BUENO, Luciana - O Paranismo e As Artes Visuais
BUENO, Luciana - O Paranismo e As Artes Visuais
BUENO, Luciana - O Paranismo e As Artes Visuais
FLORIANÓPOLIS
2009
Livros Grátis
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA UDESC
CENTRO DE ARTES
FLORIANÓPOLIS - SC
2009
LUCIANA ESTEVAM BARONE BUENO
BANCA EXAMINADORA
Orientador:
Profa. Dra. Sandra Makowiecky
UDESC-SC
Avaliador:
Profa. Dra. Rosângela Cherem
UDESC-SC
Avaliador Externo:
Prof. Dr. Artur Freitas
FAP-PR
Avaliador Suplente:
Profa. Dra. Sandra Ramalho e Oliveira
UDESC-SC
Tudo nesta vida é construído a partir de várias pessoas, umas com funções
mais destacadas, outras menos, mas, como num espetáculo teatral, cada papel é
gente, muitas foram as palavras de conforto, força, carinho, compreensão. Muitas foram
Marcio, meu esposo, pela força, pela ajuda, pela paciência e pela função de pãe em
minha falta. Ao meu filho Davi, por ter perdoado minha ausência e pelas vezes que
deixei de brincar, de contar histórias..., aos meus pais e à minha irmã Sônia que sempre
me deram total apoio a cada passo dado, obrigada também pelas orações.
mesmo aumentando meu trabalho. A todos vocês, muito obrigada, de todo o coração e
muito obrigada, não apenas pelo incentivo e por ter acreditado em mim, mas também
Luciana Barone
BARONE, Luciana E. O Paranismo e as Artes Visuais. 2009. 177 f. Dissertação
(Mestrado em Artes Visuais, Linha de Pesquisa em História, Teoria e Crítica da Arte) –
Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV) do Centro de Artes (CEART)
da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis, S.C.
RESUMO
In inventing the past, city constructs future, its architectonical particularities are
characterized by the past that is possible to see. This work had as pretension to search,
in the city of Curitiba, a past that left vestiges in the present. In the 19th century, some
intellectuals from Paraná start to worry about the State’s cultural identity. In the 20’s, a
group of uncomfortable people yet by the fact that the state of Paraná did not have
regional traces itself, they idealize the Paranista Movement, highlighting, among others,
the writer Romário Martins and the plastic artists Lange de Morretes and João Turin.
One of the Paranismo idealizers’ speech’s characteristics was to integrate all individuals
who adopted Paraná as their own land, no matter if they were paranaenses, Brazilians or
immigrants. The Movement was divulged in the city of Curitiba, intending to reach all
state of Paraná, through legends, published articles and mainly through Visual Arts,
which were their main exposure vehicle. Icons and stylization were spread all over the
city of Curitiba, even being recognized among its creators as the “paranista style”,
intending to convince all population that from that time on, images of the pine tree, the
pine and the pine fruit were effectively Paraná’s symbols. Later on, also the blue crow
as a possible preservation of the pine trees. Despite the paranista movement to be
restricted to Curitiba, paranaenses usually still today recognize paranistas’ symbols,
despite the fact that they did not know its history. This acceptance of the paranaense
population, specially the curitibana, is strengthened also due some attitudes posterior the
Paranismo which perpetuated its ideas, being able to cite the law and culture’s
inducements from the government and State’s representatives and collaborators in
relation tradition’s rescue and paranaense symbology. However it is undeniable that the
main agent of the paranistas symbols’ permanence was the artistic production generated
after the movement, allowing a Neo-paranismo, this, with alternative and differentiated
ideas, allowed paranaenses symbols innovative resolutions that, probably, were never
imagined by their first idealizers.
Imagem 33- Fachada da casa do Dr. Bernard Leinig - João Turin (1928)...................96
Imagem 34 - Casa do Dr. Bernardo Leinig (outro ângulo) - João Turin (1928)..........96
Imagem 53 - Praça Dr. João Cândido. Calçada externa com motivo paranista....……116
Imagens 81, 82 e 83- Bijuterias criadas pela designer Suelli Zavvadinack. ................133
Imagem 99 - Papel impresso com pedras da rua XV- Sérgio Monteiro de Almeida..144
Imagem 106 - Mural da Praça do Asilo São Vicente de Paula - Ida Hannemann de
Campos.........................................................................................................................153
INTRODUÇÃO.............................................................................................................15
1.1 O Paranismo........................................................................................................25
1.2 O Vocábulo..........................................................................................................27
1.3 O Centro Paranista...............................................................................................29
1.4 Os Imigrantes.......................................................................................................33
1.5 O Simbolismo e o Paranismo..............................................................................35
1.6 O Pinheiro, a Pinha e o Pinhão............................................................................41
1.7 A Inserção de um Novo Símbolo – A Gralha Azul.............................................44
CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................155
REFERÊNCIAS...........................................................................................................167
INTRODUÇÃO
1
Simpósio: Cultura e Arte Educação para Cidadania. Paranismo 70 anos. Centro Juvenil de Artes
Plásticas. – 16 a 19 de agosto de 1994.
16
Assim, a partir de uma curiosidade em saber mais sobre este assunto, comecei
um estudo em torno do Movimento Paranista. Minha leitura inicial foi a obra de Luis
Fernando Lopes Pereira, “Paranismo: O Paraná Inventado; cultura e imaginário no
Paraná da I República”. O autor aponta em seu trabalho as particularidades existentes no
Estado do Paraná principalmente em relação ao republicanismo anticlerical e positivista,
destacando a participação do Movimento Paranista na tentativa de forjar a identidade
regional para um Estado que era considerado apenas uma parcela de terra sem fronteiras
definidas, cuja população heterogênea não possuía quaisquer características em comum.
Pereira faz uma relação do recurso utilizado pelos paranistas - ou seja, as artes visuais -
para construção da identidade regional, com a obra de José Murilo de Carvalho “A
formação das almas”, onde o autor apresenta as artes plásticas como fonte de construção
para o imaginário republicano, e o mesmo afirma que a população brasileira não teve
participação direta na construção da república, ela assistiu à proclamação.
A partir destas leituras, iniciei uma pesquisa que, a priori, pretendia estabelecer
uma relação maior entre o Paranismo e os ideais republicanos, analisando a
alfabetização visual imposta pelo Paranismo sobre a população curitibana, principiando
pelas obras apresentadas no livro de Pereira. Porém, ao aprofundar o trabalho de coleta
de imagens, percebi que as obras visuais citadas por Pereira tratavam-se apenas de uma
pequena parcela da extensa produção artística chamada paranista. Apesar de extensa,
não havia uma documentação do registro imagético deste movimento, estas obras não
estavam organizadas de forma mais sistemática em lugar algum, a não ser como parte
de trabalhos onde o assunto se relacionava. Sobre estes, podemos citar os estudos de:
Rachel Menezes Butter, “O Escultor João Turin no Paraná de 1920 a 1940”, cuja
Monografia apresenta uma parcela considerável da obra de João Turin abordando sua
participação no Movimento Paranista e suas influências, ou não, na construção de uma
identidade paranaense; Luis Afonso Salturi em sua Dissertação em Sociologia,
“Frederico Lange de Morretes, liberdade dentro de limites: Trajetória do Artista-
cientista”, faz um estudo mais aprofundado sobre Lange de Morretes e sua importante
contribuição ao movimento, analisando a produção artística, cientifica e intelectual,
relacionando-a com a trajetória do artista, apresentando sua rede de relações sociais,
bem como sua atuação como docente e pesquisador em instituições públicas e
particulares. A análise dos desenhos e pinturas de Lange, neste estudo, foi feita a partir
da visão sociológica e com respaldo das influências de estilos artísticos, diferentes
temáticas e aspectos simbólicos; Geraldo Leão Veiga de Camargo, em sua Tese na linha
17
ausência de seus idealizadores, porém com soluções plásticas bem diferenciadas. Assim
sendo, temos como objetivo neste trabalho: investigar de que maneira inicialmente o
Paranismo foi estruturado por seus idealizadores, assim como entender seus objetivos e
seus meios de divulgação; analisar as diferentes manifestações visuais utilizadas pelo
Movimento Paranista a fim de difundir seus ideais; questionar a busca pelo moderno
paranista em contraposição às vanguardas do mesmo período e da mesma maneira;
investigar em que se inspiravam as obras paranistas; avaliar as ressonâncias no
imaginário-popular bem como a permanência icônica paranista no decorrer histórico da
Arte Paranaense; pesquisar a permanência da iconologia paranista que possivelmente
ainda exista em trabalhos de artistas atuais.
Para o desenvolvimento desta pesquisa, que se insere na linha de pesquisa em
Teoria e História das Artes Visuais, inicialmente foi feito o levantamento do material
bibliográfico considerando como fontes primárias o “Manifesto Paranista”, os
“Periódicos Paranistas”, “Revista Ilustração Paranaense”, obras de Romário Martins e
Luis Fernando Lopes Pereira. Em seguida foi direcionada a pesquisa na produção
artística paranista, que se desenvolveu nas diversas manifestações visuais como: a
pintura, a escultura, o desenho, a gravura, a arquitetura, a decoração. Diante destas
propostas de fontes, foram selecionadas as imagens e o discurso dentro da linguagem
visual. De acordo com a leitura que realizei, esta pesquisa pode ser classificada da
seguinte forma: qualitativa, exploratória, bibliográfica e documental.
Cabe questionar que apesar do Paranismo estar visualmente circunscrito em
Curitiba pelas obras públicas, por que os paranaenses em geral reconhecem a pinha, o
pinheiro e o pinhão como seus símbolos? Quais seriam as permanências do Paranismo e
seus símbolos e desdobramentos nas percepções modernas e contemporâneas da arte
paranaense no que tange o fenômeno desta iconologia?
Dentro deste pensamento o trabalho desenvolveu-se em torno de duas hipóteses:
1 - O paranismo é uma invenção para forjar uma identidade; 2 - A utilização de obras
visuais como veículo de divulgação do movimento foi o motivo pelo qual o movimento
teve sua sustentação.
O trabalho está organizado em capítulos, estruturados de forma a mostrar um
encadeamento de idéias. No primeiro capítulo este estudo abordou algumas relações
entre a cidade de Curitiba, seu passado e presente, numa conexão entre história e
memória. Ainda, o Movimento Paranista foi relatado de maneira que pudéssemos
19
entender quais foram seus principais objetivos, seus ideais e principais meios de
divulgação.
O Segundo capítulo trata do Paranismo e a utilização das Artes Visuais como
efetivação do mesmo, bem como seus principais divulgadores, os artistas plásticos João
Ghelfi, Zaco Paraná, Langue de Morretes e João Turin. Neste capítulo pretendemos
questionar quais foram as manifestações artísticas utilizadas pelos artistas para
divulgarem o Paranismo, e quais os recursos plásticos, ou seja, de que maneira os
elementos símbolos do Paraná foram inseridos nas obras visuais.
O terceiro capítulo aborda a permanência do paranismo nas obras de artistas
posteriores ao movimento. Buscamos compreender quais foram os meios e atitudes que
proporcionaram a conservação do Paranismo mesmo depois da ausência de seus
idealizadores, bem como de que maneira este Paranismo se apresentou nas obras
denominadas Neo-paranistas.
20
CAPÍTULO I
Para a autora a cidade é analisada pelo presente, mesmo a cidade do passado, ela
está em constante renovação no hoje, seja no pensamento individual ou coletivo, ou
ainda através dos contos históricos que as gerações reconstroem do passado.
1
Informação sobre a localização, extraída do Artigo: Catedrais de Cultura e de Arame em Curitiba: Mito
e Metáfora. De Carmen Lúcia Fornari Diez - Professora da UFPR e doutoranda pela UNIMEP. Geraldo
Balduíno Horn - Professor da UFPR e doutorando pela USP. Disponível em:
http://www.anped.org.br/reunioes/23/textos/0229t.PDF
23
A autora completa ainda, citando Aldo Rossi, que identifica a memória coletiva
em uma associação entre o imaginário e o espaço social, onde o espaço urbano não pode
ser pensado sem o tempo, e a cidade não pode ser refletida dissociada do espaço
construído. A cidade em que pensamos é, portanto, uma construção gerada a partir de
pedaços de memória que se exteriorizam por imagens, sendo ainda a cidade a própria
memória coletiva do homem (PESAVENTO 2002, p. 28).
A memória coletiva, bem como a memória individual, estão ligadas
afetivamente e relacionadas a partir de vivências tanto individuais como coletivas.
Curitiba ainda pode ser observada através de sua memória cívica. A memória cívica está
intimamente ligada ao patrimônio, ao poder político, onde alguns valores são destacados
e outros desconsiderados, podemos observar claramente nos monumentos erguidos com
finalidades bem definidas, ou ainda através das comemorações relacionadas à
emancipação política, sempre visando reforçar uma identidade.
Esta busca pela identidade cultural foi o ponto forte das reflexões que levaram a
intelectualidade curitibana a criar o Paranismo, movimento este que tinha dentre suas
principais finalidades forjar a identidade paranaense. O Movimento Paranista foi
resultado de um processo de formulação de uma imagem do Paraná posteriormente à
sua emancipação política, ocorrida em 1853.
1.1 O Paranismo
influentes. A situação financeira difícil de sua família foi o fato agravante para que
Romário não adquirisse o conhecimento acadêmico, um dado que seria fundamental
para uma possível dificuldade de seu ingresso na elite econômica, tendo em vista que,
para nossa cultura, tornar-se bacharel seria um fato imprescindível. Contudo, Romário,
ao se dedicar à literatura, à política e às realizações cívicas, fez com que o círculo das
elites educadas lhe abrisse as portas. Em 1896, inicia a história literária paranaense
partindo da emancipação política, em que citamos suas principais obras: “História do
Paraná”, “Terra e Gente do Paraná”, “Quantos Somos e Quem Somos”, “Dados para a
História e a Estatística do Povoamento do Paraná”, “Eu Penso que...”. Romário foi
autor de vários manifestos paranistas e sua imensa simpatia pela cultura indígena lhe
inspirara a escrever muitos poemas em defesa desta causa, tendo com exemplo o mito
do Guairacá. Também faz uma notável atuação na redação da “Revista do Clube
Curitibano”. Segundo Camargo, esta revista proporcionará a Romário o contato com os
formuladores dos pontos de vista “culturais” das elites paranaenses (CAMARGO,
2007, p. 15).
Romário Martins foi o primeiro secretário do Instituto Histórico e Geográfico do
Paraná, atuou como diretor do Museu Paranaense e, na política, foi deputado estadual de
1904 a 1928. Esta versatilidade entre a literatura, as artes plásticas e a política lhe
propiciou uma ligação importante entre os membros das mesmas e, conseqüentemente,
uma posição socialmente privilegiada.
Para o historiador, professor, poeta e museólogo David Carneiro2, Romário
Martins:
2
Transcrição do depoimento de David Carneiro a Roselys Roderjan, sem data. Cópia em anexo. Doação
por Aparecida Zanatta ao Centro Estadual de Capacitação em Artes Guido Viaro – 1996.
27
1.2 O Vocábulo
Conta ela que, num encontro com Jeff, Hilário Rodrigues e Pike-
Pake, naquela redação, esses conhecidos personagens do nosso “set”
de escritores divergiram sobre a questão proposta, isto é, sobre “quem
inventou a palavra, se Romário Martins ou Domingos Nascimento. E
transcreve, a respeito, o seguinte “nheengato” entre eles: - “Quem
inventou essa palavra foi Romário Martins”, disse Jeff, taxativamente.
– “Nego!”, contestou Hilário, que é conhecedor de coisas antigas de
nossa terra. “A autoria dessa invenção cabe a Domingos
Nascimento”. E Pike-Pake sentenciou, dizendo que o substantivo
paranista fora lançado, em 1906, por Domingos Nascimento, com a
significação de “natural do Paraná”, tomado de amor erangé pelo seu
Estado, por cujo progresso, prestígio e integridade envida todos os
esforços. – “É então um paladino que se bate pelo Paraná?”, pergunta
Araci. – “Isso mesmo”. – Uma espécie de jacobino destas plagas?” –
“Mais ou menos (MARTINS, 1948).
Além deste texto “Paranística”, onde Romário Martins relata a investigação feita
por Araci Martins sobre o vocábulo paranista, outra afirmação do autor esclarece ainda
que o termo não partiu de sua autoria, e sim de Domingos Nascimento, no qual
podemos constatar em seu relato:
28
Paranista é todo aquele que tem pelo Paraná uma afeição sincera, e
que notavelmente a demonstra em qualquer manifestação de atividade
digna, útil à coletividade paranaense. [...] Paranista é aquele que em
terras do Paraná lavrou um campo, cadeou uma floresta, lançou uma
ponte, construiu uma máquina, dirigiu uma fábrica, compôs uma
estrofe, pintou um quadro, esculpiu uma estátua, redigiu uma lei
29
3
Frase escrita a partir de uma anotação feita pelo Professor Artur Freitas em banca de qualificação no dia
08 de dezembro de 2008, Florianópolis.
4
MARTINS, Romário. Programa do Centro Paranista. In: Boletim do IHGE. p.75. art.1. 1927.
30
5
Ibid idem. p. 75 art.8.
31
Como pudemos constatar, a oração faz uma menção às riquezas do Paraná, onde
o Estado é considerado um “gigante adormecido”, destacando seus patrimônios
naturais, seus pontos típicos ou exóticos, valorizando sua terra e engrandecendo sua
gente. Podemos pensar então que através do Centro Paranista e atitudes como a
divulgação desta oração os paranistas determinavam um exemplo de comportamento
social, valorização do Estado, e conseqüentemente difundiam os alicerces para a
ramificação do movimento.
32
6
O primeiro exemplar da Revista Ilustração Paranaense se deu em novembro de 1927.
7
Posteriormente, no Segundo Capítulo, faremos uma análise mais detalhada deste trabalho de Turin.
33
1.4 Os Imigrantes
8
Fonte: “Gazeta do Povo”. Caderno Extra sobre os “Personagens do Paraná” n. 02, 09 de março de 2003
e n.03, 16 de março de 2003.
34
Wachowicz, o termo seria atribuído a Romário Martins e sua significação teria uma
definição adversa de ádvena, uma expressão no sentido pejorativo para mencionar os
estrangeiros e seus descendentes. O termo “paranismo” teria sido inventado para
designar a “intellegentia” luso-brasileira [...] cultuadores das tradições paranaenses.9
Wachowicz prossegue afirmando que seria um termo nativista dos que insistiam contra
a participação do estrangeiro. O segundo discorda e comprova que o movimento não era
xenófobo e, ainda, tinha melhores intenções quanto aos imigrantes, comungando com as
palavras de Romário Martins quando afirma que paranista é todo aquele que tem pelo
Paraná uma afeição sincera (MARTINS, 1946, p. 91).
De qualquer maneira, é importante ressaltar que o Movimento Paranista, e
principalmente seus idealizadores, Romário e Brasil, passaram longe de qualquer tipo
de rejeição ao imigrante, pelo menos é o que podemos constatar em seus textos. Outro
fator que também foi possível constatar é que estes intelectuais paranistas não fecharam
os olhos para as manifestações contrárias ao imigrante. Brasil Pinheiro Machado se
utilizou da expressão poética para rejeitar esse tipo de atitude na poesia “Paisagem da
Minha Terra”:
9
WACHOWICZ, Ruy. Os ádvenas e os paranistas na obra de Romário Martins. Anais do colóquio de
estudos regionais, comemorativo do I Centenário de Romário Martins. Boletim do Departamento de
História. Curitiba, Universidade Federal do Paraná, p.119, 1974.
35
Francês está vinculada a outro poeta também francês, Baudelaire, que em 1857
exercitava a estética simbolista em “As Flores do Mal”. Para o literato Massaud Moisés,
Baudelaire era a fonte praticamente de todas as linhas de força que compuseram a
poesia moderna.
O poeta Baudelaire também é apontado por Giulio Argan, entre outros autores,
como aquele homem que esteve indisposto e ao mesmo tempo usufruidor da
modernidade que o atingiu. O poeta debruçou-se sobre o caos da cidade resultante da
multidão, esse tema deu origem a um dos seus mais célebres poemas, chamado “A uma
passante”. Outra preocupação de Baudelaire – junto aos impressionistas – foi a respeito
das influências que a arte sofreu depois da invenção da máquina fotográfica, bem como
às outras maquinarias surgidas na sua época. Talvez por tudo isso Baudelaire tenha
conseguido representar o Simbolismo na sua essência, ou seja, compreendeu aquele
mundo aparentemente absurdo e o codificou sob o signo dessa nova corrente estética:
um mergulho no inconsciente e nas sensações, atitudes que a lógica parnasiana não foi
capaz de expressar e explicar.
O Simbolismo cruzou a fronteira francesa e exerceu sua influência em várias
literaturas da Europa e da América. No Brasil adota-se a data de 1893 para o início do
Movimento Simbolismo na figura do poeta catarinense Cruz e Souza, especificamente
da publicação de “Broqueis”, poemas em verso, e “Missal”, poemas em prosa, nos
moldes do figurino simbolista. No entanto, no Brasil, o Simbolismo não constitui um
período literário autônomo, na verdade ele coexistiu como o Romantismo, Realismo e
Parnasianismo, pois sofreu forte resistência das correntes estéticas anteriores.
nas relações sociais paranaenses, deixando transparecer em seus textos a inserção dos
estrangeiros nos ideais paranistas, como constatamos anteriormente.
Outra atuação singular e original do simbolismo em Curitiba é em relação ao
clima que pode ser comparado a algumas regiões da Europa, diferenciando-a então de
outras cidades brasileiras. Segundo Marcio Oliveira:
10
Importante se faz salientar aqui que o pinheiro em que se refere ao símbolo do Paraná trata-se do
Pinheiro Araucária, tendo em vista que outras árvores são, em outros Estados, também denominadas
pinheiros.
41
José Murilo de Carvalho, em seu livro “A Formação das Almas”, ao falar sobre
os ideais republicanos afirma que, para operar um extravasamento de república no
mundo extra-elite, seriam necessárias outras tentativas além do discurso: [...] não
poderia ser feito por meio do discurso, inacessível a um público com baixo nível de
educação formal. Ele teria de ser feito mediante sinais universais, de leitura mais fácil,
como as imagens, as alegorias, os símbolos, os mitos (CARVALHO, 2005, p. 13-4).
Assim sendo, o principal recurso do Movimento Paranista para atingir o “Imaginário-
popular” foi utilizar-se das artes plásticas, propondo uma alfabetização visual não
formal, ou seja, não escolar.
Os símbolos que serviram para a identificação emblemática do Paraná giraram
imflamadamente em torno das imagens do pinheiro, da pinha e do pinhão. Dentre os
símbolos e representações, o ideário regional foi o que produziu a aura de afeições da
população às terras paranaenses, bem como a construção do tipo ideal paranista - o
paranaense – que até então não se havia consolidado.
A criação simbólica exercida pelos idealizadores do movimento teve um reforço
bem considerável, tendo em vista que, segundo Pereira, ao falar em pinheiro devemos
remeter à Curitiba, cujo nome, derivado de curii que significa pinheiro, pinha, pinhão,
acrescido do sufixo tiba que indica abundância [...] a própria significação de Curitiba
possui ligação com o pinheiro, já que quer dizer “pinheiral” (PEREIRA, 1998, p. 141-
2). Certamente a estrutura paranista teve um forte alicerce, se levarmos em conta o fato
de seus símbolos sobreviverem até hoje nas obras de alguns artistas.
O escritor Romário Martins dedicou-se aos escritos e lendas indígenas, sendo
responsabilizado inclusive pela invenção de muitas lendas onde o índio e o pinheiro
eram os personagens principais. Muitas histórias e lendas sobre o Paraná foram
registradas em seu livro “Paiquerê”, editado em 1940, onde possui ilustrações de Guido
Viaro, Hélio Barros, De Bona e João Turin.
Na revista “Ilustração Paranaense” podemos identificar alguns poemas
relacionados ao pinheiro, dentre eles o artigo intitulado “Pinheiro” dedicado a Romário
Martins, onde os elogios não são poupados à ilustre árvore: Como és dadivoso e bom!
Quando o homem não te derruba a golpes de machado, e desdobra-te, e tortura-te nas
machinas de aço, tu, que lhe foste fructo e sombra, dás-lhe o tecto que protege, o berço
que acalenta, o leito que repousa, o ataúde que adormece (COLLAÇO, 1928. In.
42
Ilustração Paranaense, p. 19). A ilustração ficou por conta de Artur Nísio (1906-1974),
desenhista, gravador e pintor (imagem 01).
11
No próximo capítulo faremos um estudo mais aprofundado sobre os artistas plásticos ligados ao
Paranismo.
44
Cada símbolo traz em si uma significação que contribuirá para uma estrutura
possivelmente mais densa para o movimento. Neste ponto da pesquisa, necessário se faz
abordar um outro símbolo no Paraná que até agora não foi mencionado. Atualmente os
paranaenses reconhecem além do Pinheiro, da pinha, do pinhão, também a gralha azul,
como sendo seus símbolos regionais. Mas afinal, em que momento da história a gralha
azul acabou sendo inserida? Não se pode deixar de frisar que o pequeno animal,
segundo a tradição lendária, igualmente se faz responsável pelo plantio do majestoso
pinheiro, porém os inauguradores do paranismo, ou seja, seus elaboradores, não fizeram
referência à gralha azul em 1927, data marcada como efetivação do movimento.
Para Luis dos Anjos: Esta lei, na verdade, torna oficial o que já existia no
coração dos paranaenses: um sentimento de respeito à gralha-azul manifestado ao
longo de anos (ANJOS, 1995, p. 02).
Apesar de a Lei ter sido efetivada em 1984, a lenda da gralha plantadora já
existia há muito tempo. Luiz dos Anjos (1995), em seu livro “Gralha-azul: Biologia e
Conservação”, remonta a Eurico Branco Ribeiro a responsabilidade de ter publicado
literariamente pela primeira vez a lenda da gralha-azul em 1925, num livro de sua
autoria, “A sombra dos Pinheirais”, mais especificamente no capítulo “O plantador de
pinheiro”. Posteriormente, muitas publicações acerca da lendária ave foram
identificadas, reforçando ainda mais o mito que fora criado. Luis dos Anjos faz um
resumo da lenda escrita por Eurico nas seguintes palavras:
12
Site da SEEC – Disponível em:
http://www.cultura.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=15 -acesso 21 de outubro de
2008.
46
O pinheiro dá pinha
Pinha dá o pinhão
Gralha Azul leva no bico
Vai fazer a plantação
Vai fazer a plantação
13
No terceiro capítulo, quando iremos comentar sobre a produção plástica paranaense com símbolos
paranistas nos anos 90, teremos a presença marcante da gralha-azul e seu possível encargo para com a
preservação do pinheiro.
48
CAPÍTULO 2
agora mais positivo, foi a participação de Brasil Pinheiro Machado com textos e poemas
na “Revista Klaxon”. Há de se destacar algumas questões: a Semana de 22 não resultou
em nenhum impacto imediato no Paraná, mas não podemos esquecer que a partir da
Semana houve o desdobramento do Movimento Modernista Paulista e um de seus
inauguradores, enquanto Movimento, foi a “Revista Klaxon”, que veio a ressoar nas
terras paranaenses. O intelectual Brasil Pinheiro Machado foi um dos líderes do
Movimento Paranista, como visto anteriormente, mas não se deixou inebriar pela
maçante idéia regional e bebeu da modernidade paulistana, porém, no entanto, não foi
suficiente para introduzir o Estado nestes novos discursos estéticos. Outra faceta de
Machado é a maneira como ele se colocava perante as forças ideológicas que o
perpassavam, pois no Movimento Paranista foi destacada sua negação à rejeição ao
imigrante. Nos seus enlaces com o Movimento Modernista Paulista ele também se
resguardou de não ser colaborador da “Revista Festa”, que era Simbolista, fato que
ficou registrado no prefácio de seu livro. Falo na “Revista Festa”, porque embora
editada no Rio, é uma revista paranaense, terra a que pertence o autor desses poemas;
e quero deixar patente o nenhum contato entre ele e o grupo dos seus idealísticos
conterrâneos (SHMIDT, 2001, p.11).
Os esforços de poucos intelectuais no Paraná com as questões do Movimento
Modernista dentro da linguagem modernista paulistana pode-se dizer que acabaram
ficando isolados frente a uma permanência do Simbolismo na literatura e uma
exacerbação regional nas artes plásticas. Posteriormente algumas iniciativas foram
tomadas em virtude de aproximação do Movimento Modernista Paranaense dentro dos
ideais do Modernismo Paulista, porém isto só veio a consolidar-se no final da década de
40 e início de cinqüenta. A literatura tomou frente em uma nova proposta de renovação
com a publicação, em 1946, da “Revista Joaquim”, seguida pela renovação nas artes
plásticas com o grupo “Garaginha” em 1950-511. Estes dois movimentos foram os
veículos de tentativa de ruptura com as linguagens tradicionais que predominavam no
Paraná, inclusive contra os pensamentos paranistas. No campo da literatura, as idéias
“modernas” propunham às letras locais o fim do “Mito Emiliano”, referindo-se ao Poeta
Emiliano Perneta que possuía uma obra fortemente impregnada de um parnasianismo-
simbolista. Nas artes plásticas o grupo “Garaginha” desejava pôr abaixo outro mito, o
1
O grupo Garaginha levou esse nome por ter sido inaugurado na garagem da casa da artista plástica
Violeta Franco. Esse espaço foi tão freqüentado por artistas e intelectuais que acabou se tornando
pequeno, daí surgiu o nome Garaginha, batizado por seus freqüentadores.
54
2
A “Escola Profissional Feminina” foi oficializada em 08/08/1917, através do decreto nº 548 (Diário
Oficial/PR), em 1992 esta escola passa a denominar-se “Centro de Artes Guido Viaro” e em 2005 torna-
se o “Centro Estadual de Capacitação em Artes Guido Viaro”. Fonte: PARANÁ. Secretaria de Estado da
Educação. Departamento de Ensino Fundamental e Médio. Diretrizes Curriculares de Arte para os anos
finais do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. Curitiba: SEED, 2008.
56
3
Site – Museu Alfredo Andersen. Disponível em: http://www.pr.gov.br/maa/o_mestre.shtml acesso: 20
de abr. 2009 - 20:40.
57
4
O Impressionismo – 1874 (data da primeira exposição) a 1886 - foi um movimento artístico que rompeu
com muitas regras impostas pelas escolas acadêmicas, tendo como principal preocupação o efeito que a
luz solar produz na natureza. Com o surgimento da fotografia os pintores se sentiram libertos da
58
necessidade de copiar a realidade ou retratar pessoas, então, como faziam os fotógrafos, os artistas saíram
de seus ateliês e foram pintar o sol ao ar livre (BUENO, 2008. p.25). Para Gombrich, as novas teorias
não diziam respeito somente ao tratamento das cores ao ar livre (plein air), mas também das formas em
movimento (GOMBRICH, 1999, p. 517).
59
favorecidos, enfermeiro e farmacêutico, obra realizada por João Turin. O artista executa
a obra logo após seu retorno da Europa.
Na obra a “Caridade” (imagem 06) o tema principal adotado pelo artista é a
figura de uma jovem, uma jovem que transmite um semblante de Pietá renascentista,
em cada braço acolhe uma criança, como que se estivesse acolhendo o filho morto. Não
há pesar, nem tristeza aparente, seu rosto mantém uma harmonia com o fundo repleto de
folhas de erva-mate, as folhas nativas preparam-lhe um altar. Segundo Araújo, esta
mulher apresentada por Turin trata-se de uma jovem dotada de uma poética típica do
Pré-Rafaelismo, que se integra, harmoniosamente, a um fundo construído com as
nativas folhas da erva-mate (ARAÚJO. In: GAZETA DO POVO, 1994). Destacam-se
aqui, então, as folhas nativas da erva-mate, como uma expressão local. Há uma réplica
desta obra no pátio de entrada da Santa Casa de Misericórdia de Curitiba.
É importante salientar que esta obra não nos apresenta o pinheiro, tão pouco
seus pinhões e, no entanto, é reconhecida e atestada por Araújo como a primeira
“materialização plástica” do paranismo. Além do pinheiro, outros elementos da flora
local foram incorporados pelos paranistas, é comum encontrar em artes decorativas
denominadas paranistas os pinhões, elementos como folhas de café, erva-mate e outras
frutas. Segundo Elizabete Turin: além do pinheiro, ícone do “paranismo”, outros
elementos da flora paranaense, entre os quais a guabiroba, a pitanga, o Maracujá, o
café e o mate, fazem parte do estilo paranaense. Animais e índios também se incluem
(TURIN, 1998, p. 44).
O nome João Turin, bem como Lange de Morretes, são reconhecidos como
“paranistas de linha de frente”, pois em nenhum momento da literatura de arte
paranaense comenta-se o contrário. Porém há algumas contradições em relação a outros
artistas inseridos no movimento. Há certa discordância de autores no que se diz respeito
aos artistas Zaco Paraná e João Ghelfi.
Elisabeth Prosser afirma, ao falar do Paranismo: nas artes plásticas, seus
maiores representantes foram Ghelfi, João Turin e Lange de Morretes (2004, p. 154).
Esta autora comunga com o pensamento de Elizabete Turin, sobrinha-neta do escultor,
que alega em seu livro “A Arte de João Turin” serem estes três os artistas do paranismo,
portanto Zaco Paraná não estaria incluso. O professor Artur Freitas, concordando com
as autoras acima, declara que: Zaco Paraná retorna da Europa, em 1922, fixa-se no Rio
de Janeiro, longe de Curitiba e do Paraná. Zaco não participa do movimento5.
Geraldo Leão de Camargo, em sua tese de doutorado “Paranismo: Arte,
Ideologia e Relações Sociais no Paraná”, comenta:
5
Frase escrita a partir de uma anotação feita pelo Professor Artur Freitas em banca de qualificação no dia
08 de dezembro de 2008.
62
De acordo com o autor acima, a tríade de artistas paranistas não seria formada
por João Ghelfi, João Turin e Lange de Morretes, e sim por Zaco Paraná, João Turin e
Lange de Morretes.
Pereira, em um artigo, ao comentar sobre as reuniões dos artistas envolvidos
com o Paranismo, declara que os encontros aconteciam nas confeitarias como a
Confeitaria Esmeralda à Rua XV de Novembro e o Café Belas Artes. Nestes locais se
encontravam inúmeras vezes os expoentes máximos do Movimento Paranista, em
particular artistas plásticos como João Turin, Zaco Paraná e Lange de Morretes
(PEREIRA, 2000, p. 130). Concordando, portanto, com Camargo.
O mesmo autor, dois anos antes do referido artigo, em seu livro “Paranismo: O
Paraná Inventado; cultura e imaginário no Paraná da I República”, no capítulo sobre
“símbolos e imaginário”, inclui a participação de Ghelfi como destaque entre os artistas
do Movimento, destacando então, não três artistas e sim quatro, afirmando:
Imagem 07 - João Guelfi, João Turin e Zaco Paraná – Paris, antes da I Guerra. Imagem
Arquivo Casa João Turin.
Fonte: TURIN, Elizabete – A Arte de João Turin. 1998. p. 43.
Imagem adaptada pela autora.
várias gerações. Lange de Morretes relata sobre um dos encontros dos artistas paranistas
na referida tenda:
O velho atelier da Rua Marechal Deodoro, em Curitiba, que fora do
fotógrafo Volk, depois do pintor Andersen e mais tarde do pintor João
Ghelfi, era ponto central das reuniões dos intelectuais da cidade e dos
que a visitavam. Lá, certa vez, em vida íntima, três artistas discutiam
arte: Ghelfi, Turin e Lange de Morretes. Discutíamos sobre o
pinheiro, nas qualidades, dificuldades e nas novas possibilidades para
o campo da arte (MORRETES. In. ARAÚJO, 1974, p. 108).
O Atelier da Rua Marechal Deodoro foi realmente um dos pontos principais para
a consagração do Paranismo dentro das Artes Plásticas, as discussões sobre arte e as
qualidades visuais do pinheiro eram assuntos para horas de conversa. Lange de
Morretes, em sua obra “Uma Árvore Bem Brasileira”, faz exaltações ao pinheiro e,
segundo o artista, os artistas de modo geral e principalmente os artistas paranaenses
prestavam reverências à ilustre árvore:
Pinheiro é o nome que o povo lhe dá, o que os cientistas lhe dão é
Araucária Brasiliensis – Os artistas ao contemplá-la dizem com
respeito: “É o rei da floresta” Assim sendo, Lange continua a afirmar:
[...] Várias telas de pinheiros devemos ao pincel de Alfredo Andersen
[...]. Quase todos os artistas que pelo Paraná passaram ou lá se
fizeram: Bruno Lechowiski, Tonti, Guido Viaro, dedicaram telas ao
pinheiro. É natural que o filho da terra a ele fosse mais afeiçoado. Os
artistas paranaenses João Ghelfi, Gustavo Kopp, Waldemar
Fryesleben com óleos e Kopp com aquarelas (MORRETES. In.
ARAÚJO, 1974, p. 108).
Este relato nos alerta sobre a participação de João Ghelfi dentro do movimento
paranista, definindo-a como sendo essencial e marcante. A ele foi atribuído a criação do
delineamento da coluna paranaense, esboçada a carvão em uma parede de seu ateliê.
Dentre os artistas plásticos envolvidos no paranismo, Ghelfi foi considerado um
semeador, sua função dentro do grupo foi lançar a semente, a vida não lhe deu
oportunidade de vê-la crescer, provavelmente continuaria atuante se não fosse sua morte
repentina, antes mesmo da consolidação oficial do movimento paranista, faleceu em
Curitiba a 28 de agosto de 1925.
estudar. Seus pais não tinham condições de custeá-lo em outros centros, não havendo
outra alternativa senão aceitar a ajuda oferecida por François Gheur. Jan Zak vai habitar
em sua residência em Curitiba, e por ter apenas onze anos, seu protetor passa a ser
também seu tutor.
Aos quatorze anos Jan Zak ganha bolsa de estudos ofertada pelo Presidente do
Estado, Santos Andrade. Passa então a estudar na “Escola de Belas Artes e Indústrias do
Paraná”, a escola de Mariano de Lima, nesta mesma época passa a ser chamado de João
Zaco Paraná. De 1901 a 1903 cursa a “Escola Nacional de Belas Artes do Rio de
Janeiro”, mantendo-se ainda como bolsista.
Com o auxílio do governo paranaense e de seus amigos belgas, viaja para
Europa onde estuda na “Academia Real de Belas Artes”, em Bruxelas. Sob a orientação
do professor Charles van der Stappen, Zaco Paraná consegue premiações bem
significativas. Em 1908 recebe o primeiro prêmio em escultura conferido pela
municipalidade de Bruxelas. Em 1909 recebe o diploma de acadêmico e o prêmio de um
atelier na Academia, com as despesas pagas por um ano. Em sua permanência na
Europa participa de vários salões recebendo um número bem considerável de
premiações. É admitido na “Escola Superior de Belas Artes de Paris”, fazendo parte do
movimento cultural francês. Permanece neste país de 1912 a 1922 quando retorna ao
Brasil e se instala no Rio de Janeiro. Declarando que veio para ficar, naturaliza-se
brasileiro em 1923.
Recebe então várias encomendas sobre o centenário de Independência do Brasil,
dentre elas os dois grupos escultóricos “Ordem” e “Progresso” da fachada do Palácio
Tiradentes (prédio da Câmara dos Deputados) no Rio de Janeiro, capital federal na
época. É nesta mesma época que a colônia polonesa no Paraná faz a encomenda de um
monumento para homenagear o centenário da Independência. Zaco Paraná trabalha
então na elaboração de “O Semeador”, que será inaugurada em 1925. É principalmente
esta obra que dá a Zaco Paraná o título de paranista, pois atualmente esta escultura é
reconhecida como um dos grandes símbolos do movimento.
O jornal “O Dia” relata em vinte sete de setembro de 1923 a seguinte nota: O
Monumento da Colônia Polonesa – O Jovem escultor paranaense João Zaco Paraná
seguiu para o Rio a fim de modelar “O semeador” – Monumento que a colônia
polonesa oferecerá à Curitiba.
O “Diário da Tarde” - Curitiba, setembro de 1923 - faz um relato bem detalhado
a respeito da maquete da estátua, deixando a população ansiosa à espera do monumento:
67
conforto que ele moldou essa maravilha (DE BONNA, 1934. Apud
PEREIRA, 1998, p.156).
do pinhão desenhado, quase que central pendendo à esquerda do papel podendo até dar
uma alusão a um coração (imagem 10).
dirigiu uma fábrica, compôs uma estrofe, pintou um quadro, esculpiu uma estátua,
redigiu uma lei liberal, praticou a bondade (MARTINS, 1946, p. 91).
Atualmente a obra de Zaco Paraná é reconhecida como um símbolo paranista,
bem como seu autor, um colaborador do paranismo. Ainda que residindo no Rio de
Janeiro, não estando presente no período de efetivação do movimento, Zaco deu sua
parcela de participação, mesmo porque mantinha relações pessoais com Turin, o que
provavelmente lhe proporcionaria estar por dentro das discussões e andamento das
produções consideradas paranistas. A praça onde ainda se encontra “O Semeador”
continua sendo um local extremamente importante para a cidade. A Praça Eufrásio
Corrêa6 é conhecida popularmente como “Praça do Semeador”, possui também o busto
de Teixeira Soares, um dos engenheiros responsáveis pela construção da Estrada de
Ferro Paranaguá-Curitiba. O Movimento Paranista está visualmente circunscrito pelas
obras públicas restritas à capital, assim sendo o escultor Zaco Paraná deixou na cidade
sua colaboração aos ideais e pensamentos paranistas. David Carneiro resume seu
pensamento em relação à obra de Zaco Paraná: [...] e eu creio que do ponto de vista de
excelência de produção “O Semeador” dele, é uma obra perfeita (CARNEIRO, s.n.t).
Segundo Luis Afonso Salturi, Frederico Lange nasceu a cinco de maio de 1892,
numa cidade do litoral paranaense denominada Morretes. Iniciou seus estudos de
pintura com Andersen por intermédio de seu pai que, ao encontrar com o pintor no
Porto de Paranaguá vendendo suas pinturas a serem compradas, Rudolph Lange,
admirador de arte, não só comprou as telas de Andersen como decidiu convidá-lo para
retratar seus filhos, onde os mesmos passaram a ter aulas com o artista, com um
destaque bem acentuado de Frederico.
6
Inaugurada em 1912 faz uma homenagem a Manoel Eufrásio Corrêa, irmão de Ildefonso Corrêa, o
Barão do Serro Azul. A praça encontrada em frente à Estação Ferroviária (inaugurada anteriormente em
1885), considerada um núcleo importante de Curitiba, acolhia um grande número de pessoas, passageiros
em transição da linha Curitiba ao Porto de Paranaguá e principalmente pela chegada de imigrantes. Um
dos locais mais movimentados da cidade na época acolheu a obra “O Semeador”. Local nobre para o
monumento, sendo o monumento não menos importante para a localização. Tudo foi devidamente
pensado, direcionado, calculado.
72
Lange de Morretes manteve sua lealdade a Morretes, sua terra natal, da mesma
maneira que o pinheiro nunca saiu de seus pensamentos. Sua preocupação em estudar os
variados tipos de pinheiro, os aspectos de acordo com a idade ou em relação ao habitat,
enfim, tudo o que seria relacionado ao pinheiro, sua forma, sua espécie, era motivo de
pesquisa e estudo para Lange, chegando a declarar que:
Estado. Segundo ele, a estilização foi decorrência de muito estudo, muitas horas de
desenho e empenho para chegar a uma definição final.
Esse empirismo relatado por Lange estaria relacionado à maneira com que os
artistas, incluindo Turin, haviam reproduzido o pinheiro, ou seja, com base nas
observações do mundo, de maneira “tradicional”. Para Lange, o pinheiro deveria ser
explorado de outras maneiras, como um cientista.
Não satisfeito com a maneira com que o pinheiro, sua grande preocupação,
estava sendo representado, ou seja, de modo empírico, Lange começa um trabalho de
pesquisa com base nas propriedades do pinheiro, onde sua inquietação girava em torno
do pictórico e do ilustrativo, tendo como referência a geometrização e a ciência.
O artista, no artigo “O Pinheiro na Arte”, confessa lamentar não ter fixado data
da descoberta da fórmula para a forma plana, supondo ter sido em maio de 1930, pelo
fato da revista “Ilustração Paranaense”, em 31 de julho de 1930, ter reproduzido um
desenho seu com o título de “Depois da Tormenta” (imagem 16), apresentando uma
moldura fúnebre com pinhões geometrizados. A aplicação da estilização de Lange em
“Depois da Tormenta” nos mostra uma execução do trabalho de Lange em artes
gráficas. Segundo Salturi, para compor esse desenho, ele conciliou seus estudos sobre a
estilização do pinhão e do sapé com seus conhecimentos acerca da representação da
figura humana do início de sua carreira, em sua maioria retratos e estudos de nu
(SALTURI, 2007, p. 137).
Silveira Neto7
A pintura de Lange de Morretes nos revela uma íntima relação entre o autor e a
obra. Suas telas nos mostram a liberdade de expressão e ao mesmo tempo a fidelidade
para com seus temas. Tanto quanto na produção de artes gráficas, podemos notar na
pintura que seus estudos sobre anatomia e proporções do pinheiro foram explorados em
todos os aspectos, percebemos também que a preocupação com a luz é constante,
principalmente quando em relação ao pinheiro. O artista nos revelou que passava horas
em profundo contato com a natureza, com os pinheiros, falei muito com pinheiros [...]
7
LEITE, José Roberto Teixeira. Dicionário crítico da pintura no Brasil. Rio de Janeiro: Artlivre, 1988.
Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/ enciclopedia_IC/index.cfm? fuseaction=
artistas_criticas&cd_verbete=2418&cd_item=15&cd_idioma=28555. Acesso em: 27 de abr. 2009.
77
guardei segredo que êles me revelaram (MORRETES, 1953, p. 168). Este “estar na
floresta” nos remete ao impressionismo, pois neste movimento o artista, necessitando de
maiores estudos sobre os efeitos da luz e da cor, deixa de lado seu atelier e sai em busca
de mudanças e novas visões. Outra coisa que remete Lange a este movimento é o fato
de fazer na pintura seqüências de telas de pinheiros, pois o artista nos mostra que uma
só árvore pode se modificar em diferentes momentos do dia ou em diferentes estações
do ano. Porém Salturi prefere não classificar Lange como impressionista, pois segundo
o autor o artista ultrapassa esta classificação.
Lange de Morretes, em alguns quadros, fez a feliz harmonia entre os nus que
havia estudado e paisagens com pinheiros. Em telas de dimensões avantajadas, o artista
reuniu a representação da figura humana, bem como a representação pictórica do
pinheiro.
A tela “A Natureza” (imagem 19) apresenta uma mulher nua deitada sobre um
gramado com variedades de tons verdes, pincelado com vermelhos e laranjas. A mulher,
que pode ser comparada à “Vênus de Urbino”, de Ticiano ou “Maja Desnuda”, de Goya,
possui a pele rosada com tons amarelos, a cabeça voltada para o horizonte, ou seja, para
80
Podemos compará-la a uma “deusa Vênus”, devido à sua posição muito comum,
onde se destacam os seios, o quadril, as pernas cruzadas e deixa à mostra a púbis. Duas
borboletas em tons amarelos voam sobre a mulher. O céu, em segundo plano, nos
mostra um tom azul que é interrompido com nuvens bem claras. Um pinheiro se
apresenta à esquerda com variações de galhos altos e baixos, onde se pode observar por
trás de um dos galhos uma cachoeira, seguida de uma montanha um pouco mais à
esquerda. À direita da tela há uma pequena montanha com uma palmeira, onde se pode
observar uma entrada d’água. Na moldura podemos encontrar nos cantos o relevo dos
pinhões estilizados por Lange.
81
Segundo Salturi, esta tela está carregada de simbologia que pode ser interpretada
além das aparências. O autor afirma que Lange de Morretes pode ter utilizado a
natureza, bem como a figura feminina, para representar alguns elementos da paisagem
paranaense, assim como o próprio Estado:
Vale ressaltar que a mulher em posição de deusa grega pode ser interpretada
como sendo o próprio Estado do Paraná, ou uma alegoria à natureza do mesmo. Assim
sendo, nesta mesma linha, podemos observar a obra “Alma da Floresta” (imagem 20).
8
Ana Letícia Genaro. Especial para a Gazeta do Povo. João Turin, precursor da escultura no Paraná.
Publicado em 15 de Abr. 2009. Disponível em:
http://portal.rpc.com.br/gazetadopovo/ensino/conteudo.phtml? id = 877253. Acesso 27 de Jun. 2009.
84
9
TURIN, João. A arte decorativa no Brasil. Folheto da Casa João Turin, s/d, SEEC/Pr. Centro de
Pesquisa do MAC/PR.
85
Turin teria uma proposta de criação artística que estivesse liberta das “receitas”
estrangeiras, daí a indicação de se trabalhar com os elementos naturais do Paraná.
Porém, podemos identificar que, em seus estudos, bem como em suas produções, o
escultor buscou inspirações na arte clássica, talvez para estruturar uma idéia de que
mesmo o clássico poderia receber uma nova “roupagem”, no caso paranista. Ou,
segundo Pereira, para reforçar os pensamentos paranistas de que, ao se revestir de um
caráter de antiguidade clássica, estaria reafirmando o discurso histórico onde se
acreditava que o imaginário popular carecia de retorno às antiguidades. Segundo
Pereira:
Portanto, retornar ao clássico nas artes plásticas poderia ser um recurso também
de reafirmação do Movimento Paranista, pois as colunas criadas por Turin visualmente
retrocediam ao passado, como que reforçando o discurso de que a antiguidade seria o
melhor alicerce para a identidade que estava sendo criada.
João Turin, inspirando-se na coluna grega, “criou” a coluna paranista, bem como
a ânfora, ambas adornadas com as pinhas e pinhões, que seriam características do
movimento. Ao observar a imagem 22 identificamos uma ânfora em bronze em forma
de pinhão, trazendo na parte superior uma seqüência de pinhões estilizados em
tonalidades de marrons, seguido de uma folha central em verde adornada com sementes
de café em tons de marrons claros num fundo em tom de bege. Uma faixa decorativa se
inicia no centro do objeto para baixo, com seqüência de folhas e sementes de café em
tons de verdes e marrons, na parte inferior outra fileira de três pinhões em tons marrons
e um agrupamento de sementes também em tons de marrons finalizam e encostam-se à
base retangular, na lateral, simetricamente dois pinhões maiores. Na imagem 23
podemos fazer a comparação da ânfora paranaense à ânfora grega, e assim termos idéia
de onde Turin se inspirou. A ânfora grega geralmente possuía uma forma ovóide e duas
alças simétricas, diferenciando-a da ânfora de Turin, a mesma também pode ser
reconhecida como vaso e era utilizada para abrigar líquidos.
Imagem 22 - Ânfora Paranaense – João Turin Imagem 23 - Ânfora Grega- Período Pré-
Escultura em Bronze não datada Homérico (XX a.C. - XII a.C.) Disponível em:
Casa João Turin http://www.conecteeducacao.com/escconect/me
Foto: Luciana Barone dio/his/HIS03020100.asp. Acesso: 15de Mai.
2009.
87
ser observado claramente na presença de pinhões e pinhas expostos como que numa
colagem na estrutura da coluna, que agora passa a ser coluna paranaense. Para Irã
Dudeque, a idéia de se criar uma diferenciação para o Paraná era na verdade uma
necessidade de mostrar que este Estado tinha uma cultura, um símbolo. Para este autor,
o Paranismo seria:
pinhões e uma faixa com folhas já fazendo um acabamento. No segundo a parte superior
apresenta uma composição periódica de pequenos pinhões, um espaço vazio
razoavelmente grande, e depois seqüências de faixas, sendo uma com muitas folhas,
outra com pequenas pinhas e grupos de pinhões e uma terceira de pinhões.
Dudeque afirma que a construção da coluna paranista, partiu do desenvolvimento
da ordem jônica com simplificações do pinheiro e adaptações encaixadas nas receitas
corriqueiras dos estilos arquitetônicos. A ordem jônica, como podemos constatar na
imagem 27, possui formas mais rebuscadas que a ordem dórica, apresentando faixas
horizontais, o capitel também apresenta elementos decorativos inspirados em formas
orgânicas como vegetais ou ainda em penteados femininos. Irã Dudeque afirma que
poucas eram as regras de construção da coluna paranista e que o escultor João Turin não
apresentou todas as proporções, o artista apenas registrou que:
O autor nos alerta que no período da década de 20 o que poderia ser considerado
“moderno” seria a arquitetura sugerida pelas vanguardas européias. Contudo, João Turin
quando propõe a arquitetura e a decoração paranaenses, também tinha uma intenção de
“moderno”, porém dentro das propostas de se aproveitar o que já se considerava
consagrado inserindo “novidades” características do Paraná. João Turin relatou em seus
escritos sobre arte decorativa no Brasil que os arquitetos não se davam o trabalho de
olhar para a flora mais rica do mundo e que nela existiam elementos para se fazer
criações originais e modernas.
Podemos perceber que o artista tinha exata consciência do que estava fazendo,
propondo inclusive aos arquitetos que buscassem exemplo nas idéias dos gregos ou
outras civilizações que encontraram em seus elementos naturais motivos para suas
criações. É o que nos afirma o texto a seguir:
João Turin afirmava ainda que o pinheiro em si, já se tratava de uma coluna
maravilhosa, no entanto, para se igualar às colunas da Grécia, Roma ou Egito, era
necessário orná-la com suas folhas e frutos. O artista trabalhou no “estilo” denominado
paranaense ou paranista incansavelmente, e afirmava ter sido o criador do mesmo,
descartando as idéias impostas vindas da Europa. A idéia de desenvolver este “estilo” na
arquitetura e decoração no Paraná levou João Turin a elaborar inúmeros projetos e
estudos arquitetônicos e decorativos, em que alguns deles chegaram a ser executados. O
artista dizia que estava nas mãos do arquiteto em convencer um cliente em aplicar um
determinado “estilo” em uma construção, dizendo até que achava bem fácil convencer
um homem que passou a vida trabalhando só para enriquecer e que de arte não entende
nada, aceita tudo o que o arquiteto lhe propõe. Visto não saber distinguir o moderno do
antigo, tudo está na vontade do arquiteto e nada mais (TURIN, s.n.t).
Assim sendo, a sede antiga do Clube Curitibano situada na Rua XV de
Novembro foi o local que abrigou uma “sala paranista”. Esta sala, denominada Salão
Paranaense, possuía uma ornamentação elaborada por Turin em 1928 e aprovada por
Ulisses Vieira, na época presidente do Clube Curitibano.
Como podemos observar nas imagens 28, 29 e 30 o teto todo adornado possuía
pinhões entalhados e pinturas com arte decorativa indígena, onde a flora paranaense foi
detalhadamente lembrada. As paredes com desenhos de pinhões e folhas em formato de
flores, seqüências de faixas decorativas com pinhões entalhados seguidos de faixas
pintadas, fizeram toda margem das paredes inclusive acompanhando as colunas,
também decoradas.
92
Segundo Pereira, João Turin foi quem mais se esforçou pela revelação dos
motivos paranistas, o autor afirma que o artista chegou a criar uma arte paranaense com
certa relação com o art déco, que serviu tanto para divulgar como para enfeitar os
pensamentos paranistas.
Imagem 31 - Casa Ateliê - Modelo entrando no ateliê – Foto: Djalma Badaró Braga, 1948.
Acervo: Casa João Turin. Fonte da imagem: TURIN, Elizabete – A Arte de João Turin. 1998, p. 80-1
Imagem adaptada pela autora.
95
Imagem 32 - Casa Ateliê - Rua Sete de Setembro esquina com Cel. Dulcídio (Demolido na dec. 50).
Foto: Domingos Foggiato. Acervo: Casa João Turin.
Fonte da imagem: TURIN, Elizabete – A Arte de João Turin. 1998. p. 47-48
Imagem adaptada pela autora.
Por outro lado, os adornos de pinhões podem também ser enquadrados como
fazendo parte de um Art Nouveau, e não do Art Déco como sugeriu Pereira. O Art
Nouveau é um estilo floreado, onde as linhas curvas e as formas orgânicas se destacam e
sua composição normalmente provém de folhagens e flores. Podemos perceber as
formas orgânicas em feitio de pinhas e pinhões expostos na casa do Dr. Bernardo Leinig
nas imagens 33 e 34, projeto de João Turim. Já o Art Déco, em uma maneira bem
modesta de definição, apresenta seus desenhos de aspecto simples, a simplificação das
formas seria sua principal característica, linhas bem precisas, talvez a única relação
possa ser os ornatos geométricos ou a estilização dos padrões naturais.
96
Imagem 34 - Casa do Dr. Bernardo Leinig (outro ângulo). Acervo da Casa João Turim, Curitiba.
Foto: Arthur Valle 2008, p. 05. Imagem adaptada pela autora.
97
Diante destas imagens, fica difícil classificar a obra de Turin num determinado
estilo, pois a idéia do artista seria “criar” um estilo, o “estilo paranaense”. Em seus
escritos podemos conferir que ele próprio afirma ter criado a base do referido estilo.
Nesta afirmação João Turin não só declara sua intenção em instituir um “estilo”
como também afirma tê-lo criado, e que sua base estava no pinheiro. Em vários
momentos de seus escritos afirmou ser o pinheiro a grande inspiração de seus trabalhos
e propunha ainda que os demais artistas e decoradores fizessem a mesma coisa. A flora
paranaense estava explicitamente agregada nas criações de Turin, bem como a faixas
inspiradas nas produções indígenas, o próprio índio, as esculturas de animais e
elementos decorativos com frutas e flores.
João Turin nos apresenta um projeto que ainda não foi concretizado, trata-se de
um estudo para um “Chafariz Paranaense” (imagem 35), onde a escultura de um índio
se apresenta ao centro sobre uma base de composição periódica de pinhões, e toda
estrutura da fonte se encontra adornada com pinhões e folhas em formas de faixas
decorativas. Novamente, alia arquitetura e escultura dentro do que seria para ele o ideal
paranista.
98
10
A análise da capa da revista “Ilustração Paranaense” trata-se de uma parte de um trabalho referente à
disciplina “Leitura de Imagens na Educação”, que, através de uma abordagem dentro da Semiótica
discursiva, segue o modelo de leitura de imagens sugerido pela Professora Dra. Sandra Regina Ramalho e
Oliveira – UDESC.
100
oferece uma composição periódica de pinhões na altura dos ombros e folhagens verdes
que descem nos quadris. Abaixo, uma faixa decorativa de pinhões e no barrado formas
de pinhões fazem o acabamento.
Imagem 38 –círculos - esquema Luciana Barone Imagem 39– triângulos – esquema - Luciana
Barone
Uma sombrinha, utensílio muito utilizado na década de 20, também foi esboçada
por Turin em forma de pinheiro. Nas imagens 44 e 45 podemos observar o objeto que,
aberto, tem o formato de um pinheiro e sua decoração é feita com formas geométricas e
seqüências de pinhões, adornos que se repetem em todos os trabalhos que são
característicos do chamado “estilo paranaense”.
103
pinhões estilizados por Lange de Morretes não faz idéia do que há por trás destas
produções e desconhecem sua história. No próximo capítulo iremos identificar o que
restou, em termos de artes visuais, deste movimento após as décadas de 20 e 30.
105
CAPÍTULO 3
APÓS AS DÉCADAS DE 20 E 30
106
2
Disponível em: (www.curitiba.pr.gov.br/pmc/curitiba) Acesso: 20 de Mai. 2009
3
Disponível em: (www.fundacaoculturaldecuritiba. com.br/leidoincentivo/index.asp) . Acesso 20 de Mai.
2009.
109
4
Disponível em: (http://www.psg.com/~walter/curitiba.html). Acesso: 20 de mai. 2009.
110
sobre nossa história, e muitas vezes divulgam noticiários que não são próprios das
raízes paranaenses. Segundo ela, muitos enganos históricos já aconteceram. Rosely
segue questionando se esses enganos poderiam ser sanados caso houvesse mais estudos
sobre a história da cultura paranaense, ou se estas informações fossem apreendidas nas
escolas e universidades paranaenses, em programas educacionais sobre a história, sobre
o povoamento e as diferenças regionais. Por fim, a autora pergunta se a população está
realmente preparada para comemorar e valorizar os trezentos anos da cidade.
5
O evento, promovido pela Secretaria de Estado da Educação – SEED - foi realizado no período de
28/04/2008 a 30/04/2008 e reuniu 120 (cento e vinte) participantes, sendo eles professores da Rede
Pública Estadual com formação nas áreas de Música, Dança, Artes Visuais ou Teatro, e atuantes como
docente de 5ª a 8ª séries, Ensino Médio, Ed. Especial ou Educação de Jovens e Adultos. O curso
congregou professores de todas as regiões do Estado do Paraná, sendo que as vagas foram divididas em
grupos por Núcleos Regionais de Educação, no qual cada núcleo teve a participação de um determinado
número de representantes. Como podemos constatar nas cidades e participantes a seguir: Apucarana (03),
AMN – Colombo (08), AMS - São José dos Pinhais (08), Assis Chateaubriand (03), Campo Mourão (03),
Cascavel (03), Cianorte (03), Cornélio Procópio (04), Curitiba (10), Dois Vizinhos (03), Foz do Iguaçu
(03), Francisco Beltrão (03), Goioerê (03), Guarapuava (03), Irati (03), Ivaiporã (03), Jacarezinho (04),
Londrina (04), Maringá (04), Ibaiti (03), Loanda (03), Paranaguá (04), Paranavaí (03), Pato Branco (03),
Pitanga (03), Ponta Grossa (04), Telêmaco Borba (03), Toledo (03), Umuarama (03), União da Vitória
(03), Wenceslau Braz (04), Laranjeiras do Sul (03).
6
A palestra foi ministrada pela autora deste trabalho, Professora Luciana Estevam Barone Bueno.
112
como a gralha azul. A resposta da segunda questão foi bem diversificada entre: - Porque
tem muito pinheiro no Paraná; – Porque só tem o pinheiro araucária no Paraná; –
Porque a gralha planta o pinheiro nas terras paranaenses. A terceira pergunta foi a
mais discutida, pois eram poucos os professores que sabiam sobre o Paranismo, destes
poucos, a maioria era da cidade de Curitiba.
O resultado foi surpreendente, porém esperado. Os professores reconheciam os
símbolos paranaenses, em geral em todo Estado, mas ignoravam a história, confirmando
a declaração de Dudeque, a pregação paranista foi tão bem sucedida que os
curitibanos” podemos acrescentar ainda, que os paranaenses, “esqueceram que houve
um movimento paranista, e repetem que o pinheiro é o símbolo do Paraná (DUDEQUE,
2001, p. 70). Os professores reconheciam o pinheiro, o pinhão e também a gralha como
símbolos do Paraná, mas não sabiam sobre o Paranismo, pelo menos até aquele instante.
Muitos foram os questionamentos sobre o assunto durante a explanação e também ao
término da palestra, ou seja, algumas pessoas não acreditavam que mesmo morando
tanto tempo no Estado do Paraná, nunca haviam ouvido falar no Paranismo.
A população que pisa nas calçadas pouco sabe da história que elas contam. Os
desenhos presentes em cada pedra dos calçamentos curitibanos nos remetem a um
passado que os paranaenses perdem por não conhecer. A fórmula de Lange de Morretes,
ou seja, a estilização da caruma, bem como dos pinhões, foi parar nas calçadas de
Curitiba, em tom de vermelho castanho, preto e branco, em petit-pavé – nome francês –
também conhecido como “mosaico português”.
Vasconcelos em seu livro “Calçadas de Curitiba: preservar é preciso” faz um
estudo sobre as calçadas curitibanas, bem como os desenhos das mesmas, classificando-
os em grupos de influências: portuguesa, Art Nouveu, Art Déco, Paranista e Indígena.
Segundo Vasconcelos, o mosaico português surgiu no século XIX e foi introduzido no
Brasil no começo do século XX. Em Curitiba a autora afirma que, de origem italiana, a
primeira empreiteira a trabalhar com o calçamento foi a da Família Greca, e através de
uma citação de Rafael Greca de Macedo, a autora alega que no final dos anos 20,
113
Imagem 49 - Praça Osório, desenho de Lange de Morretes ao redor do relógio. Petit-pavé vermelho
castanho. Fonte: VASCONCELOS, 2006, p. 30. Imagem adaptada pela autora.
Salturi afirma ainda que remetem aos originais de Lange de Morretes o desenho
pintado no pátio da Reitoria da Universidade Federal do Paraná e o petit-pavê da
calçada da Praça do Rio Iguaçu, próxima ao Palácio. Segundo o autor, trata-se de uma
rosácea grande, construída a partir da fórmula do pinhão, parecida com a Pinha-dos-
Ventos (imagem 51) da calçada do cruzamento da Rua XV de Novembro com a Rua
Barão do Rio Branco.
A capital ainda está repleta de calçadas com estes elementos em diversos locais
como a Av. Luiz Xavier, a Rua XV de Novembro, Praça Santos Andrade, onde é
possível encontrar os desenhos em forma de pinhões, pinhas e pinheiros inspirados em
Lange de Morretes e no Movimento Paranista. Na imagem 53 detectamos a rosácea de
pinhões e o pinheiro dividindo a mesma calçada.
Imagem 53 - Praça Dr. João Cândido. Calçada externa com motivo paranista. Petit-pavé preto e branco.
Fonte: VASCONCELOS, 2006, p. 73. Imagem adaptada pela autora.
117
Imagens 57 e 58 - Memorial de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais - Maria Inês Di Bella – 1993.
Foto: Luciana Barone.
mesmo, juntamente com seus alunos da “Escola de Belas Artes”, projetar e construir seu
próprio caixão em forma de pinhão.
escultura que sugere uma cortina e envolve o jazigo, em forma de panos, que segue a
partir da porta central e desce por toda construção.
Imagem 59 - Túmulo da Família Stenghel – Cemitério São Francisco de Paula - Cemitério Municipal de
Curitiba – Foto: Luciana Barone.
Imagem 62 e 63 - Escada externa com acabamento com pinhas e Placa de indicação das portas –
Centro Cultural Solar do Barão – situado à Rua Presidente Carlos Cavalcanti, 533. Curitiba.
Foto: Luciana Barone
123
Para Edson havia um contraste entre o pinheiro e o pinhão, pois ambos são
símbolos que ao mesmo tempo em que representam uma simplicidade, também trazem
uma extraordinária sofisticação e nas mãos do decorador Paulo José Marcelli estes
elementos tornaram-se uma composição muito bonita.
A idéia de reunir motivos paranaenses na decoração do shopping foi uma
homenagem ao Paraná por parte dos empreendedores Alfredo e Virgínia Gulin, que
possuem suas raízes no Estado. O resultado foi uma união de gralhas azuis, pinheiro e
pinhões. O piso foi feito em granito e adornado com pinhões em madeira, numa
124
Dois painéis em relevo podem ser encontrados, sendo um com três pinheiros e
um pano de fundo que sugere um pôr do sol, ao lado esquerdo do visitante (imagem 67),
e o outro com folhas e frutos de café (imagem 68) que compõe o lado direito da entrada
principal do shopping.
Imagem 66 - Calçada de entrada do Champagnat Shopping com estilizações de pinhões nos petit pavés
em preto e branco. Painel esquerdo de pinheiros em relevo. Foto: Luciana Barone.
126
A mobília com pinhões estilizados, mesmo que em com poucas peças, ainda
pode ser encontrada, com uma influência art decô e detalhes em latão dourado ou na cor
do próprio pinhão. São exemplos o pinhão do balcão de informações da entrada
principal (imagem 71) e os pequenos adornos dos encostos ou laterais de bancos e
cadeiras (imagens 72, 73 e 74).
Imagem 77- Urna Paranista. Arca dos 300 Anos. Fonte: Gazeta do Povo. Suplemento Viver Bem.
Curitiba, 27 de junho de 1993. Imagens adaptadas pela autora.
132
Este trabalho apresentado pela designer Suelli Zavvadinack deixa explícito que
as idéias de Turin em relação à moda e adornos com elementos simbólicos no Paraná
não ficaram guardados na gaveta da década de 20. As propostas de Turin aparecem
também na moda, mesmo que demorando certo tempo, vieram fazer parte da vida
comum dos paranaenses, ou pelo menos dos curitibanos. As peças da desenhista foram à
venda em algumas lojas da cidade, podendo então ser acessadas por todos.
133
8
No www.videolog.uol.com.br é possível encontrar vídeos com desfiles do “Prêmio João Turin”, onde na
abertura há uma decoração com uma rosácea inspirada nas estilizações de Lange de Morretes.
9
Disponível em: www.utp.br/noticias. Acesso: 25 de Mai. 2009.
134
Imagens 84 e 85 - Troféu “Prêmio João Turin” de incentivo a novos designers. Valdir Francisco.
Casa João Turin – Foto: Luciana Barone
10
Depoimento gravado para o projeto Memória História do Paraná - Texto de Aramis Millarch (publicado
originalmente no Tablóide – Almanaque do Jornal “Estado do Paraná” em 02/04/1991 p. 20). Disponível
em: http://www.millarch.org/artigo/artes-amores-de-violeta-rebelde. Acesso: 17 de Nov. 2008.
136
A autora afirma que profundamente ligado às raízes locais, com esta proposta
Wilmar comprova a contemporaneidade da temática voltada à ecologia, ao misticismo
e ao resgate da memória local (INDÚSTRIA E COMÉRCIO, 1987).
O Curitibano Wilmar Nascimento desenvolveu um trabalho a partir de pesquisas
com materiais reciclados e nativos coletados de Curitiba ao litoral de 1976 a 1981,
quando entrou em contato com a pesquisa sobre o Movimento Paranista realizada pelo
Museu de Arte Contemporânea, constatou que sua obra estava relacionada com o
mesmo, motivo pelo qual o levou a organizar a mostra sem ufanismo exacerbante, mas
com a visão de quem, voltando ao passado, encontra semente germinando futuro fruto
maduro, declarou o artista no catálogo da exposição.
Marisa Bertolli, a propósito da instalação de Wilmar, declarou que se lembrou
de Umberto Eco: uma obra aberta enfrenta plenamente a tarefa de oferecer uma
imagem da descontinuidade: não a descreve, ela própria é a descontinuidade11 (MAC,
1987). A autora prossegue dizendo que a exposição iria decepcionar aos que esperavam
encontrar estilizações precisas do repertório paranista, como podiam ser observadas nas
calçadas, tampouco encontrariam relevos alegóricos, a paisagem era ausente.
Infelizmente não consta nos arquivos do Museu de Arte Contemporânea imagens que
pudessem apresentar um pouco do conteúdo desta exposição visualmente, apenas o
cartaz está disponível, assim como da exposição “Resgate Icongráfico/Paranismo”.
Uma das artistas que expôs suas obras na mostra “Resgate
Icongráfico/Paranismo”, como podemos constatar na lista de participantes, merece um
destaque neste trabalho, pois a gaúcha Lirdi Jorge, atualmente professora da Faculdade
de Artes do Paraná (FAP), desde os anos 80 desenvolveu sua carreira como escultora,
tendo o Paranismo como seu principal tema. A artista compôs muitas obras esculpindo
sementes de milho e café, e principalmente com pinhões. Em uma entrevista para a
“Folha do Paraná” em 1999 declarou que ainda trabalho muito as composições, em
especial, com pinhões estilizados em vários tamanhos que resulta num trabalho leve e
gostoso (CARNEIRO. In: Folha do Paraná, 1999)12.
Nas imagens 89, 90 e 91 temos uma escultura de grãos de café que faz parte da
série “Cafés”, são grãos de cafés esculpidos em cerâmica organizados de maneira que
matêm um equilíbrio e uma harmonia estável. As duas imagens seguintes são partes da
11
Texto da exposição “Neo-Paranista”. Arquivo Mac- 1987.
12
Elisa Marília Carneiro, Folha do Paraná, 19 de fevereiro de 1999.
138
Imagem 92 - A Gralha Azul Escondida... (1982). Dimensões 38x24x18; Imagem 93 - Vamos ajudar a
gralha - Lirdi Jorge - Esculturas em Cerâmica. Fonte: Arquivo Mac.
139
13
Transcrição do depoimento de Sérgio Monteiro de Almeida à autora Luciana Barone, em 08 de maio de
2009. Via Online.
140
Imagem 94 - Sérgio Monteiro de Almeida. Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de
Curitiba". Estudo para Instalação. Fonte: ALMEIDA, 2009.
Imagem 95 - Sérgio Monteiro de Almeida. Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de
Curitiba" - Instalação - Material: vidro, papel, parafina, carimbo. Dimensões: 3 m² Ano: 1993.
Fonte: ALMEIDA, 2009.
141
Almeida nos alerta sobre o fato das pessoas caminharem nos petit-pavés e não
saberem sobre suas raízes históricas. Através de sua obra, pôde proporcionar à
população uma alternativa de conhecimento, de aprendizagem, além de apreciação
visual. Por este motivo o projeto levou o título de “Resgate”. O fato das gravuras
estarem em recipientes de vidro fechados, se mantêm, portanto, “Preservadas”, e a partir
do momento em que as pessoas passam e terem consciência do significado das rosetas,
“há a preservação da memória”. Cada ano da história de Curitiba foi resgatado e
preservado na representação de cada garrafa. Na imagem 96 temos uma vista lateral e
colorida da instalação. Nesta podemos ter uma idéia mais esclarecida de como as
garrafas foram organizadas, bem como sua relação com o piso, rodapé e a porta ao
fundo, estes elementos num conjunto harmonioso ressaltam a qualidade do trabalho.
Esta instalação participou posteriormente do “50° Salão Paranaense” em 1993.
O artista revela que a crítica de arte Adalice Araújo comentou em matéria sobre o salão
na Gazeta do Povo que de forma conceitual Lange de Morretes estava presente no 50°
Salão Paranaense (ALMEIDA, 2009).
A obra poderá ser exposta em outros momentos, porém em cada vez que isto
acontecer ela deverá ser atualizada. O número de garrafas carecerá sempre ser
respectivo à idade de Curitiba, as gravuras que compõem o interior das mesmas serão
impressas em papel vermelho, da mesma forma que as etiquetas receberão um carimbo
de "Memória - Atualizada".
142
Imagem 96 - Sérgio Monteiro de Almeida. Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de
Curitiba" - Instalação - Material: vidro, papel, parafina, carimbo. Dimensões: 3 m² Ano: 1993.
Fonte: ALMEIDA, 2009.
Imagem 97 - Sérgio Monteiro de Almeida - Álbum de gravuras. Projeto "Resgate & Preservação da
Memória: Pedras de Curitiba" - Fonte: ALMEIDA, 2009.
Imagem 98 - Sérgio Monteiro de Almeida - Intervenção urbana / performance. Projeto "Resgate &
Preservação da Memória: Pedras de Curitiba" - Local: Rua XV de Novembro, Curitiba, PR (1994).
Fonte: ALMEIDA, 2009.
144
A quarta fase do projeto de arte conceitual ainda não foi realizada, porém o
artista nos fez um relato do que pretende. Será efetivado com o papel impresso do
padrão das pedras da Rua XV de Novembro (imagem 99) e terá o título de Projeto
"Resgate & Preservação da Memória: Pedras de Curitiba-Difusão da Memória”. A idéia
é reproduzir por flexografia do padrão obtido com o decalque das pedras da Rua XV de
Novembro, em bobinas de papel reciclado. Este papel será vendido em metros. A
intenção é as pessoas possam comprar e levar para casa metros da Rua XV, assim,
segundo o artista, os compradores estarão preservando e difundindo a memória da
cidade. Todas as fases do projeto nunca foram expostas juntas, exceto no livro de Sérgio
Monteiro de Almeida.
Imagem 99 - Sérgio Monteiro de Almeida. Papel impresso com pedras da rua XV: Difusão da Memória.
Projeto "Resgate & Preservação da Memória: Pedras de Curitiba".
Fonte: ALMEIDA, 2009.
de Poty puderam ser apreciadas, este artista também fez parte das reuniões do “Grupo
Garaginha” (1950-51). Neste período os artistas plásticos como os “joaquins” viviam –
do ponto de vista filosófico – as angústias provocadas pela perplexidade da Segunda
Guerra. Tal evento acabou colocando a comunidade artística paranaense sujeita aos
embates políticos internacionais. Além do mergulho sobre o choque de uma guerra, os
artistas paranaenses, dentre eles Poty, foram tocados pictoricamente sobre os dramas do
conflito mundial e se inseriram em representações pictóricas regidas pela linha
expressionista. O Expressionismo marcou o futuro da arte paranaense, principalmente
naquele período de pós-guerra, pois esta linha estética capturava as expressões humanas
sob os aspectos das emoções, da dor e da miséria humana. A arte paranaense pós-guerra
ainda carregou as mazelas psicológicas do conflito e acabou sendo regida por um
“humanismo social”. Essa expressão batizou a temática moderna dos artistas do Paraná
que se inaugurou com o grupo “Garaginha”, comentado anteriormente. Podemos
identificar, portanto, na obra de Poty, a linha expressionista que foi estimulada também
por sua ligação com este grupo.
Porém a produção artística de Poty que mais faz sentido neste trabalho não é
referente ao Poty dos anos 1940 e 50, expressionista convicto e militante modernista e
sim, o Poty dos anos 1990, estrela badalada e cooptada pela ideologia do Neo-
paranismo da era Lerner–Greca14. Poty atingiu um grande respeito com suas
ilustrações em livros de escritores consagrados marcando presença com seu traço
singular e características próprias, haja visto que foram várias suas passagens pelos
Salões de Arte e com consideráveis premiações. Seus painéis estão firmados em várias
capitais e demais cidades. Em Curitiba existem 60 painéis de Poty, em grande
dimensão, espalhados pelas ruas, praças, fachadas, muros e portais de edifícios
(BUCHMANN, 2007 p. 57).
Seu primeiro mural no Estado do Paraná foi o mural no Hotel Aeroporto, de
propriedade de Ingeborg Rusti, em 1953, como homenagem à emancipação do Paraná.
No mesmo ano executou seu primeiro mural em azulejos “Monumento ao Primeiro
Centenário do Paraná”, na Praça 19 de Dezembro em Curitiba. Neste painel (imagem
100) Poty faz uma representação da evolução política do Estado do Paraná, para isso o
artista faz uma descrição dos ciclos históricos e econômicos mais importantes do
14
Frases escritas a partir de anotações feitas pelo Professor Artur Freitas em banca de qualificação no dia
08 de dezembro de 2008.
147
Nos anos 90, Poty pôde apresentar sua obra nos mais variados pontos da cidade
de Curitiba, nas quais os símbolos paranistas estão presentes. Luciano Buchmann afirma
que um dos motivos que levaram Poty a se tornar um ícone para Curitiba e também para
o Estado é o fato da coincidência de datas, do aniversário do artista com o aniversário
da cidade de Curitiba. Este dado poderia ser absolutamente irrelevante não fosse o
149
argumento da Prefeitura para firmar o laço imaginário entre o artista e a cidade nas
comemorações dos 300 anos da capital (BUCHMANN, 2007, p. 58). Várias
encomendas de trabalhos de Poty para a cidade tiveram o argumento comemorativo da
narrativa cultural, política e econômica do Paraná e de Curitiba. Buchmann afirma que
no texto de abertura do catálogo da exposição de Poty, o então prefeito de Curitiba
escreveu: Quando Poty nasceu, em 29 de março de 1924, já deu uma pista de seu
destino. Era o dia do aniversário da cidade, que ele nunca mais cansaria de retratar.
Nesta exposição sobressai um dos aspectos mais importantes de sua obra: a celebração
de Curitiba (CURITIBA, PMC, 1994. Apud BUCHMANN, 2007, p. 58).
Dentre tantos trabalhos remetendo aos símbolos paranistas, nos chamam atenção
duas partes de um dos painéis do centro de Curitiba, no Largo da Ordem. Estas obras,
todas coloridas sobre azulejos brancos, apresentam o pinheiro como personagem
principal, na primeira (imagem 102) um grande pinheiro é escalado por um homem, e
ao fundo a mesma cena se repete. O pinheiro está carregado de folhas e gralhas-azuis,
ao lado direito uma casa amarela, típica das casas da Curitiba da década de 20, de
madeira, com lambrequins nas bordas do telhado. Segundo Dudeque, os lambrequins
em Curitiba foram impostos a partir do Código de Posturas de 1919, onde, no parágrafo
7º do artigo 61, sejam as abas dos telhados, exceto as do fundo, guarnecidas de
lambrequins (DUDEQUE, 2001, p. 250). Os lambrequins eram justificados como
pingadeiras, já que as calhas não estavam à disposição, porém Dudeque afirma que o
verdadeiro motivo era o modismo, vigente por alguns anos. Podemos dizer que Poty faz
um resgate da década de 20 e 30, recordado a arquitetura e os símbolos forjados no
período.
O painel apresenta à direita operários trabalhando, onde, ao escavacarem a terra,
uma pequena árvore é preservada. Ao fundo, a cidade como que representada pelo
centro histórico. Ao lado esquerdo outro pinheiro, cuja continuação está na outra
imagem (imagem 103). Bem como a anterior, o homem plantando sementes a germinar,
o menino trazendo em seu carrinho uma muda de árvore, neste ínterim a gralha-azul
também fazendo sua parte, à direita a ave traz um enorme pinhão em seu bico. Todo
painel é adornado com pinhões e pinheiros estilizados, esta obra é composta ainda de
uma terceira parte que não foi incluída nesta leitura.
150
Imagem 102 - Poty Lazzarotto - Curitiba e sua gente - Largo da Ordem – Centro - Curitiba-PR.
Painel Cerâmico situado na Rua Augusto Stelfeld, com 500 m·, inaugurado em maio de 1996.
Fotos: Renato Wandeck. Imagem adaptada pela autora.
Disponível em: http://www.ceramicanorio.com/paineis/potylargodaordem/potylargodaordem.html.
Acesso 27 de Mai.2009.
Imagem 103 - Poty Lazzarotto - Curitiba e sua gente - Largo da Ordem – Centro - Curitiba-PR.
Painel Cerâmico situado na Rua Augusto Stelfeld, com 500 m·, inaugurado em maio de 1996.
Fotos: Renato Wandeck. Imagem adaptada pela autora.
Disponível em: http://www.ceramicanorio.com/paineis/potylargodaordem/potylargodaordem.html.
Acesso 27 de Mai.2009.
151
Não podemos dizer que Poty Lazarotto possa ser considerado um paranista
convicto, pois os motivos que o levaram a reafirmar os símbolos do Movimento
Paranista não foram idealizações próprias, pelo menos até onde sabemos, mesmo que
tais elementos fossem para ele também significativos. Da mesma maneira que as
estilizações de Poty não são esteticamente comparáveis às estilizações de Lange. Cada
artista em sua respectiva época colaborou, independente dos motivos pessoais,
consideravelmente pelo reforço do Paranismo, ou pela imposição de seus símbolos.
Estes símbolos nos murais curitibanos acabam gerando certa indução de seus
significados. Os paranaenses ou curitibanos, em contato com o pinheiro, a pinha e a
gralha constantemente em sua rotina visual, tendem a adotar estes símbolos como seus,
mesmo que haja uma imprecisão entre o que é real ou foi imposto pelo recurso das artes
visuais.
15
Transcrição do depoimento de Ida Hannemann de Campos à autora Luciana Barone, em 15 de setembro
de 2008.
152
Imagem 106 - Ida Hannemann de Campos - Mural da Praça do Asilo São Vicente de Paula, situado à
esquina da Rua Barão dos Campos Gerais com Rua Manoel Eufrásio – Juvevê - Curitiba-PR.
Foto: Renato Wandeck.
Disponível em: http://www.ceramicanorio.com/paineis/idahannemanncampos/idahann emann
campos.html. Acesso em 27 de Jun. 2009.
Ida Hannemann foi ainda responsável pelo poema que compõe a embalagem do
licor de Araucária, intitulado “O Pinheiro II”. Este produto, obtido a partir da acícula
(folha) da Araucária é apresentado como original do Paraná. A parte esférica da
licoreira representa uma pinha, muito próxima às pinhas esculpidas por Turin, a pinha é
154
o local onde se desenvolve a semente dessa árvore, o pinhão, cuja amostra em tamanho
natural decora o frasco. O Papa João Paulo II, na ocasião de sua visita, foi presenteado
com um exemplar da bebida.
Ida Hannemann, com suas obras, seus poemas, seu modo de viver, possui em
sua casa um pinheiro centenário e faz questão de apresentá-lo a todos que a visitam,
bem como este produto, o licor e o seu recipiente, são exemplos de que o paranismo
ainda continua vivo, gerando adeptos e proporcionando, ainda, as mais variadas
maneiras de sua divulgação, tão variadas que seus primeiros idealizadores,
provavelmente nem fizessem idéia das transformações que as formas inventadas
pudessem alcançar.
16
Material fornecido pela autora em entrevista com a pesquisadora.
155
CONSIDERAÇÕES FINAIS
156
colônias. Grosso modo, de certa forma, esta preocupação também atingia outros Estados
e a todo país, haja visto que o movimento modernista no Estado de São Paulo buscava
uma construção de identidade brasileira dentro da arte, de maneira que se espelhasse a
realidade do país e não de criações estrangeiras. O modernismo paulista, pelo menos
aparentemente, tinha a finalidade de utilizar as artes para explorar características
apreciadas como bem brasileiras para expor um panorama artístico com cara de Brasil,
tentando fugir das influências européias e, ao mesmo tempo, buscando inspirações nas
mesmas. Este seria o discurso apresentado pelos intelectuais considerados modernistas
brasileiros.
A identidade reconhecida em alguns Estados brasileiros pode ser identificada
como característica de determinadas regiões, também é interrogada por parte de alguns
autores, como podemos constatar em Dudeque (2005, p. 50 - 68) que, ao relacionar a
identidade à arquitetura, faz um questionamento sobre o Barroco Mineiro, enfatizando
que outros autores dizem que ele não existe e o que realmente existe é o Barroco
Colonial. Chegando a afirmar que não ter identidade não se trata de nenhuma vergonha,
[...] isso é importante porque, se não houver identidade, uma identidade arquitetônica
que possa nos diferenciar, também não há alguma coisa vergonhosa. Não temos
identidade porque no fundo ninguém tem (2005, p.56). O autor acaba chegando à
conclusão de que, se não há identidade, o que nos resta é a memória. Para Ortiz, a
construção de uma identidade estará sempre acoplada à junção entre o popular, o Estado
e a identidade, trazendo como sustentação os ideários da memória coletiva e da
memória nacional (ORTIZ, 2003, p. 135).
Podemos então pensar que os paranistas, mesmo forjando uma identidade com
os símbolos por eles adotados, conseguiram fazer com que hoje os paranaenses os
reconhecessem como parte de sua identidade, a “possível identidade paranaense”,
mesmo que esta afirmação seja de difícil aferição. Esta afirmação torna-se de certo
modo pertinente quando relacionada ao fato de os paranaenses reconhecerem os
símbolos estabelecidos pelos paranistas como seus. Atualmente os paranaenses
relacionam a araucária angustifólia, ou seja, o pinheiro do Paraná, como o símbolo de
seu Estado, mesmo desconhecendo o motivo pelo qual esta árvore foi eleita e quais
foram os meios utilizados para esta atribuição. É muito comum encontrar em todo
Paraná estabelecimentos comerciais dos mais variados segmentos, como padarias,
farmácias, mercearias, oficinas, onde, além de trazer como nome fantasia algo
relacionado ao Paraná ou ao Paranaense, reforça ainda com uma imagem do pinheiro
158
Apesar das obras públicas paranistas, bem como sua iconografia se restringirem
à Curitiba, os paranaenses em geral reconhecem a pinha, o pinheiro e o pinhão e
também a gralha como seus símbolos, mesmo não sabendo a razão de ser o “Pinheiro” a
árvore que representa o Paraná, tendo em vista que em outros Estados esta árvore
também é encontrada. Esta aceitação da população paranaense é remetida ao esforço de
nomes como Romário Martins, Lange de Morretes e João Turin, pois lutaram para a
efetivação verbal e principalmente visual dos símbolos paranaenses, sendo estes os
elementos que deveriam representar todo Estado, chegando a ponto de ser entendido
entre seus idealizadores como o estilo paranista, que foi estampado e decalcado pelas
ruas, praças, muros da cidade de Curitiba, atingindo as mais variadas manifestações das
Artes Visuais, como pintura, escultura, arquitetura, moda.
Para Henri Focillon (1983), o estilo é absoluto e variável, o termo precedido
1
Fontes das imagens: http://www.paranalistas.com.br/img/Parana-Listas-Logo.gif
http://1.bp.blogspot.com/_0kzVHi69qZY/SOfbj4SwJqI/AAAAAAAAGDg/xdR0MtQ68OI/s400/copa+pa
rana.jpg
http://www.guiasjp.com.br/fotos_noticias/1228253976.1245F.jpg
http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://www.sindifar-
pr.org.br/noticias/00090.jpg&imgrefurl=http://www.sindifar-pr.org.br/Noticias_
159
do artigo definido pode indicar uma propriedade superior da obra de arte, lhe
permitindo sobreviver ao tempo, ser infindável. O estilo, idealizado de maneira integral,
pode ser considerado como duradouro, eterno, capaz de definir limites. Para o autor,
através deste conhecimento, o homem manifesta sua necessidade de distinguir uma
compreensão sobre o que é durável e unânime, sobre os conhecimentos da história, além
do que é local e característico. Um estilo é um desenvolvimento, um conjugado lógico
de formas conectadas por uma convivência mútua, onde a consonância se almeja, se
fazendo e desfazendo dentro de uma heterogeneidade. Os estilos bem definidos
possuem momentos de curvaturas e anormalidades, isto, segundo o autor, foi que
instituiu um estudo, há muito tempo, sobre os monumentos da arquitetura. Na França,
os criadores da arqueologia medieval, em especial de Caumont, determinaram que a arte
gótica não podia ser considerada uma coletânea de monumentos, e sim uma sucessão ou
um encadeamento, ou seja, um estilo, esta determinação foi alcançada através de um
estudo rigoroso sobre as formas. Focillon nos alerta que todas as artes podem ser
abarcadas sob a categoria de estilo, inclusive a própria vida do homem, na medida em
que a vida individual e a vida histórica são formas (FOCILLON, 1983, p. 22).
João Turin almejou a criação de um estilo próprio que se estruturasse a partir de
elementos originais do Estado do Paraná, para ele a arquitetura paranaense produzida
até então não transcendia às produções apresentadas em outras regiões, em suas
palavras: O povo que copia tudo o que é estrangeiro e se submete vergonhosamente à
vontade de outros povos, sem ter a força de agir e de pensar por si próprio é um povo
escravo, que não pode ter o direito de se apresentar em uma assembléia de homens
livres e civilizados (TURIN, s.n.t). O artista relacionava o estilo à produção apresentada
a partir de elementos característicos, a partir de formas comuns existentes no Estado.
Focillon afirma que um estilo se constitui de elementos formais com valores de
indicação, sobre seu conteúdo, sua linguagem, o mesmo se afirma a partir de suas
medidas. Os gregos não arquitetavam o estilo de outra maneira quando decidiam as
proporções referentes às partes.
Aplicado à coluna grega, o estilo determinado por Turin foi apresentado a partir
das medidas da ordem jônica, numa adaptação em que o pinheiro passou a ser a própria
coluna. O estilo proposto estava acarretado de singularidades particulares do Paraná,
comungando com as palavras de Tassinari, o estilo possui uma generalidade maior que
cada uma de suas aparições, algo como um ar de família (TASSINARI, 2001, p. 139).
Para Focillon, a atividade de se definir um estilo que, ao mesmo tempo, se foge de sua
definição, é oferecida como uma “evolução”, adotando o termo em seu sentido comum,
segundo o autor, qualquer interpretação dos estilos deve considerar dois fatores
fundamentais:
elaborado que nos permite comprazer em detectar a obra de um Deus artista, em que,
até mesmo nas ondas rápidas ou tênues, as formas podem ser identificadas.
p. 5). Ao existir a repetição, ela traduz uma singularidade que contrapõe o geral.
Deleuze nos alerta que é o primeiro nenúfar de Monet que repete todos os
outros (DELEUZE, 2000, p. 3). Assim sendo, as primeiras obras paranistas repetem
todas as outras. Através dos processos de diferenciação os artistas paranistas posteriores
ao movimento, (re)criaram as formas, repetindo as imagens, construindo possivelmente,
juntamente com seus precursores, um simulacro do homem, um homem paranista em
forma de pinheiro, forte, imponente. Para o autor, pode-se “representar” a repetição
como uma semelhança extrema ou uma equivalência perfeita (DELEUZE, 2000, p. 3),
porém passar gradualmente de uma coisa a outra não evita que exista diferença de
natureza entre as duas coisas.
Na produção paranista após anos 80, denominada Neo-paranista, nota-se a
reutilização dos elementos simbólicos em uma linguagem atualizada, percebe-se, além
disso, uma preocupação por parte dos artistas em acompanhar as propostas apresentadas
pelo pós-modernismo, sem escapar das referências representativas geradas pelo
Movimento Paranista. Plasticamente os símbolos foram incorporados em novas
interpretações propiciando uma fusão de idéias, sem perder o reforço concentrado em
cima da tradição paranaense. Por este motivo, podemos concordar com Georges Didi-
Huberman quando nos alerta que a imagem propõe uma abertura ao olhar e que,
anacronicamente, uma imagem viaja pelo tempo, encontrando possibilidades de
entrelaçamento e até semelhanças com outras imagens.
O autor nos chama a atenção que, diante de uma imagem, podemos pensar além
do contexto em que ela foi pintada, pensar além do período em que ela foi enquadrada,
pensar em todas as outras possibilidades que esta imagem propõe ao abrir a fenda que
liga diretamente o olhar do espectador. Desta maneira as imagens que trazem os
símbolos paranistas, trazem também uma história, uma tradição que foi inventada, um
passado que foi forjado, uma identidade que foi buscada. Diante destas imagens o
passado não para de ser apresentado, a memória continua se construindo, estas imagens
sobreviverão à história, à memória e até mesmo a nós, meros espectadores.
Estes símbolos, pinheiro, pinha, pinhão e gralha-azul, acabaram ainda
assumindo dentro do Estado do Paraná caracteres diferenciados e funcionais, tornaram-
se modelos para planos urbanísticos em Curitiba, exemplos ecológicos de preservação
das matas, incentivos econômicos em relação ao cultivo em terras paranaenses, além do
valor estético pela aceitação geral dos paranaenses, principalmente dentro do censo
comum. Certamente, desta maneira, ainda hoje os ideais paranistas continuam sendo
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reforçados, pois estas imagens, estas formas apresentadas nas mais variadas situações e
atingindo diferentes intenções não escapam da visão da população, mesmo com
roupagem distintas, e reafirmam a simbologia criada por Romário Martins e demais
idealizadores.
Diante disso, este trabalho tende a considerar que os paranistas forjaram sim
uma identidade para o Estado do Paraná e, na busca constante em incutir seus ideais
para os paranaenses, exploraram a natureza a fim de extrair seus elementos e apresentá-
los à população, destacando qualidades consideradas únicas dentro do Estado. O
Paranismo dos anos 20 e 30 agiu como um suporte para as produções artísticas
elaboradas posteriormente em que através de uma reinterpretação cultural continuaram a
incentivar os valores regionais. De certa forma, em algumas questões, o Movimento
Paranista talvez tenha deixado a desejar, pois não manteve no Estado a consistência de
um manifesto, nem o estruturalismo de uma escola, tão pouco uma formação acadêmica
ou teórica. Sua efetivação se manteve apenas no sentimento despertado em algumas
pessoas preocupadas com a preservação da identidade cultural paranaense criada pelos
integrantes do movimento. Os símbolos, estes permaneceram, mesmo com a
efemeridade do Movimento Paranista. A simbologia permaneceu nas calçadas, nos
painéis, nas construções de estruturas ecléticas adornadas com pinhões. As formas
paranistas se perpetuaram.
As formas vivas arrancadas do pinheiro passaram a se confundir com a tradição
que hoje, graças ao paranismo, é considerada paranaense. Assim sendo podemos afirmar
que a arte cumpriu com uma tarefa extremamente importante, pois foi através das
formas artísticas que a população foi atingida. Nas palavras de Pereira, a arte não pode
mudar o mundo, mas pode modificar as consciências e as pulsões dos homens e é
exatamente neste sentido que a mesma será utilizada pelos paranistas (PEREIRA, 1998
p. 137). As obras paranistas realizaram os desejos dos intelectuais idealizadores do
Movimento, as imagens efetivaram o que verbalmente não foi possível concretizar
através das palavras. Para Manguel, independente do caso, tanto as imagens como as
palavras refletem a matéria de que somos feitos (MANGUEL, 2006, p. 21).
Este trabalho que, inicialmente tinha a pretensão de elaborar um estudo
fundamentado na ação visual provocada pelo paranismo em resposta à república,
acabou se limitando em apresentar as obras paranistas que, até então, não haviam sido
organizadas em um só trabalho. A princípio não se imaginava encontrar tantas obras
dentro desta temática, assim como a imensa variação manifestada nas artes visuais.
165
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