História Da Farmácia
História Da Farmácia
História Da Farmácia
1
História da Farmácia
1
Phillippe, Adrien P. N., 1801-1858 - Histoire des apothicaires chez les principaux peuples du monde,
depuis les temps les plus recules jusqu'a nos jours, suivie du tableau de l'etat actuel de la pharmacie
en Europe, en Asie, en Afrique et en Amerique. Paris, Direction de publicite medicale, 1853.
2
1866, Silva, Pedro José da - Historia da pharmacia portugueza desde os primeiros seculos da
manarchia até ao presente: memórias publicadas na Gazeta de farmácia. Lisboa: Tip. Franco-
Portuguesa, 1866-1868.
3
Berendes, J. Die Pharmacie bei den alten Culturvolkern; historisch-kritische Studien. Halle a. S.:
Tausch & Grosse, 1891.
4
Peters, H. Der arzt die heilkunst in der deutschen vergangenheit. Mit 153 abbildungen u. beilagen
nach den originalen aus dem 15.-18. jahrhundert. Leipzig: E. Diederichs, 1900; Aus pharmazeutischer
Vorzeit in Bild und Wort. Berlin: Springer, 1886-89.
5
Schelenz, H. Geschichte der pharmazie. Berlin: J. Springer, 1904.
2
Figura: Julius Berendes (1837-1914) e Hermann Schelenz (1848-1922)
3
lógica interna consistia em considerar os farmacêuticos e o exercício farmacêutico
como sendo o objecto desta disciplina. Esta perspectiva tinha como principal
consequência o facto de considerar fora da História da Farmácia um grande número
de aspectos da História das Ciências Farmacêuticas, que seriam remetidos para o
âmbito da História da Química, da Botânica, da Biologia, etc. Esta perspectiva
choca-se frontalmente com as tendências da moderna historiografia, nomeadamente
da escola dos Annales, de busca de uma história global, acabando por limitar o
estudo da própria profissão farmacêutica, restringindo-a a um ponto de vista estreito
que não permite a sua compreensão.
4
Aspectos científicos e sociais e formas de abordar a
História da Farmácia.
Uma vez definido o objecto da disciplina, vejamos os níveis a que pode ser feito o
seu estudo. Podemos distinguir principalmente dois, que correspondem grosso
modo aos dois significados de farmácia acima referidos. O primeiro é o das
transformações sofridas pelas teorias e conceitos científicos relacionados com os
medicamentos. O segundo é o das transformações ocorridas na relação rofissional-
medicamento-sociedade Estes níveis correspondem tradicionalmente a duas formas
de encarar a História da Farmácia, uma ligada predominantemente à História das
Ciências e a outra à História Económico-Social. Actualmente, a principal tarefa da
historiografia farmacêutica é a síntese entre estas duas perspectivas, que têm
técnicas de trabalho específicas, mas que só de uma forma integrada podem
permitir a global compreensão do lugar do medicamento na história dos homens. A
integração entre a componente próxima da História das Ciências e a componente
próxima da História Económico-Social é um problema de abordagem relativamente
recente e resulta em larga medida do impacto do programa da escola dos Annales e
da viragem que se observa com o aparecimento e crescente interesse pela
Farmácia clínica. Esta mudança acontece quando as atenções deixam de estar
exclusivamente centradas no medicamento em si, para se virarem igualmente para
as relações entre o medicamento e o doente, com o consequente aumento do
interesse pelos aspectos sociais da farmácia e do medicamento6. Nestas condições,
deixou de ter sentido uma historiografia que aborde o medicamento apenas do ponto
de vista da sua composição e técnica de preparação.
Fontes históricas.
O estudo do passado não pode ser feito directamente, mas de forma mediada
através dos vestígios da actividade humana, a que é dado o nome genérico de
6
Para uma introdução aos problemas metodológicos da historiografia farmacêutica, cf. E. Hickel,
Pharmaziegeschichte als Wissenschafts- oder Sozialgeschichte ? Veroff. Int. Ges. Gesch. Pharmaz.,
47 (1979) 23-28; F. Ledermann, Retour à Urdang ? Schweiz. Apoth. Ztg., 120, 22 (1982) 526-528 e
Faire de l'histoire de la pharmacie: porquoi, comment ? Quelques éléments historiographiques et
théoriques en guise d'apologie Pharm. Acta Helv., 59, 4 (1984) 118-128; J. Esteva de Sagrera, El
envejecimiento conceptual y metodológico de la Historia de la Farmacia Bol. Soc. Esp. Hist. Farm.,
38, 149-150 (1987) 27-32.
5
fontes históricas. Embora com ligeiras cambiantes no significado, também se
utilizam termos como documentos, testemunhos, vestígios ou monumentos. As
fontes podem ser classificadas segundo vários pontos de vista, mas vamos aqui
referir apenas as fontes materiais, as escritas, as iconográficas e as orais. As fontes
materiais ou documentos figurados, constituem os vestígios materiais da actividade
humana e que incluem as fontes arqueológicas em geral, os instrumentos de
trabalho, os monumentos, as moedas, entre muitas outras. Algumas ciências
auxiliares da história são dedicadas a este tipo de fontes, como a Arqueologia, a
Numismática e a Sigilografia. No campo da História da Farmácia, estas fontes são
muito importantes e incluem aquelas (almofarizes, potes de outros artefactos de
farmácia) a cuja conservação se dedicam os museus de farmácia. As fontes escritas
são geralmente as de utilização mais geral e distinguem-se entre si pelo suporte e
técnica utilizados na escrita. No estudo das épocas Moderna e Contemporânea, as
fontes escritas utilizadas são normalmente classificadas em manuscritas (uma carta
de boticário, uma receita) e impressas (uma farmacopeia, um periódico
farmacêutico). Das fontes escritas se ocupam ciências auxiliares como a
Paleografia, a Filologia, a Epigrafia, a Papirologia, a Diplomática. As fontes
iconográficas são as que representam imagens (uma gravura, uma fotografia, um
filme). As fontes orais incluem toda a informação e tradição que é conservada na
memória dos indivíduos e transmitida oralmente de uns para outros. Estas fontes
são particularmente importantes no estudo da história dos povos primitivos.
Crítica histórica.
6
ainda se trata de um original ou de uma cópia. Em geral subdivide-se em crítica de
proveniência (que inclui a determinação da autoria, local e data da sua redacção) e a
crítica de reconstituição (que procura reconstituir o texto original de um documento
que chegou até nós na forma de cópias com erros de transcrição). Na crítica interna
ou de credibilidade procura-se determinar a veracidade da informação contida num
documento através de cinco operações: crítica de interpretação (que se confunde
em parte com a hermenêutica e através da qual se procura apreender o conteúdo do
texto, o que o autor disse, o que quis dizer e mesmo o não disse), crítica de
competência (que determina a qualidade do testemunho, através da capacidade do
autor de conhecer e compreender os factos), crítica de veracidade (que examina a
possível existência de faltas à verdade por parte do autor), crítica de rigor (que
procura detectar os erros involuntários na descrição dos factos) e verificação dos
testemunhos (em que se comparam as informações contidas no texto com as de
outros testemunhos sobre o mesmo facto).
Orientação Bibliográfica
Para além da que é indicada ao longo dos seguintes capítulos, existe uma variada
bibliografia de carácter geral que pode auxiliar o leitor a aprofundar os temas
tratados e da qual vamos apenas indicar alguns títulos mais recentes. A obra que
melhor integra a História da Farmácia no âmbito da História da Ciências e das
modernas perspectivas historiográficas é El mito de Panacea de Francisco Javier
Puerto Sarmiento[23]. As restantes histórias gerais da Farmácia, como a obra
monumental de G. Folch Jou, J. M. Sunné e J. L. Valverde[11], a edição de G.
Sonnedecker sobre o livro de Kremer e de Urdang[28] e o livro em português de J.
R. Pita[19], embora ricas do ponto de vista descritivo, são muito menos
interessantes na abordagem dos problemas. Mais abundante é a literatura de
História da Medicina. Para uma visão moderna da História Social da Medicina, ver o
livro de Roy Porter, The greatest benefit to Mankind[21], a qual inclui um repertório
7
actualizado da mais importante bibliografia em língua inglesa. O mesmo autor
escreveu uma breve síntese da história da medicina, intitulada Blood & Guts. A short
History of Medicine, traduzido para castelhano, com o título Breve Historia de la
Medicina[22]. Dirigida pelo mesmo autor e profusamente ilustrada, ver a The
Cambridge Illustrated History of Medicine[20]. Para o período até 1800, o leitor
dispõe igualmente da síntese The Western Medical Tradition[6], proveniente de
autores da mesma escola. Em castelhano, dispomos da síntese, tão curta quanto
interessante, de José Maria López Piñero, Breve historia de la medicina[16] e da
monumental Historia Universal de la Medicina, de vários autores e coordenada por
Pedro Laín, actualmente disponível em CD-ROM[15]. Do mesmo autor, existe uma
outra Historia de la Medicina, compacta mas muito informativa[14]. Igualmente muito
exaustiva, embora fortemente centrada na literatura médica, é a obra com o mesmo
título de Francisco Guerra[12]. Para a história da descoberta de novos
medicamentos nos séculos XIX e XX, o leitor dispõe dos livros de W. Sneader, Drug
discovery[27] e de M. Weatherall, In search of a cure[31]. Forma um conjunto muito
interessante e abrangente a série de dois livros de texto[9,4], e duas colectâneas de
fontes primárias e secundárias[10,3], editadas pela Manchester UP em conjunto com
a Open University para apoiar um curso desta última intitulado ``Medicina e
Sociedade na Europa, 1500-1930''. Para além das sínteses referidas, o estudante
dispõe ainda de boas obras de referência, como a Companion encyclopedia of the
History of Medicine[5] e a The Cambridge World History of Human Disease[13].
Sociedades pré-urbanas.
Figura: Pré-história
8
O emprego para fins curativos de plantas e de substâncias de origem animal data,
de acordo com vários antropólogos, do Paleolítico ou idade da pedra lascada, o
primeiro dos três grandes períodos em que se subdivide a idade da pedra, podendo
ser visualizada a sua localização na Pré-história na figura acima. O estudo das
paleomedicinas, a medicina e farmácia das sociedades pré-históricas, é feito
usualmente por analogia com outras sociedades sem escrita que ainda subsistem ou
subsistiam nos tempos modernos, dada a escassez de fontes arqueológicas. Estas
últimas resumem-se praticamente aos tecidos ósseos, donde resulta algum
conhecimento das práticas de trepanação craneana e dos hábitos alimentares. A
trepanação ou perfuração dos ossos do crâneo deixou marcas em largas centenas
de crâneos do Paleolítico japonês, do Neolítico europeu e ainda do Peru, desde o
segundo milénio a.C., sobrevivendo a sua prática até recentemente em algumas
comunidades isoladas e de povos primitivos. Ao conjunto das crenças e práticas
relacionadas com a saúde utilizadas por estes povos é dada a denominação de
Medicina Primitiva, a qual se baseia, do ponto de vista da terapêutica, numa
fortíssima componente psicológica baseada em crenças e ritos mágicos, aliada ao
emprego de plantas medicinais. As populações do Paleolítico, embora tivessem uma
esperança de vida curta, não sofriam, devido ao seu estilo de vida nómada, das
mesmas doenças que virão a afectar as sociedades sedentárias e urbanas. A baixa
densidade populacional, o facto de não se manterem nos mesmos locais o tempo
suficiente para contaminar os solos e os cursos de água e a inexistência de animais
domesticados que funcionassem como reservatórios, reduziam drasticamente o
perigo das doenças infecciosas.
9
processos tecnológicos de obtenção de alimentos continua na actualidade, como o
mostra o problema da BSE e da gripe das aves. Para além do mais, como acontece
hoje, estas novas doenças humanas transmitiam-se muito mais facilmente em
sociedades de grande densidade demográfica e de fácil contaminação ambiental. O
impacto das novas doenças epidémicas nas primeiras sociedades urbanas foi tal
que a sua marca sobreviveu na tradição oral e escrita, como a que se refere às Sete
Pragas do Egipto referidas no Antigo Testamento
10
unificado c. 3000 a.C., passou sucessivamente pelo Antigo Império (2850-2052 a.C.)
com capital em Mênfis, pelo Médio Império (2052-1570 a.C.) com capital em Tebas e
pelo Novo Império (1570-715 a.C.) com a capital primeiro em Tebas e depois em
Sais. A Mesopotâmia foi dominada pelos Sumérios (3000-1900 a.C.), pelos
Babilónios (1900-1200 a.C.) e pelos Assírios (1200-612 a.C.). O corredor sírio-
palestiniano é a região onde se instalaram os Fenícios e os Hebreus.
11
Saúde e Magia na Mesopotâmia
A doença pode ter lugar quando os deuses retiram a protecção, devido à magia
negra ou, na Suméria, simplesmente em resultado do destino. Várias causas
naturais são conhecidas, mas consideradas acessórias. Os espíritos malignos
causadores de doenças, os Edimmu ou Ekimmu, são os espíritos dos mortos que
não conseguiram descansar, os mortos por enterrar, a que não se dedicavam
oferendas ou que não tinham cumprido a sua missão na terra, os Lilû, Lilîtinou e
Ardatlilî (resultantes da união entre demónios e humanos) ou outros deuses
inferiores ou diabos. Entre estes contam-se Nergal, causador da peste, Ashakku, da
7
«Febre (Ashakku) no homem, invadiu a sua cabeça.
12
Desta visão resultavam práticas de diagnóstico e terapêuticas específicas. O
objectivo do diagnóstico consistia em saber que pecado o doente cometera, que
demónio se apoderara do seu corpo e quais os propósitos dos deuses, por técnicas
de adivinhação (piromancia, hepatoscopia, oniromancia, presságios a partir de
nascimentos anormais de homens e animais e astrologia), encaradas como forma
pelas quais os deuses manifestavam a sua vontade. A terapêutica visava a
reconciliação com os deuses, através da oração e de sacrifícios, assim como a
expulsão dos demónios, recorrendo a encantamentos e purificações por magia. Os
deuses a quem os povos mesopotâmicos se dirigiam eram Ea8, Marduk9, os deuses
da doença e de doenças específicas e os deuses pessoais ou deuses protectores10.
As preces eram dirigidas a deuses intermediários que intercediam junto dos grandes
no tribunal dos deuses. Por mandato de Ea, os sacerdotes representavam o doente
perante este tribunal. Os sacrifícios podiam ser alimentícios (dos deuses),
expiatórios (destruição de bens) e substitutivos (do homem). Os encantamentos e
purificações por magia eram dirigidos ao tribunal dos deuses ou directamente contra
os demónio, podendo ser profiláticos, com o recurso a amuletos.
8
Ea, na Babilónio, ou Enki, na Suméria. O seu reino é o oceano de água doce sob a terra,
fonte da vida. É o Deus da sabedoria e da arte mágica, criador da vegetação e dos seres
humanos.
9
Deus tutelar da Babilónia, senhor dos deuses. Deus da luz, do exorcismo, da arte de curar e da
sabedoria.
10
Estes são os deuses confidentes e amigos, os primeiros a quem é pedida intervenção. Não agem
directamente, mas intercedem junto de deuses poderosos, como Marduk e Ea
13
cobriu o ``corpo como um manto'' e que, dado por morto, foi roubado dos seus bens
e sujeito à chacota dos seus inimigos. Porque é que os deuses o desampararam ?
Para o seu autor, tão-somente porque os juízos dos deuses são por vezes
insondáveis:
• O culto de Asclépio.
• Bases filosóficas da Teoria dos Humores.
o As escolas pré-hipocráticas.
• Hipócrates.
o Patologia geral, terapêutica e ética hipocráticas.
o Aristóteles e a ciência peripatética.
14
O culto de Asclépio.
Figura: Asclépio
A Medicina racional grega não implicou uma ruptura com as crenças mágico-
religiosas, mantendo-se um florescente culto a Asclépio, depois latinizado como
Esculápio. Asclépio é filho de Apolo e da ninfa Coronis. Como deus solar (não o
deus do sol: Hélios), Apolo é também deus da saúde (Alexikakos), devido às
propriedades profilácticas do sol. O facto de Apolo ter tirado o filho do ventre da mãe
no momento em que esta se encontrava na pira funerária, confere-lhe o simbolismo
de deus da medicina logo à nascença: a vitória da vida sobre a morte. A arte da
medicina foi-lhe ensinada pelo centauro Quirón e uma serpente ensinou-lhe como
usar uma certa planta para dar vida aos mortos. Acusado de diminuir o número dos
mortos, Asclépio foi morto por um raio de Zeus. Esta saga heróica, cantada pelo
poeta Píndaro (ca.522-443a.C.), traduziu-se depois na deificação de Asclépio,
transformado em Deus e tornado imortal por vontade divina. O seu culto terá
começado em Epidauro, mas também existiam templos ou santuários (asklépieia)
em outros locais, como Kos, Knidos e Pérgamo, onde os sacerdotes se dedicavam à
cura de doentes. Asclépio é representado com o caduceu, bastão com uma serpente
enrolada. Dos filhos de Asclépio e de Epione são particularmente importantes
Panaceia e principalmente Higeia, a qual foi intimamente associada ao culto a seu
pai. A cura nos templos de Asclépio era feita através da incubatio, que consistia em
os doentes passarem a noite no templo, normalmente em grupo, onde eram
visitados individualmente pelo deus nos seus sonhos. Este curava-os dando-lhes
15
indicações a seguir no seu tratamento ou praticando um milagre, que tomava a
forma de uma administração de medicamentos ou de um acto cirúrgico, praticado
pelo próprio deus. O enorme número de pedras votivas encontradas nas imediações
dos templos, agradecendo a intervenção e a cura dos deuses, mostra que a crença
no seu culto era muito difundida e foi muito persistente no tempo. Também é
interessante referir que as pedras votivas referem diferentes intervenções de
Asclépio em diversos períodos. Assim, nas pedras encontradas em Epidauro e
datando do Séc. IV a.C., a intervenção de Asclépio é feita prestando directamente
cuidados curativos, enquanto nas de Pérgamo, datando do Séc. II d.C., ele se
limitava a indicar qual a prescrição a ser seguida pelo doente quando saísse do
templo. A ausência de incompatibilidade entre a medicina racional grega e o culto de
Asclépio é atestada pelo facto de este ser geralmente considerado o patrono dos
médicos, um papel que seria anterior ao da difusão do seu culto como deus. O
próprio juramento de Hipócrates se inicia com a invocação aos deuses: ``Juro por
Apolo médico, por Asclépio, por Higeia e Panaceia, por todos os deuses e deusas,
fazendo-os minhas testemunhas, que eu cumprirei inteiramente este juramento de
acordo com as minhas capacidades e discernimento’’ [7]. O voto de pureza11 do
juramento é também uma estatuição presente numa inscrição epigráfica em
Epidauro: ``Puro deve ser aquele que entra neste fragrante templo''.
11
``Guardarei a minha vida e a minha arte na pureza e na santidade''
16
desses elementos. Para ele, a doença era provocada por desequilíbrio entre esses
elementos na constituição do corpo humano.
As escolas pré-hipocráticas.
Hipócrates.
Hipócrates de Kos (460-370 a.C.) nasceu nesta ilha jónica, sendo filho de um
asclepíade de nome Heráclides, de quem recebeu a formação médica básica. Foi
contemporâneo de Péricles, de Empédocles, Sócrates e Platão, entre muitas outras
figuras do florescimento intelectual ateniense. Sócrates e Aristóteles referiram-se
elogiosamente a Hipócrates.
17
Patologia geral, terapêutica e ética hipocráticas.
18
vieram posteriormente a ter. Os medicamentos eram encarados como um recurso
secundário.
12
Uma interpretação detalhada do Juramento pode ser vista em L. Edelstein. The Hippocratic Oath:
Text, translation and interpretation. Ancient Medicine. Baltimore: The Johns Hopkins Press, 1987. pp.
3-63.
.
19
Aristóteles e a ciência peripatética.
A teoria dos quatro elementos, em que assenta a teoria hipocrática dos quatro
humores, embora devida a autores como Empédocles e outros, ficou conhecida
como uma teoria de Aristóteles, filósofo grego que a defendeu vigorosamente.
Aristóteles (384-322 a.C.) foi discípulo de Platão e professor de Alexandre, ficando
conhecido como mestre dos que sabem As suas ideias influenciaram o Ocidente
cristão até à Idade Moderna, sendo dominantes, por exemplo, na Universidade de
Coimbra até à reforma de Pombal em 1772. A Escola de Aristóteles ficou conhecida
como Escola Peripatética devido ao facto de o ensino no Liceu que ele fundou em
Atenas ser ministrado enquanto os alunos passeavam no peripaton.
• A Escola de Alexandria.
• Medicina greco-romana.
• Dioscórides.
• Galeno.
• A utilização de drogas e especiarias na Antiguidade
• Profissões da área farmacêutica.
o Grécia.
o Roma.
A Escola de Alexandria.
A Medicina grega foi levada para o Egipto e Ásia Menor por via das conquistas de
Alexandre (356-323 a.C.). A fundação de Alexandria em 332 a.C. deu origem a um
novo centro da cultura helénica, onde se preservaram os escritos hipocráticos e das
várias escolas médicas gregas na famosa biblioteca do mouseion, fundado por
Ptolomeu I c. 285 a.C. A escola médica que aí se desenvolveu teve como expoentes
maiores os médicos Herófilo e Erasístrato. Formaram-se várias seitas médicas em
20
Alexandria e foi aí que, como já foi referido, Baccheio de Tanagra reuniu os escritos
hipocráticos.
Medicina greco-romana.
Aulo Cornelio Celso (c. 25 a.C.-c. 40) não era médico mas conhecia bem a medicina
greco-romana sobre a qual escreveu um tratado intitulado De medicina octo libri,
dividido segundo um critério terapêutico, dietético, farmacêutico e cirúrgico, que
permaneceu desconhecido até ser descoberto pelo papa Nicolau V no século XV e
foi o primeiro livro médico a ser impresso (Florença, 1478). Scribonius Largus (fl. 10-
50) foi médico do imperador Cláudio e escreveu o De compositiones
medicamentorum, que é um verdadeiro formulário farmacêutico, no qual indica a
utilização de alguns medicamentos simples, simplicia, e de grande número de
medicamentos compostos, composita. Scribonius faz grande apologia da utilização
dos medicamentos. Ainda no séc. I, uma grande fonte de informação foi Plínio o
velho (23-79), um militar que procedeu a uma compilação enciclopédica dos
conhecimentos do seu tempo sobre os reinos animal, vegetal e mineral na Naturalis
Historia, constituída por 37 livros e baseando-se, segundo o próprio autor, na
consulta de mais de 2.000 obras.
Dioscórides.
21
em cinco livros, nela se descrevem cerca de 600 plantas, 35 fármacos de origem
animal e 90 de origem mineral, dos quais só cerca de 130 já apareciam no Corpus
hippocraticum e 100 ainda são considerados como tendo actividade farmacológica.
A sua influência foi enorme até ao século XVIII, existindo inúmeras traduções do
grego para um grande número de línguas[25].
Galeno.
Galeno (129-200) nasceu em Pérgamo quando esta era colónia romana e aí estudou
Medicina14. Foi médico de gladiadores e foi viver para Roma em 161, onde veio a
atingir uma posição conceituada, vindo a ser nomeado médico do filho do imperador
Marco Aurélio, Cómodo, que foi igualmente imperador em 180. Galeno baseou-se na
Medicina hipocrática para criar um sistema de patologia e terapêutica de grande
complexidade e coerência interna.
13
Sobre Dioscórides, ver também a breve síntese de J. M. Riddle no Dictionary of Scientific
Biography, vol. 4, pp. 119-123.
.
14
DSB, vol. 5, pp. 227-237.
22
à qual se tornava necessário classificar os medicamentos. Assim, tendo em vista
utilizar os medicamentos que tivessem propriedades opostas às da causa da
doença, Galeno classificou-os em três grandes grupos, segundo um critério
fisiopatológico humoral: o primeiro grupo incluía os simplicia, aqueles que possuíam
apenas uma das quatro qualidades, seco, húmido, quente ou frio, o segundo grupo
era o dos composita, quando possuíam mais do que uma e por fim o terceiro grupo
incluía os que actuavam segundo um efeito específico inerente à própria substância
como os purgantes os vomitivos e outros. Foi na forma de galenismo que a Medicina
greco-romana passou para o Ocidente cristão, dominando a Medicina e a Farmácia
até ao Século XVII e mantendo ainda uma grande influência mesmo no século XVIII.
Para a determinação das qualidades, tanto presentes nas doenças como nos
medicamentos, a patologia e a farmacologia galénicas recorriam aos caracteres
organolépticos, principalmente ao sabor e ao odor. Assim, aos quatro gostos
primários, amargo, azedo, salgado e doce, correspondiam respectivamente os pares
de qualidades Quente e Seco, Seco e Frio, Frio e Húmido e Húmido e Quente na
patologia galénica. Na farmacologia, encontra-se a mesma correspondência, à
excepção do gosto salgado, que era usualmente quente e seco[29]. Naturalmente,
as especiarias, pelas fortes percepções gustativas e olfactivas causadas, não só se
tornavam mais fáceis de classificar como evidenciavam uma forte actividade
farmacológica. Assim, segundo Galeno, os coentros tinham uma qualidade
moderadamente quente, por serem ligeiramente doces e adstringentes. Neste
23
quadro teórico, é fácil de compreender a utilização terapêutica da pimenta nas dores
de cabeça. Sendo uma droga quente e seca, seria adequada para o tratamento de
afecções provocadas por uma concentração excessiva de Linfa (Fria e Húmida) na
cabeça. Este tratamento é descrito numa conhecida passagem da Crónica de
D. Dinis. A uma dona da Rainha D. Isabel que padecia de ``huma dor muy má, que
lhe vinha a tempos'', era-lhe lançada ``pimenta muyda pelos narizes'', depois de
atada de pés e mãos.
24
Profissões da área farmacêutica.
Subsecções
• Grécia.
• Roma.
Grécia.
15
E. Kremers e G. Urdang, op. cit., pp. 20-21 e Ap. 7; J. M. Riddle, op. cit., pp. 5-6.
25
introduza a proibição do uso da faca pelo médico, o que não é mais que uma
manifestação da tendência para a ascensão da medicina através da separação das
componentes funcionais que implicavam trabalho manual, como a cirurgia. Esta
tendência terá o seu ponto mais alto na Idade Média com a ascensão da Medicina
ao ensino nas Universidades, acompanhada da clara demarcação em relação à
Cirurgia e à Farmácia, que permanecem como actividades mecânicas.
Roma.
26
A cristianização do mundo antigo.
Ao reinado de Augusto, imperador absoluto de 31 a.C. até 14 d.C., seguiram-se
quatro dinastias governando a Pax Romana em todo o império. Foi o Alto Império.
Em 235, com o assassínio de Severo Alexandre, iniciou-se o Baixo Império, dividido
em Baixo Império pagão (235-305) e Baixo Império cristão (306-476). O Baixo
Império cristão iniciou-se com o reinado de Constantino, que concedeu a liberdade
de culto aos cristãos através do Édito de Milão (313 d.C.) e fundou a cidade de
Constantinopla em Bizâncio.
Subsecções
• Doença e pecado
• Dor, sofrimento e religião curativa
• A condenação do culto de Asclépio
• Herança da Filosofia e Medicina clássica
• O culto dos santos
Doença e pecado
27
Cristo, que se compara a si próprio com um médico16. Recorrendo a uma analogia
cara aos filósofos clássicos pagãos, que se consideravam médicos da alma, os
padres da igreja vêem-se como medici animarum, seguindo o exemplo daquele que
é simultaneamente o médico e o medicamento: o Christus medicus.
16
"Não são os que têm saúde que necessitam de um médico, mas sim os doentes" (Mateus 9, 12;
Marcos 2, 17; Lucas 5, 31). A mesma ideia é repetida nos Actos dos Apóstolos: "Pelas suas feridas
fostes curados".
17
A manutenção da relação entre pecado e doença continua presente no Novo Testamento, sendo
manifesta nos casos dos paralíticos de Cafarnaum e da piscina de Bezatha ou Bethesda. No primeiro
caso, Jesus começa por afirmar ``Meu filho, os teus pecados estão perdoados'' ainda antes de o curar
com ``Levanta-te e caminha'' (Mateus 9, 1-7; Marcos 2, 1-12; Lucas 5, 17-26). No segundo caso,
Jesus diz-lhe mais tarde quando o encontra no Templo: ``Foste curado, não voltes a pecar, para que
não te suceda alguma coisa pior'' (João 5, 1-14).
18
A visão judaica dominante encontra-se manifesta na perplexidade dos fariseus "Tu nasceste
coberto de pecados e dás-nos lições ?" (João, 9, 34) e na pergunta dos discípulos ``Mestre, quem
pecou para que este homem tenha nascido cego, ele ou os seus pais ?''.
28
parte o sofrimento, incluindo a dor física causada pela doença. Desta forma, como
nas culturas anteriores, a doença continua a ser causada pela divindade mas,
contrariamente ao que se passava no mundo pagão, a doença deixava de ser um
mal absoluto, provocado por uma entidade sobrenatural, mas que podia ser anulado
por uma outra. O Deus único do Cristianismo visava o bem último mesmo quando
aparentemente causava o mal. O sofrimento do Novo Testamento tem um objectivo:
é usado por Deus para o bem e a maturidade espiritual dos seus filhos, para corrigir
certos pecados ou fraquezas, como a gula, para aumentar o auto-conhecimento e
estimular as graças cristãs, como a humildade, a paciência e a fé. É esta uma das
ideias que são caras no uso da medicina como metáfora. Da mesma forma que,
para atingir a cura final, o médico acentua a necessidade de recurso a um regime e
meios terapêuticos rigorosos e frequentes vezes penosos, também Deus exige uma
conduta de vida pura e pode mesmo enviar o sofrimento, para que o homem alcance
a vida eterna.
29
Herança da Filosofia e Medicina clássica
30
juntamente com os próprios deuses, para o cristianismo, tanto o homem como a
natureza, a terra, os astros, os animais e as plantas, eram criaturas de Deus e
existiam em resultado da vontade divina. Desta forma, o mundo é necessariamente
bom enquanto produto de Deus e do seu plano para a salvação. O corpo é também
ele criação de Deus e deve ser cuidado e preservado do pecado. Se o Verbo se fez
carne é porque esta não se tornou maligna, mesmo depois da expulsão do Paraíso.
Central para a atitude dos padres da Igreja face à medicina é o entendimento que o
mundo material foi criado por Deus para ser usado por e para o homem. A divina
Providência concedeu ao homem os meios materiais para sobreviver fora do
Paraíso, incluindo a sabedoria e o conhecimento para os utilizar. ``Todo o
conhecimento vem de Deus''19, citou Orígenes para sublinhar a origem divina da
medicina e a sua qualidade de ``benéfica e essencial para a humanidade''. A
medicina é boa enquanto parte do mesmo plano para socorrer o homem na terra.
Orígenes, Clemente, Gregório de Nissa, João Crisóstomo e Santo Agostinho, todos
eles entendem que a medicina é um bem concedido por Deus que os cristãos não
devem ignorar. O pecado em que estes poderiam incorrer seria o de pôr toda a sua
fé na medicina e não em Deus ou o de a aflição pelo sofrimento e a busca da cura
fazer esquecer o carácter efémero da doença terrena e o bem supremo da vida
eterna.
31
lícito, o culto dos santos, e o ilícito, a superstição, a bruxaria e todas áreas do foro
da demonologia. Figura marcante que coroa todo este processo foi o Papa Gregório
I (590-604), que simultaneamente deu forma definitiva ao Catolicismo com a sua
jurisdição universal sobre o povo cristão e promoveu as suas principais
manifestações culturais medievais, como o monasticismo, as virtudes ascéticas, o
culto dos santos e das relíquias e a demonologia. Entre os santos cujo culto se
desenvolveu desde a antiguidade contaram-se vários anargyroi, médicos que
curavam sem dinheiro, como os Santos Cosme e Damião, irmãos martirizados sob o
imperador Diocleciano (284-305), que seriam os santos padroeiros das profissões de
saúde durante as Idades Média e Moderna.
Medicina Bizantina.
32
romano do Ocidente, de língua latina. O Império romano do Oriente ou Bizantino, de
língua grega, manteve-se até à conquista de Constantinopla pelos turcos em 1453.
O Império romano do Oriente manteve a língua e a cultura grega como dominantes.
Os locais onde se cultivava a ciência e a cultura médicas eram Alexandria, Atenas,
assim como Constantinopla e várias localidades da Ásia Menor. Entre os médicos
bizantinos destacaram-se vários autores de obras médicas de carácter
enciclopédico.
As heresias do Séc. V.
33
muitos médicos e outros homens de ciência, que levaram consigo grande número de
obras científicas em grego. Em Gundishapur, onde desde o século III existia um
centro de estudos, concentraram-se os nestorianos expulsos de Edessa, aos quais
se vieram depois juntar os sábios da escola de Atenas, encerrada por Justiniano
(527-565) em 529. Estes emigrados do Império bizantino iniciaram um movimento de
tradução das obras científicas gregas, primeiro para o siríaco e mais tarde para o
árabe.
A ascensão do Islão.
A medicina árabe era pouco desenvolvida no início da expansão do Islão, tendo sido
o contacto com os sábios nestorianos que a elevou e lhe permitiu atingir grande
importância nos séculos seguintes. Contudo, não é de desprezar o papel da religião
34
no desenvolvimento da medicina islâmica, não só por identificar várias práticas
sanitárias com cerimónias rituais e regras religiosas, mas principalmente por atribuir
à prática e ao conhecimento médico um elevado conteúdo ético e religioso. Para o
hakim, o médico islâmico, a assistência aos doentes e a contínua busca do
conhecimento eram ambas obrigações para seguir o caminho da salvação. O início
do apoio dado pelos dirigentes islâmicos à medicina grega corporizada pelos
médicos nestorianos, costuma ser identificado com a cura do califa de Bagdá al-
Mansur em 765 pelo médico Girgis ibn Gibril do hospital nestoriano de Gundishapur,
em resultado da qual o califa terá ordenado a tradução do grego para árabe de
vários autores médicos clássicos. Entre os médicos nestorianos que iniciaram essa
tarefa destacam-se os nomes de Abu Zakariya Yuhanna ibn Masawayh (777-857),
conhecido na Europa por Mesué o velho João Damasceno e do seu discípulo Abu
Zayd Hunayn ibn Ishaq al-Ibadi (808-873), latinizado como Johanitius. Ambos eram
filhos de farmacêuticos nestorianos e exerceram em Bagdade, onde Hunayn dirigiu
uma escola de tradutores, onde foram traduzidas do grego e do sírio para árabe
obras de Aristóteles, Hipócrates, Dioscórides, Galeno e outros autores.
Al-Kindi (c.801-c.866), de seu nome completo Abu Yusuf ya qub ibn Ishaq Al-
Sabbah21, viveu em Bagdade, onde foi contemporâneo da primeira geração de
tradutores da literatura grega para o árabe e chegou a ser encarregado da educação
do filho do califa. Como autor, Al-Kindi dedicou-se à filosofia e à ciência, de um
ponto de vista enciclopédico. Escreveu, além de muitas outras obras de filosofia e
ciência, várias de cunho farmacêutico como um Aqrabadhin, um formulário
20
Cf. P. Johnstone, Galen in Arabic: the transformation of Galenic pharmacology in V. Nutton, Galen:
Problems and prospects, London, WIHM, 1981, pp. 197-212.
.
21
J. Jolivet e R. Rashed, DSB, vol. 15, pp. 261-267.
35
organizado por formas farmacêuticas. Os formulários árabes foram bastante
numerosos. Em data próxima do de Al-Kindi, foi igualmente redigido o al-Agrabadhin
al Kabir de Sabur ibn Sahl (fl. 869), e o Risala i ma'ria quwwat al-adwiyat al-
murakkaba, traduzido para latim por Gerardo de Cremona com o título De
medicinarum compositarum gradibus investigandis, onde, como o título indica, se
dedica ao estudo dos graus de intensidade das qualidades (frio, húmido, etc.) dos
medicamentos compostos. Este problema fora anteriormente tratado pelos autores
clásssicos, como Galeno, apenas para os medicamentos simples. Al-Kindi propôs
resolver o problema com uma fórmula matemática através da qual a Intensidade de
uma qualidade seria igual ao logaritmo de base 2 da proporção entre essa qualidade
e a oposta no medicamento composto.
Ex:
I=log
22
E. S. Kennedy, DSB, vol. 2, pp. 147-158.
.
36
Ibn Sina, ou Abu 'Ali al-Husayn ibn 'Abdallah, conhecido no Ocidente como Avicena
(980-1037) nasceu na Ásia central e faleceu em Hamadan, na Pérsia. Foi médico,
jurista, professor e ocupou cargos políticos. A sua obra é enorme, quase 270 títulos
tratando de filosofia e ciência. A sua classificação das ciências naturais ou físicas
previa oito ciências principais e sete subordinadas. Nestas última incluía a Medicina
(al-tibb) e a Alquimia (al-kimya'). A principal obra médica de Ibn Sina é o
enciclopédico al-Qanun ou Canon, mais considerado no seu tempo que a obra de
Razés ou de Galeno23. A parte farmacêutica encontra-se nos livros II e V que tratam,
respectivamente, da matéria médica e dos medicamentos compostos. O Livro II
encontra-se dividido em duas partes, a primeira tratando das propriedades das
drogas, incluindo as qualidades, virtudes e modos de conservação, e a segunda
contendo uma lista de fármacos ordenados alfabeticamente, com as suas virtudes
terapêuticas. O al-Qanun foi traduzido para latim por Gerardo de Cremona e teve
várias edições24.
23
A. Z. Iskandar, DSB, vol. 15, pp. 498-501.
24
As primeiras foram as de Milão, 1473, Pádua, 1476 e 1479, Veneza, 1482 e 1486.
25
J. Vernet, DSB, vol. 1, pp. 538-539.
37
terminada por volta do ano 1000. Aí trata de medicina, de cirurgia, de farmácia,
matéria médica, química farmacêutica e cosmética, entre muitos outros assuntos.
Abulcassis enriqueceu o conhecimento da matéria médica com descrições da flora e
fauna ibéricas e tratou da preparação e purificação de várias substâncias químicas
medicinais. O capítulo XXVIII do Tasri foi traduzido para latim com o título de Liber
servitoris e foi muito apreciado, nomeadamente devido à sua informação sobre
medicamentos químicos26.
O mundo árabe foi o primeiro a desenvolver uma divisão de trabalho entre médicos
e farmacêuticos. Em Bagdade estabeleceram-se estabelecimentos de venda de
drogas e medicamentos. Muitos desses estabelecimentos seriam dirigidos por
comerciantes de fraca preparação técnico-científica, o al-attar, mas desde o séc. VIII
que também passou a existir um outro profissional de mais elevada formação, o
Sayadilah.
26
S. Hamarneh, DSB, vol. 14, pp. 584-585.
27
J. Vernet, DSB, vol. 14, pp. 112-113.
28
J. Vernet, DSB, vol. 14, pp. 112-113.
29
S. Hamarneh, DSB, vol. 14, pp. 637-639.
38
A Medicina e a Farmácia no Ocidente Cristão
39
religiosos a estudar a terapêutica pelas plantas medicinais. Isidoro de Sevilha (c.
560-636) foi bispo da cidade por cujo nome ficou conhecido. Para além de vários
temas de religião, escreveu a obra enciclopédica Etymologiarum Libri XX,
compendiando em vinte livros os conhecimentos do seu tempo sobre as artes e as
ciências. Esta obra parece ter sido escrita para o ensino na escola fundada por
Leandro, bispo de Sevilha e irmão de Isidoro, que este também dirigiu e que
constituiu um importante centro de cultura. Alguns livros desta obra são dedicados à
Medicina, ao corpo humano, à História Natural e à dietética. Isidoro de Sevilha
atribui um lugar de destaque à Medicina entre as artes liberais, o que levou o bispo
Teodulfo de Orleans (f. 821) a proclamá-la como a oitava arte liberal, digna de ser
ensinada nas escolas monásticas (nos próprios mosteiros) ou nas escolas
episcopais ou catedralícias (em seminários), junto com as sete que constituíam o
trivium (gramática, retórica e dialéctica) e o quadrivium (aritmética, geometria,
música e astronomia). A partir do século IX, a Medicina começou a ser ensinada no
quadrivium, integrada na Physica. Daqui foi originada a denominação de físicos, pela
qual eram conhecidos os médicos na Idade Média. Além de outros autores religiosos
que escreveram sobre Medicina, destacamos ainda Hildegarde de Bingen (1098-
1179), que foi abadessa do Convento beneditino de Disibodenberg e fundou o de
Ruperstsberg, perto de Bingen. Escreveu textos sobre o uso medicinal de plantas,
animais e vegetais e descrevendo as doenças e os seus medicamentos seguindo a
ordenação denominada ab capitae ad calcem (da cabeça aos pés). Entre os
aspectos que tornam a obra de Hildegarde singular destaca-se a sua atenção aos
problemas do foro ginecológico, numa perspectiva que se chocava com a visão
tradicionalmente negativa da mulher na cultura medieval.
Salerno.
Por volta do século X foi criada em Salerno uma Civitas Hippocratica, uma
comunidade de médicos que estudava, compendiava e ensinava a medicina.
Tratava-se de um centro laico, embora em estreita ligação com o mosteiro de
Montecassino. Pouco se sabe da sua fundação, à excepção de uma lenda que a
atribuía a quatro médicos, Ponto, grego, Helinus, judeu, Adela, árabe e Salernus,
latino, a qual, se a mais não corresponder, reflecte as influências culturais presentes.
As primeiras figuras da escola foram Garioponto (c. 970-1050), autor de uma
40
epítome de textos bizantinos denominado Passionarius Galeni e Alfano (c. 1015-
1085), médico que aprendeu em Montecassino e foi arcebispo de Salerno, cuja obra
é igualmente de influência bizantina e greco-síria. A influência médica árabe e o
consequente amadurecimento da personalidade própria do Studium Salernitanum
dá-se em finais do século XI com Constantino o Africano (c. 1020-1087). Natural de
Cartago, dedicou-se ao comércio de drogas e viajou entre o Oriente e a Europa até
se instalar em Salerno, trazendo consigo uma selecção de vários manuscritos
médicos árabes. Munido de uma carta de recomendação do arcebispo Alfano, foi
recebido no mosteiro de Montecassino, onde se converteu ao cristianismo. Na
qualidade de irmão leigo, traduziu várias obras médicas importantes do árabe para o
latim, num total de cerca de três dezenas de textos, durante os anos seguintes.
Das obras nascidas da Escola de Salerno durante os séculos XII e XIII, destacamos
apenas algumas. O Tractatus de aegritudinum curatione é uma obra colectiva onde
se reúnem os ensinamentos sobre medicina geral de vários mestres de Salerno. As
doenças encontram-se dispostas na ordem já referida da cabeça aos pés. Entre os
autores citados, encontra-se uma mulher, Trotula, a quem se deverá parte da obra
De passionibus mulierum, que trata de ginecologia, obstetrícia e cosmética. O
conjunto dos ensinamentos ministrados aos estudantes de Salerno encontram-se
patentes nas diferentes versões das Articella, um conjunto de textos didácticos que
incluem normalmente a Isagoge de Johanitius, a In arte parva de Galeno, o
Prognostikón de Hipócrates, o Liber pulsum de Philaretros e o Liber urinarum de
Teophilus. Algumas versões incluem outros textos, como os Aforismos de
Hipócrates e parte do Canon de Avicena. As Articella influenciaram grandemente o
ensino médico por toda a Europa, constituindo o corpo de doutrina médica utilizado
inicialmente nas Universidades e foram impressas pela primeira vez em Pádua em
1476. Muito conhecido foi também o Regimen Sanitatis Salernitanus ou Flos
medicinae (c. 1300), um grande poema com cerca de 360 versos, de que se
conhecem três centenas de edições em várias línguas, sendo a primeira impressa a
de Pisa, em 1484. Inclui um conjunto de conselhos relativos a higiene e saúde que
tiveram grande e prolongada influência, tanto na medicina erudita como na popular.
41
palavras com que se inicia o texto. O primeiro contém umas 140 fórmulas
farmacêuticas ordenadas alfabeticamente e um apêndice sobre pesos e medidas.
Foi um dos receituários mais utilizados por médicos e farmacêuticos durante a Idade
Média. Em 1322 a Faculdade de Medicina de Paris determinou ser obrigatória a sua
existência em todas as boticas. O segundo inclui mais de duas centenas e meia de
artigos referentes a drogas medicinais igualmente dispostas alfabeticamente, onde
trata das suas propriedades, etimologia e história. Ambos foram repetidamente
editados em conjunto durante o século XVI.
Toledo.
42
Toledo e sem passar pelo árabe, é de referir o trabalho de Burgundio de Pisa (1110-
1193), que traduziu directamente do grego ao latim os Aforismos de Hipócrates e
vários livros de Galeno, incluindo o Methodus medendi.
• As universidades.
• Separação das profissões médicas.
As universidades.
A Escola de Salerno foi o centro da formação médica na Europa até finais do século
XII. Os médicos aí formados espalharam-se por todo o continente ao mesmo tempo
que se criavam as universidades e se desenvolvia o ensino da Medicina. Algum
ensino médico começou a ser ministrado ainda nas escolas clericais, a partir da
divisão da última arte do quadrivium, a astronomia, em duas partes, uma
extraterrestre, a astronomia propriamente dita, e outra terrestre, a física. A Medicina,
como parte fundamental desta última, integra-se no conjunto do sistema universal do
saber e da filosofia e desta forma deixa de ser um mero ofício manual. Esta
43
tendência, a que já se assistira no mundo árabe, aprofunda-se no mundo cristão,
apoiando-se no novo corpo teórico de conhecimentos trazidos igualmente do mundo
islâmico por via de Salerno e Toledo. A criação das universidades nasce da
necessidade de professores e alunos criarem uma estrutura própria, diferenciada
das estruturas clericais originais, capaz de afirmar o seus direitos e privilégios. Em
Salerno e Montpellier, foram os professores médicos que estiveram na origem do
impulso para a criação das universidades, mas em regra foram outras faculdades
que dominaram a criação dos studium generale. Em Montpellier, a escola médica foi
autorizada em 1180, mais de cem anos antes da criação da própria universidade.
Em Paris, a Universidade foi criada por volta de 1200, a partir da respectiva escola
catedralícia, sendo dominada pelos teólogos. Na universidade de Bolonha
dominavam inicialmente os juristas. Na de Oxford, prevaleciam os teólogos. Em
todas estas universidades as faculdades de medicina só foram criadas mais tarde.
No ensino da medicina, o estudante passava por três fases, cada uma das quais
correspondendo a um título: bacharel, licenciado e magister, este substituído mais
tarde pelo título de doutor. O bacharelato era obtido através de um ou mais exames,
depois de quatro anos de estudos, um em Artes e três em Medicina. O licenciado
tinha que desenvolver um certo número de textos na forma de lições próprias, assim
como assistir a três séries de lições teóricas e uma prática. Este título dava direito
(licença) ao exercício da Medicina. Para ensinar na universidade tinham que obter o
título de magister, através de um período de prática e da submissão a dois novos
exames. No século XIII, depois de este título ter sido introduzido na Faculdade de
Direito em Bolonha, o título de doutor começou a ser igualmente concedido,
substituindo o de magister nas faculdades de Medicina. Embora se destinasse de
início aos que iam ensinar nas universidades, também passou a ser atribuído a
outros médicos.
44
aumentando a sua perícia e formação técnica e perdendo progressivamente o
carácter ambulante, à medida que, a partir do século XI, a formação médica em
geral e a assimilação do saber médico greco-romano aumentavam e que as
condições económico-sociais, o desenvolvimento do comércio e crescimentos das
cidades, o permitiam. O processo de nobilitação da profissão médica, associado ao
domínio do latim e ao ensino universitário, implicava o abandono progressivo das
funções manuais, incluindo a preparação de medicamentos, deixando o campo
aberto para o crescimento do número de boticários. O mesmo processo de
separação se deu entre a medicina, chamada dogmática, e a cirurgia, que
juntamente com a farmácia constituíam a Medicina ministrante. Ao mesmo tempo
que os médicos passavam a ter um ensino universitário com professores altamente
especializados, os farmacêuticos e cirurgiões mantinham um tipo de formação
baseado na aprendizagem com um mestre estabelecido, um tipo de aprendizagem
que era comum às restantes profissões mecânicas. Os boticários, cujo nome se
encontra etimologicamente relacionado com a existência de um armazém fixo, foram
surgindo por toda a Europa, substituindo os especieiros, mesmo nos idiomas em que
esta denominação se manteve.
A separação de facto entre as duas profissões foi seguida pela separação legal. O
primeiro caso em que tal aconteceu terá sido em Arlés, França, onde posturas
municipais redigidas em 1162 determinaram a separação das duas profissões. Em
1240, Frederico II da Sicília e Nápoles, através do chamado Édito de Melfi, reafirmou
a obrigatoriedade de um curso de tipo superior em Salerno para os médicos, ao
mesmo tempo que proibiu qualquer sociedade entre médicos e farmacêuticos e
determinou que estes tinham de dispensar os medicamentos de acordo com as
receitas médicas e as normas da arte provenientes de Salerno. O mesmo diploma
introduziu o princípio da necessidade de algum tipo de controlo dos preços dos
medicamentos e do licenciamento e inspecção da actividade farmacêutica. Estas
normas foram progressivamente adoptadas pela Europa. Em França, as cidades de
Avignon (1242) e Nice (1274) proibiram a sociedade entre farmacêuticos e médicos.
Na Europa central, Basileia também separou as duas profissões entre finais do
século XIII e princípios do século XIV. Em Portugal a obrigatoriedade dessa
separação foi determinada em 1462.
45
A Farmácia e a Terapêutica no Renascimento
A queda de Constantinopla em 1453, às mãos dos turcos otomanos, levou à
emigração para Itália de grande número de bizantinos, continuadores da cultura de
língua grega e portadores de manuscritos de ciência, de medicina e de outras áreas
do saber. Foi essa chegada que marcou o início do Renascimento, provocando uma
enorme renovação do interesse pela cultura clássica, num movimento crescente que
foi das letras e das artes à ciência e à tecnologia, potenciado pela introdução dos
caracteres móveis na imprensa por Gutemberg (1454). A descoberta da imprensa foi
o culminar de um longo processo. Durante a Idade Média, o principal suporte da
escrita é o pergaminho. Este, preparado a partir da pele de animais, constituira um
grande avanço em relação ao papiro, mais raro, caro e difícil de conservar em climas
húmidos. O papel, utilizado pelos chineses, só se torna conhecido dos árabes no
século VIII e é a partir destes que se difunde na Europa. O Papel utiliza uma
matéria-prima ainda mais abundante que o pergaminho e a sua manipulação é muito
mais prática. A escrita continua a ser realizada manualmente. A impressão em série
de folhas de papel inicia-se pela gravura de madeira em página inteira, a que se
segue no século XV a tipografia com caracteres móveis, primeiro de madeira
(Laurent Coster) e depois de metal (Gutemberg).
No campo geográfico e político-económico, o Renascimento foi complementado pela
expansão europeia, de que podemos indicar, como marcos, a passagem do Cabo da
Boa Esperança por Bartolomeu Dias (1487), a chegada de Colombo às Antilhas
(1492) e a viagem de Vasco da Gama, contornando a África e chegando à Índia
(1498).
46
Outro desenvolvimento, de carácter religioso, com profundas consequências para a
história das ciências e da medicina na Europa, foi a Reforma. A Reforma protestante
foi iniciada em 1517, com a afixação na porta da Igreja universitária de Wittenberg
das noventa e cinco teses do monje alemão Martinho Lutero (1483-1546) contra o
sistema das indulgências da Igreja católica. Este movimento, que ganhou fortes
raízes na Europa central e do Norte, originou uma reacção por parte da Igreja
católica, iniciada com o Concílio de Trento (1545-1563), que é denominada a
Contra-Reforma.
O Humanismo Médico.
47
científica, baseada na raiz etimológica greco-latina. Esta preocupação pela fiel
interpretação dos textos, aliada ao desenvolvimento da tipografia, leva a uma
enorme difusão da literatura médica e à edição de novos textos latinos de
Hipócrates, Galeno e Dioscórides.
48
Procedimentos anatómicos (1529 e 1531), o tratado de métodos e técnicas
anatómicas de Galeno. Este tratado revelou um Galeno com um método mais
racional e com uma técnica descritiva superior à dos autores medievais, o que
aumentou a confiança e a perícia dos anatomistas e continha em si um programa de
investigação, porque Galeno, por falta de cadáveres humanos, utilizara macacos e
outros animais, mas indicara o estudo preferencial com humanos e aconselhara os
estudiosos a fazerem as suas próprias observações. Daqui resultou um apreciável
número de textos na senda da observação pessoal e original. O mais importante de
todos foi o De Humani Corporis Fabrica (1543). O seu autor, Andreas Vesalius
(1514-1564) nasceu em Bruxelas, filho de um farmacêutico do imperador Carlos V.
Estudou em Lovaina e Paris. Foi seu mestre Gunther von Andernach, tradutor da
mais influente edição dos Procedimentos anatómicos (a de 1531). Em 1537, depois
de uma curta passagem por Lovaina, foi convidado para ensinar em Pádua, onde foi
nomeado professor de cirurgia e anatomia. Aí levou a cabo o programa galénico de
observação anatómica, tonando-se mais crítico da sua anatomia por volta de 1539,
quando se convenceu que o autor greco-romano só realizara dissecções em
animais. A sua De Humani Corporis Fabrica, preparada entre 1540 e 1542, inclui
uma crítica sistemática à anatomia de Galeno, assente na observação pessoal e
directa do corpo humano. Apesar das suas críticas às descrições morfológicas de
Galeno, tanto Vesalius como os restantes autores renascentistas, não atacaram a
fisiologia galénica, mesmo quando esta se baseava em aspectos estruturais que
eles negavam.
49
A Matéria médica no Renascimento.
Dioscórides
Dioscórides foi impresso em 1478 (por P. d'Abano) e em 1512, seguindo uma versão
alfabética medieval. A sua primeira edição em grego foi impressa em 1499 (por H.
Roscius). A partir de 1516, este autor foi objecto de um grande número de edições,
traduções e comentários. O veneziano Ermolao Barbaro (1454-1493), professor de
filosofia em Pádua, embaixador e Patriarca de Aquileia, foi o autor da edição
póstuma do Dioscorides... medicinali materia (Veneza, 1516), traduzida do grego
para o latim. Jean de Ruelle (1474-1537), professor da Faculdade de Medicina de
Paris, também foi o autor de influentes edições latinas de Scribonius Largus e
Dioscórides (Paris, 1516). O mais destacado tradutor e comentador de Dioscórides
50
foi o médico Pier Andrea Mattioli (1501-1577). Neste movimento também participou
o médico português Amato Lusitano. De seu nome João Rodrigues de Castelo
Branco (1511-1568), dedicou grande atenção ao estudo da Matéria médica de
Dioscórides, em obras como o Index Dioscoridis (1536) e In Dioscoridis ... Materia
Medica... enarrationes (1553). As correcções feitas por Amato a algumas traduções
feitas por Mattioli, levaram a uma violenta reacção deste, acompanhada da denúncia
das origens judaicas de Amato, que obrigaram o português a exilar-se de Ragusa
(Ancona) para Salónica. A principal edição ibérica de Dioscórides foi a de Andrés
Laguna (1511-1559), feita a partir da de Jean de Ruelle, intitulada Pedacio
Dioscorides... Materia medicinal (Antuérpia, 1555). As obras de Galeno, em latim e
grego, foram objecto de várias edições a partir de1520.
51
teólogo protestante alemão Otto Brunfels (1489-1534). Esta obra inclui 238 imagens
desenhadas a partir do natural por Hans Weiditz, um artista da escola de Dürer. O
expoente mais elevado deste movimento foi outro protestante, Leonhard Füchs
(1501-1566), médico de câmara em Brandenburg e professor de Medicina em
Tübingen. A sua obra mais importante é a De historia stirpium (1542), onde estuda
meio milhar de plantas, a maior parte pertencentes à flora alemã. Inclui 511
ilustrações magníficas de Albrecht Mayer e Heinrich Fülmanner, gravadas em
madeira por Veit Rudolph Speckele. A importância dada às ilustrações fica patente
pelo facto de a obra incluir os retratos dos desenhadores e do gravador. Fora da
Alemanha, este movimento contou com a colaboração de autores como os ingleses
William Turner (1508-1568) e John Gerard (1545-1612), o flamengo Rembert
Dodoens (1516-1585) e o francês Mathieu de l'Obel (1538-1616). Dois outros
autores, o francês Jacques Daléchamps (1513-1588) e o italiano Andrea Cesalpino,
escreveram importantes obras botânicas, mas sem contributo terapêutico, o que
diminuiu a sua aceitação na época em que foram publicadas[1].
Drogas e política
52
estado italianas, com Veneza à cabeça, dominavam todo este comércio. Veneza
ainda dominava directamente as ilhas de Creta e de Chipre, donde eram
provenientes muitas das drogas mencionadas por Dioscórides. Neste contexto, não
é de estranhar que o interesse dos botânicos protestantes alemães pela sua flora
fosse também motivado por um desejo de independência das matérias primas da
Europa católica do Sul. Pelas razões opostas, também é evidente o interesse
veneziano em promover o estudo da matéria médica da Antiguidade. Este trabalho
foi realizado por uma rede informal de médicos, farmacêuticos, botânicos,
mercadores, viajantes e diplomatas, em parte centralizada por Mattioli, primeiro em
Gorizia e depois em Praga e Innsbruck. Mattioli começou em 1544 por traduzir para
italiano a edição latina do Dioscórides de Ruelle, sem ilustrações. Estas foram
introduzidas apenas nos Comentarii in Libros Sex Pedacii Dioscoridis Anazarbei,
publicados em 1554 pelo veneziano Valgrisi. Esta edição, da qual terão sido
vendidas 32.000 cópias, valeu-lhe ter sido contratado como médico pessoal do
Arquiduque Fernando do Tirol, futuro Imperador, o que veio aumentar os
rendimentos disponíveis para o seu trabalho. Esta rede incluiu a colaboração de
Luca Ghini (1490?-1556), professor de botânica em Bolonha e fundador do jardim
botânico de Pisa (1544) e Ulisse Aldrovandi (1524?-1607), fundador do jardim de
Bolonha (1568), que forneceram informação e examplares botânicos a Mattioli.
53
A manipulação da teriaca ilustra a evolução do conhecimento da matéria médica da
Antiguidade. Este medicamento, um antídoto polifármaco, mencionado pela primeira
vez no poema Theriaká de Nicandro de Colófon (Séc. II a.C.), foi objecto de várias
formulações, sendo a mais conhecida a do médico de Nero, Andrómaco (Séc. I). Na
sua composição entravam cerca de oito dezenas de ingredientes dos três reinos da
natureza, um quarto dos quais eram necessariamente objecto de substituição na
década de 1540, por se desconhecerem as verdadeiras drogas referidas na
formulação de Andrómaco. A redescoberta das drogas antigas foi de tal forma rápida
que, em 1566, o farmacêutico de Verona Francesco Calzolari já só tinha que usar
três substitutos e, em 1568, Mattioli podia escrever que a teriaga preparada nessa
altura já era tão boa como a que Galeno preparava para o imperadores romanos.
A destilação
54
Medicina e religião no Renascimento
• Saúde e Reforma
• Paracelso
Saúde e Reforma
55
Paracelso
56
Embora se mantivesse formalmente como católico, Paracelso desenvolveu uma
visão radical, reformista e profética da religião, onde a salvação se encontraria na
descoberta das marcas da presença de Deus no mundo natural e na fé popular.
Paracelso manifestou grande distanciamento em relação à Medicina universitária do
seu tempo, embora ela próprio tenha ensinado durante algum tempo numa
Faculdade de Medicina e possa ter estudado noutra. Em Basileia, onde o ensino era
parte das suas funções como médico da cidade, Paracelso deu aulas em alemão e
não em latim e anunciou que não ensinaria a partir dos autores clássicos, como
Hipócrates ou Galeno, mas da sua própria experiência. Para deixar bem clara a sua
posição, queimou publicamente um exemplar do Canon de Avicena numa fogueira
durante as festas de S. João.
[Anon. Aurora Thesaurusque Philosophorum Paracelsi (Basileia, 1577)]
Outra das ideias mestres de Paracelso consistia na adesão à teoria das assinaturas.
Segundo esta teoria, exposta em grande detalhe no livro Phytognomonica (1588) de
Giambattista della Porta (1538-1615), a terra, enquanto palco destinado por Deus
para a caminhada do homem para a sua salvação, encontrar-se-ia cheio de animais,
vegetais e minerais úteis para o homem, nomeadamente para o seu tratamento, que
aí teriam sido colocados pelo Criador para o seu usufruto, e que teriam sido
devidamente marcados, assinados, através da sua forma, cor, textura, para que o
homem reconhecesse a sua utilidade e a grandeza divina. Assim, um fruto com a
58
forma de um coração teria a assinatura da sua utilidade para doenças cardíacas, ou
outro com a forma de um fígado para as doenças hepáticas.
Drogas asiáticas.
59
Drogas americanas.
60
investigação no México durou sete anos (1571-1578), estudando cerca de 4.000
plantas mexicanas. Em 1578 regressou a Espanha para ocupar o lugar de médico
da câmara, falecendo nove anos depois sem ter visto publicados os resultados dos
seus estudos. O texto original de Hernández acabou por desaparecer durante um
incêndio no Escorial em 1671. O que se conhece da obra e tudo o que se publicou
sobre ela foi feito a partir de cópias e resumos dos originais. A parte mais importante
é a que foi resumida pelo napolitano Nardo Antonio Recchi, a pedido de Filipe II,
provavelmente para permitir uma edição com menores custos. O resumo de Recchi
acabou por ser impresso em 1615, numa versão castelhana de Francisco Ximénez,
e em 1628, no Rerum Medicarum Novae Hispaniae Thesaurus, editado pela
Accademia dei Lincei. A última versão foi editada em 1790 por Casimiro Gomez
Hortega, com o título de Opera.
Os primeiros boticários terão surgido em Portugal ainda no século XIII, mas antes
destes já existiam os especieiros. As especiarias tiveram na Idade Média uma
utilização generalizada para fins terapêuticos, entrando na composição de
variadíssimos medicamentos, quer como drogas activas quer como correctivos. O
açúcar, que pelo elevado preço que então tinha pode ser incluído entre as
especiarias, ocupava um lugar de destaque na galénica da época devido à
necessidade de tornar deglutíveis as variadíssimas substâncias de sabor
abominável utilizadas na terapêutica medieval, entrando em quantidades apreciáveis
na composição de inúmeras formas galénicas, entre as quais se destacavam os
electuários, os xaropes e as conservas. A importância das especiarias na
terapêutica pode ser vista na literatura medieval, nomeadamente no Thesaurus
Pauperum, atribuído ao português Pedro Hispano (c. 1210-15-1277), falecido em
Viterbo como papa João XXI. O seu comércio é atestado em Portugal por vários
documentos desde o século XII. Entre os especieiros destacar-se-iam os judeus,
como o do conhecido episódio do judeu especieiro, morto em Belas entre 1357 e
1367, narrado por Fernão Lopes na Crónica de D. Pedro. Os especieiros, entre os
quais encontramos um subgrupo particular, os teriagueiros, ou vendedores de
teriaga, aparecem principalmente como vendedores ambulantes de drogas e
61
especiarias. Os boticários surgiram depois dos especieiros e coexistiram com estes
ainda durante um certo período. A evolução de uma denominação para a outra
parece corresponder precisamente ao aparecimento de um estabelecimento fixo
para a venda de medicamentos. O boticário surge assim com a botica, que tem
precisamente o significado etimológico de armazém ou depósito.
62
separação entre as profissões médica e farmacêutica. Este diploma vedou aos
médicos e cirurgiões a preparação de medicamentos para venda e proibiu qualquer
outra pessoa de vender medicamentos compostos ao público em localidades onde
houvesse boticário. Uma única excepção foi aberta aos teriagueiros, desde que
portadores de uma certidão médica atestando a boa qualidade da teriaga. Em
contrapartida, os boticários foram proibidos de aconselhar qualquer medicamento
aos doentes. Este princípio da separação de interesses entre a prescrição e a
dispensa foi reforçado em 1561, com a proibição das sociedades entre médicos e
boticários e da dispensa de medicamentos por boticário parente do médico que os
receitou.
63
As questões relativas ao exercício das profissões sanitárias em geral e ao exercício
da profissão farmacêutica em particular encontravam-se debaixo da alçada do físico-
mor do reino, apesar de outras entidades, nomeadamente as câmaras municipais,
também terem tido algumas atribuições neste campo. A administração das questões
sanitárias relacionadas com epidemias e salubridade estava atribuída ao Provedor-
mor da Saúde. O físico-mor era escolhido pelo rei entre os médicos da sua casa e
regia-se por regimento próprio, vigorando durante mais tempo o de 1521. Apenas
durante o curto período de 1782 a 1809 existiu, antes do Liberalismo, um órgão
colegial responsável pela administração médico-farmacêutica, a Junta do Proto-
Medicato, constituída por sete deputados, médicos e cirurgiões da Casa Real. O
lugar de físico-mor só foi definitivamente extinto em 1836.
64
numeroso e incluía um boticário, que tinha que exercer no próprio hospital durante
os seis meses em que este se encontrava aberto.
Os boticários portugueses dos séculos XVI a XVIII apresentam uma grande linha
divisória, a que diz respeito à separação entre cristãos-novos e cristãs-velhos. Os
médicos e boticários, muito abundantes entre os descendentes dos judeus
convertidos à força no reinado de D. Manuel, constituíam um dos alvos preferidos
das campanhas de intolerância religiosa. O ódio aos cristãos-novos, alimentado pela
Igreja, encontrava um solo fértil entre as camadas sociais não privilegiadas, devido à
apreciável concentração de capital dentro desse grupo. No caso das profissões
ligadas à saúde, há também a considerar o grande peso da religião nas crenças
terapêuticas, sendo natural que as populações cristãs-velhas desconfiassem da
acção de medicamentos vindos das mãos de quem eles consideravam falsos
cristãos. Desde 1525, que foram apresentadas nas Cortes petições para que os
cristãos-novos fossem proibidos de ser boticários, a par do pedido de que as
receitas médicas não pudessem ser redigidas em latim. Em 1565, os boticários de
Lisboa foram mesmo proibidos de ter praticantes cristãos-novos nas suas boticas,
mas esta medida não terá sido seguida à risca, pois continuamos a encontrar
praticantes e boticários cristãos-novos nesta cidade ao longo dos dois séculos
seguintes. Além da discriminação profissional, ainda há a considerar a perseguição
directa. Só no tribunal de Évora, os processos de boticários somam a meia centena
desde o século XVI até finais do século XVIII.
65
Uma peculiaridade portuguesa é a existência de mulheres boticárias, fenómeno
singular na Península Ibérica. A mais antiga referência diz respeito a uma boticária
em Lamego em 1326, mas nada sabemos sobre o seu verdadeiro estatuto ou
funções profissionais. Nos séculos XV e XVI surgem outras referências a mulheres
boticárias, ligadas a senhoras da alta nobreza, a quem serviam na qualidade de
responsáveis pelas respectivas boticas e de manipuladoras de medicamentos e
preparados que utilizavam técnicas afins, como as conservas.
A Filosofia experimental.
67
A rejeição das teorias aristotélicas na mecânica.
As academias científicas.
Iatroquímica.
A Iatroquímica foi o primeiro sistema a romper abertamente com o galenismo. Ele foi
formulado na segunda metade do século XVII pelo holandês Franz de le Boe
(Sylvius) e pelo inglês Thomas Willis, que se basearam numa interpretação química
dos processos fisiológicos, patológicos e terapêuticos. Embora assente nas
interpretações químicas de Paracelso e dos seus seguidores, os iatroquímicos
afastaram-se destes do ponto de vista filosófico, rejeitando a Filosofia Química e
apoiando-se antes nas correntes filosóficas do seu tempo, como o cartesianismo, o
atomismo e o indutivismo de Bacon. Aproveitaram igualmente todos os avanços
mais recentes no campo da Medicina, como a anatomia baseada na dissecção de
cadáveres humanos e a doutrina da circulação do sangue de William Harvey (1578-
1657).
68
Franz de le Boe (Sylvius) (1614-1672) elaborou uma Fisiologia baseada em
processos de fermentação e de reacções de ácidos e bases. Enfermidade como
excesso de acidês ou alcalinidade.
Iatromecânica.
69
apresentado como uma máquina física com alma imaterial. A digestão, por exemplo,
é explicada através de sucessivas operações de divisão, mistura, fermentação e
filtração dos alimentos até à obtenção do sangue.
[De medicina statica, 1614.]
70
e fezes. Desenvolveu vários instrumentos para auxiliar esta investigação, como o
termómetro graduado (c. 1605), o pulsilógio e outros.
[G. A. Borelli, De motu animalium (1680).]
Boerhaave.
71
Embora influenciado pelas teorias iatromecânicas e cartesianas, o sistema do
holandês Hermann Boerhaave (1668-1738) merece um tratamento à parte.
Boerhaave ensinou Medicina, Química e Botânica na Universidade de Leiden,
influenciando directamente e indirectamente toda uma geração de médicos. Entre
1714 e 1738 quase dois mil alunos acorreram de toda a Europa a assistir às suas
aulas de clínica, entre os quais o português António Ribeiro Sanches. Os seus
manuais de ensino, como as Institutiones Medicae (1708), os Aphorismi de
cognoscendis et curandis morbis (1709) e os Elementa Chimiae (1724) ajudaram a
criar uma reputação de grande mestre. Ele foi sem dúvida o autor médico mais
influente durante o século XVIII, chegando a ser apelidado por Haller de communis
Europae praeceptor. Apesar da influência iatromecânica, Boerhaave manteve uma
posição empirista, defendendo que as teorias médicas sobre patologia deviam ser
elaboradas de forma indutiva a partir da observação clínica das doenças, no
seguimento do programa anteriormente elaborado pelo médico inglês Thomas
Sydenham (1624-1698), em vez de serem produzidas a partir dos pressupostos
teóricos de qualquer sistema. Além disso, defendeu a aplicação da Química à
Medicina, disciplina que ensinou em Leyden. Baseados no empirismo do mestre, os
discípulos de Boerhaave assumiram uma atitude de oposição aos sistemas teóricos,
que se tornou largamente dominante durante o século XVIII.
Animismo.
72
Novas drogas.
Quina (Cinchona)
Ipecacuanha
A mais célebre das drogas brasileiras difundidas no século XVII foi a ipecacuanha
(Cephaelis ipecacuanha) e a história da sua entrada na literatura e na prática
médicas ilustra bem a participação portuguesa no enriquecimento da proto-
73
farmacologia seiscentista. A acção da raiz da ipecacuanha, utilizada pelos índios
tupis no Brasil, foi conhecida pelos jesuítas logo no século XVI. O Padre José de
Anchieta descreveu-a na já referida carta de 1560 e o Padre Fernão Cardim tratou
igualmente da ipecacuanha no capítulo sobre ervas medicinais do tratado sobre o
Clima e Terra do Brasil. O tratado de Fernão Cardim foi publicado em inglês por
Samuel Purchas em Hakluytus posthumus (1625), nas condições atrás descritas,
dando assim a primeira notícia impressa sobre a ipecacuanha. As primeiras
descrições detalhadas da ipecacuanha devem-se contudo a Georg Markgraf (1610-
1644) na Historia rerum naturalium Brasiliae e a Willem Piso (1611-1644), na
Historia naturalis Brasiliae, publicadas juntas em Leyden em 1648. Apesar de
conhecida, a ipecacuanha foi pouco utilizada até que Jean Adrien Helvetius (1661-
1727) a usou para curar o Delfim de França de disenteria em 1688. No século XVIII
as suas virtudes foram confirmadas por Carlo Gianelli (1696-1759) em De admirabili
radicis ipecacuanhae virtute (Pádua, 1745), mas persistiram várias confusões e
incertezas sobre a verdadeira natureza da raiz até que Bernardino António Gomes,
depois de regressar do Brasil, a descreveu na Memória sobre a ipecacuanha fusca
do Brasil ou cipó das nossas boticas (Lisboa, 1801), juntamente com a classificação
feita por Brotero com base nas suas observações. O esclarecimento da natureza
botânica da ipecacuanha veio permitir que Joseph Pelletier e o fisiologista François
Magendie, em colaboração, isolassem o seu princípio activo, a emetina, em 1817.
Medicamentos químicos.
74
Substâncias minerais de uso interno.
William Withering (1741-1799), An account on the Foxglove and some of its medical
uses (1785). Uso da digital no tratamento de doenças cardíacas.
Pós de [Tomas] Dover. 1732. Ópio e ipecacuanha como diaforético para queixas
reumáticas.
Licor de [Gerard] van Swieten. 1750. Sol. bicloreto de mercúrio em brandy para sífilis
por via interna.
75
A Farmácia em Portugal nos séculos XVII e XVIII
76
de uma tradução do Cours de chimie de Nicolas Lémery, foi o primeiro livro editado
em Portugal a incluir uma descrição do material e das técnicas da química
farmacêutica.
77
comprando as matérias-primas já com alto grau de transformação. Também existiam
razões adicionais que levavam os boticários a preferir a aquisição aos droguistas em
relação à manipulação laboratorial, como as vantagens do recurso à compra a
crédito e a tendência para investir em actividades e vias de ascensão social alheias
à profissão. Pela via do fornecimento a crédito, os droguistas constituíram uma
importante fonte de financiamento da actividade farmacêutica. Nesta situação, os
droguistas asseguraram, por via da importação, o fornecimento do mercado
português em medicamentos químicos. O abastecimento dos boticários, que se
caracterizava inicialmente pelo recurso a grande variedade de canais de aquisição,
sofreu uma tendência para a sua redução a favor dos droguistas, à medida que o
século XVIII foi avançando. Os droguistas surgiram ligados à farmácia, não apenas
pelo seu papel de fornecedores dos boticários, mas também pelo facto de muitos
terem exercido as duas profissões. Apesar das origens comuns, a evolução deu-se
em direcções divergentes, para o que contribuíram vários factores, como as maiores
possibilidades de ascensão social e maior peso económico e riqueza dos droguistas
e a crescente utilização para fins não farmacêuticos de muitas das suas
mercadorias. Os valores das boticas não eram muito elevados e só uma pequena
parte do património era constituído pelo capital fixo, como o mobiliário e os
instrumentos. Isso permitia que uma botica pudesse ser facilmente instalada ou
mantida em funcionamento com base no fornecimento a crédito por parte de um
droguista. As dívidas aos droguistas chegavam a atingir valores muito elevados e a
prolongar-se por vários anos. Esta situação traduziu-se num aumento muito grande
no número de boticários. Durante toda a primeira metade do século XVIII, assistiu-se
em Portugal a uma forte aceleração do número de praticantes que entravam
anualmente na profissão farmacêutica através do exame perante o físico-mor. Em
vez do enriquecimento dos boticários, observou-se o aumento do seu número.
78
económica. Os dados correspondentes a impostos mostram que os médicos
ocupavam um lugar muito distanciado do dos restantes profissionais. A média de
impostos pagos por médicos chegavam a ser quase quatro vezes superior à dos
cirurgiões e 3,5 vezes maior que a dos boticários. Alguns boticários eram
relativamente abastados, mas mesmo entre os de hierarquia mais elevada não
existiam grandes fortunas, como as que se encontravam entre os droguistas, que
acabavam por ficar com uma fracção importante dos lucros da actividade
farmacêutica. As poupanças que ficavam nas mãos dos boticários eram em grande
parte desviadas para investimentos nobilitantes e não investidas na botica. Muitos
boticários aplicavam o seu dinheiro em actividades e rendimentos alheios à
farmácia, destacando-se a aquisição de bens de raiz, o empréstimo a juros e o
investimento dirigido à ascensão social dos filhos. A posse da botica raramente era
reservada aos filhos mais velhos, para os quais preferencialmente se canalizavam
importantes recursos tendo em vista a sua entrada no clero. As boticas eram assim
transmitidas para os filhos segundos, viúvas, filhas que casavam com praticantes,
sobrinhos e outros, o que facilitava a entrada na profissão a partir de níveis sociais
mais baixos.
Perante este panorama, não é de estranhar que tenham sido muito poucos os
boticários dos séculos XVII e XVIII a destacarem-se do ponto de vista científico ou
cultural. Uma excepção merece referência, a do poeta e boticário lisboeta António
Serrão de Castro (1613?-1683?), que pertenceu à segunda Academia dos
Singulares (1663-1670) e foi autor de s Ratos da Inquisição Foi preso pala
Inquisição em 1672, sob a acusação de judaizante, sendo seguido no cativeiro por
quase todos os membros da sua família. Durante dez anos, negou as acusações
que lhe eram feitas, até que confessou por duas vezes, a última das quais após ser
sujeito a tormento. Serrão saiu em Auto-de-Fé em 1682, condenado a cárcere
perpétuo, hábito penitencial e expropriado. Acabou os seus dias cego, miserável, a
escrever poemas por esmola e com os filhos dementes.
79
de Cristo tinha uma importante botica no Convento de Tomar. Muitas não se
limitavam a fornecer as próprias ordens, vendendo medicamentos ao público. Era o
caso das boticas dos dominicanos e dos jesuítas. Na Batalha, os dominicanos
tinham mesmo um privilégio para que nenhum concorrente laico se pudesse aí
instalar. Os jesuítas fabricavam remédios secretos em todas as suas boticas, sendo
os mais conhecidos os Pedras Cordiais, preparadas em Goa na botica do Colégio de
S. Paulo e a Teriaga Brasílica. Desta forma, os boticários laicos não só se viam
privados do apreciável mercado constituído pelos membros do clero regular, como
eram confrontados pela concorrência destes.
81
§ Microbiologia.
§ Pasteur e Koch
§ Louis Pasteur (1822-1895).
§ Robert Koch (1843-1910)
o Farmacologia e terapêutica.
§ Separação de princípios activos.
§ Química Orgânica.
§ Mecanismo de acção dos medicamentos.
§ Farmacologia experimental
§ Rudolf Buchheim (1820-1879)
§ Oswald Schmiedeberg (1838-1921)
§ Quimioterapia sintética
82
Medicina anatomo-clínica.
Programa anatomo-clínico
Sinais anatomopatológicos
Endoscopia
Raios-X
Anatomia patológica
83
Medicina de laboratório
Subsecções
Teoria celular.
Patologia celular.
84
Mentalidade fisiopatológica
Mentalidade fisiopatológica
Transtornos funcionais como processos energéticos (física) ou materiais (química)
Febre como processo energético
85
Doenças metabólicas
Patologia experimental
Mentalidade etiopatológica
Toxicologia.
Microbiologia.
86
Pasteur e Koch
Vacinação.
Microbiologia
Bacteriologia
Imunologia
87
Descoberta da fagocitose por Elie Metchnikoff (1884), discípulo de Pasteur
Etiologia
Desenvolvimento dos sinais etiológicos
Farmacologia e terapêutica.
Química extractiva
Alcalóides
Estricnina (1819)
Glucósidos
Química Orgânica.
Hidrato de cloral
Farmacodinamia
89
François Magendie (1783-1855)
curare (1850)
Farmacologia experimental
90
Oswald Schmiedeberg (1838-1921)
Quimioterapia sintética
91
Sulfamidas por Gerhard Dogmack em 1935
Até ao séc. XIX, a transmissão dos saberes farmacêuticos era realizada através da
aprendizagem nas boticas. O acesso à profissão tinha lugar por via de um exame,
realizado após um período de aprendizagem de quatro ou mais anos. Anteriormente
aos séculos XVII-XVIII, o nível técnico da produção de medicamentos não exigia
uma formação em instituições de ensino próprias e a aprendizagem com um
profissional estabelecido, o mestre, era a que correspondia a um ofício mecânico.
No campo das profissões de saúde, o ensino de nível superior estava reservado aos
médicos, através da Universidade de Coimbra. O documento legal básico que
regulou o acesso à profissão farmacêutica desde o século XVI até ao século XIX foi
o Regimento do Físico-mor do Reino (1521), em vigor até 1836. Este Regimento
determinava como os praticantes seriam examinados por este oficial do rei e por
médicos e boticários por ele escolhidos. Além dos regimentos do físico-mor, há
ainda a considerar o Regimento dos médicos e boticários cristãos-velhos (1604) que
regulava uma segunda via de acesso, de carácter mais restrito. Este segundo
regimento regulamentou pormenorizadamente os partidos para boticários cristãos-
velhos criados na Universidade de Coimbra anteriormente a 1585. Estes partidos
consistiam em bolsas para praticantes cristãos-velhos, primeiro para acabarem de
aprender gramática latina e depois para aprenderem numa botica, sendo o dinheiro
do partido entregue a mestres boticários igualmente cristãos-velhos. Uma vez
considerados aptos pelos mestres, os praticantes eram examinados pelos lentes de
Prima e de Véspera da Faculdade de Medicina. Aos boticários dos partidos da
Universidade era depois dada preferência no preenchimento dos partidos de
boticários das câmaras, dos hospitais e das misericórdias. Em ambas as vias, o
92
praticante trabalhava gratuitamente na botica do mestre durante o período mínimo
de quatro anos que constituía a aprendizagem. O mestre, além do ensino,
assegurava a alimentação e cama, normalmente na própria botica. A semana de
trabalho era de sete dias e os tempos livres deveriam ser raros.
93
xaropes, unguentos, pírulas, electuários e todas as mais preparações da Farmácia,
como o mais hábil boticário, e ainda melhor, pois que tem a vantagem de adquirir o
hábito de obrar prevenido com o auxílio dos princípios científicos que o facilitam e
dirigem Os primeiros lentes de Matéria Médica depois de 1772, José Francisco Leal
(1744-1786) e Francisco Tavares (1750-1812) deixaram várias obras com interesse
para o ensino da Farmácia.
94
durante todo o período de 1837 a 1902, chegando a ser apenas de 0,67 entre 1860
e 1880. Só a partir desta última data é que o ensino farmacêutico sofreu um
crescimento, acompanhando igual expansão económica das farmácias.
O Curso Farmacêutico durava dois anos, mas antes da matrícula nas Escolas de
Farmácia os alunos tinham que obter aprovação em vários preparatórios, que
incluíam a Química Orgânica e Inorgânica e Botânica, ministrados na Faculdade de
Filosofia de Coimbra e nas Escolas Politécnicas de Lisboa e Porto. Uma vez nas
Escolas de Farmácia, o aluno tinha aulas com o Professor que ministrava Matéria
Médica aos estudantes de Medicina e tinha aulas práticas no Dispensatório com o
professor farmacêutico, com prelecções teóricas de Farmácia e Toxicologia. O
currículo era constituído pelas mesmas disciplinas no primeiro e no segundo ano, só
havendo exame no final deste. Os livros seguidos eram essencialmente os
compêndios escritos pelos professores e as farmacopeias oficiais em vigor.
95
farmacêuticos de Primeira e de Segunda classe e obrigava todos os candidatos a
farmacêuticos à frequência do Curso de Farmácia. Para se fazer face aos encargos
provenientes da manutenção das Escolas de Farmácia, foi criado um selo sobre as
especialidades farmacêuticas que acabou por ser desviado para outros fins.
O movimento geral de reforma do ensino levado a cabo pela 1.^a República levou à
constituição da Universidade de Lisboa, em 1911, mas a Escola de Farmácia
continuou anexa à mesma instituição, agora denominada Faculdade de Medicina. O
curso passou a ter um maior número de disciplinas e a duração total de quatro anos,
conferindo o título de farmacêutico químico, mas só em 1918, o ensino da Farmácia
passou a ser ministrado em Escolas Superiores independentes e autónomas. Em
1921, as três Escolas Superiores ascenderam a Faculdades de Farmácia,
competindo-lhes atribuir os graus de licenciado e doutor em Farmácia. Em curto
espaço de tempo, porém, as esperanças postas na existência das faculdades e os
esforços dispendidos para o seu desenvolvimento viriam a sofrer um rude golpe. A
Faculdade de Coimbra foi extinta em 1928, juntamente com outros
estabelecimentos, como parte da contenção das despesas orçamentais determinada
pelo Estado Novo. Em 1932, foi também extinta a Faculdade de Lisboa e criadas,
em substituição, as Escolas de Farmácia de Lisboa e Coimbra. A Farmácia ficou
com um curso de licenciatura na Faculdade do Porto e com cursos médios de três
anos em Lisboa e Coimbra. Esta situação manteve-se durante três décadas e meia,
só vindo a ser corrigida em 1968, ano em que foram restauradas as Faculdades de
Farmácia de Lisboa e de Coimbra.
96
A Farmacopeia Portuguesa
97
O associativismo
A história da farmácia e dos farmacêuticos no Portugal contemporâneo encontra-se
intimamente ligada a dois desenvolvimentos que tiveram lugar depois da vitória do
Liberalismo: a criação e consolidação do ensino superior farmacêutico e o
fortalecimento do associativismo entre a profissão. Em Portugal, a primeira
associação especificamente farmacêutica foi a Sociedade Farmacêutica Lusitana,
criada em 1835, inicialmente com a denominação de Sociedade Farmacêutica de
Lisboa. Nos séculos anteriores, encontramos os boticários em dois tipos de
corporações: as bandeiras do ofício de S. Miguel, com funções predominantemente
profissionais e as Confrarias dos Santos Cosme e Damião, com funções religiosas.
Assim como a falta de atribuições de auto-regulamentação levara ao esvaziamento
da sua participação nas bandeiras, o desenvolvimento do associativismo dos
farmacêuticos vai nascer de um movimento de oposição ao físico-mor, o oficial régio
que sempre centralizou atribuições como o controlo da admissão na profissão, a
marcação de preços e a realização das visitas de inspecção. Entre as aspirações de
justiça criadas pelas ideias liberais entre os farmacêuticos ganhou força a da
libertação da submissão àquele que era visto como um representante da profissão
médica. Em Julho de 1834, cerca de centena e meia de farmacêuticos de Lisboa
subscreveram uma petição com várias reivindicações dirigidas contra o físico-mor.
Um relatório da Câmara dos Deputados deu parcialmente razão aos requerentes,
considerando que a administração farmacêutica necessitava de ser reformada e que
não seriam desprezadas as opiniões dos subscritores. Em Fevereiro de 1835 foram
suspensas as atribuições do físico-mor. Os farmacêuticos, animados por esta vitória,
iniciaram a organização da Sociedade Farmacêutica, cuja cerimónia de instalação
teve lugar na botica do Hospital de S. José a 24 de Julho de 1835.
98
Os primeiros trinta anos de vida da Sociedade caracterizaram-se igualmente por
uma grande intervenção no campo da política profissional. Directa ou
indirectamente, a Sociedade Farmacêutica influenciou as reformas e a produção
legislativa de importância para a farmácia portuguesa. A sua campanha pela reforma
do ensino e do exercício farmacêutico produziu frutos. Em 1836 foram criados os
cursos farmacêuticos anexos à Faculdade de Medicina de Coimbra e às Escolas
Médico-Cirúrgicas de Lisboa e Porto. Em 1837 foi criado o Conselho de Saúde
Pública que passou a centralizar toda a administração sanitária e era composto por
5 médicos e 2 farmacêuticos, além de outros 5 membros. Este Conselho acabou por
ser extinto em 1868, criando-se uma Junta Consultiva em seu lugar e passando os
poderes deliberativos e executivos para a Secretaria de Estado dos Negócios do
Reino.
99
A ascensão dos farmacêuticos.
100
farmacêuticas, algumas provenientes de conventos, mas outras vindas de farmácias
laicas. Apesar disso, a praticante Maria José Cruz de Oliveira e Silva, de Lavos
ainda foi obrigada a dirigir um requerimento ao rei pedindo autorização para fazer
exame de farmácia na Universidade de Coimbra. Deste resultou uma portaria de
1860 que afirmava ão haver lei nenhuma no país, que proíba às mulheres o estudo
da Medicina ou da Farmácia, nem incompatibilidade da prática farmacêutica com o
sexo feminino Maria José Cruz de Oliveira e Silva acabaria por ser examinada e
aprovada em 1869 e outras praticantes do sexo feminino foram examinadas nas três
escolas de farmácia na segunda metade do século.
A indústria farmacêutica.
30
A Dosimetria foi uma corrente terapêutica elaborada pelo cirurgião flamengo Burggraeve, que
ganhou alguma notoriedade em Portugal na penúltima década do século XIX. Advogava a utilização
exclusiva de substância activas puras, como alcalóides, glucósidos, arsenicais e outras, em doses
exactas, que eram aumentadas de forma progressiva até se produzirem efeitos terapêuticos. Utilizava
principalmente um tipo de forma farmacêutica, os grânulos dosimétricos.
.
101
tivesse constituído um avanço significativo em relação à situação anterior, as
matérias ministradas no novo plano de estudos continuavam longe de estar a par
com os contributos científicos de finais do século passado, com uma reduzida
componente curricular no campo da Biologia. Só em 1911 surgiram os cursos de
``Botânica criptogâmica e fermentações'', de ``Bacteriologia'' e de ``Química
biológica''.
102
A Grande Guerra veio encontrar uma indústria farmacêutica suficientemente
equipada para responder à falta de abastecimento em produtos medicinais
provenientes dos fornecedores habituais, como a Alemanha. A falta de matérias
primas normalmente importadas em tempo de paz obrigou a um esforço
complementar de produção, com o aparecimento de nova s indústrias subsidiárias
e de novos laboratórios. Os Laboratórios Sicla foram fundados em 1915 para
responder à falta de produtos químicos e farmacêuticos resultante da eclosão da
Grande Guerra. O Laboratório Farmacológico de J. J. Fernandes, em Lisboa, terá
sido criado por volta de 1918 pelo farmacêutico José Joaquim da Costa Fernandes,
associado a João António Correia dos Santos, oficial do exército e professor de
Química no Colégio Militar. O laboratório apresentou uma importante dinâmica
científica desde os primeiros tempos, com a edição do Boletim Farmacológico e o
registo de várias patentes de invenção. Este laboratório terá sido o primeiro a
introduzir em Portugal o fabrico de drageias utilizando cobertura de glúten e
queratina e terá dado um novo impulso ao fabrico de comprimidos. O período do
pós-guerra surgiu como um dos mais promissores para a indústria farmacêutica
portuguesa, dominando um ambiente de grande optimismo entre os próprios
industriais, que esfriou com a diminuição da protecção às especialidades
farmacêuticas nacionais pela nova pauta aduaneira de 1923. Entre os que surgiram
no período do pós-guerra destacaram-se os Laboratórios de Biologia e
Quimioterapia do Dr. Seixas Palma, fundados no início da década de 20 pelo
cientista José de Seixas Palma em colaboração com o farmacêutico José Carvalho
da Fonseca Júnior (?-1965). Em 1924, iniciou a edição do boletim Laboratório e
Clínica. Estes laboratórios tiveram um papel pioneiro na introdução da Opoterapia,
mantendo-se em 1935 como o principal produtor nacional de opoterápicos. Outros
laboratórios fundados neste período incluiram a firma J. A. Baptista de Almeida, Lda,
proprietária da Farmácia Universal em Lisboa, fundada pelo farmacêutico José
António Baptista de Almeida, a Sociedade Industrial Farmacêutica, constituída em
1923 com base na farmácia da firma "Azevedo, Irmão, Veiga Sucessores Barata
Limitada", mas congregando um grupo de capitalistas exterior a essa farmácia e o
Laboratório "BIAL fundado no Porto em 1924 pelo capitalista Álvaro Portela.
103
Cronologias
• Do mundo árabe ao Ocidente cristão (capítulos V e VI)
• Glossário
104
Início da expansão
634
islâmica
Morte de Isidoro de
636
Sevilha
Conquista de Alexandria
640
pelos árabes
Morte de Paulo de
690
Egina
Proíbida a língua grega
700
no Império Islâmico
Conquista da Península
711
Ibérica
732 Batalha de Poitiers
Capital do império árabe
750 transferida de Damasco
para Bagdade
al-Mansur curado pelo
médico Girgis ibn Gibril
do hospital nestoriano
765
de Gundishapur
Morte de Geber, Jabir
ibn Hayyan
Bispo Teodulfo de
Orleans proclama a
821
Medicina como a oitava
arte liberal
Morte de Mesué o
velho, João
857 Damasceno, Abu
Zakariya Yuhanna ibn
Masawayh
c. 866 Morte de Al-Kindi
Morte de Hunayn ibn
873
Ishaq, lat. Johannitius
925 Morte de Razés
1001 Árabes chegam à Índia
Morte de Abulcassis, Al-
c. 1013
Zahrawi
Morte de Avicena, Ibn
1037
Sina
1050 Morte de Al-Biruni
105
Morte de Garioponto,
autor do Passionarius
Galeni de Salerno 1075
Morte de Abenguefit
Morte de Alfano, autor
1085 médico de Salerno
Reconquista de Toledo
Morte de Constantino o
1087
Africano
1095-1270 Cruzadas
Criada a escola de
c. 1135
tradutores de Toledo
Rogério II da Sicília
estabelece
1140 obrigatoriedade de
exame oficial para
exercício da medicina
Gerardo de Cremona
1144 junta-se à escola de
tradutores de Toledo
Floresce Nicolaus
1150 Salernitanus, autor do
Antidotarium
Morte de Mattheus
Platearius, o Jovem,
1161 autor do De simplici
Medicina, ou Circa
instans
Morte de Avenzoar
Posturas municipais de
1162
Arlés separam
profissões médicas
Morte de Hildegarde de
1179
Bingen
Autorizada a escola
1180
médica de Montpellier
Morte de Gerardo de
1187
Cremona
Morte de Burgundio de
1193 Pisa, tradutor de
Hipócrates e Galeno
Criadas as Universidade
c. 1200
de Paris e de Oxford
106
Morte de Maimonides Cruzados saqueiam
1204
Constantinopla
Frederico II promulga
1240
Édito de Melfi
Sociedade entre
farmacêuticos e
1242
médicos proibida em
Avignon
1248 Morte de Ibn al-Baytar
Sociedade entre
farmacêuticos e
1274
médicos proibida em
Nice
Morte de Pedro
1277
Hispano, Papa João XXI
1280 Morte de Alberto Magno
Regimen Sanitatis
c. 1300 Salernitanus ou Flos
medicinae
Morte de Arnaldo de
c. 1313
Vilanova
1321 Morte de Dante
Faculdade de Medicina
de Paris determina
obrigatoriedade do
1322 Antidotarium Nicolai e
do De simplici medicina
de Platearius nas
boticas
107
Glossário
Arqueologia.
Estudo dos vestígios materiais da actividade humana.
Berendes, Julius (1837-1914).
Farmacêutico e historiador da farmácia alemão. Dedicou-se ao estudo da
farmácia na Antiguidade, tendo escrito Die Pharmacie bei den alten
Kulturvölkern (1891) e traduzido do latim e do grego para o alemão a Materia
medica de Dioscórides e os Sete Livros de Paulus Aegineta. Também
escreveu Das Apothekenwessen, onde tratou da história da farmácia alemã.
Climatologia.
Estudo da evolução do clima.
Cronologia.
Estudo da situação dos factos históricos no tempo, estudando assim as
diferentes formas de medir o tempo e os vários calendários.
Demografia.
Estudo quantitativo das populações.
Diplomática.
Estudo dos diplomas e documentos oficiais.
Heráldica.
Estudo dos brasões.
Filologia.
Estudo das línguas.
Genealogia.
Estudo das filiações.
Onomástica.
Estudo dos nomes próprios.
Paleografia.
Estudo dos diferentes tipos de escrita ao longo dos tempos.
Peters, Hermann (1847-1920).
Farmacêutico e historiador da farmácia alemão. Autor de muitos escritos
sobre história da farmácia, dos quais os mais conhecidos são Der Arzt und
die Heilkunde in der deutschen Vergangenheit e Aus pharmaceutischer
Vorzeit.
Schelenz, Hermann (1882-1960).
Farmacêutico e historiador da farmácia alemão. Foi farmacêutico de oficina
em Rendsburg, Schleswig de 1875 a 1893 e depois dedicou-se às letras.
Escreveu o livro Geschichte der Pharmazie (Berlin: 1904), um clássico da
literatura histórico-farmacêutica.
108
Índice
Abenguefit
A literatura médico-farmacêutica árabe.
Abulcassis
A literatura médico-farmacêutica árabe. | Toledo.
Aecio de Amida
Medicina Bizantina.
Agostinho, Santo
Herança da Filosofia e
Al-Baytar
A literatura médico-farmacêutica árabe.
Al-Biruni
A literatura médico-farmacêutica árabe.
Al-Israili
Toledo.
Al-Kindi
A literatura médico-farmacêutica árabe. | Toledo.
Al-Wafid
Toledo.
Alcméon
Bases filosóficas da Teoria
Aldrovandi, Ulisse
Drogas e política
Alexandre de Trales
Medicina Bizantina.
Alfano de Salerno
Herança da Filosofia e | Salerno. | Salerno.
Alvares, Simão
Drogas asiáticas.
Ananias, Mestre
A Farmácia em Portugal
Anchieta, José de
Ipecacuanha
Andrómaco
Drogas e política
Aristóteles
Hipócrates. | A herança da cultura | Toledo. | Dioscórides
Aristóteles
no title
Asclépio
no title
Avenzoar
A literatura médico-farmacêutica árabe.
Avicena
A literatura médico-farmacêutica árabe. | Toledo. | Dioscórides
Baccheio de Tanagra
109
A Escola de Alexandria.
Barbaro, Ermolao
Dioscórides
Basílio o Grande
Herança da Filosofia e
Berendes, Julius
Primeiros passos. | Glossário
Boerhaave, Hermann
Boerhaave.
Borelli, Giovanni
Iatromecânica.
Brunfels, Otto
Herbários modernos e jardins
Brunschwig, Hieronimus
A destilação
Burgundio de Pisa
Toledo.
Calzolari, Francesco
Drogas e política
Cardim, Fernão
Ipecacuanha
Cassiodoro Senator
A Medicina e a
Celso, Aulo Cornelio
Medicina greco-romana.
Cesalpino, Andrea
Herbários modernos e jardins
Clemente
Herança da Filosofia e
Clusius
Drogas asiáticas.
Constantino o Africano
Salerno.
Cosme e Damião, Santos
O culto dos santos
Costa, Cristóvão da
Drogas asiáticas.
Dürer, Albrecht
O Humanismo Médico.
Da Vinci, Leonardo
O Humanismo Médico.
Daléchamps, Jacques
Herbários modernos e jardins
De l'Obel, Matthieu
Herbários modernos e jardins
Della Porta, Giambattista
Paracelso
Della Torre, Marco Antonio
O Humanismo Médico.
Descartes, René
Iatromecânica.
110
Dioscórides
Galeno. | Grécia. | Medicina Bizantina. | A herança da cultura | A literatura
médico-farmacêutica árabe. | A Medicina e a | O Humanismo Médico. |
Dioscórides | Dioscórides | Dioscórides | Herbários modernos e jardins |
Drogas e política | Drogas e política | Glossário
Dioscórides
no title
Dodoens, Rembert
Herbários modernos e jardins
Ea
Saúde e Magia na
Ebers, Georg
Sociedades urbanas arcaicas.
Empédocles
Bases filosóficas da Teoria
Erasístrato
A Escola de Alexandria.
Füchs, Leonhard
Dioscórides | Herbários modernos e jardins
Galeno
no title | Grécia. | A visão cristã da | Medicina Bizantina. | A herança da cultura
| A literatura médico-farmacêutica árabe. | A literatura médico-farmacêutica
árabe. | A literatura médico-farmacêutica árabe. | A Medicina e a | Salerno. |
Toledo. | Toledo. | O Humanismo Médico. | O Humanismo Médico. | O
Humanismo Médico. | Dioscórides | Dioscórides | Drogas e política | Paracelso
| Do mundo árabe ao
Garioponto
Salerno.
Gaza, Theodorus
Dioscórides
Geber
A literatura médico-farmacêutica árabe.
Gerard, John
Herbários modernos e jardins
Gerardo de Cremona
Toledo.
Ghini, Luca
Drogas e política
Gianelli, Carlo
Ipecacuanha
Gilgamesh
Saúde e Magia na
Gomes, Bernardino António
Ipecacuanha
Gregório de Nazianzus
Herança da Filosofia e
Gregório de Nissa
Herança da Filosofia e
Helvetius, Jean Adrien
Ipecacuanha
Herófilo
111
A Escola de Alexandria.
Hernandez, Francisco
Drogas americanas.
Hildegarde de Bingen
A Medicina e a
Hipócrates
O culto de Asclépio. | As escolas pré-hipocráticas. | Patologia geral,
terapêutica e | Patologia geral, terapêutica e | A Escola de Alexandria. |
Grécia. | A visão cristã da | A herança da cultura | A Medicina e a | Salerno. |
Salerno. | Toledo. | Toledo. | O Humanismo Médico. | Paracelso | Do mundo
árabe ao
Hipócrates
no title
Hispano, Pedro
A Farmácia em Portugal
Hortega, Casimiro Gomez
Drogas americanas.
Imhotep
Saúde e Magia na
Isidoro de Sevilha
A Medicina e a
Jerónimo, São
Herança da Filosofia e
Johanitius
A herança da cultura | Salerno.
Laguna, Andrés
Dioscórides
Lusitano, Amato
Dioscórides
Magendie, François
Ipecacuanha
Marduk
Saúde e Magia na
Markgraf, Georg
Ipecacuanha | Ipecacuanha
Mattheus Platearius, o Jovem
Salerno.
Mattioli, Pier Andrea
Dioscórides | Drogas e política
Mesué
A herança da cultura
Miguelangelo
O Humanismo Médico.
Monardes, Nicolás
Drogas americanas.
Nemesius de Emesa
Herança da Filosofia e
Nicandro de Colófon
Drogas e política
Nicolaus Salernitanus
Salerno.
112
Orígenes
Herança da Filosofia e
Oribásio de Pérgamo
Medicina Bizantina.
Orta, Garcia de
Drogas asiáticas.
Paracelso
no title | Paracelso | Medicamentos químicos.
Paulo de Egina
Medicina Bizantina.
Pelletier, Joseph
Ipecacuanha
Peters, Hermann
Primeiros passos. | Glossário
Philaretros
Salerno.
Pires, Tomé
Drogas asiáticas.
Piso, Willem
Ipecacuanha | Ipecacuanha
Pitágoras
Bases filosóficas da Teoria
Plínio
Medicina greco-romana. | A utilização de drogas | Dioscórides | Dioscórides
Rafael
O Humanismo Médico.
Razés
Toledo.
Recchi, Nardo Antonio
Drogas americanas.
Ruelle, Jean de
Dioscórides
Sanches, António Ribeiro
Boerhaave.
Santorio, Santorio
Iatromecânica.
Schelenz, Hermann
Primeiros passos. | Glossário
Scribonius Largus
Medicina greco-romana. | Dioscórides
Serapião
Toledo. | Dioscórides
Sousa, Gabriel Soares de
Ipecacuanha
Sydenham, Thomas
Boerhaave.
Sylvius
Iatroquímica.
Teofrasto
Dioscórides
Teophilus
113
Salerno.
Turner, William
Herbários modernos e jardins
Urdang, George
Da história da profissão
Van Helmont, Joan Baptista
Iatroquímica.
Vesalius, Andreas
O Humanismo Médico. | O Humanismo Médico. | O Humanismo Médico.
Von Andernach, Gunther
O Humanismo Médico.
Willis, Thomas
Iatroquímica.
114
Bibliografia
1. Arber,A. Herbals: their origin and evolution. A chapter in the history of botany.
Cambridge: Cambridge University Press, 1988.
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Spice Trade Association, 1951.
6 Conrad, L.I. et al.. The Western Medical Tradition. 800 BC to AD 1800. Cambridge:
Cambridge University Press, 1995.
9 Elmer, P. The Healing Arts. Health, disease and society in Europe. 1500-1800.
Manchester: Manchester University Press / The Open University, 2004.
11 Folch Jou, G.; Suñé, J.M. e Valverde, J.L. Historia General de la Farmacia.
Madrid, 1986.
16 López Piñero, J.M. Breve historia de la medicina. Madrid: Alianza Editorial, 2000.
17 Miller, J.I. The spice trade of the Roman Empire. 29 B.C. to A.D. 641. Oxford:
Clarendon Press, 1969.
24 Reeds, K.M. Botany in medieval and Renaissance universities. New York and
London: Garland, 1991.
26 ``Folklore and Folk Medicines''. No Folk Tradition and Folk Medicine. Recognition
of Drugs in Classical Antiquity. Wisconsin: American Institute of the History of
Pharmacy, 1987. pp. 33-61.
116
27 Sneader, W. Drug discovery. The evolution of modern medicines. Chichester:
John Wiley & Sons, 1985.
117