Parecer-Built To Suit

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Município de Jacareí

Secretaria de Assuntos Jurídicos

PARECER Nº 001/AA/SAJ/2013

Consulta: contratação “Built to Suit”

LOCAÇÃO DE PRÉDIO. OBRIGAÇÃO DE FAZER


CONSISTENTE NA CONSTRUÇÃO DO MESMO.
FIGURA DA “CONSTRUÇÃO SOB MEDIDA”, MELHOR
CARACTERIZADA COMO “BUILT TO SUIT”.
CONCEITUAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE RETORNO,
PELO LOCADOR, ATRAVÉS DO CRI - CERTIFICADO
DE RECEBÍVEIS IMOBILIÁRIOS. SECURITIZAÇÃO.
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ENQUADRAMENTO.
APLICABILIDADE DA LEI DE LOCAÇÕES.
CONSIDERAÇÕES SOBRE A UTILIZAÇÃO DE IMÓVEL
PRÓPRIO. INSTITUTO DA PERMUTA. NÃO
RECOMENDÁVEL A UTILIZAÇÃO DO DIREITO DE
SUPERFÍCIE. POSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO.
NECESSIDADE DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.

I - A CONSULTA - CONSIDERAÇÕES GERAIS

A consulta básica diz respeito à pretensão, por parte da


Administração Pública Municipal, de proceder licitação cujo objeto seria a locação de um
prédio para instalação de equipamento público. Até aí não haveria problema algum, uma vez
que toda e qualquer licitação visa buscar as melhores condições de contratação para o ente
público num universo de mercado em que haveria uma multiplicidade de ofertas.

Ocorre que, especificamente para locação de imóveis, essa


multiplicidade é muito mais restrita. Não necessariamente existe disponibilidade de imóveis
em determinado local ou região que atenderiam as necessidades e especificações para
instalação de equipamentos públicos - antes o contrário! E exatamente por esse motivo que
a Lei Licitatória traz como uma das possibilidades de dispensa de licitação justamente a
locação de imóveis (desde que observado o preço de mercado), pois a oferta é tão restrita
que realizar todo um procedimento licitatório restaria inócuo perante os possíveis licitantes
que atenderiam à demanda da Administração. Invariavelmente apenas um teria a

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capacidade de disponibilizar um imóvel, o qual, certamente, ainda teria que passar pela
inafastável etapa de reforma e adequação, gerando, inclusive, uma despesa complementar
aos cofres públicos.

Partindo dessa premissa temos que o Poder Público - cujos


recursos são limitados, inclusive para a aquisição de bens imóveis (em que pese a
prerrogativa da desapropriação) - possui uma grande dificuldade para encontrar no mercado
um imóvel no local certo, do tamanho certo, construído do modo certo e que viabilize a
instalação de um equipamento público. Também invariavelmente a única saída acaba sendo
a construção do que é necessário de acordo com as disponibilidades orçamentárias, o que
acaba inviabilizando projetos de grande porte.

Assim, voltando ao objeto original da consulta, considerando as


argumentações acima, e complementando o intento da Municipalidade, pretender-se-ia a
abertura de licitação cujo objeto seria a locação de um prédio com obrigação de fazer,
consistente na construção desse prédio pela licitante em imóvel da própria licitante, segundo
as especificações apresentadas pela Administração, para instalação de equipamento
público.

Temos assim o que poderíamos chamar de “locação sob


medida” ou então “construção sob medida”, isto é, a locação de um imóvel a ser construído
pelo futuro locador (proprietário) conforme as especificações pré-determinadas pelo futuro
locatário (Município). O contrato locatício garantiria que o locador teria a receber tantos
aluguéis quanto necessários para garantir não só o retorno dos investimentos realizados na
construção, como também a justa remuneração pela utilização do bem imóvel por um
período longo suficiente a viabilizar esse ajuste.

Esse tipo de locação é na realidade uma modalidade de


negócio conhecida no mercado como “built to suit”.

II - LOCAÇÃO “BUILT TO SUIT” - CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

Mais especificamente baseado no conceito de “construção sob


medida”, basicamente temos a figura do desenvolvimento e execução de um
empreendimento com características e parâmetros específicos visando o atendimento a um
usuário pré-definido. Esta é a essência de um “contrato built to suit”, também conhecido
como “locação built to suit”: uma locação em que a contratada adquire o terreno indicado
pelo contratante, realiza o projeto e a obra em conformidade com as exigências deste, e a

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ele cede o uso do imóvel, por meio de locação, por período de tempo suficiente para lhe
garantir a amortização do investimento inicial - um prazo que geralmente varia em torno de
10 a 15 anos.

Ainda que no cerne estejamos falando de uma relação


locatícia, tendo por fundamento a Lei nº 8.245/91, esse tipo de contratação possui
características bastante específicas.

O que a assemelha a uma relação qualquer de locação é que


possui elementos característicos desse tipo de contrato, ou seja, uma das partes
disponibiliza à outra a utilização de um imóvel por determinado período de tempo.

Já o que a torna distinta de uma típica contratação é que, no


momento do ajuste, o imóvel que será objeto da relação sequer está construído. Mais: o
futuro locatário tem o poder arbitrário de interferir na construção do imóvel, podendo
estabelecer os parâmetros para que o projeto e execução atendam às suas próprias
necessidades e particularidades.

Essa característica diferenciada acaba por determinar duas


fases distintas para a contratação, logo após sua formalização.

Em primeiro lugar temos a compra do terreno por parte do


locador, o desenvolvimento do projeto e a efetiva construção do imóvel. Essa fase é regida
pelo Direito Civil.

Em segundo lugar temos o aceite e a entrega do imóvel ao


locatário, quando de fato começa a relação locatícia. Essa fase é regida pela Lei de
Locações.

Indispensável lembrar que, entre uma fase e outra dessa


contratação - ainda que a locação já esteja previamente ajustada desde o início do negócio -
existe ainda uma fase intermediária de transição para viabilizar sua eficácia. Explico. Como
a primeira fase está subordinada ao Direito Civil, somente quando de sua conclusão é que
haverá a possibilidade de subordinação direta à Lei de Locações. Desse modo a
aplicabilidade da Lei de Locações dar-se-á somente após o cumprimento das condições
suspensivas, conforme determina o próprio Código Civil:

“Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando


exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do

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negócio jurídico a evento futuro e incerto.

(...)

Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à


condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se
terá adquirido o direito, a que ele visa.”

E de quais “condições suspensivas” estaríamos falando?


Daquelas intrinsecamente ligadas à consecução do prédio, cabendo relacionar mas não
exaurir:

a) elaboração e aprovação dos projetos básicos e executivos pelo locatário contratante;

b) aprovação pelos órgãos governamentais competentes dos projetos de construção do


imóvel objeto da locação;

c) execução da edificação conforme projeto definido e aprovado pelo locatário e sob


responsabilidade e custo do locador

d) obtenção do certificado de ocupação (“habite-se”) da edificação a ser locada.

Em paralelo, como direito do locador, temos que a avaliação da


estabilidade financeira do locatário é etapa imprescindível. Ora, tratando-se de uma
construção “sob medida”, esse imóvel servirá tão-somente aos propósitos e necessidades
daquele locatário em específico - não sendo viável ou desejável o rompimento do pacto para
buscar uma nova relação locatícia. Desse modo o futuro locatário deve ter meios de garantir
que possuirá recursos futuros para honrar um compromisso de tão longo prazo.

Assim, para mitigar o risco que corre o locador de que o


locatário rompa o vínculo antes que se dê pelo menos a amortização de seu investimento
original, é que o contrato prevê um prazo mínimo de permanência do locatário, prazo este
calculado com base no custo do desenvolvimento do projeto e realização da construção,
não afastando a necessidade de aplicação de multa, a qual teria o condão somente de
viabilizar o ressarcimento ao locador, motivo pelo qual sua estipulação geralmente
corresponde ao total do valor devido referente às parcelas do aluguel a vencer. Ou seja, a
multa não teria caráter punitivo ou mesmo moratório, mas tão-somente compensatório.

Outra característica inerente a esse conceito de contratação é


a nítida distinção das figuras de locador e locatário.

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Pela própria essência do modelo, o locatário é usualmente a


figura de uma empresa ou órgão que busca ocupar um imóvel que atenda todas suas
necessidades e exigências requeridas por sua atividade, desde a localização até mesmo
detalhes específicos do projeto de arquitetura e instalações da edificação. O locatário busca
um locador com características de investidor ou de empreendedor e que tenha interesse em
investir em toda a operação, desde a compra do imóvel, elaboração do projeto e construção
do prédio.

Já o locador pode ser encontrado na figura de um fundo


imobiliário, de instituição financeira ou até mesmo construtora ou incorporadora que tem
como foco ou parte de seus negócios o investimento em empreendimentos de base
imobiliária. A edificação pretendida poderá ser construída por ele mesmo, locador, ou este
poderá ainda contratar e gerenciar os trabalhos de uma empresa construtora. Sua obrigação
primordial será entregar o imóvel ao locatário totalmente apto à ocupação, inclusive com
todas as licenças de uso, quando, então, passa a receber o aluguel pactuado.

III - CERTIFICADO DE RECEBÍVEIS IMOBILIÁRIOS - CRI

Um conceito merecedor de ser considerado à parte diz respeito


à figura do Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI), que são títulos de crédito
nominativos, escriturais e transferíveis, conforme consta na Lei nº 9.514, de 20 de novembro
de 1997:

“Art. 6º O Certificado de Recebíveis Imobiliários - CRI é título


de crédito nominativo, de livre negociação, lastreado em
créditos imobiliários e constitui promessa de pagamento em
dinheiro.

Parágrafo único. O CRI é de emissão exclusiva das


companhias securitizadoras.

(...)

Art. 8º A securitização de créditos imobiliários é a operação


pela qual tais créditos são expressamente vinculados à
emissão de uma série de títulos de crédito, mediante Termo de
Securitização de Créditos, lavrado por uma companhia
securitizadora, do qual constarão os seguintes elementos:

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I - a identificação do devedor e o valor nominal de cada crédito


que lastreie a emissão, com a individuação do imóvel a que
esteja vinculado e a indicação do Cartório de Registro de
Imóveis em que esteja registrado e respectiva matrícula, bem
como a indicação do ato pelo qual o crédito foi cedido;

II - a identificação dos títulos emitidos;

III - a constituição de outras garantias de resgate dos títulos da


série emitida, se for o caso.”

Na seara da presente análise, esse tipo de certificado é a


possibilidade de que o locador possa obter a antecipação de seu retorno através de um
processo de securitização (artigo 8º da Lei nº 9.514/97). O processo se dá quando o locador
cede seus recebíveis (os aluguéis futuros) a uma companhia de securitização, a qual emitirá
Certificados de Recebíveis Imobiliários; estes certificados, colocados no mercado, poderão
ser adquiridos por investidores, os quais passarão a deter direitos sobre o recebimento dos
aluguéis. Dessa maneira o locador pode levantar antecipadamente os valores necessários
ao investimento através da venda dos CRIs.

Desse modo, através da emissão de CRIs, o locador pode


vender seus recebíveis para terceiros, recebendo à vista aquilo que teria que esperar por
anos - o que, conforme dito, se dá através da contratação de uma securitizadora, uma
instituição não financeira constituída na forma de sociedade por ações, que “empacota”
esses recebíveis em títulos dessa categoria. Esses títulos podem se apresentar em duas
formas: Performado e Não Performado.

O primeiro, Performado, caracteriza-se por ter como base


direitos de crédito garantidos por imóveis que possuam certidão de “habite-se”. Já o
segundo, Não Performado, é lastreado em direitos de crédito garantidos por imóveis não
concluídos - o que é o caso quando da contratação no formato “built to suit”.

Para melhor compreensão do conceito, considerando que tudo


aquilo que gera fluxo de dinheiro é um “recebível”, temos que o termo “securitização” é um
estrangeirismo que significa transformar em “security” (valor mobiliário) os recebíveis de
determinado empreendimento, o que se dá através da emissão de certificados, que são
livremente negociado entre investidores.

Talvez por isso mesmo, no tocante à sua regulamentação, o

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Conselho Monetário Nacional, por intermédio da Resolução CMN nº 2517, de 29 de junho


de 1998, expressamente considerou como valores mobiliários os Certificados de Recebíveis
Imobiliários de que trata o artigo 6º da Lei nº 9.514/97, equiparando-os àqueles dispostos no
artigo 2º, inciso III, da Lei nº 6.385/76, que dispõe sobre o mercado de valores mobiliários.

E, assim o sendo, coube à Comissão de Valores Mobiliários,


através da instrução CVM nº 414, de 30 de dezembro de 2004, dispor sobre a forma de
registro de companhia aberta para companhias securitizadoras de créditos imobiliários e da
oferta pública de distribuição de Certificados de Recebíveis Imobiliários - CRI.

Pois bem. O CRI, então, é um título de renda fixa baseado em


créditos imobiliários (pagamentos de contraprestações de aquisição de bens imóveis ou de
aluguéis) - ainda que um título de crédito impróprio, isto é, um “documento” que dá direito ao
seu detentor de receber determinada quantia em dinheiro em uma determinada data, não
desfrutando porém das demais características de títulos de crédito propriamente ditos -
principalmente no tocante à liquidez.

O que torna atrativo o investimento em CRIs - principalmente


para as pessoas físicas - é que os rendimentos pagos (mensais, semestrais ou anuais) são
isentos de imposto de renda, conforme artigo 3º, inciso II, da Lei nº 11.033, de 21 de
dezembro de 2004. O contraponto é que, como todo investimento, possui também seus
riscos, e, além de tudo, apresentam uma característica falta de liquidez, isto é, como são
títulos de longo prazo, caso o investidor precise sair antecipadamente poderá encontrar uma
certa dificuldade para encontrar um comprador.

IV - A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Temos, pois, que a legislação atual prevê - até com uma certa
riqueza de detalhes - a possibilidade de contratação de “construção sob medida”, ou,
conforme também denominado, a “locação built to suit”. O que é plenamente viável entre
particulares.

Entretanto a Administração Pública, além de certas


prerrogativas, possui também determinadas limitações, uma vez que, para todos seus atos,
deve obedecer o chamado Princípio da Legalidade.

Determina o citado princípio que, enquanto ao particular é


permitido fazer tudo que a lei não proíbe, ao Administrador Público compete executar
somente o que a lei autoriza. Sendo silente a regra, vedada estaria a atuação do

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Administrador. Segundo Hely Lopes Meirelles, em sua obra Direito Administrativo Brasileiro,
26.ed, 2001, página 82:

“Legalidade - A legalidade, como princípio de administração


(CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está,
em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da
lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar
ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a
responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.

(...)

Na Administração Pública não há liberdade nem vontade


pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer
tudo o que a lei não proíbe, na Administração Pública só é
permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular
significa ‘pode fazer assim’; para o administrador público
significa ‘deve fazer assim’.”

Pois bem. Que é possível à Administração Pública proceder a


locação de um imóvel - quer seja pela regra geral da licitação, quer seja através da dispensa
de licitação - isso resta claro, conforme expressamente previsto na Lei nº 8.666, de 21 de
junho de 1993, que regulamenta as licitações e os contratos administrativos.

Num primeiro momento poder-se-ia alegar que a forma de


contratação ora analisada não se enquadraria naquelas preconizadas na lei. Isso porque a
contratação, como delineado no item II supra, divide-se em duas fases distintas: a primeira
regida pelo Direito Civil e a segunda, pela Lei de Locações.

Entretanto, a Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, que


dispõe especificamente sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a elas
pertinentes, encontra pleno amparo nas determinações da Lei nº 8.666, de 21 de junho de
1993, que regulamenta as normas para licitações e contratos da Administração Pública,
sendo possível a aplicação de ambas subsidiariamente, conforme artigo 62, § 3º, inciso I,
da Lei nº 8.666/93:

“Art. 62. O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de


concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas
e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos

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limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos


demais em que a Administração puder substituí-lo por outros
instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de
empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de
execução de serviço.

(...)

§ 3º. Aplica-se o disposto nos arts. 55 e 58 a 61 desta Lei e


demais normas gerais, no que couber:

I - aos contratos de seguro, de financiamento, de locação em


que o Poder Público seja locatário, e aos demais cujo conteúdo
seja regido, predominantemente, por norma de direito privado;”

Tal determinação da Lei Licitatória vai exatamente ao encontro


da possibilidade aventada de locação, eis que a mesma aplica-se apenas subsidiariamente
à Lei de Locações, posto que esta, em detrimento daquela, rege predominantemente a
matéria que diz respeito às locações de imóveis urbanos.

Pela própria redação do artigo temos que, no que couber,


deverão ser aplicadas as regras constantes nos artigos 55 e 58 a 61 aos contratos regidos
pelas normas do direito privado. Esses artigos tratam basicamente acerca das cláusulas
necessárias aos contratos, as prerrogativas da Administração Pública e disposições acerca
de sua formalização. Desse modo, a contrariu sensu, não se aplicariam expressamente os
demais dispositivos da Lei Licitatória.

Marçal Justen Filho, em sua obra Comentários à Lei de


Licitações e Contratos Administrativos, 11.ed, assevera à página 531 que a aplicação
dessas regras “(...) não apresentam maior controvérsia. Disciplinam requisitos de forma na
contratação. Inexiste conflito entre esses princípios e os do direito privado. Seu efeito mais
sensível é tornar obrigatórias formalidades que no direito privado seriam meramente
facultativas.”

Ou seja, conforme ensina Maria Zanella Di Pietro, uma vez que


a locação de imóveis é um pacto de natureza civil e a Administração Pública celebra um
contrato regido pelo direito privado, ocorre uma horizontalidade na relação contratual, na
qual a Administração se nivela (em termos) ao particular, não agindo assim como Poder
Público.

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Verificada a subsidiariedade da legislação pertinente e


comprovada a plena possibilidade da contratação de uma locação pela Administração
Pública sob a égide da Lei de Locações, restaria ainda uma questão específica: o modelo
“built to suit” poderia ser aplicado?

A resposta veio com a edição da Lei nº 12.744, de 19 de


dezembro de 2012, que alterou o artigo 4º da Lei de Locações, acrescentando, ainda, o
artigo 54-A:

“Art. 2º O caput do art. 4º da Lei nº 8.245, de 1991, passa a


vigorar com a seguinte redação:

'Art. 4º Durante o prazo estipulado para a duração do


contrato, não poderá o locador reaver o imóvel alugado.
Com exceção ao que estipula o § 2º do art. 54-A, o
locatário, todavia, poderá devolvê-lo, pagando a multa
pactuada, proporcional ao período de cumprimento do
contrato, ou, na sua falta, a que for judicialmente
estipulada.

...........................................................................' (NR)

Art. 3º A Lei nº 8.245, de 1991, passa a vigorar acrescida do


seguinte art. 54-A:

'Art. 54-A. Na locação não residencial de imóvel urbano


na qual o locador procede à prévia aquisição,
construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por
terceiros, do imóvel então especificado pelo
pretendente à locação, a fim de que seja a este locado
por prazo determinado, prevalecerão as condições
livremente pactuadas no contrato respectivo e as
disposições procedimentais previstas nesta Lei.

§ 1º Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de


revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de
vigência do contrato de locação.

§ 2º Em caso de denúncia antecipada do vínculo

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locatício pelo locatário, compromete-se este a cumprir a


multa convencionada, que não excederá, porém, a
soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo
final da locação.

§ 3º (VETADO).' “

Com essas alterações a Lei de Locações - norma que rege


conteúdo predominantemente de direito privado, mas aplicável à Administração Pública por
força do artigo 62, § 3º, inciso I, da Lei Licitatória - açambarcou o parágrafo único do artigo
473 do Código Civil, que prevê:

“Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei


expressa ou implicitamente o permita, opera mediante
denúncia notificada à outra parte.

Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma


das partes houver feito investimentos consideráveis para a sua
execução, a denúncia unilateral só produzirá efeito depois de
transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto dos
investimentos.”

Desta forma é possível assim concluir que a Administração


Pública encontra pleno respaldo legal para a contratação de construção sob medida que se
pretende realizar, eis que a figura da locação “built to suit” possui clara tipificação na
legislação pátria. Mesmo o Tribunal de Contas da União já consagrou essa possibilidade,
conforme restou evidente no Acórdão AC-1301-19/13-P, de 29 de maio de 2013, em que
respondeu consulta formulada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho - CSJT:

“Por todas essas considerações, entendo que o TCU deve


responder ao nobre Presidente do Conselho Superior da
Justiça do Trabalho que, nos termos do art. 62, § 3º, I, da Lei nº
8.666, de 21 de junho de 1993, c/c o art. 54-A da Lei nº
8.245/1991 (incluído pela Lei nº 12.744, de 19 de dezembro de
2012), a despeito de a realização de licitação dever ser a regra,
admite-se excepcionalmente a contratação direta de "locação
sob medida", em operação built to suit, por meio de licitação
dispensável fundada no art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666/1993,

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mas desde que, neste caso, a administração pública


demonstre claramente que as necessidades de instalação e de
localização condicionam a escolha de determinado imóvel e
que o preço da locação se mostra compatível com o valor de
mercado, segundo avaliação prévia, bem assim que a junção
do serviço de locação (parte principal) com o de execução
indireta de obra (parte acessória) apresenta economia de
escala e que, por isso, tal locação sob encomenda não ofende
o princípio do parcelamento do objeto, previsto no art. 23, § 1º,
e no art. 15, IV, da Lei nº 8.666/1993, sem prejuízo de se
destacar que tudo deve estar devidamente justificado nos
autos do processo de licitação, em respeito ao art. 50, IV, da
Lei nº 9.784, de 1999.”

Apenas a título de curiosidade, o Projeto de Lei nº 356/11, que


resultou na Lei nº 12.744/12, introduzia um parágrafo 3º ao artigo 54-A, que impunha a
obrigatoriedade de registro do contrato no Serviço de Registro de Títulos e Documentos.
Esse dispositivo foi vetado, conforme a Mensagem nº 580, de 19 de dezembro de 2012, sob
a justificativa que “Ao exigir que o contrato seja levado ao Registro de Títulos e
Documentos, o dispositivo cria ônus adicional, contrário à própria finalidade do projeto.
Ademais, a supressão do dispositivo não obstrui a cessão de crédito nos termos da
legislação vigente”.

V - O IMÓVEL A SER UTILIZADO

Uma pequena variação que obrigatoriamente deve fazer parte


das presentes considerações é acerca da eventual possibilidade de já haver imóvel de
propriedade da Administração que poderia ser utilizado para construção. Ou seja, o objeto
diria respeito à locação de um prédio com obrigação de fazer, consistente na construção
desse prédio em imóvel da própria Municipalidade, segundo as especificações apresentadas
pela Administração, para instalação de equipamento público.

É evidente que se o Município já possui uma área livre e


desimpedida e em local apropriado a questão diria respeito somente à forma de contratação
da construção. Mas e se assim não o for? E se já houver um imóvel no local? Ou, pior, e se
o Município já possuir um imóvel de tamanho e características compatíveis mas em local
inapropriado? Poder-se-ia considerar, no primeiro caso, a mera demolição. Mas e no
segundo caso?

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Obviamente que, nesse formato, deveria a Municipalidade


dispor desse imóvel em prol de outro que melhor atendesse suas necessidades. Entretanto,
mais uma vez, voltamos às obrigações contidas no Princípio da Legalidade já discorrido em
tópico anterior.

Primeiramente é relevante ressaltar que a alienação de


qualquer bem público pressupõe o cumprimento de certas formalidades, as quais se
relacionam com a verificação de compatibilidade do ato como interesse público - princípio
este que rege todo e qualquer ato do Poder Público.

Aliás, entenda-se por “alienação” toda e qualquer transferência


de um bem para terceiros, não simplesmente a venda. O termo em si, “alienar”, tem por
significado “tornar alheios, a título legítimo, determinados bens ou direitos, transferir a
outrem”. Essa conceituação torna-se importante para melhor compreensão das
considerações a seguir.

A primeira disposição em legislação que rege a matéria


encontra-se no artigo 17 da Lei nº 8.666/93:

“Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública,


subordinada à existência de interesse público devidamente
justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às
seguintes normas:

I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para


órgãos da administração direta e entidades autárquicas e
fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades
paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na
modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes
casos:

a) dação em pagamento;

b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou


entidade da administração pública, de qualquer esfera de
governo, ressalvado o disposto nas alíneas “f”, “h” e “i”;

c) permuta, por outro imóvel que atenda aos requisitos


constantes do inciso X do art. 24 desta Lei;

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d) investidura;

e) venda a outro órgão ou entidade da administração pública,


de qualquer esfera de governo;

f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de


direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens
imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente
utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de
regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por
órgãos ou entidades da administração pública;”

Denota-se que, das possibilidades citadas, a que atenderia a


pretensão da Administração seria a disposta no artigo 17, inciso I, alínea “c”: permuta.

Relevante lembrar que, por força da Ação Direta de


Inconstitucionalidade nº 927-3-RS interposta pelo Governador do Estado do Rio Grande do
Sul, em novembro de 1993 foi concedida pelo STF liminar para suspender a eficácia
justamente desse dispositivo. A ação ainda aguarda julgamento no Supremo Tribunal
Federal.

Mesmo que num primeiro momento surja a impressão de que,


com o dispositivo suspenso, o Município não poderia então realizar permuta de imóvel, é
importante atentar que a regra do inciso I do artigo 17, combinada com seu caput, diz
claramente que para a alienação de imóveis (e a permuta seria uma forma de alienação)
existem quatro requisitos básicos a serem cumpridos:

a) há que se justificar o interesse público;

b) depende de autorização legislativa;

c) deve possuir avaliação prévia; e

d) deve ser realizado por meio de licitação na modalidade concorrência.

Todas as demais hipóteses das alíneas desse inciso dizem


respeito à parte final do mesmo: “dispensada esta [a licitação na modalidade concorrência]
nos seguintes casos”. E dentro destes casos encontra-se a figura da “permuta” - que, como
restou evidente, encontra-se suspensa pelo STF. Ou seja, o Município pode alienar - ainda
que por permuta - um imóvel; o que não pode é fazê-lo sem licitar.

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Essa argumentação - a de licitar - prevaleceria caso se


lançasse uma licitação visando permutar um imóvel pertencente ao Município por algum
outro com características semelhantes mas sem um rigor maior na escolha, haja vista que
vários imóveis poderiam atender a necessidade da Administração. Pela própria descrição do
que seria um procedimento desse naipe percebe-se a dificuldade em justificar o pleno
interesse público do mesmo. Se a Municipalidade já possui um imóvel que não lhe é
conveniente não faria sentido buscar uma troca por um outro qualquer que também poderia
vir a não sê-lo. O que faria sentido é ter em vista imóvel específico que atendesse
plenamente o interesse público - o que vai ao encontro do Princípio da Eficiência,
consagrado no artigo 37 da própria Constituição Federal.

Assim, apesar de ser um dos requisitos básicos para


consumação do disposto no artigo 17 da Lei nº 8.666/93, considerando-se que a essência
de um procedimento licitatório é a ampla competitividade, para a permuta de um imóvel por
outro específico impõe-se a necessidade de excluir-se a licitação, eis que inviável um
certame competitivo. Hely Lopes Meirelles, em sua obra Direito Municipal Brasileiro, 17.ed, à
página 337 elimina quaisquer dúvidas:

“Permuta, troca ou escambo é o contrato pelo qual as partes


transferem e recebem um bem uma da outra - bens, esses,
que se substituem reciprocamente no patrimônio dos
permutantes. Há sempre na permuta uma alienação e uma
aquisição de coisas, da mesma espécie ou não. A permuta
pressupõe igualdade de valor entre os bens permutáveis, mas
é admissível a troca de coisas de valores desiguais, com
reposição ou torna em dinheiro do faltante. Essa
complementação em pecúnia, para se igualarem os valores
das coisas trocadas, não desnatura a permuta, desde que a
intenção precípua de cada parte é obter o bem da outra.

A permuta de bem público municipal, como as demais


alienações, exige autorização legislativa e avaliação prévia das
coisas a serem trocadas, mas não exige licitação, pela
impossibilidade mesma de sua realização, uma vez que a
determinação dos objetos da troca não admite substituição ou
competição licitatória em qualquer de suas modalidades (Lei
8.666/1993, art. 17, I, “c”).

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Qualquer bem municipal, desde que desafetado do uso comum


do povo ou de destinação pública especial, pode ser
permutado com outro bem público ou particular, da mesma
espécie ou de outra. O essencial é que a lei autorizadora da
permuta identifique os bens a serem permutados e a avaliação
prévia lhes atribua corretamente os valores, para a efetivação
da troca sem lesão ao patrimônio público.

Aplicam-se à permuta as disposições da compra e venda civil


(CC, art. 533); e, tratando-se de troca de imóveis, fica sujeita
às formas e registros competentes para a transferência do
domínio.”

Esclarecido inequivocamente tal ponto, ou seja, a possibilidade


de permuta face a legislação federal, temos que a legislação municipal limita-se a repetir
genericamente os mesmos princípios, conforme estabelece a Lei Municipal nº 2.761, de 31
de março de 1990 - Lei Orgânica do Município de Jacareí:

“Art. 107. A alienação de bens municipais, subordinada a


existência de interesse público devidamente justificado, será
sempre precedida de avaliação, quando se tratar de imóveis,
dependerá de autorização legislativa e concorrência pública,
dispensada esta nos casos de doação, que será permitida
exclusivamente para fins assistenciais ou quando houver
interesse público relevante, justificado pelo Executivo.”

Ponto relevante nesse procedimento é a necessidade de


eventual desafetação do imóvel. Explica-se. Conforme estabelece o artigo 99 do Código
Civil Brasileiro, os bens públicos são classificados conforme sua destinação, dividindo-se em
bens de uso comum (praças, ruas, jardins, etc), em bens de uso especial (destinados a um
determinado serviço ou estabelecimento público) e em bens dominicais (meramente
patrimônio público, não classificados nas duas espécies anteriores.

Assim, quando um imóvel é “afetado” (ou “destinado” ou


“consagrado”) a um fim público, assume características especiais que o torna inalienável,
imprescritível e impenhorável, enquanto se mantiver essa condição, vale dizer, enquanto
não for desafetado.

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Assim, caso o imóvel pertencente à Municipalidade que se


pretende permutar esteja afetado como bem de uso especial ou mesmo de uso comum,
imprescindível promover sua desafetação, convertendo-o em dominical.

VI - DIREITO DE SUPERFÍCIE

Seguindo as considerações do item anterior, para se utilizar um


imóvel pertencente à Municipalidade para que um particular construa um prédio segundo as
especificações que lhe forem passadas e alugue esse prédio para a própria Municipalidade,
teria esse particular que poder exercer direitos reais sobre a área, como se proprietário
fosse. E isso dar-se-ia através da concessão do chamado “Direito de Superfície”, um direito
real, que se destaca do direito de propriedade sobre o solo, podendo ser atribuído a quem
não seja o proprietário do terreno. Conforme estabelecem os artigos de 1.369 a 1.377 do
Código Civil Brasileiro:

“Art. 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de


construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado,
mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório
de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O direito de superfície não autoriza obra no


subsolo, salvo se for inerente ao objeto da concessão.”

Também o Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257, de 10 de julho de


2001, em seus artigos de 21 a 24 regulamentam esse instituto.

Assim, essa relação superficiária possui em sua essência


apenas dois atores: o proprietário do solo, como concedente, e o superficiário, como
concessionário. Dessa maneira o concessionário passa a ter domínio do imóvel, podendo
usar e explorar o mesmo, inclusive construindo e utilizando-o ou até mesmo locando essa
construção. O superficiário é considerado o proprietário do edifício e das obras realizadas às
suas custas sobre a superfície cedida pelo proprietário do terreno.

Essa concessão poderá ser por tempo determinado ou


indeterminado, mediante escritura pública, e, ainda, gratuita ou onerosa, abrangendo o solo,
subsolo e espaço aéreo, conforme se determine, não deixando de lado sequer as hipóteses
de extinção do contrato de concessão. Aliás a própria extinção do contrato também deve ser
averbada no Cartório de Registro de Imóveis, sendo que, uma vez extinto, o proprietário
recupera o domínio do terreno, bem como das benfeitorias introduzidas no imóvel.

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O superficiário, por sua vez, deve responder integralmente por


todos e quaisquer encargos e tributos que incidirem sobre a propriedade superficiária
enquanto dela usufruir.

Dentre as possibilidades de exploração do imóvel temos a


figura da locação, ou seja, o prédio que o superficiário vier a construir sobre o terreno
concedido pode ser locado para terceiro - e nada impede que esse “terceiro” seja o próprio
proprietário do imóvel.

E nesse ponto temos a possibilidade de que o imóvel tenha


sido cedido ao empreendedor para construção de prédio que atenda às exatas
necessidades do proprietário, que o irá locar por conseguinte. Temos, então, a realização
em conjunto de dois tipos de contratos: o do direito real de superfície e o “built to suit”,
sendo que, para este último, as considerações já foram lançadas em item anterior.

Sob o ponto de vista do empreendedor a maior vantagem seria


a preservação de seu capital, que, em outras situações, seria utilizado para aquisição do
terreno. Já do ponto de vista do locatário/proprietário a vantagem é a de não ter que realizar
investimentos em construções e, mesmo assim, ao final do contrato ter o imóvel como um
todo revertido para seu patrimônio.

A desvantagem neste caso, no que diz respeito à


Administração Pública, é que, com o direito de superfície, ainda que o superficiário exerça
direitos reais sobre o imóvel, o qual admite inclusive hipoteca e outros tipos de gravame,
talvez venha a encontrar dificuldades caso queira levar a cabo um processo de securitização
do mesmo.

VII - OBSERVAÇÕES NECESSÁRIAS A UM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO

Temos então, apesar de todas as variáveis nominativas citadas


na presente análise, que a primeira providência seria dar a correta denominação para o que
se pretende licitar. E, no caso, é a contratação “built to suit”, a qual pode, sim, ser
realizada através de regular procedimento licitatório. Importante entretanto destacar alguns
pontos que devem restar claros no certame, de modo a evitar ao máximo eventuais falhas
num edital.

A regra constitucional do procedimento licitatório deve ser


aplicada (ressalvadas as exceções que serão a frente citadas), uma vez que a contratação
“built to suit” pela Administração Pública torna-se relevante frente ao fato de que a

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singularidade e especificidade do prédio surgem como resultado do negócio e não o


contrário.

Diferentemente de uma relação normal de locação, onde o


locatário simplesmente remunera o locador (aos valores de mercado) pelo uso e fruição do
bem imóvel, na locação “built to suit” o locatário deve também remunerar o projeto e a obra,
eis que foi executada exatamente dentro das necessidades específicas apontadas.

Esse ponto torna-se relevante à medida em que não seria


possível comparar o valor da contraprestação (que visa a amortização ao proprietário) com
um mero valor de aluguel. São figuras remuneratórias distintas - e é exatamente por isso
que num contrato dessa espécie não existe a possibilidade de adequação ao valor de
mercado do aluguel. Trata-se de um “plano de negócios” com investimentos preliminares
que deverão ser amortizados de forma justa numa linha de tempo considerada adequada e
orçamentariamente compatível com as possibilidades da Administração Pública.

Daí a necessidade de um contrato de longa duração, com os


fatores de reajuste claramente fixados, de modo a permitir tanto a sua exequibilidade por
parte da Administração quanto trazer a necessária segurança ao empreendedor.

Exatamente por isso é que os pagamentos a serem efetuados


à título de aluguel - mas na verdade uma contraprestação - somente têm início após a
entrega do imóvel à Administração. Até a efetiva construção trata-se praticamente de um
“contrato de risco” para o investidor/empreendedor, eis que a obra somente será aceita se
construída exatamente nos moldes acordados previamente e que atendam plenamente o
interesse público almejado para a instalação do equipamento pretendido.

E, ainda, conforme já visto no item II supra, caso haja a


desocupação do imóvel por parte do contratante - no caso, a Administração - antes do
término do prazo pactuado, a cláusula penal utilizada num contrato dessa espécie tem o
condão de fazer vencer todas as parcelas ainda não pagas. Isso diverge diametralmente de
uma relação locatícia normal, onde tal penalidade poderia ser considerada excessiva,
gerando, inclusive, enriquecimento ilícito por parte do locador.

Mas numa locação “built to suit” há o envolvimento de


investimentos prévios e substanciais para consecução do contrato, de forma que a
penalidade pela rescisão antecipada deve ter o poder de compensar o empreendedor de
maneira satisfatória e razoável. Repete-se: nesse tipo de contrato a multa não tem caráter

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punitivo ou mesmo moratório, mas tão-somente compensatório.

Para início de um procedimento licitatório, ante a atipicidade do


objeto face às usuais contratações de uma Administração Pública, faz-se necessário que a
justificativa a ser apresentada seja extremamente detalhada, inclusive com uma projeção -
ainda que meramente estimada - de qual seria o valor total do investimento por parte do
particular. Importante, ainda, deixar claro e evidente que a opção por locação de imóvel com
terceiros é a melhor escolha após a verificação de todas as opções disponíveis para uso ou
integração de imóvel já pertencente à Administração para instalação do equipamento público
pretendido.

A modalidade licitatória recomendada indubitavelmente é a


“concorrência”, haja vista que duas são as possibilidades do tipo a ser utilizado: menor
preço global ou menor parcela. Tudo, de fato, depende do detalhamento a ser exigido no
plano de negócios a ser apresentado pelas licitantes. No primeiro caso é óbvio que busca-se
o menor preço - o que nem sempre resulta na melhor contratação. Já no segundo caso,
havendo um estudo prévio de viabilidade por parte da Administração, torna-se possível fixar
o tempo máximo de duração do contrato, permitindo à licitante diluir o valor de seu plano de
negócios de forma a apresentar uma proposta competitiva.

Pela provável complexidade de todas as etapas de um certame


desse naipe, desde a fase interna da licitação até mesmo quando da execução contratual, é
que se afasta, ainda que célere, a possibilidade de a mesma ser levada a cabo pela
modalidade denominada “pregão”.

De se recomendar, desde já e ainda que não seja legalmente


exigível, que uma ampla publicidade teria o condão de atingir um universo bem maior de
prováveis licitantes, até mesmo pela especificidade do objeto, sendo viável pois a
publicação do extrato da licitação tanto no DOU - Diário Oficial da União, como não só em
um, mas em diversos jornais de grande circulação no estado.

Outra vantajosidade a se considerar, do ponto de vista da


Administração, é que um contrato desse tipo, por sua similaridade à locação, insere-se
orçamentariamente na categoria de “despesa corrente”, de modo que não haveria
comprometimento da capacidade de investimento da Municipalidade.

Pelos mesmos motivos supra é que não se recomenda a


utilização da Parceria Público-Privada, conforme permite a Lei nº 11.079, de 30 de

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dezembro de 2004. Isso porque seu artigo 28, para a soma de todas as despesas de caráter
continuado derivadas do conjunto de parcerias já contratadas, impõe que não seja
ultrapassado o limite de 5% (cinco por cento) da receita corrente líquida - quer seja do
exercício, quer seja de sua projeção para os dez anos subsequentes à contratação. Isso
seria um limitador à discricionariedade da Administração, vez que, caso suplantado esse
limite, a União não mais poderia conceder garantias ou realizar transferências voluntárias ao
Município.

Por derradeiro, a opção de compra ou mesmo reversão ao final


do contrato seria uma possibilidade, mas não uma necessidade.

VIII - CONCLUSÃO

Percebe-se, por fim, que as vantagens apresentadas pelo


“modelo de negócio” objeto desta análise em relação a contratação “built to suit” pela
Administração Pública é legalmente viável e, ainda, vai plenamente ao encontro da
satisfação do interesse público, eis que viabiliza ao administrador, ainda que não possua
recursos financeiros de imediato, buscar no mercado a solução para construção sob medida
e instalação de equipamentos públicos sem necessariamente comprometer a capacidade de
endividamento do ente público.

E também ao particular que se lança em tal empreitada há


segurança tanto jurídica quanto contratual, apresentando-se a possibilidade de levantar
rapidamente recursos imobilizados em bens imóveis, através da securitização, permitindo a
alavancagem de seus próprios negócios.

O procedimento licitatório nos moldes sugeridos é


imprescindível para esse tipo de contratação, não se podendo falar mera e simplesmente
em locação de imóvel, eis que trata-se de contrato complexo, em que se mesclam várias
figuras jurídicas.

Este, SMJ, é o parecer.

Jacareí, 26 de junho de 2013.

Adauto de Andrade
Secretário de Assuntos Jurídicos

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NOTAS BIBLIOGRÁFICAS - Tanto o tema é novo para contratação pela Administração


Pública que a esmagadora maioria de informações obtidas e que serviram de base para o
presente estudo foram passíveis de serem localizados somente por intermédio de notícias e
estudos disponibilizados na Internet.

CAMARGO, Cristiane Bueno de; SISTI, Carlos Eduardo Poli; FERREIRA, Rogéria Cristina. Built to
Suit, Direito Real de Superfície e Sale and Leaseback, uma análise comparativa. 10ª Conferência
Internacional da LARES. São Paulo, SP. 15 a 17 de Setembro de 2010. http://www.lares.org.br/
2010/anais2010/images/461-542-1-SP.pdf

CAVAZANI, Cecília Reia. “Built-to-Suit”: Formas de Contratação pela Administração Pública. 12ª
Conferência Internacional da LARES. São Paulo, SP. 19 a 21 de Setembro de 2012.
http://www.lares.org.br/2012/images/633-946-1-DR.pdf

DI PIETRO. Maria S. Z. Direito Administrativo. 18.ed. 2005.

FÉ, Ana Lúcia Moura. Bult to Suit ganha reforço legal. Revista Construção Mercado. Março de 2013.
http://www.original123.com.br/assessoria/2013/03/05/built-to-suit-ganha-reforo-legal/

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 11.ed. 2005.

MEIRELLES, Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro. 26.ed. 2001.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, 17.ed. 2013.

ROSA, Tuca. Locação sob medida. Revista Digital Infraestrutura Urbana - projetos, custos e
construção. 10 de Agosto de 2013. http://www.infraestruturaurbana.com.br/solucoes-tecnicas/23/
artigo276220-1.asp

VALENÇA, Marcelo José Lomba. A regulamentação da locação modelo Built to Suit. Revista
Eletrônica Migalhas. 8 de Setembro de 2011. http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI140798,
61044-A+regulamentacao+da+locacao+modelo+Built+to+Suit

VEIGA, Beto. O que é CRI - Certificado de Recebíveis Imobiliários. 16 de fevereiro de 2011.


http://www.betoveiga.com/log/index.php/2011/02/o-que-e-cri-certificado-de-recebiveis-imobiliarios/

WILTGEN, Julia. Como funcionam os certificados e os títulos imobiliários? Revista Exame. 25 de julho
de 2012. http://exame.abril.com.br/seu-dinheiro/dicas-de-especialista-para-seu-dinheiro/noticias/
como-funcionam-as-cris-e-os-fundos-imobiliarios

Portal do Investidor. Certificado de Recebíveis Imobiliários CRI. http://www.portaldoinvestidor.gov.br/


menu/Menu_Investidor/valores_mobiliarios/certificado_recebiveis.html

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