Poluição Cap 11

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CAPÍTULO 11

OXIGÊNIO DISSOLVIDO E MATÉRIA


ORGÂNICA EM ÁGUAS

11.1. OXIGÊNIO DISSOLVIDO EM ÁGUAS ...................................................................... 253


11.1.1. Fontes de oxigênio nas águas....................................................................... 253
11.1.2. Importância nos estudos de controle de qualidade das águas ..................... 256
11.1.3. Determinação da concentração de oxigênio dissolvido em águas................ 257
11.2. MATÉRIA ORGÂNICA EM ÁGUAS ........................................................................... 260
11.2.1. Fontes de matéria orgânica nas águas naturais ........................................... 260
11.2.2. Histórico das medidas de concentração de matéria orgânica em águas ...... 262
11.2.3. Demanda bioquímica de oxigênio - DBO ...................................................... 263
11.2.3.1. Conceito......................................................................................... 263
11.2.3.2. Importância nos estudos de controle de qualidade das águas ..... 264
11.2.3.3. Considerações sobre a determinação de DBO ............................. 266
11.2.3.4. Modelo cinético da reação de DBO ............................................... 270
11.2.4. Demanda química de oxigênio - DQO........................................................... 279
11.2.4.1. Conceito......................................................................................... 279
11.2.4.2. Importância nos estudos de controle de qualidade das águas ..... 279
11.2.4.3. Determinação da DQO .................................................................. 280
11.2.5. Carbono orgânico total .................................................................................. 283
11.2.6. Demanda teórica de oxigênio ........................................................................ 284
11.2.7. Remoção de matéria orgânica das águas ..................................................... 285
11.3. QUESTÕES PROPOSTAS ....................................................................................... 286
11.4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 288
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

CAPÍTULO 11

OXIGÊNIO DISSOLVIDO E MATÉRIA


ORGÂNICA EM ÁGUAS

11.1. OXIGÊNIO DISSOLVIDO EM ÁGUAS

11.1.1. Fontes de oxigênio nas águas


O oxigênio se dissolve nas águas naturais proveniente da atmosfera, de-
vido à diferença de pressão parcial. Este mecanismo é regido pela Lei de Henry,
que define a concentração de saturação de um gás na água, em função da tem-
peratura:
CSAT = α · pgás
onde α é uma constante que varia inversamente proporcional à tempe-
ratura e pggás é a pressão exercida pelo gás sobre a superfície do líquido. No caso
do oxigênio, considerando-o como constituinte de 21% da atmosfera, pela lei de
Dalton, a pressão exercida é de 0,21 atm. Para 20°C, por exemplo, α é igual a 43,9
e portanto a concentração de saturação de oxigênio em uma água superficial é
igual a 43,9 x 0,21 = 9,2 mg/L.
É muito comum em livros de química, a apresentação de tabelas de con-
centrações de saturação de oxigênio em função da temperatura, da pressão e da
salinidade da água. Na Tabela 11.1, apresentam-se alguns valores para a pressão
de 760 mmHg.

Tabela 11.1. Concentração de saturação de oxigênio dissolvido em águas em função da


temperatura e salinidade (à pressão de 760 mmHg). Fonte: AGUDO(1)

T °C Concentração de NaCl (mg/L)


0 10.000 20.000
5 12,8 11,4 10,0
10 11,3 10,1 9,0
15 10,2 9,1 8,1
20 9,2 8,3 7,4
25 8,4 7,6 6,7
30 7,6 6,9 6,1

A taxa de introdução de oxigênio dissolvido em águas naturais através da


superfície, depende das características hidráulicas e é proporcional à velocidade,
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Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

sendo que a taxa de reaeração superficial em uma cascata é maior do que a de


um rio de velocidade normal, que por sua vez apresenta taxa superior à de uma
represa, onde a velocidade normalmente é bastante baixa.
Outra fonte importante de oxigênio nas águas é a fotossíntese de algas.
Este fenômeno ocorre em maior extensão em águas poluídas ou, mais propria-
mente, em águas eutrofizadas, ou seja, aquelas em que a decomposição dos com-
postos orgânicos lançados levou à liberação de sais minerais no meio, especial-
mente os de nitrogênio e fósforo que são utilizados como nutrientes pelas algas.
Esta fonte não é muito significativa em rios nos trechos iniciais à jusante
de lançamentos pontuais de esgotos. A turbidez e a cor elevadas dificultam a
penetração dos raios solares e apenas poucas espécies resistentes às condições
severas de poluição conseguem sobreviver. A contribuição fotossintética de oxi-
gênio só é expressiva após grande parte da atividade bacteriana na decomposi-
ção de matéria orgânica ter ocorrido, bem como após terem se desenvolvido os
protozoários que, além de decompositores, consomem bactérias clarificando as
águas e permitindo a penetração de luz.
Este efeito pode “mascarar” a avaliação do grau de poluição de uma
água, quando se toma por base apenas a concentração de oxigênio dissolvido.
Sob este aspecto, águas poluídas são aquelas que apresentam baixa concentra-
ção de oxigênio dissolvido (devido ao seu consumo na decomposição de com-
postos orgânicos), enquanto que as águas limpas apresentam concentrações de
oxigênio dissolvido elevadas, chegando até a um pouco abaixo da concentração
de saturação. No entanto, uma água eutrofizada pode apresentar concentrações
de oxigênio bem superiores a 10 mg/L, mesmo em temperaturas superiores a
20 °C, caracterizando uma situação de supersaturação. Isto ocorre principalmente
em lagos de baixa velocidade, onde chegam a se formar crostas verdes de algas
à superfície.
Nas lagoas de estabilização fotossintéticas, usadas para o tratamento de
esgotos, recorre-se a esta fonte natural de oxigênio para a decomposição da ma-
téria orgânica pelos microrganismos heterotróficos que, por sua vez, produzem
gás carbônico que é matéria prima para o processo fotossintético. Esta simbiose
pode ser representada pelo esquema da Figura 11.1:

Figura 11.1. Simbiose entre bactérias e algas em lagoas de estabilização.


Fonte: JORDÃO e PESSOA (1982)

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Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

Existem outros processos de tratamento de esgotos em que a aeração


do meio é feita artificialmente, empregando-se aeradores superficiais eletro-me-
cânicos ou máquinas sopradoras de ar em tubulações contendo difusores para a
redução do tamanho das bolhas. Novos sistemas de aeração vêm sendo conti-
nuamente desenvolvidos. São utilizados também processos em que, ao invés de
aeração, introduz-se oxigênio puro diretamente no reator biológico.

11.1.2. Importância nos estudos de controle de qualidade das


águas
O oxigênio dissolvido é o elemento principal no metabolismo dos micror-
ganismos aeróbios que habitam as águas naturais ou os reatores para tratamento
biológico de esgotos. Nas águas naturais, o oxigênio é indispensável também
para outros seres vivos, especialmente os peixes, onde a maioria das espécies
não resiste a concentrações de oxigênio dissolvido na água inferiores a 4,0 mg/L.
É, portanto, um parâmetro de extrema relevância na legislação de classificação
das águas naturais, bem como na composição de índices de qualidade de águas
(IQAs). No IQA utilizado no Estado de São Paulo pela CETESB, a concentração de
oxigênio dissolvido é um parâmetro que recebe uma das maiores ponderações.
A concentração de oxigênio dissolvido é também o parâmetro funda-
mental nos modelos de autodepuração natural das águas. Nestes modelos, são
balanceadas as entradas e saídas de oxigênio em função do tempo nas massas
líquidas, de modo a prever-se sua concentração em seus diversos pontos, o que
pode ser utilizado, por exemplo, para se estimar as eficiências necessárias na re-
moção de constituintes orgânicos biodegradáveis pelas estações de tratamento
de esgotos a serem construídas.
A determinação da concentração de oxigênio dissolvido em águas é tam-
bém imprescindível para o desenvolvimento da análise da DBO, demanda bioquí-
mica de oxigênio, que representa o potencial de matéria orgânica biodegradável
nas águas naturais ou em esgotos sanitários e muitos efluentes industriais. Em
última instância, este teste bioquímico empírico se baseia na diferença de con-
centrações de oxigênio dissolvido em amostras integrais ou diluídas, durante um
período de incubação de 5 dias a 20 °C. O que se “mede” de fato nesta análise é a
concentração de oxigênio dissolvido antes e depois do período de incubação.
Nos reatores anaeróbios de tratamento de esgotos ou lodos, o oxigênio dis-
solvido na água em geral exerce efeito tóxico sobre as metanobactérias, devendo ser
evitado. Isto faz com que a maioria dos reatores seja fechada. Também as elevadas
cargas orgânicas aplicadas garantem condições de anaerobiose. Em reatores que uti-
lizam meio suporte inerte inserido artificialmente para a formação de “películas bioló-
gicas” ou “biofilmes” e nos reatores com mantos de lodo, onde se formam grânulos,
estas estruturas naturais do próprio processo de tratamento dificultam a entrada de
oxigênio, criando uma espécie de proteção às bactérias estritamente anaeróbias.

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Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

11.1.3. Determinação da concentração de oxigênio dissolvido


em águas
Para a determinação da concentração de oxigênio dissolvido em águas
são disponíveis o método eletrométrico e o método químico. No método eletro-
métrico, empregam-se aparelhos chamados de oxímetros (Figura 11.2.) ou me-
didores de OD, em que a sonda do eletrodo possui uma membrana que adsorve
seletivamente o oxigênio, tendo por base o seu raio de difusão molecular. Estes
aparelhos precisam ser calibrados antes do uso, empregando-se solução de sul-
fito de sódio para a calibração do OD zero e água aerada e refrigerada para a cali-
bração do valor de saturação. Apesar da simplicidade, uma vez que basta calibrar
o aparelho e executar a medição direta, ocorrem freqüentemente problemas de
descalibração ou de perfuração ou desativação da membrana, o que leva a resul-
tados não confiáveis, especialmente em situações de campo. Portanto, deve-se
tomar cuidado em seu uso, devendo-se freqüentemente comparar-se os resulta-
dos com os obtidos pelo método químico.
Nestes aparelhos, dois eletrodos metálicos são mergulhados em um ele-
trólito contido em uma membrana seletiva. A membrana impede a passagem de
água e de sólidos dissolvidos, sendo que o oxigênio e outros gases se difundem
através dela. Sob a ação de uma diferença de potencial entre os eletrodos e na
presença de oxigênio no eletrólito, ocorre a seguinte reação:
Anodo M → M+2 + 2e–
½ O2 + H2O + 2e− → 2 OH−
Catodo
½ O2 + M + H2O → M (OH)2

A intensidade da corrente elétrica gerada é proporcional à concentração


de oxigênio dissolvido dentro da membrana que, por sua vez, é proporcional ao
OD da amostra onde o sensor encontra-se mergulhado.
Há a necessidade de correção dos resultados em função da temperatura,
que influencia na permeabilidade da membrana.
Outro fator que pode influenciar a leitura é o esgotamento do oxigênio
da amostra na camada imediatamente em contato com a sonda. Alguns senso-
res vêm equipados com um pequeno vibrador que faz circular a amostra junto à
membrana.
O método químico utilizado é o conhecido método de Winkler modificado
pela ázida de sódio, que compreende diversas fases. A primeira delas é a fixação
do oxigênio dissolvido da amostra, que deve ser feita imediatamente após a co-
leta, para evitar alterações na concentração. As amostras de água da superfície
devem ser retiradas através de imersão cautelosa do frasco (utilizam-se frascos
de vidro de 300 mL com tampa esmerilhada e selo de água no gargalo), para
evitar borbulhamento. As amostras em profundidade são coletadas usando-se
amostradores especiais. Após a coleta, são adicionadas à amostra as soluções de

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Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

sulfato manganoso, MnSO4, e a solução álcali-iodeto-azida, que contém hidróxido


de sódio, NaOH, iodeto de sódio, NaI, e a ázida sódica, NaN3.
A fixação do oxigênio dissolvido ocorre através da formação de óxido de
manganês, segundo a reação:
Mn(OH2) + ½O2 → MnO2 + H2O
Nesta etapa ocorre intensa floculação da amostra. A ázida de sódio é utili-
zada para a remoção da interferência de nitritos, que pode ser representada por:
NaN3 + H+ → HN3 + Na+
HN3 + + H+ → N2 + N2O + H2O
A segunda fase é a liberação de iodo, que ocorre após a adição de ácido
sulfúrico concentrado, que provoca a ruptura dos flocos e o desenvolvimento de
uma coloração amarelada, cuja intensidade é proporcional à concentração de oxi-
gênio dissolvido presente inicialmente na amostra. Esta reação pode ser expressa
por:
MnO2 + 2 I- + 4 H+ → Mn+2 + I2 + 2 H2O
Note-se que o íon iodeto é oxidado a iodo molecular, proporcionalmente
à quantidade de óxido de manganês que, por sua vez, é proporcional à concen-
tração de oxigênio dissolvido na amostra, conforme mostrado na reação de fixa-
ção.
A fase final da análise é a titulação do iodo liberado com tiossulfato de
sódio (iodometria). Esta reação pode ser representada por:
2 Na2S2O3 + I2 → Na2S4O6 + 2 NaI + 10 H2O
O indicador desta reação é uma solução de amido, com viragem de azul
para incolor.
Os resultados são expressos finalmente em termos de mgO2/L, utilizan-
do-se o equivalente-grama do oxigênio (em mg), ou seja:
NNa2S2O3 x VNa2S2O3 x 8000
mg / L O2 =
VAMOSTRA

Utilizando-se o tiossulfato 0,025 N e titulando-se 100 mL de amostra, tem-se:


0, 025 x VNa2S2O3 x 8000
mg / L O2 = 2 x VNa2S2O3
100
Infelizmente, o método químico perde um pouco a sua precisão quando
se trata de uma aplicação importante no campo do tratamento de esgotos, que é
a determinação da concentração de oxigênio dissolvido em tanques de aeração
(processo de lodos ativados). Por se tratar de lodo biológico concentrado, há a
necessidade de se inativar a atividade dos microrganismos, empregando-se para

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Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

este caso a modificação do ácido sulfâmico, apresentada no “Standard Methods”.


Mas após a inativação há a necessidade de sifonamento de um frasco para outro
do líquido decantado, para a continuidade do método analítico, o que aumenta a
imprecisão.

Figura 11.2. Frasco para determinação de OD pelo método químico e oxímetro.

11.2. MATÉRIA ORGÂNICA EM ÁGUAS

11.2.1. Fontes de matéria orgânica nas águas naturais


A principal fonte de matéria orgânica nas águas naturais nos dias de hoje
é, na grande maioria das vezes, a descarga de esgotos sanitários. Isto é devido a
que no Brasil, a maioria absoluta dos municípios não possui sistema de tratamen-
to de esgotos.
Em um esgoto predominantemente doméstico, 75% dos sólidos em sus-
pensão e 40% dos sólidos dissolvidos são de natureza orgânica. Estes compostos
são constituídos principalmente de carbono, hidrogênio e oxigênio, além de ou-
tros elementos como nitrogênio, fósforo, enxofre, ferro, etc. Os principais grupos
de substâncias orgânicas encontradas nos esgotos são proteínas (40 a 60%), car-
boidratos (25 a 60%) e óleos e graxas (10%). Outros compostos orgânicos sintéti-
cos são encontrados em menor quantidade como detergentes, pesticidas, fenóis,
etc. (Metcalf & Eddy, 1991).
As proteínas são os principais constituintes do organismo animal, ocor-
rendo em menor extensão nas plantas. Todos os gêneros alimentícios naturais
(animais ou vegetais) contêm proteínas. Elas são estruturalmente complexas e
instáveis, estando sujeitas a diversas formas de decomposição. Existem proteínas
solúveis e insolúveis na água. São formadas quimicamente pela ligação de um
grande número de aminoácidos, resultando em pesos moleculares que variam de
20 mil a 20 milhões de gramas. Todas as proteínas contêm carbono, hidrogênio
e oxigênio, mas distinguem-se por apresentarem cerca de 16% de nitrogênio e
constituem, conjuntamente com a uréia, as principais fontes de nitrogênio nos
esgotos. Na maioria dos casos, o fósforo, o enxofre e o ferro também estão pre-
sentes.
7
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

Os carboidratos encontram-se amplamente distribuídos na natureza, in-


cluindo os açúcares, amidos, celulose e fibras de madeira. Contêm carbono, hi-
drogênio e oxigênio. Alguns são solúveis em água, como os açúcares, outros,
como os amidos, são insolúveis. Os açúcares tendem a se decompor produzindo
álcool e gás carbônico, durante a sua fermentação por enzimas produzidas por le-
veduras e bactérias. Os amidos são mais estáveis, mas são convertidos em açúcar
pela atividade microbiana; a celulose é o carboidrato mais resistente à decompo-
sição.
Os óleos e graxas são ésteres de álcool ou glicerina com ácidos graxos.
Os glicerídeos de ácidos graxos, que são líquidos à temperatura ambiente, são
chamados óleos e os que são sólidos, graxas. Quimicamente são muito pareci-
dos, constituídos de carbono, hidrogênio e oxigênio em proporções variáveis.
Estão presentes nos alimentos, não sendo facilmente decompostos biologica-
mente. São atacados pelos ácidos minerais, resultando na formação de glice-
rina e ácidos graxos. Na presença de álcalis (NaOH, por exemplo), a glicerina é
liberada e são formados sais alcalinos de ácidos graxos, denominados sabões,
que são estáveis. Os sabões comuns são formados pela saponificação de gor-
duras com o NaOH. São solúveis em água mas, como visto anteriormente, na
presença dos constituintes da dureza, os sais de sódio são trocados por sais de
cálcio e magnésio, também chamados de sabões minerais, que são insolúveis e
se precipitam.
Os detergentes ou agentes tensoativos são grandes moléculas ligeira-
mente solúveis em água que causam o fenômeno da formação de espumas nas
águas naturais. O tipo de surfactante utilizado nos detergentes sintéticos comer-
ciais foi substituído no Brasil na década de 80. Anteriormente era empregado o
sulfonato de alquil benzeno, ABS, e hoje em dia se utiliza o sulfonato de alquil ben-
zeno linear, LAS, bem menos resistente à biodegradação que o ABS, reduzindo os
problemas de formação de espuma.
Os fenóis são produzidos industrialmente e podem ser oxidados biologi-
camente quando presentes em concentrações relativamente baixas ou através de
processo de aclimatação.
Traços de pesticidas e outros produtos químicos agrícolas, que são tóxi-
cos à maioria das formas de vida, podem ser encontrados nos esgotos, embora
sejam mais típicos de águas drenadas de áreas agrícolas.
Além dos esgotos sanitários, muitos efluentes industriais são também
predominantemente orgânicos, como são os casos dos efluentes de indústrias
de celulose e papel, têxteis, químicas e petroquímicas, alimentícias e de bebidas,
matadouros e frigoríficos, curtumes, usinas de açúcar e álcool, etc..
As chamadas “fontes difusas” de matéria orgânica podem também con-
tribuir para o agravamento das condições de poluição das águas naturais. Ocor-
rem principalmente devido ao efeito de lavagem da superfície do solo pelas águas
pluviais.

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Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

11.2.2. Histórico das medidas de concentração de matéria


orgânica em águas
Historicamente, o primeiro parâmetro a ser utilizado para quantificar a
presença de matéria orgânica em águas foi a determinação da concentração de
sólidos voláteis. Foi visto que a fração de sólidos voláteis em uma amostra cor-
respondia aos compostos orgânicos que se volatilizavam à temperatura na faixa
de 550 a 600 °C. No entanto, os resultados desta análise gravimétrica tornaram-se
pouco precisos para diversas aplicações.
Introduziu-se em seguida o teste da demanda bioquímica de oxigênio
(DBO). A DBO corresponde à fração biodegradável dos compostos presentes na
amostra, que é mantida cinco dias a uma temperatura constante de 20 °C. A me-
dida da concentração de matéria orgânica biodegradável neste ensaio resulta in-
diretamente, através de dados de consumo de oxigênio ocorrido na amostra ou
em suas diluições, durante o período de incubação. Apesar de muito importante,
a determinação de DBO é demorada, necessitando-se de um prazo de cinco dias
para a obtenção dos resultados. Pode-se também encontrar problemas de impre-
cisão, especialmente nos casos de efluentes industriais que não contêm micror-
ganismos, em que são necessários a semeadura da amostra e o controle paralelo
da demanda bioquímica de oxigênio da semente.
Outra limitação da DBO é a de acusar apenas a fração biodegradável dos
compostos orgânicos, uma vez que o processo é de natureza bioquímica. Este
fato motivou o uso paralelo da demanda química de oxigênio, a DQO. Emprega-
se na análise de DQO um oxidante químico forte, o dicromato de potássio, que
em uma reação catalisada oxida um número maior de compostos do que o que
ocorre na reação bioquímica. A relação entre a DBO de cinco dias e a DQO de
amostras de efluentes industriais é bastante utilizada nas previsões das suas con-
dições de biodegradabilidade.
Já se encontra difundida a análise de “carbono orgânico total”, que tem se
demonstrado parâmetro bastante eficiente, determinado mais rapidamente e re-
produzindo de maneira mais fidedigna os comportamentos das estações de trata-
mento de efluentes industriais. O método consiste na queima da matéria orgânica
em forno, sendo que se determina a quantidade de gás carbônico produzido neste
processo, através de analisador de infra-vermelho. O gás carbônico produzido é
proporcional à quantidade de carbono orgânico presente na amostra. Um problema
importante a ser superado refere-se à presença de sólidos em suspensão na amos-
tra que, praticamente, limita esta técnica à detecção de matéria orgânica solúvel.
Finalmente, se apresenta neste capítulo a chamada demanda teórica de
oxigênio, em que se calcula, através da estequiometria das reações de decompo-
sição, a quantidade de oxigênio necessária para oxidar determinado composto.
Dada a complexidade dos esgotos sanitários e da maioria dos efluentes indus-
triais em termos de número de compostos presentes, este parâmetro quase não
tem aplicação prática, servindo apenas para algumas avaliações preliminares.

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Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

11.2.3. Demanda bioquímica de oxigênio - DBO

11.2.3.1. Conceito

Na Figura 11.3., sintetiza-se o fenômeno da degradação biológica de com-


postos que ocorre nas águas naturais, que também se procura reproduzir nas esta-
ções de tratamento de esgotos e sob condições controladas na análise da DBO:

Figura 11.3. Metabolismo de microrganismos heterotróficos. Fonte: METCALF & EDDY (1991).

Neste esquema, apresenta-se o metabolismo dos microrganismos hete-


rotróficos, em que os compostos orgânicos biodegradáveis são transformados em
produtos finais mais estáveis ou mineralizados, tais como água, gás carbônico, sul-
fatos, fosfatos, amônia, nitratos, etc. Nesse processo há consumo de oxigênio da
água e liberação da energia contida nas ligações químicas das moléculas decom-
postas. Os microrganismos desempenham este importante papel no tratamento de
esgotos, pois necessitam desta energia liberada, além de outros nutrientes que por-
ventura não estejam presentes em quantidades suficientes nos despejos, para exer-
cer suas funções celulares tais como reprodução e locomoção, o que genericamen-
te se denomina síntese celular. Quando passa a ocorrer insuficiência de nutrientes
no meio, os microrganismos sobreviventes passam a se alimentar do material das
próprias células, até que têm a membrana celular rompida. Este processo todo se
denomina respiração endógena. Finalmente, há neste circuito, compostos para os
quais os microrganismos são incapazes de produzir enzimas que possam romper
suas ligações químicas, permanecendo inalterados. Ao conjunto destes compostos
dá-se o nome de resíduo não biodegradável ou recalcitrante.

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Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

11.2.3.2. Importância nos estudos de controle de qualidade das


águas

A DBO é o parâmetro fundamental para o controle da poluição das águas


por matéria orgânica. Nas águas naturais a DBO representa a demanda potencial
de oxigênio dissolvido que poderá ocorrer devido à estabilização dos compostos
orgânicos biodegradáveis, o que poderá trazer os níveis de oxigênio nas águas
abaixo dos exigidos pelos peixes, levando-os à morte. É, portanto, importante
padrão de classificação das águas naturais. Nas classes que correspondem às
águas menos poluídas, exigem-se baixos valores máximos de DBO e elevados
limites mínimos de oxigênio dissolvido. Na legislação federal, com a Resolução
nº 357 do CONAMA, são impostos os limites máximos de DBO de 3, 5 e 10 mg/L
para as águas doces de classe 1, 2 e 3 e os limites mínimos de oxigênio dissolvido
de 6, 5, 4 e 2 mg/L, para as águas doces de classes 1, 2, 3 e 4, respectivamente.
A DBO é também uma ferramenta imprescindível nos estudos de auto-depuração
dos cursos d’água. Além disso, a DBO constitui-se em importante parâmetro na
composição dos índices de qualidade das águas.
No campo do tratamento de esgotos, a DBO é um parâmetro importante
no controle da eficiência das estações, tanto de tratamentos biológicos aeróbios
e anaeróbios, bem como físico-químicos (embora de fato ocorra demanda de oxi-
gênio apenas nos processos aeróbios, a demanda “potencial” pode ser medida à
entrada e à saída de qualquer tipo de tratamento). Na legislação do Estado de São
Paulo, com o Decreto Estadual nº 8468, a DBO5 de cinco dias é padrão de emissão
de esgotos diretamente nos corpos d’água, sendo exigidos ou uma DBO5 máxima
de 60 mg/L ou uma eficiência global mínima do processo de tratamento na remo-
ção de DBO5 igual a 80%. Este último critério favorece aos efluentes industriais
concentrados, que podem ser lançados com valores de DBO ainda altos, mesmo
removida acima de 80%.
A carga de DBO, expressa em kg/dia é um parâmetro fundamental no
projeto das estações de tratamento biológico. Dela resultam as principais caracte-
rísticas do sistema de tratamento como áreas e volumes de tanques, potências de
aeradores, etc. A carga de DBO pode ser obtida do produto da vazão pela concen-
tração de DBO. Por exemplo, em uma indústria já existente em que se pretenda
instalar um sistema de tratamento, pode-se estabelecer um programa de medi-
ções de vazão e de análises de DBO, obtendo-se a carga através do produto dos
valores médios. O mesmo pode ser feito em um sistema de esgotos sanitários já
implantado. Na impossibilidade, costuma-se recorrer a valores unitários estimati-
vos. No caso de esgotos sanitários, é tradicional no Brasil a adoção de uma contri-
buição “per capita” de DBO5 de 54 g/hab.dia. Porém, há a necessidade de melhor
definição deste parâmetro através de determinações de cargas de DBO em bacias
de esgotamento com população conhecida. No caso dos efluentes industriais,
também costuma-se estabelecer contribuições unitárias de DBO em função de
unidades de massa ou de volume de produto processado. Na Tabela 11.2 são
apresentados valores típicos de concentração e contribuição unitária de DBO5:
11
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

Tabela 11.2. Concentrações e contribuições unitárias típicas de DBO de efluentes industriais.


Fontes: BRAILE e CAVALCANTI (1993); CETESB (1989, 1990).

CONCENTRAÇÃO DBO5,20ºC CONTRIBUIÇÃO UNITÁRIA DE


TIPO DE (mg/L) DBO5,20
5,20ºC
EFLUENTE VALOR
FAIXA FAIXA VALOR TÍPICO
TÍPICO
esgoto sanitário 110-400 220 --- 54 g/hab.dia
celulose
29,2 a 42,7
branqueada 300
kg/ton
(processo Kraft)
Têxtil 250-600
1,5-1,8 kg/m3
Laticínio 1000-1500
leite
abatedouro 6,3 kg/1000 kg
1125
bovino Peso vivo
curtume (ao 88 kg/ton pele
2500
cromo) salgada
10,4 kg/m3
Cervejaria 1611-1784 1718
cerveja
4,8 kg/m3
Refrigerante 940-1335 1188
refrigerante
suco cítrico 2,0 kg/1000 kg
2100-3000
concentrado laranja
açúcar e álcool 25000

11.2.3.3. Considerações sobre a determinação de DBO

Basicamente, a determinação de DBO consiste em medidas da concen-


tração de oxigênio dissolvido nas amostras, diluídas ou não, antes e após um
período de incubação de 5 dias a 20 °C. Durante este período, ocorrerá redução no
teor de oxigênio dissolvido da água, consumido para satisfazer as reações bioquí-
micas de decomposição de compostos orgânicos biodegradáveis. Quanto maior
for a quantidade de matéria orgânica biodegradável nas amostras, maior será o
consumo de oxigênio durante os 5 dias de incubação e, portanto, maior será o
valor da DBO.
Dependendo das características das amostras, a análise poderá ser de-
senvolvida segundo três procedimentos diferentes, que são descritos a seguir:

a) Determinação de DBO de águas naturais pouco poluídas


12
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

Neste caso, como a concentração de oxigênio dissolvido presente ini-


cialmente na amostra é maior do que a demanda esperada, a análise pode ser
desenvolvida de forma bastante simples. Em dois frascos de DBO coletam-se as
amostras da água do rio ou lago no ponto em que se pretende analisar. Todos os
procedimentos de coleta devem ser respeitados, pois do contrário as interferên-
cias nos resultados podem invalidá-los totalmente. Em um dos frascos mede-se o
oxigênio dissolvido presente na amostra no instante da coleta (oxigênio dissolvi-
do inicial). Quando se emprega o método químico para a análise do “OD inicial”,
apenas a etapa de fixação do OD necessita ser feita imediatamente após a coleta.
As demais podem ser desenvolvidas após a chegada ao laboratório.
O outro frasco em que se coletou a amostra de água deverá ser conduzi-
do diretamente para a incubadora (Figura 11.4.), onde deverá permanecer cinco
dias a 20 °C para a ocorrência das reações bioquímicas. Ao final deste período,
deve-se determinar a concentração de oxigênio dissolvido - “OD final”, segundo
os mesmos procedimentos anteriormente recomendados. A DBO (de 5 dias a
20 °C) será a diferença entre as concentrações de oxigênio dissolvido inicial e final.
Quando as medidas de OD são feitas com eletrodo, um único frasco é utilizado
para as leituras no primeiro e no quinto dia, pois não há interferência nas caracte-
rísticas da amostra.

Figura 11.4. Incubadora de DBO.

b) Determinação de DBO de águas naturais muito poluídas, esgotos sa-


nitários e efluentes industriais que contêm microrganismos

Imagine-se no caso anterior, que se encontre uma concentração de oxi-


gênio dissolvido final igual a zero. Isto significa que a demanda superou a quan-
tidade de oxigênio dissolvido na amostra e não pôde ser medida. Nestes casos,
deve-se proceder a diluições da amostra. Normalmente são empregadas cinco
diluições diferentes, para que ocorra em pelo menos uma delas, porcentagem de
redução de oxigênio dissolvido na faixa de 40 a 70%, que representa a melhor
condição para se obter resultados com boa precisão. A água de diluição deve

13
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

ser previamente preparada, aerando-se água destilada e adicionando-se-lhe so-


luções contendo nutrientes (N, P, K, Fe, etc.) para que o único fator limitante no
teste seja, de fato, a concentração de matéria orgânica presente na amostra. Para
o estabelecimento das diluições deve-se recorrer às experiências anteriores com
a análise de DBO feitas com a amostra em questão, ou utilizar-se os resultados da
DQO (que é maior que a DBO), como referência. Os demais aspectos relativos à
determinação de oxigênio dissolvido presente nas diversas diluições da amostra,
são idênticos ao caso anteriormente descrito. A DBO é calculada através da média
dos resultados em que a redução de oxigênio dissolvido ocorreu na faixa de 40 a
70%.
Na Tabela 11.3 a seguir, apresenta-se um exemplo de planilha de cálculo
da DBO de uma amostra de água do rio Tamanduateí em São Paulo:
Tabela 11.3. Exemplo de planilha de cálculo de DBO

Nº Vol. frasco Vol. amostra O.D. Redução DBO


Diluição
Frasco (mL) (mL) (mg/L) (%) (mg/L)
01 I 300 -- 7,6
B --
02 F 300 -- 7,6
03 I 300 2 7,6
1ª 13
04 F 300 2 6,6
05 I 300 4 7,6
2ª 29
06 F 300 4 5,4
07 I 300 6 7,5
3ª 43 160
08 F 300 6 4,3
09 I 300 8 7,4
4ª 59 165
10 F 300 8 3,0
11 I 300 10 7,4
5ª 72
12 F 300 10 2,1
Observações: 1. B = branco, I = inicial e F = final
ODi − ODF
2. % Redução = x 100
OD i
VFRASCO
3. DBO = (ODi − ODF ) x
VAMOSTRA
160 + 165
4. DBO
OMÉDIA = ≅ 163 m
mg
g/L
2

Alguns efluentes industriais que possuem microrganismos, como são os


casos dos laticínios e dos matadouros, por exemplo, podem ter a DBO analisada
desta forma.
c) Análise da DBO de efluentes industriais que não contêm microrganis-
mos
14
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

Este caso engloba efluentes de indústrias que contêm orgânicos biode-


gradáveis mas não possuem microrganismos decompositores como, por exem-
plo, os de indústrias têxteis e de celulose e papel. É um pouco mais complexo que
o anterior, pois, não havendo microrganismos na amostra, é necessário introduzi-
los artificialmente através de semeadura. Há, basicamente, dois tipos de sementes
que podem ser utilizadas: aclimatadas ou não aclimatadas. As sementes aclimata-
das são constituídas de microrganismos que já venham previamente interagindo
com o substrato em questão. Pode-se utilizar água ou lodo do corpo receptor à
jusante do lançamento ou lodo de estação de tratamento biológico do próprio
efluente. Semente não aclimatada, que é o caso mais utilizado, é obtida a partir
de esgoto sanitário, decantado ou filtrado em algodão para que se reduza a DBO
trazida pela própria semente, sem diminuir significativamente a concentração de
microrganismos. Para este tipo de medição da DBO, além da dificuldade em se
definir as diluições das amostras que devem ser feitas, há também a necessidade
de se definir o quanto de semente deverá ser adicionado aos frascos. O critério
empregado é que a quantidade adotada, que pode ser 1 ou 2 mL, por exemplo,
não deve provocar demanda de oxigênio superior a 0,6 mg/L. O consumo de
oxigênio devido à matéria orgânica presente na própria semeadura é chamado
fator da semente. Este fator deverá ser levado em consideração no cálculo final da
DBO da amostra, isto é, para cada diluição, a variação de oxigênio ocorrida deverá
ser descontada do fator da semente. Este será determinado através da realização
paralela da DBO da semente, em que se empregam, por exemplo, cinco diluições
para o cálculo do consumo médio de oxigênio por mililitro de semente. Note-se
que neste caso a imprecisão nos resultados é maior pela introdução de mais uma
variável, a condição da semente, tornando a situação crítica em alguns casos de
efluentes industriais tratados que apresentem valores de DBO5 próximos ao limite
máximo imposto na legislação.
É histórica a tentativa de se instrumentalizar a análise de DBO, utilizando-
se respirômetros como o de Warburg, em que a DBO é medida manometricamen-
te. Estes respirômetros são constituídos de manômetros acoplados aos frascos
em que ocorrem as reações de DBO. Devido ao consumo de oxigênio, deverá
ocorrer uma deflexão no fluído manométrico que deverá ser associada ao valor
da DBO. Para que o efeito contrário da pressão do gás carbônico produzido na de-
composição da matéria orgânica não altere o resultado, são colocadas nos frascos
soluções que absorvem CO2, como por exemplo o hidróxido de potássio. Tem-se
encontrado muita dificuldade na calibração deste método, além de não se conse-
guir com isso eliminar a necessidade da incubadora ou reduzir o tempo gasto na
análise. Equipamentos que permitem leitura direta de concentração de oxigênio
dissolvido encontram-se disponíveis no mercado.

11.2.3.4. Modelo cinético da reação de DBO

A oxidação bioquímica é um processo lento e teoricamente leva um tem-


po infinito para ser completada. Em um período de 20 dias, ocorre para esgotos

15
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

sanitários, a oxidação de cerca de 95 a 99% dos compostos e, em um período de


5 dias que é utilizado no teste de DBO5,20, cerca de 60 a 70%. A temperatura de
20°C é mantida em incubadora, pois deve haver uma temperatura de referência,
uma vez que influi na velocidade dessas reações.
A reação de DBO é, para fins práticos, formulada de acordo com o mode-
lo cinético de primeira ordem, podendo ser expressa por:
∂ Lt
= −kk| ⋅ L t
∂t
onde Lt é a DBO de primeiro estágio remanescente no tempo t, e k’ é a taxa ou
constante da velocidade da reação (base e). Integrando-se esta equação, tem-se:
t
ln L t | = −K ⋅t ou
|

|
Lt = Lo ⋅ e−k t

onde L0 é a DBO total de primeiro estágio, também chamada de DBO “última” ou


DBO carbonácea total. Trabalhando-se na base decimal, tem-se:
Lt = L0·10-k·t
onde k é a constante da velocidade da reação, referida à base 10. Para se estabe-
lecer a relação entre k| e k pode ser utilizado:
k'
k=
2.303
Mas, em geral, necessita-se trabalhar com valores da DBO removida e não
remanescente, uma vez que os resultados das análises laboratoriais se referem a
dados de DBO removida, porque o que se mede é consumo de oxigênio, que se
relaciona com a matéria orgânica já oxidada ou removida. A DBO remanescente,
Lt, e a DBO removida, y, são complementares, conforme ilustrado na Figura 11.5.

Figura 11.5. Curva de DBO remanescente e DBO removida.

16
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

Pode-se observar que a DBO removida y, em cada instante, é igual a DBO


de primeiro estágio L0, subtraída da DBO remanescente, Lt, ou:
y = L0 – Lt
Como Lt = L0.e-k’.t, podemos escrever:
y = L0 – L0·e-k’·t ou
y = L0 (1 – e-k’·t),
que é a equação da DBO removida em função do tempo, base e. Na base 10, temos:
y = L0 (1 – 10-k·t)
Seja, por exemplo, determinar a DBO de um dia e a DBO final de primeiro
estágio para um esgoto cuja DBO5 a 20 °C é 200 mg/L. A constante da reação, k| é
igual a 0,23d-1.
Y5 = L0 (1 – e-5k’)
200 = L0 (1 – e-5x0,23) ⇒ L0 = 293 mg/L
y1 = 293 (1 – e-0,23x1) ⇒ y1 = 60 mg/L
Para esgoto doméstico, um valor típico de k é 0,1 d-1 (base 10, 20 °C). O
valor de k varia com o tipo de despejo, compreendendo valores de 0,05 a 0,3 d-1
ou mais. Para o mesmo valor da DBO final, o oxigênio consumido deverá variar
com o tempo e com valores diferentes de k. Este efeito pode ser observado na
Figura 11.6.

Figura 11.6. Efeito da constante de reação k na DBO (para um dado valor de L0).
Fonte: METCALF & EDDY (1991).

O efeito da temperatura se exerce sobre o valor da constante k’ (ou k)


e L0. O efeito da temperatura sobre a taxa da reação k pode ser expressa pela
seguinte equação, derivada da Lei de Van’t Hoff-Arrhenius.

17
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

kT°C = k20 °C · θ(T – 20)


onde kT°C é o valor de k na temperatura T°C e θ é o coeficiente de tempe-
ratura; são propostos os seguintes valores médios para θ:
θ = 1,056, para temperaturas entre 20 e 30 °C
θ = 1,135, para temperaturas entre 4 e 20 °C.
Para outras situações, são atribuídos outros valores para θ. Na equação de
Streeter-Phelps utilizada em estudos de autodepuração natural de cursos d’água,
o efeito da temperatura sobre k é calculado utilizando-se θ = 1,047. Em estudos de
tratamento de esgotos em lodos ativados e filtros biológicos, utiliza-se θ = 1,08.
A temperatura provoca também efeito sobre o valor de L0, pois apesar de
corresponder à quantidade total de matéria carbonácea biodegradável, em tem-
peraturas superiores a 20 °C, por exemplo, podem se desenvolver melhor outros
grupos de microrganismos não atuantes a 20 °C e o valor de L0 aumenta. A ex-
pressão proposta para a correção de L0 para a temperatura é a seguinte:
L0  = L0 1 + 0, 02 ( T − 20 ) 
TC 20 C

Em contraposição, Von Sperling (1998) sugere que o efeito da temperatu-


ra sobre L0 seja negligenciado.
A matéria não carbonácea, como a amônia, é produzida durante a hidróli-
se de proteínas. Algumas bactérias autotróficas são capazes de utilizar o oxigênio
para oxidar a amônia em nitritos e nitratos. A demanda de oxigênio causada pelas
bactérias nitrificadoras é chamada de DBO de 2° estágio. A 20 °C, no entanto, a
velocidade de reprodução das nitro-bactérias é muito baixa. Normalmente levam
de 6 a 10 dias para atingir uma população significativa e exercer uma demanda
mensurável de oxigênio. A interferência causada pela presença dessas bactérias
pode ser eliminada através de pré-tratamento da amostra (pasteurização, cloração
e tratamento ácido) ou pelo uso de agentes inibidores (azul de metileno, tiuréia, 2
cloro 6 triclorometil piridina, etc). A configuração geral da DBO (1° e 2° estágios)
pode ser vista na Figura 11.7:
É um problema prático muito importante a determinação das constantes
do modelo cinético da DBO, k’(ou k) e L0, em função de uma série de dados de
DBO ao longo de um período de tempo obtidos em laboratório, que são anali-
sados matematicamente. Os métodos mais comumente empregados são o dos
mínimos quadrados e os métodos gráficos de Thomas e de Fujimoto. O método
dos mínimos quadrados consiste em ajustar uma curva a partir de um conjunto
de dados (DBO,t), de modo que a soma dos quadrados dos resíduos (diferença
entre o valor observado e o valor ajustado) seja mínima. Utilizando-se este méto-
do, uma variedade de tipos de curvas podem ser ajustadas a partir de uma série
de dados. Por exemplo, para uma série de medidas de DBO de uma amostra, a
seguinte equação pode ser descrita para cada um dos n pontos:

18
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

Figura 11.7. Curva da DBO: a) Curva normal para a oxidação da matéria orgânica carbonácea;
b) influência da nitrificação. Fonte: JORDÃO e PESSOA (1982).

∂y
= k '(L0 − Yn )
∂t t =n

∂y
Nesta equação, k’ e L0 são desconhecidos. Se for assumido que re-
∂t
presenta o valor da declividade da curva a ser traçada através de uma série de
dados, para um dado valor de k’ e L0, então, devido a erros experimentais, os dois
lados da equação acima diferirão de uma quantidade R. Reescrevendo a equação
em termos do resíduo R, tem-se:

∂y
Utilizando-se a notação para , tem-se:
∂t
R = k’ · L0 – k’ y –y’
Sejam a = k’ · L0 e b = -k’:
R = a + by – y’
Se a soma dos quadrados dos resíduos deve ser mínima, as seguintes
equações devem ser satisfeitas:
∂ ∂R
∑ R = 0 ⇒ ∑ 2R
2
=0
∂a ∂a
∂ ∂R
∑ R = 0 ⇒ ∑ 2R
2
=0
∂b ∂b

Aplicando-se as operações acima ao residual R, escrito anteriormente,


tem-se:

19
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

Na + b Σ y – Σ y’ = 0

a Σ y + b Σ y2 – Σ yy’= 0
onde: n = número de dados
k’ = - b (base e)
L0 = -a/b
Exemplo: calcular as constantes da DBO, utilizando o método dos míni-
mos quadrados, para a seguinte série de dados (Metcalf & Eddy, 1991):
t (dias) 2 4 6 8 10
y (mg/L) 11 18 22 24 26

Solução: deverá ser construída a seguinte tabela:


T y y2 y’ yy’
2 11 121 4,50 49,5
4 18 324 2,75 49,5
6 22 484 1,50 33,0
8 24 576 1,00 24,0
Σy = 75 Σy2 = 1505 Σy’ = 9,75 Σyy’ = 156
∆y 24 − 18
Obs: y’= y ' = , por exemplo, para t = 6 dias ⇒ y’= y ' = = 1, 5
∆t 8−4

E n é o número de dados efetivamente utilizados na tabela, ou seja, n = 4.


Portanto, pode-se escrever:
4a + 75
75b − 9, 75 = 0

75a + 1505b − 156 = 0
Resolvendo-se o sistema de equações acima, tem-se:
a = 7,5 e b = -0,271 e, portanto:
k’ = -b ⇒ k’ = 0,271 d-1 (base e)
a
L0 = − ⇒ L0 = 27, 7 m
mgg/L
b
Outro método utilizado é o método gráfico de Thomas, que se baseia na
similaridade entre duas séries de funções. É um procedimento gráfico baseado na
seguinte função:
2
1 −1 k 3
(t y) 3
= ( 2, 3 ⋅ k ⋅ L0 ) 3
+ 1
⋅ t, o
onde
43 ⋅ L0
3, 4 3

y é a DBO removida no intervalo de tempo t


k é a constante da velocidade da reação (base 10)
L0 é a DBO final de 1° estágio

20
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

( y)
1 2
3 −1 k 3
Fazendo-se Z = t , a = ( 2, 3 ⋅ k ⋅ L0 ) 3
e b= 1
43 ⋅ L0
3, 4 3

tem-se a equação da reta: Z = a + b · t

Z pode ser plotado em função de t. O coeficiente angular, b, e o parâme-


tro linear, a, da reta que melhor se ajustar à série de dados podem ser utilizados
para o cálculo de k e L0, através de:
b 1
k = 2, 61 ⋅ x e L0 =
a 2, 3 ⋅ k ⋅ a3
No exemplo anterior:

t(dias) 2 4 6 8 10
y(mg/L) 11 18 22 24 26
(t/y)1/3 0,57 0,61 0,65 0,69 0,73

0, 0
04
a = 0, 53 e b = = 0,02
2
0, 0
02
∴ k = 2, 6 x ⇒ k = 0, 099 d-1 (k ' = 0, 228 d-1 )
0, 5
53
1
L0 = = 29, 4 m
mg
g/L
2, 3 ⋅ 0, 099 ⋅ 0, 5
533

O método de Fujimoto consiste em lançar-se em gráfico os valores de


DBOt+1 versus DBOt, sendo que o ponto de intersecção desta reta com a reta de
tangente igual a 1, representa o valor de L0. A partir deste e com um dos valores
de DBO removida pode-se determinar a taxa k| através da equação da DBO remo-
vida.
Para o exemplo anterior, obtém-se:

21
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

Do gráfico: L0 = 27,8 mg/L


Y6 = 22 mg/L
Y = L0 (1 – e-k · t)
|

22 = 27,8 (1 – e-k · 6) ⇒ k| = 0,293 d-1


|

11.2.4. Demanda química de oxigênio - DQO

11.2.4.1. Conceito

A demanda química de oxigênio consiste em uma técnica utilizada para


a avaliação do potencial de matéria redutora de uma amostra, através de um pro-
cesso de oxidação química em que se emprega o dicromato de potássio (K2Cr2O7).
Neste processo, o carbono orgânico de um carboidrato, por exemplo, é converti-
do em gás carbônico e água.

11.2.4.2. Importância nos estudos de controle de qualidade das


águas

A DQO é um parâmetro indispensável nos estudos de caracterização de


esgotos sanitários e de efluentes industriais. A DQO é muito útil quando utilizada
conjuntamente com a DBO, para observar o nível e a maior facilidade ou dificul-
dade de biodegradabilidade dos despejos. Sabe-se que o poder de oxidação do

22
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

dicromato de potássio é maior do que o que resulta mediante a ação de micror-


ganismos, exceto raríssimos casos como hidrocarbonetos aromáticos e piridina.
Desta forma, os resultados da DQO de uma amostra são superiores aos de DBO.
Como na DBO mede-se apenas a fração biodegradável, quanto mais este valor se
aproximar da DQO significa que mais facilmente biodegradável será o efluente. É
comum aplicar-se tratamentos biológicos para efluentes com relações DQO/DBO
de 3/1, por exemplo. Valores muito elevados desta relação indicam grandes possi-
bilidades de insucesso, uma vez que a fração biodegradável torna-se pequena; há
ainda a possibilidade do tratamento biológico ser prejudicado pelo efeito tóxico
sobre os microrganismos, exercido pela fração não biodegradável.
A DQO tem se demonstrado um parâmetro bastante eficiente no con-
trole de sistemas de tratamento anaeróbio de esgotos sanitários e de efluentes
industriais. Após o impulso que estes sistemas tiveram em seus desenvolvimen-
tos a partir da década de 70, quando novos modelos de reatores foram criados
e muitos estudos foram conduzidos, observa-se o uso prioritário da DQO para o
controle das cargas aplicadas e das eficiências obtidas. A DBO nestes casos tem
sido utilizada apenas como parâmetro secundário, mais para se verificar o aten-
dimento à legislação, uma vez que tanto a legislação federal quanto a do Estado
de São Paulo não incluem a DQO. Parece que os sólidos carreados dos reatores
anaeróbios devido à ascensão das bolhas de gás produzidas ou devido ao escoa-
mento, trazem maiores desvios nos resultados de DBO do que nos de DQO. Pode-
se extrapolar esta idéia e considerar também o uso atualmente bastante difundido
da DQO no controle de processos aeróbios, tanto pela praticidade, quanto pela
confiabilidade dos resultados.
Outro uso importante que se faz da DQO é para a previsão das diluições
das amostras na análise de DBO. Como o valor da DQO é superior, e pode ser
obtido no mesmo dia da coleta, poderá ser utilizado para balizar as diluições. No
entanto, deve-se observar que as relações DQO/DBO são diferentes para os diver-
sos efluentes e que, para um mesmo efluente, a relação se altera mediante trata-
mento, especialmente o biológico. Desta forma, um efluente bruto que apresente
relação DQO/DBO igual a 3/1, poderá, por exemplo, apresentar relação da ordem
de 10/1 após tratamento biológico, que provoca maior redução na DBO.

11.2.4.3. Determinação da DQO

A reação ocorre em meio fortemente ácido, adicionando-se à amostra,


ácido sulfúrico concentrado. Temperaturas elevadas também favorecem a oxi-
dação, que é procedida sobre chapa ou manta de aquecimento. As substâncias
voláteis que eventualmente se desprendam da amostra são retornadas ao ba-
lão onde se processa a reação, através de sistema de condensação, utilizando-se
condensadores do tipo Friedricks. A prata catalisa a oxidação, sendo adicionado
sulfato de prata para esta finalidade, dissolvido previamente no ácido sulfúrico. A
principal interferência no teste é a oxidação de cloretos pelo dicromato de potás-
sio. Para corrigir esta interferência, adiciona-se sulfato de mercúrio, mas a análise

23
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

não é válida para amostras contendo concentrações muito elevadas de cloretos,


como a água do mar, por exemplo. Na fotografia da Figura 11.8. mostra-se uma
execução da análise de DQO.

Figura 11.8. Aparato utilizado na determinação de DQO

A principal dificuldade da análise está no estabelecimento de diluições


corretas das amostras, pois a etapa final constitui-se na titulação do dicromato
não utilizado, com sulfato ferroso amoniacal. Se a amostra for pouco diluída, po-
derá ocorrer consumo total de dicromato e, se for muito diluída, o excesso quase
que total também não conduz a bons resultados. O final da reação é indicado pela
viragem de amarelo para marrom, devido à presença de gotas de ferroin (indica-
dor à base de ortofenantrolina) adicionadas ao balão contendo a amostra a ser
titulada. O sulfato ferroso amoniacal, por sofrer decomposição na presença de luz,
deve ser repadronizado toda vez que for utilizado para a análise de DQO.
Paralelamente à oxidação e titulação das diluições da amostra, realiza-se
a prova em branco, executando-se o mesmo procedimento sobre água deioniza-
da. O volume consumido de sulfato ferroso amoniacal na titulação será a referên-
cia para o cálculo da DQO, que é feito da seguinte forma:
(B − A)Nsfa x 8000
DQO = x f , onde:
VAMOSTRA
B: volume gasto de sulfato ferroso amoniacal na titulação do branco.
A: volume gasto de sulfato ferroso amoniacal na titulação de cada dilui-
ção da amostra.
NSFA = Normalidade do sulfato ferroso amoniacal, obtida mediante pa-
dronização com dicromato de potássio.
VAMOSTRA = volume da amostra diluída utilizada, em geral 50 mL.
f = fator de diluição.
Na expressão para o cálculo da DQO apresentada, o número 8000 repre-
senta o equivalente grama do oxigênio, expresso em mg, para que os resultados
sejam expressos em termos de demanda de oxigênio. A DQO deve ser calculada
através da média dos resultados obtidos para duas ou três diluições da amostra.

24
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

Reações:
a) Oxidação da matéria orgânica pelo dicromato de potássio

a + 8c
CnHaOb + cCr
cCr2O7 + 8cH+ → nCO
cH nCO2 + cCr +3 , onde
H2O + 2cCr
2
2 a b
C = n+ −
3 6 3
O dicromato de potássio é dosado em excesso nos balões para que o sal-
do seja determinado por titulação na fase seguinte e com isto se possa determinar
seu consumo.

b) titulação do excesso de dicromato pelo sulfato ferroso amoniacal

O titulante empregado é o sulfato ferroso amoniacal, Fe(NH4)2 (SO4)2.


Nesta reação, ocorre oxidação de ferro e redução do cromo hexavalente, indicado
pela viragem de amarelo para marrom mediante a adição de gotas de ferroin.
6Fe+2 + Cr2O7-2 + 14H+ → 6Fe+3 + 2Cr+3 + 7H2O
c) interferência de cloreto

Algumas substâncias inorgânicas oxidáveis presentes na amostra podem


interferir nos resultados, aumentando-os.
6Cl- + Cr2O7-2 + 14H+ → 3Cl2 + 2Cr+3 + 7H2O
d) eliminação da interferência de cloretos pelo sulfato de mercúrio

Particularmente, a interferência devida a cloretos é removida mediante a


adição de sulfato de mercúrio, HgSO4, conforme a reação:
2Cl- + Hg+2 ↔ HgCl2
Como observado, há necessidade de se diluir corretamente as amostras
para que sejam obtidos bons resultados. No caso de monitoramento de estações
de tratamento de efluentes industriais, recomenda-se que, para cada tipo de amos-
tra (efluentes brutos ou tratados) construam-se tabelas reunindo as informações
históricas de diluições x consumo de sulfato ferroso amoniacal x DQO, para servir
de orientação para o estabelecimento das diluições em análises futuras.
Recentemente foi desenvolvida a técnica de análise de DQO em ampolas
(Figura 11.9.), cujo princípio básico é o mesmo, isto é, oxidação da matéria orgâ-
nica com dicromato de potássio. Difere, por um lado, pelo fato de utilizar menor
quantidade de amostra, o que pode ser considerado uma desvantagem em termos
de precisão, uma vez que normalmente não se consegue total homogeneidade
das amostras de efluentes. Por outro lado, a determinação final da concentração
de excesso de dicromato não utilizado é feita por meio de colorimetria. Embora

25
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

persistam dúvidas sobre a perfeita correspondência de resultados com o método


convencional, há que se destacar a vantagem de se descartar menor quantidade
de reagentes tóxicos residuais das análises.

Figura 11.9. Digestor utilizado na DQO em ampolas.

11.2.5. Carbono orgânico total


A análise de carbono orgânico total é aplicável especialmente para a de-
terminação de pequenas concentrações de matéria orgânica. O teste é desen-
volvido colocando-se uma quantidade conhecida de amostra em um forno a alta
temperatura. O carbono orgânico é oxidado a CO2 na presença de um catalisador.
O gás carbônico produzido é quantificado utilizando-se um analisador de infra-
vermelho. A acidificação e a aeração da amostra antes da análise eliminam erro
devido à presença de carbono inorgânico. A análise pode ser desenvolvida muito
rapidamente. Certos compostos orgânicos não são oxidados e a concentração de
carbono orgânico medida é ligeiramente inferior à presente na amostra.

11.2.6. Demanda teórica de oxigênio


A matéria orgânica de origem animal ou vegetal presente nos despejos é
geralmente uma combinação de carbono, oxigênio, hidrogênio e nitrogênio. Os
principais grupos destes compostos que estão presentes nos despejos são car-
boidratos, proteínas, gorduras e os produtos de sua decomposição. Se as fórmu-
las químicas dos compostos orgânicos presentes nos despejos são conhecidas,
a demanda teórica de oxigênio pode ser determinada, escrevendo-se e balance-
ando-se as equações que representam as reações químicas de decomposição,
conforme ilustrado no exemplo a seguir.

Exemplo: Determinar a demanda teórica de oxigênio para a glicina, ami-


noácido cuja fórmula química é CH2(NH2)COOH, assumindo que:

26
Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

a) no primeiro estágio, o carbono é convertido em CO2 e o nitrogênio é


convertido em amônia;
b) no segundo estágio, a amônia é convertida sucessivamente em nitrito
e nitrato;
c) a demanda teórica de oxigênio é a soma do oxigênio necessário para
satisfazer aos dois estágios.

Solução:
a) Demanda Carbonácea
CH2(NH2)COOH + 3/2 O2 → NH3 + 2CO2 + H2O
b) Demanda Nitrogenada
NH3 + 3 / 2 O2 
NITROSSOMONAS
→ H NO2 + H2O
HNO

O2 + ½ O2 
HNO 


NITROBACTER
→ HNO3

c) A demanda teórica de oxigênio é igual a [3/2 + (3/2 + ½)] mol O2/mol


glicina, ou 3,5 mol O2/mol glicina ou ainda 112g O2/mol.

11.2.7. Remoção de matéria orgânica das águas


Os processos mais adequados para a remoção de matéria orgânica das
águas residuárias, esgotos sanitários e efluentes industriais são, sem dúvida, os
de natureza biológica. Quando comparados aos processos físico-químicos, apre-
sentam as grandes vantagens de resultarem em eficiências mais elevadas na re-
moção de DBO ou DQO, a um custo operacional mais baixo quando se compara,
por exemplo, o custo da energia elétrica para a aeração do sistema (processos
biológicos aeróbios mecanizados) com o custo de produtos químicos necessários
à floculação dos esgotos.
Os processos biológicos podem ser agrupados, de acordo com a nature-
za do metabolismo predominante, em aeróbios e anaeróbios. Os processos aeró-
bios são aqueles em que os microrganismos usam o oxigênio dissolvido na água
como aceptor de elétrons em seus processos respiratórios. Podem ser compactos,
retendo-se a biomassa ativa através de recirculação de lodo (processo de lodos
ativados e suas variações) ou através da introdução artificial de meio suporte iner-
te de biomassa (filtros biológicos aeróbios). Podem também ter apenas acelerada
a oxigenação do conteúdo do tanque, através de aeração artificial, sem recircula-
ção de biomassa, como é o caso das lagoas aeradas mecanicamente. Ou podem
ser totalmente naturais, como é o caso das lagoas de estabilização fotossintéticas.
Os processos anaeróbios recorrem ao uso de microrganismos que apresentam
o mecanismo da respiração intra-molecular, usando o hidrogênio como aceptor
de elétrons na ausência de oxigênio dissolvido nas águas. Os processos anaeró-

27
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

bios eram antigamente mais conhecidos na digestão do excesso de lodo biológi-


co produzido em estações de tratamento de lodos ativados ou filtros biológicos
aeróbios. Para o tratamento direto de esgotos, ainda são muito conhecidos os
sistemas de fossas sépticas, inclusive os decanto-digestores ou tanques Imhoff
e as lagoas anaeróbias. Mais recentemente foram desenvolvidos os processos
de filtros anaeróbios, reatores anaeróbios de fluxo ascendente e manto de lodo
(UASB) e os reatores de leito fluidizado, dentre outros modelos de reatores, que
retêm grande quantidade de biomassa, reduzindo os volumes de reatores neces-
sários, e tornando o processo mais competitivo comparado com os aeróbios. Es-
tes últimos apresentam geralmente eficiências mais elevadas na remoção de DBO
ou DQO dos despejos, mas normalmente são mais caros devido à necessidade de
aeração e de estabilização de uma grande quantidade de lodo gerado. A idéia pre-
dominante atualmente é a de associação, utilizando-se, por exemplo, um reator
anaeróbio para redução parcial da carga orgânica, complementando o tratamento
com um sistema aeróbio. Em muitos casos, os sistemas mistos apresentam van-
tagens econômicas em relação aos exclusivamente aeróbios. Além disso, podem
apresentar também maior eficiência na remoção de nitrogênio e fósforo.
Existem também reatores como as lagoas facultativas, em que ocorrem
ao mesmo tempo a decomposição aeróbia (massa líquida) e anaeróbia (lodo de
fundo).
Alguns efluentes industriais necessitam ser pré-tratados por processos
físico-químicos para a remoção de componentes tóxicos (metais pesados, óleos
e graxas, solventes orgânicos, etc), antes de serem submetidos ao tratamento
biológico (Figura 11.10.).

Figura 11.10. Estação de tratamento de esgotos da SABESP (lodo ativado)

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Qualidade das águas e poluição: aspectos físico-químicos

11.3. QUESTÕES PROPOSTAS


1. Em uma determinação de DBO, foram misturados 6,0 mL de um despejo e
294,0 mL de água de diluição contendo 8,6 mg/L de OD. Após em período de
incubação de 5 dias à 20 °C, a concentração de OD na mistura foi de 5,4 mg/L.
Calcular a DBO do despejo.

2. A DBO5 a 20 °C de um despejo é igual a 210 mg/L. Qual será a DBO final? Qual
será a DBO10? Se o frasco tivesse sido incubado a 30 °C, qual seria a DBO5?
Dado: k’ = 0,23 d-1

3. A DBO5 a 20 °C é igual a 250 mg/L para 3 despejos diferentes, mas os valores


de k a 20 °C são iguais a 0,12 d-1, 0,16d-1 e 0,20d-1. Determinar a DBO última de
cada amostra.

4. O valor da DBO de um esgoto foi medido a 2 e a 4 dias, sendo encontrados


125 e 225 mg/L, respectivamente. Determinar a DBO5, utilizando um modelo
cinético de 1ª ordem.

5. Os seguintes resultados de DBO foram obtidos para uma amostra de esgoto


bruto a 20 °C:

t(dias) 0 1 2 3 4 5
y (mg/L) 0 65 109 138 158 172
Calcular a constante da velocidade da reação e a DBO final de 1° estágio, utili-
zando o método dos mínimos quadrados e o método de Thomas.

6. Idem para:
t(dias) 1 2 4 5 8
y(mg/L) 32 57 84 106 111

7. Dados os seguintes resultados determinados para uma amostra de esgoto à


20 °C, determinar a DBO carbonácea final, a DBO nitrogenada final, a constante
de velocidade da reação carbonácea k e a constante de velocidade para a de-
manda nitrogenada kn. Determinar k (θ = 1,05) e kn (θ = 1,08) à 25 °C.
t, dias 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
DBO, mg/L 0 10 18 23 26 29 31 32 33 46 56

t, dias 11 12 13 14 16 18 20 25 30 40
DBO,mg/L 63 69 74 77 82 85 87 89 90 90

29
Oxigênio dissolvido e matéria orgânica em águas

8. Determinar a demanda de oxigênio carbonácea e nitrogenada para um esgoto


representado pela fórmula C9N2H6O2 (N é convertido em NH3 no 1° estágio).

9. Determinar a demanda de oxigênio carbonácea e nitrogenada em mg/L para


1 litro de solução contendo 300 mg de ácido acético (CH3COOH) e 300 mg de
glicina (CH2 (NH2) COOH).

10. Os seguintes dados foram obtidos de uma caracterização de despejo:


DBO5 = 400 mg/L
K = 0,20 d-1
NH3 = 80 mg/L
Estimar a quantidade total de oxigênio em mg/L que deve ser fornecida para
estabilizar completamente este despejo. Qual seria o valor da DQO e da de-
manda teórica de oxigênio para este despejo?

11. Sabe-se que um despejo industrial contém apenas ácido esteárico, C100H36O2,
glicina, C2H5O2N e glicose C6H12O6. Os resultados das análises de laboratório
são os seguintes: nitrogênio orgânico: 10 mg/L, carbono orgânico: 125 mg/L
e DQO = 400 mg/L
Determinar a concentração de cada constituinte, em mg/L.

11.4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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Washington, 2000.
2. AGUDO, E.G. “Demanda Bioquímica de Oxigênio”. Curso Fundamentos Químicos do Saneamen-
to. Universidade Mackenzie, 1992.
3. AGUDO, E.G. “Demanda Química de Oxigênio”. Curso Fundamentos Químicos do Saneamento.
Universidade Mackenzie, 1992.
4. BRAILE, P.M. & CAVALCANTI, J.E., “Manual de Tratamento de Águas Residuárias Industriais”. São
Paulo, CETESB, 1993.
5. CETESB, “Nota técnica sobre tratamento de efluentes de abatedouros e frigoríficos”. 1989.
6. CETESB, “Nota técnica sobre tratamento de efluentes de laticínios”. 1989.
7. CETESB, “Nota técnica sobre tratamento de efluentes de indústrias de celulose e papel”.
8. CETESB, “Nota técnica sobre tratamento de efluentes de curtumes”. 1989.
9. CETESB, “Nota técnica sobre tratamento de efluentes de indústrias de refrigerantes e cerveja-
rias”. 1989.
10. CETESB, “Nota técnica sobre tratamento de efluentes de indústrias de suco cítrico concentrado”.
1990.
11. JORDÃO, E.P.; PESSOA, C.A., “Tratamento de Esgotos Domésticos” - Vol. I - Concepções Clás-
sicas de Tratamento - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES) - 2a.
Edição - Rio de Janeiro, 1982. 536p.
12. METCALF & EDDY, “Wastewater Engineering: Treatment, Disposal, Reuse”. 3rd ed, Mc Graw - Hill
Book Company. New York, 1991.

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