Gas Ideal Bosons

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12 Gás Ideal de Bósons

Essas notas estão baseadas no capítulo 7 do livro do Pathria (ref. 2) e capítulo 7 do Sethna

(ref. 3), capítulo 6 do Gould&Tobochnik (ref. 1), capítulo 3 da Vauclair (ref. 4), capítulo 10

do Salinas (ref. 5) e no artigo The elusive chemical potential, R. Baierlein, Am. J. Phys.

69 (4), 423 (2001).

Como zemos para o caso dos férmions, podemos inicialmente escrever as equações fun-

damentais para um gás ideal de bósons. Para a função de partição, tempos,

X
ln Z(T, V, µ) = − ln {1 − exp [−β (j − µ)]} (1)
j

lembrando sempre que a soma é sobre os estados de partícula única.

No limite termodinâmico, partindo do potencial grande canônico, podemos expressar a

pressão como

1
p(T, µ) = −kB T lim Z(T, V, µ) (2)
V →∞ V

O valor esperado de ocupação para os bósons (também conhecida como distribuição de

Bose-Einstein ) ca

1
hnj i = (3)
eβ(j −µ) −1

e o número termodinâmico de partículas é

X X 1
N= hnj i = (4)
j j
eβ(j −µ) −1

Finalmente, a energia interna se escreve na forma

X X 1
U= j hnj i = j (5)
j j
eβ(j −µ) − 1

1
Já comentamos no capítulo anterior que, para um gás de bósons, o potencial químico

necessariamente tem que ser negativo ou nulo. Para temperaturas altas, essa condição é

evidente. Para baixas temperaturas, o potencial químico pode se anular. Essa situação gera

efeitos físicos inesperados que discutiremos aqui. O fato do potencial químico ser negativo

reete a tendência dos bósons (ideais) de acumularem-se nos estados de uma partícula, e, a

medida que a temperatura diminui, nos estados de mais baixa energia.

Vamos discutir dois exemplos de gás ideal de bósons que permitem explorar as consequên-

cias físicas da estatística quântica de sistemas de partículas com spin inteiro. Temos duas

situações bem distintas, uma quando o número de partículas não é xo porque as partículas

tem massa zero e, portanto, energia de ponto zero, com partículas existindo virtualmente.

No outro caso, as partículas tem massa, e podem ter um número xo.

12.1 Condensação de Bose-Einstein

Vamos considerar um gás de bósons não-interagentes que possuem massa. Nesse caso, o

número de partículas é uma grandeza termodinâmica bem denida.

O melhor sistema para isso é um gás de átomos, com spin total inteiro, bosônicos, por-

tanto. Não vamos analisar o problema em detalhe, mas apenas desenvolver o suciente para

podermos ter uma percepção da física envolvida. Para isso, vamos considerar um sistema de

bósons sem spin, com massa m, não-relativísticos, e com energia  igual a

p2 −∇2
h= = (6)
2m 2m

onde h refere-se ao hamiltoniano de uma partícula (atenção para a nomenclatura; infeliz-

mente ela se confunde com a constante de Planck). A função de onda é simplesmente

~
eik·~r
ψ= (7)
V

e a energia da partícula se escreve

2
~k 2
= (8)
2m

Para T muito grande, recuperamos o caso (semi-)clássico e o potencial químico é

( 3/2 )
h2
  
µ 1N 1 3
= ln = ln nλ (9)
kB T 2V 2πmkB T 2 T

O critério para validarmos a aproximação semi-clássica é

nλ3T  1 (10)

Efeitos quânticos começam a aparecer quando o sistema ca menos diluído e/ou a tem-

peratura aumenta. Quando nλ3T é pequeno mas não desprezível, temos que considerar os

efeitos quânticos. A situação ca mais drástica quando nλ3T ca da ordem da unidade. Nesse

caso, a distinção entre férmions e bósons se faz necessária. A gura 1 mostra o potencial

químico em função da temperatura para uma densidade xa, onde podemos observar quando

os efeitos de spin tornam-se visíveis. Quando a temperatura diminui o suciente (depen-

dendo da concentração e da massa das partículas), o potencial químico atinge o valor nulo.

Enquanto isso não é um problema para férmions, esse é o limite máximo para bósons. Clara-

mente, nessas circunstâncias, a equação 9 não é mais válida. Na prática, a medida que a

temperatura diminui, mais e mais partículas condensam no estado fundamental formando

um condensado.

3
Figura 1: Potencial químico em função da temperatura para uma densidade xa para férmions
e bósons livres. A linha cheia indica o limite clássico. A temperatura T0 indica o início da
condensação de Bose-Einstein. Extraído da ref. 5.

Podemos examinar qualitativamente a situação observando que temos um número xo de

partículas, determinado pelo potencial químico:

ˆ ∞
g()
N (µ) = d (11)
0 e(−µ)/kT −1

Em geral, conhecemos N. Para conhecermos µ, variamos o seu valor na equação 11 até

encontrarmos o número de partículas correto. No entanto, sabemos que o potencial químico

não pode superar o valor de menor energia que um único átomo pode ter, o que nesse caso é

zero. Logo, µ deve sempre ser negativo. Para um grande número de partículas, aumentamos

o valor de µ forçando um número maior de partículas em cada estado de uma partícula.

Quando µ aproxima-se de zero, o número de partículas diverge.

4
Para bósons livres em três dimensões, o valor de N (µ) converge para um valor nito. O

número máximo de partículas que pode estar contido na caixa, na aproximação contínua da

densidade de estados, é obtido para µ = 0:

ˆ
cont g()
Nmax = d
e/kT
−1
ˆ ∞ √
V m3/2 
= √ d
/kT
2
2π ~ 0 3 e −1
√ !3 ˆ ∞ √
2πmkT 2 z
= V √ z
dz
h π 0 e −1
 
V
= ζ(3/2) (12)
λ3T

onde ζ é a função zeta de Riemann (caso especial das funções de Bose-Einstein que

veremos mais adiante), onde ζ(3/2) ≈ 2, 612.


Aqui temos o nosso resultado fundamental. A densidade de partículas atinge um valor

crítico para ncont cont


max = Nmax /V = ζ(3/2)/λT = 2, 612 partículas/volume de de Broglie. A

estatística quântica começa a dominar quando as partículas encontram-se aproximadamente

em um volume de de Broglie.

A questão que nos interessa é o que acontece quando tentamos introduzir ainda mais

partículas. Na prática, o que fazemos não é acrescentar mais partículas, mas trabalhar com

um número xo e baixar a temperatura. Quando a temperatura ca abaixo da temperatura

crítica, Tc ,

3/2
h2

N
kTc = (13)
2πm V ζ(3/2)

a aproximação contínua falha. A gura 2 exemplica essa situação. Quando o potencial

químico aproxima-se do menor valor de energia possível, a diferença entre esses dois valores é

muito menor que a diferença de energia entre o estado fundamental e o primeiro estado exci-

tado de uma única partícula (0 e 1 na gura). Consequentemente, a aproximação contínua

5
falha. Na prática, com a aproximação contínua, estávamos desprezando a participação do

estado fundamental, o qual agora tem a tendência a acomodar um grande número de partícu-

las. Na verdade, ele absorve o número excedente de partículas em relação àquele calculado

a uma certa temperatura na aproximação contínua. Essas partículas vão se encontrar todas

no estado fundamental, com a mesma fase, e o que temos é uma transição de fase, formando

um condensado de Bose-Einstein.

Figura 2: Níveis discretos de energia quando o potencial químico aproxima-se de 0 . Extraído


da ref. 3.

Vamos examinar em mais detalhe o que acontece nesse limite. Para isso, retomamos nossa

expressão para a pressão, escrevendo-a em termos da fugacidade z e de β:

pV X
= ln Z = − ln(1 − ze−βj ) (14)
kB T j

6
X 1
N= (15)
j
z −1 eβj −1

O gás de átomos está contido em uma caixa. Utilizando as condições de contorno per-

iódicas e aproximando a densidade de estados como um contínuo, temos a densidade de

estados

m √
g()d = 2md (16)
2π 2 ~3

O resultado que obtivemos antes simplesmente substitui a densidade de estados na soma

dos estados. Aqui está o ponto delicado de nossa aproximação. Ao somarmos (integrarmos)

na energia, estamos atribuindo um peso zero para os estados com  = 0. Embora essa

estratégia não é um problema no limite semi-clássico, uma vez que estamos falando de apenas

um estado em relação a uma innidade de outros, a situação torna-se crítica quando estamos

no limite degenerado. Para gases de bósons, um grande número de partículas pode encontrar-

se no estado fundamental e não é possível desprezar o peso estatístico desse estado. Temos

que corrigir essa contribuição. Para isso, vamos extrair esse estado da somatória antes de

transformá-la em uma integração. A justicativa rigorosa pode ser encontrada no Apêndice

F da ref. 2. As equações 14 e 15 escrevem-se agora na forma

ˆ ∞
p 2π √ 1
= − 3 (2m)3/2 d  ln(1 − ze−β ) − ln(1 − z) (17)
kB T h 0 V

ˆ ∞ √
N 2π  1 z
n= = 3 (2m)3/2 d + (18)
V h 0 z −1 eβ −1 V 1−z

O limite da integral foi extendido a zero uma vez que, como vimos, essa contribuição tem

peso nulo na integral. Vamos examinar agora em mais detalhe o último termo que destacamos

da somatória.

7
Para z  1, no limite semi-clássico, cada termo é da ordem de 1/N e, portanto, é

desprezível no limite termodinâmico. A medida que z aumenta (a temperatura diminui),

esse valor aproxima-se da unidade e, consequentemente o termo z/V (1 − z) pode tornar-se

uma fração signicativa de N/V . Note que os termos da eq. 18 referem-se ao número de

partículas nos estados excitados e no estado fundamental, ou seja,

N0 1 z
= (19)
V V 1−z

ˆ ∞ √
Ne 2π 
= 3 (2m)3/2 d
−1 β
(20)
V h 0 z e −1

onde N0 é o número de partículas no estado fundamental e Ne é o número de partículas

nos estados excitados. A medida que T → 0, N0 torna-se uma parte signicativa de N. É

esse fenômeno que dá origem a condensação de Bose-Einstein. Reescrevendo N0 , temos

N0
z= (21)
(N0 + 1)

Reescrevendo com esse resultado o segundo termo para a pressão, temos

1 1
ln(1 − z) = ln(N0 + 1) ≈ 0(N −1 ln N ) (22)
V V

e podemos desprezar para todos e quaisquer valores de z.


Podemos agora calcular a pressão e o número de partículas, substituindo β = x:

ˆ ∞
p 2 3/2 √
= − λ
1/2 T
dx x ln(1 − ze−x )
kB T π
0 ˆ
3 ∞ x3/2

2
3/2 2 3/2 −x ∞
= − 1/2 λT x ln(1 − ze )|0 − dx
π 3 2 0 z −1 ex − 1
ˆ ∞
4 x3/2 1
= 1/2
dx
−x
= 3 g5/2 (z) (23)
3π 0 1 − ze λT

8
Figura 3: Funções gν (z). Extraído da ref. .

e,

ˆ ∞
N − N0 2 3/2 x1/2 1
= 1/2 λT dx = g3/2 (z) (24)
V π 0 z −1 ex − 1 λ3T

onde introduzimos as funções de Bose-Einstein (ver Apêndice D da ref. 2) (ver a gura

para o comportamento das mesmas),

ˆ ∞
1 xν−1 z2 z3
gν (z) = dx = z + + + ... (25)
Γ(ν) 0 z −1 ex − 1 2ν 3ν

As equações 23 e 24 são as equações essenciais para descrever o sistema. Eliminando z

temos a equação de estado do sistema em questão. Podemos calcular a energia interna,

  
∂ 2 ∂ pV
U = − ln Z|z,V = kT
∂β ∂T kT z,V
  
d 1 3 V
= kT 2 V g5/2 (z) 3
= kT 3 g5/2 (z) (26)
dT λT 2 λT

9
Combinando as equações, temos,

2
pV = U (27)
3

que é a equação de estado já encontrada anteriormente.

Para valores pequenos de z, utilizamos a expansão da eq. 25 (e desprezamos N0 em

relação a N ). Com isso, podemos eliminar z se zermos uma inversão da série da eq. 24 e a

substituirmos na equação 23. A equação de estado toma a forma de uma expansão virial (já

vimos algo semelhante por ocasião da discussão do gás real clássico):

∞ l−1
λ3T

p X
= al (28)
nkT l=1
v

onde v = 1/n é o volume por partícula (já denido anteriormente) e os coecientes al são

conhecidos como os coecientes do virial do sistema. Os primeiros valores são,

a1 = 1
1
a2 = − √ = −0, 17678
4 2
 
2 1
a3 = − √ − = −0, 00330
9 3 8
 
3 5 1
a4 = − + √ − √ = −0, 00011
32 32 2 2 6
etc ... (29)

Para o calor especíco, temos,

    
cV 1 ∂U 3 ∂ pV
= =
N kB N kB ∂T N,V 2 ∂T N kB v
∞  3
l−1
3 X 5 − 3l λT
= al
2 l=1 2 v

10
"  3  3 2  3 3 #
3 λT λT λT
= 1 + 0, 0884 + 0, 0066 + 0, 0004 + ... (30)
2 v v v

Para T → ∞ (λT → 0) recuperamos o resultado clássico. Para temperaturas nitas, mas

altas (condição de validade desses resultados) o calor especíco tem um valor maior do que o

seu valor limite ou seja o calor especíco tem uma derivada negativa para temperaturas altas.

No entanto, o calor especíco deve ir para zero quando T → 0, temos que ter um máximo

em algum ponto. Isso vai acontecer exatamente na temperatura crítica (quando o potencial

químico se anula) e o máximo é na verdade na forma de um cume (cusp ), com a derivada do

calor especíco com a temperatura sendo descontínua. Examinaremos esse ponto mais tarde.

Antes vamos olhar o que acontece para temperaturas mais baixa.

A medida que a temperatura diminui, a expansão do virial não é mais possível. Temos

que voltar às equações anteriores. Para encontrarmos z temos de utilizar a equação 24, que

pode ser reescrita na forma

(2πmkB T )3/2
Ne = V g3/2 (z) (31)
h3

onde Ne é o número de partículas nos estados excitados ( 6= 0). Exceto no caso em que

z é muito próximo da unidade, Ne ' N . z tem como valor limitante a unidade. A medida

que T → 0, temos

N0 N
z= → (32)
N0 + 1 N +1

que é muito próximo da unidade (mas inferior). O valor de g3/2 (z)cresce monotonicamente
com z, como vimos, sendo limitada ao seu valor máximo para z = 1,

1 1
g3/2 (1) = 1 + + + ... ≡ ζ(3/2) ' 2, 612 (33)
23/2 33/2

Portanto, uma vez xados V, T , o número de partículas em equilíbrio em todos os estados


excitados tem um valor limite,

11
 
V
Ne ≤ ζ(3/2) ≡ Nmax (34)
λ3T

que é o valor encontrado anteriormente. Temos agora uma imagem mais precisa do que

acontece. Enquanto o número de partículas for inferior ao número máximo, temos Ne ' N e

o potencial químico é determinado pela equação 31. Quando o número de partículas excede

o valor máximo, não é mais possível para os estados excitados absorverem partículasa. Essas

colapsarão inteiramente para o estado fundamental,  = 0, o qual possui capacidade ilimitada


de abosrver partículas. O número de partículas no estado fundamental é dado por

 
V
N0 = N − ζ(3/2) (35)
λ3T

e o potencial químico é

N0 1
z= '1− (36)
N0 + 1 N0

ou seja, próximo da unidade, e recuperamos nosso resultado discutido qualitativamente, de

um número macroscópico de partículas acumulando-se em um único estado quântico ( = 0).


O fenômeno pode ser comparado a condensação de um vapor em líquido. No entanto, há

duas diferenças fundamentais: (a) a condensação de Bose-Einstein é um fenômeno puramente

quântico (na ausência de interações) e (b) ela ocorre no espaço dos momentos e não no espaço

de coordenadas espaciais.

Resumindo nossos resultados, a condição para a condensação de Bose-Einstein é que

(2πmkB )3/2
N > V T 3/2 ζ(3/2) (37)
h3

ou, se mantivermos N xo e variarmos a temperatura,

2/3
h2

N
T < Tc = (38)
2πmkB V ζ(3/2)

Para T < Tc , o sistema é uma mistura de duas fases:

12

(i) uma fase normal formada por Ne = N (T /Tc )3/2 partículas distribuídas nos estados

excitados, e

(ii) uma fase condensada formada por N0 {= N − Ne } partículas acumuladas no estado

fundamental.

A gura mostra a variação das frações Ne /N e N0 /N em função da temperatura. Para T >


Tc o sistema tem apenas uma fase (normal) e o número de partículas no estado fundamental

é z/(1 − z) ≈ 0(1), que é desprezível quando comparado com N. A situação muda para

T = Tc quando as partículas começam a condensar-se no estado fundamental. Próximos da

temperatura crítica, e aproximando-se por baixo, a fração de partículas no condensado tende

a zero com a dependência

 3/2
N0 T 3 Tc − T
=1− ≈ (39)
N Tc 2 Tc

A gura mostra a dependência de z com a temperatura (na verdade, com v/λ3T , a variável
da expansão do virial, que é proporcional a T 3/2 ).

Figura 4: Frações da fase normal e da fase condensada para o gás ideal em fução da temper-
atura. Extraído da ref. 2.

13
Figura 5: Fugacidade, z, para um gás de Bose-Einstein em função de (v/λ3T ). Extraído da
ref. 2.

Vamos agora analisar a equação de estado do sistema. Mais precisamente, o diagrama

(p, T ) mantendo v xo. Para T < Tc , a pressão é obtida da equação 23, fazendo z = 1,

kB T
p(T ) = ζ(5/2) (40)
λ3T

que é proporcional a T 5/2 e é independente de v (compressibilidade innita). Na temper-

atura de transição, a pressão é,

 3/2
2πm
p(Tc ) = (kB Tc )5/2 ζ(5/2) (41)
h2

que pode ser escrita na forma

ζ(5/2)
p(Tc ) = (nkB Tc ) ' 0, 5134(nkB Tc ) (42)
ζ(3/2)

A pressão exercida pelas partículas do gás de Bose-Einstein na temperatura de transição

é aproximadamente metade do valor exercido por um gás de Boltzmann, equivalente. Para

14
temperaturas acima da temperatura crítica,

g5/2 (z)
p = nkB T (43)
g3/2 (z)

onde z(T ) é determinado pela relação implícita

λ3T h2
g3/2 (z) = =n (44)
v (2πmkB T )3/2

Não há uma forma simples de escrevermos a pressão em termos da temperatura. Para

T  Tc podemos utilizar a expansão do virial. Para T → ∞, recuperamos o valor clássico,

p = nkB T . A gura 6 mostra o diagrama p × T, onde a linha de transição refere-se a

equação 40. A pressão segue a curva de transição entre T = 0 e T = Tc , quando separa-

se assimptoticamente, convergindo para o valor clássico. Essa gura representa também

a variação de U com a temperatura (sempre com v xo) Podemos novamente vericar a

forma do calor especíco a volume constante. Ele diminui com a temperatura, indo a zero

a medida que a temperatura anula-se e cresce com a temperatura atingindo um máximo em

T = Tc . Para T > Tc ele diminui, convergindo assimptoticamente para o valor clássico. A

forma esquemática da dependência do calor especíco com a temperatura está representada

na gura 7.

15
Figura 6: Pressão e energia interna de um gás de Bose-Einstein em função da temperatura.
Extraído da ref. 2.

16
Figura 7: Calor especíco de um gás de Bose-Einstein em função da temperatura. Extraído
da ref. 2.

A condensação de Bose-Einstein foi prevista por Einstein, baseado nos trabalhos de Bose,

em 1924-1925. As primeiras manifestações desse efeito foram identicados com a fase su-

peruida do He4 , em 1938, por F. London. A razão disso foi a identicação da variação

do calor especíco do He4 com a temperatura e sua comparação com a previsão teórica. A

gura 8 mostra os resultados experimentais de Buckingham and Fairbank. A temperatura

crítica do He4 superuido é de 2,19 K. A previsão teórica, utilizando os parâmetros do He4 ,


m = 6, 65 × 10−24 g e v = 27, 6cm3 /mole, produz uma temperatura crítica de 3,13 K, muito

próxima, portanto. Embora o He4 superuido não é uma manifestação da condensação de

Bose-Einstein, essa está relacionada ao seu comportamento superuido.

17
Figura 8: Medidas do calor especíco do hélio a volume constante nas vizinhanças do ponto
crítico (λ). Interessante observar a precisão com que a temperatura crítica pode ser denida.
(gura extraída da ref. 5, baseada no artigo de M.J. Buckingham e W.M. Fairbank, publicado
no Progress in Low Temperature Physics, vol. 3, editado por C.J. Gorter, North Holland,
1961).

A condensação de Bose-Einstein só foi observada em 1995, em um gás de átomos bosôni-

cos, por E. A. Cornell, W. Ketterle e C.E. Wieman, trabalhando com metais alcalinos (rubídio

e sódio).Para atingirem esse estado, foi necessário reduzir a temperatura para valores da or-

dem do nano-kelvin. Por esse trabalho eles ganharam o prêmio Nobel em 2001. A gura 9

mostra o resultado fundamental da condensação de Bose-Einstein, onde as duas dimensões

planares representam dimensões no espaço de momentos e a terceira dimensão é a intensidade

(número de partículas). A sequência mostra a evolução de um gás de átomos frios para um

gás onde uma parte dos átomos condensa em um único estado.

18
Figura 9: Condensação de Bose-Einstein. Extraído de
http://nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/2001/public.html

Nota nal : A discussão que zemos aqui indica que não é possível formar fases de con-

densado de Bose-Einstein com partículas que não conservam seu número, como os fótons. No

entanto, recentemente, (J. Klaers, J. Schmitt, F. Vewinger e M. Weitz, Nature 468, 545 (25

nov. 2010)), foi observado a condensação de Bose-Einstein em fótons. Como isso é possível?

Só há uma forma: os fótons devem estar em uma situação onde seu número se conserva. Isso

foi possível connando os fótons em microcavidades ópticas (ver comentário de J. Anglin,

Nature 468, 517 (25 nov. 2010)).

12.2 Radiação de Corpo Negro

Consideremos a radiação de um corpo negro. O sistema é composto pela radiação eletromag-

nética connada em um volume xo, V , a uma temperatura determinada, T . Na linguagem da

19
quantização do campo eletromagnético, temos um sistema de fótons não-interagentes (dentro

de uma boa aproximação), cada um com uma energia hν , onde ν é a frequência da radiação.

O sistema mantém-se em equilíbrio pela interação dos fótons com as parades do recipiente

que o contém. Os átomos podem emitir e absorver fótons, de forma que o número total de

fótons não é mantido. Quando um corpo em equilíbrio térmico emite radiação, chamamos

de radiação de corpo negro e o objeto um corpo negro. O nome origina-se na radiação que

é perfeitamente absorvida e re-emitida pelo objeto. A forma da radiação - seu espectro -

depende apenas da temperatura T. A lei de radiação do corpo negro foi derivada por Planck

e deu início a mecânica quântica.

A lei de radiação de Planck pode ser derivada no ensemble canônico ou no grande-

canônico. A não-conservação do número de fótons faz com que o potencial químico anule-se.

Há várias maneiras de compreendermos esse resultado. A mais direta é partir do fato que o

equilíbrio é estabelecido pelas interações entre os fótons e os átomos das paredes do recipi-

ente. Portanto, o número de fótons N não pode ser imposto externamente (pelo contato com

um reservatório de fótons, por exemplo), mas sim, xado pela temperatura T das paredes

do recipiente e do volume V ali contido. Na verdade, o que podemos conhecer é o número

médio de partículas, hN i, o qual depende de T e V. Ou seja, hN i → hN i (T, V ). Tudo que

precisamos saber sobre o gás de fótons em equilíbrio térmico pode ser conhecido sabendo-se a

temperatura e o volume. ou seja, a entropia pode ser escrita em função de T, V . Com isso, a

temperatura pode ser escrita em termos de S, V . logo, a energia - normalmente considerada

função de T, V - pode ser expressa em função de S e V. Com isso, a energia livre, F , também
não depende explicitamente de N, mas apenas de T, V : F (N (T, V ), T, V ) → F (T, V ). N não

é uma variável termodinâmica e toda derivada da energia livre com S e V constantes deve ser

zero: µ = (∂F/∂N )V,S = 0. Nesse caso, a distribuição de Bose-Einstein ca simplesmente,

1
hnj i = (45)
eβj −1

Uma discussão mais ampla sobre o potencial químico anular-se no caso dos fótons pode

20
ser encontrado no artigo de R. Baierlein (Am. J. Phys. 69, 423 (2001)).

Nosso objetivo agora é calcular a distribuição de energia dentro da caixa, quando em

equilíbrio. A radiação emitida reetirá essa distribuição. Para isso, precisamos calcular a

densidade de estados por unidade de energia para esse sistema (a mesma grandeza g() que

calculamos para obter o número de microestados no ensemble microcanônico). Para isso,

temos que relembrar a dispersão dos fótons,

 = ~ω (46)

e,

2
~k 2 = ω (47)
c2

O número de estados de um único fóton com frequência ω dentro de um intervalo dω , é

g(ω)dω , que pode ser calculado na forma

 
d ~
k  
2  2V
g(ω)dω = (4πk ) dω  (48)
dω (2π)3

É comum para fótons escrevermos g(ω) em vez de g(). Temos então uma densidade de

estados por unidade de frequência. Observe que gω (ω)dω = g ()d, e, portanto, gω = ~g .
Os termos da expressão 48 são facilmente identicáveis: o primeiro termo é a superfície de

~
uma esfera de raio k , o segundo termo é a espessura da casca nessa superfície, contendo

os estados no intervalo dω, o terceiro termo é o número de estados de um único fóton por

intervalo de volume do espaço-~


k. O fator dois deve-se a existência de duas polarizações

independentes para os fótons (não confundir com o spin!). Da equação 47 temos,


d ~
k

1
= (49)
dω c

e então,

21
V ω2
g(ω) = (50)
π 2 c3

A energia eletromagnética (fótons) por unidade de volume, u(ω) = E(ω)/V é,

~ωg(ω)
u(ω)dω = dω
e~ω/kT −1
~ ω3
= dω (51)
π 2 c3 e~ω/kT − 1

Essa é a fórmula de Planck para a radiação de corpo-negro. Historicamente, introduz a

quantização da radiação eletromagnética e a constante h, conhecida agora por constante de

Planck, mais utilizada na sua forma ~ = h/2π . A gura 10 mostra a radiação de corpo-negro

calculada por Planck (e de acordo com os dados experimentais) e o resultado obtido por

Rayleigh-Jeans, a partir da equipartição de energia (clássica).

Figura 10: Espectro demissão da radiação de corpo-negro calculado por Planck e por
Rayleigh-Jeans. Extraído da ref. 3.

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Para baixas frequências, temos,


e~ω/kT − 1 ≈ (52)
kT

e obtemos a expressão de Rayleigh-Jeans,

 
kT
uRJ (ω)dω = V ω 3 dω
π 2 c3
= kT g(ω) (53)

ou seja, kT por oscilador harmônico.

Para altas frequências, a fórmula de Rayleigh-Jeans leva a conhecida catástrofe do ul-

travioleta. Obviamente, nesse regime, a equipartição de energia não se sustenta. O gap de

energia de ~ω leva a uma supressão da ocupação dos estados mais energéticos por um fator

aproximadamente de Boltzmann (1/(e


~ω/kT
− 1) ≈ e−~ω/kT .

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Referências
[1] Harvey Gould e Jan Tobochnik, Statistical and Thermal Physics, Princeton Uni-

versity Press, 2010 e http://www.compadre.org/stp (Statistical and Thermodynamic

Project, apoiado pela National Science Foundations  EUA).

[2] Pathria,

[3] James P. Sethna, Statistical Mechanics: Entropy, Order Parameters, and Com-

plexity, Oxford Master Series, 2006.

[4] Sylvie Vauclair, Elements de Physique Statistique, InterEditions.

[5] Sílvio S. Salinas, Introdução à Física Estatística, EdUsp, 1997.

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