Teoria Da Comunicção - PDF

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 65

1

2
Leonardo Vasconcelos de
Araújo

Teoria da Comunicação

1ª Edição
Sobral/2017
3
4
Sumário
Palavra do professor

Sobre o autor

Ambientação

Trocando ideias com os autores

Problematizando

Unidade de Estudo I: Paradigmas Básicos da Comunicação

Conceito de Teoria e Comunicação.

Introdução aos Paradigmas Básicos da Comunicação

Teoria hipodérmica

Abordagem empírico-experimental ou da persuasão.

A abordagem empírica de campo ou dos efeitos limitados

Teoria funcionalista das comunicações de massa.

Teorias Críticas e Escola de Frankfurt

Unidade de Estudo II: As teorias comunicativas

Introdução

O modelo comunicativo da teoria da informação

Modelo comunicativo semiótico-informacional

O modelo semiótico-textual

Unidade de Estudo III: Hipótese do agenda-setting e nova comunicação

Introdução

Revisando

Leitura Obrigatória

Bibliografia Básica

5
6
Palavra do professor

Caro estudante,

Atualmente a comunicação está no contexto mundial em todos os


planos da vida humana, de modo que vivemos em plena “sociedade da
comunicação”. Arrogar-se afirmar que comunicação é a própria sociedade,
através das múltiplas formas por meio das tecnologias desde a primeira
geração tecnológica até as mídias digitais atuais, estas assumiram um papel
incisivo no contexto social, entretanto é quase impossível pensar a vida sem as
redes comunicacionais de midiatização.

As demandas da sociedade provocam os avanços tecnológicos. A


globalização assume dimensão da mundialização em sintonia com as
tendências tecnológicas, e, redimensionado a atuação dos meios de
comunicação alteram profundamente a vida em sociedade.

Nesta disciplina você deve ampliar seu conhecimento a partir de


algumas indicações sobre o caminho que você deve trilhar para apreender
sobre as teorias da comunicação:

 Estudar alguns elementos do processo de comunicação (linguagens e


mídia) com o embasamento da história e das teorias da comunicação;
 Refletir sobre a importância da comunicação e da informação na
educação e na vida social;
 Constituir as categorias de aprendizagem para uma percepção crítica
dos produtos da mídia de massa na sociedade.

O autor!

7
Sobre o autor

Leonardo Vasconcelos de Araújo, Mestre em Comunicação Social e


graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Coordenador da
Instituição Urucum – Direitos Humanos, Comunicação e Justiça, no qual
desenvolve, escreve e executa projetos de comunicação, com enfoque na
temática Terra e Território. É integrante do grupo de pesquisa e Mídia,
Cultura e Política da Universidade Federal do Ceará. Tem experiência na
área de direitos humanos e comunicação, pesquisando sobre mídia,
especialmente a Internet, e movimentos sociais. Atualmente realiza
pesquisa em gênero, performance, corpo e política, com o objetivo de
mapear e compreender a criação, através de processos artísticos, de
resistências e pontos de fuga â subjetividade capitalista.

8
Ambientação

A comunicação se constitui um elemento básico para as afinidades


humanas e para o desenvolvimento humano. Através da comunicação o ser
humano se faz pessoa, se afasta do “eu” para o “nós”. Em seu cotidiano a
comunicação envolve um ethos, que diz respeito à atitude de quem argumenta
e o logos, que significa a racionalidade do sujeito que argumenta.

A comunicação é uma condição humana. Dá sentido as coisas,


interpreta os acontecimentos e busca entender os acontecimentos do mundo. A
comunicação tem por base a mensagem, esta conduz significados e os
receptores decodificam os sentidos, o ato comunicacional produz sentido,
portanto, comunicar é atribuir sentido.

No século XX surgiram os estudos sobre a comunicação de massa,


aforam a pesquisa sobre a função do emissor, nos padrões comunicacionais.
Dessa análise surgiu a teoria da agulha hipodérmica, com evidência a
funcionalista, supondo enorme poder dos meios em conformar o espaço social
em seu entorno.

O poder entre emissor e receptor não pode ser desprezado, porque a


decodificação ocorre nos limites do universo da codificação; a recepção das
mensagens não é fixa, como em teorias funcionalistas. Assim, o público é
percebido como ativo, que produz seus próprios significados, mas não a partir
do nada, pois o significado não circula livremente, não se recebe a mensagem
do “jeito que o receptor quer”.

Bons Estudos!

9
Trocando ideias com os autores

Agora é o momento de você trocar ideias com autores

Sugerimos que você leia o livro Teoria da Comunicação:


conceitos, escolas e tendências. Os autores na primeira
parte apresentam a Epistemologia e as origens históricas da
comunicação, na segunda parte apresentam as correntes
teóricas, paradigmas e tendências das Teorias da
Comunicação.

MARTINO, Luiz C; HOHLFELDT, Antônio; FRANÇA, Vera Veiga. (org’s.)


Teoria da Comunicação: conceitos, escolas e tendências. Edição 10, 2011.

Propomos também a leitura da obra Comunicação


Midiática: matizes, representações e reconfigurações.
O grande tema do momento, tratado neste livro, é o do
eterno diálogo que travamos com o outro, quer seja aquele
que se esconde por detrás de uma enigmática mensagem
eletrônica, quer seja aquele teórico que, por via de
publicação, mostrou caminhos diversos e percebeu
inusitados valores e concepções de mundo e de vida, sob
diferentes aspectos.

PEDROSO, Dafne; COUTINHO, Lúcia; SANTI, Vilson Júnior. (org’s.).


Comunicação Midiática: matizes, representações e reconfigurações. Porto
Alegre. EDIPUCRS, 2011.

10
Paradigmas Básicos da
Comunicação

11
12
Conceito de Teoria e Comunicação

Antes de entrarmos em nosso objeto de investigação, “Teorias da


Comunicação”, é interessante dar alguns passos atrás, a fim de tentarmos
entender para que serve e como se constitui uma teoria, e o que queremos
dizer com o termo “Comunicação” - área de estudo que possui metodologias e
objetos próprios. A partir daí, estaremos mais aptos a compreender o que são e
qual o sentido das Teorias da Comunicação.

Todo estudo científico – seja na Sociologia, na Antropologia ou na


Comunicação, só para citar alguns exemplos - pretende investigar quais as leis
gerais que regulam seu objeto de escolha, ou seja, que relações ele estabelece
com a realidade e quais são suas dinâmicas próprias de funcionamento. Para
tanto, especialmente no caso das ciências sociais, qualquer teorização que se
desenvolva parte da elaboração de sistemas abstratos de categorias que, em
tese, denominam propriedades-chave de um campo de estudo, bem como
dizem algo sobre as relações que se estabelecem entre essas propriedades.
De acordo com o sociólogo Jonathan Turner, “Conceitos abstratos dissecam
propriedades básicas do universo e em seguida as ordenam de modo a
oferecer uma visão da estrutura e da dinâmica do universo” (TURNET, 1999, p.
238).

É por meio, então, da elaboração de modelos esquemáticos que se


tenta interpretar a realidade. E um esquema interpretativo é tanto melhor
quanto mais eventos específicos ele consegue explicar. Uma lei geral da física,
por exemplo, “F = m * a”, pode ser considerada um caso perfeito de modelo
interpretativo, uma vez que ela vale para qualquer evento particular.
Independentemente do objeto, tem-se que quanto maior a aceleração ou a
massa, maior será também a força aplicada a um corpo.

Para as ciências humanas de um modo geral, por lidarem com um


objeto muito mais complexo do que o estudado pelas ciências naturais, a
elaboração de uma teoria, por mais refinada que seja, consegue ser no máximo

13
uma aproximação do fenômeno sobre o qual pretende se debruçar, estando
sempre sujeita a revisões, críticas e reelaborações. Ainda segundo Turner
(1999), a elaboração de uma teoria social, o que obviamente também se aplica
aos estudos das teorias da comunicação, deve obedecer às seguintes
propriedades: representação de características genéricas do universo
estudado; produção de enunciados verificáveis; consideração de processos
causais.

Nesse sentido, para se começar a teorizar sobre a realidade social


(TURNER, 1999), não é suficiente a construção de esquemas analíticos que
representem as propriedades essenciais do universo social em questão; é
preciso, ainda, que seja possível, a partir do esquema elaborado, produzir
enunciados abstratos e verificáveis – como a “Lei de Newton” citada acima. Por
fim, se faz necessário também uma constante adaptação dos processos que
ligam os conceitos advindos do esquema geral às proposições (enunciados)
produzidas. Isso garantiria um mecanismo de constante revisão do esquema
proposto e atualização dos enunciados produzidos sobre o fenômeno que se
pretende analisar.

Mas onde entra a comunicação em tudo que vimos falando até agora?
Como destaca Eduardo Duarte (2003), a comunicação é um campo de saber
relativamente novo, e é por esse motivo que ela ainda passa por tentativas de
atualizações e redefinições conceituais cujo objetivo é dar materialidade e rigor
científico a uma palavra que está presente no vocabulário das pessoas e que
possui diversos contextos de uso e aplicação. Ainda segundo Duarte:

Reanalisar o conceito de comunicação permite a observação


de sentidos que podem ir além da multivariedade
contemporânea de aplicações. Aplicações essas que estão fora
de um bom senso contextual que as unifique, mas dentro do
bom senso do espírito relativista de todos os valores e sentidos
dos nossos dias (DUARTE, 2003, p. 45).

Em outras palavras, com o cuidado de não torná-lo estanque, de uma


multitude de significados que o conceito de comunicação pode assumir, vai nos

14
interessar aquele que permite o delineamento tanto de seu campo, quanto de
seu objeto de estudo.

Josgrilberg (2006) afirma que, principalmente a partir de 1930, houve o


surgimento de várias linhas de pesquisa com o intuito de construir um objeto de
estudo para a comunicação, destacando-se as teorias sistêmicas, as
abordagens dialéticas e, por último, as fenomenológicas.

O filósofo francês Merleau- Ponty vai dar uma contribuição aos estudos
da comunicação ao defini-la como uma partilha, com a construção dialógica de
um sentido comum. Isso não implica dizer que a comunicação é,
necessariamente, a construção de um acordo entre partes, uma vez que, a
elaboração de uma concordância ou discordância é algo de segunda ordem,
posterior ao estabelecimento do terreno comum onde se dá a interação,
mediada pela linguagem. Ainda segundo o filósofo, como destacado por Duarte
(2003), nessa interação entre sujeitos, cada um deixa algo de si; se
desterritorializam para, em seguida, se reterritorializarem novamente. Ou seja,
a comunicação pressupõe um movimento de reconfiguração dos territórios
subjetivos dos sujeitos em interação. Nas palavras de Duarte (2003), a partir da
leitura de Merleau-Ponty, a comunicação:

É um terceiro plano cognitivo que emerge e que não estava


contida inicialmente nos planos de nenhuma das partes, mas
se construiu pela desterritorialização das partes que
reterritorializam um terceiro cogito emergente. A comunicação
então é uma virtualidade que se atualiza na relação (DUARTE,
2003, p. 48).

Outro conceito interessante de comunicação é trazido por Rodrigues


(1994), segundo ele a comunicação, processo de compreensão mútua entre
pessoas dotadas de razão e liberdade, e pertencentes a um mesmo mundo
cultural.

Para determinar os contornos da comunicação como campo de estudo,


além de estabelecer um conceito, faz-se necessário também localizar seus

15
objetos. De acordo com Duarte (2003), a comunicação teria por objeto o
encontro entre planos cognitivos, os quais, por esse mesmo encontro,
estabeleceriam um terceiro plano, ausente antes do encontro das partes em
diálogo.

Nesse sentido, o campo da comunicação pode ser teórico, quando se


debruça sobre os aspectos ontológicos da relação comunicativa; ou empírico,
quando os suportes aos quais os planos cognitivos estão atrelados passam a
ter precedência.

Aqui vale destacar a diferença entre objetos de mídia e objetos da


comunicação. O primeiro diz respeito ao suporte – rádio, televisão, internet –
de veiculação da informação, o que, por si só, não implica no estabelecimento
de um processo comunicacional. Como afirmamos anteriormente, este
pressupõe uma relação, o surgimento de um elemento-síntese (terceiro plano
cognitivo) anterior ao encontro dos planos cognitivos em ação, e que é
decorrência direta deles. Outra diferença importante entre informação e
comunicação, destacada por Rodrigues (1994), é que esta não se dá em uma
relação. Em verdade, ela é uma “realidade relativa que compreende o conjunto
dos acontecimentos que ocorrem no mundo e formam o nosso meio ambiente”
(p. 20-21). Com efeito, ela lida com a natureza complexa dos fenômenos, os
quais, para serem compreendidos, necessitam de uma moldura de sentido,
ainda que provisória, que os localize dentro de um conjunto de símbolos
operáveis.

Para finalizar esse tópico, a partir das ideias e conceitos tratados até
aqui, podemos dizer que uma teoria da comunicação é um esquema (modelo)
analítico que representa as propriedades essenciais do objeto em questão – a
comunicação – e, a partir que, é possível produzir enunciados abstratos e
verificáveis sobre ele; devendo, ainda, haver uma constante adaptação dos
processos que ligam os conceitos advindos do esquema geral às proposições
produzidas a partir dele.

16
Introdução aos Paradigmas Básicos da Comunicação

A comunicação se impõe como matéria de interesse científico a partir


das primeiras décadas do século XX, ainda que com o nome de propaganda.
Isso deveu, em grande medida, aos desenvolvimentos tecnológicos que
começavam a ocorrer. No entanto, foi com o surgimento dos novos meios de
comunicação, como o telégrafo, os quais representaram um meio técnico que
tornou possível a circulação de mensagens, que a comunicação passou a
significar “o intercâmbio tecnologicamente mediado de mensagens na
sociedade” (RÜDIGER, 2011).

Ainda segundo Rüdiger (2011), o interesse das ciências humanas pela


comunicação se deu não apenas por um dever científico de investigação dos
fenômenos sociais em geral, mas pelas várias implicações que o
desenvolvimento da comunicação de massa (mass media) passou a exercer na
vida social. Durante a 2ª Guerra Mundial, por exemplo, seu poder serviu como
meio eficaz para a construção de narrativas e a solidificação de discursos
político-ideológicos tanto pelo estado nazista na Alemanha e pelo fascista na
Itália, com suas máquinas estatais de propaganda, quanto pelos países
aliados.

Não obstante essa constatação é preciso deixar claro que não foram os
mass media que “inventaram” a comunicação. Esta deve ser compreendida
como um “processo social primário” (RÜDIGER, 2011), diante do qual os meios
de comunicação de massa representam sua mediação tecnológica, não
podendo ser com eles confundida.

O esforço encetado neste tópico, de fornecer um panorama das teorias


da comunicação, deve ser entendido a partir de uma perspectiva que considere
tratar-se a comunicação de um objeto em constante mutação, propondo
problemas novos e complexos, que exigem um esforço multidisciplinar de
tratamento. Por isso, não causa surpresa a existência de tantos pontos de
vista, métodos de investigação e teorias discordantes entre si. Nesse sentido,

17
uma síntese exaustiva das teorias da comunicação seria praticamente
impossível, ainda mais levando em conta a exiguidade de espaço e o objetivo
do presente trabalho.

O que nos propomos a fazer aqui é oferecer um apanhado geral das


principais correntes de pesquisa destacadas pela literatura sobre as teorias da
comunicação. É preciso levar em consideração também, como destaca Rüdiger
(2011), que muitas das teorias tradicionalmente consideradas - comunidade de
recepção, newsmaking e agenda-setting – são melhores entendidas, na
verdade, como “construtos metodológicos de projetos de pesquisa empírica”
(RÜDIGER, 2011). Essa discussão, no entanto, não nos interessará em nosso
trabalho, constando na bibliografia indicada para maiores aprofundamentos.

Teoria hipodérmica

Também conhecida como Teoria da Bala Mágica (Bullet Theory) ou


Teoria da Correia de Transmissão, ela tem por fundamento a noção de que
cada indivíduo é atingido diretamente pela mensagem. Os meios de
comunicação de massa (LUCAS, 2010) seriam, portanto, instâncias que
produziriam “respostas” de uma audiência, a partir da criação de “estímulos”
vindos de um emissor.

A emergência dessa teoria pode ser situada historicamente no período


das duas grandes guerras mundiais, quando a propaganda, quase tanto quanto
as armas de destruição em massa passaram a ter um impacto global,
influenciando a conformação da subjetividade coletiva. Vivia-se, nesse período,
o contexto do que pode ser considerado o início da comunicação de massa, a
qual esteve vinculada as experiências políticas totalitárias.

18
A teoria hipodérmica pode ser conceituada como “uma abordagem
global aos mass media, indiferente à diversidade existente entre os vários
meios e que responde, sobretudo à interrogação: que efeito tem os mass
media numa sociedade de massa?” (WOLF, p. 23, 1999).

A teoria hipodérmica era embasada por uma teoria da sociedade de


massas, enquanto no aspecto comunicativo operava por uma teoria psicológica
da ação (WOLF, 1999). No que toca a seu embasamento social, é importante
salientar alguns aspectos da teoria da sociedade de massas que se imbricam
profundamente com o modelo comunicativo da teoria hipodérmica, o qual será
discutido com detalhes mais a frente.

Wolf (1999) ressalta que “sociedade de massas” é um conceito guarda-


chuva, abrigando em si desenvolvimentos teóricos e correntes diversas de
pensamento. Em uma de suas acepções, de caráter mais conservador, a
sociedade de massas seria consequência do avanço da sociedade industrial,
que trouxe em seu esteio o desenvolvimento dos transportes, do comércio e
dos meios de comunicação, bem como de valores humanistas, legados pelo
iluminismo, como a liberdade e a igualdade. Isso, de certa forma, contribui para
que esses direitos fundamentais passassem a ser extensíveis a um número
maior de pessoas, provocando, em certa medida, a perda de alguns privilégios
por parte das elites, que agora estariam expostas às massas. A consequência

19
da entrada em cena desse novo ator político seria o enfraquecimento dos laços
tradicionais, o que acarretaria um enfraquecimento do tecido social como um
todo, preparando o terreno para o isolamento e a alienação das massas. De
acordo com essa visão, as massas seriam formadas por um aglomerado de
indivíduos com poucas ou nenhumas ligações entre si, restando, portanto,
indefesos frente às ingerências dos grupos de poder, sejam eles econômicos
ou políticos.

Nessa mesma linha Ortega y Gasset (1930 apud WOLF, 1999),


destaca que o “homem-massa” se distanciaria do indivíduo burguês, com sua
cultura e valores humanistas, ao basear seu saber na técnica e no saber
especializado. Nesse sentido, o “homem-massa” seria incapaz de uma reflexão
autônoma sobre sua própria condição, agindo egoisticamente em prol de seu
próprio bem-estar.

Segundo o pensamento da época, estamos falando do começo do


século XX, a massa representaria uma forma de organização primitiva, capaz
de se orientar apenas por objetivos finalísticos imediatos. Seria uma
consequência indesejada da evolução da sociedade capitalista. De acordo com
essa noção, a massa seria composta “por pessoas que não se conhecem, que
estão separadas umas das outras no espaço e que têm poucas ou nenhumas
possibilidades de exercer uma ação ou uma influência recíproca” (WOLF,
1999).

Essa ideia – do indivíduo isolado dentro de uma massa desorganizada


e indivisa – implica em uma teoria psicológica da ação calcada no
behaviorismo, segundo o qual organismo e ambiente interagem por meio do
mecanismo “estímulo-resposta” (E => R). Todo estímulo, então, sendo formado
por objetos e condições que estão fora do sujeito, seria capaz de provocar uma
resposta. Essa é como vimos a base, do modelo comunicativo da teoria
hipodérmica.

Segundo Wolf:

20
Os meios de persuasão de massa constituíam, de fato, um
fenômeno completamente novo, desconhecido, sobre o qual o
público ainda não tinha conhecimentos suficientes, e o contexto
social em que tais meios apareciam e eram utilizados era o dos
regimes totalitários ou de sociedades que se estavam a
organizar em torno da destruição das formas comunitárias
anteriores. Nesse contexto, grandes massas de indivíduos
eram representadas, segundo hábitos de pensamento
heterogéneos, mas concordantes neste ponto, como
atomizadas, alienadas, primitivas (WOLF, 1999, p. 28).

Abordagem empírico-experimental ou da persuasão

Como o próprio nome diz aqui não se trata tanto de uma teoria
comunicativa, como de uma abordagem, ou seja, um método cujos
desenvolvimentos se fiaram na vasta utilização de pesquisas empíricas. Nesse
tópico, reunimos, seguindo a orientação de Wolf (1999), as principais
características que se tem escrito sobre os resultados desses estudos, em
forma de um corpo de saber organizado.

Apesar de ser contemporânea a teoria hipodérmica e ter se valido, em


vários níveis, de suas contribuições, a abordagem empírico-experimental
representou a superação da primeira, isso porque operou uma extensa revisão
dos processos comunicativos que entendiam a comunicação a partir de
esquemas mecanicistas e estritamente causais, deixando passar ao largo, a
complexidade dos elementos em relação, nomeadamente: emissor, receptor e
mensagem. Segundo Wolf (1999, p. 34), “A abordagem deixa de ser global,
incidindo sobre todo o universo dos meios de comunicação e passa a apontar,
por um lado, para o estudo da sua eficácia persuasiva ótima e, por outro, para
a explicação do insucesso das tentativas de persuasão”.

21
Diferentemente da teoria hipodérmica, que parte do pressuposto de
que a mensagem chega e é absorvida pelo receptor sem que este possa opor-
lhe qualquer resistência, na abordagem empírico-experimental, a persuasão
que a mensagem é capaz de causar a quem chega não é um fato dado. Há a
compressão, portanto, de que uma mensagem é capaz sim de persuadir um
destinatário, desde que sua forma consiga, de alguma forma, ressonar com sua
subjetividade, ou seja, que seja capaz de estabelecer uma conexão com seu
universo cultural e características pessoais.

A teoria resultante da abordagem aqui discutida é orientada por duas


coordenadas. A primeira se interessa pelas características do destinatário que
podem intervir no efeito que a mensagem lhe causa, enquanto a segunda se
preocupa com a organização das mensagens para que atinjam o melhor efeito
persuasivo possível (WOLF, 1999). Daí pode-se perceber que ela possui um
viés explicitamente psicológico, uma vez que, leva em conta as características
particulares dos indivíduos como variáveis que afetam o grau de persuasão da
mensagem. Essa característica representa a principal diferença relativamente à
teoria hipodérmica, já que ambas se valem do mesmo modelo comunicacional
“estímulo-resposta”.

Isso implica em uma abordagem de estudo que deixa de ser global,


para se tornar particularizada, a fim de compreender a melhor maneira de

22
tornar uma mensagem persuasiva, ao mesmo tempo em que se preocupa em
entender, em caso de insucesso, os fatores responsáveis por isso.

A teoria dos mass media desenvolvida a partir da abordagem empírico-


experimental vai levar em conta, portanto, fatores tanto relativos à audiência
(seu interesse em obter informação, a exposição seletiva a qual é submetida, a
seletividade de sua percepção e de sua memorização em relação à
mensagem) quanto à mensagem (credibilidade do comunicador, ordem da
argumentação e sua integralidade, a explicitação das conclusões) (WOLF,
1999).

Ela destaca a importância que o interesse do indivíduo exerce no


sucesso da recepção da informação. Para que uma mensagem seja efetiva,
portanto, é necessário que ela se mostre relevante para a audiência que com
ela irá travar contato. Essa teoria leva em consideração também que tipos de
veículos chegam a determinado público, entendendo que o nível de acesso às
mídias varia de acordo com fatores sociais como classe, gênero e educação.
Passa a haver a noção de um público-alvo, de que o grau de persuasão da
mensagem varia também de acordo com a mídia utilizada para a veiculação da
mensagem. Não foge de suas considerações analíticas o fato de que, ao ter
contato com uma mensagem, o receptor não está despido de suas inclinações
e interesses pessoais. O que também vale para a memorização das
mensagens, sendo aquelas que estão de acordo com as tendências e
percepções dos indivíduos mais facilmente lembradas, do que outras que
trazem elementos discordantes ou culturalmente distantes.

A credibilidade do comunicador, considerando aos fatores ligados à


mensagem, é outro dado que se impõe. Não é possível negar, por exemplo,
que parte do critério para se chegar à construção do conceito da veracidade de
uma informação que diz respeito a quem a veicula. Em geral, os grandes
veículos de comunicação, seja no impresso (Folha de São Paulo, O Estado de
São Paulo, O Povo, Jornal Correio da Semana), na televisão (Globo, Record,
Sbt) ou no rádio gozam do status privilegiado de enunciador legítimo, o que
confere às mensagens por eles veiculadas um maior grau de persuasão frente

23
à audiência. A ordem de exposição dos argumentos é uma variável de
influência para a persuasão de uma mensagem, especialmente, quando o que
está em jogo é o cotejamento de argumentos opostos. Fala-se do efeito
primacy (primazia), quando se verifica uma maior eficácia dos argumentos
expostos incialmente. O efeito recency (aquilo que tem caráter recente) se
verifica quando os argumentos finais acabam por se mostrar mais eficientes.

Em resumo, a teoria decorrente da abordagem empírico-experimental


direciona sua preocupação analítica não só para emissor, como também para o
receptor e o conteúdo da mensagem, reconhecendo o poder potencialmente
persuasivo de uma informação, desde que levada em consideração as
especificidades da audiência e suas características psicológicas.

A teoria empírica de campo ou dos efeitos limitados

Essa teoria não chega a contradizer a abordagem que de tratamos no


tópico anterior, sendo mais bem entendida como uma proposta que adiciona
outra camada analítica às consideradas pela abordagem empírico-
experimental. Sem desconsiderar seu viés psicológico, entendido como uma
contribuição importante para o estudo das especificidades dos elementos que
compõe o processo comunicativo, com ênfase no receptor e na mensagem,
essa perspectiva marca o início da “pesquisa sociológica empírica sobre as
comunicações de massa” (WOLF, 1999, p. 47).

24
O nome consolidado para fazer referência a essa teoria pode dar a
entender que sua única preocupação é entender os efeitos das mensagens.
Mas o fato é que, na verdade, ela está interessada em processos sociais mais
amplos, os quais fogem a uma abordagem teórica calcada puramente em um
viés psicológico. Para Wolf (1999, p. 47), essa teoria “consiste em associar
processos de comunicação de massa às características do contexto social em
que esses processos se realizam”.

Nessa teoria, é possível destacar a existência de duas correntes. A


primeira delas vai investigar a composição diferenciada dos públicos, bem
como os modos pelos quais cada um deles consome as comunicações de
massa; enquanto a segunda se refere às mediações sociais que caracterizam
esse consumo, o que significa dizer que, para que os mass media sejam
devidamente analisados, deve-se considerar o contexto social em que eles
funcionam (WOLF, 1999).

As pesquisas que se aliam a primeira corrente conseguem demonstrar


um nível de complexidade superior às teorias que vimos até agora, por não
desconsiderar o meio social onde se dá a relação entre os elementos que
compõem o processo comunicacional (emissor-receptor-mensagem). Um
trabalho que procure determinar os fatores que condicionam a preferência por

25
uma determinada mídia vai levar em consideração, por exemplo, não só as
características individuais de uma audiência em particular, mas também as
relações entre seus hábitos de consumo e o estrato social onde podem ser
localizada. Além dessa variável específica, outras tantas podem ser
estabelecidas (gênero, idade, nível de escolaridade, profissão), conferindo um
maior poder analítico e acuidade à pesquisa.

As pesquisas ligadas a segunda corrente se detém em demonstrar que


os efeitos causados pelos mass media estão vinculados às forças sociais que
se impõem em um período determinado. Desse modo Wolf diz:

A teoria dos efeitos limitados deixa de salientar a relação


causal direta entre propagandas de massas e manipulação da
audiência para passar a insistir num processo indireto de
influência em que as dinâmicas sociais se intersectam com os
processos comunicativos. Na realidade, as pesquisas mais
famosas e notáveis que expõem esta teoria nem sequer se
dedicaram a estudar especificamente os mass media, mas
fenômenos sociais mais amplos, ou seja, os processos de
formação de opinião, no seio de determinadas comunidades
sociais (WOLF, 1999, p. 51).

Essa teoria põe em destaque o papel dos líderes de opinião na


assimilação da mensagem, além de ter contribuído para o desenvolvimento do
modelo comunicativo do two step flow (fluxo de comunicação em dois níveis).
Por meio desses dois aspectos evidenciou-se que a formação de opinião, ou
seja, o efeito que uma mensagem provoca ao atingir uma audiência possui
uma lógica mais complexa do que a considerada pela teoria hipodérmica.
Segundo esta, os efeitos de uma mensagem se dão em um nível individual,
desconsiderando-se qualquer diferenciação ou hierarquia possível entre os
receptores. Para a teoria dos efeitos, ao contrário, os efeitos provocados por
uma mensagem se organiza através de uma lógica que leva em consideração
a rede de relações formadas pelos indivíduos.

Segundo o modelo do two-step flow, certos indivíduos, por


apresentarem um maior nível de interesse e de conhecimentos, se constituem
como pontos nodais nas redes de relações das quais fazem parte, posição, a
26
partir da qual, influenciam os demais indivíduos que as conformam. Segundo
uma pesquisa destacada por Wolf (1999) – The Peolpe’s Choice. How the
Voter Makes up his Mind in a Presidential Campaign (A escolha popular. Como
os eleitores se decidem em uma campanha presidencial), realizada no ano de
1944, a qual inspirou o referido modelo, os líderes de opinião ocupam um lugar
privilegiado na formação de atitude de votos das pessoas.

Para entender melhor a diferença entre o modelo comunicativo que


orienta a teoria hipodérmica e o que orienta a teoria dos efeitos, vejamos o
seguinte esquema citado por Katz-Lazasrfeld (1955):

Mass media Mass media

Teoria Hipodérmica Teoria dos efeitos limitados

No primeiro, é possível observar que a lógica comunicativa é primária,


obedecendo a um esquema emissor-receptor, sem intermediários. Ao receber
a mensagem, cada indivíduo, isoladamente, é afetado por ela da mesma forma.
No caso do modelo do two-step flow, podemos ver que os círculos maiores
representam os formadores de opinião, que cumprem a função, como afirmado
acima, de pontos nodais de suas redes de relações.

Para encerrar, gostaríamos de salientar mais uma vez que a teoria da


experimentação de campo ou dos efeitos limitados buscou evidenciar a
influência do campo social no modo como às comunicações de massa operam,
uma vez que, ela produziu o “enraizamento completo e total dos processos
comunicativos de massa em quadros sociais muito complexos, nos quais

27
existem variáveis econômicas, sociológicas e psicológicas que exercem uma
ação constante” (WOLF, 1999, p. 55).

Teoria funcionalista das comunicações de massa

Antes de discutirmos propriamente o objeto deste tópico, é importante


recuarmos um pouco, a fim de apresentar a teoria social que fundamenta esse
modelo comunicativo.

O funcionalismo é uma corrente do pensamento sociológico que


defende que os processos de ação social se estruturam por meio de sistemas,
os quais têm por função amenizar as tensões da vida em sociedade, mantendo
seu equilíbrio. Através dessa concepção, a sociedade deve ser entendida como
um sistema complexo, organizados em vários níveis para garantir a dinâmica
da vida em comum (RÜDIGER, 2011).

Desse modo, considerando a sociedade como um organismo vivo,


cujos “órgãos” podem ser entendidos como partes (instituições) que
desempenham um papel em prol do equilíbrio do todo, o funcionalismo é uma
proposição teórica ligada diretamente à sociologia de Émile Durkheim.

Com respeito à aplicação da teoria funcionalista aos mass media,


pode-se dizer que ela representa uma abordagem global aos meios de
comunicação de massa, pois destaca, neles, a relação função/sistema.
Segundo Wolf (1999), é essa característica que a diferencia de outras teorias
da comunicação, porque o que está em foco, aqui, não é mais os efeitos e sim
as funções desempenhadas pela comunicação de massa na sociedade.

28
Ainda segundo Wolf (1999), para o funcionalismo, a lógica que regula
os fenômenos sociais obedece às relações de funcionalidade que norteiam a
solução de quatro problemas centrais em todo sistema social, quais sejam, a
manutenção do modelo e o controle das tensões, adaptação ao ambiente, o
alcance dos objetivos pelos modelos sociais e a conexão das partes que
compõe o sistema.

Em resumo, o que interessa ao funcionalismo é entender como as


partes que integram um sistema social se relacionam entre si para garantir o
equilíbrio dinâmico da sociedade. Nesse quadro teórico, a comunicação teria o
papel de garantir que esse equilíbrio fosse alcançado através das trocas
simbólicas entre os sujeitos, uma vez que, é a base de interação entre as
pessoas.

O sociólogo Harold Lasswell foi quem primeiro definiu a estrutura e a


função da comunicação, estabelecendo os paradigmas dos estudos teóricos
sobre a comunicação de massa a partir de um ponto de vista funcionalista. Se
para teoria hipodérmica, o emissor, ao emitir “estímulos” (mensagens) para o
receptor, não encontra qualquer resistência deste, com a evolução dos estudos
da comunicação começou-se a explicitar as diversas resistências que os
destinatários opunham às mensagens que lhes chegavam. Como salientamos

29
acima, a teoria hipodérmica apresentava uma visão muito primária de como se
dava a comunicação entre emissor e receptor, ao tirar destes últimos qualquer
poder de agência frente às ideias e mensagens que lhes chegavam.

Lasswell entendia que a comunicação se constituía em um processo


intencional, por meio das quais pessoas procuravam influenciar outras,
valendo-se da transmissão de mensagens (RÜDIGER, 2011). Dessa forma,
segundo Lasswell, comunicação seria toda ação que responderia as seguintes
perguntas: Quem? Diz o quê? Em que canal? Para quem? Com que efeito?
(1948 apud RÜDIGER, 2011).

Cada uma dessas variáveis define uma parte específica da pesquisa. A


primeira (“Quem?”) caracteriza o estudo dos emissores; a segunda (“Diz o
quê?”), diz respeito à análise do que está contido nas mensagens; a terceira
(“Através de que canal?”) se refere à análise dos meios, ou seja, os tipos de
mídia que servem de suporte ao que está sendo veiculado; a quarta, por fim,
trata dos outros módulos da pesquisa de processos comunicativos de massa
(WOLF, 1999).

Lasswell preocupava-se com o papel da mídia na sociedade,


entendendo que ela exercia três funções: generalização do conhecimento
comum; correlação das partes sociais; e transmissão da herança cultural.

De acordo com a primeira dessas funções, a comunicação permitiria as


pessoas dotarem-se de conhecimentos importantes para sua condução social,
tendo mais condições, assim, de fazer frente aos problemas comuns. A
segunda função da era de ajustar o contato entre as pessoas, coordenando
seus comportamentos e, dessa forma, melhorando a reposta coletiva diante de
problemas sociais. A terceira função era a de manter a coesão social, tendo a
comunicação papel importante no processo de coesão social.

Como destaca Rüdiger (1999), para Lasswell

30
A comunicação constitui, portanto, um processo que visa, em
essência, a minimizar as tensões e reduzir a complexidade dos
problemas da interação social; que, embora, por vezes, veicule
certas disfunções, visa, em última instância, a conter as
tendências à desintegração do sistema social (p. 60).

Para o modelo de Lasswell, portanto, entre o qual tinha como modelo


teórico subjacente o funcionalismo, o receptor da mensagem estava longe de
ser essa figura frágil, isolada e individualista representada pelo “homem-
massa” da teoria da sociedade de massa, no qual nada podia contra poder dos
mass media. Neste modelo, a sociedade era entendida como um organismo
vivo, que cada parte mantinha-se em um contínuo processo de comunicação,
tendo por o bom funcionamento do organismo social como todo. Nesse sentido,
a comunicação servia, conforme vimos acima, como uma ferramenta poderosa
para a garantia do funcionamento do corpo social, ao oferecer instâncias de
interação, capazes de produzir ajustes e reorientação de comportamento em
uma escala macrossocial, essencial a produção de uma resposta coordenada e
harmônica frente a um cenário social cada vez mais complexo e interligado.

O sociólogo americano Wilbur Schramm, aprofundando as críticas ao


modelo da teoria hipodérmica, destaca a permutatividade entre as posições
ocupadas por emissores e receptores, considerando que a comunicação não
se realiza de maneira finalística, ou seja, que ela não se constitui como algo
que se dê fora do âmbito de interação social, representando elemento
essencial da “rede de interação societária” (RÜDIGER, 2011, p. 63).

Essa concepção provocou uma revisão no modelo proposto por


Lasswell, uma vez que, se deixou de reputar às mensagens a capacidade de
provocar uma mudança qualitativa no comportamento das pessoas,
relativizando a relação causa e efeito, que constituía o núcleo da teoria
hipodérmica, e que ainda influenciava outras abordagens teóricas como a de
Lasswell. Com Schramm, as estruturas sociais passaram a ter maior relevância
para entendimento do efeito das comunicações de massa, a qual passou a ser

31
compreendida em um esquema teórico mais amplo do que o estabelecido pela
relação emissor-mensagem-receptor.

Nesse sentido, o processo comunicativo passou a ser considerado como:

...estruturado socialmente; comunicador e receptor não são


figuras descarnadas, mas pessoas que se comunicam como
membros do grupo social em que vivem e com o qual ligam seu
destino. Os indivíduos se socializam e vinculam seu modo de
vida a certos grupos durante sua vida, partilhando com eles
suas experiências, valores e padrões de comportamento, na
medida em que estes grupos constituem o meio em que
satisfazem suas diversas necessidades sociais (RÜDIGER,
2011, p. 63).

Parsons também ofereceu contribuição essencial à teoria das mídias


de viés funcionalista, ao introduzir as contribuições da teoria dos sistemas para
seu objeto de estudo, caminho que, posteriormente, foi aprofundado por
Luhmann. Esse teórico entendia que a comunicação não podia ser reduzida a
produção, veiculação e recepção das mensagens, constituindo-se como um
processo complexo, estruturado em determinados códigos, os quais, criados
previamente, possibilitavam que a comunicação pudesse não só ocorrer, como
fosse bem sucedida.

Para Luhmann, a comunicação é imprescindível para os sistemas


sociais, uma vez que estes, para sua própria manutenção, necessitam que haja
uma correlação de atividades entre os indivíduos, o que só pode ser
conseguido por meio da interação entre os indivíduos. A comunicação surge,
portanto, para possibilitar as trocas simbólicas dentre um sistema social, o qual,
por sua natureza complexa, está constantemente sujeito a desajustes e
desestabilizações, sendo necessárias adaptações permanentes para a
manutenção do tecido social e as demandas de escala suscitadas pela vida
coletiva. De acordo com Rüdiger (2011), as formas generalizadas de
comunicação - envolvendo tanto a comunicação de indivíduo para indivíduo,
quanto às comunicações de massa – constituem “mecanismos de controle
sistêmico ou codificações simbólicas da ação, que regulam os processos de

32
interação, determinando o modo como pode se comunicar com sucesso” (p.
69).

Para saber mais:


http://www.infoamerica.org/documentos_pdf/luhmann_05.pdf

Teorias Críticas e Escola de Frankfurt

Assim como fizemos no tópico passado, antes de falarmos das


contribuições da Escola de Frankfurt para os estudos da comunicação, faz-se
necessário remontar alguns de seus antecedentes teóricos.

Para Honneth (1999), a teoria crítica assume uma posição de destaque


entre as diversas teorias que buscaram desenvolver o pensamento marxista.
Isso se deveu não tanto a seu objeto teórico – uma vez que se tratava, acima
de tudo, de uma tentativa de entendimento do fenômeno social – mas sim de
seu objeto metodológico. A escola de Frankfurt, muito mais do que as
elaborações analíticas anteriores, se valeu de conhecimento amplo das
ciências sociais. De acordo com Honneth, “a utilização sistemática de todas as
disciplinas de pesquisa da ciência social no desenvolvimento de uma teoria
materialista da sociedade foi o principal objetivo da teoria crítica” (HOMMETH,
1999, p. 505).

Em outras palavras, a escola de Frankfurt tinha por objetivo


desenvolver uma teoria que continuasse os caminhos trilhados pelo
pensamento marxista, e, para isso, ela se valeu de todas as disciplinas da
ciência social que estavam à mão.

33
Uma teoria que se propunha interdisciplinar e que requeria
contribuições de intelectuais de diferentes áreas encontrou na Frankfurt dos
anos 20 um clima propício para o debate acadêmico e para o encontro de
ideias. Desse modo, Frankfurt acabou nomeando o círculo, ou melhor, a escola
a que pertenciam esses pensadores sociais, os quais possuíam vínculo com o
Instituto para a Pesquisa Social. Os principais nomes mais representativos da
Escola de Frankfurt foram: Theodor W. Adorno, Max Horkheimer, Herbert
Marcuse, Erich Fromm, Walter Benjamin, Siegfried Kracauer.

Dentro de um viés assumidamente marxista, a teoria crítica criticava a


oposição “indivíduo/sociedade”, ao afirmar que ela era, na verdade, fruto da
divisão de classes. Ela partia, portando, de uma crítica dialética da economia
política (WOLF, 1999), ou seja, de uma análise marxista da economia, bem
como suas implicações sociais, colocando em destaque temas como
desemprego, crises econômicas, militarismo, nas relações de produção, só
para citar alguns exemplos.

Além disso, a teoria crítica se propunha a comportar, em si, meios que


garantissem uma atitude crítica sobre seu próprio fazer científico; pregava
também que a reflexão jamais poderia perder de vista as tensões que se
estabelecem entre instituições sociais e a vida das pessoas, de modo a permitir
o surgimento de condições de possibilidade de diminuir a pressão das
primeiras sobre as últimas.

No que concerne aos estudos do mass media, a Escola de Frankfurt


representou uma crítica ao funcionalismo e a pesquisa administrativa dos
meios de comunicação desenvolvida pela teoria americana. No âmbito da
comunicação, essa última possui três fases: teoria dos efeitos ilimitados
(representados pela Teoria Hipodérmica); teoria dos efeitos limitados e
revalorização dos efeitos da Mídia (correspondendo ao período da década de
70 até os dias de hoje) (BOTELHO, 2004). Desse modo, para os teóricos de
Frankfurt, a pesquisa administrativa, possuindo um caráter majoritariamente
empírico, se limitava a estudar as condições em que se dava o monopólio da
indústria cultural, em vez de, refletir sobre sua estrutura, seu funcionamento e

34
dinâmica histórica de constituição. Os dados colhidos em campo,
empiricamente, não seriam capazes, por si só, de evidenciar “as ligações com
a dinâmica histórica” (WOLF, 1999, p, 94), ou seja, não seriam capazes de
evidências como se constituiu o sistema social, tampouco sua relação com o
sistema econômico.

Ainda outro traço legado pela teoria crítica foi o entendimento, baseado
na dialética da razão, de que o projeto modernista de emancipação intelectual
do homem, acabou por produzir o seu contrário, ou seja, uma racionalização da
dominação e a reificação do homem (RÜDIGER, 2011). Nesse quadro, a
comunicação seria um elemento central para a sistematização dessa
dominação, estando submetida à lógica das trocas mercantis e do sistema
capitalista.

O conceito de indústria cultural surge em decorrência dessa


perspectiva. Por meio dela, cada produto cultural (filmes, jornais, programas de
rádio e TV) constitui parte de um sistema de dominação ideológico, por meio do
qual as mídias de massa proveriam o público com conteúdos de baixa
qualidade e estandardizados, mantendo-o preso a um círculo de manipulação e
necessidade, que, em último caso, visa eliminar o espírito crítico e a
capacidade de reflexão dos consumidores. De acordo com essa visão -
assemelhada, de certa maneira, à vulnerabilidade que os sujeitos se
encontravam frente ao poder do emissor da mensagem, estabelecida pela
Teoria Hipodérmica – o indivíduo não seria mais do que um mero objeto de
dominação das normas sociais. Incapaz de decidir de uma maneira autônoma,
ao indivíduo só restaria uma adesão acrítica aos valores impostos
verticalmente. Manipulado pela sociedade, as pessoas pouco poderiam fazer
diante de suas condicionantes, mobilizadas pela dinâmica do sistema
econômico capitalista.

Ainda a segunda teoria crítica, não seria nem mesmo possível às


pessoas uma fuga das atividades desenvolvidas fora do espaço de trabalho,
uma vez que, “a mecanização determina tão integralmente o fabrico dos
produtos de divertimento que aquilo que se consome são apenas cópias e

35
reproduções do próprio processo de trabalho” (Wolf, 1999, p. 86). Para a teoria
crítica, portanto, mesmo em nossos momentos de lazer continuamos presos
nas engrenagens dos processos produtivos, os quais teriam objetivo disciplinar
e normalizar comportamentos.

Nesse sentido, os objetos produzidos pela indústria cultural


eliminariam, nas pessoas, a capacidade de refletir sobre sua própria condição,
mobilizando um processo de captura simbólica intenso ao ponto de provocar
uma confusão entre necessidades institucionais, ou seja, aquelas sem as quais
o sistema não poderia sobreviver, e as necessidades subjetivas e individuais
de cada um dos sujeitos sociais.

No que toca aos efeitos dos meios de comunicação, a teoria crítica


chama atenção para a estrutura multiestratificada das mensagens, com uma
estratégia de manipulação da indústria cultural. Desse modo, embora as
mensagens veiculadas em filmes e programas de televisão, por exemplo,
possam parecer, a primeira vista, distantes de um discurso totalitário, na
verdade elas se aproximam dele, à medida que induzem estados de inércia
intelectual.

Apesar de suas inúmeras contribuições ao pensamento social e aos


estudos de comunicação, mais especificamente, à teoria crítica podem ser
feitas algumas críticas. A primeira que pode ser levantada diz respeito ao papel
atribuído a cultura, relegada à componente funcional de dominação.

Outra crítica que pode ser levantada é a desconsideração de um papel


ativo dos indivíduos submetidos aos produtos da indústria cultural, os quais
parecem estar completamente a mercê de suas estratégias de dominação e
manipulação. A teoria crítica também esposava um pensamento muito elitista
da arte, ao afirmar que esta, se pretendesse ser verdadeira, não poderia ir de
encontro às massas, devendo privilegiar a comoção em contraposição à
emoção. Para Adorno, filósofo que refletiu bastante sobre a estética, a arte só
poderia reivindicar sua legitimidade quando não participasse da comunicação.

36
Por fim, ao enxergar a indústria cultural como um “sistema”, a teoria
crítica deixa passar muitas das contradições que lhe são inerentes, além de
desconsiderar os aspectos da vida social que ela reproduz, o que implica uma
visão dos meios de comunicação como ferramentas de dominação totalitária,
contra as quais estaríamos todos indefesos.

Teoria culturológica

Paralelamente a consolidação dos estudos desenvolvidos no Instituto


para a Pesquisa Social pela Escola de Frankfurt, desenvolveu-se na França
outra abordagem aos estudos de comunicação, a qual ficou conhecida como
teoria culturológica. A preocupação com a cultura de massa ganha traços
antropológicos, ao centrar seu objeto de análise na relação entre consumidor e
objeto de consumo.

Desse modo, como ressalta Wolf (1999), a teoria culturológica apenas


indiretamente diz respeito aos mass media, uma vez que, confere sua
importância destacada à preocupação de definir o novo tipo de cultura da
sociedade contemporânea.

O sociólogo francês Edgar Morin inaugura essa abordagem de


pesquisa com a obra “Indústria Cultural” de 1962, defendendo que as
perspectivas teóricas que se valem da categoria “cultura de massa” deixam de
entender o problema da cultura de massa, ou por desconsiderarem dados
históricos ou por produzirem pesquisas extremamente particularizadas.

Metodologicamente, a teoria culturológica se afastava da pesquisa


administrativa ao apontar para a necessidade de uma análise totalizante,
entendo a cultura de massa como uma categoria não redutível a alguns dados
essenciais, produzidos por meio de estudos empíricos localizados. Para Morin
(1962), a cultura de massa deveria ser entendida, portanto, no
entrecruzamento de três vetores teóricos: cultura, história e civilização. Essa
abordagem sistêmica fazia par com o objetivo do autor francês de elaborar uma

37
sociologia da cultura contemporânea e que, ao mesmo tempo, não caísse no
que Wolf (1999) considera um falso dilema que se associa à maneira como a
sociologia tradicional aborda a cultura de massa: estabelecendo uma clivagem
dos aspectos positivos e negativos que a constituem.

Ao mesmo tempo, a teoria culturológica se contrapõe à teoria crítica ao


problematizar o entendimento da indústria cultural como um dos elementos do
sistema de dominação do sujeito. Para os culturólogos, a cultura de massa não
obedece ao esquematismo proposto pela Escola de Frankfurt, segundo o qual
a agência dos indivíduos sequer era considerada dentro da dinâmica de
consumo dos produtos culturais. Ao contrário, para esses autores, a cultura de
massa não se configurava como esse polo irradiador das ondas de captura do
poder instituído, servindo para as pessoas, muitas vezes, como uma forma de
autorrealização do que lhes é negado na vida real.

Morin (1962) destaca outro aspecto muito importante da cultura de


massa ao afirmá-la não como o único sistema de cultura – agregado de
valores, símbolos, mitos e imagens coletivas – mas como um dos sistemas de
cultura da sociedade contemporânea, as quais se configuram como realidades
policulturais. Nas palavras de Morin,

A cultura de massa não é autônoma no sentido absoluto do


termo, pode embeber-se de cultura nacional, religiosa ou
humanística e, por sua vez, penetrar na cultura nacional,
religiosa ou humanística. Não é a única cultura do século XX,
mas é a corrente verdadeiramente de massa e
verdadeiramente nova do séc. XX (MORIN, 1962, p. 8).

Nesse sentido, a cultura de massa corromperia e desagregaria as


outras culturas, as quais não saíram intactas desse contato. A perspectiva
culturológica está assentada em duas contradições do sistema industrial que
tem implicações na cultura, as quais podem ser localizadas no âmbito da
produção e do consumo, ou seja, a oposição entre processos de
estandardização produtiva e exigências de individualização. A industrial
cultural, dessa forma, operaria sempre a partir dessas duas tendências, e o que

38
possibilitaria a organização burocrático-industrial seria a estrutura do imaginário
do público consumidor com seus arquétipos1, que transformados em
estereótipos, serviriam de matéria-prima para a produção dos objetos culturais
de consumo.

Em resumo, o que importa aos culturólogos não é saber se são os


meios de comunicação que determinam os indivíduos ou se estes é que
determinam o conteúdo dos meios de comunicação. A verdadeira questão,
aquela que se impõe com mais força, pode ser encontrada na relação dialética
entre o sistema de produção cultural e as necessidades culturais dos
consumidores (MORIN, 1962). Nesse processo, a indústria cultural cria um
novo público, cujo consumo homogeneizado é decorrência da produção de
uma identidade de valores, bem como nivela as diferenças sociais, a partir da
padronização das preferências. É através desse movimento que, segundo
Morin (1962), enfraquecem-se as instituições que ele classifica como
intermediárias – família e classe social – para dar passagem ao aglomerado de
indivíduos – a massa – que estão a serviço da máquina social, evocando,
nesse ponto, alguns aspectos da teoria hipodérmica.

Cultural Studies

Os estudos culturais fazem parte de um contexto social muito particular


vivenciado na segunda metade do século XX no Reino Unido. Filhos de
imigrantes de ex-colônias inglesas, os intelectuais que deram corpo a essa
abordagem teórica, ao não encontrarem espaço no meio acadêmico inglês –
majoritariamente branco e burguês – constituíram um espaço de reflexão
própria, que refletia as questões enfrentadas por eles, inicialmente à raça, já
que muitos desses teóricos eram negros, e a classe social, por sua origem
social ser proletária.

1
Para Jung, os arquétipos se configuram como estruturas inatas que servem de base para o
desenvolvimento e a expressão da psique. Em outras palavras, arquétipos são conjuntos de imagens
primordiais que tem origem na repetição progressiva de uma mesma experiência ao longo do tempo.
(Fonte: https://oarquetipo.wordpress.com/o-arquetipo/).

39
Esses intelectuais – entre outros podemos citar Stuart Hall, Richard
Hoggart, E.P. Thompson – se reuniam no Centre for Contemporary Cultural
Studies (CCCS), fundado em 1964. Como dito acima, muito em razão da
própria origem social dos intelectuais que faziam parte do CCCS, o eixo
principal de concentração teórica se localizava nas formas, relações e práticas
culturais, em sua relação com a sociedade e suas transformações.

Algumas obras iniciais, consideradas fontes dos estudos culturais -


marcaram trilhas que foram sendo aprofundadas posteriormente. Entre elas
podemos citar The Uses of Literacy (1957), “Os Usos da Alfabetização”, de
autoria de Richard Hoggart; Culture and Society (1958), “Cultura e
Sociedade”, de Raymond Willams; e “The Making of English Working-class"
(1963), “A Produção da Classe Trabalhadora Inglesa”, de E.P. Thompson.

A originalidade dos estudos culturais se deve à centralidade conferida a


materiais culturais antes desprezados, especialmente objetos da cultura
popular e da cultura de massa. Segundo Escosteguy, foi a partir do citado
trabalho de Hoggart que foi inaugurado o olhar de que “no âmbito popular não
existe apenas submissão, mas também resistência, o que mais tarde, será
recuperado pelos estudos de audiência dos meios massivos” (2011, p. 2).

40
Nesse sentido, os estudos culturais vão se interessar pela constituição
de um campo social comum de significados, de práticas sociais
compartilhadas, tendo a cultura como um elemento integrador das várias teias
que compõe o tecido societário.

Como toda abordagem teórica que contempla contribuições de


pensadores e saberes diferentes, há que se ter em mente que, ao falar dos
princípios orientadores dos estudos culturais, somos levados a operar por meio
de aproximações, deixando um pouco de lado as diferenças que marcam as
especificidades dos pensamentos de cada um dos intelectuais que podem ser
considerados como fundadores dessa abordagem.

Desse modo, podemos dizer que o objeto de interesse dos estudos


culturais circunscrevem as conexões entre cultura, história e sociedade. De
fato, o encontro, que acabou se mostrando tão fecundo, desses campos de
estudo, se originou das disciplinas que marcaram a formação dos teóricos
apontados pela literatura como fundadores da abordagem dos estudos
culturais. Dos estudos da literatura inglesa, veio a preocupação com as formas
de expressão da cultura popular; da sociologia, veio o interesse pelas formas
de organização social e suas estruturas intrínsecas; e da história, por fim, veio
o reconhecimento dos atores históricos marginalizados e também da tradição
oral (ESCOSTEGUY, 2011).

Ele tem por objetivo explícito situar o estudo da cultura em suas


diversas relações com a sociedade contemporânea, constituindo, a partir daí,
um campo teórico fundamentado, de onde partirão suas análises sociais. Isso
implica na construção de um conceito de cultura que abrange não só os valores
e significados – sem esquecer suas dinâmicas específicas – que atravessam
diferentes classes e grupos sociais, mas também as práticas concretas que tais
valores e significados mobilizam.

No caldo de elementos que constituem a cultura, os mass media


desempenham papel relevante, tendo merecido atenção especial dos estudos
culturais.

41
Com a crescente influência dos meios de comunicação de massa,
estes passam a ser vistos não somente como entretenimento, mas também
como aparelhos ideológicos de Estado (Althusser). Em relação aos meios de
comunicação, segundo destaca Escoteguy, a abordagem dos estudos culturais
se caracterizava:

Pelo foco na análise da estrutura ideológica, principalmente, da


cobertura jornalística. Esta etapa foi denominada por Hall
(1982) de “redescoberta da ideologia”, sendo que uma das
premissas básicas desta fase pressupunha que os efeitos dos
meios de comunicação podiam ser deduzidos da análise
textual das mensagens emitidas pelos próprios meios
(ESCOSTEGUY, 2011, p. 7).

Nesse quadro, o interesse pela análise textual dos discursos


produzidos pelos mass media revela a atenção dada à temática da recepção
daqueles pelo público, na tentativa de localizar e identificar a ideologia
subjacente em tais discursos.

Escosteguy (2011) ressalta que nos anos 80, o interesse pelos


discursos produzidos pelos mass media se desloca para a audiência, e é esse
um dos fatores que vai possibilitar o destaque do papel central que, as criações
coletivas possuem na apropriação das mensagens produzidas pelas mídias de
comunicação de massa, complexificando o enquadramento teórico que entendi
a mídia simplesmente como um instrumento de dominação ideológica, e não
como um fenômeno perpasse por condicionamentos econômicos, sociais e
culturais.

Nesse sentido, o problema que vai orientar os estudos culturais diz


respeito tanto às formas de produção cultural, como os tipos de organização
que tal produção é capaz de gerar, fomentar e organizar.

42
O paradigma materialista

Apesar de Marx e Engels não terem proposto uma teoria da


comunicação, muitos dos desenvolvimentos de seus pensamentos foram
utilizados para pensar a comunicação de um ponto de vista materialista.

A partir da perspectiva marxista, o trabalho é o processo por meio do


qual o homem modifica a natureza, servindo como motor para a socialização
dos indivíduos, além de criar as possibilidades para a produção da vida
material. Nesse sentido, de acordo com Rüdiger a comunicação deve der
entendida “como a generalização simbólica da práxis humana, enquanto
mediação mais ou menos universal do modo de produção” (RÜDIGER, 2011, p.
77).

Isso significa que a necessidade de modificar a natureza por meio de


trabalho é o que, de fato, produz a sociedade, tanto do ponto de vista das
relações entre as pessoas, como da produção de riqueza, e, nesse contexto, a
comunicação vai servir como um meio na qual vai permitir que, através de
generalizações compartilhadas, as trocas simbólicas sejam possíveis entre os
sujeitos. É partir também do trabalho que nós construímos nossa percepção
sensível do mundo, mecanismo que é expresso, necessariamente, pela
linguagem, uma vez que, ela “não é senão a condensação simbólica da práxis
humana que possibilita a comunicação” (RÜDIGER, 2011, p.78).

Daí resulta que o modo de produção de uma sociedade vai determinar


como se dá a interação entre as pessoas, o tipo de mediação subjetiva que vai
constituir a vida das pessoas. Na sociedade capitalista, por exemplo, o fato de
haver uma divisão de classes, entre os sujeitos que trabalham e aqueles que
possuem os meios de produção, ou seja, que dirigem e determinam os
processos de trabalho, vai produzir um tipo de consciência que é condicionada
por essa desigualdade. A comunicação, portanto, além de servir como uma
mediação da práxis social atua como um meio de socialização do tipo de

43
consciência produzida pelas condições históricas, que determinam essa
mesma práxis.

No capitalismo, modo de produção que define nosso período histórico,


as relações sociais se dão a partir da instituição de uma desigualdade
fundamental entre os sujeitos, por meio da qual uns detêm os meios de
produção da riqueza, enquanto outros, por não possuírem esses meios,
vendem sua força de trabalho. A maneira como vai organizar-se o trabalho,
segundo a teoria marxista, é o que vai determinar, em última instância, o modo
como vão se dar as relações e as trocas em uma sociedade. Nesse processo,
a comunicação vai representar a mediação que torna essas trocas possíveis,
socializando a consciência que é produzida pelo modo organizado do trabalho.

Como parte da abordagem materialista surge a noção, no pensamento


de Marx, de que a comunicação é uma categoria abstrata, que necessita de
uma compreensão que lhe dê concretude histórica, e ele buscar isso ao afirmar
que a comunicação é determinada, em última instância, pelo modo de
produção dominante na sociedade. Como Rüdiger destaca (2011) a
comunicação surge no momento em que os homens precisam agir em conjunto
para modificar a natureza, estabelecendo, a partir do trabalho, relações entre
si. Para a teoria marxista, as relações sociais não se desenvolvem por causa
de uma necessidade abstrata, mas para promover formas cooperativas de
produção da vida coletiva. Daí a afirmação consequente de que a comunicação
é fruto do estabelecimento de cooperação para a produção da vida material.

44
Segundo Rüdiger:

A comunicação se desenvolveu primitivamente como mediação


do trabalho, tornando-se a principal condição de possibilidade
das relações sociais entre os homens. Para produzir, os
homens terminaram firmando determinadas relações sociais,
dentro das quais passaram a produzir. O processo de divisão
do trabalho determinou, por sua vez, o surgimento de certas
relações entre os indivíduos no que se refere ao material, ao
instrumento e ao produto das tarefas (RÜDIGER, 2011, p. 79).

A comunicação seria, assim, a mediação do processo de mediação,


estabelecendo, a partir de uma gramática comum, formas de interação entre os
sujeitos em sociedade. Na perspectiva marxista, portanto, o trabalho
representa a condição para as interações simbólicas, e a comunicação seria o
meio através do qual aquele seria possível. Primeiro, porque ela (a
comunicação) vai permitir que se desenvolva uma consciência desse trabalho,
ainda que alienado; depois, porque ela transforma o trabalho em si mesmo
considerado em trabalho cooperativo, o que, como vimos, é condição para a
existência da sociedade. Por último, porque a comunicação, conforme já
afirmamos, realiza a socialização da consciência, a qual é determinada por um
modo de produção específico. Isso implica dizer que a comunicação é o que
vai permitir a reprodução da consciência capitalística e o reinvestimento dessas
formas de consciência na produção.

Por exemplo, se hoje nos deparamos com uma ideologia que exorta a
gestão empresarial da vida - o que implica que todo sucesso ou fracasso que
alguém possa alcançar na vida depende exclusivamente de suas habilidades
como empresário de si, e não das condicionantes estruturais – é porque o
modo de organização da produção capitalista no século XXI produz esse tipo
de consciência em seu próprio benefício. Assumir riscos, ser empreendedor,
não depender do Estado, todos esses valores andam par a par com o processo
de flexibilização das leis trabalhistas e a modificação das relações de produção
em detrimento de quem efetivamente contribui a geração de riquezas. Esse é
um caso em que a produção de uma ideologia é reinvestida na alimentação do
próprio sistema, concedendo-lhe o que é necessário para sua manutenção.
45
Em suma, “comunicação, linguagem e consciência formam, de
qualquer maneira, uma unidade, cujo surgimento está entrelaçado com o
desenvolvimento da produção material e o processo de cooperação entre os
homens” (RÜDIGER, 2011, p. 81).

É importante destacar que as práticas comunicativas não estão


vinculadas exclusivamente às relações de trabalho, uma vez que, a evolução
do modo de produção vai complexificando as relações sociais, fazendo com
que a comunicação se desloque para outros contextos. Desse modo, para a
teoria marxista, os processos de trabalho determinam a comunicação, mas
essa influência vai ficando menos direta à medida que o processo de divisão
social do trabalho vai ficando mais intricado.

Uma vez que as estruturas que fundamentam o poder vão gerando


distanciamentos cada vez maiores, baseados no grau de acesso aos meios de
produção material, a ponto de determinar a divisão dos indivíduos em classes,
ainda que o condicionamento da comunicação pelos meios de produção vá
deixando de se dar de maneira direta, à medida que as relações de trabalho
vão ficando mais complexas, é preciso considerar que a comunicação não
deixa de ser um fator de reprodução das relações de poder, dotando as
interações sociais de um sentido político, pois passam a “agenciar relações de
poder entre as pessoas” (RÜDIGER, 2011, p. 83).

Decorrência disso, é que o controle dos meios de produção pelas


classes privilegiadas vai desenhar o modo como a comunicação se dá na
sociedade, servindo, muitas vezes, pelo menos quanto às mídias de
comunicação de massa, como instrumentos de dominação de classe.

46
As teorias
comunicativas

47
48
Introdução

Até aqui, abordamos os estudos de comunicação a partir de um ponto


de vista sociológico, mas não podemos deixar de destacar que tal perspectiva
não deixa de concorrer com outras especificamente comunicativas. Em certo
momento, houve mesmo uma disputa entre sociologia e semiótica sobre a
melhor maneira de se tratar os mass media; disputa que se encontra hoje
superada pelas tentativas de integração entre as linhas teóricas que
atravessam o complexo campo dos estudos de comunicação.

Nessa unidade de estudo, portanto, a fim de darmos o panorama mais


completo possível sobre as teorias da comunicação, vamos trazer modelos
comunicativos formulados de um ponto de vista comunicativo, para, a seguir,
apontar os caminhos que buscam uma colaboração integrativa dos estudos de
tendência sociológica e dos de tendência comunicativa.

O modelo comunicativo da teoria da informação

O primeiro modelo “puramente” comunicativo que trataremos aqui teve


sua origem nos trabalhos de teoria da comunicação, e ficou conhecida como
teoria matemática da comunicação. Os estudos que deram origem a esse
modelo comunicacional tinha por objetivo, inicialmente, buscar uma melhoria
do rendimento informacional, aumentando a velocidade de transmissão das
mensagens e diminuindo os ruídos e interferências na comunicação.

De acordo com essa teoria, surgida nos Estados Unidos no começo


dos anos 50, a comunicação ocorre segundo o esquema proposto por Claude
Shannon e Warren Weaver:

49
fonte destinatário
Sentido da transmissão
mensagem mensagem

codificador (E) sinal canal sinal decodificador (R)

(ruído)

O que esse esquema tenta demonstrar, portanto, é que, em qualquer


processo de transmissão da informação - seja entre máquinas, entre pessoas
ou entre máquinas e pessoas – a informação parte de uma fonte, viaja através
de um canal, evento durante o qual pode ocorrer a interferência de ruídos. Em
seguida ela é captada por um receptor que, através de um processo de
decodificação, a informação é transformada em mensagem.

Esse paradigma, de viés matemático-informacional, se ocupa


exclusivamente dos aspectos técnicos da comunicação, com a finalidade de
que a mensagem saia do emissor e chegue ao destinatário com a menor
interferência possível. O objetivo é a transmissão da mensagem, não havendo
preocupação com seus aspectos semânticos.

Esse esquema foi adaptado para a comunicação humana por Wilbur


Schramm, que para entender como ela se dava, levou em consideração a
contribuição de outras disciplinas, além de dar ênfase ao processo de interação
entre as pessoas.

50
O modelo comunicativo semiótico-informacional

Para nos situarmos um pouco melhor sobre o real significado desse


modelo comunicacional é necessário dar pelo menos alguma noção introdutória
sobre o que seria semiótica.

A semiótica, ou teoria dos signos, foi desenvolvida pelo filósofo


americano Charles Sanders Peirce, com auxílio de elementos da lógica
simbólica e da matemática. O objeto central dessa teoria reside na
determinação do que é um signo e na elaboração de categorias que os
especifiquem entre si. Para ele, signo é algo que equivale alguma coisa. Assim,
as palavras “chuva” ou “areia” apenas representam as coisas em si mesmas,
não podendo ser com elas identificadas. Para Peirce, as ideias ou
pensamentos requerem um objeto a ser interpretado, um intérprete que irá
realizar a interpretação desse objeto.

51
Os signos seriam divididos em três espécies principais: ícones, índices
e símbolos. O primeiro, diz respeito a um tipo de signo em que significado e
significante possuem uma semelhança de fato, como um cachorro e um
desenho que o represente, por exemplo. O índice tem a ver com um signo que
apenas indica o objeto significado, como é o caso da fumaça, que avisa de um
possível incêndio. O último, símbolo, depende da adoção de uma regra para
seu uso, como é o caso das bandeiras que representam as nações.

Com relação ao sistema anterior, há aqui uma precedência da


semântica, no sentido de que, em lugar de se centrar mais na eficácia do
processo comunicativo, passou-se a dar importância aos fatores semânticos
introduzidos pelo código. A comunicação como transmissão da informação dá
lugar, portanto, a noção de comunicação como a transformação, através de um
código, de um sistema em outro.

Se a teoria da informação se preocupava em analisar os fatores que


possibilitavam uma comunicação ótima, ou seja, com o mínimo de ruídos
possível, a teoria semiótico-informacional destaca que “os efeitos e as funções
sociais dos mass media não podem prescindir do modo como se articula,
dentro da relação comunicativa, o mecanismo de reconhecimento e de
atribuição de sentido, que é parte essencial dessa relação” (WOLF, 1999, p.
123). Isso quer dizer, em outras palavras, que a introdução da noção de código
vai levantar a questão essencial de como o público constrói um sentido –
interpretação - a partir do que chega a ele através dos meios de comunicação
de massa.

Um novo campo de análise surge à medida que se abre espaço entre a


mensagem veiculada como significante e a mensagem recebida como
significado; é aqui que emissor e receptor estabelecem um processo de
negociação, cuja determinação concorre toda uma ordem de fatores, criando
uma significação. E é nessa negociação que poderá surgir o que Eco e Fabri
(1965) denominam de comunicação aberrante, ou seja, interpretações
desviantes que os receptores fazem das mensagens que chegam até eles,
modificando a compreensão da mensagem inicialmente pretendida.

52
Por fim, vale salientar que esse modelo tem importância por revelar
que, nas pesquisas sobre os mass media é essencial integrar as estratégias de
análise a influência dos “mecanismos comunicativos na determinação dos
efeitos macrossociais” (WOLF, 1999, p. 125); ou seja, dar a ver as
interferências e efeitos em larga escala que os meios de comunicação de
massa são capazes de provocar, ainda mais quando se leva em consideração
o contexto das novas tecnologias da comunicação.

O modelo semiótico-textual

Em relação ao modelo anterior, o modelo semiótico-textual apresenta a


vantagem de ser um instrumento mais adequado para a análise dos aspectos
específicos da comunicação de massa, por levar em conta três fatores: que os
destinatários não recebem mensagens, mas conjuntos textuais; que estes não
confrontam as mensagens que lhes chegam a partir de códigos, e sim de
conjuntos de práticas textuais, de onde reconhecem sistemas gramaticais de
regras; e, por fim, que os destinatários não recebem uma só, mas várias
mensagens (ECO – FABRI, 1978, apud WOLF, 1999).

O que mudar de um modelo para outro, portanto, é a especificidade com


que é estudada a relação “emissor-receptor” nas comunicações de massa. Se
a abordagem semiótico-informacional servia para descrever desde interações
interpessoais, até as comunicações de massa, o modelo semiótico-textual vai
considerar as especificidades das comunicações de massa (WOLF, 1999).

Outra diferença relevante é que, no modelo semiótico-informacional, a


ação interpretativa levada a cabo pelo destinatário se dava por meio da
utilização de códigos, ou seja, estes interpretavam as mensagens a partir de
códigos conhecidos, o que acabava, em última instância, por desconsiderar a
diferença de posições entre emissor e receptor nas comunicações de massa.
No modelo semiótico-textual, por outro lado, na comunicação entre emissor e
receptor o que vai importar é a relação que se estabelece em torno de
conjuntos de práticas textuais (WOLF, 1999).

53
A noção de “conjunto de práticas textuais” parte da ideia de que a cultura
pode ser representada como um mecanismo que cria um conjunto de textos,
sendo estes últimos um tipo de realização da cultura. E é o fato de os mass
media serem uma cultura textual que vai afetar as próprias modalidades de seu
consumo, uma vez que, a interpretação operada pelos destinatários se dá por
meio do amálgama e da articulação com conjuntos de textos já consumidos.
Isso quer dizer que, para interpretar uma mensagem, os destinatários se valem
de textos (cultura) já consumidos para elaborar um ato interpretativo, e isso é
levado em conta, pelos próprios mass media na elaboração da mensagem.

Na prática, isso significa que o modelo semiótico-textual possui a


capacidade de articular elementos estruturais, à medida em que leva em conta
o modo como os aparelhos da mídia de comunicação de massa se organizam,
a elementos particulares, que dizem respeito aos mecanismos comunicativos,
ao modo como se dá o processo de interpretação e, em último caso, aos
efeitos sociais provocados pelos mass media.

Como destacado acima, esse modelo comunicativo põe em destaque o


papel do destinatário da mensagem na construção da interpretação de um
texto, o que joga luz sobre a assimetria dos papéis comunicativos dos
emissores e dos receptores nas comunicações de massa, considerando os
elementos que constituem os atos interpretativos praticados pelos destinatários
e como mass media levam isso em conta na confecção de sua mensagem.

54
Hipótese da agenda-
setting e a nova
comunicação

55
56
Introdução

Dentro das teorias da comunicação, a hipótese da agenda setting


produz efeitos midiáticos em longo prazo. O que isso significa? De maneira
geral, os efeitos da mídia de comunicação de massa podem ser classificados
em (GOLDING, 1980, p. 1) efeitos intencionais em curto prazo; efeitos não
intencionais em curto prazo; efeitos intencionais em longo prazo; efeitos não
intencionais em longo prazo.

De acordo com essa tipologia, o grau de intencionalidade dos efeitos


da mensagem variaria segundo uma grandeza temporal. Desse modo, efeitos
intencionais em curto prazo, por exemplo, poderiam ser classificados como
tendenciosos, por quererem provocar um condicionamento específico em um
pequeno espaço de tempo. Uma campanha eleitoral, na qual um candidato
precisa, às vezes em poucos segundos, convencer o eleitorado de que ele é a
pessoa mais indicada para ocupar a posição pública, a mensagem não prima
pela precisão ou verdade, mas sim pela persuasão, pelo efeito que ela pode
ocasionar.

Efeitos intencionais em longo prazo, segundo essa classificação,


poderiam ser considerados políticos, na medida em que se preocupariam em
influenciar o modo de organização e funcionamento do poder na sociedade.
Por outro lado, efeitos não intencionais em longo prazo teriam uma natureza
ideológica, porque ele hierarquizaria fatos, ao mesmo tempo em que produziria
molduras de interpretação de sentido; ou seja, seria responsável mais pela
produção de visões de mundo do que em causar um efeito específico.

É nessa última categoria que se enquadra a hipótese da agenda-


setting. Em um bom português, esse termo significa “definição de agenda”, o
melhor, a produção de uma circunscrição temática dos assuntos a serem
debatidos no espaço público.

57
Em outras palavras, tal hipótese traz a compreensão de que, por meio
da ação das mídias de comunicação de massa (televisão, jornal, rádio e, de
certo modo, a internet), o público ignora ou dá atenção a determinados temas,
que passam a ocupar ou não o espaço público. Além da escolha dos temas em
si, a importância dada a elas, segunda a hipótese da agenda-setting também é
definida pelos mass media.

Segundo Wolf (1999) os mass media “descrevendo e precisando a


realidade exterior, apresentam ao público uma lista daquilo sobre o que é
necessário ter uma opinião e discutir”. (SHAW apud WOLF, 1985, p.13). Dessa
forma, o pressuposto no qual se apoia a hipótese da agenda-setting é o de que
a mídia fornece boa parte da compreensão que as pessoas têm da realidade.
Há o entendimento aqui de que a mídia contribui fortemente para a construção
coletiva da realidade, tendo um efeito não apenas psicológico, mas também
cognitivo. Além disso, seus efeitos, como já falamos acima, não se dão de
imediato. Ao contrário, são segmentados, acumulando-se com o passar do
tempo.

A agenda-setting parte da premissa de que a mídia é capaz de


influenciar a opinião pública, ao escolher os temas aos quais será dado
destaque e também o modo como serão abordados. É preciso deixar claro que
não se trata apenas da elaboração da lista de assuntos que circulará

58
privilegiadamente no espaço público, mas sim, juntamente com ela, das
molduras de sentido, por meio das quais a realidade será interpretada. Essa
construção da realidade traz muitas implicações para a dinâmica social, por
conformar uma visão de mundo que tem influência direta no modo pelo qual as
pessoas encaram os assuntos mais diversos, desde os mais estruturantes,
como política, violência urbana, até os mais tangenciais, como o artista ou a
música da moda.

Diferentes tipos de agenda – agenda individual, agenda interpessoal,


agenda da mídia, agenda público (relativo aos assuntos de estado), agenda
institucional – coexistem em uma sociedade de massa. No entanto, a agenda
da mídia é a única que tem condições de se impor em uma escala macro, a
ponto de afetar e influenciar os destinos de toda uma sociedade. Isso se dá
especialmente em contextos como o brasileiro, em que os meios de
comunicação estão concentrados nas mãos de poucas famílias, sendo usados,
muitas vezes, como instrumentos de legitimação de interesses privados,
travestidos de públicos.

Ainda segundo a hipótese agenda-setting a eficácia da mensagem está


sujeita a alguns condicionantes como o conteúdo da mensagem, sua origem,
ou seja, a fonte que a divulgou, bem como a mídia em que foi veiculada.

Wolf (1999) traz um exemplo disso ao citar uma pesquisa conduzida


por McClure e Patterson (1976), na qual se procurou investigar a diferença de
influência da informação televisiva, em comparação com outros meios de
comunicação, durante a eleição presidencial americana de 1972. Por meio
dela, chegou-se a conclusão de que, por serem mais fragmentárias, mais
rápidas, breves, heterogêneas e superficiais, as informações veiculadas
através da televisão não teriam uma eficácia cognitiva tão duradoura quanto às
informações veiculadas por escrito. Obviamente, por se tratar de um contexto
específico de outro país e também porque a pesquisa já possui mais de trinta
anos seria muito arriscado afirmar que esses resultados teriam alguma
validade ainda hoje, principalmente se o contexto brasileiro for levado em
conta. Em uma sociedade que ainda apresenta um baixo nível de escolaridade

59
como a nossa, fica evidente que esse fator não poderia ficar de fora na análise
de se a mídia televisiva ou a impressa seriam mais bem sucedidas em
conseguir provocar efeitos mais duradouros. A hipótese agenda-setting não
chega a representar uma teoria. Segundo Wolf:

Um núcleo de temas e de conhecimentos parciais, suscetíveis


de ser, posteriormente, organizado e integrado numa teoria
geral sobre a mediação simbólica e sobre os efeitos de
realidade exercidos pelos mass media, do que um modelo de
pesquisa definido e estável (WOLF, 1999, p. 145).

Quanto a nova comunicação, podemos afirmar que ela surgiu nos anos
50, tendo como principais teóricos Gregory Bateson, Paul Watzlawick, Ray
Birdwhistlell, Edward Hall e Erving Goffman.

Entendendo a comunicação como um processo eminentemente


interacional, a abordagem da nova comunicação vai estudar como se dá a
troca simbólica na interação humana, a partir da linguística, da pragmática,
promovendo uma renovação no modelo comunicacional.

Para Bateson, por exemplo, a comunicação pode ser entendida como a


“matriz social da vida moderna”. O entendimento da comunicação atinge aqui
um nível mais profundo, uma vez que, era a partir dela que se tentava
compreender como o indivíduo construía seu mundo interior, ao mesmo tempo
em que seu comportamento no espaço social.

60
Revisando

Conforme pudemos verificar a comunicação é um objeto de estudo


complexo, cuja investigação requer diversas entradas e perspectivas. Ao nos
debruçarmos inicialmente no que constitui uma teoria e quais são os
pressupostos para sua produção, conseguimos localizar os estudos de
comunicação dentro do campo de abrangência da teoria social. Não por acaso,
em sua tentativa de se constituir como um campo autônomo de estudo, a
comunicação não se furtou a buscar contribuição de uma gama diversa de
disciplinas, incluindo Sociologia, Antropologia, Psicologia, Matemática e
Linguística, só para citarmos alguns exemplos. Por se constituir como um
objeto complexo, dinâmico e extremamente sensível às mudanças sociais e os
avanços tecnológicos, várias foram às teorias, hipóteses e modelos que
tentaram explicar a difícil tarefa de compreender os fenômenos que abrangem
as abordagens do tema “comunicação”.

Dessa forma, ao nos ver diante de um objeto de estudo tão mutável e


zigomático, uma pergunta se faz pertinente: qual valor devemos atribuir aos
modelos teóricos elaborados no passado? Em outras palavras, as teorias
desenvolvidas anteriormente teriam um valor meramente histórico, ou seriam
elas capazes de dar alguma contribuição aos estudos de comunicação no
presente, especialmente, diante das novas tecnologias da informação?

De fato, a comunicação como objeto dificilmente vai ser descrita e


analisada em sua completude por uma única teoria, por mais atual que ela
seja. Por se constituir como um fenômeno multifacetado, várias são as
abordagens possíveis para tentar descrevê-lo. Dessa forma, apesar de a teoria
hipodérmica ter surgido para dar conta do modelo comunicacional surgido no
pós-guerra, ela ainda encontra ambientes específicos onde suas premissas e
conclusões podem ser validadas, ainda que falhe em diversos outros aspectos.
E o mesmo pode ser dito para cada uma das teorias que tratamos aqui.

61
Como estudantes de comunicação, isso nos coloca diante do desafio
perpétuo de construir novas abordagens, estratégias de reflexão e
entendimento, que lancem mão não só das mais modernas teorias e
tecnologias, mas também das contribuições passadas, pois seus erros e
acertos são ótimas pistas para indicar que caminhos deverão seguir. O desafio
está lançado a quem se dispuser a enfrentá-lo, lembrando que a melhor
maneira de vencê-lo é adotando uma postura sempre crítica e solidamente
vincada em uma observação entusiasmada dos fenômenos que constituem o
mundo social.

62
Leitura Obrigatória,

LEIA O LIVRO PARA PRODUZIR UMA RESENHA SOBRE O ENFOQUE DOS AUTORES
SOBRE MIDIA E SOCIEDADE.

Sugerimos a leitura do livro Mídia e Sociedade: em


transformação. A dinâmica social contemporânea e a
produção incessante de informação e conhecimento
suscitam novos olhares sobre as transformações na
apropriação das mídias pelos diversos setores sociais.
Observam-se reflexões sobre como as mídias passam a
figurar nos cenários políticos, sociais, econômicos e
culturais, nas dimensões nacional e transnacional.
Verificam-se processos que se caracterizam, muitas
vezes de forma paradoxal, por fenômenos como
transitoriedade e permanência, apresentando questões inéditas e outras
recorrentes na história das mídias. Este livro expõe diferentes perspectivas
sobre a relação entre mídia e sociedade, contribuindo para a compreensão da
comunicação midiática no fortalecimento da democracia em um contexto de
investigação marcado por ambiguidades, contradições e desafios.

LUVIZOTTO, Caroline Kraus (Org.); LOSNAK, Célio José (Org.)


e ROTHBERG, Danilo (Org.). Mídia e Sociedade: em transformação. 1ª
Edição, 2016.

Guia de Estudo:
Leia o livro para produzir uma resenha sobre o enfoque dos autores sobre
mídia e sociedade.

63
Bibliografia Básica

FRANÇA, Vera Veiga; HOHFELDT, Antonio; MARTINO, Luiz C.; SILVA,


Juremir Machado da; BERGER, Christa; ESCOSTEGUY, Ana Carolina D.;
FERREIA, Giovandro Marcus; ARAÚJO, Carlos Alberto; RÜDIGER, Francisco.
Teorias da Comunicação. Conceitos, Escolas e Tendências. 13. ed. Rio de
Janeiro: Vozes, 2011.

LUVIZOTTO, Caroline Kraus (Org.); LOSNAK, Célio José (Org.)


e ROTHBERG, Danilo (Org.). Mídia e Sociedade: em transformação. 1ª
Edição, 2016.

MARCOS FERREIRA, Giovandro; HOHFELDT, Antonio; MARTINO, Luiz C.; J.


DE MORAIS, Osvando. Teorias da comunicação: trajetórias investigativas.
Porto Alegre: EDiPUCRS, 2010.

MATELLART, Armand; MATELLART, Michèle. História das teorias da


comunicação. São Paulo: Edições Loyola, 2010.

PEDROSO, Dafne; COUTINHO, Lúcia; SANTI, Vilson Júnior. (org’s.).


Comunicação Midiática: matizes, representações e reconfigurações. Porto
Alegre. EDIPUCRS, 2011.

POLISTCHUCK, Ilana; TRINTA, Aluísio Ramos. Teorias da Comunicação: o


pensamento e a prática da Comunicação Social. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.

RÜDIGER, Francisco. Introdução à teoria da comunicação: problemas,


correntes e autores. 2. ed. São Paulo: Edicon, 2005.

WOLF, Mauro. Teorias da comunicação. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

Bibliografia complementar

MARTIN-BARBERO, Jesús. Dos meios às mediações: comunicação, cultura


e hegemonia. 6. Ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009.

DEBORD, Guy. Sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Editora


Contraponto, 1997.

64
65

Você também pode gostar