Teorias Pedagógicas

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6

Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE


NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
O estudo das Teorias Pedagógicas e da Função Social da Escola, como
forma de emancipação do indivíduo

Rosana Meire Cazadei Rezende1


Edmilson Lenardão2

RESUMO: O cenário educacional atual exige que os profissionais da educação promovam um


ensino de qualidade que garanta ao indivíduo a formação baseada no conhecimento científico,
elaborado e construído pelo ser humano no decorrer de sua história. Desta forma, este trabalho,
possibilitou aos professores e professores pedagogos o aprofundamento dos estudos acerca das
principais teorias pedagógicas com ênfase na Pedagogia Histórico-Crítica. Teoria esta,
norteadora do Projeto Político Pedagógico e que melhor contempla a função social da escola.
Conscientes de que a Pedagogia Histórico-Crítica vislumbra esta perspectiva, torna-se
necessário embasar o trabalho pedagógico, pautado por reflexões e operacionalizadas por meio
da reconstrução do Projeto Político Pedagógico, promovendo assim, a unidade nas ações
docentes e por consequência na educação formal do indivíduo. O estudo das teorias
pedagógicas, por meio de debates e ações planejadas coletivamente, visa permitir maior
aproximação da função social da escola, promovendo o conhecimento e o desenvolvimento
humano em todas suas possibilidades.

Palavras-chaves: Função social da escola. Concepções pedagógicas.


Pedagogia Histórico-Crítica, Projeto Político-Pedagógico.

INTRODUÇÃO

O atual modelo educacional tem gerado uma série de questionamentos


referentes à sua eficácia. Buscam a culpa pelos resultados negativos nos mais
diversos setores e surgem com listas de sugestões acerca do que deve ser feito
para resolver a situação. Enquanto isso, o problema se arrasta e se agrava.
Preocupado com esse cenário, o Governo do Paraná, tem possibilitado
aos profissionais da educação a oportunidade de desenvolver um trabalho
voltado para as questões mais preocupantes, de acordo com a realidade de cada
escola, por meio da participação no Programa de Desenvolvimento Educacional
PDE que, a cada ano, seleciona em torno de 2.000 profissionais, para durante
dois anos, estudar e pensar em novas possibilidades de trabalho, visando
melhorar a qualidade educacional das escolas e proporcionar aos alunos uma
formação adequada. Além do Programa de Desenvolvimento Educacional PDE,
participamos de um momento de socialização com profissionais de todo Estado,

1 Professora da Rede Estadual de Educação do Paraná, participante do PDE.


2 Professor do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Londrina, orientador do
trabalho.
2

por meio de Grupos de Trabalho em Rede-GTR, que visa conhecer outras


realidades e trabalhos diferenciados.
A partir da minha atuação como professora pedagoga e gestora, observei
que os professores não tem clareza sobre as principais teorias de aprendizagem,
até mesmo a que orienta o Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola, a
Pedagogia Histórico-Crítica. Conhecer a concepção e método são fundamentais
na organização da práxis educativa e, imprescindíveis, na qualidade do processo
educativo.
As teorias pedagógicas em que se fundamenta nossa prática educacional
está sendo pouco estudada e pouco aplicada nas escolas. O resultado não é dos
melhores, visto que o conhecimento superficial do processo metodológico
adotado favorece um ecletismo de tendências na prática pedagógica e,
consequentemente, maiores dificuldades nos processos de ensino e
aprendizagem.
O que buscamos com este estudo foi aprofundar o conhecimento
filosófico, psicológico e pedagógico das tendências pedagógicas, porém
buscamos a unidade na Pedagogia Histórico-Crítica que fundamenta o Projeto
Político Pedagógico da escola.
Pensando nisso, nossa opção de trabalho foi possibilitar aos professores
o estudo das principais teorias pedagógicas, procurando relacioná-las à prática,
com ênfase na Pedagogia Histórico-Crítica, que é a teoria que fundamenta o
Projeto Político Pedagógico, da escola estudada.
É necessário estabelecer um norte para o trabalho docente e fazer com
que a escola retome sua função social. Seu objetivo deve ser propiciar aos
alunos o conhecimento formal, aquele produzido historicamente pela
humanidade. A Educação é essencial não só à humanização e socialização do
homem, mas na preservação da memória e renovação da cultura, como veremos
a seguir.

1. FUNÇÃO SOCIAL DA ESCOLA

Apesar dessa discrepância no que se refere ao ritmo das


transformações, a função social da escola não pode nem deve, desviar-se de
seu foco principal, ou seja, transmitir ao aluno o saber sistematizado, o
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conhecimento cientifico acumulado ao longo dos tempos e que instrumentalizem


os alunos para atuar na sociedade em que vivem, de forma consciente e
concreta. A educação deve ser
[...] “o ato de produzir direta e intencionalmente, em cada indivíduo
singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo
conjunto de homens” (Saviani, 1991, p. 21).
Dessa forma, é imprescindível a formação do professor para que possa
desenvolver um trabalho que possibilite a aquisição desse saber sistematizado,
bem como a relação com a realidade dos alunos.
É fato que a experiência do professor, seu cotidiano escolar contribuem
para um trabalho que apresente resultados positivos. Mas, muito além da prática,
é importante para o trabalho concreto da sala de aula, o embasamento teórico,
que direcione e legitime a prática do outro.
O Projeto Político Pedagógico é um documento democrático, abrangente
e flexível que pode e deve ser estudado e modificado sempre que for necessário
e permite à escola retratar sua história, sua realidade atual e as perspectivas de
curto, médio e longo prazos.
O PPP deve direcionar o trabalho de todos os agentes do processo
educacional, visando a unidade do trabalho. Dentre as informações contidas no
PPP está o Currículo Escolar que, para Saviani (1991, p.23)
[...] “é o conjunto das atividades nucleares desenvolvidas pela escola”,
ou seja, deve diferenciar o conteúdo essencial do secundário. É fundamental,
determinar quais conteúdos são essenciais, para que tenha significado para os
alunos, em sequência, e com objetivos concretos. Além disso, deve-se respeitar
a diversidade de culturas representadas nas escolas, não priorizando algumas
em detrimento de outras, mas considerando todas como importantes e que
contribuem para a construção da humanidade. Segundo Duarte (1998, p. 86)
O trabalho educativo alcança sua finalidade quando cada indivíduo
singular apropria-se da humanidade produzida histórica e
coletivamente, quando o indivíduo apropria-se dos elementos culturais
necessários à sua formação como ser humano, necessária à sua
humanização.

Para o autor, todo indivíduo tem direito ao saber sistematizado e que,


esse conhecimento, resultado de acertos, erros, da construção de valores
morais, das tradições, que vão propiciar a preservação da espécie humana, sua
continuidade e transformações necessárias para seu aprimoramento.
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Apesar da clareza com relação à função social da escola, nas últimas


décadas tem-se observado uma descaracterização dessa função, resultante das
transformações sociais, de novas linhas de pensamento e de diferentes políticas
educacionais, que mudam sempre que muda um governo, dificultando a
continuidade de trabalho e a necessidade de adaptação constante às novas
regras impostas a cada período de transição. Essa imprecisão resulta em uma
multifuncionalidade do espaço escolar, que assume o papel da família, da
sociedade, das políticas públicas e deixa, para segundo plano, sua função
primeira que é proporcionar a apropriação do saber sistematizado pelos alunos.
Assim, observa-se a necessidade de retomar a discussão em torno
desse tema, priorizando o trabalho educacional em sua essência, favorecendo a
retomada da função social da escola, ou seja, da aquisição, pelos alunos, do
saber sistematizado. Isso só será possível, quando os agentes educacionais
estabelecerem a unidade necessária, entre meios e fins. Para Saviani (2012, p.
14), a escola é
[...] uma instituição cujo papel consiste na socialização do saber
elaborado, e não do saber espontâneo, do saber sistematizado e não
do saber fragmentado, da cultura erudita e não da cultura popular.

Cientes dos problemas e da necessidade de mudança em nossa


realidade educacional, visto que são recorrentes as reclamações, os pedidos de
novos direcionamentos, de novas propostas, devemos fazer alguns
questionamentos, relacionados aos agentes do processo educacional. Todos
participaram da construção do PPP da escola? Todos sabem o teor desse
documento? O PPP está de acordo com a realidade vivenciada? A discussão
sobre o PPP é realizada e são feitas as mudanças necessárias? Todos
desenvolvem seus trabalhos de acordo com o que está determinado no PPP, já
que ele é resultado das decisões comuns da comunidade escolar e deve orientar
o trabalho na escola.
A solução de alguns problemas está fora de nosso alcance, no entanto,
outros dependem de nossas atitudes e de nossa participação concreta. De
acordo com Evangelista & Shiroma (2007, p. 539)
[...] o desafio é sermos capazes de criar a capacidade coletiva de
nossa constituição como sujeitos históricos, capazes de apropriar-nos
da dimensão pública da escola e do conhecimento como direito social,
capazes de lutarmos pela socialização dos bens culturais e materiais.
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Partindo da constatação do quanto é importante o saber sistematizado


e a apropriação deste conhecimento pelas novas gerações, Saviani (1991, p.30)
afirma que
[...] a especificidade dos estudos pedagógicos (ciência da educação),
que, diferentemente das ciências da natureza (preocupadas com a
identificação dos fenômenos naturais) e das ciências humanas
(preocupadas com a identificação dos fenômenos culturais), preocupa-
se com a identificação dos elementos naturais necessários à
constituição da humanidade em cada ser humano e à descoberta das
formas adequadas para se atingir esse objetivo.

Observamos, dessa forma, o quanto deve ser valorizado o estudo


pedagógico para o direcionamento das ações no espaço escolar, caracterizando
o trabalho realizado. É fundamental que o professor, o professor pedagogo, e o
gestor, conheçam as diferentes teorias da educação e optem por aquela que
melhor atenda as propostas da escola em que atuam. Não é desejável que cada
profissional da educação trabalhe como se fosse um indivíduo isolado, mas que
participe dos objetivos comuns, mantendo a unidade necessária para o sucesso
do processo de ensino e aprendizagem dos alunos.
É importante ressaltar que essa é uma tarefa árdua, que requer muito
estudo, muito debate, troca de informações e experiências, pois a escolha final
vai ser compartilhada por todos, como deve ser em um processo democrático.
Nesse sentido, o papel do professor pedagogo deve ser o de direcionar
os estudos, instrumentalizando os professores e possibilitando-lhes à prática, de
acordo com a Pedagogia Histórico-Crítica, efetivar a unidade teórico-prática.

2. AS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS

As tendências pedagógicas são teorias que visam direcionar o trabalho


educacional, orientando o professor, por meio de metodologias que tem por
objetivo concretizar o processo de ensino e aprendizagem.
Libâneo (1985) apresentou a seguinte classificação: Pedagogias
Liberais, sendo subdivididas em: Tradicional, Renovada Progressista, Renovada
Não Diretiva e Tecnicista e Pedagogias Progressistas que se subdividem em:
Libertadora, Libertária e Crítico-Social dos Conteúdos.
Saviani (1985) propôs a classificação das tendências em: teorias Não-
Críticas: Pedagogia Tradicional, Pedagogia Nova e Pedagogia Tecnicista e as
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teorias Crítico-Reprodutivistas: Teoria do Sistema de Ensino como Violência


Simbólica, Teoria da Escola como Aparelho Ideológico de Estado (AIE) e Teoria
da Escola Dualista; Teoria Crítica: Tendência Histórico-Crítica.
Analisando os autores, as divisões e subdivisões apresentadas por eles,
a nossa opção é pela classificação apresentada por Saviani, visto que propicia
um direcionamento do trabalho a ser desenvolvido de acordo com a realidade da
escola em que atuamos.

2.1. TEORIAS NÃO-CRÍTICAS

2.1.1. Pedagogia Tradicional

Sua organização inspirou-se no princípio de que a educação é um direito


de todos e dever do Estado. Era necessário atender aos interesses da nova
classe que se consolidava no poder: a burguesia. Neste momento da história, a
intenção era a de incentivar uma sociedade democrática, livre para contrapor-se
ao “Antigo Regime”. Para alcançar esta sociedade era necessário vencer a
ignorância, já que o marginalizado é o indivíduo que não é esclarecido. Neste
momento
A escola surge como um antídoto à ignorância, [...] Seu papel é difundir
a instrução, transmitir os conhecimentos acumulados pela
humanidade e sistematizados logicamente. [...] A escola se organiza
como uma agência, [...] O mestre-escola será o artífice dessa grande
obra (SAVIANI, 2009, p.5)

A pedagogia tradicional baseia-se na metodologia educacional proposta


por Herbart (1776-1841), em que as aulas são expositivas, centradas no
professor, sendo este o detentor do conhecimento científico. A marginalidade é
identificada como ignorância, assim o direito de todos decorria dos interesses da
burguesia. Sua função é disseminar a instrução, os conhecimentos acumulados
pela humanidade ao longo da história; construir uma sociedade democrática e
consolidar a democracia burguesa.

2.1.2. Pedagogia Nova

De acordo com Saviani (2009) na Pedagogia Nova, a marginalidade


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deixa de ser vista sob o ângulo da ignorância, da falta de conhecimento, e toma


um novo enfoque, agora o marginalizado é o rejeitado. A educação surge como
instrumento de correção da marginalidade, na tentativa de integrar o indivíduo à
sociedade.
O foco deixa de ser a questão pedagógica voltada ao intelecto e passa
a priorizar o sentimento. O aluno é o centro do processo e começa a exercer um
papel ativo, participativo. A iniciativa da aprendizagem parte dos alunos e não do
professor. Saviani (2009, p.8-9) diz que:
[...] em lugar de classes confiadas a professores que dominavam as
grandes áreas do conhecimento, revelando-se capazes de colocar os
alunos em contato com os grandes textos que eram tomados como
modelos a serem imitados e progressivamente assimilados pelos
alunos, a escola deveria agrupar os alunos segundo áreas de
interesses decorrentes de sua atividade livre.

O professor, neste contexto, age como orientador, propicia desafios a


partir do interesse dos alunos, que são organizados em pequenos grupos. O
método de ensino está baseado em Dewey (1859-1952), no aprender a aprender
ou aprender fazendo. Valorizam-se as atividades coletivas em que as relações
interpessoais dos alunos são priorizadas e as ações pedagógicas partem do
concreto para o abstrato. Mas, segundo SAVIANI (2012, p.9), a “Escola Nova”
aprimorou a qualidade do ensino destinado às elites.

2.1.2. Pedagogia Tecnicista

A pedagogia tecnicista destina-se a formação de um aluno racional,


eficiente e produtivo e o processo educacional passa a ser objetivo e
operacional. Nesta teoria o marginalizado deixa de ser o rejeitado e passa a ser
o indivíduo incompetente, ineficiente e improdutivo. De acordo com Saviani
(2009, p.12),
[...] A educação estará contribuindo para superar o problema da
marginalidade na medida em que formar indivíduos eficientes, portanto
capazes de darem sua parcela de contribuição para o aumento da
produtividade da sociedade. Assim, estará ela cumprindo sua função
de equalização social.

Na pedagogia tecnicista, a educação perdeu sua finalidade a partir do


momento em que se torna um subsistema que veicula o conteúdo específico, e
a escola passa a ser vista como uma instituição que tem como base a aquisição
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de habilidades, o que contribuiu para o caos do ensino já que gera


descontinuidade, heterogeneidade e fragmentação dificultando o trabalho
pedagógico.
Os aspectos metodológicos desta pedagogia ficam evidentes já que dão
ênfase aos meios, aos recursos audiovisuais, instrução programada de módulos
instrucionais. Desta forma, tanto aluno quanto professor ficam relegados às
técnicas, ao saber fazer, à eficiência. Saviani (2012, p. 12) diz que:
[...] o professor e o aluno ocupam posição secundária, relegados que
são à condição de executores de um processo cuja concepção,
planejamento, coordenação e controle ficam a cargo de especialistas
supostamente habilitados, neutros, objetivos, imparciais.

Ocorre assim, a padronização que define para o professor e aluno o que


devem fazer, quando e como, muda-se o foco para o aprender a fazer. Há uma
padronização de planejamentos formulados antecipadamente e adaptados às
diferentes modalidades. De acordo com Saviani (2009, p.11) surge a
especialização das funções pedagógicas, afirmando que “Daí a proliferação de
propostas pedagógicas tais como o enfoque sistêmico, o microensino, o
teleensino, a instrução programada, as máquinas de ensinar etc.”. Agravou-se o
problema da marginalidade. Esta teoria educacional desvalorizou o professor e
o aluno enfatizando a técnica e o saber fazer, resultando em um maior aumento
da evasão e repetência.
Foram analisadas até aqui as teorias pedagógicas difundidas pelas
teorias não-críticas, assim como foram explicitados seus conteúdos, forma de
organização e funcionamento da escola.

2.2. TEORIAS CRÍTICO-REPRODUTIVISTAS


.
2.2.1. Teoria do Sistema de Ensino Enquanto Violência Simbólica

A ideia principal que dá embasamento a esta teoria é a violência


simbólica. Como diz Saviani (2009, p. 16): “Sobre a base da força material e sob
sua determinação erige-se um sistema de relações de força simbólica cujo papel
é reforçar, por dissimulação, as relações de força material”. É evidente que a
violência material é exercida por meio da dominação econômica exercida pela
classe dominante sobre a classe dominada, que sofre a violência simbólica,
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dissimulada pela cultura da dominação.


Esta dominação se manifesta de várias formas, ou seja, pelos veículos
comunicação; religião, atividades artísticas e literárias; moda; propaganda e
educação familiar e pela ação pedagógica, a qual acentua a desigualdade. Fica
claro que as classes dominadas não possuem a força material, que é o capital
econômico, e muito menos a força simbólica que é o capital cultural. Desta forma,
este tipo de teoria só reforça a marginalidade, ao invés de superá-la.

2.2.2. Teoria da Escola enquanto Aparelho Ideológico do Estado (AIE)

Nesta teoria no plano do Estado segue duas linhas distintas: a dos


Aparelhos Repressivos do Estado e dos Aparelhos Ideológicos do Estado (AIE).
O primeiro citado funciona por meio da força, da violência; e o segundo, por meio
da ideologia. O primeiro lista: o Governo, a Administração, o Exército, a Polícia,
os Tribunais, as Prisões. Dentre os Aparelhos Ideológicos do Estado,
compreendem-se: o religioso, o escolar, o familiar, o jurídico, o político, o
sindical, o da informação e o cultural.
A escola, nesta teoria, transfere os saberes da ideologia dominante aos
alunos, durante anos, constituindo-se no instrumento mais completo de
reprodução das relações de produção do tipo capitalista, e é no contexto dessas
relações que se nota o fenômeno da marginalização que deseja perpetuar os
interesses da elite capitalista.

2.2.3. Teoria da Escola Dualista

Esta teoria nos dá conta de que a escola está dividida em duas grandes
redes que correspondem à divisão da sociedade capitalista em duas classes:
burguesia e proletariado. O espaço escolar reforça essa dualidade quando
contribui para a formação da força de trabalho e enfatiza a ideologia burguesa.
“Saviani (2009, p. 24) salienta que: “Mais do que isso: todas as práticas
escolares, ainda que contenham elementos que implicam um saber objetivo (...)
são práticas de inculcação ideológica”. Sendo assim, o espaço que deveria ser
de transformação, passa a ser de manutenção da ideologia dominante.
[...] qualifica o trabalho intelectual e desqualifica o trabalho manual,
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sujeitando o proletariado à ideologia burguesa sob um disfarce


pequeno burguês. Assim pode-se concluir que a escola é ao mesmo
tempo um fator de marginalização relativamente à cultura burguesa
assim como em relação cultura proletária (SAVIANI, 2009, p. 25).

Ou seja, quando prioriza o trabalho intelectual em detrimento do trabalho


manual, a escola assume a função de reprodutora e não de transformadora da
ordem vigente, descaracterizando sua função social.

2.3. PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA

Na década de 1970 há a necessidade premente de se articular uma


proposta pedagógica cujo compromisso maior seja a transformação da
sociedade e não sua manutenção. Desta forma, surge a Pedagogia Histórico-
Crítica como resposta às pedagogias não-críticas (Tradicional, Escola nova e
Tecnicista) e às pedagogias crítico-reprodutivistas (Escola como Aparelho
Ideológico do Estado, Teoria da Reprodução e Escola Dualista). Assim, o
objetivo da Pedagogia Histórico-Crítica é resgatar a crítica e a dialética no
processo de ação-reflexão sobre a práxis social.
As teorias progressistas buscam uma pedagogia que tenha por
finalidade atender os interesses dos que estão sendo dominados pelo sistema
capitalista e não mais dos dominantes. Destaca-se aqui a “pedagogia crítico-
social dos conteúdos”, apresentada por Libâneo (1990, apud SAVIANI, 2008)
[...] Libâneo entende que, na pedagogia crítico-social dos conteúdos, o
papel primordial da escola é difundir conteúdos vivos, concretos,
indissociáveis das realidades sociais, sendo esse o “melhor serviço
que se presta aos interesses populares” (idem, p. 39). E os conteúdos
do ensino não são outros senão os conteúdos culturais universais que
vieram a se constituir em patrimônio comum da humanidade, sendo
permanentemente reavaliados à luz das realidades sociais nas quais
vivem os alunos (SAVIANI, 2011, p.419)

A Pedagogia Histórico-Crítica aparece logo em seguida, empenhada em


colocar a educação escolar a serviço da transformação social de forma crítica
não reprodutivista. Tem seu fundamento no materialismo histórico e nos
fundamentos psicológicos da Teoria Histórica Cultural de Vygotsky. Conforme
esclarece Saviani (1996, p. 102) a expressão “Pedagogia Histórico-Crítica”
representa
[...] o empenho em compreender a questão educacional a partir do
desenvolvimento histórico objetivo. Portanto, a concepção pressuposta
nesta visão da pedagogia histórico-crítica é o materialismo histórico,
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ou seja, a compreensão da história a partir do desenvolvimento


material, da determinação das condições materiais da existência
humana. No Brasil, esta corrente pedagógica firma-se
fundamentalmente, a partir de 1979.

Tal teoria responde aos três grandes passos do método dialético da


construção do conhecimento: prática-teoria-prática.
O que define de forma objetiva a expressão Pedagogia Histórico-Crítica
é a articulação de uma proposta pedagógica que se empenha, não apenas em
manter a sociedade como está posta, mas em transformá-la a partir da
compreensão dos condicionantes sociais. Saviani (2009) afirma que é possível
uma pedagogia capaz de superar o problema da marginalidade, articulando a
escola aos interesses da classe dominada.
A Pedagogia Histórico-Crítica se empenha na defesa da finalidade da
escola, que está ligada à questão do conhecimento produzido historicamente,
indispensável à compreensão da prática social e neste sentido é preciso resgatar
a função da escola e reorganizar o trabalho educativo.
[...] situar a especificidade da educação como referida aos
conhecimentos, ideias, conceitos, valores, atitudes, hábitos, símbolos
sob o aspecto de elementos necessários a formação da humanidade
em cada indivíduo singular, na forma de uma segunda natureza, que
se produz, deliberada e intencionalmente, através das relações
pedagógicas historicamente determinadas que se travam entre os
homens (SAVIANI, 2012, p. 20).

A educação, mesmo sendo elemento condicionado pela sociedade, não


deixa de exercer influência sobre o elemento condicionante, quando é capaz de
cumprir sua especificidade e sua função social que é socializar o saber elaborado
entre as camadas populares. A relação entre professor e aluno deve ser de
agentes ativos no processo de aquisição de conhecimento, em que o professor
incentive e estimule os alunos em suas atividades, favoreça o diálogo dos alunos
entre si e com ele, sem perder de vista a relação com a cultura acumulada
historicamente. Deve-se levar em conta os interesses dos alunos, os variados
ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, mas sem perder de
vista a sistematização dos conhecimentos, sua ordenação e gradação para
efeitos do processo de transmissão-assimilação dos conteúdos cognitivos. A
aprendizagem, nesta teoria é resultante da interação entre aluno, conhecimento
e elementos culturais. Dessa forma, Saviani (2009, p. 63) diz que: “Esse método
realiza a vinculação entre educação e sociedade, que os professores e alunos
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são tomados como agentes sociais”.


A Pedagogia Histórico-Crítica se compromete a articular teoria e prática,
professores e alunos numa unidade, compreendendo que esses dois pólos
contrapõem-se entre si e dá movimento ao trabalho pedagógico. Entende a
educação como mediação na prática social global, sendo, portanto, a prática
social, o ponto de partida e o ponto de chegada nas atividades educativas.
Saviani (2009) propõe um método organizado em cinco passos: A
prática social inicial, problematização, instrumentalização, catarse, prática social
final.
A Prática social inicial é o ponto de partida, o início, comum tanto ao
professor quanto aos alunos, já que assumem posições diferentes em relação
ao conhecimento. Assim, inicia o movimento dialético que vai da síncrese (visão
caótica, fragmentada do todo) à síntese (conhecimento mais elaborado,
científico) pela mediação da teoria.
O segundo momento é o da problematização, isto é, a etapa em que o
professor levanta, com os alunos, os problemas enfrentados na sociedade, sobre
determinado tema, objeto de estudo da unidade planejada pelo professor.
Na instrumentalização, o conhecimento científico deve ser elaborado
entre professor e aluno. Entretanto, vale ressaltar que o aluno parte de uma visão
sincrética, não idêntica à do professor que já possui uma visão de síntese, e,
portanto, media o conhecimento.
A catarse, por sua vez, revela-se na síntese final elaborada pelo aluno,
que, partindo de sua realidade (conhecimento sincrético), por meio da mediação
do professor, tem um salto qualitativo na aprendizagem, chegando a uma visão
mais elaborada, de síntese. A catarse revela‐se na elaboração e expressão final
da síntese a que o aluno foi capaz de chegar.
Em sua nova prática social, o aluno alterou qualitativamente seu
conhecimento pela mediação, em movimento dialético contínuo “[...] a prática
social referida no ponto de partida (primeiro passo) e no ponto de chegada
(quinto passo) é e não é a mesma (SAVIANI, 2009, p. 65)”. O ponto de chegada
volta a ser o ponto de partida constantemente.

3. PROJETO DE IMPLEMENTAÇÃO PEDAGÓGICA


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A implementação do Projeto aconteceu no Colégio Estadual Rosa Delúcia


Calsavara - Ensino Fundamental e Médio, em Cambira, Paraná entre fevereiro
e junho de 2014, com a participação de professores e professores pedagogos.
Durante a Semana Pedagógica de 2014, foi exposta a proposta de
trabalho, bem como os objetivos pretendidos, oportunizando a realização de um
Grupo de Estudos, composto por professores e professores pedagogos. Os
profissionais presentes demonstraram interesse e 10 pessoas se
comprometeram em participar.
No Grupo os trabalhos foram realizados de forma presencial. Inicialmente
foi aplicado um questionário pertinente à temática do projeto: função social da
escola e as teorias pedagógicas com foco na Pedagogia Histórico-Crítica. Por
meio das respostas dos educadores, foi possível conhecer o grau de domínio
que possuíam acerca das teorias pedagógicas, com vistas aos estudos
pretendidos no Grupo.
Elaborou-se um cronograma, de acordo com as possibilidades do Grupo
e, por e-mail, foram informadas as datas e os materiais que seriam estudados,
para que todos pudessem se familiarizar com os temas.
No primeiro encontro foi trabalhado o texto “Sobre a Natureza e
Especificidade da Educação” (SAVIANI, 2012), o objetivo foi mostrar que, ao
longo de sua trajetória, a escola perdeu sua função primordial, ou seja, a de
ensinar o conteúdo formal, ficando assim descaracterizada e assumindo outras
funções não pertinentes ao processo de ensino e aprendizagem.
No três encontros seguintes foram apresentadas as “teorias não críticas”:
(Saviani 2012), A Pedagogia Tradicional, A Pedagogia Nova e a Pedagogia
Tecnicista. “As teorias críticos-reprodutivistas”, Teoria do sistema de ensino
como violência simbólica, Teoria da escola como Aparelho Ideológico de Estado
(AIE) e Teoria da Escola Dualista. Ao tempo em que os textos foram sendo lidos
e discutidos, foi notório perceber que o conhecimento dos professores sobre as
teorias pedagógicas é superficial, e que os mesmos acabam fazendo confusão
entre as mesmas. Na prática pedagógica em sala de aula o professor utiliza um
pouco de cada teoria e acredita que está fazendo o melhor possível, mas falta
aporte teórico, devido às lacunas na formação inicial e continuada.
No quinto encontro foi realizada leitura e debatida a Pedagogia Histórico-
Crítica, que norteia o Projeto Político-Pedagógico da Escola. No decorrer das
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discussões os professores perceberam que, apesar da Pedagogia Histórico-


Crítica orientar o PPP de nossa escola na prática pedagógica, ainda há
necessidade de ações coletivas na prática pedagógica, garantindo assim, o
conhecimento formal do indivíduo. É comum, em sala de aula, o professor
reproduzir o modelo que aprendeu na formação inicial ou o que norteou a prática
dos seus professores na educação básica, desprezando o embasamento teórico,
privando o aluno de se apropriar de uma aprendizagem significativa que promova
sua emancipação.
Ficou evidente que o trabalho pedagógico transforma-se em uma “colcha
de retalhos”, visto que não há embasamento teórico resultando em uma prática
pedagógica sem continuidade.
Como a Pedagogia Histórico-Crítica é que embasa o Projeto Político-
Pedagógico da escola, tida como a que melhor contempla a sua função,
promovendo o ensino do saber sistematizado, o Grupo percebeu a importância
de buscar a unidade na Pedagogia Histórico-Crítica.
A leitura e reflexão do texto “A materialidade da ação pedagógica e os
desafios da Pedagogia Histórico-Crítica (Saviani 2012), possibilitou aos
educadores uma análise da prática pedagógica e dos desafios a serem vencidos
para alcançar os objetivos de uma educação transformadora. Esta reflexão foi
muito importante como subsidio para as próximas etapas da formação que
consistiam na leitura, análise e reelaboração do Projeto Político- Pedagógico da
Escola.
O trabalho final do Grupo de Estudos consistia no estudo e propostas de
reelaboração do Projeto Político-Pedagógico da escola. Durante a leitura e
análise do Projeto Político-Pedagógico foi possível perceber que o documento
escrito está pautado na Pedagogia Histórico-Critica, sendo necessárias
mudanças na organização do trabalho pedagógico.
O grupo concluiu que o ideal seria que todos os profissionais da escola,
participassem da formação, pois é necessário um aprofundamento nos estudos
da Pedagogia Histórico-Crítica, em especial, no que se refere ao conhecimento
e prática dos cinco passos organizados por Saviani (2012). Este método de
ensino possibilita ao professor transmitir o saber elaborado, assegurando à
escola o cumprimento de sua função social.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dentre os objetivos do Governo do Paraná, ao ofertar a formação, por


meio do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), estão diagnosticar
os problemas de cada realidade escolar e propor alternativas capazes de
resolvê-los ou minorá-los. Cientes da importância do papel do professor no
processo educacional, da necessidade da teorização de sua prática, e
constatando a lacuna existente na formação acadêmica dos mesmos, foi
oportunizado retomar estudos visando a prática em sala de aula.
Neste sentido, estudou-se e discutiu-se a respeito da função social da
escola, bem como oportunizou-se aos professores e professores pedagogos
aprofundar os estudos a respeito das teorias pedagógicas, com foco na
Pedagogia Histórico-Crítica, já que é esta teoria que embasa o Projeto Político-
Pedagógico da escola em que o Projeto foi implementado.
Uma das questões presentes durante o nosso trabalho está relacionada
ao fato de que os professores não conseguem perceber a necessidade do
embasamento teórico sólido, para sustentar os conteúdos ministrados, e por esta
razão reproduzem o que a sociedade capitalista determina. Não oportunizam aos
alunos das classes trabalhadoras, que são o “público alvo” das escolas públicas,
o acesso ao conhecimento científico, artístico e filosófico.
O processo de gestão democrática da escola exige dos profissionais da
educação maior participação na elaboração dos documentos que regem o
trabalho desenvolvido na escola. Para isso é importante que tenham ciência da
Pedagogia Histórico-Crítica, que acreditamos, é a que torna possível a formação
adequada do indivíduo para atuar na transformação social superando as
desigualdades existentes.
Podemos pesar a relevância da Pedagogia Histórico-Crítica para
educação brasileira e a necessidade de ser estudada, debatida e difundida no
interior das escolas, pois entende-se que esta teoria foi desenvolvida refletindo
a educação da escola pública do nosso país.

REFERÊNCIAS
16

DUARTE, Newton. Concepções afirmativas e negativas sobre o ato de ensinar.


Caderno Cedes, Campinas, v. 19, n. 44, abr. 1998.

EVANGELISTA, Olinda; SHIROMA, Eneida Oto. Professor: protagonista e obstáculo da


reforma. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.33, n.3, p. 531-541, set./dez. 2007.

LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da escola pública: a pedagogia crítico-social


dos conteúdos. São Paulo: Loyola, 1990.

LUFT, Celso Pedro. Minidicionário Luft. São Paulo: Ática, 2002.

SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara,


onze teses sobre a educação política. 41. ed. Campinas SP: Autores Associados, 2009.

_____. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 2. ed. São Paulo: Cortez:


Autores Associados, 1991.

_______. Histórias das ideias pedagógicas no Brasil. 3. ed. Campinas, SP: Autores
Associados, 2011.

_____. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 11. ed. Campinas SP:


Autores Associados, 2012.

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