BUENO, Luciana - O Paranismo e As Artes Visuais

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LUCIANA ESTEVAM BARONE BUENO

O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS

FLORIANÓPOLIS

2009
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA UDESC

CENTRO DE ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS

LUCIANA ESTEVAM BARONE BUENO

O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa


de Pós–Graduação em Artes Visuais, Linha de
Pesquisa em História, Teoria e Crítica da Arte; do
Centro de Artes da Universidade do Estado de
Santa Catarina.
Orientadora: Profa. Dra. Sandra Makowiecky

FLORIANÓPOLIS - SC

2009
LUCIANA ESTEVAM BARONE BUENO

O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS

Esta dissertação de mestrado em História, Teoria e Crítica da Arte foi considerada


_______________ pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do Centro de
Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina.

BANCA EXAMINADORA

Orientador:
Profa. Dra. Sandra Makowiecky
UDESC-SC

Avaliador:
Profa. Dra. Rosângela Cherem
UDESC-SC

Avaliador Externo:
Prof. Dr. Artur Freitas
FAP-PR

Avaliador Suplente:
Profa. Dra. Sandra Ramalho e Oliveira
UDESC-SC

Florianópolis, 19 de junho de 2009.


Aos meus pais, Antonio e Maria
Gabriela, pessoas fundamentais em minha
vida, que me ensinaram a não desistir, por
mais difícil que seja uma situação, com fé e
coragem iremos vencer.

Com amor aos meus filhos Davi e


Daniel.
AGRADECIMENTOS

Tudo nesta vida é construído a partir de várias pessoas, umas com funções

mais destacadas, outras menos, mas, como num espetáculo teatral, cada papel é

fundamental. Esta dissertação só pôde ser concluída a partir da colaboração de muita

gente, muitas foram as palavras de conforto, força, carinho, compreensão. Muitas foram

as idéias, livros emprestados, galhos quebrados no trabalho.

Primeiramente, quero agradecer a Deus, pela oportunidade de realizar este

desejo de conseguir entrar, freqüentar e concluir o mestrado. Quero agradecer ao

Marcio, meu esposo, pela força, pela ajuda, pela paciência e pela função de pãe em

minha falta. Ao meu filho Davi, por ter perdoado minha ausência e pelas vezes que

deixei de brincar, de contar histórias..., aos meus pais e à minha irmã Sônia que sempre

me deram total apoio a cada passo dado, obrigada também pelas orações.

Agradeço aos amigos, Lizete, Giovana, Gilmar e Dulcirene, vocês foram

mais que amigos, foram maravilhosos.

Agradeço ao pequeno Daniel, por ter chegado durante o mestrado e ter

aliviado meus pensamentos, me dado momentos de paz, abrandado meus anseios,

mesmo aumentando meu trabalho. A todos vocês, muito obrigada, de todo o coração e

meu amor eterno.

Agradeço, com especial carinho, às amizades adquiridas durante a

caminhada, aos companheiros de sala em especial à Luciane, à Elke e à Milla.


À minha querida e estimada professora orientadora Sandra Mackowieky,

muito obrigada, não apenas pelo incentivo e por ter acreditado em mim, mas também

pelo profissionalismo, dedicação e amizade que conduziram nossas orientações.

Agradeço pelas trocas de idéias, e aos professores pelos conhecimentos

transmitidos durante esta trajetória.


Nossos sonhos só serão realizados quando

a nossa fé ultrapassar a nossa ousadia.

Luciana Barone
BARONE, Luciana E. O Paranismo e as Artes Visuais. 2009. 177 f. Dissertação
(Mestrado em Artes Visuais, Linha de Pesquisa em História, Teoria e Crítica da Arte) –
Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV) do Centro de Artes (CEART)
da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis, S.C.

RESUMO

Ao inventar o passado a cidade constrói o futuro, suas particularidades arquitetônicas


são caracterizadas pelo passado que é possível de se enxergar. Este trabalho teve como
pretensão buscar na cidade de Curitiba um passado que deixou vestígios no presente.
No século XIX inicia-se no Paraná uma preocupação por parte de alguns intelectuais em
relação à identidade cultural do Estado. Na década de 20, um grupo de pessoas
incomodadas ainda pelo fato do Estado do Paraná não possuir em si traços regionais,
idealizam o Movimento Paranista, destacando, entre outros, o escritor Romário Martins
e os artistas plásticos Lange de Morretes e João Turin. Uma das características do
discurso dos idealizadores do Paranismo era de integrar todos os indivíduos que
adotassem o Paraná como sua terra, sendo eles paranaenses, brasileiros ou imigrantes. O
Movimento foi divulgado na cidade de Curitiba com a intenção de atingir a todo Estado
do Paraná através de lendas, artigos publicados e principalmente por meio das Artes
Visuais, que foram seu principal veículo de exposição. Ícones e estilizações foram
espalhados por toda cidade de Curitiba, chegando a ser reconhecido entre seus criadores
como o “estilo paranista”, com a intenção de convencer a toda população de que, a
partir daquele momento, imagens do pinheiro, da pinha e do pinhão eram efetivamente
os símbolos do Paraná. Posteriormente também a gralha-azul, remontando à mesma,
uma possível preservação dos pinheiros. Apesar do movimento paranista se restringir à
Curitiba, os paranaenses ainda hoje em geral reconhecem os símbolos paranistas, apesar
de desconhecerem sua história. Esta aceitação da população paranaense, em especial a
curitibana, é fortalecida também graças a algumas atitudes posteriores ao Paranismo que
acabaram perpetuando as idéias do mesmo; podemos citar os incentivos às leis e à
cultura por parte de governantes e representantes do Estado e de colaboradores em
relação ao resgate da tradição e simbologia paranaense. Porém é inegável que o agente
principal da permanência dos símbolos paranistas foi mesmo a produção artística que se
gerou durante as décadas de 20 e 30, bem como a produção gerada após o movimento,
propiciando um Neo-paranismo; este e suas idéias e alternativas diferenciadas,
proporcionaram aos símbolos paranaenses resoluções inovadoras que, provavelmente,
jamais foram imaginadas por seus primeiros idealizadores.

Palavras-chave: Paranismo; Símbolos Paranaenses; Artes Visuais.


ABSTRACT

In inventing the past, city constructs future, its architectonical particularities are
characterized by the past that is possible to see. This work had as pretension to search,
in the city of Curitiba, a past that left vestiges in the present. In the 19th century, some
intellectuals from Paraná start to worry about the State’s cultural identity. In the 20’s, a
group of uncomfortable people yet by the fact that the state of Paraná did not have
regional traces itself, they idealize the Paranista Movement, highlighting, among others,
the writer Romário Martins and the plastic artists Lange de Morretes and João Turin.
One of the Paranismo idealizers’ speech’s characteristics was to integrate all individuals
who adopted Paraná as their own land, no matter if they were paranaenses, Brazilians or
immigrants. The Movement was divulged in the city of Curitiba, intending to reach all
state of Paraná, through legends, published articles and mainly through Visual Arts,
which were their main exposure vehicle. Icons and stylization were spread all over the
city of Curitiba, even being recognized among its creators as the “paranista style”,
intending to convince all population that from that time on, images of the pine tree, the
pine and the pine fruit were effectively Paraná’s symbols. Later on, also the blue crow
as a possible preservation of the pine trees. Despite the paranista movement to be
restricted to Curitiba, paranaenses usually still today recognize paranistas’ symbols,
despite the fact that they did not know its history. This acceptance of the paranaense
population, specially the curitibana, is strengthened also due some attitudes posterior the
Paranismo which perpetuated its ideas, being able to cite the law and culture’s
inducements from the government and State’s representatives and collaborators in
relation tradition’s rescue and paranaense symbology. However it is undeniable that the
main agent of the paranistas symbols’ permanence was the artistic production generated
after the movement, allowing a Neo-paranismo, this, with alternative and differentiated
ideas, allowed paranaenses symbols innovative resolutions that, probably, were never
imagined by their first idealizers.

Keywords: Paranismo; Paranaenses Symbols; Visual Arts.


LISTA DE IMAGENS

Imagem 01 - Pinheiros – A Romário Martins - Artur Nísio..........................................42

Imagem 02 - O baile das raças - Hermann Schiefelbein (1933)..................................50

Imagem 03 - Lavando Roupa - Alfredo Andersen (s.d.)...............................................57

Imagem 04 - A Queimada [Lavadeiras] - Alfredo Andersen (s.d.)..............................58

Imagem 05 - Túmulo de André de Barros - João Turin.................................................60

Imagem 06 - Baixo relevo “Caridade” - João Turin (1923).........................................60

Imagem 07 – Foto de João Guelfi, João Turin e Zaco Paraná.........................................63

Imagem 08 - O Semeador – Zaco Paraná (1923)..........................................................68

Imagem 09 - Ilustração Paranaense ano II nº. 01, Janeiro de 1928.................................70

Imagem 10 - Ilustração Paranaense ano II, nº. 05 / maio de 1928..................................70

Imagens 11, 12, 13, 14 e 15 - Estilizações de Lange de Morretes....…………………..74

Imagem 16 - Depois da Tormenta - Frederico Lange de Morretes (1930)..................75

Imagem 17- Rei Solitário – Frederico Lange de Morretes (1953)...............................78

Imagem 18 - Paisagem com Pinheiro - Frederico Lange de Morretes (1929)............79

Imagem 19 - A Natureza - Frederico Lange de Morretes (s/d.)...................................80

Imagem 20 - Alma da Floresta - Frederico Lange de Morretes (1927-1930).............81

Imagem 21 - Auto Retrato Paranista – João Turin (década de 20)...............................84

Imagem 22 - Ânfora Paranaense – João Turin..............................................................86

Imagem 23 - Ânfora Grega- Período Pré-Homérico (XX a.C. - XII a.C.)......................86


Imagem 24 - Capitel Paranaense I – João Turin...........................................................87

Imagem 25 - Capitel Paranaense II – João Turin.........................................................87

Imagem 26 – “Ilustração Paranaense” – Janeiro de 1928...............................................88

Imagem 27 - Capitel Grego da Ordem Jônica................................................................89

Imagem 28 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin (1928).....................................92

Imagem 29 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin (1928 - detalhe)....................92

Imagem 30 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin (1928 - detalhe)....................93

Imagem 31 - Casa Ateliê - Modelo entrando no ateliê....................................................94

Imagem 32 - Casa Ateliê.................................................................................................95

Imagem 33- Fachada da casa do Dr. Bernard Leinig - João Turin (1928)...................96

Imagem 34 - Casa do Dr. Bernardo Leinig (outro ângulo) - João Turin (1928)..........96

Imagem 35 - Estudo para Chafariz Paranaense – João Turin (década de 20)...............98

Imagem 36 - Revista “Ilustração Paranaense” - ano II nº10 e 11- out/nov 1928............99

Imagem 37 - Homem Vitruviano - Leonardo da Vinci..................................................99

Imagem 38 – círculos - esquema Luciana Barone.........................................................101

Imagem 39 – triângulos – esquema Luciana Barone.....................................................101

Imagens 40, 41 e 42 - Moda Paranaense – João Turin (década de 20)........................101

Imagem 43 - Acessórios para Moda Paranaense – João Turin (década de 20)...........102

Imagens 44 e 45 - Sombrinha Paranaense – João Turin (década de 20).....................103

Imagem 46 – Logomarca criada por Poty Lazzaroto...................................................109

Imagem 47 - 300 gralhas para Curitiba - Rogério Dias..............................................110

Imagem 48 - Rosácea do pátio do Museu Alfredo Andersen........................................113

Imagem 49 - Praça Osório, desenho de Lange de Morretes ao redor do relógio........114

Imagem 50 - Rosácea da Praça Osório..........................................................................114

Imagem 51 - Desenho Pinha-dos-Ventos......……………………………....................115


Imagem 52 - Pinha-dos-Ventos.....................................................................................116

Imagem 53 - Praça Dr. João Cândido. Calçada externa com motivo paranista....……116

Imagens 54 – Tapete Paranista – Bússola.....................................................................117

Imagem 55 - Tapete Paranista –Rosácea..............…………………………………….117

Imagem 56 - Tapete com motivos inspirados na obra de Lange de Morretes.............118

Imagens 57 e 58 - Memorial de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais - Maria Inês Di


Bella (1993)...................................................................................................................119

Imagem 59 - Túmulo da Família Stenghel....................................................................121

Imagem 60 e 61 - Túmulo da Família Stenghel............................................................122

Imagem 62 e 63 - Centro Cultural Solar do Barão........................................................122

Imagem 64 - Champagnat Shopping.............................................................................124

Imagem 65 - Fachada principal do Champagnat Shopping...........................................125

Imagem 66 - Calçada de entrada do Champagnat Shopping.........................................125

Imagens 67 e 68 - Painéis da entrada do Champagnat Shopping..................................126

Imagens 69 e 70 - Decoração do Champagnat Shopping..............................................127

Imagens 71 e 72 - Peças da mobília do Champagnat Shopping....................................127

Imagens 73 e 74 - Peças da mobília do Champagnat Shopping....................................128

Imagem 75 - Memorial Cidade de Curitiba - Escadaria em forma de Pinheiro ..........129

Imagem 76 - Memorial Cidade de Curitiba. Rio de Pinhões.........................................130

Imagem 77- Urna Paranista. Arca dos 300 Anos.........................................................131

Imagens 78, 79 e 80 - Bijuterias criadas pela designer Suelli Zavvadinack.................132

Imagens 81, 82 e 83- Bijuterias criadas pela designer Suelli Zavvadinack. ................133

Imagens 84 e 85 - Troféu “Prêmio João Turin” - Valdir Francisco............................134

Imagem 86 - Cartaz de divulgação da Exposição “Resgate Icongráfico/Paranismo”...135

Imagem 87 – Foto interna do catálogo de divulgação da Exposição “Resgate


Icongráfico/Paranismo”.................................................................................................136
Imagem 88 - Cartaz de divulgação da Exposição “Instalação Neo-Paranista”.............136

Imagem 89 - Cafés - Lirdi Jorge..................................................................................138

Imagem 90 - Série: Paraná-Pinheiros-Pinhões (1982) - Lirdi Jorge..........................138

Imagem 91- Série: Paraná-Pinheiros-Pinhões (1982) - Lirdi Jorge...........................138

Imagem 92 - A Gralha Azul Escondida... (1982) - Lirdi Jorge...................................138

Imagem 93 - Vamos ajudar a gralha - Lirdi Jorge......................................................138

Imagem 94 - Estudo para Instalação - Sérgio Monteiro de Almeida..........................140

Imagem 95 – Instalação - Sérgio Monteiro de Almeida.............................................140

Imagem 96 - Instalação - Sérgio Monteiro de Almeida.............................................142

Imagem 97 - Álbum de gravuras - Sérgio Monteiro de Almeida...............................143

Imagem 98 - Intervenção urbana / performance - Sérgio Monteiro de Almeida.......143

Imagem 99 - Papel impresso com pedras da rua XV- Sérgio Monteiro de Almeida..144

Imagem 100 - Monumento ao Primeiro Centenário do Paraná - Napoleon Potyguara


Lazzarotto ....................................................................................................................147

Imagem 101 - O Paraná (1987) - Poty Lazzarotto.....................................................148

Imagem 102 - Curitiba e sua gente - Poty Lazzarotto................................................150

Imagem 103 - Curitiba e sua gente - Poty Lazzarotto................................................150

Imagem 104 - O Alimento - Ida Hannemann de Campos..........................................152

Imagem 105 – Pesquisa I - Ida Hannemann de Campos...........................................153

Imagem 106 - Mural da Praça do Asilo São Vicente de Paula - Ida Hannemann de
Campos.........................................................................................................................153

Imagem 107 – Licor de Araucária - Ida Hannemann de Campos..............................154


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................15

CAPÍTULO I - A CIDADE DE CURITIBA E O PARANISMO................................20

1.1 O Paranismo........................................................................................................25
1.2 O Vocábulo..........................................................................................................27
1.3 O Centro Paranista...............................................................................................29
1.4 Os Imigrantes.......................................................................................................33
1.5 O Simbolismo e o Paranismo..............................................................................35
1.6 O Pinheiro, a Pinha e o Pinhão............................................................................41
1.7 A Inserção de um Novo Símbolo – A Gralha Azul.............................................44

CAPÍTULO II: O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS..........................................48

2.1 O Paranismo e o Modernismo Paulista................................................................51


2.2 As Escolas de Mariano de Lima e Alfredo Andersen.........................................54
2.3 Os Artistas Plásticos e as produções paranistas das décadas de 20 e 30.............59
2.4 João Ghelfi – um Semeador.................................................................................63
2.5 Zaco Paraná e O Semeador..................................................................................65
2.6 Lange de Morretes...............................................................................................71
2.6.1 Lange de Morretes – A busca por um método.........................................73
2.6.2 Lange de Morretes e a Pintura.................................................................76
2.7 João Turin............................................................................................................82
2.7.1 João Turin e as propostas de arquitetura e decoração............................85
2.7.2 A capa da Revista “Ilustração Paranaense” e a Moda João Turin.........98
CAPÍTULO III – O PARANISMO VISUALMENTE PRESENTE APÓS AS
DÉCADAS DE 20 E 30................................................................................................105

3.1 Curitiba e o Incentivo à Cultura e à Tradição...................................................107


3.2 As Calçadas Curitibanas e as Idéias de Lange..................................................112
3.2.1 As Idéias de Lange de Morretes além das calçadas...............................117
3.3 A Arquitetura em Curitiba e os Vestígios de Turin..........................................120
3.3.1 Paranismo Além das Idéias de Turin.....................................................123
3.3.2 João Turin presente nos Acessórios e na Moda.....................................132
3.4 Os artistas, as exposições e a simbologia paranista após a década de 80..........134
3.4.1 Sérgio Monteiro de Almeida - um paranista dos anos 90....................139
3.4.2 Napoleon Potyguara Lazzarotto e os painéis com símbolos
paranistas........................................................................................................145
3.4.3 Ida Hannemann de Campos - uma eterna paranista..............................151

CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................155

REFERÊNCIAS...........................................................................................................167

ANEXO I – Entrevista de David Carneiro a Rosely Roderjan...............................173


15

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa pretendeu abordar o momento em que intelectuais


curitibanos denominados “paranistas” empenharam-se, estimulados pelo fato do Estado
não possuir traços próprios regionais específicos, em inventar uma tradição para o
Paraná , idealizando o Movimento Paranista. Este, além da inserção do imigrante como
componente da família paranista, teve como iniciativas principais atitudes de
valorização do Estado do Paraná, onde divulgavam suas qualidades e idealizações de
um Paraná melhor para o trabalho, em busca da ordem, rumo ao progresso, através da
bondade e da justiça. Os projetos paranistas foram anunciados através de artigos
publicados em revistas e jornais, porém a principal estratégia do Movimento Paranista
para atingir o “imaginário-popular” foi utilizar-se das artes visuais, propondo uma
alfabetização visual não formal, ou seja, não escolar. Estilizações, decorações e ícones
foram alastrados por toda cidade de Curitiba, capital do Estado, com a intenção de
convencer toda população de que, a partir daquele momento, imagens do pinheiro, da
pinha e do pinhão eram efetivamente os símbolos do Paraná.
O fato de ser paranaense e de morar quase que minha vida toda no interior do
Estado me estimulou a estudar este assunto que nunca me foi apresentado nas escolas
públicas onde estudei. Ouvi sobre “Paranismo” pela primeira vez quando, já formada na
faculdade, participei de um simpósio na capital1. Descobri então que existia um
movimento que se declarava paranaense e mantinha-se restrito a Curitiba, pelas obras
públicas que compunham a mesma. Porém, mesmo sem acessar o interior paranaense, o
Paranismo se faz presente em todo Estado, pois os paranaenses em geral reconhecem
seus símbolos e desconhecem sua história. Eu mesma cresci reconhecendo os símbolos
paranaenses como verdadeiros representantes do meu Estado.

1
Simpósio: Cultura e Arte Educação para Cidadania. Paranismo 70 anos. Centro Juvenil de Artes
Plásticas. – 16 a 19 de agosto de 1994.
16

Assim, a partir de uma curiosidade em saber mais sobre este assunto, comecei
um estudo em torno do Movimento Paranista. Minha leitura inicial foi a obra de Luis
Fernando Lopes Pereira, “Paranismo: O Paraná Inventado; cultura e imaginário no
Paraná da I República”. O autor aponta em seu trabalho as particularidades existentes no
Estado do Paraná principalmente em relação ao republicanismo anticlerical e positivista,
destacando a participação do Movimento Paranista na tentativa de forjar a identidade
regional para um Estado que era considerado apenas uma parcela de terra sem fronteiras
definidas, cuja população heterogênea não possuía quaisquer características em comum.
Pereira faz uma relação do recurso utilizado pelos paranistas - ou seja, as artes visuais -
para construção da identidade regional, com a obra de José Murilo de Carvalho “A
formação das almas”, onde o autor apresenta as artes plásticas como fonte de construção
para o imaginário republicano, e o mesmo afirma que a população brasileira não teve
participação direta na construção da república, ela assistiu à proclamação.
A partir destas leituras, iniciei uma pesquisa que, a priori, pretendia estabelecer
uma relação maior entre o Paranismo e os ideais republicanos, analisando a
alfabetização visual imposta pelo Paranismo sobre a população curitibana, principiando
pelas obras apresentadas no livro de Pereira. Porém, ao aprofundar o trabalho de coleta
de imagens, percebi que as obras visuais citadas por Pereira tratavam-se apenas de uma
pequena parcela da extensa produção artística chamada paranista. Apesar de extensa,
não havia uma documentação do registro imagético deste movimento, estas obras não
estavam organizadas de forma mais sistemática em lugar algum, a não ser como parte
de trabalhos onde o assunto se relacionava. Sobre estes, podemos citar os estudos de:
Rachel Menezes Butter, “O Escultor João Turin no Paraná de 1920 a 1940”, cuja
Monografia apresenta uma parcela considerável da obra de João Turin abordando sua
participação no Movimento Paranista e suas influências, ou não, na construção de uma
identidade paranaense; Luis Afonso Salturi em sua Dissertação em Sociologia,
“Frederico Lange de Morretes, liberdade dentro de limites: Trajetória do Artista-
cientista”, faz um estudo mais aprofundado sobre Lange de Morretes e sua importante
contribuição ao movimento, analisando a produção artística, cientifica e intelectual,
relacionando-a com a trajetória do artista, apresentando sua rede de relações sociais,
bem como sua atuação como docente e pesquisador em instituições públicas e
particulares. A análise dos desenhos e pinturas de Lange, neste estudo, foi feita a partir
da visão sociológica e com respaldo das influências de estilos artísticos, diferentes
temáticas e aspectos simbólicos; Geraldo Leão Veiga de Camargo, em sua Tese na linha
17

de História “Paranismo: Arte, Ideologia e Relações Sociais no Paraná. 1853 – 1953”,


faz uma abordagem mais ampla sobre os artistas no Paraná, dentre eles os paranistas e
as lutas de origem adventícia para colaborar na consolidação simbólica do Estado,
porém as obras paranistas apresentadas são poucas, tendo em vista que a leitura destas
imagens não faz parte do foco da pesquisa, as obras são exibidas de maneira que se
possa reforçar o conteúdo do texto, limitando-se ainda nos trabalhos realizados até a
década de 1950, ou seja, sem relação com obras atualmente produzidas dentro desta
temática.
Assim sendo, minha intenção inicial de estudar a persistência das formas
paranistas, tendo por base o repertório mais denso em termos de memória, identidade,
sociologia, filosofia, entre outros aspectos, foi modificada a partir da revisão
bibliográfica, em que percebi notória falta de repertório imagético sobre o Paranismo
mais concentrado. A dificuldade encontrada acabou por redirecionar esta pesquisa, que
se voltou mais para o registro das obras, tendo como pretensão desta forma apresentar
um trabalho que viesse servir para estudantes de arte, historiadores e demais estudiosos
que desejem entender um pouco mais sobre a relação entre Paranismo e Artes Visuais.
Desta maneira fui recolhendo fragmentos e atuando como detetive de modo que
pudesse refazer um percurso imagético e assim elaborar um estudo que pudesse se
tornar também mais uma referência para o estudo das Artes Visuais e o Paranismo.
Desta forma o trabalho acabou se diferindo dos demais estudos referentes ao Paranismo,
pois a maior preocupação foi em apresentar um repertório visual produzido, a partir da
simbologia paranista, iniciando-se nas décadas de 20 e 30, passando pelos anos 90, onde
houve um considerável resgate da temática, e ainda buscando na atualidade a
reverberação da potência das imagens construídas pelos Paranistas, tornando-se desta
maneira um estudo inédito no Estado do Paraná.
Hoje, oitenta anos depois do Movimento Paranista, podemos identificar que os
símbolos consagrados pelo mesmo continuam maciçamente nas calçadas, nas
luminárias, nos pilares, fazendo parte de um cenário comum, a cidade de Curitiba
visualmente incorporou esse repertório de forma indelével. É interessante apontar que
continua-se produzindo obras com características paranistas, ou seja, a pinha, o pinhão,
o pinheiro e também a gralha estão presentes ainda hoje em muitos trabalhos de artistas
plásticos. Outro apontamento pertinente é que, apesar da história sobre o Movimento
Paranista não ter atingido a população em geral de todo Estado, como era a intenção do
movimento, seus símbolos continuaram a serem reproduzidos mesmo depois da
18

ausência de seus idealizadores, porém com soluções plásticas bem diferenciadas. Assim
sendo, temos como objetivo neste trabalho: investigar de que maneira inicialmente o
Paranismo foi estruturado por seus idealizadores, assim como entender seus objetivos e
seus meios de divulgação; analisar as diferentes manifestações visuais utilizadas pelo
Movimento Paranista a fim de difundir seus ideais; questionar a busca pelo moderno
paranista em contraposição às vanguardas do mesmo período e da mesma maneira;
investigar em que se inspiravam as obras paranistas; avaliar as ressonâncias no
imaginário-popular bem como a permanência icônica paranista no decorrer histórico da
Arte Paranaense; pesquisar a permanência da iconologia paranista que possivelmente
ainda exista em trabalhos de artistas atuais.
Para o desenvolvimento desta pesquisa, que se insere na linha de pesquisa em
Teoria e História das Artes Visuais, inicialmente foi feito o levantamento do material
bibliográfico considerando como fontes primárias o “Manifesto Paranista”, os
“Periódicos Paranistas”, “Revista Ilustração Paranaense”, obras de Romário Martins e
Luis Fernando Lopes Pereira. Em seguida foi direcionada a pesquisa na produção
artística paranista, que se desenvolveu nas diversas manifestações visuais como: a
pintura, a escultura, o desenho, a gravura, a arquitetura, a decoração. Diante destas
propostas de fontes, foram selecionadas as imagens e o discurso dentro da linguagem
visual. De acordo com a leitura que realizei, esta pesquisa pode ser classificada da
seguinte forma: qualitativa, exploratória, bibliográfica e documental.
Cabe questionar que apesar do Paranismo estar visualmente circunscrito em
Curitiba pelas obras públicas, por que os paranaenses em geral reconhecem a pinha, o
pinheiro e o pinhão como seus símbolos? Quais seriam as permanências do Paranismo e
seus símbolos e desdobramentos nas percepções modernas e contemporâneas da arte
paranaense no que tange o fenômeno desta iconologia?
Dentro deste pensamento o trabalho desenvolveu-se em torno de duas hipóteses:
1 - O paranismo é uma invenção para forjar uma identidade; 2 - A utilização de obras
visuais como veículo de divulgação do movimento foi o motivo pelo qual o movimento
teve sua sustentação.
O trabalho está organizado em capítulos, estruturados de forma a mostrar um
encadeamento de idéias. No primeiro capítulo este estudo abordou algumas relações
entre a cidade de Curitiba, seu passado e presente, numa conexão entre história e
memória. Ainda, o Movimento Paranista foi relatado de maneira que pudéssemos
19

entender quais foram seus principais objetivos, seus ideais e principais meios de
divulgação.
O Segundo capítulo trata do Paranismo e a utilização das Artes Visuais como
efetivação do mesmo, bem como seus principais divulgadores, os artistas plásticos João
Ghelfi, Zaco Paraná, Langue de Morretes e João Turin. Neste capítulo pretendemos
questionar quais foram as manifestações artísticas utilizadas pelos artistas para
divulgarem o Paranismo, e quais os recursos plásticos, ou seja, de que maneira os
elementos símbolos do Paraná foram inseridos nas obras visuais.
O terceiro capítulo aborda a permanência do paranismo nas obras de artistas
posteriores ao movimento. Buscamos compreender quais foram os meios e atitudes que
proporcionaram a conservação do Paranismo mesmo depois da ausência de seus
idealizadores, bem como de que maneira este Paranismo se apresentou nas obras
denominadas Neo-paranistas.
20

CAPÍTULO I

A CIDADE DE CURITIBA E O PARANISMO


21

Sandra Pesavento, ao falar sobre a cidade, afirma que a mesma é sensibilidade, é


produção de imagens:

[...] é expressão de utopias, desejos e medos [...] é, sobretudo,


materialidade erigida pelo homem, é ação humana sobre a natureza.
[...] é, pois sociabilidade: comporta atores e relações sociais,
personagens, grupos, classes, práticas de interação e de oposição.
Marcas que registram uma ação social de domínio e transformação, no
tempo, de um espaço natural (PESAVENTO, 2002, p. 24).

Para a autora a cidade é analisada pelo presente, mesmo a cidade do passado, ela
está em constante renovação no hoje, seja no pensamento individual ou coletivo, ou
ainda através dos contos históricos que as gerações reconstroem do passado.

É, ainda, nesta medida, que uma cidade inventa seu passado,


construindo um mito de origens, descobre pais ancestrais, elege seus
heróis fundadores, identifica um patrimônio, cataloga monumentos,
transforma espaços em lugares com significados. Mais do que isso, tal
processo imaginário de invenção da cidade é capaz de construir
utopias, regressivas ou progressivas, através das quais a urbs sonha a
si mesma (PESAVENTO, 2002, p. 25).

Assim sendo, a cidade constrói o futuro ao inventar o passado, e o tempo está


sempre relacionado ao espaço, é impossível separar os dois. A cidade se “dá a ver” por
suas particularidades e materialidade arquitetônica, e se “dá a ler” pelo passado que é
possível de se enxergar, passado que faz parte de outras cidades e se faz presente na
cidade atual. Esta relação entre espaço e tempo oferecida ao olhar pela cidade propõe
ainda uma cidade imaginária, que existe no pensamento, que é produzida pela memória
e pela história, que reconstrói uma ausência, que visualiza o tempo e o espaço. Neste
processo imaginário de construção de espaço-tempo, na invenção de um passado e de
um futuro, a cidade está sempre a explicar o seu presente. A cidade, desta maneira,
sugere uma definição de seu [...] “modo de ser, uma cara e um espírito, um corpo e
uma alma, que possibilitam reconhecimento e fornecem aos homens uma sensação de
pertencimento e de identificação com a sua cidade (PESAVENTO, 2002, p. 25).
Na cidade de Curitiba podemos identificar a busca de pertencimento, a
necessidade em definir uma identidade, quando voltamos no tempo e nos deparamos
22

com intelectuais curitibanos, em plenos anos 20, reunidos em confeitarias,


principalmente no café Belas Artes na época no centro da Rua XV - entre as ruas Barão
do Rio Branco e Monsenhor Celso1 - para pensar sobre a inexistência de traços por meio
de lendas, tradições e vultos históricos regionais no Paraná.
A cidade de Curitiba nos traz uma descrição de um passado que por vezes
precisamos reconhecer através das entrelinhas. Isso nos é apresentado por meio do
visual, um visual que nos é tão comum que em muitas ocasiões nos passa despercebido.
É atravessadamente pelo olhar da memória que se faz possível enxergar algo que já
aconteceu, a presença daquilo que não existe mais, mesmo que pela ausência da matéria.
Portanto, ao caminhar pelas avenidas de Curitiba, ao depararmos com uma determinada
obra pública, ou com os petit pavês que compõem várias calçadas, é possível reconhecer
além da matéria que nos é apresentada pela visão, a presença de algo que não está
presente no presente.
Fundada em 1693, Curitiba conta hoje com uma população de um milhão e
oitocentos mil habitantes, portanto um grande centro. É apontada como uma cidade de
bons negócios, de ser bem planejada, de possuir um sistema de transporte coletivo
integrado e ser considerada uma cidade poli-cultural, tendo como exemplo o Bosque do
Alemão, o Memorial Ucraniano, O Memorial Polonês, O Bosque de Portugal e tantos
outros.
Apesar de trazer uma fachada reconhecida nacionalmente como uma cidade
“moderna”, com seus edifícios pós-modernos e seus “bi-articulados”, Curitiba, também
possui seu Centro Histórico É possível também reconhecer nele a arquitetura de
variados estilos dos séculos XVIII e XIX, Luso-brasileiro, Eclético e Art Déco. Muitos
deles tombados, hoje restaurados e adaptados, em sua maioria para o desempenho de
funções culturais, como a Casa Vermelha e a Casa Romário Martins. No Largo Coronel
Enéas (Largo da Ordem) se encontra a Igreja mais antiga da cidade, construída em
1737, a igreja da Ordem Terceira de São Francisco das Chagas.
Além desta aura de cidade modelo, Curitiba é ornamentada por seus pinhões e
pinheiros. A cidade carrega em suas ruas e praças a construção de uma identidade que
não existia, uma apropriação de símbolos que não eram seus. Curitiba, bem como o

1
Informação sobre a localização, extraída do Artigo: Catedrais de Cultura e de Arame em Curitiba: Mito
e Metáfora. De Carmen Lúcia Fornari Diez - Professora da UFPR e doutoranda pela UNIMEP. Geraldo
Balduíno Horn - Professor da UFPR e doutorando pela USP. Disponível em:
http://www.anped.org.br/reunioes/23/textos/0229t.PDF
23

Estado do Paraná, na opinião de seus intelectuais comprometidos com a tradição e


pensamentos históricos, não possuía um mito, uma lenda, algo concreto que pudesse
reforçar suas raízes. Podemos identificar isso nas palavras de Brasil Pinheiro Machado,
em uma publicação no ano de 1930, num dos “Instantâneos Paranaenses” – “A Ordem”
– onde afirma: O Paraná é um estado típico desses que não tem um traço que faça deles
alguma coisa notável [...] (MACHADO, 1930 p.09). A inexistência de traços regionais
foi apontada pelos intelectuais como resquícios de descaso do regime monárquico com
o Estado. Era preciso, então, criar uma tradição para este Estado, era preciso forjar uma
historiografia, o que Hobsbawm chamou de Invenção das Tradições:

Por tradição inventada entende-se um conjunto de práticas,


normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais
práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores
e normas de comportamento através da repetição o que implica
automaticamente, uma continuidade em relação ao passado. Alias,
sempre que possível, tenta-se estabelecer continuidade com um
passado histórico apropriado (HOBSBAWM, 1984, p.09).

Hobsbawm, ao falar de uma necessidade de continuidade de um passado


histórico, está se referindo à construção exercida pelos americanos, porém esta
construção pode ser percebida nos paranaenses quando determinados a edificar uma
história regional no Paraná. Este passado era reforçado com alicerces políticos, ou seja,
a história era embasada em documentos oficiais, determinando assim que o melhor
presente seria um presente que revivesse o passado, e este passado era, portanto,
exaltado com heróis e personagens históricos, levando exemplos gloriosos a toda
população.
Com isso podemos pensar alguns referenciais na cidade de Curitiba levando em
consideração o espaço e o tempo com auxílio da Memória e também da História,
analisando que tanto uma como a outra possam representar de forma imaginária ou não
o passado que nos é pertinente.
Ítalo Calvino em seu escrito “Porque ler os clássicos” (2007) nos alerta que um
clássico é aquela obra que nunca acaba de dizer o que tinha para dizer. Portanto, ao
retornarmos aos clássicos, constatamos que os gregos nos contam que a Memória
(Mnemósine) era esposa de Zeus e mãe das musas. As musas, entidades que davam vida
a seu canto/fala, criavam o que cantavam. Clio, filha de Mnemósine, portanto uma das
musas, era a musa da História, pois falava do passado das cidades e dos homens. Assim
sendo a História se apresenta como filha da Memória, assumindo ainda as duas, História
24

e Memória, a incumbência de tornar presente a ausência que possa existir no tempo.


Esta presença da ausência se faz através do pensamento, e este pode proporcionar o
retorno de algo que esteve guardado no passado.
Aristóteles define a História como “narrativa do que aconteceu”, portanto, se
para nós a memória é o retorno de algo do passado, podemos pensar então que a
História, bem como a Memória, são as citações presentes de alguma coisa que passou.
Porém, Paul Ricoeur apresenta entre elas algumas diferenças, como podemos
observar nas palavras de Pesavento: [...] a História estabelece para como o passado um
pacto de verdade: ela quer chegar até aquela realidade do acontecido, pelo que
persegue esta meta pela utilização de várias provas documentais que, testadas e
cruzadas em correspondência, lhe assegurem uma margem de veracidade à narrativa
(PESAVENTO, 2002, p. 26). Contudo, desta forma o historiador perde a experiência da
vivência, a ele, ao historiador, lhe é negado as alegrias da memória feliz, que, segundo
Ricoeur, seria regozijar-se com a “identificação e o reconhecimento da lembrança”.

E, no entanto, nada temos de melhor que a memória para garantir que


algo ocorreu antes de formarmos sua lembrança. A própria
historiografia, digamo-lo desde já, não conseguirá remover a
convicção, sempre criticada e sempre reafirmada, de que o referente
último da memória continua sendo o passado, independentemente do
que possa significar a preteridade do passado (RICOEUR, 2007, p.
27).

Cabe então à História conferir um determinado acontecimento através de um


trabalho incansável de veracidade através de provas concretas, não podendo reportar a
experiência vivida no passado, fato que se pode difundir através da memória. A
memória poderá ainda fazer uso da imaginação para apresentar algo que não aconteceu,
ou seja, um momento fantasioso, almejado, ilusório, construído.
Além desta memória que nos é apresentada através da construção e que relembra
um passado existente no espaço, podemos ainda identificar em Curitiba a memória
social. Esta se apresenta edificada historicamente e trata-se de um produto de um
pensamento comum, de um trabalho feito em grupo, onde indivíduos se amparam no
exercício do lembrar, recordam e narram histórias de outros momentos. Para Pesavento,
ao estabelecer didaticamente a apreensão do passado, a memória social:

[...] torna a lembrança partilhada, ela disciplina a evocação, repete o


que deve ser retido e, sobretudo, ensina o que lembrar, construindo
uma bagagem de experiências socializadas, vividas, herdadas. Seja
pela oralidade, na rememoração coletiva de lembranças celebradas
25

em conjunto, seja pela fixação e sistematização da memória narrativa,


difundida pela escola, pelo texto literário ou histórico ou ainda pela
mídia, a memória social sacraliza as evocações, como que
oficializando o passado e delimitando, no espaço da cidade, os
lugares de ancoragem das lembranças no tempo (PESAVENTO,
2002, p. 28).

A autora completa ainda, citando Aldo Rossi, que identifica a memória coletiva
em uma associação entre o imaginário e o espaço social, onde o espaço urbano não pode
ser pensado sem o tempo, e a cidade não pode ser refletida dissociada do espaço
construído. A cidade em que pensamos é, portanto, uma construção gerada a partir de
pedaços de memória que se exteriorizam por imagens, sendo ainda a cidade a própria
memória coletiva do homem (PESAVENTO 2002, p. 28).
A memória coletiva, bem como a memória individual, estão ligadas
afetivamente e relacionadas a partir de vivências tanto individuais como coletivas.
Curitiba ainda pode ser observada através de sua memória cívica. A memória cívica está
intimamente ligada ao patrimônio, ao poder político, onde alguns valores são destacados
e outros desconsiderados, podemos observar claramente nos monumentos erguidos com
finalidades bem definidas, ou ainda através das comemorações relacionadas à
emancipação política, sempre visando reforçar uma identidade.
Esta busca pela identidade cultural foi o ponto forte das reflexões que levaram a
intelectualidade curitibana a criar o Paranismo, movimento este que tinha dentre suas
principais finalidades forjar a identidade paranaense. O Movimento Paranista foi
resultado de um processo de formulação de uma imagem do Paraná posteriormente à
sua emancipação política, ocorrida em 1853.

1.1 O Paranismo

Apesar de ter sido conseqüência de uma preocupação com a identidade


paranaense a partir do século XIX, a terminologia “Paranismo” foi definida oficialmente
apenas em 1927 por Romário Martins.
Alfredo Romário Martins nasceu em Curitiba em 08 de dezembro de 1876. Aos
dez anos, com a perda do pai, teve que abandonar seus estudos. Em 1889, no jornal “19
de dezembro”, começa a trabalhar como auxiliar de tipógrafo, esta relação com a
imprensa lhe proporcionará posteriormente se ingressar entre políticos e nomes
26

influentes. A situação financeira difícil de sua família foi o fato agravante para que
Romário não adquirisse o conhecimento acadêmico, um dado que seria fundamental
para uma possível dificuldade de seu ingresso na elite econômica, tendo em vista que,
para nossa cultura, tornar-se bacharel seria um fato imprescindível. Contudo, Romário,
ao se dedicar à literatura, à política e às realizações cívicas, fez com que o círculo das
elites educadas lhe abrisse as portas. Em 1896, inicia a história literária paranaense
partindo da emancipação política, em que citamos suas principais obras: “História do
Paraná”, “Terra e Gente do Paraná”, “Quantos Somos e Quem Somos”, “Dados para a
História e a Estatística do Povoamento do Paraná”, “Eu Penso que...”. Romário foi
autor de vários manifestos paranistas e sua imensa simpatia pela cultura indígena lhe
inspirara a escrever muitos poemas em defesa desta causa, tendo com exemplo o mito
do Guairacá. Também faz uma notável atuação na redação da “Revista do Clube
Curitibano”. Segundo Camargo, esta revista proporcionará a Romário o contato com os
formuladores dos pontos de vista “culturais” das elites paranaenses (CAMARGO,
2007, p. 15).
Romário Martins foi o primeiro secretário do Instituto Histórico e Geográfico do
Paraná, atuou como diretor do Museu Paranaense e, na política, foi deputado estadual de
1904 a 1928. Esta versatilidade entre a literatura, as artes plásticas e a política lhe
propiciou uma ligação importante entre os membros das mesmas e, conseqüentemente,
uma posição socialmente privilegiada.
Para o historiador, professor, poeta e museólogo David Carneiro2, Romário
Martins:

[...] foi o campeão pelo lado do Paraná da campanha intelectual de


defesa histórica do Paraná quanto ao contestado. Foi ele que teve
argumentações, ele escreveu um livro Se eu fosse advogado do
Paraná o que eu diria porque ele conhecia muito bem o problema
histórico, de maneira que ele era a pessoa indicada para fazer este
movimento interno (CARNEIRO, s.n.t).

Segundo Carneiro, o Paranismo se tratou de um movimento interno, pois seria


uma reação ao fato do Paraná ter contribuído na guerra do Paraguai ter sido elemento
forte na defesa da emancipação dos escravos e defensor da república na Lapa, e mesmo
assim Santa Catarina havia recebido os benefícios na conquista de territórios. Romário

2
Transcrição do depoimento de David Carneiro a Roselys Roderjan, sem data. Cópia em anexo. Doação
por Aparecida Zanatta ao Centro Estadual de Capacitação em Artes Guido Viaro – 1996.
27

sentia dentro de si todas estas reações e extravasou com o Paranismo (CARNEIRO,


s.n.t). Portanto o Paranismo, conforme Carneiro, se tratou de um movimento profundo,
foi um resultado de razões essencialmente históricas; une-se ao fato do Paraná ter se
emancipado tardiamente, pois a capitania de Paranaguá em Curitiba não tinha condições
para ser capitania e as manifestações de conquistas para o Estado, em sua maioria,
frustradas. Para ele, ainda teria a questão com Santa Catarina, e esta questão é um
fracasso para o Paraná como reivindicação de seus direitos. Então teria que explodir
em outra feição. E esta feição justamente a Paranista, que quer dizer criarem-se
elementos artísticos, intelectuais internos aqui no Paraná (CARNEIRO, s.n.t).

1.2 O Vocábulo

No depoimento de David Carneiro temos a afirmação de que Romário Martins


tenha sido o criador da palavra paranismo, porém este termo já foi motivo de várias
discussões. A cronista Araci Martins, investigando sobre a origem da palavra
paranismo, questiona no jornal “O Dia”, em maio de 1946, se a denominação partiu
realmente de Romário Martins ou de Domingos Nascimento:

Conta ela que, num encontro com Jeff, Hilário Rodrigues e Pike-
Pake, naquela redação, esses conhecidos personagens do nosso “set”
de escritores divergiram sobre a questão proposta, isto é, sobre “quem
inventou a palavra, se Romário Martins ou Domingos Nascimento. E
transcreve, a respeito, o seguinte “nheengato” entre eles: - “Quem
inventou essa palavra foi Romário Martins”, disse Jeff, taxativamente.
– “Nego!”, contestou Hilário, que é conhecedor de coisas antigas de
nossa terra. “A autoria dessa invenção cabe a Domingos
Nascimento”. E Pike-Pake sentenciou, dizendo que o substantivo
paranista fora lançado, em 1906, por Domingos Nascimento, com a
significação de “natural do Paraná”, tomado de amor erangé pelo seu
Estado, por cujo progresso, prestígio e integridade envida todos os
esforços. – “É então um paladino que se bate pelo Paraná?”, pergunta
Araci. – “Isso mesmo”. – Uma espécie de jacobino destas plagas?” –
“Mais ou menos (MARTINS, 1948).

Além deste texto “Paranística”, onde Romário Martins relata a investigação feita
por Araci Martins sobre o vocábulo paranista, outra afirmação do autor esclarece ainda
que o termo não partiu de sua autoria, e sim de Domingos Nascimento, no qual
podemos constatar em seu relato:
28

Quem introduziu esse vocábulo entre nós foi Domingos Nascimento,


1906, ao regressar de uma viagem ao norte do Estado, onde notara
que ninguém nos chamava de paranaenses e sim paranistas. A palavra
nascera ali espontaneamente. A população de nossas terras setentrião,
era na sua quase unanimidade, constituída de paulistas, e estes, por
natural aproximação com o nome dado aos naturais do seu Estado,
designavam os paranaenses de paranistas (MARTINS, Apud
PEREIRA, 1998, p.78).

Devemos levar em consideração o fato do termo ter aparecido em 1906 em


referência àquele que ama o Estado do Paraná, sendo este natural do mesmo. Segundo
Luis Fernando Pereira, o termo refere-se:

[...] aquele tomado de amor pelo Estado. Com a mesma significação o


termo volta a aparecer em um conto de Waldomiro Silveira intitulado
Desespero de Amor, que encerra o livro Os Caboclos do mesmo
autor, publicado em 1915, onde o mesmo aparece em um trecho em
que o personagem Chico Só tentava conter um animal (burro) de
Guarapuava quando foi aconselhado por seu companheiro que
afirmou Não é por desfazer na sua destreza, seo Chico, mas contanto
que este burro paranista vai dar trabalho, ao final o autor acrescenta a
definição de paranista: o natural do Estado do Paraná (PEREIRA,
1998, p. 78).

Podemos constatar, portanto, que o vocábulo paranista, bem como paranismo, já


era utilizado em diferentes épocas e sua definição seria para o indivíduo nascido no
Paraná e que por este Estado guardava grande afeição.
Comungando de forma analógica com o termo paulista, o termo paranismo foi
adotado não só pela sonoridade, mas também, segundo Romário Martins, pelo sufixo
ista que propunha significação de cultor de alguma coisa. O termo não estava, para
Martins, relacionado ao nativismo, com a identificação de local de nascimento e sim no
cultivo de amor ao Paraná, possibilitando assim um leque maior, abarcando a
participação de todos, incluindo os imigrantes, na construção do Estado do Paraná com
uma identidade cultural, não permitindo ainda nenhuma possibilidade de xenofobia.
Para reforçar este pensamento, Romário Martins publicou um artigo explicando a
significação do termo Paranista:

Paranista é todo aquele que tem pelo Paraná uma afeição sincera, e
que notavelmente a demonstra em qualquer manifestação de atividade
digna, útil à coletividade paranaense. [...] Paranista é aquele que em
terras do Paraná lavrou um campo, cadeou uma floresta, lançou uma
ponte, construiu uma máquina, dirigiu uma fábrica, compôs uma
estrofe, pintou um quadro, esculpiu uma estátua, redigiu uma lei
29

liberal, praticou a bondade, iluminou um cérebro, evitou uma


injustiça, educou um sentimento, reformou um perverso, escreveu um
livro, plantou uma árvore (MARTINS, 1946, p. 91).

Portanto, o conceito de “paranismo” para Romário Martins, estava ligado a uma


implicação moral, onde não poderiam se adequar à condição de “paranistas” os maus, os
injustos, os preguiçosos ou perversos, mesmo que estes pudessem ser eventualmente
paranaenses por nascimento ou por adoção3.
Romário Martins determina ainda que o paranaense do futuro, portanto o
paranista, deixe suas marcas no Estado, ou seja, no novo Estado que está sendo
construído. Pois Romário afirma ainda que paranismo é o espírito novo, de enlace e
exaltação, idealizador de um Paraná maior e melhor pelo trabalho, pela ordem, pelo
progresso, pela bondade, pela justiça, pela cultura, pela civilização (MARTINS, 1946,
p. 91).

1.3 O Centro Paranista

Em 1927, Romário Martins, retomando o termo paranismo depois de 21 anos,


faz uma nova definição para o mesmo, ou seja, o que em 1906 era relacionado ao
nativismo, agora ultrapassa esta idéia de “natural do Estado do Paraná” e ganha uma
conotação social, filosófica, existencial. O líder do Movimento Paranista funda
oficialmente neste ano o Centro Paranista, determinando assim a efetiva data para o
início do paranismo. Vale lembrar que a preocupação com a tradição e a identidade
paranaense precedia a esta data e já estava presente nas discussões dos intelectuais
paranaenses, como vimos anteriormente.
O Centro Paranista recebe a função de promover e estimular todas as iniciativas
úteis ao progresso e à civilização do Estado do Paraná, função esta delimitada no
Programa Geral do Centro Paranista e divulgada em seu primeiro artigo4. O Centro vem
contribuir para a reafirmação da idéia “paranista: amigo do Paraná”, servindo de
estímulo a núcleos de estudo, dentre eles, a Sociedade de Agricultura do Paraná e

3
Frase escrita a partir de uma anotação feita pelo Professor Artur Freitas em banca de qualificação no dia
08 de dezembro de 2008, Florianópolis.
4
MARTINS, Romário. Programa do Centro Paranista. In: Boletim do IHGE. p.75. art.1. 1927.
30

Instituto Histórico e Geográfico do Paraná. Um Conselho Superior Paranista foi


formado, onde os 21 membros deveriam apreciar as propostas para possíveis adesões de
novos componentes. Para se tornar um novo membro, o candidato deveria se justificar
ou esta justificativa poderia ser feita por um dos membros do conselho, desde que
suprisse com as exigências determinadas no Programa do Centro Paranista, a proposta
de adesão deveria ser justificada pelo candidato ou por membro do Conselho, com
razões que demonstrem se tratar de pessoas que hajam prestado serviço de relevante
utilidade ao progresso e à civilização paranaense, em qualquer ordem de realização5.
Segundo Pereira, o Programa ponderava sobre oito teses consideradas
essenciais para o progresso do Paraná, sobre o meio físico e vital, meio econômico,
social, especialmente educativo e intelectual e meio cívico e moral, o autor afirma ainda
que estes pontos fundamentais eram os mesmos definidos por Romário para o Centro de
Defesa do Patrimônio Cultural do Estado alguns anos depois (PEREIRA, 1998, p. 84).
O referido Centro chegou a emitir uma mensagem assinada por Romário Martins
ao Dr. Affonso Camargo, na época presidente do Paraná. Na distinta mensagem o
presidente foi chamado de “Illustre Paranista” e no conteúdo constava: Não queremos a
adhesão dos incapazes nem dos egoístas. Elles são os entraves do progresso e da
civilização (MARTINS, 1927.p.1).
Romário afirmava que para se tornar sócio era necessário desempenhar o
compromisso de trabalhar em prol da ordem e progresso, da justiça e ir à busca das
intenções do movimento, entre as quais uma seria firmar uma identidade para o Estado
do Paraná. Em suas palavras, a mesma mensagem prossegue: Quem não tiver pelo
Paraná uma sincera afeição e não for capaz de um esforço pelo seu progresso, não
deve se alistar entre os sócios do Centro Paranista (MARTINS, 1927, p. 1).
Para Pereira, o citado presidente não se enquadrava totalmente dentro das
exigências para ser apontado como “Illustre Paranista”, e o mesmo foi ainda brindado
com outra obra, a Conferência Paranista escrita em 19 de dezembro 1928 (data do
aniversário da Emancipação Política do Paraná) por Affonso Guimarães Correia. Esta
obra poderia, segundo Pereira, até ter a intenção de elevar o Paraná, porém, acaba
apenas enaltecendo ao presidente e aos seus programas de governo. Na Conferência
Paranista encontra-se ainda a “Oração Paranista”, que veremos a seguir:

5
Ibid idem. p. 75 art.8.
31

FAÇAMOS TODOS OS DIAS A ORAÇÃO PARANISTA


Gigante adormecido!
- As serras, as chapadas, os campos, as matas do PARANÁ!
Ondas de calôr; rajadas de frio!
Oh! Riqueza incomparável da fauna paranaense!!!
Chanaan que nos torna envaidecidos, PARANÁ!
Gemmas admiráveis do Tybagy!!!
do peixe!!!
carvão de pedra!!!
Sete-Quedas!
Saltos de Santa Maria do Iguassú!!!
Oh! PARANÁ
incomprehendido nas victorias econômicas do amanhã!
Polycultura! – O PÃO NOSSO DE CADA DIA –
- recolhido o grão de ao pé da casa; trazido ou do secco ou do banhado o arroz fumegante
em nossas mesas, mas, dalli, do nosso alqueire de chão! Centeio, cevada num quartel de
emfrente!...
Em Ponta Grossa as ruínas de Villa Velha!
Na Serra o Véo da Noiva, o Marumby da Serra!
Lindas sem igual nossas praias, Ilha do Mel!
Bregetuba!
Para as bandas de Guaratuba!
E a tranqüilidade de Guarakessaba!
Havera porventura, mais dadivosos mares de que os mares do PARANÁ!
Que abundância, que variedade de pescados!!!
...galhos estralejam cobertos pelo vermelho brilhante,
- gottas muito grandes de sangue, da rubiácea preciosa.
Nevadas paranaenses,
- sendal suisso,
- as maçãs em flocos de ouro branco enriquecem o patrimônio explorado;
- é a malvácea, o algodão, oriundo das zonas equatoreares, as cápsulas rompidas esperando a
colheita em cargas fortes!
Palmeiras em leque e coqueiros em affagos soberbos com specimens de musáceas, como um
despudor que alegra, vemos fructificando numa leira unica as ameixas do Canadá, azeitonas
Delvas de Sevilha, os Kakis do Japão, maçãs norte americanas, nêsperas d´Itália, - numa
palissada ao lado, finas, succulentas uvas da França.
Tudo assim, na TERRA DAS MARAVILHAS, neste PARANÁ, das moças bonitas, das
mulheres mais lindas do mundo!!!
É o despertar de GOLIAS!
(CORREIA, 1928. p. 33-34).

Como pudemos constatar, a oração faz uma menção às riquezas do Paraná, onde
o Estado é considerado um “gigante adormecido”, destacando seus patrimônios
naturais, seus pontos típicos ou exóticos, valorizando sua terra e engrandecendo sua
gente. Podemos pensar então que através do Centro Paranista e atitudes como a
divulgação desta oração os paranistas determinavam um exemplo de comportamento
social, valorização do Estado, e conseqüentemente difundiam os alicerces para a
ramificação do movimento.
32

Outra fonte de divulgação de pensamentos e ideais paranistas foi a revista


“Illustração Paranaense”, que circulou entre 1927 e 19306. Dirigida pelo fotógrafo e
cineasta João Batista Groff, esta revista foi considerada muito importante para o
Movimento Paranista, pois teve como objetivo principal divulgar todo o processo de
desenvolvimento urbano de Curitiba e suas atividades culturais, incluindo os símbolos
do Paraná eleitos pelos paranistas. A atuação da revista “Ilustração Paranaense” dentro
do Movimento Paranista foi tão significativa que o período de “vida ativa” determinado
ao Movimento foi exatamente durante a circulação da mesma, segundo Camargo:
Embora o Paranismo, em sentido estrito, não possa, em nosso entendimento, ser
estendido além dos esforços de Romário Martins, nos limites da existência da
Ilustração Paranaense, que não resiste às mudanças políticas e, apesar do adesismo
imediato à “revolução”, acaba por volta de 1931 (CAMARGO, 2007, p. 178). Desta
maneira, considera-se neste trabalho o término do Movimento Paranista em torno de
1931.
Assim sendo, é comum encontrar em suas páginas, entre outros assuntos, a
presença de personagens locais em homenagens ao pinheiro, bem como artigos
relacionados às lendas indígenas ou textos publicados na forma de pinhão.
As idéias paranistas na revista “Illustração Paranaense” eram também
expressadas através dos desenhos de João Turin e Lange de Morretes e a direção ficou
por conta do fotógrafo e cineasta João Batista Groff. A capa desenhada por Turin se
mantém em todos os números até 1930, em cada edição apenas as cores eram alteradas7.
Aproveitando o surto econômico positivo da exportação de café, da erva-mate,
da exportação da madeira e da implantação de fábricas os paranistas acentuaram o
desejo de construir uma narrativa regional que mostrasse o Estado do Paraná como um
local que possuía uma tradição e uma história. Os paranistas tinham a intenção de
inventar uma tradição para um Estado julgado sem características, tentando suprir o que
Brasil Pinheiro Machado havia afirmado no “Instantâneo – A Ordem” sobre a ausência
de traços típicos no Estado do Paraná. Este artigo de Brasil Pinheiro Machado sobre a
inexistência de traços típicos no Estado do Paraná foi publicado em 1930, portanto a
publicação foi posterior à fundação do Centro Paranista. Mesmo assim sendo, Pereira
nos afirma que:

6
O primeiro exemplar da Revista Ilustração Paranaense se deu em novembro de 1927.
7
Posteriormente, no Segundo Capítulo, faremos uma análise mais detalhada deste trabalho de Turin.
33

É neste sentido que surge, em 1927, o Centro Paranista, fundado por


Romário Martins, (...) deixando ainda mais evidente a vontade dos
paranistas em construir um novo Paraná e igualmente tentar resolver
os problemas de identidade apontados por Brasil Pinheiro Machado
(PEREIRA,2000, p.140).

Brasil Pinheiro Machado foi considerado também idealizador e colaborador do


paranismo, como Martins, engajado na política foi prefeito de Ponta Grossa, deputado
estadual, deputado federal, presidente da Procuradoria Geral da Justiça do Paraná, vice-
diretor e reitor da UFPR, juiz do Tribunal de Contas do Paraná e também interventor
federal no Paraná de 25 de fevereiro de 1946 a 06 de outubro do mesmo ano. É autor de
poemas publicados na “Revista Antropofagia” em 1928, e dos ensaios “Esboço de uma
sinopse da História Regional do Paraná, Paraná no Centenário8. Podemos entender que
a preocupação com a identidade própria do Paraná já existia anteriormente por parte de
Brasil Pinheiro Machado, no entanto publicamente isto só foi declarado em 1930.

1.4 Os Imigrantes

Uma das características do discurso dos idealizadores do Movimento


Paranista (Romário Martins e Brasil Pinheiro Machado) era de integrar todos os
indivíduos que adotassem o Paraná como a sua terra. Romário Martins, junto ao
Instituto Histórico Geográfico, desejava agregar os migrantes e imigrantes das mais
diversas partes do Brasil e do exterior, pois entendia que a Sociedade Paranaense vinha
a ser a mais cosmopolita do Brasil, e, ainda, o Centro Paranista não pretendia uma
aculturação dos imigrantes, mas ao contrário, contava com o aspecto heterogêneo para a
construção da sociedade paranaense.
No entanto, o nobre desejo dos idealizadores paranistas foi minado e entristecido
com arroubos xenófobos por parte de alguns intelectuais. A xenofobia no Movimento
Paranista tem sido a causa de alguns confrontamentos acadêmicos, como, por exemplo,
entre Ruy Wachowicz e Luiz Fernando Lopes Pereira. O primeiro afirma a existência da
xenofobia e insiste que o Paranismo era conivente com tal situação. Segundo

8
Fonte: “Gazeta do Povo”. Caderno Extra sobre os “Personagens do Paraná” n. 02, 09 de março de 2003
e n.03, 16 de março de 2003.
34

Wachowicz, o termo seria atribuído a Romário Martins e sua significação teria uma
definição adversa de ádvena, uma expressão no sentido pejorativo para mencionar os
estrangeiros e seus descendentes. O termo “paranismo” teria sido inventado para
designar a “intellegentia” luso-brasileira [...] cultuadores das tradições paranaenses.9
Wachowicz prossegue afirmando que seria um termo nativista dos que insistiam contra
a participação do estrangeiro. O segundo discorda e comprova que o movimento não era
xenófobo e, ainda, tinha melhores intenções quanto aos imigrantes, comungando com as
palavras de Romário Martins quando afirma que paranista é todo aquele que tem pelo
Paraná uma afeição sincera (MARTINS, 1946, p. 91).
De qualquer maneira, é importante ressaltar que o Movimento Paranista, e
principalmente seus idealizadores, Romário e Brasil, passaram longe de qualquer tipo
de rejeição ao imigrante, pelo menos é o que podemos constatar em seus textos. Outro
fator que também foi possível constatar é que estes intelectuais paranistas não fecharam
os olhos para as manifestações contrárias ao imigrante. Brasil Pinheiro Machado se
utilizou da expressão poética para rejeitar esse tipo de atitude na poesia “Paisagem da
Minha Terra”:

O brasileiro nortista que chegava


Dizia que aquilo não era Brasil
Que aquilo era aldeia russa.
Que o verdadeiro Brasil estava lá no Amazonas
Lá no nordeste
Lá no sertão ensolado de Canudos
Onde os homens eram de bronze
O ano todo era verão
E as casas todas tinham linhas curvas
Que não podia ser Brasil onde houvesse geada até meio-dia
Onde em vez do caboclo meio bronze mulato
Andasse polacos fazendo barganhas de porco e plantando mandioca
Onde os bandoleiros em vez de usarem roupas de couro dos cangaceiros
Usassem bombachas largas e boleadeiras e cantassem (meu Deus!) em castelhano.
Só que o brasileiro do norte que chorava a desbrasilidade do sul
Não notou que quando parava o seu fordinho na estrada esburacada
E apeava pra pedir água ou comprar fruta na chacrinha em frente
O polaquinho
O russinho
O alemãozinho
O italianinho
Nascido ali
Traduzia o pedido do viajante pro pai
E do pai pro viajante
Numa língua igualzinha à dos caboclos
De cor de bronze amulatado

9
WACHOWICZ, Ruy. Os ádvenas e os paranistas na obra de Romário Martins. Anais do colóquio de
estudos regionais, comemorativo do I Centenário de Romário Martins. Boletim do Departamento de
História. Curitiba, Universidade Federal do Paraná, p.119, 1974.
35

Sem regra de gramática portuguesa, graças a Deus!


(MACHADO, 2001, p. 23 - 24)

No poema de Pinheiro Machado constatamos a preocupação com a importância


do estrangeiro, percebemos uma necessidade de abarcar raças, descendências de países
bem distintos. Percebemos também certa valorização da língua brasileira, como uma
definição do caráter nacional, tendo em vista que a idéia de nação estava se
apresentando numa junção de múltiplas nacionalidades.
Os imigrantes instalados em Curitiba deram sua contribuição e alteraram
costumes. Cada colônia tinha sua organização e possuía suas próprias instituições, como
escolas, clubes, igrejas. Posteriormente iremos detalhar um pouco mais sobre as
contribuições dos artistas plásticos descendentes de imigrantes que aderiram ao
Movimento Paranista, assim poderemos ter mais uma possível constatação de que o
Movimento realmente abarcava todos aqueles que possuíam sincera afeição pelo Paraná
e estavam dispostos a contribuir com o “problema” da inexistência destes traços
regionais apontada pelos intelectuais, independentemente de sua nacionalidade.
Os Paranistas, ao buscarem no Estado do Paraná características que pudessem
defini-lo como um Estado de tradição e história reforçadas, acabaram se aliando ao
posicionamento de caráter simbolista, pois o Movimento Simbolista mesmo com
representantes em outros Estados, no Paraná teve uma atuação singular e original.

1.5 O Simbolismo e o Paranismo

O Simbolismo foi uma tendência estética de origem francesa e comum às


literaturas ocidentais durante os últimos anos do século XIX. O conteúdo formal do
novo movimento literário quis comunicar o homem moderno nos seus gostos, prazeres e
sensações, além de refletir as neuroses do impacto científico na sua evolução social.
Portanto o simbolismo foi uma reação às estéticas literárias anteriores como: Realismo,
Naturalismo e Parnasianismo, buscando redescobrir o mundo interior do homem, sede
dos valores espirituais e afetivos.
Em 1866 o poeta Jean Moréas divulgou um Manifesto lembrando que o termo
simbolista era o único capaz de designar as tendências artísticas da época. Apesar do
Manifesto de Jean Moréas, a atribuição de grande difusor e pensador do Simbolismo
36

Francês está vinculada a outro poeta também francês, Baudelaire, que em 1857
exercitava a estética simbolista em “As Flores do Mal”. Para o literato Massaud Moisés,
Baudelaire era a fonte praticamente de todas as linhas de força que compuseram a
poesia moderna.

É que Baudelaire desmistificaria totalmente a poesia, e trouxera-a para


o plano do homem, já então angustiado por uma existência sem deuses
e mitos válidos. A uma poesia do divino, o que fatalmente se reduzia a
bem comportada estética anterior, ele contrapõe uma poesia satânica,
irreverente e cáustica, propelida por uma ânsia trágica de libertação e
narcisamento (MOISÉS, 1866, p. 49).

O poeta Baudelaire também é apontado por Giulio Argan, entre outros autores,
como aquele homem que esteve indisposto e ao mesmo tempo usufruidor da
modernidade que o atingiu. O poeta debruçou-se sobre o caos da cidade resultante da
multidão, esse tema deu origem a um dos seus mais célebres poemas, chamado “A uma
passante”. Outra preocupação de Baudelaire – junto aos impressionistas – foi a respeito
das influências que a arte sofreu depois da invenção da máquina fotográfica, bem como
às outras maquinarias surgidas na sua época. Talvez por tudo isso Baudelaire tenha
conseguido representar o Simbolismo na sua essência, ou seja, compreendeu aquele
mundo aparentemente absurdo e o codificou sob o signo dessa nova corrente estética:
um mergulho no inconsciente e nas sensações, atitudes que a lógica parnasiana não foi
capaz de expressar e explicar.
O Simbolismo cruzou a fronteira francesa e exerceu sua influência em várias
literaturas da Europa e da América. No Brasil adota-se a data de 1893 para o início do
Movimento Simbolismo na figura do poeta catarinense Cruz e Souza, especificamente
da publicação de “Broqueis”, poemas em verso, e “Missal”, poemas em prosa, nos
moldes do figurino simbolista. No entanto, no Brasil, o Simbolismo não constitui um
período literário autônomo, na verdade ele coexistiu como o Romantismo, Realismo e
Parnasianismo, pois sofreu forte resistência das correntes estéticas anteriores.

Se na literatura européia o Simbolismo teve grande aceitação, no


Brasil esse estilo mal conseguiu se fazer notar, pois o estilo
parnasiano vinha ao encontro de uma vasta camada de leitores para
quem boa poesia confundia-se apenas com linguagem repleta de
adornos, coisa que os parnasianos faziam muito bem (MOURA, 1996,
p. 337).
37

Mesmo sofrendo resistência, o movimento simbolista disseminou-se


principalmente por Santa Carina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Paraná, mas seus
adeptos acabavam por se encontrar isolados, pois aos poetas simbolistas não foram
concedidas grandes oportunidades de manifestação em jornais ou revistas na proporção
que eram ofertados aos parnasianos. Grande destaque do simbolismo foi a ação em
Curitiba, a Capital Paranaense foi um centro de excelência e divulgação do Simbolismo
brasileiro, como atesta Moisés:

Curitiba tornou-se grande núcleo do culto e irradiação dos ideais


simbolistas. Várias revistas, congregando numerosos aficionados da
“poesia nova”, foram criadas na capital paranaense: Clube Curitibano
(1890), O Artista (1892), Revista Azul (1893), O Cenáculo (1895-
1897), a mais importante de todas, Galáxia (1897), A Penna (1897),
Jerusalém (1898), O Sapo (1898), Esphinge (1899), Pallium (1900),
Breviário (1900), Turris Ebúrnea (1900), Azul (1900), Acácia (1901),
Stellario (1905-1906), Victrix (1907). Como se vê, das 29 revistas
inventadas por Andrade Muricy, dezesseis circulam em Curitiba. A
sua volta se organizaram vários grupos e “igrejinhas” dos quais os
principais representantes foram: Dario Veloso, Silveira Neto, Julio
Perneta, Antonio Braga, que juntos dirigiram O Cenáculo, Jean
Itiberê (João Itiberê da Cunha) e Emiliano Perneta. A tal ponto que o
movimento literário em Curitiba se elevou que a primeira das figuras
citadas, ardorosamente convicta das idéias em voga, empreendeu “as
revivescências helênicas da Festa da Primavera, as cerimônias
ritualísticas do Instituto Pitagórico que fundou em 1909”, um
harmônico templo em estilo grego, “Templo das Musas”, onde
presidia a atraentes e estranhas celebrações de arte e de pensamento
(MOISÉS, 1966, p. 81-2).

Para entender o arroubo simbolista em Curitiba é importante destacar em que


contexto social, político e econômico se encontrava a intelectualidade paranaense. Nesta
época, o Paraná se encontrava engajado em um republicanismo positivista e anticlerical,
as críticas ao regime monárquico tomaram força após a proclamação devido às
condições de abandono, fruto do descaso do Império, com a região paranaense. Então,
com a Proclamação da República, o Paraná se ergueu em um republicanismo positivista
radical, ou seja, esperava-se um espargir de luzes sobre as trevas da monarquia. Para os
intelectuais paranaenses, a República traria o progresso, o conhecimento científico seria
o comando da sociedade num ideal modernizante. Cita-se, como exemplo dessa
idealização de progresso, um artigo de 10 de agosto de 1889:

Já disse alguém que no Paraná, só progride a indústria dos foguetes, a


arte da pyrotthécnica. É isso o elemento principal da nossa vida, a
manifestação estrondosa de nosso progresso no atrazo [...] somos um
povo de foguetório, na expressão lata da palavra: o que quer dizer que
38

somos um povo atrazadíssimo. Não temos indústrias, não temos artes,


não temos sciência. Em Política sofremos de paralizya completa.
Temos apenas a política do foguetório. Deixemos os velhos partidos
de lado [...] Trabalhemos pela República (REPÚBLICA, A.Coritiba,
p.01 – 10 ag/1889 Apud PEREIRA, 1998, p. 26).

Em comunhão com a republicanização, surgiu no Paraná um levante anticlerical


embasado na separação do Estado e da igreja. Esse posicionamento anticlerical marcou
quase toda a produção literária da sociedade paranaense com o Movimento Simbolista.
O anticlericalismo e positivismo foram rigorosos em Curitiba, e se expressam na linha
simbolista nas figuras de Dario Veloso, Silveira Neto, Julio Perneta e Antônio Braga,
estampadas nas páginas da revista “O Cenáculo”. Em 1891 Dario Veloso fez um
pronunciamento no Clube Curitibano sobre a abolição da escravatura e sobre a
República, segundo ele as duas grandes idéias cívicas da mocidade brasileira da época.
Todo proselitismo de Dario Veloso e seus colaboradores convergiram para a mesma
aura construída pela República, acreditava-se na ciência e no ensino laico que eram os
elementos modernizadores, ou seja, a sociedade em oposição a uma visão mística do
mundo dada pela Igreja Católica que foi sustentáculo falido do regime monárquico.
Foi num contexto de projeção econômica paranaense que emergiu o Movimento
Paranista, tendo como base idéias de progresso e ciência. Em 1900 foi criado o Instituto
Histórico Geográfico do Paraná, do qual o presidente era Romário Martins, líder do
Movimento Paranista e um dos principais colaboradores do Movimento Simbolista
Paranaense. É relevante esclarecer que o Paranismo é conseqüência direta do
Simbolismo, pois o primeiro estende os ideais republicanos, positivistas e anticlericais
do simbolismo curitibano no plano das artes visuais. Paranismo e simbolismo são ainda
mais consoantes, pois a idéia simbolista transplantada para as artes plásticas se revelará
por signos da realidade que deseja construir. O crítico e historiador de arte Giulio Argan
conceitua a ressonância do Simbolismo nas artes plásticas, nas representações do
mundo social e das relações culturais.

O Simbolismo também é um dos componentes essenciais da corrente


modernista, e influi não apenas sobre a pintura, mas ainda sobre a
arquitetura (Horta, Van de Helde, Gaudí, etc) a decoração e os
costumes. Como cada coisa, natural ou artificial, pode assumir um
significado simbólico para nós, não existem limites para a morfologia
e a simbologia da arte. As novas técnicas industriais permitem
realizar formas totalmente diferentes de toda a morfologia tradicional,
sempre numa relação mais ou menos direta com a morfologia natural;
atribui-se a essas formas, não mais explicáveis em termos de
“analogia” com as formas naturais, o valor dos signos de uma
39

existência transcendental ou profunda, cuja infinitude escapa à


apreensão dos sentidos e a reflexão do intelecto, mas que é
fenomenizada e revelada pela arte, e apenas pela arte (ARGAN, 1992,
p. 83-4).

O Simbolismo, nas palavras de Argan, se difundiu além da pintura também em


outras manifestações artísticas como arquitetura e decoração, característica que também
iremos identificar no Paranismo. Segundo o autor não podemos delimitar a simbologia
da arte, bem como sua morfologia, assim sendo, cada fato ou objeto, artificial ou
natural, poderá ostentar um significado bem distinto para cada indivíduo.
Industrialmente muitas técnicas podem colaborar para a realização de formas
dessemelhantes ao que conhecemos tradicionalmente da morfologia, relacionando-as
muitas vezes com a morfologia natural. Não explicáveis em termos analógicos com as
formas naturais, atribui-se a essas formas a importância dos signos de uma essência
transcendental ou intensa, em que, devido sua profundidade, muitas vezes não se
permite compreensão através dos sentidos, porém por meio da arte poderá ser revelada.
O Movimento Simbolista no Paraná ocorreu devido à tendência deste
movimento se ligar às aspirações construídas pela República, principalmente no que se
referiu à ciência e ao ensino laico. Considerados elementos modernizantes da sociedade,
a ciência e o ensino laico foram colocados como oposição a uma visão mística do
mundo dada pela Igreja Católica, sendo esta uma das falências do regime monárquico,
segundo os anticlericais. Para Camargo:

Preocupavam-se com questões esotéricas e doutrinas místicas e


praticavam um anticlericalismo militante, corrente nas vertentes
simbolistas e positivistas no Paraná e na capital federal. Formado
nesse ambiente intelectual, um dos principais ativistas das lutas pela
construção de uma herança tradicional local foi o jornalista e
historiador Alfredo Romário Martins (CAMARGO, 2007, p. 28).

O idealizador do paranismo, Alfredo Romário Martins, teve inicialmente suas


atividades ligadas ao Simbolismo e possuía certa restrição aos imigrantes vindos da
Europa, considerando-os elementos perturbadores. Sua relação com o simbolismo lhe
permitiu adequar hipóteses sociais e científicas sobre as interferências do meio físico e
também da raça para formar uma narração específica do Paraná. Esta particularidade
paranaense acabou desvinculando o Estado do conceito do tropical e da mulata,
considerados pelos modernistas, como Mário de Andrade, “a cara do Brasil”.
Posteriormente, Romário Martins acabou por introduzir a contribuição dos imigrantes
40

nas relações sociais paranaenses, deixando transparecer em seus textos a inserção dos
estrangeiros nos ideais paranistas, como constatamos anteriormente.
Outra atuação singular e original do simbolismo em Curitiba é em relação ao
clima que pode ser comparado a algumas regiões da Europa, diferenciando-a então de
outras cidades brasileiras. Segundo Marcio Oliveira:

[...] O Simbolismo, embora tendo representantes em vários estados,


foi especialmente vigoroso no Paraná e, por conseguinte, é descrito
como um simbolismo particular. A primeira particularidade
(estendida ao próprio estado) liga-se ao clima da cidade de Curitiba,
considerado frio e europeu, e ao relevo ondulado de suas montanhas,
o que aproximaria os escritores locais do “clima” da matriz simbolista
parisiense (OLIVEIRA, 2007, p. 3).

Bastide (1980) afirma que a particularidade do Simbolismo no Paraná bem como


no Sul é extremamente relacionada ao clima bem específico e diferenciado de outros
Estados brasileiros:

O Simbolismo do Paraná é também a primeira manifestação de um


“Brasil diferente” contra o Brasil tropical, uma tomada de consciência
literária do que o Paraná apresenta de específico, mas também de
autenticamente brasileiro, contra os que querem modelar todos os
brasileiros segundo um mesmo padrão: clima temperado contra sol
tórrido, bruma esbranquiçada e geada, minuano gelado do Sul, contra
os alísios, os pomares em flores e florestas virgens (BASTIDE, 1980,
p. 212).

Assim, o Movimento Paranista se concretiza no Paraná pela consagração dos


valores locais e desenvolve uma simbologia com base em elementos naturais como o
pinheiro paranaense10 e o pinhão. Estes elementos são estilizados e transformados em
formas de logotipos. Segundo Camargo, os elementos iconográficos regionais,
marcados por uma linguagem art-déco de forte teor panfletário, foram elaborados de
modo a se constituírem em estímulo à criação de um “espírito paranaense
(CAMARGO, 2007. p. 15). A recorrência às artes plásticas foi, ao que parece, a grande
estratégia paranista de construir, no imaginário paranaense, a idéia de progresso e
ciência.

10
Importante se faz salientar aqui que o pinheiro em que se refere ao símbolo do Paraná trata-se do
Pinheiro Araucária, tendo em vista que outras árvores são, em outros Estados, também denominadas
pinheiros.
41

1.6 O Pinheiro, a Pinha e o Pinhão

José Murilo de Carvalho, em seu livro “A Formação das Almas”, ao falar sobre
os ideais republicanos afirma que, para operar um extravasamento de república no
mundo extra-elite, seriam necessárias outras tentativas além do discurso: [...] não
poderia ser feito por meio do discurso, inacessível a um público com baixo nível de
educação formal. Ele teria de ser feito mediante sinais universais, de leitura mais fácil,
como as imagens, as alegorias, os símbolos, os mitos (CARVALHO, 2005, p. 13-4).
Assim sendo, o principal recurso do Movimento Paranista para atingir o “Imaginário-
popular” foi utilizar-se das artes plásticas, propondo uma alfabetização visual não
formal, ou seja, não escolar.
Os símbolos que serviram para a identificação emblemática do Paraná giraram
imflamadamente em torno das imagens do pinheiro, da pinha e do pinhão. Dentre os
símbolos e representações, o ideário regional foi o que produziu a aura de afeições da
população às terras paranaenses, bem como a construção do tipo ideal paranista - o
paranaense – que até então não se havia consolidado.
A criação simbólica exercida pelos idealizadores do movimento teve um reforço
bem considerável, tendo em vista que, segundo Pereira, ao falar em pinheiro devemos
remeter à Curitiba, cujo nome, derivado de curii que significa pinheiro, pinha, pinhão,
acrescido do sufixo tiba que indica abundância [...] a própria significação de Curitiba
possui ligação com o pinheiro, já que quer dizer “pinheiral” (PEREIRA, 1998, p. 141-
2). Certamente a estrutura paranista teve um forte alicerce, se levarmos em conta o fato
de seus símbolos sobreviverem até hoje nas obras de alguns artistas.
O escritor Romário Martins dedicou-se aos escritos e lendas indígenas, sendo
responsabilizado inclusive pela invenção de muitas lendas onde o índio e o pinheiro
eram os personagens principais. Muitas histórias e lendas sobre o Paraná foram
registradas em seu livro “Paiquerê”, editado em 1940, onde possui ilustrações de Guido
Viaro, Hélio Barros, De Bona e João Turin.
Na revista “Ilustração Paranaense” podemos identificar alguns poemas
relacionados ao pinheiro, dentre eles o artigo intitulado “Pinheiro” dedicado a Romário
Martins, onde os elogios não são poupados à ilustre árvore: Como és dadivoso e bom!
Quando o homem não te derruba a golpes de machado, e desdobra-te, e tortura-te nas
machinas de aço, tu, que lhe foste fructo e sombra, dás-lhe o tecto que protege, o berço
que acalenta, o leito que repousa, o ataúde que adormece (COLLAÇO, 1928. In.
42

Ilustração Paranaense, p. 19). A ilustração ficou por conta de Artur Nísio (1906-1974),
desenhista, gravador e pintor (imagem 01).

Imagem 01 - Pinheiros – A Romário Martins - Artur Nísio


Gravura em madeira
Ilustração Paranaense 1928 – ano 03 - p.19
Disponível em: http://www.museuparanaense.pr.gv.br/modules/conteudo /conteudo .php?conteudo=87.
Acesso em 13 mai. 2009.
Imagem adaptada pela autora.

Irã Taborda Dudeque, no “Simpósio de Cultura Paranaense - Terra, Cultura e


Poder: A Arqueologia de um Estado”, relata o fato de Romário Martins afirmar a
possibilidade de existir um ‘certo pinheiro’ onde os alunos das escolas de Curitiba iam
visitar, pois se tratava, segundo Romário Martins, do pinheiro onde o imperador havia
descansado. Depois de muito tempo que os alunos foram lá, perguntaram para Romário
Martins: ´Mas, escuta, por que é esse pinheiro e não outro, como é que você sabe qual
a fonte que você utilizou?` Então Romário Martins teria respondido: ´Ora, nenhuma,
mas o pinheiro é tão bonito!` (DUDEQUE, 2005, p. 55).
43

As lendas sobre o pinheiro também ganharam espaço nas páginas da “Revista


Ilustração Paranaense”, uma delas relata a história lendária de um príncipe de cabelos
ondulados e com a bravura de um grande guerreiro:

Um belo dia o príncipe se apaixonou e sua amada fora convertida em


uma ninféia do bosque e o príncipe vagava, enlouquecido à sua
procura, bradando aos céus seu nome. Procurando-a em vão na
planície sem fim quando a piedade do rei socorreu-o, e como não
podia fazer com que ela voltasse a ser mulher, transformou-a em
árvore assim descrita: árvore alta com uma torre, que parece querer
enfiar no céu de turquesa os braços trêmulos, que o desespero fustiga:
e ainda com a coroa real equilibrada muito lá em cima, sobre os
ombros desfeitos que as tempestades chicoteiam, e que, nos
crepúsculos tristes, imitam, de encontro ao incendiado horizonte o
perfil sofredor do rei!!! Essa árvore foi o Pinheiro! (ILUSTRAÇÃO
PARANAENSE, 1929, p. 15).

Inspirados em textos como este, uma parte da produção artística paranaense


tendia a estabelecer ainda mais as correntes que levavam à exaltação do pinheiro. Tão
forte quanto o próprio pinheiro foi a sua solidificação no Estado, tanto pedagogicamente
através da imposição à população, quanto ao reforço remontado aos artistas; as raízes
desta árvore tornaram-se profundas, tornou-se parte do cotidiano paranaense, muitos são
os artistas que o pintaram11.
Romário Martins além de contribuir literariamente para a difusão, bem como
para a permanência do movimento e seus símbolos, teve ainda a preocupação com a
preservação do pinheiro junto à defesa florestal, sendo ele o responsável por um projeto
de Lei, ou seja, um Código Florestal para o Estado do Paraná que, segundo Pereira, vem
a ser o primeiro do país. Preocupado com a ocupação das terras no sul, o escritor
minuciosamente se atém a detalhes, ocupando-se em várias atualizações:

[...] preocupado com a marcha para oeste, que se fazia em detrimento


das florestas. Além disto publicou o livro intitulado O livro das
árvores do Paraná, com um catálogo das árvores principais do estado
e um item específico de como se cultiva o pinheiro, explicação
repetida na revista A Cruzada, mensário ilustrado dirigido por
Valfrido Pilotto e Frederico Carlos Allende, de 1934 (PEREIRA,
1992, p. 38).

11
No próximo capítulo faremos um estudo mais aprofundado sobre os artistas plásticos ligados ao
Paranismo.
44

O esforço em manter, bem como aumentar a produção do pinheiro, acabou se


tornando preocupação também do Governo do Estado. A Lei Estadual nº 1986 veio
regularizar a época correta para o corte e promove projetos de incentivo ao plantio.
Szvarça (1998) comenta, num trabalho sobre Romário Martins, que ao construir
os símbolos os paranistas identificam no Paraná e no paranaense os imaginários para
uma civilização, o pinheiro confunde-se com a imagem do homem, outras vezes este
homem forte está presente na figura do índio, do imigrante e do próprio curitibano, a
erva-mate indicando o alimento com suas propriedades nutritivas e ao mesmo tempo
uma perspectiva de futuro, para o autor:

O pinheiro confunde-se com a própria imagem deste homem. Alto,


viril, forte e de braços abertos para o futuro auspicioso é o ideal que
passa a caracterizar o tipo humano do Paraná. Se o pinheiro é alto e
eril indicando os caminhos, a ervamate indica o lugar do futuro, as
propriedades nutritivas da erva-mate servem como alimento barato,
propiciando ao homem forças para resistir às fadigas e doenças do
corpo e do espírito, permitindo que se entregue a jornadas estafantes
com pouca despesa (SZVARÇA, 1998, apud. BUTTER, 2002, p.15).

Cada símbolo traz em si uma significação que contribuirá para uma estrutura
possivelmente mais densa para o movimento. Neste ponto da pesquisa, necessário se faz
abordar um outro símbolo no Paraná que até agora não foi mencionado. Atualmente os
paranaenses reconhecem além do Pinheiro, da pinha, do pinhão, também a gralha azul,
como sendo seus símbolos regionais. Mas afinal, em que momento da história a gralha
azul acabou sendo inserida? Não se pode deixar de frisar que o pequeno animal,
segundo a tradição lendária, igualmente se faz responsável pelo plantio do majestoso
pinheiro, porém os inauguradores do paranismo, ou seja, seus elaboradores, não fizeram
referência à gralha azul em 1927, data marcada como efetivação do movimento.

1.7 A Inserção de um Novo Símbolo – A Gralha Azul

Segundo a SEEC – Secretaria de Estado da Cultura - em 12 de novembro de


1984 a gralha azul é consagrada como “ave símbolo” do Estado do Paraná, através da
Lei Estadual 7957, no Artigo 1º onde podemos conferir:
45

É declarada ave-símbolo do Paraná o passeriforme denominado


Gralha-azul, Cyanocorax caeruleus, cuja festa será comemorada
anualmente durante a semana do meio ambiente, quando a Secretaria
da Educação promoverá campanha elucidativa sobre a relevância
daquela espécie avícola no desenvolvimento florestal do Estado, bem
como no seu equilíbrio ecológico (SEEC)12.

Para Luis dos Anjos: Esta lei, na verdade, torna oficial o que já existia no
coração dos paranaenses: um sentimento de respeito à gralha-azul manifestado ao
longo de anos (ANJOS, 1995, p. 02).
Apesar de a Lei ter sido efetivada em 1984, a lenda da gralha plantadora já
existia há muito tempo. Luiz dos Anjos (1995), em seu livro “Gralha-azul: Biologia e
Conservação”, remonta a Eurico Branco Ribeiro a responsabilidade de ter publicado
literariamente pela primeira vez a lenda da gralha-azul em 1925, num livro de sua
autoria, “A sombra dos Pinheirais”, mais especificamente no capítulo “O plantador de
pinheiro”. Posteriormente, muitas publicações acerca da lendária ave foram
identificadas, reforçando ainda mais o mito que fora criado. Luis dos Anjos faz um
resumo da lenda escrita por Eurico nas seguintes palavras:

Em uma linda tarde um caçador apanha a sua espingarda e sai de casa


para caçar. Após caminhar algum tempo pelo campo vê de longe, na
borda da floresta, algumas aves azuis. Não tendo tido sorte em sua
caçada decide gastar alguns chumbos naquelas aves. Se aproximou
sorrateiramente do bando que estava a voar próximo a uma araucária.
Disparou, então, um tiro certeiro em uma daquelas aves azuis, que cai
morta no chão no mesmo instante. Mas, na afobação de atirar, o
caçador não havia segurado com firmeza a espingarda. Com o
disparo, eis a que a arma lhe dá um coice, fazendo-o tombar
desacordado. Acontece, então, que o caçador tem um sonho com a
gralha-azul, que acaba de abater. Ela aparece em sua frente toda
ensangüentada e pergunta: “Por que fizeste isto comigo? Por que me
tiraste a vida? Então não sabes que eu estava a cuidar para que não
faltasse alimento aos outros animais da floresta? O Homem só pensa
em destruir, em derrubar as árvores. Ele não se preocupa em plantá-
las. Sem o pinhão, do que achas que os animais se alimentarão no
inverno? A vida na floresta não é fácil. Não existe alimento em
abundância como para o Homem. E até ele sentirá falta das florestas e
acabará por não ter o que comer também. Eu estava a plantar pinhões
para que eu e meus companheiros pudéssemos aproveitar alguns no
inverno e para que o restante germinasse e crescesse fornecendo
sombra e alimento para os outros animais. Mas agora tu me abateste.
Tu destróis tudo na tua frente. Não tens respeito pela natureza.
Haverá dia em que tu sentirás falta das árvores e dos animais.”
Quando acordou o caçador largou a espingarda e voltou para a casa

12
Site da SEEC – Disponível em:
http://www.cultura.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=15 -acesso 21 de outubro de
2008.
46

pensativo, com remorso do que havia feito e do que o Homem estava


fazendo à natureza (ANJOS, 1995, p. 02 - 3).

Luis dos Anjos afirma que: A araucária é considerada árvore-símbolo do


Estado do Paraná. Então a ave gralha-azul e a árvore araucária acabam por estar
intimamente relacionadas não só na natureza mas no coração dos paranaenses
(ANJOS, 1995, p. 02). Vários poetas e escritores se atreveram a escrever poemas e
narrativas sobre a gralha-azul e sua lenda. Diva Gomes publicou em 1963 “Poesia da
Natureza”, e Inami Custódio Pinto compôs uma música em homenagem à pequena ave,
a canção foi editada em 1965 e interpretada por Eli Camargo:

Vem ver, vem conhecer


Minha Cidade Sorriso
Terra dos pinheirais

Vem ver, nossas riquezas


As mil e uma belezas
Um paraíso no sul.
Onde nasceu a “Gralha Azul”
Onde nasceu a “Gralha Azul”

O pinheiro dá pinha
Pinha dá o pinhão
Gralha Azul leva no bico
Vai fazer a plantação
Vai fazer a plantação

Vô-ô-ô-ô-ôa – “Gralha Azul” Gralha Azul


Vô-ô-ô-ô-ôa – “Gralha Azul” Gralha Azul

Gralha Azul tu és pequenina


Mas é grande o teu valor
És paranaense, bichinho
És bom, trabalhador
(In: ANJOS, 1995, p. 04 -5).

De acordo com a crença popular, a gralha-azul martela os pinhões contra um


tronco retirando a semente que por vezes cai ao chão ou é enterrada pela ave em lugares
variados. Pelo que se sabe, ela faz um estoque de pinhões para evitar que outros animais
se apropriem dos mesmos. Porém Bigarella em seu livro “Lapinha: a natureza da Lapa”
afirma que: É de crença geral que esse comportamento da gralha-azul teria sido
responsável pela preservação do pinheiro através dos séculos. Essa crença popular,
contudo, ainda não encontra confirmação científica (BIGARELLA, 1997, p. 71).
Cientificamente nada se comprova do peculiar comportamento deste corvídeo
azul, de cabeça preta com topete. No entanto, numa parte da produção artística
47

paranaense, a gralha-azul está presente, cumprindo com sua possível responsabilidade


da preservação do tão saudoso pinheiro, nos deteremos nesta afirmação
13
posteriormente .
Os símbolos paranistas presentes na produção plástica de artistas paranaenses
foram atingindo o imaginário-popular e, conseqüentemente, a população da cidade de
Curitiba acabou aderindo a esta imposição criada pelos idealizadores do movimento.
Portanto, além dos discursos e lendas divulgadas pelos paranistas, a grande estratégia
para construir no imaginário paranaense a idéia de progresso e ciência, bem como a
imagem de um Estado com características próprias, foi a recorrência às Artes Visuais,
às imagens. Daí a importância central da produção artística que procurara atingir os
corações dos paranaenses e levá-los a demonstrar todo seu afeto ao Paraná
(PEREIRA, 2000, p. 142).
Ainda segundo Luiz F.L Pereira, a representação pictórica do pinheiro, da pinha
e do pinhão foi tão forte que ultrapassou as telas dos quadros e ganhou as ruas
curitibanas e paranaenses. O Paranismo foi responsável pela comunicação visual na
estilização de pinhas, nas calçadas, luminárias públicas, pilares, etc., até os dias atuais
(PEREIRA, 1998). Nossa pesquisa fará no próximo capítulo um estudo sobre alguns
artistas ligados ao Movimento Paranista, bem como a produção plástica que tanto
favoreceu aos ideais do mesmo.

13
No terceiro capítulo, quando iremos comentar sobre a produção plástica paranaense com símbolos
paranistas nos anos 90, teremos a presença marcante da gralha-azul e seu possível encargo para com a
preservação do pinheiro.
48

CAPÍTULO 2

O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS


49

Sendo um recurso também de divulgação, as Artes Visuais foram utilizadas por


parte dos paranistas como uma forma de atingir os paranaenses, de maneira que os
símbolos impostos pelo movimento começassem a fazer parte do dia a dia, se não de
cada paranaense, pelo menos dos curitibanos. As artes visuais também foram veículos
de construção para a identidade cultural do Paraná. O paranismo almejou que
paranaenses, brasileiros, estrangeiros, se tornassem paranistas, ou seja, homens com
verdadeiro “amor pelo Paraná”, e que unidos pudessem construir uma terra nobre com
tradições e culturas definidas.
Em 1933, a revista “Paranista”, na época sob a direção de Alfredo Andersen e
Romário Martins, exibe um quadro do alemão Hermann Schiefelbein num artigo
intitulado “O baile das raças” (imagem 02). A obra retrata um baile rural e, como o
próprio artigo o descreve, há uma miscigenação de etnias em uma harmonia intensa,
onde bailam a flor eslava e o descendente do índio, o velho imigrante polonês toca
rabeca, os alemães bebem cerveja, os ucranianos preparam o churrasco, os colonos
discutem sobre as safras do milho e do mate, e o guri, filho de duas raças, ensaia no
pistão seus primeiros sopros. A mixtão de etnias que elaboraram este novo typo humano
que há de formar o Paraná do futuro, essa árvore genealógica construída das seivas
nacionaes de todos os continentes (PARANISTA, 1933, p. 8). Esta mistura de raças
que, segundo os paranistas, iria formar o Paraná, se confraterniza em plena floresta
onde, ao fundo da imagem, podemos notar a presença dos pinheiros que no texto são
apontados assim: os pinheiraes erguem suas taças verdes para o infinito em saldação
ao mundo que vem vindo (PARANISTA, 1933, p. 8).
Este quadro além de ilustrar os diferentes povos que compõem o Estado do
Paraná ainda reforça a possibilidade de todos viverem juntos, felizes e em prol da
mesma causa. Propõe a todos serem filhos das terras paranaenses, independente de suas
nacionalidades que conseqüentemente juntos estariam nutrindo um sincero afeto pelo
Paraná. A imagem reforça os ideais paranistas.
50

Imagem 02 - O baile das raças - Hermann Schiefelbein, 1933.


Fonte: Revista Paranista. p.8.
Imagem adaptada pela autora.

Com isso, os ideais e os símbolos paranistas atuantes na produção plástica de


alguns artistas paranaenses, bem como em outras fontes como as revistas, manifestos e
poemas reforçados com suas ilustrações, tenderam a alcançar o imaginário-popular,
conseqüência esta prevista pelos idealizadores do movimento. Para Carvalho: [...] o
imaginário, apesar de manipulável, necessita, para criar raízes, de uma comunidade de
imaginação, de uma comunidade de sentido. Símbolos, alegorias, mitos só criam raízes
quando há terreno social e cultural no qual se alimentarem (CARVALHO, 2005, p.
89). Certamente o Paranismo teve bons argumentos para a imposição de seus símbolos,
não se pode dizer que o Movimento em si tenha criado raízes a ponto de ser reconhecido
em todo Estado e que sua história tenha alcançado a todos os curitibanos, porém seus
símbolos ainda estão enraizados, seja nos petit pavês, nos murais, nas esculturas
públicas. A cidade de Curitiba visualmente nunca mais foi a mesma depois dos anos 20,
ou seja, ela incorporou esse repertório.
Pois é na Curitiba dos anos 20 que surgem os primeiros vestígios de repertórios
decorativos com base em elementos nativistas, estas peculiaridades simbólicas
conseqüentemente acabariam por diferenciá-la de outras regiões do país. Os artistas
51

plásticos trabalharam metodicamente no objetivo de estabelecer uma característica


estética-ideológica a partir da exaltação dos valores locais e em elementos nativos como
o pinheiro, a pinha, o pinhão. Atualmente, a cidade de Curitiba é também reconhecida
por seus pinhões.
Conseqüentemente, o Paranismo, na tentativa de regionalização, de certa forma
desviou possíveis diálogos com a “modernidade” pretensa em outras regiões do país.
Claro que para as questões paranaenses este tipo de mergulho regional teve seu valor,
porém deixou a desejar a inserção paranaense na modernidade plástica, se comparamos
com os ideais dos intelectuais paulistas de 1922.

2.1 O Paranismo e o Modernismo Paulista

Para Sergio Miceli, em seu livro “Nacional Estrangeiro”, o movimento


modernista paulista constituiu, pois, a reação possível da geração emergente de
artistas às novas condições de operação em âmbito interno num quadro radicalmente
alterado de relações de dependência externa (MICELI, 2003, p. 19). Segundo o autor,
as obras apresentadas eram carregadas de relações entre as experiências vividas dos
grupos inseridos e os visíveis retornos implantados pela influência mútua dos mestres
por meio das vanguardas, caminhando ainda em direção à tendência de “retorno à
ordem”. Tal ordem se refere à inclusão de citações de padrões clássicos em história da
arte, retornando muitas vezes à iconografia greco-romana e aos protótipos
renascentistas. Este “retorno à ordem” teve no início da década de 1920 com a aceitação
inclusive dos chamados mestres cubistas mais arraigados, onde apresentaram extrações
do vocabulário dos maneiristas, ou mesmo de artistas como Ingres e David.
Em algumas produções chamadas paranistas, podemos também identificar um
retorno às obras já consagradas dentro da História da Arte, como uma apropriação de
algo já inventado, onde as mesmas foram adornadas com elementos que seriam
característicos do movimento, ou seja, com a pinha, o pinhão e o pinheiro.
Os artistas assumem as condições locais caracterizando-as e tornando-as
positivas. O modernismo instaurou-se sob o signo do nacionalismo, projetando para o
futuro o que tentava resgatar do passado, estabelecendo alguns possíveis contornos para
uma imagem brasileira.
52

Ao falarmos de modernismo, podemos entender as características da nova


mentalidade, como as sintetizadas por Mário Barata (1983) baseadas no anti-
convencional, no anti-declamatório, na liberdade de se inventar poéticas, linguagens,
sintaxes, de lidar com os sentidos, de colocar a composição subordinada à construção
mental, de tornar o colorido não um fato de representação, mas de uma opção estética,
desprezo aos padrões convencionais, necessidade de renovação, mas, sobretudo à
liberdade absoluta de espírito, considerada como elemento criador por excelência.
Um ponto interessante entre o Movimento Paranista e a Semana de Arte de 22 é
que houve quase uma coincidência temporal entre os eles, fato que não se pode levar à
conclusão de que estes dois movimentos possuíam o mesmo discurso. [...] no Paraná,
aproximadamente na mesma época do Movimento Pau Brasil [1924], surgiria o
Paranismo, que, sem ter o mesmo sentido renovador do primeiro, representou, contudo,
um primeiro sintoma da plástica local, de uma consciência nativista (ARAÚJO, 1980,
p. 33). Adalice Araújo afirma que [...] seria temerário tentar explicar todo o
modernismo brasileiro tomando por base a experiência paulista. A verdade é que cada
Estado viverá à sua maneira, o seu processo evolutivo (ARAÚJO, 1980, p. 33).
Na verdade, as ocorrências entre Paranismo e a Semana são bem dissonantes,
inclusive em suas questões adjacentes, como, por exemplo, a temática da Semana de 22
era a comemoração do centenário da independência, que desejava arrancar do Brasil o
ranço de nação colonizada, e para tal se realizou a manifestação de artistas e
intelectuais. Já na capital paranaense, a comemoração da independência se deu sob o
caráter simbolista liderado por Dario Veloso que, dentro de sua linha filosófica, fugia da
estética literária “moderna” de Paulicéia Desvairada apresentada por Mário de Andrade.
Um ponto fundamental da distância de diálogo da Semana de 22 com Curitiba é a
ausência do ocorrido na imprensa curitibana, que só fez as primeiras menções à Semana
em 1924, e ainda de maneira esparsa. Podemos constatar esta afirmação nas palavras de
Prosser: na imprensa curitibana, as primeiras alusões à Semana ocorreram dois anos
depois, em 1924, e eram breves e esparsas. No entanto, as linguagens do modernismo
eram criticadas e rejeitadas pela maioria dos artistas locais e pela sociedade
(PROSSER, 2004, p. 156).
Mas em meio a este descaso paranaense em relação à Semana de 22, é relevante
assinalar que houve no Paraná alguns poucos focos que se envolveram com a Semana
de Arte Moderna. O primeiro de teor negativo foi a “Revista Festa”, fundada no Rio de
Janeiro por paranaenses que eram conhecedores dos ideais da Semana. O segundo foco,
53

agora mais positivo, foi a participação de Brasil Pinheiro Machado com textos e poemas
na “Revista Klaxon”. Há de se destacar algumas questões: a Semana de 22 não resultou
em nenhum impacto imediato no Paraná, mas não podemos esquecer que a partir da
Semana houve o desdobramento do Movimento Modernista Paulista e um de seus
inauguradores, enquanto Movimento, foi a “Revista Klaxon”, que veio a ressoar nas
terras paranaenses. O intelectual Brasil Pinheiro Machado foi um dos líderes do
Movimento Paranista, como visto anteriormente, mas não se deixou inebriar pela
maçante idéia regional e bebeu da modernidade paulistana, porém, no entanto, não foi
suficiente para introduzir o Estado nestes novos discursos estéticos. Outra faceta de
Machado é a maneira como ele se colocava perante as forças ideológicas que o
perpassavam, pois no Movimento Paranista foi destacada sua negação à rejeição ao
imigrante. Nos seus enlaces com o Movimento Modernista Paulista ele também se
resguardou de não ser colaborador da “Revista Festa”, que era Simbolista, fato que
ficou registrado no prefácio de seu livro. Falo na “Revista Festa”, porque embora
editada no Rio, é uma revista paranaense, terra a que pertence o autor desses poemas;
e quero deixar patente o nenhum contato entre ele e o grupo dos seus idealísticos
conterrâneos (SHMIDT, 2001, p.11).
Os esforços de poucos intelectuais no Paraná com as questões do Movimento
Modernista dentro da linguagem modernista paulistana pode-se dizer que acabaram
ficando isolados frente a uma permanência do Simbolismo na literatura e uma
exacerbação regional nas artes plásticas. Posteriormente algumas iniciativas foram
tomadas em virtude de aproximação do Movimento Modernista Paranaense dentro dos
ideais do Modernismo Paulista, porém isto só veio a consolidar-se no final da década de
40 e início de cinqüenta. A literatura tomou frente em uma nova proposta de renovação
com a publicação, em 1946, da “Revista Joaquim”, seguida pela renovação nas artes
plásticas com o grupo “Garaginha” em 1950-511. Estes dois movimentos foram os
veículos de tentativa de ruptura com as linguagens tradicionais que predominavam no
Paraná, inclusive contra os pensamentos paranistas. No campo da literatura, as idéias
“modernas” propunham às letras locais o fim do “Mito Emiliano”, referindo-se ao Poeta
Emiliano Perneta que possuía uma obra fortemente impregnada de um parnasianismo-
simbolista. Nas artes plásticas o grupo “Garaginha” desejava pôr abaixo outro mito, o

1
O grupo Garaginha levou esse nome por ter sido inaugurado na garagem da casa da artista plástica
Violeta Franco. Esse espaço foi tão freqüentado por artistas e intelectuais que acabou se tornando
pequeno, daí surgiu o nome Garaginha, batizado por seus freqüentadores.
54

“Mito Andersen”, ou seja, a permanência pictórica de tendência realista própria dos


discípulos de Andersen. Foi em “Joaquim” que ocorreu o início da reação contra o
“marasmo artístico curitibano”.
Portanto a questão das artes plásticas envolvia além dos símbolos paranaenses
um comprometimento com o “objetivismo visual de tendência realista”, como fruto da
contribuição de Mariano de Lima e de Alfredo Andersen, a produção dos artistas
plásticos paranaenses das primeiras gerações do século XX estaria situada dentro do
objetivismo visual de tendência realista (ARAÚJO, 1980, p. 33). Mariano de Lima e
Alfredo Andersen são apontados pela autora como os primeiros formadores das
gerações de pintores paranaenses, o que permitiu a permanência do de tendência
realista que teria sido herdado por seus discípulos, alguns inclusive do Movimento
Paranista. Ainda segundo a crítica de arte paranaense Adalice Araújo, não era um
estágio acadêmico rígido; apesar desse alívio conceitual de Araújo, é verdadeiro que o
Paraná se estagnou na sua peculiar estética de “tendência realista”. Ao analisar esse
comportamento cultural curitibano, seja na literatura ou nas artes plásticas, Dalton
Trevisan e Poty Lazarotto concluíram que Curitiba tinha o comportamento de uma ilha
e se encantava consigo mesma.
Para fazermos uma abordagem sobre os artistas plásticos inseridos no
Movimento Paranista, bem como os demais artistas simpatizantes, é necessário pensar
nesta questão apontada por Araújo sobre a influência de Mariano de Lima e Alfredo
Andersen a respeito dos artistas paranaenses. Este é o assunto que veremos a seguir.

2.2 As Escolas de Mariano de Lima e Alfredo Andersen

Duas importantes escolas estruturaram a Arte Paranaense no período de 1886 a


1940: a “Escola de Artes e Indústrias” fundada por Mariano de Lima e a “Escola”
formada pelos discípulos de Alfredo Andersen. De uma maneira geral as produções
paranistas estavam relacionadas a elas, pois os artistas envolvidos no Movimento
Paranista foram considerados discípulos de Mariano de Lima ou de Alfredo Andersen.
Chegando a Curitiba em cerca de 1884, o artista português Antonio Mariano de
Lima dá início a um período contundente para a concretização de uma arte que se pode
caracterizar paranaense. Para Osinski, o artista desenvolveu um procedimento de
55

desenvolvimento das artes plásticas que de certa forma, já se encontrava em estado


latente, esperando por uma oportunidade para se manifestar (OSINSKI, 2000, p. 143-
152).
Em 1886 Mariano de Lima funda sua “Aula de Desenho e Pintura” que em 1889
passará a ser oficialmente a “Escola de Belas Artes e Indústrias”. Esta escola ofertava
cursos nas áreas de música, artes plásticas, artes aplicadas e arquitetura. Com o
currículo baseado no da “Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro”, em 1890
houve a realização de convênios entre os dois estabelecimentos, assim sendo na área das
Belas Artes, segundo Osinski, os cursos de pintura, desenho, arquitetura, gravura e
escultura incluíam em seu elenco disciplinas como desenho de figura e ornato,
arqueologia, mitologia e história da arte, algumas delas remetendo claramente ao
pensamento estético neoclássico (OSINSKI, 2000, p. 143-152). Em relação às artes
aplicadas e industriais, o programa do curso ofertava disciplinas como: mecânica,
marcenaria, carpintaria, funilaria, litografia, prendas domésticas e encadernação.
Mariano de Lima foi o responsável pelas “primeiras exposições organizadas de
arte que se tem notícia”, estas exposições acabaram por promover a participação da
“Escola de Belas Artes e Indústrias” em 1893, na “Exposição Universal Colombiana”, e
também a possibilidade de concretização da “Exposição de Belas Artes do Paraná” no
Rio de Janeiro, em 1896 (OSINSKI, 2000, p. 143-152).
A Escola de Mariano de Lima pôde contar com a participação de grandes
professores como Georgina Mongruel, Vitor Ferreira do Amaral, Agostinho Ermelino
de Leão, entre outros. Entre seus nobres alunos, dois nomes marcantes para a arte
paranaense, os escultores João Turin e Zaco Paraná.
Posteriormente, em 1917, a escola de Mariano de Lima passou a ser a “Escola
Profissional Feminina”, onde oferecia cursos destinados ao público feminino como
corte e costura, bordados e arranjo de flores. Com o passar dos anos e depois de várias
mudanças de nomenclatura, a escola deixou de ser direcionada às mulheres e atualmente
é reconhecida como “Centro Estadual de Capacitação em Artes Guido Viaro”, tendo
como objetivo principal a capacitação de professores da rede pública do Estado do
Paraná junto à SEED2.

2
A “Escola Profissional Feminina” foi oficializada em 08/08/1917, através do decreto nº 548 (Diário
Oficial/PR), em 1992 esta escola passa a denominar-se “Centro de Artes Guido Viaro” e em 2005 torna-
se o “Centro Estadual de Capacitação em Artes Guido Viaro”. Fonte: PARANÁ. Secretaria de Estado da
Educação. Departamento de Ensino Fundamental e Médio. Diretrizes Curriculares de Arte para os anos
finais do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. Curitiba: SEED, 2008.
56

Alfredo Andersen, pintor norueguês radicado no Paraná, desembarcou em


Paranaguá em 1892. Em 1902 atuou em Curitiba dando aulas particulares de desenho e
pintura, no mesmo ano dividiu um estúdio com o fotógrafo Adolpho Volk.
Posteriormente, com a transferência de Volk para outro local, o prédio da Rua Marechal
Deodoro passa a ser a localização do primeiro atelier de Andersen na cidade de
Curitiba. Este atelier acaba se transformando numa escola de arte pela intensa atividade
que desenvolvia. Com seus alunos, organizou exposições coletivas e sempre procurou
introduzir entre eles um apurado senso crítico, bem como uma consciência profissional.
De seu atelier-escola nasceria a “Pintura Paranaense” e, mais especificamente, o
“Objetivismo Visual na História da Arte no Paraná”3.
Apontado como acadêmico pela literatura artística, Alfredo Andersen tinha
realmente uma consistente formação da Academia de Belas Artes de Copenhague, e sua
experiência era vasta com o ensino de arte em várias instituições em seu país de origem.
Segundo Osinski, enquanto Mariano de Lima desenvolveu um método de ensino
baseado em modelos estudados em instituições do Rio de Janeiro e sofreu a influência
do neoclassicismo, as aulas ministradas por Andersen mantinham uma metodologia de
ensino diferente, pois influenciado pelas idéias impressionistas em seu trabalho
pictórico, o mestre incorporou também alguns de seus conceitos em sua atuação
didática, como a ênfase no naturalismo, traduzida pela observação direta da natureza
na busca da “realidade pictórica” (OSINSKI, 2000, p. 143-152). As paisagens
executadas ao ar livre, bem como os estudos de modelos vivos e de naturezas mortas
expressavam esse objetivismo visual. Também podemos conferir nas imagens a seguir:

3
Site – Museu Alfredo Andersen. Disponível em: http://www.pr.gov.br/maa/o_mestre.shtml acesso: 20
de abr. 2009 - 20:40.
57

Imagem 03 - Lavando Roupa - Alfredo Andersen, s.d.


Óleo sobre tela, 75 x 56 cm - Museu Alfredo Andersen (Curitiba, PR)
Disponível em:
http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=obra&cd_verbete=99
8&cd_obra=8050 Acesso em 13 de Nov. 2008.
Imagem adaptada pela autora.

O objetivismo visual encontrado na obra de Andersen é uma característica


apresentada pelos impressionistas. O artista é capaz de traduzir ao espectador uma
possível sensação visual imediata. Na pintura “Lavando Roupa” (imagem 02), duas
mulheres se apresentam na cena, uma a lavar a roupa e a outra aparentemente a
conversar. Como pano de fundo as roupas, que possivelmente acabaram de ser lavadas,
estão estendidas em contato direto com a natureza, como que em uma harmonia com a
mesma. As cores se mantêm numa transição de vermelhos, ocres e marrons,
contrapondo-se com o tom claro das roupas lavadas. A cena ao ar livre, as pinceladas
rápidas, comungam com o momento exato que está passando, é o movimento, a
transição, é o impressionismo4.

4
O Impressionismo – 1874 (data da primeira exposição) a 1886 - foi um movimento artístico que rompeu
com muitas regras impostas pelas escolas acadêmicas, tendo como principal preocupação o efeito que a
luz solar produz na natureza. Com o surgimento da fotografia os pintores se sentiram libertos da
58

Imagem 04 - A Queimada [Lavadeiras] - Alfredo Andersen, s.d.


Óleo sobre tela, c.i.d. - 90,5 x 152 cm
Disponível em:
http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=obra&cd_ve
rbete=998&cd_obra=8050 Acesso 13 de Nov. 2008.
Imagem adaptada pela autora.

Andersen em “A Queimada [Lavadeiras]” (imagem 04) realiza na sensação uma


condição de autenticidade do ser humano junto ao um cenário aberto de queimada.
Novamente lavadeiras, numa liberdade imensa, as roupas são estendidas ao chão por
uma mulher, num nuance temos a sensação de que outras duas mulheres estão mais ao
fundo da cena, provavelmente a lavar as roupas, animais pouco definidos também
podem ser observados. Trata-se de uma cena ao ar livre onde os pinheiros fazem o pano
de fundo, trata-se de uma observação instantânea da natureza, uma busca da realidade
pictórica.
Remonta-se a Andersen a responsabilidade pela formação de toda uma geração
de artistas, entre os quais se destacam os nomes de Lange de Morretes, Theodoro de
Bona, João Ghelf, Kurt Freysleben e Stanislau Traple, entre outros.

necessidade de copiar a realidade ou retratar pessoas, então, como faziam os fotógrafos, os artistas saíram
de seus ateliês e foram pintar o sol ao ar livre (BUENO, 2008. p.25). Para Gombrich, as novas teorias
não diziam respeito somente ao tratamento das cores ao ar livre (plein air), mas também das formas em
movimento (GOMBRICH, 1999, p. 517).
59

Tanto Mariano de Lima quanto Andersen, para Osinski, em relação às escolas


formais focaram suas inquietações na afirmação de um ensino de arte aplicado aos
meios produtivos, procurando por meio da criação de escolas de artes e ofícios uma
integração da arte com a indústria. Mariano de Lima preocupava-se com uma
vinculação com o ensino oficial e regular de arte, sua prática pedagógica era com base
nos conceitos do neoclassicismo. Andersen buscou na sua produção como pintor
repassar uma formação a partir dos estudos do natural, tanto de estúdio como ao ar livre.
Os ensinamentos destes dois mestres deram à arte paranaense uma contribuição
consideravelmente de grande importância.

2.3 Os Artistas Plásticos e as produções paranistas das décadas de 20 e 30

David Carneiro em seu depoimento a Roselys Roderjan afirma que as escolas de


artes, especialmente no desenho e pintura, foram anteriores ao Paranismo, portanto
tenderiam a ser desligadas do Movimento. Porém, para o autor, Andersen sente o
movimento dos paranaenses e já inspira os outros, o artista também movido pelo clima
paranista começa a fazer os retratos como de Vicente Machado, Romário Martins e
outros literatos da época (CARNEIRO, s.n.t).
Em relação à escola de Mariano de Lima, David Carneiro assegura que
propiciou aos alunos o preparo técnico e a concentração para as artes plásticas. Segundo
ele, os integrantes da escola não eram [...] grandes desenhistas e nem grandes pintores,
mas quando Andersen surgiu, ele já tinha o meio formado. E havia este movimento
social e sociológico que daria como conseqüência o Paranismo, nas artes plásticas, o
Paranismo é oriundo dele e de seus alunos (CARNEIRO, s.n.t).
Como visto anteriormente e agora atestado no depoimento de David Carneiro,
podemos afirmar que Mariano de Lima e Alfredo Andersen abriram os caminhos para
as artes plásticas paranaense e, conseqüentemente, proporcionaram uma fenda para as
discussões paranistas também na área das artes plásticas, recurso que acabou sendo
fundamental para a difusão dos ideais do movimento.
Precedendo a oficialização do Paranismo por Romário Martins nas Artes Visuais
a primeira manifestação é considerada sendo de 1923. Trata-se de um baixo relevo para
a sepultura de André de Barros (imagem 05), uma pessoa dedicada às causas dos menos
60

favorecidos, enfermeiro e farmacêutico, obra realizada por João Turin. O artista executa
a obra logo após seu retorno da Europa.
Na obra a “Caridade” (imagem 06) o tema principal adotado pelo artista é a
figura de uma jovem, uma jovem que transmite um semblante de Pietá renascentista,
em cada braço acolhe uma criança, como que se estivesse acolhendo o filho morto. Não
há pesar, nem tristeza aparente, seu rosto mantém uma harmonia com o fundo repleto de
folhas de erva-mate, as folhas nativas preparam-lhe um altar. Segundo Araújo, esta
mulher apresentada por Turin trata-se de uma jovem dotada de uma poética típica do
Pré-Rafaelismo, que se integra, harmoniosamente, a um fundo construído com as
nativas folhas da erva-mate (ARAÚJO. In: GAZETA DO POVO, 1994). Destacam-se
aqui, então, as folhas nativas da erva-mate, como uma expressão local. Há uma réplica
desta obra no pátio de entrada da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba.

Imagem 05 - Túmulo de André de Barros Imagem 06 - Baixo relevo “Caridade”


Busto executado por João Turin João Turin - 1923
Cemitério São Francisco de Paula Cemitério Municipal de Curitiba
Fotos: Luciana Barone
61

É importante salientar que esta obra não nos apresenta o pinheiro, tão pouco
seus pinhões e, no entanto, é reconhecida e atestada por Araújo como a primeira
“materialização plástica” do paranismo. Além do pinheiro, outros elementos da flora
local foram incorporados pelos paranistas, é comum encontrar em artes decorativas
denominadas paranistas os pinhões, elementos como folhas de café, erva-mate e outras
frutas. Segundo Elizabete Turin: além do pinheiro, ícone do “paranismo”, outros
elementos da flora paranaense, entre os quais a guabiroba, a pitanga, o Maracujá, o
café e o mate, fazem parte do estilo paranaense. Animais e índios também se incluem
(TURIN, 1998, p. 44).
O nome João Turin, bem como Lange de Morretes, são reconhecidos como
“paranistas de linha de frente”, pois em nenhum momento da literatura de arte
paranaense comenta-se o contrário. Porém há algumas contradições em relação a outros
artistas inseridos no movimento. Há certa discordância de autores no que se diz respeito
aos artistas Zaco Paraná e João Ghelfi.
Elisabeth Prosser afirma, ao falar do Paranismo: nas artes plásticas, seus
maiores representantes foram Ghelfi, João Turin e Lange de Morretes (2004, p. 154).
Esta autora comunga com o pensamento de Elizabete Turin, sobrinha-neta do escultor,
que alega em seu livro “A Arte de João Turin” serem estes três os artistas do paranismo,
portanto Zaco Paraná não estaria incluso. O professor Artur Freitas, concordando com
as autoras acima, declara que: Zaco Paraná retorna da Europa, em 1922, fixa-se no Rio
de Janeiro, longe de Curitiba e do Paraná. Zaco não participa do movimento5.
Geraldo Leão de Camargo, em sua tese de doutorado “Paranismo: Arte,
Ideologia e Relações Sociais no Paraná”, comenta:

Os artistas efetivamente ligados ao movimento Paranista


propriamente dito podem ser resumidos a três, todos iniciando sua
formação na Escola de Artes e Indústrias ou com um seu ex-
professor, Alfredo Andersen. O escultor Jan Zak, [...] João Zaco
Paraná, [...] O também escultor João Turin [...], Frederico Lange de
Morretes, o outro artista a formar a trindade dos criadores da parcela
visual do paranismo (CAMARGO, 2007, p.149 a 159).

5
Frase escrita a partir de uma anotação feita pelo Professor Artur Freitas em banca de qualificação no dia
08 de dezembro de 2008.
62

De acordo com o autor acima, a tríade de artistas paranistas não seria formada
por João Ghelfi, João Turin e Lange de Morretes, e sim por Zaco Paraná, João Turin e
Lange de Morretes.
Pereira, em um artigo, ao comentar sobre as reuniões dos artistas envolvidos
com o Paranismo, declara que os encontros aconteciam nas confeitarias como a
Confeitaria Esmeralda à Rua XV de Novembro e o Café Belas Artes. Nestes locais se
encontravam inúmeras vezes os expoentes máximos do Movimento Paranista, em
particular artistas plásticos como João Turin, Zaco Paraná e Lange de Morretes
(PEREIRA, 2000, p. 130). Concordando, portanto, com Camargo.
O mesmo autor, dois anos antes do referido artigo, em seu livro “Paranismo: O
Paraná Inventado; cultura e imaginário no Paraná da I República”, no capítulo sobre
“símbolos e imaginário”, inclui a participação de Ghelfi como destaque entre os artistas
do Movimento, destacando então, não três artistas e sim quatro, afirmando:

Este é, sem dúvida o recorte central para a análise do Movimento


Paranista, pois trata de como através da produção artística tentarão
criar um terreno comum para os habitantes de seu território, ou seja,
como pela dimensão estética estes criarão um terreno comum de
identificação que será capaz de gerar uma identidade cultural para o
estado. Aqui se destacam as figuras de João Turin, Zaco Paraná,
Lange de Morretes e João Ghelfi, entre outros que, através de sua
produção artística, geradora do que se convencionou chamar de estilo
paranista, irão elaborar uma arte regional e os símbolos não oficiais
do estado (PEREIRA, 1998, p.135).

Portanto, Pereira afirma que os paranistas, através da produção artística,


prepuseram um terreno comum aos habitantes a fim de gerar uma “possível” identidade
cultural para o Paraná. Destacando como responsáveis os artistas plásticos João Turin,
Zaco Paraná, Lange de Morretes e João Ghelfi.
Na imagem 07, três dos quatro artistas acima citados, João Ghelfi, João Turin e
Zaco Paraná, posando para um retrato em Paris, antes da I Guerra. Uma prova da
amizade e convivência entre os artistas, mesmo fora das terras paranaenses. Assim
sendo, iremos comentar sobre a participação destes quatro artistas dentro do Movimento
Paranista, levando em consideração a colaboração de cada um, mesmo que tenha sido
por pouco tempo, como é o caso de Ghelfi, ou à distância, como Zaco Paraná.
63

Imagem 07 - João Guelfi, João Turin e Zaco Paraná – Paris, antes da I Guerra. Imagem
Arquivo Casa João Turin.
Fonte: TURIN, Elizabete – A Arte de João Turin. 1998. p. 43.
Imagem adaptada pela autora.

2.4- João Ghelfi - um Semeador

João Ghelfi nasceu em Curitiba em 29 de dezembro de 1890, estudou com


Alfredo Andersen de 1907 a 1911, executou o projeto para a Prefeitura Municipal de
Curitiba da galeria de retratos, ficando conhecido pela qualidade de seus retratos.
Freqüentou e estudou em ateliês em Paris, permanecendo por alguns meses no período
de 1913 e 1914. Em 1921, em Curitiba, instalou uma tenda que veio a se tornar um local
de encontro para discussões sobre arte, freqüentada por artistas plásticos, intelectuais e
jornalistas. É interessante ressaltar que a tenda de Ghelfi foi instalada no ateliê que
havia pertencido ao fotógrafo Volk e também ao pintor Alfredo Andersen, localizada à
Rua Marechal Deodoro, ou seja, era um local privilegiado e escolhido pelos artistas de
64

várias gerações. Lange de Morretes relata sobre um dos encontros dos artistas paranistas
na referida tenda:
O velho atelier da Rua Marechal Deodoro, em Curitiba, que fora do
fotógrafo Volk, depois do pintor Andersen e mais tarde do pintor João
Ghelfi, era ponto central das reuniões dos intelectuais da cidade e dos
que a visitavam. Lá, certa vez, em vida íntima, três artistas discutiam
arte: Ghelfi, Turin e Lange de Morretes. Discutíamos sobre o
pinheiro, nas qualidades, dificuldades e nas novas possibilidades para
o campo da arte (MORRETES. In. ARAÚJO, 1974, p. 108).

O Atelier da Rua Marechal Deodoro foi realmente um dos pontos principais para
a consagração do Paranismo dentro das Artes Plásticas, as discussões sobre arte e as
qualidades visuais do pinheiro eram assuntos para horas de conversa. Lange de
Morretes, em sua obra “Uma Árvore Bem Brasileira”, faz exaltações ao pinheiro e,
segundo o artista, os artistas de modo geral e principalmente os artistas paranaenses
prestavam reverências à ilustre árvore:

Pinheiro é o nome que o povo lhe dá, o que os cientistas lhe dão é
Araucária Brasiliensis – Os artistas ao contemplá-la dizem com
respeito: “É o rei da floresta” Assim sendo, Lange continua a afirmar:
[...] Várias telas de pinheiros devemos ao pincel de Alfredo Andersen
[...]. Quase todos os artistas que pelo Paraná passaram ou lá se
fizeram: Bruno Lechowiski, Tonti, Guido Viaro, dedicaram telas ao
pinheiro. É natural que o filho da terra a ele fosse mais afeiçoado. Os
artistas paranaenses João Ghelfi, Gustavo Kopp, Waldemar
Fryesleben com óleos e Kopp com aquarelas (MORRETES. In.
ARAÚJO, 1974, p. 108).

Sendo a recorrência às Artes Plásticas a estratégia paranista de construir, no


imaginário paranaense, a idéia de progresso e ciência, a preocupação dos artistas
envolvidos ultrapassava ao simples prazer de produzir arte, era um compromisso com o
Estado. Desde o início dos anos 20 os artistas plásticos como Frederico Lange de
Morretes, João Turin e João Ghelfi discutiam idéias a serem inseridas ao Paranismo,
antes mesmo do movimento ter se efetivado.
Não é de se admirar quando Lange de Morretes, ao descrever sobre a idéia de
como chegaram à estilização do pinheiro, faz o comentário de que um artista paranaense
está sempre pensando, falando ou discutindo sobre o pinheiro. No relato seguinte,
Lange além de descrever como chegaram à efetiva estilização da distinta árvore, ainda
deixa explícito que estava no ateliê de João Ghelfi, juntamente com João Turim:

[...] Quando um artista paranaense está só ele pensa no pinheiro;


quando está em companhia de outro artista, fala do pinheiro; e quando
65

os artistas reunidos são mais de dois, discutem sobre o pinheiro. Não


era pois de se estranhar a conversa ter se encaminhado para o
pinheiro. Discutíamos as suas qualidades, as suas dificuldades e as
suas novas possibilidades para o campo da arte. Ghelfi, sempre,
entusiasmado e sonhador, tomou de um pedaço de carvão e na parede
de seu atelier traçou, do tronco do pinheiro, um fragmento de fuste,
sobre o qual compôs um grupo de pinhas como capitel.” Lange de
Morretes continua sua descrição intitulando Ghelfi como um
semeador [...] “Depois seguimos cada um para sua casa, com um
pinheiro na cabeça envolto na bruma do chope. Turin e eu estávamos
com uma semente no peito a germinar. E, curioso, o semeador Ghelfi
contentou-se com a semeadura. Talvez, devido a sua morte prematura
[...] Há sementes que não brotam ao cair da primeira chuva. Levam
tempo. Assim a estilização do pinheiro não nascera da noite para o
dia. Turin matutou muito, eu não menos. (MORRETES. In: Revista
Ilustração Brasileira, dez 1953).

Este relato nos alerta sobre a participação de João Ghelfi dentro do movimento
paranista, definindo-a como sendo essencial e marcante. A ele foi atribuído a criação do
delineamento da coluna paranaense, esboçada a carvão em uma parede de seu ateliê.
Dentre os artistas plásticos envolvidos no paranismo, Ghelfi foi considerado um
semeador, sua função dentro do grupo foi lançar a semente, a vida não lhe deu
oportunidade de vê-la crescer, provavelmente continuaria atuante se não fosse sua morte
repentina, antes mesmo da consolidação oficial do movimento paranista, faleceu em
Curitiba a 28 de agosto de 1925.

2.5 Zaco Paraná e O Semeador

A família imigrante polonesa de Miguel Zak e Pelágia chega ao Brasil,


especificamente no Paraná, em Restinga Seca (entre as cidades de Palmeira e Ponta
Grossa) no ano de 1887. O único filho, Jan Zak, que tinha aproximadamente três anos
de idade (data-se seu nascimento em 3 de julho de 1884) não podia imaginar que nesta
nova terra o futuro lhe reservaria grandes novidades.
Sendo o pai Miguel um carpinteiro que consegue emprego na estrada de ferro, o
pequeno Jan, ao freqüentar a oficina do progenitor, começa a entalhar pequenos
trabalhos com canivete e a vendê-los na estação de trem. Seu talento chama a atenção de
todos, principalmente de alguns engenheiros ferroviários. Um deles, de nacionalidade
belga, sensibilizado, ofereceu ajuda para que o filho dos colonos pudesse estudar em
Curitiba. Sem haver escolas nas redondezas, ocorria então a impossibilidade de Jan
66

estudar. Seus pais não tinham condições de custeá-lo em outros centros, não havendo
outra alternativa senão aceitar a ajuda oferecida por François Gheur. Jan Zak vai habitar
em sua residência em Curitiba, e por ter apenas onze anos, seu protetor passa a ser
também seu tutor.
Aos quatorze anos Jan Zak ganha bolsa de estudos ofertada pelo Presidente do
Estado, Santos Andrade. Passa então a estudar na “Escola de Belas Artes e Indústrias do
Paraná”, a escola de Mariano de Lima, nesta mesma época passa a ser chamado de João
Zaco Paraná. De 1901 a 1903 cursa a “Escola Nacional de Belas Artes do Rio de
Janeiro”, mantendo-se ainda como bolsista.
Com o auxílio do governo paranaense e de seus amigos belgas, viaja para
Europa onde estuda na “Academia Real de Belas Artes”, em Bruxelas. Sob a orientação
do professor Charles van der Stappen, Zaco Paraná consegue premiações bem
significativas. Em 1908 recebe o primeiro prêmio em escultura conferido pela
municipalidade de Bruxelas. Em 1909 recebe o diploma de acadêmico e o prêmio de um
atelier na Academia, com as despesas pagas por um ano. Em sua permanência na
Europa participa de vários salões recebendo um número bem considerável de
premiações. É admitido na “Escola Superior de Belas Artes de Paris”, fazendo parte do
movimento cultural francês. Permanece neste país de 1912 a 1922 quando retorna ao
Brasil e se instala no Rio de Janeiro. Declarando que veio para ficar, naturaliza-se
brasileiro em 1923.
Recebe então várias encomendas sobre o centenário de Independência do Brasil,
dentre elas os dois grupos escultóricos “Ordem” e “Progresso” da fachada do Palácio
Tiradentes (prédio da Câmara dos Deputados) no Rio de Janeiro, capital federal na
época. É nesta mesma época que a colônia polonesa no Paraná faz a encomenda de um
monumento para homenagear o centenário da Independência. Zaco Paraná trabalha
então na elaboração de “O Semeador”, que será inaugurada em 1925. É principalmente
esta obra que dá a Zaco Paraná o título de paranista, pois atualmente esta escultura é
reconhecida como um dos grandes símbolos do movimento.
O jornal “O Dia” relata em vinte sete de setembro de 1923 a seguinte nota: O
Monumento da Colônia Polonesa – O Jovem escultor paranaense João Zaco Paraná
seguiu para o Rio a fim de modelar “O semeador” – Monumento que a colônia
polonesa oferecerá à Curitiba.
O “Diário da Tarde” - Curitiba, setembro de 1923 - faz um relato bem detalhado
a respeito da maquete da estátua, deixando a população ansiosa à espera do monumento:
67

Zaco aprontou já a maquete, aprovada pela comissão da colônia


poloneza, iniciando agora a feitura do modelo definitivo. É uma
estátua devendo attingir a mais de 5 metros de altura, sendo a figura
de 2 a 20 e o pedestal de mais de 3 metros. Encimando o pedestal será
pousada a figura de um camponez, typo de slavo, lançando a semente
à terra. É um semeador de músculos rijos, em passo aberto, mão cheia
de sementes, braço em posição de atirar a semente ao longe e com a
sacola de sementes a tiracolo, cabeleira ondeando ao vento. Figura
linda, de expressões fortes, muito concentanea como o grande
elemento de trabalho, que é o agricultor polonez, notável factor de
nosso progresso. Esta estátua deverá ser acabada até janeiro do
próximo anno (DIARIO DA TARDE, 1923).

Segundo Pereira, esta descrição da estátua de Zaco Paraná nos relata um


imigrante polonês radicado no Estado. Tiveram a intenção de retratar, a princípio, um
camponês de origem eslava, como os imigrantes que chegaram ao Paraná àquela época.
Segundo o mesmo autor, a realização da obra gerou uma série de dificuldades, pois esta
deveria ser inaugurada nos festejos do Centenário da Independência e foi concluída
somente em 1924. Afirmava Zaco Paraná que as minhas esculturas têm que ter alma,
dizer alguma mensagem (PEREIRA, 1998, p. 156). Entendemos, portanto, que mesmo
com data marcada a ser entregue Zaco Paraná não o fez, a fim de que a escultura
estivesse exatamente pronta, ou seja, independente da data prevista, o artista só entregou
a obra quando achou que mesma estava concluída.
A obra “O Semeador” viria simbolizar o esforço do camponês polonês e sua
gratidão à nova pátria. Esforço que não foi menor por parte do artista que a executou.
Sendo polonês, Zaco Paraná não mediu barreiras, não se deixou levar pelo cansaço,
pelas dificuldades. Esta obra representava a sua gente e homenageava a sua terra, a terra
que escolhera. Tanta dedicação não poderia resultar senão no sucesso artístico, que foi
seguido por uma série de encomendas de monumentos e estátuas.
Theodoro de Bonna, artista plástico paranaense, descreve, em “Cartas a Romário
Martins”, a dificuldade que enfrentou Zaco Paraná no processo de execução de “O
Semeador”:

Zaco residia na Rua do Senado, no último quarto de um cortiço mal


iluminado, úmido e bastante triste. Seu quarto era extremamente
modesto e a desordem geral aí era uma constante [...]. Apanhava água
que vinha da calha e não se preocupava consigo mesmo. [...] Moldou
lenta e apaixonadamente, durante os dias e as noites de muitos meses,
em seu próprio quarto, no quarto daquele cortiço da rua do senado.
Para moldá-lo, não poucas vezes, tinha que apanhar água da chuva
que caía do telhado, pois a torneira da pia estava seca. Foi nesse
modesto e tão mal iluminado ambiente, apertado e sem qualquer
68

conforto que ele moldou essa maravilha (DE BONNA, 1934. Apud
PEREIRA, 1998, p.156).

O semeador Zaco Paraná lançava a semente, plantava a cada dia um detalhe em


sua obra, trabalhava incansavelmente, tinha dentro de si algo maior que uma simples
encomenda, tinha o retrato de seu povo, de sua vida, estava tudo em suas mãos, no
decorrer de seus dedos sobre a obra. A expectativa em relação à obra “O Semeador”
(imagem 08) de Zaco Paraná foi grande, tanto da colônia polonesa como da população
em geral, os jornais relatavam a espera e a ansiedade pela inauguração. Apesar da
pressão, o artista não hesitou em entregar a obra, entregou a encomenda somente com
sua total satisfação, ou seja, quando se sentiu satisfeito com o resultado final.

Imagem 08 - O Semeador – Zaco Paraná, 1923


Bronze, 300 cm - Praça Eufrásio Correia – Curitiba
Imagem disponível em:
http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=artistas_obras&cd_v
erbete=519&cd_idioma=28555. Acesso 13 de Nov. 2008.
Imagem adaptada pela autora.
69

“O Semeador” foi inaugurado em 1925. É uma escultura de porte médio,


firmada em um suporte. Representa o camponês a olhar para o futuro e a lançar
sementes ao chão. Trata-se da figura de um homem de porte físico bem estruturado,
músculos definidos à mostra, rosto marcado com traços fortes, com os pés ao chão,
cabelos esvoaçados, carregando uma bolsa recheada de sementes, sementes que são
lançadas pelas mãos do semeador, o semeador imigrante que em terras paranaenses faz
seu plantio. “O Semeador”, desde sua encomenda, foi marcado por uma grande carga
simbólica. Segundo Pereira, o caráter simbólico desta imagem será explorada a tal
ponto que o Semeador figura atualmente no símbolo oficial do Paraná em substituição
ao antigo Ceifador, pois este apenas colhe um passado, o Semeador semeia um futuro e
simboliza (1998, p. 157). Podemos dizer que esta escultura veio a ser um símbolo
representante de todos os que estiveram na linha de frente neste movimento de
aspiração modernizante, mas o fato de João Ghelfi não ter podido participar da colheita,
o fez realmente um semeador.
O trabalho que, na verdade, não se trata de uma obra paranista, além de ter sido
produzida antes da consolidação do movimento, não possui no sentido estilístico
absolutamente nada de paranista. Para Camargo:

O aspecto interessante a ser destacado é o fato de O Semeador não


apresentar nenhuma característica, estilística ou temática, que o ligue
ao Estado, sendo associado ao paranismo por suas relações pessoais
com Turin e, como já vimos, pela descrição do imigrante trabalhador
bastante do interesse das forças no poder desde então (CAMARGO,
2007, p. 150).

Nela não há características de pinha, pinhão ou pinheiro ou qualquer elemento


da flora paranaense. Porém, a estátua do semeador representa o semeador do futuro, a
mesma se apresenta juntamente a outros monumentos de Curitiba como símbolos de
modernidade. Na revista “Ilustração Paranaense”, na edição nº 1, a obra é colocada
junto a outras esculturas consideradas de aspirações modernizantes. Como “O
Semeador”, de Zaco Paraná, o “Barão do Rio Branco”, de Rodolfo Bernardelli, e
“Tiradentes”, de João Turin (imagem 09). Na edição de nº 5 há um relato sobre Zaco
Paraná incluindo a execução de “O Semeador”. No texto o artista é incorporado ao
Paraná, porém não falam em Paranismo, mas se percebe, ilustrando o texto, a presença
70

do pinhão desenhado, quase que central pendendo à esquerda do papel podendo até dar
uma alusão a um coração (imagem 10).

     Imagem 09 ‐ Ilustração Paranaense ano II nº. 01 Imagem 10- Ilustração Paranaense ano II


Janeiro de 1928 nº. 05 / maio de 1928
Imagens adaptadas pela autora.

“O Semeador” foi incorporado pelos Paranistas, como uma


prova da existência de uma arte simbólica antes do Paranismo
propriamente dito. Para Pereira esta obra, mais do que o pinheiro, reúne em si todas as
características pretendidas pelo Movimento Paranista (PEREIRA, 1998, p. 155).
Segundo o mesmo autor, a obra feita para representar a Colônia Polonesa:

[...] passa com o tempo a ser identificado como o grande herói


paranista, que semeia o Paraná do futuro e deixa no Paraná a sua
marca. [...] Uma das grandes vantagens desta figura era o fato de que
o mesmo pode ser qualquer um, qualquer pessoa que se enquadre na
caracterização de paranista, ou seja, aquele que semeia a cultura, as
artes, o solo, as fábricas, todos aqueles que deixam a sua semente
para a construção de um Paraná melhor (PEREIRA, 1998, p. 157).

Portanto, “O Semeador” pode ser coligado ao estrangeiro, ao paranaense e ao


paranista, nas palavras de Romário Martins, a qualquer pessoa que em terras do Paraná
lavrou um campo, cadeou uma floresta, lançou uma ponte, construiu uma máquina,
71

dirigiu uma fábrica, compôs uma estrofe, pintou um quadro, esculpiu uma estátua,
redigiu uma lei liberal, praticou a bondade (MARTINS, 1946, p. 91).
Atualmente a obra de Zaco Paraná é reconhecida como um símbolo paranista,
bem como seu autor, um colaborador do paranismo. Ainda que residindo no Rio de
Janeiro, não estando presente no período de efetivação do movimento, Zaco deu sua
parcela de participação, mesmo porque mantinha relações pessoais com Turin, o que
provavelmente lhe proporcionaria estar por dentro das discussões e andamento das
produções consideradas paranistas. A praça onde ainda se encontra “O Semeador”
continua sendo um local extremamente importante para a cidade. A Praça Eufrásio
Corrêa6 é conhecida popularmente como “Praça do Semeador”, possui também o busto
de Teixeira Soares, um dos engenheiros responsáveis pela construção da Estrada de
Ferro Paranaguá-Curitiba. O Movimento Paranista está visualmente circunscrito pelas
obras públicas restritas à capital, assim sendo o escultor Zaco Paraná deixou na cidade
sua colaboração aos ideais e pensamentos paranistas. David Carneiro resume seu
pensamento em relação à obra de Zaco Paraná: [...] e eu creio que do ponto de vista de
excelência de produção “O Semeador” dele, é uma obra perfeita (CARNEIRO, s.n.t).

2.6 - Lange de Morretes

Segundo Luis Afonso Salturi, Frederico Lange nasceu a cinco de maio de 1892,
numa cidade do litoral paranaense denominada Morretes. Iniciou seus estudos de
pintura com Andersen por intermédio de seu pai que, ao encontrar com o pintor no
Porto de Paranaguá vendendo suas pinturas a serem compradas, Rudolph Lange,
admirador de arte, não só comprou as telas de Andersen como decidiu convidá-lo para
retratar seus filhos, onde os mesmos passaram a ter aulas com o artista, com um
destaque bem acentuado de Frederico.

6
Inaugurada em 1912 faz uma homenagem a Manoel Eufrásio Corrêa, irmão de Ildefonso Corrêa, o
Barão do Serro Azul. A praça encontrada em frente à Estação Ferroviária (inaugurada anteriormente em
1885), considerada um núcleo importante de Curitiba, acolhia um grande número de pessoas, passageiros
em transição da linha Curitiba ao Porto de Paranaguá e principalmente pela chegada de imigrantes. Um
dos locais mais movimentados da cidade na época acolheu a obra “O Semeador”. Local nobre para o
monumento, sendo o monumento não menos importante para a localização. Tudo foi devidamente
pensado, direcionado, calculado.
72

Por incentivo de Andersen, em 1910 Frederico dá seqüência a seus estudos na


Alemanha. Em maio de 1920 retorna ao Brasil com esposa e filhas, além de outras
mudanças, sendo elas em termos artísticos e pessoais. Na Europa pôde entrar em
contato com a luz impressionista, cuja influência em sua obra foi notável e seu nome
passou a ser “Lange de Morretes”, pelo fato de ser um nome muito comum na
Alemanha, mudança esta que causou desgosto a seu pai.

Seu pai se desgostou com essa mudança, principalmente porque a


família tinha um nome prestigioso. Para o mesmo, não havia mais a
necessidade de manter o homônimo no Brasil. Apesar disso, o filho
não se deixou convencer pelo pai. Morretes, sua cidade natal, era sua
referência, e seu novo nome mostrava bem a identificação com suas
origens (SALTURI, 2007, p. 28).

Lange de Morretes manteve sua lealdade a Morretes, sua terra natal, da mesma
maneira que o pinheiro nunca saiu de seus pensamentos. Sua preocupação em estudar os
variados tipos de pinheiro, os aspectos de acordo com a idade ou em relação ao habitat,
enfim, tudo o que seria relacionado ao pinheiro, sua forma, sua espécie, era motivo de
pesquisa e estudo para Lange, chegando a declarar que:

Mais de dois lustros convivi com pinheiros, sempre os estudando,


sempre colhendo dados que êles me inspiravam. Embrenhando na
floresta falei muito com pinheiros novos, falei muito com pinheiros
velhos, guardei segredo que êles me revelaram, sonhei, amei e
trabalhei, desprezando o que os outros chamam de confôrto e de
fadiga (MORRETES. In: Revista Ilustração Brasileira, dez 1953, p.
168).

Para Lange, o pinheiro era um problema a ser resolvido, um mistério a ser


desvendado. Quando esteve na Europa encontrou outro problema, a luz. O artista
declara que dedicou muito tempo de estudo para tentar sanar esta dificuldade. Lange
afirmara que o Brasil é uma nação de muitos encantos e também carregada de luz,
portanto neste país os artistas tinham muitos problemas a resolver. O pinheiro era um
dos que ao lado do da luz, mais me impressionaram (MORRETES. In: Revista
Ilustração Brasileira, dez. 1953, p. 169).
Com isso, essa dedicação a esta árvore de porte gigantesco, sustentou ainda
mais os pensamentos e ideais paranistas existentes no artista, fazendo de Lange um dos
maiores representantes do movimento. Lange foi o responsável pela estilização do
pinheiro, da pinha e do pinhão utilizados como adornos decorativos em toda Capital do
73

Estado. Segundo ele, a estilização foi decorrência de muito estudo, muitas horas de
desenho e empenho para chegar a uma definição final.

[...] Todo pedaço de papel era aproveitado para rabiscar esbôços. De


modo empírico eram executados inúmeros desenhos. Lange declara,
[...] a estilização do pinheiro não nasceu da noite para o dia. Turin
matutou muito, eu não menos. No começo nossos trabalhos tinham
sido empíricos. Turin, como escultor, dedicou-se à fatura de capitéis.
Eu como pintor e desenhista, conhecendo as artes gráficas,
encaminhei-me para o problema pictórico e o lado ilustrativo
(MORRETES. In: Revista Ilustração Brasileira, dez 1953, p.169).

Esse empirismo relatado por Lange estaria relacionado à maneira com que os
artistas, incluindo Turin, haviam reproduzido o pinheiro, ou seja, com base nas
observações do mundo, de maneira “tradicional”. Para Lange, o pinheiro deveria ser
explorado de outras maneiras, como um cientista.

2.6.1 Lange de Morretes - A busca por um método.

Não satisfeito com a maneira com que o pinheiro, sua grande preocupação,
estava sendo representado, ou seja, de modo empírico, Lange começa um trabalho de
pesquisa com base nas propriedades do pinheiro, onde sua inquietação girava em torno
do pictórico e do ilustrativo, tendo como referência a geometrização e a ciência.

Árvore de crescimento simétrico, requeria o auxílio da ciência para a


sua representação. E o que mais difícil se mostrava era casar a parte
científica com o problema da luz, emprestando a tudo a maior
naturalidade possível. Até então o pinheiro havia sido pintado de
modo empírico, dependendo, a sua perfeição, da argúcia e do sentido
visual do pintor (MORRETES. In: Revista Ilustração Brasileira, dez
1953, p. 169).

Lange dizia que pretendia sair da terminação empírica com aplicação de


métodos científicos que pudessem favorecer a coletividade. Para isso fez viagens em
busca de métodos novos, fazendo averiguações dos arrasamentos feitos às florestas,
incentivando o plantio por onde passava. Sua busca pela fórmula exata para trabalhar
com pinhões era constante e obsessiva, até que um dia, enfim, conseguiu a
geometrização ideal e tão almejada para seu trabalho.
74

Centenas de pinhões foram estudados em suas proporções até que


uma bela noite me foi dado fixá-las em uma fórmula geométrica,
saindo assim do empirismo em que até então se encontrava a nossa
ornamentação paranista. Finalmente tinha conseguido o que, a meu
ver, era de utilidade imediata. De posse do segredo desdobrei a
fórmula para a forma plana, e ornamentei-a com a caruma, obtendo
assim a seqüência que fornecia os elementos para serem aplicados nos
mais diferentes ramos da arte aplicada (MORRETES. In: Revista
Ilustração Brasileira, dez 1953, p. 274).

A fórmula encontrada foi aplicada na “escola de desenho e pintura” de Lange, e


também na “Escola Normal Secundária”, onde os estudantes criavam os modelos a
serem efetuados em trabalhos manuais (imagens11 a 15).

Imagens 11, 12, 13, 14 e 15 - Estilizações de Lange de Morretes


Fonte: Revista Ilustração Brasileira, dez 1953 p. 168-169.
Fotos: Luciana Barone.

As chapas eram feitas no atelier e posteriormente iriam servir para decorar


paredes. Em relevo, Lange aplicou ornamentação desenhada por ele e depois mandada
entalhar, aplicando inclusive em molduras de quadros. Lange de Morretes teve a
preocupação de esclarecer que a fórmula aplicada nos desenhos apresentados por ele,
deveria ficar para quem dela quisesse fazer uso, nunca poderia ser patenteado, devendo
pertencer a domínio público e servir principalmente aos pequenos profissionais.
75

O artista, no artigo “O Pinheiro na Arte”, confessa lamentar não ter fixado data
da descoberta da fórmula para a forma plana, supondo ter sido em maio de 1930, pelo
fato da revista “Ilustração Paranaense”, em 31 de julho de 1930, ter reproduzido um
desenho seu com o título de “Depois da Tormenta” (imagem 16), apresentando uma
moldura fúnebre com pinhões geometrizados. A aplicação da estilização de Lange em
“Depois da Tormenta” nos mostra uma execução do trabalho de Lange em artes
gráficas. Segundo Salturi, para compor esse desenho, ele conciliou seus estudos sobre a
estilização do pinhão e do sapé com seus conhecimentos acerca da representação da
figura humana do início de sua carreira, em sua maioria retratos e estudos de nu
(SALTURI, 2007, p. 137).

Imagem 16 - Depois da Tormenta - Frederico Lange de Morretes - c. 1930


Publicado na Ilustração Paranaense, ano IV, nº. 7, julho de 1930.
Fonte: CAMARGO, 2007, p.163.
Imagem adaptada pela autora.
76

O desenho que faz uma combinação de figura humana e estilização trata-se de


uma ilustração sobre a morte do Monsenhor Celso, uma morte que na época tornou-se
um enigma para a população curitibana. Ocorreu que, no momento exato em que o
religioso morreu, houve uma tempestade seguida de um forte vento, que acabou
derrubando um cedro que se encontrava ao lado da Catedral. O artista faz um retrato do
morto num caixão, tendo como pano de fundo uma janela onde podemos constatar o
cedro caído. Na direção da cabeça, ao lado da janela, uma vela acesa. As estilizações
laterais de pinhões e sapés fazem a moldura, e, na parte superior, remetendo talvez a
ocupação de religioso, uma cruz, e como não poderia ser diferente, a cruz também
composta por pinhões.
Lange de Morretes, apesar de ter dado sua imensa colaboração ao Movimento
Paranista com as estilizações que posteriormente tomaram conta das avenidas e praças
curitibanas, produziu ainda pinturas com verdadeira fidelidade ao pinheiro.

2.6.2 Lange de Morretes e a Pintura

As telas de Lange de Morretes nos dão um artista


arrojado nos seus intentos e adiantado nos seus
processos, marcando-lhe um lugar muito digno na
nova geração de pintores brasileiros: elas demonstram
com vigor o seu talento pictural.

Silveira Neto7

A pintura de Lange de Morretes nos revela uma íntima relação entre o autor e a
obra. Suas telas nos mostram a liberdade de expressão e ao mesmo tempo a fidelidade
para com seus temas. Tanto quanto na produção de artes gráficas, podemos notar na
pintura que seus estudos sobre anatomia e proporções do pinheiro foram explorados em
todos os aspectos, percebemos também que a preocupação com a luz é constante,
principalmente quando em relação ao pinheiro. O artista nos revelou que passava horas
em profundo contato com a natureza, com os pinheiros, falei muito com pinheiros [...]

7
LEITE, José Roberto Teixeira. Dicionário crítico da pintura no Brasil. Rio de Janeiro: Artlivre, 1988.
Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/ enciclopedia_IC/index.cfm? fuseaction=
artistas_criticas&cd_verbete=2418&cd_item=15&cd_idioma=28555. Acesso em: 27 de abr. 2009.
77

guardei segredo que êles me revelaram (MORRETES, 1953, p. 168). Este “estar na
floresta” nos remete ao impressionismo, pois neste movimento o artista, necessitando de
maiores estudos sobre os efeitos da luz e da cor, deixa de lado seu atelier e sai em busca
de mudanças e novas visões. Outra coisa que remete Lange a este movimento é o fato
de fazer na pintura seqüências de telas de pinheiros, pois o artista nos mostra que uma
só árvore pode se modificar em diferentes momentos do dia ou em diferentes estações
do ano. Porém Salturi prefere não classificar Lange como impressionista, pois segundo
o autor o artista ultrapassa esta classificação.

No que diz respeito à técnica, alguns críticos consideram Lange de


Morretes como um pintor com uma tendência impressionista, na
medida em que sua formação artística foi marcada por esse estilo.
Contudo, certos trabalhos do artista têm a marca pós-impressionista
porque não segue os preceitos básicos do estilo impressionista, indo
além deles. Além de sua ligação com o Impressionismo, Lange
também enxergava o mundo pelo viés científico e mesmo que sua
pintura estivesse ligada a fantasia e a alegoria, seus quadros eram
naturalistas devido ao seu interesse pela percepção exata da natureza
(SALTURI, 2007, P.141).

O artista procurou, através da geometria, explorar ao máximo o pinheiro,


tornando esta temática até uma necessidade para sua realização profissional. Os troncos
reproduzidos por Lange estão dentro da visão in loco de alguém que conviveu de perto
com seu tema. O artista, com suas pinturas de pinheiros, transmite ao espectador a
sensação de estar dentro da floresta.
Na obra “Rei Solitário” (imagem 17) um grande pinheiro nos é apresentado,
extremamente solitário, porém imponente. A árvore gigantesca se torna ainda maior à
vista do observador, ela se destaca como o personagem de um monólogo, numa
perspectiva central, não permitindo ao espectador admirar mais nada além de sua
grandeza. Além do mais, o pinheiro é visto de baixo e não de frente, seus galhos estão
direcionados para cima, o que ainda sugere maior nobreza em relação ao observador. O
pinheiro é a própria obra.
78

Imagem 17- Rei Solitário – Frederico Lange de Morretes, 1953.


Óleo sobre tela; 57 x 70,5 cm.
Coleção Wladimir Trombini.
Fonte: SALTURI, 2007, p. 176.
Imagem adaptada pela autora

Em “Paisagem com Pinheiro” (imagem 18) novamente um pinheiro arrebatador


toma todo centro da tela reforçando o símbolo paranaense, contudo desta vez um
segundo personagem se faz presente, um animal, uma presença quase que insignificante
diante da grandeza do majestoso pinheiro, ou seja, a “Paisagem” que intitula a obra,
pouco influencia a mesma, pois o pinheiro rouba toda cena. Um contraste de verdes
claros e escuros compõe o fundo da tela em uma vegetação pouco nítida, característica
do impressionismo. Nas duas imagens “Rei Solitário” e “Paisagem com Pinheiro”
podemos notar a tendência impressionista em que Lange foi buscar na Europa durante
seu percurso de estudante, bem como a presença de suas principais preocupações, o
pinheiro e a luz.
79

Imagem 18 - Paisagem com Pinheiro - Frederico Lange de Morretes, 1929.


Óleo sobre tela; 100 x 70 cm.
Universidade Federal do Paraná, Setor de Ciências da Saúde, Departamento de Farmácia, Curitiba.
Foto: Luis Afonso Salturi. Fonte: SALTURI, 2007, p. 175.
Imagem adaptada pela autora

Lange de Morretes, em alguns quadros, fez a feliz harmonia entre os nus que
havia estudado e paisagens com pinheiros. Em telas de dimensões avantajadas, o artista
reuniu a representação da figura humana, bem como a representação pictórica do
pinheiro.
A tela “A Natureza” (imagem 19) apresenta uma mulher nua deitada sobre um
gramado com variedades de tons verdes, pincelado com vermelhos e laranjas. A mulher,
que pode ser comparada à “Vênus de Urbino”, de Ticiano ou “Maja Desnuda”, de Goya,
possui a pele rosada com tons amarelos, a cabeça voltada para o horizonte, ou seja, para
80

o fundo da tela. Os cabelos longos, escuros, ondulados e bem compridos, espalhados


pelo gramado, são prensados pelo braço esquerdo, onde o cotovelo na altura do rosto
direciona sua mão até a cabeça.

Imagem 19 - A Natureza - Frederico Lange de Morretes, s/d.


Acervo EMBAP. Foto: Lilian H. Gassen, 2007.
Fonte: CAMARGO, 2007, p.178.
Imagem adaptada pela autora.

Podemos compará-la a uma “deusa Vênus”, devido à sua posição muito comum,
onde se destacam os seios, o quadril, as pernas cruzadas e deixa à mostra a púbis. Duas
borboletas em tons amarelos voam sobre a mulher. O céu, em segundo plano, nos
mostra um tom azul que é interrompido com nuvens bem claras. Um pinheiro se
apresenta à esquerda com variações de galhos altos e baixos, onde se pode observar por
trás de um dos galhos uma cachoeira, seguida de uma montanha um pouco mais à
esquerda. À direita da tela há uma pequena montanha com uma palmeira, onde se pode
observar uma entrada d’água. Na moldura podemos encontrar nos cantos o relevo dos
pinhões estilizados por Lange.
81

Segundo Salturi, esta tela está carregada de simbologia que pode ser interpretada
além das aparências. O autor afirma que Lange de Morretes pode ter utilizado a
natureza, bem como a figura feminina, para representar alguns elementos da paisagem
paranaense, assim como o próprio Estado:

Além de uma forte referência à cultura indo-européia, a mulher


deitada também pode ser interpretada como uma alegoria da natureza
paranaense ou até mesmo o próprio Paraná. Isso porque os elementos
que constituem a tela se assemelham ao mapa do Estado, em que são
ressaltados alguns elementos geológicos, com as Cataratas do Iguacu,
do lado esquerdo, e a região do litoral com o mar, no lado direito da
tela (SALTURI, 2007, p. 171).

Vale ressaltar que a mulher em posição de deusa grega pode ser interpretada
como sendo o próprio Estado do Paraná, ou uma alegoria à natureza do mesmo. Assim
sendo, nesta mesma linha, podemos observar a obra “Alma da Floresta” (imagem 20).

Imagem 20 - Alma da Floresta - Frederico Lange de Morretes, 1927-1930.


Óleo sobre tela; 285 x 245 cm. Assembléia Legislativa do Paraná, Curitiba. Foto: Luis Afonso Salturi.
Fonte: SALTURI, 2007, p. 172.
Imagem adaptada pela autora
82

A tela, se dividida ao meio, nos apresenta à esquerda um tronco de pinheiro


cortado, em tons de vermelhos claros e marrons, cujo corpo do mesmo se dá caído em
direção ao fundo da tela, em uma perspectiva onde o ponto de fuga encontra-se no final
da árvore. À direita um pouco atrás, um enorme tronco de pinheiro, seguido de outros
três pinheiros em seqüencia de distanciamento, direcionando para o interior do quadro,
sendo o primeiro de grande porte quase similar ao pinheiro caído, o segundo mais ao
fundo, em visão perspectiva menor, e outros dois bem pequenos, vistos ao longe.
Um campo em tonalidades de verdes sugere um gramado que fixa a base para os
elementos. O pano de fundo é um céu acinzentado com manchas em tons de azuis. O
pinheiro cortado é consolado por uma mulher nua, caída de joelhos ao chão, chorando
sua morte. Seus cabelos longos e escuros se espalham pela árvore cortada, bem como
seu corpo que, da cintura para cima, se encontra todo encostado no pinheiro. No
momento da morte, a grandeza do pinheiro torna-se evidente, árvore é encarada como
um mito, onde o próprio ser humano é reduzido, a mulher chora a morte da árvore,
podemos perceber ainda nesta obra uma possível alegoria da natureza.
Lange de Morretes sempre teve grande preocupação com pinheiro, em seus
escritos podemos perceber que a grande árvore lhe remetia à curiosidade, ao estudo, à
preservação. Através da Mulher que chora pela morte, Lange nos chama a atenção para
uma consciência ecológica. Para ele, uma Araucária no chão é uma desgraça, duas,
desgraça maior e a destruição de um pinheiral uma catástrofe (MORRETES, 1937, p.
19. Apud. SALTURI, 2007. p. 173). Talvez por esse motivo, por não gostar de ver o
pinheiro caído e sim em pé, majestoso, imponente, e provavelmente para provar sua
fidelidade a esta árvore até a morte, Lange de Morretes deixou recomendado que após
sua morte [...] queria ser enterrado em pé e com o rosto virado para o Pico do
Marumbi, em terreno de um metro quadrado que comprara em Morretes a fim de lhe
servir de sepultura (PEREIRA, 1998 p. 147). Segundo Salturi, em seu sepultamento,
numa declaração feita pela filha do pintor, seus desejos foram respeitados.

2.7 João Turin

O artista plástico João Turin, descendente de imigrantes italianos, nasceu no ano


de 1878 em 21 de setembro, no município de Porto de Cima, litoral paranaense próximo
83

a Morretes. Iniciou seus estudos em Curitiba na “Escola de Artes e Ofícios” de Mariano


de Lima, onde, aos 18 anos, passa a ser aluno-professor. Posteriormente aos 27 anos, ao
conseguir uma bolsa, continua os estudos na “Escola de Belas Artes” de Bruxelas, na
Bélgica, sempre se dedicando à escultura. Ao chegar a Bruxelas encontrou-se com Zaco
Paraná, que já o esperava, segundo a sobrinha-neta do escultor, Elisabete Turin, Zaco
muito o ajudou, chegando inclusive a lhe comprar um casaco apropriado para enfrentar
o rigoroso inverno europeu, pois o recém-chegado tinha poucas mudas de roupas e
inadequadas para o frio que lá fazia.
Em seu livro “A Arte de João Turin” Elizabete Turin esclarece que tanto Zaco
Paraná como João Turin tiveram o apoio de Romário Martins junto à Assembléia para
uma subvenção do Estado, a fim de conseguir bolsa-auxílio para arcar com os estudos
na Europa. Elisabete afirma que foi no exterior que Turin aprendeu a valorizar os
elementos da sua terra porque percebeu que artistas de lá faziam o mesmo (GENARO,
2009. In: GAZETA DO POVO)8. De fato, ao retornar do exterior em 1922 João Turin,
juntamente com Lange de Morretes e Ghelfi, idealiza e começa a inserir o Movimento
Paranista dentro das artes plásticas, aproveitando os motivos da natureza paranaense,
exaltando a flora e o pinheiro, como já fazia Romário Martins em seus escritos. Em seu
auto-retrato da década de 20 Turin utiliza os elementos naturais do Paraná, como
podemos identificar na imagem 21, folhas e pinhas são empregadas fazendo uma base
paranista para seu próprio rosto, como se o artista estivesse envolto à natureza
paranaense.

8
Ana Letícia Genaro. Especial para a Gazeta do Povo. João Turin, precursor da escultura no Paraná.
Publicado em 15 de Abr. 2009. Disponível em:
http://portal.rpc.com.br/gazetadopovo/ensino/conteudo.phtml? id = 877253. Acesso 27 de Jun. 2009.
84

Imagem 21 - Auto Retrato Paranista – João Turin, década de 20


Casa João Turin
Foto: Luciana Barone

Ao estudar a flora paranaense e se envolver com os elementos típicos de sua


terra, João Turin começa a questionar os trabalhos artísticos, principalmente o que dizia
respeito às construções e decorações desenvolvidas no Paraná, julgando-os comuns e
pouco elaborados, pelo fato de os arquitetos, na sua maioria, na opinião de Turin,
estarem presos a modelos e cópias estrangeiras. Basta olharmos os edifícios e as
moradas do Amazonas ao Rio Grande do Sul, para termos a certeza que aqui é tudo
cópia do que foi feito mil vezes na velha Europa. Todos os moldes e modelos vêm
prontos da Europa, é só aplicá-los (TURIN, s.n.t)9. O escultor, em seus relatos, deixou
explícita sua preocupação com a criação artística, para ele era necessário que a obra
tivesse uma intimidade com seu Estado, dizendo que não podia compreender como que
um artista, vivendo em meio a uma flora rica e terra fecunda, pudesse viver numa
escravidão das criações de outros povos.

9
TURIN, João. A arte decorativa no Brasil. Folheto da Casa João Turin, s/d, SEEC/Pr. Centro de
Pesquisa do MAC/PR.
85

Decorar os templos, edifícios e moradas com criações inspiradas em


nossa deslumbrante flora, é vivermos unidos com a beleza natural
desse solo, que faz parte integral de nossa própria vida. É quebrar as
correntes que nos retêm escravos do pensamento e da criação
estrangeira, é mostrar aos que nos visitam que também temos a
liberdade de pensar e de plasmar o que sentimos como um povo livre
(TURIN, s.n.t).

Turin teria uma proposta de criação artística que estivesse liberta das “receitas”
estrangeiras, daí a indicação de se trabalhar com os elementos naturais do Paraná.
Porém, podemos identificar que, em seus estudos, bem como em suas produções, o
escultor buscou inspirações na arte clássica, talvez para estruturar uma idéia de que
mesmo o clássico poderia receber uma nova “roupagem”, no caso paranista. Ou,
segundo Pereira, para reforçar os pensamentos paranistas de que, ao se revestir de um
caráter de antiguidade clássica, estaria reafirmando o discurso histórico onde se
acreditava que o imaginário popular carecia de retorno às antiguidades. Segundo
Pereira:

O passado construído pelos paranistas, como não podia deixar de ser,


privilegiava a história política encontrada nos documentos oficiais,
tentando impor tal visão ao presente que seria, necessariamente, fruto
de uma continuidade com este passado glorioso e, criando
estereótipos e fabricando heróis, com grandes personagens históricos,
legam um exemplo à população (PEREIRA, 1998, p. 93).

Portanto, retornar ao clássico nas artes plásticas poderia ser um recurso também
de reafirmação do Movimento Paranista, pois as colunas criadas por Turin visualmente
retrocediam ao passado, como que reforçando o discurso de que a antiguidade seria o
melhor alicerce para a identidade que estava sendo criada.

2.7.1 João Turin e as propostas de arquitetura e decoração

Rodrigo Naves, em relação ao retorno às obras consagradas (2007), afirma:


Acredito que num momento confuso e turbulento o retorno às melhores obras tem mais
a ensinar do que o apego a idéias apenas aparentemente confiáveis. Quando se está
perdido, mais valem os vagos contornos da intuição do que o norte claro de parte
alguma (NAVES, 2007, p. 28). Pensamentos desta ordem devem ter guiado as escolhas.
86

João Turin, inspirando-se na coluna grega, “criou” a coluna paranista, bem como
a ânfora, ambas adornadas com as pinhas e pinhões, que seriam características do
movimento. Ao observar a imagem 22 identificamos uma ânfora em bronze em forma
de pinhão, trazendo na parte superior uma seqüência de pinhões estilizados em
tonalidades de marrons, seguido de uma folha central em verde adornada com sementes
de café em tons de marrons claros num fundo em tom de bege. Uma faixa decorativa se
inicia no centro do objeto para baixo, com seqüência de folhas e sementes de café em
tons de verdes e marrons, na parte inferior outra fileira de três pinhões em tons marrons
e um agrupamento de sementes também em tons de marrons finalizam e encostam-se à
base retangular, na lateral, simetricamente dois pinhões maiores. Na imagem 23
podemos fazer a comparação da ânfora paranaense à ânfora grega, e assim termos idéia
de onde Turin se inspirou. A ânfora grega geralmente possuía uma forma ovóide e duas
alças simétricas, diferenciando-a da ânfora de Turin, a mesma também pode ser
reconhecida como vaso e era utilizada para abrigar líquidos.

Imagem 22 - Ânfora Paranaense – João Turin Imagem 23 - Ânfora Grega- Período Pré-
Escultura em Bronze não datada Homérico (XX a.C. - XII a.C.) Disponível em:
Casa João Turin http://www.conecteeducacao.com/escconect/me
Foto: Luciana Barone dio/his/HIS03020100.asp. Acesso: 15de Mai.
2009.
87

Na escultura “Capitel Paranaense I” (imagem 24) identificamos um capitel em


gesso em tom pastel, decorado em sua parte superior com pinhas carregadas em tons de
marrons claros, seguido de folhas que sugerem cair em tons de verdes também claros.
Mais abaixo, aproximadamente ao centro, começa uma seqüência de faixas decorativas,
próximas às criações indígenas, uma composição periódica de círculos, uma de pinhões
esculpidos, outra em forma de pequenas folhas e mais uma de pinhões, na base um
relevo atenuado em seqüência de formas circulares, em tons de marrons mais claros.

Imagem 24 - Capitel Paranaense I – João Imagem 25 - Capitel Paranaense II – João


Turin - Escultura em Gesso, década de 20 Turin - Escultura em Gesso, década de 20
Casa João Turin – Foto: Luciana Barone Casa João Turin. Foto: Luciana Barone

No “Capitel Paranaense II”, na imagem 25, identificamos um capitel em gesso


branco com tonalidades de marrons, decorado em sua parte superior com pinhas
carregadas em meio a muitas folhas que sugerem cair aproximando-se do centro, mais
abaixo uma organização de pequenos pedaços de madeira empilhados formam uma
estrutura para a base.

Portanto João Turin utilizou a coluna grega mundialmente conhecida, e a


adornou com os símbolos que seriam característicos do movimento paranista, isto pode
88

ser observado claramente na presença de pinhões e pinhas expostos como que numa
colagem na estrutura da coluna, que agora passa a ser coluna paranaense. Para Irã
Dudeque, a idéia de se criar uma diferenciação para o Paraná era na verdade uma
necessidade de mostrar que este Estado tinha uma cultura, um símbolo. Para este autor,
o Paranismo seria:

[...] uma tentativa de criar um símbolo que identificasse todos os


homens do Paraná. Que símbolo seria esse? Nós não temos um
grande literato, nós não temos uma grande data, nós não temos uma
grande história, nós não temos um grande poeta como Castro Alves,
nós não temos um grande literato como José de Alencar. O que nos
sobra? Sobra a natureza, quer dizer, é um discurso que acaba sendo
muito triste no sentido de que só nos tenha sobrado uma árvore e que
ao longo das décadas nos coubesse cultuar essa árvore e reverenciá-la
(DUDEQUE, 2005, p.52).

Portanto, para Dudeque, a utilização do pinheiro e toda criação produzida a


partir desta árvore seria uma falta de opção dos paranistas pelo fato da ausência de
nomes, acontecimentos ou vultos no Estado do Paraná.
Ainda, segundo o mesmo, em seu livro “Espirais de Madeira – Uma História da
Arquitetura de Curitiba”, João Jurin utilizou o princípio de Roberto Lacombe
metamorfoseando as ordens clássicas arquitetônicas com adaptações nas proporções do
pinheiro. O autor faz uma citação extraída da revista “Ilustração Paranaense”, na qual a
referida coluna é apresentada como sendo da “ordem paranaense”, A estylisação
paranaense: fragmentos inspirados em nossos magestosos e imponentes pinheiros
(PARANAENSE, Jan.1928). Segundo Camargo (2007), esta é a primeira publicação de
Turin a respeito das estilizações de capitéis e
colunas com base na idéia de Ghelfi, que
posteriormente passaram a serem chamadas de
“estilo Paranista”.
Nos desenhos publicados na revista “Ilustração
Paranaense” (imagem 26) podemos observar dois
trabalhos de Turin, o primeiro uma coluna com
seqüências de faixas decorativas, sendo a primeira
na parte superior formada de pinhões, uma de
pinhas, outra de pinhões com flores, mais uma de

Imagem 26 – “Illustração Paranaense” – Jan-1928.


89

pinhões e uma faixa com folhas já fazendo um acabamento. No segundo a parte superior
apresenta uma composição periódica de pequenos pinhões, um espaço vazio
razoavelmente grande, e depois seqüências de faixas, sendo uma com muitas folhas,
outra com pequenas pinhas e grupos de pinhões e uma terceira de pinhões.
Dudeque afirma que a construção da coluna paranista, partiu do desenvolvimento
da ordem jônica com simplificações do pinheiro e adaptações encaixadas nas receitas
corriqueiras dos estilos arquitetônicos. A ordem jônica, como podemos constatar na
imagem 27, possui formas mais rebuscadas que a ordem dórica, apresentando faixas
horizontais, o capitel também apresenta elementos decorativos inspirados em formas
orgânicas como vegetais ou ainda em penteados femininos. Irã Dudeque afirma que
poucas eram as regras de construção da coluna paranista e que o escultor João Turin não
apresentou todas as proporções, o artista apenas registrou que:

[...] a coluna paranaense não deveria ser excessivamente esbelta e


nem teria entablamentos, pois o tronco do pinheiro brota diretamente
do solo. O capitel seria formado por pinhas e pinhões inscrustados,
que também poderiam se espalhar em guirlandas (DUDEQUE, 2001,
p.62).

Imagem 27 - Capitel Grego da Ordem Jônica. Disponível


em:
http://www.histeo.dec.ufms.br/trabalhos/teoria1_2008/Greci
a%20Arquitetura.pdf. Acesso: 15 de Mai. 2009.
90

Dudeque nos alerta que muitos artistas renascentistas e barrocos utilizaram as


origens vegetais das colunas clássicas e que o Paraná, ao criar sua própria ordem, estaria
ligado às mais remotas gêneses da arquitetura e da arte. Segue ainda o autor, dizendo
que:

Tal ordem apontava para a grandeza da terra paranaense, uma força a


mais para a grandeza da terra brasileira, o que ampliaria a grandeza
da arquitetura universal. E não só. Com a ordem paranaense, o Paraná
poderia atingir uma expressão própria na arquitetura moderna [...].
Tal definição pode parecer uma aberração depois que o adjetivo
moderno foi encapado pela arquitetura derivada das vanguardas
européias daquela mesma década de 1920 (DUDEQUE, 2001, p. 62).

O autor nos alerta que no período da década de 20 o que poderia ser considerado
“moderno” seria a arquitetura sugerida pelas vanguardas européias. Contudo, João Turin
quando propõe a arquitetura e a decoração paranaenses, também tinha uma intenção de
“moderno”, porém dentro das propostas de se aproveitar o que já se considerava
consagrado inserindo “novidades” características do Paraná. João Turin relatou em seus
escritos sobre arte decorativa no Brasil que os arquitetos não se davam o trabalho de
olhar para a flora mais rica do mundo e que nela existiam elementos para se fazer
criações originais e modernas.

Os nossos arquitetos e os nossos artistas nunca deram-se a pena de


olharem para essa deslumbrante flora, a mais rica do mundo, onde
existem elementos preciosos e suficientes para uma decoração
genuinamente nossa e moderna, entretanto até agora ela viveu
esquecida e desprezada, na sua exuberante beleza, para dar lugar a
ornamentos estrangeiros, que chegam deturpados dos modelos
primitivos (TURIN, s.n.t, Grifo meu).

Podemos perceber que o artista tinha exata consciência do que estava fazendo,
propondo inclusive aos arquitetos que buscassem exemplo nas idéias dos gregos ou
outras civilizações que encontraram em seus elementos naturais motivos para suas
criações. É o que nos afirma o texto a seguir:

Mas os nossos arquitetos vivem no meio dessa variedade de arbustos,


folhas e frutos tão belos, tão originais como foram as palmeiras e o
lótus do Egito, como a folha de acanto da Grécia que se fez o famoso
capitel coríntio, como o teto que os góticos ornavam as maravilhosas
catedrais e não vêem nada de interessante para estudar, para estilizar e
aplicar em suas criações (TURIN, s.n.t).
91

João Turin afirmava ainda que o pinheiro em si, já se tratava de uma coluna
maravilhosa, no entanto, para se igualar às colunas da Grécia, Roma ou Egito, era
necessário orná-la com suas folhas e frutos. O artista trabalhou no “estilo” denominado
paranaense ou paranista incansavelmente, e afirmava ter sido o criador do mesmo,
descartando as idéias impostas vindas da Europa. A idéia de desenvolver este “estilo” na
arquitetura e decoração no Paraná levou João Turin a elaborar inúmeros projetos e
estudos arquitetônicos e decorativos, em que alguns deles chegaram a ser executados. O
artista dizia que estava nas mãos do arquiteto em convencer um cliente em aplicar um
determinado “estilo” em uma construção, dizendo até que achava bem fácil convencer
um homem que passou a vida trabalhando só para enriquecer e que de arte não entende
nada, aceita tudo o que o arquiteto lhe propõe. Visto não saber distinguir o moderno do
antigo, tudo está na vontade do arquiteto e nada mais (TURIN, s.n.t).
Assim sendo, a sede antiga do Clube Curitibano situada na Rua XV de
Novembro foi o local que abrigou uma “sala paranista”. Esta sala, denominada Salão
Paranaense, possuía uma ornamentação elaborada por Turin em 1928 e aprovada por
Ulisses Vieira, na época presidente do Clube Curitibano.
Como podemos observar nas imagens 28, 29 e 30 o teto todo adornado possuía
pinhões entalhados e pinturas com arte decorativa indígena, onde a flora paranaense foi
detalhadamente lembrada. As paredes com desenhos de pinhões e folhas em formato de
flores, seqüências de faixas decorativas com pinhões entalhados seguidos de faixas
pintadas, fizeram toda margem das paredes inclusive acompanhando as colunas,
também decoradas.
92

Imagem 28 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin, 1928.


Fonte da imagem: CAMARGO, 2007 p.176.
Imagem adaptada pela autora.

Imagem 29 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin, 1928 (detalhe).


Fonte da imagem: PEREIRA, Monografia – UFPR. Curitiba: 1992.
Imagem adaptada pela autora.
93

Imagem 30 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin, 1928 (detalhe).


Fonte da imagem: PEREIRA, Monografia – UFPR. Curitiba: 1992.
Imagem adaptada pela autora.

Segundo Pereira, João Turin foi quem mais se esforçou pela revelação dos
motivos paranistas, o autor afirma que o artista chegou a criar uma arte paranaense com
certa relação com o art déco, que serviu tanto para divulgar como para enfeitar os
pensamentos paranistas.

Para aqueles que qualificam o movimento com um mero estilo


artístico, Turin é tido como seu criador e, de fato será o personagem
que mais lutará para a divulgação dos motivos paranistas, chegando
realmente a criar uma arte paranaense, muito ligada ao art déco, que
serviria tanto para enfeitar como para divulgar os ideais paranistas
(PEREIRA, 1998, p. 147).

A historiadora e crítica de arte Adalice Araújo também atesta essas


características do art déco na arquitetura de Turin. A própria casa-ateliê de Turin
encontra-se, logo no portão de entrada, dois pinhões estilizados e mais do que esta, a
própria estrutura de cimento feita para dar sustentação ao retiro órfão têm, elas
também, pinhões estilizados (ARAÚJO, 1974, p. 21). Nas imagens 30 e 31 podemos
conferir a afirmação da autora, onde a primeira trata-se de uma imagem frontal com a
presença de uma modelo quando estava por entrar no ateliê, e na segunda, onde o ateliê
é visto quase que lateralmente. Uma faixa decorativa de pinhões faz toda parte superior
94

da fachada, como alega Araújo, os pinhões estilizados e paralelos da entrada ladeiam o


portão e continuam nos demais pilares do muro, o próprio portão possui estilizações de
pinhões na madeira. A construção também apresenta em cada lado da fachada esculturas
de corpos nus. Segundo Sérgio Kirdziej, os corpos nus na fachada escandalizavam
quem passava na frente (GENARO, 2009. In: GAZETA DO POVO). O ateliê de João
Turin estava localizado na Rua Sete de Setembro esquina com a Rua Coronel Dulcídio.
Infelizmente demolido na década de 50, esta é a primeira construção que conhecemos
com características paranistas.

Imagem 31 - Casa Ateliê - Modelo entrando no ateliê – Foto: Djalma Badaró Braga, 1948.
Acervo: Casa João Turin. Fonte da imagem: TURIN, Elizabete – A Arte de João Turin. 1998, p. 80-1
Imagem adaptada pela autora.
95

Imagem 32 - Casa Ateliê - Rua Sete de Setembro esquina com Cel. Dulcídio (Demolido na dec. 50).
Foto: Domingos Foggiato. Acervo: Casa João Turin.
Fonte da imagem: TURIN, Elizabete – A Arte de João Turin. 1998. p. 47-48
Imagem adaptada pela autora.

Por outro lado, os adornos de pinhões podem também ser enquadrados como
fazendo parte de um Art Nouveau, e não do Art Déco como sugeriu Pereira. O Art
Nouveau é um estilo floreado, onde as linhas curvas e as formas orgânicas se destacam e
sua composição normalmente provém de folhagens e flores. Podemos perceber as
formas orgânicas em feitio de pinhas e pinhões expostos na casa do Dr. Bernardo Leinig
nas imagens 33 e 34, projeto de João Turim. Já o Art Déco, em uma maneira bem
modesta de definição, apresenta seus desenhos de aspecto simples, a simplificação das
formas seria sua principal característica, linhas bem precisas, talvez a única relação
possa ser os ornatos geométricos ou a estilização dos padrões naturais.
96

A casa do Dr Bernardo Leinig apresenta uma decoração carregada de


detalhes. Na parte superior, uma seqüência de pinhões intercalados com guirlandas de
pinhas e folhagem em forma de correntes. Um pouco abaixo identificamos uma
composição periódica de
pinhões alternada com
pinhas e espaços com
retângulos, em seguida
notamos a presença das
colunas com seus capitéis
carregados de pinhas e
folhas, seguidas de faixas
horizontais de pinhões. As
janelas com arcos também
possuem acabamento com
pinhas, abaixo das mesmas
adornos com pinhas e outros
elementos florais.

Imagem 33- Fachada da casa do


Dr. Bernard Leinig. Por João
Turin (1928). Acervo Casa João
Turin.
Fonte: (CAMARGO, 2007 p.177).
Imagem adaptada pela autora

Imagem 34 - Casa do Dr. Bernardo Leinig (outro ângulo). Acervo da Casa João Turim, Curitiba.
Foto: Arthur Valle 2008, p. 05. Imagem adaptada pela autora.
97

Diante destas imagens, fica difícil classificar a obra de Turin num determinado
estilo, pois a idéia do artista seria “criar” um estilo, o “estilo paranaense”. Em seus
escritos podemos conferir que ele próprio afirma ter criado a base do referido estilo.

Apesar dessas decorações não serem mais que um esboço do que


desejo executar, já está ali lançada a base de um estilo, quer queira ou
não, será incontestavelmente o estilo paranaense, que tem por base o
arbusto gigantesco que simboliza esse solo maravilho onde nascemos
(TURIN, s.n.t).

Nesta afirmação João Turin não só declara sua intenção em instituir um “estilo”
como também afirma tê-lo criado, e que sua base estava no pinheiro. Em vários
momentos de seus escritos afirmou ser o pinheiro a grande inspiração de seus trabalhos
e propunha ainda que os demais artistas e decoradores fizessem a mesma coisa. A flora
paranaense estava explicitamente agregada nas criações de Turin, bem como a faixas
inspiradas nas produções indígenas, o próprio índio, as esculturas de animais e
elementos decorativos com frutas e flores.
João Turin nos apresenta um projeto que ainda não foi concretizado, trata-se de
um estudo para um “Chafariz Paranaense” (imagem 35), onde a escultura de um índio
se apresenta ao centro sobre uma base de composição periódica de pinhões, e toda
estrutura da fonte se encontra adornada com pinhões e folhas em formas de faixas
decorativas. Novamente, alia arquitetura e escultura dentro do que seria para ele o ideal
paranista.
98

Imagem 35 - Estudo para Chafariz Paranaense –João Turin, década de 20.


Grafite, Nanquim e Aguada sobre papel. Casa João Turin. Foto: Luciana Barone

2.7.2 A capa da Revista “Ilustração Paranaense” e a Moda João Turin

Além da escultura e da arquitetura, a pintura, bem como a moda fizeram parte do


currículo de João Turin. É de sua responsabilidade a capa da revista “Ilustração
Paranaense” (imagem 36), onde o artista mostra todo seu talento na anatomia humana,
provavelmente inspirado no clássico de Leonardo Da Vinci (imagem 37). Seu “homem-
pinheiro” circulou na capa da revista se repetindo em todas as publicações, apenas as
cores eram modificadas, com adornos em dourados e prateados. Somente após a
revolução de 1930 é que a imagem é trocada. A revista “Ilustração Paranaense”, que
circulou de 1927 a 1930, como vimos anteriormente, teve como objetivo principal
divulgar todo o processo de desenvolvimento urbano de Curitiba e suas atividades
culturais.
99

Imagem 36 - Revista “Ilustração Paranaense” Imagem 37 - Homem Vitruviano


ano II nº10 e 11- out/nov 1928. Leonardo da Vinci
Imagem adaptada pela autora. Imagem adaptada pela autora. Disponível em:
http://www.interconect.com.br
/clientes/pontes/diversos/vitruviano.htm
Acesso em 13 de Nov. 2008.

A figura central em forma humana possui maior ênfase na imagem e também se


encontra em primeiro plano. Esta nos faz lembrar a figura do Cristo Crucificado,
podemos ainda identificar a semelhança quando observamos onde são expostas as linhas
horizontais e verticais, a cena remete a um “Calvário”. Esta mesma figura humana nos
leva ao mesmo tempo à imagem do “Homem Vitruviano” que Leonardo da Vinci
desenhou por volta do ano 1490 num dos seus diários. Mais uma vez podemos
identificar relação da obra de Turin aos clássicos, porém com uma nova roupagem, de
pinhões e pinheiros. A semelhança com a obra de da Vinci torna-se ainda evidente
quando relacionamos a figura central ao círculo existente no fundo.
Na imagem analisada10, ao redor da forma humana existem elementos orgânicos
em forma de árvores, no caso pinheiros. Tende-se então a relacionar o homem central às

10
A análise da capa da revista “Ilustração Paranaense” trata-se de uma parte de um trabalho referente à
disciplina “Leitura de Imagens na Educação”, que, através de uma abordagem dentro da Semiótica
discursiva, segue o modelo de leitura de imagens sugerido pela Professora Dra. Sandra Regina Ramalho e
Oliveira – UDESC.
100

figuras dos pinheiros que se repetem na perspectiva. A representação de um homem


forte, com músculos acentuados, lembrando a uma estátua clássica é comparado à
estrutura sólida de um pinheiro. Podemos até dizer que o homem vem na linha de frente
de um exército inabalável.
A cena é aparentemente ao ar livre, percebemos pela folhagem representada nos
cantos inferiores. A perspectiva nos mostra um caminho em que os pinheiros fazem
margem em suas laterais e o “homem-pinheiro” encontra-se no meio deste. No fundo da
imagem, no círculo, que pela influência das linhas curvas se põe a mover, temos a
sensação de que um grande agito está às costas das figuras de frente, parece que algo
extremamente tumultuado aproxima-se. A moldura relaciona-se com a imagem, pois
possui dezessete desenhos de “pinhões estilizados” que provavelmente simbolizam os
frutos da colheita que foi feita dos pinheiros que aparecem na imagem. O homem pode
ter sido a pessoa que plantou, que colheu ou o próprio pinheiro que produziu.
Vários caminhos podem ser feitos para transitar entre o visível da imagem, ou
seja, o plano de expressão e a significação, isto é, o plano de conteúdo. É importante
resgatar pontos relevantes para recriar relações. Na imagem de Turin podemos notar que
as formas circulares do centro da cabeça, peitoral e braços do “homem-pinheiro” unidas
às formas circulares dos dois pinheiros da frente podem dar a alusão a um pinheiro
estilizado (imagem 38). O mesmo homem, unindo a linha horizontal dos braços à ponta
dos pés em junção com a cabeça (que já tem forma triangular) tem a forma de um
pinhão estilizado, ou seja, o fruto do pinheiro (imagem 39).
João Turin realmente tinha a intenção de que o “estilo paranaense” criado por
ele fosse aplicado nas mais variadas manifestações artísticas, seja em desenhos,
esculturas, arquitetura, decorações e inclusive na moda. Na moda paranaense, sugerida
por Turin, podemos observar que seus projetos da década de 20 não foram executados,
porém lançaram a idéia e posteriormente foram aproveitados.
Nas imagens 40, 41 e 42 identificamos roupas femininas adornadas com folhas
de café e faixas de pinhões. Na imagem 40, um vestido azul é adornado com pinhões,
folhas de café nos ombros, e acabamentos em marrom no tom do pinhão na gola e na
altura do busto. Na cintura, folhas em verde e, um pouco abaixo, uma imitação de cinto
adornado com pinhões. No barrado, folhas de café e pinhões pendurados. Na imagem
41 outro vestido azul com um tom um pouco mais escuro apresenta uma gola de ombro
caído adornada com folhas verdes de café, seguindo até abaixo do busto, no barrado,
faixa decorativa com folhas verdes. Na imagem 42 um vestido amarelo visto de costas
101

oferece uma composição periódica de pinhões na altura dos ombros e folhagens verdes
que descem nos quadris. Abaixo, uma faixa decorativa de pinhões e no barrado formas
de pinhões fazem o acabamento.

Imagem 38 –círculos - esquema Luciana Barone Imagem 39– triângulos – esquema - Luciana
Barone

Imagens 40, 41 e 42 - Moda Paranaense –João Turin, década de 20.


Estudos em Grafite, Nanquim e Aquarela - Casa João Turin
Foto: Luciana Barone
102

João Turin fez estudos de acessórios femininos que poderiam acompanhar as


roupas sugeridas por ele, na imagem 43 identificamos um chapéu feminino com adornos
de pinhões, onde um grande pinhão faz a decoração das laterais e faixas decorativas
seguem por todo chapéu. Uma bolsa também é desenhada por Turin, e como não
poderia ser diferente, carregada de composições periódicas de pinhões e folhas de café.

Imagem 43 - Acessórios para Moda Paranaense – João Turin, década de 20.


Estudos em Grafite, Nanquim e Aquarela - Casa João Turin – Foto: Luciana Barone

Uma sombrinha, utensílio muito utilizado na década de 20, também foi esboçada
por Turin em forma de pinheiro. Nas imagens 44 e 45 podemos observar o objeto que,
aberto, tem o formato de um pinheiro e sua decoração é feita com formas geométricas e
seqüências de pinhões, adornos que se repetem em todos os trabalhos que são
característicos do chamado “estilo paranaense”.
103

Imagens 44 e 45 - Sombrinha Paranaense – João Turin, década de 20.


Estudos em Grafite, Nanquim e Aquarela - Casa João Turin – Foto: Luciana Barone

Em síntese, esta produção artística elaborada pelos paranistas não acompanhou


as características “modernas” sugeridas pelo movimento paulista no período, e também
não teve o intuito de “engolir” as imposições vindas da Europa, como pudemos
constatar anteriormente nos escritos de Turin. Os paranistas intencionaram incutir um
símbolo num Estado acusado de incaracterístico, e para isso apropriam-se do pinheiro.
Para que este símbolo, o pinheiro, tivesse a aceitação da população paranaense, suas
peculiaridades foram exaltadas, e também tudo que pudesse ser relacionado a ele, ou
seja, suas pinhas, pinhões e folhas foram exageradamente divulgados através das artes
visuais, almejando assim que os objetivos fossem atingidos. João Turin acreditava que
embutindo “elementos paranaenses” em objetos já reconhecidos estaria revestindo a arte
com uma “roupagem moderna”, porém para isso ele retorna aos clássicos, como
pudemos observar em seus trabalhos, causando, no entanto, certa confusão onde utilizou
estereótipos locais aliados aos estereótipos classicistas.
Portanto, esta arte chamada de “estilo paranaense” foi uma tentativa de
construção de uma identidade regional no Estado Paraná. Os paranistas tiveram a
preocupação de construir obras que tivessem um elo perfeito com o imaginário popular
da época, estabelecendo assim uma sintonia entre os símbolos criados pela elite
curitibana, ou seja, pelos intelectuais da época e a população que os acolheu.
Hoje os símbolos criados continuam presentes maciçamente na Capital do
Estado, fazendo parte de um cenário comum, seja nas praças, nas construções, nas
calçadas. Porém a maioria das pessoas que pisam nos petit pavês com formas de
104

pinhões estilizados por Lange de Morretes não faz idéia do que há por trás destas
produções e desconhecem sua história. No próximo capítulo iremos identificar o que
restou, em termos de artes visuais, deste movimento após as décadas de 20 e 30.
105

CAPÍTULO 3

O PARANISMO VISUALMENTE PRESENTE

APÓS AS DÉCADAS DE 20 E 30
106

Como visto anteriormente, neste trabalho enquadramos o movimento paranista


no período de circulação da revista “Ilustração Paranaense”, ou seja, de 1927 a 1930
aproximadamente. Porém as obras plásticas paranistas continuaram a ser apresentadas
por artistas posteriores às décadas de 20 ou 30, da mesma maneira que as idéias de
Romário Martins, Lange de Morretes e João Turin não foram esquecidas. Pelo
contrário, se mantiveram na produção dos discípulos dos mesmos.
A reverência ao “Pinheiro” constituída pelos paranistas continuou efervescendo
a produção artística dos artistas após o movimento, bem como o pinhão, a pinha e
posteriormente a gralha-azul. Ousemos até dizer que muitos sobreviveram às influências
estabelecidas pela “Revista Joaquim” ou pelo “Grupo Garaginha”, comentados no
segundo capítulo, não se deixando levar pelas seduções propostas pelo “modernismo”
paulista. O caso é que a necessidade de alimentar uma tradição comum para o Estado do
Paraná ainda manteve-se em muitos dos ideais e propostas de escritores e artistas
plásticos posteriores ao Movimento Paranista. Podemos remeter esta atitude ao fato
destes artistas sentirem necessidade de uma direção simbólica, ou seja, a produção
artística teria um reforço se embasada em origens da própria terra, onde tanto o artista
quanto o espectador reconhecem na obra suas raízes.
José Murilo de Carvalho nos alerta que os símbolos e os mitos só podem criar
raízes se houver um terreno cultural ou social para se fortalecerem. O autor prossegue
afirmando que na carência deste alicerce, qualquer tentativa de utilização de mitos,
alegorias ou símbolos como elementos de legitimação, bem como a criação e
manipulação dos mesmos, cai no vazio, quando não no ridículo (CARVALHO, 1990, p.
89).
Portanto, podemos dizer que a semente lançada pelos paranistas foi acolhida por
terreno fértil, pois algumas atitudes posteriores ao Movimento Paranista acabaram
prolongando as idéias do mesmo, bem como a divulgação de sua produção artística.
Citemos aqui os incentivos às leis e à cultura por parte de governantes e representantes
do Estado, e de colaboradores e adeptos aos esforços de Romário Martins em relação ao
resgate da tradição e simbologia deste Estado. Irã Dudeque afirma que a aceitação de
um símbolo é uma decisão política e, neste sentido, os paranistas podem ser vistos
107

como estrategistas bem sucedidos (DUDEQUE, 2001, p. 69). Assim sendo, a


necessidade de alguns artistas e também de governantes do Estado em manter relações
com o regionalismo e com o tradicional sustentou uma chama acesa, não permitindo
que o Paranismo fosse levado pelo vento. Esses mantenedores da força simbólica no
Estado do Paraná conseguiram cultivar a semente plantada pelos paranistas.

3.1 Curitiba e o Incentivo à Cultura e à Tradição

Além das lembranças e registros em livros e em museus, atualmente o


paranismo ocupa um considerável espaço nas esculturas, nas portas entalhadas, nos
tecidos da cor ou com estilização de pinhão, em quadros ou em alguns exemplos da
arquitetura. A cidade de Curitiba nos mostra que o “estilo paranista” sobreviveu às
décadas de 20 e 30 e ainda se mantém vivo, mesmo que suavemente. Podemos remeter
esta resistência dos símbolos paranistas tanto aos artistas quanto ao incentivo dos
governantes do Estado, bem como do Município. Para entendermos um pouco mais a
trajetória de Curitiba em relação ao resgate e à valorização dos símbolos paranaenses,
onde houve um reforço na década de 90, faremos um breve histórico do seu
desenvolvimento a partir da década de 40.
Nos anos 40 a Prefeitura de Curitiba contratou uma empresa a fim de projetar
um plano urbanístico para a cidade, cuja responsabilidade ficou por conta do arquiteto
francês Alfred Agache. O denominado “Plano Agache” estabeleceu algumas prioridades
e propôs a divisão da cidade em zonas especializadas, de maneira que pudesse propiciar
o desenvolvimento comercial, bem como da vida social através da estruturação de
centros, o descongestionamento de vias e o saneamento. Deste plano podemos
identificar a implementação das galerias pluviais da Rua XV de Novembro, as grandes
avenidas, a Zona Industrial, o Mercado Municipal, as áreas previstas para o Centro
Politécnico e para o Centro Cívico e o recuo de cinco metros obrigatórios para novas
construções1.
Segundo Buchmann (2007), nos anos 50 com a centralização de poder do Estado
Novo mantida pela influência da era Vargas alguns monumentos marcam datas e
1
Disponível em: (www.curitiba.pr.gov.br/pmc/curitiba) Acesso: 20 de Mai. 2009
108

projetos grandiosos firmam e registram a cidade de Curitiba caminhando para um


possível avanço à “modernidade”. O Estado estava sendo dirigido por Bento Munhoz da
Rocha Netto (1905-1973), seguidor do populismo de Getúlio e também comprometido
com a modernização, por ele foram criados o Palácio Iguaçu e o Centro Cívico onde
apresentava uma arquitetura modernista, o Centenário de Emancipação Política do
Paraná foi comemorado em seu governo (BUCHMANN, 2007, p. 55).
Alguns urbanistas da Universidade Federal do Paraná propõem nos anos 60 à
prefeitura um plano para a cidade, que veio a ser implantado posteriormente numa
promoção do seminário "Curitiba de Amanhã". Este plano saiu do papel a partir de
1971, reconhecido como Plano Diretor, e foi colocado em prática pela equipe de Jaime
Lerner, arquiteto e urbanista que na época havia sido eleito prefeito. O Plano Diretor foi
propagado durante o período de 1971-1983, com administrações que vieram incorporar
mudanças à proposta inicial, dentre estas mudanças tendo um maior destaque no
transporte coletivo2.
Jaime Lerner por três vezes assumiu a prefeitura de Curitiba (1971-75; 1979-83;
1989-92), neste período preocupou-se com o planejamento urbano, com transportes,
projetos urbanísticos, com o meio ambiente e com os programas sociais. Na gestão de
1989-92 foram criados o sistema de transporte interligado e o ônibus ligeirinho, a Ópera
de Arame, A Rua 24 horas e o Jardim Botânico.
Em 13 de novembro de 1991 é promulgada a Lei Municipal de Incentivo à
Cultura e implantada em 1993. Considerada uma das mais significantes ferramentas de
incentivo à produção cultural na cidade, esta Lei promoveu muitos espetáculos teatrais,
vídeos, filmes, livros, CDs, exposições, publicações que valorizam a história e as
tradições do município, palestras, concertos e shows, projetos de cursos, entre outras
manifestações que identifiquem a produção cultural curitibana. O incentivo baseia-se na
renúncia fiscal pela Prefeitura de Curitiba de até 2% da arrecadação de Imposto
Predial e Territorial Urbano (IPTU) e Imposto Sobre Serviços (ISS)3. A logomarca da
Lei de Incentivo à Cultura ficou por conta de Poty Lazzarotto, onde o artista fez um
pinhão estilizado nos tons de marrom, marrom avermelhado, preto e branco. O desenho
de um pinhão para simbolizar a valorização da história e tradições do município de
Curitiba (imagem 46).

2
Disponível em: (www.curitiba.pr.gov.br/pmc/curitiba) Acesso: 20 de Mai. 2009
3
Disponível em: (www.fundacaoculturaldecuritiba. com.br/leidoincentivo/index.asp) . Acesso 20 de Mai.
2009.
109

Imagem 46 – Logomarca criada por Poty Lazzaroto. Disponível


em:http://www.curitiba.pr.gov.br/pmc/orgaos/fcc/acontece/entrada/i
ndex.html. Acesso: 21 de Mai. 2009.

O sucessor político de Jaime Lerner na prefeitura


de Curitiba foi Rafael Greca de Macedo, que podia
contar com o apoio do antigo prefeito. Na gestão do
Prefeito Rafael Greca foram inaugurados os Faróis do
Saber, as Ruas da Cidadania, murais de Poty Lazzarotto,
o Memorial dos 300 anos, entre outros. Foi na gestão de
Greca que ocorreram as comemorações dos 300 anos de
Curitiba, onde houve um considerável resgate paranista.
Segundo Cassiana Lacerda Carollo, Secretária
Executiva da Comissão dos 300 Anos, desde as primeiras iniciativas voltadas para as
comemorações dos 300 Anos de Curitiba, a administração municipal procurou
instaurar um processo cultural configurado no lema “comemorar, conhecer”4. Retomar
os caminhos da memória seria a preocupação principal e fio condutor dos trabalhos que
iriam ser realizados durante o processo de comemoração dos 300 anos de Curitiba.
Muitas iniciativas foram tomadas no sentido de resgatar as tradições paranaenses,
valorizando a cultura e a produção plástica. Assim sendo, muitas das produções
artísticas lançadas durante este período remeteram às tradições e ao Paranismo. A
simbologia criada nas décadas de 20 e 30 estava agora ressurgindo nos painéis e
construções dos anos 90, contando ainda com a gralha-azul. Este pensamento inovador
sobre o Paranismo foi denominando por alguns críticos como Neo-Paranismo.
Trezentas gralhas foram aprisionadas num grande painel pelo artista plástico
Rogério Dias em comemoração aos 300 anos da cidade de Curitiba em 1993 (imagem
47. O autodidata Rogério José de Moura e Dias nasceu em 1945, na cidade de
Jacarezinho, interior do Paraná. Pintor, desenhista, gravador, designer gráfico,
cartunista, escultor é também reconhecido como o “Artista dos Pássaros”, pela
recorrente representação de pássaros em sua obra. Não é de se estranhar que a prefeitura
de Curitiba tenha convidado este artista para compor a obra com 300 gralhas, que se
encontra no Acervo Municipal da cidade. As gralhas refletem cada ano que se passou
para a cidade que é alimentada por seus pinheiros; num fundo amarelo vibrante, o artista

4
Disponível em: (http://www.psg.com/~walter/curitiba.html). Acesso: 20 de mai. 2009.
110

espalhou as pequenas aves azuis, intercalando-as em posições para a direita e para a


esquerda, algumas manchas vermelhas e pinceladas em tons de verdes compõem um
trabalho harmonioso e agradável aos olhos.

Imagem 47 - 300 gralhas para Curitiba - Rogério Dias


Acervo da Prefeitura Municipal de Curitiba. Disponível em:
http://www.rogeriodias.com/Portugues/principaisobras.html acesso: 28 de mai. 2009.

Em 1994 Rogério Dias executa também para a Prefeitura Municipal de Curitiba


o projeto para um painel de azulejos de 50 metros sobre o “Rio Iguaçu”, que foi
inaugurado em 1996 ao lado do Palácio do Governo. Encomendado pelo então prefeito
Rafael Greca. Tal painel retrata o rio de sua nascente à sua foz, com a fauna e flora, a
imagem relata a história, as lendas e personagens. A obra foi realizada para homenagear
o descobridor das “Cataratas do Iguaçu”, Dom Alvar Nuñes Cabeza de Vaca, bem como
o Rio Iguaçu, cuja história é um registro de luta pela integração do Estado do Paraná.
Roselys Vellozo Roderjan, num artigo do jornal “Gazeta do Povo” intitulado
“Vamos repensar o paranismo?”, fez um alerta à população em relação às
comemorações dos 300 anos da Vila de Nossa Senhora da Luz e Bom Jesus dos Pinhais,
atualmente Curitiba. Em seu texto, a autora explicita sua preocupação em aproveitar o
momento de comemoração e resgatar verdadeiramente a memória do Estado e da cidade
de Curitiba, afirmando ainda que alguns setores de comunicação não informam o leitor
111

sobre nossa história, e muitas vezes divulgam noticiários que não são próprios das
raízes paranaenses. Segundo ela, muitos enganos históricos já aconteceram. Rosely
segue questionando se esses enganos poderiam ser sanados caso houvesse mais estudos
sobre a história da cultura paranaense, ou se estas informações fossem apreendidas nas
escolas e universidades paranaenses, em programas educacionais sobre a história, sobre
o povoamento e as diferenças regionais. Por fim, a autora pergunta se a população está
realmente preparada para comemorar e valorizar os trezentos anos da cidade.

Será que estamos preparados para valorizarmos os trezentos anos de


nossa Curitiba? Vamos, até lá, fazer alguma coisa, evitando essas
impunes informações de apressados cronistas da nossa história.
Vamos repensar nossa história, tão divulgada no passado, resgatar
essa memória. Vamos lembrar o “paranismo” acrescentando nossa
contribuição. Assim estaremos realmente em condições de
comemorarmos nossos trezentos anos de história (GAZETA DO
POVO, 1991).

Para a autora, a população, na ocasião do tricentenário de Curitiba, comemorava


300 anos e desconhecia a história. No entanto, esta mesma população paranaense,
principalmente a curitibana, ainda hoje, mesmo estando constantemente em contato com
os símbolos paranistas, na sua maioria desconhece sua história. É possível aferir esta
afirmação a partir de uma pesquisa informal realizada durante o curso de “Artes Visuais
no Paraná”, concretizado no “Centro Estadual de Capacitação em Artes Guido Viaro”,
no município de Curitiba5.
Na ocasião do evento houve uma palestra sobre “Paranismo e as Artes Visuais”6.
Antes da abordagem efetiva do assunto, a ministrante fez três perguntas aos docentes:
Qual é o símbolo do Paraná? Por quê? E o que vem a ser Paranismo? A resposta da
primeira pergunta foi unânime, a maioria respondeu que o símbolo era o pinheiro, bem

5
O evento, promovido pela Secretaria de Estado da Educação – SEED - foi realizado no período de
28/04/2008 a 30/04/2008 e reuniu 120 (cento e vinte) participantes, sendo eles professores da Rede
Pública Estadual com formação nas áreas de Música, Dança, Artes Visuais ou Teatro, e atuantes como
docente de 5ª a 8ª séries, Ensino Médio, Ed. Especial ou Educação de Jovens e Adultos. O curso
congregou professores de todas as regiões do Estado do Paraná, sendo que as vagas foram divididas em
grupos por Núcleos Regionais de Educação, no qual cada núcleo teve a participação de um determinado
número de representantes. Como podemos constatar nas cidades e participantes a seguir: Apucarana (03),
AMN – Colombo (08), AMS - São José dos Pinhais (08), Assis Chateaubriand (03), Campo Mourão (03),
Cascavel (03), Cianorte (03), Cornélio Procópio (04), Curitiba (10), Dois Vizinhos (03), Foz do Iguaçu
(03), Francisco Beltrão (03), Goioerê (03), Guarapuava (03), Irati (03), Ivaiporã (03), Jacarezinho (04),
Londrina (04), Maringá (04), Ibaiti (03), Loanda (03), Paranaguá (04), Paranavaí (03), Pato Branco (03),
Pitanga (03), Ponta Grossa (04), Telêmaco Borba (03), Toledo (03), Umuarama (03), União da Vitória
(03), Wenceslau Braz (04), Laranjeiras do Sul (03).
6
A palestra foi ministrada pela autora deste trabalho, Professora Luciana Estevam Barone Bueno.
112

como a gralha azul. A resposta da segunda questão foi bem diversificada entre: - Porque
tem muito pinheiro no Paraná; – Porque só tem o pinheiro araucária no Paraná; –
Porque a gralha planta o pinheiro nas terras paranaenses. A terceira pergunta foi a
mais discutida, pois eram poucos os professores que sabiam sobre o Paranismo, destes
poucos, a maioria era da cidade de Curitiba.
O resultado foi surpreendente, porém esperado. Os professores reconheciam os
símbolos paranaenses, em geral em todo Estado, mas ignoravam a história, confirmando
a declaração de Dudeque, a pregação paranista foi tão bem sucedida que os
curitibanos” podemos acrescentar ainda, que os paranaenses, “esqueceram que houve
um movimento paranista, e repetem que o pinheiro é o símbolo do Paraná (DUDEQUE,
2001, p. 70). Os professores reconheciam o pinheiro, o pinhão e também a gralha como
símbolos do Paraná, mas não sabiam sobre o Paranismo, pelo menos até aquele instante.
Muitos foram os questionamentos sobre o assunto durante a explanação e também ao
término da palestra, ou seja, algumas pessoas não acreditavam que mesmo morando
tanto tempo no Estado do Paraná, nunca haviam ouvido falar no Paranismo.

3.2 As Calçadas Curitibanas e as Idéias de Lange

A população que pisa nas calçadas pouco sabe da história que elas contam. Os
desenhos presentes em cada pedra dos calçamentos curitibanos nos remetem a um
passado que os paranaenses perdem por não conhecer. A fórmula de Lange de Morretes,
ou seja, a estilização da caruma, bem como dos pinhões, foi parar nas calçadas de
Curitiba, em tom de vermelho castanho, preto e branco, em petit-pavé – nome francês –
também conhecido como “mosaico português”.
Vasconcelos em seu livro “Calçadas de Curitiba: preservar é preciso” faz um
estudo sobre as calçadas curitibanas, bem como os desenhos das mesmas, classificando-
os em grupos de influências: portuguesa, Art Nouveu, Art Déco, Paranista e Indígena.
Segundo Vasconcelos, o mosaico português surgiu no século XIX e foi introduzido no
Brasil no começo do século XX. Em Curitiba a autora afirma que, de origem italiana, a
primeira empreiteira a trabalhar com o calçamento foi a da Família Greca, e através de
uma citação de Rafael Greca de Macedo, a autora alega que no final dos anos 20,
113

chegaram à cidade, portugueses especialistas em petit-pavé (VASCONCELOS, 2006, p.


24).
Neste mesmo período as calçadas foram adornadas com manifestações
regionalistas e os motivos indígenas ganharam espaço nas ruas curitibanas, juntamente
com os demais desenhos dos mais variados estilos. Segundo a autora, o prefeito da
época, Moreira Garcez, recebeu de Romário Martins, que no período era diretor do
Museu Paranaense, a recomendação sobre a necessidade da utilização de elementos
indígenas nas calçadas, e a seleção dos mesmos era feita pelo próprio Romário. Em
1949, juntamente com os motivos indígenas, foram implantados desenhos do pinheiro e
seus derivados, onde alguns destes foram inspirados nos desenhos de Lange de
Morretes. A rosácea paranista, por exemplo, ao ser aplicada em algumas calçadas
perdeu seus detalhes laterais, facilitando assim sua implantação. Na imagem 48
podemos observar que os pinhões estilizados foram inspirados nos desenhos de Lange
para a formação da rosácea, porém não possuem detalhes nas laterais.

Imagem 48 - Rosácea do pátio do Museu Alfredo Andersen. Petit-pavé preto e branco.


Foto: Luciana Barone.

Segundo Salturi, o petit-pavé vermelho castanho aplicado na calçada, embaixo


da coluna do relógio da Praça Osório, é um desenho que remete aos originais de Lange
de Morretes, embora a implantação seja mais recente (SALTURI, 2007, p. 139).
Podemos conferir na imagem 49.
114

Imagem 49 - Praça Osório, desenho de Lange de Morretes ao redor do relógio. Petit-pavé vermelho
castanho. Fonte: VASCONCELOS, 2006, p. 30. Imagem adaptada pela autora.

A Praça Osório apresenta ainda aos transeuntes uma seqüência de rosáceas


formando uma passarela central, e nas laterais faixas paralelas com pinhões estilizados.
Caminho este que direciona o passeio até o relógio central (Imagem 50).

Imagem 50 - Rosácea da Praça Osório. Petit-pavé preto e branco.


Fonte: VASCONCELOS, 2006, p.54. Imagem adaptada pela autora.
115

Salturi afirma ainda que remetem aos originais de Lange de Morretes o desenho
pintado no pátio da Reitoria da Universidade Federal do Paraná e o petit-pavê da
calçada da Praça do Rio Iguaçu, próxima ao Palácio. Segundo o autor, trata-se de uma
rosácea grande, construída a partir da fórmula do pinhão, parecida com a Pinha-dos-
Ventos (imagem 51) da calçada do cruzamento da Rua XV de Novembro com a Rua
Barão do Rio Branco.

Imagem 51 - Desenho Pinha-dos-Ventos.


Fonte: Salturi, 2007, p.140.

Em 1993, em comemoração ao Tricentenário da Fundação da cidade de Curitiba,


muitas atitudes em relação à preservação e divulgação dos elementos símbolos do
Paraná foram tomadas por parte da prefeitura. A Linha Pinhão/Pegadas da Memória foi
criada como um roteiro cultural e histórico, inaugurada no período. Este roteiro permite
que o pedestre faça uma caminhada sobre os “Caminhos da História” numa extensão de
2,4 quilômetros, percorrendo a área central da cidade. Neste trajeto pré-estabelecido a
Pinha-dos-ventos faz parte do conjunto de desenhos, a mesma se encontra em petit-pavé
vermelho cuja cor se aproxima da tonalidade do pinhão (imagem 52).
116

Imagem 52 - Pinha-dos-Ventos - cruzamento da Rua XV de Novembro com a Rua Riachuelo.


Foto: Luciana Barone.

A capital ainda está repleta de calçadas com estes elementos em diversos locais
como a Av. Luiz Xavier, a Rua XV de Novembro, Praça Santos Andrade, onde é
possível encontrar os desenhos em forma de pinhões, pinhas e pinheiros inspirados em
Lange de Morretes e no Movimento Paranista. Na imagem 53 detectamos a rosácea de
pinhões e o pinheiro dividindo a mesma calçada.

Imagem 53 - Praça Dr. João Cândido. Calçada externa com motivo paranista. Petit-pavé preto e branco.
Fonte: VASCONCELOS, 2006, p. 73. Imagem adaptada pela autora.
117

3.2.1 As Idéias de Lange de Morretes além das calçadas

Os elementos geometrizados criados por Lange de Morretes passaram a fazer


parte do cotidiano dos curitibanos. Além das calçadas, é possível detectar suas
estilizações nos mais variados locais e objetos, objetos estes que ainda estão presentes
no dia-a-dia da população, bem como nos trabalhos de artistas e artesãos (imagens 54 e
55).

Imagens 54 e 55 - Tapetes Paranistas – Bússola e Rosácea – Entrada da Fundação Cultural


Foto: Luciana Barone.

Em comemoração ao aniversário da padroeira de Curitiba, Nossa Senhora da


Luz dos Pinhais, no dia 04 de novembro 1995, Rafael Greca, na época prefeito da
cidade, faz uma doação para a Catedral Basílica de um tapete com as estilizações de
Lange de Morretes. O tapete 7m x 2,80m possuía desenhos de pinhões no centro e nas
bordas, em tons de bordô e amarelo (imagem 56). Em solenidade no salão nobre da
prefeitura, ao entregar o presente ao administrador e vigário da Catedral padre Helcion
Ribeiro, o prefeito se expressou nas seguintes palavras: Os pinhões que já estão nas
calçadas em petit-pavê agora também enfeitam os tapetes, uma obra de arte que vai
permanecer por muito tempo. É uma forma de retribuir a proteção de Nossa Senhora,
porque sem ela a cidade não avança (GAZETA DO POVO, 1995).
O prefeito, na ocasião, deixou claro que o tapete havia sido uma gentileza do
Unibanco Corporate, portanto não havia gerado custos aos cofres públicos. O padre
agradecendo afirmou: o tapete agora fará parte do patrimônio da Catedral, que como
edifício centenário já é um dos valores culturais que se tornaram um orgulho
paranaense (GAZETA, 1995). Disse ainda que o digno presente seria colocado entre a
cátedra do bispo e o altar, sobre um chão de mármore. O referido banco ainda
118

patrocinou outros três tapetes com os motivos de Lange de Morretes, porém em


tamanhos menores, que foram colocados nos salões da prefeitura.

Imagem 56 - Tapete com motivos inspirados na obra de Lange de Morretes.


Fonte: Gazeta do Povo. 05 de Setembro de 1995. Imagem adaptada pela autora.

Pinhões estilizados e inspirados em Lange de Morretes podem ainda ser


encontrados adornando o mastro que sustenta a imagem de Nossa Senhora da Luz dos
Pinhais. Inaugurado em 1993, o Memorial de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais foi
produzido pela escultora argentina Maria Inês Di Bella, radicada em Curitiba, em molde
de gesso e executado em bronze pela Fundição Adalberto Baso. A escultura em bronze
mede 2,5m e pesa 650 quilos e o pedestal cilíndrico mede 10m de altura. Trata-se de
uma imagem de uma mulher que carrega uma criança em um dos braços e o outro
estende a mão, como que em sinal de oração pela cidade. Com traços retorcidos e
expressão forte de movimento, a imagem nos remete a uma escultura barroca (imagens
57 e 58). No pedestal identificamos os sinais do paranismo, as faixas decorativas de
pinhões estilizados, sendo duas logo aos pés da Santa na parte superior do cilindro, e
uma outra na parte inferior, próxima às placas de informações. Uma das placas nos
apresenta as seguintes plavras Ave Maria Mater Dei Lux Et Spes Nostra Regina
Curytibensis. Na outra, Todas as gerações me chamarão bem aventurada, Maria, Mãe
de Jesus – Evangelho de São Lucas, continua com uma explicação: Esta coluna triunfal,
sinal de perpétua gratidão do povo de Curitiba a Maria Nossa Senhora da Luz dos
119

Pinhais, marca os 300 anos da cidade e os 100 anos da inauguração da catedral. Na


terceira placa constam os créditos da artista e na última a data, 8 de setembro de 1993,
juntamente com as assinaturas do Prefeito Rafael Greca e do Arcebispo Dom Pedro
Fedalto. Na imagem podemos ter uma visibilidade de localização da obra, situada no
cruzamento das Ruas Barão do Serro Azul e São Francisco, identificando aos fundos,
além dos prédios comerciais e restaurantes, as torres da Catedral Basílica de Curitiba e
ao lado, também ao fundo, como não poderia faltar, um pinheiro.

Imagens 57 e 58 - Memorial de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais - Maria Inês Di Bella – 1993.
Foto: Luciana Barone.

Dentre os discípulos que estudaram no ateliê de Lange de Morretes no período


de 1892 a 1954, podemos citar: Arthur José Nísio (Curitiba, 1906 – 1974), Augusto
Conte (São José dos Pinhais, 1913 – Curitiba, 1988) e Oswald Lopes (Curitiba, 1910 -
1964), sendo este último reconhecido por sua fixação pelo pinheiro, certamente por
influência do mestre. O escultor e pintor Oswaldo Lopes tinha também uma persistente
estilização das formas vegetais com destaque aos motivos paranistas. Segundo Camargo
(2007), o artista seguiu ardorosamente os princípios paranistas chegando a ponto do
120

mesmo, juntamente com seus alunos da “Escola de Belas Artes”, projetar e construir seu
próprio caixão em forma de pinhão.

3.3 A Arquitetura em Curitiba e os Vestígios de Turin

Segundo Cláudia Malkes, preservar as raízes da nossa história não significa


simplesmente recordar um passado morto, mas promover o fortalecimento da
personalidade de todos que têm ligações com esse passado (GAZETA DO POVO,
1994, A12). Para a escritora, o Paraná teve, além dos estilos arquitetônicos trazidos
pelos imigrantes poloneses, japoneses, italianos, seu estilo próprio, o estilo paranista.
João Turin lutou pela propagação deste estilo bravamente e em seu artigo “A Arte
Decorativa no Brasil”, chegou a afirmar que faltava ousadia nos arquitetos em Curitiba
para se efetivar uma decoração de livre expressão. O que falta em Curitiba é um
arquiteto que tenha a audácia e a coragem de colaborar para essa grande obra de
liberdade artística que é a mais alta expressão de alma livre de um povo (TURIN,
s.n.t). João Turin se referia a uma arquitetura com simbologia e elementos que ligassem
a construção ao Estado do Paraná, segundo ele, desta maneira o arquiteto estaria
revelando sua liberdade artística. Alguns arquitetos levaram em frente às propostas de
Turin, podemos aferir isto ao identificar ainda hoje alguns projetos com vestígios
paranistas existentes na cidade de Curitiba. É o caso de um “Túmulo Paranista”
encontrado no Cemitério Municipal de Curitiba, pertencente à família Stenghel.
Segundo Dudeque, um raro e curioso sobrevivente dos princípios da ordem paranista
(DUDEQUE, 2001, p. 69). A obra, cujo autor é desconhecido, possui uma decoração
Art Nouveu acompanhada de pinheiros. Na imagem 59 a fachada principal apresenta um
túmulo em tom de amarelo com uma escada central, onde seus dois lados são
simetricamente adornados com vasos decorados com pinhas e folhas, a porta de ferro
contém elementos naturais com variações entre frutos e folhas. Também numa
composição simétrica, ao lado da porta, dois grandes pinheiros em branco, seguidos de
outros dois menores, novamente outros dois maiores, com duas janelas retangulares
dividindo-os acima das janelas outros dois pinheiros. Temos a sensação de um pinheiral
colado em paredes, neste caso, em paredes de um túmulo. Na parte superior, três
guirlandas também em branco fazem o adorno central. A construção é ornada com uma
121

escultura que sugere uma cortina e envolve o jazigo, em forma de panos, que segue a
partir da porta central e desce por toda construção.

Imagem 59 - Túmulo da Família Stenghel – Cemitério São Francisco de Paula - Cemitério Municipal de
Curitiba – Foto: Luciana Barone.

Na imagem 60 temos um panorama da parte de trás do túmulo, em que as


formas do pinheiro se repetem, e ao centro uma pequena janela ladeada por dois
pinheiros, seguidos de outros dois. A imagem 61 nos apresenta uma vista interna do
sepulcro, como não poderia ser diferente, decorando um altar branco, três pinheiros se
fazem presentes.
122

Imagem 60 e 61 - Túmulo da Família Stenghel –


Cemitério São Francisco de Paula - Cemitério Municipal
de Curitiba – Foto: Luciana Barone.

Ao caminhar pelas ruas de Curitiba é possível identificar sinais do Paranismo


em algumas construções, que muitas vezes não mantiveram o estilo totalmente, mas
guardam alguns detalhes que remetem ao mesmo. É o caso da escada externa do prédio
do Solar do Barão em que uma pinha (imagem 62) faz o acabamento do corre-mão,
aproximando-se de um Art Nouveu onde a escada traz detalhes de folhas e linhas
onduladas remetendo a raízes, e a placa (imagem 63) de indicação das portas com
pinhões em relevo, atualmente não mais utilizada.

Imagem 62 e 63 - Escada externa com acabamento com pinhas e Placa de indicação das portas –
Centro Cultural Solar do Barão – situado à Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 533. Curitiba.
Foto: Luciana Barone
123

O antigo casarão onde morou o Barão do Serro Azul, prédio construído em


1883, restaurado entre 1980 e 1983, é atualmente o “Centro Cultural Solar do Barão”,
vinculado à “Fundação Cultural de Curitiba”, um espaço que abriga exposições e local
onde são realizados vários cursos de arte.
A “Arquitetura Curitibana Paranista” pode ser vista atualmente com inúmeras
variações. Com o passar dos anos, os poucos arquitetos que aderiram às idéias de Turin
foram adaptando as construções às aproximações aos estilos vigentes, porém sempre
com a presença do pinheiro ou de elementos que remetessem a ele. Para Dudeque,
quando se ideasse a existência de uma arquitetura paranaense, invocavam-se os
pinheiros mimetizados por João Turin [...] numa variação jamais imaginada por Turin
(DUDEQUE, 2001, p. 70-1).

3.3.1 Paranismo Além das Idéias de Turin

Numa tentativa de resgate paranista com influência art decó inaugurou-se em


outubro de 1992 o Shopping Center Champagnat, situado à Rua Padre Anchieta, 1.287,
no Bairro Champagnat. Para a efetivação desta construção, Edson Paes Sillas, diretor
superintendente do Shopping, foi buscar inspiração para a decoração nos elementos da
cultura paranaense.

Nós queríamos criar um local sóbrio, clássico e elegante, que fugisse


dos modismos, o que, por conseqüência, poderia tornar desgastante a
imagem do shopping. Assim, resolvemos ressaltar a simbologia
paranista, usando o pinhão, pinheiro e a gralha azul, aliados a
materiais nobres, como o latão, granito, e madeira (GAZETA DO
POVO, 1993).

Para Edson havia um contraste entre o pinheiro e o pinhão, pois ambos são
símbolos que ao mesmo tempo em que representam uma simplicidade, também trazem
uma extraordinária sofisticação e nas mãos do decorador Paulo José Marcelli estes
elementos tornaram-se uma composição muito bonita.
A idéia de reunir motivos paranaenses na decoração do shopping foi uma
homenagem ao Paraná por parte dos empreendedores Alfredo e Virgínia Gulin, que
possuem suas raízes no Estado. O resultado foi uma união de gralhas azuis, pinheiro e
pinhões. O piso foi feito em granito e adornado com pinhões em madeira, numa
124

composição como se os pinhões estivessem naturalmente “caindo” da árvore. No centro,


como pode ser observado na imagem 64, ao lado das escadas foi colocado um pinheiro
de ferro como se estivesse “plantado”, compondo um ambiente agradável e ao mesmo
tempo sofisticado.

Imagem 64 - Champagnat Shopping: em estilo pós-moderno, usa elementos regionais na decoração.


Fonte: Jornal Gazeta do Povo 1994. A12. Acervo MAC. Imagem adaptada pela autora.

Foi preciso chegarmos ao pós-modernismo para que se entendesse a utilidade


daquilo que era considerado meramente ornamental, é o que diz Cláudia Belfort
Malkes ao comentar sobre a arquitetura do Champagnat Shopping no jornal “Gazeta do
Povo”, no artigo intitulado “Arquitetura – Paranismo: Resgatando Nossas Raízes”
(Gazeta, 1994. A12). Atualmente a fachada do Champagnat Shopping continua
apresentando o pinhão estilizado da entrada, como podemos observar na imagem 65,
bem como os petit-pavês com desenhos inspirados nas estilizações de Lange de
Morretes das calçadas (imagem 66).
125

Imagem 65 - Fachada principal do Champagnat


Shopping com pinhão estilizado em vermelho.
Foto: Luciana Barone.

Dois painéis em relevo podem ser encontrados, sendo um com três pinheiros e
um pano de fundo que sugere um pôr do sol, ao lado esquerdo do visitante (imagem 67),
e o outro com folhas e frutos de café (imagem 68) que compõe o lado direito da entrada
principal do shopping.

Imagem 66 - Calçada de entrada do Champagnat Shopping com estilizações de pinhões nos petit pavés
em preto e branco. Painel esquerdo de pinheiros em relevo. Foto: Luciana Barone.
126

Imagens 67 e 68 - Painéis da entrada do Champagnat Shopping. À esquerda com Pinheiros em relevo e à


direita com relevo de folhas e frutos de café. Foto: Luciana Barone.

Porém, internamente a arquitetura do Champagnat Shopping está totalmente


modificada, o pinheiro central já não é mais encontrado, tampouco as escadas rolantes e
os pinhões que “caíam” do pé. O que sobrou do “estilo paranista” dentro do Shopping
Champagnat difere totalmente do projeto inicial, são detalhes tão pequenos que somente
o espectador atento consegue identificar. Hoje em dia, no Shopping, funciona uma
central de serviços do Banco do Brasil, mínimas são as lojas que permaneceram abertas,
mantendo apenas os locais de escritórios e salas comerciais. Tanta modificação com as
intenções comerciais do Shopping acabou transformando o que seria uma homenagem
ao Paraná em mais um edifício comercial comum. As várias gralhas azuis se limitaram
em duas, expostas bem ao alto em armação de ferro que fogem totalmente da linha do
observador (imagem 69). As grades com adornos de pinhões permanecem, como
podemos observar no plano de fundo da imagem da gralha e também na imagem 70,
com detalhe.
127

Imagens 69 e 70 - Decoração do Champagnat Shopping, a gralha azul pendurada em armação de ferro e


ao fundo, grade adornada com pinhões estilizados. À direita, detalhe da grade. Foto: Luciana Barone.

A mobília com pinhões estilizados, mesmo que em com poucas peças, ainda
pode ser encontrada, com uma influência art decô e detalhes em latão dourado ou na cor
do próprio pinhão. São exemplos o pinhão do balcão de informações da entrada
principal (imagem 71) e os pequenos adornos dos encostos ou laterais de bancos e
cadeiras (imagens 72, 73 e 74).

Imagens 71 e 72 - Peças da mobília do Champagnat Shopping adornadas com pinhões estilizados. À


esquerda, balcão de entrada para informações, à direita, banco giratório do café. Foto: Luciana Barone.

Para Dudeque, a auto-afirmação do paranismo permaneceria como uma


possibilidade e, às vezes, uma necessidade (DUDEQUE, 2001, p. 70). Para o autor, esta
atitude de auto-afirmação do Paranismo sobreviveu mesmo com os profissionais da
arquitetura, em sua maioria desconhecendo o termo Paranismo, o termo paranismo
permaneceria como uma referência quase mitológica de pessoas que tentaram criar
128

obras ligadas ao Paraná, que expressassem a posição do artista no Brasil e no mundo


a partir de sua localização geográfica (DUDEQUE, 2001, p. 70).

Imagens 73 e 74 - Peças da mobília do Champagnat Shopping, adornadas com pinhões estilizados. À


esquerda, banco com detalhes de pinhões dourados, à direita, cadeira com pinhão dourado do café.
Foto: Luciana Barone.

Outra construção com referenciais ao Paranismo que merece destaque neste


trabalho é o “Memorial Cidade de Curitiba”. Construído em comemoração aos trezentos
anos da cidade e situado na Rua Claudino dos Santos no Setor Histórico, o projeto do
arquiteto Fernando Popp é considerado um dos mais modernos centros culturais da
América Latina, tornando-se ainda mais charmoso em contraste com as antigas
construções do Setor Histórico, idealizado em 1993 e inaugurado em 1996.
A armação principal da construção é formada a partir de um grande pinheiro
central (imagem 75), diferentemente das idéias de Turin, porém ainda com a presença
do pinheiro, o arquiteto deu uma solução inovadora onde os braços do pinheiro
sustentam a estrutura principal e seu tronco é a parte central da escada. Para Dudeque,
soluções como esta estariam propondo uma arquitetura com vestígios dos símbolos
paranaenses, mas que superariam os dilemas apresentados na década de 20 e
alcançariam uma mimese do pinheiro, que resolvia, de maneiras originais, e até
inesperadas, a equação que envolvia o entorno físico-cultural de Curitiba com avanços
técnicos da arquitetura (DUDEQUE, 2001, p. 71). O memorial foi erguido com 5 mil
metros quadrados de área construída com vigas metálicas e laterais de vidros
transparentes, possui quatro pavimentos e um terraço panorâmico com vista para o
entorno.
129

Imagem 75 - Memorial Cidade de Curitiba. Escadaria em forma de Pinheiro.


Imagem disponível em: www.skyscrapercity. com/showthread.php?t=421484, acesso 04 de Maio, 2009.

O edifício conserva os acervos históricos e é um espaço cultural para abrigar os


elementos fundamentais da cultura, bem como da vida dos paranaenses.
Possui teatro, salas de exposição com climatização museológica, cinema, área de
reserva técnica e uma praça coberta com um chão de paralelepípedos que é cortado por
rio de pinhões (imagem 76). O córrego, criado pelo escultor Elvo Benito Damo
juntamente com Priscila Azambuja e Maria Helena Saparolli, possui o leito revestido de
pinhas e pinhões esculpidos em cerâmica.
130

Imagem 76 - Memorial Cidade de Curitiba. Rio de Pinhões.


Imagem disponível em: www.skyscrapercity. com/showthread.php?t=421484, acesso 04/05/2009 às
16h32.

O Memorial abriga peças históricas e o acervo é integrado por dois altares da


primeira Matriz de Curitiba e duas imagens de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais de
Curitiba, em exposição permanente no Salão Paranaguá. Esculturas como: uma cabeça
do pensador “Voltaire”, de Zaco Paraná; “Leonardo da Vinci”, esculpido por Poty
Lazzarotto; “Quatro Estações”, de João Turin; “A Tocadora de Guitarra”, do escultor
Victor Brecheret, Ricardo Tod e obras de outros artistas podem ser apreciadas na Praça
do Iguaçu7.
No segundo andar, sobre os altares, um teto em afresco pintado por Sérgio Ferro
evoca os 300 Anos de Curitiba em um grande painel, no centro a imagem de Nossa
Senhora da Luz dos Pinhais, no alto uma Gralha Azul representando o Espírito Santo.
Sérgio Ferro tem ainda outro painel no Memorial, um Painel Monumental
comemorativo aos 500 Anos do Brasil. No local destinado às apresentações musicais,
7
Disponível em: www.curitiba-parana.net/memorial.htm. Acesso: 25 de Mai. 2009.
131

há um mapa histórico-geográfico, em azulejos, realizado por Poty Lazarotto, e um


painel de Antonio Maria representando gralhas-azuis.
É também no Memorial que está guardado um objeto paranista no mínimo
curioso. Uma arca, a “Arca dos 300 Anos”, ou melhor, um grande pinhão em bronze
(imagem 77) que está “plantado” como pedra fundamental no Memorial. A Arca foi
enterrada numa câmara de 2,5 de profundidade, embaixo de uma pedra em granito
circular, esta pedra, com 45 centímetros de altura, 1,40 metros de diâmetro e pesando
quatro toneladas, apresenta em sua parte superior um entalhe onde uma rosácea em
bronze foi encaixada. Esta urna paranista guarda em seu interior vários documentos e
escritos referentes à Curitiba desde seus primeiros habitantes até o ano de 1993, contém
também desenhos de importantes prédios da cidade. Este “pinhão da memória” foi
enterrado pelo prefeito Rafael Greca e deverá ser aberto somente no ano de 2043, 50
anos depois (GAZETA DO POVO, 1993).

Imagem 77- Urna Paranista. Arca dos 300 Anos. Fonte: Gazeta do Povo. Suplemento Viver Bem.
Curitiba, 27 de junho de 1993. Imagens adaptadas pela autora.
132

3.3.2 João Turin presente nos Acessórios e na Moda

No período das comemorações do tricentenário de Curitiba, o jornal “Gazeta do


Povo” apresentou a seus leitores uma coleção de bijuterias criadas pela designer Suelli
Zavvadinack. Utilizando como matéria-prima o pinheiro, a pinha e o pinhão, tal como
Turin, a desenhista expõe uma variação de objetos utilitários e decorativos que
impressionam e agradam a vários estilos. São adereços como pulseiras, colares,
braceletes, brincos, todos com elementos nativos, compondo harmoniosamente com
requinte e ao mesmo tempo propondo certa ousadia. Nas imagens 78, 79 e 80 temos três
colares, sendo o primeiro um fio simples adornado com um pequeno pingente em forma
de pinhão. O segundo, um pouco mais ousado, todo em dourado, com uma correte
grossa e uma grande pinha também dourada, contendo no centro três pedras. O terceiro,
uma corrente dourada onde vários pinhões são pendurados e intercalados com os
adornos da corrente.

Imagens 78, 79 e 80 - Bijuterias criadas pela designer Suelli Zavvadinack.


Fonte: Gazeta do Povo. Suplemento Viver Bem. Curitiba, 27 de junho de 1993.
Imagens adaptadas pela autora.

Este trabalho apresentado pela designer Suelli Zavvadinack deixa explícito que
as idéias de Turin em relação à moda e adornos com elementos simbólicos no Paraná
não ficaram guardados na gaveta da década de 20. As propostas de Turin aparecem
também na moda, mesmo que demorando certo tempo, vieram fazer parte da vida
comum dos paranaenses, ou pelo menos dos curitibanos. As peças da desenhista foram à
venda em algumas lojas da cidade, podendo então ser acessadas por todos.
133

Ao observarmos as imagens 81, 82 e 83 temos na primeira um brinco simples e


dourado em forma de pinhão, na segunda outro brinco em forma de pinha contendo no
centro uma pedra, e na terceira uma grande corrente dourada em forma de pulseira se
apresenta com uma série de pinhões também dourados pendurados.

Imagens 81, 82 e 83- Bijuterias criadas pela designer Suelli Zavvadinack.


Fonte: Gazeta do Povo. Suplemento Viver Bem. Curitiba, 27 de junho de 1993.
Imagens adaptadas pela autora.

No site8 da Universidade Tuiuti do Paraná João Turin é apontado como o


primeiro designer da moda paranaense, pelo fato de utilizar elementos típicos do Paraná
em suas criações da moda e acessórios, além destes elementos já estarem presentes em
suas esculturas e decorações já conhecidas. Inspirados nas idéias de João Turin, sobre a
moda e acessórios paranaenses, foi criado o “Prêmio João Turin” como um incentivo
aos novos designers de moda no Paraná. A primeira edição aconteceu em março de
2003, e teve como tema “João Turin e o Movimento Paranista”, na segunda edição o
tema foi “A Moda Entra no Ritmo do Fandango”, a terceira edição propôs a temática
“As Modas da Moda Paranaense”, na quarta edição foi proposto o tema “Tropeiros na
Rota da Moda”, na quinta “A Moda é a Nossa Bandeira” e a sexta edição, de 2009,
trouxe a temática “Passaporte para a Moda”, inspirado nas Cataratas do Iguaçu9.
O “Prêmio João Turin” trata-se de um concurso que oferece oportunidades
para estudantes de cursos na área de confecção, propondo a estimulação de novos

8
No www.videolog.uol.com.br é possível encontrar vídeos com desfiles do “Prêmio João Turin”, onde na
abertura há uma decoração com uma rosácea inspirada nas estilizações de Lange de Morretes.
9
Disponível em: www.utp.br/noticias. Acesso: 25 de Mai. 2009.
134

talentos e principalmente o desenvolvimento e criação da moda inspirada no Paraná.


Nas imagens 84 e 85 podemos observar o troféu de 2005, uma escultura do artista
plástico Valdir Francisco onde um corpo feminino estilizado é adornado com um
chapéu decorado com pinhões. A base do troféu, uma placa espelhada, traz também um
pinhão estilizado juntamente com a descrição do prêmio.

Imagens 84 e 85 - Troféu “Prêmio João Turin” de incentivo a novos designers. Valdir Francisco.
Casa João Turin – Foto: Luciana Barone

3.4 Os artistas, as exposições e a simbologia paranista após a década de 80.

Nas décadas de 50, 60 e 70 foram poucas as iniciativas em relação ao


Paranismo. Durante a pesquisa deste trabalho não foram encontrados, neste período,
registros de exposições coletivas ou individuais que pudesse caracterizar
exclusivamente trabalhos dentro da simbologia paranista, exceto alguns artistas que
continuaram a pintar pinheiros, porém dentro de uma temática de paisagem paranaense,
não como símbolo máximo do Estado, ou em referência ao Paranismo. Neste período
também alguns intelectuais e artistas procuraram desenvolver no Paraná trabalhos que
escapassem da temática regional, preferindo se inspirar nas idéias que estavam se
desenvolvendo em outras regiões, e ainda produções que revelavam as ansiedades
provocadas pela perturbação da Segunda Guerra. Os artistas paranaenses neste período
foram estimulados a partir dos dramas do conflito mundial e se introduziram em
135

produções pictóricas conduzidas pela linha expressionista. A artista plástica Violeta


Franco, líder grupo “Garaginha”, foi taxativa em afirmar: Afinal, não quero ser, como
tantos pintores já foram, mais um gigolô de nossos pinheiros (VIOLETA, 1991)10.
No entanto, no Paraná, a partir dos anos 80 houve um resgate do Paranismo por
parte de algumas faculdades, Museus e conseqüentemente engajamento de alguns
artistas. Para alguns críticos, bem como para alguns artistas, este retrocesso à temática
regional significaria uma dependência por parte dos artistas paranaenses em representar
a simbologia do Estado e uma dificuldade em arriscar em novidades. Para outros,
retornar ao passado com uma temática paranista nas obras de arte seria uma busca de
raízes com características atuais. As obras produzidas a partir deste “Resgate Paranista”
visualmente não remeteram às obras da década de 20, senão pela temática.
Adalice Araújo, no jornal “Indústria e Comércio” em 12 de agosto de 1987,
comenta que a tendência pós-moderna gerou nos jovens artistas curitibanos uma
propensa preocupação em recuperar o Paranismo, que até recentemente se encontrava
um tanto quanto adormecido. Atento às novas tendências, o Núcleo de Semiótica do
Museu de Arte contemporânea do Paraná dedicou o mês de agosto de 1987 a este
Movimento. Na Sala de Exposições do Teatro Guaíra, de 14 a 30 de agosto, aconteceu a
exposição “Resgate Icongráfico / Paranismo” (imagem 86), onde foram apresentados os
resultados da pesquisa de Carmen Carini,
realizada no decorrer do curso de
especialização em “Metodologia do Ensino
Superior de Educação Artística”, proposta
pela professora Ana Mae Barbosa junto à
Faculdade de Educação Musical do Paraná.

Imagem 86 - Cartaz de divulgação da Exposição


“Resgate Icongráfico/Paranismo”. Acervo: Mac.
Foto: Luciana Barone.

10
Depoimento gravado para o projeto Memória História do Paraná - Texto de Aramis Millarch (publicado
originalmente no Tablóide – Almanaque do Jornal “Estado do Paraná” em 02/04/1991 p. 20). Disponível
em: http://www.millarch.org/artigo/artes-amores-de-violeta-rebelde. Acesso: 17 de Nov. 2008.
136

Para a realização do evento, a professora enfatizou a necessidade de que toda


atividade de expressão artística deveria ser acompanhada de um suporte teórico, seja ele
histórico, filosófico ou estético. A exposição que envolveu caleidoscópios, instalações,
performance e música foi promovida pela Secretaria de Estado da Cultura através do
Museu de Arte Contemporânea do Paraná. Na imagem 87 identificamos os rótulos de
caixas de fósforos com a estilização do pinheiro. Esta imagem compôs a parte interna
do catálogo de divulgação do evento, mostrando, portanto, que os artistas envolvidos
não deixaram de lado a inspiração no pinheiro, no entanto procuram novos recursos
visuais ajustados à época. A exposição contou
com a participação dos artistas: Adolfo Rocha da
Cruz, Carmen Carini, Dirceu Wolff Júnior, Dulce
R. M. dos Mártires, Ivo Vaz de Oliveira, João
José de Félix Pereira, Tônia Maria Dozza
Messagi, Lirdi M. Jorge, Marlene Maia Britez,
Marília de O. Dias, Maria José Braga, Mirian F.
Poeter.

Imagem 87 – Foto interna do catálogo de


divulgação da Exposição “Resgate
Icongráfico/Paranismo”.
Acervo: Mac. Foto: Luciana Barone.

No mesmo artigo no jornal “Indústria e


Comércio” Adalice Araújo chama a atenção
para outra exposição que aconteceu na Sala
Miguel Bakun anexa à Biblioteca Pública do
Paraná, trata-se da mostra do artista plástico
Wilmar Nascimento denominada “Instalação
Neo-Paranista” (imagem 88), uma
homenagem a João Turin, João Ghelfi, Lange
de Morretes, Oswald Lopes e Romário
Martins.

Imagem 88 - Cartaz de divulgação da Exposição “Instalação Neo-Paranista”.


Acervo: Mac. Foto: Luciana Barone.
137

A autora afirma que profundamente ligado às raízes locais, com esta proposta
Wilmar comprova a contemporaneidade da temática voltada à ecologia, ao misticismo
e ao resgate da memória local (INDÚSTRIA E COMÉRCIO, 1987).
O Curitibano Wilmar Nascimento desenvolveu um trabalho a partir de pesquisas
com materiais reciclados e nativos coletados de Curitiba ao litoral de 1976 a 1981,
quando entrou em contato com a pesquisa sobre o Movimento Paranista realizada pelo
Museu de Arte Contemporânea, constatou que sua obra estava relacionada com o
mesmo, motivo pelo qual o levou a organizar a mostra sem ufanismo exacerbante, mas
com a visão de quem, voltando ao passado, encontra semente germinando futuro fruto
maduro, declarou o artista no catálogo da exposição.
Marisa Bertolli, a propósito da instalação de Wilmar, declarou que se lembrou
de Umberto Eco: uma obra aberta enfrenta plenamente a tarefa de oferecer uma
imagem da descontinuidade: não a descreve, ela própria é a descontinuidade11 (MAC,
1987). A autora prossegue dizendo que a exposição iria decepcionar aos que esperavam
encontrar estilizações precisas do repertório paranista, como podiam ser observadas nas
calçadas, tampouco encontrariam relevos alegóricos, a paisagem era ausente.
Infelizmente não consta nos arquivos do Museu de Arte Contemporânea imagens que
pudessem apresentar um pouco do conteúdo desta exposição visualmente, apenas o
cartaz está disponível, assim como da exposição “Resgate Icongráfico/Paranismo”.
Uma das artistas que expôs suas obras na mostra “Resgate
Icongráfico/Paranismo”, como podemos constatar na lista de participantes, merece um
destaque neste trabalho, pois a gaúcha Lirdi Jorge, atualmente professora da Faculdade
de Artes do Paraná (FAP), desde os anos 80 desenvolveu sua carreira como escultora,
tendo o Paranismo como seu principal tema. A artista compôs muitas obras esculpindo
sementes de milho e café, e principalmente com pinhões. Em uma entrevista para a
“Folha do Paraná” em 1999 declarou que ainda trabalho muito as composições, em
especial, com pinhões estilizados em vários tamanhos que resulta num trabalho leve e
gostoso (CARNEIRO. In: Folha do Paraná, 1999)12.
Nas imagens 89, 90 e 91 temos uma escultura de grãos de café que faz parte da
série “Cafés”, são grãos de cafés esculpidos em cerâmica organizados de maneira que
matêm um equilíbrio e uma harmonia estável. As duas imagens seguintes são partes da

11
Texto da exposição “Neo-Paranista”. Arquivo Mac- 1987.
12
Elisa Marília Carneiro, Folha do Paraná, 19 de fevereiro de 1999.
138

série “Paraná-Pinheiros-Pinhões”, são pinhões esculpidos em cerâmica organizados com


as pontas para baixo, onde as mesmas não aparecem, pois servem de base para
estruturar e dar estabilidade à obra.

Imagem 89 - Cafés - Imagem 90 - Série: Paraná-Pinheiros-Pinhões (1982) Dimensão: 40x26x30 -


Imagem 91 - Série: Paraná-Pinheiros-Pinhões (1982). Dimensão: 40x26x28. Lirdi Jorge.
Esculturas em Cerâmica - Fonte: Arquivo Mac.

Nas imagens 92 e 93 temos novamente esculturas de pinhões esculpidos em


cerâmica organizados também com as pontas para baixo, porém estas peças fazem parte
da série “Gralha-azul”. A primeira, intitulada “A Gralha Azul Escondida...”, sugere que
os pinhões que ali estão foram enterrados pela ave, a segunda, com o título “Vamos
ajudar a gralha”, tem a conotação de reflorestamento, pois ao enterrar o pinhão, segundo
a crença popular, a ave torna-se responsável pelo plantio da árvore símbolo do Paraná.

Imagem 92 - A Gralha Azul Escondida... (1982). Dimensões 38x24x18; Imagem 93 - Vamos ajudar a
gralha - Lirdi Jorge - Esculturas em Cerâmica. Fonte: Arquivo Mac.
139

3.4.1 Sérgio Monteiro de Almeida - um paranista dos anos 90

O curitibano Sérgio Monteiro de Almeida nasceu em 1964 e trabalha com uma


versatilidade artística entre arte postal, escultura, gravura, instalações e desenho, sendo
internacionalmente reconhecido como artista plástico e poeta visual. Participou de
vários salões de mostras coletivas e individuais, suas produções ligadas à arte conceitual
permitem ao público refletir sobre, e algumas vezes, participar da obra. Segundo
Adalice Araújo, ele é considerado um dos principais representantes da poesia visual
contemporânea no Brasil (ARAÚJO, 1994. In: ALMEIDA, 2007). Porém é a sua
produção sobre o projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de Curitiba" que
nos faz abordar sua obra neste trabalho, pois esta produção está intimamente
relacionada aos símbolos paranistas nos quais queremos identificar. Sérgio Monteiro
nos apresenta um projeto de arte conceitual constituído por quatro fases, sendo elas:
“Instalação”; “Álbum de gravuras”; “Intervenção urbana: Registro da Memória”; “Papel
impresso com pedras da rua XV: Difusão da Memória”.
A “Instalação” é formada por 300 garrafas descartáveis de 250 ml (one way),
com ausência de rótulo, onde, no interior das mesmas, foram introduzidas gravuras
reproduzidas em Xerox. A gravura representa um corte transversal de uma pinha, cujo
desenho é o mesmo encontrado nas calçadas nos petit-pavés e nos pinhões inspirados na
fórmula de Lange de Morretes.
Na imagem 94 podemos identificar inicialmente o estudo da garrafa, bem como
sua metragem. Na seqüência, uma foto da garrafa propriamente dita, com a reprodução
da pinha em seu interior. Finalmente, a imagem da calçada onde a obra foi inspirada.
Este desenho não foi exposto junto à obra, mas o mesmo, além de ser um registro do
artista, pode nos proporcionar uma perfeita compreensão do projeto conceitual.
Na instalação as garrafas são dispostas de forma retangular no assoalho da sala,
20 filas de 15 garrafas, com um espaço de 5 cm entre elas. Na imagem 95 temos uma
foto da instalação em vista aérea. Notamos que as garrafas são fechadas e, segundo o
autor13, com rolha de papel e lacradas com parafina. Cada garrafa recebe uma etiqueta
numerada, assinada e carimbada. O carimbo circular possui a inscrição "Curitiba-300
anos".

13
Transcrição do depoimento de Sérgio Monteiro de Almeida à autora Luciana Barone, em 08 de maio de
2009. Via Online.
140

Imagem 94 - Sérgio Monteiro de Almeida. Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de
Curitiba". Estudo para Instalação. Fonte: ALMEIDA, 2009.

Imagem 95 - Sérgio Monteiro de Almeida. Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de
Curitiba" - Instalação - Material: vidro, papel, parafina, carimbo. Dimensões: 3 m² Ano: 1993.
Fonte: ALMEIDA, 2009.
141

Esta obra foi realizada a partir de um convite para participação da exposição


coletiva “Gravadores Paranaenses - 300 Anos de Curitiba”, no Solar do Barão em
Curitiba no ano de 1993, em comemoração ao aniversário de 300 anos da cidade. A
instalação foi realizada com gravuras experimentais pelo fato de a exposição ser de
gravadores paranaenses. Sérgio Monteiro de Almeida declara que:

A idéia surgiu pelo fato de que as pessoas transitam pelo centro de


Curitiba, onde estão os cortes das pinhas e não sabem que aquelas
rosetas são cortes transversais de pinhas estilizadas, que foram
resultado do Movimento Paranista e que foram projetadas por Lange
de Morretes (ALMEIDA, 2009).

Almeida nos alerta sobre o fato das pessoas caminharem nos petit-pavés e não
saberem sobre suas raízes históricas. Através de sua obra, pôde proporcionar à
população uma alternativa de conhecimento, de aprendizagem, além de apreciação
visual. Por este motivo o projeto levou o título de “Resgate”. O fato das gravuras
estarem em recipientes de vidro fechados, se mantêm, portanto, “Preservadas”, e a partir
do momento em que as pessoas passam e terem consciência do significado das rosetas,
“há a preservação da memória”. Cada ano da história de Curitiba foi resgatado e
preservado na representação de cada garrafa. Na imagem 96 temos uma vista lateral e
colorida da instalação. Nesta podemos ter uma idéia mais esclarecida de como as
garrafas foram organizadas, bem como sua relação com o piso, rodapé e a porta ao
fundo, estes elementos num conjunto harmonioso ressaltam a qualidade do trabalho.
Esta instalação participou posteriormente do “50° Salão Paranaense” em 1993.
O artista revela que a crítica de arte Adalice Araújo comentou em matéria sobre o salão
na Gazeta do Povo que de forma conceitual Lange de Morretes estava presente no 50°
Salão Paranaense (ALMEIDA, 2009).
A obra poderá ser exposta em outros momentos, porém em cada vez que isto
acontecer ela deverá ser atualizada. O número de garrafas carecerá sempre ser
respectivo à idade de Curitiba, as gravuras que compõem o interior das mesmas serão
impressas em papel vermelho, da mesma forma que as etiquetas receberão um carimbo
de "Memória - Atualizada".
142

Imagem 96 - Sérgio Monteiro de Almeida. Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de
Curitiba" - Instalação - Material: vidro, papel, parafina, carimbo. Dimensões: 3 m² Ano: 1993.
Fonte: ALMEIDA, 2009.

A segunda fase do projeto de arte conceitual trata-se do “Álbum de gravuras”.


Lançado na Casa da Gravura da Fundação Cultural de Curitiba em 1993, o trabalho
apresentado por Sérgio Almeida resume-se em gravuras de pedras de Curitiba. No total
de quatro, as gravuras são depositadas em garrafas de vidro descartáveis e embaladas
numa caixa. Cada gravura representa um Marco Zero de Curitiba presente em lugares
distintos da cidade, sendo eles: A Praça Tiradentes; as pedras colocadas
concentricamente ao redor do bebedouro no Largo da Ordem; as calçadas da década de
70, com Pinhões na Rua Augusto Stelfeld; e uma foto da própria instalação do Projeto
"Resgate & Preservação da Memória: Pedras de Curitiba" (imagem 97).
A terceira fase do projeto de arte conceitual é uma Intervenção urbana/
performance. Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de Curitiba" -
Registro das Pedras de Curitiba. Em 1994 Sérgio Almeida faz registros das pedras da
Rua XV, utilizando para isso giz de cera preto (flotage) em um papel de 100m de
comprimento. O trabalho foi realizado pelo artista, como também pela população que
caminhava pelo calçadão e era convidada a participar. Na imagem 98 podemos perceber
a participação dos transeuntes que, ao mesmo tempo, dividem espaço com os petit-
pavés do corte transversal da pinha, inspirados nos projetos de Lange de Morretes.
143

Imagem 97 - Sérgio Monteiro de Almeida - Álbum de gravuras. Projeto "Resgate & Preservação da
Memória: Pedras de Curitiba" - Fonte: ALMEIDA, 2009.

Imagem 98 - Sérgio Monteiro de Almeida - Intervenção urbana / performance. Projeto "Resgate &
Preservação da Memória: Pedras de Curitiba" - Local: Rua XV de Novembro, Curitiba, PR (1994).
Fonte: ALMEIDA, 2009.
144

A quarta fase do projeto de arte conceitual ainda não foi realizada, porém o
artista nos fez um relato do que pretende. Será efetivado com o papel impresso do
padrão das pedras da Rua XV de Novembro (imagem 99) e terá o título de Projeto
"Resgate & Preservação da Memória: Pedras de Curitiba-Difusão da Memória”. A idéia
é reproduzir por flexografia do padrão obtido com o decalque das pedras da Rua XV de
Novembro, em bobinas de papel reciclado. Este papel será vendido em metros. A
intenção é as pessoas possam comprar e levar para casa metros da Rua XV, assim,
segundo o artista, os compradores estarão preservando e difundindo a memória da
cidade. Todas as fases do projeto nunca foram expostas juntas, exceto no livro de Sérgio
Monteiro de Almeida.

Imagem 99 - Sérgio Monteiro de Almeida. Papel impresso com pedras da rua XV: Difusão da Memória.
Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de Curitiba".
Fonte: ALMEIDA, 2009.

O jornal “Gazeta do Povo” em 1993 definiu o artista plástico Sérgio Monteiro de


Almeida como sendo um paranista dos anos noventa. Em entrevista com o artista, o
mesmo relatou que para ele o ponto alto do movimento é a roseta de Lange de Morretes
que representam cortes transversais de pinhas estilizadas reproduzidas e presentes até
hoje nas ruas do centro de Curitiba. Almeida afirma que trata-se de uma simplificação
145

eficaz, o desenho é moderno e identificável ao art decô, graficamente muito bem


resolvido. O fato de essas rosetas estarem presentes em todo o centro da cidade mostra
o impacto que o movimento teve na época na pequena Curitiba. O artista segue dizendo
que o Movimento Paranista deveria ser estudado distante de uma postura iconoclasta,
com mais detalhes, em especial nos aspectos ligados às artes aplicadas. Em relação a ser
considerado paranista dos anos 90, o artista nos relata: nasci em Curitiba desde criança
o efeito gráfico das Rosetas Paranistas nas calçadas de Curitiba me impressionam, por
isso desenvolvi este projeto, e declara que seu trabalho é desenvolvido a partir de
experiências vividas, que procura sempre explorar temas comuns ao ser humano. Neste
projeto, ao se apropriar da Roseta Paranista, tenta propor novos questionamentos, como
a preservação da memória a partir de um olhar contemporâneo “livre de pré-
julgamentos” e sempre permitindo novas e ricas leituras. Sergio Monteiro de Almeida
diz que é uma característica do seu trabalho a recriação e apropriação dos próprios
símbolos, onde, de certa forma, procura esgotar um tema. Atualmente está
desenvolvendo uma ação artística que pode, segundo ele, ser considerada dentro de um
conceito paranista ampliado, tendo como título “Recenseamento das Araucárias das
Praças de Curitiba”.

3.4.2 Napoleon Potyguara Lazzarotto e os painéis com símbolos paranistas

O artista plástico Napoleon Potyguara Lazzarotto nasceu em Curitiba em 29 de


março de 1924, e veio a falecer na mesma cidade em 1998. Reconhecido por suas
gravuras, desenhos, ilustrações e murais, foi um artista que se destacou
consideravelmente dentro do panorama visual das artes plásticas no Paraná, bem como
no Brasil e no exterior. Segundo Buchmann, Poty alcançou o que nenhum outro artista
nascido no Paraná conseguiu: viver de sua arte, ser conhecido e respeitado
nacionalmente. Podemos supor que, em meio a tantas dificuldades, ter chegado onde
Lazzarotto chegou é possível apenas com um toque de fada (BUCHMANN, 2007 p.
13).
Poty Lazzarotto sempre esteve engajado nos assuntos referentes à arte, marcou
presença na “Revista Joaquim” (1946) juntamente com Dalton Trevisan, o desenho
padrão da capa foi feito por Poty. Durante a circulação da “Joaquim” várias ilustrações
146

de Poty puderam ser apreciadas, este artista também fez parte das reuniões do “Grupo
Garaginha” (1950-51). Neste período os artistas plásticos como os “joaquins” viviam –
do ponto de vista filosófico – as angústias provocadas pela perplexidade da Segunda
Guerra. Tal evento acabou colocando a comunidade artística paranaense sujeita aos
embates políticos internacionais. Além do mergulho sobre o choque de uma guerra, os
artistas paranaenses, dentre eles Poty, foram tocados pictoricamente sobre os dramas do
conflito mundial e se inseriram em representações pictóricas regidas pela linha
expressionista. O Expressionismo marcou o futuro da arte paranaense, principalmente
naquele período de pós-guerra, pois esta linha estética capturava as expressões humanas
sob os aspectos das emoções, da dor e da miséria humana. A arte paranaense pós-guerra
ainda carregou as mazelas psicológicas do conflito e acabou sendo regida por um
“humanismo social”. Essa expressão batizou a temática moderna dos artistas do Paraná
que se inaugurou com o grupo “Garaginha”, comentado anteriormente. Podemos
identificar, portanto, na obra de Poty, a linha expressionista que foi estimulada também
por sua ligação com este grupo.
Porém a produção artística de Poty que mais faz sentido neste trabalho não é
referente ao Poty dos anos 1940 e 50, expressionista convicto e militante modernista e
sim, o Poty dos anos 1990, estrela badalada e cooptada pela ideologia do Neo-
paranismo da era Lerner–Greca14. Poty atingiu um grande respeito com suas
ilustrações em livros de escritores consagrados marcando presença com seu traço
singular e características próprias, haja visto que foram várias suas passagens pelos
Salões de Arte e com consideráveis premiações. Seus painéis estão firmados em várias
capitais e demais cidades. Em Curitiba existem 60 painéis de Poty, em grande
dimensão, espalhados pelas ruas, praças, fachadas, muros e portais de edifícios
(BUCHMANN, 2007 p. 57).
Seu primeiro mural no Estado do Paraná foi o mural no Hotel Aeroporto, de
propriedade de Ingeborg Rusti, em 1953, como homenagem à emancipação do Paraná.
No mesmo ano executou seu primeiro mural em azulejos “Monumento ao Primeiro
Centenário do Paraná”, na Praça 19 de Dezembro em Curitiba. Neste painel (imagem
100) Poty faz uma representação da evolução política do Estado do Paraná, para isso o
artista faz uma descrição dos ciclos históricos e econômicos mais importantes do

14
Frases escritas a partir de anotações feitas pelo Professor Artur Freitas em banca de qualificação no dia
08 de dezembro de 2008.
147

Estado: a descoberta do ouro, a evangelização, o desmatamento das florestas pelos


bandeirantes, as cidades sendo povoadas, o comércio dos tropeiros, as embarcações dos
índios descendo o rio. No canto direito podemos identificar a recepção a Zacarias Goes
de Wasconcellos, nomeado então primeiro presidente da nova província, por duas
pessoas, um homem e uma mulher. Em segundo plano temos a presença do pinheiro e
uma figura feminina abaixo da árvore, com uma ferramenta nas mãos, sugerindo cortar
o capim junto à araucária. Outra mulher é identificada um pouco mais à esquerda, quase
na mesma posição da anterior, que abaixada sugere colher algo do chão, possivelmente
colhendo pinhões. No fundo aparece a cidade de Curitiba. Podemos imaginar que o
pinheiro aqui está representando a terra fértil, pois é colocado logo à frente da cidade,
da mesma maneira duas pessoas trabalhando ao seu entorno, sendo uma a preparar a
terra e a outra a colher o fruto. Não há, aparentemente, uma exaltação ao símbolo, ele
está presente na obra na mesma proporção de outros elementos, como o tropeiro, o
índio, os bandeirantes. O painel se apresenta numa monocromia em azul.

Imagem 100 - Napoleon Potyguara Lazzarotto Monumento ao Primeiro Centenário do Paraná, na


Praça 19 de Dezembro em Curitiba.
http://www.ceramicanorio.com/paineis/potypraça19dezembro/potypraça19dezembro.html. Acesso 27de
Mai. 2009. Imagem adaptada pela autora.

Em 1987, na obra “O Paraná” (imagem 101) na fachada do Palácio Iguaçu, em


Curitiba, sede do governo do Estado, temos um painel que possui 17 metros de extensão
por 6 metros de altura, e sua matéria é o concreto (BUCHMANN, 2007 p. 191).
148

Nesta obra, executada anos depois do painel da Praça 19 de dezembro, é visível


a exaltação dos símbolos paranaenses, o índio, o tropeiro, os imigrantes, as araucárias e
os semeadores, o homem e as gralhas. O homem é apresentado como um semeador do
futuro, ligado ao progresso do Estado (BUCHMANN, 2008, p. 252), e com ele,
semeando também o futuro, uma revoada de gralhas-azuis.
Podemos perceber aqui uma ligação muito importante entre a alegoria de Poty
aos pensamentos paranistas. Os paranistas “instituíram” o paranaense ideal, aquele que
semeia o futuro, assim como “O Semeador” de Zaco Paraná, na obra de Poty, ele está
novamente representando alguém que trabalha em prol do futuro, neste caso por meio
da colheita, para completar o paranista de Poty ainda pode contar com a ajuda da gralha,
que também semeia o futuro plantando seus pinhões. Segundo Buchmann, os símbolos
paranistas, após o Paranismo, passam a ser representados no Estado como emblemas
identitários e de cunho político (BUCHMANN, 2008, p. 248).

Imagem 101 - Poty Lazzarotto. O Paraná (1987). Dimensões: 6 x 17 metros


Disponível em http://www. flickr.com /photos/koyothe/2162601743/ Acesso 28 de Mai. 2009.

Nos anos 90, Poty pôde apresentar sua obra nos mais variados pontos da cidade
de Curitiba, nas quais os símbolos paranistas estão presentes. Luciano Buchmann afirma
que um dos motivos que levaram Poty a se tornar um ícone para Curitiba e também para
o Estado é o fato da coincidência de datas, do aniversário do artista com o aniversário
da cidade de Curitiba. Este dado poderia ser absolutamente irrelevante não fosse o
149

argumento da Prefeitura para firmar o laço imaginário entre o artista e a cidade nas
comemorações dos 300 anos da capital (BUCHMANN, 2007, p. 58). Várias
encomendas de trabalhos de Poty para a cidade tiveram o argumento comemorativo da
narrativa cultural, política e econômica do Paraná e de Curitiba. Buchmann afirma que
no texto de abertura do catálogo da exposição de Poty, o então prefeito de Curitiba
escreveu: Quando Poty nasceu, em 29 de março de 1924, já deu uma pista de seu
destino. Era o dia do aniversário da cidade, que ele nunca mais cansaria de retratar.
Nesta exposição sobressai um dos aspectos mais importantes de sua obra: a celebração
de Curitiba (CURITIBA, PMC, 1994. Apud BUCHMANN, 2007, p. 58).
Dentre tantos trabalhos remetendo aos símbolos paranistas, nos chamam atenção
duas partes de um dos painéis do centro de Curitiba, no Largo da Ordem. Estas obras,
todas coloridas sobre azulejos brancos, apresentam o pinheiro como personagem
principal, na primeira (imagem 102) um grande pinheiro é escalado por um homem, e
ao fundo a mesma cena se repete. O pinheiro está carregado de folhas e gralhas-azuis,
ao lado direito uma casa amarela, típica das casas da Curitiba da década de 20, de
madeira, com lambrequins nas bordas do telhado. Segundo Dudeque, os lambrequins
em Curitiba foram impostos a partir do Código de Posturas de 1919, onde, no parágrafo
7º do artigo 61, sejam as abas dos telhados, exceto as do fundo, guarnecidas de
lambrequins (DUDEQUE, 2001, p. 250). Os lambrequins eram justificados como
pingadeiras, já que as calhas não estavam à disposição, porém Dudeque afirma que o
verdadeiro motivo era o modismo, vigente por alguns anos. Podemos dizer que Poty faz
um resgate da década de 20 e 30, recordado a arquitetura e os símbolos forjados no
período.
O painel apresenta à direita operários trabalhando, onde, ao escavacarem a terra,
uma pequena árvore é preservada. Ao fundo, a cidade como que representada pelo
centro histórico. Ao lado esquerdo outro pinheiro, cuja continuação está na outra
imagem (imagem 103). Bem como a anterior, o homem plantando sementes a germinar,
o menino trazendo em seu carrinho uma muda de árvore, neste ínterim a gralha-azul
também fazendo sua parte, à direita a ave traz um enorme pinhão em seu bico. Todo
painel é adornado com pinhões e pinheiros estilizados, esta obra é composta ainda de
uma terceira parte que não foi incluída nesta leitura.
150

Imagem 102 - Poty Lazzarotto - Curitiba e sua gente - Largo da Ordem – Centro - Curitiba-PR.
Painel Cerâmico situado na Rua Augusto Stelfeld, com 500 m·, inaugurado em maio de 1996.
Fotos: Renato Wandeck. Imagem adaptada pela autora.
Disponível em: http://www.ceramicanorio.com/paineis/potylargodaordem/potylargodaordem.html.
Acesso 27 de Mai.2009.

Imagem 103 - Poty Lazzarotto - Curitiba e sua gente - Largo da Ordem – Centro - Curitiba-PR.
Painel Cerâmico situado na Rua Augusto Stelfeld, com 500 m·, inaugurado em maio de 1996.
Fotos: Renato Wandeck. Imagem adaptada pela autora.
Disponível em: http://www.ceramicanorio.com/paineis/potylargodaordem/potylargodaordem.html.
Acesso 27 de Mai.2009.
151

Não podemos dizer que Poty Lazarotto possa ser considerado um paranista
convicto, pois os motivos que o levaram a reafirmar os símbolos do Movimento
Paranista não foram idealizações próprias, pelo menos até onde sabemos, mesmo que
tais elementos fossem para ele também significativos. Da mesma maneira que as
estilizações de Poty não são esteticamente comparáveis às estilizações de Lange. Cada
artista em sua respectiva época colaborou, independente dos motivos pessoais,
consideravelmente pelo reforço do Paranismo, ou pela imposição de seus símbolos.
Estes símbolos nos murais curitibanos acabam gerando certa indução de seus
significados. Os paranaenses ou curitibanos, em contato com o pinheiro, a pinha e a
gralha constantemente em sua rotina visual, tendem a adotar estes símbolos como seus,
mesmo que haja uma imprecisão entre o que é real ou foi imposto pelo recurso das artes
visuais.

3.4.3 Ida Hannemann de Campos - uma eterna paranista.

A gralha-azul, uma grande pinha em forma de flor, pinheiros estilizados ao


fundo e um grande pôr do sol, tudo isso num colorido harmonioso de amarelos, verdes,
marrons, azuis, resultando numa imagem muito agradável (imagem 105).
É assim a obra de Ida Hannemann. Nasceu em Curitiba em 16 de junho de 1922,
seu nascimento data o período de grande efervescência em busca da simbologia para o
Estado do Paraná e grandes mudanças em relação aos pensamentos artísticos em todo
país. Pintora das paisagens, dos personagens comuns, de naturezas mortas e
principalmente dos elementos paranistas, alegra-se ao ser denominada paranista,
declarando inclusive ser apaixonada pelo tema. Desde pequena, a gralha sempre esteve
presente na vida de Ida. Quando criança, com oito ou nove anos de idade, tinha uma
gralha presa em uma grande gaiola, me fascinava olhar a maneira como aquela ave se
esforçava em enterrar objetos na areia que continha na caixa da gaiola
(HANNEMANN, 2008) 15.

15
Transcrição do depoimento de Ida Hannemann de Campos à autora Luciana Barone, em 15 de setembro
de 2008.
152

Imagem 104 - Ida Hannemann de Campos - O Alimento


Cerâmica. Dimensões: 20 x 20 cm. 2005. Fonte: NORONHA, 2007, p.07.

Inúmeros desenhos feitos a grafite, lápis de cor e nanquim registram o


carinho com que a artista interpreta as lendas relatadas por Romário Martins em seu
livro “Paiquerê”, fazendo questão de exibir seu raro exemplar, da mesma maneira,
vários estudos sobre o pinheiro, a pinha e a gralha estão guardados em seu ateliê
(imagem 106). Nos anos 90 dois grandes murais de Ida de Campos foram realizados
com temas paranistas, o primeiro no hall da biblioteca central da PUC-PR, inaugurado
em 1994 e o segundo, o mural da Praça do Asilo São Vicente de Paula (imagem 107),
no Juvevê, inaugurado em 1996 (NORONHA, 2007, p. 21). Neste último identificamos
uma paisagem onde, do pinheiro, só vemos o tronco. A obra traz como personagem
principal a gralha-azul exercendo sua “possível” função de plantar o pinhão, juntamente
com uma série de rosáceas de pinhas em várias cores e tamanhos, elementos que às
vezes se confundem com o sol, e às vezes com flores, outras gralhas são encontradas
153

numa alusão como se estivessem plantando o fruto do pinheiro. Trata-se de uma


imagem policromática com tons acentuados em azuis e vermelhos claros.

Imagem 105 - Ida Hannemann de Campos - Pesquisa I.


Nanquim e ecoline sobre papel, 20 x 20 cm. Década de 90. Fonte: NORONHA, 2007, p.17.

Imagem 106 - Ida Hannemann de Campos - Mural da Praça do Asilo São Vicente de Paula, situado à
esquina da Rua Barão dos Campos Gerais com Rua Manoel Eufrásio – Juvevê - Curitiba-PR.
Foto: Renato Wandeck.
Disponível em: http://www.ceramicanorio.com/paineis/idahannemanncampos/idahann emann
campos.html. Acesso em 27 de Jun. 2009.

Ida Hannemann foi ainda responsável pelo poema que compõe a embalagem do
licor de Araucária, intitulado “O Pinheiro II”. Este produto, obtido a partir da acícula
(folha) da Araucária é apresentado como original do Paraná. A parte esférica da
licoreira representa uma pinha, muito próxima às pinhas esculpidas por Turin, a pinha é
154

o local onde se desenvolve a semente dessa árvore, o pinhão, cuja amostra em tamanho
natural decora o frasco. O Papa João Paulo II, na ocasião de sua visita, foi presenteado
com um exemplar da bebida.

Do Pinheiro, cai a pinha,


Esfacela-se pelo chão.
É o petisco das Gralhas,
Fruto da vida, é o pinhão..
.
Bico forte tem a Gralha,
Bica o fruto, amolece...
E depois do banquete, farta,
Enterra seu tesouro, esquece...

Brota o fruto abandonado,


Buscando a mata, o seu, o sol...
É um novo Pinheiro majestoso,
Nascendo com se fosse um rei!
16
Ida Hannemann de Campos

Imagem 107 – Licor de Araucária.


Disponível em:www.araucariadobrasil.com.br.
Acesso em 27 de Jun. 2009

Ida Hannemann, com suas obras, seus poemas, seu modo de viver, possui em
sua casa um pinheiro centenário e faz questão de apresentá-lo a todos que a visitam,
bem como este produto, o licor e o seu recipiente, são exemplos de que o paranismo
ainda continua vivo, gerando adeptos e proporcionando, ainda, as mais variadas
maneiras de sua divulgação, tão variadas que seus primeiros idealizadores,
provavelmente nem fizessem idéia das transformações que as formas inventadas
pudessem alcançar.

16
Material fornecido pela autora em entrevista com a pesquisadora.
155

CONSIDERAÇÕES FINAIS
156

Ao falar em Paranismo podemos chegar a pensar em Curitibanismo, afinal o


grupo de pessoas que começou a pensar em construir uma tradição para o Paraná se
encontrava nos bares de Curitiba e em Curitiba permaneceram, difundindo suas idéias.
Este sentimento profundo pela cidade, pelo Estado, em forma de movimento, começou a
se desenvolver na criação de símbolos, elementos já existentes, porém, até aquele
momento, estes mesmos não eram nomeados símbolos do Paraná. E foi nesta cidade,
Curitiba, que desenvolveram, divulgaram uma narração e impuseram os símbolos que
representariam o Paraná buscando atingir a todo Estado.
Porém isto não ocorreu, pelo menos não integralmente. As idéias paranistas, ou
seja, sua história, seu discurso, seus ideais, manifestos não atingiram a todo Estado do
Paraná, porém seus objetivos podemos dizer que foram atingidos, mesmo que
parcialmente. Além da preocupação de se “moldar” um paranaense ideal - o paranista -
a fim de englobar os imigrantes com a intenção de que todos que vivessem em terras
paranaenses se sentissem responsáveis pelo crescimento econômico do Estado, bem
como se empenhassem em prol da ordem e do progresso do mesmo, a idéia de se forjar
uma identidade para o Paraná foi um grande desafio para estes jovens intelectuais que
se declaravam paranistas. Tarefa um tanto quanto ousada, assumida por este grupo.
Afinal, a identidade pode ser considerada uma entidade subjetiva, não estanque,
praticamente indefinível, atingindo as mais variadas abrangências, desde associar-se às
experiências vividas por um grupo que poderão servir posteriormente de referência para
outros, como ser ligada aos aspectos culturais que tendem a se divergir de região,
cidades ou países distintos, ou as identidades particulares que tendem a existir em cada
indivíduo, e ainda como a distinções políticas, sociais, econômicas.
Variados são os fatores que podem interferir na identidade de um povo. No caso
do Paraná, ao que parece, a grande preocupação da intelectualidade curitibana residia
em unificar a população de maneira que todos falassem a mesma língua dentro do
Estado, levando em consideração o fato da miscigenação de raças existente no Paraná,
onde os costumes e tradições se mantinham à medida que os imigrantes formavam suas
157

colônias. Grosso modo, de certa forma, esta preocupação também atingia outros Estados
e a todo país, haja visto que o movimento modernista no Estado de São Paulo buscava
uma construção de identidade brasileira dentro da arte, de maneira que se espelhasse a
realidade do país e não de criações estrangeiras. O modernismo paulista, pelo menos
aparentemente, tinha a finalidade de utilizar as artes para explorar características
apreciadas como bem brasileiras para expor um panorama artístico com cara de Brasil,
tentando fugir das influências européias e, ao mesmo tempo, buscando inspirações nas
mesmas. Este seria o discurso apresentado pelos intelectuais considerados modernistas
brasileiros.
A identidade reconhecida em alguns Estados brasileiros pode ser identificada
como característica de determinadas regiões, também é interrogada por parte de alguns
autores, como podemos constatar em Dudeque (2005, p. 50 - 68) que, ao relacionar a
identidade à arquitetura, faz um questionamento sobre o Barroco Mineiro, enfatizando
que outros autores dizem que ele não existe e o que realmente existe é o Barroco
Colonial. Chegando a afirmar que não ter identidade não se trata de nenhuma vergonha,
[...] isso é importante porque, se não houver identidade, uma identidade arquitetônica
que possa nos diferenciar, também não há alguma coisa vergonhosa. Não temos
identidade porque no fundo ninguém tem (2005, p.56). O autor acaba chegando à
conclusão de que, se não há identidade, o que nos resta é a memória. Para Ortiz, a
construção de uma identidade estará sempre acoplada à junção entre o popular, o Estado
e a identidade, trazendo como sustentação os ideários da memória coletiva e da
memória nacional (ORTIZ, 2003, p. 135).
Podemos então pensar que os paranistas, mesmo forjando uma identidade com
os símbolos por eles adotados, conseguiram fazer com que hoje os paranaenses os
reconhecessem como parte de sua identidade, a “possível identidade paranaense”,
mesmo que esta afirmação seja de difícil aferição. Esta afirmação torna-se de certo
modo pertinente quando relacionada ao fato de os paranaenses reconhecerem os
símbolos estabelecidos pelos paranistas como seus. Atualmente os paranaenses
relacionam a araucária angustifólia, ou seja, o pinheiro do Paraná, como o símbolo de
seu Estado, mesmo desconhecendo o motivo pelo qual esta árvore foi eleita e quais
foram os meios utilizados para esta atribuição. É muito comum encontrar em todo
Paraná estabelecimentos comerciais dos mais variados segmentos, como padarias,
farmácias, mercearias, oficinas, onde, além de trazer como nome fantasia algo
relacionado ao Paraná ou ao Paranaense, reforça ainda com uma imagem do pinheiro
158

em seu anúncio, como podemos observar nas propagandas abaixo1:

Apesar das obras públicas paranistas, bem como sua iconografia se restringirem
à Curitiba, os paranaenses em geral reconhecem a pinha, o pinheiro e o pinhão e
também a gralha como seus símbolos, mesmo não sabendo a razão de ser o “Pinheiro” a
árvore que representa o Paraná, tendo em vista que em outros Estados esta árvore
também é encontrada. Esta aceitação da população paranaense é remetida ao esforço de
nomes como Romário Martins, Lange de Morretes e João Turin, pois lutaram para a
efetivação verbal e principalmente visual dos símbolos paranaenses, sendo estes os
elementos que deveriam representar todo Estado, chegando a ponto de ser entendido
entre seus idealizadores como o estilo paranista, que foi estampado e decalcado pelas
ruas, praças, muros da cidade de Curitiba, atingindo as mais variadas manifestações das
Artes Visuais, como pintura, escultura, arquitetura, moda.
Para Henri Focillon (1983), o estilo é absoluto e variável, o termo precedido

1
Fontes das imagens: http://www.paranalistas.com.br/img/Parana-Listas-Logo.gif
http://1.bp.blogspot.com/_0kzVHi69qZY/SOfbj4SwJqI/AAAAAAAAGDg/xdR0MtQ68OI/s400/copa+pa
rana.jpg
http://www.guiasjp.com.br/fotos_noticias/1228253976.1245F.jpg
http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.sindifar-
pr.org.br/noticias/00090.jpg&imgrefurl=http://www.sindifar-pr.org.br/Noticias_
159

do artigo definido pode indicar uma propriedade superior da obra de arte, lhe
permitindo sobreviver ao tempo, ser infindável. O estilo, idealizado de maneira integral,
pode ser considerado como duradouro, eterno, capaz de definir limites. Para o autor,
através deste conhecimento, o homem manifesta sua necessidade de distinguir uma
compreensão sobre o que é durável e unânime, sobre os conhecimentos da história, além
do que é local e característico. Um estilo é um desenvolvimento, um conjugado lógico
de formas conectadas por uma convivência mútua, onde a consonância se almeja, se
fazendo e desfazendo dentro de uma heterogeneidade. Os estilos bem definidos
possuem momentos de curvaturas e anormalidades, isto, segundo o autor, foi que
instituiu um estudo, há muito tempo, sobre os monumentos da arquitetura. Na França,
os criadores da arqueologia medieval, em especial de Caumont, determinaram que a arte
gótica não podia ser considerada uma coletânea de monumentos, e sim uma sucessão ou
um encadeamento, ou seja, um estilo, esta determinação foi alcançada através de um
estudo rigoroso sobre as formas. Focillon nos alerta que todas as artes podem ser
abarcadas sob a categoria de estilo, inclusive a própria vida do homem, na medida em
que a vida individual e a vida histórica são formas (FOCILLON, 1983, p. 22).
João Turin almejou a criação de um estilo próprio que se estruturasse a partir de
elementos originais do Estado do Paraná, para ele a arquitetura paranaense produzida
até então não transcendia às produções apresentadas em outras regiões, em suas
palavras: O povo que copia tudo o que é estrangeiro e se submete vergonhosamente à
vontade de outros povos, sem ter a força de agir e de pensar por si próprio é um povo
escravo, que não pode ter o direito de se apresentar em uma assembléia de homens
livres e civilizados (TURIN, s.n.t). O artista relacionava o estilo à produção apresentada
a partir de elementos característicos, a partir de formas comuns existentes no Estado.
Focillon afirma que um estilo se constitui de elementos formais com valores de
indicação, sobre seu conteúdo, sua linguagem, o mesmo se afirma a partir de suas
medidas. Os gregos não arquitetavam o estilo de outra maneira quando decidiam as
proporções referentes às partes.

Mais do que as volutas do capitel, é um número o que distingue a


ordem jônica da ordem dórica, e bem se vê que a coluna do templo de
Menéia é um monstro uma vez que, dórica por seus elementos, ela
tem medidas jônicas. A história da ordem dórica, isto é, o seu
desenvolvimento como estilo, é feita unicamente de variações e de
pesquisas sobre medidas (FOCILLON, 1983, p. 23).
160

Aplicado à coluna grega, o estilo determinado por Turin foi apresentado a partir
das medidas da ordem jônica, numa adaptação em que o pinheiro passou a ser a própria
coluna. O estilo proposto estava acarretado de singularidades particulares do Paraná,
comungando com as palavras de Tassinari, o estilo possui uma generalidade maior que
cada uma de suas aparições, algo como um ar de família (TASSINARI, 2001, p. 139).
Para Focillon, a atividade de se definir um estilo que, ao mesmo tempo, se foge de sua
definição, é oferecida como uma “evolução”, adotando o termo em seu sentido comum,
segundo o autor, qualquer interpretação dos estilos deve considerar dois fatores
fundamentais:

[...] vários estilos podem conviver simultaneamente, mesmo em


regiões muito próximas, mesmo em uma única região; os estilos não
se desenvolvem da mesma maneira nos diversos domínios técnicos
em que se exercem [...] pode-se considerar a vida de um estilo quer
como uma dialética, quer como um processo experimental
(FOCILLON, 1983, p. 23).

Ou seja, mesmo admitindo a simultaneidade da convivência de vários estilos,


entende que existem restrições que apontam a vida de um estilo, quer como uma
dialética, quer como processo experimental. O estágio experimental é o momento em
que o estilo procura definir-se. Numa acepção geral sobre a definição de estilo, a noção
de “evolução” era analisada pelas ciências biológicas e a arqueologia tendia a enquadrar
numa metodologia de classificação. Para o autor, este trajeto unilinear pode adquirir um
caráter falsamente harmonioso pelo fato de ser também empregado em casos duvidosos,
nos quais se torna possível enxergar o futuro em torno do passado. A noção de estilo
para Focillon, mesmo se estendendo a várias categorias com característica de unidade,
onde vale até mesmo a arte de viver, é considerada pelas técnicas e pelas matérias o
movimento não é uniforme e sincrônico em todos os domínios (FOCILLON, 1983, p.
26). O autor afirma que as formas possuem uma história, e esta não pode ser
representada por uma trilha de maneira ascendente. Enquanto um estilo morre o outro
nasce, portanto o homem deve sempre reiniciar as mesmas buscas e é o mesmo homem,
ou seja, a constância e a identidade do espírito humano, que as recomeça (FOCILLON,
1983, p. 28).
Os artistas plásticos paranistas denominaram estilo paranista as produções
elaboradas a partir de formas extraídas da natureza paranaense. Focillon nos afirma que
a natureza cria formas e estas são impressas nos objetos, este trabalho é tão bem
161

elaborado que nos permite comprazer em detectar a obra de um Deus artista, em que,
até mesmo nas ondas rápidas ou tênues, as formas podem ser identificadas.

A vida orgânica desenha espirais, esferas, meandros e estrelas. Se eu


quiser estudá-la, é pela forma e pela quantidade que a conheço. Mas a
partir do momento em que essas figuras intervêm no espaço da arte e
nas suas matérias particulares, elas adquirem um novo valor,
engendram sistemas inteiramente originais, inéditos (FOCILLON,
1983, p. 12).

Os paranistas, ao utilizar os elementos orgânicos da natureza paranaense em


produções artísticas, almejavam apresentar uma arte que se mantivesse por sua
originalidade, escapando, segundo eles, das imposições geradas pelas artes estrangeiras.
Se formos levar em conta a afirmação de Focillon, onde declara que as formas orgânicas
inseridas no espaço artístico concebem sistemas inéditos e originais, podemos pensar
que estes idealizadores não estavam totalmente equivocados, pois os artistas paranistas
destrincharam o pinheiro e todas as possibilidades que suas formas pudessem oferecer, e
embutiram nas produções que serviriam para a divulgação do Movimento Paranista,
criando, segundo eles, o estilo paranista.
A solução de se utilizar das Artes Visuais como recurso principal para a
divulgação dos ideais paranistas foi a grande estratégia dos intelectuais curitibanos, pois
a apelação visual inserida no ambiente cultural, bem como nos locais públicos, não
poderia ser superada por nenhuma outra tática, somente o manifesto escrito não seria
suficiente para perpetuar a simbologia paranista. A imagem, ou seja, a obra de arte, por
mais simples que seja, estará sempre em vantagem sobre o discurso verbal, mesmo que
este seja elaborado pelo próprio autor da obra. Segundo Focillon, a mais rica coleção de
comentários e de memórias elaborados pelos artistas mais imbuídos do seu objeto, mais
hábeis em retratar através de palavras, não seria capaz de substituir a mais
insignificante das obras de arte (FOCILLON, 1983, p. 12). A obra de arte domina ainda
seus mais variados significados, pode servir para ilustrar o homem, a história, o mundo.
Ela é criadora do homem, criadora do mundo e instala na história uma ordem que não
pode ser reduzida a nenhuma outra coisa (FOCILLON, 1983, p. 10). Podemos dizer
que uma obra nos conta a história e, se esta história for imaginária, a obra de arte por
sua vez, é real.
A iconografia paranista se instalou na cidade de Curitiba e, a partir da década de
20, os símbolos passaram a fazer parte do dia a dia dos curitibanos. Atualmente são
162

inúmeros os painéis espalhados pela cidade, em grandes e pequenas dimensões,


executados pelos mais variados artistas e compostos pelas formas do pinheiro, do
pinhão, da pinha e da gralha. Estas formas são reforçadas ao passo que cada painel é
construído. Cada vez que uma forma paranista é decalcada num mural, numa calçada,
num painel, reforça o imaginário popular gerando até uma ambigüidade entre o que é
imaginário e o que é real. Estes símbolos impostos à população acabam induzindo o
espectador que passa a adotar estas formas como referência para sua cultura, tradição e
valores locais.
Focillon afirma que se pode idealizar uma iconografia nas mais variadas
maneiras, com variações de formas sobre um determinado significado, ou com
variações de significados sobre uma determinada forma, porém a forma sobreviverá ao
seu conteúdo, e até poderá se renovar consideravelmente. As formas paranistas
sobreviveram aos anos que conseguiram apagar a história do Movimento Paranista. A
população não conhece a história, mas reconhece seus ícones, obviamente isto poderia
não ter acontecido se não fossem os incentivos políticos que ocorreram posteriormente
aos anos 20 e 30. Com o passar dos anos, estas formas foram se transformando ao
mesmo tempo em que se repetiam. Os artistas que abraçaram a temática paranista a
partir dos anos 80, seja por conta própria ou por encomenda, proporcionaram
consideráveis diferenças para a repetição das formas paranistas, porém mesmo com
variações visivelmente elaboradas, mesmo com a transformação, estas formas não
perderam seu significado.
Gilles Deleuze ressalta que até mesmo na natureza a repetição anda na contra-
mão. Se a repetição existe, ela exprime, ao mesmo tempo, uma singularidade contra o
geral (DELEUZE, 2000, p. 5). Deleuze afirma que a repetição não é a generalidade e
que a repetição, por sua vez, deve ser distinguida da generalidade. A generalidade para
Deleuze está relacionada à reunião de coisas com suposição de semelhanças em um
determinado conceito, a generalidade é da ordem das leis (DELEUZE, 2000, p. 4),
somente a lei pode determinar a semelhança dos sujeitos que estão a ela subjugados. Ao
se tratar de repetição não devemos generalizar a ponto de nos referirmos à igualdade ou
à semelhança. Para o autor é de natureza a diferença entre a repetição e a semelhança.
Repetir seria escapar à lei, a lei não consente a repetição, ela a coage. Portanto, se for
possível a repetição, pode-se remeter à ordem do milagre mais que da ordem da lei. Se a
repetição pode ser encontrada, mesmo na natureza, é em nome de uma potência que se
afirma contra a lei, que trabalha sob as leis, talvez superior às leis (DELEUZE, 2000,
163

p. 5). Ao existir a repetição, ela traduz uma singularidade que contrapõe o geral.
Deleuze nos alerta que é o primeiro nenúfar de Monet que repete todos os
outros (DELEUZE, 2000, p. 3). Assim sendo, as primeiras obras paranistas repetem
todas as outras. Através dos processos de diferenciação os artistas paranistas posteriores
ao movimento, (re)criaram as formas, repetindo as imagens, construindo possivelmente,
juntamente com seus precursores, um simulacro do homem, um homem paranista em
forma de pinheiro, forte, imponente. Para o autor, pode-se “representar” a repetição
como uma semelhança extrema ou uma equivalência perfeita (DELEUZE, 2000, p. 3),
porém passar gradualmente de uma coisa a outra não evita que exista diferença de
natureza entre as duas coisas.
Na produção paranista após anos 80, denominada Neo-paranista, nota-se a
reutilização dos elementos simbólicos em uma linguagem atualizada, percebe-se, além
disso, uma preocupação por parte dos artistas em acompanhar as propostas apresentadas
pelo pós-modernismo, sem escapar das referências representativas geradas pelo
Movimento Paranista. Plasticamente os símbolos foram incorporados em novas
interpretações propiciando uma fusão de idéias, sem perder o reforço concentrado em
cima da tradição paranaense. Por este motivo, podemos concordar com Georges Didi-
Huberman quando nos alerta que a imagem propõe uma abertura ao olhar e que,
anacronicamente, uma imagem viaja pelo tempo, encontrando possibilidades de
entrelaçamento e até semelhanças com outras imagens.
O autor nos chama a atenção que, diante de uma imagem, podemos pensar além
do contexto em que ela foi pintada, pensar além do período em que ela foi enquadrada,
pensar em todas as outras possibilidades que esta imagem propõe ao abrir a fenda que
liga diretamente o olhar do espectador. Desta maneira as imagens que trazem os
símbolos paranistas, trazem também uma história, uma tradição que foi inventada, um
passado que foi forjado, uma identidade que foi buscada. Diante destas imagens o
passado não para de ser apresentado, a memória continua se construindo, estas imagens
sobreviverão à história, à memória e até mesmo a nós, meros espectadores.
Estes símbolos, pinheiro, pinha, pinhão e gralha-azul, acabaram ainda
assumindo dentro do Estado do Paraná caracteres diferenciados e funcionais, tornaram-
se modelos para planos urbanísticos em Curitiba, exemplos ecológicos de preservação
das matas, incentivos econômicos em relação ao cultivo em terras paranaenses, além do
valor estético pela aceitação geral dos paranaenses, principalmente dentro do censo
comum. Certamente, desta maneira, ainda hoje os ideais paranistas continuam sendo
164

reforçados, pois estas imagens, estas formas apresentadas nas mais variadas situações e
atingindo diferentes intenções não escapam da visão da população, mesmo com
roupagem distintas, e reafirmam a simbologia criada por Romário Martins e demais
idealizadores.
Diante disso, este trabalho tende a considerar que os paranistas forjaram sim
uma identidade para o Estado do Paraná e, na busca constante em incutir seus ideais
para os paranaenses, exploraram a natureza a fim de extrair seus elementos e apresentá-
los à população, destacando qualidades consideradas únicas dentro do Estado. O
Paranismo dos anos 20 e 30 agiu como um suporte para as produções artísticas
elaboradas posteriormente em que através de uma reinterpretação cultural continuaram a
incentivar os valores regionais. De certa forma, em algumas questões, o Movimento
Paranista talvez tenha deixado a desejar, pois não manteve no Estado a consistência de
um manifesto, nem o estruturalismo de uma escola, tão pouco uma formação acadêmica
ou teórica. Sua efetivação se manteve apenas no sentimento despertado em algumas
pessoas preocupadas com a preservação da identidade cultural paranaense criada pelos
integrantes do movimento. Os símbolos, estes permaneceram, mesmo com a
efemeridade do Movimento Paranista. A simbologia permaneceu nas calçadas, nos
painéis, nas construções de estruturas ecléticas adornadas com pinhões. As formas
paranistas se perpetuaram.
As formas vivas arrancadas do pinheiro passaram a se confundir com a tradição
que hoje, graças ao paranismo, é considerada paranaense. Assim sendo podemos afirmar
que a arte cumpriu com uma tarefa extremamente importante, pois foi através das
formas artísticas que a população foi atingida. Nas palavras de Pereira, a arte não pode
mudar o mundo, mas pode modificar as consciências e as pulsões dos homens e é
exatamente neste sentido que a mesma será utilizada pelos paranistas (PEREIRA, 1998
p. 137). As obras paranistas realizaram os desejos dos intelectuais idealizadores do
Movimento, as imagens efetivaram o que verbalmente não foi possível concretizar
através das palavras. Para Manguel, independente do caso, tanto as imagens como as
palavras refletem a matéria de que somos feitos (MANGUEL, 2006, p. 21).
Este trabalho que, inicialmente tinha a pretensão de elaborar um estudo
fundamentado na ação visual provocada pelo paranismo em resposta à república,
acabou se limitando em apresentar as obras paranistas que, até então, não haviam sido
organizadas em um só trabalho. A princípio não se imaginava encontrar tantas obras
dentro desta temática, assim como a imensa variação manifestada nas artes visuais.
165

Atualmente podem-se encontrar obras caracterizadas paranistas em instalações ou em


interferências urbanas, realizações que, possivelmente, jamais imaginadas por Lange de
Morretes ou João Turin. Vale ressaltar que, pelo fato de estarem espalhadas nos mais
variados pontos da cidade de Curitiba, houve uma dificuldade para reunir estas
produções, e ainda, algumas acabaram tendo pouca repercussão, ficando limitadas
apenas a registros ou fotos dos eventos.
Atualmente, pode-se dizer que o Movimento Paranista continua sendo motivo de
estudo para as mais diversificadas linhas de pensamento, como na linha da história das
idéias, sobre as relações com a ética, estética e política, sobre as questões de memória,
história e tradição, contando com adeptos e também com antipatizantes, mesmo dentro
do próprio Estado. Dentro do universo plástico paranaense, não é diferente, muitos
afirmam gostar das obras paranistas e outros simplesmente as ignoram, afirmando
serem estas obras, apenas resultados de interesses políticos. Enfim, podemos considerar
que, mesmo questionando a qualidade estética de algumas produções paranistas, este
estudo do “Paranismo e as Artes Visuais” tornou-se de grande importância para o
conhecimento destas obras, e principalmente para tornar explícita a força de indução das
Artes Visuais sobre a população. As Artes Visuais agiram incontestavelmente a favor do
Paranismo, afinal, a população não pôde esquivar os olhares sobre as formas impostas.
Com exceção dos que não podem gozar de uma visão perfeita, pois estes decifram a
imagem através de outras formas de percepção, as imagens ocupam uma posição nas
percepções diretas do indivíduo, segundo Manguel, a alma nunca pensa sem uma
imagem mental, assim sendo, o autor afirma que:

[…] para aqueles que podem ver, a existência se passa em rolo de


imagens que se desdobra continuamente, imagens capturadas pela
visão e realçadas ou moderadas pelos outros sentidos, imagens cujo
significado (ou suposição de significado) varia constantemente,
configurando uma linguagem feita de imagens traduzidas em palavras
e de palavras traduzidas em imagens, por meio das quais tentamos
abarcar e compreender nossa própria existência. As imagens que
formam nosso mundo são símbolos, sinais, mensagens e alegorias
(MANGUEL, 2006, p. 21).

O paranismo apresentou-se e ainda se apresenta aos paranaenses como um rolo


de imagens, imagens que representam, que reafirmam, que induzem. O Movimento
Paranista acabou por exaltar o Paraná, bem como a capital Curitiba, possibilitando uma
melhor compreensão, por meio das imagens, a respeito de um Estado em construção, de
um Estado caracterizado de incaracterístico. Para Nascimento, a exaltação de uma
166

cidade, de um estado, de uma região, da terra natal ou de adoção, não constitui


pecado, defeito artístico ou literário (NASCIMENTO, 1997). Assim, as imagens
impostas se revelaram formando uma história, uma tradição, por meio de alegorias,
símbolos, sinais e mensagens, suprindo a preocupação, pelo menos parcial, a respeito de
um Estado que se encontrava carente de uma herança histórica. Atualmente o Paraná
possui seus símbolos e uma suposta tradição, que é reconhecida e reafirmada por sua
gente. As palavras viraram imagens, a mensagem foi decodificada, apreendida e
incorporada pela população.
167

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