O ASSASSINO DA HONRA Ou A LOUCA DO JARDIM

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O ASSASSINO DA HONRA Ou A LOUCA DO JARDIM

Caetano Cosme da Silva

Vinde musa mensageira

Do reino de Eloim

Traz a pena de Apolo

E escreve aqui por mim

O Assassino da Honra

Ou a Louca do Jardim

Esta história é um exemplo

Pra qualquer mulher casada

Que respeita seu marido

E deseja ser honrada

Que para quem não tem honra

A honra não vale nada.

Só pune a honra o honrado

Porque é conhecedor

Pois o honrado conhece

Que a honra tem valor

E quem fere a honra alheia

Fica sendo devedor.


E o desonrado fica

Na maior lamentação

E quando sofre inocente

Já sente no coração

Uma sede de vingança

Pedindo a Deus punição.

E Deus que nunca dormiu

Nem de noite nem de dia

Vê quem é merecedor

De sua devocacia

E vê também quem merece

Pagar pela covardia.

O mau não é perseguido

O justo sofre demais

Onde reina a união

Tem inveja o satanás

Portanto conto um passado

De uns cem anos atrás

Foi no velho Portugal

Na capital de Lisboa

Que Orberto Alves Lins

A mais sincera pessoa

Casou-se com Julia Alves

Alma santa justa e boa.


Orberto era um exemplo

Da mais sincera união

Amava tanto a esposa

Como Deus ama a razão

Parecia que os dois

Tinham um só coração.

Sua esposa tinha um dom

Que a natureza lhe deu

Honrada e criteriosa

Julia era o nome seu

Justa igualmente a ela

No mundo inda não nasceu.

Dessa união santa e pura

Só nasceu uma menina

E os seus pais lhe puseram

O nome de Albertina

Que veio ajudar a Julia

Cumprir a tirana sina.

Quando a mesma nasceu

Inda mais multiplicou

]aquele amor santo e puro

como Deus lhe ordenou

somente pra Julia Alves


o amor nada durou.

Porque ao fazer seis meses

Que Albertina nasceu

Um grande conquistador

Para Julia apareceu

Paulo Ferreira da Silva

Era esse o nome seu.

Era amigo de Orberto

Porem era desordeiro

Contava dezoito anos

Ainda era solteiro

Vivia de roubar honra

Confiando no dinheiro.

E passando certo dia

Naquela santa morada

De seu bom amigo Orberto

Julia estava na calçada

De cobiça ele ficou

Com a alma marcheteada.

- Dona Julia, dê-me água

e ela sem maldade

trouxe água e deu a ele

com educabilidade
sem saber que ele queria

roubar-lhe a moralidade.

E perguntou por Orberto

Disse ela – Foi receber

Umas casas na cidade

Que deixou para vender

Disse Paulo: - Eu tenho pena

De ver Orberto sofrer.

Orberto era pra ser

Um homem mais felizardo

É bastante que possui

Um anjo delicado

Que pode dar-lhe um conforto

De viver mais descansado.

Dona Julia respondeu-lhe:

- Mas Orberto não é pobre

só não é milionário

porem possui certo cobre

e tem mais essa fazenda

que a nossa pobreza encobre.

Paulo lhe disse: - É verdade

Ele tem certo dinheiro

Porem não é como eu sou


Capitalista e banqueiro

E posso fazer Orberto

Meu sucessor e herdeiro.

A senhora neste sitio

Não está bem colocada

E a senhora não pode

Viver aqui sendo honrada

E Orberto na cidade

Até alta madrugada.

Vou propor-lhe uma proposta

Mas quero ser perdoado

Se não acertar perdoe

Esse seu menor criado

Que por seu amor se acha

Quase louco apaixonado.

Dona Julia conheceu

Ser caso de adultério

Lhe respondeu: - Senhor Paulo

O homem que tem critério

Não desonra o lar alheio

Que honra contem mistério.

- Quem diz assim não engana

o senhor fique avisado


o homem que tem vergonha

não é desmoralizado.

Eu vou contar a Orberto

Pra não trazê-lo enganado.

- Dona Julia tenha calma

não tenha perturbação

pois a senhora não sabe

quanto é minha paixão

tudo isso são fraquezas

de meu pobre coração.

Nisso Paulo avistou

Numa banca pequenina

De dona Julia o retrato

E outro de Albertina

Pegou-os e botou no bolso

Com sua ação assassina.

E perguntou: - Dona Julia

Vai contar ao seu marido

Que eu a si declarei-me?

Eu já estou prevenido

Com o seu retrato eu provo

Que de si sou querido.

Se a senhora contar
A Orberto este passado

Com os seus retratos eu provo

Que fui seu apaixonado

E a senhora só conta

Por eu lhe ter desprezado.

Ao dizer essas palavras

Com Julia se abraçou

A fim de beijá-la a pulso

Mas dona Julia açoitou

A mão pela cara dele

Que até um dente quebrou.

Paulo então se retirou

Com a cara bem opada

E o dentro que quebrou

Botando sangue em golfada.

E disse pra dona Julia

- Esta desfeita é vingada.

Com meia hora depois

Em casa Paulo chegou

Fez depressa um curativo

E o rosto desinchou

E ele disse: - Vingar-me

Daquela maldita eu vou.


Deixemos Paulo o bandido

Pensando no que faria

Para se vingar de Julia

Por meio de covardia

E falaremos de Orberto

Que chegou no outro dia.

Quando Orberto chegou

Achou Julia descontente

Ele perguntou a ela:

- Que tens tu anjo inocente

que teu olhar está mostrando

que alguma coisa sente?

- Nada sofro, disse ela

apenas uma sombra escura

com vontade de jogar-me

na mais cruel desventura

da qual eu só me livrava

se baixasse à sepultura.

- Não querida, disse Orberto

entre nós não há ruína

isto é algum nervoso

que teu juízo imagina

viva sempre para mim

e nossa filha Albertina.


Com isso ela conformou-se

Porem com perturbação

Vendo a hora de cair

Na maior condenação

Porque o falso nodoa

O mais limpo coração.

Com trinta dias depois

O bandido novamente

Armou-se com os retratos

Daquela pobre inocente

E disse: - Hoje eu me vingo

Do que sofri cruelmente.

Quando ele chegou lá

Fazia apenas uma hora

Que Orberto viajava

E Paulo sem ter demora

Bateu na porta e falou

Dona Julia veio fora.

- Senhora, disse o bandido

amigo Orberto chegou?

Respondeu Julia que sim:

- porem hoje viajou

nessa conversa o bandido


abriu a porta e entrou.

Entrou com toda afoiteza

Com os retratos na mão

E disse pra dona Julia:

- Pra findar nossa questão

receba aqui seus retratos

e dê-me o seu coração.

- Bandido, eu já lhe disse

que você não é capaz

de entrar na minha casa

mas você é muito audaz

um ladrão conquistador

roubador da santa paz.

Eu só nasci pra Orberto

A quem amo e mais ninguém

E já disse que você

Pelo sentido que vem

Só entra em minha casa

Porque vergonha não tem.

Você é mais que covarde

Pela má inclinação

O homem que tem vergonha

Honra o outro cidadão


Não faz o que você

Disse Paulo: - Tem razão.

Paulo vendo que perdia

Fez um plano traiçoeiro

Pôde entrar no quarto dela

Como um lobo carniceiro

E botou uma cigarreira

Debaixo do travesseiro.

Dona Julia vendo ele

Entrar para o quarto dela

Nem sequer abriu a porta

Saiu por uma janela

Depois ele saiu como

Quem não perseguia ela.

Ela vendo ele sair

Pra sua casa voltou

Foi cuidar de Albertina

Na traição não pensou

Às 4 horas da tarde

Orberto Alves chegou.

Ela pensava em dizer

Aquele terrível maltrato

Que Paulo tinha lhe feito


Mas pensava em seu retrato

Que se achava em poder

Daquele bandido ingrato.

- Se eu contar a Orberto

vai se dar grande questão

Orberto quer se vingar

Quer o fato tem razão

O bandido se defende

E eu fico na perdição.

O meu caso está sem jeito

Só Deus pode me valer

Faz de conta que estou

Sentenciada a morrer

Só não morro se Orberto

Só der crença no que ver.

Orberto vendo a mulher

Quase sem consolação

Compreendeu ser nervoso

Ou gases no coração

Dizendo que tudo isso

Trazia perturbação.

Nessa mesma noite Orberto

Entrando no camarim
Chegou-lhe no pensamento

Uma idéia mesmo assim

De examinar seu leito

Com um desejo sem fim.

Firmado no pensamento

Ele logo examinou

Então no seu travesseiro

Sem querer ele encontrou

Uma linda cigarreira

Que achando desmaiou.

- Dona Julia venha cá

pra me dizer com franqueza

se aqui entrou alguém

que disto eu tenho certeza

é esse o motivo justo

de sua grande tristeza.

- Achei uma cigarreira

debaixo do travesseiro

quer dizer que quando eu saio

aqui me chega um herdeiro

me conte isso direitinho

que quero ser justiceiro.

Dona Julia quase tremula


A ele se apresentou

Orberto mostrou a ela

O que ali encontrou

Quando dona Julia viu

Do traidor se lembrou.

- Orberto, quero Orberto

só sendo uma tentação

satânica, onde alguém

que inveja nossa união

botou esta cigarreira

em cima do meu colchão.

Nada disso, disse Orberto:

- Você me atraiçoou

vai pagar com sua vida

o crime que praticou

nisso alguém bateu na porta

e bem alto assim falou:

- Dona Julia, olhe aqui

uma cartilha de amor

que seu amante querido

me pediu esse favor

dona Julia ouvindo isso

soltou um grito de dor.


Entregando aquela carta

Dali desapareceu

Nem sequer o portador

Orberto não conheceu

Porem quando abriu a carta

De raiva o corpo tremeu.

Na carta viu o retrato

De sua filha Albertina

E o de Julia também

Ele disse: - Oh! Assassina

Teu crime pede vingança

A Providencia Divina.

A carta dizia assim:

“Oh! Julia minha querida

eu estou arrependido

de me tornar homicida

porque te jurei deixar

Orberto no chão sem vida.

De gozar os teus carinhos

Não estou arrependido

Porque de fato eu já fui

Pela senhora vencido

E a senhora pediu-me

Que matasse seu marido.


Mas me acho sem coragem

De praticar tal horror

Pois conheço que a vida

É o ser de mais valor

Mesmo sem matar Orberto

Eu já gozei seu amor.

Estão aí os retratos

Caso não os queira mais

Divida lá seu amor

Com outro qualquer rapaz

Que possa fazer seus gostos

Desse seu gênio voraz.

A senhora já pediu

Pra eu matar seu marido

Pode ser que muito breve

Eu também seja traído

No dia que a senhora

Arranjar outro marido.

Orberto nem terminou

De ler a carta citada

Disse pra Julia assim:

- Minha honra é vingada

porque o homem sem honra


no mundo não vale nada.

- Bote a benção a sua filha

para deixar de viver

porque o que você fez

só paga quando morrer

o homem que pune a honra

está em cima do dever.

- Orberto venha mais calmo

não seja tão positivo

o próprio deus soberano

morreu sem ser vingativo

e o roubador da honra

não morreu, inda está vivo.

- Isto pode ser alguém

que tenha paixão por mim

e não podendo vencer-me

te fez esta carta assim

quer se vingar com a morte

fazendo meu triste fim.

- Orberto você não crê

que houve morte e paixão

de nosso mestre Jesus

a fonte do galardão.
Também creia como eu

Tenho limpo o coração.

- Bote a benção à sua filha

que seu tempo se venceu

mulher séria neste mundo

se nasceu mais já morreu

disse Julia: - Há mulher séria

e uma delas sou eu.

Orberto pega um punhal

Bem grande que possuía

Com dois palmos e quatro dedos

Desse que quando batia

Na matéria de alguém

Até a alma morria.

Julia pegou Albertina

Em soluço comovente

E disse: - Senhor Jesus

Ainda existe vivente

Que faça sofrer na vida

Uma infeliz inocente.

- Orberto vai me matar

porém vai se arrepender

porque o falsineroso
terá que apodrecer

pois dos castigos de deus

ninguém pode se esconder.

- Minha Albertina coitada

vai ficar sem o amor

de sua mamãe querida

por causa dum traidor

que me fez merecedora

do sofrimento e da dor.

- Só peço para que deus

abençoe minha filhinha

enquanto viver no mundo

porque a língua mesquinha

pode roubar a honra

já como roubou a minha.

- Só peço que tu Orberto

para vingar tua paixão

me cortes a orelha esquerda

uma perna e uma mão

porém me deixes com vida

até nascer a razão.

- Porque nascendo a razão

eu sendo mesmo aleijada


podes pegar teu punhal

e dar-me uma punhalada

eu morrerei satisfeita

porque morro sendo honrada.

- Qual lá honra, qual lá nada

bote Albertina no chão

ou mesmo no berço dela

que já perdi a razão

e levantou o pinhal

com toda força da mão;.

- Orberto quero esposo

pelo leite que mamou

Jesus, na Virgem Maria

Quando deus lhe enviou

Pra terra, perdoa a mim

Porque inocente estou.

Ao dizer estas palavras

Orberto o punhal soltou

porque naquele momento

Albertina ali chorou

Mais vendo o punhal no chão

A menina se calou.

E assim continuou
Que quando Orberto pegava

No punhal a criancinha

Abria boca e chorava

Ele soltava o pinhal

A criança se calava.

Assim Orberto ficou

Que já não se dominava

Era pegar no punhal

A criancinha chorava

Orberto conheceu que

Dessa forma não matava.

Resolveu mandá-la embora

Para nunca mais voltar

Então Julia garantiu

Não vir mais nesse lugar

No mesmo instante saiu

No mundo a peregrinar.

Enlouqueceu de repente

Por pensar na Albertina

Embrenhou-se na montanha

Lamentando a sua sina

Onde foi viver igual

Uma ave de rapina


Portanto deixemos Julia

Na montanha abandonada

E vamos ver Albertina

De que forma foi criada

E como chegou a ver

Sua vida angustiada.

Orberto logo mudou-se

Para o centro da cidade

E trouxe para Albertina

De sua propriedade

Uma velha caridosa

Que lhe criou sem maldade.

E não tentou mais casar

Porque de fato arranhou

Essa velha já idosa

Que muito lhe agradou

A qual criou Albertina

Até quando se formou.

Quando Albertina contou

Quatorze anos de idade

Sua mãe de criação

A velhinha de bondade

Por ordem da Providência

Herdou a eternidade.
Já foi o segundo golpe

Que Albertina sofreu

Pois a mãe que conhecia

Foi aquela que morreu

Sabia que teve outra

Porem não a conheceu.

O leitor está lembrado

Que a mãe de Albertina

Do traidor foi traída

E saiu cumprindo a sina

Como louca pelo mundo

Feita a maior peregrina.

Pasou um ano na mata

Mais cavernosa que havia

Na hora que estava sã

Se ajoelhava e pedia

Vingança do crime injusto

Que sendo justa sofria.

Seu vestido, coitadinha

Já fazia piedade

Não havia quem dissesse

Qual foi sua qualidade

De cipó, folha e embira


Já era mais da metade.

Assim passou doze anos

Pelejando com a sorte

Chorava e depois gemia

E pedia a deus a morte

Até que um dia viu-se

Com seu espírito mais forte.

Abandonou a montanha

E seguiu para a cidade

Só em dizer heresia

Avançava sua idade

Antes de chegar passou

Em sua propriedade.

Na fazenda viu Orberto

E logo reconheceu

Lhe pediu uma esmola

Ele sem ter dúvida deu

Ela disse: - deus lhe dê

O que já lhe pertenceu.

Orberto lhe perguntou:

- Que conversa é essa sua?

A louca respondeu: - Nada

Me ensine o caminho da rua


E não olhe para mim

Que me acho quase nua.

Com as palavras da louca

Orberto se conformou

E a louco com dois dias

Na cidade chegou

E dos bancos do jardim

Ela se apoderou.

Sorria sem ver de que

Chorava sem sentir dor

Chamava dizendo assim:

- Oh! Jesus meu salvador

vingança, Jesus vingança

sobre aquele traidor.

- Considera oh! Meu Jesus

quem já fui eu nessa vida

de par com o meu esposo

e minha filha querida

tudo tinha e hoje aqui

me vejo quase despida

- Meu vestido e minha sombra

se findaram eu estou nua

descalça de pé no chão
peregrinando na rua

igual uma nuvem escura

que cobre o sol e a lua.

Então naquele momento

Foi chegando perto dela

Paulo Ferreira da Silva

O que atraiçoou ela

Foi conhecido e não soube

Nem sequer que era aquela.

Perguntou o nome dela

Respondeu ela: - Uma louca

E você monstro assassino

Se tiver língua na boca

Aumente minha miséria

Que essa inda foi pouca.

Ouvindo essas palavras

Paulo logo caminhou

Para loja e um vestido

Muito decente comprou

Costurou no outro dia

E para a louca levou.

- Senhora tome um vestido

a louca respondeu: - Não


receba 5 moedas

a louca disse: - Patrão

pegue seu dinheiro e guarde

pra sua condenação.

Nada disso, disse Paulo:

- Tome minha boa louca

o vestido e as moedas

e com a voz muito rouca

a louca lhe perguntou:

- Sua consciência é pouca?

Quando a louca disse assim

Uma mendiga chegou

Trazendo um fraco vestido

E pra louca assim falou:

- Aceite esse mulambinho

então a louca aceitou.

A louca muito contente

O vestido recebeu

E depois com um palito

Ela no chão escreveu

O nome do assassino

Por quem sofria e sofreu.

Lendo aquele escrito


Retirou-se o traidor

Portanto vamos falar

Sobre o ente sofredor

Que só herdou nesta vida

O sofrimento e a dor.

Vou citar para os leitores

O que a louca cantava

Quando ela mais ou menos

Da filhinha se lembrava

E do marido também

Que na mente ainda estava.

“Minha vida é um romance

desde o meu nascimento

o amor me iludiu

e fez meu sofrimento

tudo isso são lembranças

do maldito casamento.

“Enquanto eu era solteira

não tive perseguição

porem depois de casada

me veio grande tentação

sou justa porem o mundo

fez minha condenação.


“Satisfeita com a sorte

sofro mesmo sendo honrada

da maior língua ferina

eu me vejo desonrada

porque na mulher honesta

a honra é precipitada.

Leitores deixemos a louca

E falemos de Albertina

Contando seis quinze anos

Que para cumprir sua sina

Destinou-se a conhecer

Esta louca peregrina.

Pediu a seu pai Orberto

Ele sem duvida aceitou

Ela foi até a praça

E assim que lá chegou

Vendo o estado da louca

De comovida chorou.

Abraçou-se com a louca

E pegou-a com a mão

Até que levou-a logo

Para a sua habitação

Sem conhecer sua mãe

Naquela situação.
Trocou as vestes da louca

Por outra que já foi dela

E quando ela vestiu

Deu muito certinho nela

Nisto foi chegando Orberto

Perguntou quem era aquela.

- Essa é a louca, papai

Albertina assim falou.

= Aquela que o senhor disse-me

que vivia no jardim

eu fui visitá-la e trouxe

ela hoje para mim.

- Não filhinha, disse Orberto

- Assim não dá certo não

dê roupa a ela e dinheiro

e uma boa refeição

depois mande ela voltar

para a sua habitação.

Albertina foi levar

A louca lá no jardim

Deu-lhe dinheiro e comida

E findou dizendo assim:

- Boa louca tu vais ser


apadrinhada por mim.

- Oh! Minha boa menina

que palavra de valor

foi deus que te deu a vida

um coração de amor

para te compadecer

de um ente sofredor.

Albertina despediu-se

Mui chorosa e regressou

Com dez minutos depois

Em sua casa chegou

Já um rapaz conversando

Com Orberto ela encontrou.

Esse rapaz era Paulo

O maldito traidor

O assassino da honra

A cobiça do amor

Com a presença de santo

Mas sendo um devorador.

Assim que viu Albertina

Tratou de lhe conquistar

E disse sou bocado rico

Bom de um homem gozar


Vou roubar-lhe a virgindade

Ou então lhe difamar.

Porem a moça pra ele

Não soltou um ar de riso

E Paulo de cá dizendo:

De te gozar eu preciso

E assim se retirou

Quase doido do juízo.

Com quinze dias depois

Ele foi lá novamente

Com o coração do mal

Natureza de serpente

Com vontade de manchar

A linda jovem inocente.

Nesse dia Orberto Alves

Para o sitio viajou

E Paulo chegando lá

Orberto não encontrou

Mas pelo atrevimento

Abriu a porta e entrou.

Albertina saiu fora

E ele apertou a mão

E Paulo decente achou


Da moça a educação

Da vontade com o desejo

Chegou a ocasião.

Paulo disse: - Minha santa

Me encho de alegria

Em ter a honra de entrar

Nesta sua moradia

Somente para lhe dizer

Que lhe tenho simpatia.

Albertina então lhe disse:

- Muito obrigada senhor

pela sua exaltação

sua honra e seu valor

só não fale para mim

em assunto de amor.

- Por qual razão a senhora

deseja me recusar?

Eu sendo milionário

E você a me rejeita?

A moça disse: - Riqueza

Nem fez nem faz eu amar.

- Ainda que o senhor

possua todo brasão


tenha honra muito mais

de que mesmo D. João

eu não lhe amo porque

lhe odeio de coração.

Paulo Ferreira ouvindo

Albertina falar assim

Retirou-se angustiado

Pensativo a estudar

Um meio com que pudesse

Ele dela se vingar.

Enquanto o bandido estuda

A forma de traição

Vamos ver um grande exemplo

Do autor da criação

Porque o falso só reina

Enquanto dorme a razão.

Albertina foi buscar

A louca lá no jardim

E quando ela chegou

Albertina disse assim:

- Minha louca, Paulo, ontem

veio seduzir a mim.

A louca chorando disse:


- Boa menina cuidado

Paulo é um roubador

Da honra do povo honrado

Pois eu conheço um casal

Já por ele desonrado.

- E era um casal honrado

a quem ele atraiçoou

com dois objetos alheios

que ele mesmo roubou

feriu uma mulher justa

e o marido acreditou.

- Ainda não satisfeito

com o falso traiçoeiro

foi no quarto do casal

e deu um golpe certeiro

deixando uma cigarreira

debaixo do travesseiro.

Albertina ouvindo isso

Um grande choque tomou

Porem conservou-se muda

E quando seu pai chegou

O que a louca lhe disse

Ao pai ela contou:


- Esta história tem areia

Orberto lhe disse assim:

- A história dessa louca

caiu em cima de mim

e se ela não mentiu

o caso vai ser ruim.

Não deixou mais que a louca

Voltasse para o jardim

Mas a louca disse: - Eu vou

Que lá há de ser meu fim

Se for mentira o que eu disse:

- Pode castigar a mim.

Albertina mui chorosa

Lhe abraçou soluçando

E disse: - Boa mulher

És louca mas estás mostrando

Que não és mulher ruim

Pois teu gesto está provando.

O leitor sabe que Paulo

Jutou manchar a donzela

Então neste mesmo dia

Ele com muita cauteça

Tentado pelo diabo

Pode entrar no quarto dela.


Agora o leitor vai ver

Quanto vale a virgindade

Paulo foi ferir a honra

Mas deus da eternidade

Fez ele pegar no sono

E pagar a crueldade.

Mesmo debaixo da cama

Da mochila ele ficou

E prometido por deus

O sono lhe agarrou

Porque só assim pagava

Os crimes que praticou.

Albertina à meia noite

Avistou Paulo destado

Dormindo de boca aberta

E chamou seu pai de lado

Orberto chegando disse:

- Me considero vingado.

Orberto acordou Paulo

Já debaixo do facão

E quando ele acordou-se

Conheceu a perdição

Pra não morrer acusou-se


Como assassino e ladrão

Paulo tinha um bom revolver

Mas com ele não armou-se

Forçado pelo remorso

Então ele acovardou-se

Que de fato era assassino

Da honra, então declarou-se.

Contou que entrou no quarto

Da moça para se vingar

Porque ela em outro dia

Tratou de lhe recusar

Veio roubar-lhe a virgindade

Ou então lhe difamar.

Contou também que peitou

A mulher do seu amigo

E a mulher lhe cuspiu

Ele se vendo em perigo

Roubou os retratos dela

Temendo um certo castigo.

Contou como colocou

Debaixo do travesseiro

A cigarreira cromada

Achando um golpe certeiro


E falou também na carta

Que mandou por desordeiro

E jurou por todos santos

Que dona Julia era pura

E que lamentou depois

Em ver uma criatura

Tão justa e por sua língua

Sofrer tanta desventura.

É aquela pobre louca

Que está lá no jardim

A tua mulher que foi

Martirizada por mim

Um bandido como eu

Só presta levando fim.

Ao dizer estas palavras

Pelo revolver puxou

Em cima do peito esquerdo

Em si mesmo detonou

Morreu no mesmo momento

Pelo mal que praticou.

Orberto e Albertina

Derramaram prantos tantos

Chegou a louca dizendo:


- O que é isso meus santos

essa louca é Julia Alves

que veio enxugar seus prantos.

Considere meu leitor

Que honra santa e feliz

Julia Alves como esposa

Orberto Lins inda quis

E foram viver felizes

Segundo a história diz.

A louca vendo tombar

No chão sem vida o bandido

Ficou sã igual a quem

Inda não tinha sofrido

De loucura e foi viver

Com a filha e o marido.

Albertina, Orberto e Julia

No mesmo dia levaram

Paulo numa padiola

E à policia entregaram

E como tinha razões

No mesmo dia voltaram.

Disse Albertina: - O futuro

Será o que deus quiser


Esse exemplo é um conselho

Só não toma quem não quer

Homem nenhum nesse mundo

Terá a mim por mulher.

Com papai e com mamãe

A vida tem mais prazer

Eu vou viver mais feliz

Todo mundo pode crer

A minha mãe conheci

No santo dia que vi

O assassino morrer.

CAETANO COSME DA SILVA – Caetano Cosme da Silva nasceu em Nazaré da Mata, PE, no dia
25 de novembro de 1927. Autor muito fecundo, seus temas favoritos são histórias dramáticas,
algumas delas "continuações" de outras obras conhecidas (A filha da louca do jardim, O filho
de João de Calais). Compôs também algumas "pelejas". É falecido. Viveu na cidade paraibana
de Campina Grande. Ele é autor dos cordéis “Assassino da honra ou a louca do jardim, O (FC-
115)”, . Exemplo de um homem que atirou em uma imagem de São Severino do Ramos, O (FC-
165) . Farrapo humano (FC-448) . Helena a deusa de Tróia (FC-413) . Lágrimas de amor ou a
vingança de um condenado (FC-533) . Moça cendendo tabaco no mercado em Catolé, Uma
(FC-834) . Peleja de Ana Roxinha com Maria Roxinha (FC-611) . Pescaria em Boqueirão, a vara,
o anzol, o minhocão, Uma (FC-963) Traição de Alfredo e a vingança de Justino, A (FC-753) .

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