Mudança Do Artigo 9 CPM

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terça-feira, 17 de outubro de 2017

Olá amigos do Dizer o Direito,

Foi publicada hoje mais uma importante novidade legislativa.

Trata-se da Lei nº 13.491/2017, que altera o Código Penal Militar.

Vejamos o que mudou, mas, antes, é necessária uma revisão sobre o tema.

Competências da Justiça Militar


Compete à Justiça Militar processar e julgar os crimes militares, assim definidos
em lei (art. 124 da CF/88).
A lei que prevê os crimes militares é o Código Penal Militar (Decreto-Lei
1.001/1969).
• No art. 9º do CPM são conceituados os crimes militares em tempo de paz.
• No art. 10 do CPM são definidos os crimes militares em tempo de guerra.

Assim, para verificar se o fato pode ser considerado crime militar, sendo,
portanto, de competência da Justiça Militar, é preciso que ele se amolde em
uma das hipóteses previstas nos arts. 9º e 10 do CPM.

A alteração promovida pela Lei nº 13.491/2017 foi no art. 9º.

ALTERAÇÃO 1: CRIMES MILITARES PODERÃO SER PREVISTOS NA


LEGISLAÇÃO PENAL COMUM

Alteração no inciso II do art. 9º


A primeira mudança ocorrida foi no inciso II do art. 9º. Veja:
Código Penal Militar
Redação original Redação dada pela Lei nº 13.491/2017
Art. 9º Consideram-se crimes militares, Art. 9º Consideram-se crimes militares,
em tempo de paz: em tempo de paz:
II - os crimes previstos neste Código, II - os crimes previstos neste Código e
embora também o sejam com igual os previstos na legislação penal,
definição na lei penal comum, quando quando praticados:
praticados:

O que significa essa mudança?


• Antes da Lei: para se enquadrar como crime militar com base no inciso II do
art. 9º, a conduta praticada pelo agente deveria ser obrigatoriamente prevista
como crime no Código Penal Militar.
• Agora: a conduta praticada pelo agente, para ser crime militar com base no
inciso II do art. 9º, pode estar prevista no Código Penal Militar ou na legislação
penal “comum”.

Vejamos com um exemplo concreto a relevância dessa alteração.


João, sargento do Exército, contratou, sem licitação, empresa ligada à sua
mulher para prestar manutenção na ambulância utilizada no Hospital militar.

Qual foi o crime praticado, em tese, por João?


O delito do art. 89 da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações):
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou
deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.

De quem é a competência para julgar esta conduta?


• Antes da Lei nº 13.491/2017: Justiça Federal comum.
• Agora (depois da Lei nº 13.491/2017): Justiça Militar.

Por quê?
João, militar da ativa, praticou uma conduta que não é prevista como crime no
Código Penal Militar.
A conduta de dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei,
tipificada no art. 89 da Lei nº 8.666/93, não encontra figura correlata no
Código Penal Militar.
Assim, antes da Lei nº 13.491/2017, apesar de o crime ter sido praticado por
militar (sargento do Exército), o caso não se enquadrava em nenhuma das
hipóteses previstas no art. 9º do CPM. Isso porque o art. 9º, II, exigia que o
crime estivesse expressamente previsto no Código Penal Militar.

A agora?
Atualmente, com a mudança da Lei nº 13.491/2017, a conduta de João passou
a ser crime militar e se enquadra no art. 9º, II, “e”, do CPM:
Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
II - os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando
praticados:
e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio
sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar;

Obs: a doutrina afirmava que o art. 9º, II, do CPM era um crime militar ratione
legis (em razão da lei – porque previsto no CPM) e ratione personae (em razão
da pessoa – porque praticado por sujeito ativo militar em atividade). Isso agora
mudou. O crime militar do art. 9º, II, do CPM deixou de ser ratione legis.

ALTERAÇÃO 2: CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA PRATICADOS POR


MILITARES CONTRA CIVIL

Se um militar, no exercício de sua função, pratica lesão corporal contra


vítima civil, qual será o juízo competente?
JUSTIÇA MILITAR, considerando que se trata de crime militar (art. 9º, II, “c”,
do CPM):
Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
II - os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando
praticados:
c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de
natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à
administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil;

Isso não sofreu nenhuma mudança. Já era assim antes da Lei nº 13.491/2017
e continuou da mesma forma.
E no caso de crime doloso contra a vida? Se um militar, no exercício de
sua função, pratica tentativa de homicídio (ou qualquer outro crime
doloso contra a vida) contra vítima civil, qual será o juízo competente?
Temos agora que analisar antes e depois da Lei nº 13.491/2017.

Antes da Lei nº 13.491/2017:


• REGRA: os crimes dolosos contra a vida praticados por militar contra civil
eram julgados pela Justiça comum (Tribunal do Júri). Isso com base na antiga
redação do parágrafo único do art. 9º do CPM.
• EXCEÇÃO: se o militar, no exercício de sua função, praticasse tentativa de
homicídio ou homicídio contra vítima civil ao abater aeronave hostil (“Lei do
Abate”), a competência seria da Justiça Militar. Tratava-se de exceção à regra
do parágrafo único do art. 9º do CPM.
Veja a antiga redação do art. 9º, parágrafo único:
Art. 9º (...)
Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra a
vida e cometidos contra civil serão da competência da justiça comum, salvo
quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do art. 303
da Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de
Aeronáutica. (Atenção! Redação que não mais está em vigor.)

Depois da Lei nº 13.491/2017:


• REGRA: em regra, os crimes dolosos contra a vida praticados por militar
contra civil continuam sendo julgados pela Justiça comum (Tribunal do Júri).
Isso com base no novo § 1º do art. 9º do CPM:
Art. 9º (...)
§ 1º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e
cometidos por militares contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri.

• EXCEÇÕES:
Os crimes dolosos contra a vida praticados por militar das Forças
Armadascontra civil serão de competência da Justiça Militar da União, se
praticados no contexto:
I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente
da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa;
II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão
militar, mesmo que não beligerante; ou
III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e
da ordem (GLO) ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com
o disposto no art. 142 da CF/88 e na forma dos seguintes diplomas legais:
a) Código Brasileiro de Aeronáutica;
b) LC 97/99;
c) Código de Processo Penal Militar; e
d) Código Eleitoral.

Isso está previsto no novo § 2º do art. 9º do CPM.


Obs: as exceções são tão grandes que, na prática, tirando os casos em que o
militar não estava no exercício de suas funções, quase todas as demais irão ser
julgadas pela Justiça Militar por se enquadrarem em alguma das exceções.
Antes de analisarmos cada um dos incisos, vamos entender um pouco melhor
como funciona o emprego das Forças Armadas segundo o ordenamento jurídico
brasileiro.
Forças Armadas
A expressão "Forças Armadas" abrange a Marinha, o Exército e a Aeronáutica.
As três são classificadas como instituições nacionais permanentes e regulares,
organizadas com base na hierarquia e na disciplina.
As Forças Armadas ficam sob a autoridade suprema do Presidente da República.

Qual é a função das Forças Armadas no Brasil?


Segundo o art. 142 da CF/88, elas destinam-se:
1) à defesa da Pátria
2) à garantia dos poderes constitucionais e
3 à garantia da lei e da ordem.

Segundo a doutrina, as duas primeiras (defesa da pátria e garantia dos poderes


constitucionais) são funções primárias das Forças Armadas, enquanto que a
terceira (garantia da lei e da ordem) tem natureza subsidiária e excepcional. É
o que ensina José Afonso da Silva:
"Só subsidiária e eventualmente lhes incumbe a defesa da lei e da ordem,
porque essa defesa é de competência primária das forças de segurança pública,
que compreendem a polícia federal e as policias civis e militar dos Estados e do
Distrito Federal. Sua interferência na defesa da lei e da ordem depende, além
do mais, de convocação dos legitimados representantes de qualquer dos
poderes federais: Presidente da Mesa do Congresso Nacional, Presidente da
República ou Presidente do Supremo Tribunal Federal." (SILVA, José
Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25ª ed., São Paulo: Malheiros,
1992, p. 772).

Lei complementar
A Constituição estabelece que uma lei complementar deverá disciplinar as
normas gerais sobre como será o emprego das Forças Armadas (art. 142, §
1º). Esta lei já foi editada e se trata da Lei Complementar 97/99.

Garantia da lei e da ordem e atuação das Forças Armadas em atividades


de segurança pública
Como a Constituição Federal afirma que uma das finalidades das Forças
Armadas é a garantia da "lei e da ordem", entende-se que a Marinha, o
Exército e a Aeronáutica podem atuar também, excepcionalmente, na
segurança pública interna do país.
Dessa forma, não é inconstitucional o emprego das Forças Armadas para
atividades de defesa interna, desde que isso seja feito de forma excepcional,
temporária e justificada pela incapacidade dos órgãos de segurança pública de
garantirem a lei e a ordem.

Emprego das Forças Armadas


A decisão sobre o emprego das Forças Armadas é de responsabilidade do
Presidente da República (art. 84, XIII, da CF/88 e art. 15 da LC 97/99).

Análise do inciso I do novo § 2º do art. 9º


O inciso I do § 2º do art. 9º do CPM prevê o seguinte:
§ 2º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e
cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência
da Justiça Militar da União, se praticados no contexto:
I – do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente
da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa;

No Rio de Janeiro, o governo do Estado, há alguns anos, instituiu uma política


pública chamada de “pacificação das favelas”, por meio da qual os órgãos de
segurança pública ocupam as favelas, prendendo ou expulsando criminosos e
estabelecendo um regime de presença ostensiva do Poder Público nessas áreas.
Como o efetivo da Polícia Militar e da Polícia Civil é insuficiente para tais
operações, a Secretaria de Segurança do Rio tem se valido da colaboração da
Polícia Federal e das Forças Armadas.
Nesse contexto, se um militar do Exército, no exercício do policiamento nestas
favelas, pratica homicídio (consumado ou tentado) esta conduta será julgada
pela Justiça Militar com fulcro neste dispositivo.

Neste inciso I poderíamos também imaginar a atuação das Forças Armadas em


atividades de defesa civil e de construção civil. Explico.
As Forças Armadas têm sido constantemente utilizadas para atividades de
defesa civil. É o caso, por exemplo, de distribuição de alimentos e remédios em
regiões que passaram por alguma calamidade pública ou mesmo em situações
de socorro e resgate de pessoas feridas.
O Decreto nº 895/93 prevê isso expressamente:
Art. 10. Aos órgãos setoriais, por intermédio de suas secretarias, entidades e
órgãos vinculados, e em articulação com o órgão central do Sindec, entre
outras atividades, compete:
(...)
II - ao Ministério da Marinha coordenar as ações de redução de danos
relacionados com sinistros marítimos e fluviais, e o salvamento de náufragos;
apoiar as ações de defesa civil com pessoal, material e meios de transporte;
III - ao Ministério do Exército cooperar no planejamento de defesa civil e em
ações de busca e salvamento; participar de atividades de prevenção e de
reconstrução; apoiar as ações de defesa civil com pessoal, material e meios de
transporte;
(...)
X - ao Ministério da Aeronáutica coordenar ações de busca e salvamento,
evacuação aeromédicas e missões de misericórdia; apoiar as ações de defesa
civil com pessoal, material e meios de transporte;

Outra utilização atípica, mas frequente, das Forças Armadas está relacionada
com obras de construção civil. O Exército possui um Departamento de
Engenharia e Construção, que foi idealizado originalmente para construir e
reformar as instalações militares (quarteis etc.). No entanto, apesar disso,
devido aos bons trabalhos que realiza, este Departamento de Engenharia é
constantemente convocado para executar obras públicas. Foi o caso, por
exemplo, da transposição do rio São Francisco e da duplicação da BR-101.

Podemos, portanto, aventar que se um militar das Forças Armadas, no exercício


de uma dessas atribuições conferidas pelo Presidente da República (ou pelo
Ministro da Defesa), comete crime doloso contra a vida de um civil, ele terá
praticado crime militar e será julgado pela Justiça Militar.

Análise do inciso II do novo § 2º do art. 9º


O inciso II do § 2º do art. 9º do CPM estabelece:
§ 2º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e
cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência
da Justiça Militar da União, se praticados no contexto:
(...)
II – de ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão
militar, mesmo que não beligerante; ou

É o caso do soldado do Exército que está fazendo a guarda do quartel e atira


contra um ladrão que tentou invadir o imóvel. Mesmo que se alegue que
houve animus necandi por parte do soldado, esse julgamento será de
competência da Justiça Militar.
Antes da alteração, o STJ possuía precedentes no sentido de que, havendo
dúvida se o militar agiu ou não com a intenção de matar, o processo deveria
tramitar na Justiça Comum (e não na Justiça Militar). Nesse sentido: STJ. 3ª
Seção. CC 129.497/MG, Rel. Min. Ericson Maranho (Des. Conv. do TJ/SP),
julgado em 08/10/2014. Agora isso mudou!

Análise do inciso III do novo § 2º do art. 9º


Por fim, o inciso III do § 2º do art. 9º do CPM preconiza:
§ 2º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e
cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência
da Justiça Militar da União, se praticados no contexto:
(...)
III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e
da ordem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o
disposto no art. 142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas
legais:
a) Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986 - Código Brasileiro de
Aeronáutica;
b) Lei Complementar nº 97, de 9 de junho de 1999;
c) Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969 - Código de Processo Penal
Militar; e
d) Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

Enquadram-se neste inciso a grande maioria das hipóteses.


Vejamos cada uma das suas alíneas.

Lei nº 7.565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica)


O CBA prevê algumas situações em que as autoridades poderão determinar que
a aeronave que está voando de forma irregular pouse imediatamente no
aeródromo que lhe for indicado (art. 303, § 1º). É o caso, por exemplo, de uma
aeronave em que se suspeita que está transportando drogas. Se a aeronave
não cumprir a determinação, a Força Aérea Brasileira poderá disparar tiros
contra o avião considerado hostil a fim de forçá-lo a pousar. Confira:
Art. 303. A aeronave poderá ser detida por autoridades aeronáuticas,
fazendárias ou da Polícia Federal, nos seguintes casos:
I - se voar no espaço aéreo brasileiro com infração das convenções ou atos
internacionais, ou das autorizações para tal fim;
II - se, entrando no espaço aéreo brasileiro, desrespeitar a obrigatoriedade de
pouso em aeroporto internacional;
III - para exame dos certificados e outros documentos indispensáveis;
IV - para verificação de sua carga no caso de restrição legal (artigo 21) ou de
porte proibido de equipamento (parágrafo único do artigo 21);
V - para averiguação de ilícito.
§ 1º A autoridade aeronáutica poderá empregar os meios que julgar
necessários para compelir a aeronave a efetuar o pouso no aeródromo que lhe
for indicado.
§ 2º Esgotados os meios coercitivos legalmente previstos, a aeronave será
classificada como hostil, ficando sujeita à medida de destruição, nos casos dos
incisos do caput deste artigo e após autorização do Presidente da República ou
autoridade por ele delegada.
§ 3º A autoridade mencionada no § 1º responderá por seus atos quando agir
com excesso de poder ou com espírito emulatório.

Esses tiros podem acabar gerando a efetiva derrubada (abate) do avião e a


morte dos seus tripulantes. A apuração deste fato – se é caso de arquivamento
ou de processo por crime doloso contra a vida – compete ao Ministério Público
Militar e à Justiça Militar, não sendo competência da Justiça Comum.

Lei Complementar nº 97/99


Conforme já vimos acima, a LC 97/99 regulamenta o art. 142, § 1º, da CF/88 e
estabelece normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das
Forças Armadas.
O art. 15, § 7º da Lei prevê diversas hipóteses de atuação das Forças Armadas
em atribuições subsidiárias que são também consideradas atividades militares:
Art. 15 (...)
§ 7º A atuação do militar nos casos previstos nos arts. 13, 14, 15, 16-A, nos
incisos IV e V do art. 17, no inciso III do art. 17-A, nos incisos VI e VII do art.
18, nas atividades de defesa civil a que se refere o art. 16 desta Lei
Complementar e no inciso XIV do art. 23 da Lei nº 4.737, de 15 de julho de
1965 (Código Eleitoral), é considerada atividade militar para os fins do art. 124
da Constituição Federal.

A hipótese mais conhecida e frequente é a do art. 16-A da LC 97/99:


Art. 16-A. Cabe às Forças Armadas, além de outras ações pertinentes, também
como atribuições subsidiárias, preservadas as competências exclusivas das
polícias judiciárias, atuar, por meio de ações preventivas e repressivas, na faixa
de fronteira terrestre, no mar e nas águas interiores, independentemente da
posse, da propriedade, da finalidade ou de qualquer gravame que sobre ela
recaia, contra delitos transfronteiriços e ambientais, isoladamente ou em
coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, executando, dentre outras,
as ações de:
I - patrulhamento;
II - revista de pessoas, de veículos terrestres, de embarcações e de aeronaves;
e
III - prisões em flagrante delito.

Imagine que, ao realizar um patrulhamento no mar, a Marinha do Brasil aborde


uma embarcação suspeita e seja recebida a tiros. Ao revidar os disparos, os
fuzileiros navais acabam matando os agressores. A apuração deste fato
competirá ao Ministério Público Militar e à Justiça Militar.

Decreto-Lei nº 1.002/69 - Código de Processo Penal Militar


O art. 8º do CPPM traz as atribuições da Polícia judiciária militar. Dentre elas,
destaco:
a) apurar os crimes militares;
b) realizar diligência requisitadas pelos órgãos e juízes da Justiça Militar e pelos
membros do Ministério Público;
c) cumprir os mandados de prisão expedidos pela Justiça Militar.

O art. 7º traz o rol das autoridades militares que exercem a polícia judiciária
militar.
Imagine que, ao cumprir um mandado de prisão expedido pela Justiça Militar, o
civil que iria ser preso reage e os soldados acabam matando-o. O julgamento
deste fato será de competência da Justiça Militar, mesmo a vítima do suposto
crime doloso contra a vida sendo um civil.

Lei nº 4.737/65 - Código Eleitoral


As Forças Armadas, em especial o Exército, desempenham relevantes funções
durante o período eleitoral. As tropas fazem a segurança das urnas, dos locais
de votação e dos eleitores, coibindo possíveis crimes eleitorais.
As Forças Armadas atuam apenas em alguns Municípios e locais de votação,
mediante decisão do Tribunal Superior Eleitoral, sendo isso previsto no art. 23,
XIV, do Código Eleitoral:
Art. 23 - Compete, ainda, privativamente, ao Tribunal Superior:
XIV - requisitar a força federal necessária ao cumprimento da lei, de suas
próprias decisões ou das decisões dos Tribunais Regionais que o solicitarem, e
para garantir a votação e a apuração;

Suponha que um soldado acabe ceifando a vida de um civil durante o exercício


dessa função de vigilância do local de votação. A competência para julgar este
eventual crime doloso contra a vida é da Justiça Militar.

Derrogação implícita do art. 82 do CPPM


O art. 82 do CPPM exclui, peremptoriamente, da competência da Justiça Militar
os crimes dolosos contra a vida. Este dispositivo foi, portanto, tacitamente
derrogado pela Lei nº 13.491/2017:
Art. 82. O foro militar é especial, e, exceto nos crimes dolosos contra a vida
praticados contra civil, a ele estão sujeitos, em tempo de paz:

Fora do exercício de suas funções


O militar que praticar homicídio fora do exercício de suas funções será julgado
normalmente pela Justiça Comum (Tribunal do Júri).

O novo art. 9º, § 2º do CPM, fala em “militares das Forças Armadas”. E


no caso de crimes dolosos contra a vida praticados por militares
estaduais (policiais militares e bombeiros militares) em desfavor de
civis, de quem será a competência?
Da Justiça Comum (Tribunal do Júri), por força de expressa previsão
constitucional:
Art. 125. (...)
§ 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos
Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos
disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for
civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do posto e da
patente dos oficiais e da graduação das praças.

Veto
O art. 2º da Lei nº 13.491/2017 trazia a previsão de que essa competência da
Justiça Militar seria temporária. Veja o que dizia o dispositivo:
Art. 2º Esta Lei terá vigência até o dia 31 de dezembro de 2016 e, ao final da
vigência desta Lei, retornará a ter eficácia a legislação anterior por ela
modificada.

Essa previsão existia porque o projeto de lei foi pensado especialmente para a
atuação das Forças Armadas durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro em 2016.
Ocorre que a tramitação demorou no Congresso Nacional e o projeto somente
foi aprovado agora.
Diante disso, o Presidente da República vetou este art. 2º.

Márcio André Lopes Cavalcante


Professor. Juiz Federal

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