Document 3
Document 3
Document 3
RESUMO
O presente trabalho objetivou investigar o conteúdo Lutas no currículo real da disciplina
Educação Física de escolas públicas situadas no interior do estado da Bahia, buscando
identificar os possíveis motivos que contribuem para a sua presença ou ausência nas aulas
desta disciplina. Para isso, foi utilizado, como instrumento investigativo, um questionário
contendo 15 questões, entre abertas e fechadas. A pesquisa contou com 26 professores que
atuavam em escolas públicas de 11 cidades. As Lutas ainda são pouco presente nas aulas
de Educação Física nesta região, sobretudo experiências pedagógicas de vivências
corporais. A formação acadêmica dos professores se mostrou determinante tanto na
presença quanto na ausência deste conteúdo no currículo real das escolas. Conclui-se que
alterações no formato das disciplinas que tratam o tema Lutas na graduação, a oferta de
formação continuada e a melhoria nas condições materiais das escolas podem contribuir
para uma presença mais efetiva das Lutas nas aulas de Educação Física. Sugere-se, então,
que as formações privilegiem as abordagens estruturadas em similaridades e nos princípios
das Lutas.
ABSTRACT
This study investigated the presence/absence of the contents martial arts in Physical
Education in the practicum curriculum of Bahia´s State schools. The aim was to identify
the possible reasons for that. To this, it was used applied a questionnaire containing fifteen
questions, between open and closed. The research involved 26 teachers who worked in
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
117
public schools in 11 Bahia´s cities. Like in other Brazilian regions, martial arts were little
addressed in classes, especially pedagogical activities of bodily experiences. As conclusion
teacher´s primary University formation is pointed as decisive in the presence or not of this
content in the real schools´ curriculums. We conclude that changes in the format of the
disciplines that treat the subject struggles in college, the provision of continuing education
and improvement in the material conditions of the schools can contribute to a more
effective presence of the struggles in Physical Education classes. Then it is suggested that
the formations in favor structured similarities and principles of the struggles approaches.
RESUMEN
El objetivo fui investigar la presencia/ausencia del contenido lucha en el currículo efectivo
de Maestría en Educación Física de las escuelas situadas en Bahía, identificando las
razones que contribuyen a su presencia o ausencia en las clases de esta disciplina. Como
herramienta de investigación se aplicó un cuestionario de 15 preguntas. Participaron 26
profesores que trabajaban en las escuelas públicas en 11 ciudades bahianas. En estas, como
en otras regiones del país, las luchas siguen estando insuficientemente representadas en las
clases de educación física, en especial las actividades pedagógicas de experiencias
corporales. Concluimos que la formación inicial del profesorado fue decisiva en la
presencia o ausencia de estos contenidos en el currículo real de las escuelas. Llegamos a la
conclusión de que los cambios en el formato de las disciplinas que tratan las luchas materia
en la universidad, la provisión de la educación continua y la mejora de las condiciones
materiales de las escuelas pueden contribuir a una presencia más efectiva de las luchas en
las clases de Educación Física. A continuación se sugiere que las formaciones en favor
estructurado similitudes y principios de las luchas de los enfoques.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
118
INTRODUÇÃO
Há pelo menos três décadas se discute a necessidade de diversificação dos conteúdos na
Educação Física escolar e um tratamento pedagógico que supere práticas tecnicistas.
Apesar disso, as Lutas, conteúdo clássico da cultura corporal, têm enfrentado dificuldades
em sua inserção no currículo real das escolas.1-3 A ausência deste conteúdo sugere que a
Educação Física escolar vem oferecendo uma formação limitada, já que negligencia um
conteúdo de grande relevância social.
Diretrizes curriculares de vários Estados4-8 preveem o ensino das Lutas nas aulas de
Educação Física, tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio. Mais que isso, os
documentos nacionais que orientam a constituição do currículo da Educação Física escolar
também indicam o ensino deste conteúdo.9-10
Em relação a essas questões, Santos e Paraíso15 afirmam que o termo currículo guarda
diversas especificidades e se manifesta no ambiente escolar em diferentes dimensões,
necessitando de terminologias específicas. Nesse sentido, os conhecimentos presentes no
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
119
plano oficial a serem ensinados nas diferentes disciplinas e séries compõem o denominado
currículo oficial, enquanto que as aprendizagens resultantes de experiências educativas
compõem o chamado currículo em ação ou real.
Breda et al.16:22 também sinalizam como dificuldades a recente inclusão deste tema na
Educação Física escolar e, consequentemente, o receio do professor em abordar o conteúdo
Lutas em suas aulas. Um conjunto de situações parece tornar esta insegurança justificada,
visto que muitos problemas são detectados, tais quais a escassez de propostas pedagógicas
de tratamento ao conteúdo Lutas e o pequeno número de publicações sobre o ensino das
Lutas.2, 17 Os indícios aventados pelos autores suscitam diversas questões, dentre elas: Por
que as Lutas não se estabelecem no currículo real da Educação Física escolar? Quais são as
maiores dificuldades enfrentadas pelos professores? A formação relacionada ao ensino das
Lutas nos cursos de Educação Física atende às demandas do cotidiano escolar?
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
120
nas aulas desta disciplina e sinalizar possibilidades de minimização de problemas
encontrados por meio de propostas recentes de pedagogia das Lutas.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Como o estudo pretendeu diagnosticar a realidade de uma determinada região, foi utilizado
como instrumento investigativo um questionário, visto que este recurso possibilita atingir
um grande número de pessoas, mesmo que estas estejam ou vivam em áreas geográficas
extensas.18 Apesar do número de professores que responderam aos questionários parecer
pequeno, esta quantidade passa a ser representativa quando se relaciona ao universo total
de profissionais que atuam com a disciplina Educação Física na região do Vale do
Jiquiriçá. A coleta de dados da pesquisa foi realizada durante um seminário de formação
dos professores de Educação Física que atuavam, durante o ano de 2013, em escolas
públicas sob a circunscrição da 4ª Diretoria Regional de Educação da Bahia – DIREC. A
pesquisa contou com a participação de 26 professores de 11 cidades1 diferentes,
representando uma amostra de 40% dos profissionais, de um total de 65 professores que
lecionavam a disciplina Educação Física na região administrativa desta diretoria, onde
existem 26 unidades escolares. Importante salientar que no estado da Bahia é permitido
que professores de outras disciplinas assumam as aulas de Educação Física para
completarem suas respectivas cargas horárias.
O questionário foi composto por 15 questões, entre abertas e fechadas, que versavam sobre
o ensino das Lutas nas aulas de Educação Física, as condições físicas e materiais das
escolas e sobre a formação inicial e continuada dos professores em relação ao tema Lutas.
A DIREC 4 encaminhou convite e garantiu transporte e alimentação a todos os professores
de escolas públicas desta região para participarem do referido evento. Todos os professores
que compareceram foram convidados a participar da pesquisa, sendo adotado como critério
de inclusão “ministrar aulas de Educação Física nas escolas públicas da região” e declarar
motivação e interesse em participar da pesquisa.
1
12 Municípios compõem a região administrativa da DIREC 4, dos quais 9 contaram com representantes nesta pesquisa,
a saber: Santo Antônio de Jesus, Dom Macedo Costa, Castro Alves, Aratuípe, Varzedo, Jaguaripe, Muniz Ferreira, Santa
Terezinha e Nazaré. Apenas Conceição de Almeida, Salinas da Margarida e Itatim não tiveram representantes. A DIREC
4 convidou professores de Ubaíra e Laje, cidades próximas e apoiadas pela diretoria, para participarem do evento, os
quais aceitaram participar da pesquisa, totalizando 11 cidades representadas.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
121
Para analisar os dados, recorreu-se a análise de conteúdo,21 que, segundo Souza Júnior,
Melo e Santiago,20 vem sendo bastante utilizada em pesquisas qualitativas em Educação
Física escolar, já que possibilita a análise de mensagens escritas ou transcritas. A opção por
essa técnica se deu por interesse de verificar além da frequência dos fenômenos, os seus
significados e relevância no contexto estudado.
Desta forma, a partir das respostas aproximadas dos participantes, levantamos os temas,
realizando as “formulações” e relacionando-as com o referencial teórico.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
122
junto à comunidade escolar. Tanto a formação inicial quanto a formação continuada,
agindo de maneira articulada, devem dar subsídios científicos para que o professor possa
sentir-se competente para recriar sua prática e atuar de maneira transformadora. Nesse
sentido, a inclusão das Lutas no currículo real da Educação Física estabelece dependências
com a formação dos professores em relação a esse conteúdo.
Estes dados indicam o distanciamento de propostas de ensino que tratam as Lutas a partir
de seus princípios gerais e aproximações.16, 22-23 Desta forma, as possibilidades de atuação
do professor ficam limitadas às poucas modalidades abordadas, que são, em geral,
trabalhadas tradicionalmente com ênfase em seus aspectos técnicos em detrimento das
possibilidades de relação com outras expressões através de suas semelhanças. No mesmo
sentido, destaca-se a ênfase no conteúdo Capoeira, indicando a preferência regional, visto
que o Vale do Jiquiriçá e Recôncavo Baiano2 são conhecidos por serem o berço desta
manifestação. No entanto, ao se oferecer como conteúdo apenas uma modalidade,
minimizam-se as possibilidades de ampliação das vivências e discussões sobre a cultura
corporal relacionadas às demais Lutas.
Um dos problemas reside no fato das próprias disciplinas ofertadas, embora tenham uma
denominação genérica como “Lutas” ou “Metodologia do Ensino das Lutas”, na prática
tratam, em muitos casos, de algumas poucas modalidades específicas, senão apenas uma
2
A DIREC 4 integra cidades destas duas regiões administrativas da Bahia.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
123
(em geral a que o docente domina com vivências como lutador). Como discutir as Lutas
sem que se restrinja o conteúdo abordando apenas uma modalidade?
Somente estudos mais recentes, marcadamente do final da década 1990, têm levantado
propostas de intervenção com as Lutas buscando tratá-las a partir de suas similaridades,
proporcionando a abordagem de diversas modalidades sem necessariamente excluir outras,
dentre eles destacam-se os estudos de Espartero,14 de Breda et al.,16 Gomes22 e Olivier.24 A
partir dos autores, uma alternativa para os componentes curriculares que abordam o tema
Lutas no ensino superior seja conduzir uma abordagem a partir destas propostas.
Espartero14 classifica as Lutas em três categorias, quais sejam, Lutas de agarre, Lutas de
golpes e Lutas com implementos. No mesmo sentido Breda et al.16 também apresenta
classificação das Lutas em elementos de curta, média e longa distância. Tais classificações
permitem ao professor melhor sistematizar seu planejamento no sentido de abordar as
Lutas partindo de seus princípios operacionais, envolvendo, desta forma, muitas
modalidades diferentes, mas com características semelhantes.
Do total de entrevistados (26 professores), apenas 12 afirmaram ter cursado a disciplina
Lutas na graduação. Destes, 8 afirmam que se sentem preparados para abordar este
conteúdo nas aulas de Educação Física. Contudo, 5 destes profissionais alegam que a
disciplina de Lutas cursada na graduação não foi suficiente para prepará-los para as
demandas enfrentadas na escola:
"Não. Obviamente as experiências acadêmicas nos dão uma boa base
para o trato com o conhecimento Lutas, porém as vivências das Lutas no
curso de formação acontecem muito pontualmente e às vezes
superficialmente, o que não contribui para uma maior apropriação do
conhecimento sobre o conteúdo já na Universidade." Prof. 43
Para ser capaz de abordar o conteúdo Lutas na Educação Física escolar e suprir as
deficiências da disciplina específica vivenciada na graduação, alega-se a necessidade de
formação continuada.
"Porque a graduação não é suficiente para que o professor sinta-se
habilitado para ensinar, é preciso uma busca continua de conhecimentos
para que se concretize o conhecimento e daí está apto para suprir as
demandas da escola." Prof. 13
3
Optamos por manter a originalidade das respostas, sem realizar modificações ortográficas.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
124
“Pois 60 horas de aula não foi suficiente para nos embasar de forma pelo
menos mediana. É preciso e pretendo me capacitar um pouco mais, pois,
as demandas são enormes." Prof. 11
Segundo Ferreira,3 muitos alunos encaram a disciplina de Lutas na graduação como “mais
uma disciplina descartável”, questionando como seria possível aprender judô ou caratê, por
exemplo, em seis meses e estarem aptos a empregarem esses conhecimentos na escola.
As experiências dos professores que colaboraram com esta pesquisa indicam a necessidade
de revisão das disciplinas que tratam do conteúdo Lutas nos cursos de Educação Física. O
aumento da carga horária ou inclusão de novas disciplinas nos currículos podem contribuir
na qualificação dos futuros professores. O ensino tecnicista parece não atender à realidade
escolar, ao mesmo tempo os professores reclamam por mais experiências práticas durante a
formação inicial, por isso, propostas que não sejam centradas nas técnicas formais mas
que, ao mesmo tempo, não negligenciem o fazer corporal presentes nas Lutas possam
concorrer para que as Lutas se façam mais presentes no currículo real das escolas.
Sobre a inclusão deste conteúdo nas aulas de Educação Física, quando questionados, 4
professores se posicionaram contrários ao ensino das Lutas nas aulas de Educação Física, 1
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
125
professor não respondeu e a grande maioria dos professores afirmou que concordava,
totalizando 21 professores, atribuindo ao conteúdo a contribuição para a formação cidadã,
evidenciando-se o estímulo a valores de relacionamento inter e intrapessoal.
No entanto, é interessante destacar que a minoria dos professores que se mostraram contra
a abordagem do conteúdo Lutas na Educação Física escolar, ao todo 4 professores,
alegaram como justificativa exatamente o contrário dos colegas que defendem o tratamento
deste conteúdo, ou seja, que a oferta de atividades relacionadas às Lutas estimulariam
atitudes inadequadas para a convivência, como a agressividade.
É importante destacar que estes 4 professores que se posicionaram contra a abordagem das
Lutas na Educação Física escolar não cursaram na graduação disciplina específica deste
conteúdo. Suas afirmações denunciam um entendimento superficial do fenômeno muitas
vezes relacionando luta à briga.24
Essa visão que vincula as Lutas ao aumento da violência também foi identificada em uma
investigação com alunos do ensino fundamental no Paraná, que não tinham experiência
com Lutas. Ao serem questionados se a prática das Lutas geraria mais violência, 84% dos
alunos (n-80) afirmaram que sim. Contudo, após a abordagem deste conteúdo em uma
intervenção de vinte horas, apenas 8% dos alunos continuaram afirmando que as Lutas
fomentavam a violência.28
Esse relato confirma a necessidade de abordamos este conteúdo nas aulas de Educação
Física, no intuito de desmistificar preconceitos relacionados às Lutas, além de cumprir a
função da escola de oferecer a apreensão de conhecimentos científicos, para que os alunos
possam fazer uma leitura crítica e intervir de maneira transformadora na sociedade.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
126
Negligenciar o ensino das Lutas no âmbito escolar pode ainda alimentar equívocos
fomentados pela mídia e contribuir para a proliferação de consumidores pouco conscientes.
Já que a mídia vem explorando com maior frequência emoções relacionadas à violência em
transmissões de Lutas.29
Outros professores concordam que seja possível abordar o tema nas aulas de Educação
Física, mas fazem ressalvas referentes às dificuldades geradas pela falta de conhecimento
relativo às técnicas das modalidades:
"Possível é, porque todos são capazes de aprender, mas considero muito
difícil e desconfortante para o professor que não tem experiência nem
afinidade com a área. Seria melhor se fosse possível o professor trabalhar
em conjunto com um professor específico da área." Prof. 4
"É possível, mas é bem mais difícil a partir do momento que você tem
que empregar as técnicas." Prof. 1
Por outro lado, a mesma dificuldade relativa ao não conhecimento das técnicas é o motivo
principal alegado por outros professores que entendem que não é possível ensinar as Lutas
sem esta vivência anterior. Identifica-se nas respostas forte tendência tecnicista e a
exigência do professor ensinar através do exemplo prático, distante ainda das
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
127
possibilidades de mediação/facilitação do docente e consequentemente da minimização dos
processos de criação, investigação e experimentação por parte dos alunos:
"Caso o professor nunca tenha praticado uma arte (luta) ele não tem
condições de ensinar". Prof 14
"Não. É preciso que tenha conhecimento e vivenciado para que saiba
como agir em determinadas atuações." Prof. 13
Esse posicionamento dos professores está alinhado a uma tradição formativa no campo das
modalidades de Lutas, que seguem um formato de repetição exaustiva, em que o aluno
‘copia’ o professor e assim reproduz tudo aquilo nas aulas e competições.16
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
128
sem experiência prática do professor, as seguintes respostas confirmam o tratamento
teórico:
"Só se for teórica, mas não terá tanta habilidade para trabalhar na
prática". Prof. 17
"Sim. Porque o conteúdo pode ser estudado na teoria, sem exatamente a
necessidade de praticá-los." Prof. 23
O fato de incluir a discussão das Lutas nas aulas de Educação Física pode ser considerado
um avanço, entretanto, não devemos perder de vista a necessidade de oferecermos espaço
para a apropriação do fazer corporal presente nestas manifestações. Parece que um dos
desafios postos a estes professores está relacionado à proposição de experiências corporais
aos seus alunos quando o tema for Lutas. Visto que a Educação Física não pode ser uma
disciplina apenas que fale sobre os esportes, jogos, danças, ginásticas e Lutas, correndo o
risco de perder aquilo que a caracteriza, o fazer corporal.
Somente em uma resposta foi encontrada ênfase em aulas baseadas apenas na prática de
modalidades ou ações relacionadas às Lutas:
"Sim, foi abordado Lutas livres sem socos, só no sentido de imobilizar o
colega, mas eles não aceitaram o desafio não estavam preparados para
tais desafios." Prof. 16
No entanto, foram relatadas propostas que relacionavam a prática com aspectos sociais,
históricos e econômicos, destacando a atenção na abordagem do conteúdo para além do
fazer corporal, aproximando-se da proposta defendida por Soares et al.13
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
129
Apesar da carência formativa apontada por diversos professores e escassez de bibliografia
e material didático disponíveis na região, foram relatadas experiências interessantes. A
sistematização e socialização dessas propostas podem ser uma alternativa para introduzir
de fato as Lutas no currículo da Educação Física escolar na região. A maioria das
experiências práticas relatadas por aqueles professores que abordaram o conteúdo Lutas
em suas aulas se aproximava de propostas estruturadas em similaridades das Lutas ou em
seus princípios,14, 16, 24 mesmo as experiências dos professores que tiveram uma formação
mais “tecnicista”.
Como exemplo de utilização das classificações é possível descrever uma aula em que se
abordem Lutas de pequena distância ou com agarre. Criar e vivenciar jogos com regras
onde se deva retirar o adversário de um local determinado ou projetá-lo ao solo podem
servir de gatilho para discussões sobre diferentes modalidades que envolvam esta dinâmica
como o Sumô, a Luta Olímpica e o Judô.
Ao responderem sobre quais materiais seriam necessários, a ênfase foi nos tatames, que de
fato pode contribuir para as atividades relacionadas às Lutas. Os demais materiais são
específicos de modalidades como luvas de boxe, protetores, vestimentas e instrumentos
musicais da capoeira, denunciando uma aproximação da percepção da prática atrelada às
diferentes modalidades.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
130
Como nenhum material de uso geral foi descrito, como cordas, cones, bolas, grandes
colchões, entre outros, é possível inferir duas situações: tais materiais já existam na escola,
ou não há percepção por parte do professor em utilizá-los em aulas com este conteúdo.
CONCLUSÃO
Apesar de ser considerado um conteúdo clássico da cultura corporal e marcar presença
significativa em diferentes momentos históricos da humanidade,9, 13-14 as Lutas, como em
outras localidades, ainda são pouco presentes nas aulas de Educação Física nesta região da
Bahia, sobretudo experiências pedagógicas de vivências corporais.
Este cenário, suas práticas docentes e as demandas do cotidiano escolar indicam que
propostas inovadoras do ensino de Lutas podem contribuir na inserção das Lutas nas aulas
de Educação Física. Tendo por características a abordagem da diversidade de modalidades
de Lutas com ênfase em seus princípios, afastando-se da ênfase nas técnicas específicas,
propondo a adaptação de materiais para as vivências, estimulando a criação de gestos a
partir de situações problemas oferecidas nas aulas, é possível minimizar as dificuldades
atribuídas para a inclusão deste conteúdo nas aulas de Educação Física.
Conclui-se que alterações no formato das disciplinas que tratam o tema Lutas na
graduação, a oferta de formação continuada, a melhoria nas condições materiais das
escolas, o aumento de publicações sobre o ensino das Lutas, assim como a sistematização
de experiências realizadas pelos professores da educação básica podem contribuir para
uma presença mais efetiva das Lutas nas aulas de Educação Física.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
131
REFERÊNCIAS
1
CARREIRO, E. Lutas. In: DARIDO, S. C.; RANGEL, I. C. Educação Física na escola:
implicações para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. p. 244-
261.
2
RUFINO, L. G. B.; DARIDO, S. C. Possíveis diálogos entre a Educação Física escolar e o
conteúdo das Lutas na perspectiva da cultura corporal. Conexões, Campinas, v. n. 1, p.
145-170, 2013.
3
FERREIRA, H. S. As lutas na Educação Física escolar. Revista de Educação Física, Rio
de Janeiro, v. 135, n.1, p. 36-44, 2006.
4
MINAS GERAIS (Estado). Secretaria de Educação e Cultura. Conteúdo básico comum:
Educação Física - ensino fundamental e médio. Belo Horizonte, 2005
5
PARANÁ. Departamento de Educação Básica. Diretrizes Curriculares da Educação
Básica: Educação Física. Curitiba, 2008
6
PERNAMBUCO (Estado). Secretaria da Educação. Orientações teórico-metodológicas:
ensino fundamental e ensino médio. Recife, 2008.
7
RIO GRANDE DO SUL (Estado). Secretaria da Educação. Referenciais Curriculares do
Estado do Rio Grande do Sul: linguagens, códigos e suas tecnologias. Porto Alegre,
2009.
8
SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Educação. Proposta Curricular do Estado de São
Paulo: Educação Física, ensino fundamental ciclo II e ensino médio. São Paulo, 2008.
9
BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação
Física. Brasília, 1997.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
132
10
BRASIL. Ministério da Educação Parâmetros Curriculares Nacionais: ensino médio.
Brasília, 1999.
11
FRANCHINI, E.; DEL VECCHIO, F. B. Princípios pedagógicos e metodológicos no
ensino de Lutas. In: FRANCHINI, E.; DEL VECCHIO, F. B. Ensino de lutas: reflexões e
propostas de programas. São Paulo: Scortecci, 2012.
12
RUFINO, L. G. B. A Pedagogia das lutas: caminhos e possibilidades. São Paulo: Paco,
2012.
13
SOARES, C. L. et al. Metodologia do ensino da Educação Física. São Paulo: Cortez,
1992.
14
ESPARTERO, J. C. Aproximación históricoconceptual a los deportes de lucha. In:
VILLAMÓN, M. Introducción al judo. Barcelona: Hispano Europea, 1999.
15
SANTOS, L. L. P.; PARAÍSO, M. A. “Currículo”. Revista Presença Pedagógica, v. 2,
n. 7, p. 82-84, 1996.
16
BREDA, M. et al. Pedagogia do esporte aplicada às lutas. São Paulo: Phorte, 2010.
17
CORREIA, W. R.; FRANCHINI, E. Produção acadêmica em lutas, artes marciais e
esportes de combate. Motriz, Rio Claro, v. 16, n.1, p. 1-9, 2010.
18
GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. ed. São Paulo: Atlas, 1999.
20
SOUZA JÚNIOR, M. B. M.; MELO, M. S. T.; SANTIAGO, M. E. Análise de conteúdo
como forma de tratamento dos dados numa pesquisa qualitativa em Educação Física
escolar. Movimento, Porto Alegre, v. 16, n. 3, p. 31-49, 2010.
21
BARDIN, L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
133
22
GOMES, M. S. P. Procedimentos pedagógicos para o ensino das lutas: contextos e
possibilidades. 2008. 139 f. (Dissertação de Mestrado em Educação Física) - Universidade
Estadual de Campinas, Campinas, 2008.
23
GOMES, M. S. P. et al. Ensino das lutas: dos princípios condicionais aos grupos
situacionais. Movimento, Porto Alegre, v. 16, n. 2, p. 207-227, 2010.
24
OLIVIER, J. C. Das brigas aos jogos com regras: enfrentando a indisciplina na escola.
Porto Alegre: Artmed, 2000.
25
TAFFAREL, C. N. Z. Programas sociais de esporte e lazer na escola e na comunidade: as
evidências de exclusão social e educacional na sociedade brasileira. Motrivivência, v. 38,
n. 1, p. 135-148, 2012.
26
TAFFAREL, C. N. Z.; SANTOS JUNIOR, C. L.; SILVA, W. A. Megaeventos
esportivos: determinações da economia política, implicações didático-pedagógicas e rumos
da formação humana nas aulas de Educação Física. Em Aberto, Brasília, v. 26, n. 89, p.
57-66, 2013.
27
NASCIMENTO, P. R. B.; ALMEIDA, L. A tematização das lutas na Educação Física
Escolar: restrições e possibilidades. Movimento. Porto Alegre, v. 13, n. 3, p. 91-110, 2007.
28
LIMA JUNIOR, H. C.; CHAVES JUNIOR, S. R. Possibilidades das lutas como conteúdo
na Educação Física escolar: o confrontamento em uma abordagem pedagógica com alunos
da 6ª série em um colégio estadual do município de Guarapuava-PR. Cadernos de
Formação RBCE, Florianópolis, v. 2, n.1, p. 69-80, 2011.
29
VASQUES, D. G.; BELTRÃO, J. A. MMA e Educação Física escolar: a luta vai
começar. Movimento, Porto Alegre, v. 19, n. 4, p. 289-308, 2013.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
134
30
PORT, V. P.; PRAZERES, R. M.; PINTO, F. M. Lutas e surfe na Educação Física
escolar. Cadernos de Formação RBCE, Florianópolis, v. 4, n. 1, p. 37-48, 2013.
Conexões: revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v. 13, n. 2, p. 117-135, abr./jun. 2015.
ISSN: 1983-9030
135