Ciência Da Religião - Uma Disciplina
Ciência Da Religião - Uma Disciplina
Ciência Da Religião - Uma Disciplina
Abstract
The present article presents a brief historiography of the transformations that
European society and culture went through, pointing out the events that promoted the
constitution of the science of religion as an autonomous discipline. It also describes a
succinct inventory of part of the academic production that provided research material
on religions in the century preceding the creation of the new science. Finally, the
article develops the methodological contributions, based on classical authors, to the
institutionalization of the science of religion.
Keywords: Religious studies. Theory and method in religious studies. Religiography.
Discipline. Religion.
* Declaração dos coautores: Este artigo teve a sua primeira versão elaborada pelo primeiro
coautor, sendo o presente trabalho parte integrante de sua tese doutoral no Programa
de Pós-graduação em Ciências da Religião da PUC Minas. O segundo coautor contribuiu
com a redação da versão final e na revisão crítica do artigo.
** Doutor em Ciências da Religião pela PUC Minas. Bolsista CAPES. https://orcid.org/0000-
0002-3673-5215 . [email protected] .
*** Doutor em Filosofia pela Universidad Complutense de Madrid. Bolsista de Produtividade
de Pesquisa do CNPq. Docente do Depto. de Ciências da Religião da PUC Minas.
http://orcid.org/0000-0001-7676-9850 . URL http://www.pucminas.br/ppgcr .
[email protected]
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Flávio Senra
Resumen
El presente artículo presenta una breve historiografía de las transformaciones que
experimentaron la sociedad y la cultura europeas, señalando los acontecimientos que
favorecieron la constitución de la ciencia de la religión como disciplina autónoma.
También describe un breve inventario de parte de la producción académica que
proporcionó material de investigación sobre las religiones en el siglo anterior a
la creación de la nueva ciencia. Por último, el artículo desarrolla las aportaciones
metodológicas, de autores clásicos, a la institucionalización de la ciencia de la religión.
Palabras clave: Ciencias de la religión. Epistemología de la religión. Religiografia.
Disciplina. Religión.
Introdução
O processo de institucionalização da disciplina ciência da religião 1
percorreu um longo caminho até a sua consolidação na Europa do século
dezenove. Reconhecer tal processo para os tempos atuais se faz necessário,
pois nenhuma disciplina se consolida sem revisar continuamente o seu
percurso intelectual, questionar perspectivas de abordagem e propor
continuamente novos caminhos. Até mesmo uma crítica descolonizadora
dependerá desse reconhecimento para avançar em sua crítica.2 A construção
do perfil teórico-metodológico da disciplina é um processo sempre aberto
e criativo. No entanto, não há criação sem reconhecimento do lastro
desse empreendimento acadêmico. Estamos cada vez mais convencidos
de que não haverá significativo avanço no processo de consolidação da
disciplina ciência da religião em nosso país enquanto persistir certa recusa
do reconhecimento do seu percurso intelectual. Não desconsideramos,
por força da nossa compreensão da interdisciplinaridade constitutiva da
ciência da religião, as referências, teorias e métodos de outras disciplinas
dedicadas ao estudo da religião. Contudo, a afirmação da disciplina ciência
da religião como disciplina autônoma, requer que as suas pesquisadoras e os
pesquisadores não renunciem à tarefa de construção de um saber que tem
1
Os leitores e as leitoras poderão estranhar o uso do termo no singular. Ocorre que
a disciplina Religionswissenschaft foi acolhida no Brasil como Ciências da Religião.
Comumente, utilizamos essa nomenclatura majoritária em nossos escritos. Porém, em se
tratando de uma reflexão que se assenta sobre os textos clássicos da disciplina na Europa
da segunda metade do século XIX, optamos por manter o termo no singular. Esse debate
de fundo não é irrelevante nem simples. Contudo, não entraremos aqui nos meandros
dessa questão.
2
Cf. Borges; Senra (2020).
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3
Um levantamento sobre os estudos antigos foi realizado por Frank Usarski (2013). O
pesquisador destaca como os historiadores gregos se empenharam na descrição das
religiões dos outros povos no período da expansão helenista. No século V AEC, Heródoto
descreveu os costumes religiosos do Egito, Babilônia e Pérsia, e, no século IV AEC,
Evêmero criou uma das primeiras especulações sobre a origem da religião. Usarski destaca
que estudos da religião não ficaram restritos ao contexto ocidental. No oriente, entre os
séculos IV e V EC, o chinês Fa-Hien publicou estudos detalhados sobre o budismo na
Índia e em outros países. No século VII, Hieun-Tsiang desenvolveu pesquisas e acumulou
artefatos e escritos sagrados sobre o budismo na Índia. A partir do século IX autores
muçulmanos se destacaram no estudo de outras religiões. Tabari (838-923) estudou a
religião persa; Mas’udi (?-956) o judaísmo, cristianismo e as religiões indianas; Al Biruni
(973-1050) as crenças e práticas religiosas da Índia e Pérsia; Ibn Hazman (994-1064), o
judaísmo e o cristianismo, e o persa Sharastani (1086-1153) escreveu um tratado sobre as
religiões conhecidas no período.
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A leitora e o leitor compreenderão que não é nosso objetivo aprofundar a complexidade
desses eventos. O que se pretende, outrossim, é demarcar um conjunto de fatores que
contribuíram, de certa forma, para a criação de um ambiente cultural para o surgimento
da disciplina Ciência da Religião.
5
A renascença foi um movimento histórico caracterizado pelo renascimento do pensamento,
da redescoberta e da valorização da cultura grega e por um processo evolutivo do
conhecimento que favoreceu o desenvolvimento gradual do espírito científico. Veja-se
conforme Rosa (2012a).
6
Rosa (2012a) relaciona as mais importantes universidades: Paris (1175), Oxford (1220),
Montpellier e Salamanca (1222), Pádua (1224), Nápoles (1229), Palermo (1230), Toulouse
(1230), Cambridge (1231), Siena (1246), Sorbonne (1253), Lisboa (1290), Roma (1303),
Coimbra (1308), Praga (1317), Florença (1349), Cracóvia (1364), Viena (1365), Heidelberg
(1386), Saint Andrews em Edimburgo (1410), Louvain (1426), Poitiers (1432), Caen (1436),
Bordéus (1441), Valencia (1452), Nantes (1460) Burgos (1463) e Uppsala (1476).
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Como destaca Karina Bellotti, o imperialismo e o colonialismo europeu produziram um
imenso acervo de informações sobre as religiões dos povos colonizados. Documentos
religiosos, relíquias, papiros, estátuas e inscrições hieroglíficas foram sequestrados pelos
colonizadores para as respectivas sedes. Além disso, a expansão colonial colocou em
contato as elites europeias e as formas religiosas dos povos considerados por eles, segundo
um viés etnocêntrico, como primitivos, sem ciência e sem cultura (BELLOTTI, 2011).
Investidas colonialistas, tais como as expedições militares de Napoleão no norte da África,
tiveram grande impacto nos estudos da linguística, da história e dos estudos acadêmicos da
religião, assim como as investidas britânicas no Oriente Médio, que impactaram os estudos
filológicos com o acesso à língua copta, assíria e hitita (SOUZA, 2019). Recomendamos
a leitura de Wirth (2013) para uma compreensão sobre a disciplina Ciência da Religião na
perspectiva dos estudos pós-coloniais.
8
O orientalismo (incluindo aqui também estudos de outros povos não europeus) foi
marcado pelos estudos filológicos, antropológicos, arqueológicos, sociológicos e
comparativos da religião.
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Para mais informações sobre o processo de secularização, sugerimos a leitura de Berger
(2012); Lepargneur (1971); e Silva (2016a; 2016b).
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Também aqui ressaltamos que o objetivo do presente trabalho está focado em apresentar
uma visão panorâmica e circunstanciada da formação da disciplina.
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An intuition of God, the sense of human weakness and dependence, a belief in a Divine
government of the world, a distinction between good and evil, and the hope of a better life.
14
The ag gregate of all those phenomena which are invariably ter med religious, in
contradistinction to ethical, aesthetical, political, and others.
15
The task of investigating religion as a historical-psychological, social, and wholly
human phenomenon undoubtedly belongs to the domain of science.
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Filoramo e Prandi (1999), assim como Hock (2010) destacam que, a esse respeito, o
método comparativo consistia em nomear, classificar, reagrupar e ordenar os fatos
religiosos visando acessar os elementos genéricos das religiões. Para mais dados sobre as
diversas formas de pesquisas comparativas, sugerimos a leitura do capítulo IV, Aproximações
sistemáticas e fenomenológicas, item 5, A comparação histórico-religiosa, (HOCK, 2010).
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cumpre ao cientista da religião ser “o mestre do material com o qual ele tem
que trabalhar, embora outros tenham descoberto isso para ele” (TIELE,
1896, p. 19, tradução nossa)20.
Chantepie de la Saussaye (1891), assim como os demais fundadores,
considerou que a ciência da religião deveria desenvolver seu próprio método
a partir da especificidade e da diferenciação de seu objeto de pesquisa em
relação às outras disciplinas 21. Entretanto, para o autor, o que possibilitou
o desenvolvimento de uma ciência específica no estudo e compreensão do
fenômeno religioso foi a análise da religião sob perspectivas antropológicas,
filosóficas, culturais e metodológicas de outras ciências, o que obriga o
cientista da religião a desenvolver ações de colaboração com outras disciplinas.
Uma proposta metodológica significativa de Saussaye (1891) diz respeito à
coleta de dados da pesquisa. O autor propõe que os dados da pesquisa não
sejam concentrados exclusivamente nas produções literárias dos estratos
mais altos dos povos, mas também no indivíduo simples, com suas práticas
religiosas, costumes, consciência religiosa, superstições e forma de cultuar.
A contribuição metodológica mais importante de Saussaye diz respeito
à fenomenologia da religião. Em sua compreensão, a fenomenologia da
religião está ligada à psicologia, tendo em vista que lida com os fatos da
consciência humana. Em virtude disso, os processos internos explicariam até
mesmo as formas exteriores da religião igualando-as aos demais processos
da atividade humana. Ele propõe que a análise fenomenológica se baseie na
análise dos rituais religiosos, cultos e costumes, que apesar de serem atos
externos, assimilados e combinados com elementos da cultura, são precedidos
de atos internos como pensamentos, impressões, sentimentos e estados
religiosos (SAUSSAYE, 1891)
Joachim Wach, nessa sequência de autores destacados como
clássicos da disciplina, teve seus estudos marcados pela preocupação com
a determinação empírica da disciplina (WACH, 2018) e com a preocupação
da base metodológica dos estudos da religião (QUADROS, 2010). Em
virtude disso, ele propôs a divisão metodológica dos estudos da religião em
dois ramos: 1), o ramo dos estudos empíricos da religião, que consiste na
análise do fazer das religiões, e do estudo do “desenvolvimento contínuo
da religião empiricamente observável” (WACH, 2018, p. 237), buscando a
compreensão e apresentação do desenvolvimento das religiões.; 2) o ramo
Master of the material with which he has to work, although others have discovered it for him.
20
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3.3.1 Interdisciplinaridade
O primeiro pressuposto, da interdisciplinaridade, é que garante à ciência
da religião a capacidade de ter “algo a dizer e algo a ouvir de todas as outras
áreas” (SOUZA, 2019). Nenhum dos clássicos da disciplina conheceu o termo
interdisciplinaridade, mas podemos identificar que todos mantiveram posturas
teóricas e metodológicas de cunho interdisciplinar. O termo interdisciplinaridade
foi desenvolvido na França por Georges Gusdorf (1967) a partir da crítica
dos efeitos da fragmentação do conhecimento na formação acadêmica. Em
suas considerações ele afirmou que “o especialista acessa apenas a visão geral
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[...] no limite de seu campo [...] nada em sua experiência pessoal o prepara
para ir além” (GUSDORF, 1967, p. 45). 22 Em virtude dessas questões o
pensador francês criou o primeiro “projeto de pesquisa interdisciplinar nas
ciências humanas” (GUSDORF, 1967, p. 38, tradução nossa), 23 visando à
criação de uma inteligência e imaginação disciplinares24.
Extemporaneamente, a questão interdisciplinar pode ser antevista na
gênese da ciência da religião, considerando, ao seu modo, a proposição da
necessária confluência de disciplinas como a história da religião, filosofia da
religião, ciência da linguagem, filologia, ciências sociais e teologia. A ciência
da religião se desenvolveu e se consolidou nesse contexto de cooperação, o
que podemos definir como um ambiente proto interdisciplinar onde se observa,
entretanto, que nem sempre as interações visavam especificamente o estudo
acadêmico da religião.
Max Müller (1867) foi o responsável pela aplicação desse ambiente
proto interdisciplinar na ciência da religião. Tomando de empréstimo suas
considerações sobre a ciência da linguagem, o autor afirmou a necessidade
de uma divisão do trabalho científico entre áreas distintas.
Para Cornelis Petrus Tiele (1896), tal divisão do trabalho científico
correspondeu ao empréstimo teórico de outras ciências na construção da
compreensão da natureza e da origem da religião.
Pierre Daniel Chantepie de la Saussaye (1891) considerou que a análise
da religião e a explicação dos processos internos do sentimento religioso
demandavam a análise de outras ciências como a psicologia e a filosofia,
além de colaborações fenomenológicas, antropológicas e culturais, o que
necessariamente implicaria esforços de outras ciências.
Joachim Wach ampliou a compreensão de divisão do trabalho para
trabalho conjunto. Sua proposta era que “os estudiosos da religião e da filosofia
como também os das ciências sociais se reunissem em conjunto, a intervalos
periódicos, para estimulação recíproca, contribuindo cada um deles para o
22
Le spécialiste n’accède aux vues d’ensemble [...] aux confins de son domaine. Dans son
expérience personnel, ne le prépare à aller plus loin.
23
Projet recherche interdisciiplinaire dans les sciences humaines.
24
A pesquisadora Tatiane Almeida, doutoranda no Programa de Pós-graduação em Ciências
da Religião da PUC Minas, desenvolve uma pesquisa relacionada à interdisciplinaridade
nas Ciências da Religião com o título: “Ciências da Religião no Brasil: estudo analítico-
comparativo sobre o perfil teórico-metodológico das propostas pedagógicas dos programas
de Pós-graduação em Ciência(s) da(s) Religião(ões) no Brasil (2017-2020) a partir das
noções de disciplinaridade e interdisciplinaridade”. Veja-se ainda em Almeida (2020).
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Deve-se considerar que a interdisciplinaridade contribuiu para o desenvolvimento
teórico/epistemológico da ciência da religião, na medida em que posições evolucionistas,
comparativas e apologéticas foram abandonadas através das discussões interdisciplinares
sobre os fundamentos e métodos da ciência da religião nas décadas que se seguiram à
fase formativa da disciplina (HOCK, 2010).
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Considerações Finais
A disciplina ciência da religião não surge ao acaso dos interesses
acadêmicos de sua época. Trata-se de um fruto amadurecido ao longo dos
séculos. Um conjunto de transformações sociais e culturais favoreceram o
surgimento das condições de sua aparição no cenário acadêmico. Significativos
esforços no campo da pesquisa sobre religiões, motivadas pelo processo de
exploração colonialista das metrópoles europeias ofereceram o material para
que a disciplina se organizasse a partir da segunda metade do século XIX. O
presente artigo, partiu do reconhecimento sobre o processo de constituição da
disciplina ciência da religião, pontuou as transformações, eventos e produções
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