Século 20 e Brasil República II

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 111

HISTÓRIA

CIÊNCIAS HUMANAS e suas tecnologias


CIÊNCIAS HUMANAS
e suas tecnologias

6
CIÊNCIAS HUMANAS
e suas tecnologias
Eduardo Antônio Dimas e Tiago Rozante
Caro aluno
Ao elaborar o seu material inovador, completo e moderno, o Hexag considerou como principal diferencial sua exclusiva metodologia em pe-
ríodo integral, com aulas e Estudo Orientado (E.O.), e seu plantão de dúvidas personalizado. O material didático é composto por 6 cadernos
de aula e 107 livros, totalizando uma coleção com 113 exemplares. O conteúdo dos livros é organizado por aulas temáticas. Cada assunto
contém uma rica teoria que contempla, de forma objetiva e transversal, as reais necessidades dos alunos, dispensando qualquer tipo de
material alternativo complementar. Para melhorar a aprendizagem, as aulas possuem seções específicas com determinadas finalidades. A
seguir, apresentamos cada seção:

incidência do tema nas principais provas vivenciando

De forma simples, resumida e dinâmica, essa seção foi desenvol- Um dos grandes problemas do conhecimento acadêmico é o seu
vida para sinalizar os assuntos mais abordados no Enem e nos distanciamento da realidade cotidiana, o que dificulta a compreensão
principais vestibulares voltados para o curso de Medicina em todo de determinados conceitos e impede o aprofundamento nos temas
o território nacional. para além da superficial memorização de fórmulas ou regras. Para
evitar bloqueios na aprendizagem dos conteúdos, foi desenvolvida
a seção “Vivenciando“. Como o próprio nome já aponta, há uma
preocupação em levar aos nossos alunos a clareza das relações entre
aquilo que eles aprendem e aquilo com que eles têm contato em
teoria seu dia a dia.

Todo o desenvolvimento dos conteúdos teóricos de cada coleção


tem como principal objetivo apoiar o aluno na resolução das ques-
tões propostas. Os textos dos livros são de fácil compreensão, com-
pletos e organizados. Além disso, contam com imagens ilustrativas aplicação do conteúdo
que complementam as explicações dadas em sala de aula. Qua-
dros, mapas e organogramas, em cores nítidas, também são usados Essa seção foi desenvolvida com foco nas disciplinas que fazem
e compõem um conjunto abrangente de informações para o aluno parte das Ciências da Natureza e da Matemática. Nos compilados,
que vai se dedicar à rotina intensa de estudos. deparamos-nos com modelos de exercícios resolvidos e comenta-
dos, fazendo com que aquilo que pareça abstrato e de difícil com-
preensão torne-se mais acessível e de bom entendimento aos olhos
do aluno. Por meio dessas resoluções, é possível rever, a qualquer
momento, as explicações dadas em sala de aula.
multimídia
No decorrer das teorias apresentadas, oferecemos uma cuidadosa
seleção de conteúdos multimídia para complementar o repertório
do aluno, apresentada em boxes para facilitar a compreensão, com áreas de conhecimento do Enem
indicação de vídeos, sites, filmes, músicas, livros, etc. Tudo isso é en-
contrado em subcategorias que facilitam o aprofundamento nos Sabendo que o Enem tem o objetivo de avaliar o desempenho ao
temas estudados – há obras de arte, poemas, imagens, artigos e até fim da escolaridade básica, organizamos essa seção para que o
sugestões de aplicativos que facilitam os estudos, com conteúdos aluno conheça as diversas habilidades e competências abordadas
essenciais para ampliar as habilidades de análise e reflexão crítica, na prova. Os livros da “Coleção Vestibulares de Medicina” contêm,
em uma seleção realizada com finos critérios para apurar ainda mais a cada aula, algumas dessas habilidades. No compilado “Áreas de
o conhecimento do nosso aluno. Conhecimento do Enem” há modelos de exercícios que não são
apenas resolvidos, mas também analisados de maneira expositiva
e descritos passo a passo à luz das habilidades estudadas no dia.
Esse recurso constrói para o estudante um roteiro para ajudá-lo a
apurar as questões na prática, a identificá-las na prova e a resolvê-
conexão entre disciplinas -las com tranquilidade.

Atento às constantes mudanças dos grandes vestibulares, é ela-


borada, a cada aula e sempre que possível, uma seção que trata
de interdisciplinaridade. As questões dos vestibulares atuais não
exigem mais dos candidatos apenas o puro conhecimento dos diagrama de ideias
conteúdos de cada área, de cada disciplina.
Cada pessoa tem sua própria forma de aprendizado. Por isso, cria-
Atualmente há muitas perguntas interdisciplinares que abrangem
mos para os nossos alunos o máximo de recursos para orientá-los
conteúdos de diferentes áreas em uma mesma questão, como Bio-
em suas trajetórias. Um deles é o ”Diagrama de Ideias”, para aque-
logia e Química, História e Geografia, Biologia e Matemática, entre
les que aprendem visualmente os conteúdos e processos por meio
outras. Nesse espaço, o aluno inicia o contato com essa realidade
de esquemas cognitivos, mapas mentais e fluxogramas.
por meio de explicações que relacionam a aula do dia com aulas
de outras disciplinas e conteúdos de outros livros, sempre utilizan- Além disso, esse compilado é um resumo de todo o conteúdo
do temas da atualidade. Assim, o aluno consegue entender que da aula. Por meio dele, pode-se fazer uma rápida consulta aos
cada disciplina não existe de forma isolada, mas faz parte de uma principais conteúdos ensinados no dia, o que facilita a organiza-
grande engrenagem no mundo em que ele vive. ção dos estudos e até a resolução dos exercícios.

Herlan Fellini

1
© Hexag Sistema de Ensino, 2018
Direitos desta edição: Hexag Sistema de Ensino, São Paulo, 2020
Todos os direitos reservados.

Autores
Eduardo Antônio Dimas
Tiago Rozante

Diretor-geral
Herlan Fellini

Diretor editorial
Pedro Tadeu Vader Batista

Coordenador-geral
Raphael de Souza Motta

Responsabilidade editorial, programação visual, revisão e pesquisa iconográfica


Hexag Sistema de Ensino

Editoração eletrônica
Arthur Tahan Miguel Torres
Matheus Franco da Silveira
Raphael de Souza Motta
Raphael Campos Silva

Projeto gráfico e capa


Raphael Campos Silva

Imagens
Freepik (https://www.freepik.com)
Shutterstock (https://www.shutterstock.com)

ISBN: 978-85-9542-129-5

Todas as citações de textos contidas neste livro didático estão de acordo com a legislação, tendo por fim único e exclusivo
o ensino. Caso exista algum texto a respeito do qual seja necessária a inclusão de informação adicional, ficamos à dis-
posição para o contato pertinente. Do mesmo modo, fizemos todos os esforços para identificar e localizar os titulares dos
direitos sobre as imagens publicadas e estamos à disposição para suprir eventual omissão de crédito em futuras edições.
O material de publicidade e propaganda reproduzido nesta obra é usado apenas para fins didáticos, não repre-
sentando qualquer tipo de recomendação de produtos ou empresas por parte do(s) autor(es) e da editora.

2020
Todos os direitos reservados para Hexag Sistema de Ensino.
Rua Luís Góis, 853 – Mirandópolis – São Paulo – SP
CEP: 04043-300
Telefone: (11) 3259-5005
www.hexag.com.br
[email protected]

2
SUMÁRIO
HISTÓRIA
HISTÓRIA GERAL
Aulas 45 e 46: Nazismo e Guerra Civil Espanhola 6
Aulas 47 e 48: Segunda Guerra Mundial 17
Aulas 49 e 50: Guerra Fria: consolidação da ordem bipolar 30
Aulas 51 e 52: Guerra Fria: direitos civis e o fim da ordem bipolar 39

HISTÓRIA DO BRASIL
Aulas 45 e 46: Ditadura militar: governos Médici e Geisel  50
Aulas 47 e 48: Ditadura militar: governo Figueiredo e regimes militares sul-americanos  66
Aulas 49 e 50: Nova República: governos Sarney e Collor 82
Aulas 51 e 52: Nova República: governos Itamar, FHC, Lula e Dilma 94

3
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
H8 Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferentes
grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, fa-
vorecendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.

4
HISTÓRIA GERAL:
Incidência do tema nas principais provas

As temáticas presentes neste livro são Questões sobre nazismo, Segunda Guerra Mundial e Guerra
abordadas no Enem por meio de análises Fria têm sido abordadas neste vestibular com enfoque nas
estruturas sociais, econômicas e culturais. Utiliza variadas
dos aspectos sociopolíticos, econômicos
fontes para elaborar suas perguntas, entre as quais imagens,
e culturais. Além disso, para responder às tabelas e documentos.
questões, o candidato necessita interpretar
uma combinação de documentos
e imagens.

As interações dos aspectos culturais, econômicos No vestibular da instituição não são abordadas diretamente A análise das estruturas sociais, econômicas e culturais das
e sociopolíticos associados às temáticas estuda- questões de História, mas há um grau de interdisciplinari- temáticas estudadas neste livro costumam ser apresentadas
das são abordadas com a utilização de textos dade que permite o uso dos conhecimentos históricos para em associação de fatos, conceitos históricos e imagens.
longos e imagens. O caráter das questões é de auxílio da resolução das questões e escrita da redação. Ademais, exige do candidato um domínio amplo de
âmbito reflexivo, trazendo temas históricos para interpretação textual.
o debate da atualidade.

Na prova apresentada nos últimos vestibulares Os últimos vestibulares apresentam uma aborda- Os últimos vestibulares abordam nazismo, Percebe-se que o vestibular não tem contemplado
consta a presença das temáticas estudadas neste gem sobre as temáticas que levam em conside- Segunda Guerra Mundial e Guerra Fria, por meio com frequência os temas abordados neste livro.
livro. A abordagem prioriza uma integração entre ração os aspectos sociais, econômicos, políticos e de uma correlação entre os aspectos sociais, Entretanto, o caráter da prova exige do candidato
Medicina e História, principalmente voltada para culturais, assim como as suas correlações durante econômicos e políticos. Ademais, exige do candi- um domínio amplo de interpretação textual e
temas como vacinas e disseminação de doenças. o período estudado. dato um domínio amplo de interpretação textual estabelecimento de conexões entre diferentes áreas
e imagética. do conhecimento.

UFMG

Há um tema determinado pela própria organização A banca do vestibular privilegia que o candi- No vestibular não são contemplados diretamente
do vestibular que percorre toda a prova e nele dato realize análises e interpretações sobre temas de História, entretanto, há um grau de
pode-se englobar as temáticas abordadas neste diferentes processos históricos e perceba suas interdisciplinaridade que permite o uso dos conhe-
livro, por meio da associação entre os aspectos continuidades e rupturas. Assim, utiliza textos in- cimentos históricos para auxílio da resolução dos
sociais, econômicos, culturais e políticos. trodutórios e imagens para elaborar as questões exercícios, interpretação de tabelas/imagens e
sobre as temáticas estudadas. escrita da redação.

O vestibular solicita análises de estruturas Na prova, não há uma divisão clara entre A banca do vestibular elabora questões de
históricas em suas questões, que propõem aos História e Geografia, que são abordadas múltipla escolha direcionadas aos candidatos
candidatos uma reflexão sobre as temáticas como Estudos Sociais, portanto, não existem que pretendem uma vaga nos cursos de
elencadas, estabelecendo relações com o definições específicas de tema, mas sim um Enfermagem, Biomedicina e Medicina. Há uma
mundo contemporâneo. Utiliza documentos grau elevado de interdisciplinaridade. Há tendência em abordar temas contemporâneos.
e imagens de forma mesclada em uma tendência em abordar temas
suas questões. contemporâneos.

5
AULAS Nazismo e Guerra Civil Espanhola
45 e 46
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10,
Competências: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 Habilidades: 11, 12, 13, 14, 15, 16,
19, 20, 21, 22, 27 e 29

1. Nazismo europeu. Nesse contexto veio o declínio das democracias


parlamentares, permitindo o surgimento de Estados totalitá-
rios, como a Alemanha nazista.

1.2. A Alemanha pós-guerra


Nos últimos dias da Primeira Guerra Mundial, uma revolu-
ção derrubou o Governo Imperial alemão e levou à criação
de uma república democrática. O novo Governo, chefiado
pelo chanceler Friedrich Ebert, um social-democrata, assi-
nou em 11 de novembro de 1918 o armistício que pôs fim
à guerra. Pouco depois, o humilhante Tratado de Versalhes
impunha à Alemanha cláusulas que reduziram sua área
territorial e arrasaram sua economia.

1.3. O Levante Espartaquista


Em 1918, a economia alemã estava arruinada. Se comparado
a 1913, a produção industrial diminuíra 57% e a agrícola,
50%. Tal situação propiciava a instauração do caos político e
social. No final de 1918, o setor mais radical do Partido So-
cial-Democrata, a Liga Espartaquista, rompeu com o setor
moderado e fundou o Partido Comunista. Em janeiro de 1919
ocorreu o primeiro levante armado contra a recém-instaura-
“Vida longa à Alemanha”, cartaz de propaganda nazista. da República. Conhecido como o Levante Espartaquista,
esse movimento revolucionário comunista, liderado por Karl
1.1. Introdução Liebknecht e Rosa Luxemburgo, eclodiu em Berlim e irradiou-
-se para outros centros, como Hamburgo, Baviera, Bremen,
A Primeira Guerra Mundial gerou uma grande crise no Magdeburgo, Saxônia e Sarre. A repressão foi imediata e bru-
sistema capitalista europeu, que foi se tornando crônica. tal. O Exército e setores voluntários monarquistas naciona-
Grandes Impérios, como o Austro-húngaro e o Turco-oto- listas lideraram a repressão. Oficiais de direita assassinaram
mano, desapareceram e as economias europeias ficaram Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, deixando seus corpos
totalmente arruinadas. A Alemanha, maior potência indus- nos esgotos da cidade. Os mesmos militares incumbiram-se
trial antes da guerra, foi arrasada pelo Tratado de Versa- de eliminar os focos comunistas em outras cidades da Ale-
lhes. Não só os países perdedores estavam arruinados: a manha, inclusive na Baviera, onde Kurt Eisner foi assassinado.
Europa inteira conhecia recessão, inflação e desemprego.
Com o fermento produzido pela crise econômica, ganhou
força o socialismo na Rússia e os partidos de esquerda
cresceram na Europa, assustando os burgueses. Na Itália e
na Alemanha, por exemplo, insurreições e agitações de tra-
balhadores obrigaram as burguesias desses países a fazer
certas concessões.
A crise de 1929 – iniciada nos Estados Unidos e rapidamen-
te espalhada na Europa – aprofundou a crise do capitalismo Levante Espartaquista de 1919

6
1.4. A República de Weimar (1919–1933)
Em fevereiro de 1919, a Assembleia Nacional recentemen-
te eleita reuniu-se em Weimar para preparar a constitui-
ção do novo Estado. Nascia assim a República de Weimar
(1919–1933). Uma nova constituição – a Constituição de
Weimar –, redigida por Hugo Preuss, foi aprovada pela
Assembleia Nacional e assinada pelo presidente Ebert. A
Constituição definia a República como federativa, parla-
mentar e democrática. O presidente seria eleito pelo voto Nota de 10 milhões de marcos, em 1923, na Alemanha.
direto universal, pelo período de sete anos. Indicaria um Em 1923, a situação complicou-se. A ocupação pela França
chanceler, a quem caberia efetivamente o exercício do go- da região industrial do Ruhr, com a finalidade de garantir
verno. Ele poderia aplicar as leis, submetê-las a uma apro- o pagamento das indenizações estipuladas pelo Tratado de
vação popular, dissolver o Parlamento e adotar medidas Versalhes, elevou a crise a níveis insustentáveis. O número de
excepcionais em caso de crise. desempregados chegou a cinco milhões de pessoas; a infla-
O Parlamento foi dividido em duas câmaras: o Reichstag, ção desvalorizou ainda mais o marco a ponto de um dólar
formado por deputados eleitos, e o Reichsrat, formado pe- valer oito bilhões de marcos! A confusão instalou-se. Cida-
los representantes dos estados federados. des e empresas foram autorizadas a emitirem moedas auxi-
liares. O salário variava no decurso do mesmo dia, enquanto
O presidente eleito Ebert organizou a nova República e
os camponeses recusavam-se a ceder a produção em troca
governou com uma frágil composição partidária formada
de papel-moeda, fazendo ressurgir o sistema de escambo.
por social-democratas, representantes dos operários sindi-
calizados das regiões protestantes, pelo Partido de Centro
Católico – defensor dos pequenos proprietários do Sul e do
Oeste da Alemanha – e pelo Partido Democrata, represen-
tante da alta burguesia.

1.5. A crise econômica


Terminada a Primeira Guerra Mundial, a economia alemã
estava arruinada. Durante a guerra, sem poder aumentar
os impostos sobre os ganhos de capital, as finanças foram
equilibradas através da emissão monetária. O grande vo- multimídia: vídeo
lume de dinheiro em circulação provocou a desvalorização
Fonte: Youtube
do marco (moeda alemã): em 1914, um dólar valia 4,2
O grande ditador
marcos e, no início de 1922, 182 marcos.
Adenoid Hynkel (Charles Chaplin) assume o
governo de Tomainia. Ele acredita em uma na-
ção puramente ariana e passa a discriminar os
judeus locais. Esta situação é desconhecida por
um barbeiro judeu (Charles Chaplin), que está
hospitalizado devido à participação em uma
batalha na Primeira Guerra Mundial. Ele recebe
alta, mesmo sofrendo de amnésia sobre o que
aconteceu na guerra. Por ser judeu, passa a ser
perseguido e precisa viver no gueto.

1.6. Hitler e as origens


do Partido Nazista
A derrota na guerra, a humilhação e as dificuldades im-
Crianças brincam com o dinheiro alemão durante a hiperinflação. postas pelo Tratado de Versalhes, a consequente crise eco-

7
nômico-financeira, o temor gerado pelas agitações sociais inflamando e hipnotizando o público. Hitler percebia ins-
colocavam o governo social-democrata em uma incômoda tintivamente os sentimentos, ressentimentos e anseios
situação, pressionado pelos mais variados segmentos da mais íntimos da multidão.
sociedade. Em 1923, aproveitando-se do clima geral de insegurança
Nessas condições, em 1919 foi fundado em uma cervejaria de e crise que dominava a República de Weimar, Hitler liderou
Munique um partido semelhante ao fascista da Itália. Um ano uma tentativa de golpe na Baviera, o Putsch de Munique,
depois, ele assumia o nome de Partido Nacional-Socialis- apoiado por Ludendorff. O golpe fracassou, foi preso e con-
ta dos Trabalhadores Alemães ou Partido Nazista. denado a cinco anos de prisão. Mas foi libertado oito meses
depois. Na prisão, aproveitou o tempo para escrever a primei-
Em setembro de 1919, o ex-cabo do Exército alemão, Adolf
ra parte de seu livro Mein Kampf (Minha luta), obra que con-
Hitler, aderiu ao então minúsculo Partido Nazista. Mostran- tém os fundamentos da ideologia nazista: repúdio ao Tratado
do uma fantástica energia e uma extraordinária capacida- de Versalhes, antissemitismo, anticomunismo, nacionalismo
de como orador demagógico, propagandista e organizador, exacerbado, Estado totalitário, unipartidarismo, superioridade
tornou-se rapidamente o líder do partido. Líder, Hitler in- da raça alemã (raça ariana), expansionismo (“espaço vital”)
sistiu na autoridade absoluta e total fidelidade, exigência e militarismo.
que coincidia com o anseio popular de um líder forte que
consertasse a nação em ruínas.

“As massas são despertadas pela palavra falada, não pela


escrita – por uma onda de paixão cálida proveniente do
orador que como golpes de aríete pode abrir os portões
do coração do povo” (Adolf Hitler, Mein Kampf).

1.7. A ascensão de Hitler


Adolf Hitler, o primeiro sentado à esquerda, O período de 1924 a 1929 caracterizou-se pela recupera-
durante a Primeira Guerra Mundial. ção econômica da Alemanha e pelo refluxo do movimento
A filosofia fascista foi difundida na Alemanha por Hitler, nazista. A recuperação contou com a ajuda do capital nor-
que nasceu na Áustria e lutou na Primeira Guerra Mundial te-americano, através do Plano Dawes1, que consistia em
pelas tropas germânicas, sem aceitar que a derrota fora consideráveis empréstimos para auxiliar o ressurgimento
causada pela superioridade bélica dos inimigos (Entente), industrial alemão.
mas pelos traidores internos da pátria: judeus, socialistas e Após o Putsch de Munique, o prestígio dos nazistas estava
liberais. Hitler considerou o Tratado de Versalhes uma hu- bastante abalado. Nas eleições de 1924 obtiveram apenas
milhação, que não deveria ser aceito pela liberal República 3% dos votos e 14 cadeiras no Parlamento. Já os comunis-
de Weimar. Passou a apoiar o antigo militarismo mitológico tas contaram com uma votação maior, 9%, e o centro e os
dos bárbaros germânicos, o autoritarismo do Kaiser, a per- social-democratas dominavam o cenário político, com 26%
seguição contra socialistas, judeus, ciganos, testemunhas dos votos. Com isso, os socialistas necessitavam do apoio
de Jeová, eslavos, poloneses, homossexuais e deficientes conservador para se manter no poder.
físicos e mentais. Mas em 1925, a direita apoiou a candidatura do marechal
Como Mussolini, Hitler levou atitudes e técnicas mili- Hindenburg, que foi eleito presidente com uma pequena
tares para a política. Uniformes, saudações, emblemas, vantagem sobre o candidato socialista. Monarquista con-
bandeiras e outros símbolos davam aos membros do victo, o novo presidente sonhava em restaurar o Império
partido uma sensação de solidariedade e camaradagem. e imprimiu ao seu governo um caráter ultraconservador.
Nos comícios de massa, Hitler era um orador fascinante, Entretanto, o ministério encontrava muita dificuldade para
com desempenhos espantosos. Com os punhos cerrados, se manter no poder, dada a fragilidade das alianças entre
gestos agressivos, olhos hipnóticos e rosto conturbado moderados e direitistas conservadores.
pelo ódio, criticava repetida e furiosamente o Tratado de Enquanto isso, depois que Hitler saiu da prisão, o Partido
Versalhes, o marxismo, a República de Weimar e os judeus,

8
Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães reestrutu- vadidas, jornais depredados, assassinatos de líderes rivais.
rou-se. Organizaram-se grupos paramilitares, como as SA Em 27 de fevereiro de 1933, os nazistas incendiaram o
(seções de assalto), cuja incumbência era disseminar a vio- Parlamento alemão e culparam os comunistas, que foram
lência contra os opositores da ideologia nazista. presos junto com os socialistas e os liberais hostis ao nazis-
mo. Restabeleceu-se a pena de morte e foram suspensas
Em 1929, no entanto, a Alemanha sofreu violentamente
as garantias individuais e civis.
os reflexos da crise que havia começado em Nova Iorque.
Os norte-americanos retiraram seus capitais e não renova- A pretensa conspiração comunista tinha a finalidade de
ram os empréstimos de curto prazo. O mercado mundial levar os eleitores a votar no Partido Nazista. Os nazistas
fechou-se e provocou o fechamento de fábricas alemãs e tiveram 44% dos votos e os comunistas eleitos (81 de-
desemprego em massa. As exportações, que em 1929 atin- putados) foram excluídos do Parlamento, o que deu aos
giram a cifra de 113,7 bilhões de dólares, baixaram para nazistas maioria absoluta. A 23 de março, Hitler conseguiu
98,7 bilhões, em 1933; a produção industrial caiu 39%; do Parlamento o voto que lhe dava plenos poderes.
a fundição de aço, de 16,1 milhões toneladas em 1929,
Começou a aplicar alguns pontos do programa nazista: to-
estava reduzida a 5,6 milhões em 1932. Nesse ano, o de-
dos os partidos políticos foram suspensos (exceto o nazis-
semprego atingiu sete milhões de trabalhadores. Ressurgiu
ta), os sindicatos foram extintos, os privilégios dos Estados
a agitação social e com ela o temor de uma revolução so-
foram diminuídos em favor do poder central, o direito de
cialista nos moldes do que ocorrera na Rússia.
greve foi cassado, os jornais da oposição foram fechados, a
A incapacidade de o governo parlamentar solucionar a censura à imprensa foi estabelecida e as primeiras medidas
crise contribuiu para a polarização das forças políticas e antissemitas foram postas em prática.
para o fortalecimento dos partidos comunista e nazista – A principal oposição a Hitler surgiu dentro do pró-
financiado por industriais e banqueiros, temerosos com o prio partido. Em 30 de junho de 1934, centenas de
crescimento do comunismo. oponentes da SA foram massacrados, metralhados
Nas eleições de 1930, os nazistas elegeram 107 deputados de surpresa em uma reunião. Foi a Noite dos Longos
para o Reichstag (Parlamento), com 6,5 milhões de votos. Punhais. Ao todo foram mortas três mil pessoas em
Em 1932, conquistaram 280 cadeiras, com 13,5 milhões toda a Alemanha sem contar os que foram juntar-se
de votos, seguidos do Partido Social-Democrata, com oito aos comunistas e judeus nos campos de concentração
milhões de votos. Assim fortalecido, o partido com um mi- recentemente abertos.
lhão de membros passou a atacar o adversário com as SA
Com a morte do presidente Hindenburg, Hitler assumiu o
(tropas de choque) e as SS, que somavam 400 mil homens
título de Führer (guia), acumulando as funções de chan-
e compunham um exército particular nazista. Hitler exigiu
celer e presidente. Nessas condições, anunciou ao mundo
e recebeu o cargo de chanceler em 30 de janeiro de 1933.
a fundação do Terceiro Reich (Terceiro Império) alemão.
Consumava-se assim a ascensão do nazismo ao poder.
O membros do Partido Nazista ocuparam todos os cargos
da administração pública e a política reduziu-se às mani-
1.8. O Terceiro Reich alemão festações anuais do partido, os congressos realizados em
Nuremberg. O Parlamento, cem por cento nazista, reunia-
-se intermitentemente, dependendo da vontade de Hitler
de convocá-lo.
Os judeus foram duramente perseguidos e excluídos
da administração, do ensino, do jornalismo, das ativi-
dades artísticas e literárias. Pelas leis de Nuremberg,
de 1935, passavam à condição de súditos e perdiam
direitos civis, acesso a lugares públicos, casamento
com “arianos”, punido como crime de profanação ra-
cial. O antissemitismo nazista chegou ao auge durante
a Segunda Guerra Mundial, com a solução final. Es-
Hitler ao lado do presidente Hindenburg, em agosto de 1933.
tima-se que aproximadamente seis milhões de judeus
Com a autorização do presidente Hindenburg, foram con- tenham sido mortos ao longo de todo Terceiro Reich
vocadas novas eleições após a dissolução do Parlamento. (1933–1945)
A campanha eleitoral foi um verdadeiro terror: reuniões in-

9
uma frente de patrões, em estilo corporativo, supervisio-
nadas pelo Führer. As grandes empresas foram prote-
gidas, impondo-se a formação de cartéis e acelerando a
concentração industrial.
Buscou-se o desenvolvimento econômico com base nos
planos quadrienais. No primeiro plano, em 1933, foram
realizados numerosos empreendimentos públicos para ab-
sorver a mão de obra: aeroportos, autoestradas e ferrovias.
O desemprego praticamente desapareceu em 1937, mas
Soldados nazistas colam um cartaz na vitrine de uma o grande trunfo foi o desenvolvimento da indústria bélica,
loja, em Berlim, com os dizeres:
“Alemães! Defendam-se! Não comprem de judeus”. que provocou a retomada industrial. Uma inflação disfar-
çada e empréstimos forçados financiaram essas atividades.
Foi determinada também a obrigatoriedade de pagamento
das importações alemãs com produtos da indústria alemã,
o que correspondia às necessidades dos países da Europa
Central exportadores de produtos primários.
O segundo plano quadrienal, 1936, já sob a direção do
marechal Goering, tinha por finalidade libertar ao máximo
a Alemanha das matérias-primas importadas. Retomou-se
a exploração de minérios, avançou-se na pesquisa têxtil, na
produção de borracha, de carburantes e de petróleo.
multimídia: vídeo Em 1939, a indústria alemã era a segunda mais poderosa
Fonte: Youtube do mundo. Faltavam, entretanto, minerais para desenvol-
A onda ver totalmente a indústria siderúrgica. A agricultura supria
A escola onde o professor Rainer Wenger leciona as necessidades do país em cerca de 75%. O fantástico
começa a oferecer cursos voltados a temas po- desenvolvimento da indústria bélica exigia grande quan-
líticos, e ele fica responsável por ministrar o de tidade de matéria-prima o que, por sua vez, alimentava
autocracia. Durante o mesmo, o professor perce- pretensões expansionistas. Todo o esforço de produção
be que os alunos, parte da terceira geração após bélica tinha por alvo a expansão militarista sobre outros
a Segunda Guerra Mundial, não acreditam que países, contribuindo diretamente para a eclosão da Segun-
uma ditadura poderia surgir na Alemanha mo- da Guerra Mundial.
derna, então ele começa um experimento para
mostrar o quão fácil é manipular as massas.

Outros adversários não foram poupados. Milhares de obras


foram destruídas ou excluídas dos museus, consideradas arte
degenerada: abstracionismo, impressionismo e cubismo.
O Estado nazista realizava uma intervenção moderada
na economia. Procurava controlar o mundo do trabalho e
orientar a produção sem alterar basicamente a estrutura
capitalista. Todas as atividades econômicas foram inte-
gradas de modo a harmonizarem a produção. O Estado
fixava a jornada de trabalho, os salários e os lucros dos O Ministério do Esclarecimento Popular, dirigido por Joseph
empresários, bem como velava pela formação profissional Goebbels, controlava a imprensa, a publicação de livros, o
e pelo lazer dos trabalhadores. No campo foi criado o Er- rádio, o teatro e o cinema. A propaganda nazista buscava
bhof, domínio familiar com menos de 25 acres, inaliená- condicionar a mente a reverenciar o Führer e a obedecer ao
vel, indivisível e transferível a um só herdeiro. Realizava-se regime. Concentrando-se no mito da raça e na infalibilida-
uma frente de trabalhadores, operários e camponeses e de do Führer, a propaganda nazista tentava desorientar a

10
mente racional e dar ao indivíduo novos modelos nos quais setores dominantes na sociedade espanhola levaram o país
acreditar e obedecer. A propaganda visava moldar toda a a um impasse. Surgiu nessa época um pequeno partido de
nação a pensar e responder de acordo com os comandos características fascistas, denominado Falange.
do Estado líder. Para as eleições gerais de 1936, anarquistas, comunistas,
“(...) Em maio de 1933, professores e alunos queimavam socialistas radicais, socialistas moderados, empresários
orgulhosamente livros considerados como uma ameaça liberais e minorias nacionais da Catalunha e províncias
à ideologia nazista. Muitos acadêmicos elogiavam Hitler
e o novo regime. Cerca de 10% dos professores univer-
bascas formaram a Frente Popular. Vitoriosos nas eleições,
sitários, principalmente judeus, social-democratas e libe- os partidos da Frente procuraram efetivar várias reformas
rais, foram demitidos, muitas vezes com a aprovação de sociais prometidas em campanha. O presidente eleito, Ma-
seus colegas.” nuel Azaña, anistiou 30 mil presos políticos, retomou a re-
forma agrária, deu autonomia à Catalunha e implementou
Marvin Perry Civilização ocidental: uma história concisa.
São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 582. (Adaptado) a reforma da educação.
Em 18 de julho de 1936, o general Francisco Franco
deu início a um levante contra o governo republicano.
Recebeu a adesão da Falange, de latifundiários, dos ban-
queiros, dos industriais, da maior parte da classe média e
de amplos setores da Igreja, à exceção do clero catalão e
basco. Ao lado do governo republicano legalista estavam
operários, camponeses, catalães, bascos, pequenos indus-
triais, enfim, todos que acreditavam na democracia. Como
tentativa de se defender, em outubro de 1936 o governo
multimídia: livros republicano decretou a formação de um exército popular.
Começava assim a Guerra Civil Espanhola.
1984
Embora não retrate especificamente a ascen-
são do nazismo, o livro consegue abordar uma
série de elementos importantes a se observar
sobre regimes totalitários e suas práticas.

2. A Guerra Civil Espanhola


(1936–1939)
Um fato colaborou com as tensas relações que antecede-
ram a Segunda Guerra Mundial: a guerra civil deflagrada
entre fascistas e republicanos na Espanha. Como toda a
Península Ibérica, esse país era atrasado e predominante-
mente agrário até o início do século XX, quando teve início
seu processo de industrialização. Nos primeiros anos da
década de 1930, a Espanha já possuía nas cidades uma
Adolf Hitler e Francisco Franco
parcela de sua população vinculada ao desenvolvimento
industrial, que exigia mudanças no antigo regime. Essa guerra tornou-se rapidamente um foco de tensão in-
ternacional. Os republicanos contavam com um pequeno
Em 1931, o rei Afonso XIII, pressionado pelas camadas ur-
banas que exigiam a República, abdicou. Estabeleceu-se apoio material dos soviéticos e com o auxílio das Brigadas
então um governo comandado pela burguesia liberal. O Internacionais, batalhões formados por operários, estu-
crescimento das reivindicações populares, o anticlericalismo, dantes, intelectuais e militantes de esquerda dos mais di-
o autonomismo das regiões economicamente mais adian- versos países. Alguns escritores famosos participaram des-
tadas (Catalunha e províncias bascas), a reação dos antigos sas brigadas, como Ernest Hemmingway e George Orwell.

11
Os falangistas, por sua vez, comandados por Francisco
Franco, contaram com amplo apoio da Alemanha e da Itá-
lia. Fascistas e nazistas auxiliaram as forças nacionalistas
– como ficaram conhecidos os comandados por Franco –,
por meio de homens e de ajuda material e bélica.
A partir de fevereiro de 1937, o avanço das tropas na-
cionalistas, auxiliadas pelos nazistas e fascistas, foi mais
violento. Tropas italianas tomaram Málaga. Em março de
1937, a aviação alemã, a famosa Legião Condor, bom-
bardeou a pequena cidade de Guernica, na região basca.
A intervenção da Itália e da Alemanha foi decisiva, alte- multimídia: vídeo
rando a correlação de forças da luta e transformando a
Fonte: Youtube
Espanha em um campo de testes dos novos armamentos.
Terra e liberdade
A guerra civil terminou em 1939, quando os rebeldes con-
Após a morte de seu avô, uma adolescente decide
quistaram Madri, restabeleceram a monarquia e impuseram
vasculhar seus documentos e descobre que ele era
um governo de tendências fascistas liderado por Franco. Em
um veterano da Guerra Civil Espanhola. Durante
três anos de guerra civil, o saldo de morte chegou a um mi-
sua juventude, David se juntou ao Partido Comu-
lhão. Surgia assim mais um país totalitário na Europa.
nista e logo se aliou ao POUM (Partido Obrero de
Como a Ditadura de Franco era extremamente centra- Unificación Marxista). Ele deixou a Inglaterra para
lizadora, catalães e bascos passaram a utilizar o esporte lutar contra os fascistas na Espanha, em 1936, ven-
como trincheira nacionalista – clube do Atlético de Bil- do seus sonhos e ideologias serem postos à prova.
bao, onde só jogam atletas bascos ou de ascendência
basca; parte da torcida do Barcelona (Catalunha) con-
sidera seu clube um símbolo do ideal da autonomia
catalã. Durante a Segunda Guerra Mudial, o governo
fascista de Franco não inseriu oficialmente a Espanha
ao Eixo e à Alemanha, mas apenas como simpatizante,
bem como durante a Guerra Fria, associou-se aos Es-
tados Unidos na luta contra o socialismo soviético. Esse
PICASSO, P. Guernica. Pintura-mural.
governo manteve-se no poder até a década de 1970. Disponível em: www.museoreinasofia.es

Disponível em: http://mrzine.monthlyreview.org.


Quando estoura a Guerra Civil Espanhola, em julho de 1936,
multimídia: livros Pablo Picasso torna-se um ardente defensor da causa repub-
licana (...). E como instrumento de guerra ele usou o pin-
Soldados de Salamina – Javier Cercas cel: em branco e preto e retratou todo o horror de homens,
mulheres e crianças, mutilados, de forma magistralmente
Uma reflexão sobre o que é memória e o que
trágica. E criou Guernica. Conta-se que Abetz, embaixador
é história diante de um dos episódios mais
de Hitler em Paris, ficou tão impressionado com a obra, que
sangrentos da história universal: a Guerra
teria perguntado a Picasso, aparentando desinteresse:
Civil Espanhola. É o que oferece o romance
de Javier Cercas, ao revisitar a Guerra Civil – É obra sua?
Espanhola e um de seus mais importantes – Não. Sua. – replicou o artista com frieza.
personagens, o líder da falange espanhola CARRASCO, Walcir. Picasso. São Paulo: Abril,
Ráfael Sanches Mazas. 1977, p. 20. Coleção Mestres da Pintura.

12
mostrou-se, em 1854, infinitamente superior ao Japão dos
samurais, cavaleiros dos Shoguns. A solução foi aniquilar a
economia agrícola e descentralizada do Japão e inspirar-se
na economia tecnológica do Ocidente, implantando uma
divinização do Imperador, juntamente com excessiva mili-
tarização. Esse processo foi notado quando, em 1905, o Ja-
pão derrotou a Rússia czarista, bem como quando invadiu
a Manchúria chinesa em busca de mercado consumidor e
de matéria-prima para seu parque industrial.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
A língua das mariposas
Enquanto a Espanha se aproxima da guerra ci-
vil, o garoto Moncho precisa se preparar para
o maior desafio de sua vida, a apenas algumas
horas de seu primeiro dia de aula. Ele tinha
medo de ir à escola porque ficou sabendo que
os professores batiam nas crianças. Mas quan-
do seu novo professor começa a dar aulas ao
multimídia: vídeo
garoto em sua casa, o menino tem uma oportu- Fonte: Youtube
nidade de conhecer melhor seu mestre, ficando O labirinto do fauno
fascinado por sua bondade e sabedoria, aspecto
Oficialmente, a Guerra Civil Espanhola já termi-
contrastante com a maioria dos professores rígi-
nou, mas um grupo de rebeldes ainda luta nas
dos e autoritários da época.
montanhas ao Norte de Navarra. Ofelia, uma
menina de 10 anos, muda-se para a região com
2.1. Portugal sua mãe, Carmen. Lá, seu novo padrasto as
espera, um oficial fascista que luta para exter-
Salazar foi outro ditador fascista ibérico que no entreguer-
minar os guerrilheiros da localidade. Solitária, a
ras, a partir de 1932, governou com o apoio de Hitler, mas
menina logo descobre a amizade de Mercedes,
na Segunda Guerra Mundial manteve neutralidade oficial,
jovem cozinheira da casa, que serve de contato
que o manteve no poder, mesmo após o conflito, porque
secreto dos rebeldes.
soube se tornar aliado dos EUA na Guerra Fria. Vale sa-
lientar que essa perpetuação de Salazar no poder manteve
a repressão sobre as colônias portuguesas, notadamente
na África, como Angola e Moçambique, que tiveram difi-
culdade em promover a Independência com a descoloni-
zação. Mesmo após a saída física de Salazar do poder, o
Estado português manteve a Ditadura e a colonização. As
Independências das colônias somente ocorreram em 1974,
após a Revolução dos Cravos, que democratizou Portugal.

2.2. Japão
O totalitarismo contemporâneo japonês teve início na se-
gunda metade do século XIX, quando ocorreu uma centra-
lização excessiva do poder político e ideológico em torno
do Imperador, com o apoio do Exército. Essa centralização
destruiu o Japão feudal do Shogunato. A Revolução Mei-
ji modernizou o Japão nos aspectos industriais, uma vez
que a elite ditatorial notou o atraso tecnológico japonês
quando a esquadra norte-americana, liderada por Perry,

13
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

George Orwell, escritor inglês conhecido pelos clássicos 1984 e A revolução dos bichos, participou da Guerra Civil Espanhola,
batalhando ao lado dos republicanos. Seu livro Lutando na Espanha é tido como um dos melhores relatos de guerra já escritos.
O autor relata as tramas políticas entre stalinistas e anarquistas durante o desenrolar do conflito, emitindo duras críticas ao
governo soviético, que minava a atuação dos republicanos por meio de fraudes e boicotes aos demais grupos políticos.
Apesar de ser escrito em linguagem simples, o livro contém inúmeras reflexões
sociológicas e filosóficas, dialogando com a realidade histórica e sociológica do
período, isto é, sobre a ascensão e manutenção de governos autoritários no
Ocidente.

ÁREAS DE CONHECIMENTO DO ENEM

Habilidade
13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.

A habilidade 13 contempla diversos aspectos relacionados ao caráter e ao papel que diversos movimentos sociais
assumiram durante a história. Significa dizer que, para além da pauta reivindicatória de cada movimento, o estudante
deve ater-se à composição social do mesmo. Cabe lembrarmos de que a existência moderna dos movimentos sociais
ganhou força a partir da industrialização (séculos XVIII e XIX) e assumiu papel fundamental durante o século XX.
Por vezes, também, esses movimentos se institucionalizam, ganhando contornos burocráticos e profissionais, transfor-
mando-se em partidos políticos. Dessa forma, o candidato deve compreender o funcionamento, a composição social e os
objetivos desses movimentos sociais durante cada período histórico, seja na história brasileira e na chamada história geral.

Modelo
(Enem) As Brigadas Internacionais foram unidades de combatentes formadas por voluntários de 53 nacionalidades
dispostos a lutar em defesa da República espanhola. Estima-se que cerca de 60 mil cidadãos de várias partes do mun-
do – incluindo 40 brasileiros – tenham se incorporado a essas unidades. Apesar de coordenadas pelos comunistas, as
Brigadas contaram com membros socialistas, liberais e de outras correntes político-ideológicas.
SOUZA, I.I. A guerra civil europeia. História Viva, n. 70, 2009 (fragmento).
A Guerra Civil Espanhola expressou as disputas em curso na Europa na década de 1930. A perspectiva política comum
que promoveu a mobilização descrita foi o(a):
a) crítica ao stalinismo. c) rejeição ao federalismo. e) adesão ao anarquismo.
b) combate ao fascismo. d) apoio ao corporativismo.

14
Análise expositiva - Habilidade 13: O movimento fascista – incorporado pela Itália e pela Alemanha, onde
B ficou conhecido como nazismo – ganhou corpo na Europa a partir da década de 1930. Sistematizado a partir de
atitudes autoritárias (como o unipartidarismo, a censura e o racismo), o fascismo foi responsável por alguns episódios
violentos no velho continente, o que fez surgir uma série de movimentos contrários a ele.
Alternativa B

DIAGRAMA DE IDEIAS

NAZISMO

A CONTEXTO B IDEOLOGIA NAZISTA

• DERROTA NA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL: TRATADO • FASCISMO


DE VERSALHES • REPÚDIO AO TRATADO DE VERSALHES
• LEVANTE ESPARTAQUISTA (1919): FORÇA DO MARXISMO/ • ANTISSEMITISMO
LENINISMO • ANTICOMUNISMO
• REPÚBLICA DE WEIMAR (1919-1933): REPÚBLICA FE- • NACIONALISMO EXACERBADO
DERATIVA, PARLAMENTAR E DEMOCRÁTICA • ESTADO TOTALITÁRIO
• CRISE ECONÔMICA E INFLAÇÃO • UNIPARTIDARISMO
• CRISE DE 1929 • MILITARISMO
• SUPERIORIDADE DA RAÇA ARIANA
• EXPANSIONISMO (“ESPAÇO VITAL”)
• GRUPOS PARAMILITARES (SA E SS)
C ASCENSÃO DO NAZISMO

1919 1923 1932 1933 1934


• CRIAÇÃO DO PARTIDO NA- • PUTSCH DE MU- • ELEIÇÃO DE • HITLER SE TORNA • HITLER SE TORNA FÜHRER
CIONAL-SOCIALISTA DOS NIQUE (GOLPE MAIORIA CHANCELER (PRI- (GUIA)
TRABALHADORES ALEMÃES FRACASSADO) NAZISTA NO MEIRO-MINISTRO)
OU PARTIDO NAZISTA PARLAMENTO
• LÍDER: ADOLF HITLER

D GOVERNO NAZISTA

1933 1935
• INCÊNDIO DO PARLAMENTO • PERSEGUIÇÃO AOS JUDEUS
• SOCIAIS-DEMOCRATAS EXPULSOS RETOMADA ECONÔMICA
1934 • DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL
• SA ASSASSINA OPOSITORES • ALIANÇA ENTRE ESTADO E CAPITAL PRIVADO
• HITLER SE TORNA FÜHRER • ESTÍMULO A OBRAS PÚBLICAS (FIM DO DESEMPREGO)
• CRIAÇÃO DO III REICH • DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA BÉLICA

15
GUERRA CIVIL ESPANHOLA
(1936-1939)

A CONTEXTO B ANTECEDENTES

• PAÍS AGRÍCOLA • DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL


• BAIXA INDUSTRIALIZAÇÃO ACELERADO (SÉC. XX)
• FORÇA DO CATOLICISMO • NECESSIDADE DE MUDANÇAS POLÍTICAS
• CONCENTRAÇÃO DO PODER REAL • 1931
• ABDICAÇÃO DO REI
• PROCLAMAÇÃO DE REPÚBLICA LIBERAL
C GUERRA CIVIL • FORÇA DAS REIVINDICAÇÕES POPULARES
• LUTA POR AUTONOMIAS LOCAIS (EX.: CATALUNHA)
ELEIÇÃO DE 1936 • FORMAÇÃO DA FALANGE (PARTIDO FASCISTA)
• VITÓRIA DA FRENTE POPULAR (ANARQUISTAS, COMU-
NISTAS, SOCIALISTAS, DEMOCRATAS E REPUBLICANOS
LIBERAIS)
• LEVANTE MILITAR (GENERAL FRANCO, FALANGE, BAN- FIM DA GUERRA CIVIL
QUEIROS E LATIFUNDIÁRIOS) • VITÓRIA DOS FRANQUISTAS
• GOVERNO DO GENERAL FRANCO ATÉ 1975
SETORES E APOIO INTERNACIONAL
• REPUBLICANOS: APOIO DA URSS E BRIGADAS POPULARES
• FRANQUISTAS: APOIO DA ITÁLIA E DA ALEMANHA

PORTUGAL JAPÃO

SALAZARISMO REVOLUÇÃO MEIJI


• 1932 – GOLPE DE ANTONIO SALAZAR • MEADOS DO SÉCULO XIX
• GOVERNO DE INSPIRAÇÃO FASCISTA • CENTRALIZAÇÃO POLÍTICA NO IMPERADOR
• NEUTRALIDADE NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL • MODERNIZAÇÃO DA INDÚSTRIA E DO EXÉRCITO
• APOIO AOS EUA NA GUERRA FRIA • EXPANSIONISMO NO SÉCULO XX
• MANUTENÇÃO DAS COLÔNIAS AFRICANAS
• FIM DA DITADURA E INDEPENDÊNCIA COM A REVOLU-
ÇÃO DOS CRAVOS (1974)

16
AULAS Segunda Guerra Mundial
47 e 48
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10,
Competências: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 Habilidades: 11, 13, 14,15, 16, 19,
20, 21, 22, 27 e 29

União Soviética stalinista e socialista estava isolada da con-


juntura internacional e inimiga dos capitalistas, tanto dos
Aliados, como do Eixo, embora uma exceção desse “cor-
dão sanitário” tenha ocorrido quando a diplomacia apro-
ximou Berlim de Moscou para firmar um singular pacto de
paz que vigorou até 1941.

2. Antecedentes
Hitler se aproveitava das questões internacionais para
ampliar seu sistema de alianças. Aproximou-se da Itá-
Soldados alemães invadem a Polônia, em 1º de setembro
lia em 1935, prestando-lhe ajuda econômica durante o
de 1939: começava a Segunda Guerra Mundial. embargo econômico aplicado pela Liga das Nações por
causa da invasão da Etiópia. Juntamente com Mussolini,

1. Introdução apoiou Francisco Franco na Guerra Civil Espanhola, de


1936 a 1939, aproveitando para testar a eficiência de
Entre os anos de 1939 e 1945, o mundo foi envolvido por seus tanques e aviões. Assinou com o Japão o Pacto An-
um conflito de grandes proporções que ultrapassou as ti-Komintern, em novembro de 1936, destinado a conter
fronteiras da Europa, tendo como pano de fundo a concor- a União Soviética e a ação da Internacional Comunista.
rência imperialista entre o capitalismo industrial monopo- A Itália, a Hungria e a Espanha aderiram ao pacto. Ao
lista inglês e francês em contraposição ao alemão, japonês mesmo tempo, Hitler se aproximava da Itália e Mussolini
e italiano, acrescido da óbvia divergência entre o capitalis- proclamava o Eixo Roma–Berlim, uma manifestação de
mo e o socialismo da recém-criada URSS. É possível afir- solidariedade, que o Duce lembraria durante a visita do
mar que a Segunda Guerra Mundial é uma continuação da Führer a Roma, em 1938.
Primeira, pois as disputas por mercado consumidor entre
a burguesia da antiga Entente contra a burguesia do extin-
to II Reich alemão não foram solucionadas com o término
do conflito militar em 1918. Em 1939, os blocos milita-
res eram os Aliados, formados pela Inglaterra e a França,
acrescidos pelos Estados Unidos e pela União Soviética,
em 1941; e o outro bloco bélico era o Eixo, formado pela
Alemanha, Itália e Japão. A Inglaterra e a França represen-
tavam ideologicamente a democracia burguesa Ocidental,
que valorizava a política pela via parlamentar e o exercício
da cidadania, seja por intermédio da Monarquia Consti-
tucional, no curso inglês, ou da República, no francês. O
Eixo se orientava pelo fascismo de Estados totalitários, pois Benito Mussolini e Adolf Hitler, em 28 de setembro de 1938.
a Alemanha era comandada por Hitler com o III Reich, a
Itália era dirigida por Benito Mussolini e o Japão pelo im- O III Reich germânico não aceitava as imposições do Tra-
perador divinizado Hirohito. No início da guerra, o governo tado de Versalhes e passou a ambicionar um crescimento
estadunidense adotou uma política de distanciamento dos bélico e territorial, principalmente sobre o corredor polo-
problemas europeus. Apesar de ser próximo da Inglaterra, nês, embora o próprio Tratado de Versalhes proibisse o mi-
relutou até 1941 em participar diretamente do conflito; a litarismo alemão.

17
Foi nesse contexto que o parlamento britânico elaborou
um plano diplomático chamado de Política de Apazigua-
mento, que se caracterizava pela “permissão” de um re-
lativo crescimento bélico alemão, que teria o intuito de
barrar um possível avanço do socialismo soviético, ou seja,
o Estado inglês queria que o nazismo defendesse a civiliza-
ção Ocidental da “barbárie” comunista. Como resultado,
Hitler conseguiu fortalecer-se e passou a buscar o controle
territorial de parte da Europa central, que ele chamava de
“espaço vital”, apoiado veladamente pela Inglaterra e pela
França na formação do III Reich. Antes da Segunda Guerra
Mundial começar, a Alemanha já tinha anexado a Áustria e
a Tchecoslováquia, cuja invasão foi legalizada pela Confe-
rência de Munique, em setembro de 1938.

Cerimônia de assinatura do Pacto de não agressão Germano-Soviético.


Molotov está assinando.
Atrás, Ribbentrop (com os olhos fechados) ao lado de Stalin.

Da esquerda para direita: Chamberlain (Inglaterra), Daladier (França),


3. Fatores da guerra
Hitler (Alemanha), Mussolini (Itália) e A esperança de uma paz duradoura, após o fim da Primeira
Ciano (ministro de Assuntos Exteriores da Itália),
quando da assinatura do Acordo de Munique.
Guerra Mundial, foi mera ilusão. Vários fatores criaram as
condições para que um novo conflito surgisse, envolvendo
O potencial de guerra alemão cresceu enormemente com as nações europeias e a maior parte dos países do mundo,
a integração da indústria tcheca. Mussolini aproveitou para no período de 1939 a 1945.
invadir e conquistar a Albânia. A aproximação entre os dois § O comportamento revanchista das nações perdedo-
Estados totalitários foi consagrada na aliança ofensiva entre ras da Primeira Guerra Mundial, especialmente da
Itália e Alemanha, o Pacto de Aço, firmado em maio de 1939. Alemanha em relação à França, contou com vencidos
Para posterior desespero dos Aliados, Hitler e Stalin resol- desgastados pela guerra e sobrecarregados com seus
veram criar o Pacto de não agressão germano-sovi- compromissos financeiros para com os vencedores
ético. Esse acordo permitiria que, no futuro, a Alemanha (indenizações e reparações). Cresciam seus problemas
pudesse invadir seus inimigos europeus Ocidentais (a Oes- econômicos e sociais. Na Itália e na Alemanha, o des-
te) sem dividir seu exército, pois estaria em “harmonia” contentamento da população deu oportunidade ao
com sua inimiga URSS (a Leste). Também conhecido como surgimento de partidos totalitários – fascista e nazista
Ribbentrop-Molotov, esse pacto ajudaria o governo de –, culminando com a implantação de Estados militaris-
Stalin, pois a União Soviética não tinha estrutura militar tas e expansionistas, com forte apelo nacionalista.
que pudesse protegê-la de um ataque nazista. Com isso,
§ A crise de 1929 e suas graves consequências políticas e
a URSS ganharia tempo para implantar uma política arma-
sociais em quase todos os países da Europa. Em razão
mentista. Havia, também, outros acordos firmados entre
as duas potências, como o da invasão e divisão da Polônia de sua amplitude internacional, reduziu o mercado con-
por tropas alemãs e soviéticas. Além disso, os soviéticos sumidor de todas as nações capitalistas. Os países atin-
receberam secretamente o controle sobre a Finlândia, a Le- gidos pela Grande Depressão procuraram defender seus
tônia, a Estônia e a Bessarábia.1 Os alemães ficaram com mercados internos da concorrência estrangeira através
a Lituânia. da elevação das tarifas alfandegárias. Esse nacionalismo
1 A Bessarábia é o nome de uma região histórica da Europa Oriental, econômico intensificou as lutas pelo domínio dos merca-
cujo território se divide entre a Moldávia e a Ucrânia. dos entre as várias potências imperialistas.

18
§ O surgimento de governos totalitários, militaristas e A França foi dividida em duas áreas. O Sul continuou supos-
expansionistas. A partir de 1930, quando os efeitos da tamente independente, nomeada de República de Vichy e
recessão econômica repercutiram em todo o mundo, liderada pelo general francês Pétain, que não demonstrou
iniciou-se o expansionismo de alguns países imperia- resistência à ascensão de Hitler, por isso mesmo foi con-
listas. A Itália ocupou a Etiópia, em 1935, situada no siderado seu colaborador; já o Norte foi completamente
Nordeste da África. A Alemanha, desrespeitando o Tra- ocupado pelas tropas nazistas, que passaram a adminis-
tado de Versalhes, remilitarizou a região da Renânia, trá-lo. Vale salientar que o acervo arquitetônico de Paris
em 1936, e anexou a Áustria e a Tchecoslováquia, em foi deliberadamente protegido por Hitler, pois ele queria,
1938. O Japão, no segundo semestre de 1931, partiu numa suposta vitória alemã, no pós-guerra, embelezar Ber-
para a conquista da Manchúria – que pertencia à Chi- lim e superar a cidade das luzes. Parte considerável da po-
na –, começando, assim, a penetração naquele país pulação francesa humilhada, sem poder lutar abertamente
dominado pelo governo de Chiang Kai-shek. contra o poderoso exército germânico, criou o Movimento
da Resistência, que, mediante atos de sabotagem, espio-
§ O fracasso da Liga das Nações. Ao longo da década de nagem e atentados, ajudou a minar a ocupação hitlerista.
1930, o mundo contava com a Liga das Nações, órgão As tropas francesas fixadas em solo inglês foram lideradas
internacional que tinha por objetivo manter a paz e a pelo general Charles de Gaulle, que as manteve unidas e
ordem entre os diversos países. No entanto, Inglaterra com a chama da esperança acesa de que era viável, num
e França dominaram o organismo, direcionando as de- futuro não muito remoto, voltar para sua pátria e libertá-
cisões de acordo com seus interesses. Quando algum -la do jugo nazista. É importante salientar que de Gaulle
país menos importante era agredido, as decisões da também utilizava emissoras inglesas de rádio de ondas
Liga das Nações eram quase sempre brandas em re- curtas para ser ouvido, reservadamente, por membros da
lação aos agressores. França e Inglaterra temiam ge- Resistência e, com isso, articular ações contra o domínio
rar conflitos com as potências expansionistas. Dessa germânico. Ao final da Segunda Guerra Mundial, a popu-
lação francesa elegeu de Gaulle presidente da República.
forma, em inúmeras vezes, as pequenas nações foram
sacrificadas.

4. As fases da guerra
4.1. Avanço do Eixo (1939–1941)
Nesse contexto, o cenário da guerra já estava criado e, em
1º de setembro de 1939, as forças bélicas de Hitler invadi-
ram o corredor polonês da cidade de Danzig, hoje Gdánsk.
Em resposta, o governo inglês, mais bem preparado, decre-
tou guerra à Alemanha; em 1940, com a blitzkrieg (guerra
relâmpago), as tropas nazistas invadiram a Dinamarca, a
Noruega, a Holanda, a Bélgica e a França. Diante dessa
inusitada realidade, os exércitos francês e inglês foram
General Charles de Gaulle discursa na BBC, em
obrigados à Retirada de Dunquerque e a fugirem para a Londres, em 30 de outubro de 1941.
Grã-Bretanha.
Após vencer a França, a Alemanha preparou-se para in-
vadir a Inglaterra pelo canal da Mancha. Contudo, a força
naval britânica mostrou-se eficiente e conseguiu afundar
o encouraçado “Bismarck”, evitando, assim, ser invadida
por mar. Em vista disso, Hitler fustigou a marinha de guerra
e comercial britânica com seus submarinos, denominados
“lobos do mar”, e lançou mão da tática de derrotar o reino
britânico pelo ar, com gigantescos ataques aéreos da Luf-
twaffe (Força Aérea Alemã), dando início, em setembro de
1940, à Batalha da Inglaterra. Essa tática alemã arruinou
Tropas nazistas invadem Paris, durante a Segunda Guerra Mundial. a economia britânica. Contudo, a Inglaterra não se rendeu

19
graças à valentia dos pilotos da RAF (Força Aérea Real), do Em fevereiro de 1941, após o fracasso da ofensiva
apoio moral da coroa inglesa, na pessoa da Rainha-mãe, italiana no Norte da África, a Alemanha desembarcou
e à magnífica ajuda econômica dos EUA. A derrota da Ale- na Líbia, com o Afrikakorps, comandado pelo general
manha nessa batalha obrigou Hitler a adiar indefinidamen- Rommel. Seu objetivo era conquistar o canal de Suez,
te a Operação Leão do Mar, cujo objetivo era invadir a In- cortando, assim, as rotas vitais da Inglaterra e isolando-
glaterra. Referindo-se ao heroico desempenho dos pilotos -a de seu império colonial. Ao mesmo tempo, ocorreu a
da RAF nessa batalha, o primeiro-ministro inglês Winston adesão da Hungria, da Romênia e da Bulgária às forças
Churchill afirmou: “Nunca na história dos grandes conflitos do Eixo. Em maio de 1941, a ocupação da Iugoslávia e
humanos, tantos deveram tanto a tão poucos”. da Grécia completou o isolamento da Inglaterra.
Com o fracasso na Batalha da Inglaterra, a Alemanha co-
locou-se diante da perspectiva de uma guerra de longa
duração na Europa. Com a finalidade de assegurar su-
primentos vitais à continuação da guerra, Hitler rasgou
o Pacto de não agressão germano-soviético, ordenou a
invasão da União Soviética e deu início à Operação Bar-
barossa. A invasão estendeu-se por uma frente de quase
três mil quilômetros com vistas às conquistas simultâneas
de Leningrado, ao Norte, Moscou, ao centro, e Ucrânia e
Londres, após oito semanas de violentos bombardeios alemães, em 1940,
quando foram despejadas mais de 20 mil
Cáucaso, ao Sul.
toneladas de bombas sobre a cidade.

Paralelamente, agravavam-se as tensões entre os Estados Unidos e o Japão, na Ásia e no Pacífico. Em 1941, prosseguia a
Guerra Sino-Japonesa. Com a queda da França, o Japão promoveu a ocupação da Indochina Francesa. Em novembro, o go-
verno estadunidense decretou o embargo comercial ao Japão e exigiu a imediata evacuação da China e da Indochina. Em 7

20
de dezembro de 1941, enquanto prosseguiam as negocia- consideravam a suposta raça inferior dos eslavos. Em ra-
ções diplomáticas entre os dois países, o Japão atacou sem zão disso, a invasão foi chamada de Operação Barbarossa
prévia declaração de guerra a base naval estadunidense de (Barba Ruiva). Pretendia também destruir o comunismo re-
Pearl Harbor, no Havaí. Logo depois, a Alemanha e a Itália presentado pelo governo de Stalin. Apesar de socialista, a
declaravam guerra aos Estados Unidos. URSS foi recebida de braços abertos pelas combalidas for-
ças capitalistas inglesas e francesas, cujos exércitos tinham
sido divididos para penetrar o Leste europeu. Hitler acredi-
tava que venceria a União Soviética em semanas ou meses,
mas experientes generais alemães, como Rommel, sabiam
que seu exército possivelmente seria derrotado. Hitler es-
tava cometendo os mesmos erros de Napoleão Bonaparte.
Foi o que realmente ocorreu, uma vez que, utilizando a táti-
ca da terra arrasada e do extremo frio, o Exército Vermelho
aniquilou as forças alemãs, em 1943, e passou a atacar a
Alemanha. Por isso, considera-se a Batalha de Stalingrado
O encouraçado USS West Virginia (BB-48) em chamas, atingido
“o começo do fim da Alemanha”.
por um bombardeio japonês durante o ataque a Pearl Harbor.

O bombardeio a Pearl Harbor foi seguido de uma ofensiva


japonesa na Ásia meridional e no Pacífico. A Malásia Bri-
tânica, o porto de Cingapura, a Birmânia, a Indonésia e
as Filipinas sucumbiram aos ataques japoneses. No litoral
da China, foi ocupado o porto de Hong Kong. No Pacífico,
foram conquistadas ilhas pertencentes aos EUA e à Ingla-
terra. A ocupação japonesa dessas áreas foi recheada de
atitudes de genocídio, semelhantes às dos nazistas nos
campos de concentração na Europa. Ataque do Exército Vermelho em Stalingrado, em fevereiro de 1943, que
deteve a ofensiva alemã e
obrigou o exército nazista a se render, pondo
fim ao mito da invencibilidade alemã.

Quando o Japão atacou os EUA em Pearl Harbor, avaliou


que não teria dificuldade em controlar definitivamente o
Pacífico e o extremo Oriente. Contudo, o governo Roosevelt
passou a fortalecer os Aliados e a economia estadunidense
mostrou sua pujança. Em pouquíssimo tempo, construiu
navios, aviões e fuzis, oxigenando os Aliados e, paulati-
namente, enviando armamentos e tropas para a Europa
Ocidental e para o Pacífico. Também paulatinamente, o
Japão teve suas forças armadas, notadamente a marinha,
arrasada em batalhas como a de Midway e Iwojima. Ape-
Área sob domínio japonês, durante a Segunda Guerra Mundial. sar de os ditadores Franco, na Espanha, e Salazar, em Por-
tugal, pertencerem à área de influência de Hitler, eles não
entraram diretamente na guerra, o que rendeu-lhes a não
4.2. Ascensão dos Aliados (1941–1945) perseguição por parte dos Aliados. Hitler sofreu derrotas
O ano de 1941 marcou a mudança do curso da guerra. na Iugoslávia pelos guerrilheiros partisans, liderados por
O Eixo, até então imbatível, tomou duas decisões nefastas Tito. Mesmo com o socorro alemão às tropas de Mussolini,
para a continuidade do seu domínio: invadir a União So- os partisans atacaram o belicismo nazista e se refugiaram
viética e atacar a base estadunidense de Pearl Harbor, no eficazmente nas montanhas.
Pacífico, pelo Japão.
No Norte da África, o Afrikakorps alemão, com seus tan-
Após o fracasso na Batalha da Inglaterra, a Alemanha re- ques panzers, liderados pelo general Rommel, foi der-
solveu ocupar a URSS em busca de reservas de matéria-pri- rotado fragorosamente pelas forças anglo-francesas do
ma e de petróleo, no Cáucaso, e aniquilar o que os nazistas general britânico Montgomery e pelos blindados estadu-

21
nidenses do general Patton, que aniquilou os alemães, Após a Batalha de Stalingrado, a Alemanha foi perdendo
em maio de 1943, e partiu para derrotar as tropas de grande contingente de tropas no Leste em razão do incisivo
Mussolini, na Itália. avanço soviético, que fez diminuir o poder germânico no ca-
nal da Mancha. Como consequência, o alto comando aliado
Em julho de 1943, as forças aliadas desembarcaram na
europeu Ocidental, nas mãos do general estadunidense Ei-
Sicília. Logo depois, Mussolini foi destituído pelo rei Vitor
senhower, reuniu tropas dos EUA, inglesas e francesas e pe-
Emanuel III. Foi nesse momento que o Brasil entrou na
netrou no território europeu, libertando a França no episódio
guerra ao lado dos Aliados e o governo ditatorial do Esta-
que se tornou conhecido como o Dia D, 6 de junho de 1944,
do Novo de Vargas criou a Força Expedicionária Brasileira,
quando as tropas aliadas desembarcaram na Normandia.
FEB. Ao lado da Força Aérea Brasileira, FAB, os pracinhas
brasileiros conseguiram grandes vitórias em Monte Castelo
e Montese.

Desembarque das forças aliadas na Normandia, França: o Dia D.

multimídia: vídeo
Soldado brasileiro estampado no jornal Cruzeiro do Sul. Apesar da Fonte: Youtube
expressão popular,
“é mais fácil uma cobra fumar do que o Brasil entrar Roma, cidade aberta
na guerra”, não foi bem o que ocorreu.
Um dos líderes da resistência, Giorgio Manfredi
(Marcello Pagliero), é procurado pelos nazistas.
Em setembro de 1943, o novo governo italiano firmou
Giorgio planeja entregar um milhão de liras para
um armistício com os Aliados, retirando a Itália da guer-
seus compatriotas. Ele se esconde no apartamento
ra. Libertado por um comando nazista, Mussolini fundou,
de Francesco (Francesco Grandjacquet) e pede
ao Norte do país, a efêmera República Social Italiana. Em
ajuda à noiva de Francesco, Pina (Anna Magnani),
outubro, a Itália uniu-se aos Aliados e declarou guerra à
que está grávida. Giorgio planeja deixar um padre
Alemanha e, em abril de 1945, ocorreu a capitulação das
católico, Don Pietro (Aldo Fabrizi), fazer a entrega
forças nazistas na Itália. Mussolini foi detido ao tentar fugir
do dinheiro.
para a Suíça e, em seguida, foi fuzilado por um comando
da Resistência Italiana Antifascista.

Enquanto isso, em janeiro de 1945, a Polônia fora libertada


4.3. Derrota do Eixo pelos russos, que logo depois realizaram a junção de suas
Com a derrota da Itália, fechou-se o cerco à Alemanha. tropas com as estadunidenses às margens do rio Elba. Com
A Leste, a ofensiva soviética culminou, em 1944, com a o suicídio de Hitler, a conquista de Berlim pelo Exército Ver-
libertação da Romênia, da Bulgária, da Tchecoslováquia e melho e a queda do III Reich, em maio de 1945, terminava
da Hungria pelo Exército Vermelho. a guerra na Europa.

22
Destruição de Hiroshima causada pela bomba
O Exército Vermelho conquista Berlim. Era o atômica, em 6 de agosto de 1945.
fim da Segunda Guerra na Europa.

No Pacífico, apesar do inequívoco recuo, o Japão reluta-


va em render-se, pois acreditava que a derrota seria um
martírio religioso, já que o imperador Hirohito era consi-
derado Deus. Em razão disso, muitos pilotos japoneses
transformaram-se em kamikazes e praticaram o suicídio
bélico, utilizando seus aviões como mísseis para melhor
se chocar contra os navios dos EUA. Foi nesse contexto
que o presidente estadunidense Harry Truman autori-
zou o bombardeio atômico em Hiroshima (6 de agosto
de 1945), cuja bomba foi intitulada de Little boy, e em
Nagazaki (9 de agosto de 1945). É curioso notar que a
bomba atômica chamada de Fat man, composta por plu- Explosão nuclear em Nagasaki, Império do
Japão, em 9 de agosto de 1945.
tônio-239, foi detonada em Nagazaki, mas tinha como
principal alvo a antiga cidade de Kokura, que deixou de
ser bombardeada porque a tripulação do bombardeiro
4.4. As conferências
B-29 não conseguiu localizar o centro dela e, por isso, Ao longo do conflito, as potências aliadas realizaram inú-
rumou para Nagazaki. meras conferências, cujas decisões diplomáticas refletiram-
As bombas nucleares foram concebidas pelo dispendioso -se política e militarmente no mundo do pós-guerra.
Projeto Manhattan, liderado pelo físico Oppenheimer, no
deserto do Novo México. No seu início, esse projeto teve
o apoio do físico pacifista Albert Einstein, que, apesar de
não participar diretamente da confecção dos artefatos,
acreditava que sua concepção teria o propósito de aniqui-
lar a expansão do nazismo, ou seja, seria uma bomba da
“cidadania”. Por isso, muitos cientistas, inclusive Einstein,
criticaram o bombardeio sobre o Japão, pois tinham medo
de que o uso de armas nucleares em guerras ficasse sem
controle. Ressalte-se que o uso das bombas nucleares teve
como pretexto oficial a aceleração da rendição japonesa;
contudo, muitos historiadores acreditam que a real causa multimídia: vídeo
das detonações esteja relacionada à antecipação da Guer-
ra Fria, já que os EUA queriam anular a ascensão das forças Fonte: Youtube

socialistas soviéticas. A lista de Schindler


Com a rendição japonesa, em 2 de setembro de 1945, O filme conta a história de Oskar Schindler,
a Segunda Guerra Mundial terminava e, com ela, a he- um empresário alemão que salvou a vida de
gemonia europeia sobre o mundo, que assistiu ao sur- mais de mil judeus durante o Holocausto ao
gimento de uma nova ordem mundial dominada pela empregá-los em sua fábrica.
Guerra Fria.

23
4.4.1. Conferência do Cairo (novembro de 1943) Outra decisão importante, com a anuência do presidente
Roosevelt, foi transformar os países da Europa Oriental
Após o início da contraofensiva estadunidense na guerra em área de influência da União Soviética. Finalmente, es-
do Pacífico e a capitulação da Itália, realizou-se no Cai- tabeleceu-se a intervenção da União Soviética na guerra
ro, capital do Egito, a primeira conferência dos Aliados. contra o Japão em troca de Port Arthur, ao Sul de Sacali-
Dela participaram Roosevelt, Churchill e Chiang Kai-shek, na e das ilhas Kurilas. Pela relevância de suas decisões e
presidente da China, com o objetivo de discutir o destino pelas consequências que produziu no pós-guerra, a Con-
político da Ásia Oriental, após a derrota do Japão. Nela, ferência de Ialta foi considerada a mais importante da
os Aliados decidiram devolver à China todos os territórios Segunda Guerra Mundial.
tomados pelo Japão, durante a Guerra Sino-Japonesa. Foi
decidido ainda o restabelecimento da Independência da 4.4.4. Conferência de Potsdam (julho de 1945)
Coreia e de todos os países conquistados pelo Japão.
Após a derrota alemã, os Aliados se reuniram para uma nova
conferência em Potsdam, subúrbio de Berlim. Dos “três gran-
4.4.2. Conferência de Teerã (dezembro de 1943) des”, apenas Stalin participou dessa conferência, uma vez
que Churchill havia perdido as eleições na Inglaterra e fora
Os “três grandes” – Roosevelt, Churchill e Stalin – reuni-
ram-se pela primeira vez em Teerã, capital do Irã. A ofensiva substituído por Clement Attlee, e Roosevelt falecera pouco
soviética no Leste europeu e a capitulação da Itália haviam antes do fim da guerra e fora substituído por Harry Truman.
alterado de forma irreversível o curso da guerra a favor dos Em Potsdam, foi fixado em 20 bilhões de dólares o montante
Aliados e selado definitivamente o destino da Alemanha que a Alemanha pagaria como reparações de guerra. Dessa
nazista. Nessa conferência decidiu-se a abertura de uma importância, caberiam 50% à União Soviética, 14% à Ingla-
segunda frente de guerra na Europa Ocidental e foi es- terra, 12,5% aos Estados Unidos e 10% à França.
colhida a costa francesa como local de desembarque das Foi decidido ainda suprimir a indústria de guerra alemã,
forças aliadas. Os Estados Unidos e a Inglaterra também reduzir sua produção de aço, transferir a maior parte de
reconheceram oficialmente a anexação pela União Sovié- suas fábricas para os países aliados e promover o julga-
tica dos países bálticos – Lituânia, Letônia e Estônia – e o mento dos líderes do regime nazista. Esse julgamento foi
Leste da Polônia. realizado pelo Tribunal de Nuremberg, do qual resultou a
condenação à morte de 12 líderes nazistas. Finalmente, a
4.4.3. Conferência de Ialta (fevereiro de 1945) Conferência de Potsdam confirmou a divisão da Alemanha
em quatro zonas de ocupação dos países aliados – Estados
Unidos, Inglaterra, França e União Soviética.

Churchill, Roosevelt e Stalin: os “três


grandes” reunidos em Ialta, 1945.

Quando já era iminente a derrota do III Reich, os “três gran- multimídia: livros
des” voltaram a se reunir em Ialta, na Crimeia, às margens
do mar Negro. Nesse encontro, foi fixada oficialmente a Linha A rosa do povo – Carlos Drummond de Andrade
Curzon como fronteira entre a União Soviética e a Polônia, Foi escrito quando os horrores da Segunda
e foram cedidas aos soviéticos as regiões ocupadas quando Guerra Mundial angustiavam a humanidade
da partilha, em 1939; em compensação, a Polônia receberia, e o exército nazista recuava, especialmente
a Leste, os territórios alemães até as margens do rio Oder. na então União Soviética. As mais importan-
Decidiu-se também que os Estados Unidos, a União Soviética tes divisões alemãs haviam sido derrotadas
e a Inglaterra manteriam controle sobre os países libertados no Leste europeu pelos russos, prenunciando
da Europa Oriental e que a Alemanha seria dividida em zonas a capitulação do III Reich.
de ocupação sob a direção de um Conselho Aliado.

24
Campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, na Polônia.

multimídia: vídeo Para apressar a “solução final”, os campos de concentra-


ção, que originalmente se destinavam a presos políticos,
Fonte: Youtube
foram transformados em centros de execução, e novos
A vida é bela campos foram construídos com esse objetivo. Judeus de
Durante a Segunda Guerra Mundial na Itália, o toda Europa eram presos, amontoados em vagões fe-
judeu Guido (Roberto Benigni) e seu filho Giosué chados de transportar gado e enviados para Treblinka,
são levados para um campo de concentração Auschwitz, Dachau, Buchenwald e outros campos de exter-
nazista. Afastado da mulher, ele tem que usar mínio. Utilizando a tecnologia e a burocracia de um Estado
sua imaginação para fazer o menino acreditar moderno, os nazistas mataram cerca de seis milhões de
que estão participando de uma grande judeus, dois terços da população judaica da Europa. Cer-
brincadeira, com o intuito de protegê-lo do ca de 1,5 milhão dos assassinados eram crianças; quase
terror e da violência que os cercam. 90% das crianças judias em terras ocupadas pelos nazis-
tas morreram. Dezenas de milhares de famílias inteiras

5. Consequências da
desapareceram sem deixar traço. Comunidades judaicas
com centenas de anos desapareceram para jamais serem

Segunda Guerra Mundial restabelecidas. Muitos dos criminosos de guerra alemães


foram julgados pelo Tribunal de Nuremberg e alguns deles
condenados à morte. Com o avanço da discussão sobre
5.1. Perdas humanas as garantias dos direitos humanos, o Tribunal de Nurem-
Os números relativos às perdas humanas são dificilmente berg tornou-se a semente para o surgimento do Tribunal
calculáveis. No mínimo, chegaram a 50 milhões, dentre os Internacional de Haia, na Holanda, que tem a finalidade de
quais 20 milhões de russos, que sacrificaram, em popula- julgar os atuais criminosos de guerra.
ção e recursos materiais, mais do que os outros participan-
tes. Morreram, proporcionalmente, muito mais civis que
militares. A guerra mecanizada, de movimentos rápidos,
fez mais mortos do que prisioneiros. Bombardeios aéreos
dizimaram populações inteiras de civis. Em Berlim, fizeram
50 mil vítimas; em Dresden, 200 mil.

5.2. Genocídio
Com a penetração de soldados aliados em territórios an- Os líderes nazistas Hermann Goering (de óculos escuros) e Rudolph
teriormente controlados pelas forças do Eixo, como a Po- Hess, no Tribunal de Nuremberg.
A defesa clássica de ambos foi que “só estavam seguindo ordens”.
lônia, constatou-se a nefasta política nazista de extermínio
de minorias e de pessoas que se distanciassem do padrão A guerra provocou uma enorme migração de povos sem
de raça “pura” proposto pelos nazistas. As tropas aliadas paralelo na história humana. A União Soviética anexou
encontraram campos de concentração, o mais conhecido o Leste da Prússia e as terras bálticas da Letônia, Lituâ-
deles foi o de Auschwitz. Judeus, ciganos, eslavos, homos- nia e Estônia, deportando pela força muitos habitantes
sexuais, germânicos com deficiências mentais sucumbiram para a Rússia central. A maior parte da Prússia Oriental
numa dor atroz que ainda repercute entre os homens e as foi ocupada pela Polônia. Milhões de alemães fugiram
ideias de liberdade e tolerância. Os judeus chamaram-na ou foram expulsos da Prússia, da Tchecoslováquia, da
de Holocausto; Hitler, de “solução final”. Romênia, da Iugoslávia e da Hungria, onde seus ancestrais

25
haviam vivido durante séculos. Os custos materiais foram Sob o ponto de vista econômico, os grandes beneficiários
espantosos. Por toda parte, cidades estavam em ruínas: foram os Estados Unidos, que perderam no conflito em torno
pontes, sistemas ferroviários, vias fluviais e portos destru- de 400 mil homens, mas dobraram sua produção industrial
ídos; terras agrícolas devastadas, gado morto e minas de entre 1939 e 1945. A aeronáutica passou a liderar a indús-
carvão desabadas. Pessoas sem lar e famintas vagavam tria estadunidense; os setores têxtil e químico livraram-se da
pelas ruas e estradas. A Europa enfrentou uma gigantes- concorrência europeia. Com o gasto de 300 milhões de dó-
ca tarefa de reconstrução. lares, os estadunidenses viram crescer sua produção indus-
trial em 75%; no setor agrícola, a produção de trigo cresceu
A guerra provocou alterações nas estruturas de po-
25%. No final da guerra, os Estados Unidos contavam com
der. Os Estados Unidos e a União Soviética surgiram
superávit na balança comercial de 11 bilhões de dólares,
como os dois mais poderosos Estados do mundo. As concentrando 80% das reservas mundiais de ouro.
grandes potências tradicionais – Inglaterra, França e
Alemanha – foram obscurecidas por essas superpo-
tências. Os Estados Unidos tinham a bomba atômica e
um imenso poderio industrial; a União Soviética tinha
o maior exército do mundo e estendia seu domínio à
Europa Oriental, além de dominar também a tecnolo-
gia da energia atômica. Com a Alemanha derrotada, o
principal incentivo para a cooperação soviético-norte-
-americana desaparecera.
A Segunda Guerra Mundial acelerou a desintegração multimídia: livros
dos impérios europeus de além-mar. Os Estados euro-
O diário de Anne Frank – Otto H. Frank,
peus não puderam mais justificar o domínio de africa-
Mirjam Pressler
nos e asiáticos, depois de terem lutado para libertar
terras europeias do imperialismo alemão. A Grã-Breta- Publicado originalmente em 1947, tornou-
nha abriu mão da Índia; a França, do Líbano e da Síria; -se um dos relatos mais impressionantes das
e os holandeses, da Indonésia. Nas décadas de 1950 e atrocidades e horrores cometidos contra os
1960, praticamente todos os territórios coloniais con- judeus durante a Segunda Guerra Mundial.
quistaram a independência – a descolonização afro-a- A força da narrativa desta adolescente – que
siática. Nos casos em que a potência colonial resistiu mesmo com sua pouca experiência de vida
à independência desejada pela colônia, o preço foi o foi capaz de escrever um testemunho de hu-
derramamento de sangue. manidade e tolerância – a tornaria uma das
figuras mais conhecidas do século XX.

CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Durante o governo nazista de Adolf Hitler, diversas empresas alemãs ampliaram seus capitais e participaram ativa-
mente das políticas de governo. Gigantes como a Siemens, Volkswagen, BMW e Bayer são alguns exemplos. A Bayer,
uma das maiores empresas do setor químico do mundo, produziu o gás Zyklon B, utilizado nas câmaras de gás para
o extermínio de judeus e inimigos de Hitler.
Atualmente, há provas documentais de que o regime nazista promoveu uma série de experimentos médicos de-
sumanos contra seus adversários. Um dos principais agentes dessa barbárie, o médico Josef Mengele, faleceu em
Bertioga/SP. Chamado de “anjo da morte”, promovia uma série de experimentos com gêmeos e anões.

26
Os experimentos realizados por Mengele em gêmeos incluíam a amputação desnecessária de membros, a infecção
intencional de um gêmeo com tifo ou outras doenças e transfusão de sangue de um gêmeo no outro. Muitas das
vítimas morreram ao passar por esses procedimentos. Depois que um experimento terminava, os gêmeos às vezes
eram mortos e seus corpos dissecados.
Seus experimentos em anões e pessoas com anormalidades físicas incluíam medidas físicas, extração de sangue,
extração de dentes saudáveis e tratamento com drogas desnecessárias e raios-X. Muitas das vítimas eram enviadas
para as câmaras de gás após cerca de duas semanas e seus esqueletos eram enviados para Berlim para estudo pos-
terior. Mengele também procurava por mulheres grávidas, nas quais realizaria experimentos antes de enviá-las para
as câmaras de gás.

ÁREAS DE CONHECIMENTO DO ENEM

Habilidade
1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.

Como frisamos diversas vezes durante nossos livros de História, o Enem exige frequentemente sua habilidade 1.
Cabe ressaltar que os organizadores da prova têm uma noção ampla do que significa uma fonte documental. Alguns
poderiam argumentar, por exemplo, que um quadrinho ou uma arte infanto-juvenil não representariam uma fonte
histórica, meramente por sua representação na vida social.
Contudo, hoje vemos diversas pesquisas nas Ciências Humanas que levam em consideração o teor desse tipo de
arte e como elas moldaram o imaginário coletivo acerca de outras nacionalidades, costumes sociais ou organizações
políticas. Durante a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria, por exemplo, boa parte da arte – tanto estadunidense
quanto soviética ou nazista – assumiam o discurso de suas nações, gerando caricaturas dos inimigos reais.
Diante disso, o estudante deve interpretar os materiais apresentados, bem como fragmentos de texto, com o intuito
de buscar a alternativa correta.

27
Modelo
(Enem)

Com sua entrada no universo dos gibis, o Capitão chegaria para apaziguar a agonia, o autoritarismo militar e comba-
ter a tirania. Claro que, em tempos de guerra, um gibi de um herói com uma bandeira americana no peito aplicando
um sopapo no Führer só poderia ganhar destaque, e o sucesso não demoraria muito a chegar.
COSTA, C. Capitão América, o primeiro vingador: crítica. Disponível em: <www.revistastart.com.br>. Acesso em: 27 jan. 2012 (adaptado).

A capa da primeira edição norte-americana da revista do Capitão América demonstra sua associação com a participa-
ção dos Estados Unidos na luta contra:
a) a Tríplice Aliança, na Primeira Guerra Mundial.
b) os regimes totalitários, na Segunda Guerra Mundial.
c) o poder soviético, durante a Guerra Fria.
d) o movimento comunista, na Segunda Guerra do Vietnã.
e) o terrorismo internacional, após 11 de setembro de 2001.

Análise expositiva - Habilidade 1: Questão de resolução mais objetiva, a imagem e o texto destacam a figura
B de Hitler, e cabe ao estudante associá-la ao nazismo e à liderança da Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial.
Alternativa B

28
DIAGRAMA DE IDEIAS

SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

A CONTEXTO B ANTECENDENTES

• CONTINUIDADE DA PRIMEIRA GUERRA • POLÍTICA DE ALIANÇAS ENTRE ESTADOS TOTALITÁRIOS


• CONCORRÊNCIA IMPERIALISTA • 1936: ALEMANHA E JAPÃO – PACTO ANTIKOMINTERN
• FORMAÇÃO DE BLOCOS DE INTERESSE • 1939: ALEMANHA E ITÁLIA – PACTO DE AÇO
• 1938:
EIXO ALIADOS • POLÍTICA DE APAZIGUAMENTO
• CONFERÊNCIA DE MUNIQUE
• 1939: PACTO MOLOTOV-RIBBENTROP – ALEMANHA E URSS

C FATORES

• REVANCHISMO PÓS-PRIMEIRA GUERRA


• FORMAÇÃO DE ESTADOS TOTALITÁRIOS
• CRISE DE 1929 E NACIONALISMO ECONÔMICO
D FASES DA GUERRA • EXPANSIONISMO
• INEFICÁCIA DA LIGA DAS NAÇÕES
AVANÇO DO EIXO (1939-1941)
• ALEMANHA AVANÇA SOBRE EUROPA (BLITZKRIEG) CONFERÊNCIA
E
• OCUPAÇÃO DA FRANÇA (REPÚBLICA DE VICHY)
• AVANÇO ALEMÃO PARA O LESTE EUROPEU E URSS
• CONFERÊNCIA DO CAIRO (1943)
• AVANÇO ITALIANO E ALEMÃO NA ÁFICA (AFRIKAKORPS)
• CONFERÊNCIA DE TEERÃ (1944)
• TENSÕES ENTRE JAPÃO E EUA NO PACÍFICO: ATAQUE A
• CONFERÊNCIA DE IALTA (1945)
PEARL HARBOR
• CONFERÊNCIA DE POTSDAM (1945)
• DIVISÃO DA ALEMANHA
ASCENSÃO DOS ALIADOS (1941-1945) • ALEMANHA OCIDENTAL (CAPITALISTA)
• 1941: EUA ENTRAM NA GUERRA • ALEMANHA ORIENTAL (SOCIALISTA)
• 1943: • TRIBUNAL DE NUREMBERG
• DERROTA ALEMÃ NA URSS
• DERROTA NA ÁFRICA
• FORÇAS EXPEDICIONÁRIAS BRASILEIRAS F CONSEQUÊNCIAS
(FEB) LUTAM NA ITÁLIA
• PARTISANS IUGOSLAVOS E ANTIFASCISTAS • ALTA MORTALIDADE DE CIVIS
ITALIANOS DERROTAM MUSSOLINI • GENOCÍDIO DE JUDEUS (HOLOCAUSTO)
• DESTRUIÇÃO DE INFRAESTRUTURA, INDÚSTRIAS E CAMPOS
DERROTA DO EIXO EUROPEUS
• 1944: • INDEPENDÊNCIA DAS COLÔNIAS EUROPEIAS NOS ANOS
• DIA D: LIBERAÇÃO DA FRANÇA SEGUINTES
• URSS OCUPA BERLIM • FORMAÇÃO DE DUAS POTÊNCIAS MUNDIAIS
• 1945: EUA VENCEM JAPÃO COM BOMBAS ATÔMICAS

29
Guerra Fria: consolidação
AULAS
da ordem bipolar
49 e 50
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10,
Competências: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 Habilidades: 11, 13, 14, 15, 16, 19,
20, 21, 22, 27 e 29

Soviética, chamada Guerra Fria. Contudo, esse novo modelo


de relacionamento internacional se diferenciava dos anteriores,
porque o embate não se dava somente por controle de ter-
ritórios e riqueza, mas também pela confrontação ideológica
entre capitalismo e socialismo, acrescida por uma monstruosa
construção de arsenais nucleares que colocaria em risco a exis-
tência da humanidade.
Os Estados Unidos tornaram-se o Estado líder do capitalismo. Por
intermédio de uma eficaz política externa, interferiram decisiva-
mente para expandir seus domínios, seja por métodos “pacíficos”,
Em 1946, os Estados Unidos executaram a chamada Operação Crossroads, como o Plano Marshall, ou violentos, como a Guerra da Coreia.
que consistiu em testes nucleares no atol de Bikini, na Micronésia. Se de

2. Organização das
um lado ela fez ferver os ânimos do mundo em plena Guerra Fria, também
rendeu fotografias históricas e até influenciou a moda.

Nações Unidas – ONU

multimídia: vídeo
Bandeira das Nações Unidas
Fonte: Youtube
A ONU (Organização das Nações Unidas) foi criada em
Ponte dos espiões 1945 com o objetivo de reorganizar as relações internacio-
Em plena Guerra Fria, um advogado especia- nais, de modo a superar os acordos militares secretos entre
lizado em seguros aceita uma tarefa muito os países e instaurar reuniões que abrangessem os interesses
diferente do seu trabalho habitual: defender das nações, onde fossem discutidos livremente entre todos
Rudolf Abel, um espião soviético capturado os Estados membros. Com isso, as soluções de caráter pa-
pelos estadunidenses. cífico nasceriam democraticamente e com mais viabilidade.
Já em 1941, ainda durante a Segunda Guerra, o presidente
Roosevelt e o primeiro-ministro inglês Winston Churchill ide-

1. Introdução alizaram um trabalho conjunto de países através da Carta do


Atlântico, que destruísse as forças do Eixo, mas que possuís-
Com o término da Segunda Guerra Mundial, a Europa Oci- se o ideal de manter a união dos países no pós-guerra para
dental perdeu o poder hegemônico sobre as relações inter- evitar novos conflitos internacionais. Em abril de 1945, vários
nacionais. Sua política imperialista entrou em decadência e representantes de países se reuniram na cidade estaduni-
o mundo foi submetido a uma nova ordem mundial baseada dense de São Francisco e, evitando os erros da antiga Liga
na expansão e na disputa pela hegemonia econômica, militar das Nações, resolveram criar uma instituição que viabilizasse
e política das novas superpotências: Estados Unidos e União a paz mundial e, ao mesmo tempo, se preocupasse com os

30
problemas sociais e de cidadania. A partir dessa conferência,
a ONU passou a contar com 192 países membros, da qual o 3. Guerra Fria (1945–1991)
Vaticano participaria apenas como observador.
Apesar do suposto aspecto democrático da ONU, uma vez
que ela representa quase todos os países do mundo, trans-
mitindo a impressão de que é comandada segundo os inte-
resses dessas nações, na realidade o poder de decisão está
concentrado nas mãos dos cinco Estados fixos do Conselho
de Segurança. Esse conselho constitui-se como autoridade
máxima, pois, ao ter o poder de veto, possibilita que a deci-
são de um único país tenha o poder de anular as decisões A charge mostra o Premiê da União Soviética, Nikita Khrushchev, e o
da Assembleia Geral. Os cinco países fixos do Conselho são presidente JohnF. Kennedy, dos Estados Unidos, durante a Guerra Fria.
Ambos estão sentados em mísseis e têm seus dedos junto ao botão
EUA, Rússia (antiga URSS), Inglaterra, França e China. de detonação, que levaria a uma guerra nuclear. 1962.

3.1. Definição
Guerra Fria é a designação atribuída ao período histórico
de disputas políticas, econômicas, ideológicas, tecnológi-
cas, estratégicas e conflitos indiretos entre os Estados
Unidos e a União Soviética, compreendido entre o final
Reunião do Conselho de Segurança da ONU da Segunda Guerra Mundial (1945) e a extinção da União
A ONU também é constituída por importantes agências Soviética (1991).
especializadas. As principais são: Unesco (Organização das
Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), a FAO 3.2. Antecedentes
(Organização de Alimentação e Agricultura), a OMS (Orga- Antes da Segunda Guerra Mundial eclodir, as divergências
nização Mundial da Saúde), a OIT (Organização Internacio- ideológicas entre o socialismo soviético e o capitalismo já
nal do Trabalho), a Iaea (Agência Internacional de Energia eram visíveis, razão pela qual a URSS era isolada da di-
Atômica), o Bird (Banco Internacional para Reconstrução e plomacia internacional pelo chamado “cordão sanitário”1;
Desenvolvimento), o FMI (Fundo Monetário Internacional), contudo, a invasão pela Alemanha governada por Hitler
entre outras. A sede principal da ONU fica na cidade de sobre o território eslavo fez com que a URSS ingressasse
Nova Iorque, nos Estados Unidos, e o prédio administrativo nas fileiras dos Aliados, quando passou a ser “bem-vista”
foi projetado pelo arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer, com e a ocupar papel crucial na bancarrota do Eixo; entretanto,
colaboração de Corbusier. ainda no transcurso final da guerra, já se percebia que os
No processo de descolonização do pós-guerra quando Estados Unidos (“Tio Sam”) e a Rússia (“Tio Joe”) se dis-
nações da África e da Ásia lutaram pela independência, a tanciariam radicalmente e se tornariam inimigos mortais.
ONU se mostrou solidária às suas lutas e consolidou seu Na Conferência de Ialta, apoiou-se a política de que o ter-
apoio ao reconhecer a soberania desses países. Contudo, a ritório europeu ficaria orientado pelas forças militares que
ONU mantém-se atrelada aos interesses dos Estados Uni- o tivesse libertado, o que foi positivo para Stalin, pois a
dos e da Rússia, como pode ser observado com a invasão URSS, antes isolada, agora interferiria diretamente no Leste
estadunidense, no governo de George W. Bush, ao Iraque e europeu, criando condições para o que Winston Churchill a
à intromissão militar russa na Ossétia do Sul (Geórgia) sem chamasse de “Cortina de Ferro”.2
a permissão da ONU. 1
Essa expressão foi supostamente utilizada pelo ex-primeiro ministro francês
Georges Clemenceau para descrever o isolamento da Rússia a ser promovi-
Atualmente, existe uma significativa discussão acerca da do por uma aliança dos países fronteiriços a ela, os quais se haviam tornado
influência e do papel da ONU nas relações internacionais. independentes após a Guerra Civil Russa. Em março de 1919, ele exortou os
Estados fronteiriços recém-independentes (também chamados de Estados
Com o fim da Guerra Fria e o surgimento de uma nova or- limítrofes) que tinham se separado do Império Russo e da Rússia Soviética,
dem num mundo globalizado, as fronteiras entre os países para formar uma união defensiva e, assim, barrar o avanço do comunismo na
estão sendo rediscutidas, bem como a ascensão de países Europa Ocidental, chamando essa aliança de cordon sanitaire. Essa denomi-
nação tem um claro sentido pejorativo e discriminatório, pois sugere isolar uma
emergentes como o Brasil e a Índia. A ONU também tem região “doente” ou “suja”.
sido criticada por sua submissão aos interesses dos EUA e 2
Expressão usada para designar a divisão da Europa em duas partes, a Europa
Oriental e a Europa Ocidental como áreas de influência político-econômica dis-
da Rússia e por não oferecer uma resposta concreta, pro- tintas, no pós-Segunda Guerra, conhecido como Guerra Fria. A designação “Cor-
funda e viável aos problemas sociais do planeta. tina de Ferro” também tem o sentido de estigmatizar a Rússia e o Leste europeu.

31
A Europa após a segunda Guerra Mundial

3.3. A divisão da Alemanha Estado Soviético), a União Soviética resolveu isolar total-
mente Berlim Oriental da Alemanha Ocidental, quando, em
1961, construiu o criticado Muro de Berlim. Os berlinenses
Ocidentais passaram a receber mantimento por intermédio
de uma gigantesca ponte aérea que durou vários meses.

A Conferência de Potsdam dividiu a Alemanha em quatro Foto do Muro de Berlim


zonas de administração, das quais três ficariam sob o con-
trole do capitalismo representado pelos EUA, Inglaterra e
França; a quarta seria dominada pela URSS (comunista).
3.4. Doutrina Truman
Na prática, em 1949, a Alemanha foi dividida em duas:
República Federal Alemã (Alemanha Ocidental, RFA), su-
bordinada aos três países capitalistas, e a República De-
mocrática Alemã (Alemanha Oriental, RDA), socialista,
subordinada aos interesses de Moscou. Ressalte-se que
o símbolo da Guerra Fria surgiu nesse contexto, já que
a cidade de Berlim se situava no território da Alemanha
socialista (Oriental); contudo, segundo a Conferência de
Potsdam, ela também seria dividida entre capitalistas e
socialistas. Devido ao acirramento da Guerra Fria, notada-
mente o Plano Marshall e a espionagem da CIA (Agência
Central de Inteligência) e da KGB (Comitê de Segurança do Harry Truman

32
Temendo a penetração soviética no Mediterrâneo Oriental ático, e Pyongyang tornou-se uma Ditadura de economia
e ciente da fragilidade da Inglaterra nessa região, em mar- pobre governada por Kim Jong-un, colocando em risco a
ço de 1947 o presidente Harry Truman promulgou a Dou- frágil paz da região através de um belicismo atômico no
trina Truman: “Os Estados Unidos devem ter como política início do século XXI.
apoiar os povos livres que estejam resistindo às tentativas de
subjugação por parte de minorias armadas ou de pressões Evolução da Guerra da Coreia 1950/1953:
externas”. Essa doutrina foi a peça central da nova políti-
ca de contenção – de manter o poder soviético dentro de 05/1950 09/1950 11/1950 01/1951 07/1953

suas fronteiras. Os Estados Unidos logo forneceram apoio


militar e econômico à Grécia e à Turquia, e a política externa
estadunidense sofreu uma profunda inversão: o isolamento
anterior à grande guerra deu lugar a uma vigilância mundial
Em verde: Nações Unidas e Coreia do Sul; em
contra qualquer esforço soviético de expansão. vermelho: Coreia do Norte e China.
Imagem: Wikipédia

3.5. Guerra da Coreia (1950–1953) Com o decorrer da Guerra Fria, surgiram nitidamente dois
blocos díspares, que simbolicamente tiveram início em
A Doutrina Truman tornou-se real quando, em junho de 1949, quando os Estados Unidos criaram a Otan (Orga-
1950, eclodiu uma guerra entre as duas Coreias. O Norte, nização do Tratado do Atlântico Norte), reunindo militar-
socialista e governado por Kim II Sung, apoiado pela URSS mente os países capitalistas, ou seja, uma gigantesca força
e pela China maoísta, não aceitou a divisão da península e militar que a União Soviética isoladamente não teria como
atacou a Coreia do Sul, que foi defendida pelas tropas dos enfrentar. Em contrapartida, em 1955, a URSS criou o Pacto
EUA lideradas pelo general Douglas McArthur. Para evitar de Varsóvia. Coordenando os exércitos dos países satélites
que o conflito desembocasse numa Terceira Guerra Mun- com o Exército Vermelho, essa aliança tinha como objeti-
dial, em 1953, foi declarado o cessar-fogo de Panmunjon, vo servir de instrumento militar para preservar a unidade
mantendo o paralelo 38 como linha divisória dos dois pa- político-ideológica do bloco socialista e contrabalançar a
íses. Seul tornou-se, anos depois, capital de um Tigre Asi- força da Otan.

OTAN
OTAN
Outros
Outrosaliados
aliadosdo
doE.E.U.U
E.E.U.U
Pacto
Pactode
deVarsovia
Varsovia
Países
PaísesSocialistas
Socialistasaliados
aliadoscom
comaaURSS
URSS
Outros
Outrospaíses
paísessocialistas
socialistasou
oualiados
aliadosaaURSS
URSS
Nações
Naçõesnão-alinhadas
não-alinhadas

Guerrilheiros
Guerrilheiroscomunistas
comunistas
Guerrilheiros
Guerrilheirosanti-comunistas
anti-comunistas

3.6. O Plano Marshall e o Comecon


Em junho de 1947, os Estados Unidos deram um importante passo rumo ao fortalecimento de seu poder sobre o Ocidente. O
secretário de Estado George Marshall anunciou um formidável programa de auxílio econômico à Europa, cujo nome formal
era Programa de Recuperação Europeia, mundialmente conhecido como Plano Marshall.
Entre 1947 e 1951, a Europa recebeu uma ajuda de mais de 12 bilhões de dólares – um modesto investimento, se compa-
rado com o índice subsequente de aumento da prosperidade dos EUA e do Ocidente europeu.
O Plano Marshall surgiu para proteger os interesses do capitalismo, principalmente na Europa Ocidental e no Japão, pois essas
áreas estavam com seus parques produtivos destruídos devido à Segunda Guerra Mundial; consequentemente, o desemprego
era muito grande ao lado de todos os problemas gerados por essa situação, criando, assim, condições para que movimentos
dissidentes surgissem, particularmente para a difusão dos de esquerda. Com o Plano Marshall financiado pelos EUA, a entrada

33
de capitais nessas regiões, a revitalização econômica, o pro-
grama do Estado de bem-estar social3 e criação pelos EUA
3.7. KGB, CIA e a “caça às bruxas”
de um mercado para os seus insumos e máquinas enfraque- Para encontrar parceiros estratégicos, as duas superpotên-
ceram naturalmente os movimentos da esquerda. cias promoviam alianças sem nenhum escrúpulo ideológico.
Os Estados Unidos aproximaram-se das ditaduras fascistas
de Franco, na Espanha, e de Salazar, em Portugal, ambas
A rápida reconstrução do Japão, após a anticomunistas; a União Soviética, por sua vez, defendeu a
Segunda Guerra Mundial ditadura de Ceausescu, na Romênia. Nos aspectos relacio-
Logo após a Segunda Guerra Mundial, as relações en- nados à inteligência, à espionagem, os Estados Unidos e a
tre os Estados Unidos e o Japão foram norteadas pelo União Soviética dinamizaram, respectivamente, a CIA (Agên-
Plano Colombo, cuja intenção era manter o Extremo Ori- cia de Inteligência dos EUA) e a KGB (Comitê de Segurança
ente sob a esfera de influência estadunidense e que se do Estado Soviético) a ponto de se criar um clima de “caça às
baseou em empréstimos voltados para a reconstrução do bruxas” tanto nos assuntos externos como internos.
capitalismo japonês. Naquela época, os Estados Unidos
impuseram ao Japão condições bastante duras, como a Nos Estados Unidos, essa “caça às bruxas” deu origem ao
proibição de militarizar-se. Mas as imposições não trans- macarthismo, cujo autor, o senador Joseph McCarthy, dis-
formaram o país numa economia periférica do capitalis- seminou perseguições sem provas de supostos inimigos
mo mundial. Pelo contrário, permitiram uma política de internos dos EUA. Inúmeros cidadãos passaram a ser consi-
desenvolvimento econômico muito bem-sucedida. derados espiões, principalmente artistas de Hollywood, como
Charles Chaplin, entre outros. Na União Soviética, a “caça
Entre os princípios dessa política, podem ser destacados:
às bruxas” consolidou o stalinismo, a estrutura estatal buro-
§ elevada qualificação profissional da mão de obra; crática e policialesca através dos gulags, campos de trabalho
§ rigorosos programas de controle de qualidade dos forçado criados após a Revolução Bolchevique de 1917 para
produtos industrializados, baseados em cálculos abrigar criminosos e “inimigos” do Estado.
estatísticos;
§ direcionamento de grande parte da produção indus-
trial para o mercado externo, estimulado por uma
forte desvalorização da moeda japonesa, o iene;
§ construção de grandes e modernos navios, que ba-
ratearam o frete para os distantes mercados con-
sumidores do Ocidente;
§ maciços investimentos em pesquisa e desenvolvi-
mento, que resultaram na robotização e na minia-
turização de suas mercadorias altamente sofistica-
das, como os microeletrônicos e a nanotecnologia.
Em poucas décadas, uma notável expansão industrial
conduziu o Japão à terceira posição entre as maiores O casal Etbel e Julius Rosemberg foi preso e condenado pelo
macartismo. Foram executados e, alguns meses depois,
economias do mundo. constatou-se que a acusação contra eles, de venda de
segredos militares para a União Soviética, era infundada.

3.6.1. Comecon (Council for A criação da CIA para os estadunidenses foi uma ne-
Mutual Economic Assistance) cessidade estratégica devido ao início da Guerra Fria
Para revitalizar os países socialistas, a URSS criou o Co- e ao avanço do comunismo.
mecon, que se estruturou através de planos estatais quin-
A espionagem foi um dos aspectos da Guerra Fria
quenais, foi integrado à economia dos Estados socialistas
e serviu como máquina política para perseguir oposicionis- mais explorados pelo cinema. O espião mais famoso
tas dentro do Leste europeu; entretanto, como a Segunda das telas, James Bond, criado por um ex-agente do
Guerra Mundial destruiu a infraestrutura soviética, o Co- serviço secreto britânico, Ian Fleming, vivia aventuras
mecon não suplantou o dinamismo do Plano Marshall. glamorosas e bem distantes da realidade. No mundo
3
O Estado de bem-estar social também é conhecido por sua denominação em real, as duas grandes agências de espionagem, a KGB
inglês Welfare State. Os termos servem basicamente para designar o Estado as-
sistencial que garante padrões mínimos de educação, saúde, habitação, renda soviética e a CIA estadunidense, treinavam agentes
e seguridade social a todos os cidadãos.

34
cosmonauta, Yuri Gagarin, em 1961, na nave Vostok I. Em
para atos de sabotagem, assassinatos, chantagens 1963, levou ao espaço a primeira mulher, a cosmonauta
e coleta de informações. Nos dois lados se criou um Valentina Tereshkova.
clima de histeria coletiva, em que qualquer cidadão
poderia ser acusado de espionagem a serviço do
inimigo. Na União Soviética, Stalin contribuiu para
esse clima, confinando muitos de seus adversários
em campos de concentração na Sibéria. Nos Estados
Unidos, o senador anticomunista Joseph McCarthy
promoveu uma verdadeira “caça às bruxas”, levan-
do ao desespero inúmeros intelectuais e artistas de
Hollywood, acusados de colaborar com Moscou.
Um dos momentos dramáticos da história da espiona-
gem na Guerra Fria aconteceu em 1962. O presidente
Yuri Gagarin
dos EUA John Kennedy reagiu duramente contra a ini-
ciativa soviética de instalar uma plataforma de mísseis
em Cuba. Chegou a advertir o líder soviético Nikita
Khruschev de que usaria armas nucleares se fosse
necessário. Depois de três semanas, a União Soviética
recuou. Durante esse tempo, o mundo viveu o pavor de
um confronto nuclear entre as superpotências.
A CIA, Central Intelligence Agency (em português,
Agência Central da Inteligência) é um serviço de inte-
ligência dos Estados Unidos da América. Está proibida
por lei de coletar informações sobre as atividades do-
Neil Armstrong, em solo lunar
mésticas de cidadãos do seu país, o que é feito pelo FBI
Federal Bureau of Investigation (Departamento Federal Os Estados Unidos somente conseguiram melhorar sua
de Investigação). performance quando a Nasa passou a ser assessorada por
Wernher Von Braun, ex-chefe do órgão militar alemão cria-
No momento, a CIA perdeu muito da importância
dor de bombas voadoras V-2, que destruíram grande parte
que teve no passado, pois a relevância das informa-
de Londres na Segunda Guerra Mundial. Von Braun liderou
ções obtidas através de fontes humanas é muito me-
a criação dos foguetes Saturno e, em 1969, à frente da
nor que as obtidas por meio da captura de sinais de
Apollo 11, o astronauta estadunidense Neil Armstrong foi
comunicação (Sigint), que é tarefa da NSA National
o primeiro homem a pisar na Lua.
Security Agency (Agência de Segurança Nacional).
A China é a terceira força na conquista espacial. Inicial-
mente apoiada pela ex-aliada URSS, conseguiu receber
tecnologia e bem desenvolvê-la com a nave Shenzhou 5,
3.8. A corrida espacial que, em 2003, levou o primeiro taikonauta, Yang Liwei, ao
espaço, com tecnologia chinesa.
Esse foi um capítulo especial, porque a propaganda oficial
estava imbuída de amor à aventura e à glamorização do des-
bravamento das fronteiras do universo. No entanto, os proje-
tos de viagem ao cosmo representavam a real disputa ideoló-
4. A Revolução Cubana (1959)
gica de que a tecnologia de uma superpotência era superior No século XIX, a ilha de Cuba foi uma área extremamente
a da outra, além do fato de que o foguete que se desloca ao explorada pelo imperialismo estadunidense, seja através de
espaço aperfeiçoa a tecnologia usada nos mísseis balísticos invasões militares patrocinadas pelo Big Stick ou por pressões
que transportam ogivas nucleares de um continente a outro. diplomáticas, como a Emenda Platt. Outro fato que prejudicou
No primeiro momento, a corrida espacial foi vencida pela a população pobre cubana foi a manutenção dos latifúndios,
URSS, pioneira ao lançar com sucesso o primeiro satélite que se estruturavam na monocultura do açúcar e do fumo.
artificial chamado Sputnik, em 1957, enviar a cadela Lai- Em 1952, Cuba conheceu a Ditadura de Fulgêncio Batista,
ka como primeiro ser vivo a viajar pelo espaço e, princi- que simbolizou os interesses da aristocracia dos Estados
palmente, por promover a primeira viagem sideral de um Unidos, bem como da máfia italiana, ao disseminar a

35
prostituição ao lado da exploração dos cassinos em Hava- grande Estado, a economia cubana mantinha um grande
na. Na busca de destruir a Ditadura de Fulgêncio, um pe- relacionamento econômico com os eslavos; contudo, com
queno grupo de estudantes, liderados pelos irmãos Castro, o governo de Gorbachev, a economia cubana ruiu e, atual-
Raúl e Fidel, tentaram invadir o palácio La Moncada, ama- mente, passa por dificuldades.
doristicamente, num completo fracasso e foram exilados.
No México, Fidel Castro, Raul e Camilo Cienfuegos uni-
ram-se ao argentino Che Guevara e fundaram o MR-26
(Movimento Revolucionário 26 de Julho), com o objetivo
de derrubar a Ditadura de Fulgêncio Batista. Voltaram à
Cuba para liderar uma guerrilha rural em Sierra Maestra
inspirados na revolução chinesa de Mao.

Fotos aéreas mostram instalações militares e soviéticas em


Cuba. Tudo estava pronto para o ataque atômico.

Che Guevara merece uma análise especial, uma vez que,


após se consolidar no grupo dirigente cubano, resolveu
abandonar os privilégios pessoais adquiridos na ilha e pe-
netrou na selva africana no intuito de fortalecer a guerrilha
socialista no Congo e destruir o governo entreguista de
Mobutu. Posteriormente, rumou para o meio rural da Amé-
Che Guevara e Fidel Castro
rica do Sul, onde foi derrotado pelo exército da Bolívia, que
Em 1959, a Revolução foi vitoriosa e os guerrilheiros, agora tinha o apoio logístico da CIA, e tornou-se seu prisioneiro,
no governo, implantaram uma estrutura baseada na reforma em 1967, para logo depois ser fuzilado. Essa trajetória pelo
agrária em toda a ilha e no distanciamento em relação ao mundo nos países do Terceiro Mundo transformou Che
imperialismo estadunidense. Além disso, o governo de Fidel Guevara em um mito, a ponto de sua foto, tirada em 1960
Castro promoveu a nacionalização das empresas estrangei- por Alberto Korda, ter se tornado um ícone.
ras e, em 1961, oficialmente instaurou um regime socialista
em Cuba. Por meio do estreitamento das relações com a
União Soviética, Cuba obteve os recursos necessários para
realizar melhorias significativas em áreas como a saúde e a
educação. Após a chegada dos socialistas ao poder com a
revolução de 1959, os índices de melhoria social atingiram
patamares espetaculares, pois o serviço de medicina foi ex-
pandido para toda a população, num padrão que nenhum
país da América Latina sonhou em atingir; o analfabetismo
foi praticamente erradicado e a distribuição de alimentos
bem planejada. Contudo, na ilha implantou uma Ditadura
[...] política, inspirada no modelo stalinista, centralizada em multimídia: vídeo
Fidel Castro e tendo como heróis as figuras emblemáticas
dos guerrilheiros Che Guevara e Camilo Cienfuegos. Fonte: Youtube

As forças conservadoras, sob o auspício do governo de Dr. Fantástico


John Kennedy, tentaram invadir Cuba, mas foram derrota- Um general estadunidense acredita que os
das na baía dos Porcos, em 1961; a partir desse momento, soviéticos estão sabotando os reservatórios de
os EUA determinaram o bloqueio econômico à ilha, o que água dos Estados Unidos e resolve fazer um
selou a aproximação entre Cuba e a URSS, dando início ataque anticomunista, bombardeando a União
a uma das maiores crises da Guerra Fria, quando Nikita Soviética para se livrar dos “vermelhos”. Com
Kruschev, da União Soviética, a pedido de Fidel Castro, as comunicações interrompidas, ele é o único
colocou mísseis atômicos em Cuba. Após as negociações que possui os códigos para parar as bombas e
de paz, a URSS retirou seus mísseis e os EUA deixariam evitar o que, provavelmente, seria o início da
de realizar incursões militares na ilha, apesar de manter o Terceira Guerra Mundial.
bloqueio econômico. Enquanto a União Soviética foi um

36
ÁREAS DE CONHECIMENTO DO ENEM

Habilidade
7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.

As relações entre nações, por vezes, desembocam em conflitos não necessariamente de caráter militar, mas ideo-
lógicos, diplomáticos e econômicos. Uma disputa frequentemente velada sobre projetos geopolíticos e a busca de
hegemonia ideológica ganhou força a partir do século XX, principalmente após os traumas da guerra aberta vividos
durante as duas grandes guerras mundiais.
A questão a seguir versa sobre a Guerra Fria. O estudante deve ser capaz de compreender as dinâmicas e os conflitos
gerados pelas duas superpotências do período: os Estados Unidos – representantes máximos do capitalismo Ociden-
tal – e a União Soviética – líder do bloco socialista.
Vê-se, como neste caso, que as questões do Enem lançam mão de diversos fragmentos de textos acadêmicos e jor-
nalísticos sobre os fenômenos a serem abordados. Cabe ao estudante, juntamente com seus conhecimentos prévios,
lê-los atentamente em busca da resposta, o que torna a prova extremamente interpretativa.

Modelo
(Enem) A Guerra Fria foi, acima de tudo, um produto da heterogeneidade no sistema internacional – para repetir, da
heterogeneidade da organização interna e da prática internacional – e somente poderia ser encerrada pela obtenção
de uma nova homogeneidade. O resultado disto foi que, enquanto os dois sistemas distintos existiram, o conflito da
Guerra Fria estava destinado a continuar: a Guerra Fria não poderia terminar com o compromisso ou a convergência,
mas somente com a prevalência de um destes sistemas sobre o outro.
HALLIDAY, F. Repensando as relações internacionais. Porto Alegre: Editora da Ufrgs, 1999.

A caracterização da Guerra Fria apresentada pelo texto implica interpretá-la como um(a):
a) esforço de homogeneização do sistema internacional negociado entre Estados Unidos e União Soviética.
b) guerra, visando o estabelecimento de um renovado sistema social, híbrido de socialismo e capitalismo.
c) conflito intersistêmico em que países capitalistas e socialistas competiriam até o fim pelo poder de influência em escala mundial.
d) compromisso capitalista de transformar as sociedades homogêneas dos países socialistas em democracias liberais.
e) enfrentamento bélico entre capitalismo e socialismo pela homogeneização social de suas respectivas áreas de influência política.

Análise expositiva - Habilidade 7: Como a Guerra Fria foi uma disputa ideológica pela hegemonia mundial, na
C qual EUA e URSS competiam para provar qual sistema socioeconômico era melhor (capitalismo ou socialismo), o desfe-
cho do embate só poderia vir com a falência de um dos sistemas, o que se concretizou em 1989, com a queda da URSS.
Alternativa C

37
DIAGRAMA DE IDEIAS

GUERRA FRIA (1945-1991)

A CONTEXTO B CARACTERÍSTICAS

• FIM DA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL


• FIM DA HEGEMONIA POLÍTICA DA EUROPA OCIDENTAL • PERÍODO DE DISPUTAS POLÍTICAS
• FORMAÇÃO DE DOIS BLOCOS DE INTERESSE MUNDIAIS • DISPUTA POR HEGEMONIA ECONÔMICA
• CAPITALISTA • POLARIZAÇÃO IDEOLÓGICA
• SOCIALISTA • DISPUTAS TECNOLÓGICAS (CORRIDA ESPACIAL)
• CRIAÇÃO DA ONU • CONFLITOS INDIRETOS (EX.: ORIENTE MÉDIO)
• CRIAÇÃO DO BLOCO DE PAÍSES NÃO ALINHADOS

C BLOCOS DE INTERESSE D PRINCIPAIS CONFLITOS

• PACTOS MILITARES ALEMANHA


• CRIAÇÃO DA OTAN (1949) – CAPITALISTA • DIVISÃO DA ALEMANHA (1945)
• PACTO DE VARSÓVIA (1955) – COMUNISTA • REPÚBLICA FEDERAL ALEMÃ – CAPITALISTA
• PACTOS ECONÔMICOS • REPÚBLICA DEMOCRÁTICA ALEMÃ – SOCIALISTA
• PLANO MARSHAL (1947) • CRIAÇÃO DO MURO DE BERLIM (1945-1989)
• COMECOM (1949)
• AGÊNCIAS ESPECIAIS DE INFORMAÇÕES
GUERRA DA COREIA (1950-1953)
• CIA
• DIVISÃO DA COREIA
• KGB
• COREIA DO NORTE – SOCIALISTA
• ORGANIZAÇÃO DOS PAÍSES NÃO ALINHADOS (EXS.: ÍNDIA
• COREIA DO SUL – CAPITALISTA
E IUGOSLÁVIA)
REVOLUÇÃO CUBANA (1959)
• IMPLANTAÇÃO DO SOCIALISMO VIA GUERRILHA
• MODELO STALINISTA
• LIDERANÇAS: FIDEL CASTRO E CHE GUEVARA
• MELHORIA NAS CONDIÇÕES SOCIAIS
• BLOQUEIO ECONÔMICO DOS EUA
• RELAÇÃO COM A URSS

38
Guerra Fria: direitos civis
AULAS
e o fim da ordem bipolar
51 e 52
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10,
Competências: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 Habilidades: 11, 13, 14, 15, 16, 19,
20, 21, 22, 27 e 29

1. Estados Unidos ra-dama, Jacqueline Kennedy, incentivou a corrida espacial,


enfim, investiu no nacionalismo. Entretanto, foi figura cen-
Após a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos tive- tral de fatos que mostram sua prepotência e autoritarismo,
ram um surto de desenvolvimento em várias áreas, como como a tentativa fracassada de invadir a baía dos Porcos,
o baby boom populacional; entretanto, vários problemas em Cuba, em 1961, provocando um dos momentos mais
afloraram e foram exaustivamente discutidos, principal- tensos da Guerra Fria: a crise dos mísseis atômicos. O mun-
mente na década de 1960. Os presidentes continuavam a do ficou muito próximo de uma guerra nuclear. Também
ser livremente eleitos, sejam do partido Democrata ou do pesa sobre os ombros desse governo o início do acirramen-
Republicano, mas todos sempre administravam numa óp- to dos atritos que geraram a Guerra do Vietnã.
tica imperialista de confirmação do poderio estadunidense,
como grande nação capitalista do mundo.
Ainda no final da guerra e após a morte de causas naturais
de Roosevelt, o vice-presidente Harry Truman (1945-1953)
assumiu a faixa presidencial e ofereceu um esboço do que
seria a Guerra Fria, ao autorizar o bombardeio atômico so-
bre o Japão e a aumentar o militarismo ao formular a Dou-
trina Truman. O próximo presidente eleito foi o republicano
general Dwight Eisenhower (1953-1961), que manteve
o conservadorismo de Truman, a Guerra Fria; entretanto,
iniciou timidamente o questionamento acerca da severa
segregação racial nos estados do Sul, se bem que existisse John Kennedy
em todo os EUA, ao autorizar o estudo de negros ao lado Em 1961, após o fracasso da invasão de Cuba por uma
dos brancos em algumas escolas, o que revoltou agremia- força de exilados cubanos apoiados pela CIA, o governo
ções racistas como a Ku Klux Klan. Kennedy formulou as bases de uma nova política para a
América Latina, conhecida como Aliança para o Progresso.
Segundo essa política, os Estados Unidos forneceriam uma
substancial ajuda econômica e financeira aos países lati-
no-americanos, que, em contrapartida, deveriam realizar
reformas internas com vistas à superação de seu crônico
subdesenvolvimento. Essa política de reformas fracassou
em consequência da obstinada resistência imposta pelas
oligarquias locais. Kennedy não chegou a completar o
Truman e Eisenhower
mandato, pois foi morto em um atentado, em 1963, na
cidade de Dallas, Texas. Com essa política sobressaem os
1.1. De Kennedy a Reagan pontos iniciais do seu intervencionismo na América latina
(presidentes dos EUA) e sua posterior participação nos governos ditatoriais aqui
instalados, comprovada por farta documentação, que tem
O próximo presidente eleito foi o democrata John Kennedy
sido liberada pelo governo dos EUA e pelos governos lati-
(1961-1963), que derrotou o republicano Nixon e iniciou
no-americanos.
um governo marcado pelo propagandismo da figura pre-
sidencial e da nação estadunidense. Aperfeiçoou o marke- O vice-presidente Lyndon Johnson (1963-1969) assumiu o
ting político, promoveu um personalismo festivo em torno governo após o assassinato de Kennedy. Durante seu go-
do casal presidencial, particularmente em torno da primei- verno, o envolvimento estadunidense na Guerra do Vietnã

39
atingiu o ponto culminante: dos 55 mil soldados no campo
de luta, em 1965, passou a 550 mil em, 1968. Mesmo
assim, tornou-se evidente a impossibilidade de uma vitória
militar decisiva dos EUA no conflito do Sudeste Asiático.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Forrest Gump
Quarenta anos da história dos Estados Uni-
Richard Nixon dos visto pelos olhos de Forrest Gump, um
rapaz com QI abaixo da média e boas in-
O próximo presidente da República foi o republicano Ri-
tenções. Por obra do acaso, ele consegue par-
chard Nixon (1969-1974), que manteve a inimizade polí-
ticipar de momentos cruciais, como a Guerra
tica com a URSS. Entretanto, iniciou uma série de conver-
do Vietnã e o caso Watergate, mas continua
sações, promovendo então uma distensão militar que foi
pensando no seu amor de infância.
amenizando as relações da Guerra Fria e gerou um tímido
sinal verde à busca pela paz. Em seu governo, teve início a
Em 1979, o Irã tinha promovido uma revolução liderada
retirada gradual das tropas estadunidenses do Vietnã, hou-
pelo sectário aiatolá Khomeini e havia destruído o governo
ve o reconhecimento diplomático da China e a busca de
pró-Estados Unidos do xá Reza Pahlev, além de ter feito o
um entendimento global com a União Soviética. Contudo,
embaixador dos EUA refém. As decisões de Carter foram
a trajetória do presidente Nixon ficou irremediavelmente
consideradas lentas pelo eleitorado; somadas à crise eco-
manchada devido ao escândalo Watergate, que provo-
nômica interna, Carter perdeu a reeleição.
cou sua renúncia, em 1974. O escândalo, investigado por
jornalistas do Washigton Post consistiu numa operação
secreta e ilegal promovida pelo presidente, que usou a
máquina de inteligência governamental para espionar as
reuniões do Partido Democrata, durante a campanha para
a Presidência da República. Após a renúncia de Nixon, a
Presidência foi entregue ao parlamentar republicano Ge-
rald Ford (1974-1977) numa espécie de mandato tampão,
pois Ford foi derrotado na eleição presidencial seguinte
pelo democrata Jimmy Carter (1977-1981), que praticou
uma política externa voltada para o não financiamento de
algumas Ditaduras na América Latina, como a de Somo-
za, na Nicarágua, anteriormente apoiada pelos Estados Carter e Reagan
Unidos. Carter também buscou a paz no Oriente Médio,
conseguindo aproximar, na memorável reunião de Camp O ex-ator de Hollywood Ronald Reagan foi eleito para
David, o israelense Begin e o egípcio Sadat. Esse acordo o mandato de 1981 a 1989. Anticomunista feroz, Rea-
de paz perdura na atualidade. Outro fato importante, mas gan ocupou a Casa Branca com intenção de acelerar a
criticado, foi o boicote estadunidense à Olimpíada de Mos- contenção do comunismo mundial e posicionou-se con-
cou, em 1980, pois a URSS tinha invadido o Afeganistão trário à política de desarmamento nuclear, que governos
no ano anterior, sendo que os EUA apoiaram o guerrilhei- anteriores haviam negociado nos anos 1970. Propôs um
ro Mujahedin Osama Bin Laden na guerra para expulsar ambicioso programa chamado “Guerra nas Estrelas” –
a URSS do Afeganistão. Porém, o fato que desgastou ex- uso de lasers e satélites para proteger os Estados Unidos
cessivamente o governo Carter foi sua política ineficaz em de mísseis soviéticos. A oposição massiva de europeus
solucionar a crise dos reféns. e estadunidenses ao acirramento das relações entre os

40
dois superpoderes resultou na retomada de negociações, ídolos, morreram prematuramente de overdose de drogas.
em 1983. Reagan administrou os Estados Unidos no mo- Entretanto, o rock’n roll idealizou canções de protesto be-
mento em que a Guerra Fria chegava ao fim, com a desa- líssimas, como Blowin’ in the wind, de Bob Dylan, embora
gregação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. haja a tentativa de despolitizá-las na atualidade.
Na política interna, Reagan introduziu o neoliberalismo. Im-
postos foram cortados em 25% e regulamentações da eco-
nomia, do meio ambiente e do direito do consumidor foram
desmanteladas. Cortes sucessivos nos programas sociais
voltados à população carente caminharam ao lado de acor-
dos de livre comércio negociados em nível internacional para
abolir restrições à expansão de mercados internacionais.

1.2. Movimentos sociais e


culturais na década de 1960
Na década de 1960, a sociedade estadunidense, oriunda multimídia: vídeo
do conservadorismo puritano anglo-saxão, foi sacudida pelo Fonte: Youtube
movimento Black Power, que passou a reivindicar direitos de
cidadania para a população afrodescendente, ou seja, para Selma
os negros. Na música, surgiram grupos de artistas na grava- A história da luta de Martin Luther King Jr. para
dora Motown, como The Supremes e Stevie Wonder. Na es- garantir o direito de voto dos afrodescenden-
tética, o penteado afro, intitulado black, fez sucesso. Mas foi tes – uma campanha perigosa e aterrorizan-
na luta pela cidadania, liderada, entre outros, pelo pacifista te que culminou na marcha épica de Selma
Martin Luther King, que o movimento negro amadureceu e a Montgomery, Alabama, e que estimulou a
exigiu que os direitos constitucionais à cidadania fossem es- opinião pública estadunidense e convenceu o
tendidos a todos. No Sul, ainda havia a segregação racial em presidente Johnson a implementar a Lei dos
diversas instituições públicas. Diante disso, uma parcela do Direitos de Voto, em 1965.
movimento negro defendia o recurso à violência, se neces-
sário, na defesa das suas reivindicações, como os Panteras
Negras liderados por Malcom X.
2. União Soviética e
o bloco socialista
2.1. União Soviética
O socialismo implantado na União Soviética consolidou-se
no pós-guerra e conseguiu polarizar com os Estados Unidos
o poder sobre as relações internacionais na chamada Guer-
ra Fria. É importante observar que o socialismo russo possui
um viés político autoritário, mas melhorou o padrão de vida
Martin Luther King e Malcolm X de grande parte da população russa, influenciando a Euro-
pa Ocidental através da social-democracia, uma espécie de
Ainda nos chamados anos rebeldes, surgiu nos EUA o mo- capitalismo humanizado, e alimentou as reivindicações tra-
vimento hippie, formado na sua maioria por jovens. Ficou balhistas Ocidentais. A estrutura do socialismo real ruiu entre
mundialmente conhecido por suas reivindicações de caráter as décadas de 1980 e 1990, com o sepultamento da URSS,
social, pela luta contra a Guerra do Vietnã, suas manifesta- na era Gorbachev, iniciando sua adesão ao neoliberalismo.
ções culturais, principalmente na música, e pela sua maior
expressão no festival de Woodstock. Apesar da sua impor- O socialismo foi implantado na Rússia, em outubro de 1917,
tância ao reivindicar uma sociedade alternativa, fraternal e por meio da Revolução Bolchevique liderada por Lênin, Sta-
comunitária, com mais liberdade sexual e de pregar a des- lin e Trotsky, que implantou uma vasta estatização da econo-
criminalização do uso de drogas etc., o movimento hippie mia. Contudo, os países capitalistas isolaram a Rússia no ce-
sucumbiu às suas próprias contradições e foi “engolido” nário internacional e financiaram uma contrarrevolução dos
pelo capitalismo. Jimi Hendrix e Janis Joplin, alguns dos seus “brancos” burgueses contra os vermelhos socialistas, que a

41
venceram. Após a guerra civil, Lênin instaurou a NEP - Nova Stalin morreu, em 1953, e foi sucedido por Nikita Kruschev
Política Econômica, que ainda continha traços da economia (1953-1964), que obteve a confiança do partido ao liderar
capitalista para revitalizar a combalida estrutura produtiva a batalha de Stalingrado. Contudo, o novo governo, ape-
soviética. Contudo, após a morte de Lênin, Stalin aniquilou sar da manutenção da Ditadura, criticou a figura de Stalin
a influência de Trotsky, que foi assassinado no México pelo no XX Congresso do PUCS – Partido Comunista da União
agente stalinista Ramón Mercader, em 1940, e implantou Soviética, em 1956. Kruschev buscou implantar a desestali-
um sistema político que acelerou o autoritarismo do Partido nização através de tímidas reformas políticas e do aumento
Comunista da União Soviética. A figura principal da política na produção de bens de consumo, o que prejudicava os
soviética tornou-se a do secretário-geral do partido, que riva- interesses da nomenklatura e dos altos militares. É impor-
lizou com o poder autocrático dos antigos czares. tante ressaltar que o governo de Kruschev não sedimentou
os direitos humanos, pois, para manter o domínio da União
Soviética sobre o Leste europeu, Krushev ordenou a inva-
são da Hungria, destruindo o levante reformista, em 1956.

Joseph Stalin

Na economia, a gosplan1 instituiu uma intervenção exage-


rada do Estado voltada para alavancar a indústria de base,
desmerecendo a produção de consumo e implantando
uma fome desenfreada, mas sem repercutir decisivamente
no crescimento da oposição, pois Stalin tinha aumentado o
poder da polícia secreta NKVD, Comissariado do Povo para
Assuntos Internos, que era liderada pelo famigerado Béria.
Ela prendeu, torturou e expurgou supostos opositores para
os campos de concentração, os gulags. Kruschev (à esquerda) ao lado do presidente dos EUA John Kennedy

O clima de paranoia foi tão elevado entre os apadrinhados Um problema externo que afligiu a diplomacia da URSS foi
de Stalin, que grandes nomes do movimento socialista, que o início de profundos atritos com a China, de Mao Tsé-Tung,
lutaram em 1917, foram expurgados do comitê central e que de aliada tornou-se sua inimiga, provocando uma divi-
mortos. Como consequência, surgiu um pequeno grupo que são no bloco socialista. Apesar de incentivar a coexistência
controlou a máquina estatal, não por suas qualidades, mas pacífica, Kruschev teve papel marcante na crise dos mísseis
porque era formado por pessoas de confiança de Stalin. Essa atômicos, em Cuba, que colocou o governo de Kennedy em
elite, chamada de nomenklatura, instituiu um regime que a dificuldades. É interessante notar que essa crise foi solucio-
oposição chamou de “capitalismo de Estado” ou “socialis- nada com a retirada dos mísseis soviéticos da ilha cubana
mo burocrático”. Nas áreas rurais, o stalinismo implantou e, em contrapartida, com a retirada, pelos Estados Unidos,
fazendas dirigidas pelo governo, as sovkhozes, totalmen- de seus mísseis nucleares da Turquia. Essa solução foi vista
te estatais, e kolkhozes, cooperativas. Durante a Segunda
pelo Politburo2 soviético como um fracasso, que, somado
Guerra Mundial, toda a força produtiva soviética foi atrelada
à oposição da nomenklatura e dos militares, provocou a
ao esforço de guerra para poder enfrentar o III Reich. Já os
queda de Kruschev, num golpe branco, em 1964.
territórios mais a Oeste foram devastados pelos próprios so-
viéticos na campanha da terra devastada contra os alemães. O secretário-geral escolhido foi Leonid Brejnev (1964-
Após a Segunda Guerra, a economia estatizante conseguiu 1982), que revitalizou muitos aspectos do stalinismo,
o desenvolvimento das indústrias de base e a produção de manteve a coexistência pacífica implantando a détente,
bens de consumo aumentou, melhorando a situação do ho- que abriu caminho para a salutar negociação sobre ar-
mem comum soviético. Contudo, grande parte da riqueza mas nucleares com a criação do plano Salt3 com o gover-
era drenada para a indústria bélica, devido à Guerra Fria e no dos EUA.
para beneficiar os privilégios da nomenklatura. 2
Comitê central do Partido Comunista da antiga URSS.
1
Gosplan era o nome coloquial da política de economia planejada na União 3
O Tratado de Limitação de Armas Estratégicas (Salt I), assinado entre o presi-
Soviética. A palavra gosplan é uma aglutinação de Gossudarstvênnîi Komitet dente dos EUA Richard Nixon e o líder soviético Leonid Brejnev, em Moscou, em
póPlanirovâniu (Comitê Estatal de Planejamento), órgão cuja principal função era 26 de maio de 1972, foi o primeiro tratado de controle de armas que limitou
estabelecer os planos quinquenais soviéticos. expressamente a construção de novas armas nucleares.

42
É bom frisar que a oposição gerada pela Guerra Fria se relativa liberdade de imprensa e partidária. Gorbachev
manteve. Para consolidar o poder soviético no Leste eu- passou a sofrer a oposição da nomenklatura e dos altos
ropeu, Brejnev instituiu na teoria da soberania limitada, oficiais das Forças Armadas, que tentaram promover um
inspirada na ideologia ufanista e nacionalista stalinista golpe branco, mantendo-o numa prisão domiciliar; entre-
do “socialismo num só país”, por força da qual reprimiu tanto, a população russa reagiu a essa tentativa de golpe.
inúmeros movimentos reformistas, como o da Primavera
de Praga, liderada por Dubcek, na Tchecoslováquia, com
tanques de guerra do Pacto de Varsóvia, em 1968. Ainda
no plano externo, a União Soviética invadiu o Afeganistão,
em 1979, provocando o boicote estadunidense à Olimpía-
da de Moscou, em 1980. Em retaliação, Brejnev liderou o
boicote à Olimpíada de 1984, em Los Angeles (EUA). Essas
atitudes foram duramente criticadas pelo Comitê Olímpico
Internacional, pois as Olimpíadas foram ressuscitadas para
unir, integrar e harmonizar as nações, e não como instru-
mento de domínio de algum Estado.
Mikhail Gorbachev

Bóris Yeltsin não apoiou a queda de Gorbachev, pois ti-


nha interesses pessoais de poder, usando a solidarieda-
de à parcela da população que era contrária à queda de
Gorbachev em seu próprio benefício. Com sucesso, isolou
politicamente a nomenklatura e os generais. Yeltsin consi-
derava a Perestroika e a Glasnost muito lentas e não acei-
tou a autoridade do secretário-geral Gorbachev, passando
a tomar decisões governamentais na Rússia, tornando-a
independente da URSS e aproximando-se do ideal de se-
paração das Repúblicas Bálticas da Letônia, Estônia e Li-
tuânia. Quando Gorbachev percebeu que não possuía mais
Misha, o ursinho mascote dos Jogos de Moscou, tornou-se muito
nenhum poder, restou somente a tarefa de assinar o docu-
popular. Na cerimônia de encerramento do evento, mento que selou o fim da União das Repúblicas Socialistas
ele aparece derramando uma lágrima, numa das mais
Soviéticas, em 8 de dezembro de 1991.
ternas e emocionantes imagens daqueles Jogos.
Após a morte da URSS, tentou-se manter uma integração
Sobre o Afeganistão, é importante ressaltar que o domínio entre as nações com a criação da CEI (Comunidade dos
soviético não foi eficaz, pois a oposição afegã foi incen- Estados Independentes). Contudo, divergências étnicas,
tivada pela entrada dos mujahedins, guerrilheiros do Islã econômicas, territoriais e históricas dificultaram a manu-
fundamentalista, que, apoiados pela CIA e liderados pelo tenção da integração e alguns Estados tornaram-se inimi-
saudita Osama Bin Laden, entrincheiraram-se nas monta- gos. Mesmo antes, com a queda do muro de Berlim, em
nhas e passaram a atacar os comboios soviéticos. 1989, já era claro que o modelo econômico e político do
Em 1982, Brejnev faleceu e foi sucedido por Yuri Andropov bloco socialista estava em decadência.
(1982-1984), dirigente da KGB. Naquele momento, a eco-
nomia soviética estava em declínio devido à burocratização
dos planos quinquenais, aos privilégios da nomenklatura e
ao militarismo exagerado da Guerra Fria, à defasagem na
criação de novas tecnologias do parque industrial e do
campo. Andropov não resolveu esses problemas estrutu-
rais, nem seu sucessor Konstantin Chernenko (1984-1985).
Mikhail Gorbachev (1985-1991) governou a União Soviéti-
ca tentando revitalizar sua estrutura econômica através da
Perestroika (reconstrução), utilizando-se de elementos de
caráter liberal com a gradativa diminuição do poder estatal
sobre a economia, permitindo a implantação de empresas
privadas, e da Glasnost (transparência), aceitando uma Boris Yeltsin

43
Bóris Yeltsin (1991-1999) procurou governar a Rússia se- As Repúblicas da Sérvia, Croácia, Eslovênia, Macedônia,
gundo os paradigmas do capitalismo neoliberal. Contudo, o Bósnia-Herzegovina (capital Sarajevo) e Montenegro man-
parque produtivo não possuía suporte para concorrer com os tiveram uma união que foi fundamental na luta contra os
produtos importados do mundo capitalista e a economia es- exércitos nazifascistas. Quando Hitler e Mussolini invadiram
tava arrasada. Viu-se obrigado a pedir socorro ao FMI (prati- os Bálcãs, na Segunda Guerra Mundial, através da guerri-
cante da teoria neoliberal), que promoveu uma vasta deses- lha socialista dos Partisans, liderada por Tito, a Iugoslávia
tatização. Parte da antiga nomenklatura adquiriu parcela do conseguiu sua libertação sem a ajuda direta da União So-
parque fabril. Atualmente, a Rússia mantém um gigantesco viética. Devido a esse fato, a Iugoslávia não se sentia obri-
poder nuclear, por isso quando os grandes países capitalistas gada a ser subalterna aos interesses do Kremlin, por isso
(G-7) reúnem-se, convocam a Rússia, criando o G-8, com o manteve sua estrutura socialista, mas ligada nos assuntos
objetivo de não desencadear com suas decisões uma crise e internacionais aos não alinhados. Apesar dessa autono-
uma instabilidade política ou prejudicar os interesses estra- mia diplomática, a Iugoslávia representava uma grande
tégicos do G-7. Um grande problema que aflige a Rússia é a quantidade de etnias que a enfraquecia. Para evitar que
guerrilha fundamentalista e nacionalista na Chechênia, que uma etnia se sentisse prejudicada ou marginalizada por
busca a independência dessa região do Cáucaso. outra e para evitar que surgisse alguma liderança que pu-
desse rivalizar com seu poder, o marechal Tito implantou
2.2. Alemanha Oriental uma Ditadura pessoal em que o cargo de primeiro-minis-
tro, subordinado ao seu de presidente, seria preenchido
A República Democrática Alemã (RDA) tinha como capital a numa espécie de rodízio entre as etnias. Contudo, após a
cidade de Berlim Oriental. Cerca de 75% da cidade situava- morte de Tito, a Sérvia, liderada por Slobodan Milosevic,
-se na parte Ocidental e era capitalista, ou seja, a área era um pretendeu implantar sua hegemonia, mas foi contestada
enclave capitalista num país socialista. No intuito de impedir pelos outros povos, gerando uma guerra civil que chegou
o grande fluxo de pessoas para o lado Ocidental (capitalista), somente ao fim com a intervenção da ONU, na década
em 1961 foi levantado um muro que dividia a cidade, isolan- de 1990, com a desagregação do país em vários Estados.
do os dois blocos: Ocidental e Oriental. A construção do Muro
de Berlim recebeu duras críticas de todo o mundo Ocidental, A região que representou a maior intensidade de genocí-
pois era um assombroso desrespeito aos direitos humanos. dio foi a Bósnia-Herzegovina. Devido a esse fato, Slobodan
Ele representou a Guerra Fria, por isso sua queda, em 1989, Milosevic foi preso pela ONU no Tribunal Internacional em
simbolizou o fim da Guerra Fria e do mundo “comunista”. Haia, com a acusação de crimes de guerra. Essa acusação
foi acrescida também quando forças sérvias massacraram a
população de Kosovo, de origem muçulmana, que desejava
sua separação.

Guerra da Bósnia
Conflito internacional na região da antiga
Iugoslávia
O Muro de Berlim, que dividia a Alemanha em Ocidental e Oriental, foi (abril/1992 a dezembro/1995)
derrubado em 9 de novembro de 1989.
A queda foi um dos marcos do fim da Guerra No período em que os Bálcãs estiveram unidos em uma
Fria e reunificou a Alemanha. federação socialista, o país manteve coesão e as dispu-

2.3. Iugoslávia tas nacionalistas permaneceram sob controle. A coesão


começou a se desgastar na década de 1980, com o
surgimento de partidos múltiplos, a morte do presiden-
te Tito e a maior autonomia das províncias dentro da
Federação. A Iugoslávia dissolveu-se gradativamente.
Seguindo uma tendência existente entre os países
comunistas após o colapso da União Soviética, a Es-
lovênia e a Croácia garantiram a autonomia em 1991.
Como consequência, as minorias de origem sérvia
nesses países organizaram movimentos de resistência
contrários à separação, o que culminou com a “Guerra
dos Dez Dias” e a “Guerra Croata de Independência”.

Mapa da extinta Iugoslávia

44
Em fevereiro de 1992, a República Socialista da
2.4. Tchecoslováquia
Bósnia e Herzegovina (habitada por bósnios muçul-
manos e minorias de sérvios ortodoxos e croatas
católicos) aprovou em plebiscito uma declaração
de independência, ratificada mais tarde pela União
Europeia e pelas Nações Unidas. Oficiais bósnios de
origem sérvia, apoiados pelo governo sérvio de Slo-
bodan Milosevic, ordenaram um ataque militar contra
a província da Bósnia com o objetivo de garantir a
integridade de seu território.
O episódio logo degenerou em um conflito sangrento
de caráter genocida. Os sérvios cercaram a capital da Tanques soviéticos invadem a Tchecoslováquia,
durante a Primavera de Praga, em 1968.
Bósnia, Sarajevo, e perseguiram muçulmanos e croa-
tas. Apesar de representar apenas 33% da população Em 1968, o Estado tchecoslovaco iniciou a implantação
da Bósnia, os bósnios de origem sérvia passaram a de um tipo de socialismo que possuía elementos liberais,
controlar 70% do território da Bósnia-Herzegovina.
sob a orientação de Alexander Dubcek, secretário-geral do
Milhares de bósnios muçulmanos foram assassinados
Partido Comunista da Tchecoslováquia, em um processo
pelas forças sérvias na província, enquanto dezenas
de milhares foram obrigados a deixar o país. As cam-
político chamado de Primavera de Praga.
panhas militares contaram com crimes contra a popu- Dubcek estimulou a discussão dos problemas econômicos e
lação civil, como estupro, tortura e espancamentos. As sociais na imprensa e recebeu reivindicações de agricultores.
Forças de Proteção das Nações Unidas, criadas duran- Em março, nomeou para presidente o general Svoboda, co-
te a guerra da independência croata, passaram a atu- nhecido por suas ideias reformistas. Em abril de 1968, ado-
ar em “zonas de segurança” para ajuda humanitária,
tou um programa de reformas que incluiu a descentralização
mas obtiveram pouco sucesso.
das decisões, a criação de conselhos de trabalhadores nas
No começo da guerra, a República da Croácia, que indústrias, a ampliação de direitos sindicais, a criação de co-
almejava territórios da Bósnia-Herzegovina, entrou operativas independentes e a garantia dos direitos políticos
em guerra contra os bósnios e assinou um acordo individuais e da liberdade de reunião e de expressão.
de repartição das terras da província com os líde-
res sérvios. Esse conflito, conhecido como “a guerra Entretanto, a URSS, liderada por Brejnev, temeu perder o
dentro da guerra”, foi encerrado com o Acordo de controle sobre o Leste europeu e determinou a invasão
Washington, em 1994. Seguiu-se a formação da da Tchecoslováquia pelas forças do Pacto de Varsóvia,
Federação da Bósnia-Herzegovina, uma aliança pondo fim ao movimento reformista, em agosto de 1968.
entre bósnios e croatas contra os sérvios e bós-
nios de origem sérvia. Nesse mesmo ano, a Or-
Em 1989, a Tchecoslováquia distanciou-se da União Sovié-
ganização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), tica e com a liderança de Havel e Dubcek implantou, paci-
após as fracassadas tentativas de mediar o confli- ficamente, reformas democráticas, a Revolução de Veludo.
to por parte das grandes potências, investiu con- Já em 1993, também pacificamente, a Tchecoslováquia foi
tra tropas bósnias de origem sérvia. A presença desmembrada em dois Estados irmãos: a Eslováquia e a
da Otan e a aliança bósnio-croata enfraqueceu República Tcheca, numa aula de cidadania para o mundo,
os sérvios e foi essencial para o encerramen- pois não houve derramamento de sangue, em contraposi-
to do conflito em 1995.No dia 14 de dezembro ção ao ocorrido na Iugoslávia.
de 1995, em Paris, foi assinado um acordo geral de
paz. Negociações de paz foram conduzidas em Day-
ton, Ohio. No dia 21 de dezembro, foram assinados 2.5. Polônia
acordos que definiam os limites da soberania sérvia.
Os crimes de guerra foram julgados pelo Tribunal
Internacional Penal da antiga Iugoslávia, que conde-
nou 45 sérvios, 12 croatas e 4 bósnios. A guerra foi
descrita como o evento mais devastador da história
da Europa, desde a Segunda Guerra Mundial, tendo
resultado na morte de cerca de 100 mil pessoas.
(Disponível em: <acervo.estadao.com.br>. Acesso em: 30 ago. 2015).

Lech Walesa

45
Após a Segunda Guerra Mundial, a Polônia, liderada por
Gomulka e Jaruzeslki, ficou atrelada aos interesses sovié-
ticos, por isso o debate a respeito do genocídio de Katyn
(março de 1940), em que cerca de 20 mil poloneses fo-
ram executados pelos alemães com o consentimento de
Stalin e parte do aparato político russo, foi censurado. No
final da década de 1980, em busca de melhorias salariais
e de liberdade política, os trabalhadores dos estaleiros de
Gdansk (antiga Dantzig), liderados pelo proletário Lech
Walesa e apoiados pelo papa João Paulo II, antigo cardeal
Karol Wojtyla, criou o sindicato Solidarnosc (Solidariedade),
que capitaneou o processo de democratização polonês.
multimídia: vídeo
É importante notar que a trajetória política de Walesa é Fonte: Youtube
parecida com a do líder metalúrgico brasileiro Lula, pois
Libertem Angela Davis
ambos eram trabalhadores metalúrgicos sindicalizados,
que lutaram contra a Ditadura em seus países e chegaram O documentário conta como a militante de
à Presidência da República. direitos humanos Angela Davis, professora de
Filosofia da Universidade da Califórnia, em
Los Angeles, foi demitida da universidade por
pressão do então governador Ronald Reagan
e injustamente acusada de terrorismo, e a con-
sequente campanha de solidariedade interna-
cional que foi constituída para defender sua
inocência e libertação.

CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Embora não tenha havido confronto militar direto entre os EUA e os líderes do bloco comunista (URSS e China),
inúmeras guerras foram travadas indiretamente entre os dois lados. Trata-se, por exemplo, da Guerra do Vietnã. Nes-
se conflito, os EUA utilizaram um potente herbicida, chamado de ”agente laranja”, para desfolhar as densas matas
vietnamitas e, assim, facilitar a visualização das tropas inimigas.
No entanto, o composto químico desse herbicida é extremamente nocivo à saúde humana, causando inúmeros
distúrbios neurológicos, pulmonares e epidérmicos, além de ser extremamente cancerígeno. Os dois principais com-
postos do “agente laranja” são o ácido diclorofenoxiacético e o ácido 2,4,5-triclorofenoxiacético. Estima-se que cerca
de 4,8 milhões de vietnamitas se expuseram ao veneno, o que explica, até hoje, os altos índices de câncer e de má
formação em crianças no país.

Ácido diclorofenoxiacético Ácido 2,4,5-triclorofenoxiacético

46
DIAGRAMA DE IDEIAS

GUERRA FRIA (1945-1991)

A ESTADOS UNIDOS

PRINCIPAIS PRESIDENTES DO PERÍODO DÉCADA DE 1960 – MOVIMENTOS


SOCIAIS E CONTRACULTURA
JOHN KENNEDY (1961-1963)
• GUERRA DO VIETNÃ
MOVIMENTO POR DIREITOS CIVIS
• INVASÃO DA BAÍA DOS PORCOS, EM CUBA
• MARTIN LUTHER KING JR.
• CRISE DOS MÍSSEIS
• MALCOM X
• ALIANÇA PARA O PROGRESSO
• PARTIDO DOS PANTERAS NEGRAS
RICHARD NIXON (1969-1974)
• REATA RELAÇÕES COM A URSS MOVIMENTO HIPPIE
• WATERGATE • FIM DA GUERRA DO VIETNÃ
• CONTESTAÇÃO SOCIAL
JIMMY CARTER (1977-1981)
• REUNIÃO DE CAMP DAVID
• CORTA FINANCIAMENTO DE DITADURAS B UNIÃO SOVIÉTICA
LATINO-AMERICANAS
PRINCIPAIS LÍDERES
RONALD REAGAN (1981-1989)
• REFORÇO DO ANTICOMUNISMO STÁLIN (1928-1953)
• REFORMAS NEOLIBERAIS NOS EUA • GOSPLAN E PLANOS QUINQUENAIS
• INDUSTRIALIZAÇÃO ACELERADA
• COLETIVIZAÇÃO FORÇADA DAS TERRAS (KHOLKOZES)
MIKHAIL GORBACHEV (1985-1991) • BUROCRATIZAÇÃO DO APARELHO DE ESTADO
• PERESTROIKA
• GLASNOST KRUSHEV (1953-1964)
• QUEDA DO MURO DE BERLIM • DESESTALINIZAÇÃO (XX CONGRESSO PCUS)
• FIM DA URSS • ROMPIMENTO COM A CHINA
• CRISE DOS MÍSSEIS
BORIS YELTSIN (1991-1999)
- “COVEIRO DA URSS” BREJNEV (1964-1982), ANDROPOV (1982-1984)
• ABERTURA ECONÔMICA DA RÚSSIA E CHERNENKO (1984-1985)
• DESESTATIZAÇÃO DAS EMPRESAS • REPRESSÃO À PRIMAVERA DE PRAGA (1968)
• EMPRÉSTIMOS AO FMI • INVASÃO DO AFEGANISTÃO (1970)
• OLIMPÍADAS DE MOSCOU (1984)

C BLOCO SOCIALISTA

PRINCIPAIS LÍDERES TCHECOSLOVÁQUIA


IUGOSLÁVIA • PRIMAVERA DE PRAGA (1968)
• GOVERNO DE TITO (1945-1980) • REVOLUÇÃO DE VELUDO (1989)
• SOCIALISTA (BLOCO DOS NÃO ALINHADOS) • SEPARAÇÃO (1993)
• DESINTEGRAÇÃO NOS ANOS 1990 REPÚBLICA ESLOVÁQUIA
• GUERRA DA BÓSNIA (1992-1995) TCHECA

47
HISTÓRIA DO BRASIL:
Incidência do tema nas principais provas

Questões sobre ditadura militar têm sido abor- As temáticas estudadas neste livro são abordadas através da
dadas no Enem com enfoque nas estruturas interação dos aspectos econômicos, sociais, políticos e cultu-
rais. Para tanto, utiliza-se de documentos, imagens, tabelas e
sociais, econômicas e culturais. Exige do
textos introdutórios para compor suas questões.
candidato um domínio amplo de interpretação
textual e imagética para estabelecer cone-
xões entre as diferentes áreas do
conhecimento.

Com forte teor de análise social, econômica Existe um grau de interdisciplinaridade que permite o uso Aborda aspectos sociais, econômicos e culturais que
e cultural, a prova fornece aos candidatos um dos conhecimentos históricos para auxílio da resolução das permearam o período da ditadura militar. Elabora questões
desafio, quando das temáticas ditadura militar questões e escrita da redação, no qual paralelos podem com uso de imagens, charges e textos médios/grandes como
e Nova República. Vale estudar os processos ser traçados sobre a importância desses processos na auxílio para a pergunta.
históricos relacionados aos períodos. construção da República Brasileira.

Nos últimos vestibulares, consta a presença das Nos últimos vestibulares, percebe-se uma As últimas provas abordaram as temáticas Nos últimos vestibulares, a temática da ditadura
temáticas estudadas neste livro. A abordagem tendência em abranger temas relacionados à His- estudadas neste livro por meio de uma correlação militar tem tido presente e exige do candidato análise
prioriza uma integração entre Medicina e História, tória do Brasil. Nota-se uma ênfase em questões entre os aspectos sociais, econômicos e políticos. dos aspectos sociopolíticos, econômicos e culturais,
principalmente voltada para temas como vacinas e relacionadas aos aspectos sociais, econômicos e Utiliza textos para elaborar suas questões, que por meio de questões que combinam documentos,
interações com a população durante o período da políticos que caracterizam o período da ditadura cobram do candidato conhecimentos detalhados imagens e charges.
ditadura militar. militar e da Nova República. sobre os conteúdos.

UFMG

O vestibular aborda as temáticas da ditadura militar A banca do vestibular privilegia que o candidato Neste vestibular não são contemplados direta-
e Nova República por meio das correlações entre os realize análises e interpretações sobre diferentes mente temas de História, entretanto, há um grau
aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais. processos históricos. Assim, na elaboração das de interdisciplinaridade que permite o uso dos co-
Utiliza textos introdutórios, charges e imagens para questões sobre ditadura militar e Nova República nhecimentos históricos para auxílio da resolução
elaborar suas questões. são utilizados trechos de registros documentais dos exercícios, interpretação de tabelas/imagens
e imagens. e na escrita da redação.

O vestibular realiza análises de estruturas Percebe-se uma tendência em abranger temas O vestibular elabora questões de múltipla
históricas brasileiras em suas questões, que relacionados à História do Brasil contemporâ- escolha direcionadas aos candidatos que pre-
propõem ao candidato uma reflexão sobre neo, mas há um grau de interdisciplinaridade tendem uma vaga nos cursos de Enfermagem,
as temáticas estudadas, relacionando-as com que permite o uso dos conhecimentos históri- Biomedicina e Medicina. Há uma tendência em
pertinências contemporâneas, como precon- cos para auxílio da resolução dos exercícios e abordar temas contemporâneos.
ceito e desigualdade social. escrita da redação.

49
Ditadura militar:
AULAS
governos Médici e Geisel
45 e 46
1, 2, 8, 10, 11, 12, 13,
Competências: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 Habilidades: 14, 15, 16, 17, 18, 21,
22, 23, 24 e 25

1. Governo Médici (1969–1974) Os grupos da luta armada – guerrilhas urbanas e rurais que
enfrentavam o regime militar – declinaram e praticamente
desapareceram durante o governo, graças à violência e a
1.1. Auge da repressão: os “anos de eficácia da repressão. Carlos Marighella, da Aliança de Li-
bertação Nacional, ALN, foi assassinado em novembro de
chumbo” 1969, em uma emboscada policial, resultado de informa-
O general Emílio Garrastazu Médici era um fiel representante ções obtidas via tortura aos freis Tito e Beto. A Vanguarda
da “linha dura”. No seu governo, empenhou-se em com- Popular Revolucionária, VPR, fora inviabilizada no início de
bater toda e qualquer oposição ao Regime Militar. Aquele 1971. Aconselhado por seus companheiros a fugir do país,
período – conhecido como os “anos de chumbo” – foi o Lamarca, líder da VPR, insistiu em ficar. Após vários des-
mais cruel e de mais repressão do Estado sobre a socieda- locamentos, embrenhou-se no sertão da Bahia, onde foi
de civil e os meios de comunicação. Em nome da segurança descoberto e assassinado em setembro de 1971.
nacional, o governo promoveu perseguições, torturas e as-
sassinatos contra seus opositores e contra os meios de co- 1.2. O “milagre econômico brasileiro”
municação, que foram bastante censurados. Só podiam ser
veiculadas notícias favoráveis ao Regime Militar. Jornais e A base política e econômica do governo Costa e Silva foi
revistas tiveram suas redações ocupadas e as notícias eram mantida por Médici, bem como o ministro da Fazenda, An-
“filtradas” antes de publicadas. Os grandes jornais, no en- tonio Delfim Netto, o que lhe permitiu colher os frutos da
tanto, quase sempre apoiaram a ditadura conforme relatos política econômica implantada no governo anterior pelo
do grupo Tortura Nunca Mais e da Comissão da Verdade. Programa Estratégico de Desenvolvimento, PED.

Médici

Delfim Netto com o presidente Médici

Com o intuito de elevar o Brasil às grandes potências


econômicas mundiais, foi criado o Plano Nacional de
Desenvolvimento, (PND), cujas principais metas eram
manter os baixos índices inflacionários e promover o de-
senvolvimento da economia nacional.
Houve grande estímulo às exportações, principal fonte de re-
cursos da economia brasileira, bem como à importação de
máquinas e equipamentos industriais, fundamentais para o
Censura da ditadura militar sobre o jornal O Estado
de S. Paulo, que substituía textos proibidos por versos desenvolvimento do país. As exportações diversificaram-se com
de Os Lusíadas, de Camões (26 de julho de 1974). os incentivos dados pelo governo aos produtos industriais:

50
créditos em condições favoráveis, isenção ou redução de tribu- A política econômica de Delfim Netto tinha o propósito de
tos e outras medidas semelhantes. Nas exportações agrícolas, fazer crescer o “bolo” para só depois pensar em distribuí-
destacou-se o avanço da soja, cujos preços no mercado inter- -lo. Alegava-se que, antes do crescimento, pouco ou nada
nacional eram bastante favoráveis. deveria ser distribuído. Privilegiou-se assim a acumulação,
graças às facilidades já apontadas e da criação de um ín-
Um fator a ser destacado é o aumento da capacidade de
dice prévio de aumento dos salários, em nível que subesti-
arrecadar tributos por parte do governo. Esse fato contri-
mava a inflação. Do ponto de vista do consumo pessoal, a
buiu para a redução do déficit público e da inflação.
expansão da indústria, notadamente no caso dos automó-
Outra base importante do PND foi a grande abertura da veis, favoreceu as classes de renda alta e média. Os salários
economia para o capital e os investimentos estrangeiros. dos trabalhadores de baixa qualificação foram comprimi-
Além de vantagens oferecidas pelo governo a investidores dos, enquanto os empregos administrativos de empresas e
internacionais, o Brasil recorreu aos constantes emprésti- publicidade valorizaram-se ao máximo. Tudo isso resultou
mos no exterior, especialmente junto ao Fundo Monetário na aceleração da concentração de renda e riqueza.
Internacional, (FMI), responsáveis por grande aumento da
dívida externa do país. Em 1973, os ingressos de capital O Milagre econômico brasileiro

tinham alcançado o nível anual de 4,3 bilhões de dólares,


quase o dobro do nível de 1971 e mais de três vezes o de
1970. Um dos setores mais importantes do investimento
estrangeiro foi o da indústria automobilística, que liderou
o crescimento industrial com taxas anuais acima de 30%.
Durante o período do chamado “milagre econômico”
(1969–1973), o PIB cresceu na média anual 11,2% e al-
cançou o pico em 1973, com uma variação de 13%. A in-
flação média anual não passou de 18%, índice baixo para
a época.
Médici realizou grandes investimentos no setor de in-
fraestrutura e na construção de grandes e portentosas
obras, chamadas “faraônicas”, em virtude do tamanho,
como, por exemplo, a Ponte Rio–Niterói e a rodovia
Transamazônica, símbolos de um “Brasil grande”.

Afinal, que país é este? (Rio de Janeiro: DP&A, 1999). Charge critica as
consequências do “milagre econômico brasileiro”
(NOVAES, C. E.; RODRIGUES, V.; BOCAYUVA, P.C.; VEIGA, S. M. (orgs).
Capitalismo para principiantes.
18 ed. São Paulo: Ática, 1989).

Construção da rodovia Transamazônica, 1970. Outro aspecto negativo do “milagre” foi a desproporção
Apesar desses indicadores positivos, no entanto, o “mi- entre o avanço econômico e o atraso, se não abandono,
lagre brasileiro” também apresentou pontos negativos. dos problemas sociais pelo Estado. O Brasil iria se notabi-
Um dos seus pontos vulneráveis estava em sua excessiva lizar no contexto mundial por uma posição relativamente
dependência do sistema financeiro e do comércio interna- destacada de seu potencial industrial e por indicadores
cional, responsáveis pela facilidade dos empréstimos exter- muito baixos de saúde, educação e habitação, que medem
nos, pela inversão de capitais estrangeiros, pela expansão a qualidade de vida de um povo.
das exportações etc. Outro ponto negativo era a necessida-
de cada vez maior de contar com determinados produtos
importados, dos quais o mais importante era o petróleo.
1.3. A propaganda do Regime
Porém, o principal aspecto negativo do “milagre” foi de Os altos índices de crescimento econômico, a baixa infla-
natureza social. ção, as grandes obras e o crescimento do poder aquisitivo

51
da classe média foram usados pelo governo como propa- § “Esse é um país que vai pra frente”
ganda do regime, que passou a utilizar os meios de comu- § “Ninguém mais segura esse país”
nicação, especialmente o rádio e a televisão, para divulgar § “Brasil, conte comigo”
a imagem de um Brasil potência. § “Brasil, ame-o ou deixe-o”
Nesse sentido, também contribuíram as vitórias no es-
porte, especialmente do futebol, que em 1970 sagrou-se 1.4. Sucessão de Médici
tricampeão mundial no México, favorecendo a consolida- Em janeiro de 1974 foi realizada uma eleição indireta
ção da expressão “pátria de chuteiras”. Entretanto, ainda para escolha do sucessor do presidente Médici, pelo Co-
ocorreram o título mundial de boxe, conquistado por Eder légio Eleitoral, composto de membros do Congresso e de-
Jofre (1973) e o bicampeonato (1972-74) conquistado legados das Assembleias Legislativas dos Estados, como
por Emerson Fittipaldi na Fórmula 1. previa a emenda no 1 da Constituição de 1967. Outra vez
o candidato militar, general Ernesto Geisel, que concor-
reria pela Arena, venceu com facilidade o candidato do
MDB, Ulysses Guimarães.
A indicação de Geisel representou um triunfo dos “caste-
listas” e uma derrota da “linha dura”. Seria equivocado
pensar, porém, que ele tivesse recebido o mandato de
uma corrente no interior das Forças Armadas favorável à
liberalização do regime. No âmbito da corporação, Gei-
sel foi escolhido pela sua capacidade de comando e suas
Médici e Carlos Alberto erguem a taça da Copa do Mundo em 1970. qualidades administrativas. Pesou também na escolha o
A propaganda de caráter ufanista foi favorecida pela con- fato de o futuro presidente ser irmão do ministro do Exér-
quista do tricampeonato mundial de futebol, no México, cito, Orlando Geisel, embora ele tenha realizado a políti-
ca dos duros. De fato, os conceitos de “linha dura” em
pela Seleção Brasileira comandada por Pelé, Jairzinho e
oposição aos “castelistas”, representantes de uma linha
Tostão. A Ditadura Militar associou a conquista esportiva
mais “branda”, não correspondem à verdade histórica é
ao regime e aproveitou-se da euforia da população para
já foram devidamente desconstruídos pela documentação
difundir a ideia com slogans de que ser contrário ao gover- editada no livro “Tortura nunca mais” e pelos relatórios da
no era não amar o Brasil. Comissão Nacional da Verdade.

2. Governo Ernesto
Geisel (1974–1979)

Slogans do regime militar:

Os cartunistas de O Pasquim ironizavam a euforia criada pela


Copa do Mundo, contraposto à realidade miserável. Ernesto Geisel

52
O general Ernesto Geisel ocupava a presidência da Petro- Em outubro de 1973, ainda no governo Médici, ocorreu a
brás pouco antes de ser eleito e já havia exercido o cargo primeira crise internacional do petróleo, consequência
de Chefe da Casa Militar no governo Castello Branco. Sua da chamada Guerra do Yom Kippur, movida pelos Estados
posse representou o retorno da ala dos militares conside- árabes contra Israel. Produtores de petróleo, os países árabes
rada mais moderada, o grupo da Sorbonne, castelista, que articularam-se para reduzir a oferta do produto e provocar
passa a defender o início da transição para a democracia forte aumento dos preços. A crise afetou profundamente o
de forma “lenta, gradual e segura”, nas suas palavras. Brasil, que importava mais de 80% do total de seu consumo.
No governo, Geisel iniciou um processo de distensão políti- Com o objetivo de combater a crise e retomar o crescimento
ca “lenta, gradual e segura”, apesar de alguns retrocessos econômico do país, a equipe econômica liderada pelo mi-
observados. O governo foi marcado pela contradição de nistro da Fazenda Mário Henrique Simonsen elaborou o II
implementar medidas na direção da abertura política e de Plano Nacional de Desenvolvimento, II PND. O plano
fechar o regime, para evitar a perda do controle da situa- elegia um novo setor prioritário para a economia nacional: a
ção e a ascensão política da oposição. produção de bens de capital – máquinas, derivados de petró-
leo, eletricidade, ferro e aço. A equipe econômica acreditava
Já no início do mandato de Geisel, que tomou posse em que a crise do petróleo seria passageira e que novos capitais
março de 1974, as eleições parlamentares de novembro do internacionais seriam disponibilizados para a execução do
mesmo ano, contaram com a vitória do MDB, que obteve plano, que requeria grandes investimentos.
16 das 22 cadeiras disputadas para o Senado e 160 para
O II PND seria responsável por uma ampliação da atuação
a Câmara dos Deputados. O avanço do MDB preocupava o
do Estado na economia, representado principalmente pelas
governo. Para impedir novas vitórias políticas da oposição, foi
empresas estatais responsáveis pela execução das medidas,
promulgada a Lei Falcão (1976), criada pelo Ministro da
com destaque para a Petrobrás e a Eletrobrás. O governo
Justiça Armando Falcão, que limitava a propaganda eleitoral
passou a estimular a pesquisa em energias alternativas,
no rádio e na televisão. Os candidatos não poderiam mais
reduzindo a dependência em relação ao petróleo. O Brasil
falar; portanto, não mais atacariam o governo. Na televisão
assinou um acordo nuclear com o governo da Alemanha
seria mostrada a imagem do candidato enquanto um narra-
Ocidental e criou o Programa Nacional do Álcool, Proálcool.
dor oficial expunha seu nome, número, partido e currículo.
O acordo nuclear Brasil-Alemanha seria um acordo de
Ressalte-se que Geisel não pretendia restaurar imediata- cooperação nuclear entre os dois países, através do qual a
mente a democracia no Brasil, mas promover o início de Alemanha forneceria tecnologia para a construção de oito usi-
um processo de liberalização política que depois de algum nas nucleares a custo de 10 bilhões de dólares e urânio para
tempo culminaria na redemocratização. Além disso, preten- abastecer suas centrais nucleares. O acordo suscitou críticas,
dia controlar a “linha dura” do Exército, impedindo novos inclusive do governo dos EUA, que acusou o Brasil de tentar
atos de exceção ou ampliação do autoritarismo. construir uma bomba atômica. Internamente, avolumaram-se
Os atos de tortura e morte pelos meios de repressão es- críticas ao elevado valor investido, e à ultrapassada tecnologia
tavam se tornando públicos e a publicidade dos atos da a ser empregada, além do risco de acidentes nucleares. Das
repressão e de suas consequências não interessavam à Di- oito usinas previstas, somente duas foram construídas.
tadura Militar. Era tarefa política e administrativa de Geisel O Proálcool foi anunciado também em 1975 e consistia
manter sob controle o aparelho repressivo. no incentivo ao desenvolvimento de carros movidos a álco-
A crise econômica avizinhava-se e se agravaria durante o ol e na produção em larga escala de álcool combustível e
governo Geisel, afetando militares que temiam suas conse- de seu uso como matéria-prima na indústria química. Além
quências para a imagem que haviam construído das Forças disso, o álcool seria adicionado à gasolina, visando dimi-
Armadas como grandes governantes. nuir a dependência do petróleo.

2.1. Economia
No governo de Geisel, a economia sofria com os sintomas
do fim do “milagre econômico”, representados pela queda
do PIB e pelo retorno da inflação, que reduziriam o poder
aquisitivo da população e o consumo, provocando aumen-
to do desemprego e crises no setor industrial e comercial.
A dívida externa havia crescido muito e representava apro-
ximadamente 25% do PIB nacional, situação que retirava
investidores e impedia novos investimentos no país. Complexo nuclear com Angra I e Angra II, no Rio de Janeiro.

53
2.2. Os atritos com a “linha dura” Frota, Ministro do Exército, que procurava reforçar sua can-
didatura nos meios militares, seria o próximo candidato à
O processo de abertura do presidente Geisel sofria críti- presidência. O grupo fazia severas críticas à economia e à
cas constantes da “linha dura”, através de panfletos dis- política externa do governo, além de acusar assessores do
tribuídos nos quartéis e nos bastidores, denotando haver presidente de corrupção e incompetência.
“briga” interna entre os membros das Forças Armadas
Em outubro de 1977, Geisel demitiu Sylvio Frota do Ministé-
quanto à forma de condução das políticas governamen-
rio do Exército e nomeou para seu posto o Comandante do
tais. Por outro lado foram mantidas a tortura, a repressão e
III Exército, general Bethlem. Frota ainda tentou reagir, mas
até mesmo o assassinato de opositores ao regime, embora
não obteve o apoio necessário e acabou acatando a decisão,
Geisel deixasse ser difundida a versão de que tudo ocorria
o que abriu caminho para a candidatura do chefe do Serviço
à sua revelia.
Nacional de Informações (SNI), general João Baptista de Oli-
Em outubro de 1975, o jornalista Wladimir Herzog, diretor veira Figueiredo, candidato preferido de Geisel.
de jornalismo da TV Cultura, foi assassinado sob tortura
Deve ser lembrada ainda a proximidade das mortes dos
nas dependências do DOI-Codi, em São Paulo. Como era
membros da Frente Ampla (JK, Jango e Lacerda), os quais,
de costume, os órgãos de segurança argumentaram que
num intervalo de 9 meses (agosto de 1976 a maio de
o preso havia se suicidado. A morte do jornalista provocou
1977) faleceram, o que levantou dúvidas sobre a coinci-
grande comoção e mobilização da sociedade civil contra o
dência da proximidade das mortes.
governo, representada por um culto ecumênico na Cate-
dral da Sé, que reuniu cerca de 10 mil pessoas, conduzido
pelo cardeal católico Dom Paulo Evaristo Arns, pelo rabino
judeu Henry Sobel e pelo evangélico reverendo Wright.

Automóvel avariado depois do acidente que vitimou JK

2.3. Pacote de Abril


Em 1978, ocorreriam eleições para governadores estaduais,
deputados e senadores. Havia uma clara ameaça para o go-
Vladimir Herzog encontrado morto na sede do DOI-Codi.
verno de uma expressiva vitória eleitoral do MDB, vitória essa
que impediria a aprovação no Congresso de vários projetos
do governo, especialmente um de reforma do Judiciário, já
derrotado por influência do MDB, mas que o governo insistia
em aprovar.
Usando os poderes especiais conferidos pelo AI-5, em abril
de 1977 o presidente Geisel determinou o fechamento do
Congresso Nacional e decretou o Pacote de Abril.
Com essa medida, foram alteradas as regras eleitorais e es-
Missa de Vladimir Herzog
tabelecidas eleições indiretas para governador, criação dos
senadores biônicos1 e ampliação do mandato presidencial
Em janeiro de 1976 ocorreu outra morte na sede do DOI-
para seis anos.
-Codi, a do operário Manuel Fiel Filho, acusado de ser mili-
tante comunista, de novo sob o argumento de suicídio, que O pacote determinava ainda que a escolha do presidente não
não foi aceito. Em represália, o presidente Geisel demitiu o seria mais realizada pelo Congresso Nacional, mas por um
comandante do II Exército, general Ednardo D’Avila Melo. Colégio Eleitoral, composto pelo Congresso Nacional e mais
seis representantes de cada Assembleia Legislativa Estadual.
A “linha dura” reagiu por meio da divulgação pela im-
prensa, à revelia do presidente Geisel, que o general Sylvio 1 Senadores indicados indiretamente, por meio de um colégio
eleitoral e sob o aval do presidente da República

54
“Os grandes estados, que tinham Assembleias Legislativas Em maio de 1978, exigindo aumento de salários, os meta-
maiores, mandavam para o Colégio Eleitoral o mesmo nú- lúrgicos da região do ABC Paulista entraram em greve, lide-
mero de representes que os estados menores. Essa reforma rados por Luís Inácio Lula da Silva, presidente do Sindicato
visava manter o Colégio Eleitoral nas mãos do governo, já dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema.
que a oposição era forte no Congresso Nacional e nas As-
Em outubro de 1978, o governo anunciou a revogação
sembleias Legislativas do Sul e Sudeste. Mantendo o mes-
do AI-5, que deixaria de vigorar a partir de 1o de janeiro
mo número de representantes das Assembleias Legislativas
de 1979, iniciando de fato a desmontagem do Estado mi-
Estaduais, independentemente do seu tamanho, o regime
litar autoritário. A medida agradava setores da sociedade
militar continuava controlando o Colégio Eleitoral, graças
civil – Ordem dos Advogados do Brasil, OAB, Associação
ao apoio das Assembleias Legislativas do Norte, Nordeste
Brasileira de Imprensa, ABI, Igreja Católica, sindicatos, es-
e Centro-Oeste, que eram governistas” (CÁCERES, Florival.
tudantes, bem como até mesmo o governo estadunidense,
História do Brasil. São Paulo: Moderna, 1993. p. 348).
comandado pelo presidente Jimmy Carter – que pressiona-
vam pela redemocratização do Brasil.
2.4. No fim do governo, a Ainda em 1978, Geisel lançou a candidatura do chefe do
anunciada abertura SNI, João Baptista de Oliveira Figueiredo, para a presidên-
A crise econômica que se abatia sobre o Brasil e a inflação cia da República, e o vice Aureliano Chaves, que venceram
levaram segmentos da imprensa, da sociedade civil e dos as eleições sem dificuldades.
trabalhadores a pressionar o governo pela abertura e a re-
alizar manifestações.

CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Durante o governo Geisel, o Brasil passou a investir em energias alternativas, tentando diminuir a enorme dependên-
cia que vivia em relação ao petróleo e seus derivados. Neste contexto, passa a ser importante a utilização de energia
nuclear e o Programa Nacional do Álcool (Proálcool).
No caso da energia nuclear, o Brasil fez um acordo com o governo alemão para a construção de oito usinas de energia
nuclear, sendo que apenas duas tiveram suas obras iniciadas durante o governo militar. A tecnologia seria importante para
o Brasil, pois, apesar das estapafúrdias suspeitas estadunidenses de que o Brasil poderia ter como objetivo nas usinas
enriquecer urânio ou plutônio para construir uma bomba atômica, o país visava transformar a energia nuclear em energia
elétrica. Isso é possível porque as usinas nucleares funcionam como usinas térmicas, e o calor produzido na fissão nuclear
é utilizado para ferver a água que movimenta enormes turbinas, as quais, por sua vez, produzem energia elétrica.

55
multimídia: vídeo multimídia: vídeo
Fonte: Youtube Fonte: Youtube

Anos rebeldes (minissérie) O ano em que meus pais saíram de férias

No auge da Ditadura Militar no Brasil, os jovens Mauro (Michel Joelsas) é um garoto mineiro de
João Alfredo (Cássio Gabus Mendes), um rapaz 12 anos que adora futebol e jogo de botão. Um
que liderava o movimento estudantil e era mui- dia, sua vida muda completamente, já que seus
to preocupado com as questões sociais, e Maria pais saem de férias, de forma inesperada e sem
Lúcia (Malu Mader), uma jovem individualista motivo aparente para ele. Na verdade, os pais de
que só queria ter uma vida tranquila, se apai- Mauro foram obrigados a fugir da perseguição
xonam, apesar de terem perfis muito diferentes política (1970), tendo que deixá-lo com o avô
um do outro. Ao lado de João Alfredo, estava paterno (Paulo Autran). Porém, o avô enfrenta
Edgar (Marcelo Serrado), grande amigo seu que problemas, o que faz com que Mauro tenha de
era apaixonado por Maria Lúcia, mas que nunca ficar com Shlomo (Germano Haiut), um velho
disputava o amor da jovem com seu amigo. judeu solitário que é vizinho do avô de Mauro.

multimídia: vídeo
multimídia: vídeo Fonte: Youtube
Fonte: Youtube Cidadão Boilesen
O que é isso, companheiro?
Com um título notoriamente inspirado no clás-
O jornalista Fernando (Pedro Cardoso) e seu ami- sico “Cidadão Kane“, Chaim Litewski produziu,
go César (Selton Mello) abraçam a luta armada ao longo de 16 anos, um documento audiovisu-
contra a Ditadura Militar, no final da década de al de qualidade ímpar em termos de pesquisa,
1960. Os dois se alistam a um grupo guerrilheiro impacto e apuro técnico. Em sua abertura, com
de esquerda. Em uma das ações do grupo mili- uma levada diferente, o filme revela o curricu-
tante, César é ferido e capturado pelos militares. lum vitae de Boilesen (batido a máquina) e vai
Fernando então planeja o sequestro do embaixa- tecendo a sua história através dos depoimentos
dor dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke de vítimas de tortura, diplomatas, militantes de
Elbrick (Alan Arkin), para negociar a liberdade de organizações de esquerda, políticos, militares da
César e de outros companheiros presos. reserva, religiosos e até ex-presidentes.

56
multimídia: vídeo multimídia: vídeo
Fonte: Youtube Fonte: Youtube

Cabra-cega Zuzu Angel


Dois jovens militantes da luta armada sonham A Ditadura Militar faz o Brasil mergulhar em um
com uma revolução social no Brasil. Quando um dos momentos mais obscuros de sua história.
deles precisa se esconder na casa de um amigo, Alheia a tudo isto, Zuzu Angel (Patrícia Pillar),
simpatizante da causa, conhece o comandante uma estilista de moda, fica cada vez mais famosa
de um grupo de esquerda, que estuda um retor- no Brasil e no exterior. O desfile da sua coleção
no à luta política. em Nova York consolidou sua carreira, que esta-
va em ascensão. Paralelamente, seu filho Stuart
(Daniel de Oliveira) ingressa na luta armada, que
combatia as arbitrariedades dos militares.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Batismo de sangue
O convento dos frades dominicanos torna-se
uma trincheira de resistência à Ditadura Militar multimídia: vídeo
que governa o Brasil. Movidos por ideais cris- Fonte: Youtube
tãos, os freis Tito (Caio Blat), Betto (Daniel de
Pra frente, Brasil
Oliveira), Oswaldo (Ângelo Antônio), Fernando
(Léo Quintão) e Ivo (Odilon Esteves) passam a Em 1970, o Brasil inteiro torce e vibra com a
apoiar o grupo guerrilheiro Ação Libertadora seleção de futebol no México, enquanto prisio-
Nacional, comandado por Carlos Marighella neiros políticos são torturados nos porões da
(Marku Ribas). Eles logo passam a ser vigiados Ditadura Militar e inocentes são vítimas desta
pela polícia e, posteriormente, são presos, pas- violência. Todos estes acontecimentos são vistos
sando por terríveis torturas. pela óptica de uma família, quando um dos seus
integrantes, um pacato trabalhador da classe
média, é confundido com um ativista político e
“desaparece”.

57
multimídia: vídeo
Fonte: Youtube multimídia: vídeo
Perdão, mister Fiel Fonte: Youtube

A morte do operário Manoel Fiel Filho, no Cidade de Deus


DOI-Codi, em São Paulo, em 1976, é a base Buscapé (Alexandre Rodrigues) é um jovem po-
desse documentário, cujo objetivo é mostrar a bre, negro e muito sensível, que cresce em um
atuação dos Estados Unidos na caça aos co- universo de muita violência. Ele vive na Cidade
munistas e nas ditaduras militares na América de Deus, uma favela carioca conhecida por ser
do Sul. A produção traz revelações inéditas de um dos locais mais violentos do Rio. Amedron-
personagens históricos que estiveram em lado tado com a possibilidade de se tornar um ban-
opostos durante o regime. dido, Buscapé acaba sendo salvo de seu destino
por causa de seu talento como fotógrafo, o qual
permite que siga carreira na profissão. É através
de seu olhar atrás da câmera que o jovem ana-
lisa o dia a dia da favela onde vive, na qual a
violência aparenta ser infinita.

multimídia: sites
www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbe-
te-tematico/frente-ampla
www.memorialdaresistenciasp.org.br/me-
morial/default.aspx?mn=68&c=148&s
www.infograficos.estadao.com.br/especiais/
multimídia: livros
confissoes-do-doi-codi/
A ditadura encurralada – Elio Gaspari
www.forumverdade.ufpr.br/caminhosdaresis-
tencia/a-repressao/departamento-de-ordem- Quarto volume da série sobre os “anos de
-politica-e-social-dops/ chumbo” escrita por Elio Gaspari, narra como
www.documentosrevelados.com.br/catego- Geisel e o general Golbery do Couto e Silva,
ria/repressao/ditadura-reoressao/ ministro-chefe do Gabinete Civil, consegui-
www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbe- ram vencer essa guerra, que o marechal Cas-
te-tematico/tortura-nunca-mais tello Branco perdera e seu sucessor, Costa e
www.cnv.gov.br/ Silva, nela se rendera.
www.mundoeducacao.bol.uol.com.br/histo-
ria-america/operacao-condor.htm

58
multimídia: livros multimídia: livros
Operação Condor: o sequestro dos uruguaios – A doutrina da segurança nacional e “milagre
Luiz Claudio Cunha econômico” (1969/1973) – Carlos Giannazi
Este livro trata de um tempo em que adversários O Brasil tem discutido cada vez mais as con-
eram punidos com a tortura, o desaparecimento sequências danosas do Golpe Civil-Militar de
e a morte. O sequestro dos uruguaios Lílian Ce- 1964, que só teve o seu término oficial em
liberti e Universindo Díaz, em 1978, numa ação 1985, com a eleição do presidente Tancredo
dos órgãos de repressão do Uruguai e do Brasil, Neves. Este livro apresenta uma contribuição
expôs as vísceras da “Operação Condor“ à opi- significativa para todos aqueles que querem
nião pública brasileira e internacional. Fundada aprofundar os conhecimentos sobre essa parte
em 1975 no Chile de Pinochet, a Condor era da história recente do país, ao colocar em relevo
uma ação terrorista de Estado que atropelava a Doutrina de Segurança Nacional, responsável
fronteiras nacionais e afrontava direitos hu- pela fundamentação ideológica de sustentação
manos, forçando o desaparecimento de quem ao Regime Militar que, por meio dela, procu-
ousasse contestar os regimes de força dos ge- rava legitimar as ações autoritárias do Estado
nerais. Dissidentes políticos eram caçados por brasileiro nas áreas política, econômica e social.
comandos clandestinos militares e policiais.

multimídia: livros multimídia: livros


Mata!: o major Curió e as guerrilhas no Araguaia Operação Araguaia – Taís Moraes;
– Leonencio Nossa Eumano Silva
Resultado de dez anos de pesquisas em arqui- As forças armadas sempre afirmaram que os
vos públicos e particulares, além de diversas arquivos da guerrilha do Araguaia, comanda-
viagens à região do Bico do Papagaio (con- da pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B),
fluência dos rios Araguaia e Tocantins) e de nos anos 1970, não existem e que, se exis-
depoimentos de mais de 150 pessoas, Mata! tiram algum dia, foram destruídos. Não é
pode ser lido de diferentes maneiras. Entre as verdade. A partir de documentos secretos
numerosas facetas do livro − reportagem, re- recolhidos pela pesquisadora Taís Morais, ao
lato histórico, pesquisa antropológica, reflexão longo de sete anos, junto a militares − que os
política − a mais espetacular é, sem dúvida, guardaram por cerca de 30 anos − ela pró-
seu conteúdo inédito de documentos sobre a pria e o jornalista Eumano Silva escreveram
guerrilha do Araguaia (1966-1974). este o livro.

59
multimídia: livros multimídia: livros
No centro da engrenagem – Mariana Joffily Mergulho no inferno – E.P. Cavalcante
Mariana Jofilly aborda neste livro um ponto de Um dos mais corajosos militantes de esquer-
vista ainda pouco explorado dentre os diversos da que combateram a ditadura imposta em
estudos sobre o Regime Militar brasileiro. Trata- 1964, Eunício Precílio Cavalcante lançou um
-se dos interrogatórios preliminares de militantes livro que busca reconstituir a violência e a
acusados de subversão pela Operação Bandei- barbárie que vigoraram no Brasil durante 21
rante e pelo DOI-Codi, realizados em São Paulo, anos e cuja herança ainda nos castiga.
entre 1969 e 1975. A obra foi uma das ganhado-
ras do Prêmio Memórias Reveladas 20, instituído
pela Casa Civil da Presidência da República, que
tem o objetivo de incentivar a divulgação de tra-
balhos feitos com base nas fontes documentais
referentes ao Regime Militar no Brasil.

multimídia: livros
Memórias de uma guerra suja – Claudio Guerra
Memórias de uma guerra suja revela os basti-
dores de uma parte do trabalho de destruição
multimídia: vídeo da esquerda brasileira durante os anos 1970
e início dos 1980. É o depoimento, em pri-
Fonte: Youtube
meira pessoa, de um ex-delegado do Dops,
Ação entre amigos que foi o principal agente de um grupo de
Lutando contra o Regime Militar brasileiro, os militares fora da cadeia de comando oficial
amigos Miguel, Paulo, Elói e Osvaldo são presos das forças armadas.
pelas forças de repressão da Ditadura, em
1971, e torturados durante meses por Correia,
responsável pela morte de Lúcia, namorada de
Miguel.
25 anos depois, os quatro amigos se reúnem ao
tomar conhecimento de que o torturador, ao con-
trário da versão oficial, está vivo. Decidem então
sequestrá-lo e matá-lo. Todavia, ao ser capturado,
Correia faz uma revelação surpreendente que
muda toda a história.

60
multimídia: vídeo multimídia: vídeo
Fonte: Youtube Fonte: Youtube

O velho: a história de Luiz Carlos Prestes Hércules 56


O documentário reúne 70 anos de imagens da Na semana da Independência de 1969, o em-
História do Brasil: a épica marcha de 25 mil km baixador dos EUA no Brasil, Charles Burke
da Coluna Prestes nos anos 1920; passando Elbrick, foi sequestrado. Em sua troca, foi exigi-
pelo dramático romance com Olga Benário até da a divulgação de um manifesto revolucionário
a repressão política da Ditadura Militar. Depoi- e a libertação de 15 presos políticos, que repre-
mentos de jornalistas, familiares, ex-membros sentavam diversas tendências políticas que se
do PCB e um raro material de arquivo formam a opunham à Ditadura Militar. Banidos do territó-
mais completa cinebiografia de Prestes, Quixote rio nacional e com a nacionalidade cassada, eles
obstinado que carregou durante toda a sua vida são levados ao México no avião da FAB Hércules
o projeto de um mundo melhor. 56. Através de entrevistas com os sobreviventes,
os fatos desta época são relembrados.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Marighella (documentário)
multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Devido à Ditadura Militar, muito sobre os bas-
tidores da época foi mantido em sigilo ou, no Lamarca
máximo, pouco divulgado. Natural, afinal de Crônica dos últimos anos da vida do capitão do
contas o país vivia um período em que a cen- exército Carlos Lamarca (Paulo Betti), que, nos
sura atuava com rigor, impedindo a publicação anos da Ditadura, desertou das forças armadas
livre de notícias e opiniões. Nos últimos anos, o e passou a fazer oposição, tornando-se um dos
cinema brasileiro tem recuperado um pouco de- mais destacados líderes da luta armada.
sta história, seja devido à vivência dos diretores
mais antigos ou pelo próprio interesse da nova
geração.

61
multimídia: livros
multimídia: vídeo JK e a ditadura – Carlos Heitor Cony
Fonte: Youtube JK e a ditadura começa três anos do exílio
Carlos Marighella: quem samba fica, quem de Juscelino, narrando sua trajetória política
não samba (...) e pessoal, abrangendo o período anterior e
as consequências do regime ditatorial instau-
O documentário foca o período da luta arma- rado no país pelo movimento militar de 1964,
da de resistência à Ditadura Militar, de 1964 indo até a sua morte, em 1976.
até a morte de Carlos Marighella em dezem-
bro de 1969. Montado a partir de importantes
depoimentos de militantes políticos, estudiosos
e pesquisadores, o título “quem samba fica,
quem não samba vai embora” é uma referên-
cia à carta homônima redigida por Marighella
e endereçada aos revolucionários de São Paulo,
em dezembro de 1968: “O fundamental na or-
ganização são os grupos e a atuação de baixo
para cima.”

multimídia: livros
Marighella: o guerrilheiro que incendiou
o mundo – Mário Heitor Magalhães
“Cuidado, que o Marighella é valente”, dis-
se Cecil Borer, diretor do Dops do Rio, antes
de despachar uma equipe para capturá-lo
em seguida ao Golpe de 1964. A narrativa
percorre a vida, a obra e a militância do con-
multimídia: livros troverso mulato baiano, que foi deputado
federal, poeta e estrategista da guerrilha no
A ditadura derrotada – Elio Gaspari
Brasil. Passagens pela prisão, resistência à
Durante os últimos trinta anos, o jornalista tortura, assaltos a bancos (e a um trem pa-
Elio Gaspari reuniu documentos até então gador), tiroteios, espionagem internacional,
inéditos e fez uma exaustiva pesquisa so- tudo é apresentado em ritmo de thriller, com
bre o Governo Militar no Brasil. O resul- revelações desconcertantes.
tado desse meticuloso trabalho gerou um
conjunto de quatro volumes que compõe
a obra mais importante sobre a história
recente do país. A obra é dividida em dois
conjuntos: As ilusões armadas e O sacer-
dote e o feiticeiro.

62
multimídia: livros multimídia: livros
Viagem à luta armada – Carlos Eugênio Paz Meu tio Carlos Lacerda – Gabriel Lacerda
Uma viagem que nos leva ao mundo de Com narrativa leve, em tom quase confessio-
Carlos Marighella, Joaquim Câmara Ferreira, nal, Gabriel Lacerda faz aparecer a dimensão
o Toledo, e Carlos Lamarca, na guerrilha ur- simplesmente humana de um personagem
bana contra a Ditadura Militar no final dos histórico – seu tio, Carlos Lacerda. Não o
anos 1960 e início dos anos 1970. Clemente, polêmico político que derruba presidentes,
nome de guerra de Carlos Eugênio, é o nosso escreve artigos e faz discursos candentes.
guia nessa viagem. Ele entrou na luta com Gabriel mostra simplesmente o tio Carlos, um
17 anos e, como tantos outros, conheceu homem como tantos outros, que viaja e traz
a rebeldia, revoltou-se contra a miséria e a presentes para a família, gosta de conversar
repressão policial, fez opção por um dos la- e plantar rosas, sempre agitado e vibrante,
dos − exigência da época − amou, guerreou, algumas vezes teimoso, outras vezes aberto
fugiu, matou... E não morreu. No exílio, as ao diálogo. De forma coloquial, o livro descre-
dores da sobrevivência são anestesiadas em ve episódios da relação entre tio e sobrinho,
suas fugas com as drogas, que não libertam, relembrando alguns dos principais aconteci-
mas permitem o escape. Um processo psico- mentos da história política do Brasil, desde
terápico ensina-o a conviver com as marcas, a derrubada de Vargas, em 1945, à cassação
atenua as culpas e o restitui à vida. Um livro dos direitos políticos de Lacerda, em 1968.
carregado de adrenalina, mas sem amargura.
Nas palavras de Franklin Martins, “convém
afivelar o cinto de segurança“.

multimídia: vídeo
multimídia: vídeo Fonte: Youtube
Fonte: Youtube Conhecendo os Presidentes - Ep. 26: Ernesto Geisel
Conhecendo os Presidentes - Ep. 25: Emílio Médici

63
ÁREAS DE CONHECIMENTO DO ENEM

Habilidade

2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.

A forma como uma sociedade constrói uma noção coletiva de seu passado é fundamental em sua cultura e na
formatação ideológica de seus partidos políticos. A habilidade 2 se preocupa justamente em abordar este tema, em
diferentes pontos de vista. No caso da questão a seguir, vemos o caso da Comissão da Verdade, órgão criado para
averiguar os mandos e desmandos cometidos durante a Ditadura Civil-Militar brasileira (1964-1985). A tentativa da
comissão era o de desarquivar antigos documentos sobre o período e de coletar depoimentos das vítimas de abuso,
de alguns políticos e militares que viveram essa história.
Embora acusada de certo viés ideológico, o órgão assumiu um caráter objetivo nas suas investigações, procurando
reconstruir fatos da maneira mais clara possível. Trata-se, portanto, de remexer um passado obscuro, que existia
velado após a Lei de Anistia (1979), que perdoou tanto os perseguidos políticos quanto os torturadores e assassinos
da Ditadura.

Modelo
(Enem) A Comissão Nacional da Verdade (CNV) reuniu representantes de comissões estaduais e de várias instituições
para apresentar um balanço dos trabalhos feitos e assinar termos de cooperação com quatro organizações. O coor-
denador da CNV estima que, até o momento, a comissão examinou, “por baixo”, cerca de 30 milhões de páginas de
documentos e fez centenas de entrevistas.
Disponível em: <www.jb.com.br>. Acesso em: 2 mar. 2013 (adaptado).

A notícia descreve uma iniciativa do Estado que resultou da ação de diversos movimentos sociais no Brasil diante de
eventos ocorridos entre 1964 e 1988. O objetivo dessa iniciativa é:
a) anular a anistia concedida aos chefes militares.
b) rever as condenações judiciais aos presos políticos.
c) perdoar os crimes atribuídos aos militantes esquerdistas.
d) comprovar o apoio da sociedade aos golpistas anticomunistas.
e) esclarecer as circunstâncias de violações aos direitos humanos.

Análise expositiva - Habilidade 2: A Comissão Nacional da Verdade foi criada para esclarecer os abusos
E cometidos contra os direitos humanos, na época da Ditadura Militar brasileira.
Alternativa E

64
DIAGRAMA DE IDEIAS

DITADURA MILITAR:
GOVERNO MÉDICI

GOVERNO MÉDICI
A B MILAGRE ECONÔMICO
(1969-1974)
CARACTERÍSTICAS
• PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO (PND)
• LINHA DURA
• MINISTRO DA FAZENDA (DELFIM NETTO)
• ANOS DE CHUMBO: DESTRUIÇÃO DA LUTA ARMADA
• ESTÍMULO À EXPORTAÇÃO (EX.: SOJA)
(MORTE DE LAMARCA, MARIGHELA
• DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL
E FIM DA GUERRA DO ARAGUAIA)
SETOR AUTOMOBILÍSTICO
• “MILAGRE ECONÔMICO”
• CONTROLE DA INFLAÇÃO
• UFANISMO
• EMPRÉSTIMO AO FMI
VITÓRIA EM MODALIDADES ESPORTIVAS
• OBRAS FARAÔNICAS
PROPAGANDAS MIDIÁTICAS
• CONCENTRAÇÃO DE RENDA
• FORTALECIMENTO DA CLASSE MÉDIA

DITADURA MILITAR:
GOVERNO GEISEL

GOVERNO GEISEL
A B ECONOMIA
(1974-1979)
CARACTERÍSTICAS • FIM DO MILAGRE ECONÔMICO
• “CASTELISTA” • AUMENTO DA INFLAÇÃO
• “ABERTURA LENTA, GRADUAL E SEGURA” • AUMENTO DA DÍVIDA EXTERNA
• CONFLITOS COM A LINHA DURA • 1973: CRISE INTERNACIONAL DO PETRÓLEO
• II PND
ACORDO NUCLEAR BRASIL–ALEMANHA
C REPRESSÃO PROÁLCOOL
AMPLIAÇÃO DAS ESTATAIS
• ATRITOS COM A LINHA DURA (PETROBRAS E ELETROBRAS)
OPOSIÇÃO À ABERTURA
• MANUTENÇÃO DA TORTURA
1975: ASSASSINATO DE VLADIMIR HERZOG
D POLÍTICA
1976: ASSASSINATO DO OPERÁRIO MANUEL FILHO
• GEISEL APOIA CANDIDATURA DE JOÃO BATISTA FIGUEIREDO
• 1974: MDB GANHA MAIORIA NA CÂMARA E NO SENADO
(PRESIDENTE DO SNI)
• 1976: LEI FALCÃO
• 1977: FECHAMENTO DO CONGRESSO
PACOTES DE ABRIL
CRIAÇÃO DOS SENADORES BIÔNICOS
PRESIDENTE ELEITO POR COLÉGIO ELEITORAL
• 1978: GREVE DE METALÚRGICOS NO ABC
LÍDER: LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
• FIM DO AI-5

65
Ditadura militar: governo Figueiredo
AULAS
e regimes militares sul-americanos
47 e 48
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10,
Competências: 1, 2, 3, 4 e 5 Habilidades: 11, 12, 13, 14, 15, 21,
22, 23, 24 e 25

1. Fim do regime militar Para o processo de redemocratização, em 1985, foi deter-


minante a atuação de diversos movimentos sociais. A partir
da década de 1970, o movimento operário, liderado pelos
e redemocratização metalúrgicos da região do ABC paulista, realizou a primeira
greve operária, em 1978, em plena vigência do AI-5. Des-
taca-se, ainda, a atuação de grupos como a ABI (Associa-
ção Brasileira de Imprensa), o CBA (Comitê Brasileiro de
Anistia), setores progressistas da Igreja Católica ligados às
CEB (Comunidades Eclesiais de Base) e muitos outros que
atuaram em várias frentes, buscando reconquistar as liber-
dades individuais e coletivas perdidas com a instauração
do Regime Ditatorial Militar, em 1964.
A pressão da sociedade civil organizada e da oposição rep-
Manifestação por eleições diretas à Presidência.
resentada pelo MDB, e depois pelo PMDB, surtiu efeito. Ain-
da que se discutam os limites dos avanços, tivemos neste
A partir de 1973, o Regime Militar brasileiro começou a contexto momentos importantes como a aprovação da Lei
demonstrar sinais de desgaste, devido ao contexto econômi- de Anistia (28/8/1979) e da revogação do AI-5 (1978).
co internacional de crise, resultado de mais um episódio Mas havia ainda um longo processo até a concretização da
do conflito árabe-israelense (Guerra do Yom Kippur) que redemocratização, que viria depois de uma grande derro-
repercutiu e provocou significativas alterações no cenário ta: a não aprovação da Emenda Dante de Oliveira (1984),
político e econômico no Brasil e no mundo. A redução da que propunha eleições diretas para presidente, em 1985.
oferta de petróleo pelos países árabes levou a uma grande Mesmo com esse grande revés, a indicação de Tancredo
alta no preço do produto, afetando, particularmente, os Neves para a Presidência acabou aglutinando elementos
EUA, que se viram obrigados, diante do quadro recessivo, a dos mais variados campos políticos, inclusive dissidentes
repatriar capitais, ocasionando o fechamento de muitas de do PDS para enfrentar a candidatura de Paulo Maluf, que
suas empresas multinacionais espalhadas mundialmente. amargava uma forte rejeição em diversos setores.
O modelo econômico implantado pelos militares, coman-
A vitória de Tancredo naquele momento, mesmo com
dado pelo economista e ministro Antonio Delfim Netto, de-
eleições indiretas, significava o fim do regime militar, já
pendia muito dos investimentos estrangeiros para manter
que ele havia prometido ser o último presidente a subir na
os altos índices de crescimento econômico. Sem a oferta
rampa do Planalto por via indireta. Nascia, então, a Nova
de crédito para os investimentos em infraestrutura e com
República, expressão criada por Ulysses Guimarães.
os cortes de gastos dos EUA, a economia brasileira seria
seriamente afetada. Nesse caso, mais uma vez percebemos Vale salientar, no entanto, que a transição não ocorreu
os significados histórico-geográficos das relações de poder de maneira tranquila, já que Tancredo, acometido por um
entre as nações. grave problema de saúde, acabou impedido de assumir o
cargo, resultando na posse de seu vice José Sarney ao car-
Fragilizado em sua política econômica, as diversas formas
go de presidente da República, de maneira interina; e, após
de oposição ao Regime Militar ganharam fôlego. Os pre-
a sua morte, em 21 de abril de 1985, de forma definitiva,
sidentes Geisel (1974-1979) e Figueiredo (1979-1985)
mediante um arranjo constitucional. Pesava sobre Sarney a
fizeram governos denominados de “distensão”. Dentre as
desconfiança dos anos em que fez parte da Arena, partido
opções dessa transição para a democracia, o Regime Mili-
que dava sustentação política ao Regime Militar.
tar optou pela distensão lenta, segura e gradual, segundo
o seu discurso, quando se observa uma alternância entre Os desafios da Nova República eram gigantescos, já
avanços em direção à democracia e recaídas autoritárias. que herdava do Regime Militar um país em condições

66
lastimáveis com a economia em crise, a sociedade à beira O novo presidente da República assumiu o cargo com o com-
de um processo de desintegração e uma estrutura políti- promisso de manter o processo de abertura política lenta,
ca em frangalhos, além do aparato jurídico da Ditadura. gradual e segura iniciada por Geisel. O novo governo deveria
Para alterar esse quadro, o novo governo precisava agir, evitar o radicalismo político, tanto na oposição ao Regime
simultaneamente, na área política e na econômico-social, quanto na “linha dura”, contrária à abertura, evitando que
de maneira rápida, decidida e sem cometer erros. prejudicassem o processo de redemocratização do Brasil.
No plano econômico-social, a tarefa era delicada. Eliminar A crise econômica, a elevada dívida externa e o crescimen-
a recessão, retomar o crescimento, combater a inflação to da inflação eram sérias dificuldades que deveriam ser
galopante e reduzir as enormes desigualdades sociais que superadas. Com esse intuito, Delfim Netto foi nomeado mi-
haviam se aprofundado durante os Governos Militares. nistro da Fazenda e lançou o III Plano Nacional de Desen-
volvimento – III PND, que não teve resultados favoráveis,
Em termos políticos, era necessário fazer a chamada transição
especialmente em virtude da falta de recursos disponíveis
democrática, que começaria pela remoção do “entulho au-
no mercado financeiro internacional.
toritário”, ou seja, a eliminação de toda a legislação arbitrária
e ditatorial do Regime Militar, e terminaria pela construção
A crise econômica e a pressão pela abertura política foram
de um sistema político democrático e legítimo, inclusive com
os principais motivos para uma nova onda de greves na
a eleição de uma Assembleia Constituinte e a elaboração de
região do ABC paulista. Novamente, os operários cruza-
uma nova Constituição, promulgada em 1988.
ram os braços e o movimento estimulou greves em todo
o país. Em represália, o governo decretou a intervenção
nos sindicatos e a prisão de seus dirigentes, entre os quais
Luís Inácio Lula da Silva, presidente do Sindicato dos Me-
talúrgicos de São Bernardo do Campo, em março de 1979,
enquadrado na Lei de Segurança Nacional.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Lula comanda assembleia de metalúrgicos em 13
Conhecendo os Presidentes - Ep. 27 de maio de 1979, em São Bernardo, SP.

2. Governo João Figueiredo


(1979–1985)

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Regime/Ditadura Militar/HISTÓRIA

2.1. Anistia e pluripartidarismo


Em junho de 1979, o presidente Figueiredo enviou ao Con-
João Baptista de Oliveira Figueiredo gresso a Lei de Anistia, que foi aprovada em outubro do

67
mesmo ano. O projeto previa anistia ampla, geral e irres- § Partido dos Trabalhadores, PT: que congregava
trita para crimes políticos e conexos, e beneficiou militares representantes do movimento operário e intelectuais
envolvidos nos atos de torturas, mortes e desaparecimen- de esquerda, cuja liderança coube a Luís Inácio Lula
tos. A lei não incluía pessoas envolvidas em ações consi- da Silva.
deradas terroristas pelo Estado e não apresentava solução
Em 1980, foram restauradas eleições diretas para gover-
para o problema dos prisioneiros políticos desaparecidos,
nadores dos Estados e extinto o cargo de senador biônico.
o que suscitou críticas de vários setores da sociedade civil,
particularmente dos movimentos sociais e da imprensa.
Todavia, o projeto beneficiou milhares de brasileiros, com a
libertação de presos políticos e a permissão para os exila-
dos voltarem para o país, que recebeu efusivamente perso-
nalidades políticas como Leonel Brizola, Luís Carlos Prestes
e Miguel Arraes.

multimídia: música
Fonte: Youtube
Vai passar – Chico Buarque

Cartaz em favor da aprovação da Lei de Anistia ampla, geral e irrestrita. 2.2. A reação da “linha dura”
A anistia fortalecia a oposição ao governo, enquanto en- A abertura política revoltava os setores conservadores ra-
fraquecia mais ainda a Arena. A situação preocupava o go- dicais do Exército ligados à “linha dura”, que decidiram
verno e seus aliados, que não pretendiam perder o controle reagir por meio da violência, realizando sequestros de mi-
da situação e perceberam que o bipartidarismo favorecia a litares de esquerda, torturas e assassinatos, além de aten-
polarização. Diante da crise econômica que atingia o Brasil, tados a bomba contra bancas de revistas que vendiam pu-
a oposição unida levaria grande vantagem nas eleições. blicações de esquerda ou de oposição ao Regime Militar e
contra cerimônias ou atos públicos de partidos e entidades
Com o intuito de dividir a oposição, enfraquecendo-a, o pre-
de oposição.
sidente Figueiredo enviou ao Congresso uma proposta de
Emenda Constitucional, aprovada em novembro de 1979, Foram praticados atentados na quadra da Escola de Sam-
que extinguia o bipartidarismo e implantava o pluripartida- ba Salgueiro, no Rio de Janeiro, no início de 1980, onde
rismo no Brasil. Conforme o previsto pelo governo, a Arena seria realizado um comício do PMDB, e no auditório da
manteve-se coesa, mudando o nome para Partido Democrá- Confederação Nacional da Agricultura, em Brasília, onde o
tico Social, PDS, enquanto o MDB- Movimento Democrático dirigente comunista Gregório Bezerra fazia uma palestra.
Brasileiro fragmentou-se, dividindo a oposição, com a forma- Também foram praticados atentados na sede do jornal oposi-
ção dos seguintes partidos: cionista A Hora do Povo, na sede do Sindicato dos Jornalistas
§ Partido do Movimento Democrático Brasileiro, de Minas Gerais, e no prédio da OAB, no Rio de Janeiro. Além
PMDB: liderado por Ulysses Guimarães e que contou desses, alcançou grande repercussão o atentado no Centro
com a maioria dos ex-membros do MDB; de Convenções do Rio de Janeiro, o Riocentro.
§ Partido Popular, PP: fundado por Tancredo Neves e O atentado ocorreu durante um show que comemorava o
que teve curta duração, com a maioria de seus inte- Dia do Trabalho, em primeiro de maio de 1981, promovido
grantes ingressando posteriormente no PMDB; pelo Centro Brasil Democrático. Em pleno estacionamen-
to do prédio, explodiu uma bomba em um automóvel que
§ Partido Trabalhista Brasileiro, PTB: comandado
conduzia dois militares, matando o sargento do Exército
por Ivete Vargas, sobrinha de Getúlio Vargas;
Guilherme Pereira do Rosário e ferindo o capitão Wilson
§ Partido Democrático Trabalhista, PDT: fundado Luís Chaves Machado. As investigações da imprensa pa-
por Leonel Brizola; reciam revelar que os dois foram vítimas de um “acidente

68
de trabalho”, quando, na realidade, se preparavam para deputados federais do que Sul e Sudeste), tinha ampla
executar um atentado terrorista de extrema direita. No en- maioria do PDS (partido aliado do governo). Assim, a única
tanto, o laudo oficial das investigações concluiu que am- maneira de a Ditadura não fazer o sucessor seria alterar
bos foram “vítimas”. O caso foi considerado escandaloso a Constituição e realizar eleições diretas para presidente.
e ligou-se, certamente, ao pedido de demissão do general
Com o intuito de pressionar o Congresso a reformular a
Golbery do Couto e Silva, ministro de Figueiredo, conside-
Constituição, o PT lançou a ideia, logo incorporada pelo
rado o grande ideólogo do Regime Militar.
PMDB e outros partidos de oposição, de associados a en-
tidades da sociedade civil, sindicatos e estudantes orga-
nizarem grandes comícios e manifestações nas principais
cidades brasileiras, especialmente em São Paulo e no Rio
de Janeiro. A campanha das “Diretas Já!” usava o slogan
“Eu quero votar para presidente” e mobilizou a população
brasileira, que, empolgada, saía às ruas defendendo a ime-
diata redemocratização do país.
A campanha das “Diretas já!” adotou o amarelo como cor
símbolo do apoio ao movimento. Ela conseguia o apoio da
classe artística, intelectuais, e alguns atletas. Nesse contex-
Militar que pretendia cometer um atentado a bomba, no
Riocentro, morreu com a explosão do artefato, em 1981. to, merece destaque o movimento nascido no Corinthians
entre 1982-83, denominado “democracia corintiana”. Li-
derada por Sócrates, os jogadores do Corinthians usavam a
sua popularidade e a do clube para realizarem propaganda
pela volta da democracia.

multimídia: livros
Diretas Já: 15 meses que abalaram a ditadura –
Domingos Leonelli; Dante Oliveira
”Dante e Leonelli mostram que política tam- 1984 – Diretas Já!: na Praça da Sé, 200 mil pessoas
bém se faz assim: dando a quem não viu a gritavam: “Queremos eleger o presidente do Brasil!”

oportunidade de saber; e a quem viveu a


chance de reorganizar na cabeça o passado,
enxergar melhor o presente e tentar construir
um futuro firme para a democracia brasilei-
ra.” (Dora Kramer)

2.3. A campanha das Diretas Já!


A escolha do sucessor do presidente Figueiredo estava pre-
vista para novembro de 1984 e, de acordo com as regras
Ulysses Guimarães, um dos ícones da campanha Diretas
eleitorais vigentes, o novo presidente da República deveria Já!, ao lado da esposa, D. Mora Guimarães.
ser escolhido de maneira indireta, pelo Colégio Eleitoral
(composto pelo Congresso Nacional e seis deputados es- O clima nacional levou o deputado federal Dante de Oliveira
taduais, todos do partido que tinha maioria naquele Esta- (PMDB-MT) a propor uma Emenda Constitucional que resta-
do). Mas esse Colégio Eleitoral, também pelas regras da belecia as eleições diretas para presidente da República.
Ditadura (senadores biônicos, Norte e Nordeste tendo, pro- A emenda foi votada no dia 25 de abril de 1984 e, para
porcionalmente em relação ao número de eleitores, mais a frustração da população nacional, não foi aprovada, pois

69
necessitava de dois terços de votos favoráveis (320), rece- abril de 1985. Sarney foi então efetivado no cargo de presiden-
bendo apenas 298 votos. O problema na verdade foram te da República por meio de uma manobra na Constituição.
as abstenções, pois muitos deputados contrários a emenda
não foram votar contra, já que ficariam marcados pelo povo,
preferindo não comparecerem na sessão e não dando quo-
rum à votação. Após o acontecimento, os movimentos de rua
ganharam, assim, cada vez mais força e representatividade.

2.4. A sucessão de Figueiredo


Com a não aprovação da Emenda Dante de Oliveira e a
manutenção da eleição indireta para presidente da Repú-
blica, a oposição passou a se mobilizar para tentar derro-
tar o governo no Colégio Eleitoral, ou como dizia Ulysses
Guimarães, “vamos matar a cobra no seu próprio ninho”.
O PMDB lançou o nome de Tancredo Neves, e o PDS, que
tinha maioria no Congresso, acabou enfraquecido por uma
divergência interna entre Mario Andreazza, Paulo Maluf e Manchete do Jornal do Brasil, de 21 de abril de
Aureliano Chaves, que disputavam a indicação do partido 1985, anuncia a morte de Tancredo Neves.
para concorrer ao cargo. Chaves desistiu de concorrer e a
maioria do partido optou por lançar a candidatura de Ma-
luf, o que desagradou os “caciques” do PDS, como Antônio 3. Regimes militares
Carlos Magalhães, Marco Maciel e Aureliano Chaves, que
formaram uma dissidência: a Frente Liberal. O presidente
na América latina
do PDS, José Sarney, também não aceitou a candidatura
de Maluf e se retirou do partido pouco antes das eleições,
ingressando no PMDB e participando da chapa encabeça-
da por Tancredo como candidato a vice-presidente, conse-
guindo em troca, o apoio da Frente Liberal a Tancredo.

O ditador argentino Jorge Rafael Videla


discursa para as Forças Armadas.

3.1. Introdução
As Ditaduras na América Latina se estabeleceram no
José Sarney e Tancredo Neves período em que a ordem internacional sofria pelos en-
frentamentos da Guerra Fria. Na época, os Estados Unidos
As eleições ocorreram no dia 15 de janeiro de 1985 e fo- desenvolveram uma série de mecanismos de combate ao
ram vencidas por Tancredo Neves, que deveria tomar pos- expansionismo comunista. Já nos anos 1950, fora estabe-
se no dia 15 de março. Todavia, na véspera da posse, o lecida pelas autoridades do país a Doutrina de Segurança
presidente eleito sofreu um mal-estar e foi internado no Nacional, cujas diretrizes procuravam combater o “perigo
Hospital de Base de Brasília, sendo, posteriormente, trans- vermelho” dentro e fora do território estadunidense.
ferido para o Instituto do Coração, em São Paulo. No dia Nesse contexto e, notadamente, a partir da Revolução
15 de março, o vice-presidente José Sarney tomou posse, Cubana (1959) e da ascensão do governo comunista de
assumindo interinamente o cargo de presidente. Fidel Castro (1961), os EUA intensificaram a vigilância
Tancredo Neves foi submetido a várias cirurgias, mas não re- sobre a América Latina. Tal preocupação originou, por
sistiu. Seu falecimento foi oficialmente anunciado no dia 21 de exemplo, a Aliança para o Progresso, programa instituído

70
por Washington em conjunto com diversas lideranças la- mais radicais. Depois de sua deposição em 1955, Perón
tino-americanas, através do qual se buscava melhorar os exilara-se na Espanha, e o peronismo “sem Perón” ganhou
índices socioeconômicos da região, e ao mesmo tempo, características próprias. Foram formados grupos alinhados
frear o crescimento das alternativas socialistas. com projetos revolucionários, os quais partiram para ações
armadas. Dentre eles, destacam-se os chamados Monto-
No entanto, a despeito de tais esforços, grupos de esquerda
neros, que constituíram uma estrutura de guerrilha que os
e simpatizantes da causa comunista floresceram em diversas
militares se esforçaram em destruir.
nações do continente. Frente a isso e geralmente com auxílio
estadunidense, forças conservadoras se mobilizaram nessas No início dos anos 1970, porém, a Argentina atravessava
regiões e, atendendo às demandas das classes dominantes e uma fase de democratização. Com o fim do governo do
de setores da sociedade civil, apoiaram a instituição de Go- general Juan Carlos Onganía (1966-1970) os militares vol-
vernos Militares. Através de Golpes de Estado sucessivos, a taram aos quartéis, permitindo o retorno de Juan Domingo
América Latina assistiu, nos anos 1960 e 1970, à ascensão Perón, exilado desde 1955.
de várias Ditaduras Militares.
Perón voltou, em 1973, para se eleger novamente presi-
Centros de inteligência militar formados nessa época, dente da Argentina. Em seu governo, deu sinais de suas
em diferentes países, passaram a definir os contornos da inclinações conservadoras, condenando os movimentos
chamada Doutrina de Segurança Nacional, voltada para radicais que falavam em seu nome. Doente, faleceu em
um novo tipo de inimigo – o inimigo interno, infiltrado na primeiro de julho de 1974, ficando a Presidência nas mãos
sociedade e divulgador de “ideias subversivas”. Diante de sua viúva e vice, María Estela Martínez de Perón, mais
desse quadro, era necessário que as forças armadas re- conhecida como Isabelita.
definissem suas estratégias de atuação, ampliando-a para
as áreas da política, da economia, da cultura e da ideolo-
gia. A “defesa nacional” começava a se confundir com a
“política de Estado”.

Isabelita e Perón

As divergências no interior do peronismo e a crise


econômica mantinham a situação interna tensa e instiga-
vam os militares a voltar à política. O governo dava sinais
multimídia: vídeo de fraqueza em meio às pressões exercidas por forças con-
servadoras, como as Forças Armadas, a Igreja e as asso-
Fonte: Youtube ciações empresariais. Setores da alta burguesia argentina
se aproximaram dos quartéis e, em 1975, já se aventava
Condor
a hipótese de um Golpe. Em março de 1976, os militares
Condor foi o nome dado à cooperação entre derrubaram a presidente. A justificativa para o Golpe era
Governos Militares sul-americanos que resultou reprimir os movimentos guerrilheiros, proteger o país da
no sequestro e assassinato de milhares de pes- “ameaça comunista”, superar a desordem administrativa
soas e no exílio de tantas outras. Uma análise e a impotência das forças políticas dominantes para obter
contemporânea destes eventos, trazendo uma uma saída institucional para a crise.
história de terrorismo de Estado, mas também
Ao longo dos sete anos em que os militares dirigiram a
de pessoas e da procura pela verdade e justiça.
Argentina – generais Jorge Rafael Videla (1976-1981), Ro-
berto Marcelo Viola (1981) e Leopoldo Fortunato Galtieri
(1981-1982) –, nenhum projeto nacional foi desenvolvido e
3.2. Argentina o país não foi efetivamente reorganizado. Os investimentos
Desde o final dos anos 1950, os peronistas se aproxima- estrangeiros deixaram o país, tendo início um processo de
vam dos grupos de esquerda, adotando posições políticas decadência econômica acelerada. A debilidade do projeto

71
nacional foi compensada pela truculência da repressão. Os O protagonismo na oposição ao Regime Militar argentino
militares armaram um enorme aparato repressivo que rapi- coube à Associação das Mães da Praça de Maio, que fez do
damente escapou ao controle do Estado, fragmentou-se e drama pessoal de seus filhos desaparecidos uma bandeira
passou a servir a interesses de grupos específicos ou priva- pela redemocratização do país. Ao caminharem juntas pela
dos. Aos poucos, as organizações de esquerda foram sendo Praça de Maio, no centro de Buenos Aires, com o lenço bran-
desmanteladas. Os militantes que não estavam desapareci- co, que se tornou o símbolo de sua ação, as Mães pressiona-
dos ou exilados isolaram-se no silêncio. Foi a Ditadura mais ram a Ditadura a reconhecer os crimes de assassinato, do que
violenta da América Latina, com estimativa de 30 mil civis mais tarde descobriu tratar-se de milhares de pessoas.
mortos na chamada “guerra suja”.
Assim como no Brasil, os militares tentaram usar o fute-
bol como propaganda para o Regime Militar. Aproveitando
que a copa do mundo seria disputada na Argentina em
1978, a vitória no torneio era uma questão de honra para
os militares. A seleção Argentina foi campeã do torneio,
vencendo a Holanda na final. Contudo, a “estranha” go-
leada Argentina sobre o Peru na fase anterior, a qual eli-
minou o Brasil, entrou para a história como um momento As Mães da Praça de Maio reivindicam o paradeiro de seus filhos.
suspeito de acordo entre os governos do Peru e Argentina.

3.3. Desastres econômicos


da Ditadura argentina
§ Em sete anos de Ditadura, a dívida externa subiu de
US$ 8 bilhões para US$ 45 bilhões.
§ A inflação do governo civil derrubado pela Ditadura, que
era considerada um índice “absurdamente alto” pelos
Cerimônia de abertura da Copa do Mundo de militares, havia sido de 182% anual. Mas esse índice foi
Futebol de 1978 na Argentina. superado pela política econômica caótica da Ditadura,
que encerrou sua administração com 343% anual.
§ A pobreza disparou de 5% da população argentina
para 28%.
§ A participação da indústria no PIB caiu de 37,5% para
25%, o que equivaleu a um retrocesso aos níveis dos
anos 1960.
§ Ao mesmo tempo em que tomavam medidas neolibe-
rais, como a abertura irrestrita das importações, os mi-
litares continuavam mantendo imensas estruturas nas
multimídia: vídeo empresas estatais, que se transformaram em cabides
de emprego de generais, coronéis e seus parentes.
Fonte: Youtube
§ Os militares também estatizaram US$ 15 bilhões de
Kóblic
dívidas das principais empresas privadas do país (além
Na Argentina, durante o período da Ditadura das filiais argentinas de empresas estrangeiras).
Militar da década de 1970, Kóblic (Ricardo
§ No meio desse caos econômico, os militares provoca-
Darín), um ex-capitão das Forças Armadas, é
ram um déficit fiscal de 15% do PIB.
responsável por coordenar as operações aére-
as conhecidas como os “voos da morte”, em § A repressão provocou um êxodo de centenas de milha-
que elementos considerados subversivos eram res de profissionais do país. Os militares, em cargos bu-
arremessados de dentro dos aviões diretamen- rocráticos, exacerbaram a corrupção na máquina estatal.
te ao encontro do mar. § Em 1982, perante uma crise social, perda de susten-
tabilidade política e problemas econômicos, o então

72
ditador Leopoldo Fortunato Galtieri – famoso por seu A crise das Malvinas teve grandes consequências aos paí-
intenso approach ao scotch – decidiu invadir as ilhas ses beligerantes. Na Argentina, a humilhante derrota pre-
Malvinas para distrair a atenção da população. Resul- cipitou a queda da Ditadura Militar. Em outubro de 1983,
tado: após um breve período de combate, os oficiais do o país teve eleições democráticas para presidente e para o
ditador renderam-se às tropas britânicas. Legislativo. No Reino Unido, a vitória aumentou a popula-
(Disponível em: internacional.estadao.com.br>. Acesso em: 16 ago. 2015). ridade do Partido Conservador e de Margaret Thatcher, que
foi reeleita primeira-ministra. As relações entre a Argentina
3.4. A Guerra das Malvinas (1982) e o Reino Unido foram reatadas em 1989. Durante o con-
flito, morreram 649 argentinos e 255 britânicos. Cerca de
Em 1982, a Ditadura argentina – então comandada pelo 270 veteranos argentinos suicidaram-se após a guerra. O
general Leopoldo Galtieri – via-se pressionada pelos pro- governo argentino ainda reivindica a soberania das ilhas.
blemas sociais e econômicos que punham a população
contra o governo. Dessa maneira, seu objetivo era a for- 3.5. A redemocratização
mulação de um plano capaz de recuperar a imagem do
governo por meio da guerra.
Em 2 de abril de 1982, tropas argentinas desembarcaram
nas Ilhas Malvinas, localizadas no extremo Sul do conti-
nente americano e objeto de disputa entre Argentina e
Grã-Bretanha desde o século XVIII. O território tornou-se
domínio colonial britânico na década de 1830, fato que
nunca foi plenamente aceito pela Argentina.
Algumas semanas após a invasão, os britânicos retomaram
uma ilha nas proximidades do arquipélago e começaram a Raúl Alfonsín
receber armamentos da Organização do Tratado do Atlânti-
co Norte (Otan). Os argentinos, por sua vez, mobilizaram sua Enquanto Margaret Thatcher colhia os louros políticos da
Força Aérea e buscaram interceptar unidades britânicas. No vitória na Guerra das Malvinas entre o eleitorado britânico,
dia 2 de maio, os argentinos sofreram uma de suas maio- o Governo Militar argentino selava seu colapso. A renúncia
res baixas ao perder o cruzador Belgrano, afundado por um do general Galtieri foi acompanhada do início do processo
moderno submarino britânico. A destruição do cruzador tri- de redemocratização da Argentina. Ganhou destaque, nes-
pulado por mil homens matou 320 argentinos. Dois dias de- se contexto, a figura de Raúl Alfonsín, que congregava em
pois, os argentinos afundaram o destróier britânico Sheffield, um movimento de renovação do Partido União Cívica Radi-
matando 20 soldados. Nas semanas seguintes, os argenti- cal, lideranças ligadas ao meios universitários e intelectuais
nos conseguiram destruir mais embarcações britânicas. Os e aos grupos defensores dos direitos humanos.
britânicos não desistiram e, em 21 de maio, desembarcaram Alfonsín venceu as eleições, em outubro de 1983, e as-
na costa Norte do arquipélago. Com forças terrestres despre- sumiu o desafio de redemocratizar o país e recuperar sua
paradas e mal equipadas, os argentinos foram rapidamente combalida economia.
derrotados pelos britânicos, que retomaram a capital das
Malvinas, Stanley. No dia 14 de junho, a Argentina anunciou
sua rendição e abandonou definitivamente a área.
3.6. Chile
3.6.1. O governo Salvador Allende (1970–1973)

Militares argentinos rendem-se às tropas britânicas,


pondo fim à Guerra das Malvinas. Salvador Allende

73
bro de 1973, o general Augusto Pinochet, comandante
em chefe do Exército, ordenou o bombardeio do Palácio
La Moneda, onde Salvador Allende procurou resistir com
uma arma em punho, presenteada por Fidel Castro, e com
a qual se suicidou em seguida.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Chove sobre Santiago


Palácio Presidencial La Moneda, bombardeado
O filme retrata a preparação e o momento do durante o golpe militar no Chile.

Golpe, quando o governo de Salvador Allende,


estando totalmente isolado na área militar,
é derrubado. Allende é vitorioso nas eleições 3.6.2. O governo Pinochet (1973–1990)
presidenciais em 1970 e a Unidade Popular
assume o governo, mas não o poder, pois o
aparelho de Estado − a organização burocráti-
co-militar − mantém-se intacta.

Em 1970, Salvador Allende, ex-líder estudantil, médico,


ex-deputado, senador e ex-ministro da Saúde, elegeu-se
presidente como candidato da chamada Unidade Popu-
lar – uma coalizão de partidos de esquerda liderada pelo
Partido Socialista. Allende recebeu 36,2% dos votos con-
tra 34,9% de Jorge Alessandri, político conservador que já
fora presidente entre 1952 e 1958.
O governo da Unidade Popular passou a cumprir as
promessas de campanha estabelecidas no programa
“Via chilena ao socialismo”, ou seja, a transição para
o socialismo nos marcos da legalidade democrática.
Augusto Pinochet
Nacionalizou, sem indenização, as explorações de cobre
e mais 200 empresas estrangeiras, estatizou os bancos
O Golpe Militar pôs fim à longa tradição democrática do
privados e o comércio exterior, deu continuidade à re-
Chile e deu início a uma das mais brutais Ditaduras Mmi-
forma agrária iniciada pelo governo democrata-cristão
litares latino-americanas. A repressão atingiu os diversos
anterior de Eduardo Frei e criou um setor social da eco-
setores da sociedade e foi especialmente dura na área
nomia controlado pelos próprios trabalhadores através
sindical e entre os artistas e intelectuais. Os partidos polí-
de suas entidades. Todas essas medidas foram tomadas
ticos foram dissolvidos, todos os suspeitos de ligação com
sob o respeito das leis existentes e mantidas as liberda-
a esquerda foram perseguidos. Nos primeiros dias após o
des democráticas. bombardeio do Palácio La Moneda, milhares de pessoas
Os setores sociais prejudicados com as reformas – demo- foram levadas ao Estádio Nacional, em Santiago, submeti-
cratas-cristãos de direita, latifundiários, classe média e For- das a interrogatórios, surras e toda sorte de arbitrariedade.
ças Armadas – articularam um plano de desestabilização Cerca de mil detidos foram sumariamente executados. Os
do governo, respaldados decisivamente pelo Pentágono direitos civis foram suspensos e a população deveria obe-
(organismo que comanda a defesa dos Estados Unidos), decer ao toque de recolher, enquanto casas eram invadidas
pela CIA (serviço de informações dos Estados Unidos) e e suspeitos de contrariar a nova ordem, levados na calada
por poderosas empresas estadunidenses. Em 11 de setem- da noite, muitas vezes para nunca mais voltar. Muitos depoi-

74
mentos posteriores afirmaram que a tortura foi largamente
empregada pelo novo governo contra prisioneiros e adver-
sários políticos.

multimídia: livros
O Estádio Nacional de Chile usado como campo de
concentração durante a ditadura dePinochet, em 1973.
A ditadura acabada – Elio Gaspari
A mais aclamada obra sobre o Regime Militar
Do ponto de vista econômico, o governo Pinochet foi no Brasil chega à conclusão com o livro A di-
marcado pela adoção de medidas de caráter neoliberal: tadura acabada. No quinto volume da Coleção
desnacionalização de empresas e de atividades produti- Ditadura, o jornalista Elio Gaspari examina com
vas. Foram privatizados os setores estatizados durante o riqueza de detalhes o período de 1978 a 1985,
governo de Allende e ampliou-se o ingresso de capital es- desde o final do governo do presidente Ernesto
trangeiro no país por meio da abertura da economia para Geisel e a posse de seu sucessor, o general João
empresas multinacionais. A redução dos gastos sociais au- Baptista Figueiredo, até a eleição de Tancredo
mentou o abismo entre ricos e pobres, fazendo do Chile Neves pelo Colégio Eleitoral. São os anos da
um dos países com pior desigualdade social e de renda no abertura política, momento decisivo na histó-
mundo. De 1970 a 1987, a proporção da população chile- ria de nosso país e repleto de acontecimentos,
na abaixo da linha de pobreza saltou de 20% para 44,4%. como o fim do AI-5, as manifestações políticas
pela anistia e pela volta das eleições diretas para
a presidência, os atentados promovidos por
aqueles que se opunham à redemocratização,
como o episódio da bomba no Riocentro, em
1981, e uma crise econômica sem precedentes.

3.7. O fim da Ditadura chilena


A violenta e antidemocrática forma de governar de Augusto
Pinochet começou, no final dos anos 1980, a gerar pressões
contrárias de países e instituições internacionais. Essa ima-
gem negativa do governo chileno no exterior resultou no
multimídia: vídeo isolamento internacional do país. Vários países romperam re-
Fonte: Youtube lações diplomáticas com o Chile, em sinal de protesto contra
seu governo truculento.
A batalha do Chile
Internamente, grande parte do povo chileno não aguen-
Considerado um dos melhores e mais comple- tava mais o governo Pinochet e a Ditadura Militar. A eco-
tos documentários latino-americanos, é resulta- nomia do país enfrentava problemas e as desigualdades
do de seis anos de trabalho do cineasta Patrício sociais só haviam aumentado durante o Regime Militar.
Guzmán. Dividido em três partes (A insurreição
da burguesia, O golpe militar e O poder popu- Em 1988, o Chile passou por um plebiscito nacional, pre-
lar), o filme cobre um dos períodos mais turbu- visto pela Constituição, em que a população deveria esco-
lentos da história do Chile, a partir dos esforços lher pelo Sim (permanência de Pinochet no poder) ou Não
do presidente Salvador Allende em implantar (convocações de eleições para o ano seguinte). Grande
um Regime socialista (valendo-se da estrutura parte do povo votou pelo fim do Regime Militar.
democrática) até as brutais consequências do Em 1989, o Chile passou por eleições diretas e Patricio
Golpe de Estado que, em 1974, instaurou a Di- Aylwin foi eleito presidente pela Coalização de Partidos
tadura do general Augusto Pinochet. pela Democracia. A Ditadura chilena encerrou em 11 de
março de 1990, com a posse do novo presidente civil.

75
No caso do Paraguai, a história longeva da Ditadura re-
monta a 1954, quando o general Alfredo Stroessner li-
derou um Golpe de Estado contra o presidente Federico
Chaves, líder do Partido Colorado, constitucionalmente
eleito em 1950.
Ao longo de 35 anos, Stroessner elegeu-se para sete man-
datos consecutivos, como candidato do Partido Colorado.
Expurgou do partido seus integrantes moderados e incen-
tivou a filiação de profissionais dependentes de oportuni-
dades nos serviços públicos.
multimídia: música A partir dos anos de 1980, a Ditadura Militar de Stroessner
Fonte: Youtube começou a perder força, motivada pela desaceleração eco-
Geração Coca-Cola – Legião Urbana nômica. Um novo Golpe de Estado foi planejado por alguns
setores do Partido Colorado. Nos dias 2 e 3 de fevereiro de
1989, foi destituído o ditador da presidência paraguaia. Stro-
3.8. Outros Regimes Militares essner faleceu em 2006, exilado no Brasil, aos 93 anos.
latino-americanos
3.8.1. Uruguai
A instauração de um regime autoritário no Uruguai deu-se
a partir da presidência de Juan Maria Bordaberry (1972-
1976), do Partido Colorado. Em 1973, sob crescente pres-
são dos militares, o governo dissolveu o Parlamento e os
partidos políticos e suspendeu as liberdades civis. Por de-
sentendimentos com a alta cúpula do Exército, Bordaberry multimídia: livros
foi destituído do cargo em 1976, mas, apesar da fachada
parcialmente civil, as Forças Armadas mantiveram o co- Na vertigem do dia – Ferreira Gullar
mando político da nação até 1985. O ritmo frenético da metrópole e a entrada
de Ferreira Gullar na maturidade. Na vertigem
3.8.2. Paraguai do dia foi publicado originalmente em 1980.
Trata-se do livro seguinte ao célebre Poema
sujo, lançado em 1976. O título é coerente
com a trajetória de um poeta para quem a
poesia nasce do espanto. A vertigem está no
atropelo das coisas, dos ritmos metropolita-
nos, dos fatos incontroláveis, da memória,
dos valores em combate dentro do sujeito.

3.9. Operação Condor


A Operação Condor foi uma aliança estabelecida formal-
mente, em 1975, entre as Ditaduras Militares da América
Latina. O acordo consistiu no apoio político-militar entre os
governos da região, com o objetivo de investigar, informar
e combater os focos de “subversão”. Na prática, a aliança
apagou as fronteiras nacionais entre seus signatários para
a repressão aos adversários políticos.
O nome do acordo era uma alusão ao condor, ave tí-
Alfredo Stroessner pica dos Andes e símbolo do Chile. Trata-se de uma ave

76
extremamente sagaz na caça às suas presas. Nada mais
simbólico do que batizar a aliança entre as Ditaduras de
Operação Condor. Não à toa, foi justamente o Chile, sob os
auspícios do governo de Augusto Pinochet, que assumiu a
dianteira da operação.
Além do Chile, fizeram parte da aliança: Argentina, Bo-
lívia, Brasil, Paraguai e Uruguai. Nos anos 1980, o Peru,
então sob uma Ditadura Militar, também se juntou ao
grupo. Pode-se dizer que a operação teve três fases. A
primeira consistiu na troca de informações entre os pa-
íses-membros. A segunda caracterizou-se pelas trocas e multimídia: sites
execuções de opositores nos territórios dos países que
formavam a aliança. A terceira ficou marcada pela per- www.todamateria.com.br/diretas-ja/
seguição e assassinato de inimigos políticos no exterior
– muitas vezes, no próprio exílio.
Calcula-se que, apenas nos anos 1970, o número de mor-
tos e “desaparecidos” políticos tenha chegado a aproxi-
madamente 290 no Uruguai, 360 no Brasil, dois mil no
Paraguai, 3,1 mil no Chile e impressionantes 30 mil na
Argentina – a Ditadura latino-americana que mais vítimas
deixou em seu caminho. Estimativas menos conservadoras
dão conta de que a Operação Condor teria chegado ao
saldo total de 50 mil mortos, 30 mil desaparecidos e 400
mil presos. multimídia: livros
Brasil nunca mais – Paulo Evaristo Arns
Um grupo de especialistas dedicou-se du-
rante oito anos a reunir cópias de mais de
700 processos políticos que tramitaram pela
Justiça Militar, entre abril de 1964 e março
de 1979. O resumo desta pesquisa está neste
livro. Um relato doloroso da repressão e tor-
tura que se abateram sobre o Brasil.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Democracia em preto e branco


Durante o ano de 1982, a Ditadura Militar com-
pletava 18 anos. A música popular brasileira
sobrevivia de metáforas, devido à grande opres-
são e censura, e o clube de futebol Corinthians
passava por um período interno turbulento. No
meio disso, o rock nacional começava a nascer.
O filme mostra como a música, o esporte e a
política se encontraram para mudar o rumo da
história do país.

77
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Em 1984, seria votada a proposta de Emenda Constitucional Dante de Oliveira, a qual propunha a mudança do
modo de eleição do presidente da República que assumiria em 1985. Tal proposta pedia a mudança do sistema de
escolha pelo Colégio Eleitoral para votação direta popular, mas não foi aprovada na votação ocorrida em 25 de abril
de 1984, pois não alcançou os dois terços de votos de deputados necessários.
Contudo, vale a lembrança de que essa emenda só foi proposta devido a um desejo popular de reestabelecer a de-
mocracia no país e que a população havia iniciado mobilizações nas ruas das grandes cidades pedindo o direito ao
voto, o fim do Governo Militar e muitas outras mudanças. As manifestações iniciadas ainda em fins de 1982 (após a
volta das eleições diretas para governador) e que ganharam força entre 1983-84, ficaram conhecidas como a cam-
panha pelas “Diretas Já!”. Tal momento é especial devido ao retorno do povo às ruas e à retomada da consciência
da necessidade de a população lutar pelos seus direitos políticos e sociais.

Comício na Praça da Sé (1984) a favor das Diretas Já! reuniu mais de 300 mil pessoas

Durante a Ditadura Militar no Brasil, os países vizinhos sul-americanos também atravessavam momentos de gover-
nos autoritários. Nessa época, para acabar com a constante migração para países vizinhos de pessoas procuradas
pelos regimes autoritários, foi criada, em 1975, a Operação Condor, acordo entre os governos do Chile, Brasil, Argen-
tina, Uruguai, Paraguai, Bolívia e Peru, em que esses governos e suas agências responsáveis pelas investigações e
prisões de opositores políticos trocavam informações e até mesmo prisioneiros.
Numa última fase de operações, os governos aceitavam até mesmo a execução de seus perseguidos políticos por
agentes dos governos vizinhos. Estima-se que, ao fim das suas atividades, a Operação Condor possa ter sido respon-
sável por entre 30 e 50 mil assassinatos.

Charge alusiva à Operação Condor. A ave que nomeia a operação é um símbolo do Chile.

78
ÁREAS DE CONHECIMENTO DO ENEM

Habilidade
Analisar a ação dos Estados nacionais, no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de
8 problemas de ordem econômico-social.

A habilidade 8 contém um aspecto amplo, embora seja-nos útil a partir de um aspecto específico: analisar a ação
dos Estados nacionais no enfrentamento de problemas de ordem social. Como a Ciência Política nos ensina, um
Estado nacional é a realização institucional da dominação, que pode ser vista em aspectos ideológicos ou físicos.
Significa dizer que necessariamente o Estado é a instituição com legitimidade de impor sanções físicas e a violên-
cia sobre seus súditos.
No caso da questão a seguir, há uma exemplificação do que foi dito acima, mas estendida a uma aliança entre
países da América Latina, que, durante as décadas de 1960 e 1980, viviam sob a mesma preocupação social e
política: combater todos os movimentos dissidentes às Ditaduras, mormente aqueles com ideologia de esquerda,
isto é, nacionalistas, socialistas, comunistas e anarquistas.

Modelo
(Enem) A Operação Condor está diretamente vinculada às experiências históricas das ditaduras civil-militares que se
disseminaram pelo Cone Sul entre as décadas de 1960 e 1980. Depois do Brasil (e do Paraguai de Stroessner), foi a
vez da Argentina (1966), Bolívia (1966 e 1971), Uruguai e Chile (1973) e Argentina (novamente, em 1976). Em todos
os casos se instalaram ditaduras civil-militares (em menor ou maior medida) com base na Doutrina de Segurança
Nacional e tendo como principais características um anticomunismo militante, a identificação do inimigo interno, a
imposição do papel político das Forças Armadas e a definição de fronteiras ideológicas.
PADRÓS, E.S. et al. Ditadura de Segurança Nacional no Rio Grande do Sul
(1964-1985): história e memória. Porto Alegre: Corag, 2009 (adaptado).

Levando-se em conta o contexto em que foi criada, a referida operação tinha como objetivo coordenar a:
a) modificação de limites territoriais.
b) sobrevivência de oficiais exilados.
c) interferência de potências mundiais.
d) repressão de ativistas oposicionistas.
e) implantação de governos nacionalistas.

Análise expositiva - Habilidade 8: A Operação Condor foi criada em conjunto pelos órgãos de segurança dos
D países que compunham o chamado Cone Sul, com o objetivo de investigar, vigiar e punir qualquer atividade de
oposição aos Governos Militares.
Alternativa D

79
DIAGRAMA DE IDEIAS

DITADURA MILITAR: GOVERNO


FIGUEIREDO (1979-1985)

A CARACTERÍSTICAS B ECONOMIA

• “CASTELISTA”
• CONTINUIDADE DA ABERTURA • DEPENDÊNCIA DO CAPITAL EXTERNO
• OPOSIÇÃO À “LINHA DURA” • DÍVIDA EXTERNA
ATENTADOS E TERRORISMO (EX.: RIOCENTRO) • INFLAÇÃO
• CRISE ECONÔMICA • FORTES GREVES NO ABC PAULISTA
• “DÉCADA PERDIDA”
• FIM DA DITADURA MILITAR

C POLÍTICA

• LEI DA ANISTIA (TAMBÉM FAVORECE TORTURADORES)


• PLURIPARTIDARISMO ARENA PDS
PFL (1985)
PMDB
PP
MDB PTB
PDT
PSDB
• 1984: CAMPANHAS “DIRETAS JÁ!”
FORÇA DOS MOVIMENTOS SOCIAIS
DERROTA DA EMENDA DANTE DE OLIVEIRA
• 1985: ELEIÇÕES INDIRETAS
VITÓRIA DA CHAPA: TANCREDO NEVES (PMDB) PRESIDENTE
JOSÉ SARNEY (EX-ARENA) VICE
• MORTE DE TANCREDO NEVES
SARNEY ASSUME

80
REGIMES MILITARES
NA AMÉRICA LATINA

A CONTEXTO B ARGENTINA

• GUERRA FRIA
PERONISMO
• REVOLUÇÃO CUBANA (1959)
• 1950: RADICALIZAÇÃO DE JUAN PERÓN
• FINANCIAMENTO DOS EUA
• 1955: DEPOSIÇÃO DE PERÓN
• DOUTRINA DE SEGURANÇA NACIONAL
GOVERNO MILITAR
ORGANIZAÇÃO DE GRUPOS GUERRILHEIROS
• 1970: REDEMOCRATIZAÇÃO
C DITADURA (1976-1982)
• 1973: VITÓRIA DE PERÓN
• FORTE REPRESSÃO DISCURSO CONSERVADOR
• DESTRUIÇÃO DA ECONOMIA ARGENTINA • 1974: MORTE DE PERÓN
• ALTA CORRUPÇÃO IZABELITA (VICE) ASSUME
• 1982: GUERRA DAS MALVINAS • 1976: GOLPE MILITAR
INGLATERRA VENCE ARGENTINA
DESPRESTÍGIO MILITAR
D CHILE
• REDEMOCRATIZAÇÃO – FORÇA DO MOVIMENTO “MÃES
DA PRAÇA DE MAIO”
GOVERNO ALLENDE (1970-1973)
• CANDIDATOS DA UNIDADE POPULAR
GOVERNO PINOCHET (FRENTE DE ESQUERDA)
E
(1973-1990) • “VIA CHILENA AO SOCIALISMO”
• ALTA REPRESSÃO DEMOCRÁTICA E PACÍFICA
• DESNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS • REFORMA AGRÁRIA
• NEOLIBERALISMO • ESTATIZAÇÃO DE EMPRESAS ESTRANGEIRAS
• AUMENTO DA DESIGUALDADE SOCIAL • GOLPE MILITAR EM 1973
• 1988 (PLEBISCITO): FIM DO GOVERNO PINOCHET
• 1989: ELEIÇÕES DIRETAS
G URUGUAI

F OUTRAS DITADURAS • (1973-1985)

PARAGUAI
• GENERAL STROESSNER (1954-1989)

H OPERAÇÃO CONDOR

• ALIANÇA POLÍTICA E MILITAR


• DITADURAS SUL-AMERICANAS
• REGIONALISMO DE REPRESSÃO
• FASE 1 – TROCA DE INFORMAÇÕES
• FASE 2 – EXECUÇÃO DE OPOSITORES
• FASE 3 – ASSASSINATOS DE INIMIGOS POLÍTICOS NO EXTERIOR

81
Nova República: governos
AULAS
49 e 50 Sarney e Collor
2, 3, 10, 11, 12, 13,
Competências: 1, 2, 3 e 5 Habilidades: 14, 15, 21, 22, 23, 24
e 25

1. Governo José Sarney sempre apoiou a Ditadura, fora senador pela Arena, presi-
dente do PDS e o principal articulador da derrota da emen-
(1985–1990) da Dante de Oliveira –, mesmo assim, José Sarney assumiu
o governo contando com um razoável crédito de confiança
por parte do público.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Conhecendo os Presidentes - Ep. 28: Tancredo
Neves e José Sarney
José Sarney

A Campanha pelas “Diretas Já!” mobilizou a sociedade


brasileira, resultando numa imensa rejeição à Ditadura e
reivindicando o restabelecimento do Estado de Direito. 1.1. Economia
Derrotada a Emenda Dante de Oliveira, graças à atuação José Sarney herdara do Regime Militar um país com sé-
das lideranças políticas e econômicas ligadas ao PDS – rios problemas econômicos, especialmente com altas taxas
que, aliás, continuam presentes no cenário político brasi- de inflação (223,8%, em 1984), crescente dívida externa,
leiro, tão fortes e influentes como antes –, alguns segui- investimentos produtivos baixos, especulação financeira,
mentos da sociedade civil, influenciados pelos meios de recessão e um Estado falido. O novo presidente tinha a di-
comunicação, passaram a apoiar claramente a candidatura fícil tarefa de superar essa situação e, durante os primeiros
de Tancredo Neves, no Colégio Eleitoral. A vitória do can- meses de 1985, nenhuma medida importante foi tomada
didato, em janeiro de 1985, alimentava alguma esperança pela equipe do ministro da Fazenda Francisco Dornelles,
de restabelecimento democrático, embora a ideia de que que havia sido indicado por Tancredo Neves.
algum golpe pudesse ser tentado pelas forças desconten- No segundo semestre do mesmo ano, em substituição a
tes em entregar o poder aos civis. Dornelles, Dílson Funaro foi nomeado para o Ministério da
Subitamente, vieram a doença e a morte de Tancredo Ne- Fazenda com a tarefa de combater os problemas econômi-
ves. Chocada e perplexa pela rapidez com que os aconteci- cos, de uma maneira mais intensa. Em fevereiro de 1986,
mentos tinham se desenrolado, a população, ainda eston- o novo ministro lançou um plano econômico: O Plano de
teada, assistiu à posse de José Sarney na Presidência da Estabilização Econômica ou Plano Inflação Zero, que visava
República. Mas a necessidade de esperança era tão grande combater a inflação e manter o crescimento econômico,
que, apesar do passado político do novo presidente – que tendo como principais disposições:

82
§ criação de uma nova moeda: o Cruzado; O consumo foi estimulado e a queda no rendimento das
aplicações financeiras, inclusive a poupança, levou as
§ congelamento de preços e salários, que foram reajus-
pessoas a retirar seu dinheiro das aplicações financeiras
tados em 8%;
e utilizá-lo na compra de mercadorias. O crescimento do
§ redução das taxas de juros; consumo não foi acompanhado pelo crescimento da oferta
§ desindexação1 da economia; e de mercadorias, pois parte das empresas não estava pre-
parada para ampliar rapidamente sua produção, enquan-
§ aumento automático dos salários, todas as vezes que a to outras viram os preços de venda defasados em relação
inflação superasse os 20% mensais. aos custos, não tendo, portanto, estímulo para aumentar a
produção. Além disso, muitas empresas sobreviveram no
mercado graças aos lucros das aplicações financeiras. Em
face da redução destes, passaram a ter dificuldades para
continuar produzindo. Havia um grande número de em-
presários que, graças à inflação, tinham lucros fabulosos e
não queriam abrir mão deles, passando então a reter mer-
cadorias e matérias-primas, provocando o ágio2 e agravan-
do os problemas do desabastecimento, que provocavam o
aumento dos preços das mercadorias em geral.

Capa da revista Veja destacando a criação do Plano Cruzado.

O plano ficou conhecido como Plano Cruzado e, em virtu-


de da estabilização dos preços, da queda da inflação e dos
juros, recebeu o apoio da população. Tabelas de preços eram
distribuídas diariamente nos jornais e os brasileiros foram
convocados a fiscalizar os preços, denunciando aumentos
irregulares como “fiscais do Sarney”, assim denominados. 31 de janeiro de 1989 – consumidores observam prateleiras vazias em
supermercado durante o Plano Verão,
o terceiro a fracassar na tentativa de controlar a inflação.

A escassez de mercadorias e o ágio provocaram a perda do


controle da situação por parte das autoridades econômicas.
Por razões políticas, o congelamento de preços foi mantido
até as eleições de novembro de 1986, quando seriam esco-
lhidos os novos governadores estaduais, conhecidos como
“estelionato eleitoral”. A vitória eleitoral do PMDB foi
https://conteudo.imguol.com.br/c/noticias/2e/2016/02/26/04031986- devastadora: somente o Estado de Sergipe não elegeu um
consumidor-exibe-bottom-com-a-frase-eu-sou-fiscal-do-sarney-
governador do partido do presidente Sarney. Logo após as
eleições, veio o descongelamento de preços e salários, fazen-
do com que a inflação subisse descontroladamente.
Daí em diante, a situação econômica brasileira deteriorou-
-se cada vez mais, chegando a atingir, no final do mandato
de Sarney, o espantoso índice de 90% ao mês, apesar da
constante troca dos ministros da Fazenda ao longo do seu
mandato. Depois de Dílson Funaro, vieram Luís Carlos Bres-
Veja mais em https://economia.uol.com.br/noticias/ ser Pereira e Maílson da Nóbrega, responsáveis, respectiva-
redacao/2016/03/14/inflacao-vovos-que-foram-fiscais-do-sarney-
voltam-a-vigiar-precos-em-minas.htm?cmpid=copiaecola mente, por mais dois choques econômicos: o Plano Bresser,
em 1987, e o Plano Verão, em 1989. Este substituía o Cru-

83
zado (CZ$) pelo Cruzado Novo (NCz$). assalariados, de modo especial aqueles que recebiam seus
salários mensalmente, cujo valor real chegava a ser cerca
de 50% inferior ao nominal. O país foi marcado por gre-
ves e manifestações contra o governo, que perdia cada vez
mais popularidade.

No Plano Verão, notas de Cz$ 1.000,00 eram carimbadas multimídia: livros


com o valor de NCz$ 1,00 (um cruzado novo).

Tancredo Neves, o príncipe civil – Plínio Fraga


A vida e o legado do político que se tornou
símbolo da redemocratização brasileira. Si-
lencioso nas articulações políticas e estron-
doso na tribuna, Tancredo Neves participou
dos momentos mais impactantes da história
brasileira: foi ministro da Justiça de Getúlio
Vargas, em 1954; primeiro-ministro da expe-
riência parlamentarista de João Goulart, em
multimídia: livros 1961; líder do governo, senador e governa-
dor de Minas Gerais. Nos 21 anos de resis-
Honoráveis bandidos: um retrato do Brasil na tência pacífica ao Regime Militar, costurou a
Era Sarney – Palmério Dória derrocada da Ditadura em 1985 aceitando
eleger-se presidente, ainda que sob regras
Palmério Dória, um dos jornalistas mais res-
não democráticas. A posse, marcada para
peitados do país, conta pela primeira vez num
15 de março, não aconteceu. Mais do que
livro, toda a história secreta do surgimento, en-
uma biografia, o livro de Plínio Fraga é uma
riquecimento e tomada do poder regional pela
grande reportagem sobre a política brasileira
família Sarney, no Maranhão, e o controle qua-
e os bastidores do poder entre as décadas de
se total, do Senado, pelo patriarca que virou
1950 e 1980.
presidente da República por acidente, transfor-
mou o Maranhão no quintal de sua casa e be-
neficiou amigos e parentes. Um livro arrasador,
na mesma linha de Memórias das trevas, que
1.2. A Assembleia Nacional
tinha o também senador Antonio Carlos Ma- Constituinte e a Constituição de 1988
galhães como personagem e vendeu mais de Em novembro de 1986, realizaram-se eleições simultane-
80 mil exemplares quando lançado. amente para governador, Assembleias Estaduais, Câmara
Federal e Senado. Favorecido pelos resultados inicialmente
do Plano Cruzado, o PMDB elegeu governadores em qua-
A crise econômica e o desemprego provocaram desconten- se todos os Estados e tornou-se majoritário no Congresso
tamento geral da população com a situação econômica do Nacional, que seria também Assembleia Constituinte; os
país. No último mês do governo Sarney, março de 1990, a deputados federais e senadores então eleitos eram encar-
inflação correspondente ao período de 15 de fevereiro a regados de elaborar a nova Constituição brasileira.
15 de março atingiu o recorde histórico de 84,32%, che- Durante a Constituinte, Sarney lutou com muito afinco para
gando ao índice acumulado de 4853,90% nos 13 meses que seu mandato fosse ampliado para cinco anos. Houve
anteriores. Os mais prejudicados foram os trabalhadores acusações de que, em troca dessa ampliação, o presidente

84
teria atribuído numerosas concessões de rádio e televisão
aos deputados constituintes.
As acusações levaram alguns parlamentares, inclusive do
PMDB, a exigir a convocação de uma Comissão Parlamentar
de Inquérito (CPI) para investigar o caso. As manobras do go-
verno impediram a CPI, o que levou vários políticos do PMDB
a romperem com o presidente Sarney, deixando o partido e
fundando uma nova sigla política, o Partido da Social De-
mocracia Brasileira (PSDB), liderados por Fernando Henrique
Cardoso, Franco Montoro, Pimenta da Veiga e Mário Covas.
Elaborada ao longo de um ano e meio, a nova Constituição
foi promulgada no dia 5 de outubro de 1988 pelo presi-
dente do Congresso Constituinte, Ulysses Guimarães. Ela Na imagem anterior, encerramento dos trabalhos da
apresentava como principais características: Constituinte de 1988. Acima, Ulysses Guimarães, presidente da
Assembleia Constituinte, exibe um exemplar da Constituição,
§ manutenção do regime republicano e do sistema pre- depois de promulgada pelo Congresso Nacional.

sidencialista;
§ mandato presidencial de quatro anos;
§ eleição direta para todos os níveis e em dois turnos,
sempre que um dos candidatos não conseguisse maio-
ria absoluta, do qual participariam os dois primeiros
candidatos, para os cargos dos Executivos federal, es-
tadual e municipal;
§ voto obrigatório para ambos os sexos entre 18 e 60
anos de idade e facultativo para pessoas de 16 e 17 multimídia: livros
anos de idade, maiores de 60, analfabetos, deficientes
físicos e indígenas; A história das constituições brasileiras: 200
§ ênfase aos poderes do Legislativo e transformação do anos de luta contra o arbítrio – Marco Antonio
Judiciário em poder verdadeiramente independente, Villa
apto inclusive a julgar e anular atos do Executivo; Neste livro, Villa oferece ao leitor uma análi-
§ consolidação dos princípios democráticos e defesa dos se de cada constituição que o país já teve e
direitos individuais e coletivos dos cidadãos; do pano de fundo que a gerou. Em sete capí-
tulos, acompanhamos os embates políticos,
§ nacionalismo econômico, reservando várias atividades
os conflitos com o governo, os costumes rei-
somente a empresas nacionais;
nantes na época. As Emendas Constitucio-
§ assistencialismo social, com a ampliação dos direitos nais ao longo período da Ditadura também
dos trabalhadores; e são examinadas. O quadro se completa com
§ ampliação da autonomia administrativa e financeira um capítulo dedicado ao Supremo Tribunal
dos Estados da federação. Federal e seu papel na República. O histo-
riador Marco Antonio Villa nos leva a um
passeio pela história, onde desfilam figuras
notórias e nem sempre tão ilustres. Fala das
revoltas, do voto feminino, da chegada de
levas de imigrantes e outros assuntos que
sempre provocavam discussões. Como bem
observa Villa, “não é exagero afirmar que
os últimos 200 anos da nossa história têm
como ponto central a luta do cidadão con-
tra o Estado arbitrário“. E, na maioria das
vezes, o Estado ganhou de goleada.

85
a eleição presidencial, a primeira eleição direta para presi-
dente da República desde 1960, quando Jânio elegeu-se
com uma votação recorde até então.
Quase todas as legendas lançaram candidaturas próprias,
mesmo as que tinham remotas chances de vitória, num
total de 21 candidatos ou 22, se incluídos nesse grupo
a tentativa de candidatura do apresentador de televisão
Sílvio Santos. Era, na prática, uma maneira de os políticos
apresentarem-se à população e tornarem-se nacionalmen-
te conhecidos.
multimídia: música Entre as candidaturas mais conhecidas estavam a de
Fonte: Youtube Ulysses Guimarães, pelo PMDB, tendo contra ele o fato
A rasteira do presidente – Bezerra da Silva de pertencer ao partido de Sarney, bastante desgastado.
Já Mario Covas candidatou-se como representante do
recém-criado PSDB, integrado por dissidentes do PMDB,
que fundaram a nova legenda. Com tendências mais
1.3. Eleições de 1989 conservadoras apresentavam-se as candidaturas de Pau-
Em 1989, os brasileiros votaram para o cargo de presiden- lo Maluf, pelo PDS (Partido Democrata Social), Aureliano
te da República após, uma longa espera de 29 anos, em Chaves, pelo PFL (Partido da Frente Liberal). Havia, ainda,
meio a um quadro político-econômico e social bastante as candidaturas de Roberto Freire, pelo PCB (Partido Co-
conturbado. munista Brasileiro) e Guilherme Afif Domingos, pelo PL
(Partido Liberal).

multimídia: vídeo
multimídia: música
Fonte: Youtube
Fonte: Youtube
Depois da chuva
Que país é este – Legião Urbana
No ano de 1984, quando a Ditadura Militar se
enfrequece, dois jovens baianos de 16 anos co-
meçam a perceber que estão vivendo uma fase Outros nomes tornaram-se conhecidos nacionalmen-
importante do país. A descoberta do contexto te naquele momento: o do médico Enéas Carneiro, que
político, com as eleições diretas para presidente, disputou eleição pelo Prona (Partido de Reedificação da
mistura-se às descobertas sexuais e ao fim da Ordem Nacional). Dispondo de pouco tempo na mídia,
adolescência. ele fazia discursos que mais pareciam palavras de ordem
ou gritos de guerra, sempre encerrando com um bordão
– “Meu nome é Enéas!”. Mais tarde, Enéas entraria para
Primeiro, o descontrole inflacionário, devido ao fracasso su- a história da política nacional ao se eleger um dos de-
cessivo de vários planos econômicos; o imobilismo do go- putados federais mais votados do país pelo Estado de
verno, que não buscou encaminhar soluções efetivas para São Paulo, “arrastando”, pelo coeficiente eleitoral, outros
questões essenciais e que afligia a população há décadas, candidatos de votação inexpressiva de seu partido para o
tais como emprego, alimentação, saúde, educação, habi- Congresso Nacional, em um fenômeno conhecido como
tação, transporte etc. Marcou-se, então, a campanha para a “bancada Enéas”. É possível perceber que essas candi-

86
daturas que concorriam por legendas tradicionais tinham representava a esquerda, especialmente por promover
poucas chances de vitória, num claro recado da popula- um discurso de ruptura, prometendo inclusive a suspen-
ção que demonstrava estar insatisfeita com o tradiciona- são do pagamento da dívida externa e apoio à reforma
lismo político. agrária, contando com o apoio de vários segmentos de
intelectuais, artistas, sindicatos, entidades estudantis,
A opinião pública recaía sobre dois personagens: um deles
trabalhadores e do movimento operário. Seu projeto era
já tradicional na política brasileira e o outro vindo do movi-
nacionalista e propunha desenvolver uma política demo-
mento sindical, mas ambos identificados como candidatos
crática que favorecesse os trabalhadores; promovesse
com posicionamentos mais à esquerda, isto é, estabelecen-
o crescimento do mercado interno, com a elevação do
do prioridades em suas propostas sociais: Leonel Brizola e
padrão de vida das classes populares, priorizando a área
Luiz Inácio Lula da Silva.
social (educação, saúde, moradia etc.). Nesse momento,
houve grande debate nacional a respeito das consequên-
cias de uma possível vitória de Lula.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Brizola: tempos de luta


A vida de Leonel Brizola, político brasileiro
do Rio Grande do Sul, e sua participação nos
principais acontecimentos políticos e sociais do
país. Para contar sua história desde o pequeno
povoado gaúcho até a sua morte, 27 depoi-
mentos de familiares, amigos, companheiros
e líderes políticos de peso, como Luís Carlos
Prestes, Lula, Dilma Roussef e Mário Soares,
Leonel Brizola (PDT), único político eleito para governar ex-presidente de Portugal.
dois Estados diferentes (Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro)
em toda a história do Brasil, foi um dos candidatos à Presi-
dência da República que concorreu nas eleições de 1989.
As pesquisas apontavam um provável segundo turno
Mesmo entre os dois havia diferenças quanto às priori- entre Brizola e Lula, o que atemorizava os setores con-
dades de seus projetos. Brizola, candidato pelo PDT, era servadores. Mas na reta final da campanha, a candida-
considerado herdeiro do trabalhismo varguista e fazia um tura de Lula cresceu e a militância do PT ganhou as ruas,
discurso em defesa das riquezas nacionais e de valori- conquistando eleitores indecisos e convencendo outros,
zação da educação como ferramenta de transformação levando seu candidato ao segundo turno para enfrentar
econômica e de inclusão social. Pesava em seu favor a Fernando Collor, que aparecia como um novo fenômeno
experiência de ter sido governador de dois importantes eleitoral lançado pelo pequeno PRN (Partido da Recons-
Estados, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Lula foi can- trução Nacional) e que ganhou, imediatamente, o apoio
didato pelo PT (Partido dos Trabalhadores), partido que, das classes dominantes e dos grandes órgãos de impren-
assim como o PDT, foi fundado após a reforma partidária sa, pois tinha apelo para afastar o “perigo” Lula e seu
em 1979. Para muitos, a candidatura de Lula na época discurso socialista.

87
tinha sido ministro de Vargas, era bem jovem, ocupara a pre-
feitura de Maceió e o governo do Estado, ainda que insistisse
em dizer que representava o novo na política e desligado dos
poderosos. Collor utilizou sua juventude para conquistar o
eleitorado. Seus discursos fortes destacavam a necessidade
de moralização da vida pública, prometendo um combate
incansável à corrupção, apelo popular fácil e sempre utiliza-
do. Segundo ele, era preciso promover a “caça aos marajás”
– denominação atribuída pelo jovem candidato aos funcio-
multimídia: livros
nários que recebiam altíssimos salários, além dos que não
Quem foi que inventou o Brasil? Vol. 3 – exerciam função alguma. Outro destaque em sua campa-
Franklin Martins nha foi a promessa de modernização econômica através da
integração do Brasil ao mercado mundial, fundamentando
Jornalista e comentarista político, Franklin
algumas de suas ações nos princípios neoliberais. Collor
Martins começou a estudar a intensa relação
era na verdade o candidato das elites, dos empresários, dos
entre a política e a música no Brasil em 1997.
latifundiários e dos usineiros e contava com o apoio dos prin-
Apaixonou-se pelo tema – e o resultado des-
cipais grupos que controlavam os meios de comunicação e
sa paixão é a impressionante trilogia Quem
foi que inventou o Brasil?. Em uma extensa a grande imprensa, especialmente as Organizações Globo.
pesquisa que reúne mais de mil composições, A campanha para o segundo turno foi acirrada. Collor não
Franklin nos conta a história da república bra- havia comparecido a nenhum debate do primeiro turno,
sileira sob a óptica da produção musical no mas no segundo turno não teve como evitar o embate com
país. Fechando a saga, o volume 3 aborda os seu oponente. Nesse momento, empresários davam decla-
tropeços, as conquistas e os desafios vividos rações ameaçando sair do país, investidores pressionaram
pelo país, desde a abertura política, em 1985, os grupos empresariais e os patrões, na mídia, anunciavam
até a primeira eleição de Lula, em 2002. uma possível quebradeira em virtude do quadro formado
no cenário nacional e internacional. Segmentos da classe
média receavam perder alguns privilégios e, por isso, com-
batiam a candidatura de Lula.

Lula e Collor cumprimentam-se durante a


campanha presidencial de 1989.

Collor explorou esse medo no debate final, às vésperas da


eleição, alegando que Lula promoveria o confisco de to-
das as aplicações financeiras e investimentos dos cidadãos.
Collor investiu também em ataques pessoais, alegando que
seu oponente defenderia o aborto, tendo inclusive contado
para isso com a declaração de uma ex-namorada de Lula,
além de assegurar que Lula seria favorável à luta armada.
Banner eleitoral de Collor, 1989
Collor venceu com uma pequena margem e Lula, apesar
Fernando Afonso Collor de Melo, proveniente de uma tra- da derrota, saiu fortalecido como principal representante
dicional família alagoana de políticos empresários, cujo avô da oposição.

88
eficientes de combate à inflação. Não era fácil, pois seu
antecessor já tinha buscado em fórmulas, denominadas
pelos economistas de choques heterodoxos, controlar a
inflação. Todas as tentativas haviam fracassado.
Antes de tomar posse, o presidente Fernando Collor infor-
mou que “só tinha uma bala na agulha para disparar con-
tra a inflação e, portanto, não poderia errar”. Menos de 24
horas depois de subir a rampa do Planalto, Fernando Collor
fez o disparo, só que, ao invés de uma bala de revólver,
detonou uma bomba nuclear sobre a economia.
multimídia: vídeo O presidente divulgou o novo plano econômico de com-
Fonte: Youtube bate à inflação, denominado Brasil Novo, também conhe-
História - Da Nova República ao Real - Parte 1- 2 cido por Plano Collor, articulado por um grupo de mi-
nistros chefiados pela professora Zélia Cardoso de Mello,
então ministra da Fazenda. Foi sem dúvida impactante,
pois promoveu o confisco geral da economia, limitando
2. Governo Fernando os saques de investimentos, aplicações financeiras, cader-

Collor (1990–1992) netas de poupança entre outros, além de mudar nova-


mente a moeda (retornou ao Cruzeiro) e promover novo
congelamento de preços.

Cerimônia de posse: Collor recebe a faixa presidencial de Sarney.

Zélia Cardoso de Mello, ministra da Fazenda,


durante anúncio do Plano Collor, em 1990.

A justificativa usada era a da necessidade de evitar uma ex-


plosão do consumo, como ocorreu nos tempos de Sarney,
visando impedir uma crise de abastecimento que favorece-
ria a especulação e a cobrança do ágio; portanto, o retorno
da inflação.
Além disso, o governo, assumindo princípios da política
econômica neoliberal, promoveu o enxugamento da má-
multimídia: vídeo quina administrativa com a extinção de secretarias e minis-
térios que resultou em demissões em massa, promoveu a
Fonte: Youtube privatização de várias empresas e cortou subsídios a vários
Conhecendo os Presidentes - Ep. 29: Fernando setores da economia e da cultura. Ao mesmo tempo, o go-
Collor de Mello verno facilitou a entrada de capitais e produtos estrangeiros
no Brasil. Se em alguns casos essas medidas contribuíram
para o aperfeiçoamento de produtos nacionais, que com-
2.1. O Plano Collor petissem com os importados, em outros, gerou a falência,
O governo Collor, desde o início, foi bastante conturba- já que muitas dessas empresas não tinham condições de
do, especialmente pela necessidade de criar mecanismos competir com as vantagens concedidas aos estrangeiros.

89
2.2. Denúncias de corrupção
Somados aos desgastes resultantes do fracasso dos pla-
nos de combate à inflação, surgiram sérias denúncias de
corrupção na equipe de governo, algumas das quais envol-
viam até mesmo o presidente e a primeira-dama.
A mesma mídia que trabalhara intensamente para garantir
a eleição de Collor abastecia a opinião pública com novida-
des sobre os escândalos de corrupção no governo.
Uma das denúncias mais graves partiu do irmão mais velho
multimídia: vídeo do presidente, o empresário Pedro Collor, que, em uma en-
trevista concedida à revista Veja, em maio de 1992, acusava
Fonte: Youtube
o presidente de se envolver em negociatas ilícitas e ter rece-
Anúncio do Confisco das Poupanças bido doações não contabilizadas em sua campanha coorde-
nada pelo tesoureiro Paulo César Farias, o PC Farias, como
Diante do fracasso da política econômica, a ministra da Fa- era conhecido, numa operação conhecida popularmente
zenda Zélia Cardoso de Mello pediu demissão e foi substi- como “caixa 2”. O nome PC Farias já aparecia em denúncias
tuída por Marcílio Marques Moreira, que tentou manter o desde 1991, que o acusavam de fazer lobbies para realizar
plano com alguns ajustes. Mas a tentativa de um novo plano negociações envolvendo empresas públicas, ainda que elas
só agravou a crise existente. A mais grave consequência das pudessem gerar prejuízos aos cofres públicos. Seria PC o co-
medidas postas em prática pela equipe da ministra Zélia ordenador de um grande “esquema” criado para favorecer
e, posteriormente, por Marcílio Marques Moreira foi uma determinados grupos econômicos, promovendo, para isso,
acentuada recessão, isto é, uma redução drástica da ativi- tráfico de influência dentro do governo.
dade econômica, sobretudo industrial. Destaca-se o quadro As denúncias feitas pelo irmão do presidente tiveram gran-
geral de desemprego, que alcançou os maiores índices das de repercussão junto à opinião pública. A partir daí, outras
últimas décadas. Os salários, devido à inflação, perderam a denúncias de irregularidades foram aparecendo. Como re-
maior parte do seu poder de compra. sultado do clima de indignação, foi instaurada no Congres-
so Nacional uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito)
para apurar as denúncias de irregularidades.

Com a justificativa de debelar uma inflação de mais de


80% ao mês, a equipe de Zélia, nas palavras do ex-minis-
tro Delfim Netto, transformou a economia do país em uma
“experiência de laboratório e os brasileiros, em ratinhos”.
As consequências para muitas famílias foram irreparáveis,
com mortes, suicídios e desemprego – provocado por uma
recessão aguda logo no primeiro ano do plano. Em 1990, o
PIB caiu 4,5% e a economia permaneceu atrofiada.
A inflação também despencou para 7,59%, mas resusci- Edição da revista Veja com a bombástica entrevista de Pedro Collor,
tou com força nos anos seguintes, encerrando o período marca do começo do fim do ex-presidente.

Collor em mais de 25% (IPCA de dezembro de 1992).


Apesar das muitas acusações, Pedro Collor não apresentou
Foram os anos da chamada “estagflação” – uma ano-
provas concretas de suas denúncias e acusações, o que não
malia econômica.
foi levado em consideração pela grande mídia e pela opinião
O fracasso dos planos acabou levando antigos apoiadores pública. Seria apenas uma questão de família mal resolvida?
a promoverem abertamente críticas ao presidente, que a (Vale lembrar que o empresário houvera descoberto que PC
essa altura já tinha seu nome associado a escândalos de Farias abriria um jornal em Alagoas para concorrer com o jor-
corrupção, já que o Brasil vivia com a economia estagnada, nal de sua família. Detalhe: PC era sócio de Fernando Collor).
mas sofria com a inflação. As denúncias estariam fadadas a serem arquivadas?

90
Em junho de 1992, outra entrevista, agora na revista Isto
É, com Eriberto França, motorista da secretária de Collor,
2.3. Manifestações em todo o país:
mudaria os rumos da investigação. O motorista revelou surgem os “caras-pintadas”
detalhes da ligação de PC Farias com o presidente Collor, Insuflados pela mídia, a “população” foi tomada pela in-
que faziam uso de contas fantasmas, isto é, de pessoas ine- dignação. Surgiam cada vez mais manifestações que exi-
xistentes, para pagamentos de despesas pessoais do presi- giam o afastamento do presidente.
dente – boa parte delas superfaturadas –, em sua mansão
Ganhou destaque a atuação dos estudantes em todo o
em Brasília, a Casa da Dinda.
país. Os jovens chamavam a atenção pintando o rosto de
verde, amarelo e preto em sinal de protesto contra a cor-
rupção em manifestações pelo Brasil afora, ficando conhe-
cidos como os “caras-pintadas”.

Capa da revista Isto É com foto de Eriberto França, peça-chave


para a CPI que culminou com o impeachment de Collor. Os “caras-pintadas” saíram às ruas, em 1992, para
pedir o impeachment de Fernando Collor.

Essas manifestações foram amplamente divulgadas pelos


meios de comunicação e contribuíram decisivamente para
engrossar as fileiras dos que queriam ver Collor fora do
governo.

multimídia: livros
Collor presidente – Marco Antonio Villa
O governo Collor é um dos mais (mal) fala-
dos da história brasileira. Mas quem de fato
conhece, em detalhes, os trinta meses em que multimídia: livros
um desconhecido ex-governador de Alagoas
presidiu o Brasil? Este livro vem para preen- Fora Collor – Chico Caruso
cher esta grave lacuna. Autor do best-seller “Para que um fenômeno se decomponha, é
Década perdida, o historiador Marco Antonio preciso que vários outros ocorram. Este é o bo-
Villa pesquisou arquivos desconhecidos, in- letim da maior história policial da história do
vestigou documentos inéditos e entrevistou país. Pessoas jurídicas, físicas, varas de família,
dezenas de personagens do período – inclu- sigilo bancário – foram todos pras cucuias, le-
sive o próprio Fernando Collor. O resultado vados pela ânsia de uns poucos de fazer, como
é uma brilhante reconstrução do ambiente diria o Barão, ‘de sua vida pública uma exten-
– político, econômico e cultural – que permi- são da privada’.Acabou na descarga. Quem vi-
tiu os trinta meses de turbulências, reformas, veu viu. Quem quiser rever pode começar por
intrigas e corrupção do governo Collor. aqui.” (Rio, novembro de 1992. Chico Caruso)

91
da que alguns atendessem os seus apelos, a maior parte da
população saiu às ruas de preto em sinal de luto e protesto.

multimídia: música
Fonte: Youtube
Desordem – Titãs
multimídia: vídeo
Ainda que se possa questionar a espontaneidade do mo- Fonte: Youtube

vimento, já que alguns alegam manipulação da mídia, Filme sobre o Impeachment de Collor
especialmente da Rede Globo, que aproveitou para exi-
bir a minissérie Anos Rebeldes, que mostrava a atuação
Os trabalhos na CPI seguiram e várias denúncias acabaram
destemida dos estudantes durante o Regime Militar, não
surgindo; graças à pressão exercida pela opinião pública,
se pode deixar de constatar a importância histórica de
a CPI aprovou o impeachment do presidente Fernando
um movimento como esse. Era de fato a consolidação
Collor de Melo no dia 29 de setembro de 1992, que foi
da democracia. Afinal, o impeachment é um instrumento
afastado do cargo até o julgamento no Senado.
jurídico que permite ao Congresso Nacional destituir do
cargo o presidente da República de maneira legal. No en- Tentando evitar a perda de seus direitos políticos, Collor
tanto, essa leitura necessita ser mais bem fundamentada resolveu renunciar ao seu mandato horas antes da vota-
pelos estudos dos historiadores, pois há que se entender ção no Senado, em 29 de dezembro de 1992, mas não
as motivações das classes dominantes e quais interesses adiantou, pois perdeu o mandato presidencial e os direitos
econômicos em jogo no movimento político levaram ao políticos, tornando-se inelegível, por oito anos.
impeachment de Collor em contradição com sua absolvi-
ção pelo STJ (Supremo Tribunal de Justiça).

multimídia: sites
multimídia: vídeo oglobo.globo.com/brasil/nova-republi-
ca-completa-30-anos-15053641
Fonte: Youtube
www.youtube.com/
Impeachment do Collor watch?v=rRscFxw_D0U
www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/
Collor ainda tentou algumas manobras para evitar sua depo- verbete-tematico/plano-cruzado
sição. Em rede nacional, tentou mobilizar a população para www.planalto.gov.br/ccivil_03/
que saísse às ruas vestido de verde e amarelo em defesa do constituicao/constituicao.htm
seu mandato, dizendo ser vítima de uma conspiração. Ain-

92
multimídia: música
Fonte: Youtube
Super Collor – Juca Chaves

O jornal Folha de S.Paulo noticiou, em 30 de setembro de 1992, o


impeachment do então presidente
Fernando Collor, episódio destacado como “vitória da democracia”. multimídia: livros
Tancredo Neves: a noite do destino – Ribeiro
José Augusto
A biografia definitiva de Tancredo, escrita
brilhantemente por seu assessor na histórica
campanha de 1984, retrata a vida pessoal e,
principalmente, a trajetória política do primei-
ro presidente brasileiro eleito após o Regime
Militar. O jornalista político José Augusto Ri-
beiro traz a público o resultado de mais de
quinze anos de pesquisa. O leitor encontrará
multimídia: música farto material bibliográfico, incluindo docu-
mentos do arquivo pessoal de Tancredo, fo-
Fonte: Youtube tos, entrevistas exclusivas e fatos ainda inédi-
Faroeste caboclo – Legião Urbana tos sobre esse líder nacional.

93
AULAS Nova República: governos
51 e 52 Itamar, FHC, Lula Lula e Dilma
1, 7, 8, 10, 13, 14, 15,
Competências: 1, 2, 3 e 5 Habilidades:
21, 23, 24 e 25

1. Governo Itamar Ainda que fosse visto como homem honesto e íntegro, o
governo Itamar não conseguiu passar imune aos escân-
Franco (1992–1994) dalos de corrupção. Entre 1993 e 1994, ocorreu a CPI
do Orçamento, conhecida popularmente como a “má-
fia dos anões do orçamento”. Duas situações foram
identificadas nesse esquema. Primeiro, o fato de os parla-
mentares apresentarem emendas destinando verbas para
entidades filantrópicas ligadas a parentes e “laranjas”.
Segundo e principal, eram os acordos firmados entre par-
lamentares e as grandes empreiteiras para a inclusão de
verbas orçamentárias para grandes obras, em troca de
polpudas comissões.
Foi instalada uma CPI que descobriu o funcionamento do
esquema, através do qual, por meio de emendas ao orça-
mento do governo, deputados e senadores desviavam mi-
lhões de dólares, canalizados para numerosas entidades
fantasmas, a título de assistência social, e que acabavam
Itamar Franco indo para as contas bancárias dos parlamentares. A investi-
gação comprovou o envolvimento de ministros, parlamen-
Com o afastamento de Collor, assumiu o cargo o vice-pre- tares e altos funcionários num amplo esquema de mani-
sidente Itamar Cautiero Franco, primeiro interinamente, em pulação do orçamento. Confirmara-se o desvio sistemático
2 de outubro de 1992, e empossado como presidente em de verbas para empreiteiras e obras filantrópicas fantas-
29 de dezembro do mesmo ano, diante de uma situação mas, apadrinhados políticos etc. Respondendo a respeito
econômica e política de crise devido à inflação e à descon-
da origem de sua riqueza, o líder do esquema conhecido
fiança da população na política, após sucessivos escânda-
como “os anões do orçamento”, o deputado João Alves,
los de corrupção.
declarou ser um homem de sorte e ter perdido as contas
Em termos políticos, Itamar buscou formar um governo de do número de vezes que ganhou na loteria.
coalizão, com a participação de políticos de diversas ten-
dências partidárias, em que se destacavam os represen-
tantes do PSDB. O presidente promoveu ainda inúmeras
substituições de ministros, principalmente na pasta da Fa-
zenda, que comandava a área mais traumática do governo.
Os debates no Congresso para a aprovação das reformas
políticas e socioeconômicas que a nação tanto precisava
acabaram ficando em segundo plano. Nos bastidores, ga-
nhavam um espaço cada vez maior as discussões sobre a
sucessão presidencial.
Como previa a Constituição de 1988, foi realizado um
plebiscito em que a forma e o sistema de governo foram
avaliados pela população, vencendo a forma republicana
entre a monarquia e o sistema presidencialista de governo João Alves tinha uma movimentação financeira 300 vezes
ante o parlamentarismo. maior que a compatível com sua renda de parlamentar.

94
xador econômico que promoveria a transformação do valor
das compras em Cruzeiros reais para o Real.
Para manter o câmbio próximo ao dólar, entre outras medi-
das, foram tomados empréstimos destinados a reforçar as
reservas monetárias brasileiras. A elevação acentuada da
taxa de juros foi outro artifício usado para controlar a infla-
ção e para a atração de capitais para o país. Essa medida
acabou, no entanto, contribuindo posteriormente para um
quadro recessivo e para o aumento do desemprego.
A desconfiança logo deu lugar ao otimismo, à medida que a
Itamar relançou o Fusca na fábrica da Volkswagen em São Paulo, em
1993. Sonho do presidente durou apenas três anos, inflação baixava, contribuindo decisivamente para a candida-
quando a montadora encerrou sua produção. tura e para a vitória de FHC nas eleições presidenciais de 1994.

Mesmo com pouco tempo de mandato, Itamar terminou


seu governo com alto índice de popularidade, o que em
parte se explica pelo sucesso do Plano Real que conseguiu
o controle da inflação, visto a seguir.

Fernando Henrique Cardoso, à época ministro da


Fazenda, faz o anúncio do Plano Real.

A inflação foi controlada e o país voltou a crescer tam-


bém controladamente e com uma moeda forte. Apesar de
algumas turbulências que foram controladas pela equipe
econômica e da troca de ministros da Fazenda em curtos
períodos (Fernando Henrique Cardoso deixou o Ministério
para concorrer à Presidência; Rubens Ricupero deixou o
cargo depois de ser flagrado em declarações de que es-
tavam sendo escondidas informações negativas acerca do
multimídia: vídeo plano, e foi substituído por Ciro Gomes, que deixou o cargo
Fonte: Youtube
de governador do Ceará), o plano foi mantido, bem como
a estabilidade econômica do Brasil.
Conhecendo os Presidentes - Ep. 30: Itamar Franco

1.1. O Plano Real


A inflação continuava a ser o inimigo público número um
de todos os brasileiros. Os diversos choques na economia
tinham se mostrado incapazes de solucionar o problema
da inflação de maneira definitiva.
Itamar, no primeiro ano de governo, também enfrentou
essa crise que gerou uma consecutiva substituição de mi- multimídia: vídeo
nistros até a indicação de Fernando Henrique Cardoso para
o Ministério da Fazenda. Fonte: Youtube

Inspirado em exemplos semelhantes no México e na Ar- Real, o plano por trás da história
gentina, FHC, como é conhecido, e uma equipe de econo- Após uma sequência de planos econômicos que
mistas, estruturaram um plano econômico fundamentado não surtiram efeito, o país é levado à hiperinfla-
na paridade da nossa moeda com a moeda norte-america- ção. Uma seleta equipe econômica, protegida em
na, inclusive com a criação de uma nova moeda chamada um bunker contra pressões políticas, mergulha na
Real. O plano fora criado para ser implantado em etapas. missão de reformar o Estado e criar o Plano Real.
Inicialmente, foi criada a URV (unidade real de valor), inde-

95
1.2. Política externa De um lado, Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, recebeu apoio
de outros partidos de esquerda – PSB, PC do B, PV e PPS
O Brasil orientou sua política externa procurando seguir (Partido Popular Socialista, antigo PCB). De outro, o so-
tanto a tendência à globalização da economia mundial ciólogo Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, recebeu
quanto a da regionalização do comércio, adotando uma o apoio de partidos como o PFL e o PTB. Além de Lula
política econômica fundada nos princípios do neolibera- e Fernando Henrique, que polarizaram as eleições, mais
lismo. Por um lado, a economia sofreu um processo de seis candidatos disputaram a Presidência: Enéas Carnei-
abertura, para favorecer a atuação das empresas trans- ro (Prona), Orestes Quércia (PMDB), Leonel Brizola (PDT),
nacionais. Por outro, o país dedicou-se à ampliação do Espiridião Amin (PPR, antigo PDS), Carlos Gomes (PRN) e
Mercosul – Mercado Comum do Sul. Hernani Fortuna (PSC).
O Mercosul, criado em 1991, é um bloco econômico que Lula começou a campanha antes, tendo realizado várias
reúne a Argentina, o Brasil, o Paraguai, e o Uruguai. Re- viagens a todas as partes do Brasil, denominadas de “ca-
centemente, passaram a fazer parte do bloco a Venezuela, ravanas da cidadania”. Visitando as diversas regiões do
como país membro (suspenso por questões políticas de Brasil, Lula procurava conhecer de perto os problemas do
2016), e os demais países sul-americanos associados. O país. Por isso, apareceu inicialmente com grande vantagem
acordo entre os países membros prevê o livre trânsito de sobre os demais candidatos nas pesquisas eleitorais.
mercadorias (o que já ocorre com 90% da produção in-
Fernando Henrique Cardoso tornou-se candidato à Pre-
terna dessas regiões) e a unificação da política aduaneira.
sidência pela coligação PSDB/PFL, que indicou o senador
Com o tempo, pretendem-se ampliar os acordos rumo à
Marco Maciel, do PFL, para a vice-presidência. FHC baseou
união das políticas econômicas, a unificação das moedas
sua campanha no sucesso do Plano Real e na necessidade
nacionais e o livre trânsito de mão de obra entre os países.
de manter a política econômica que vinha sendo imple-
O Mercosul tem permitido melhores condições de negocia-
mentada. Conseguiu o apoio especial dos setores da elite,
ção dos países membros no mercado internacional. Exis-
temerosos de que uma vitória de Lula pudesse reduzir seus
tem acordos de cooperação com os EUA e a perspectiva
privilégios. A consequência foi o crescimento da candida-
de se criar uma Área de Livre Comércio da América do Sul,
tura FHC, ultrapassando Lula nas pesquisas de intenção
passo que deve anteceder a participação desses países na
de voto e mantendo essa vantagem até as eleições, que
Área de Livre Comércio das Américas, Alca, bloco econô-
venceu já no primeiro turno com cerca de 54% dos votos.
mico previsto para agrupar todos os países americanos,
exceto Cuba, sob a liderança dos Estados Unidos. As eleições consolidaram o PMDB e o PSDB como maio-
res partidos nacionais. Juntos, os dois partidos elegeram
15 governadores e a maioria dos senadores e deputados
1.3. As eleições de 1994 e a estaduais e federais.
sucessão de Itamar Franco
O quadro político-eleitoral ao final do período Itamar Fran-
2. A era FHC (1995–2002)
co mostrava-se bem diferente de 1989, quando mais de 20
candidatos concorreram à Presidência da República. Essa
eleição foi marcada por colocar em campos opostos anti-
gos aliados contra o Regime Militar.

Lula e FHC nos tempos da luta pela redemocratização do Brasil. Fernando Henrique Cardoso

96
Ao tomar posse em 1o de janeiro de 1995, FHC fez um também surgiram críticas, uma vez que tais medidas aca-
discurso de acordo com sua formação acadêmica de so- bavam dando ao Executivo o poder de legislar.
ciólogo, destacando a necessidade de combater as desi-
Algumas propostas de Emendas Constitucionais resulta-
gualdades sociais no país. Porém, suas primeiras medidas
ram em discussões e polêmicas, mas eram consideradas
acarretaram frustrações para a população devido à autori-
indispensáveis pelo governo, para o crescimento e a mo-
zação do aumento do próprio salário, de parlamentares e
dernização do país, bem como para garantir a manutenção
ministros, resultando em fortes críticas.
da estabilidade econômica obtida a duras penas.
Desses projetos polêmicos, destacaram-se:
§ quebra dos monopólios do petróleo, das telecomunica-
ções, do gás canalizado e da navegação de cabotagem
(dentro das fronteiras nacionais);
§ alteração do conceito de empresa nacional, no sentido
de não discriminar o capital estrangeiro;
§ reforma administrativa;
§ reforma tributária; e
multimídia: vídeo § reforma da Previdência, que ampliava as exigências
para aquisição da aposentadoria (medida justificada
Fonte: Youtube pelo famoso déficit da Previdência, que necessitava
Conhecendo os Presidentes - arrecadar mais e pagar menos).
Ep. 31: Fernando Henrique Cardoso
É fato também que o Congresso Nacional não aprovou to-
das as medidas apresentadas pelo governo. Observamos,
2.1. Política no entanto, que algumas leis sancionadas promoveram
alterações nas relações de trabalho em busca de uma flexi-
Sabendo que a aliança política que garantiu a vitória do bilização na legislação trabalhista. A justificativa era que o
PSDB nas eleições não podia depender só do PFL, parti- alto custo com os encargos trabalhistas inviabilizaria novas
do que compunha a aliança principal, era imprescindível contratações por parte dos empresários. Com a redução
o apoio do PMDB, detentor de uma grande bancada par- dos custos, surgiram novos postos de trabalho, contribuin-
lamentar e de considerável representação nos Estados e do para redução dos índices de desemprego. Para muitos,
municípios, bem como de outros partidos, como o PTB, tais iniciativas do governo apenas prejudicariam os traba-
de tal modo que o governo pudesse contar com o apoio lhadores, sendo relacionados à política neoliberal a que
da maioria no Congresso. Essas alianças, costuradas com FHC negava ser adepto.
vários partidos, era, segundo o governo, uma necessidade
Outra importante alteração constitucional foi a aprova-
para garantir a governabilidade do país.
ção da emenda que autorizou a reeleição para os car-
Um dos recursos para a obtenção de apoio dos partidos era a gos do Executivo. Presidente, governadores e prefeitos
distribuição de cargos entre os parlamentares da base aliada, a ganharam o direto de disputar a reeleição sem deixar o
que os opositores acusam de estar sendo feito o loteamento do cargo. Contudo, denúncias sobre propinas a deputados
poder. Sem maioria no Congresso, as reformas não avançam, para a aprovação da emenda sobre a reeleição foram re-
afirmavam os representantes do governo, pois determinados latados e investigados, mas não resultaram em nada para
partidos e figuras políticas conservadoras e retrógradas só vo- o presidente.
tavam favoravelmente se fossem recompensados. Tais alianças
e atitudes acabaram rendendo críticas ao governo devido à 2.2. Economia
contradição ideológica de interesses. No entanto, essa era uma
prática antiga, usada pelos parlamentares como instrumento Para consolidar a estabilidade econômica, o governo pro-
de pressão contra os governantes, de tal modo que os presi- moveu mudanças e ajustes. Era preciso assegurar a vitória
dentes, em maior ou menor proporção, continuavam a usar. contra a inflação que, durante tantos anos, foi a mais visí-
vel ameaça à economia brasileira. Sinais de recessão, como
Em termos políticos, uma marca registrada da gestão FHC aumento das taxas de inadimplência, queda no consumo e
foi o grande número de Medidas Provisórias, se compara- demissões em massa, exigiam respostas rápidas do gover-
da a outros governos que o antecederam. Diante disso, no, algumas das quais já mencionadas.

97
Outro fato que provocou uma série de medidas e altera- ser comprovado, bem como a receita necessária para sua
ções que o governo foi obrigado a realizar, deu-se por oca- conclusão. O objetivo era evitar que houvesse mais gastos
sião da crise na Ásia, em Hong Kong, no final de 1997, da do que a receita permitia, o que quase sempre ocorria, es-
qual se destacaram o aumento das taxas de juros, que visa- pecialmente nos momentos em que antecediam as eleições.
va desestimular o consumo e atrair o capital especulativo, A inobservância dessas regras passaria a acarretar sérias pu-
a desvalorização da moeda, para estimular as exportações nições, inclusive perda de direitos políticos, pagamento de
e equilibrar a balança comercial, e a realização de acordos multas, prisão e confisco de bens dos infratores.
com o FMI, Fundo Monetário Internacional. Nesse caso, o Em termos políticos foram, várias questões que abalaram a
Brasil receberia recursos na forma de empréstimos e, em imagem do governo, principalmente a crise no relacionamento
contrapartida, adotaria diretrizes estabelecidas pelo Fundo, político com o Congresso Nacional a propósito do setor ener-
como garantir o superávit primário, o ajuste das contas pú- gético. A questão envolveu a reação de Antônio Carlos Maga-
blicas com o corte de gastos e o controle da inflação. lhães, do PFL-BA, em face da indicação de Jader Barbalho, do
PMDB-PA, para a Presidência do Senado. A partir desse mo-
2.3. Sociedade mento, ACM passou a dirigir sérias críticas ao presidente que,
em retaliação, destituiu ministros ligados ao senador baiano.
Para muitos, a gestão FHC provocou uma série de frustra- Paralelamente, surgiam denúncias de corrupção no governo,
ções, uma vez que se esperava de um sociólogo, professor que deram origem a uma série de Comissões Parlamentares
universitário, o melhor conhecimento dos problemas do de Inquérito (CPI); porém, quase todas elas acabaram arqui-
país. Esse foi o sentimento de muitos que apostaram suas vadas ou não tiveram os responsáveis punidos exemplarmen-
fichas em um intelectual de prestígio internacional e com te por falta de provas. Ainda que do ponto de vista jurídico,
um handcap de ter apoiado a criação de um vitorioso pla- boa parte das denúncias não fossem comprovadas, o governo
no de estabilização econômica de combate à inflação. sentiu os efeitos dos sucessivos escândalos com os índices de
De fato, podemos constatar um certo imobilismo do go- popularidade caindo progressivamente. Mas, talvez, a crise
verno ao atendimento das questões sociais, algumas das que mais tenha contribuído para desgastar o governo foi a
quais foram até prejudicadas pelas reformas propostas do setor de energia, que resultou em um racionamento geral
pelo governo, como no caso da flexibilização das leis tra- em 2001. Em princípio, toda a população deveria reduzir o
balhistas. Se a educação básica ganhou fôlego com pro- consumo de energia elétrica em 20%. As críticas foram duras
gramas como o Bolsa Escola, o ensino superior suscitou ao governo, à medida que não houvera traçado um planeja-
muitas críticas. As reclamações eram originadas pela falta mento, tampouco feito os necessários investimentos em um
de apoio e de investimentos, provocando um progressivo setor essencial para o crescimento do país.
sucateamento das universidades públicas.

2.4. A reeleição
Apesar do contexto econômico complicado ao final do seu
primeiro mandato devido à crise na Ásia, FHC lançou-se
novamente como candidato, reeditando a aliança vitoriosa
de 1994 com o PFL, desta vez com o foco no combate ao
desemprego. Usava o slogan: “O homem que acabou com
a inflação agora vai acabar com o desemprego”. Lula seria
mais uma vez o principal adversário, mas não resistiu ao
poder que a estabilidade econômica dera ao seu adver-
sário e o apoio das elites. FHC foi eleito mais uma vez no
primeiro turno com cerca de 53%.

2.5. O segundo mandato


FHC iniciou seu segundo mandato em, 1o de janeiro de
1999, e tinha à sua frente grandes desafios a superar.
O primeiro deles referia-se à aprovação da Lei de Responsa- A crise do apagão* afetou o fornecimento e a distribuição de energia elétrica,
bilidade Fiscal, aprovada em 2000, que restabelecia regras entre julho de 2001 e fevereiro de 2002, durante o segundo mandato do presidente
Fernando Henrique Cardoso. Foi causada por falta de planejamento e investimentos
para o uso do dinheiro público em todas as esferas (federal, em geração de energia. *Apagão foi o termo que designou interrupções ou falta de
estadual e municipal). Todo gasto ou investimento deveria energia elétrica frequentes; blecautes (do inglês, blackout) de maior duração.

98
Devemos reconhecer, no entanto, que diante de tantas São inegáveis os significativos avanços em determinados seto-
dificuldades resultantes do cenário internacional, o go- res, em especial na área de telecomunicações, com a facilita-
verno conseguiu manter a estabilidade, evitando o retor- ção do acesso à telefonia a milhares de pessoas. No setor de
no da inflação. Desde a crise da Ásia, no final de 1997, energia elétrica, a oferta foi significativamente ampliada. No
da Rússia, em 1998, outras várias ocorreram, como na entanto, os problemas advindos da privatização não puderam
nossa vizinha Argentina (2001-02), importante parceiro ser encobertos, especialmente no atendimento ao consumidor,
ainda que existissem normas e leis que regulassem essas ati-
comercial no Mercosul.
vidades. Além das agências reguladoras, foram criadas regras
para fiscalizar a ação dos grupos que receberam concessão
2.6. As privatizações pública para aquela atividade específica, o que nem sempre foi
Particularmente após o governo Collor, os debates sobre feito com eficácia. Vender mais produtos do que a capacidade
as vantagens e prejuízos que as privatizações trariam ga- de atendimento, não cumprir a responsabilidade prevista em
nharam um lugar de destaque no cenário político nacional. contrato com o consumidor são infrações mais comuns que
até hoje lideram o ranking de reclamações nos órgãos de de-
Um dos argumentos dos privatistas era o de que a escas- fesa do consumidor. Convém lembrar que, muitos estudiosos
sez de recursos tornava muitas empresas estatais obsole- das questões econômicas desse período, particularmente do
tas, uma vez que os investimentos não estavam à altura processo de privatizações, apontaram o modo o como as pri-
da competitividade exigida pelo mercado mundial. Dessa vatizações foram levadas a cabo pelo governo, não revertendo
forma, os que defendiam a privatização como uma neces- nos lucros esperados; o capital significativo apregoado para
sidade, usavam como argumento o alto custo operacional que se resolvessem os problemas de caixa não apareceu nem
de algumas empresas nacionais, especialmente com pa- para programas sociais, senão para alimentar a corrupção.
gamento de mão de obra. Livre dessa responsabilidade,
o governo poderia dispor de mais recursos para investir
em projetos sociais; além disso, a privatização incentiva-
ria, em nome da concorrência, tanto uma ampliação da
oferta quanto uma redução de preços, o que beneficiaria
o consumidor.
Os que eram contra alegavam a desmontagem do pa-
trimônio público nacional, bem como o preço defasado
que as empresas nacionais estariam sendo ofertadas,
valores bem menores que os praticados pelo mercado –
multimídia: livros
indícios de favorecimento a determinados grupos parti-
A miséria da política –
culares interessados na compra das estatais. Criticavam
Fernando Henrique Cardoso
ainda a inobservância dos interesses nacionais, já que
não foram realizadas consultas públicas sobre a venda Reúne textos escritos por Fernando Henrique
das tais empresas. Cardoso entre 2010 e 2015. Publicados em
jornais de grande circulação ou apresentados
O programa de privatização atingiu setores considerados em conferências no país e no exterior, traçam
essenciais ao país, como as telecomunicações (Telebrás), um panorama da “crise moral” que assombra
distribuição de energia (Eletrobrás), siderurgia (Usiminas, o Brasil, e apontam direções possíveis para a
Cosipa e CSN-Cia. Siderúrgica Nacional) e recursos mine- reinvenção da política e para o fortalecimento
rais (Companhia Mineradora Vale do Rio Doce), não sem da democracia. Como José Serra diz na orelha
muito protestos, além de bancos estaduais. do livro, “Em cada artigo, em cada análise, em
cada julgamento moral, em cada rumo que
traça para os que nele se inspiram, Fernando
Henrique não abandona em momento algum
a coerência de princípios, o rigor da análise
e a referência ao bem público como objetivo
maior. O intelectual, no autor, faz da capaci-
dade analítica uma barreira contra o ‘realismo’
oportunista; enquanto o político, nele, comba-
te o voluntarismo com a força da realidade“.
Manifestação contra a privatização da Cia. Vale do Rio Doce.

99
2.7. As políticas sociais 2.9. A campanha
Naquele período, algumas políticas sociais foram consideradas
excessivamente paternalistas e assistencialistas. Ainda que
não tenha sido uma revolução, são inegáveis alguns importan-
tes avanços na área social postos em prática na gestão FHC,
que em boa parte serviram de esteio para o governo Lula.
Destaque especial merece a atuação do Ministério da Saúde,
sob o comando de José Serra, com a quebra das patentes do
setor de medicamentos usados no tratamento da AIDS (Sín-
drome da Imunodeficiência Adquirida), bem como do lança-
mento de medicamentos genéricos, que usavam o mesmo
princípio ativo dos remédios de “marca” “patenteados” a
preços mais baixos. Sem dúvida, a atuação como ministro
da Saúde, entre 1998 e 2002, juntamente a esses fatores, O novo visual de Lula na campanha
credenciariam José Serra para concorrer à Presidência da Re- de 2002.

pública nos pleitos de 2002 e 2010.


Nos bastidores da campanha de Lula, o principal reforço foi a
Na educação, o destaque ficou com o Programa Bolsa Escola, contratação do publicitário Duda Mendonça, considerado pe-
que assegurava determinada quantia em dinheiro às famílias los especialistas um verdadeiro mago no ramo do marketing
que mantivessem os filhos na escola. Resultado: houve um político. Lula demonstrava uma postura diferente da apresen-
substancial aumento do número de matrículas nos ensinos tada em outras campanhas eleitorais. Nos programas, passou
fundamental e médio e a redução da taxa de analfabetismo. a aparecer com ternos bem cortados, barba bem feita, pala-
Outro feito importante do governo foi ter incluído na pauta de vras e gestos mais suaves, evitando ao máximo os ataques
problemas nacionais a questão dos direitos humanos. A dis- aos adversários e concentrando seus esforços na apresen-
cussão sobre a Ditadura foi retomada e as vítimas de violência tação de propostas para o desenvolvimento da nação. Lula
do Regime Militar ou suas famílias passaram a ser indenizadas. definia essa sua nova fase como: “Lulinha Paz e Amor”.

2.8. O processo eleitoral de 2002 Essa sua nova “versão” suscitou nas alas mais radicais não
só do PT, mas da esquerda, dúvidas sobre a possível mu-
Em 2002, o PT e Lula tiveram de atender a determinadas dança de comportamento e ideologia do candidato. Anti-
demandas políticas para que pudessem concorrer às elei- gos companheiros acusavam-no de ter desbotado. Mesmo
ções. Internamente, o nome de Lula já não era mais unani- assim, Lula continuava crescendo nas pesquisas e reduzin-
midade, razão pela qual, pela primeira vez, ele disputou as do seus índices de rejeição.
prévias com o senador Eduardo Suplicy, das quais Lula saiu
vitorioso com mais de 80% dos votos. Lula liderou a campanha desde o início e conseguiu rever-
ter vários estigmas negativos (estigmas preconceituosos,
A mudança de comportamento de Lula e do PT impressio- aliás), principalmente quando alguns empresários de reno-
nou e causou muita polêmica, especialmente em virtude da me nacional deram depoimentos de apoio ao candidato
aliança com o PL, Partido Liberal, e da indicação do senador petista em seu programa político no horário eleitoral.
José Alencar, um megaempresário do setor têxtil, para a vice-
-presidência. As alianças com setores conservadores levaram Em sua matéria de capa, a revista Veja perguntava: “Quem
a senadora Heloísa Helena a fazer abertas críticas ao PT e a será o antiLula?”, o que refletia as circunstâncias que ilus-
desistir de concorrer pelo partido nas eleições para governo traram a disputa pelo segundo lugar.
de Alagoas. Essas discordâncias mais tarde levariam os dissi- A disputa pelo segundo lugar ficou mais acirrada quando
dentes do PT à formação de uma nova legenda denominada Ciro Gomes, candidato do PPS, cresceu nas pesquisas no cur-
Psol, Partido do Socialismo e Liberdade. to período de três semanas, chegando a superar José Serra,
candidato pelo PSDB. De temperamento notadamente forte,
Ciro deu algumas declarações polêmicas e bastante explora-
das pelos adversários, provocando a queda de seus índices
para o quarto lugar ao término do primeiro turno.
Anthony Garotinho, candidato pelo PSB, chegou a crescer
Lula, PT, com o senador José Alencar, PL, aliança nos momentos finais da disputa, baseando sua campanha
polêmica às vésperas das eleições de 2002. no aumento do salário mínimo e afirmando que somente ele

100
representava uma esquerda de fato e não aceitaria ajuda de No início da campanha, havia uma forte disputa dos prin-
elementos da política tradicional, numa clara acusação ao cipais candidatos pelo apoio do PMDB, considerado funda-
candidato petista, que então já contava com o apoio dos ex- mental para se alcançar a vitória.
-presidentes José Sarney e Itamar Franco, sem contar ainda
Desde o princípio, as coligações apresentavam incoerên-
com a estranha aparição de Antonio Carlos Magalhães que,
cias, contradições e, muitas vezes, jogo de interesses não
em litígio com o PSDB, declarara apoio a Lula.
revelado. No Ceará, o ex-candidato Ciro Gomes apoiou
Lula e, em âmbito estadual, Lúcio Alcântara.
Logo que soube da necessidade de um segundo tur-
no, o PT tomou as providências necessárias e saiu a
campo para costurar novas alianças e somar esforços
para a campanha. Não foi fácil. Os partidos dos candi-
datos derrotados quiseram negociar propostas e posi-
ções num eventual governo Lula, que declarou debater
ideias, não cargos. No programa de abertura do horário
eleitoral gratuito, após superar divergências internas,
Ciro Gomes, do PPS, e Anthony Garotinho, do PSB, nos
multimídia: música limites da coerência política, visto que se propuseram a
Fonte: Youtube ser oposição ao modelo em vigor até então, declararam
apoio à Lula.
Perfeição – Legião Urbana
Lula apresentava um discurso de mudança, mostrando que
76% da população exigia mudanças ao escolher um can-
2.9.1. Ao final do primeiro didato de oposição ao atual governo.
turno, o quadro era este: Já José Serra, do PSDB, revivia em seus programas
Nº Candidato Partido Votos % suas mais importantes realizações como ministro da
Saúde, ao quebrar em fórum internacional o direito
13 Lula PT 39.454.692 46.44%
das patentes de remédios usados no tratamento da
45 Serra PSDB 19.705.061 23.2% AIDS e conseguir convencer os fabricantes estran-
40 Garotinho PSB 15.179.879 17.87% geiros a reduzir os preços. O lançamento bem-su-
23 Ciro PPS 10.170.666 11.97%
cedido dos remédios genéricos e a obrigação de as
empresas produtoras de cigarro a veicularem men-
16 Zé Maria PSTU 402.232 0.47%
sagens explícitas, alertando os consumidores sobre
29 Rui Guerra PCO 38.619 0.05% as consequências do uso do produto e a publicação
Resultado TRE-SP nas embalagens de fotos de impacto sobre os males
causados pelo tabagismo.
Repetindo o sucesso de 2000 nas eleições municipais, o
PT conseguiu eleger sua maior bancada. Era a chamada Durante toda a campanha, Serra procurou convencer a po-
“onda vermelha”, composta de 91 deputados federais e pulação da necessidade de ser experiente no exercício do
10 senadores, o dobro da anterior. poder sem o que o país estaria ameaçado de total descon-
Apesar desse crescimento, no entanto, o PT perdeu o go- trole, do caos generalizado e da perda das principais con-
verno de Estados importantes, como o do RS, onde Tarso quistas obtidas no governo FHC, como e, principalmente, a
Genro foi derrotado; do Distrito Federal, com Geraldo estabilidade econômica.
Magela; do Ceará, com José Airton, para Lúcio Alcântara, A vitória de Lula significava seguir os mesmos destinos
do PSDB, apoiado pelo já eleito senador Tasso Jereissati da Argentina e da Venezuela, alertava Serra. Alegando
que, assim como FHC, havia permanecido oito anos no po- que Lula jamais tivera uma experiência administrativa,
der, com a menor margem de votos de todo o país. chegou a comparar o país a um avião Boeing cujo pilo-
Nº Candidato Partido Votos % to, sem experiência seria Lula, que levaria certamente o
avião a um desastre. Num dos momentos mais polêmicos
45 Lúcio Alcântara PSDB 1.765.726 50.04%
da campanha, a atriz Regina Duarte afirmou no horário
13 José Airton PT 1.762.679 49.96% eleitoral de Serra que tinha medo do governo Lula, reavi-
<eleicoes.uol.com.br> vando o temor das campanhas anteriores.

101
O paulistano José Serra, candidato a presidente
da República pelo PSDB, em 2002.

Durante todo o segundo turno, Lula preferiu fazer diversas


viagens, fato criticado intensivamente por Serra. Ele foi a
apenas um debate, às vésperas da eleição, ao vivo na TV,
Globo, onde foi montada uma arena com eleitores indeci-
sos de todo o país. De acordo com as regras, os candidatos
não poderiam fazer perguntas diretas um ao outro. Nesse
debate, Lula declarou: “Eu sei que não posso errar, qual-
quer um pode errar, mas eu não posso errar”.
Às vésperas do encerramento da campanha, Lula reuniu-se
com empresários e tentou tranquilizar o mercado, afirman-
do que as regras seriam claras e que o desenvolvimento do
país estaria sempre em primeiro lugar. Proclamou ainda a
necessidade de um pacto social que envolvesse todos na multimídia: vídeo
luta contra a fome e a miséria.
Fonte: Youtube
Em 27 de outubro de 2002, Lula foi eleito o primeiro presi-
Conhecendo os Presidentes -
dente operário da República do Brasil.
Ep. 32: Luiz Inácio Lula da Silva
% votos
Nome Candidato Partido Votos
válidos

Lula 13 PT 52.793.364 61.3


3. Governo Lula (2003–2010)
José
45 PSDB 33.370.739 38.7
Serra
<portalbrasil.net>

As frases do presidente eleito foram marcadas pela emo-


ção. No discurso da vitória, Lula repetiu um gesto de 1969
dizendo: “Que nunca mais ninguém ouse duvidar da força
da classe trabalhadora deste País”. Após a acomodação
natural do período eleitoral, chegava a hora de fazer um
balanço do resultado e das consequências das urnas.
Apesar da derrota nas eleições presidenciais, o PSDB con-
seguiu consolidar vitórias importantes em muitos Estados: Luiz Inácio Lula da Silva
elegeu sete governadores, 72 deputados federais e 11 se-
No dia 1o de janeiro de 2003, Lula tomou posse numa ce-
nadores, garantindo uma situação confortável e prometen-
rimônia histórica em Brasília, marcada pelo estilo persona-
do fazer uma oposição responsável ao governo.
lista do novo presidente. Várias caravanas saíram de todo
Este quadro mostra a composição do Congresso Nacional o país para assistir à posse do presidente, que havia sido
no primeiro governo Lula. operário e, como tantos outros brasileiros, veio de “baixo”.

102
O PT sentiu nos primeiros dias do mandato o peso de ser go- déficits do governo sem vender o patrimônio público e sem
verno. Promessas e ataques outrora feitos ao governo ante- mexer nos direitos dos trabalhadores.
rior passaram a ser mais bem dimensionados, como a ques-
Porém, não tardaram a vir as primeiras críticas, especial-
tão da redução da alíquota do imposto de renda. Surgiram
mente pela proposta da Reforma da Previdência, que es-
críticas dos setores mais à esquerda que exigiam mudanças
tabelecia a taxação da cobrança mensal dos aposentados
na política e na economia. Lula optou por seguir o modelo
(inativos) e que até então deixavam de pagar essa contri-
econômico de seu antecessor, começando a inovar na área
buição após a aposentadoria.
social, ao criar o programa denominado Bolsa Família.
Em se tratando de política externa, podemos destacar a
Logo após a posse, Lula acabou se indispondo com as For-
atuação do Brasil no comando das operações da missão de
ças Armadas por suspender a licitação de compra de aviões
paz da ONU no Haiti, desde 2004, chamada de Minustah,
de combate.
Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti. O
As primeiras medidas do governo voltaram-se para o Brasil ganhava projeção no cenário internacional.
Projeto Fome Zero, e todos os esforços se concentrariam
em erradicar a fome no país. Foi formada uma comitiva
composta pelo presidente e vários ministros e secretários
de Estado, que visitou algumas áreas críticas, como a pe-
riferia de Recife e Teresina, que faziam parte do mapea-
mento do projeto.

Logotipo do programa Fome Zero e cartão do programa Bolsa Família.

A formação da equipe atendeu aos interesses dos partidos


que formavam a base aliada, de acordo com a força políti-
ca de cada um. Era o tal pacto pela governabilidade.
Soldados brasileiros da missão de paz da ONU no Haiti, a Minustah.
Além dos ministérios tradicionais, foram criadas secretarias
diretamente subordinadas ao presidente, com o objetivo O pagamento antecipado de acordos firmados com o
de atenderem demandas específicas. Mesmo com alguma FMI provocou dúvidas na população e resultou em po-
demora, a indicação da equipe econômica e do primeiro es- lêmicas sobre as intenções e benefícios de ação. Lula te-
ria antecipado o pagamento de empréstimos contraídos
calão do governo acalmou a tensão do mercado financeiro
nas gestões passadas, chegando até a aportar recursos
que temia por mudanças radicais na política econômica.
no Fundo, tirando o país da condição de devedor e co-
Lula, pelo contrário, manteve os compromissos de cam-
locando-o na condição de credor. O governo alegava
panha e honrou todos os acordos firmados por seu ante- que, pagando esses acordos, o Brasil teria mais liber-
cessor. Grande prova foi a indicação de Henrique Meirelles dade para estabelecer suas metas na área econômica
para a presidência do Banco Central. Meirelles pertencia sem se submeter às exigências feitas pelo FMI (especial-
aos quadros do PSDB e tinha grande experiência na área mente no superávit primário e na taxa de inflação) em
econômica. Com a confiança restabelecida, aos poucos os troca dos empréstimos. O problema é que, para muitos,
indicadores econômicos foram melhorando, possibilitando o Brasil tinha zerado a centenária dívida externa, o que
ao governo reduzir a taxa básica de juros. A cotação do não era verdade, e que o governo teria tirado vantagem
dólar cedeu, valorizando o real e reduzindo o risco-país, política desse equívoco. Os críticos alegavam que es-
indicador usado no mercado internacional para medir os ses recursos destinados à antecipação do pagamento
riscos de promover investimentos naquele país. do crédito com o FMI poderiam ter sido aplicados em
saúde, habitação, educação, transporte etc. Essa é uma
Os maiores desafios do governo Lula foram provar a via- longa discussão que deve ser estudada com atenção,
bilidade das propostas sociais concomitantemente ao mas sem dúvida o pagamento da dívida com o FMI deu
desenvolvimento econômico sustentado do país, além de ao Brasil liberdade de ação sem ingerências externas na
promover uma reforma constitucional visando a reduzir os sua política econômica.

103
3.1. Escândalos de corrupção
O governo Lula não escapou de escândalos envolvendo
alguns de seus membros com denúncias de corrupção. A
título de exemplo, podemos citar a CPI dos Bingos e dos
Correios e outros escândalos. Porém, o maior prejuízo à
imagem do governo ficou por conta do denominado “es-
quema do mensalão”, que consistia, segundo os de-
nunciantes, se bem nunca provado, no pagamento de uma
“mesada” aos parlamentares em troca de apoio político
no Congresso, e na prática do chamado “caixa 2”, isto é, Lula com Alckmin, durante um dos debates da campanha de 2006.

uso de dinheiro não contabilizado em campanha. Segundo


o deputado Roberto Jefferson, do PTB, autor das denún-
cias e do nome “mensalão”, em várias entrevistas, ocorria
um esquema para garantir a aprovação dos projetos do
governo nas casas legislativas, em que parlamentares rece-
beriam dinheiro em troca do seu apoio.
O presidente Lula deu declarações afirmando desconhecer tal
esquema e conclamou os diversos órgãos envolvidos na inves-
tigação a apurar minuciosamente as denúncias. O “eu não multimídia: livros
sabia” se tornaria um mantra de Lula em escândalos futuros.
A CPI do “mensalão” indiciou vários nomes que envolviam Lula do Brasil: a história real, do Nordeste ao
desde ex-ministros, parlamentares até dirigentes do PT. Por Planalto – Richard Bourne
fim, alguns parlamentares, diante de iminente cassação, Este livro conta a história completa do ho-
acabaram renunciando para não perderem seus direitos mem, do sindicalista e do político Lula, da
políticos. Efetivamente, foram cassados apenas dois: Ro- infância pobre no Nordeste ao topo da car-
berto Jefferson e José Dirceu, homem forte do governo e reira, quando se tornou um dos mais popu-
Ministro Chefe da Casa Civil.1 lares líderes mundiais. Richard Bourne vai
com emoção e poesia às origens de Lula e
3.2. A reeleição de Lula em 2006 o acompanha até sua ascensão como líder
de massas, apresentando-o como digno de
Carismático, Lula partiu firme na campanha de sua reelei-
admiração por seu pragmatismo, bom humor
ção respaldado no enorme apoio popular que se refletia nos
e desejo sincero de arrancar os brasileiros da
elevados índices de aceitação de seu mandato. Só não foi
mesma pobreza de onde saiu.
consagrado em uma vitória já no primeiro turno porque seus
adversários conseguiram tirar algum proveito dos escânda-
los de corrupção envolvendo membros do governo. Os críti-
cos de Lula alegavam que sua eleição deu-se especialmente 3.3. Segundo governo Lula (2007–2010)
pela ampliação do Bolsa Família, programa assistencialista Lula havia prometido que, em caso de vitória e após a
que gerava uma renda mínima para milhões de brasileiros. consolidação da estabilidade econômica, era hora do
Assim como em 2002, a disputa foi polarizada entre PT e “espetáculo do crescimento”, que resultou na cria-
PSDB, que dessa vez foi representado por Geraldo Alckmin, ção de um projeto conhecido como PAC, Programa de
crítico severo do modelo administrativo conduzido pelo PT Aceleração de Crescimento. Tratava-se de um conjunto
e dos escândalos de corrupção. Lula, por sua vez, procura- de políticas econômicas comandadas pelo governo fede-
va, através de comparações com o governo anterior, mos- ral nas mais variadas áreas e previstas para o quadriênio
trar os avanços conquistados pelo seu governo nas mais 2007–2010. O programa seria desenvolvido em blocos,
variadas áreas, destacando sua opção pela defesa do pa- do qual o principal compreenderia as medidas de infra-
trimônio nacional em contraposição ao período em que o estrutura social – habitação, saneamento e transportes
PSDB esteve no poder e procedeu por muitas privatizações. de massa. Os demais blocos incluíam medidas para es-
timular o crédito e o financiamento, melhoria do marco
regulatório na área ambiental, desoneração tributária e
medidas físicas de longo prazo. O PAC teria como madrinha a

104
ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Dessa forma,
Lula preparava sua sucessora na Presidência, que passou 4. O Governo Dilma
a aparecer frequentemente na inauguração das obras do
PAC ao lado do presidente. Também vale lembrar do pro-
Rousseff (2011-2014)
gramado pré-sal, que possibilitou a exploração de petró- 4.1. As eleições
leo em zonas marinhas abaixo da extensa camada de sal, As eleições de 2010 foram marcadas pela polarização de
e gerou muitos royalties para o Brasil. dois blocos políticos; o primeiro que defendia a manuten-
Se, para alguns Lula decepcionou, especialmente na área ção dos programas sociais estabelecidos pelo governo Lula
social, vale lembrar que as propostas sociais foram a tô- e a ampliação dos gastos em crescimento econômico para
nica de sua trajetória de mais de 20 anos até chegar ao futura ampliação dos auxílios sociais; o segundo que acre-
poder. Milhões de pessoas saíram da linha de pobreza ditava que o governo Lula, apesar de ter bons índices de
absoluta; houve melhoria na redistribuição da renda; o aprovação popular (Lula terminou seu mandato com 80%
de aprovação), utilizava os programas de assistência social
número de empregados cresceu; o governo Lula surpre-
para ganhar votos, além de estar envolvido com escândalos
endeu, ainda, na política externa. Muitos analistas apos-
de corrupção em empresas públicas.
tavam que um presidente sem diploma de nível superior,
operário, teria sérias dificuldades para representar os in- Essa polaridade foi personificada por Dilma Rousseff (PT),
teresses do Brasil no cenário internacional. Pesava contra ministra-chefe da Casa Civil no governo Lula, e candidata
ele ainda o fato de seu antecessor ser um homem culto, apoiada pelo então presidente, contra José Serra (PSDB),
diplomata e de formação acadêmica respeitável. Não foi que se candidatava ao cargo pela segunda vez. Ainda exis-
tiu uma terceira via que tentava ganhar espaço nesse mo-
bem assim que aconteceu. Aos poucos, Lula foi ganhando
mento, propondo uma renovação nas ideias de governo,
prestígio internacional, inclusive na mediação de ques-
tendo como representante Marina Silva (PV).
tões diplomáticas envolvendo a ONU. Chegou inclusive a
pleitear a indicação brasileira para membro permanente Após um primeiro turno com as seguintes porcentagens de
do Conselho de Segurança, órgão mais importante da- voto: Dilma (47%); Serra (33%); Marina (19%), o segun-
quele organismo internacional. Nesse contexto, outra do turno foi uma clara demonstração da polaridade pró e
façanha do governo foi conseguir vencer, enfrentando contra o projeto petista de governo, e, devida a enorme
força de Lula naquele momento, Dilma Rousseff foi eleita
fortes candidatos, a disputa pela realização da Copa do
no segundo turno recebendo mais de 55 milhões de votos
Mundo de Futebol, em 2014, e a dos Jogos Olímpicos, em
(56%), frente aos quase 44 milhões de votos recebidos por
2016, os maiores e mais importantes eventos esportivos
seu opositor José Serra (44%).
mundiais (os quais, futuramente, estariam ligados a es-
cândalos de propina e superfaturamento).
A estabilidade econômica consolidou-se de tal maneira,
que o Brasil chegou a ser elevado ao grau de investimento
pela Standard & Poor’s, agência de classificação de risco.
Razão pela qual a crise mundial de 2008 tenha chegado
com relativo atraso ao Brasil. À época, sob grande otimismo (Serra e Dilma se cumprimentam antes do último debate nacional)
e euforia, o presidente afirmou que a crise não passaria de
uma “marolinha” aos brasileiros. Contudo, vê-se que Lula
errou em seu prognóstico.
Além do Bolsa Família, programas como Prouni, Pro-
grama Universidade para Todos, e Fies, Programa de Fi-
nanciamento Estudantil, na área da educação, e “Minha
Casa Minha Vida”, na área da habitação, contribuíram
para uma imagem positiva do governo pela maioria da
população, cuja parcela significativa ganhou promoção e
ascensão social.
Mesmo com um novo escândalo de corrupção envolvendo o uso multimídia: música
indevido dos cartões corporativos, Lula terminou seu segundo Fonte: Youtube
governo com uma popularidade ainda maior que a do primeiro. - Futuro do país – Planet Hemp
Seu último desafio foi eleger sua sucessora, Dilma Rousseff.

105
alvo de inúmeras críticas de ambientalistas, organizações
sociais diversas e até da Organização dos Estados Ame-
ricanos (OEA). Também teve que enfrentar denúncias de
corrupção envolvendo membros do seu ministério, o que
fazia reviver o fantasma do “mensalão” e gerando desgas-
te logo no início de seu mandato. O resultado foi a troca de
sete ministros em seus treze primeiros meses de governo,
além de inúmeros outros funcionários do governo afasta-
dos de seus cargos.
multimídia: livros
Em 2012, foi criada uma importante comissão encarrega-
A vida quer é coragem: a trajetória de da de investigar violações contra os direitos humanos en-
Dilma Rousseff, a primeira presidenta tre os anos de 1964 e 1988. Tal comissão ficou conhecida
do Brasil – Ricardo Batista Amaral nacionalmente como Comissão Nacional da Verdade,
A trajetória pessoal da presidenta Dilma e era formada por sete pessoas nomeadas pela presidente,
Rousseff e a história do Brasil moderno se tendo como principal foco os casos de tortura e desapa-
entrelaçam numa grande reportagem. Do recimentos ocorridos durante a Ditadura Militar. O grande
suicídio de Getúlio Vargas, quando era crian- senão dessa comissão seria o fato dela ter caráter apenas
ça, ao Golpe de 1964, quando se aproxima investigativo e não punitivo, pois os indiciados por supos-
das organizações de esquerda. Da clandes- tos crimes na época não seriam presos pelos seus atos.
tinidade, prisão e tortura na Ditadura Militar, Economicamente, o governo Dilma ficou marcado pelo se-
à luta pela anistia e pela redemocratização. gundo Programa de Aceleração de Crescimento (PAC 2),
O encontro de Dilma com Leonel Brizola, na que tinha como objetivo acelerar as obras de infraestrutura
fundação do PDT, e sua aproximação com
nacionais e manter o Brasil fora da crise econômica que
Lula, durante o apagão e na campanha elei-
assolava o mundo. Contudo a falta de investimentos ex-
toral de 2002. A chefia da Casa Civil, que
ternos devido ao colapso global capitalista e os recorrentes
assume em plena crise do mensalão, os bas-
escândalos políticos envolvendo membros da alta cúpula
tidores da reeleição, a luta contra o câncer e
governamental, fizeram com que os recursos para as obras
a vitória nas eleições de 2010: uma história
ficassem escassos, levando o governo a desacelerar ou, em
de resistência, esperança e coragem.
alguns casos, paralisar as obra do PAC 2.
Essa crise também apertaria os programas de assistência
4.2. O Governo social, marca forte dos governos petistas, e que agora es-
Ao assumir a presidência, em 1º de janeiro de 2011, sendo tavam ameaçados pelas faltas de recursos públicos. Dilma
a primeira mulher a ocupar o cargo máximo do executivo alegou que o Brasil necessitava apenas de ajustes e que os
nacional por meio de voto, Dilma prometeu continuar com programas sociais não sofreriam corte, contudo a descon-
os projetos de crescimento e aceleração da economia do fiança sobre a situação econômica brasileira não passava
seu antecessor e padrinho político (Lula), além de manter a apenas pelo discurso de parcimônia da presidente, mas sim
batalha para erradicar a miséria no país. pela observação da sociedade de índices de inflação em
alta e um grande aumento no desemprego.
Em 2013, movimentos estudantis que protestavam contra
o aumento das tarifas nos transportes por todo o país, co-
meçam a ser reprimidos com violência pela Polícia Militar
nas grandes cidades, levando ao aumento dos protestos e
a adesão de cada vez mais pessoas. O momento que levou
as manifestações a ganharem adesão nacional definitiva
foram as atuações da PM contra os manifestantes utilizan-
(Dilma recebe a faixa presidencial de seu antecessor do balas de borracha e bombas de gás, mesmo durante
Lula. Ao seu lado, o vice, Michel Temer) manifestações pacíficas. O ápice das manifestações ocor-
reu em junho, quando a adesão de inúmeras pessoas fez
Porém, logo em seu primeiro ano de governo, a constru- com que o foco deixasse de ser o aumento das tarifas, mas
ção da usina de Belo Monte, no estado do Pará, tornou-se uma série de pedidos, como mais verbas para a educação

106
e saúde, contra a corrupção e contra a PEC 37, conhecida como PEC da Impunidade (que proibiria o Ministério Público de
fazer investigações). Outra grande característica dessa mobilização foi a ojeriza a participação de qualquer partido político,
demonstrando a falta de confiança da população nas legendas existentes.

(Congresso Nacional tomado por manifestantes em junho de 2013)

(infográfico expondo os desejos das Manifestações de 2013 e suas consequências)

Tais problemas e o estouro da operação Lava-Jato, deflagrada pela Polícia Federal em março de 2014, a qual expôs ao país
uma série de investigações e denúncias sobre lavagem e desvios de dinheiro público pela Petrobrás, além do pagamento de
propinas a políticos de inúmeros partidos (governistas e oposição) por parte de empreiteiras que buscavam vantagens em
licitações e concorrências de grandes obras públicas.
Tal cenário levou as eleições de 2014 novamente a uma polaridade entre os apoiadores da manutenção do governo e os
seus críticos, os quais se aproveitavam dos esquemas de corrupção revelados a todo o momento pela mídia para atacar o

107
governo. Após um primeiro turno marcado por acusações
e troca de ofensas, o resultado foi: Dilma (PT) (41,6%); Aé-
cio Neves (PSDB) (33,5%); Marina Silva (PSB) (21,3). No
segundo turno, novas denúncias e a crise econômica que
paralisava o país fizeram com que Aécio Neves tivesse um
grande crescimento, levando a eleição a números extrema-
mente apertados em seu resultado final, com Dilma sendo
reeleita com 51,65% dos votos, contra 48,35% de votos
para Aécio Neves. A diferença de votos foi a menor desde a
adoção de segundo turno nas eleições, tendo sido apenas
de 3,5 milhões de votos a diferença entre os dois candida-
tos, o que não representa muito num país de 200 milhões
multimídia: sites
de habitantes.
20anosdoreal.epocanegocios.globo.com/
acervo.oglobo.globo.com/fatos-histori-
cos/da-falta-de-estrutura-fez-se-crise-do-
-apagao-no-brasil-do-inicio-do-seculo-
-xxi-9396417
fernandorodrigues.blogosfera.uol.com.
br/2014/06/16/conheca-a-historia-da-compra-
-de-votos-a-favor-da-emenda-da-reeleicao/
www.infoescola.com/politica/mensalao/
exame.abril.com.br/brasil/mensalao-x-lava-ja-
to-compare-os-casos-que-chocaram-o-brasil/
bolsa-familia.info/fome-zero.html
(Aécio e Dilma no último debate antes do prontopassei.com.br/historia-do-enem
segundo turno das eleições de 2014) www.pac.gov.br
g1.globo.com/brasil/linha-tempo-manifesta-
Dilma teria que começar seu segundo mandato acalmando coes-2013/platb/
um país completamente rachado e tendo que contornar os lavajato.mpf.mp.br/entenda-o-caso
escândalos das denúncias da Lava Jato.

CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

A crise do apagão em 2001, como ficou conhecida a crise de abastecimento energético vivida pelo Brasil durante o go-
verno FHC, foi, na verdade, o ponto final de um problema crônico de falta de investimento nacional no setor energético.
Tal crise acabou por ocorrer realmente após anos de chuvas abaixo da média, o que afetou a principal matriz energética
do país, as usinas hidrelétricas. A gravidade da crise de energia foi enorme, sendo necessária a realização de raciona-
mento e imposição de multas para os “esbanjadores de luz”. Tudo isso ocorreu em 2001 (e novamente em 2015, em
menor escala) devido ao Brasil depender em mais de 75% das usinas hidrelétricas para a geração de energia elétrica.
A eletricidade que chega até nós é gerada, majoritariamente, em usinas hidrelétricas, sendo que, na verdade, ela é re-
sultado de um processo de conversão de energia potencial em energia elétrica. A água que se encontra represada em
grandes barragens armazena energia potencial, ao abrir as comportas da usina, a energia potencial da água vai sendo
convertida em energia cinética, à medida que ela vai escoando pelos dutos. Ao entrar em contato com as turbinas, as
mesmas começam a girar, dando origem à força eletromotriz induzida, processo este que consiste na conversão da ener-
gia cinética das turbinas em energia elétrica, pois em razão da força eletromotriz, será estabelecida uma corrente elétrica
entre dois pontos, gerando a eletricidade. A conclusão é que a energia, na verdade, não é gerada, mas sim transformada.

108
Esquema reproduzindo a transformação de energia em uma usina hidrelétrica

DIAGRAMA DE IDEIAS

NOVA REPÚBLICA
GOVERNOS ITAMAR, FHC, LULA E DILMA

GOVERNO ITAMAR
A
FRANCO (1992-1994)
ECONOMIA
CARACTERÍSTICAS • MINISTRO DA FAZENDA (FERNANDO HENRIQUE CARDOSO)
• VICE DE FERNANDO COLLOR • PLANO REAL
• PMDB • EMPRÉSTIMOS ESTRANGEIROS
• CRISE ECONÔMICA • VALORIZAÇÃO DA MOEDA (REAL)
• CRISE POLÍTICA • CONTROLE DA INFLAÇÃO
• DENÚNCIAS DE CORRUPÇÃO
POLÍTICA INTERNA
• ESTABILIZAÇÃO ECONÔMICA
• CPI DO ORÇAMENTO
POLÍTICA EXTERNA • APROXIMAÇÃO DO GOVERNO COM O PSDB
• ABERTURA DA ECONOMIA À GLOBALIZAÇÃO • ELEIÇÃO DE 1994

X
• PRINCIPAL POLARIZAÇÃO: LULA FHC
• CRIAÇÃO DO MERCOSUL
(PT) (PSDB)

B ERA FHC (1994-2002)


ECONOMIA
CARACTERÍSTICAS • RECESSÃO
• DESEMPREGO • DEFICIT PÚBLICO
• AVANÇO DO NEOLIBERALISMO
• CRISE NA ÁSIA (1997) • DENÚNCIAS DE CORRUPÇÃO
• ESTABILIDADE POLÍTICA
• ACORDOS COM O FMI • LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL
• CRISES SOCIAIS
• PRIVATIZAÇÕES (2000)
• DOIS MANDATOS
POLÍTICAS SOCIAIS
POLÍTICA • QUEBRA NA PATENTE DE MEDICAMENTOS
• BASE ALIADA NO CONGRESSO (CONCESSÃO DE CARGOS) • BOLSA ESCOLA
• EMENDAS CONSTITUCIONAIS • INDENIZAÇÃO A VÍTIMAS DA DITADURA
• QUEBRA DE MONOPÓLIOS
ELEIÇÕES DE 2002
X
• REFORMA TRIBUTÁRIA LULA JOSÉ SERRA
• ALIANÇA DO PT COM EMPRESÁ- (PT) (PSDB)
• REFORMA DA PRESIDÊNCIA
RIOS, SETORES DA ELITE E PMDB
• PEC DA REELEIÇÃO
• PROJETO DE PACTO NACIONAL
• CPI SOBRE CORRUPÇÃO PARLAMENTAR (SEGUNDO MANDATO)
• RUPTURA DO PT E FORMAÇÃO DO PSOL
• SEGUNDO TURNO

109
C GOVERNO LULA (2003-2010)

CARACTERÍSTICAS POLÍTICAS SOCIAIS


• DOIS MANDATOS • PROGRAMA FOME ZERO
• AUMENTO DOS PROGRAMAS SOCIAIS • BOLSA FAMÍLIA
• ESTABILIDADE E CRESCIMENTO ECONÔMICO • PROUNI
• ASCENSÃO SOCIAL DA POPULAÇÃO • FIES
• DIMINUIÇÃO DA FOME E DA POBREZA • MINHA CASA, MINHA VIDA
POLÍTICA EXTERNA ECONOMIA
• COMANDO NA OCUPAÇÃO MILITAR DO HAITI (2004) • PAGAMENTO DE ACORDOS ECONÔMICOS
• PAGAMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA COM O FMI • CONFIANÇA DO SETOR FINANCEIRO
• ESTADO COMO MOTOR DA ECONOMIA – PAC
POLÍTICA INTERNA
• REFORMA DA PREVIDÊNCIA
• ALIANÇA COM GRANDES EMPRESAS
• ALIANÇA COM PMDB
X
DILMA ROUSSEF JOSE SERRA
• ESCÂNDALO DO MENSALÃO (PT) (PSDB)
• ELEIÇÃO DE 2010
• POLARIZAÇÃO DO SEGUNDO TURNO:

GOVERNO DILMA
D
(2011-2016)

• MANUTENÇÃO DAS POLÍTICAS SOCIAIS • OPERAÇÃO LAVA-JATO


• POLÊMICA NA CONSTRUÇÃO DA USINA DE BELO MONTE (PA) • MANIFESTAÇÕES DE JUNHO DE 2013
• COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE (2012) • ELEIÇÕES DE 2014: VITÓRIA APERTADA SOBRE AÉCIO
• PAC 2 NEVES (PSDB)
• ESCÂNDALOS DE CORRUPÇÃO • IMPEACHMENT (2016)
• MENSALÃO

110

Você também pode gostar