Arquitetura e Percepção
Arquitetura e Percepção
Arquitetura e Percepção
MOSAICO
ARQUITETURA E PERCEPÇÃO
Abstract: The perception and environmental cognition enable the identification of needs,
expectations, values, meanings and behaviors of users in relation to the built environment.
This paper discusses the characteristics of users who influence the perception and the
perception of architecture itself through the senses of sight, touch, hearing, smell, touch and
heat. Knowing the needs and user expectations about the built environment, leads us to
analyze environments, propose solutions to improve the quality of these spaces and elaborate
architectural designs that satisfy its users, in order to be fully experienced through all the
senses.
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Professora da Universidade Estadual Paulista (UNESP). Realizou Mestrado em Geografia
com a Lívia entre março/1990 e março/1995.
Nutecca Revista Hipótese, Itapetininga, v. 2, n. 4, 2016.
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Introdução
Percepção é o ato ou a faculdade de perceber, adquirir conhecimentos
pelos sentidos: visão, audição, olfato, tato e gustação. A “percepção sempre
estará ligada a um campo sensorial e ficará consequentemente subordinada à
presença do objeto, que lhe oferece um conhecimento por conotação imediata”
(Del Rio; Oliveira, 1996, p. 203). A percepção trata da relação entre o ambiente
e seus usuários e dos estímulos provocados por esse ambiente sobre os sentidos
de seus usuários.
No entanto, a inteligência pode invocar o objeto em sua ausência,
mediante a função simbólica e, quando o objeto está presente, ela o interpreta
pelas ligações mediatas, elaboradas graças aos quadros conceituais de que o
sujeito dispõe. A cognição é: “o processo mental mediante o qual, a partir do
interesse e da necessidade, estruturamos e organizamos nossa interface com a
realidade e o mundo, selecionando as informações percebidas, armazenando-as
e conferindo-lhes significado” (Del Rio; Oliveira, 1996, p. 203). Também a
cognição envolve “a memória dos usuários incluindo suas experiências
passadas, valores e conhecimentos” (Reis, 2010).
O significado que é atribuído ao objeto percebido pode ser diferente de
pessoa a pessoa, e está em função das características individuais, dos valores,
dos símbolos, dos costumes, da cultura, da personalidade, do temperamento,
da idade, do sexo, da renda, das classes sociais e procedência, entre outros.
Ainda, com relação à percepção, Tuan (1983) chama a atenção para o fato
de que o espaço construído é extremamente variado:
Percepção da Arquitetura
Dentre os objetos percebidos, a arquitetura desperta, simultaneamente,
todos os sentidos, todas as complexidades da percepção. Arquitetura é a que
leva em conta o espaço interior. “A bela arquitetura será a arquitetura que tem
um espaço interior que nos atrai, nos eleva, nos subjuga espiritualmente; a
arquitetura feia será aquela que tem um espaço interior que nos aborrece e nos
repele” (Zevi, 1996).
A arquitetura é a arte de criar espaços para abrigar as atividades sociais,
econômicas e culturais, condicionadas ao contexto físico-geográfico-
arquitetônico, urbano e legal, e com tecnologias adequadas, podendo
proporcionar conforto, tranquilidade, seguridade, acessibilidade; beleza e vistas
agradáveis, além de permitir uma adequada acomodação e uso do mobiliário,
entre outras condições que permitam, de fato, que o espaço seja plenamente
vivenciado (Salcedo, 2009).
Somente a arquitetura permite que o olho deambule livremente por entre
os detalhes engenhosos. A arquitetura oferece as sensações táteis da textura, da
experiência da luz cambiante com o movimento, o odor e os sons que ressoam
no espaço e as relações corporais de escala e proporção. Todas essas sensações
se combinam numa experiência complexa que passa a ser articulada e a ser
específica, mesmo que sem palavras. O edifício fala dos fenômenos perceptivos
através do silêncio (Holl, 2011). O espaço engloba constantemente nosso ser:
O espaço de uma boa arquitetura nos faz sentir plenamente como seres
existenciais, desperta nossos sentidos, proporcionando percepções visuais,
auditivas, do olfato, térmica e táctil.
Percepção visual
O nervo ótico contém, aproximadamente, um número de neurônios
dezoito vezes superior ao nervo acústico; é possível, portanto, supor que tal
nervo transmita dezoito vezes mais informações. Os olhos podem chegar a ser
mil vezes mais eficazes que os ouvidos na captação de informações. O olho,
sem nenhum tipo de ajuda, recolhe uma extraordinária quantidade de
informações num raio de quase cem metros, conservando uma eficácia plena
para a interação humana, até algo mais de um quilômetro e meio (Hall, 1973).
Nas artes plásticas, a percepção visual é entendida como o
“conhecimento teórico, descritivo relacionado à forma e suas expressões
sensoriais. É uma maneira de analisar mais detalhadamente os atributos,
diferenciando os pontos relevantes e não relevantes de uma obra artística”. As
pessoas que trabalham com criação, seja um arquiteto, designer gráfico ou
artista plástico, precisam entender quais “fatores são determinantes para a
legibilidade do que se vê e como usá-los de maneira a conseguir uma
comunicação satisfatória do que se quer transmitir” (Lima, 2010).
Os fatores que afetam a percepção visual de um indivíduo são quatro:
Ressalta-se que a utilização da cor na arquitetura deve ser usada para criar
cenários, ambientes harmoniosos com a estética e com a sensibilidade
contemporânea e com as sensações espaciais a serem atribuídas ao espaço. A
cor pode influenciar na percepção visual da arquitetura. Dentre os fatores que
afetam as percepções da cor estão: características de cada cor e as sensações
espaciais produzidas, significado da cor atribuída pelas pessoas segundo suas
características (cultura, sexo, idade, entre outros) e a forma espacial. A influência
da cor em sensações espaciais é estudada por Mazillini (2003) e por Gurgel
(2005), entre outros. Sobre as características de cada cor, Gurgel (2005), em seus
estudos de cromoterapia e interiores, ressalta que o uso da cor pode influenciar
a sensação espacial24. Para Lima (2010, p. 23): “A sensação é um fenômeno
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Azul: é uma cor da natureza (céus, mares), traz tranquilidade, harmonia, paz e devoção; em
tons pastel, aumentam a sensação espacial e ajudam a acalmar; em tons escuros podem
induzir a introspecção e deprimir; em tom vivo, é poderoso e transmite paz; já em tons
acinzentados podem tornar-se monótonos. Na face Sul deve ser usado com cautela, pois
poderá passar uma sensação ainda mais fria do local; já na face Norte, pode representar um
aliado importante.
Violeta e roxo: representam sensibilidade, intuição, espiritualidade e sofisticação. Tons
escuros podem criar um refúgio e misturados a tons pastel podem criar atmosferas
interessantes.
Vermelho: a mais quente e dramática das cores, estimula os sentidos e seduz a mente.
Cuidado com uso em demasia de tons fortes, podendo deixar o espaço estressante. Em área
de refeições, estimula o apetite, esquenta o ambiente e acelera os sentidos, porém comer com
calma é o ideal.
Laranja: a energia física e dinâmica do vermelho, associada à intelectualidade do amarelo,
estimula a sociabilização e o apetite. É a cor da criatividade, do divertimento, da alegria e do
humor. Em ambientes de estudo, estimulam o raciocínio. Em tons fortes, são versáteis e dão
aconchego; em tons suaves, são delicados, esquentam levemente e dão aconchego.
Amarelo: é a cor da infância, alegre, espontânea e divertida. Estimula a criatividade, o
intelecto e o poder, além da digestão e comunicação. Interessantes para ambientes de estudo
ou leitura e não recomendada para quartos, pois dificulta o sono devido aos estímulos. Por
ter alto teor de reflexão de luz, é indicado para ambientes pequenos ou escuros.
Verde: outro tom da natureza (remete à vegetação). É a cor associada ao equilíbrio e à
harmonia, sugere honestidade, estabilidade e confiabilidade. Cor da caridade, da compaixão,
compartilhamento e esperança. Confortante e antiestresse, estimula o silêncio e pode ser
considerada neutra, quanto a temperatura. Tons pastel são indicados para ambientes de
relaxamento e não recomendados para áreas de atividades físicas.
Preto: não é considerado cor, mas atua na mente e no físico. É sóbrio, masculino e impessoal.
Diminui o tamanho dos objetos e aproxima superfícies absorve a luz e pode deprimir se
usado em excesso. Pode ser usado em qualquer composição.
Branco: neutro, simboliza a inocência, fé e pureza e está associado à alegria, à claridade e
higiene. Ideal para cozinhas, despensas, banheiros e ambientes de saúde. Aumenta o tamanho
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dos objetos e amplia os espaços, porém se usado em demasia, pode tornar o ambiente
monótono. Como o preto, pode ser usado em qualquer composição.
Cinza: associado à sabedoria e à idade, e também à fadiga e ao estresse. Quando usado em
grandes áreas, pode tornar o ambiente triste; tons de cinza diferentes num mesmo ambiente
dão movimento; compondo com cores vivas, resultados interessantes e dinâmicos são
obtidos.
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Fig. 2. MASP (Museu de Arte de São Paulo). Fig. 3. Igreja Sagrada Família, em
Fonte: Acervo autor, maio de 2011. Barcelona (Espanha).
Fonte: Acervo autor, abril de 2009.
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O CCI da UNESP, Chalezinho da Alegria, está instalado dentro do Campus da UNESP
de Presidente Prudente. Em 2009 atendia 52 crianças de 0 a 6 anos. O CCI compreende um
parquinho infantil e uma edificação térrea de 386,95 m², contendo: 5 salas de atividades,
berçário, solário, lactário, sala de enfermagem, trocador, sala de supervisão, banheiro de
funcionário, banheiro para crianças, banheiro para a supervisão, cozinha e almoxarifado.
Monteiro, Joana Fernandes; Salcedo, Rosio Fernández Baca. Avaliação pós-ocupação,
percepção e cognição ambiental no centro de convivência infantil (cci) da UNESP de
Presidente Prudente. Relatório Final, PIBIC/CNPq/Unesp. Bauru, 2009.
Fig. 7. Preferências das crianças: jogar bola. Fig. 8. Preferências das crianças:
Fonte: Monteiro, 2009. escorregador. Fonte: Monteiro, 2009.
Percepção auditiva
A audição é a percepção de sons pelos ouvidos. A acústica, a psicologia
e a psicoacústica estudam a forma como percebemos os fenômenos sonoros.
As principais variáveis do conforto acústico são: entrono (tráfego), a
arquitetura, o clima (ventilação, pluviosidade), orientação/implantação,
materiais e mobiliário. A aplicação da acústica na arquitetura é importante para
a percepção dos fenômenos sonoros como a música, o teatro, entre outros. Um
bom exemplo da arquitetura acústica é a Sala São Paulo, ver Fig. 9.
Por outro lado, o ruído definido como um som sem harmonia e que, no
geral, tem uma conotação negativa, na arquitetura pode ser amenizado com o
uso de materiais convencionais – blocos cerâmicos, bloco de
Percepção olfativa
Segundo Pallasmaa (2006), necessitamos de apenas oito moléculas de
uma substância para desencadear um impulso olfativo em uma terminação
nervosa, bem como podemos detectar mais de 10.000 odores diferentes. A
percepção olfativa engloba discriminação de odores, que diferencia um odor de
outro, o efeito de sua combinação e o alcance olfativo. Cada residência possui
seu próprio odor, característico daquele lar. Os esquimós aceitam altas
concentrações dos odores dentro do iglu, e na casa tradicional japonesa aceita-
se o odor do banho. Também há culturas em que a fumaça é sagrada e se
fomenta pela residência (Rapoport, 1972).
Ao lembrarmo-nos do cheiro da casa da avó, vêm-nos à memória gratos
momentos em família. O cheiro de um café nos lembra das reuniões com os
amigos da faculdade. Respirar é uma necessidade básica do homem. Porém, a
forma da organização dos cômodos no interior de uma residência, a
implantação da residência no lote, a disposição da janela no cômodo, entre
outros, podem permitir ou não a captação de odores. O sabor na preparação
dos alimentos numa cozinha americana pode espalhar-se pelos cômodos da
casa. Segundo a pesquisa desenvolvida em Barcelona (2009), os residentes
sentiam-se incomodados com os odores da cozinha americana, espalhados nos
ambientes do apartamento. Fig. 10.
Fig. 9. Estação Júlio Prestes: Sala São Paulo. Fig. 10. Piso 3° Habitação de Proteción
Acervo autor, 2011. Oficial Cambó 2, Barcelona, (Espanha):
Apartamentos com cozinha americana.
Legenda: 1: hall, 2: sala, 3: sala de jantar, 4:
dormitório, 5: banheiro, 6: cozinha: 7:
corredor, 8: depósito.
Fonte: Acervo autor, 2009.
Percepção térmica
Os nervos externo-receptores, localizados na pele, transmitem as
sensações de calor, frio, contato e odor ao sistema nervoso central. A pele é um
órgão sensorial por meio da qual percebemos o calor e o frio. Sem a capacidade
de percebermos essas sensações térmicas, congelar-nos-íamos no inverno e
queimar-nos-íamos no verão (Hall, 1973).
Na arquitetura, é importante a orientação das janelas para ter ambientes
com sensações térmicas confortáveis, presença do ar fresco durante o dia ou
nas noites calorosas do verão. Em climas tropicais, recomenda-se que as janelas
dos dormitórios tenham orientação leste para assimilar os raios solares da
manhã e evitar o excessivo calor da tarde.
A pesquisa desenvolvida sobre a qualidade de habitação no Edifício São
Paulo – na área central da cidade de São Paulo – com relação ao conforto
térmico expressou que a maioria das salas, salas de jantar e dormitórios têm uma
boa orientação: Nordeste, Norte e Leste, tornando esses ambientes
confortáveis. No entanto, a maioria das janelas das cozinhas está voltada para
um corredor e os banheiros possuem apenas dutos, sendo propensos à umidade
e exigindo um maior consumo de energia elétrica. Ver Fig. 11.
Percepção táctil
O tato é sentido pela pele em todo o corpo, permite reconhecer presença,
textura, forma e tamanho, temperatura dos objetos em contato com o corpo.
Entre os fatores presentes na percepção tátil estão: a discriminação da forma,
seu tamanho e textura; a dor e a temperatura. O tato não é distribuído
uniformemente pelo corpo, os dedos da mão possuem sensibilidade maior que
as outras partes do corpo, como a para a leitura do Braile; partes do corpo são
mais sensíveis ao calor, enquanto outras são mais sensíveis à dor.
Textura é a qualidade visual e táctil de certos materiais; quando temos
contato com a sua superfície, podemos perceber suas características: áspera, lisa,
rugosa, acetinada, entre outras. A textura que se enxerga visualmente se aprecia
e se valoriza quase que exclusivamente por meio do tato, com raras exceções, é
a memória das experiências tácteis as quais possibilitam apreciar a textura (Hall,
1973).
A textura é utilizada para que o ambiente possua um maior conforto
ambiental, térmico, acústico, iluminação e se encontra presente em ambientes
externos e internos como forros, paredes, esquadrias, pisos, móveis, entre
outros. Materiais como o mármore, a madeira, a pedra, água, entre outros,
propiciam experiências tácteis, atraindo o olhar e a aproximação das pessoas.
Fig. 12.
Fig. 11. Edifício São Paulo (São Paulo): Fig. 12. Palácio de Alhambra, em Granada
orientação das janelas das unidades de (Espanha): materiais diversos: madeira,
habitação social. pastilha.
Fonte: Salcedo & Arruda 2012. Fonte: Acervo autor, junho de 2009.
Considerações finais
Na avaliação pós-ocupação dos espaços construídos, na elaboração de
projetos de arquitetura, entre outros, é importante conhecer a percepção dos
usuários sobre os espaços construídos. Assim, a partir destas informações é
possível analisar os ambientes, propor soluções e melhorar a qualidade desses
espaços.
Conhecer as necessidades e as expectativas dos usuários (segundo grupos
de idade, cultura, grupos sociais, entre outros) sobre os espaços construídos,
nos leva a elaborar projetos que satisfaçam seus usuários. Propor espaços que
correspondam às necessidades sociais, econômicas, culturais, ao contexto
urbano e físico geográfico; projetar uma arquitetura com formas, tecnologias,
materiais, texturas, cores, sons, cheiros, para que sejam plenamente vivenciados
através de todos os sentidos, essa é a função da arquitetura.
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