Função Poética
Função Poética
Função Poética
POÉTICA
1 Esse texto integra o livro Ensaios de semiótica poética (1972), organizado também por
Greimas, que visa a compreender a natureza do texto poético sob a perspectiva semió-
tica. O volume reúne ensaios de Jean-Claude Coquet, Michel Arrivé, Claude Zilberberg,
Julia Kristeva, entre outros, com estudos sobre Apollinaire, Bataille, Baudelaire, Hugo,
Jarry, Mallarmé, Michaux, Nerval, Rimbaud e Roubaud.
ção do signo poético, uma vez que são elas as categorias fun-
damentais para o estudo de uma poética da expressão.
A linguística moderna inicia-se com a formulação de
Saussure (2003, p. 80)2, segundo a qual “O signo linguístico
une não uma coisa e uma palavra, mas um conceito e uma ima-
gem acústica. [...]. Esses dois elementos estão intimamente
unidos e um reclama o outro.”. Com esse postulado, inaugura-
se uma linhagem teórica que concebe o signo não mais como
uma expressão de um conteúdo exterior a ele próprio, mas
como um todo no qual expressão e conteúdo, ou, conforme a
terminologia de Saussure, significado e significante, são soli-
dários e inseparáveis dentro de uma relação arbitrária que se
estabelece entre eles. O linguista suíço também estabeleceu,
ademais, uma diferenciação entre língua e linguagem, segun-
do a qual aquela é composta somente por grandezas formais,
enquanto esta abarca também grandezas físicas e não psíqui-
cas, a que se pode denominar substância. A linguística, segun-
do ele, não deve se ocupar, senão, dos aspectos formais ou, em
outras palavras, do signo linguístico (SAUSSURE, 2003, p. 23).
A linha de pensamento saussureana foi seguida também
por Louis Hjelmslev, que avançou a construção das bases da
linguística moderna, de modo a continuar a desenvolvê-la nos
Prolegômenos a uma teoria da linguagem (1975). Muitas das
questões já intuídas por Saussure no Curso de linguística ge-
2 Cf. o texto original, num recorte um pouco maior: “Le signe linguistique unit non une
chose et un nom, mais un concept et une image acoustique. [...] Le signe linguistique est
donc une entité psychique à deux faces, qui peut être représentée par la figure: ⇞ Concept/
Image acoustique⇟. Ces deux éléments sont intimement unis et s’appellent l’un et l’autre.”
(SAUSSURE, 2005, p. 98-99). Embora o aspecto motor envolvido na articulação que pro-
duz a imagem acústica desempenhe também um papel na expressão, a edição crítica do
Cours lembra que, por conceber a língua como um repositório de elementos recebidos
“de fora”, para Saussure a imagem articulatória do estrato acústico ficava subentendida
e subordinada à representação da imagem acústica, concebida como expressão natural
de uma palavra da língua virtual (ibid., p. 98). É preciso lembrar, entretanto, que a ima-
gem articulatória passa a ser, por vezes, relevante no subsistema da Poética, como em
certos casos de iconicidade e ilusão referencial produzidos em poesia.
A Rita
5 Dicionários especializados dirão também que parônimos são palavras com sonorida-
de semelhante, bem como que seu emprego em poesia é capaz de produzir resultados
muito felizes a partir do simples jogo de significantes, mas também que não consiste
em mero artifício lúdico, podendo produzir significação sutil por meio das relações que
logra estabelecer (cf. POUGEOISE, 2006, p. 353, s.v. Paronomase).
6 Com exceção do penúltimo verso. Note-se, entretanto, que o papel estabilizador con-
ferido pela música que enforma a letra, tende a destacar e estabilizar também acentos
secundários de palavra nas sílabas pares, como ocorre na sílaba pe- de “pequenina”.
7 Vale lembrar, aqui, que esse termo é etimologicamente ligado ao substantivo latino an-
gustia- (passagem estreita) e ao adjetivo angusto-/-a- (estreito, apertado, constrito) (cf.
GLARE, 1968, p. 130-131, s.v. angustia,-ae e angustus,-a,-um) que, por sua vez, provém do
antigo verbo angĕre (estreitar, apertar, cerrar a garganta) (cf. ERNOUT; MEILLET, 1959,
p. 33, s.v. ango).
8 Como bem descreve Hannah Arendt (2001, p. 17) em uma de suas cartas amorosas dire-
cionadas a Heidegger: “Mas também é possível que a nostalgia tenha aberto seus reinos
[…] e que a angústia tenha fechado tudo pesadamente, tenha-lhe cortado a respiração
livre, deixando-a paralisada em meio à sensação de estar sendo caçada.”.
9 Tais críticas consistem geralmente no fato de a semiótica ter-se ocupado quase exclu-
sivamente com o estudo do percurso gerativo do sentido, que se dedica a esgotar as
possibilidades de compreender a articulação de sentidos do plano de conteúdo de qual-
quer objeto de significação. A crítica propriamente dita concentra-se em que isso vai
de encontro à basilar afirmação de Hjelmslev (1975, p. 77), segundo a qual plano de
conteúdo e plano de expressão não devem, sob nenhuma hipótese, ser separados. Des-
dobramentos ulteriores e avanços da teoria semiótica, porém, permitiram desenvolver o
conceito de semissimbolismo, cujo lugar e propósito são precisamente resgatar a neces-
sidade de compreender plano de conteúdo e plano de expressão como grandezas que se
pressupõem mutuamente, o que realiza o projeto do postulado hjelmsleviano e põe fim
à aparente contradição.
10 Emprega-se “natural”, aqui, na mesma direção com que o fez Saussure que, ao falar do símbo-
lo, denunciou-lhe um ‘rudimento de vínculo’ com certa motivação natural que une significante
e significado, ou seja, natural aqui significa aquilo em que há ainda um resíduo de motivação
entre o que se convenciona representar com uma determinada forma e o representado que
mantém alguma relação com o mundo natural.
Considerações finais
REFERÊNCIAS