Material Suplementar MAT 2453 Fatos Fundamentais Sobre: Apresentação
Material Suplementar MAT 2453 Fatos Fundamentais Sobre: Apresentação
Material Suplementar MAT 2453 Fatos Fundamentais Sobre: Apresentação
Apresentação
O objetivo deste material é apresentar as principais propriedades dos números reais. Não
nos preocuparemos aqui com a definição de número real, e assumiremos apenas familiari-
dade do leitor com as propriedades dos números naturais, inteiros e racionais.
Os fatos aqui apresentados serão usados no decorrer do nosso curso de MAT2453, e nos
referiremos a estes resultados frequentemente. Desta forma, é recomendável que o aluno faça
uma leitura deste material.
N = {1, 2, 3, · · · }.
A existência de um tal conjunto é simplesmente postulada, e demonstra-se que é equiva-
lente ao Axioma do Infinito da Teoria dos Conjuntos.
Este conjunto pode ser descrito de um modo mais rigoroso utilizando-se os chamados
Axiomas de Dedekind-Peano. Os axiomas a seguir caracterizam completamente o sistema
de números naturais que conhecemos:
∗ [email protected]
1
Axiomas de Dedekind-Peano: O conjunto dos números naturais, N, é o único tal que:
(DP3) Existe um único elemento em N, denotado por 1, tal que (∀n ∈ N)(s(n) 6= 1);
O axioma (DP4) é tão importante que merece algum destaque. Ele também é conhecido
como “o Princípio da Indução Finita”, que é muito utilizado para se demonstrar proposições
acerca de números naturais.
Seja P uma “propriedade” de algum número natural; escreveremos P (n) para denotar a
fórmula que expressa “n satisfaz à propriedade P ”.
Por exemplo, se P é a propriedade “ser múltiplo de 3”, então P (n) significa “n é múltiplo
de 3”, e P (9) é válida, enquanto que P (10) não é. Se P é a propriedade “ser quadrado per-
feito”, então P (n) significa “n é um quadrado perfeito”, e P (4) é válida, enquanto que P (5)
não é, e assim por diante.
O Princípio da Indução Finita é muito utilizado para demonstrar resultados que dizem
respeito a números naturais. Abaixo apresentamos um exemplo de demonstração feita por
indução.
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Exemplo 1. Para todo n ∈ N tem-se:
2n ≤ ( n + 1 ) !
Supomos que valha P (k ), ou seja, que 2k ≤ (k + 1)! seja verdade (esta é a nossa Hi-
pótese de Indução) e mostramos, usando esta presunção nos permite concluir que 2k+1 ≤
((k + 1) + 1)!.
De fato, tem-se 2k+1 = 2 · 2k , de modo que pela Hipótese de Indução pode-se concluir
que:
2 · 2k ≤ 2 · ( k + 1 ) !
Como para qualquer número natural k vale 2 ≤ k + 2, segue que
3
Observação 2. Em muitos casos queremos mostrar que uma determinada propriedade P (n) é verda-
deira para todo n ≥ n0 , para algum n0 ∈ N. O Princípio da Indução Finita é facilmente adaptado
neste caso.
(i) P (n0 );
S = {m ∈ N | Q(m)} = {m ∈ N | P (m + n0 − 1)}
Note que Q(1) ≡ P (1 + n0 − 1) = P (n0 ), ou seja, como vale P (n0 ) e P (n0 ) ≡ Q(1), assegura-
se a validade de Q(1). Note também que:
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O princípio a seguir nos permite derivar importantes resultados sobre os números natu-
rais:
Princípio da Boa-Ordem: Todo subconjunto não vazio dos números naturais possui um
menor elemento.
X = {n ∈ N | {1, 2, · · · , n − 1, n} ⊂ N \ A}.
Portanto, X é o conjunto dos números naturais n tais que todos os elementos de A são
maiores do que n. Como estamos supondo que 1 ∈ / A, sabemos que 1 ∈ X. Por outro lado,
como A 6= ∅, nem todos os números naturais pertencem a X, ou seja, temos X 6= N. Pelo
axioma (DP4), vemos que deve existir algum n ∈ X tal que n + 1 ∈ X (ou então teríamos,
obrigatoriamente, X = N). Isto significa que todos os elementos de A são maiores do que n,
mas nem todos são maiores do que n + 1. Como não há números naturais entre n e n + 1,
concluímos que n + 1 ∈ A e n + 1 é o menor elemento de A.
(∀ x ∈ X )( x ≤ M).
Neste caso dizemos que M é uma cota superior de X.
Analogamente, dizemos que é limitado inferiormente se, e somente se existir N ∈ R tal que:
(∀ x ∈ X )( N ≤ x ).
Neste caso dizemos que N é uma cota inferior de X. Se X for limitado superior e inferiormente,
diremos simplesmente que X é limitado.
5
Exemplo 5. O conjunto sem elementos, ∅, é limitado, por vacuidade.
Exemplo 7. O conjunto:
x2
X= 2 |x∈R
x +1
é limitado superiormente e inferiormente. De fato, para qualquer x ∈ R tem-se:
x2 ≤ x2 + 1
de modo que:
x2
≤ 1,
x2 + 1
e X é limitado superiormente.
Para ver que A é limitado inferiormente, basta observarmos que 0 ≤ x2 < x2 + 1, ou seja,
x2
0≤ .
x2 + 1
Assim,
x2
(∀ x ∈ R) 0 ≤ 2 ≤1
x +1
donde segue que X é limitado.
(∀ x ∈ F )(min F ≤ x ≤ max F ).
(S1) (∀ x ∈ X )( x ≤ α);
6
X
α = sup X
α−ε xε α
sup[0, 1[= 1.
Vamos ver que este é mesmo o caso.
(S2) Vamos ter que demonstrar, agora, que se tirarmos qualquer quantia positiva ε > 0 de 1, por
menor que seja essa quantia, 1 − ε não é cota superior de X = [0, 1[ (ou seja, nenhum número menor
que 1 é cota superior de X). De fato, dado qualquer ε > 0, há (pelo menos) um elemento xε ∈ [0, 1[ que
“testemunha” que 1 − ε não é cota superior: basta tomarmos o ponto médio entre 1 − ε e 1, ou seja,
basta tomarmos:
ε
xε = 1 − .
2
Temos, assim,
ε
1−ε < 1− = xε < 1.
2
Como este argumento pode ser replicado para qualquer ε > 0, tem-se:
(∀ε > 0)(∃ xε ∈ [0, 1[)(1 − ε < xε < 1), e vale (S2).
X
0 1−ε 1− ε 1
2
7
√
3 ε
xε = 7−
2
e teremos:
√
3
√
3 ε √
3
7 < xε = 7− < 7
2
Definição 12 (máximo). Se X ⊂ R é um conjunto não vazio e limitado superiormente e α = sup X ∈
X, dizemos que α é o máximo de X, e escrevemos α = max X.
(I1) (∀ x ∈ X )( β ≤ x );
X
β = inf X
β xε β+ε
− X = {− x | x ∈ X }.
Uma vez que X é limitado inferiormente, existe N ∈ R tal que:
(∀ x ∈ X )( N ≤ x )
e portanto:
(∀ x ∈ X )(− x ≤ − N ),
de modo que − X é limitado superiormente. Como X 6= ∅, segue que − X 6= ∅, e pelo Axioma
do Supremo existe α ∈ R tal que α = sup(− X ).
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Afirmamos que inf X = −α.
De fato, como α é cota superior para − X tem-se, para todo x ∈ X:
−x ≤ α
donde:
−α ≤ x,
e portanto −α é cota inferior para X (i.e., vale (I1)).
Para qualquer ε > 0, como α = sup(− X ), existe xε ∈ X tal que α − ε < − xε ≤ α, ou,
equivalentemente:
−α ≤ xε < −α + ε
e vale (I2). Logo −α = inf X.
n0 · x > y
A = { n · x | n ∈ N}.
A certamente não é vazio, uma vez que 1 ∈ A (pois 1 · x = x ∈ A), e é limitado supe-
riormente por y. Pelo Axioma do Supremo, existe α ∈ R tal que α = sup A. Como x > 0,
α − x < α; assim, α − x não é cota superior de A. Logo, existe m ∈ N tal que:
α < (m + 1) · x,
o que é um absurdo, pois α é o supremo de A e (m + 1) · x ∈ A. Deste modo, supor que
(∀n ∈ N)(n · x ≤ y) nos leva a um absurdo. Logo deve existir n0 ∈ N tal que n0 · x > y.
Da propriedade arquimediana deduz-se o seguinte:
1
< ε.
n0
9
Demonstração. Consideremos, na Propriedade Arquimediana, x como sendo ε e y como sendo
1. Assim, existe n0 ∈ N tal que:
n0 · ε > 1,
ou seja,
1
ε> .
n0
Demonstração. Suponha que exista b ∈ R que seja cota superior de N, Como b > 0, 1
b > 0.
Pelo Teorema 17, existe n0 ∈ N tal que:
1 1
0< <
n0 b
ou equivalentemente,
b < n0 ,
ou seja, b não é uma cota superior para N.
Teorema 19. Entre quaisquer dois números reais, existe um número racional.
Demonstração. Sejam a, b ∈ R com a < b. Vamos mostrar que existe r ∈ Q tal que a < r < b.
Como a < b, tem-se b − a > 0, de modo que pelo Teorema 17 existe n0 ∈ N tal que:
1
0< < b − a.
n0
Seja A = { p ∈ N | p > n0 · a} e note que A 6= ∅. Com efeito, se A = ∅, então n0 · a seria
uma cota superior para N, o que implicaria que N é limitado superiormente, contrariando
o Teorema 18. Consequentemente, tem-se A ⊂ N com A 6= ∅. Pelo Princípio da Boa
Ordenação, segue que A tem um menor elemento. Seja m0 = min A.
Como m0 ∈ A, segue que:
m0
r= > a,
n0
e m0 ≤ p para todo p ∈ A. Ainda, tem-se que m0 − 1 ∈
/ A, ou seja,
10
m0 − 1 ≤ n0 · a.
Desta forma, segue que:
m0 m −1+1 m −1 1
r= = 0 = 0 + < a + (b − a) = b,
n0 n0 n0 n0
de onde segue a tese.
Teorema 20. Entre quaisquer dois números reais existe um número irracional.
a < b ⇐⇒ b − a > 0.
Pelo Teorema 17, existe um número natural n tal que:
1 1
< b − a, e portanto a + < b.
n n
Como n > 0, a < a + n . Tomando-se t = a + n tem-se t ∈ R \ Q (pois é soma de um
1 1 1
α − ( β − α) < β < α + ( β − α)
2α − β < β < β,
logo β < β, o que é um absurdo.
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Teorema dos Intervalos Encaixados: Seja [ a0 , b0 ], [ a1 , b1 ], · · · , [ an , bn ], · · · uma sequência
de intervalos satisfazendo as condições:
(i) [ a0 , b0 ] ⊃ [ a1 , b1 ] ⊃ [ a2 , b2 ] ⊃ · · · ⊃ [ an , bn ] ⊃ · · · ;
(ii) Para todo ε > 0 existe n ∈ N tal que bn − an < ε, ou seja, à medida que n cresce, o
comprimento do intervalo [ an , bn ] vai se aproximando de zero.
Nestas condições existe um único número real α que pertence a todos os intervalos da
sequência, isto é, existe um único número real α tal que:
(∀n ∈ N)( an ≤ α ≤ bn ).
a0 a1 a2 an bn b2 b1 b0
(∀n ∈ N)( an ≤ α ≤ bn ).
(∀n ∈ N)( an ≤ β ≤ bn ).
Como (∀n ∈ N)( an ≤ α), segue que (∀n ∈ N)(−α ≤ − an ). Assim,como para qualquer
n ∈ N tem-se β ≤ bn , segue que :
β − α ≤ bn − α ≤ bn − a n .
Como (∀n ∈ N)(α ≤ bn ), segue que (∀n ∈ N)(−bn ≤ −α). Também, como (∀n ∈
N)( an ≤ β) , segue que:
a n − bn ≤ β − bn ≤ β − α
Logo,
(∀n ∈ N)( an − bn ≤ β − α ≤ bn − an )
(∀n ∈ N)(−(bn − an ) ≤ β − α ≤ bn − an )
(∀n ∈ N)(| β − α| < bn − an )
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Por (ii) segue que para qualquer ε > 0 existe n ∈ N tal que |α − β| < bn − an < ε.
Desta forma, para todo ε > 0 tem-se:
X = { x ∈ Q | x2 < 2} ⊂ Q.
Note que X é limitado superiormente, pois o número 2 é uma cota superior para X. Com efeito, se
x2 < 2 então, em particular, x < 2.
Vamos demonstrar que embora este conjunto seja não vazio e limitado em Q, X não admite supremo
em Q.
Com efeito, para todo d ∈ X, mostraremos que existe h > 0 tal que d + h ∈ X - de modo que
nenhum elemento de X é cota superior de X e, muito menos o supremo de X.
Dado qualquer número racional d ∈ X, ou seja, tal que d2 < 2, é sempre possível obter um número
racional d + h, com h número racional positivo, tal que (d + h)2 < 2. Esta desigualdade se verifica se,
e somente se:
d2 + 2dh + h2 < 2,
ou seja, se, e somente se:
2dh + h2 < 2 − d2 .
Note que como d ∈ X, 2 − d2 > 0. Assim, a desigualdade anterior fica:
h · (2d + h) < 2 − d2 ,
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ou seja:
2 − d2
h< .
2d + h
Como h < 1, segue que 2d + h < 2d + 1 e que:
2 − d2 2 − d2
< ,
2d + 1 2d + h
de modo que se exigirmos que:
2 − d2
0<h<
2d + 1
teremos, consequentemente, h < (2 − d2 )/(2d + h) e, portanto (d + h)2 < 2.
Seja α ∈ Q \ X, de modo que α é uma cota superior para X. Mostraremos que existe ε > 0 tal que
α − ε ainda é cota superior para X.
Um tal ε > 0 deverá ser tal que 2 < (α − ε)2 , ou seja, tal que:
2 < α2 − 2αε + ε2 ,
e como α2 > 2, segue que:
2αε − ε2 < α2 − 2
(2α − ε) · ε < α2 − 2
e portanto bastaria tomarmos ε satisfazendo:
α2 − 2
ε< .
2α − ε
Como ε > 0, tem-se 2α − ε < 2α e, assim:
1 1
<
2α 2α − ε
α2 − 2 α2 − 2
<
2α 2α − ε
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α2 − 2
Basta, portanto, tomarmos ε = , e teremos que (α − ε) ainda é cota superior de X - de modo
2α
que α não é a menor das cotas superiores de X e, muito menos o supremo de X.
Das afirmações (1) e (2) segue que nenhum elemento de X ∪ (Q \ X ) = Q pode ser supremo de X.
Logo, embora X ⊆ Q seja não vazio e limitado superiormente, X não admite supremo em Q.
Referências
[1] Guidorizzi, H. L., Um Curso de Cálculo, Volume I, 5a edição. Editora LTC. Rio de
Janeiro, 2015.
[4] Neves, W., Uma Introdução à Análise Real, Editora UFRJ, 2014.
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