo assim, é importante frisar que, neste trabalho,
iremos abordar apenas o vaqueiro enquanto um sujeito que se carac-
teriza enquanto habitante da região brasileira denominada de sertão
nordestino – em trabalhos posteriores, pretendemos abordar o vaqueiro
em outros cenários.
O objetivo deste trabalho é compreender como a figura do vaqueiro
é representada no ambiente midiático. Focamos, especificamente, na
representação desse sujeito na literatura e na música, por meio de uma
análise exploratória da obra de Euclides da Cunha, Os Sertões; da novela
98 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
30 É importante mencionar que essa divisão social do trabalho foi um processo lento e
gradativo, que não ocorreu assim que a Lei Áurea foi assinada em 1888, e muitos trabalha-
dores das fazendas permaneceram por muito tempo desenvolvendo diversas atividades.
TRADIÇÃO E MODERNIDADE: 101
REPRESENTAÇÕES DO VAQUEIRO NA MÍDIA
33 A vaquejada é uma prática cultural nordestina que se caracteriza por dois vaqueiros
montados em cavalos que têm que derrubar um boi puxando pelo rabo do animal dentro
de uma faixa demarcada no chão. Um exemplo que caracteriza bem a prática da vaquejada
é a música do cantor Mano Walter Festa de Vaquejada (2017): “[...] E o vaqueiro/Corre
dentro da pista em seu cavalo alazão/ Quando chega na faixa derruba o boi no chão/ Assim
é vaquejada, assim é meu sertão”.
34 A expressão “Valeu o boi!” é utilizada quando o vaqueiro derruba o boi dentro da faixa
na vaquejada. Ou seja, é o ápice da disputa.
112 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
A música da banda Mastruz com Leite é cantada sempre por uma voz
feminina e traz a representação do vaqueiro galanteador e conquistador,
que atrai e envolve emocionalmente a mulher. Esse vaqueiro cantado na
música é um sujeito livre, que anda sempre montado em seu cavalo e que
flutua livremente entre as vaquejadas e forrós da região. A sua amada o
segue: “Eu estou sempre aonde ele está”. Aqui percebemos claramente
uma postura de supremacia do homem vaqueiro sobre a mulher, seja no
espaço da lida com o gado, da prática da vaquejada35.
Ao olharmos para Os Sertões, de Euclides da Cunha, para Ataliba, o
Vaqueiro de Francisco Gil Castelo Branco, e para a música Meu vaqueiro,
meu peão, da Mastruz com Leite, percebemos a representação da figura
de um vaqueiro que se repete, é um vaqueiro tradicional, que mantém
seus trajes e hábitos. É um vaqueiro que não rompe com as tradições.
O vaqueiro, enquanto uma figura representada dentro da música
e da literatura, é frequentemente ligado a um modelo que está fincado
na tradição. Percebe-se um movimento de resistência em representar
o vaqueiro como um homem moderno, atual, do tempo presente. Por
exemplo, a música do cantor alagoano, Mano Walter36, Não deixo não
(2018), é uma representação do vaqueiro na mídia em que a aversão
do personagem vaqueiro à vida moderna fica bem evidente. Os hábitos
de consumo e as práticas, sobretudo da vida na cidade, são totalmente
repudiados pelo vaqueiro retratado por Mano Walter. Além de que a ida
para a cidade e sua adequação a esse novo espaço não acontece de forma
voluntária, mas ele é levado pela sua companheira.
35 Nos dias atuais já é possível perceber algumas mulheres praticando vaquejada. Mas,
ainda é uma atividade dominada pela figura masculina.
36 Mano Walter tem hoje mais de 3 milhões de seguidores na sua página no You Tube, e
vídeos de suas músicas chegam até a 43 milhões de visualizações.
TRADIÇÃO E MODERNIDADE: 113
REPRESENTAÇÕES DO VAQUEIRO NA MÍDIA
Referências
ALBUQUERQUE JR, D. M. A invenção do Nordeste e outras artes. 3ª.
ed. Recife, PE: Fundação Joaquim Nabuco, Ed. Massangada; São Paulo:
Cortez, 2006.
BRANDÃO, T. M. P. O vaqueiro: símbolo da liberdade e mantenedor da
ordem no sertão. In: MONTENEGRO, Antônio Torres et al. História:
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117
Capítulo 5
Roteiro do ensaio audiovisual científico:
mundo rural e o cultivo do agropolítico
no Brasil - a semente de Mato Grosso
Pedro Oliveira
Introdução
Trata-se aqui de uma proposta experimental - a publicação do roteiro
de um Ensaio Audiovisual Científico que foi apresentado no II Encontro
da Rede Interinstitucional de Acontecimentos e Figuras Públicas,
promovido pelo Grupo de Pesquisa em Imagem e Sociabilidade (GRIS),
em maio de 2019, na UFMG. Nosso esforço, no vídeo apresentado, foi
no sentido de formatar a linguagem audiovisual para acolher a discussão
científica.
Embora trabalhando com linguagens, a área da Comunicação ainda
não conseguiu acolher outras formas de produtos acadêmicos senão o
trabalho escrito (o paper). À linguagem audiovisual restam os produtos
técnicos e artísticos.
O ensaio, então, perseguiu um duplo objetivo: inicialmente, e dentro
da temática do II Encontro, apresentar os resultados de nossa pesquisa
a respeito de uma nova categoria de figura pública: o agropolítico. Mas
objetivamos também avançar na experiência da escritura audiovisual
118 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
37 Estudo realizado como parte do Projeto de Pesquisa coordenado por mim, “Instâncias
da comunicabilidade na Cultura: análise dos acontecimentos e práticas sociais e culturais
de embates e inovação”, na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
ROTEIRO DO ENSAIO AUDIOVISUAL CIENTÍFICO: MUNDO RURAL E O 119
CULTIVO DO AGROPOLÍTICO NO BRASIL - A SEMENTE DE MATO GROSSO
Lettering
Pedro (ON)
Analisamos a performance de uma figura pública que atua pelo menos
há duas décadas no cenário político do Brasil: o “agropolítico”, categoria
que se apresenta agindo, simultaneamente, nos dois lados do balcão
da política e dos negócios da agricultura e da pecuária – o chamado
agronegócio. Partimos da utopia que apresenta o Mundo Rural como
um lugar perfeito do poder econômico e da lógica mercantil, produzir/
lucrar/viver, subsumindo todas as outras relações do mundo da vida.
Pedro (ON)
Com os filósofos Günther Anders e Michel Foucault, contextualizamos
a noção de “completude”.
38 Link: http://www.fafich.ufmg.br/gris/2019/06/24/o-mundo-rural-e-o-cultivo-agropo-
litico-no-brasil/
ROTEIRO DO ENSAIO AUDIOVISUAL CIENTÍFICO: MUNDO RURAL E O 121
CULTIVO DO AGROPOLÍTICO NO BRASIL - A SEMENTE DE MATO GROSSO
Pedro (ON)
Nosso eixo teórico é a ideia relacional de comunicação de Vera França,
com as dinâmicas básicas desse paradigma vistas em conexão a partir da
noção de comunicabilidade.
Voz Off
Lettering
Pedro (ON)
O conceito operador de performance é de Erving Goffman e de valores
com o filósofo John Dewey.
122 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Lettering
Voz Off
Pedro (ON)
Locutor do vídeo
Pedro (ON)
Pedro (ON)
Voz Off
Voz Off
“Você vive dizendo que eu sou caipira. Pra que alimentar no peito tan-
ta mágoa? Se eu cruzar os braços como é que vai ser? Quando bater a
fome vou pagar pra ver você comendo areia e mastigando água”.
Estúdio
Pedro (ON)
Uma arrogância que despreza a estima. Se o agro é tudo, o resto pode ser
nada.
Locução da vinheta
Lettering
ROTEIRO DO ENSAIO AUDIOVISUAL CIENTÍFICO: MUNDO RURAL E O 125
CULTIVO DO AGROPOLÍTICO NO BRASIL - A SEMENTE DE MATO GROSSO
Voz Off
Imagens: fotos de Blairo com Lula – Blairo com Dilma – Blairo com
Temer – Jair Bolsonaro com a faixa presidencial
Voz Off
Pedro (ON)
Lettering
Os achados da Pesquisa
Lettering
Pedro (ON)
Blairo (ON)
Estúdio
Pedro (ON)
Locutor do vídeo
“Você votaria para Senador em um cuiabano, eleitor? Cuidado, cuidado! Sa-
bemos que as pessoas de Cuiabá, Várzea Grande, Poconé, Cáceres e toda re-
gião são preguiçosos e não gostam de trabalhar. As cidades do agronegócio
128 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
sustentam Mato Grosso, porque aqui, quase não tem cuiabanos! Temos três
ótimas opções de candidatos que trabalham e produzem e não são cuiabanos
preguiçosos. Fávaro, Sachetti e Nilson Leitão. O agronegócio não pode deixar
de ter representantes no Senado. O Procurador Mauro39 representa a preguiça
e a falta de vontade de todos da baixada cuiabana. Diga não aos cuiabanos
preguiçosos, que não produzem! Cuidado eleitor, a velha política está de volta
atrás do seu voto! É hora de renovação”.
Lettering
Política e Agronegócio
Estúdio
Pedro (ON)
Blairo (ON)
Lettering
Estúdio
Pedro (ON)
Blairo destaca que a formação dos líderes rurais que concorrem como
agropolíticos não se dá nos partidos políticos, mas nas associações de
classe:
Blairo (ON)
A fábrica de líderes do nosso estado político estão (sic) nas nossas as-
sociações. Ele vem, faz um mandato, faz um segundo mandato e... vai
embora. Ele vai fazer outras coisas e parte disso acaba fazendo políti-
ca. Então, é um estado que tem uma cabeça bastante aberta, diferente
de muitos outros estados... a onde as entidades são perpetuadas por
décadas e décadas, ocupadas por uma pessoa e não deixa liberar espa-
ço pra... pra novas pessoas chegar na política.
130 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Lettering
Pedro (ON)
Blairo (ON)
Estúdio
Pedro (ON)
Lettering
Pedro (ON)
Blairo (ON)
“Bem, eu... é... até pedi para a EMBRAPA e eu não tenho esses dados ainda
e a EMBRAPA nós temos... na EMBRAPA um... um centro de monitora-
mento territorial que consegue ver propriedade por propriedade o que tem
ali dentro e o que não tem e o que ela tem de reserva ou não. Eu acho que
quando você declara um patrimônio da humanidade e coisa parecida você
cria... é... burocracias e um ambiente ruim de negócios. Eu a princípio sou
contra isso, sou contra isso.”
Lettering
Considerações finais
Estúdio
Pedro (ON)
Pedro (ON)
Pedro (ON)
Lettering
ROTEIRO DO ENSAIO AUDIOVISUAL CIENTÍFICO: MUNDO RURAL E O 133
CULTIVO DO AGROPOLÍTICO NO BRASIL - A SEMENTE DE MATO GROSSO
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134 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
ministro-da-agricultura-blairo-maggi-por-corrupcao-ativa/. Acesso
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Blairo Maggi homenageia Eraí Maggi eleito dos homens mais
influentes do Brasil. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=3eDcoQVoKcs. Acesso em: 26 abr. 2019.
Blairo Maggi: governo vai criar todas as condições para baixar
o preço do feijão. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=P7DQRcxY7ak. Acesso em: 26 abr. 2019.
Ministro da Agricultura, Blairo Maggi, usa colheitadeira em sua fazenda.
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Temer: acordo para exportar carne in natura aos EUA ajuda a
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Blairo no senado. Disponível em: http://www.maxnoticias.com.br/
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ser_candidato_a_presidente_da_republica__afirma_ cidinho. Acesso
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a-ser-considerada-blairo-maggi-candidato-do-pps-ao-governo-de-
mato-grosso-para-quem-a-renuncia-da-candidatura-de-c/. Acesso em:
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ROTEIRO DO ENSAIO AUDIOVISUAL CIENTÍFICO: MUNDO RURAL E O 135
CULTIVO DO AGROPOLÍTICO NO BRASIL - A SEMENTE DE MATO GROSSO
Figuras públicas
femininas e infantis
138 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
139
Capítulo 6
Feministas e famosas: notas sobre o
sujeito do feminismo a partir de
personalidades públicas brasileiras
Rayza Sarmento
1 Introdução
“[...] escolhemos neste mês de março – o nosso mês – mostrar várias
faces nessa capa. Todas elas, e muitas mais, são o feminismo. Todas
elas são o nosso #eutenhodireito. Eu sou uma feminista. Do meu jeito”
(grifos nossos). A declaração é de Ana Paula Padrão, famosa jorna-
lista brasileira, com longa trajetória no telejornalismo, que assumiu em
2017 a diretoria de redação da revista Claudia (Editora Abril), uma das
revistas femininas de maior circulação no país. Ela se referia, no texto
do editorial, à capa de março de 2018, estampada por seis mulheres,
com a chamada Feminismo não é mimimi40, entre elas Maria da Penha
Fernandes, que dá nome à lei brasileira de combate à violência domés-
tica e familiar contra a mulher, e Valentina Muniz, uma participante da
versão infantil do programa MasterChef, exibido na emissora Bandei-
rantes, edição de 2015, que sofreu assédio nas redes sociais e levantou
discussão pública sobre pedofilia.
No mesmo mês, outra revista voltada às mulheres, Marie Claire
Brasil, trouxe em sua capa a chamada para várias matérias com o título
Aborto não é crime41. A humorista e atriz Mônica Iozzi é a “cara” da
edição. O perfil publicado na revista a descreve: “Sua maior pauta é a
luta feminista. Equidade de gênero, direitos iguais, respeito às mulheres
fazem parte de seu discurso”.
O feminismo, outrora descrito de forma caricatural em diferentes
meios de comunicação nacionais (SARMENTO, 2017; SOIHET, 2013),
aparece como pauta das revistas acima, como bandeira de suas entrevis-
tadas, como questão pública, mais naturalizado. Isso em veículos que
historicamente estão/estavam voltados para o reforço de várias pautas
criticadas pela luta feminista, como a imposição de padrões de beleza e
a servidão em relacionamentos, especialmente heterossexuais. Conhe-
cidas por suas fórmulas de juventude, emagrecimento, casamento, as
revistas femininas foram objetos fundamentais para o desenvolvimento
dos estudos feministas de mídia e para a discussão pública sobre as
expectativas sociais acerca dos comportamentos femininos (BYERLY;
ROSS, 2006).
Para além de mudanças na construção de imagens – menos estereoti-
padas – das mulheres nesses produtos midiáticos, chama a atenção, nos
anos recentes, a identificação pública de personalidades consideradas
famosas com o feminismo e mesmo a popularização do termo, cada vez
mais frequente também em programas da televisão aberta.
A percepção desse fenômeno enseja questões ligadas à teoria polí-
tica feminista, em especial as discussões densas acerca de a quem e
sobre o que o feminismo fala. Ou melhor, os feminismos. Mais do que
uma simples exposição midiática do termo ou de suas reivindicações,
a presença de pessoas públicas traz consigo discursos sobre o que é
ser feminista, disputas que se relacionam, no nível teórico, aos debates
sobre o sujeito do feminismo. A análise dessas falas de personalidades
Revista/edição Textos
Claudia, ano 57, n.3 1) Eu e você, editorial assinado por Ana Paula Padrão
março de 2018
2) Elas não se calam, de Isabella Dercolle
3) O que é feminismo?, de Bruna Carvalho
4) Corpão querido, de Vivian Elias
5) O lado dos homens, de Flavia Gianini
Marie Claire Brasil, n. 6) As lutas de Monica Iozzi, de Luíza Karam
324, março de 2018
7) Pelo direito de decidir, de Lu Angelo
8) Uma mulher que pratica aborto não deve ser presa -
Entrevista com Marina Silva, de Maria Laura Neves
Tabela 1: Textos analisados das revistas Claudia e Marie Claire Brasil, de março
de 2018. Fonte: Elaboração própria.
44 “Elas não se calam, Claudia, ano 57, n.3 março de 2018, p. 86.
150 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
4 Considerações finais
Buscamos entender neste texto como figuras públicas femininas
explicitam seus entendimentos sobre o feminismo e suas pautas, bem
como a forma como são descritas como parte deste movimento, a partir
da análise das edições de março de 2018 das revistas Claudia e Marie
Claire Brasil. Reivindicações importantes atravessam esses discursos,
mas é preciso evidenciar o quanto o ativismo impresso nessas páginas
tem forte dimensão individual.
Mais do que estabelecer uma crítica ou um código de conduta às
celebridades feministas, nossa ideia é perceber nuances recentes que
se colocam de forma muito distinta de outros momentos históricos,
quando o feminismo era abertamente negado pelas famosas. Para além
disso, mostrar como em sua fase atual vale a pena observar a configu-
ração dos campos discursivos, no sentido de Alvarez (2014), também
para além de espaços considerados a priori como políticos.
Para encerrar, talvez valha a pena mencionar que, quando este texto
estava sendo escrito, o jornal O Estado de São Paulo entrevistou Heloisa
Buarque de Holanda a respeito de suas duas últimas obras, uma delas
citadas neste trabalho – Explosão feminista – a qual procura documentar
o diverso feminismo atual. A autora, referência nos estudos de gênero
brasileiros, relata a alegria da retomada do feminismo pelas mulheres
jovens, mas admite a carência de repertório.46 Segundo ela, “esse novo
feminismo é experimentado por uma descoberta na internet, por
uma indignação que pegou essa geração. As meninas não veem como
resultado de uma luta anterior, por isso fiz o Pensamento Feminista
Brasileiro”, sustenta, citando seu livro mais recente, com caráter mais
histórico. Parece-nos que reside aí uma potente questão a ser investi-
gada com mais afinco.
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FEMINISTAS E FAMOSAS: NOTAS SOBRE O SUJEITO DO FEMINISMO 155
A PARTIR DE PERSONALIDADES PÚBLICAS BRASILEIRAS
Capítulo 7
Corpos visíveis e ativismo: o status quo
de celebridades na pauta do corpo
feminino em Marie Claire
Michele Tavares
1 Introdução
A presença de celebridades nas capas de revistas segmentadas e envol-
vidas em discussões polêmicas e de interesse público não é uma novi-
dade no espaço midiático. Em geral, a estratégia editorial dessas publi-
cações aplica a mesma receita: em contexto de efervescência, aborda o
tema a partir de um posicionamento político-editorial, acionando vozes
célebres, protagonizando e reforçando a defesa de determinada temá-
tica e, às vezes, com pouca argumentação do contraditório. Em geral, os
indivíduos que não estão vinculados à dinâmica da visibilidade midiá-
tica, mas que são/estão igualmente afetados pelas questões em debate
são acionados como coadjuvantes, estando o debate vinculado ao prota-
gonismo de sujeitos pertencentes ao campo de visibilidade do qual as
revistas fazem parte.
Nesse sentido, propomos uma reflexão a respeito da postura edito-
rial da revista Marie Claire ao pautar questões relacionadas ao corpo
feminino, convocando atrizes, modelos, cantoras, apresentadoras, entre
outras celebridades, para protagonizar o debate. Além do engajamento
158 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Figura 1: Capas de Marie Claire com manchetes que sugerem uma discussão
sobre o corpo feminino.
Fonte: Acervo Digital.
CORPOS VISÍVEIS E ATIVISMO: O STATUS QUO DE CELEBRIDADES 161
NA PAUTA DO CORPO FEMININO EM MARIE CLAIRE
47 Vale destacar que a circulação da capa nas redes sociais antes de sua publicação impres-
sa gerou certa repercussão porque a imagem de Letícia com os seios à mostra foi censura-
da pelo Instagram, com “a justificativa de descumprimento das diretrizes sobre nudez ou
pornografia”. Disponível em: https://revistamarieclaire.globo.com/Mulheres-do-Mundo/
noticia/2018/11/instagram-censura-topless-de-leticia-colin-em-perfil-da-diretora-de-re-
dacao-de-marie-claire.html Acesso em: 29/04/2019.
162 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
que registra em ângulo sua axila com pelos. A imagem da atriz e o que
ela representa (para a revista) traz ao campo da visibilidade midiática
uma reflexão sobre o feminismo aguerrido, a opinião política, a inde-
pendência em relação à ditadura da depilação e seu relacionamento com
outras mulheres. Materializados na seguinte frase, presente na linha fina
que abre a reportagem: “Bruna Linzmeyer representa o que desejamos
para as mulheres em 2019: liberdade, autoconfiança e poder”.
Neste texto, não está em discussão a forma como as revistas atuam
na celebrização dos sujeitos, mas observamos o ativismo editorial da
revista e certa celebrização da pauta feminista sobre os corpos por meio
do acionamento da opinião e a experiência pessoal de celebridades.
Portanto, ao impulsionar o debate público sobre o feminismo tendo
esses sujeitos célebres como porta vozes, Marie Claire reforça alguns
pilares de seu contrato de comunicação: o tipo de conteúdo, o perfil
de público presumido e o estilo de vida e ação no mundo. Conforme
indica em seu slogan - “Chique é ser inteligente. Marie Claire é uma
revista feminina realmente completa, para uma mulher de atitude, com
estilo e conteúdo” - a revista orienta seus leitores a certa conduta (ter
atitude), ancorada na exposição consentida da intimidade das cele-
bridades, como estratégia de aproximação e encorajamento. Assim, a
força semântica dos títulos como Aborto não é crime, Meu corpo, minhas
regras, Livre, sim potencializam a estratégia editorial de trazer na capa o
protagonismo das celebridades (algo do tipo inspire-se nela) e, somente
em algumas seções internas, publicar as experiências de pessoas que não
estão vinculadas à dinâmica da visibilidade midiática.
Rojek (2008, p. 11) destaca a crescente importância do rosto público
como reflexo de uma “sociedade que cultiva o estilo pessoal como antí-
doto para a igualdade democrática formal”. Para o autor, as celebridades
são fabricações culturais e a forma como administram suas emoções,
seja humanizando ou dramatizando, gera impacto sobre a consciência
pública. Da mesma forma, vale destacar que o limiar do público e do
privado em relação às ações dos sujeitos célebres também chama a
atenção dos holofotes.
CORPOS VISÍVEIS E ATIVISMO: O STATUS QUO DE CELEBRIDADES 163
NA PAUTA DO CORPO FEMININO EM MARIE CLAIRE
Por outro lado, como destaca Simões (2013, p. 110), “as pessoas
famosas se tornam onipresentes na vida cotidiana, a partir da circulação
166 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
49 Por se tratar de uma abordagem específica sobre a visada conceitual acerca do corpo,
restringimos a abordagem, mas reconhecemos a existência de outras frentes teóricas que
levam em consideração, por exemplo, aspectos como as interdições dos corpos (FOU-
CAULT, 1993) e a modelização do corpo feminino pela cultura (WOLF, 2018; JAGAR e
BORDO, 1997). Este último aspecto é bastante explorado em recortes empíricos que con-
templam os padrões de beleza e os parâmetros do corpo perfeito na mídia.
CORPOS VISÍVEIS E ATIVISMO: O STATUS QUO DE CELEBRIDADES 169
NA PAUTA DO CORPO FEMININO EM MARIE CLAIRE
50 O recorte conceitual e empírico utilizado para a elaboração deste artigo faz parte da
pesquisa desenvolvida no âmbito da Iniciação Científica, na Universidade Federal de
Ouro Preto, intitulada “A (in)visibilidade dos corpos e o ativismo editorial em Marie
Claire: modos de aparição dos sujeitos e apropriações simbólicas” (Edital 03/2019, PIBI-
C-CNPq 2019-2020).
CORPOS VISÍVEIS E ATIVISMO: O STATUS QUO DE CELEBRIDADES 171
NA PAUTA DO CORPO FEMININO EM MARIE CLAIRE
A seção Especial, por sua vez, não tem destaque na capa, mas é um
exemplo da discussão sobre a visibilidade dos corpos ancorada nas
histórias de personagens que não são celebridades nem protagonizam
a capa como lugar de destaque. Nesta edição, a revista convidou seis
mulheres para escrever uma carta para si próprias: Dandara Pagu,
CORPOS VISÍVEIS E ATIVISMO: O STATUS QUO DE CELEBRIDADES 173
NA PAUTA DO CORPO FEMININO EM MARIE CLAIRE
4 Considerações Finais
Entendemos que os ativismos, de alguma forma, configuram uma
aposta editorial de muitas publicações segmentadas, não apenas uma
estratégia de Marie Claire. Para pensar o mercado editorial das revistas
atualmente, é necessário levar em consideração o cenário de crise que
vem assolando os impressos e impondo um olhar atento aos fenômenos
sociais e ao debate público, além de suscitar novas formas de se rela-
cionar com o público para se manter em circulação. Neste sentido, desde
a chegada das novas tecnologias de comunicação e a possibilidade da
comunicação integrada e instantânea viabilizada pela Internet, muitas
revistas impressas sucumbiram e declararam seu fim, enquanto outras
ainda resistem e apostam em novos formatos de leitura, conteúdo e
interação com o público. No caso das revistas direcionadas ao público
feminino, há ainda o potencial dos anúncios publicitários que dialogam
com o contrato de comunicação e constituem um pilar fundamental
para manutenção do produto impresso (vender um estilo de vida reforça
também o comércio de determinadas marcas).
Mas, é justamente no debate em ebulição nas redes sociais que a
reunião de pauta parece ter seu grande motivador editorial. Parece. No
caso de Marie Claire há uma aposta nítida no ativismo editorial cele-
CORPOS VISÍVEIS E ATIVISMO: O STATUS QUO DE CELEBRIDADES 181
NA PAUTA DO CORPO FEMININO EM MARIE CLAIRE
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CORPOS VISÍVEIS E ATIVISMO: O STATUS QUO DE CELEBRIDADES 183
NA PAUTA DO CORPO FEMININO EM MARIE CLAIRE
Capítulo 8
Youtubers mirins e as subjetividades
infantis contemporâneas
Renata Tomaz
1 Introdução
O fenômeno dos youtubers mirins, crianças que chegam a ter milhões
de inscritos em seus canais no YouTube e bilhões de visualizações em
seus vídeos, é cada vez mais um lugar produtivo para compreendermos
a emergência de figuras públicas infantis e as reverberações dessa
presença nos diferentes cenários da contemporaneidade. A produção
de conteúdo audiovisual para a internet, por meninos e meninas que
ainda cursam o ensino fundamental, permite que se desloquem para
uma posição de relevo social e, assim, alcancem distinção em relação a
outras crianças usuárias da plataforma, revelando novos tipos subjetivos
infantis, dentre os quais está o da criança famosa.
A pesquisa da qual este paper se origina problematiza a presença
pública das crianças por meio dos usos que fazem das mídias digitais.
Intenciono investigar as repercussões de tamanha visibilidade e veri-
ficar se as práticas de youtubing podem amplificar suas vozes nas socie-
dades em que estão inseridas. Interessa-me saber, portanto, de modo
mais amplo, se a celebridade dos chamados youtubers mirins poderia se
186 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
4 Da visibilidade à audibilidade?
Conforme exponho acima, a emergência de figuras públicas infantis é
um fenômeno localizado historicamente, de caráter cada vez mais midi-
ático. Defendi, ainda, que o YouTube contribuiu fundamentalmente para
a formação de uma nova modalidade de fama entre as crianças, permi-
57 Tradução livre de: “with its clarity, simplicity and conviction […], its seamless conso-
nance with the reigning tenets of a neoliberal ideology”.
58 Tradução livre de: “YouTube has created an opportunity for the average person to build
his or her personal brand”.
196 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
59 Tradução livre de: “the aggregate of the actual or potential resources which are linked
to possession of a durable network of more or less institutionalized relationships of mutual
acquaintance and recognition”.
198 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
E essa rede, por sua vez, poderá ser comodificada, na medida em que
o número de inscritos de um canal e de visualizações de seus respec-
tivos vídeos incide diretamente no CPC (Custo Por Clique), indicando
o potencial monetário de cada canal60. Quanto mais inscritos e visuali-
zações, ou seja, quanto maior for a rede do canal, mais chances ela tem
de atrair anunciantes. É possível dizer, então, que esse tipo de capital
social também confere distinção aos seus detentores, uma vez que, ao
mobilizarem milhões de usuários em torno de seus nomes, legitimam
a vida de celebridade mirim como um modo prestigioso de estar no
mundo. Valendo-se de tais recursos, distinguem-se de outras crianças
quando se deslocam para uma posição de relevância social. As intera-
ções provocadas pelos youtubers, nessa perspectiva, ensejam relações de
poder, que apontam modos eficazes pelos quais a mídia se configura
como um lugar legítimo de construção de realidades.
Com base nessa percepção, defendo que a celebridade dos produ-
tores infantis de conteúdo, sustentada por tão grande rede, repercute
nas relações sociais mais amplas. Um desses impactos pode ser visto nas
ações desencadeadas por organizações de defesa do direito das crianças,
como o Instituto Alana, que acionou o Ministério Público por meio da
denúncia de prática publicitária abusiva nos canais de youtubers mirins.
A pressão sobre as marcas e fabricantes, que interpelam as crianças
enviando produtos com a expectativa de serem gratuitamente promo-
vidos, já tem efeitos sobre o próprio conteúdo dos vídeos. Em muitos
deles, independentemente do ritmo do processo, a descrição passou
a avisar que os produtos exibidos foram comprados com recursos
próprios. A ilustração mostra que o modo como as crianças são retra-
tadas impulsiona ações, nesse caso de organizações sociais, do direito e
da justiça, que, por sua vez, afetam a própria maneira de produzir nos
canais.
As múltiplas imagens e conteúdos que circulam pelas plataformas
digitais são cotidianamente carregadas de sentidos e significados que
60 “Desde 2020, os vídeos infantis do YouTube não podem mais ser monetizados via pla-
taforma. A ação é resultado de um conjunto de medidas anunciadas depois que a empresa
Google, dona do YouTube, foi multada em 170 milhões de dólares por coletar inadvertida-
mente dados das crianças usuárias site. “
YOUTUBERS MIRINS E AS SUBJETIVIDADES INFANTIS CONTEMPORÂNEAS 199
5 Considerações finais
A passagem das crianças de uma vida comum para uma vida de cele-
bridade tem suas raízes, como posto acima, na cultura popular europeia
e estadunidense, entre os séculos XVIII e XIX. Mas se estende com as
estrelas mirins do cinema hollywoodiano e se intensifica com a ascensão
das mídias eletrônicas, ao longo do século XX. No Brasil, os rituais
midiáticos que deslocaram as crianças para o lugar da celebridade são
tributários especialmente da televisão. Contudo, mais recentemente, o
aumento do acesso de meninos e meninas às mídias digitais ampliou as
oportunidades de uma criança se tornar uma celebridade.
Procurei mostrar, ainda, que esse processo depende menos de os
mais jovens terem uma habilidade específica, e mais da sua disposição
em se constituírem como uma marca pessoal, através de uma sistemá-
tica e voluptuosa produção de conteúdo audiovisual para a internet. A
possibilidade de monetizar os vídeos publicados no YouTube insere a
produção de conteúdo em um plano de negócios no qual a capacidade
de manter-se visível é premiada e recompensada tanto em termos pecu-
niários quanto simbólicos. Além de receita, os youtubers alcançam rele-
vância social.
É a partir dessas condições de possibilidade que as meninas e
os meninos youtubers conseguem expandir cada vez mais sua rede
de inscritos e seguidores, por meio da qual se tornam cada vez mais
conhecidos, atingindo graus paulatinamente maiores de influência,
rapidamente comodificada no âmbito da plataforma. Nesse sentido, a
pergunta que faço é se tal fenômeno se restringe a conferir às crianças
visibilidade midiática ou se comporta algum tipo de audibilidade, ou
seja, se permite que as crianças sejam ouvidas em suas especificidades.
Termino este paper, portanto, não com resultados de uma busca, mas
com o problema com base no qual darei seguimento ao estudo. Não se
trata, neste sentido, do que encontrei, mas do que estou indo em busca
para compreender as repercussões da presença inconteste das crianças
no YouTube, como figuras públicas.
YOUTUBERS MIRINS E AS SUBJETIVIDADES INFANTIS CONTEMPORÂNEAS 201
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Célebres e famosos
na cultura e na política
204 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Capítulo 9
Personagens personalidades: heróis que
revelam (e vilões que desvelam) valores e
anseios na contemporaneidade
Renné França
1 Introdução
Em junho de 2013, uma notícia correu pela internet gerando curiosi-
dade e risos: Robert Downey Jr., um dos atores mais famosos e mais bem
pagos do mundo, “desapontou” um fã por simplesmente ser quem ele é.
Ao encontrá-lo, Jaxson Denno, de um ano e meio, começou a chorar não
de felicidade, mas por descobrir que Downey Jr. era só um ator, e não
o Homem de Ferro de verdade61. O caso com sabor de anedota lembra
situações parecidas de atores de novela que já apanharam nas ruas do
Brasil confundidos com seus personagens - e chama a atenção para o
poder da ficção. Ao longo dos tempos, os seres humanos vêm lidando
com figuras lendárias e/ou inventadas, sejam heróis semideuses como
61 “Robert Downey Jr. Acalma criança que chorou ao descobrir que o ator não é o Homem
de Ferro”. Uol. Disponível em: https://cinema.uol.com.br/noticias/redacao/2013/06/14/
robert-downey-jr-acalma-crianca-que-chorou-ao-descobrir-que-o-ator-nao-e-o-
homem-de-ferro.htm. Acessado em: 27/04/2019.
206 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
2 A personagem
A origem dos estudos narrativos remete à Poética. Registrada entre
335 e 323 a. C., a obra é um conjunto das argumentações de Aristó-
teles a respeito do discurso literário, em que são discutidos a natureza da
poesia e seus tipos, dando maior atenção à Tragédia como forma narra-
tiva mais completa a partir de suas análises de peças do teatro grego.
Aristóteles chama a atenção para dois aspectos fundamentais do herói
trágico como centro da narrativa: a personagem como reflexo da pessoa
humana e a personagem como construção, cuja existência obedece às
leis particulares que regem o texto. Apresenta uma concepção da perso-
nagem como resultado de um encontro entre uma imitação do real e a
verossimilhança interna da obra.
Assim como Mickey Mouse dez anos antes, Superman surgiu como
representação de valores mais simples, o bem versus o mal sem escalas
cinzentas. Uma âncora moral em meio a uma época de turbulências.
Mas, mais do que isto, a personagem trazia a revolução narrativa de ser
dois em um, ampliando a identificação com seu público e expandindo
suas possibilidades como avatar dos Estados Unidos dos anos 1930.
62 Alien (termo normalmente relacionado ao ser alienígena vindo de outro planeta, como
é o caso do Superman) é também a forma como se refere nos Estados Unidos ao Outro não
pertencente à sociedade: o imigrante, o estrangeiro.
214 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Superman era o clássico herói a ser admirado, mas Clark Kent era a
personagem que permitia ao público ir além da admiração e encontrar
identificação. A característica de semideus parecia se dividir em dois
corpos, o divino e o humano, modificando para sempre a estrutura de
construção de seres heroicos na indústria cultural. As personagens céle-
bres representadas nas instâncias midiáticas, sejam eles ficcionais ou
não, possuem em comum esta ambivalência Super-Homem/Clark Kent:
são idolatradas por seus feitos, mas é a sua dimensão falha que parece
despertar o carisma, o algo mais que as tornam celebridades fascinantes.
3 Celebridade e personagem
Seja na epopeia de Homero ou nos quadrinhos de Siegel e Shuster
(ou nas colunas de fofoca de jornais impressos e digitais), as relações
entre personagens e as épocas em que foram retratados passam por um
todo estético, que organiza e seleciona de acordo com as configura-
ções artísticas e de consumo. Trata-se de personagens-avatares, signos
moldados muitas vezes de forma a provocar identificação imediata a
partir de características muito bem articuladas dentro de seu contexto:
personagens como o próprio Superman possuíram diferentes autores ao
longo de décadas, permitindo sua reinvenção em contextos distintos a
partir de sua estrutura sígnica de heroísmo.
Por isso, defende-se aqui que determinados personagens ficcionais
encontram proximidades com a concepção das celebridades enquanto
personalidades que condensam noções e valores que são partilhados
de forma coletiva por um grupo, suscitando interesse e adesão, sendo
capazes de mobilizar e sensibilizar uma grande audiência. Seres dotados
de um carisma (que se manifesta em alguém em proximidade com os
PERSONAGENS PERSONALIDADES: HERÓIS QUE REVELAM 215
(E VILÕES QUE DESVELAM) VALORES E ANSEIOS NA CONTEMPORANEIDADE
valores de sua época, com potencial para revelá-los) e que dão a ver
determinados quadros de valores em uma dada sociedade63.
Parece haver um processo de ficcionalização promovido dentro das
instâncias midiáticas que caminha exatamente para transformar pessoas
em personagens. O Star System que dominou Hollywood entre os anos
1930 e 1950 existia não apenas a partir de um controle dos estúdios de
cinema sobre o tipo de filmes que seus atores sob contrato podiam fazer,
mas também por um controle sobre a vida pessoal desses mesmos atores.
Após serem testados em diversos papéis e gêneros de filmes, eles eram
associados a determinado “tipo” (o aventureiro, o gangster, a mocinha
pura, a sedutora, o milionário, o vagabundo, o caubói) e obrigados por
contrato a repetirem-se em diferentes produções, além de adotar uma
vida pessoal pública que condizente com o “tipo” que encaravam nas
telas, mesmo que não fosse verdade. A construção de falsas biografias
de astros pelos estúdios existe desde 1911, em um sistema que foi se
tornando cada vez mais especializado em transformar atores em perso-
nagens da “vida real”.
E por que não pensar no caminho inverso? Um personagem ficcional
que invade a realidade, ganhando ares de celebridade? Um constructo
narrativo de tal forma concebido dentro de um determinado ethos que
acaba por se apresentar de maneira mais clara como reflexo de valores
compartilhados? Livre de amarras legais e éticas – uma vez que tem sua
gênese na liberdade criativa da ficção – a personagem poderia, inclusive,
se apresentar de forma mais livre, desavergonhada em relação à socie-
dade que a abriga e consome.
64 “Farda do Bope foi hit em 2008; relembramos fantasias que bombaram em outros car-
navais”. Vírgula. Disponível em: http://www.virgula.com.br/inacreditavel/farda-do-bope-
-foi-hit-em-2008-relembramos-fantasias-que-bombaram-em-outros-carnavais/. Acessa-
do em: 27/04/2019.
65 “Internautas elegem Capitão Nascimento como maior herói do cinema na história”.
Disponível em: https://ultimosegundo.ig.com.br/cultura/cinema/2012-10-28/internau-
tas-elegem-capitao-nascimento-como-maior-heroi-do-cinema-na-historia.html. Acessa-
do em 26/04/2019.
PERSONAGENS PERSONALIDADES: HERÓIS QUE REVELAM 219
(E VILÕES QUE DESVELAM) VALORES E ANSEIOS NA CONTEMPORANEIDADE
66 Entrevista de Wagner Moura ao portal G1. “’Que fique claro: eu não sou o Capitão
Nascimento’, diz Wagner Moura”. 04/10/07. Disponível em: http://g1.globo.com/Noti-
cias/PopArte/0,,MUL144175-7084,00-QUE+FIQUE+CLARO+EU+NAO+SOU+O+-
CAPITAO+NASCIMENTO+DIZ+WAGNER+MOURA.html. Acessado em: 27/04/2019.
67 “Wagner Moura: Eu não votaria no Capitão Nascimento para presidente”. Disponível
em: https://blogdacidadania.com.br/2019/02/wagner-moura-eu-nao-votaria-no-capitao-
-nascimento-para-presidente/. 02/02/19. Acessado em: 26/04/2019.
220 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
68 Este trabalho partiu das metodologias de Vanoye e Goliot (2002) e Bordwell,e Thomp-
son (2014) para a análise da linguagem do filme.
PERSONAGENS PERSONALIDADES: HERÓIS QUE REVELAM 221
(E VILÕES QUE DESVELAM) VALORES E ANSEIOS NA CONTEMPORANEIDADE
Figura 10: Print de montagens que circularam nas redes sociais durante as
manifestações populares de 2013 no Brasil.
Fonte: Elaboração própria a partir de imagens (autoria desconhecida) encon-
tradas no Facebook e no Twitter.
222 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
69 BARROS, Olavo. “O Efeito Tropa de Elite”. The Huffpost. Disponível em: https://www.
huffpostbrasil.com/olavo-barros/o-efeito-tropa-de-elite_a_21687176/. Acessado em:
28/04/2019.
70 LIMA, Carlos Rodrigues. “O Triunfo do Capitão Nascimento”. Sábado. Disponível em:
https://www.sabado.pt/opiniao/cronistas/carlos-rodrigues-lima/detalhe/o-triunfo-do-ca-
pitao-nascimento. Acessado em: 28/04/2019.
PERSONAGENS PERSONALIDADES: HERÓIS QUE REVELAM 223
(E VILÕES QUE DESVELAM) VALORES E ANSEIOS NA CONTEMPORANEIDADE
Figura 13: Prints de imagens utilizadas por apoiadores de Bolsonaro nas redes
sociais durante a campanha presidencial.
Fonte: Redes Sociais.
5 Apontamentos finais
As celebridades – e os políticos – parecem buscar nas concepções
clássicas de construção de personagens ficcionais o modelo para criar
uma persona pública para si mesmos. A eleição de 2019 na Ucrânia é
exemplar neste sentido: o ator e comediante Volodymyr Zelenskiy, que
se tornou popular em seu país interpretando um professor de História
que, inesperadamente, é eleito presidente do país na série Servo do Povo,
evitou debates e fez uma campanha baseada na divulgação de vídeos nas
redes sociais. Acabou repetindo o destino de seu personagem, sendo
eleito presidente com 73% dos votos71.
A fronteira realidade-ficção fica cada vez mais embaçada não apenas
com a alta disseminação de notícias falsas, mas também com estas
relações complexas entre personagens-pessoas-celebridades. O estudo
da construção de uma personagem ficcional e dos sentidos que agrega
enquanto celebridade pode ajudar a compreender seus impactos na
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228 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
229
Capítulo 10
O Triunfo de Emicida – um rap em dois
momentos
Denise Prado72
72 Esta pesquisa foi desenvolvida em sua primeira fase, com Bolsa de Auxílio ao Pes-
quisador da UFOP (Edital Propp/UFOP - 07/2018) e, posteriormente, com Bolsa de Pós-
-Doutorado Júnior, concedida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico – CNPq (Processo: 160879/2019-1), realizada na Universidade Federal do
Rio de Janeiro.
230 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
74 Esse discurso pode ser exemplificado por um fragmento de “Capítulo 4, versículo 3”,
dos Racionais: “Vinte e sete anos contrariando a estatística/ Seu comercial de TV não me
engana/Eu não preciso de status nem fama/ Seu carro e sua grana já não me seduz/ E nem
a sua puta de olhos azuis/Eu sou apenas um rapaz latino-americano/ Apoiado por mais de
50 mil manos/Efeito colateral que o seu sistema fez”.
O TRIUNFO DE EMICIDA – UM RAP EM DOIS MOMENTOS 235
75 Apesar disso, é de se destacar que nos últimos anos mesmo o grupo Racionais tem
participado de eventos com grandes patrocinadores, cobrando cachês elevados. Mesmo
assim, este grupo ainda é bastante seletivo nas suas aparições e nega sucessivamente a
exposição em situações que considera comprometedoras de seu papel no mundo do rap.
Para mais informações sobre as transformações na obra recente do grupo, vide Alvarado
Júnior (2018)
236 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
rado nos abismos de si mesmo. Tanto esse desejo como essa demanda
de autotransparência assumem que há um ser e uma verdade ‘dentro’ de
cada um de nós” (SIBILIA, 2015, p. 358, grifos da autora).
Essa forma discursiva – que procura ancorar um lugar de autentici-
dade para si mesmo – coloca o enunciador como o portador confiável
de um discurso “verdadeiro”. Para sustentar esse tom, deve-se trazer
elementos que deem pistas de sua veracidade, legitimando um lugar
de autoridade. A construção da autoridade está associada, para Sibilia,
a um contexto em que mais do que se reconhecer ou pertencer a um
grupo (mais do que ser alguém), é importante conquistar, aos olhos dos
outros, o reconhecimento desta posição:
Emicida coloca o rap como uma instância algo mítica, algo transcen-
dental, que seleciona aqueles que merecem ocupar o papel de rapper: ele
seria um agraciado que, ao mesmo tempo que está honrado por receber
esse dom, precisa agir à altura do que lhe foi concedido. Diante disso,
questiona-se: o que o faz ser o escolhido? O que o legitima e o autoriza a
ser um rapper? Logo na sequência, emerge um discurso autocongratula-
tório: ele teria sido escolhido por possuir três características: um poder
espiritual, resistência moral e lealdade.
O poder espiritual seria aquilo que faz com que “só de ver o brilho
no meu olho os falso já recua”; quer dizer, ele teria algum tipo de poder
transcendental que afasta os dissidentes ou contrários a ele – os falsos –
de sua presença.
A resistência moral se refere à sua imunidade à sedução do consumo
(“não é qualquer dinheirinho que vai tirar a lucidez que eu carrego na
mente, tio”). Por resistir, ele se permite afirmar que são “otários” aqueles
240 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
77 O Império Ashanti, que existiu entre o século XVIII e XIX, era localizado na África
Ocidental, na região conhecida hoje como Gana. Durante sua ascensão, esse império foi o
grande propulsor do desenvolvimento das artes e do artesanato e se tornou um importante
polo comercial de abastecimento de ouro, manufaturas, armas. O Império Ashanti, com
forte tradição militarista, se constituiu como um dos maiores focos de resistência à coloni-
zação britânica (OGOT, 2010; HERNANDEZ, 1999).
O TRIUNFO DE EMICIDA – UM RAP EM DOIS MOMENTOS 241
mazelas e, por isso, questionar sua autoridade seria leviano: “Já escrevi
RAP com as ratazana passeando em volta, tiu/ Goteira na telha tremendo
de frio/Quantos morreu assim e no fim quem viu? Meu!/’Cês ainda quer
mermo ser mais rua que eu?”.
Ele dá ênfase a esse último verso durante o clipe: fala encarando a
câmera, em contrapelo ao telespectador, reivindicando sua autoridade.
Nesse momento, vemos a articulação traçada por Sibilia entre perfor-
mance e autoridade, na qual a verdade da sua identidade aparece no
seu gesto performático de encarar o público em tom inquisidor. O frag-
mento “as ratazana passeando em volta” opera como um marcador do
real, uma pista que acena para o mundo material e funciona como um
elemento garantidor da autenticidade do seu discurso.
Além de reafirmar que se pode crer nele como o guerreiro escolhido
pelo rap, é preciso acreditar no papel do próprio rap e reforça-lo, reafir-
mando-o a partir do discurso de que o gênero seria um reduto de resis-
tência – fazendo aqui a ponte com a constituição do gênero forjada na
velha geração: “Se o rap se entregar a favela vai ter o quê?”.
Logo na sequência, o artista retoma o discurso que apela à necessi-
dade de confiar em sua autoridade e valor como rapper, fazendo uma
“promessa” diante de seu público e assegurando o compromisso e a
responsabilidade para com os seus: “Se o general fraquejar o soldado
vai ser o quê?/ Tem mais de mil moleque aí querendo ser eu/ Imitando o
que eu faço, tio, se errar fudeu!/ Ser MC é conseguir ser H ponto aço78”.
Em meio a esse discurso de apresentação como rapper/guerreiro,
entremeado por referências e valores característicos da velha geração,
aparecem pistas para entrever a transformação do rap na nova geração:
“Nóiz quer mulher sim, quer um dim também/ Quer vê todos neguinho
lá vivendo bem/ Só que ai pra mim a luta vai além/ Quem pensar peque-
ninin tio vai morre sem” e o uso do refrão “A rua é nóiz”.
Os versos fazem referência a uma ansiedade por alcançar sucesso
financeiro (ainda que como projeto coletivo) e uma crença na lógica da
78 “H ponto Aço” é uma referência à música “Homem de aço”, do grupo DMN, da velha
geração, que ressalta a dificuldade de resistir diante de todas as pressões que eles sofrem
para não aceitarem os “atalhos” da vida.
242 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
79 Uma das frases mais famosas de Rocky Balboa é “Você, eu, ninguém vai bater tão forte
como a vida, mas não se trata de bater forte. Se trata de quanto você aguenta apanhar e
seguir em frente, o quanto você é capaz de aguentar e continuar tentando” (Rocky VI), e
sintetiza esta ideia de resistência associada à figura deste boxeador no cinema.
244 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
grado gesto de “N” com os dedos durante o refrão “a rua é nóiz”. A agres-
sividade dos gestos do primeiro clipe, o esforço de encarar a câmera para
interpelar o público e colocá-lo no lugar daquele para quem o rapper
precisa provar seu valor já não existem mais. Ele tem uma atitude mais
festiva, inclina-se para o público do show, deixa o público cantar. Os
planos da câmera são trocados em ritmo acelerado e exibe-se uma
grande quantidade de closes de pessoas do público cantando junto do
artista e com os olhos vidrados no palco: o enfoque aqui é a vinculação
afetiva, o laço emocional entre artista e público.
Nesse momento, há uma representação da celebração, no qual o
Triunfo se torna tangível: ele mostra a sua potência no cenário do rap.
No palco, ele vive a cerimônia do triunfo prometido dez anos atrás. Mais
do que um single de apresentação, como foi em 2008, ali, o rap é posto à
prova e vem referendar e reconhecer o sucesso de Emicida. Na narrativa
do novo clipe, nenhum elemento é aleatório. Os longos aplausos ao final
e os gritos da plateia, a vastidão do público presente na casa de shows,
o excesso de luzes e flashes na tela reafirmam que o triunfo aconteceu:
guerreiro, Emicida sagrou-se rapper e alcançou o sucesso.
4 Considerações finais
Triunfo se constitui como uma convocação, um chamamento para
a batalha e uma afirmação de si. Ela se traduz numa dupla valorização:
eleva-se o rap pelo seu potencial político, pela sua força, pelo seu lugar
de resistência e este valor transborda para o rapper que se torna o repre-
sentante de um elevado lugar social, reconhecido, admirado pelo outros
e, de alguma maneira, responsável por estar à frente nas lutas e nas
disputas do social. Com esse gesto, o rapper se coloca como um guer-
reiro nas batalhas pelas conquistas de espaço, visibilidade e direitos no
quadro social mais amplo.
A música é construída como um momento de valorização, mas
também de celebrização de si: constituição de uma narrativa forte de
autopromoção, que atua em prol do sucesso do artista, estimula sua
conquista por visibilidade. Triunfo surge em 2008 como um rap de exal-
tação de Emicida e do próprio lugar do rap. Com isso, estabelece uma
valorização cruzada: saem valorizadas e atualizadas as percepções do
O TRIUNFO DE EMICIDA – UM RAP EM DOIS MOMENTOS 245
Referências
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248 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
249
Capítulo 11
Os escândalos políticos como propulsores
da fama: a construção da notoriedade de
Sérgio Moro no contexto da Lava Jato
Terezinha Silva80
1 Introdução
Este artigo tem um duplo objetivo. O primeiro é pensar os escândalos
como um tipo de acontecimento que não somente esvazia a reputação e
a confiança em atores e instituições (THOMPSON, 2002), como possi-
bilita a construção de imagem favorável e notoriedade para determi-
nados atores. Partindo desta ideia, nosso segundo objetivo é estimular
uma reflexão sobre o modo como a notoriedade dos atores é tratada no
âmbito do jornalismo, no qual é considerada um valor-notícia impor-
tante no processo de seleção e tratamento de temas e acontecimentos,
mas geralmente é pouco problematizada; é naturalizada como algo
sempre preexistente ao trabalho de constituição e visibilidade midiá-
tico-jornalística.
Parte-se de uma breve discussão a respeito da presença constante de
escândalos políticos nas democracias modernas, suas consequências e
81 Dentre elas, democratização em países que antes viviam em ditaduras, liberdade de im-
prensa e expressão, concorrência entre mídias e busca por audiência, desenvolvimento de
dispositivos tecnológicos de gravação e difusão de informações, criação ou fortalecimento
de instituições de controle e fiscalização, como Ministério Público e Polícia Federal, por
exemplo. .
OS ESCÂNDALOS POLÍTICOS COMO PROPULSORES DA FAMA: A CONSTRUÇÃO 251
DA NOTORIEDADE DE SÉRGIO MORO NO CONTEXTO DA LAVA JATO
3 Metodologia
Para analisar a construção da notoriedade do juiz Sérgio Moro no
contexto da operação Lava Jato no Brasil adotamos métodos comple-
mentares: quantitativo e qualitativo. Na primeira parte da pesquisa,
quantificamos a presença de Sérgio Moro em portais de notícias e
revistas semanais de informação, com o objetivo de identificar em que
momento da Lava Jato o então juiz começa a ganhar destaque, e em
OS ESCÂNDALOS POLÍTICOS COMO PROPULSORES DA FAMA: A CONSTRUÇÃO 255
DA NOTORIEDADE DE SÉRGIO MORO NO CONTEXTO DA LAVA JATO
87 Dados do site da revista indicam que Veja possui uma circulação de 567.991 exem-
plares, sendo 530.270 assinaturas e 37.721 em vendas avulsas. Fonte: IVC/agosto 2019,
disponível em: publiabril.abril.com.br/svp/tabelas/circulacao?platform=revista-impressa-
-mais-digital . Acesso: 10/11/2019.
88 O site foi escolhido devido à facilidade de acesso ao material. Além disso, disponibiliza
parte significativa do conteúdo publicado na versão impressa, ao menos no que diz respei-
to aos temas políticos que ganham destaque na revista.
258 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
2014 2015
Mídia Textos Títulos Total Textos Títulos Total
G1 67 6 73 77 31 108
R7 7 0 7 34 8 42
TERRA 5 5 10 28 6 34
UOL 7 1 8 32 5 37
Total 86 12 98 171 50 221
CARTA 5 1 6 34 3 37
VEJA 34 5 39 123 28 151
ISTOÉ 4 0 4 29 0 29
ÉPOCA 19 0 19 77 15 92
FÓRUM 1 0 1 21 6 27
Totall 63 6 69 284 52 336
260 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
2016 2017
Mídia Textos Títulos Total Textos Títulos Total
G1 11 138 149 13 80 93
R7 58 15 73 91 75 166
FÓRUM 57 31 88 16 81 97
2018 Geral
Mídia Textos Títulos Total TOTAL
G1 3 122 125 548
R7 5 131 136 424
TERRA 6 184 190 465
UOL 40 203 243 678
Total l 54 640 694694 2115
Figura 14 – Sérgio Moro nas capas da revista Veja, entre 2014 e 2018. Fonte:
Reprodução do acervo (site da revista Veja).
90 Esta matéria jornalística é parte da reportagem de capa que a revista publicará na edi-
ção impressa de 05 de novembro, como costuma fazer em outros casos: primeiro, uma
parte do material jornalístico é divulgado via site e, posteriormente, é publicado na versão
impressa.
264 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
92 Declarações que a revista Veja atribui à juíza federal Salise Sanchotene, eleita, em se-
tembro de 2015, desembargadora do TRF-4ª região (Porto Alegre), tribunal onde as ações
da Lava Jato tiveram amplo respaldo desde o início da Operação.
OS ESCÂNDALOS POLÍTICOS COMO PROPULSORES DA FAMA: A CONSTRUÇÃO 267
DA NOTORIEDADE DE SÉRGIO MORO NO CONTEXTO DA LAVA JATO
94 Frase atribuída por Veja ao advogado tributarista Irivaldo Joaquim de Souza (VEJA,
30/04/2015, s/n).
95 Como os advogados de defesa de acusados na Lava Jato, caso de Marcelo Odebrecht,
preso em 19 de junho de 2015.
270 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
6 Considerações finais
A análise desenvolvida neste trabalho mostra que Sérgio Moro
obteve ampla visibilidade midiática no período em que desempenhou
o papel de juiz responsável pelos processos da Lava Jato (2014-2018).
Sua presença em diferentes mídias cresceu de forma intensa, quantita-
tivamente, sobretudo a partir de 2015. Além disso, ele obteve também
representações e avaliações extremamente positivas, na construção
narrativa da revista Veja sobre ele e sobre sua performance no cargo.
Mesmo antes de se tornar uma figura pública conhecida de um público
mais amplo, Sérgio Moro já é representado pela revista Veja como um
ídolo nacional respeitado e consagrado desde o final de 2014, oito meses
após o início dos trabalhos da operação Lava Jato, quando suas ações
ainda não tinham significativa visibilidade público-midiática. Ainda
assim, a narrativa da revista já o associa a um conjunto de características
e de valores que o igualam à figura de um herói, o que dá sustentação
à ideia que desenvolvemos neste trabalho, de que a revista Veja, pelo
lugar que ainda ocupa no cenário midiático-jornalístico e entre diversos
públicos, teve um papel fundamental na construção das representações
positivas incorporadas ao imaginário de vários segmentos da sociedade
brasileira acerca de Sérgio Moro e sua atuação na Lava Jato. A revista
o associa a um conjunto de características como: juventude, discrição
e humildade; dedicação, firmeza, pioneirismo, brilhantismo e compe-
tência profissional; idealismo e honestidade; determinação, intransi-
gência e coragem na sua cruzada contra poderosos interesses de empre-
sários, políticos ou seus advogados, envolvidos pelo que Veja qualifica
como o maior escândalo de propinas da história do país.
Tais características, que surgem do passado e da trajetória de sucesso
construída pela narrativa para o juiz Sérgio Moro e do vínculo esta-
belecido com a sua atuação no âmbito da Lava Jato, são reforçadas ao
longo de 2015. Outros elementos são incorporados às representações
antes feitas, assim como uma explícita estratégia de defesa de Sérgio
Moro através da neutralização de críticas feitas por diferentes atores, já
naquele contexto, à atuação do magistrado. Veja o vincula a um conjunto
de outras características como: talento e produção intelectual; rigor, mas
também generosidade, defesa da justiça social e dos vulneráveis; um juiz
OS ESCÂNDALOS POLÍTICOS COMO PROPULSORES DA FAMA: A CONSTRUÇÃO 275
DA NOTORIEDADE DE SÉRGIO MORO NO CONTEXTO DA LAVA JATO
“linha dura”, indignado, mas também zeloso dos direitos dos investi-
gados e da defesa da democracia; um juiz ativista, idealista e guiado pelo
sentido de missão de salvar o Brasil da corrupção.
Se o escândalo impulsionou, como vimos, a notoriedade do juiz Moro
enquanto figura pública destacável no cenário político, com sua atuação
reconhecida e respeitada entre segmentos da sociedade brasileira e
incensada por intensa e favorável visibilidade midiático-jornalística, é
importante perceber que o ator soube captar e utilizar estrategicamente
expectativas sociais acerca do problema público da corrupção. Sérgio
Moro constrói sua reputação e notoriedade relacionada ao combate à
corrupção, uma dimensão importante do prestígio, respeito e reconhe-
cimento - o seu capital simbólico (THOMPSON, 2002) - acumulados no
âmbito da atuação na Lava Jato. A análise sinaliza marcas de um trabalho
de relações públicas na interação entre a mídia e a figura pública estu-
dadas. Marcando presença em diferentes espaços e eventos públicos e
midiáticos, alimentando expectativas de mídias e seus públicos, o herói
da narrativa elogiosa da revista Veja soube utilizar o contexto e o escân-
dalo para visibilizar sua atuação e sua figura, para construir reputação
e notoriedade ligada ao problema da corrupção. Com isso, conquistou
capital político para continuar ocupando espaço na política e sendo
noticiável nas mídias jornalísticas.
A notoriedade, portanto, não é um valor-notícia intrínseco às figuras
notórias ou proeminentes às quais o jornalismo recorre ou fala cotidia-
namente. Ela não está dada nem se constitui à priori; é conformada em
condições, situações, acontecimentos e contextos específicos. A notorie-
dade de uma figura pública tem uma história, construída no laço entre
sua atuação, o contexto e as narrativas. Os acontecimentos e suas narra-
tivas projetam seus agentes, os quais podem adquirir ou reforçar noto-
riedade em função de papéis, valores e interesses que encarnam.
276 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Referências
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OS ESCÂNDALOS POLÍTICOS COMO PROPULSORES DA FAMA: A CONSTRUÇÃO 277
DA NOTORIEDADE DE SÉRGIO MORO NO CONTEXTO DA LAVA JATO
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VEJA. Juiz da Lava Jato multa Google e bloqueia R$ 2 milhões. 15/12/2014.
VEJA. Sergio Moro e petrolão são eleitos Personalidade e Fato do Ano na
enquete VEJA-Twitter. 27/12/2014.
VEJA. Sérgio Moro: ‘Para encontrar o chefe, siga o dinheiro’. 03/03/2015.
278 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Capítulo 12
Um JK para colecionadores: reflexões
sobre publicações jornalísticas de uma
biografia célebre
Frederico Tavares
98 Como afirma Amorim (2008, p. 113): “Mesmo nos momentos de crise nacional, Jusce-
lino Kubitschek é lembrado como o estadista que construiu Brasília e desenvolveu o país
num clima de democracia e de entusiasmo do povo. A lembrança impressa na memória do
brasileiro é a imagem enobrecida de um presidente que exerceu seu mandato com plena
vigência democrática, conseguindo, em grande parte, unir o povo brasileiro em torno da
ideologia desenvolvimentista”.
282 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
99 A relação de JK com Bloch e, pode-se dizer, com o periódico, foi tão próxima que o
corpo do ex-presidente chegou a ser velado na sede da revista Manchete antes de ser tras-
ladado a Brasília, em 1976, ano de sua morte.
100 Aragão (2006), em sua pesquisa comparativa sobre a representação de JK nas revistas
Manchete e O Cruzeiro, aponta para essa dimensão contextual que envolvia tanto a relação
Juscelino e imprensa quanto resgata diversos estudos que observaram essa mesma relação
de um ponto de vista crítico e historiográfico.
101 Vale ressaltar, entretanto, que mesmo na própria imprensa havia outros posiciona-
mentos em relação a JK. Como aponta Ronaldo Costa Couto em seu livro Brasília Ku-
bitschek de Oliveira (2001, p. 216), “Assis Chateaubriand, o poderoso e influente rei da
imprensa brasileira, dono dos Diários Associados, considerava a construção de Brasília
“uma loucura de Kubitschek e um crime contra o país”. Nessa esteira de posicionamento,
como afirma (Silva, 2003), a principal concorrente da revista Manchete, a revista O Cru-
zeiro, pertencente aos Diários Associados, tinha posicionamento crítico em relação a JK.
Romanello (2007) também indica uma cobertura crítica de O Cruzeiro em relação aos
Anos JK, apontando para algumas relativizações, na revista, do tom elogioso em relação
ao desenvolvimentismo econômico pregado para a época.
UM JK PARA COLECIONADORES: REFLEXÕES SOBRE 283
PUBLICAÇÕES JORNALÍSTICAS DE UMA BIOGRAFIA
102 “O ano de 2012 marca os sessenta anos de lançamento daquela que foi uma das mais
importantes publicações da história da mídia no Brasil: a revista Manchete, que, depois
de um tenso processo de falência, concluído em 2000, retornou às bancas, reformulada,
exatamente dez anos atrás, em 2002. Porém, voltou desfigurada em vários aspectos, com
algumas modificações gráficas, editoriais e sem a periodicidade semanal característica.
Passou a ser editada esporadicamente, geralmente por ocasião de grandes eventos, como
o carnaval, até desaparecer por completo. Um ponto final numa longa, tumultuada e inte-
ressantíssima trajetória histórica” (PÁDUA, 2013, p. 213).
286 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
103 “A história de MANCHETE está ligada à história de Brasília. [...] Documentando se-
manalmente, através de fatos e textos que se tornaram históricos, as diversas etapas da
construção da Capital da Esperança, a revista cresceu entre os leitores, adquiriu maiorida-
de técnica e ficou indissoluvelmente comprometida com os temas que fizeram JK edificar,
no coração do cerrado, a sua meta-síntese: o otimismo, a confiança no futuro e no Brasil.
A 21 de abril de 1960, dia da inauguração da nova capital, o povo brasileiro compreendeu
que Brasília e MANCHETE cresceram juntas” (Revista Manchete, ed. Especial, 40 anos,
outubro de 1992).
UM JK PARA COLECIONADORES: REFLEXÕES SOBRE 287
PUBLICAÇÕES JORNALÍSTICAS DE UMA BIOGRAFIA
105 São três volumes autobiográficos de JK, publicados pela Editora Bloch (pertencente
ao mesmo grupo que publicava Manchete): Meu caminho para Brasília: a experiência de
humildade. Rio de Janeiro: Bloch, 1974, v. I; Meu caminho para Brasília: a escalada polí-
tica. Rio de Janeiro: Bloch, 1976, v. II; e Meu caminho para Brasília: 50 anos em 5. Rio de
Janeiro: Bloch, 1978, v. III.
UM JK PARA COLECIONADORES: REFLEXÕES SOBRE 291
PUBLICAÇÕES JORNALÍSTICAS DE UMA BIOGRAFIA
106 Benevides (2002, p. 35) explica esse fato a partir da lembrança de sua própria convi-
vência com o ex-político: “Juscelino diferenciava-se bastante dos outros presidentes do
período pré-64. Foi o único civil, aliás, que cumpriu o mandato presidencial nos prazos
fixados pela Constituição (31/1/56 – 31/1/61), situando-se entre duas crises de efeitos de-
vastadores: o suicídio de um e a renúncia de outro”.
UM JK PARA COLECIONADORES: REFLEXÕES SOBRE 293
PUBLICAÇÕES JORNALÍSTICAS DE UMA BIOGRAFIA
política. Sabe-se que esta é uma identidade criada tendo em vista obje-
tivos políticos, entretanto, que carece ser compreendida em sua comple-
xidade, bem como nos limites que envolvem a construção da memória
capaz de forjá-la” (p. 05).
De um ponto de vista de seus entrecruzamentos – e considerando a
maneira como, por isso, a mídia se apropriou dessa tríade – fica evidente
que a terceira hipótese levantada por Carvalho (2014) carrega uma via
de mão dupla, traduzida não apenas na imagem que JK criou de si, mas
na interação que essa construiu com o próprio espaço público, permi-
tindo uma validade de sentidos, a todo momento, de natureza rela-
cional. Juscelino, nesse viés, criou estrategicamente uma duração sobre
si mesmo, algo ligado à sua (de si mesmo e de outros) leitura histórica
como celebridade política. Segundo afirma José Santana Pereira (2019,
p. 94),
107 Leonor Arfuch afirma: “Biografias, autobiografias, confissões, memórias, diários ínti-
mos, correspondências dão conta, há pouco mais de dois séculos, dessa obsessão por dei-
xar impressões, rastros, inscrições, dessa ênfase na singularidade, que é ao mesmo tempo
busca de transcendência” (ARFUCH, 2010, p. 15).
294 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
tê-la. Este sujeito, em seu gesto, enxerga nas unidades que são o objeto,
fragmentos de algo maior. “Por entre os objetos de seu colecionar, o
sujeito estabelece um critério que explica tal reunião” (VON KRÜGER,
2014, p. 77).
No caso de edições especiais de revistas (objetos colecionáveis por
natureza) tem-se tanto o apelo ao significado específico daquela edição
– como a edição especial de Manchete, por exemplo – quanto o que ela
significa no todo de uma unidade histórica, de uma serialidade. E essa
ambiência colecionista, assumida como dispositivo de memória sobre
uma personalidade, incide transversalmente, no caso aqui tratado – e
em outros de mesma natureza –, no gesto jornalístico e biográfico, já que
singulariza o personagem (Juscelino) em uma só edição, mas também
o sintetiza de maneira legitimada, organizando o caleidoscópio de sua
história pessoal entrelaçada a um contexto sócio-político a partir de um
entorno material e noticioso. Afinal, como lembra Bourdieu (1998, p.
189-190):
108 Segundo Arfuch (2016, p. 547), “en el debate público, el tiempo transcurrido marca un
crescendo en cuanto a la aparición de múltiples voces y una notoria diversificación de las
temáticas”. No caso da(s) biografia(s) e daquilo que os estudos sobre elas apontam, há uma
construção voluntária acerca de uma memória elogiosa e edificante sobre o ex-presidente,
dotada de nós de sentido que se repetem e se perpetuam como chaves-de-leitura possíveis.
UM JK PARA COLECIONADORES: REFLEXÕES SOBRE 297
PUBLICAÇÕES JORNALÍSTICAS DE UMA BIOGRAFIA
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UM JK PARA COLECIONADORES: REFLEXÕES SOBRE 301
PUBLICAÇÕES JORNALÍSTICAS DE UMA BIOGRAFIA
Capítulo 13
O Meia Hora e a presença de Anitta
Rodrigo Portari
1 Introdução
Explorar a relação entre figuras públicas e o jornalismo popular é
também refletir sobre critérios de noticiabilidade e modos de fazer desse
segmento. Os meios e empresas de comunicação que se enquadram
nessa categoria exploram diariamente diversos acontecimentos nos
quais essas personagens se fazem presentes, sempre buscando um ponto
de contato com o leitor na tentativa de criar uma proximidade entre o
meio e seu público. E, para isso, não se furtam em criar acontecimentos
a partir de casos na esfera da vida privada. Essa é uma das várias caracte-
rísticas da imprensa popular e, justamente diante da grande exploração
de atrizes, jogadores de futebol, atores e políticos (normalmente quando
estão envolvidos em polêmicas ou prisões), o trabalho de compreender
como esse segmento lida com as figuras públicas no âmbito de seu noti-
ciário precisa ser estudado e compreendido.
É justamente nesse sentido que caminha o jornal Meia Hora de Notí-
cias. Veiculado diariamente no Rio de Janeiro, vem suprir um segmento
de mercado crescente no país: jornais com apelo popular, que não se
intimidam em usar técnicas sensacionalistas, com baixo preço de capa,
306 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
mas que, por outro lado, têm crescente preocupação com sua credibili-
dade. Assim, se nas décadas de 1960 ou 1970 os jornais sensacionalistas
representavam a imprensa marrom, sem o menor pudor de inventar
histórias para seus leitores (vide o caso do Bebê Diabo, que durante
dias foi manchete no extinto Notícias Populares), atualmente os jornais
populares querem conquistar um público cativo e bem definido: leitores
de menor poder aquisitivo, da chamada Classe C (ou que se alçaram até
ela nos últimos anos), que se interessam prioritariamente por conteúdos
próximos ao seu cotidiano e que se dispõem a gastar pouco para ter
acesso a informações.
Esse perfil de leitor já foi tratado por diversos autores como Márcia
Franz do Amaral (2009), Wagner Alexandre dos Santos Costa (2016) e
também amplamente discutido em minha tese de doutorado em 2013.
Percebe-se nessas publicações um direcionamento específico para o
segmento de leitores a que pretendem atingir. Dessa forma, em suas
primeiras páginas e mesmo em seu conteúdo interno, assuntos como
política internacional, bolsa de valores ou economia em geral são
deixados de lado a menos que possam ser traduzidos de forma a mostrar
como podem afetar o dia a dia do público projetado.
É o que encontramos, por exemplo, nas capas do Jornal Meia Hora,
como as que, a título de exemplo, apresentamos a seguir:
110 O jornal foi lançado no ano de 2005 e, em 2010, passou para o domínio do grupo Ese-
ja. Voltado essencialmente para a Classe C, o jornal mantém sua versão impressa e on line
na Internet, sendo que os conteúdos de uma e outra versão não são idênticos. Nem sempre
os conteúdos da versão impressa estão na versão publicada na Internet, e vice-versa.
308 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
Valores Notícia
Jornais de Referência Jornais Populares
Os indivíduos envolvidos forem Possuir capacidade de entretenimento;
importantes;
For próximo geográfica ou culturalmente
Tiver impacto sobre a nação; do leitor;
Envolver muitas pessoas; Puder ser simplificado;
Gerar importantes desdobramentos; Tiver identificação dos personagens com
os leitores (personalização);
For relacionado a políticas públicas;
For útil.
Puder ser divulgado com exclusividade.
111 Fazemos referência aqui a uma das notícias alvo de um grande número de piadas
quando se discute as notícias no jornalismo, intitulada “Caetano estaciona carro no Leblon
nesta quinta-feira”, publicada pelo Portal Terra no ano de 2009. Passados mais de 10 anos
da notícia – na verdade uma fotogaleria do cantor Caetano Veloso atravessando uma rua
no bairro carioca – o fato ainda reverbera em memes e piadas sobre jornalismo. Fonte:
https://www.terra.com.br/diversao/gente/caetano-estaciona-carro-no-leblon-nesta-quin-
ta-feira,41d3399ae915a310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html. Acesso em 5/04/2019..
O MEIA HORA E A PRESENÇA DE ANITTA 311
112 No presente texto não estamos fazendo distinção entre o termo “acontecimento” e
“acontecimento midiático”. Desta forma, utilizamos o termo “acontecimento” para se refe-
rir também a notícias gerais publicadas nos jornais populares, independente de seu maior
ou menor poder de afetação. Desta forma, compreendemos que o jornal popular, ao es-
tampar em suas capas fatos corriqueiros das vidas das celebridades ou figuras públicas sob
o formato noticioso, está tratando atos banais como “acontecimentos” para seus leitores.
Desta forma, há um apelo dessas publicações em justificar a presença destes conteúdos
em suas capas, seja resgatando a memória do leitor para situações anteriores ou, então,
buscando afetar esse leitor por meio do entretenimento.
O MEIA HORA E A PRESENÇA DE ANITTA 315
3 Anitta
Para entendermos o entretenimento enquanto valor-notícia para os
jornais populares, faremos um recorte a partir da presença da cantora
Anitta nas capas do jornal Meia Hora de Notícias. No entanto, faremos
um breve histórico de sua vida e carreira que levaram a cantora ao status
de celebridade da música brasileira.
Nascida em 1993, Larissa de Macedo Machado é natural do Rio de
Janeiro e começou a cantar ainda com 8 anos de idade, participando
do coral de uma igreja da zona norte da capital carioca. Aos 16 anos,
começou a produzir vídeos e músicas para serem postados na Internet
e foi assim que um produtor musical a descobriu, levando-a para a
“Furacão 2000”, considerada uma das mais famosas produtoras de
música funk do Rio de Janeiro.
foi anunciado o divórcio dela. Após esse fato, sua primeira aparição no
Meia Hora se dá na notícia sobre o prêmio Multishow de Música Brasi-
leira, ocorrido em 25 de setembro do mesmo ano. Para compreender
essa construção da visibilidade conferida a Anitta pelo jornal realizamos
uma análise de 450 capas da publicação a fim de compreender como
Anitta passou a ser um acontecimento para essa publicação, estabele-
cendo como marco inicial o dia 1 de janeiro de 2018 e como marco
final de nossa observação o dia 30 de março de 2019114. Neste período, o
que nos chama a atenção é que antes de setembro de 2018 havia apenas
uma única notícia sobre Anitta nas capas do jornal Meia Hora, que se
trata mais de uma fofoca sobre atitude da personagem do que algum ato
propriamente noticioso:
114 O marco temporal foi encerrado em março de 2019 em razão da necessidade de con-
duzir as análises pertinentes, considerando também que o período de festas e do carnaval
já haviam passado, evitando possíveis desvios nas notícias relativas à cantora no jornal.
O MEIA HORA E A PRESENÇA DE ANITTA 319
115 No momento em que esse texto é produzido, Neymar e Bruna Marquezine ainda não
reataram o relacionamento. No entanto, como a própria mídia faz questão de se interessar
pelo relacionamento de idas e vindas de ambos, não descartamos a hipótese de que no dia
em que o leitor estiver diante dessa informação, o casal já esteja junto novamente.
O MEIA HORA E A PRESENÇA DE ANITTA 321
4 Considerações Finais
Ao longo do texto, tratamos de enfocar como se dá o relacionamento
entre o jornalismo popular, com ênfase no Meia Hora de Notícias, do Rio
de Janeiro, e as celebridades. Nesse percurso, procuramos demonstrar o
interesse específico desse segmento do jornalismo pelas figuras públicas,
uma vez que há vários fatores preponderantes para esse comportamento:
326 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
116 Por exemplo, o Notícias Populares elaborou uma série de notícias sobre um “Bebê Dia-
bo” que só foi desmentida após cinco dias, o que colocava em dúvida a prática jornalística
do segmento à época.
O MEIA HORA E A PRESENÇA DE ANITTA 327
117 A reflexão de Simões é baseada na discussão de Louis Quéré, que aponta o poder
hermenêutico do acontecimento: “Desse ponto de vista, os acontecimentos se tornam, eles
próprios, fonte de sentido, fonte de compreensão e fonte de redefinição da identidade da-
queles que afetam. Nessa perspectiva, em que o acontecimento vem antes dos sujeitos e das
situações, é o que ele se torna através de seu percurso, e os efeitos de sentido que produz,
que contribuem para individualiza-lo. É nesse sentido que se pode falar de um poder her-
menêutico do acontecimento”. (QUÉRÉ, 2010, p.35).
118 Disponível em: https://meiahora.ig.com.br/celebridades-e-tv/2019/09/5679850-
anitta-fala-sobre-depressao-e-bissexualidade.html
328 CELEBRIDADES NO SÉCULO XXI
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