Oral FCC - Compilado DH - Frasseto
Oral FCC - Compilado DH - Frasseto
Oral FCC - Compilado DH - Frasseto
2. DPE-AP - Qual o termo específico da dignidade da pessoa humana para São Tomás
de Aquino? Fale sobre Kant.
Resposta: Excelência, para São Tomás de Aquino (Escola do Direito Natural de Razão
Divina), o reconhecimento da dignidade da pessoa humana é qualidade inerente a todos
os seres humanos, que nos separa dos demais seres e objetos. O intelecto e a
semelhança com Deus geram a dignidade que é inerente ao homem, como espécie. Em
2
outro viés, para Kant tudo tem um preço ou uma dignidade: aquilo que tem um preço é
substituível e tem equivalente; já aquilo que não admite equivalente, possui uma
dignidade. Assim, as coisas possuem preço; os indivíduos possuem dignidade. Nessa
linha, a dignidade da pessoa humana consiste que cada indivíduo é um fim em si mesmo,
com autonomia para se comportar de acordo com seu arbítrio, nunca um meio ou
instrumento para a consecução de resultados, não possuindo preço.
Consequentemente, o ser humano tem o direito de ser respeitado pelos demais e
também deve reciprocamente respeitá-los (forte caráter antropocentrista).
de negociação no seio das Nações Unidas, foi adotado o texto do tratado internacional
que cria o Tribunal Penal Internacional (TPI), Tribunal cuja jurisdição o Brasil se submete
nos termos do Decreto n. 4.388/02. No tocante a execução das decisões do TPI, o
Tratado de Roma disciplina ainda a execução penal, sublinhando a importância do pacto
de cooperação entre os Estados que o ratificaram. Desse modo que delineia, em seu
artigo 103, a função dos Estados na Execução das penas privativas de liberdade,
afirmando que as penas privativas de liberdade serão cumpridas em Estado que seja
indicada pelo Tribunal, consoante lista de Estados que tenham manifestado
disponibilidade para recebimento de pessoas condenadas, porém o referido Tribunal
não tem poder de polícia para executar suas decisões, em outras palavras, as decisões
do Tribunal Penal Internacional, pelo menos até o momento, não podem ser cumpridas
por aqueles Estados que não desejem seu cumprimento, nações estas amparadas pela
noção de soberania absoluta, mesmo sua relativização sendo expressamente prevista
no Estatuto de Roma; já execução das penas de multa assim como às medidas de perda
determinada pelo Tribunal, os Estados Partes farão sua aplicação, sem prejuízo de
direitos de terceiros de boa fé e de acordo com os procedimentos previstos no
respectivo direito interno. Estamos diante, mais uma vez, do dever de cooperação que
norteia as relações entre os Estados que tomaram parte do Estatuto de Roma. Quanto
ao procedimento para execução das decisões na justiça brasileira, assim como as
decisões da Corte Interamericana IDH, as decisões do TPI não se qualificam como
sentença estrangeira e sim sentença internacional, não necessitando passar pelo
procedimento previsto na CF/88. Por fim, a CF/88 veda, expressamente, a imposição de
pena de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, “b”). Logo, a doutrina no sentido de que o
Estatuto de Roma seria, a priori, inconstitucional neste aspecto. Nessa senda, a Lei n.
13.445/2017 (Lei de Migração) impõe como condição para o deferimento do pedido de
extradição, que o Estado requerente assuma o compromisso de comutar a pena de
morte, perpétua ou corporal em pena privativa de liberdade (caso cumprida no Brasil),
respeitado o limite máximo de cumprimento de 30 anos (art. 96, III); no caso da entrega
para o Tribunal Penal Internacional, essa exigência não poderia ser imposta por dois
motivos: em primeiro lugar, porque há hipótese de revisão da pena, após vinte e cinco
anos de cumprimento. Em segundo lugar, fica claro que a vedação da extradição nestes
termos foi oriunda da construção do STF para impedir que a cooperação entre Estados
pudesse se realizar fora de determinados padrões de respeito a direitos humanos (no
caso, pena excessiva). Mas o TPI é justamente um tribunal que visa proteger os direitos
humanos pela punição daqueles que violaram valores essenciais da comunidade
internacional.
Acréscimos da revisora: Em síntese, o procedimento de apuração de crimes de
genocídio, guerra, contra a humanidade e de agressão (crimes de competência do TPI)
são apreciados da seguinte forma: Inquérito -> Acusação admitida -> Juízo de
Julgamento e 1ª instância -> Juízo de recursos. O TPI pode exercer sua jurisdição a partir
de Inquérito do Procurador ou de denúncia dirigidas a este por Estado-Parte ou pelo
Conselho de Segurança da ONU. A abertura de inquérito depende da autorização do
juízo de instrução (juízo de admissibilidade), de forma que o procedimento é conduzido
pelo procurador, mas processado no âmbito do juízo de instrução. As vítimas podem
apenas apresentar representações ao juízo de instrução, de forma que o TPI não acolhe
petições individuais. Nenhum inquérito ou procedimento poderá ter início ou prosseguir
pelo período de 12 meses se o Conselho de Segurança da ONU assim aprovar resolução.
4
A sentença do TPI é obrigatória e será proferia por unanimidade ou por maioria de votos
(juízo de 1ª instância). Tanto o Procurador quanto o réu podem recorrer, nos casos de
vício processual, erro de fato ou erro de direito, sendo vedada a reformatio in pejus. O
juízo de recursos também é competente para apreciar pedido de revisão da sentença
condenatória ou da pena (ex: descoberta de prova nova). Por decisão do juízo de
revisão, a apreciação do pedido revisional poderá ser feita pelo juízo de 1ª instância. As
deliberações do TPI serão secretas, mas a sentença é publicada em audiência pública.
Quanto à execução das sentenças do TPI, uma vez que o TPI possui personalidade
jurídica de Direito Público Internacional, representando verdadeira Corte Internacional,
a execução não se submete ao rito de homologação de sentença estrangeira, uma vez
que se trata de sentença internacional.
As penas privativas de liberdade serão cumpridas num Estado indicado pelo Tribunal a
partir de uma lista de Estados que tenham manifestado a sua disponibilidade para
receber pessoas condenadas pelo TPI. Em cada caso concreto, o Estado deve concordar
em receber o condenado, podendo também estabelecer condições para tal. As penas
de multa e perda de bens serão aplicadas pelos Estados-Partes.
Obs: penas aplicáveis pelo TPI => prisão por até 30 anos, prisão perpétua (elevado grau
de ilicitude do fato + condições pessoais do condenado), perda de bens provenientes do
crime, reparações (indenização, reabilitação e restituição). Pode haver o reexame da
pena aplicada quando cumpridos 2/3 da pena ou 25 anos no caso de prisão perpétua,
se verificado que foram respeitados alguns requisitos (como a colaboração do apenado
no procedimento de investigação e na execução das penas pecuniárias)
Como já afirmado, o Brasil encontra-se vinculado ao TPI não apenas por ser signatário
do Estatuto de Roma, como também em vista da norma da CF (art. 5º, §4º). Apesar disso,
a aplicação efetiva do Estatuto de Roma do TPI em território nacional ainda é objeto de
incertezas.
Uma das maiores problemáticas enfrentadas envolve a possibilidade de entrega, pelo
Brasil, de estrangeiro ou nacional condenado pelo TPI à cumprir pena de prisão
perpétua. Uma primeira corrente doutrinária afirma a impossibilidade dessa entrega
(DP – defender essa posição), com base na prevalência do disposto na CF (art. 5º, XLVII,
b), que veda a pena de caráter perpétuo (vide voto do Min. Celso de Mello no
julgamento do pedido de cooperação jurídica – Pet 4625 – o qual defende a
impossibilidade da entrega. Obs: STF ainda não foi provocado em relação a entrega ao
TPI, mas esse pedido de cooperação sinaliza pena impossibilidade como tendência do
Tribunal). Uma 2ª corrente (Portela) defende que é possível a “surrender”, uma vez que
o Estado é parte do Estatuto de Roma, além do disposto no art. 5, §4 da CF. Entretanto,
é certo que nada impede que o brasileiro condenado pelo TPI cumpra pena no Brasil,
conforme prevê o próprio Estatuto de Roma. Outro fundamento é o princípio da
primazia dos direitos humanos como um dos princípios que rege o Brasil nas relações
internacionais (art. 4º, II, da CF). Outro argumento a favor da entrega é a sua
diferenciação da extradição – enquanto a entrega é de um indivíduo a uma Corte
Internacional independente e imparcial, cuja competência foi aceita previamente pelo
país e onde se tem certeza de que o julgamento respeitará as garantias do indivíduo, a
extradição é a entrega de um indivíduo ao “arbítrio” de outro Estado, o qual, por conta
5
teorias. Agora cite um exemplo em que a solução seria distinta em cada uma das
teorias.
Resposta: Excelência, a intensa abertura do ordenamento jurídico brasileiro aos direitos
humanos é comprovada pela existência de amplo rol de direitos previsto na Constituição
e nos tratados de direitos humanos. Além do caráter compromissário, os direitos
previstos na Constituição e nos tratados internacionais são redigidos de forma
imprecisa, com uso frequente de conceitos indeterminados que podem ser
interpretados de modo ampliativo, atingindo facetas novas da vida social. Essas
características forjam a chamada força expansiva dos direitos humanos, que consiste no
fenômeno pelo qual os direitos humanos contaminam as mais diversas facetas do
ordenamento jurídico. Nesse contexto, a primeira fórmula de superação dos conflitos
aparentes entre direitos humanos é o uso da interpretação sistemática e finalística, que
determinaria o verdadeiro conteúdo dos direitos envolvidos e a adequação desse
conteúdo à situação fática analisada. Esse modo de solução de conflitos entre direitos é
denominado “teoria interna”, o conflito teria sido meramente aparente já que há limites
internos a todo o direito, em síntese, a teoria dos limites internos dos direitos humanos
defende que as restrições a tais direitos devem estar expressamente autorizadas pela
Constituição e pelos tratados de direitos humanos, ou, ainda, devem ser extraídas dos
limites imanentes de cada direito. No caso Ellwanger (HC 82.424, Rel. p/ o ac. Min.
Presidente Maurício Corrêa, julgamento em 17-9-2003, Plenário, DJ de 19-3-2004) no
Supremo Tribunal Federal, apesar de muitos votos terem feito referência à
proporcionalidade (teoria externa), constou do acórdão passagem típica de uma teoria
interna, ao se defender que o direito à livre expressão não pode abrigar, em sua
abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal; já a teoria
externa adota a separação entre o conteúdo do direito e limites que lhe são impostos
do exterior, oriundos de outros direitos. Assim, há um procedimento de interpretação
bifásico da teoria externa: os direitos inicialmente protegidos (direitos prima facie) são
identificados, mas só serão efetivamente aplicados sobre a situação fática, caso não
exista uma restrição justificável criada externamente por outro direito (A
descriminalização do aborto realizado até o terceiro mês de gravidez, STF, Primeira
Turma, HC 124.306/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o ac. Min. Roberto Barroso,
julgado em 29-11-2016). Assim, nota-se, que o critério da proporcionalidade, então, é
chave mestra da teoria externa, pois garante racionalidade e controle da argumentação
jurídica que será desenvolvida para estabelecer os limites externos de um direito e
afastá-lo da regência de determinada situação fática, ou seja, o princípio da
proporcionalidade consiste na aferição da idoneidade, necessidade e equilíbrio da
intervenção estatal em determinado direito fundamental, tratando-se de uma
ferramenta de aplicação dos direitos humanos em geral, em situação de limitação,
concorrência ou conflito de direitos humanos, na busca de proteção. Por fim, também
cabe mencionar que as duas teorias (interna e externa) podem resultar na mesma
conclusão, como no clássico exemplo de limite imanente é o do homem que grita
falsamente “fogo” em uma sala de cinema lotada, violando com sua conduta a
integridade física daqueles que foram pisoteados pelo pânico gerado.
de direitos humanos. Assim, explique como foi possível proibir a prisão do depositário
infiel com base neste entendimento se a própria CF admite esta modalidade de prisão.
Resposta: Excelência, com o advento da EC 45/04, incluindo o §3º no art.5º da CF/88,
acaloraram-se os embates entre internacionalistas e constitucionalistas acerca do status
que os tratados de direitos humanos adquirem ao ingressarem no ordenamento jurídico
pátrio. Nessa senda, o STF posicionou-se no sentido de conferir status de
supralegalidade às normas internacionais atinentes a direitos humanos anteriores à EC
45/2004 e posteriores sem o procedimento de aprovação do Art. 5o § 3o da CF/88 (bloco
de constitucionalidade restrito), posicionados entre o bloco de constitucionalidade e a
legislação ordinária. Veja-se que o STF não declarou a superioridade normativa da
Convenção Americana de Direitos Humanos sobre a Constituição Federal, nem aplicou
o princípio pro homine de adoção da norma mais favorável à proteção dos direitos
humanos. Assim, continua vigente o artigo da CF que permite a prisão do depositário
fiel, mas esta não se faz possível, por depender de complementação por parte de lei
ordinária, defesa de ser editada em razão de norma supralegal da Convenção Americana
de Direitos Humanos, que produz uma EFICÁCIA PARALISANTE sobre a norma
constitucional.
Acréscimos da revisora: O "efeito paralisante" da eficácia da norma (Gilmar Mendes) –
não há revogação do que está disposto na CF acerca da prisão do depositário infiel
(tecnicamente), apenas paralisação de seu efeito prático (ou seja: da validade das
normas que tenham regulamentado ou que venham a regulamentar a matéria, já que é
uma norma que DEPENDE de complemento infraconstitucional para ser concretizada).
No caso da prisão civil do depositário infiel, todas as normas internas (anteriores ou
posteriores à CADH) perderam sua eficácia prática (isto é, sua validade). E nenhuma
norma posterior poderá ser editada (eficácia paralisante). Alguns votos (no STF)
chegaram a mencionar a palavra revogação (cf . RE 466.343-SP e HC 87.585-TO).
Tecnicamente não é bem isso (na prática, entretanto, equivale a isso). A norma inválida
não pode ter eficácia (aplicabilidade), logo, equivale a ter sido revogada. Ao mesmo
tempo, não poderá haver a edição de novas normas, e este foi o motivo pelo qual o STF
conseguiu proibir a prisão civil do depositário infiel.
O primeiro elemento é que tenha existido uma conduta omissiva ou comissiva que seja
uma violação ao direito internacional (elemento objetivo). Mas não basta isso. É
necessário que esse fato (essa conduta) seja imputado ao Estado ou OI (elemento
subjetivo: quem realizou a conduta). Essa imputação é uma operação normativa, não é
naturalística.
Esse fato pode consistir em ato ilícito. O ato ilícito é a conduta comissiva (uma ação) ou
omissiva (um omissão contrária ao DI) que viola norma de Direito Internacional. Ainda,
nesse ponto, a doutrina faz uma importante observação: o fato de o ato ilícito à luz do
direito internacional estar em conformidade com o direito interno do Estado não exclui
a transgressão e, portanto, a responsabilidade estatal, a teor da Convenção de Viena
sobre o Direito dos Tratados, de 1969, que dispõe no art. 27: “Uma parte não pode
11
possível que o Estado responda caso, no contexto da conduta, tenha violado os seus
deveres de prevenção e repressão. Em outras palavras, tal responsabilidade pode
emergir se restar comprovado que o ente estatal deixou de cumprir, como afirma Rezek,
seus deveres elementares de prevenir o ilícito e de reprimi-lo adequadamente.
Exemplos: Atentados praticados por indivíduos contra chefes de Estado estrangeiros ou
contra seus representantes diplomáticos, insultos à bandeira ou aos símbolos nacionais
de determinados Estados. REGRA: O ente responsável pela reparação é o Estado ou a
OI, cabendo a estes exercer o direito de regresso contra o agente que efetivamente
tenha causado o prejuízo - A responsabilidade internacional é atribuída à pessoa jurídica
detentora de personalidade jurídica de direito internacional, ou seja, Estados e OIs, o
que significa que os agentes do Estado causador do dano não responderão em caráter
pessoal pela violação internacional, pois quem o fará será o Estado, podendo se aventar,
no máximo, uma posterior ação regressiva deste contra o agente que deu causa ao
ilícito. (HÁ DOUTRINA – AINDA TÍMIDA – QUE SUSTENTA QUE, EM SEDE DE VIOLAÇÃO
DE DIREITOS HUMANOS, O INDIVÍDUO CAUSADOR DO DANO TAMBÉM RESPONDA
DIRETAMENTE, INDENIZANDO COM SEUS PRÓPRIOS RECURSOS. MAS NÃO É A REGRA!
Novidade legislativa que sinaliza para uma possível “responsabilização direta” - A Lei
13.170/2015 (entra em vigor em 17/01/2016) passa a dispor sobre a ação de
indisponibilidade de bens, valores e direitos, das pessoas físicas ou jurídicas, submetidas
a esse tipo de sanção por Resolução do Conselho de Segurança da ONU - Normalmente,
o CSNU aplica tais sanções a pessoas que tiveram participação comprovada no
financiamento ou na prática de ações terroristas.
• Ministério Público: O Brasil responde por eventual leniência, atuação negligente
ou mesmo inação do MP.
ATENÇÃO: OBS1: Em princípio, o Estado não responde pelos danos decorrentes de atos
praticados por seus cidadãos. Entretanto, o dever de reparar o prejuízo pode emergir se
ficar provado que o ente estatal deixou de cumprir seus deveres elementares de
“prevenção e repressão”. Ex.: quando o Estado concorda com ações de seus nacionais
que configuram ilícitos internacionais ou se omite frente a tais atos.
OBS2: Prevalece que o Estado deve ser responsabilizado pelas ações de grupos de
revolucionários quando tiver concorrido para a ocorrência do conflito ou quando tiver
faltado com a “diligência devida” para impedir ou reprimir o fato.
OBS3: O reconhecimento do caráter de beligerante ou de insurgente de um movimento
revolucionário por parte do ente estatal que tenha sofrido o dano exclui a
responsabilidade do Estado onde atua esse movimento, a qual passa a recair sobre o
beligerante ou insurgente. Caso os revoltosos assumam o governo, a responsabilidade
por seus atos passa a caber ao Estado.
Só assim podemos entender por que o Brasil foi responsabilizado pela COMISSÃO
INTERAMERICANA pelo Caso Maria da Penha. O caso Maria da Penha vem da Convenção
de direito Humanos e é fruto da Convenção de Belém do Pará. Essa convenção
completou 20 anos em 2014.
A convenção de Belém do Pará estabelece um Mandado de Criminalização. O Brasil tem
que prevenir e reprimir a violência doméstica. Quem atirou e tentou eletrocutar a
senhora Maria da Penha? O marido, ou seja, um particular. E por que o Brasil foi
13
A ONU foi criada pela Conferência de São Francisco, em 1945, quando foi adotada a
Carta das Nações Unidas. A carta estabeleceu os órgãos principais da ONU, a saber:
A) Assembleia Geral: principal órgão deliberativo, tratando-se de um fórum para o
debate multilateral de todas as questões internacionais que abarca a carta. Todos os
estados estão representados por uma cadeira;
B) Conselho de Segurança: composto de 15 membros – 10 temporários e os 05
permanentes – tem como responsabilidade primordial manter a paz e a segurança
internacionais;
C) Conselho Econômico e Social: com 54 membros, ele atua como fórum central para o
debate de questões internacionais de índole econômica e social, e para a formulação de
recomendações sobre políticas dirigidas aos Estados Membros e ao sistema da ONU;
D) Conselho de Tutela: atualmente desativado, era utilizado para supervisionar os
governos que administravam os territórios;
E) Corte Internacional de Justiça: composta por 15 juízes independentes, e com sede em
Haia, é o órgão judicial principal das Nações Unidas. O objetivo principal é resolver os
litígios entre os Estados, funcionando também como órgão consultivo. Não julga
indivíduos, apenas Estados;
F) Secretariado: órgão administrativo e executivo da ONU.
Além desses órgãos principais, outros de natureza subsidiária podem ser criados de
acordo com a Carta (art. 7.2), sendo exemplos importantes no âmbito da matéria de
direitos humanos o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos
(ACNUDH) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
13. DPE-AP - Qual a natureza das decisões emitidas pelos Comitês da ONU e pela
Comissão Interamericana? Tratam-se de decisões vinculantes?
- Tratado é todo acordo formal e escrito, celebrado entre Estados e/ou organizações
internacionais, que busca produzir efeitos numa ordem jurídica de direito internacional,
com caráter obrigatório. São, portanto, HARD LAW.
- As resoluções ou declarações são manifestações escritas em conferências
Internacionais que apontam paradigmas para os Estados. Não possuem o poder de criar
obrigações jurídicas e, por isso, são denominadas de SOFT LAW.
OBS: embora a DUDH seja uma resolução, há quem entenda que possui força vinculante.
Acréscimo da revisora: fundamentos para que a DUDH seja considerada vinculante – jus
cogens, primazia da proteção dos DH, dentre outros.
Elaboração da DUDH
O sistema global começa com a adoção, em junho de 1945, da Carta das Nações Unidas,
que constituiu a ONU. No entanto, a carta não trouxe rol de direitos humanos, de modo
que a tarefa foi incumbida à Comissão de Direitos Humanos (CDH), órgão subsidiário do
Conselho Econômico e Social (ECOSOC, na sua sigla em inglês).
Assim, criou-se um comitê de redação da declaração, composto por 18 membros de
diversas formações políticas, culturais e religiosas. Eleanor Roosevelt, viúva do
Presidente Americano Franklin D. Roosevelt, presidiu o Comitê. Com ela estavam René
Cassin da França, que foi o responsável pelo primeiro esboço da Declaração, o Relator
do Comitê, Chalés Marik, do Líbano, o Vice-Presidente, Peng Chung Chang da China, e
John Humphrey do Canadá, Diretor da Divisão de Direitos Humanos da ONU, que
preparou o projeto da Declaração.
Realizado o rascunho por esse comitê, foi entregue à Comissão de Direitos Humanos,
que estava acontecendo em Genebra (Suíça). Essa versão da Declaração foi
encaminhada a todos os Estados-Membros da ONU para comentários, e ficou conhecida
como o Rascunho de Genebra.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) foi aprovada em 10.12.1948 pela
Assembleia-Geral da ONU. Dos 58 países membros da ONU naquele momento: 48
votaram à favor, nenhum votou contra, 8 se abstiveram (África do Sul, Arábia Saudita,
Bielo-Rússia, Iugoslávia, Polônia, Tchecoslováquia, Ucrânia e União Soviética) e dois
países (Honduras e Iêmen) não participaram da votação.
18. DPE-AP - Discorra sobre o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP).
Ele possui protocolos facultativos?
O PIDCP, juntamente com o PIDESC, foi criado para tipificar os direitos proclamados pela
DUDH. A ideia inicial era aprovar um único tratado internacional, mas não foi possível,
principalmente porque os blocos socialista e capitalista não chegaram a um consenso
sobre a aplicação dos direitos econômicos, sociais e culturais, isto é, se desfrutariam de
aplicabilidade imediata ou se a sua aplicação seria progressiva.
O PIDCP foi promulgado através do Decreto presidencial 592/92 e traz em seu texto os
direitos de primeira dimensão, ligados aos direitos civis e políticos, assegurando a sua
aplicação imediata.
18
19. DPE-AP - Discorra sobre o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e seus
dois protocolos facultativos? (explicado na questão acima. Repetição da pergunta)
Explique o motivo da existência de dois pactos no âmbito do sistema Onusiano (PIDCP
e PIDESC)? Há previsão no PIDESC acerca de direitos da criança e do adolescente? O
Brasil ratificou os referidos protocolos? Em caso positivo foi feita alguma reserva
(acerca do PIDCP, respondido na questão acima)?
Os pactos foram criados para tipificar os direitos proclamados pela DUDH. A ideia inicial
era aprovar um único tratado internacional, mas não foi possível, principalmente porque
os blocos socialista e capitalista não chegaram a um consenso sobre a aplicação dos
direitos econômicos, sociais e culturais, isto é, se desfrutariam de aplicabilidade
imediata ou se a sua aplicação seria progressiva (os países socialistas defenderam a
adoção de um tratado único). Diante desse impasse, a AGNU pediu ao ECOSOC que
orientasse a CDH a elaborar dois Pactos, um contendo os direitos civis e políticos, e o
outro contendo os direitos econômicos, sociais e culturais. O Pacto Internacional dos
Direitos Civis e Políticos (PIDCP) e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais (PIDESC) foram aprovados pela AGNU no mesmo dia, em 16.12.1966, tendo
entrado em vigor também no mesmo ano, em 1976, após o depósito do 35º instrumento
de ratificação.
A principal diferença entre os Pactos de 1966 consiste justamente naquilo que ensejou
a adoção de dois documentos distintos, prevista nos respectivos artigos 2º: enquanto o
PIDCP assegura a aplicação imediata dos direitos civis e políticos, o PIDESC prevê a
aplicação progressiva dos direitos econômicos, sociais e culturais.
19
O estatuto dos refugiados dispõe que será reconhecido como refugiado todo indivíduo
que por fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade,
grupo social ou opiniões políticas encontra-se fora de seu país de nacionalidade e não
possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país, ainda, aquele que não tendo
nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa
ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas anteriormente e
ainda, se devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a
deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país. Dispõe ainda o
estatuto que os efeitos da condição dos refugiados serão extensivos a família do
refugiado (cônjuge, descendente, ascendentes e demais que dependam
economicamente dele). por outro lado, o estatuto também exclui aqueles que não serão
beneficiados por ele, sendo: 1) Quem já desfruta de proteção ou assistência por parte
de organismo ou instituição das Nações Unidas que não o Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados 2) residentes no território nacional e tenham direitos e
obrigações relacionados com a condição de nacional brasileiro 3) tenham cometido
crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime hediondo,
participado de atos terroristas ou tráfico de drogas; 4) considerados culpados de atos
contrários aos fins e princípios das Nações Unidas. o refugiado gozará de direitos e
estará sujeito aos deveres dos estrangeiros, tendo direito a cédula de identidade
comprobatória de sua condição jurídica, carteira de trabalho e documento de viagem.
O estrangeiro tem assegurado o direito de não ser, deportado para território em que
sua vida ou liberdade esteja ameaçada, em virtude de raça, religião, nacionalidade,
grupo social ou opinião política, salvo, se tal benefício for invocado por refugiado
20
Por conseguinte, a própria convenção também define que pessoas com deficiência são
aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua
participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais
pessoas.
Acréscimos da revisora: (fonte: ciclos r3) A pessoa com deficiência, a partir do Estatuto
da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146/2015), passou a receber tratamento mais
digno, respeitando sua condição de sujeito de direitos. Para o Estatuto (art. 2º),
considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas. Tenham em mente, que a deficiência não mais pode
ser vista como presunção de incapacidade civil. Esse paradigma foi desconstruído pelo
já citado Estatuto, que, alterando o Código Civil, manteve a incapacidade absoluta
apenas para os menores de dezesseis anos. Vejam, agora, a nova redação do art. 4º, do
Código Civil:
Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à
maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores
de dezoito anos; II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não
puderem exprimir sua vontade; IV - os pródigos. Parágrafo
único. A capacidade dos indígenas será regulada por
legislação especial.
Além disso, o Estatuto, em diversos pontos, reforça o
reconhecimento da capacidade das pessoas com deficiência.
Em seu art. 6º, garante que a deficiência não afeta a
capacidade da pessoa para casar, constituir união estável,
exercer direitos sexuais e reprodutivos, exercer direito à
família, à convivência familiar e comunitária, dentre outros.
Convenção, esta deve prevalecer, não apenas por seu status superior à legislação
ordinária, mas pelo princípio do melhor interesse da criança, ressaltando-se que a
ponderação deve ser feita de acordo com o caso concreto e com a norma que dê maior
efetividade à proteção dos direitos humanos das crianças e adolescentes. Em relação ao
direito à convivência familiar, Convenção e ECA caminham juntos no sentido de prever
o seu afastamento apenas em casos excepcionalíssimos, apenas em situações de grave
risco ao desenvolvimento da criança ou do adolescente e em casos em que seja
comprovada a ineficácia de medidas menos gravosas, o que deve ser averiguado pelo
juiz da Vara da Infância.
O controle das ações públicas de promoção e defesa se fará através das instâncias
públicas colegiadas próprias, onde se assegure a paridade da participação de órgãos
governamentais e de entidades sociais. Faz-se principalmente por meio dos Conselhos
de Direitos de Crianças e Adolescentes, além dos Tribunais de Contas e Controladorias.
Os eixos estão interligados, e juntos formam um sistema de promoção e prevenção dos
direitos das crianças e adolescentes. Assim, em primeiro lugar, as políticas de promoção
devem atuar e, quando falham, e as instâncias de controle não conseguem prevenir esta
falha, o direito resta violado, de modo que devem ser acionadas as instâncias de defesa
para garantir sua preservação, impositividade e, se for o caso, restabelecer sua fruição.
Exemplo (retirado do livro ponto a ponto do Frasseto): Uma criança de sete anos mudou-
se de cidade. A rede de educação pública do novo município tem obrigação de
disponibilizar lhe vaga no ensino fundamental, mas não oferece. A política pública de
educação pertence ao eixo de promoção. Se ela é inoperante (não oferta o serviço ou
oferta de forma irregular), o direito à educação é violado, cabendo o acionamento de
alguma instância do eixo de defesa. Dentro do desenho do eixo de defesa, o primeiro
órgão público a ser acionado – ainda que não obrigatoriamente – é o Conselho Tutelar,
25
orientações mais detalhadas, dispondo além do que dispões na lei, salvo as disposições
sobre pena, sobre extradição, entrega, expulsão, assistência internacional para
procedimento criminal entre outras.
Acréscimos da revisora:
Tortura na ótica da Convenção das Nações Unidas : Conceito: Qualquer ato pelo qual
dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma
pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pessoa, informações ou confissões; de
castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de
ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer
motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou
sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de
funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência.
Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam consequência
unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas
decorram. #OBS1: Não se admite invocação de circunstâncias excepcionais, tais como
ameaça ou estado de guerra, instabilidade política interna ou qualquer emergência
pública como justificação da tortura. Não se admite, também, a exculpante da “ordem
hierárquica” como justificação para o crime. Não há, portanto, possibilidade de derrogar
a proibição contra a tortura. #OBS2: Os atos oriundos de sanções legítimas que causem
sofrimento ou dores NÃO são considerados tortura. Elemento subjetivo: dolo. A tortura
culposa não é punível. Finalidade específica: Obter confissão, informação ou ainda como
forma de punição ou discriminação (“dolo específico”). Modalidade omissão: NÃO está
prevista na Convenção. Sujeito ativo: É o agente público ou particular agindo em caráter
oficial ou ainda por instigação, consentimento ou aquiescência do agente público.
#CONCLUSÃO: Para a Convenção da ONU, a presença do funcionário público como
sujeito ativo é obrigatória. Resultado prático da tortura: O ato deve causar dor ou
sofrimento agudo, físico ou mental.
Tortura na ótica da Convenção Interamericana de Direitos Humanos Conceito: Todo ato
pelo qual são infligidos intencionalmente a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou
mentais, com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo
pessoal, como medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim. Entender-se-
á também como tortura a aplicação, sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular
a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não
causem dor física ou angústia psíquica. punível. Elemento subjetivo: dolo. A tortura
culposa não é punível. Finalidade específica: Não há finalidade específica. Modalidade
omissão: Está prevista na Convenção. Sujeito ativo1: Empregos ou funcionários públicos
que, no exercício de sua função, ordenem a prática de ato de tortura ou ainda instiguem
ou induzem a ele, cometem-no diretamente ou, podendo impedi-lo, não o façam.
Sujeito ativo2: As pessoas que, por instigação dos funcionários ou empregados públicos
em apreço, ordenem sua prática, instiguem ou induzem a ela, cometem-no diretamente
ou nele sejam cumplices. #CONCLUSÃO: Para a Convenção Interamericana, o particular
pode ser sujeito ativo de tortura sem que esteja em concurso com um agente público.
Resultado prático da tortura: O ato pode ou não resultar em pena ou sofrimento físico
ou mental. #ATENÇÃO: Também configura tortura o ato que anule a personalidade da
vítima ou diminua a sua capacidade física ou mental, mesmo que dele não decorra
qualquer dor física ou psíquica. (fonte: ciclos r3).
27
25. DPE-AM - DADDH e CADH. Discorra sobre o contexto histórico, mencionando qual
ocorreu primeiro. Qual a dimensão de direitos a CADH protege?
Pode ser dito ainda, nos casos em que o estado alega que o peticionário não esgotou os
recursos internos para buscar amparo na comissão, cabe ao estado comprovar quais os
recursos internos que não foram esgotados e a eficácia dos mesmos.
Em suma, embora o ônus probatório recaia sobre os demandantes, no caso a comissão,
existem situações nas quais tal ônus é imposto ao Estado, e outras circunstâncias nas
quais o ônus desaparece, pois se presume – por falta de oposição do Estado – que os
fatos invocados são corretos.
Acréscimos da Revisora:
29
REGRA: O ônus da prova compete à parte demandante (CIDH e vítima ou seus familiares)
EXCEÇÃO REGULAMENTAR: Regulamento da Corte IDH – A Corte poderá considerar
aceitos aqueles fatos que não tenham sido expressamente negados e as pretensões que
não tenham sido expressamente controvertidas (art. 41.3)
EXCEÇÃO JURISPRUDENCIAL: Jurisprudência da Corte IDH; o ônus da prova deve ser
INVERTIDO E TRANSFERIDO PARA O ESTADO QUANDO OS MEIOS DE PROVA ESTIVEREM
EM SEU PODER OU EXCLUSIVAMENTE À SUA DISPOSIÇÃO, O QUE OCORRE COM MUITA
FREQUÊNCIA NOS CASOS DE DESAPARECIMENTO FORÇADO DE PESSOAS – CARGA
DINÂMICA DA PROVA NA CORTE IDH – CASO VELÁSQUEZ RODRÍGUEZ x HONDURAS.
A Comissão realizará pelo menos dois períodos ordinários de sessões por ano, no lapso
que haja determinado previamente, bem como tantas sessões extraordinárias quantas
considerem necessárias. Antes do término do período de sessões, a Comissão
determinará a data e o lugar do período de sessões seguinte. As sessões em regra são
em sua sede, contudo, pelo voto da maioria absoluta podem decidir reunir-se em outro
local, com a anuência ou a convite do respectivo Estado.
Para constituir quórum será necessária a presença da maioria absoluta dos membros da
Comissão.
Os membros da Comissão não poderão participar na discussão, investigação,
deliberação ou decisão de assunto submetido à consideração da Comissão, no caso de
ser cidadão do Estado objeto da consideração ou estiver credenciado ou cumprindo
missão especial como diplomata perante esse Estado, bem como, se houver participado
30
CASOS:
A Comissão já atuou em vários casos envolvendo o Brasil, podendo ser citado
recentemente que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) adotou em
8 de março de 2019 outorgou medidas cautelares em benefício de Julio Lancellotti,
responsável pela “Pastoral da População em Situação de Rua” em São Paulo e defensor
dos direitos humanos das pessoas em situação de rua, e de Daniel Guerra Feitosa,
morador em situação de rua.
A Comissão considerou que, segundo os solicitantes, os beneficiários teriam sido objeto
de vários atos de violência e ameaças, alguns dos quais supostamente seriam
provenientes de autoridades das forças de segurança do Estado.
Assim, Comissão solicitou ao Estado do Brasil que adote as medidas necessárias para
proteger os direitos à vida e integridade pessoal dos senhores Julio Renato Lancellotti e
Daniel Guerra Feitosa, e possibilite que Julio Lancellotti possa continuar realizando seu
trabalho como defensor de direitos humanos sem ser alvo de ameaças, intimidações ou
atos de violência durante o exercício de suas funções. Adicionalmente, determinou que
o Estado informe sobre as ações implementadas que se destinem a investigar os fatos
que provocaram a adoção da presente medida cautelar, evitando assim a sua repetição.
2. No caso Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes foram mortos a tiros em
seu carro no dia 14 de março de 2018, quando retornavam de um evento público.
A comissão atuou ainda no caso DAMIÃO XIMENES FILHO vs BRASIL, tendo a comissão
sido oficiada através da irmã de Damião, Irene Ximenes Lopes.
A CIDH recebeu a petição com as denúncias relacionadas a Damião ainda em 1999 e
prontamente o Estado brasileiro foi instado a apresentar suas considerações sobre o
caso
A CIDH, no ano de 2003, concluiu que, no caso de Damião, o Estado brasileiro foi
responsável:
"Pela violação ao direito à integridade pessoal, à vida, à proteção
judicial e às garantias judiciais consagradas nos artigos 5, 4, 25
e 8 respectivamente, da Convenção Americana, devido à
hospitalização de Damião Ximenes Lopes em condições
inumanas e degradantes, às violações de sua integridade
pessoal, a seu assassinato; e às violações da obrigação de
investigar, o direito a um recurso efetivo e às garantias judiciais
relacionadas com a investigação dos fatos [...]"
Cabe frisar que esse foi o primeiro acordo realizado pelo Estado brasileiro na fase de
mérito do processo.
A Organização dos Estados Americanos criou, ao longo dos anos, Relatorias Especiais
sobre temas de direitos humanos, vinculadas à Comissão Interamericana de Direitos
Humanos. A mais importante dessas Relatorias é a Relatoria Especial para a Liberdade
de Expressão, criada em 1997 e com caráter permanente, independência funcional e
estrutura própria (que inclusive conta com financiamento externo). A criação dessa
Relatoria permanente busca incentivar a plena liberdade de expressão e informação nas
Américas, direito essencial para o enraizamento da democracia.
A liberdade de pensamento e expressão é a pedra angular de qualquer sociedade
democrática.1 O Sistema Interamericano de Direitos Humanos, em particular, atribui um
alcance especialmente amplo a ela; o Artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos
Humanos garante o direito de toda pessoa à liberdade de expressão e esclarece que este
direito compreende “a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de
toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em
forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha”.
Cabe à Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão entre outras funções a de
preparar os relatórios temáticos.
Apesar de não possuírem força vinculante e serem considerados meras recomendações,
os relatórios temáticos são amplamente divulgados e podem servir para que a Comissão
IDH venha a processar os Estados infratores perante a Corte.
Em relatório apresentado pela Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, sobre a situação da liberdade de
expressão no Brasil em 2015, concluiu-se que 2015 foi um dos piores anos da década
recente para o exercício do jornalismo no Brasil. Em algumas regiões do país, a violência
e o assassinato de jornalistas se tornaram frequentes. A esse respeito, a Relatoria
Especial lembra que os servidores estatais devem repudiar de forma inequívoca os
ataques perpetrados como represália ao exercício da liberdade de expressão, e devem
abster-se de fazer declarações que tenham o potencial de aumentar a vulnerabilidade
das pessoas perseguidas por exercer o seu direito à liberdade de expressão. Os Estados
devem refletir claramente em seus sistemas jurídicos e suas práticas que os crimes
32
contra a liberdade de expressão têm especial gravidade, uma vez que representam um
ataque direto contra todos os direitos fundamentais.
A Relatoria reiterou que os Estados têm a obrigação de adotar medidas para prevenir a
violência contra jornalistas e funcionários(as) dos meios de comunicação. Do mesmo
modo, os Estados têm a obrigação de proteger os jornalistas e funcionários dos meios
de comunicação em risco. Deve ainda investigar, perseguir e punir dos indivíduos que
cometerem atos de violência.
Há no âmbito da corte a opinião consultiva número 05 de 1985, que trata do tema de
liberdade de expressão. O Estado da Costa Rica, arguiu sobre a "compatibilidade da
Convenção Americana de Direitos Humanas com a exigência de diploma em curso
superior e de registro profissional para o exercício da profissão de jornalista".
Segundo a Corte, “a exigência da formação obrigatória de jornalistas, enquanto impeça
o uso pleno dos meios de comunicação social como veículo para expressar ou transmitir
opiniões, é inconvencional, pois violaria o art. 13 da CADH, causando uma restrição
desproporcional à liberdade de expressão.”
A aludida opinião consultiva foi utilizada pelo STF como um dos fundamentos para
afastar a exigência de diploma de curso superior, registrado pelo MEC, para o exercício
da profissão de jornalista.
Para o STF, “a exigência de diploma de curso superior para a prática do jornalismo o
qual, em sua essência, é o desenvolvimento profissional das liberdades de expressão e
de informação - não está autorizada pela ordem constitucional, pois constitui uma
restrição, um impedimento, uma verdadeira supressão do pleno, incondicionado e
efetivo exercício da liberdade jornalística, expressamente proibido pelo art. 220, § 1º,
da Constituição” (trecho do voto do relator Min. Gilmar Mendes no RE 511.961).
I) políticas criminais que propõem níveis mais altos de encarceramento como solução à
insegurança, e que se traduzem na existência de legislação e práticas que privilegiam a
aplicação da prisão preventiva, e restringem a possibilidade de aplicação de medidas
alternativas; II) a predominância de políticas repressivas (mano dura) nos discursos das
altas autoridades para resolver a insegurança cidadã através da privação de liberdade,
e a consequente pressão dos meios de comunicação e da opinião pública neste sentido;
III) a utilização de mecanismos de controle disciplinar como meio de pressão ou castigo
contra autoridades judiciais que determinam a aplicação de medidas alternativas; IV)
inadequados serviços de defesa pública; e V) a falta de coordenação interinstitucional
entre atores do sistema de administração de justiça.
Cabe frisar ainda que a CIDH observou que os inadequados serviços de defensoria
pública continuam sendo uma das principais causas da prolongação do regime de prisão
preventiva.
as medidas provisórias que considerar pertinente. Se tratar de assuntos que ainda não
estiverem submetidos ao seu conhecimento, poderá atuar a pedido da Comissão.
No tocante a competência consultiva, os Estados poderão consultar a Corte sobre a
interpretação da Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos
humanos nos Estados americanos.
A Corte poderá ainda, a pedido de um Estado-Membro da Organização, poderá emitir
pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os
mencionados instrumentos internacionais.
31. DPE-AP - Diferencie a função contenciosa e consultiva da Corte IDH. Quais normas
podem ser objeto de consulta perante a Corte? Uma ONG pode realizar uma consulta
perante a Corte? A Defensoria Pública pode consultar, por exemplo, uma lei municipal
perante a Corte? Qual seria o fundamento de lei municipal ser passível de consulta?
A Corte IDH possui duas funções: consultiva e contenciosa. Ao exercer sua função
consultiva, a Corte irá se manifestar acerca da interpretação e aplicação das normas
previstas nos tratados de direitos humanos aplicáveis aos países do Sistema
Interamericano. Já na função contenciosa, a Corte julga um país integrante da
Organização dos Estados Americanos sobre sua atuação perante um caso concreto e
determina se o Estado violou, ou não, os tratados do Sistema Interamericano. Ressalta-
se que a competência contenciosa da Corte só pode ser aplicada aos países que
expressamente a reconheceram.
Inicialmente, entendia-se que a Corte só poderia emitir opiniões consultivas sobre
tratados de direitos humanos que podem ser aplicados aos países integrantes do
Sistema Interamericano. Contudo, conforme determinado pela Corte na Opinião
Consultiva nº 10, ela poderá emitir opiniões consultivas acerca de documentos que não
sejam tratados, como a Declaração Americana, tendo em vista que o próprio Pacto de
São José traz a referida Declaração e outros documentos de mesma natureza, como base
para interpretar e aplicar os Direitos Humanos previstos na CADH.
Conforme previsto, somente os Estados membros da Organização dos Estados
Americanos, a CIDH e órgãos da OEA com pertinência restrita a temas de DH de sua
atuação podem realizar consulta perante a Corte. Dessa forma, ONG’s e a Defensoria
Pública não poderiam, por si só, solicitar opiniões consultivas da Corte.
Entretanto, como os Estados membros podem requerer opinião consultiva acerca de
suas normas internas, nada impede que um país solicite uma opinião consultiva acerca
de lei municipal. Deve ser considerado que se busca que todos os Estados integrantes
da OEA tenham seus ordenamentos jurídicos internos de acordo com os tratados de
Direitos Humanos aplicados ao Sistema Interamericano.
Acréscimos da revisora:
No plano consultivo, conforme afirma Flávia Piovesan, a Corte pode opinar sobre a
compatibilidade de preceitos da legislação doméstica em face dos instrumentos
internacionais, efetuando, assim, o “controle da convencionalidade das leis”.
Regra geral, os pareceres e opiniões consultivas emitidos pela Corte IDH não possuem
caráter vinculante. No entanto, cabe salientar que há posicionamento doutrinário
36
submeter o caso à Corte IDH, salvo decisão fundada da maioria absoluta dos membros
da Comissão.
O novo regulamento da CIDH introduz, assim, uma “justicialização do sistema
interamericano” (Piovesan), uma vez que a avaliação acerca do encaminhamento ou não
do caso à Corte IDH no caso de descumprimento das recomendações formuladas pela
CIDH não é mais feito de forma discricionária, desprovida de parâmetros objetivos,
evitando-se, assim, a ocorrência de eventual “seletividade política”.
Apesar dessa maior tônica de “juridicidade” conferida ao sistema interamericano pelo
novo regulamento do CIDH, não se pode afirmar que a Corte IDH é órgão revisor das
decisões proferidas pela Comissão, uma vez que a Comissão pode, ainda de que forma
excepcional calcada em parâmetros objetivos, através voto da maioria absoluta dos seus
membros, não encaminhar o caso à Corte, ainda que o Estado tenha descumprido as
recomendações nos prazos assinalados ela CIDH.
Obs: as considerações acerca dos questionamentos “Se a Comissão Interamericana
profere uma decisão em face de algum Estado há possibilidade de interposição de
recursos? A Corte é órgão revisor das decisões proferidas pela Comissão? ” não foram
muito conclusivas/precisas, pois, apesar de não ter encontrado nenhuma possibilidade
de recursos contra as “decisões” proferidas pela CIDH (informes/recomendações), não
achei nenhuma resposta sólida para o questionamento. Da mesma forma, não encontrei
doutrina no sentido de ser a Corte IDH órgão revisor ou não das decisões proferidas pela
Comissão (dessa forma, trouxe a doutrina da prof. Flávia Piovesan acerca da
“justicialização do sistema interamericano”, mas fiz a ressalva de que não há – pelo
menos não encontrei nenhuma fonte – como afirmar que a Corte constitua órgão revisor
das decisões da CIDH.).
No caso Atala Riffo y niñas X Chile, a Corte IDH se manifestou quantos aos direitos de
proteção à família, não discriminação, direitos das crianças e obrigação de respeito e
garantia. Na situação analisada, Karen Atala Riffo foi casada e teve três filhas com seu
marido. Contudo, o casal se separou e a guarda das filhas permaneceu com a mãe.
Posteriormente, Atala passou a se relacionar com uma mulher e o pai pediu a guarda
das meninas, sob o argumento de que a vida sexual da mãe causaria perigo ao
desenvolvimento físico e emocional das filhas. O caso chegou à Corte Suprema de Justiça
do Chile, que concordou com a alegação do ex-marido de Atala Riffo e fixou em
definitivo a guarda das crianças com o pai. Diante dos fatos, Karen denunciou o Chile na
CIDH que levou o ocorrido à Corte IDH. A Corte decidiu que a orientação sexual e a
identidade de gênero são categorias protegidas pela CADH, não consistindo em fatores
considerados para a decisão acerca da guarda de crianças. Além disso, ressaltou que no
Pacto de San José não há definição fechada do conceito de família, a qual deve ser
protegida pelo Estado. O Chile foi condenado a prestar assistência médica, psicológica e
psiquiátrica às vítimas que requeressem, realizar ato público para reconhecer a
responsabilidade pelo ocorrido e criar programas permanente de educação e formação
para funcionários públicos. Foi mencionado, ademais, o dano ao projeto de vida, ou seja,
39
o ônus que ocorre quando se interfere no destino da pessoa, frustrando sua realização
pessoal.
Na primeira condenação do Brasil na Corte IDH, Ximenes Lopes X Brasil, foi debatido o
tema de entidades de internação. Damião Ximenes Lopes era pessoa com deficiência e
foi internado em uma clínica no estado do Ceará. Contudo, Damião faleceu em
decorrência dos maus tratos sofridos na entidade, sem receber qualquer assistência
médica na ocasião. Ademais, o médico responsável por atestar sua morte escondeu as
causas reais no laudo. A família de Damião envidou todos os esforços a fim de que o
Estado investigasse as reais causas da morte, bem como reparasse os danos materiais e
morais da família, mas não obteve êxito. Assim o caso foi levado à CIDH, que fez diversas
recomendações ao Estado Brasileiro, as quais só foram cumpridas parcialmente.
Consequentemente, o país foi levado à Corte IDH. O Brasil foi condenado por ter se
omitido no seu dever de fiscalizar a entidade de internação, vez que era um hospital
privado de saúde contratado pelo Estado para prestar serviços de atendimento
psiquiátrico sob a supervisão do SUS. Dessa forma, foram violados os direitos à vida e à
integridade pessoal de Ximenes Lopes, o direito à integridade pessoal de seus familiares,
os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial, em razão da ineficiência em
investigar e punir os responsáveis pelos maus tratos e óbito da vítima. A Corte IDH
determinou que: o Estado indenizasse os familiares de Ximenes Lopes e ordenou
diversas outras obrigações ao Estado Brasileiro, a exemplo do dever de investigar e punir
os responsáveis, bem como instruir os funcionários de entidades de internação para
respeitarem os direitos dos internos e desenvolver política antimanicomial. A decisão
foi baseada na violação à Convenção Interamericana sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (Convenção de
Guatemala), o que indiretamente causou a violação do Pacto de San José. A doutrina
chama essa violação indireta de "supervisão por ricochete".
36. DPE-AP - Discorra sobre o caso Menina Talía e o caso Atala Rifo.
Resumo CASO MENINA TALÍA GONZALES
40
consideração cada caso concreto, avaliando os danos ou riscos reais e provados, e não
especulativos ou imaginários. Portanto, não podem ser admissíveis as especulações,
presunções, estereótipos ou considerações generalizadas sobre as pessoas com
HIV/AIDS ou qualquer outro tipo de enfermidade, ainda que estes preconceitos se
escondam em razões aparentemente legítimas como a proteção do direito à vida ou a
saúde pública.
Diante da comprovação de que o tratamento diferenciado estava baseado em uma
categoria proibida, o Estado tinha a obrigação de demonstrar que a decisão não tinha
uma finalidade ou efeito discriminatório. A Corte concluiu que o risco real e significativo
de contágio que pudesse colocar em risco a saúde das crianças companheiras de Talía
era sumamente reduzido. No âmbito de um juízo de necessidade e de estrita
proporcionalidade da medida, o Tribunal ressaltou que o meio escolhido constituía a
alternativa mais lesiva e desproporcional entre aquelas disponíveis para cumprir a
finalidade de proteger a integridade das demais crianças do colégio. Mesmo que a
sentença do tribunal interno pretendesse a proteção dos companheiros de classe de
Talía, não foi provado que a motivação expressa na decisão era adequada para alcançar
este fim.
No presente caso a decisão utilizou argumentos abstratos e estereotipados para
fundamentar uma decisão extrema e desnecessária, de modo que estas decisões
constituem um tratamento discriminatório contra Talía.
Por outro lado, a Corte advertiu que este tratamento evidencia, ademais, que não existiu
adaptabilidade do ambiente educativo à situação de Talía, através de medidas de
biossegurança ou outras similares que devem existir em todo estabelecimento
educativo para a prevenção geral da transmissão de enfermidades. A Corte determinou
que no caso de Talía confluíram, de forma interseccional, múltiplos fatores de
vulnerabilidade e de risco de discriminação, associados à sua condição de criança,
mulher, pessoa em situação de pobreza e pessoa com HIV. A este respeito, a Corte se
referiu a que certos grupos de mulheres padecem de discriminação ao longo de sua vida
em razão de mais de um fator combinado ao seu sexo, o que aumenta o risco de sofrer
atos de violência e outras violações a seus direitos humanos. A Corte afirmou que a
discriminação baseada em raça, origem étnica, origem nacional, capacidade, classe
socioeconômica, orientação sexual, identidade de gênero, religião, cultura, tradição e
outras realidades, intensifica, com frequência, os atos de violência contra as mulheres.
Quando se trata de mulheres com HIV/AIDS, deve-se entender a convivência da
enfermidade no marco dos papéis e das expectativas que afetam comportamentos. A
discriminação que Talía viveu não foi apenas causada por múltiplos fatores, mas derivou
em uma forma específica de discriminação que resultou da interseção destes fatores.
Tendo em conta o anterior, a Corte concluiu que o Estado equatoriano violou o direito
à educação, previsto no artigo 13 do Protocolo de San Salvador, em relação aos artigos
19 e 1.1 da Convenção Americana, em prejuízo de Talía Gonzales Lluy.
Com respeito às garantias judiciais e à proteção judicial, a Corte concluiu que, em virtude
de que existia um dever de atuar com uma devida diligência excepcional em função da
situação de Talía, o Equador violou a garantia judicial do prazo razoável no tocante ao
processo penal. Além disso, a Corte afirmou que neste caso não existem elementos
probatórios suficientes que permitam concluir que a existência de prejudicialidade (a
44
necessidade de esgotamento da via penal para poder postular uma reparação civil) na
legislação equatoriana constituiu, por si só, uma violação às garantias judiciais, pois não
foram apresentados argumentos e provas suficientes que permitam afirmar que o
recurso interposto por Teresa Lluy foi o resultado de uma falta de claridade na legislação
equatoriana. Finalmente, a Corte considerou que não conta com provas que permitam
sustentar o argumento sobre a falta de proteção judicial de Talía no trâmite do amparo
(mandado de segurança) constitucional, do processo penal ou do processo civil.
Portanto, a Corte concluiu que não pode determinar que tenha existido uma violação à
garantia de proteção judicial.
Quanto às reparações, a Corte ordenou ao Estado, entre outros, oferecer gratuitamente,
através de instituições de saúde públicas especializadas ou de pessoal de saúde
especializado, e de forma imediata, oportuna, adequada e efetiva, o tratamento médico
e psicológico ou psiquiátrico a Talía Gonzales Lluy, incluindo o fornecimento gratuito dos
medicamentos que eventualmente sejam necessários, tomando em consideração os
seus padecimentos. Além disso, dispôs que o Estado conceda uma bolsa de estudos para
Talía, para continuar seus estudos universitários, e que lhe entregue uma casa digna no
prazo de um ano. Por outro lado, dispôs que o Estado realize um programa para a
capacitação de funcionários de saúde sobre melhores práticas e direitos dos pacientes
com HIV.
Comentário do revisor:
A resposta se encontra absolutamente correta. Ela foi extraída diretamente do boletim
jurisprudencial da Corte IDH.
Para fins da prova oral, contudo, eu suprimiria o aspecto formal/processual que
envolveu o caso. Não creio que isso vá ser objeto de questionamentos.
O foco me parece permear os pontos abaixo (conforme explanado em um artigo da
ANADEP >https://www.anadep.org.br/wtk/pagina/materia?id=38201>):
1. impacto no conceito jurídico de pessoa com deficiência:
2. tratamento estatal que deve ser concedido às pessoas portadoras do vírus HIV
3. responsabilidade das entidades privadas que prestam serviços de saúde
4. possibilidade da supervisão por ricochete da Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência pelo Sistema Interamericano
5. o fenômeno da discriminação interseccional
Dentre esses pontos, o 1º (que me parece ser o eixo central) foi trabalhado no artigo da
ANADEP acima mencionado, com mais detalhe, e pode ser assim respondido:
1. impacto no conceito jurídico de pessoa com deficiência
A Corte Interamericana, no caso sob análise, equiparou uma pessoa portadora do vírus
HIV à condição de pessoa com deficiência, nos termos da Convenção da ONU sobre os
direitos das pessoas com deficiência.
Modelo social de conceituação de pessoa com deficiência, que leva em consideração
não apenas os aspectos físicos da pessoa, mas também o contexto social em que ela
45
está inserida (se ela pertence a uma sociedade que a inclua ou que a exclua) e a
existência ou não de barreiras que impeçam o exercício dos seus direitos. Percebe-se,
portanto, que a Corte Interamericana de Direitos Humanos invocou expressamente o
modelo social de conceituação de deficiência, ao entender que Talía deveria ser
considerada pessoa com deficiência não apenas por ser portadora do vírus HIV, mas
também pelo ambiente de extrema exclusão a que ela estava submetida, o que
impossibilitou o exercício regular de seus direitos básicos como educação, saúde,
habitação, dentre outros.
Importante esclarecer que a Corte Interamericana de Direitos Humanos seguiu na
mesma linha de abordagem de conceituação de pessoa com deficiência trazido pela
Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, superando o modelo
médico para a adoção do modelo social.
Resumo CASO ATALA RIFO
O Caso Atala Riffo e crianças vs. Chile, mais conhecido como “Caso Karen Atala”, foi
apresentado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em 24 de
novembro de 2004. Karen Atala é juíza e era casada com Ricardo Jaime López Allendes
desde 29 de março de 1993, com o qual possui três filhas: M. V. e R. nascidas em 1994,
1998 e 1999, respectivamente. Em março de 2002, a senhora Atala e o senhor Lópes se
divorciaram de fato e decidiram, mutuamente, que a guarda das filhas, bem como seus
cuidados, seria de responsabilidade da mãe, Karen. Em novembro de 2002, a senhora
Emma de Rámon começou a morar na mesma casa que a senhora Atala, suas três filhas
e filho mais velho – proveniente de outro casamento -, como sua companheira
sentimental.
No dia 14 de janeiro de 2003, o pai das três meninas interpôs uma demanda de guarda
e tutela perante o Juizado de Menores de Villarrica, argumentando que a guarda da mãe
colocava em risco o desenvolvimento físico e emocional das crianças, uma vez que esta
não estava capacitada a cuidar das crianças, pois sua nova opção sexual e convivência
lésbica estavam influenciando negativamente o desenvolvimento das menores, pelo
qual a mãe não procurava zelar. O senhor Lópes também apontou que, ao atribuir
normalidade a casais do mesmo sexo no plano jurídico, acarretava-se uma
desnaturalização do sentido do casal humano, homem-mulher, alterando, assim, o
sentido natural da família, pois afetava seus valores fundamentais como núcleo central
da sociedade. Não obstante, o pai também argumentou que viver com o casal lésbico
traria riscos biológicos para as crianças, no sentido de estarem mais expostas a doenças
como AIDS e herpes.
Dessa forma, a senhora Atala cumpriu o disposto, contudo, solicitou que o Juiz Titular
de Letras de Menores de Villarrica fosse impedido de continuar a conhecer do processo
de guarda, argumentando que este deu forma e conteúdo, com força de resolução
judicial, a um certo modelo de sociedade, fundamentando-se em estereótipos e
relações patriarcais que não valorizam a pluralidade no meio social. Logo, o Juiz declarou
“suficiente a causa” e se absteve do processo. Assim, em 29 de outubro de 2003, a Juíza
Substituta do Juizado de Menores de Villarrica proferiu sentença negando a demanda
de guarda, argumentando que a orientação sexual de Karen Atala nada a tinha a ver com
sua capacidade de ser uma mãe responsável, que ela não possuía patologia alguma que
a impedisse de exercer este papel e que não existiam provas de que a presença de sua
companheira na casa oferecia riscos ao bem-estar das crianças. Explicou que
homossexualidade não configurava patologia e sim uma conduta normal do ser
humano. Defendeu que o Judiciário deveria fundamentar suas resoluções em fatos
concretos e comprovadamente presentes na causa e não em suposições ou temores,
apoiados em preconceitos.
Em 5 de abril de 2004, o pai das crianças apresentou um recurso de queixa contra os
juízes do Tribunal de Recursos de Temuco perante a Corte Suprema do Chile, alegando
que estes cometeram um abuso grave e notório por privilegiar o direito da mãe sobre
os das crianças, faltando em seu dever de protegê-las, entre outros apontamentos.
Deste modo, em 7 de abril de 2004, a Corte Suprema concedeu o mandado de segurança
solicitado e em 31 de maio de 2004, a Quarta Câmara da Corte Suprema de Justiça do
Chile concedeu a guarda definitiva ao pai.
47
Deste modo, este caso foi levado à CIDH e esta considerou sua relação com a
discriminação que sofre a senhora Atala, especialmente sobre sua vida particular. A
visão discriminatória manifestou-se claramente na causa judicial sobre a guarda e
cuidado de suas três filhas. O Estado Chileno, por sua vez, negou que a causa judicial
tenha relação com a orientação de Karen Atala, apenas com o melhor interesse das
crianças.
Como primeiro ponto abordado pela CIDH encontram-se as supostas violações aos
artigos 2.481 e 1.182 da CADH, alegando que as normas de direito interno chileno
referentes aos assuntos de família foram aplicadas a partir de uma discriminação em
detrimento da senhora Atala ao se basearem em sua orientação sexual. Já o Estado
argumentou que o Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH) requer a
confiança e comprometimentos dos Estados membros e que essa relação pode ser
afetada caso a Corte seja demasiado reguladora sem considerar os sentimentos
majoritários dos Estados. Não obstante, o Estado Chileno também afirmou que ao
aceitar a CADH em determinado contexto, este comprometera-se com certos tipos de
direitos humanos e não com outros que antes não existiam. Dessa forma, deve-se criar
48
Outra observação que a Corte IDH realizou diz respeito à possível discriminação que
culminaria sobre as crianças caso estas morassem com a mãe e sua companheira. Ela
considera que a possibilidade de determinada discriminação não pode ser utilizada
como justificativa para diferenças de tratamento ou restrições de direitos. Dessa forma,
os Estados não podem utilizar essa projeção como fator de justificação para tratamentos
discriminatórios. Pelo contrário, devem adotar medidas que tornem efetivos os direitos
assegurados na Convenção em todo seu território nacional, posicionando-se para
enfrentar tais gestos e concepções discriminatórias e intolerantes. Logo, os Estados
devem prezar pelo avanço social, sob pena de legitimar ou consolidar violações aos
direitos humanos.
Ademais, uma série de estudos foram apresentados por peritos do caso e todos
afirmavam que não há como se provar a tese geral de que a convivência de crianças com
casais homossexuais afeta per se seu desenvolvimento psicológico e emocional, sendo
suas atitudes equivalentes às aquelas de pais heterossexuais. Os relatórios também
concluem que a orientação sexual dos pais não afeta significativamente a concepção de
gênero que as crianças possuem sobre si, isto é, sua orientação sexual e seu
comportamento e também afirma que as crianças criadas por casais homossexuais não
são mais alvos de estigmas do que as crianças criadas por casais héteros. Não obstante,
49
o Tribunal notificou que, no caso concreto, viver com a mãe e sua companheira não
significava a privação da figura paterna das crianças, uma vez que o pai poderia visitá-
las e participar de sua formação.
Outro ponto importante tocado pela CIDH foi a violação ao direito à privacidade de
Karen Atala. Neste sentido, ressalta que o direito à vida privada vai além do direito à
privacidade e esta abrange a identidade física e social, o desenvolvimento e autonomia
pessoal, além de seu direito de estabelecer e desenvolver relações com outras pessoas
em seu ambiente social, inclusive se envolvendo com pessoas do mesmo sexo no seu
ambiente público e profissional.
Dessa forma, a Corte IDH decidiu que devem ser protegidos os direitos dos
homossexuais de agir conforme essa característica. A Corte IDH adota o mesmo
posicionamento ao afirmar que não é razoável que a senhora Atala adie seu projeto de
vida e família em detrimento de sua conduta homossexual. Assim, não se pode reprová-
la ou censurá-la juridicamente por ter escolhido mudar sua vida, muito menos exigir que
ela renunciasse um aspecto essencial de sua identidade privilegiando a criação dos
filhos.
Visto isso, a Corte IDH declarou que o Estado Chileno violou o direito à igualdade e à não
discriminação, presente no art. 24, em relação ao art. 1.1 da Convenção Americana, o
direito à vida privada, retratado no art. 11.2 e 17.1, em relação ao art. 1.1, em
detrimento de Karen Atala e das crianças M. V. e R. Acerca destas últimas, também
concluiu-se que o Estado Chileno violou o art. 19 da Convenção, uma vez que as separou
injustificadamente de seu ambiente familiar. Neste ponto, é importante ressaltar quais
são as considerações da Corte acerca da forma como a opinião das crianças deve ser
levada em conta. Assim:
Como houve uma discordância entre a decisão da Corte Suprema do Chile e a vontade
expressa pelas crianças de que gostariam de permanecer com a mãe, a decisão da Corte
chilena deveria ter embasado e fundamentado fortemente sua decisão. Contudo, o
Tribunal constatou que esta medida não estava presente. Logo, a Corte Interamericana
de Direitos Humanos declarou que a decisão da Corte Suprema do Chile violou o art. 81
em relação ao art. 19 e 1.1 da Convenção Americana, isto é, o direito das crianças de
serem ouvidas e levadas em consideração no processo e a garantia da imparcialidade.
Deste modo, a Corte IDH, bem como o Tribunal, ao instituir as formas de reparação à
senhora Karen Atala e suas filhas M., V. e R. afirma que a sentença já é, per se, uma
forma de reparação. As outras formas de reparação serão: tratamento médico e
psicológico ou psiquiátrico gratuito, de forma imediata e adequada, às vítimas que os
solicitem, bem como o fornecimento de remédios; o Estado deve publicar o resumo
oficial da presente Sentença, elaborado pela Corte, uma só vez, no Diário Oficial, em um
jornal de ampla circulação nacional e a íntegra da presente Sentença, disponível por um
ano, numa página eletrônica oficial; o Estado deve realizar um ato público de
reconhecimento de responsabilidade internacional pelos fatos deste caso, com
autoridades e representantes do Poder Judiciário, bem como continuar implementando
cursos de capacitação a funcionários públicos tanto da esfera estadual quanto nacional,
principalmente a funcionários judiciais de todas as áreas e escalões em: i) direitos
humanos, orientação sexual e não discriminação; ii) proteção dos direitos da
comunidade LGBTI; e iii) discriminação, superação de estereótipos de gênero contra a
população LGTBI.
Nessa linha, a Corte IDH também declarou que o Estado Chileno tem a obrigação não só
de adotar medidas legislativas que efetivem os direitos consagrados na Convenção, mas
também de evitar promulgar leis que os impeça ou modificar leis que os proteja. A Corte
Interamericana destacou, ainda, não se tratar de uma mera questão de custódia das
filhas, que seria um tema de direito interno. Registrou que as autoridades públicas
violaram os direitos humanos, em especial a igualdade e não discriminação. Destacou
que esse princípio ingressou no campo do jus cogens e que o art.1º da Convenção
americana ao listar as formas discriminação não é taxativo. A CADH foi interpretada de
forma evolutiva e mais protetiva às vítimas para incluir a proteção contra a
discriminação decorrente da orientação sexual.
A Corte IDH destacou, em primeiro lugar, o “interesse superior da criança” não pode
servir para reproduzir um “estigma social”. Em segundo lugar, a violação da vida privada
pelos processos de investigação, inclusive nos locais de trabalho da mãe. Em terceiro
lugar, determinou a indenização por danos materiais, danos morais, assistência médica
51
Comentário do Revisor:
Resposta bem completa. Só indicaria, no caso de uma leitura mais rápida, em véspera
de prova, trechos resumidos extraídos do CADERNOS ESTRATÉGICOS - ANÁLISE
ESTRATÉGICA DOS JULGADOS DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS,
páginas 74 a 77, no link abaixo.
<http://www.defensoria.rj.def.br/uploads/arquivos/658d7f8437e443989ee2db024882
7db2.pdf>
Fonte:<https://www.snh2017.anpuh.org/resources/anais/54/1502029863_ARQUIVO_
ANPUHresumidosubmissao.pdf>
1
GOMES, Joaquim B. Barbosa. A ação afirmativa e o princípio constitucional da
igualdade. O direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de
Janeiro: Renovar, 2001, p. 23-24.
59
para ser válido, deveria passar pelos dois controles. A tese encontra fundamento na
Constituição Federal, pois esta previu e reconhece a competência de ambas as
jurisdições (STF – artigo 102 CF e Tribunal Internacional de Direitos Humanos – artigo 7º
ADCT).
O parâmetro de confronto no controle de convencionalidade internacional é a norma
internacional, em geral um determinado tratado. No que diz respeito ao objeto do
controle de constitucionalidade e a possibilidade de a Constituição ser também objeto
desse controle, tem-se que pode ser objeto toda norma interna, não importando a sua
hierarquia nacional. Como exemplo, o controle de convencionalidade internacional
exercido pelos tribunais internacionais pode inclusive analisar a compatibilidade de uma
norma oriunda do Poder Constituinte Originário (normas previstas na Constituição) com
as normas previstas em um tratado internacional de direitos humanos. No caso do
controle de convencionalidade nacional, os juízes e os tribunais internos não ousam
submeter uma norma do Poder Constituinte Originário à análise da compatibilidade com
um determinado tratado de direitos humanos. O Supremo Tribunal Federal, em
precedente antigo, sustentou que “O STF não tem jurisdição para fiscalizar a validade
das normas aprovadas pelo poder constituinte originário” (ADI 815, Rel. Min. Moreira
Alves, julgamento em 28-3-1996, Plenário, DJ de 10-5-1996). Assim, há limite de objeto
do controle de convencionalidade nacional, que o restringe.
Destarte, no tocante ao objeto, há uma distinção entre o controle de convencionalidade
internacional e o controle nacional, pois naquele seu objeto é toda norma interna, não
importando a sua hierarquia nacional, podendo mesmo ser oriunda do Poder
Constituinte Originário. No controle nacional, há limite ao objeto de controle, uma vez
que não se analisam normas do Poder Constituinte Originário.
12. Direitos Humanos e acesso à justiça: o dever dos estados de promover o acesso à
justiça, 100 Regras de Brasília e desenvolvimentos no âmbito da organização dos
estados americanos relacionados à Defensoria Pública.
Por fim, o Capítulo IV estabelece formas para a eficácia das Regras, tais como a aplicação
do princípio geral de colaboração, a cooperação internacional, a investigação, a
formação de profissionais para a atuação nessas áreas, a indicação de novas tecnologias
e manuais de boas práticas, difusão e comissões de acompanhamento.
Nos termos das Regras, consideram-se em condição de vulnerabilidade aquelas pessoas
que, por razão da sua idade, gênero, estado físico ou mental, ou por circunstâncias
sociais, econômicas, étnicas e/ou culturais, encontram especiais dificuldades em
exercitar com plenitude perante o sistema de justiça os direitos reconhecidos pelo
ordenamento jurídico.
Assim, a condição de vulnerabilidade pode ser causada por diversas razões, tais como a
idade da pessoa que pretende ter acesso à justiça; o gênero, com destaque à
vulnerabilidade da mulher; o estado físico ou mental da pessoa; ou por circunstâncias
sociais, econômicas, étnicas e/ou culturais, como as populações indígenas. É importante
destacar que o rol apresentado é meramente exemplificativo, não excluindo outras
pessoas que apresentem especiais dificuldades.
Vale ressaltar que consta expressamente nas Regras que a concreta determinação das
pessoas em condição de vulnerabilidade em cada país dependerá das suas
características específicas, ou inclusive do seu nível de desenvolvimento social e
econômico.
Já os destinatários das Regras de Brasília são os atores do sistema de justiça, tais como
os responsáveis pela criação de políticas públicas dentro do sistema judicial, os Juízes, o
Ministério Público, os Defensores Públicos, os Procuradores e os demais servidores que
trabalhem na Administração da Justiça, os Advogados e outros profissionais do direito,
as Polícias e todos os operadores do sistema judicial, entre outros.
No que tange especificamente à efetividade das Regras de Brasília, o Capítulo IV das
Regras, contempla expressamente uma série de medidas destinadas a fomentar a
eficácia das Regras, como instrumentos para a obtenção de um dado objetivo, de tal
maneira que elas contribuam de forma eficaz para a melhoria das condições de acesso
à justiça das pessoas em condição de vulnerabilidade.
Nesse Capítulo há a apresentação dos seguintes princípios: o princípio geral de
colaboração e entre os seus destinatários, bem como a participação da sociedade civil
para a coesão social; a cooperação internacional com o intercâmbio de experiências
entre os diversos países e fixando boas práticas; a investigação e estudos sobre a
matéria, com a participação de entidades científicas e acadêmicas; a sensibilização e
formação de profissionais que atuem no sistema judicial; a adoção das novas
tecnologias, com a finalidade de aprimorar o serviço de acesso à justiça dos menos
favorecidos, inclusive com a conscientização da necessidade da cidadania digital, na
sociedade globalizada atual; a elaboração de manuais de boas práticas setoriais; a
difusão das Regras entre os destinatários e a criação de comissões de acompanhamento
das Regras.
É importante destacar que as 100 Regras de Brasília foram elaboradas pelos próprios
Estados, diante da necessidade de concretizar o conteúdo de direitos fundamentais,
como o de acesso à justiça à população menos favorecida e à igualdade de direitos.
Assim, as Regras buscam dar efetividade aos direitos já declarados em documentos
internacionais.
62
Humanos, que consolida as diretrizes para escolha e atuação dos defensores públicos
interamericanos.
O Regulamento Unificado disciplina em seu art. 6º o processo de escolha ou de
conformação do corpo de defensores públicos interamericanos.
Conforme prevê o Regulamento Unificado, os defensores públicos são eleitos para um
período de três anos, podendo ser reeleitos para somente um período consecutivo (art.
6.5). O art. 17 do Regulamento Unificado prevê três hipóteses em que o mandato dos
defensores públicos interamericanos se estenderá: 1) Nos casos em trâmite na Comissão
Interamericana, até que seja emitido o informe final previsto no art. 51 da CADH, no
caso de não ser remitido à CorteIDH; 2) Se o caso for submetido à CorteIDH, ou se a
assistência do defensor público interamericano se iniciar somente no procedimento
perante a Corte, até que seja emitida a sentença final; e 3) Durante o tempo que se
estenda a execução da sentença de mérito, reparações e custas da CorteIDH.
Conforme prevê o Regulamento Unificado, para cada caso em particular serão
designados três defensores públicos interamericanos, sendo dois titulares e um
suplente (art. 12). Na escolha dos defensores públicos interamericanos, segundo dispõe
o art. 13 do Regulamento Unificado, a Secretaria Geral da AIDEF observará, na medida
do possível, um sistema de designação baseado em critérios objetivos e subjetivos. São
critérios objetivos: 1) Que um defensor público interamericano não pertença ao Estado
denunciado; e 2) Que os demais defensores públicos interamericanos – dois, portanto –
pertençam ao Estado denunciado, salvo se, por disposições internas, não estiverem
autorizados para demandar contra seu próprio Estado, ou que não exista dentro da lista
de defensores públicos interamericanos um nacional do Estado denunciado. São
critérios subjetivos: 1) A índole dos direitos violados; 2) As circunstâncias do caso; 3) A
formação curricular e acadêmica do defensor público interamericano; e 4) A experiência
do defensor público interamericano em intervenções ou litígios que guardem relação
com a índole dos direitos violados e as circunstâncias do caso.
A expressão "trabalhador migrante" refere-se a uma pessoa que vai exercer, exerce ou
exerceu uma atividade remunerada em um Estado do qual ele não é um cidadão. São
exemplos de trabalhadores migrantes previstos na Convenção: a) "trabalhador
fronteiriço" refere-se a um trabalhador migrante que conserva a sua residência habitual
num Estado vizinho ao qual ele normalmente regressa todos os dias ou, pelo menos,
uma vez por semana; b) A expressão "trabalhador sazonal" refere-se a um trabalhador
migrante cuja atividade, pela sua natureza, depende de condições sazonais e só se
realiza durante parte do ano; c) A expressão "marinheiro", que inclui pescadores, refere-
se a um trabalhador migrante empregado a bordo de um navio matriculado em um
Estado do qual ele não é um cidadão; d) A expressão "trabalhador itinerante" refere-se
a um trabalhador migrante que, tendo a sua residência habitual num Estado, tem de
viajar para outro Estado ou Estados por períodos curtos, devido à natureza da sua
ocupação; e) A expressão "trabalhador vinculado a um projeto" refere-se a um
trabalhador migrante admitido num Estado de emprego por tempo definido para
trabalhar unicamente em um projeto específico sendo conduzido pelo seu empregador
nesse Estado, entre outros.
O art. 33 estabelece que os trabalhadores migrantes e os membros das suas famílias
têm o direito de serem informados pelo Estado de origem, Estado de emprego ou Estado
de trânsito, conforme o caso, relativamente aos direitos que lhes são reconhecidos pela
Convenção. Outrossim, no que diz respeito à segurança social, o art. 27 leciona que as
autoridades competentes do Estado de origem e do Estado de emprego podem, em
qualquer momento, tomar as disposições necessárias para determinar as modalidades
de aplicação desta norma.
O art. 5º da Convenção apresenta a distinção entre os trabalhadores e membros de suas
famílias considerados em situação regular ou irregular. São considerados
documentados ou em situação regular se forem autorizados a entrar, permanecer e
exercer uma atividade remunerada no Estado de emprego, ao abrigo da legislação desse
Estado e das convenções internacionais de que esse Estado seja Parte. Por outro lado,
são considerados indocumentados ou em situação irregular aqueles que não
preencherem tais condições.
O art. 7º da Convenção garante a não discriminação em matéria de direitos, de modo
que os Estados Partes comprometem-se a respeitar e a garantir os direitos previstos na
Convenção a todos os trabalhadores migrantes e membros da sua família que se
encontrem no seu território e sujeitos à sua jurisdição, sem distinção alguma. Destarte,
os trabalhadores ilegais podem ser protegidos pela Convenção. Cumpre mencionar que
a Parte III da Convenção dispões sobre “Direitos Humanos de Todos os Trabalhadores
Migrantes e dos Membros das suas Famílias”, enquanto que a Parte IV preceitua “Outros
direitos dos Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias que se
encontram documentados ou em situação regular”.
No que diz respeito a regularização a Convenção estabelece no art. 69 da Convenção,
que “os Estados Partes, em cujo território se encontrem trabalhadores migrantes e
membros das suas famílias em situação irregular, deverão tomar as medidas adequadas
para evitar que essa situação se prolongue”. Outrossim, prevê que “sempre que os
Estados Partes interessados considerem a possibilidade de regularizar a situação dessas
pessoas, de harmonia com a legislação nacional e os acordos bilaterais ou multilaterais
aplicáveis, devem ter devidamente em conta as circunstâncias da sua entrada, a duração
da sua estada no Estado de emprego, bem como outras considerações relevantes, em
66
A Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas foi aprovada pela
Assembleia Geral da ONU, tendo sido redigida no Conselho de Direitos Humanos,
contando com 143 votos a favor, 11 abstenções e 4 votos em contrário (Estados Unidos,
Nova Zelândia, Austrália e Canadá – países com expressiva população indígena).
Entre outros, a Declaração prevê o direito a autodeterminação. Para o Direito
Internacional, o direito à autodeterminação consiste na emancipação política de
comunidade humana submetida a jugo colonial, dominação estrangeira ou, de modo, a
regime no qual há grave e sistemática violação de seus direitos humanos. A Declaração
de 2007 não reconhece tal sentido do direito à autodeterminação: pelo contrário, há
menção expressa de que a integridade territorial dos Estados não deve sofrer
modificação diante dos direitos dos povos indígenas (art. 46). Assim, o sentido singular
de “autodeterminação dos povos indígenas” consiste em reconhecer que eles têm o
direito de determinar livremente sua condição política e buscar livremente seu
desenvolvimento econômico, social e cultural, tendo direito à autonomia ou ao
autogoverno nas questões relacionadas a seus assuntos internos e locais, assim como a
disporem dos meios para financiar suas funções autônomas (arts. 3º e 4º). O tripé da
autodeterminação dos povos indígenas é: território, governo e jurisdição (e não
secessão). Podem conservar e reforçar, então, seus próprios sistemas de edição de
normas, educação, saúde, moradia, cultura, meios de informação e solução de conflitos,
entre outros.
Os povos indígenas deverão ter o direito de conservar seus costumes e instituições
próprias, desde que eles não sejam incompatíveis com os direitos fundamentais
definidos pelo sistema jurídico nacional nem com os direitos humanos
internacionalmente reconhecidos.
Sempre que for necessário, deverão ser estabelecidos procedimentos para solucionar
os conflitos que possam surgir de maneira a compatibilizar as regras indígenas com as
regras de direitos humanos. Considerando a missão de promoção dos direitos humanos
constitucionalmente atribuída à Defensoria Pública (art. 134 da CF/88), a medida a ser
adotada na condição de Defensor Público deve buscar “a conscientização e a educação
em Direitos Humanos” por parte das comunidades nativas, de modo a não interferir
bruscamente em sua cultura. A busca por melhores condições de saúde básica para as
comunidades indígenas é medida que também poderia auxiliar no combate ao
infanticídio e prática de mutilações nas comunidades indígenas, muitas vezes praticada
por falta de acesso a condições mínimas de saúde.
Por fim, para aplacar o receio de Estados de que os povos indígenas pudessem
reclamar o direito à autodeterminação dos povos (levando a disputas territoriais), a
Convenção veda expressamente o uso do termo “povos” no sentido comumente
atribuído ao termo no Direito Internacional. O artigo 1º tanto do Pacto Internacional
de Direitos Civis e Políticos quanto do Pacto Internacional dos Direitos Sociais,
Econômicos e Culturais prevê que “todos os povos têm direito à autodeterminação. Em
virtude desse direito, determinam livremente seu estatuto político e asseguram
livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural”, o que representa o
direito à emancipação política e secessão dos povos submetidos à dominação
estrangeira ou regime colonial.
O direito de secessão, então, não foi reconhecido pela Convenção, que, contudo,
representa um importante avanço ao tratar, com dignidade, respeito e,
especialmente, reconhecer sua autonomia e empoderamento no trato de questões de
seu interesse.
Nas Disposições Gerais da Convenção, há peculiar mecanismo que dificulta o retrocesso.
O Estado, após a ratificação, só pode denunciar a Convenção após dez anos contados
da entrada em vigor do tratado para o denunciante. A denúncia só surtirá efeito um
ano depois. Caso não o faça, mantém-se vinculado por mais um período de dez anos,
quando, ao final, poderá denunciá-la, e assim sucessivamente.
No caso brasileiro, a Convenção entrou em vigor internacionalmente para o Brasil em
25 de julho de 2003, em que pese o atraso na edição do Decreto de Promulgação
(entrada em vigor no plano interno) somente em 2004. Assim, as eventuais pressões de
grupos de interesse (em especial de setores vinculados ao agronegócio) para a denúncia
da Convenção devem aguardar mais dez anos.
O art. 68 do ADCT prescreve que “aos remanescentes das comunidades dos quilombos
que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o
Estado emitir-lhes os títulos respectivos”. Não obstante a importância do tema, a CF não
se preocupou em definir quem são os quilombos, quais terras são essas referidas no
dispositivo e qual a natureza da propriedade.
Nesse contexto, foi editado o Decreto 4.887/2003, que definiu que compete ao
Ministério do Desenvolvimento Agrário, por meio do Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária - INCRA, a identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e
titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos,
sem prejuízo da competência concorrente dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios.
Segundo o texto legal, consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos
os grupos étnico-raciais, segundo critérios de autoatribuição, com trajetória histórica
própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade
negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida, sendo que o critério
escolhido para esse enquadramento foi o da autodefinição.
Como se percebe do conceito trazida no Decreto, os quilombos se enquadram, assim
como os índios, na categoria de comunidades tradicionais, uma vez que o traço
essencial de sua caracterização é a preservação de uma cultura distinta da majoritária,
71
mantendo uma relação com a terra que é mais do que posse ou propriedade, sendo uma
relação de identidade. Nesse sentido, o Decreto 6.040/2007, no art. 3º, I, conceitua povo
e comunidade tradicional como sendo “grupos culturalmente diferenciados e que se
reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam
e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural,
social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas
gerados e transmitidos pela tradição”.
Considerando esse enquadramento dos quilombolas no grupo de comunidades
tradicionais, aplicam-se a eles todas as disposições da Convenção 169 da OIT,
incorporada ao ordenamento jurídico pelo Decreto 5.051/04, tendo status de
supralegalidade, conforme entendimento do STF no RE 379.703-1/RS, em razão do seu
conteúdo ser relativo a direitos humanos.
Segundo Vitorelli, as terras ocupadas por remanescentes das comunidades quilombolas
têm a dimensão necessária para a garantia da reprodução física, social, econômica e
cultural da comunidade, e seus limites serão fixados levando em conta critérios de
territorialidade indicados pela própria comunidade. Isso significa que os próprios
quilombolas participarão do processo de demarcação, indicando os limites do território
tradicionalmente ocupado ou utilizado para a sua sobrevivência. Desse forma, um
estudo antropológico será peça fundamental dessa definição, o qual deverá, em
entrevistas e análise históricas da própria comunidade, de seus integrantes e
antepassados, definir quais áreas estão compreendidas no limite do conceito de
ocupação tradicional.
Em relação à aquisição dessas terras, resta a dúvida no que tange à natureza jurídica da
aquisição de propriedade quilombola é originária ou derivada. Diferentemente às terras
indígenas (art. 231, §6º), a Constituição Federal foi omissa, pois não estabeleceu se
haveria nulidade dos títulos incidentes sobre áreas quilombolas. A partir disso, surgem
diversas posições doutrinárias.
Daniel Sarmento sustenta que a CF efetuou a transferência da propriedade às
comunidades quilombolas (art. 68, ADCT), motivo pelo qual defende que há uma
consequência lógica inarredável a subsistência dos títulos anteriores incidentes sobre a
mesma área. Por outro lado, não impressiona o argumento no sentido de que, como o
texto constitucional não foi expresso ao invalidar os títulos de propriedade que antes
recaiam sobre as áreas particulares ocupadas pelos remanescentes de quilombo, a
prévia desapropriação seria indispensável para viabilizar a transferência da titularidade
dessas terras.
Vitorelli conclui que, embora garantida aos quilombolas a propriedade das terras
tradicionalmente ocupadas, faz-se necessária a atuação do Poder Público (no caso, da
União) que deverá promover as desapropriações cabíveis, caso incidem sobre terras
tradicionalmente ocupadas títulos válidos anteriores a 1988.
Nesse contexto, o Decreto 4.887/03 prevê o uso da desapropriação quando os títulos
que incidem sobre essas terras não forem nulos:
No que tange à demarcação das terras, vale registrar que o Decreto 4.887 ressalta que
compete ao compete ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, por meio do Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, a identificação, reconhecimento,
delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das
comunidades dos quilombos, sem prejuízo da competência concorrente dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios.2
2 JULGADOMUITOIMPORTANTE: O art. 68 do ADCT estabelece que “aos remanescentes das comunidades dos
quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes
os títulos respectivos.” Em 2003, foi editado o Decreto nº 4.887, com o objetivo de regulamentar o procedimento
para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das
comunidades dos quilombos. O STF entendeu que este Decreto não invadiu esfera reservada à lei. O objetivo do
Decreto foi tão somente o de regular o comportamento do Estado na implementação do comando constitucional
previsto no art. 68 do ADCT. Houve o mero exercício do poder regulamentar da Administração, nos limites
estabelecidos pelo art. 84, VI, da Constituição. O art. 2º, caput e § 1º do Decreto nº 4.887/2003 prevê como deve ser
o critério utilizado pelo Poder Público para a identificação dos quilombolas. O critério escolhido foi o da autoatribuição
(autodefinição). O STF entendeu que a escolha do critério desse critério não foi arbitrária, não sendo contrária à
Constituição. O art. 2º, §§ 2º e 3º, do Decreto preconiza que, na identificação, medição e demarcação das terras dos
quilombolas devem ser levados em consideração critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das
comunidades dos quilombos. O STF afirmou que essa previsão é constitucional. Isso porque o que o Decreto está
garantindo é apenas que as comunidades envolvidas sejam ouvidas, não significando que a demarcação será feita
exclusivamente com base nos critérios indicados pelos quilombolas. O art. 13 do Decreto, por sua vez, estabelece que
o INCRA poderá realizar a desapropriação de determinadas áreas caso os territórios ocupados por remanescentes das
comunidades dos quilombos estejam situados em locais pertencentes a particulares. O STF reputou válida essa
previsão tendo em vista que, em nenhum momento a Constituição afirma que são nulos ou extintos os títulos
eventualmente incidentes sobre as terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos. Assim, o
art. 68 do ADCT, apesar de reconhecer um direito aos quilombolas, não invalida os títulos de propriedade
eventualmente existentes, de modo que, para que haja a regularização do registro em favor das comunidades
quilombolas, exige-se a realização do procedimento de desapropriação. Por fim, o STF não acolheu a tese de que
somente poderiam ser consideradas terras de quilombolas aqueles que estivessem sendo ocupadas por essas
comunidades na data da promulgação da CF/88 (05/10/1988). Em outras palavras, mesmo que, na data da
promulgação da CF/88, a terra não mais estivesse sendo ocupada pelas comunidades quilombolas, é possível, em
tese, que seja garantido o direito previsto no art. 68 do ADCT. STF. Plenário. ADI 3239/DF, rel. orig. Min. Cezar Peluso,
red.p/ o ac. Min. Rosa Weber, julgado em 8/2/2018 (Info 890).
73
A Comissão Nacional da Verdade foi criada pela lei nº 12.528/11 para apurar as graves
violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 05 de outubro de 1988. Pode ser
apontado como precedente internacional a condenação que o Brasil sofreu na Corte IDH
no ano de 2010, por ocasião do julgamento do caso Gomes Lund e Outros x Brasil.
Na oportunidade, a corte decidiu que o povo brasileiro tinha direito à verdade e à
memória histórica referente ao período ditatorial, declarando a incompatibilidade da lei
de anistia com as disposições da CADH, especialmente por não permitir a investigação
e responsabilização civil e criminal dos agentes públicos responsáveis pelas graves
violações de direitos humanos.
De acordo com seu art. 1º da Lei n. 12.528/2011, a comissão tem como finalidade
“examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período
fixado no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (período de 18 de
setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição), a fim de efetivar o direito
à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional”. Além de (i)
esclarecer os fatos e as circunstâncias dos casos de graves violações de direitos
humanos, promovendo o esclarecimento dos casos de torturas, mortes,
desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres e sua autoria, ainda que ocorridos
no exterior, a Comissão deve encaminhar aos órgãos públicos competentes toda e
qualquer informação obtida que possa auxiliar na (ii) localização e identificação de
corpos e restos mortais de desaparecidos políticos e (iii) recomendar a adoção de
medidas e políticas públicas para prevenir violação de direitos humanos, assegurar sua
não repetição e promover a efetiva reconciliação nacional.
Quanto à obtenção da verdade judicial, é cabível a responsabilização dos agentes que
promoveram graves violações de direitos humanos durante a ditadura militar. Para
tanto, a Corte IDH considerou ser inaplicável a Lei n. 6.683/79 (Lei da Anistia) aos
agentes da ditadura, uma vez que tal lei ofendeu o direito à justiça das vítimas e seus
familiares, previsto implicitamente nos arts. 8º e 25 da Convenção Americana de
Direitos Humanos (Caso Gomes Lund vs. Brasil, sentença de 24-11- 2010).
Ocorre que o STF decidiu pela improcedência da ADPF 153, interposta pelo Conselho
Federal da OAB, que almejava a interpretação conforme a Constituição da Lei da Anistia,
no sentido de excluir os agentes da ditadura do seu alcance. Para o relator, Min. Eros
Grau, a Lei da anistia veiculou uma decisão política assumida naquele momento e a
Constituição de 1988 não pode afetar leis-medida que a tenham precedido (ADPF 153,
Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 29-4-2010, Plenário, DJE de 6-8-2010).Em 10 de
dezembro de 2014, a Comissão Nacional da Verdade, criada pela Lei n. 12.528/2011,
entregou seu relatório final, que contempla a análise de graves violações de direitos
humanos dentro do período de 1946 a 1988.
Composto por três volumes, o relatório final documentou especialmente centenas de
casos de violações graves de direitos humanos cometidos por agentes da ditadura
militar (1964-1985), atestando que tais violações consistiram em uma política
sistemática de Estado (e não atos isolados, de indivíduos – civis ou militares – agindo
contra orientações superiores). Conforme consta do relatório, “na ditadura militar, a
repressão e a eliminação de opositores políticos se converteram em política de Estado,
concebida e implementada a partir de decisões emanadas da Presidência da República
e dos ministérios militares” (p. 963). Assim, tais crimes têm, de acordo com o relatório
final, a natureza de crimes contra a humanidade. Essa conclusão é importante e está em
consonância com a decisão da Corte IDH no Caso Gomes Lund vs. Brasil (2010).
74
49. DPE-AM – Fale sobre o procedimento do IDC? Dê exemplos. O juiz pode se opor ao
incidente? (Não encontrei nada na doutrina sobre a possiblidade ou não de o juiz se
opor ao incidente)
O incidente de deslocamento de competência é o mecanismo previsto no art. 109, § 5º,
CF, introduzido pela Emenda Constitucional n. 45/2004, que permite ao PGR requerer
ao STJ o deslocamento de competência para a justiça federal, em qualquer fase do
inquérito ou processo, nos casos de grave violação a direitos humanos, com a finalidade
de assegurar o cumprimento dos TIDHs ratificados pelo Brasil. Para Carvalho Ramos,
pode ser criminal ou cível. Flávia Piovesan faz a crítica quanto à necessidade de
democratização do acesso ao pedido de deslocamento.
O “incidente de deslocamento de competência” (IDC) possui seis elementos principais,
a saber:
1) Legitimidade exclusiva de propositura do Procurador-Geral da República.
2) Competência privativa do Superior Tribunal de Justiça, para conhecer e decidir, com
recurso ao STF (recurso extraordinário).
3) Abrangência cível ou criminal dos feitos deslocados, bem como de qualquer espécie
de direitos humanos (abarcando todas as gerações de direitos) desde que se refiram a
casos de “graves violações” de tais direitos.
4) Permite o deslocamento na fase pré-processual (ex., inquérito policial ou inquérito
civil público) ou já na fase processual.
5) Relaciona-se ao cumprimento de obrigações decorrentes de tratados de direitos
humanos celebrados pelo Brasil.
6) Fixa a competência da Justiça Federal e do Ministério Público Federal para atuar no
feito deslocado.
A motivação para a criação do IDC foi o Direito Internacional, que não admite que o
Estado justifique o descumprimento de determinada obrigação em nome do respeito a
76
STF, além de haver também conceito aberto no texto constitucional com relação à
autorização de intervenção federal por violação dos “direitos da pessoa humana”.
50. Discorra sobre cláusula federativa.
Cláusula Federal, de maneira geral, é a cláusula em tratados internacionais de direitos
humanos que estabelece o cumprimento do tratado pelos estados membros de uma
federação, ou seja, governo central e estados partes estão obrigados pelo tratado. Visa
evitar que estados membros se escusem do cumprimento das regras de direitos
humanos acordadas escudados em sua organização.
O artigo 28 da Convenção Americana de Direitos Humanos3, ou Pacto de San José da
Costa Rica, nominado “cláusula federal”, do qual o Brasil é signatário, é exemplo prático
dessa clássica cláusula em Direitos Humanos, que além de estabelecer a obrigação de
cumprimento do tratado pelos estados parte, ainda determina providências a serem
adotadas pelo governo federal para o efetivo cumprimento do Tratado, bem como a
busca de sua validade num futuro estabelecimento de uma federação por dois estados
membros do Tratado.
Destarte, quando o Estado Parte for constituído como federal, o governo nacional deve
cumprir todas as disposições da Convenção. Não se exonera o Estado Federal de cumprir
a obrigação em todo seu território, isto porque é o Estado como um todo que possui
personalidade jurídica de Direito Internacional, não podendo alegar óbice de direito
interno para se eximir de sua responsabilidade.
3
Artigo 28. Cláusula federal
1. Quando se tratar de um Estado Parte constituído como Estado federal, o governo nacional do aludido
Estado Parte cumprirá todas as disposições da presente Convenção, relacionadas com as matérias sobre
as quais exerce competência legislativa e judicial.
2. No tocante às disposições relativas às matérias que correspondem à competência das entidades
componentes da federação, o governo nacional deve tomar imediatamente as medidas pertinente, em
conformidade com sua constituição e suas leis, a fim de que as autoridades competentes das referidas
entidades possam adotar as disposições cabíveis para o cumprimento desta Convenção.
3. Quando dois ou mais Estados Partes decidirem constituir entre eles uma federação ou outro tipo de
associação, diligenciarão no sentido de que o pacto comunitário respectivo contenha as disposições
necessárias para que continuem sendo efetivas no novo Estado assim organizado as normas da presente
Convenção.
78
53. Discorra sobre a proteção do idoso no sistema global e regional de proteção aos
direitos humanos.
Em que pese a relevância da tutela humanitária destinada aos idosos, o foco da proteção
jurídica a esse grupo de pessoas não se faz totalmente presente no sistema global
(onusiano) de direitos humanos. De fato, não há no plano global de proteção
instrumentos jurídicos de hard law que padronizem os direitos dos idosos, o que leva a
crer que os direitos humanos dessa categoria de pessoas não têm tido o destaque
merecido no atual direito internacional público. Apenas no contexto regional
interamericano existe normativa substancial sobre o tema.
No âmbito da ONU, o documento de destaque sobre essa temática são os Princípios das
Nações Unidas para as Pessoas Idosas, por se tratar de norma de soft law, não comporta
valor cogente para os Estados. Divididos em quatro eixos, tais Princípios reconhecem
núcleos de proteção relativos à independência, à participação, à assistência e à
realização pessoal. Apesar de não se tratar de norma de hard law, tais Princípios são
vetores capazes de conduzir as atividades dos Estados no que tange à implementação e
proteção dos direitos dos idosos.
Ainda na esfera da ONU, merece destaque a adoção da Carta de San José sobre os
Direitos dos Idosos de América Latina e Caribe, proclamada em San José (Costa Rica) em
2012.
80
O documento, que também possui natureza jurídica de soft law, reconheceu que, no
âmbito da América Latina e Caribe, a idade continua a ser motivo explícito e simbólico
de discriminação que afeta o exercício de todos os direitos humanos na velhice, e que
as pessoas idosas necessitam de especial atenção do Estado.
No que tange aos instrumentos de hard law componentes do sistema das Nações
Unidas, não se encontra qualquer proteção contundente dos direitos dos idosos. De
fato, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais traz apenas uma
proteção implícita dos direitos dessa categoria de pessoas ao consagrar o direito de toda
pessoa à previdência social, inclusive ao seguro social.
Ao contrário do sistema global, no âmbito regional interamericano, tendo
especialmente em conta o desenvolvimento progressivo dos direitos econômicos,
sociais e culturais, bem assim a urgência de efetivação desses direitos – foi colocada em
destaque a proteção dos direitos dos idosos, de forma inicial no Protocolo de San
Salvador.
Para fortalecer a proteção aos direitos humanos dos idosos no continente americano,
foi editado em 2015 um documento internacional específico para a proteção desses
direitos, qual seja, a Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos
dos Idosos, aprovada em 2015, o primeiro tratado no mundo destinado de forma
completa e sistemática às pessoas idosas.
O objetivo da Convenção é exigir dos Estados que promovam e protejam os direitos
humanos das pessoas idosas, assegurando idênticos direitos aos das demais pessoas,
inclusive o de não ser submetido à discriminação baseada na idade nem a qualquer tipo
de violência, bem assim que sejam consagrados meios específicos de proteção
decorrentes da condição própria de idoso.48 Os Estados, ademais, têm que adotar as
medidas legislativas necessárias à efetiva aplicação da Convenção.
Vale ressaltar que o governo nacional apenas assinou tal documento, sem ainda ter
concluído o seu processo de internalização no ordenamento jurídico nacional.
54. Discorra sobre saúde mental em direitos humanos efetivação dos direitos sociais.
Cabe ao Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a
promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida
participação da sociedade e da família.
O debate acerca da saúde mental no Brasil do período pós-Constituição de 1988, relativo
aos direitos fundamentais das pessoas com deficiência, sobretudo os deficientes
psíquicos, intentava uma série de reformas drásticas das práticas e da assistência em
saúde mental. Para tanto, foi editada a Lei nº 10.216/2001, que zela pelos direitos e
atendimento das pessoas com transtornos mentais. Esse atendimento deve ser
prestado em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou
unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.
Com a promulgação dessa lei passou a se reconhecer uma nova categoria de sujeitos na
perspectiva do direito e das políticas públicas, pois os pacientes psiquiátricos passaram
a ser reconhecidos como sujeitos de direitos. A ideia da Lei Antimanicomial era
fortalecer a identidade e autonomia individual dos pacientes psiquiátricos no Brasil para
81
que defende que a concepção de direitos humanos adotada na DUDH seria ocidental e
desconsideraria as diferentes culturas existentes no mundo. Para superar esse embate,
surgiram algumas propostas filosóficas como a hermenêutica diatópica e o
universalismo de chegada ou de confluência.
Unidade, Indivisibilidade e Interdependência → Todos os direitos humanos possuem a
mesma hierarquia e a dignidade humana somente é respeitada quando todos os direitos
humanos são protegidos.
Indisponibilidade ou Irrenunciabilidade → O titular não pode dispor do núcleo essencial
ou mínimo dos seus direitos humanos.
Inalienabilidade → Os direitos humanos não são objetos de comércio.
Limitabilidade ou Relatividade → A maioria dos direitos humanos podem ser
relativizados, como a liberdade de expressão, a liberdade de locomoção, os direitos
políticos etc. Contudo, há alguns direitos que são previstos como absolutos, como o
direito de não ser, sob qualquer justificativa, submetido à tortura, que está previsto na
Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou
Degradantes.
Abertura ou Não Tipicidade ou Inexauribilidade → Há sempre a possibilidade de
surgirem novos direitos humanos, não havendo, portanto, um catálogo taxativo. Nesse
sentido, prevê a Convenção Americana de Direitos Humanos que “Nenhuma disposição
desta Convenção pode ser interpretada no sentido de excluir outros direitos e garantias
que são inerentes ao ser humano ou que decorrem de forma democrática
representativa de governo”.
Historicidade → Os direitos humanos resultam de um processo histórico em que,
gradativamente, por meio de lutas, foram sendo conquistados. Esse princípio colide com
a Teoria Jusnaturalista de fundamentação dos direitos humanos.
Imprescritibilidade → A pretensão de respeito aos direitos humanos é imprescritível,
mas a pretensão de reparação econômica do dano pode não ser.
Vedação ao retrocesso → Os direitos humanos não admitem o regresso, no sentido da
diminuição do seu catálogo ou dos meios de proteção.
não é adotada pelo direito internacional a chamada “Cláusula Federal”, que pode ser
definida como o descumprimento de um tratado ou obrigação internacional por meio
da alegação de “ausência de competência federal”. (OBS: Ver Art. 28, CADH)
Ademais, verifica-se que foi adotada a Paradiplomacia no âmbito da solução amistosa
mencionada, com a participação de um ente alheio ao Ministério das Relações
Exteriores em negociações internacionais. No caso, o Estado do Maranhão foi
autorizado pelo governo brasileiro a negociar com a CIDH.
2. Caso Complexo Penitenciário de Pedrinhas – Em virtude de uma série de
assassinatos, violências e torturas contra detentos, foi determinada pela Corte
Interamericana de Direitos Humanos uma medida provisória contra o Estado brasileiro,
determinando que fossem garantidas a vida e a integridade dos presos, dos funcionários
e dos visitantes da Penitenciária de Pedrinhas.
OBS: Este material foi produzido por alguns candidatos à prova Oral da Defensoria
Pública do Maranhão, com base nas últimas perguntas feitas pela banca FCC em
concursos de Defensoria Pública, cujas respostas foram formuladas com base nas
próprias anotações e estudos, e eventuais jurisprudências retiradas do site Dizer o
Direito. Nosso objetivo não é suprir a matéria, mas auxiliar no estudo para a prova
oral.