Arte No Brasil - Da Colônia Aos Dias Atuais

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Professora autora/conteudista

CRISTINA FONSECA SILVA RENNÓ


É vedada, terminantemente, a cópia do material didático sob qualquer
forma, o seu fornecimento para fotocópia ou gravação, para alunos
ou terceiros, bem como o seu fornecimento para divulgação em
locais públicos, telessalas ou qualquer outra forma de divulgação
pública, sob pena de responsabilização civil e criminal.
SUMÁRIO
1 - Arte rupestre e pré-colonial brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

1. Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

2. Arte rupestre e pré-colonial brasileira (um relato histórico do tempo e da cultura do


homem primitivo) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.1. Cerâmicas plumagens e pinturas corporais: o misterioso mundo pré-cabralino 14
2.1.1. Os muiraquitãs e a literatura modernista brasileira . . . . . . . . . . . . . .15
2.2. Os vasos antropomorfos e zoomorfos marajoaras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.3. Arte plumária e pinturas corporais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2.3.1. Arte plumária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

3. Manifestações de arte rupestre no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

2 - Literatura informativa, quinhentismo brasileiro, a arte brasileira no período colonial,


neoclassicismo, romantismo e realismo na arte brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

4. A literatura informativa e o quinhentismo brasileiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

5. A arte brasileira no período colonial: influência do barroco e do rococó . . . . . . . . 30


5.1. Barroco e rococó . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
5.2. O barroco baiano e o barroco mineiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
5.3. O Brasil dos viajantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

6. Neoclassicismo, romantismo e realismo na arte brasileira (o engajamento político


da arte no Brasil) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
6.1. O fotógrafo e os negros de ganho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39

3 - Pré-modernismo e do modernismo à modernidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

7. Do pré-modernismo ao modernismo. A charge, a fotografia e o cinema como novos


conceitos de arte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
7.1. Manifesto da poesia pau-brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46

8. O modernismo brasileiro e a redescoberta artística do Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . 49


8.1. A Semana de Arte Moderna de 1922 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
8.2. A semana de 1922 e o manifesto de poesia pau-brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
8.3. E depois de um manifesto, outro... Manifesto antropófago . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
8.3.1. Revista de Antropofagia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
8.3.2. Revista Antropofágica – segunda dentição (separação dos Andrades) . 58

9. Do modernismo à modernidade (as vanguardas nas artes plásticas da segunda metade


do século XX no país) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60
4 - Os pioneiros da arte moderna no Brasil e a revolução de 1930 e a redefinição da
brasilidade na arte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64

10. Os pioneiros da arte moderna no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64


10.1. Anita Malfatti (1889-1964) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
10.2. Tarsila do Amaral (1886-1973) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65
10.3. Lasar Segall (1891-1957) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
Di Cavalcanti (1897-1976) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
Flávio de Carvalho (1899-1973) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70

11. A revolução de 1930 e a redefinição da brasilidade na arte: vanguardas artísticas,


formalismo e novas linguagens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
11.1. Concretismo e neoconcretismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72

Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77

Glossário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78

Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
1 - ARTE RUPESTRE E PRÉ-COLONIAL BRASILEIRA

1. INTRODUÇÃO
“Uma obra de arte é um objeto exterior; obedece portanto as leis a que estão
subordinados os objetos exteriores, no que objetos exteriores. O artista não exprime
as suas emoções. O seu mister não é esse. Exprime, das suas emoções, aquelas que
são comuns aos outros homens. Falando paradoxalmente, exprime aquelas suas
emoções que são dos outros. Com as emoções que lhe são próprias, a humanidade
não tem nada.” (Fernando Pessoa, em O pensamento estético de Fernando Pessoa)

Pensar em arte é pensar em estética e estética nada mais é do que a filosofia das artes. A
história da arte no Brasil e no mundo é o retrato dos caminhos da inteligência humana desde a
sua pré-história até a conquista do espaço sideral: podemos traçar um roteiro que vai do índio
para a máquina, numa indagação constante sobre a vida, o universo, as razões e falta de razão
das sociedades tal qual se constituem e do que foi feito dos homens e suas crenças nesse longo
e muitas vezes desconexo encontro consigo mesmo no desenvolvimento das civilizações.

Para melhor compreendermos essa trajetória humana, feita de muitas noites de dúvidas, paixões,
alegrias e medo, começaremos assistindo aos primeiros sete minutos de 2001 - Uma Odisseia
no Espaço (“A space odyssey”), apresentado no JurassiCast (acessar https://www.youtube.com/
watch?v=df4ZSZ8dvUc). O filme de Stanley Kubrick, lançado no Brasil em 1968, é considerado pela
Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos uma das maiores realizações culturais, históricas e
estéticas já produzidas pela sétima arte.

Influenciado pelas teorias do filósofo alemão do final do século XIX Friedrich Nietzsche, em
seu livro “Assim falou Zaratustra”, e ao som épico de Also sprach Zarathustra, belíssimo poema
sinfônico de Richard Strauss, o diretor americano construiu sequências lapidares sobre a evolução
filosófica do homem: suas conquistas culturais e científicas da aurora do mundo ao ultratecnológico
e admirável mundo novo do século XXI.

Todo esse longo percurso do conhecimento será o tema central deste nosso estudo sobre
história da arte.

Mas voltemos ao filme 2001 - Uma Odisseia no Espaço, ou melhor, a esse pequeno trecho inicial
que nos interessa:

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FIGURA 1 – Cena do filme 2001 - Uma Odisseia no Espaço

Fonte: https://fogsmoviereviews.files.wordpress.com/2011/09/20110925-114605.jpg

“2001” começa na Era Paleolítica. Ali, dois grupos de macacos ainda sem cultura e sem linguagem
entre si, por isso sem nenhuma troca de sinais muito claros ou de relacionamento, caminham a esmo,
relacionando-se apenas pela feroz disputa por uma poça d’água. Grunhem para o ar e se trombam
de quando em quando arreganhando os dentes uns para os outros em fúria ameaçadora. São
atacados por animais selvagens dos quais mal podem se defender, quando ocorre o imprevisto: no
meio daquele ermo um dos grupos encontra um estranho monólito negro, que os macacos observam
sem compreender do que se trata, pois é alheio ao ambiente natural a que estão acostumados.

FIGURA 2 – Cena com o monólito negro

Fonte: https://sjmj91.files.wordpress.com/2013/02/2001space037.jpg

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Depois do monólito, que tantas coisas pode significar, mas claramente se associa a uma espécie
de pedra do conhecimento, um macaco mais esperto descobre uma ossada de boi. Em posse do
osso mais pesado e instigado pela curiosidade, começa a martelar o resto do esqueleto à sua frente.
Descobre que, quanto mais bate nos ossos, mais eles se esmigalham. Reconhece que está com
um objeto poderoso nas mãos, uma espécie de arma e ferramenta que irá defendê-lo dos animais
perigosos, permitirá uma caça mais tranquila e principalmente o domínio dos outros macacos da
região.

FIGURA 3 – Cena batendo em uma ossada

Fontes: https://sjmj91.files.wordpress.com/2013/02/2001space043.jpg e http://cdn.


business2community.com/wp-content/uploads/2015/06/monkey2.jpg

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Numa das sequências mais marcantes do filme, o macaco descobre, num lampejo de consciência
claramente associado a tal pedra monolítica, o poder da ferramenta representado por esse osso.

A cada martelada que o macaco imprime na ossada, um grande animal tomba morto, por
associação. Em seguida, o macaco ameaça sua comunidade com o objeto. Esmaga o inimigo
abatido martelando seu corpo inerte por diversas vezes, anunciando sua autoridade e liderança
através da violência.

FIGURA 4 – Cena do macaco ameaçando sua comunidade com o osso

Fonte: http://homoliteratus.com/especial-sci-fi-as-adaptacoes-cinematograficas-
de-2001-uma-odisseia-no-espaco-e-o-planeta-dos-macacos/

A descoberta da ferramenta propicia a primeira comunidade dos homens. Através dessa


descoberta e do desenvolvimento ainda muito primitivo da inteligência, dá-se a imposição do poder
através da violência.

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FIGURA 5 – Cena do osso jogado para cima

Fonte: http://www.eb-mm.net/img/projects/4-million-year-2001-2.jpg

O macaco, feliz com seu conhecimento, urra glorioso para o ar empunhando seu objeto de poder,
e num ímpeto de força e alegria joga o osso para o alto, que em câmera lenta logo se transforma
numa espaçonave flutuando no espaço sideral, num dos maiores cortes do tempo/espaço da
história do cinema.

FIGURA 6 – Osso jogado para o alto e uma espaçonave no espaço

Fonte: http://www.muenster.org/filmwerkstatt/filmfestival/15/english/match-cut.jpg

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Do artesanal ao tecnológico, dois mil e um anos de inteligência e invenções se passaram. O
homem era dono do planeta! Mas, para Kubrick e muitos outros nomes da história da arte, perdia
sua alma! Será esse o grande impasse do século XXI?

FIGURA 7 – Cena do espaço

Fonte:  3Dsculptor / Shutterstock

ID: 514003537

Stanley Kubrick tem uma visão pessimista do futuro e do homem tecnizado. Sua nave flutuando no
espaço resume com brilhantismo cínico a história da humanidade, ou melhor, a história da inteligência
humana, que igualmente na história da arte começa com o mundo pré-histórico e caminha para as
artes tecnológicas das mídias de nosso tempo. Por isso seu filme tanto nos interessa.

Assim como em muitos momentos da arte, seu filme lida exemplarmente com os elementos
temáticos da evolução humana (tecnologia, inteligência artificial e vida extraterrestre) sem nenhum
encantamento. Os robôs construídos para auxiliar o ser humano no espaço sideral se tornam
supercérebros autônomos que por um processo viral tentarão dominar o próprio homem. A luta
insólita travada no filme será do personagem principal, nosso herói, contra um inimigo poderoso
que ele mesmo criou: as máquinas. Essa, enfim, é uma história que permeia obras literárias – como

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Frankenstein, da escritora inglesa Mary Shelley – e de tantos artistas, pintores, músicos e escritores
ao longo dos séculos XIX, XX e do XXI.

O início icônico deste grande trabalho de Kubrick resume toda a busca e investigação dos
homens através do espaço-tempo e, por que não dizer, da própria arte. Em seu desenvolvimento,
a arte sempre caminhou ao lado da história da inteligência do homem e ao lado, ainda, da história
social, política e cultural da humanidade, revendo-a.

Nesta apostila, que trata especificamente de história da arte brasileira, assim como em 2001 -
Uma Odisseia no Espaço, faremos recortes que irão do mundo primitivo da literatura e da arte às artes
tecnológicas da atualidade. Analisaremos alguns dos importantes movimentos artísticos do país,
fazendo associações, se necessário, aos movimentos europeus. Nessas escolhas, obedeceremos
ao tempo da arte, que nunca é cronológico e ou quantitativo, mas qualitativo. Por isso mesmo, uma
escultura feita no barroco pode emocionar um homem do século XXI.

Sobre as artes tecnológicas, veremos, por exemplo, que, igual a Stanley Kubrick em seu filme,
quase todas são de alguma forma criticadas. O homem moderno vive intermediado pelas máquinas,
mas sempre teve uma postura de encantamento e ao mesmo tempo de desconfiança em relação
a elas. Os futuristas, por exemplo, aplaudiram a guerra, as armas, o carro e a velocidade. Mais
adiante, os dadaístas negaram completamente o mundo pós-guerra e o avanço tecnológico sobre
a civilização.

Na atualidade, há quem pense que a arte está morta e que só existe cultura de massa. Por quê?
Podemos considerar que, hoje, em pleno século XXI, todos os passos humanos são intermediados
pelas máquinas, que nos facilitaram a vida ao mesmo tempo em que vivemos grandes impasses
vindos de todos os lados do universo tecnológico: redes sociais, internet e informática tomam
conta do dia a dia e também da vida cultural do homem moderno, dopando e, sem dúvida alguma,
também ajudando. Com relação a isso, ainda nos dividimos entre apocalípticos (os que odeiam tais
veículos) e integrados (aqueles que amam tudo isso). Os pessimistas veem com horror o universo
em plena transformação científica, mas hoje mesmo os mais otimistas têm se contido em seus
elogios sobre as consequências dos avanços científico-tecnológicos: o planeta está em crise e os
recursos naturais estão se esgotando.

A cultura de massa vem sendo posta em xeque. A televisão, por exemplo, já não é mais uma
TELE-VISÃO do mundo: seus índices de audiência em declínio são reveladores. Os alemães de Berlim,

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por exemplo, ainda hoje preferem o rádio a outros meios de comunicação, enquanto os brasileiros
vêm preferindo as redes sociais...

Enfim, o convulsionado mundo em que vivemos e sua relação com as produções da arte ao
longo da história serão os elementos de nosso estudo, sem nos esquecermos de que não se pode
falar em arte sem falar em literatura, parte fundamental de todo universo estético que se preza.
O poeta Fernando Pessoa, lúcido pensador sobre arte e estética, já dizia: “A arte, e não a história,
que é a mestra da vida”. Para ele, “Só a arte é útil. Crenças, exércitos, impérios, atitudes, tudo isso
passa. Só a arte fica, por isso só a arte vê-se, porque dura” (PESSOA, 1986, p. 82).

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2. ARTE RUPESTRE E PRÉ-COLONIAL BRASILEIRA (UM RELATO
HISTÓRICO DO TEMPO E DA CULTURA DO HOMEM PRIMITIVO)
Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena! Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O Português
(“Erro de Português”, de Oswald de Andrade)

As primeiras produções artísticas brasileiras são anteriores ao descobrimento do Brasil. Trata-


se de uma arte pré-jesuítica e pré-colonial composta pelas manifestações culturais indígenas
existentes no país e que faziam parte da cultura local. Ao lado dela encontram-se ainda alguns
achados surpreendentes de uma arte rupestre, que data de nossa pré-história. Mas antes de
falarmos da arte rupestre brasileira, vamos lembrar das expressões artísticas dos gentis encontradas
pelos portugueses.

Devemos lembrar que, antes da ocupação europeia no Brasil, por séculos diversas tribos
indígenas já aqui habitavam próximas aos leitos de rios, matas e trechos do litoral. Eram tribos
seminômades que viviam da terra, deslocando-se para novas paragens em busca de comida,
abrigo e maior segurança quando necessário. Não tinham contato com outras civilizações, senão
de quando em quando com as diversas tribos que por aqui habitavam. Eram povos indígenas de
diferentes etnias que tinham suas próprias culturas, religião, costumes, culinária e formas de arte
muitas vezes sofisticadas, pois eram compostas de música, dança e artesanato em barro, plumas,
pedras, cascos de árvore e sementes. Não tinham o conceito de “bens pessoais” e, como estavam
sempre em locomoção, também não conseguiam armazenar ou preservar esta arte.

Por isso mesmo, qualquer tipo de arte formal foi estabelecida só por volta de 1500 em contato
com os conquistadores portugueses. Com a influência europeia maciça do período do descobrimento,
a arte indígena passou a carregar muitas semelhanças com essas forças políticas e sociais
dominantes. Devemos lembrar que, mesmo com poucos registros das primeiras manifestações
de arte indígena anteriores ao século XVI, muitas dessas tradições se mantiveram – naturalmente,
com algumas modificações – ao longo da história do país até nossos dias, nas tribos existentes.
A arte indígena é composta tanto pela pintura corporal, rica em formas e cores, quanto por vasos,
panelas de barro, cestos, ornamentos de penas coloridas e outros objetos do dia a dia.

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FIGURA 8 – Índios kiriris do sertão baiano carregando artefatos produzidos em sua aldeia

Fonte: acervo da autora.

2.1. Cerâmicas plumagens e pinturas corporais: o misterioso mundo pré-cabralino


Os vestígios de culturas indígenas amazônicas se encontram primeiramente em artefatos de
cerâmica que datam de 5000 A.C. e 1100, encontrados na Ilha de Marajó e Santarém (próximo à foz
do rio Tapajós), numa região cercada de mistérios que resistem ao tempo. Trata-se de uma cultura
pré-cabralina de povos indígenas que desapareceram da ilha. Nada se sabe sobre eles, mas a rica
arte cerâmica dessa cultura encontrada por arqueólogos é exemplo de uma manifestação artística
muito importante, reveladora de uma civilização avançada que aconteceu naquele mundo selvagem
e que até hoje não foi completamente compreendida pelos seus pesquisadores.

Pela elegância, sofisticação e detalhes simbólicos dessas peças pode-se constatar o


desenvolvimento cultural das tribos que ali viviam. A arte marajoara e tapajônica constitui-se
basicamente por vasos antropomorfos e zoomorfos de sofisticada fabricação, com suportes e
apliques ornamentais. Além deles, encontram-se estatuetas de terracota com representações
femininas e de animais. Os objetos de pedra são os famosos amuletos chamados “muiraquitãs”,
espécie de pingentes representando tartarugas, peixes, rãs ou outros batráquios.

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FIGURA 9 – Exemplos de muiraquitãs

Fontes: https://1.bp.blogspot.com/-5zOlISWUs5E/VuBsDbIonHI/AAAAAAAAAEA/Lo0FmUPXwNA/s1600/
amazonas%2Bindias3.jpg, https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/originals/63/0f/b0/630fb0e254cd820774646d1ea6f
5298c.jpg e https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/originals/26/c4/3c/26c43ce5b1e65e6aa9f1608a3484d4ef.jpg

2.1.1. Os muiraquitãs e a literatura modernista brasileira

Os arqueólogos e historiadores supõem que essas pedras pingentes em forma de animais


denominadas muiraquitãs eram uma espécie de talismãs com poderes mágicos. Fato é que séculos
depois eles seriam imortalizados numa das obras máximas do modernismo de primeira geração
– o livro “Macunaíma”, escrito por Mário de Andrade em 1928. Neste livro, o personagem principal
Macunaíma, “um herói sem nenhum caráter”, é um índio do Amazonas que sai de sua região natal
para São Paulo atrás de seu muiraquitã, amuleto que ganhou de sua única amada Ci (a Mãe do
Mato), que, ao morrer, tinha virado estrela. A pedra preciosa estava no poder do gigante comedor
de gente, Venceslau Pietro Pietra – representante máximo do capitalismo urbano.

FIGURA 10 – Capa da 1ª edição de “Macunaíma” de Mário de Andrade, de 1928.

Fonte: https://sebodomessias.com.br/imagens/produtos/5/56996_204.jpg

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A famosa muiraquitã do herói Macunaíma havia sido levada pelo mascate peruano, Venceslau
Pietro Pietra, que era na verdade o gigante Piamã que morava em São Paulo. Depois da descoberta
do destino de sua pedra, Macunaíma e seus irmãos resolvem ir atrás dela para recuperá-la, numa
das maiores sagas feita por bricolagens da história da literatura brasileira. Este livro será visto mais
adiante, na apostila, ao falarmos do modernismo. Mas vale aqui lembrar, a partir desta informação,
como na história da arte o tempo não é linear. Pode-se utilizar peças, referências, trechos literários
inspiradores, descobertas até de mundos extintos em obras que surgem dois mil anos depois – o
caso das referências ao muiraquitã feita pelo escritor, musicólogo e folclorista Mário de Andrade
tantos séculos depois do fenômeno Marajoara e em outro momento histórico do país.

Como disse no início da apostila, a arte caminha de forma singular, muitas vezes em saltos e
retomadas, pois o tempo da arte é outro. Não segue o tempo linear dos fatos, mas o tempo qualitativo
dos acontecimentos artísticos, históricos, políticos. Algo que tinha valor na nossa pré-história da
arte será retomado séculos depois em outros movimentos históricos de arte. Isso acontece porque
todo artista verdadeiro terá que lidar com o tempo cultural, que é uma especificação qualitativa
do tempo histórico: não caminha em linha reta, mas em uma espécie de linha vertiginosa onde
certos movimentos estéticos podem a todo momento ser negados ou recuperados, pois a arte é um
processo em permanente mutação. Ela era uma coisa para os misteriosos marajoaras pré-cabralinos,
outra para os arquitetos egípcios, outra para os calígrafos chineses etc., mas sempre poderemos
encontrar alusões, verdadeiros diálogos de fatos vindos de culturas mortas citados no universo
mais tecnológico possível, como as redes sociais ou mesmo a televisão. Assim como o cubista
Picasso foi beber de fontes da cultura negra para suas máscaras e construções geometrizadas,
pode-se ver Picasso onde ele menos poderia estar: numa abertura de novela de televisão.

Voltemos ao momento histórico pré-cabralino de arte. Ao lado dos muiraquitãs, as cerâmicas


eram importantíssimas. Os vasos e objetos antropomorfos e zoomorfos encontrados valem
nossa atenção.

2.2. Os vasos antropomorfos e zoomorfos marajoaras


As tribos ceramistas pré-cabralinas deixaram ricos artesanatos de vasos, urnas funerárias, bacias
e outros utensílios, como chocalhos, machados, potes, estatuetas, bonecas para crianças, apitos,
cachimbos e até curiosas tangas de cerâmica feitas para as mulheres. As famosas e belíssimas
peças marajoaras tinham como característica principal o fato de serem objetos antropomorfos, ou
seja, com características humanas (representações do homem ou parte dele), ou ainda zoomorfos

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ou zoomórficos. Serpentes, lagartos, jacarés, tartarugas e mesmo escorpiões são os animais
constantes, recriados com técnicas variadas e com formas de espiral, triângulo, retângulo, ondas
e círculos concêntricos.

Para dar firmeza e durabilidade aos objetos, os marajoaras misturavam no barro substâncias
minerais ou vegetais como cinzas de cascas de árvores e de ossos, pó de pedra e de conchas,
além de uma esponja siliconada que retiravam da raiz de algumas árvores, os chamados cauixi.
Acredita-se que os marajoaras viveram entre 500 e 1300 e que foram os mais sofisticados artesãos
em cerâmica desse período. Porém, foi uma civilização que desapareceu completamente bem
antes da chegada dos colonizadores europeus. Seus trabalhos descobertos por arqueólogos já no
século XX são tão belos e impressionantes que, ao virem à tona (revelados para a modernidade),
chamaram tanta atenção que hoje se pode ver todo um extenso comércio de peças que imitam
essas produções. Outra curiosidade é que ainda hoje podemos ver peças confeccionadas por
caboclos ou mesmo pelos atuais indígenas de diferentes etnias com influências desse estilo de
criação: bancos de madeira em forma de jacarés, por exemplo, tão comuns em lojinhas do litoral e
interior brasileiro remetem diretamente a esses trabalhos.

A civilização marajoara não deixou obras arquitetônicas, como seus parentes incas ou maias
e, diferentemente deles, também não sobraram restos de suas cidadelas. Porém, compensou essa
falta com seu artesanato de expressão artística surpreendente. Suas cerâmicas foram capazes
de possibilitar a reconstrução de sua história: não deixam dúvidas sobre sua riqueza cultural e
possibilitaram uma mudança de paradigmas sobre o que foram as civilizações ameríndias nos
seus primórdios, principalmente no Brasil.

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FIGURA 11 – Exemplos de artesanatos marajoaras pré-cabralinas

Fonte: https://encrypted-tbn2.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSWq9FSYwic4tzWCx9wbTxGyP2rxWVhk2Bb4YxZ
EETANWO0Ti1k; http://fazendoartedmc.blogspot.com.br/2015/04/arte-marajoara-uma-riqueza-basileira.html

Além da cerâmica tapajônica e marajoara, outras peças importantes de nossos ancestrais


nativos são de tradição mina, encontradas na costa maranhense (datam de 3.200 a.C.). As peças de
tradição periperi encontradas pelos arqueólogos no litoral baiano são também muito importantes,
mas, por serem um pouco mais recentes, datadas por volta de 880 a.C., difundiram-se ao longo do
período jesuítico. Ainda que mais simples do que as cerâmicas do Amazonas, são peças de grande
diversidade decorativa que se sobressaem pelas técnicas de pintura e escovamento utilizadas.

FIGURA 12 – Cerâmicas do Amazonas

Fonte: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/736x/52/72/a3/5272a3e5ad5ce89ba5931e667dbdff8c--rio-grande-do-sul.jpg

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2.3. Arte plumária e pinturas corporais
A arte ameríndia que chamou atenção dos primeiros colonizadores brasileiros foi a arte plumária
e de pintura corporal. Adornos peitorais, labiais e auriculares feitos de penas de aves ou de pigmentos
vegetais atingiam grande complexidade de desenhos, cores e diversidade de matéria-prima utilizada.
Sobrevivem até hoje em praticamente todas as culturas indígenas do território brasileiro.

FIGURA 13 – Cacique kaimbé e seu filho (Aldeia de Massacará, BA)

Fonte: acervo da autora

A tradição plumária e de objetos e adornos corporais é tão forte em nossa cultura indígena
que se mantém mesmo entre as tribos brasileiras mais aculturadas (como a dos índios kaimbés
do sertão da Bahia, já quase caboclos), ainda que de forma empobrecida e muitas vezes singela.
Seus cocares já não são de plumas, mas de palha da região. No entanto, os colares de sementes e
dentes de animais podem ser muito sofisticados.

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2.3.1. Arte plumária
FIGURA 14 – Retrato de indígena no período colonial

Fonte: http://d3nv1jy4u7zmsc.cloudfront.net/wp-content/uploads/2014/11/4.98.jpg.

Os portugueses do descobrimento não tinham nenhum conhecimento dessa arte indígena,


que não era praticada pelos povos europeus com quem se relacionavam. A arte plumária típica
consiste na utilização de objetos confeccionados com penas e plumas de pássaros, emplumados
para diferentes fins, e na fixação de penas diretamente sobre o corpo humano como ornamento
corpóreo, quer seja de uso cotidiano ou em solenidades e rituais da tribo. Trata-se de uma expressão
tipicamente indígena brasileira que perdurou e tornou-se uma das características mais marcantes
de nossas tribos, como podemos ver nas diversas etnias do Xingu e região.

FIGURA 15 – Guerreiro enawenê-nawê e menina da tribo Kyikatêjê

Fonte: http://s2.glbimg.com/bohOl07XTPBBU_uoeJ-zs71IIMM=/e.glbimg.com/og/ed/f/
original/2016/04/18/indios_site.jpg e http://globorural.globo.com/edic/290/indios_07.jpg.

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FIGURA 16 – Índio da tribo Kyikatêjê com rosto pintado e brincos de penacho.

Fonte: http://farm4.static.flickr.com/3157/2430669147_0e43699d89.jpg.

Por todo o século XVI, os diferentes objetos e assessórios plumários dos nativos chamavam
muita atenção dos primeiros europeus que por aqui chegavam. Criou-se o hábito entre eles, por
isso mesmo, de enviar exemplares de adornos indígenas às cortes portuguesas, tanto como troféus
dos brancos conquistadores quanto para presenteá-las com esses produtos muito atraentes dos
povos bárbaros.

Na época e até pouco tempo atrás esta fascinante forma de expressão não era considerada mais
do que um artesanato exótico. Mas hoje a produção plumária dos índios brasileiros é reconhecida como
uma verdadeira linguagem visual, um reflexo requintado de culturas ricas e complexas, transmissora
de mensagens específicas, merecedora do status de arte e fonte de estudos antropológicos e
sociológicos muito sérios. Porém, a despeito de sua recente consagração entre os estudiosos e o
grande público, esse rico acervo de tradições, significados e formas corre o risco de se desvirtuar
pela aculturação das tribos e a transformação de objetos simbólicos em produto comercial e turístico.
Há o risco de desaparecer, como aconteceu com inúmeras etnias que antigamente povoavam o
território brasileiro, perdendo-se com elas uma riqueza imensa em visões de mundo e experiências
vitais, coisas de que a arte plumária sempre foi veículo privilegiado.

Na verdade, todos esses objetos e decorações corporais são expressões religiosas, artísticas ou
cotidianas repletas de significados. Fazem parte de nosso patrimônio imaterial segundo classificações
antropológicas específicas, pois são signos que sempre indiciam aspectos profundos das tribos
brasileiras, além de servir para diferenciá-las entre si. Cada etnia, mesmo que seja de povos irmãos,

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é um universo muito rico de hábitos e costumes e religiosidade diversas. A arte plumária, além de
ser uma forma de expressão tribal coletiva, é também e ao mesmo tempo a expressão onde se
encontram aspectos individuais dos membros de uma tribo.

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3. MANIFESTAÇÕES DE ARTE RUPESTRE NO BRASIL
A arte rupestre brasileira é anterior aos nossos índios. São um achado na história da arte e
na própria história do Brasil. Se os portugueses que chegaram ao Brasil não encontraram as tais
pedras preciosas que tanto queriam, eles acharam, no entanto, um tesouro arqueológico muito
precioso, que já aqui se encontrava bem antes deles, mas que na época não deram valor. Pareciam
desenhos aparentemente incompreensíveis riscados nas pedras. Trata-se, no entanto, de gravuras
simbólicas gravadas nas pedras que datam aproximadamente entre 3.000 e 10.000 anos atrás.
Ao longo desse tempo, muitas dessas gravuras foram destruídas e outras continuam ameaçadas,
apesar da importância da preservação.

Essas gravuras são um patrimônio da humanidade, pois remetem não só à nossa pré-história,
mas também à pré-história do continente americano. São essas, na verdade, as primeiras produções
artísticas brasileiras. Escassas e valiosas, elas representam uma das formas raras de arte que
sobreviveram aos séculos: um achado que pode mudar as teorias sobre quando os primeiros
humanos chegaram às Américas. Essas descobertas são de valor inestimável. Elas apontam e
fazem-nos aprender sobre o mundo simbólico dos primeiros seres humanos que se instalaram no
Novo Mundo. São peças de extrema raridade, pois é muito difícil encontrarmos objetos ou desenhos
em rochas que denotem manifestações artísticas nas Américas.

FIGURA 17 – Imagens rupestres

[A] Nicho Policrômico - Toca do Boqueirão da Pedra Furada - Serra da Capivara - PI. [B] Imagens rupestres encontradas
no Parque Nacional da Serra da Capivara no Estado de Piauí, cavernas do Piauí. Fonte: acervo da autora.

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A maior concentração de arte rupestre do país e do mundo se encontra no Nordeste brasileiro,
especialmente no Rio Grande do Norte e Paraíba. A aridez da região, com seu clima seco, a vegetação
impenetrável e a dificuldade de ocupação em algumas áreas específicas contribuiu para a conservação
dessas pinturas. As figuras rupestres mais antigas do Brasil se encontram no estado do Piauí, no
Parque Nacional da Serra da Capivara, onde a arte remonta a milênios: cerca de 13.000 anos.

Foram encontradas algumas cerâmicas e pequenos amuletos de pedra no estado do Ceará.


Muita gente se confundiu pensando que eram artesanato rupestre, mas já se detectou que esses
objetos são mais recentes e provindos do povo marajoara, datados entre 800 e 1400 d.C.

As pinturas e gravuras encravadas nas rochas da região piauiense tratam de temas ligados ao
cotidiano, como caça, fertilidade, objetos domésticos ou de trabalho. Acredita-se que muitas cenas
tinham características mágico-religiosas, como uma preparação para o que ainda seria vivido, como
uma próxima caça que ocorreria.

Quanto às técnicas utilizadas nas pinturas rupestres deixadas pelos primeiros habitantes
ameríndios do Brasil, tudo indica que elas foram feitas com os dedos ou com a ajuda de utensílios.
As cores foram obtidas do carvão (preta), do óxido de ferro (vermelha e amarela) e, às vezes, retiradas
de cera de abelhas. Outro material empregado nas pinturas são de substâncias líquidas – água,
clara de ovo, sangue etc. São atribuídos sentidos variados para as diferentes técnicas e cores,
muitas vezes superpostas.

Existem três estilos predominantes na arte rupestre brasileira: os traços geométricos pertencem
à tradição Agreste, as figuras humanas são a marca da tradição Nordeste, já as gravuras na pedra
formam a tradição Itacotiara.

Os desenhos e gravuras rupestres foram encontrados pela primeira vez no país com a descoberta
de uma rocha carving com idade estimada de mais de 10.000 anos. Os arqueólogos brasileiros
encontraram o petroglyph em 2009 em Lapa do Santo, um sítio arqueológico na região central do
Brasil a cerca de 35 milhas a partir de Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais. Trata-se
de uma pedra de cerca de 12 polegadas de comprimento e descreve um homem com uma cabeça
em forma de C, três dedos em cada mão e um grande falo. Os petroglyph encontrados em Lapa
do Santo constituem o mais antigo material arqueológico encontrado no país: um testemunho
incontestável da arte rupestre nas Américas. Depois dos testes de carbono que detectam a vericidade
temporal dos objetos, foi detectado sem margem de erros que essa rocha com desenhos rupestres,
o petroglyph, tem mais de 10.500 anos e poderia mesmo ser tão velha quanto 12.000 anos. Os

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dados demonstram que a figura antropomórfica é o mais antigo petroglyph figurativo datado de
forma fiável já encontrado no Novo Mundo, o que indica que a variabilidade cultural durante o limite
pleistoceno/holoceno na América do Sul não se restringiu a ferramentas de pedra e de subsistência,
mas também abrangeu a dimensão simbólica.

Tipos semelhantes de rock-arte foram encontrados na mesma região, na Lapa do Ballet e Lapa
das Caieiras, e também em outras partes do nordeste brasileiro. Encontrar o petroglyph em Lapa
do Santo sugere que os seres humanos que lá viveram tinha feito grandes avanços culturais, bem
maiores do que se pensava. Demonstram ainda que, na América do Sul oriental, houve alguns
contatos culturais entre grupos muito distantes (cerca de 1.600 km), no início do Holoceno.

De acordo com teorias atuais, aceita-se que há 12.000 anos os primeiros seres humanos
atravessaram o estreito de Bering da Sibéria para o Alasca, após o que gradualmente migraram para
o sul. Acredita-se que pessoas vindas do oeste da América do Norte estavam no continente 11.500
anos atrás. O petroglyph Lapa do Santo fornece a evidência mais material sobre quanto tempo nós,
seres humanos, chegamos nas Américas.

Desde as primeiras descobertas e ao longo deste tempo muitas destas gravuras já foram
destruídas e outras continuam ameaçadas. Mas existe um esforço arqueológico enorme para
conservá-las, pois a arte rupestre é um relato histórico do tempo e dos primórdios legítimos da
cultura brasileira.

SAIBA MAIS

A Associação Brasileira de Arte Rupestre - ABAR foi criada em 1997 na cidade de Vila Real (Portugal)
pelos brasileiros que participavam do Congresso Internacional de Arte Rupestre (IFRAO) e que,
por seu representativo número de participantes, levou a arqueóloga portuguesa Mila Abreu, da
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, instituição que sediava na época o citado congresso,
a sugerir a criação de uma associação própria para estudo da arte rupestre, a exemplo do que
acontecia com outros países. Reunidos os pesquisadores brasileiros presentes, fundaram a ABAR e,
por unanimidade, nomearam como primeira presidente Niède Guidon. Acesse o site da ABAR:

http://abarup.org.br/abar/

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2 - LITERATURA INFORMATIVA, QUINHENTISMO BRASILEIRO, A
ARTE BRASILEIRA NO PERÍODO COLONIAL, NEOCLASSICISMO,
ROMANTISMO E REALISMO NA ARTE BRASILEIRA

4. A LITERATURA INFORMATIVA E O QUINHENTISMO BRASILEIRO


Oh que pão, oh que comida,
Oh que divino manjar
Se nos dá no santo altar
Cada dia.
Filho da Virgem Maria
Que Deus Padre cá mandou
E por nós na cruz passou
Crua morte.
(“Ao Santíssimo sacramento”, de Padre José de Anchieta)

A arte luso-brasileira começou com a chegada de Pedro Álvares Cabral em 1500. Com o
descobrimento do Brasil, surge o que se costuma chamar de literatura informativa, literatura dos
viajantes ou ainda literatura dos cronistas, que vai durar todo o século XVI. O continente europeu
nesse período vivia em pleno renascimento nas artes, impulsionado principalmente pelas Grandes
Navegações, e Portugal era um dos países mais importantes do mercantilismo expansionista.

A literatura informativa era descritiva. No Brasil, preocupava-se principalmente em informar à


Coroa portuguesa aspectos físicos, sociais e culturais da nova terra. Descrevia nossa flora, fauna,
riquezas, habitantes locais etc.

Dentro dessa nova concepção literária, começam a surgir nomes como os de Gabriel Soares de
Souza, que retrata, entre outras coisas, detalhes da Costa Brasileira, com seu Tratado descritivo do
Brasil (1587) e o aventureiro alemão Hans Staden, que vai escrever Duas viagens ao Brasil (1557),
sobre os hábitos antropofágicos dos índios tupinambás. Mas o texto mais valioso desse gênero
é a própria Carta de Pero Vaz de Caminha, escrivão da armada de Pedro Álvares Cabral, em 1500,
endereçada ao rei de Portugal. Sua famosa “Carta a El-Rei Dom Manuel Sobre o Descobrimento do
Brasil”, além de belíssima, por tratar com exuberância descritiva e muita imaginação cada um dos
aspectos relevantes da nova terra, tem valor literário e histórico fundamental.

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Vejamos um pedaço dessa famosa carta, tão referendada no modernismo de 1922, principalmente
pelo poeta Oswald de Andrade:

FIGURA 18 – Carta de Pero Vaz de Caminha

Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Carta-caminha.png

Transcrição:

“Ali veríeis galantes, pintados de preto e vermelho, e quartejados, assim pelos corpos
como pelas pernas, que, certo, assim pareciam bem. Também andavam entre eles
quatro ou cinco mulheres, novas, que assim nuas, não pareciam mal. Entre elas
andava uma, com uma coxa, do joelho até o quadril e a nádega, toda tingida daquela
tintura preta; e todo o resto da sua cor natural. Outra trazia ambos os joelhos com
as curvas assim tintas, e também os colos dos pés; e suas vergonhas tão nuas, e
com tanta inocência assim descobertas, que não havia nisso desvergonha nenhuma.
Todos andam rapados até por cima das orelhas; assim mesmo de sobrancelhas e
pestanas. Trazem todos as testas, de fonte a fonte, tintas de tintura preta, que parece
uma fita preta da largura de dois dedos. Mostraram-lhes um papagaio pardo que o
Capitão traz consigo; tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como se
os houvesse ali. Mostraram-lhes um carneiro; não fizeram caso dele. Mostraram-
lhes uma galinha; quase tiveram medo dela, e não lhe queriam pôr a mão. Depois
lhe pegaram, mas como espantados. Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido,
confeitos, fartéis, mel, figos passados. Não quiseram comer daquilo quase nada; e
se provavam alguma coisa, logo a lançavam fora. [...] Viu um deles umas contas de
rosário, brancas; fez sinal que lhas dessem, e folgou muito com elas, e lançou-as ao
pescoço; e depois tirou-as e meteu-as em volta do braço, e acenava para a terra e
novamente para as contas e para o colar do Capitão, como se dariam ouro por aquilo.”

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Ainda que curiosa e fundamental, a literatura informativa tem pouco valor estético. Na verdade,
os primeiros artistas brasileiros foram os jesuítas da Companhia de Jesus. Trata-se de um grupo de
missionários educadores que aqui aportaram com a missão de catequizar os índios para a coroa
portuguesa. O intuito destes, na verdade, era de transformar o país num grande centro católico.
Espalhando-se em diferentes estabelecimentos chamados “reduções”, ensinavam religião através
do teatro (com suas peças sacras), poesia, música, estatuário e pintura. Nesse processo, alguns
nomes se tornaram muito importantes: José de Anchieta foi o primeiro poeta e dramaturgo do
país, Agostinho de Jesus e Agostinho da Piedade produziram as primeiras esculturas conhecidas,
Belchior Paulo, João Felipe Bettendorff, Ricardo do Pilar e alguns outros fizeram os primeiros
quadros, enquanto Francisco de Vacas e Pedro da Fonseca desenvolveram suas partituras ao
ensinar músicas sacras para as crianças indígenas.

José de Anchieta, Fernão Cardim e Manuel da Nóbrega seriam os principais expoentes da


arte quinhentista brasileira. Suas criações tinham estilo próprio, por isso deixaram sua marca nas
realizações artísticas do século XVI. Essa tríade de educadores, ao tentar converter os índios ao
catolicismo, ultrapassaram as questões meramente informativas. Anchieta, o mais criativo de
todos, atingiu um alto poder estético com seus poemas, hinos, canções e autos. Em suas peças
são claras as influências dos autos do grande dramaturgo português Gil Vicente e manifestações
culturais da Idade Média. Seu teatro multilíngue, endereçado a um público heterogêneo formado
por soldados, indígenas, colonos, marujos e comerciante tinha como foco principal atingir os índios.
Por isso, em muitas de suas peças, frases inteiras eram escritas em tupi-guarani, dotando-as de
grande singularidade. Foi ele inclusive quem primeiro escreveu um dicionário tupi-guarani de valor
histórico inestimável.

Para agradar os indígenas e ao mesmo tempo instruí-los, Anchieta incorporou em suas peças de
espírito medieval a dança e a música ao lado das representações. Seus jogos dramáticos repletos
de dogmas católicos tinham por isso algo de profano. Seu dom artístico estendeu-se às suas
poesias, que não eram apenas de catequese, mas pessoais. Seus versos escritos em latim seguiam
a mesma linhagem medieval de seu teatro e eram em sua maioria endereçados à Nossa Senhora.
Sua criação “De beata virgine dei Matre Maria” (“Poema à virgem, 1563”) destaca-se como uma de
suas obras mais importantes.

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FIGURA 19 – Padre José de Anchieta, o maior poeta do chamado quinhentismo brasileiro

Fonte: acervo da autora.

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5. A ARTE BRASILEIRA NO PERÍODO COLONIAL: INFLUÊNCIA DO
BARROCO E DO ROCOCÓ
Triste Bahia!
ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi abundante.
A ti trocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando e, tem trocado,
Tanto negócio e tanto negociante.
(“Triste Bahia”, de Gregório de Matos)

O barroco brasileiro foi um dos movimentos mais instigantes da história da arte brasileira.
Iniciou-se no século XVI e estendeu sua influência até o início do século XIX. Num primeiro momento
– ainda em 1600 – dois nomes se firmariam como os primeiros poetas seculares do país: Basílio da
Gama e Gregório de Mattos. Ao lado deles, o orador Padre Antônio Vieira com seus sermões sacros
levaria essa escola ao apogeu. Nos séculos XVI e XVII, o barroco se deu principalmente na Bahia
e ao longo da costa de Pernambuco e algumas regiões do interior. Mas foi em Minas Gerais, onde
uma sociedade rica e culta se formava a partir da corrida do ouro, que ele atingiu seu nível mais
alto. Os maiores artistas do Barroco mineiro foram o pintor Manuel da Costa Ataíde e o escultor e
arquiteto Aleijadinho. Minas Gerais também abrigou uma escola proto-neoclássica da música e da
literatura: o chamado arcadismo brasileiro. Os compositores Lobo de Mesquita e Francisco Gomes
da Rocha e os poetas Tomás Antônio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa foram os principais
expoentes desse período.

5.1. Barroco e rococó


Ainda que o estilo rococó possa ser visto como uma variante do barroco, não é este um termo
preciso para chamar a versão peculiar que o estilo barroco desenvolveu em Minas Gerais do início do
século XVIII até o final do século XIX. Isto porque uma parte significativa das manifestações artísticas
desenvolvidas no Estado Mineiro do Ciclo do Ouro cabe melhor no estilo predominantemente rococó.
Se, por um lado, esse termo se aplica melhor na arquitetura da época, também teve expressões
importantes na escultura ou mesmo na pintura. Lembramos que barroco e rococó não podem ser
vistos como estilos sinônimos. O rococó é visto por muitos estudiosos como uma escola independente
que foi predominante em Minas Gerais por volta de 1760, especialmente na elaboração das fachadas
das edificações religiosas, ornamentação interior e a disposição quadrangular das igrejas.

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5.2. O barroco baiano e o barroco mineiro
FIGURA 20 – Frontispício de edição de 1775 dos poemas de Gregório de Matos

Fonte: http://1.bp.blogspot.com/-qWPZZkJ03M8/UNtH2RMLr4I/AAAAAAAAF6g/To4_qxlXQjA/s1600/Frontis
p%C3%ADcio+de+edi%C3%A7%C3%A3o+de+1775+dos+poemas+de+Greg%C3%B3rio+de+Matos.jpg

O poeta e advogado Gregório de Matos Guerra representou o ponto alto do barroco literário
brasileiro. Nasceu a 23 de dezembro de 1636 em Salvador, (então cidade da capitania da Bahia
no período colonial) e morreu em Recife, (então cidade da capitania de Pernambuco), em 26 de
novembro de 1696. Considerado um poeta maldito, enveredou pela poesia satírica, criticando não
só os deslizes da cidade baiana, mas também suas freiras e padres católicos. Ganhou, com isso, o
apelido de “Boca do Inferno”, ainda que a sátira não represente todo o conjunto de sua obra. Poeta
versátil e prolífero, enveredou com a mesma qualidade pela poesia sacra; poesia lírica e poesia
pornográfica.

O barroco mineiro, por sua vez, não teve um grande nome na literatura. Em compensação, deixou
um legado importantíssimo para a pintura, arquitetura, escultura e artes plásticas em geral graças
ao pintor e arquiteto mineiro Aleijadinho, considerado um dos grandes gênios da arte do país.

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FIGURA 21 – Aleijadinho

Fonte: http://histormundi.blogspot.com.br/2015/05/tiradentes-e-inconfidencia-dos-letrados.html.

Antônio Francisco Lisboa, mais conhecido como Aleijadinho, foi um importante escultor,
entalhador e arquiteto do Brasil colonial. Nasceu em Ouro Preto, Minas Gerais, em 29 de agosto de
1730 e faleceu na mesma cidade em 18 de novembro de 1814, pobre e desconhecido. A principal
fonte documental sobre o Aleijadinho é uma nota biográfica escrita cerca de quarenta anos depois
de sua morte. O escultor e arquiteto nunca saiu de Minas Gerais. Sua obra feita em talhas, projetos
arquitetônicos, relevos e estatuários foi realizada nas cidadezinhas mineiras de Ouro Preto, Sabará,
São João Del-Rei e Congonhas. Considerado um dos maiores artistas barrocos do Brasil, encantou a
sociedade do período – século XVIII – com seus trabalhos feitos com madeira e pedra sabão (típica
matéria-prima brasileira) e a mistura de diversos estilos barrocos – do chamado rococó ao estilo
clássico e gótico. O escultor adquiriu seu apelido aos quarenta anos de idade porque começou a
perder os movimentos das mãos e dos pés e conta a lenda que, para trabalhar, pedia ao seu ajudante
para amarrar as ferramentas em seu braço. Deixou um conjunto surpreendente de obras, mas a
Igreja de São Francisco é considerada uma de suas maiores realizações.

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FIGURA 22 – Vista interna da igreja de São Francisco de Assis em Ouro Preto, MG

Fonte: https://ogarimpeiro.files.wordpress.com/2014/01/assis_ogarimpeiro.jpg

FIGURA 23 – Vista externa da igreja de São Francisco de Assis em Ouro Preto, MG

Fonte: Curioso / shutterstock

5.3. O Brasil dos viajantes


Ao lado da arte de inspiração barroca do período colonial, surgem os primeiros registros em
texto e imagem (pinturas) realizados pelos viajantes estrangeiros no país. São crônicas de viagens
de cientistas, biólogos e artistas que do século XVI até o século XIX por aqui passaram, deixando
suas pesquisas e impressões sobre a flora, a fauna e gentes do novo continente. Produziram um rico
material iconográfico que acabou por influenciar a própria visão de “brasilidade” do país. Em 1949, o
pesquisador Rubens Borba de Moraes catalogou um total de 266 viajantes que haviam escrito sobre

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o povo, a geografia e as riquezas brasileiras. Desses, a grande maioria visitou o país nas décadas
seguintes à abertura dos portos. Todos registraram suas impressões em livros, cartas e relatórios
oficiais, o que tornou esse um dos períodos mais bem documentados da história brasileira. Essas
obras incluem descrição de cidades, paisagens, tipos humanos, hábitos e costumes, inúmeras
observações e muitas descobertas científicas. São relatos deslumbrados de pessoas surpreendidas
pela beleza de uma terra idílica, intocada e repleta de novidades.

Alemães, espanhóis, franceses, ingleses e holandeses intensificaram suas visitas a partir do


século XIX, deixando um registro singular e precioso sobre o Brasil. Alguns desses viajantes foram
homens importantes e outros fizeram nome a partir de seus relatos e anotações pictóricas feitas
aqui. O naturalista Charles Darwin (1809-1882), pai da teoria da evolução, que esteve de passagem
pelo Rio de Janeiro em 1832, não se conteve em adjetivos maravilhados diante do que viu:

Sublime, pitoresca, cores intensas, predomínio do tom azul, grandes plantações de


cana-de-açúcar e café, véu natural de mimosas, florestas parecidas, porém mais
gloriosas que aquelas nas gravuras, raios de sol, plantas parasitas, bananas, grandes
folhas, sol mormacento. Tudo quieto, exceto grandes e brilhantes borboletas. Muita
água [...], as margens cheias de árvores e lindas flores (BELUZZO, 1999).

FIGURA 24 – “Casal de Negros na Senzala”, de Rugendas (século XIX)

Fonte: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/736x/2b/f6/f0/2bf6f02b27aab5fa83847f92e0e666d1.jpg

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Os viajantes que estiveram no Brasil no século 19 podem ser classificados em cinco categorias.
A primeira é a dos comerciantes, mineradores e outros homens de negócio, como os ingleses John
Mawe (1764-1829) e John Luccock. A segunda é a dos nobres, diplomatas, militares e funcionários
de governo que moraram ou passaram pelo país em missão oficial, caso do americano Henry Marie
Brackenridge (1786-1871) e do cônsul britânico James Henderson (1783-1848). A terceira categoria
é a dos cientistas, integrantes das inúmeras expedições que percorreram o país nesse período.
Os mais famosos são os botânicos Auguste Saint-Hilaire (1779-1853), francês, e Carl Friedrich
von Martius (1704-1868) e Johann Baptist von Spix (1781-1826), bávaros. O quarto grupo é o dos
pintores e paisagistas, como o francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848) e o austríaco Johann
Moritz Rugendas (1802-1858). O quinto e último é composto por aventureiros, curiosos e gente que
chegou ao país quase por acaso. É um grupo que, curiosamente, inclui mulheres, como a francesa
Rose Marie de Freycinet (1794-1832) e a inglesa Maria Graham (1785-1842).

FIGURA 25 – “Escravos no Rio de Janeiro”, por Debret (século XIX)

Fonte: https://s-media-cache-ak0.pinimg.com/736x/ec/8a/72/ec8a721b25f96097b00aa5174e549595.jpg

Fotógrafos, artistas, cientistas, todos passavam por aqui deixando suas impressões. Toda essa
movimentação pelo território brasileiro, principalmente no século XIX, foi muito importante. Resultou
numa linha única de material iconográfico por onde passa a vida nacional: cartas, retratos, mapas,
tapeçarias e pinturas da flora, fauna, cultura e sociedade do Brasil seriam influentes inclusive na
visão e afirmação de nossa brasilidade. Nomes como Rugendas e Debret – ao lado dos grandes
fotógrafos do século XIX, como Cristiano Júnior – comporiam uma historiografia brasileira única
a partir de imagens.

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FIGURA 26 – “Escravo com balaio”, fotografia de Cristiano Junior, 1865

Ao lado da pintura, a fotografia passou a fazer diferença. Fonte: https://


earlylatinamerica.wordpress.com/2015/03/06/brazil-circa-1870s/

No final do século XIX, a impressão que se tinha é de que tudo parecia acontecer e, com a chegada
da missão artística francesa no país, em 1986, de fato a situação das artes mudaria. Cria-se com ela
a primeira Escola Nacional de Arte do Brasil: A Academia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro,
responsável por uma renovação completa em artes visuais brasileiras, que se tornou o centro mais
importante para as artes visuais brasileiras por quase todo o século XIX. Impondo um novo conceito
de educação artística, foi a base para uma revolução na pintura, escultura, arquitetura, artes gráficas
e artesanato. Protegida e incentivada pessoalmente pelo imperador Pedro II, que tinha um ambicioso
projeto nacional de modernização, a Academia alcançou seu momento mais precioso: promoveu o
surgimento da primeira geração de pintores românticos brasileiros encabeçada por Victor Meirelles
e Pedro Américo, que seriam alguns dos nomes mais importantes. Em seus trabalhos, imprimiram
uma nova identidade à pintura brasileira através de um conjunto de símbolos visuais.

Evitando propositalmente todos os excessos, a pintura romântica do Brasil fugiu da versão europeia
que até aquele momento se apoiou na bizarrice, na fantasia, interesse em morte, dramaticidade
esmagadora e violência. Pode-se afirmar sem exageros que a pintura romântica trouxe novos ares

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às nossas artes plásticas. Por causa de sua natureza acadêmica e palaciana, todos os excessos
foram evitados.

FIGURA 27 – “Independência ou Morte!”, por Pedro Américo (1888)

Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Independ%C3%AAncia_ou_Morte.jpg

Pedro Américo de Figueiredo e Melo (Paraíba, 29 de abril de 1843- Florença, 7 de outubro


de 1905) foi um dos mais importantes pintores acadêmicos do Brasil. Deixou obras de impacto
nacional, projetando-se por suas grandes pinturas de caráter cívico e heroico, inserindo-se no
programa civilizador e modernizador do país fomentado pelo imperador Dom Pedro II. Sua arte
seguiu a tendência do período de fundir elementos neoclássicos, românticos e realistas e, no
apogeu, deixou obras como Batalha de Avaí, Fala do trono, Independência ou morte! e Tiradentes
esquartejado, reproduzidas aos milhões em livros escolares de todo o país. Num segundo momento,
ele se concentrou em temas que pessoalmente já preferia: orientalizantes, alegóricos e bíblicos,
mas não obteve muito sucesso com essas produções, que permaneceram por isso mesmo pouco
conhecidas.

Apesar de seu reconhecimento como pintor de grande talento, para as novas vanguardas do
século XX, Pedro Américo foi símbolo de tudo o que o sistema acadêmico tinha de conservador,
elitista e distante da realidade nacional. Por essa razão, ele e outros acadêmicos seriam alvo de
ataques dos modernistas.

ACONTECEU

Saiba como aconteciam as viagens e o relato dos viajantes no Brasil do século XIX acessando o
artigo “Os relatos dos viajantes estrangeiros no Brasil oitocentista: possibilidades historiográficas”.

http://www.uesc.br/eventos/cicloshistoricos/anais/bruno_alessandro_gusmao_moreira.pdf

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6. NEOCLASSICISMO, ROMANTISMO E REALISMO NA ARTE BRASILEIRA
(O ENGAJAMENTO POLÍTICO DA ARTE NO BRASIL)
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus,
Se eu deliro... ou se é verdade
Tanto horror perante os céus?!...
Ó mar, por que não apagas
Co’a esponja de tuas vagas
Do teu manto este borrão?
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!...
(“Navio Negreiro”, de Castro Alves)

O século XIX traria uma nova inclinação para o neoclassicismo, romantismo e realismo diferentes
da ousadia realista do período barroco. Essa tendência estava impregnada em todos os espectros
dos meios artísticos, incluindo a pintura, a escultura, a arquitetura e assim por diante.

Independentemente dos estilos, os artistas brasileiros nem sempre adotaram um padrão


consonante ao europeu. O romantismo brasileiro, por exemplo, foi muito diferente do que ocorria no
romantismo internacional. Escravidão e crueldade humana foram expostos e combatidos, ao invés
de escondidos sob uma máscara de fanatismo religioso e glamour exagerado do período barroco.
O realismo foi transmitido a partir da criação de belas paisagens brasileiras, capturados ao vivo
para o mundo desfrutar, e isto fez toda a diferença em nosso meio artístico e suas consequências
no século XX.

Ao lado da pintura do romantismo, a literatura brasileira do período evoluiu para uma escola
romântico-nacionalista com as obras de Casimiro de Abreu e Manuel Antônio de Almeida. Por volta
de 1850, surge uma segunda geração romântica numa transição centrada sobre Álvares de Azevedo
e muito influenciada pela poesia inglesa de Lord Byron. Este foi um período conhecido como mal de
siècle por sua obsessão pela morbidez e pela morte. Em seguida, surge uma nova geração muito
diferente da anterior, que se interessa por problemas sociais e cria a partir do poeta Castro Alves
uma espécie de ativismo social que não foi acompanhado pelas Artes Visuais da Escola de Belas
Artes, ligada ao academicismo patriótico e à religião, ainda que os fotógrafos da época, como o
português Christiano Júnior (1832-1905) e os retratistas viajantes como o alemão Rugendas e o
francês Debret tenham pintado esse tema com intensidade.

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FIGURA 28 – Negros no fundo do porão de navio negreiro (1835)

Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/71/Navio_negreiro_-_Rugendas_1830.jpg

6.1. O fotógrafo e os negros de ganho


Em 1860, período em que viveu no Rio de Janeiro, o fotógrafo português da Ilha dos Açores José
Christiano Junior (1832-1905) produz uma série de fotografias conhecidas como “cartes-de-visite”
de africanos e seus descendentes, escravos ou libertos. São fotos impressionantes, realizadas em
seu estúdio carioca, mas feitas em fundos pintados com paisagens de bosques europeus. Mostram
closes ou negros de corpo inteiro em situações que simulam suas profissões. São os chamados
“negros de ganho”, na verdade vendedores ambulantes de água, frutas, flores, cestas, legumes, aves,
bolos, biscoitos e toda sorte de pequenos comércios transportados na cabeça em latas ou caixas.
Seus lucros eram entregues aos seus proprietários. Nessa época, o Rio de janeiro concentrava
uma população urbana de negros cativos imensa que praticamente se equiparava a dos brancos.
Contavam 110 mil escravos para uma população total de 266 indivíduos. Essas fotos reveladoras
seriam o primeiro registro do que se tornaria a futura população carioca do início do século XX e
também conferem importância da fotografia para o modernismo brasileiro, que, ao lado do cinema,
influenciaria toda a arte e a literatura modernista do país.

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FIGURA 29 – Negros de ganho na cidade do Rio de Janeiro, por Christiano Júnior (1860)

Fonte: https://earlylatinamerica.wordpress.com/2015/03/06/brazil-circa-1870s/; https://s-media-


cache-ak0.pinimg.com/736x/09/e2/f2/09e2f284550bc0d3b66dc2becaddf2e9.jpg; https://s-media-
cache-ak0.pinimg.com/originals/f7/e0/3e/f7e03ef438a3a1e81268102558bee0f9.jpg.

Antônio Castro Alves (1847-1871) foi um dos maiores poetas românticos do período e toda
sua obra serviu à libertação dos escravos. Seu poema mais famoso, “Navio negreiro”, de 1869,
versava sobre os horrores da escravidão. Na prosa romântica, a grande preocupação dos escritores
ocupava-se em defender os índios perseguidos e a resgatá-los ao glorificá-los como verdadeiros
heróis brasileiros. Este movimento chamado indianista foi encabeçado por José de Alencar (1829-
1877), que escreveu romances famosos como O Guarani (1857) e Iracema (1865) e contribuiu para
a criação de uma identidade nacional brasileira com a valorização do rico ambiente natural do país.
O indianismo acabou influenciando a poesia a partir de Antônio Gonçalves Dias (1823-1864), um
feroz pesquisador das línguas indígenas e do folclore brasileiro. Sua famosa “Canção do Exílio”,
de 1846, tornou-se um dos poemas mais lidos e estudados da história da nossa literatura, mas o
definitivo tom nacionalista e patriótico de sua obra se firmaria com o curto poema épico indianista
“Juca Pirama” e com “Canção dos Tamoios” (1849), que valeu a Gonçalves Dias o título de “poeta
nacional” do Brasil. Ainda que o romantismo da primeira e da segunda geração tivessem grandes
nomes, foi atingir seu vigor máximo no terceiro momento romântico, caracterizado pelo indianismo
e pela luta abolicionista, as duas tendências mais importantes do romantismo brasileiro.

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FIGURA 30 – O abolicionista Castro Alves e os indianistas Gonçalves Dias e José de Alencar

Fontes: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/f/fe/Castro_Alves.png; https://commons.wikimedia.org/wiki/


File:Gon%C3%A7alves_dias.jpg; http://www.estudopratico.com.br/wp-content/uploads/2014/03/Jos%C3%A9-de-Alencar.jpeg.

Juca-Pirama
(Gonçalves Dias)

No meio das tabas de amenos verdores,


Cercadas de troncos – cobertos de flores,
Alteiam-se os tetos d’altiva nação;
São muitos seus filhos, nos ânimos fortes,
Temíveis na guerra, que em densas coortes
Assombram das matas a imensa extensão.

São rudos, severos, sedentos de glória,


Já prélios incitam, já cantam vitória,
Já meigos atendem à voz do cantor:
São todos Timbiras, guerreiros valentes!
Seu nome lá voa na boca das gentes,
Condão de prodígios, de glória e terror!

As tribos vizinhas, sem forças, sem brio,


As armas quebrando, lançando-as ao rio,
[...]

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FIGURA 31 – “Índios”, de Jean Baptiste Debret

Fonte: acervo da autora.

Na música, o século XIX produziu dois compositores de talento excepcional: José Maurício Nunes
Garcia, de linha sagrada e neoclássica, que foi por um tempo diretor musical para o tribunal e, mais
tarde, o primeiro músico brasileiro a conquistar fama internacional: o cantor de opera romântico
Carlos Gomes.

No final do século XIX, a arte brasileira se identificou com o realismo, um movimento que
elegeu como tema as descrições da natureza e dos povos de regiões variadas do Brasil. Os
romances psicológicos proliferaram no período, trazendo nomes como João Simões Lopes Neto,
Aluísio Azevedo, Euclides da Cunha e, acima de tudo, Machado de Assis, enquanto Almeida Júnior,
Pedro Weingärtner, Oscar Pereira da Silva e outros pintores realistas passaram a representar
tipos populares e a reproduzir as cores distintivas e a luz da paisagem brasileira. Posteriormente,
sob a influência do expressionismo, do cubismo e do surrealismo europeus, seriam lançadas as
sementes de nosso modernismo.

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FIGURA 32 – Machado de Assis (1839-1908)

Fonte: acervo da autora.

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, no Morro do Livramento, Rio
de Janeiro (então capital da monarquia portuguesa) e morreu na mesma cidade em 28 de setembro
de 1908. Estudou em escolas públicas e não frequentou a universidade, mas isso não o impediu de
assumir diversos cargos públicos, passando pelo Ministério da Agricultura, do Comércio e das Obras
Públicas e conseguindo precoce notoriedade em jornais onde publicava suas primeiras poesias e
crônicas. Foi o introdutor do realismo no país e escreveu em praticamente todos os gêneros literários:
foi poeta, romancista, cronista, dramaturgo, contista, folhetinista, jornalista e crítico literário. Ao
testemunhar as mudanças políticas no Brasil na passagem do Império para a República, tornou-se
um prolífero comentador dos eventos políticos e sociais de sua época. Mais tarde, unindo-se a alguns
colegas, fundou a Academia Brasileira de Letras, tornando-se seu primeiro presidente. Apesar da
origem pobre e de ser filho de negros num ambiente escravocrata, tornou-se um intelectual feroz,
conseguindo subir socialmente através da inteligência privilegiada. Sua obra extensa constitui-se
de nove romances e peças teatrais, duzentos contos, cinco coletâneas de poemas e sonetos e
mais de seiscentas crônicas. Sua extensa obra se inicia com uma fase ainda romântica, quando
escreveu Ressurreição, A Mão e a Luva, Helena e Iaiá Garcia, mas foi com a publicação de Memórias
Póstumas de Brás Cubas (1881), já na segunda fase, que o escritor poderoso se revelaria. Surge
então Quincas Borba, Dom Casmurro, Esaú e Jacó e Memorial de Aires. Sua obra foi de fundamental
importância para as escolas literárias brasileiras do século XIX e do século XX, despertando grande
interesse acadêmico e público. Seus principais livros influenciaram grandes nomes das letras que
surgiriam depois, como Olavo Bilac, Lima Barreto, Carlos Drummond de Andrade e outros. Mesmo
em seu tempo, atingiu grande fama, mas nada que se compare com o reconhecimento que viria a ter
depois de morto. Por sua inovação e pioneirismo em temas precoces, é considerado o maior escritor
brasileiro de todos os tempos no Brasil e está entre os grandes gênios da literatura universal ao lado

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de autores como Dante, Shakespeare e Camões. Recentemente Machado de Assis foi colocado entre
os cem maiores escritores do mundo na privilegiada coletânea internacional feita pelo respeitado
crítico norte-americano Harold Bloom, um gigante entre os críticos literários internacionais. No seu
livro Gênios, o americano atravessa séculos da literatura, começando com a Bíblia até Sócrates,
passando por Shakespeare e Dante até chegar a Machado de Assis, Faulkner e Hemingway. Para
Bloom, nosso escritor é um dos mestres da narrativa erótica, da qual fazem parte também Flaubert,
Eça de Queirós, Jorge Luiz Borges e Ítalo Calvino. “A genialidade de Machado”, argumenta o crítico,
“[...] é manter o leitor preso à narrativa, dirigir-se a ele frequentemente e diretamente, ao mesmo tempo
em que evita o mero realismo (que jamais é realista)” (BLOOM, 2003, p. 51). Da obra machadiana,
Harold Bloom aponta o romance Memórias póstumas de Brás Cubas como o seu favorito: “O livro é
cômico, inteligente, evasivo, uma leitura prazerosa, oração após oração. O gênio de Machado nega
qualquer pathos, ao mesmo tempo em que subverte todos os supostos valores e princípios, bem
como a suposta moral” (BLOOM, 2003, p. 51). Com seu tom irônico entre niilista e realista, Machado
de Assis pode ser visto com o pai da moderna literatura brasileira.

FIGURA 33 – Jose Ferraz de Almeida Júnior (1850-1899)

Fonte: acervo da autora.

Almeida Júnior nasceu em Itu no dia 8 de maio de 1850 e morreu em Piracicaba, em 13 de


Novembro de 1899. Vítima de um crime passional, foi apunhalado até a morte, que sempre esteve
envolta em mistério. Sobre sua arte, o pintor e desenhista Almeida Júnior se deixou influenciar pelo
realismo de Gustave Coubert e de Jean-François Millet e logo se tornou um dos grandes nomes
do final do século XIX nas artes plásticas do país. Enquanto artista, conseguiu estabelecer um
importante diálogo entre a rigidez formal do academicismo e uma veracidade intimista que aplicou

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sempre em sua obra. A favor do naturalismo em pintura, esse pintor e desenhista brasileiro se
tornou uma referência de arte regional da segunda metade do século XIX no Brasil. Foi precursor de
uma temática regionalista na pintura, retratando personagens simples da cultura caipira e tirando
delas toda a monumentalidade e artificialismo corrente no ensino artístico oficial da academia.
Retratou personagens simples e interioranas e seu quadro Caipira picando o fumo se tornou tão
popular que fazia parte de toda folhinha brasileira paulistana até meados do século XX no país.
Outra curiosidade a seu respeito é que o Dia do Artista Plástico brasileiro é comemorado a 8 de
maio, data de nascimento do pintor, em sua homenagem.

FIGURA 34 – “Caipira picando o fumo” (1893), um dos quadros mais famosos de Almeida Júnior

Fonte: acervo da autora.

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3 - PRÉ-MODERNISMO E DO MODERNISMO À MODERNIDADE

7. DO PRÉ-MODERNISMO AO MODERNISMO. A CHARGE, A FOTOGRAFIA E


O CINEMA COMO NOVOS CONCEITOS DE ARTE

7.1. Manifesto da poesia pau-brasil


[...] Houve um fenômeno de democratização estética nas cinco partes sábias do mundo.
Instituíra-se o naturalismo. Copiar. Quadro de carneiros que não fosse lã mesmo, não
prestava. A interpretação no dicionário oral das Escolas de Belas Artes queria dizer
reproduzir igualzinho... Veio a pirogravura. As meninas de todos os lares ficaram
artistas. Apareceu a máquina fotográfica. E com todas as prerrogativas do cabelo
grande, da caspa e da misteriosa genialidade de olho virado – o artista fotográfico.
Uma nova perspectiva. (ANDRADE, 1924 apud BARBOSA; SANTOS, 2009, p. 42).

Há quem considere que o século XX nas artes brasileiras e mundial já tem seu início em
meados do século XIX, impulsionados principalmente pelas grandes invenções, que trariam uma
nova visão de mundo, influenciando as artes e a literatura em geral. Fato é que foram as grandes
invenções, como a fotografia e o cinema, que possibilitariam o surgimento da pintura abstrata no
novo século, e os novos meios de locomoção trariam um novo conceito de velocidade tão aclamado
pelos futuristas. A ideia de quebra na aura e de reprodutibilidade técnica instauradas a partir da
fotografia significou o início de uma nova mentalidade que em nada lembraria os conceitos estéticos
dos homens até o século XVIII. Nesse aspecto, a história da fotografia brasileira do século XIX
seria um capítulo à parte na história do modernismo no Brasil. A presença marcante de fotógrafos
estrangeiros que retrataram paisagens, costumes, cenas e tipos humanos entre nós tornou-se
responsável por imagens pioneiras e deslumbrantes das transformações urbanas das principais
cidades brasileiras, entre elas Belém, Recife, Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro, então capital do
Império. Suas fotografias – notadamente as do Rio de Janeiro – correram o mundo e colaboraram
para construir uma representação expressiva do Brasil naquele período.

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FIGURA 35 – Uma panorâmica do Rio de Janeiro no século XIX feita por Marc Ferrez

Fonte: http://brasilianafotografica.bn.br/?p=1443

Nomes como o do fotógrafo franco brasileiro Marc Ferrez (1843-1923), que deixou um dos
mais importantes legados visuais de sua época, registrados entre 1865 e 1918, ao retratar cenas
dos períodos do Império e início da República, escapam do aspecto documental a que eram pagos
para registrar – por exemplo, a construção de ferrovias, a modernização dos portos e muitas outras
obras, como as de abastecimento de água nas cidades. No caso específico de Ferrez, ele acabou
tendo uma relevância histórica e estética significativa, especialmente nas imagens registradas do
entorno da cidade do Rio de Janeiro.

Outro nome que não pode ser esquecido na história da modernidade do país é do carioca
Militão Augusto de Azevedo (1837-1905), um dos maiores nomes da fotografia brasileira na segunda
metade do século XIX. Ele deixou um legado único de documentação da cidade de São Paulo entre
os anos de 1860 e 1880, quando ainda eram raros os registros urbanos no Brasil. O conjunto de
fotografias mais importantes de Militão data de 1862. Trata-se do ano em que, recém-chegado à
capital paulista como ator da Companhia Dramática Nacional, ele deu início de forma sistemática
ao trabalho seminal que publicaria em 1887 com o nome de Álbum comparativo de vistas da cidade
de São Paulo. Seu trabalho é comparável ao realizado por Augusto Stahl no Recife e Revert Henry
Klumb no Rio de Janeiro.

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FIGURA 36 – Fotos do século XIX

Dois grupos de três crianças anônimas em cada um deles e que pertenciam a grupos sociais distintos.
Foto de Militão Augusto de Azevedo, São Paulo, século XIX. Fonte: Fonseca, Moraes e Barata (2004).

Pensar nas artes do século XX é ampliar o conceito de pintura para novos conceitos de artes
visuais que incluam a fotografia, o cinema e as charges, que mais tarde – entre 1916 e 1924 – seriam
incorporados nos projetos dadaístas de colagem e de cartuns.

O século XX assistiria a uma outra mudança de estilo que apontaria para uma tendência
contemporânea de arte: questões humanitárias sensíveis como a desigualdade racial foram abordadas
sob a forma de peças de vanguarda. Artistas foram incentivados a adotar a sua própria criatividade
e buscar sua identidade pessoal, em vez de optar para os estilos já conhecidos e popularizados
por outros. Além da cultura negra, que vai se incorporar no cubismo de Picasso, por exemplo, e
que influenciaria todo nosso modernismo, aqui também os antigos rituais de pintura corporal e
arte plumária foram ressuscitados e integrados em peças modernas para um efeito intertextual.
Todas essas polêmicas questões, que já eram uma preocupação de algumas mentalidades mais
esclarecidas do século XIX, vão acontecer na busca de novas perspectivas do século XX em arte. No
Brasil, incluiu-se ainda no primeiro modernismo de 1922 a busca de uma nova identidade nacional
– de um país que deixava de ser luso-brasileiro para ser brasileiro.

CURIOSIDADE

Embora a primeira fotografia de que se tem notícia date de 1826, feita pelo francês Joseph Nicéphore
Niépce, que usou uma placa de estanho coberta com um derivado de petróleo fotossensível
(chamado Betume da Judeia), foi um outro francês, Daguerre, quem apresentou a primeira câmera
fotográfica em 07 de janeiro de 1839, na Academia Francesa de Ciência, em Paris. Sua invenção
foi chamada de “daguerreótipo” (por causa do seu nome: Daguerre). Saiba mais sobre a história da
câmera fotográfica acessando o site abaixo:

http://www.camerasantigas.com.br/a_camera_fotografica_como_surgiu.htm

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8. O MODERNISMO BRASILEIRO E A REDESCOBERTA ARTÍSTICA DO BRASIL
FIGURA 37 – Livro de poesia “Pau-Brasil” (1924)

Capa original do livro de poesia “Pau-Brasil” de Oswald de Andrade feita pela


artista plástica Tarsila do Amaral (1924). Fonte: Miramar (2010).

Antes dos portuguezes descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade.


[...]
A alegria é a prova dos nove.
No matriarcado de Pindorama. (ANDRADE, 1928, p. 7).

As principais questões do modernismo brasileiro foram desencadeadas em função do momento


político, social, econômico e cultural singular do país. A turbulenta passagem do Império para a
República exigia a redescoberta de um novo Brasil. Um país que já se desenhava no século XIX,
mas que seria idealizado e reconstruído definitivamente por intelectuais, artistas, políticos e toda
a intelligentsia​das primeiras décadas do século XX. Essa é a razão pela qual o poeta Oswald de
Andrade afirmou em seu “Manifesto antropófago”, de 1928, escrito para o nº 1 da importante Revista
de Antropofagia, que deveríamos ser

Contra Anchieta cantando as onze mil virgens do céo, na terra de Iracema – O patriarca
João Ramalho fundador de São Paulo.

A nossa independencia ainda não foi proclamada. Frase typica de D. João VI: – Meu
filho, põe essa corôa na tua cabeça, antes que algum aventureiro o faça! Expulsamos
a dynastia. É preciso expulsar o espírito bragantino, as ordenações e o rapé de Maria
da Fonte.

Contra a realidade social, vestida e oppressora, cadastrada por Freud – a realidade


sem complexos, sem loucura, sem prostituições e sem penitenciárias do matriarcado
de Pindorama. (ANDRADE, 1928, p. 7).

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O primeiro modernismo – que vai de 1920 a 1930 – teve como princípio a busca de uma identidade
nacional; de um sentido de brasilidade fundante de uma nova nação, que deixava de ser luso-
brasileira para ser brasileira. Deixou-se ainda influenciar por todos os “ismos” da arte e da política
que incendiavam a Europa: o expressionismo, o fauvismo, o cubismo, o futurismo, o dadaísmo e
o surrealismo e regimes políticos de vanguarda do período, que vinham se opor ao capitalismo,
como o fascismo, o nazismo, o socialismo, o anarquismo e o marxismo. Mas nossa busca maior
foi pela redescoberta e reconstrução de um Brasil ainda desconhecido dos brasileiros. Nas artes e
na cultura, todo esse processo de transformações estéticas fundantes de um momento histórico
que partisse do “marco zero” seria guiado por dois gigantes da literatura do país: Mário de Andrade
e seu companheiro de lutas Oswald de Andrade. Sem eles, nada teria sido como foi: eles foram os
agitadores culturais, aglutinadores e os verdadeiros mentores das mudanças radicais anunciadas na
Semana de Arte Moderna de 1922, responsáveis, cada qual a seu modo, pelas transformações radicais
na concepção estética de arte e literatura do país. Nesse novo desenho de Brasil, curiosamente, ao
lado dos Andrades, duas mulheres seriam pivôs das transformações: as geniais artistas plásticas
Anitta Malfatti e Tarsila do Amaral, como poderemos ver adiante na apostila.

8.1. A Semana de Arte Moderna de 1922


A chamada Semana de Arte Moderna de 1922, que marcou FIGURA 38 – Cartaz original da
o início do modernismo brasileiro e se tornou o movimento semana de arte moderna de 1922

mais importante do século XX no país ocorreu em São Paulo


entre os dias 11 e 18 de fevereiro de 1922, no Teatro Municipal
da cidade. Teve apoio da elite quatrocentona de São Paulo e
do próprio governador do estado da época, Washington Luís.
Além de Mário e de Oswald de Andrade, o evento foi organizado
pelo intelectual Rubens Borba de Moraes, que não participou
da semana por estar doente, assim como a pintora Tarsila do
Amaral, que depois se tornaria um dos pilares do modernismo
brasileiro, mas que na época se encontrava em Paris. Plínio
Salgado e Menotti Del Picchia vieram do Rio de Janeiro para
participar. Os outros participantes já se encontravam em São
Paulo e a maioria era paulista, muitos deles herdeiros de ricos
proprietários de cafezais. Participaram Mário de Andrade,
Oswald de Andrade, Victor Brecheret, Anita Malfatti, Guilherme
de Almeida, Sérgio Milliet, Heitor Villa-Lobos, Tácito de Almeida, Fonte: Miramar (1990).

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Di Cavalcanti, Ronald de Carvalho, entre outros. Tais nomes, depois de 1922, seriam consagrados em
definitivo. Foi uma semana de grande agitação cultural, com eventos de pintura, escultura, poesia,
literatura e música acontecendo em cada dia.

FIGURA 39 – Os intelectuais da Semana de 1922

Oswald de Andrade sentado à frente e Mário de Andrade em pé à esquerda,


logo atrás da primeira fileira de cadeiras. Fonte: Miramar (1990).

No programa da Semana de 1922 já se anunciava as atividades dos principais artistas. Por ele
podemos ver a disposição de cada um:

– Oswald de Andrade: organizador do evento. Sua crítica ao compositor Carlos Gomes


(O Guarani) e seu convite para que estudantes expressem sua “opinião” jogando
tomates no palco certamente causarão controvérsia.

– Anita Malfatti: cada vez mais popular após as críticas do escritor Monteiro Lobato
(que destruiu seus quadros a bengaladas!), ela desfiará todo seu expressionismo
em 22 obras. Mário de Andrade é um de seus fãs.

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– Mário de Andrade: um dos idealizadores do evento, conduzirá a palestra A escrava que
não é Isaura. Conheça sua proposta 
para o abrasileiramento
da língua portuguesa
e
a volta ao nativismo. Abaixo ao “passadismo”!

– Manuel Bandeira: embora esteja afastado dos palcos por conta de uma crise de
tuberculose, seu poema Os Sapos será lido por Ronald de Carvalho e promete um
soco no estômago dos escritores parnasianos!

– Heitor Villa-Lobos: o compositor irá encantar o público com sua música clássica
temperada com maxixe, samba e chorinhos. Nas palavras de Anita Malfatti, a mistura
vai “abalar as paredes do velho Municipal”! (PORTILHO, 2012, s/p).

FIGURA 40 – “O homem amarelo”, de Anitta Malfatti (1916)

Fonte: https://getuliogregori.wordpress.com/2015/01/08/fixo-20-filosofia-da-arte-pintores-brasileiros/anita-malfatti/.

Os eventos de 1922 assustaram o público pela radicalidade. Ninguém imaginava que aquelas
manifestações poderiam ser chamadas de arte. Os escândalos da Semana começaram antes, com
a exposição da jovem pintora Anita Malfatti, que voltava dos Estados Unidos trazendo a experiência
das novas vanguardas europeias. Em 1917, por incentivo de Di Cavalcanti e de Menotti Del Picchia,
ela realizou a primeira exposição modernista brasileira, com pinturas que se deixaram contaminar
pela estética do cubismo, do expressionismo e do futurismo. A exposição foi duramente criticada
em meio a uma barulhenta oposição, tornando-se o estopim para que a Semana de Arte Moderna
tivesse seu estrondoso sucesso. O quadro que mais chocou o público foi o seu “O homem amarelo”,
com fortes princípios cubistas. Sobre essa obra, o mais cáustico de todos os seus opositores foi
o escritor Monteiro Lobato, na época um crítico poderoso.

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Monteiro Lobato critica a exposição de Malfatti no artigo “Paranóia ou Mistificação?” publicado
no jornal O Estado de S. Paulo em 20 de dezembro de 1917, provocando a polêmica que afastaria
os seus seguidores modernistas. Diz ele:

Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que veem normalmente as coisas
[...] A outra espécie é formada pelos que veem anormalmente a natureza e interpretam-
na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas
cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. [...] Embora eles se deem como novos,
precursores de uma arte a vir, nada é mais velho do que a arte anormal ou teratológica:
nasceu com a paranoia e com a mistificação. [...] Essas considerações são provocadas
pela exposição da senhora Malfatti onde se notam acentuadíssimas tendências para
uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia.
(LOBATO, 1917, p. 4)

Como resultado, Anitta foi amplamente rejeitada pela elite paulistana. Todos confiavam cegamente
nas opiniões e gostos pessoais de Lobato, e de imediato a repercussão de sua crítica causou
escândalo, quadros devolvidos e uma tentativa de agressão à pintora. A mostra foi fechada antes
do tempo.

Um homem viria em sua defesa, o escritor e musicista Mário de Andrade, que a partir dali se
tornaria grande amigo de Malfatti, ainda que mais tarde também ele se desentenderia com ela. Diria
Mario desafiadoramente: “Estou impressionado com este quadro, que já é meu, mas um dia eu virei
buscá-lo”. Tinha início o modernismo brasileiro!

FIGURA 41 – Anita Malfatti (1889-1964)

Fonte: http://quadrosdecorativos.net/qd-c/uploads/2014/09/Bela-Anita-Malfatti.jpeg

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Anita Catarina Malfatti nasceu em São Paulo em 2 de dezembro de 1889 e morreu na mesma
cidade em 6 de novembro de 1964. Foi pintora, desenhista, gravadora e professora. É uma das maiores
artistas plásticas brasileiras. Foi a segunda filha do engenheiro italiano Samuele Malfatti e de mãe
norte-americana Betty Krug. Anita Malfatti nasceu apenas dezessete dias depois de proclamada
a República. Tinha uma atrofia no braço e na mão direita. Seus pais, na tentativa de corrigir esse
problema, levaram a pequena para a cidade de Lucca, na Itália na esperança de corrigir o defeito
congênito. Nada adiantou. A artista carregaria essa deficiência para o resto da vida. Aprendeu no
Brasil o uso da escrita e no aprendizado do desenho com a mão esquerda. E por seus próprios
esforços se tornaria uma das maiores artistas plásticas do país. Sua própria mãe quem lhe ensinou
os rudimentos das artes plásticas. Depois, em seus anos em Berlim, na Alemanha, onde ingressou
na Academia de Belas Artes, deram a ela a formação que necessitava e o contato suficiente com
as novas escolas de arte que a influenciariam. De Berlim foi para Paris e passou alguns anos nos
Estados Unidos. Em 1916 preparou seu retorno ao Brasil, onde organizaria sua primeira exposição
individual. Foi em Berlim e em Nova York que a pintora aprendeu os instrumentos da modernidade.

8.2. A semana de 1922 e o manifesto de poesia pau-brasil


O modernismo brasileiro foi o início de uma revolução estética sem precedentes. Além da
renovação da linguagem literária, da busca de experimentação e da liberdade de criação, representou
uma ruptura com o passado artístico brasileiro, introduzindo novos caminhos, ideias e conceitos
para a música, a escultura, a pintura, a arquitetura e as artes plásticas em geral. Influiu inclusive
na mudança da capital cultural do Rio de Janeiro para São Paulo. Uma cidade que deixava de ser
provinciana com o fenômeno da industrialização e apontava para um progresso sem precedentes
na história do Brasil.

Com todo o estardalhaço inicial, passados os dias do evento, a Semana de 1922 criticada e
incompreendida pela elite do período. Mostrou-se, por outro lado, fragilizada por uma falta de centro.
Não havia um programa muito claro sobre ao que vinham essas manifestações. Faltava um elo de
ligação entre as diferentes expressões que ali estiveram. Correntes artísticas variadas, com ideias
díspares ali se juntaram, mas, passado o vento da rebelião, o modernismo precisava de um farol
para de fato existir. Ocupando o vazio inicial, a formulação mais consistente do movimento seria
dada por Oswald de Andrade, com o “Manifesto pau-brasil” de 1924. Lançado no jornal Correio da
Manhã, seu manifesto foi endossado por Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, Guilherme de Almeida,
Raul Bopp, Guilherme de Almeida, entre outros. Muitos críticos consideram que foi a partir desse
manifesto que de fato o modernismo começou a fazer sentido.

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Vejamos a seguir alguns trechos do manifesto:

A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre nos verdes da Favela,
sob o azul cabralino, são fatos estéticos.

O Carnaval no Rio é o acontecimento religioso da raça. Pau-Brasil. Wagner submerge


ante os cordões de Botafogo. Bárbaro e nosso. A formação étnica rica. Riqueza
vegetal. O minério. A cozinha. O vatapá, o ouro e a dança.

[...] Experimentais. Poetas. Sem reminiscências livrescas. Sem comparações de


apoio. Sem pesquisa etimológica. Sem ontologia.

Bárbaros, crédulos, pitorescos e meigos. Leitores de jornais. Pau-Brasil. A floresta e


a escola. O Museu Nacional. A cozinha, o minério e a dança. A vegetação. Pau-Brasil.
(ANDRADE, 1924 apud BARBOSA; SANTOS, 2009, p. 40-41).

8.3. E depois de um manifesto, outro... Manifesto antropófago


FIGURA 42 – Grupo antropófago de 1928

Entre os participantes do grupo antropófago de 1928 estão na foto: Pagu, Tarsila


do Amaral, Oswald de Andrade e Raul Bopp. Fonte: Miramar (1990).

Manifesto antropófago
Só a antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Philosophicamente.
Unica lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os
collectivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.
Tupy, or not tupy that is the question.
Contra todas as cathecheses. E contra a mãe dos Gracchos.
Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.
(ANDRADE, 1928, p. 3).

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O “Manifesto antropófago” – segunda formulação modernista escrita por Oswald de Andrade e
publicada em maio de 1928 na Revista Antropofágica do mesmo ano – seria mais complexo do que
o de 1924, ao mesmo tempo que complementar. Tinha por objetivo resgatar a cultura primitiva de
nossos selvagens e produzir uma síntese entre as duas culturas, de um lado, a branca tecnizada e,
de outro, a antropofágica tupinambá. A partir dessa curiosa síntese, Oswald propõe uma espécie de
“socialismo tupiniquim” como base para repensarmos a dependência cultural brasileira. O Manifesto
antropófago foi o amadurecimento das ideias modernistas e se tornou a fonte teórica principal
do movimento. Ao mesmo tempo que aceitava as transformações do mundo e sua assimilação
pelo Brasil, impunha uma identidade tupiniquim no cenário artístico mundial, modificando nossas
características artísticas e culturais. O Manifesto antropófago foi lido por Oswald pela primeira vez
na casa de seu amigo Mário de Andrade. Nele, Oswald propõe que somente será possível a criação
de uma arte genuinamente brasileira quando o nosso povo mestiço apropriar-se (deglutir) a arte
europeia e produzir uma arte completamente nova.

FIGURA 43 – Revista de Antropofagia (1928)

Capa do primeiro número da Revista de Antropofagia (1928), uma das revistas mais importantes do
modernismo. Fonte: http://patrimoniograficoemrevista.blogspot.com.br/2009/12/antropofagia-1928.html

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8.3.1. Revista de Antropofagia

A Revista de Antropofagia teve duas fases ou “dentições”, como queriam os seus participantes. A
primeira fase, que vai de maio de 1928 a fevereiro de 1929, com apenas dez números, foi dirigida por
Raul Bopp e Alcântara Machado. Ainda não tinha uma ideologia totalmente definida e antropofágica.
Desta forma, contribuíram para a revista autores de ideologias diferentes como Plínio Salgado,
Mário de Andrade, Guilherme de Almeida, Jorge de Lima, Carlos Drummond de Andrade, Manuel
Bandeira, Menotti del Picchia, Murilo Mendes, Augusto Meyer e Pedro Nava (praticamente toda a
linha de frente do modernismo brasileiro da época). A “segunda dentição” ou segunda fase, dirigida
por Geraldo Ferraz, já trazia uma ideologia mais definida. Durou de 17 de março de 1929 a 1º de
agosto de 1929 e teve quinze números publicados no Diário de São Paulo. Os “antropófagos” da
segunda fase foram Oswald de Andrade, Raul Bopp, Geraldo Ferraz, Tarsila do Amaral e Patrícia
Galvão (Pagu).

Assim como “O Homem Amarelo” de Anitta Malfatti foi o estopim da Semana de Arte de 1922,
a Antropofagia surge inspirada pelo extraordinário livro Cobra Norato do poeta Raul Bopp e pelo
quadro “Abaporu”, de Tarsila do Amaral.

Figura 44 - Abaporu, Tarsila do Amaral, 1928.

Fonte: http://4.bp.blogspot.com/--ojjz3vrjyg/UDQZvUAv34I/AAAAAAAAADY/cTR2rZelgf8/s1600/imagem+09+abaporu.jpg

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Abaporu de Tarsila de Amaral é uma clássica pintura do modernismo brasileiro. O nome da
obra é de origem tupi-guarani que significa “homem que come gente” (canibal ou antropófago),
uma junção dos termos aba (homem), pora (gente) e ú (comer).

A tela foi pintada por Tarsila em 1928 e oferecida ao escritor Oswald de Andrade, na época
seu marido. Os elementos que constam da tela, especialmente a inusitada figura, despertaram em
Oswald a ideia de criação do Movimento antropofágico.

8.3.2. Revista Antropofágica – segunda dentição (separação dos Andrades)

A chamada segunda dentição da Revista Antropofágica teve como participantes o escritor o


escritor Raul Bopp, a pintora Tarsila do Amaral, a poeta e agitadora cultural Patricia Galvão, entre
outros. Mário de Andrade não participou do movimento, pois os dois Andrades – Mário e Oswald
– haviam brigado.

A lamentável briga que gerou a separação dos dois Andrades , que apesar de terem o mesmo
sobrenome não eram parentes, mas amigos inseparáveis até aquele momento, a despeito de
questões pessoais, vinha junto com grandes divergências sobre os caminhos da arte e da cultura
brasileira que passaram a abraçar ideologicamente desde então: Oswald de Andrade tinha uma
visão internacionalista de realização artistica. Ele achava que a arte e a literatura brasileira deveriam
dialogar com o estrangeiro e ser de exportação. Mário de Andrade, por sua vez, tinha uma visão
nacionalista de arte e literatura. Considerava o folclore, a música tipicamente brasileira e a busca
intransigente de nossas raízes o caminho mais importante a ser trilhado. Venceu a corrente de Mário
de Andrade, que até os anos 1960 ainda era considerado o maior mentor do modernismo brasileiro
de 1922. Com o evento do concretismo, nos anos 1950, e, mais adiante, do Tropicalismo e do teatro
Oficina, em 1960, esse quadro mudou. Ao fazer uma reavaliação de Oswald de Andrade para a cultura
brasileira, esses novos artistas de vanguarda, cada qual em sua época, acabariam por igualá-lo
em importância ao seu amigo geracional. Infelizmente, a essa altura Oswald de Andrade já havia
morrido, mas sua famosa frase “A massa ainda comerá o biscoito fino que produzo” começava a
se concretizar.

Apesar de ter provocado a famosa briga entre os dois, Oswald de Andrade sempre nutriu
profunda admiração pelo amigo e escritor de Macunaíma, de 1928, que ele considerava o principal
livro modernista, a maior obra antropofágica e um dos maiores da literatura brasileira de todos os
tempos. Tentou diversas vezes reatar com Mário de Andrade, mas foi em vão. Os dois morreram

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sem nunca mais se falar. Mas foi a genialidade desses dois grandes artistas brasileiros que abriria
todos os caminhos conhecidos da arte e da literatura brasileira contemporânea.

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9. DO MODERNISMO À MODERNIDADE (AS VANGUARDAS NAS ARTES
PLÁSTICAS DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX NO PAÍS)
Do modernismo para nossos dias, os avanços das artes plásticas foram caminhando a passos
largos, da pintura figurativa com temática nacional para a arte abstrata e dela para arte conceitual
e instalações. Se o impulso inicial de modernidade nas artes plásticas foi dado pelos modernistas
de primeira geração, hoje, quem olha uma instalação pouco ou nada perceberá dessa influência
nos meios de arte, mas, na verdade, para chegarmos onde chegamos, ela foi fundamental.

Os grandes personagens da pintura e das artes plásticas brasileiras do modernismo de 1922


até o neoconcretismo dos anos 1960 são muitos. Podemos citar, além de Anita Malfatti e Tarsila
do Amaral, os pintores Lasar Segall, Emiliano di Cavalcanti, Cândido Portinari, Alfredo Volpi e Flávio
de Carvalho. No contexto da arte concreta, Waldemar Cordeiro, Maurício Nogueira Lima e Nelson
Leirner. Na arte neoconcreta, Ligia Clarck, Lígia Pape e Helio Oiticica.

Até meados do século XX, as obras de arte brasileiras passaram a ter uma tendência estética de
enfatizar a racionalidade, enquanto correntes supostamente não racionais foram desacreditadas.
Esta situação, no entanto, não resultou de uma característica típica, mas foi resultado da influência
de um segmento da intelligentsia principalmente paulista, que transformou sua crença na
racionalidade em instrumento para o estabelecimento de uma arte que era ao mesmo tempo
moderna e exclusivamente nossa.

Essas características, no entanto, sofreram oposições. Trata-se da arte concreta, que surgiu
no Brasil na década de 1950 e que iria se distanciar do modernismo propriamente dito. Mesmo
o nosso modernismo, se olharmos retrospectivamente, foi muito diferente do futurismo italiano,
tomado diversas vezes como exemplo de vanguarda europeia. O fato é que as artes plásticas do
período entre 1920 e 1940 no Brasil têm aspectos progressistas e ao mesmo tempo conservadores,
os quais iriam se opor os concretistas dos anos 1950.

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FIGURA 45 – “A boba”, de Anita Malfatti

Fonte: Chiarelli (2013).

O “momento futurista” europeu exerceu influência sobre a arte moderna. Ainda assim, se existem
semelhanças detectáveis nas artes plásticas brasileiras desse momento estético mundial, existem
também muitas diferenças. A produção artística do futurismo italiano caminhou em duas direções
que acabaram por convergir num único ponto: atacando as convenções mais tradicionais da arte
europeia e, em sua forma mais extrema, destruindo-as em um esforço muito grande para romper
as fronteiras entre arte e vida. Num primeiro procedimento, houve a intenção de transformar os
conceitos tradicionais de pintura e escultura para materializar, no âmbito dessas modalidades, novas
percepções de tempo e espaço numa ascensão de sensações que surgiam com a vida moderna,
como a impressão crescente de velocidade. Esta é enaltecida como sentimento de mundo e de
vida-arte. Num segundo momento, o produto artístico é substituído pelo desempenho de ações
transformadoras em que a arte é submetida e se perde na vida.

Os dilemas dos modernistas brasileiros, no entanto, eram bem diferentes. Não havia nenhum
desejo de romper com a grande tradição da arte europeia no país, e sim enaltecê-la como um
constructor de modernidade. Enfatizar sua importância como meio para difundir a ideologia do
grupo. O inimigo a ser combatido pelos modernistas, ao contrário, era a pintura brasileira realista/
naturalista do século XIX ou declaradamente sua produção acadêmica.

Enquanto os futuristas queriam enfraquecer todas as formas de arte tradicionais, confrontando-


as com um espírito experimental ou abertamente destrutivo, os modernistas brasileiros mantiveram

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a tradição e não se aventuraram tão longe quanto os grupos experimentais do futurismo, que
abriram caminhos entre a arte e a vida, explorando novas tecnologias, como a fotografia, o rádio, o
cinema etc. Nesse primeiro momento isso não ocorreu com o modernismo brasileiro. As práticas
mais radicais entre tecnologia e vida não foram abordadas de imediato por nossos artistas. Além
disso, se os futuristas declararam que o passado estava morto e enterrado, em favor de um novo
experimentalismo que era de caráter internacional, os modernistas do Brasil resgataram aspectos
tanto do passado longínquo (de nossa arte rupestre, por exemplo) quanto do século anterior para
construir uma arte nacional guiada, sobretudo, pelas representações do povo brasileiro.

Ao buscar nossas raízes, os brasileiros das artes plásticas impuseram certos limites sobre o
desejo de renovação nas artes visuais. Excluíram primeiramente qualquer atividade artística fora
dos parâmetros estabelecidos pela tradição, reforçando-as nas disciplinas de arquitetura, pintura,
escultura. A arte brasileira de 1922 possuía um passado a ser recuperado que estava na produção
colonial brasileira, a qual as principais figuras do movimento modernista percebiam como originária
dos valores típicos de sua expressão. Dentro desse conceito, um fato importante para esses artistas
foi a percepção de que a renovação modernista tinha que impor limites não só na pintura, mas
também na escultura, para não perder de vista a própria exigência de temas nacionais e assuntos
típicos. Artistas modernistas não tinham escolha senão a de representar tudo o que significava esse
“sujeito” brasileiro. Nesse aspecto, a arte abstrata estava fora de questão. Tais regras forçaram os
modernistas a adotar estratégias claras: quando olharam para a Europa em busca de tendências
modernas de renovação moderada, eles encontraram brechas de “retorno à ordem” da Europa do
pós-guerra que tiveram um êxito considerável no continente. Alinhar-se com as correntes mais
conservadoras da arte europeia, ao invés das tendências mais radicais da vanguarda, significou
para nossos primeiros modernistas que o movimento poderia ser “moderno”, ao mesmo tempo que
preservaria sua aspiração de ser “nacional”.

Por fim, entre as várias abordagens propostas para que fosse possível um regresso à ordem,
havia a de explorar as tradições visuais locais. Este caminho permitiu que os modernistas brasileiros
se atualizassem e ao mesmo tempo respondessem às demandas de uma arte tipicamente nacional.

Os vários retornos dos brasileiros para a arte europeia de vanguarda não ocorreram de uma só
vez, mas foram introduzidos gradualmente e misturados com as demandas de modelos europeus
conservadores a suas vanguardas.

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Dentro desse espírito, a arte do entreguerras no Brasil foi representada igualmente com essas
características pelo trabalho dos quatro artistas considerados pioneiros da arte moderna no país: Anita
Malfatti, Tarsila do Amaral, já citadas anteriormente, além de Lasar Segall e Emiliano di Cavalcanti.

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4 - OS PIONEIROS DA ARTE MODERNA NO BRASIL E A REVOLUÇÃO
DE 1930 E A REDEFINIÇÃO DA BRASILIDADE NA ARTE

10. OS PIONEIROS DA ARTE MODERNA NO BRASIL

10.1. Anita Malfatti (1889-1964)


Malfatti teve influências das correntes de vanguarda em Berlim e Nova York durante suas
estadias nessas cidades entre 1910 e 1916. De volta a São Paulo, em 1917, ela procurou intervir no
debate sobre a arte nacional com trabalhos que demonstraram um tipo singular de primitivismo
que combinou as características pós-impressionista com a grande tradição da pintura europeia.
Se em obras como “A mulher parva” (1915), “A boba” e “A mulher de cabelos verdes” (1915-16) sua
admiração por expressionismo e futurismo é evidente, no quadro Tropical (1917), a lógica formal
é modificada. Nesta tela, o pós-impressionismo e a dimensão alegórica da terra e da fertilidade
da flora brasileiras são salientes. A mesma atmosfera é encontrada no quadro “Senador da Índia
(mulher nativa)” (1917), em que o primitivismo de Gauguin parece permear toda a alegoria brasileira.

Mesmo seu escandaloso quadro “O homem FIGURA 46 – “A mulher de cabelos verdes”,


de Anita Malfatti.
amarelo”, segundo Anita, era o retrato de um homem
pobre, excluído e desconhecido, um imigrante italiano
que lhe pediu para posar para ela, com uma “expressão
desesperada”. Ele traz uma aguda melancolia no seu
olhar vago e distante. Ainda que se apresente de gravata,
seu paletó encontra-se visivelmente desgastado e mal
ajeitado no corpo contorcido, transpondo os limites da
tela, característica comum aos trabalhos da pintora.
Seus olhos escuros são delimitados por contornos
pretos, com espessas sobrancelhas em forma de
acento circunflexo.

Fonte: Chiarelli (2013).

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10.2. Tarsila do Amaral (1886-1973)
FIGURA 47 – Tarsila do Amaral (1886-1973)

Fonte: http://www.pinturabrasileira.com/artistas_bio.asp?cod=32.

Tarsila do Amaral abraçou a pintura moderna quando ela associou-se às principais figuras da
Semana de Arte Moderna de 1922. Essas conexões ajudaram a estabelecer uma posição singular
dentro do movimento. Ela foi uma das poucos artistas que em 1920-1930 atingiram uma síntese
bem-sucedida do modernismo e do nacionalismo. Tirando lições da obra de Fernand Léger, a quem
ela havia conhecido em Paris, Tarsila criou figuras esquemáticas planas que, como Léger, parecem
simultaneamente existir no espaço tridimensional e aderir à imagem plana. Isto pode ser visto no
seu quadro “Estrada de Ferro Central do Brasil (Central Railway do Brasil)” e “São Paulo (Gazo)”,
ambos de 1924, e em “O mamoeiro (A árvore de papaia)” e “A feira II (O mercado II)”, a partir de 1925.
Nestas pinturas, o tema que evoca a brasilidade é elaborado em uma grade pictórica, uma armadura
bem adequada para organizar a realidade ideal que cada pintura descreve. Esta fase da obra da
artista ficou conhecida como pau-brasil, uma alusão ao brasileiro período de sua arte “primitiva” e
também a sua participação no movimento estético liderado por Oswald de Andrade e pela própria
Tarsila, com ressonância significativa em São Paulo e Rio de Janeiro.

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FIGURA 48 – “Estrada de Ferro Central do Brasil”, 1924, de Tarsila do Amaral

Fonte: Chiarelli (2013).

As pinturas “pau-brasil” de Tarsila foram bem recebidas pelos críticos, mas sua fase antropofágica
subsequente nem tanto. A razão para isso pode ser o apego da artista às correntes internacionais
tais como a pintura metafísica e ao surrealismo, fugindo da visão tanto quanto irracional dos críticos,
que se recusavam a compreender a antropofagia e não queriam se envolver totalmente com suas
novas telas, apesar de seu espírito de forma inequívoca “primitivo” e brasileiro.

FIGURA 49 – Lasar Segall


10.3. Lasar Segall (1891-1957) (1891-1957)

Nascido na Rússia e com formação artística na Alemanha, Lasar


Segall se adaptou rapidamente à atmosfera cultural de São Paulo
durante seus primeiros anos no Brasil (1923-28). Isto é evidente na
sua prontidão para assumir o desafio dos mais inquietos artistas de
São Paulo e Rio de Janeiro em buscar uma síntese ao mesmo tempo
moderna e típica de arte brasileira.

Logo depois de sua chegada, Segall foi tema de um artigo de Mário


de Andrade, já na época uma das principais figuras do modernismo,
Fonte: https://www.
que enfatizou o fato de que Segall, até então identificado com a avant- escritoriodearte.com/imagens/
garde alemão, no Brasil tinha mudado de rumo e estava perseguindo biografia/images/lasar-segall.jpg

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uma arte voltada para o real, abandonando a humilhação e a tragédia incessante que caracteriza
toda a sua obra anterior à sua fase brasileira.

Se mais tarde Andrade iria reagir negativamente a esta FIGURA 50 – “Mulata com criança”,
primeira etapa de trabalho brasileiro de Segall, ele estava de Lasar Segall

correto sobre o seguinte ponto: o artista abandonou seu


radicalismo anterior e aplicou-se na observação de seu
entorno, especialmente em suas evocações da paisagem
humana do Brasil. Para fazer isso, ele estudou máscaras
africanas, mas sem as intenções radicais de Picasso. Em
pinturas como “Mulata com Criança (Mestizo mulher com
a criança)”, “Mulato I (Mestizo I)” e “Menino com lagartas
(Menino e gecko)”, de 1924, “Morro Vermelho (Red Hill)”, de
1926, e “Perfil de Zulmira (Zulmira em perfil)” e “Bananal”
a partir de 1927, Segall combina geometrias esquemáticas
com descrição analógica. Se observarmos o quadro “Morro
vermelho”, veremos que o fundo da tela não foi transformado Fonte: Chiarelli (2013).
em padrões puramente ornamentais. O artista se funde em
uma única composição que é antes de tudo uma descrição
do ambiente de padrões africanos e brasileiros de outras
épocas, mais primitivas.

FIGURA 51 – “Bananal”, de Lasar Segall

Fonte: Chiarelli (2013).

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Di Cavalcanti (1897-1976)
Em 1932, Mário de Andrade também opinou sobre a FIGURA 52 – Emiliano di Cavalcanti
obra de Di Cavalcanti, afirmando que este não perdeu tempo (1897-1976)

durante suas pesquisas sobre o modernismo. Cubismos,


purismos, teorias futuristas passaram por ele sem que o
levasse ao erro. Di Cavalcanti sabia como tirar de tudo isso
o que poderia enriquecer sua técnica sem se perder em
teses nacionalistas, sendo ele sempre o pintor mais exato
das coisas nacionais. Ele não confunde o Brasil com sua
paisagem e, em vez de Pão de Açúcar, ele nos dá samba;
em vez de coqueiros, mulatas, negros e carnavais.

Esse texto não deixa dúvidas sobre os interesses


instrumentais do modernismo brasileiro de Di Cavalcanti
com a avant-garde europeu e, por outro lado, como bem
observou Mário de Andrade, com um substrato realista
Fonte: http://causaoperaria.org.br/wp-
da cultura brasileira modernista, que vai mudando uma content/uploads/2016/10/catalogo-di-
cavalcanti-composico-rio-2001-11297-
arte que anteriormente preocupava-se em retratar nossa MLB20041826222_022014-F-794x1024.jpg
topografia, flora e fauna, o Pão de Açúcar, coqueiros etc.
por um modernismo preocupado com a a absorção da FIGURA 53 – “Cinco moças de Guarat-
paisagem humana: samba, mulatas, negros e carnaval. inguetá”, 1930, de Di Cavalcanti

“Cinco Moças de Guaratinguetá (Cinco senhoras de


Guaratinguetá, 1930)” é uma pintura ideal para compreender
o trabalho de Di Cavalcanti. É um comentário bem-humorado
sobre Picasso de Demoiselles d’Avignon (1907). Di Cavalcanti
se apropria de um trabalho cubista emblemático, retirando-
lhe a sua complexidade formal e deixando apenas o
que ele possui de convencional: o tema da prostituição.
Continua a existir uma certa compressão entre figura e
fundo, mas a abstração, dispositivos, primitivização são
soltos para permitir a caracterização individual das figuras,
que representam a diversidade da sociedade brasileira:
da mulher branca para a mulher negra, e passando por
Fonte: Chiarelli (2013).

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vários tons de pele de um para o outro. Como Andrade observou, Di Cavalcanti não perdeu tempo
em teorias de vanguarda; ele tirou-lhes apenas os elementos de que precisava para realizar suas
deformações expressivas de imagens.

Em obras como “Devaneio (Reverie, 1927)” e “A mulher e o caminhão (A mulher e o caminhão,


1932)”, o artista se apropria de procedimentos de vanguarda do cubismo, surrealismo e pintura
metafísica para retratar tipos brasileiros. “Nu deitado (Reclinação nu, 1930)” tangencia uma cadência
alegórica mais tradicional. As curvas do corpo da mulher encontram eco no fundo da pintura,
formando uma paisagem brasileira, sempre repleta de sensualidade e mistério.

FIGURA 54 – “Devaneio”, de Di Cavalcanti.

Fonte: Chiarelli (2013).

O clima ameno do modernismo de 1920 mudaria na década de 1930, quando a arte de Cândido
Portinari ganhou destaque e a obra de Lasar Segall chegou à sua maturidade. A qualidade das
produções de cada um, revelada no refinamento de suas técnicas e a distância segura que souberam
manter a partir da experimentação das vanguardas serviram como modelos para a geração que
surgiu naquela época.

Em São Paulo, um grupo de artistas, a maioria deles da classe trabalhadora e de origem


imigrante começou a ganhar força. Nem modernos e nem acadêmicos, acabaram por criar obras
desconectadas com o nacionalismo e preocuparam-se apenas com o retrato sensível do cotidiano
das classes inferiores. Entre esses artistas, em 1938 iria se destacar Alfredo Volpi, que se tornaria
um dos mais importantes pintores do século XX.

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Flávio de Carvalho (1899-1973)
FIGURA 55 – Flávio de Carvalho (1899-1973)

Fonte: http://paleonerd.com.br/wp-content/uploads/2015/09/0127.jpg

Flávio de Carvalho foi um dos artistas mais radicais e provocadores dos anos 1930. Além de
artista plástico, foi um arquiteto e um intelectual feroz, cuja singularidade foi a de produzir obras
em várias disciplinas. Sua única incursão no debate sobre arte moderna brasileira “típica” é sua
pintura “Anteprojeto para Miss Brasil (Pré-projecto Miss Brasil, 1931)”. Num momento em que era
impensável aos brasileiros permitir que uma mulher negra representasse o país em um concurso
de beleza internacional, a figura de uma mulher negra pintada nas cores nacionais do Brasil,
predominantemente o verde e o amarelo, representou uma grande provocação simbólica.

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Esta preocupação com a produção de pinturas sem esboços FIGURA 56 – “Anteprojeto para Miss
Brasil”, 1931, de Flávio de Carvalho
prévios e deixando sinais óbvios de sua ação sobre a tela é
evidente em todas as obras de Carvalho. Sua ênfase no gesto
demonstra a sua adesão aos procedimentos que, absorvidos
dos surrealistas e das práticas expressionistas, foram tratados
com uma singularidade que torna difícil associar sua pintura
com a de outros colegas geracionais. A ênfase do artista em
ação iria atingir um apogeu inesperada na série trágica de nove
desenhos intitulada: Minha Mãe Morrendo. Seus trabalhos em
pintura e suas provocações performáticas, como vestir saia
e sair pelo centro da cidade foram únicas e já anunciavam
um momento de muito avanço nas artes plásticas até para
as performances da atualidade.

FIGURA 57 – “Minha mãe morrendo I”, 1947,


de Flávio de Carvalho
Fonte: Chiarelli (2013).

Fonte: Chiarelli (2013).

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11. A REVOLUÇÃO DE 1930 E A REDEFINIÇÃO DA BRASILIDADE NA ARTE:
VANGUARDAS ARTÍSTICAS, FORMALISMO E NOVAS LINGUAGENS

11.1. Concretismo e neoconcretismo


Além de algumas iniciativas estéticas ousadas, como as de Carvalho, o cenário da arte brasileira
dos anos 1930 e 1940 foi dominado pelo retorno à ordem internacional. Sinais de mudança começaram
a aparecer no final da Segunda Guerra Mundial. Não só houve uma nova geração de artistas que
procuram reviver certos movimentos da vanguarda europeia, mas também novas instituições de arte
foram surgindo. Em 1947, o Museu de Arte (Masp) foi criado em São Paulo com foco nas coleções e
exposições da produção artística em geral. Em 1948, no Rio de Janeiro, o Museu de Arte Moderna
foi inaugurado. No início da década seguinte, em 1951, a primeira Bienal do Museu de Arte Moderna
de São Paulo foi realizada.

Os fundadores dessas novas instituições compartilharam o objetivo de internacionalizar o


Brasil. Nesse momento ocorre algo anteriormente impensável: a arte brasileira estava avançando
“naturalmente” do figurativo ao abstrato. Apesar dos protestos de vários artistas de renome e
outras figuras públicas, essa nova visão de arte ganhou o apoio de uma maioria de artistas locais.
No vigoroso debate que se seguiu sobre qual direção não figurativa os jovens brasileiros devem
tomar, surgiram inicialmente as tendências construtivas com uma abordagem racionalista vitoriosa,
despertando interesse em artistas e intelectuais.

No início de 1950, o país estava começando a experimentar um desenvolvimento rápido, entendido


por muitos como a última oportunidade para se alcançar a modernidade. Assim, a dimensão projetiva,
visível na produção de ruptura e frente (parte dianteira) de dois grupos concretistas era apropriada
para o clima de transformação no Brasil, que chegaria a seu auge com a inauguração de Brasília, a
nova capital do país em 1960. O movimento de arte concreta sofreu um choque em 1959, quando a arte
neoconcreta surgiu em reação à sua ortodoxia. Se os concretistas queriam transformar o futuro, os
neoconcretistas pretendiam estabelecer no Brasil uma arte que iria transformar o presente. As obras
de Hélio Oiticica, Lygia Pape e Lygia Clark iriam receber amplo reconhecimento internacional para a
reformulação e superação dos preceitos idealistas da arte concreta, abrindo novas possibilidades
para a arte. O movimento concreto do Brasil não deve ser considerado unicamente como tendo
definido o cenário para o neoconcretismo. Os efeitos da experiência concreta no Brasil não pode
ser subestimada.

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O concretismo surgiu como uma alternativa para a arte moderna nacionalista que tinha sido
reforçada no Brasil desde a década de 1920 com nomes como Tarsila do Amaral e Cândido Portinari.
Eles viram claramente que os temas especificamente brasileiros eram um obstáculo à realização de
uma arte transformadora. Ao escolher os caminhos do racionalismo construtivista, os concretistas
acreditavam que estavam indo em direção a objetivos universais. Como a primeira consequência
desta postura, eles desenvolveram trabalhos que despertaram o público para os elementos adequados
às próprias obras. Isto é, demonstraram que a pintura, mesmo que emanando um rigor que poderia
ser estendido à vida, é composta exclusivamente por linhas e cor.

Se os modernistas viam nas obras a necessidade de uma consistente adequação às questões


externas, os concretistas enfatizaram a realidade estrutural das suas produções e a relação direta,
não mediada, que eles estabeleceram com o espectador, sem separar seus conceitos de arte em
si. Esta relação sublinhou a importância do “aqui e agora” e do ato de ver. O movimento concreto,
portanto, introduziu no Brasil as bases formais do modernismo internacional.

Pode-se dizer que os neoconcretistas injetaram conteúdo semântico na estrutura formal da


arte concreta. Se na estirpe neoconcreta “sensível” o conteúdo foi mantido dentro dos limites
da produção artística autorreferencial, na tensão “dramática” o conteúdo explodiu tanto para a
dimensão referencial do artista da obra quanto para a percepção do espectador. Oiticica, Clark e
Pape propuseram uma relação total entre obra de arte e espectador, arte e vida.

Por outro lado, a partir do concretismo novos desenvolvimentos artísticos surgiriam no Brasil.
Dois expressivos nomes vieram de ex-líderes do movimento concreto, Waldemar Cordeiro e Maurício
Nogueira Lima.

FIGURA 58 – Waldemar Cordeiro (1925-1973)

Fonte: https://br.pinterest.com/pin/471541023463449703/.

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Pressionado por críticas ao seu radicalismo como líder paulista dos concretistas e consciente da
situação política provocada pelo golpe militar de 1964, Waldemar Cordeiro procurou alternativas para
além do concretismo. Ele desenvolveu uma série de trabalhos que sintetizavam a estrutura racional
da estética concreta e a dimensão semântica da arte pop. O trabalho “O beijo”, de 1967, demonstra
essa síntese. Em um fundo mecânico móvel que reproduz a grade modernista, o artista colou uma
imagem dos lábios de Brigitte Bardot tiradas de uma fotografia, num espetacular resultado.

FIGURA 59 – “O beijo”, de Waldemar Cordeiro

Fonte: Chiarelli (2013).

FIGURA 60 – Maurício Nogueira Lima (1930-1999)

Fonte: http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo3/ruptura/lima/bio.html.

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Este tipo de imersão no cotidiano, a indústria cultural e o momento político do Brasil são
evidentes, também, em Maurício Nogueira Lima, autor de de “Não vire à esquerda” (1964). Usando uma
estrutura de grade semelhante, Lima estabeleceu um mapa poético de São Paulo que, ironicamente
enfatizando o maniqueísmo brasileiro reacionário do período divide a cidade em “certo” e a mesma
estratégia “esquerda” que levaria ao golpe militar no final daquele ano.

FIGURA 61 – “Não entre à esquerda”, 1964, de Maurício Nogueira Lima

Fonte: Chiarelli (2013).

Qualquer discussão do triunfo sobre o racionalismo concreto deve destacar o trabalho de Nelson
Leirner (nascido em 1932), o primeiro artista a desenvolver uma poética que surge pela necessidade
de desafiar a institucionalização do circuito de arte brasileiro do momento. Seu trabalho “Você faz
parte II (Você é uma parte dela II)” de 1964 é emblemático. A instalação possui teclas gigantescas
penduradas na formação da grelha, recordando o racionalismo concretista da década anterior em
um espaço de exposição preenchido com espelhos que refletem não só o espectador, mas a própria
instituição, trazendo-os todos para a foto.

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FIGURA 62 – “Você faz parte II”, 1964, de Nelson Leirner

Fonte: Chiarelli (2013).

Outra atividade de Leiner foi a desmistificação da obra de arte como um objeto a ser adquirido e
preservado como mercadoria de luxo. Continuando seus esforços para dessacralizar arte, o artista
publicou textos em jornais, instruindo os leitores sobre como criar seus próprios exemplos de obras
que ele tinha concebido.

ATIVIDADE REFLEXIVA

A arte mostra-se presente na história da humanidade desde os tempos mais remotos. Sem dúvida,
ela pode ser considerada como sendo uma necessidade de expressão do ser humano, surgindo
como fruto da relação homem/mundo. Por meio da arte a humanidade expressa suas necessidades,
crenças, desejos, sonhos. Considerando o que foi apresentado sobre a arte no Brasil, reflita sobre
qual o papel da arte no desenvolvimento do Brasil. Para contribuir na sua reflexão sugere-se a leitura
do artigo abaixo:

Título: Arte, uma necessidade humana: função social e educativa

https://www.revistas.ufg.br/rir/article/viewFile/20333/11824

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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Do primeiro modernismo para hoje, de radicalidade em radicalidade, a arte assumiu valores que
em nada lembram nossos primeiros modernistas. Nos anos 1970, por exemplo, Cildo Meireles e
Waltercio Caldas iriam desconstruir o modelo tradicional de circuito da arte, demonstrando a sua
separação, tanto do realismo exagerado e acrítico do concretismo quanto do caráter muitas vezes
meramente catártico assumido pelo “dramático” neoconcretismo. Mas nada disso seria possível
se não fosse o impacto da experiência concreta na arte brasileira.

De lá para cá, happenings, instalações, holografias, videoarte e arte eletrônica tomam conta do
cenário das artes plásticas. Fala-se também das “media arts”, uma alcunha inglesa para batizar as
chamadas artes mídias, formas de expressão artística que se apropriam de recursos tecnológicos
das mídias e da indústria do entretenimento em geral ou intervêm em canais de difusão para propor
alternativas qualitativas ao meio. Computadores, câmeras e sintetizadores são as novas armas na
produção de arte.

Apesar de todas as desconfianças que esse tipo de produção possa despertar, a arte sempre foi
produzida com as armas de seu tempo. Nesse sentido, podemos considerar que as artes eletrônicas
representam a expressão mais avançada da criação artística atual e a melhor forma de expressão
do homem do terceiro milênio.

Há quem duvide. Mas sejamos justos, não passamos de um macaco que lançou seu osso no
espaço e este virou uma espaçonave, como no filme de Kubrick.

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GLOSSÁRIO
Cubista: relativo a, característico ou próprio de cubismo, o qual foi um estilo artístico e movimento
iniciado na primeira década do século XX, em Paris, com base em obras de Georges Braque,
Pablo Picasso e outros, tendo por princípio mais importante a substituição das representações
do espaço tridimensional (e, portanto, da perspectiva) pela apreensão simultânea das diversas
formas (decompostas e geometrizadas) que se observam dos muitos ângulos de contemplação
dos motivos de uma obra.

Expressionismo: movimento artístico que surge no final do século XIX e início do século XX em
resposta ao impressionismo. Sendo assim, buscava ter valores opostos em relação a seu predecessor;
enquanto o impressionismo se preocupava com a objetividade, o expressionismo se ocupava com
a subjetividade.

Indianismo: na literatura brasileira, o indianismo corresponde a uma das tendências literárias mais


marcantes do período romântico. O nome dessa tendência remete à figura escolhida para exaltar
aspectos nacionais: o índio, considerado o “bom selvagem”, símbolo da inocência e pureza. No
continente europeu os cavaleiros medievais eram as figuras românticas que representavam o bom
herói, idealizado, corajoso e forte. Já no Brasil, a figura romântica do novo herói era a do índio.

Zoomorfos ou zoomórficos: neste contexto, indica que os objetos possuíam características de


animais.

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BIBLIOGRAFIA
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contemporâneo e comentada por Maria Ângela Vilela. São Paulo: Ediouro, 1999.

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2013. Disponível em: http://post.at.moma.org/content_items/310-modernism-and-concretism-in-
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DOCUMENTÁRIO: BIBLIOTECA Mindlin - Um mundo e páginas. Direção: Cristina Fonseca. São Paulo:
Cristina Fonseca CineVídeo, 2010. 1 DVD.

FONSECA, Cristina. (Org.). O pensamento vivo de Fernando Pessoa. São Paulo: Martin Claret, 1986.

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MIRAMAR de Andrade. Documentário. Direção: Cristina Fonseca. São Paulo: TV Cultura, 1990.
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Disponível em: <http://mundoestranho.abril.com.br/materia/o-que-foi-a-semana-de-arte-moderna-
de-1922>. Acesso em: 18 mar. 2016.

SILVA, Leonardo Dantas. Viajantes: a paisagem vista por outros olhos. Ciência e Trópico, Recife, v.
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