Ana Claudia Cmaior Monografia 27 Mar 14 (2) - 4
Ana Claudia Cmaior Monografia 27 Mar 14 (2) - 4
Ana Claudia Cmaior Monografia 27 Mar 14 (2) - 4
CAMPO MAIOR
2014
1
Campo Maior
2014
2
BANCA EXAMINADORA
AGRADECIMENTOS
Meu agradecimento primeiro é a Deus, que, durante a minha trajetória, dotou-me de forças
para que, diante dos empecilhos, não desistisse dos meus propósitos. A Ele agradeço pelo
dom da minha vida e por ter-me possibilitado a conquista de mais um sonho;
Ao meu tio Benedito Manoel, que sempre esteve presente na minha vida como pai,
incentivando a não desistir dos meus objetivos, que durante o curso assumiu verdadeiramente
o papel de pai. Meu agradecimento especial a você, meu querido tio, juntamente com minha
tia Maria Francisca Ibiapina, que foi muito importante nesse meu caminho;
À minha mãe Anastácia da Cruz, que, com sua força e determinação, mostrou-me que eu era
capaz de trilhar este caminho. Obrigada pela compreensão e pelo amor que dedicas a mim;
você é minha grande inspiradora;
Aos meus familiares que também contribuíram com suas palavras de incentivo, com
pensamento positivo, em especial à Maria Grazielly, minha prima querida, com quem dividi
momentos de dificuldades e angústia, ajudando-me a superá-las;
Aos professores da UESPI, que, de alguma forma, também contribuíram para a concretização
deste objetivo.
Aos meus amigos de curso, Anadilia Ribeiro, Antonio Fernandes, Antonio Serezo, Jessica
Gadelha e Roniel Ibiapina, que dividiram comigo as dificuldades, as dúvidas e anseios de
desenvolver um bom trabalho e a troca de conhecimento mediante as nossas discussões.
Agradeço também suas palavras de incentivo, de perseverança, os momentos que dividimos e
que estivemos juntos. Obrigada!
4
RESUMO
O presente trabalho monográfico analisa a paisagem cultural dos jardins históricos de Campo
Maior-Piauí, correspondente ao final dos anos 1970 ao início de 2013, e, dentro dessa
perspectiva, avalia-se a própria história da cidade, destacando aspectos de quando a mesma
ainda era conhecida como vila, até o momento em que a cidade, impulsionada pelo
extrativismo da cera da carnaúba, começa a passar por significativas mudanças na sua
estrutura física, momento chave para discutir a instalação dos jardins históricos, que surgem
com esse discurso de urbanização, de melhoramento urbano. Percebe-se que estes jardins
fazem parte desse processo de desenvolvimento da cidade, não foram criados aleatoriamente,
possuem estilos, significados e características próprias, não estando isolados da história de
Campo Maior. Pelo contrário, têm uma relação intrínseca com a mesma. Assim, contam
histórias, vivenciadas por outras pessoas, num determinado tempo e espaço, que podem ser
analisadas. Utilizou-se de pesquisas bibliográficas, acervos que tratam dos jardins no Brasil,
como também acervos de trabalhos locais e fontes iconográficas da época em análise. Os
resultados obtidos apontam que estes jardins, mesmo se constituindo em um bem cultural,
possuindo significações artísticas, históricas e culturais, não são igualmente percebidos dessa
forma e tampouco existem medidas para sua preservação.
ABSTRACT
This monograph Word analyzes the cultural landscape of the historic gardens of Campo
Maior-Piauí corresponding to the late 1970 to the beginning of 2013, and within that
perspective, evaluated the city’s own story, highlighting aspects of when it was still known as
village, until the moment in which the city, driven by the carnauba wax extraction, begins to
go through significant changes in its physical structure, key moment to discuss the creation of
the historicos gardens, that arise with this speech of urbanization, urban improvement. One
realizes that these gardens are part of that process of development of the city, were not
randomly created, have styles, meanings and own characteristics, not being isolated from
history de Campo Maior, on the contrary has an intrinsic relationship whith the same, so tell
stories, experienced by other person, at a particular time and space, that can be analyzed. Used
bibliographical research, collections dealing with gardens in Brasil, but also collections of
local jobs, iconographic sources of time analysis. The results obtained indicate that these
gardens even if being in a cultural object, possessing artistic, historical and cultural meanings,
are also perceived in this way and so little there are measures for its preservation.
LISTA DE SIGLAS
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 10
2 SENTIR E NARRAR: A HISTÓRIA DOS JARDINS BRASILEIROS................. 13
2.1 INTRODUZINDO A QUESTÃO: OS JARDINS HISTÓRICOS COMO
PATRIMÔNIO CULTURAL......................................................................................... 13
2.2 ARTE NA PAISAGEM: OS JARDINS PÚBLICOS................................................... 19
2.3 DESAFIOS E CRITÉRIOS DE PRESERVAÇÃO DOS JARDINS HISTÓRICOS..... 27
3 UM PASSEIO PELOS JARDINS HISTÓRICOS DE CAMPO MAIOR-PI......... 34
3.1 APRESENTA-SE A CIDADE..................................................................................... 34
3.2 A URBANIZAÇÃO EM CAMPO MAIOR................................................................. 37
3.3 (FOTO)GRAFANDO OS JARDINS PÚBLICOS DE CAMPO MAIOR.................... 44
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... 55
REFERÊNCIAS........................................................................................................... 58
GLOSSÁRIO.................................................................................................................62
10
1 INTRODUÇÃO
A paisagem como objeto de estudo foi, durante algum tempo, abordada mais pela
Geografia, que trabalha com conceitos de espaço, lugar, território e região, para desenvolver
concepções e interpretações sobre a mesma. Porém, as outras áreas do conhecimento, como
História, passaram a refletir sobre a paisagem, adotando-a como objeto de análise, surgindo,
assim, outras abordagens e concepções distintas nesse processo que está pautado em teorias e
metodologias de cada área do conhecimento que se propõe a analisar este objeto de estudo. O
conceito de paisagem está sempre em construção, pois, não se tem um conceito único ou
isolado, e tampouco se pode apreendê-la de forma totalizante. No entanto, as diversas
concepções dialogam entre si. Seu entendimento perpassa tanto pela relação do homem com a
natureza, quanto pelo seu aspecto fisionômico. Nesse caso, seu recorte espacial é o que pode
ser apropriado pela percepção humana. Assim, são várias perspectivas criadas pelos diversos
profissionais para o estudo da paisagem, sendo plausível analisá-la por uma perspectiva
histórica e não somente geográfica.
Para Milton Santos (2006), paisagem é o conjunto de formas, que, num dado
momento, exprime as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre
homem e natureza. A paisagem é comumente pensada como um conjunto que reúne
elementos da natureza com aqueles que foram modificados pelo homem, num determinado
tempo e espaço; seria a união do ambiente natural com o social, na qual se integram na
paisagem as diversas formas de que o homem se relaciona com a natureza. É nessa
perspectiva que será analisada a paisagem, neste trabalho, e ressalta-se que, para se lançar
reflexões sobre a mesma, é de fundamental importância o embasamento teórico, para que suas
concepções não se tornem superficiais e que possam de fato contribuir para seu entendimento.
Alguns trabalhos versam sobre o estudo da paisagem e, obviamente, se apropriam de
métodos e perspectivas distintas, como Carl Sauer (1925), que discorre sobre a paisagem
geográfica como uma área composta por uma associação distinta de formas, ao mesmo tempo,
físicas e culturais; Roberto Burle Marx (2004), que analisa a paisagem como um todo e
qualquer ambiente do território no domínio visual; e Carlos Sait (2005), que trabalha com a
concepção de que a paisagem é um fragmento do espaço que os olhos abarcam, portanto, é o
que se consegue ver, captar por meio do olhar.
Com efeito, em 1992, a UNESCO adotou a paisagem como bem, constituindo-se
como paisagem cultural, criada intencionalmente pelo homem. Este, por sua vez, parte de uma
sociedade com valores, ideias e padrões sociais específicos, influências que se refletem nessas
11
1
As cartas Patrimoniais são recomendação para as Nações sobre a salvaguarda do patrimônio histórico
mundial. Não se constitui como medidas punitivas, mas recomendações de preservação.
12
cidade. Por esse motivo, o trabalho apropriou-se também de estudos locais, que evidenciaram
o momento em que isso se procedeu.
Cria-se, portanto, uma relação entre os jardins históricos e a cidade, tornando esses
espaços importantes vias de conhecimento, que situam a história de Campo Maior num tempo
e espaço que remete a outro período histórico. Nesse caso, os jardins se inserem no momento
em que a cidade passava por mudanças na sua malha urbana, impulsionadas pelo extrativismo
da cera da carnaúba, que, segundo Celso Chaves (2007), é um processo teve início na década
de 1940.
Nessa perspectiva, este trabalho dialogou tanto com estudo de autores que lançavam
reflexões sobre os jardins históricos do Brasil, avaliando em que cidades dispõem-se dos
mesmos e, nesse aspecto, buscou-se estabelecer uma ponte de análise, a partir de uma reflexão
dos jardins de Campo Maior, com aqueles que se fazem presente em outras cidades
brasileiras, como também com autores que analisam a história dessa cidade, destacando os
diferentes estilos, sentido e propostas destes jardins.
A temática da monografia é disposta em capítulos, sendo que o primeiro analisa a
história dos primeiros jardins históricos no Brasil, situando-os nas cidades brasileiras e
contextualizando o período de sua criação. Insere-se também nessa discussão o momento em
que o jardim passa a ser percebido como patrimônio cultural e passa-se a refletir sobre as
medidas de preservação, como também os desafios para atender a tal objetivo.
O segundo capítulo tem como foco os jardins históricos de Campo Maior, perpassando
também por uma análise da história dessa cidade, sendo necessária para identificar o
momento em que os jardins começam a fazer parte dessa cidade, como também uma avaliação
seu estado atual, sendo perceptível às transformações causadas pelo tempo e pelo homem.
13
do Lagarto (1786), o chafariz da Pirâmide (1789) e o chafariz das Saracuras (1795). Sobre os
traçados deste Passeio Público, afirma Carvalho (1999, p. 18):
Esse jardim, percebido também como passeio, foi criado para ser um espaço de lazer,
isto é, um jardim público destinado às pessoas de maneira geral, e unia uma vegetação
autóctone e exótica, como a exuberância das mangueiras, tamarineiros, jaqueiras, jambeiros,
fruta-pão, flamboyants, cedros, vinháticos, palmeiras, pinheiros.
Ainda de acordo com Jeanne Trindade (2009), o Passeio Público do Rio de Janeiro do
século XVIII foi um projeto muito arrojado para a época, quer seja pelo traçado original e
solução urbanística, quer pelas obras de arte implantadas e pelos trabalhos de engenharia para
o aterramento da lagoa e a construção do terraço à beira-mar, mas, principalmente, pela
possibilidade de oferecer à população carioca um “jardim de prazer”.
Com isso, os jardins simbolizavam progresso e civilização das cidades que aos poucos
passavam por mudanças impulsionadas pelo processo de urbanização. Assim,
o jardim em todos os tempos, entre todos os povos, surgiu nos momentos máximos
de suas respectivas civilizações, não houve povo que evoluindo não se congregasse
em cidade. Não houve cidade que evoluindo não contivesse jardins (MARX, 1935
apud SILVA, 2010, p. 24).
Predominando, portanto, a inspiração nos jardins franceses, pelo traçado mais rígido
e utilização de repuxos com bacias e palmeiras, e figuravam componentes dos
jardins ingleses, como lagos com pedras e pontos rústicos, estátuas em bronze e
luminárias em estilo Art Nouveau (SILVA, 2010, p. 39).
Com relação à estrutura dos jardins públicos, salienta-se que são compostos tanto por
elementos naturais, nesse caso, a vegetação, com suas cores e volumes, quanto também por
elementos arquitetônicos, como os traçados, o perfil do terreno, bancos e canteiros. Estes e
outros objetos decorativos formam o mobiliário desses espaços públicos, entretanto, a
presença desses elementos não serve como modelo único de um jardim público. Existem
variações nos jardins das diversas cidades brasileiras, pois existem trabalhos diversos e com
propostas distintas. Tem-se como exemplo Auguste François Marie Glaziou, que seguia a
proposta de caminhos sinuosos, canteiros assimétricos e recantos pitorescos diferente das
linhas rígidas do Mestre Valentim.
Compreende-se, dessa maneira, que os jardins brasileiros foram concebidos, num
primeiro momento, por um forte discurso de modernização, no qual se observam mudanças na
malha urbana das cidades, modificada ao longo da história, e, para conservação dos jardins,
atualmente muitos desses espaços paisagísticos estão sendo restaurados. É uma das ações que
engloba a conservação, buscando manter e preservar suas características iniciais e atuais
adquiridos ao longo do tempo. Convém enfatizar que a criação desses jardins públicos esteve
presente em muitas cidades, que seguiam essas influências como modismo. Nesse plano,
gradualmente, muitas cidades foram criando seus próprios jardins, que ainda seguiam
modelos europeus. Surgiam assim, aos poucos, vários projetos paisagísticos que mudavam
17
praças, ruas e alamedas, trazendo para esses espaços árvores e plantas de grande e pequeno
porte. Ora se percebia na paisagem aspectos da flora brasileira, ora identificava-se com mais
ênfase elementos característicos dos jardins europeus. Dessa forma, os jardins brasileiros
seguiam e valorizavam aspecto muito mais de fora do que do próprio país, portanto, havia
pouca valorização da paisagem brasileira.
Não obstante, deve-se enfatizar que criar e fazer jardins não significa encher um
espaço com plantas de forma desordenada, dificultando a circulação dos indivíduos. Fazer
jardins é saber associar as diversas espécies vegetais, respeitando suas peculiaridades,
harmonizá-las. Assim, compor um jardim não é aglomerar plantas e sim buscar um equilíbrio
entre as associações.
Os jardins se caracterizam também pela concentração de vegetação e, por isso, analisa-
se igualmente a paisagem. Nesse contexto, ressalta-se a fala de Chiara Vangelista (2012, p.
38), ao afirmar que “Os estudiosos da paisagem, substancialmente, concordam sobre a forma
básica de sua construção: a paisagem é o resultado da interação entre o sujeito e a natureza”.
Assim, a paisagem é resultado da interação e da ação do homem, que a observa e a interpreta
de acordo com sua subjetividade. Para tanto, a paisagem vai ganhando significado e sentido
perante o olhar de quem a observa atentamente.
A paisagem pode ser representada por meio da pintura, da imagem, da poesia. O olhar
atento do observador perceberá que ela se encontra relacionada a elementos naturais e
construídos. Assim, “a palavra paisagem significa ao mesmo tempo, um recorte de natureza
percebido como um fato natural, porém, na realidade moldado pelas sociedades e pelas
culturas ao longo da história” (VANGELISTA, 2012, p. 36). Essa representação da paisagem,
que surge a partir da interpretação de quem a observa, varia de acordo com os saberes, ou
seja, com a cultura que inclui o conhecimento adquirido. Segundo Danilo Cunha (2004), o
termo cultura pode ser identificado por vários enfoques como ideias, crenças, normas,
atitudes, padrões de conduta, instituições, portanto não existe um conceito fechado de cultura,
e são essas variações que influenciam a interpretação da paisagem.
Nessa linha de pensamento, torna-se explícito que a paisagem dos jardins é composta
por aspectos naturais e construídos; são resultantes da ação humana. Como afirma Magalhães
(2009), a paisagem é uma construção humana em que se relacionam questões do ambiente
natural e do ambiente social. Nesse caso, relaciona-se com os aspectos econômicos, sociais,
culturais, históricos e políticos, por isso, quando se analisam os jardins, faz-se necessário ter
no campo da visão essas influências, pois eles não são constituídos separadamente de um
contexto histórico, mas fazem parte da própria sociedade. Por isso, de acordo com essas
18
Aos propósitos desta pesquisa, analisou-se a forte influência dos ingleses e franceses
nos jardins públicos do Brasil, cuja composição constituía-se de plantas exóticas oriundas da
Europa e plantas nativas da flora brasileira, realidade essa visível também nos jardins públicos
de Campo Maior, nos quais se observa essa relação da vegetação exótica com a nativa,
compondo assim os jardins da cidade.
Um dos trabalhos que refletem essas influências nos jardins do Brasil corresponde a
do paisagista francês Auguste François Marie Glaziou. Segundo Segawa (1996), os projetos
desse paisagista referem-se à Praça D. Pedro II (atual Praça 15 de Novembro), Praça Duque
de Caxias (atual Largo do Machado), essas duas com intervenções de Glaziou, a Praça da
Constituição (atual Praça Tiradentes), o Passeio Público (também com o seu toque), o Campo
da Aclamação e o Jardim Botânico, igualmente remodelado por esse paisagista.
Entretanto, os jardins passaram a assumir novas funções com o trabalho do paisagista
Roberto Burle Marx2, que traz uma nova forma de projetar os jardins, na qual, em sua
2
Foi um artista plástico brasileiro, renomado internacionalmente ao exercer a profissão de arquiteto-paisagista.
Morou grande parte de sua vida no Rio de Janeiro, onde estão localizados seus principais trabalhos, embora sua
obra possa ser encontrada ao redor de todo o mundo. Seu primeiro projeto de jardim públic o foi a Praça de
Casa Forte, localizada no Recife.
20
composição, prioriza os elementos naturais da paisagem regional. Assim, Burle Marx buscou
conhecer a flora brasileira para extrair dela o melhor possível e, quando usou espécies
exóticas, tinha como intenção enriquecer os jardins brasileiros. Estes, por sua vez, vão
assumindo novas funções além de embelezamento e assumem funções educativas, ecológicas,
botânicas, aspectos que identificam seu trabalho.
Roberto Burle Marx iniciou sua carreira no início dos anos 30, época em que o
modernismo estava ganhando forças e ele mostrava para o público a beleza do
jardim brasileiro despertando para o cultivo do jardim privado. Deu-se início,
portanto, a uma nova concepção de jardim, ou seja, do jardim moderno e alheio às
influências europeias (BELTRÃO et al., 2012, p. 1).
É notável que cada jardim cumpra funções específicas – algumas mais estéticas; outras
sociais e educativas. Assim, não se pode enquadrá-lo em um único modelo, e tão pouco dizer
que todos os jardins cumprem funções educativas. São apenas possibilidades que envolvem os
jardins.
Foi na cidade de Recife que Burle Marx desenvolveu um trabalho bem significativo
nas décadas de 1930 e 1950, quando iniciou sua carreira. De acordo com Joelmir Marques
Silva (2012, p. 37), “ao aceitar o convite do governador de Pernambuco, Carlos de Lima
Cavalcanti, Roberto Burle Marx assume o cargo de Diretor do Setor de Parques e Jardins da
então Diretoria de Arquitetura e Urbanismo em 1935”, projetando treze jardins públicos e
dois privados. Estes são pouco conhecidos e divulgados, o que mostra mais uma vez a
relevância do seu trabalho. Esses jardins privados correspondem ao jardim do Sítio São João
da Várzea (1940), sendo o primeiro projeto de um jardim privado e residencial no Recife e a
Praça Burle Marx (1990), na qual se insere numa nova fase artística e mais madura do
paisagista.
21
Contudo, Roberto Burle Marx buscou inserir nesses jardins elementos da manifestação
artística popular, como esculturas e azulejos, que identificavam aspectos da cultural local.
Nesse caso, convém salientar que os jardins públicos de Campo Maior não se encontram
distantes da proposta desse paisagista, sendo possível identificar nesses espaços ajardinados
da referida cidade obras de artes e esculturas ora voltadas para aspectos políticos, ora para
aspectos religiosos de Campo Maior. Dessa forma, são características que acompanham a
mesma proposta, porém em espaços distintos. Os jardins projetados por esse paisagista
refletem sua preocupação em estar relacionando aspectos da arte, da arquitetura, onde a planta
torna-se elemento de destaque, que divide espaço com tantas outras, todavia sem perder a
beleza e a harmonia nessa interação. Com relação a esses aspectos, destaca a fala de Beltrão:
Procura-se, assim, realizar uma breve análise das seguintes praças, que se constituem
jardins históricos de Recife: a Praça de Casa Forte (1935), Euclides da Cunha (1935) e Artur
Oscar (1936). Na Praça de Casa Forte (1935), assim como nas demais praças, Burle Marx
procurou trazer uma diversidade de elementos vegetais da paisagem natural, tendo como
propósito identificá-la com a paisagem de Recife.
Segundo Joelmir Marques Silva (2012), para a Praça de Casa Forte, Roberto Burle
Marx concebe um jardim composto por três partes, onde cada uma representa um grupo
isolado de plantas de acordo com a província geográfica. A primeira e segunda parte foram
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dedicadas à vegetação de ampla distribuição geográfica brasileira, sendo que a segunda abriga
espécies típicas da região amazônica. Para a terceira parte, o motivo foi a vegetação de outros
continentes, ou seja, plantas exóticas. O objetivo do paisagista era proporcionar à população
meios de distinguir a flora nativa da exótica e, com isso, despertar o amor pela natureza e,
dessa forma, conferir à praça uma função educativa.
Na Figura 1, percebe-se a proposta de Burle Marx para esta Praça de Casa Forte e seu
objetivo de conferir uma função educativa, uma das características do trabalho desenvolvido
por esse paisagista.
com o objeto de reflexão chave, para Burle Marx, na tentativa de construção de uma
linguagem paisagística ao mesmo tempo moderna e brasileira (OLIVEIRA, 2009, p.
198).
De acordo com Aline Silva (2010), a Praça Artur Oscar originou-se no século XIX, em
solo decorrente de aterros, no Bairro de Recife, e chamava-se Largo ou Praça dos Voluntários
da Pátria. O motivo principal desse projeto era vicejar plantas típicas de ecossistemas
marinhos em um grande canteiro central. Posteriomente, esse logradouro foi renomeado de
Praça Artur Oscar para homenagear o general Artur Oscar Andrade Guimarães. Com relação
à vegetação, havia espécies vegetais nativas, cuja composição vegetal constitui-se, em sua
maioria, por yucca (Yucca sp.), mangue-da-praia (Clusia fluminensis), espada-de-São Jorge
(Sansevieria trifascicata), babosa (Aloe barbadensis), aloe-vera (Aloe vera), agave (Agave
gusano) (CARNEIRO et al., 2012, p. 7).
Segundo Fátima Maria Alves da Silva Mafra (2013, p. 53), a trajetória da Praça Artur
Oscar (Figuras 3 e 4) está diretamente ligada à história da arte do paisagismo no Brasil. Com
24
Todavia, pode-se perceber e analisar o discurso que permeou o cultivo dos jardins públicos,
transmitindo por meio de sua estrutura ideias e concepções diferentes, o que caracteriza e
identifica cada jardim histórico.
O trabalho de Burle Marx tornou-se significativo na medida em que o mesmo trouxe
do exterior uma grande bagagem de conhecimento da arte, arquitetura, urbanismo e
paisagismo e os colocou em prática nos jardins públicos e privados. Para tanto, ou seja, para a
concretização desses espaços ajardinados, ocorreu uma ordenação do espaço físico para o uso
de elementos vegetais. Assim, os jardins públicos tornam-se lugares de sociabilidades,
mediante o surgimento de novas formas de socializar-se, lugares de reflexão, de aproximação
do homem com a natureza, estabelecendo-se assim um diálogo entre ambos.
Com relação aos jardins residenciais/privados, Roberto Burle Marx (2004) diz não
haver dúvidas de que a tendência é a da valorização do jardim público, enquanto o particular
tende a diminuir de importância. No caso dos jardins residenciais, ainda acrescenta que a
árvore frutífera pode entrar na composição e a horta onde plantamos legumes pode ser de
grande beleza, realidade que corresponde a de muitos jardins residenciais de Campo Maior,
em cuja composição também se fazem presentes árvores frutíferas de grande e médio porte.
Nesses jardins residenciais, especificamente nos quintais de residência, a natureza
ganha vida própria, sem precisar de normas específicas, pois a preocupação primeira não é a
beleza estética do lugar, mas a funcionalidade do espaço e a necessidade de aproveitamento
do quintal. Assim, a paisagem será composta mais por plantas medicinais de pequeno porte,
como boldo (Plectranthus barbatus), mastruz (Coronopus didymus), erva cidreira (Melissa
officinalis), e de árvores frutíferas como manga (Mangifera indica L.), caju (Anacardium
occidentale), siriguela (Spondias purpurea), usadas no consumo de sucos, doces e consumo in
natura pelos moradores; são jardins que revelam o apego de seus moradores à planta, tendo
acesso apenas por familiares e amigos e não pelo público em geral. Salienta-se que esses
jardins privados, com essas características, serão bem frequentes na cidade de Campo Maior.
Porém, existem jardins privados mais sofisticados com grande estrutura e projetados
por grandes paisagistas como o próprio Burle Marx. Esses jardins residenciais, segundo
Siomara Lima (2009, p. 159), citando Terra (2000), também assimilavam os modelos
provenientes dos jardins privados da Europa e salienta que, segundo Carlos Terra, na Europa,
“os primeiros jardins privados do século XIX, ainda utilizavam a estrutura inglesa, e aos
poucos incorporam a ela soluções italianas e francesas [...]”. Com relação a esse espaço do
jardim privado, Siomara Lima também destaca características que lhe identificam,
27
evidenciando o contato mais próximo do homem com a natureza, esta organizada por meio de
uma ordem de sentidos e estilos distintos daqueles dos jardins públicos.
São, portanto, lugares destinados à família que o homem modifica da mesma forma
que nos jardins públicos, porém com outras propostas, funções e estilos diversos. A exemplo
disso, têm-se vários trabalhos realizados em residências por Roberto Burle Marx. Cada
projeto tinha finalidades distintas. Em cada residência buscava-se construir uma ideia
específica, como na residência Couto e Silva (1954). Neste espaço, o paisagista trouxe a
experiência gráfica do desenhista, do pintor, do joalheiro, procurando acrescentar novos
elementos de relação entre o edifício e a vegetação. Contudo, na residência de Odette
Monteiro (1948), a vegetação oferece, numa visão de proximidade, múltiplas espécies florais
de variegados atrativos. Ao longe, manchas de folhagens e árvores foram intercaladas como
elementos de referência até a plena identificação com a beleza natural.
Talvez essa seja uma das grandes dificuldades de se preservar os jardins históricos,
pois necessitam de um grupo multidisciplinar, como arqueólogos, botânicos, historiadores,
geógrafos. Compreende assim um trabalho árduo que requer tempo e verba para que ocorra
em consonância com os princípios das Cartas Patrimoniais. Preservar os jardins é também
discutir medidas como conservação, manutenção, restauração, operações necessárias à defesa
3
Conservar um jardim não consiste somente em impedir as modificações como as estruturas, mas seu
desenvolvimento deve ser em equilíbrio e sem improvisos. Trabalhar a longo prazo e dispor de um conjunto
harmônico de profissionais, com formação e experiência, seriam requisitos imprescindíveis para adequada
preservação de nossos jardins históricos.
28
[...] Estabelece que a proteção dos jardins históricos exige que eles sejam
identificados e inventariados e impõe intervenções diferenciadas, que são a
29
No entanto, para se realizar qualquer intervenção nos jardins, é primordial que haja um
estudo aprofundado do mesmo, conhecendo sua estrutura como um todo.
para a garantia de uma prática correta de conservação, o jardim tem que passar por
uma investigação que abarque suas características históricas, artísticas e ecológicas
que se configuram no ato de inventariar (SÁ CARNEIRO et al., 2012, p. 5).
local, como também faz parte da história de cada cidade que possui esses espaços
paisagísticos.
De acordo com Trindade, quando um jardim histórico encontra-se mal conservado,
impossibilita o cidadão de conhecer um pouco mais da sua cultura. “[...] Recuperar a imagem
simbólica dos jardins e seu testemunho cultural no desenvolvimento de uma região é
reescrever a história das sociedades, por um viés ainda pouco percorrido no Brasil”
(TRINDADE, 2009, p. 71).
Outro exemplo de restauração relaciona-se à Praça Euclides da Cunha (Figura 5), de
Roberto Burle Marx, que pode contar com uma equipe de profissionais como paisagistas,
arquitetos, engenheiros, agrônomos e botânicos. Os desafios foram inevitáveis, na medida em
que buscavam resgatar um patrimônio cultural, sendo necessária a retirada de 25 árvores.
Entretanto, restaurar um jardim não é trazê-lo a sua forma original, mas buscar resgatar seu
significado, seus elementos que os identificam num tempo histórico, adequando a sua nova
forma.
Para tanto, o trabalho não termina nesse ponto. Torna-se necessário continuar os
cuidados com a Praça Euclides da Cunha, pois é um trabalho constante, já que seu principal
elemento é o vegetal e, por isso, requer medidas específicas para que a autenticidade dos
jardins seja mantida, autenticidade essa que, segundo a Carta de Florença (1981), no art. 9,
“[...] corresponde aos jardins históricos que diz respeito ao desenho e o volume das partes,
quanto ao seu décor ou escolha dos vegetais ou de minerais que os constituem”.
Por isso, a ação de conservar os jardins brasileiros deve ser constante, como ressalta
Joelmir Marques Silva (2012). Para que se garanta a conservação de um jardim, é necessário o
empenho constante, de tal forma que esforços sejam direcionados no sentido de acompanhar
sua natural transformação. Com isso, surgem os desafios que abarcam desde a necessidade de
um grupo de profissionais capacitados e habilitados a realizarem as medidas necessárias até o
envolvimento dos órgãos federais para que possibilite a verba e para que tais modificações
sejam feitas, pois reconhece que as Cartas Patrimoniais são apenas recomendações, que
trazem no seu conteúdo medidas, regras, buscando a melhor forma de se relacionar com esses
jardins. Portanto, não são somente leis, como também o envolvimento da população que faz
uso desses espaços, desafios que não são diferentes dos jardins públicos do município de
Campo Maior, que buscam também um maior envolvimento da população campomaiorense.
Mediante essas análises, entende-se a relevância das ações de conservação dos jardins
históricos para manter seus valores patrimoniais, valores que são gerados a partir da relação
intrínseca com o contexto histórico no qual ele foi produzido, em que o conjunto de valores
atribuídos confere a significância cultural. De acordo com Sá Carneiro (et al., 2012), quando
se fala em jardins, a esses valores juntam-se o ecológico e o botânico. No âmbito do
patrimônio histórico e cultural, valores como educativo, social, ecológico e espiritual que
envolvem a população são referenciados em trabalhos científicos.
Entretanto, quando tais medidas são inexistentes, os jardins históricos tornam-se mais
suscetíveis a mudanças negativas, resvalando na sua estrutura física, bem como na sua
vegetação. A exemplo, destaca-se o caso da Praça do Rosário, situada em Campo Maior, na
qual se observou a inexistência de tais medidas.
Na Figura 6, a seguir, visualiza-se, no fundo, a igreja de Nossa Senhora do Rosário,
juntamente com a vegetação da Praça, que, em sua maioria, é composta por carnaúbas,
32
dispostas também nas alamedas. Contudo, atenta-se para um caso raro da carnaúba 4 que se
encontra no centro da imagem, um caso difícil de se encontrar. Porém, a realidade de hoje é
que um dos elementos que compõem um jardim histórico, nesse caso específico, passou por
transformação, e essa mesma não foi benéfica para esse jardim, afetando assim, sua
vegetação.
Na Figura 7, abaixo, verifica-se que a mesma carnaúba que tinha alteração genética
encontra-se sem vida. Isso é o resultado da falta de ações necessárias e adequadas a sua
conservação, pois se as ações não forem adequadas, se não estiverem de acordo com a
necessidade do jardim, não se poderá obter êxito na sua conservação, e entende-se que a
árvore também tem seu processo evolutivo, o que torna essas ações mais indispensáveis.
Porém, é preciso conhecê-las para atuar e não agir sem esse conhecimento.
4
A carnaúba apresenta alterações genéticas, uma espécie de anomalia, fazendo com que a mesma possua
galhos, um caso difícil de encontrar.
33
Alguns autores, como Pe. Cláudio Melo (1983), Celson Chaves (2007) e Reginaldo
Lima (1995), fazem análises da história de Campo Maior, enfocando aspectos políticos,
econômicos, bem como o período em que a cidade ainda era chamada de vila. Segundo Pe.
Cláudio Melo (1983), o descobrimento daquela parte do norte piauiense, que veio a ser
freguesia do Surubim, deu-se nos primeiros anos do século XVII e seu total desbravamento só
se completou no primeiro quartel do século XVIII. Assim foi o momento em que a Freguesia
do Surubim passava à categoria de vila. Isso se procedeu em 08 de agosto de 1762, com a
presença do primeiro governador do Piauí, João Pereira Caldas. Com relação a esse
acontecimento, Olavo Silva Filho (2007, p. 68) salienta que
nessa ocasião, foi levantado o pelourinho da vila, que ficou no pátio da matriz, e
constava de um pilar quadrado sobre degraus de pedra, o qual se conservou até
1844, quando foi desfeito por se achar desmoronando pelo tempo.
Dessa forma, surgiu a vila de Campo Maior, “[...] naquele território chamado Longá,
suavemente estendida na planície de perpétuas, fincada de carnaubeiras prateadas, entre a
serra azul de perfil preciso e arestas cortantes [...]” (SILVA FILHO, 2007, p. 72). Surgiam,
então, as primeiras casas, que seguiam como referência de adensamento a igreja matriz de
Santo Antônio. Foi assim, ao redor da igreja Santo Antônio, que teve o surgimento da área
urbana de Campo Maior, com as construções de casas, que paulatinamente tomaram toda a
extensão dessa área, como se vê na imagem (Figura 8) a seguir.
Fonte: CPRM.
Portanto, a história de Campo Maior perpassa por esses acontecimentos históricos de
significância nacional, porém tem muito mais a destacar, como no seu campo religioso, a
exemplo do festejo de Santo Antonio, festividade que reúne um grande número de fiéis.
Assim, a cidade é percebida por esse outro lado, o campo da religião, destacando-se a
religiosidade e as crenças das pessoas, que, nesse período, encontram-se voltadas para
realização de promessas e agradecimentos pelas graças alcançadas, ou até mesmo para pedir
casamento ao santo casamenteiro, como é conhecido o Santo Antônio. Esse compõe mais um
38
dos aspectos culturais da cidade, que envolve um grande número de pessoas, cada uma com
seus próprios desejos e anseios.
Essa cidade cresceu e se desenvolveu, e, com essas mudanças, foi se constituindo com
seus próprios aspectos, seus pontos atrativos, suas festividades e crenças, suas tradições, que
desempenham um papel relevante na economia piauiense. Inicialmente, a economia era
baseada na criação de gado e, posteriomente, o extrativismo da cera da carnaúba, e, desse
período do desenvolvimento da pecuária, herdaram-se alguns aspectos. Segundo Mascarenhas
(2012), dessa época, tem-se a herança das casas de fazenda avarandadas, das humildes
choupanas dos vaqueiros, dos currais, entre outras edificações. Dessa maneira, Campo Maior
destacou-se por suas contribuições, não restritas apenas ao aspecto econômico, como também
se impõe por suas histórias, passa a ser percebida como um lugar de tradição, com belezas
naturais e também construídas pelo homem, como os jardins históricos, que trazem em sua
composição aspectos da história da cidade. Observa-se muito da cultura de Campo Maior
nesses espaços ajardinados, contudo, torna-se igualmente necessário analisar outro momento,
especificamente quando a cidade começa a passar por consideráveis transformações na sua
estrutura urbana, momento-chave para refletir sobre seus jardins.
a economia piauiense, durante a segunda metade do século XIX, ainda poderia ser
definida como um domínio da pecuária. A maior parte da receita provincial derivava
daquela atividade, responsável, também, pela ocupação de grande parte da
população e pela dinâmica do comércio.
Nesse contexto, influenciada por esta atividade, a vila de Campo Maior cresceu e
prosperou com o ciclo do gado e posteriomente com o ciclo da carnaúba, existindo atualmente
a intensa atividade do comércio.
Com esta atividade econômica, as pessoas concentravam-se mais na área rural do que
na área urbana. Esta, por sua vez, não possuía muitos atrativos convidativos a ponto de fazer
com que as pessoas mudassem sua moradia.
No ano de 1772 existiam no Piauí 3.034 fogos, de modo que os 360 fogos “urbanos”
representavam apenas 11,8% do total dos domicílios desta capitania. Os 88,2%
fogos restantes estavam distribuídos entre 930 propriedades rurais, das quais 578
eram apontadas como “fazendas de gado” e 352 como “sítios de lavoura”... Da
39
população [...] 14,1% viviam nas vilas ou nos seus subúrbios (SILVA FILHO, 2007,
p. 34).
De acordo com a autora, percebe-se que, quando se refere a mudanças de grande porte,
ou seja, àquelas que poderiam proporcionar grandes transformações na estrutura física das
cidades, a pecuária não se mostrou tão eficiente, talvez porque os lucros dessa atividade
concentravam-se nas mãos de poucas pessoas e não tinham como destino outros propósitos
como o desenvolvimento daqueles espaços.
No entanto, exerceu-se uma determinada influência no processo de urbanização em
muitas regiões. Por isso, Olavo Silva Filho (2007) salienta que, no Piauí, o fenômeno da
urbanização não foi diferente de outras tantas regiões interioranas, onde os caminhos do gado
fizeram surgir nucleações lineares, estruturando espaços com funções sociais, econômicas e
religiosas. Não obstante, em fins do século XIX, a pecuária mostrava-se debilitada, e no
princípio do XX, muitas fazendas passaram a se envolver com a atividade do extrativismo
vegetal.
Campo Maior passou então de uma cidade com uma tímida infraestrutura e tornou-
se um grande canteiro de obras. Prédios novos eram erigidos, ruas novas foram
abertas e calçadas, bem como as ruas que já existiam, muitas delas receberam nova
roupagem de calçamento (PAIXÃO, 2010, p. 93).
entanto, deve-se compreender a importância da cera da carnaúba nessas ações realizadas pelo
poder público:
A carnaúba proporcionou, mesmo tendo sua produção passada por ascensões e quedas,
fazendo seu preço oscilar, grandes mudanças urbanas em Campo Maior. Essas mudanças
englobavam a paisagem, pois essa passou também a ser moldada, ordenada em determinados
espaços da cidade, com destaque para as inúmeras carnaúbas, nas ruas, nas praças e até
mesmo em torno do açude grande, constituindo assim uma nova paisagem para Campo Maior,
com espaços ornamentados pelas carnaúbas e outras plantas e que variam de grande e
pequeno porte.
Na Figura 10, a Praça Bona Primo, observa-se o surgimento dos primeiros traços de
um jardim, uma praça ajardinada, composta de inúmeras árvores, constituindo uma paisagem
verde desse espaço e também das casas que se encontram no entorno. Ainda com relação a
essa praça, Fabrícia Medeiros (2011, p. 48) destaca:
na Praça Bona Primo, um dos pontos mais importantes da cidade datada desde a
fundação de Campo Maior, quando ainda era apenas freguesia, foi palco de vários
acontecimentos históricos, e ao longo dos anos recebeu vários nomes.
Foi nessa Praça que tudo acontecia: o centro comercial, a cadeia pública, sem deixar
de ressaltar a igreja de Santo Antônio – que também passou por muitas transformações e
reformas – e também as casas, com influências da arquitetura portuguesa. Assim se constituía
a Praça Bona Primo, um espaço importante e de referência para a cidade.
A criação do jardim insere-se no momento em que a cidade se urbanizava, onde um
conjunto de melhorias estava sendo colocado em prática. A cidade passava por um processo
de desenvolvimento, de modificações no cenário físico e social, por isso os jardins de Campo
Maior vão se constituindo nesse contexto histórico, vivenciado por muitas pessoas, que
observaram essas transformações, como também o surgimento desses espaços ajardinados,
que ornamentavam e deixavam a cidade mais atrativa aos olhos de quem via.
Na Figura 10, apresenta-se a Praça Bona Primo com algumas mudanças de ordem
estrutural, de iluminação e percebe-se que, na sua composição paisagística, foram
acrescentadas mais espécies arbóreas, como as carnaúbas que se encontram no centro da
Praça. A Figura 11 mostra que havia apenas a disposição das mesmas e outras espécies não
identificadas. Observa-se também o surgimento e o aumento do número de casas no entorno
desse espaço, juntamente com a vegetação, que passa a fazer parte não somente da Praça, mas
das casas e dos quintais residenciais. Por meio desta análise, percebeu-se como este jardim ao
longo do tempo passou por transformações na sua estrutura física, como também na sua
composição paisagística, cujas mudanças são de ordem natural, em decorrência da vegetação,
e outras são resultados da intervenção do homem.
Fonte: IPHAN.
Analisa-se o surgimento de outros jardins na cidade, contudo vale ressaltar que esses
espaços ajardinados foram mudando de acordo com as transformações que ocorriam em
Campo Maior. De cada período, os jardins foram absorvendo aspectos que hoje revelam
muitas histórias, trazem na sua estrutura uma dinâmica histórica, sendo possível perceber cada
período que os compõem. A Figura 12, por exemplo, refere-se à Praça Luiz Miranda, que,
segundo os antigos moradores da cidade, já foi um mercado de muita movimentação. Para
além disso, percebe-se que a mesma está se constituindo em um jardim, que a princípio possui
pouca vegetação. Contudo, passado algum tempo, a mesma será composta por inúmeras
árvores, a exemplo da carnaúba, plantas nativas e algumas outras exóticas, e, no seu conjunto
mobiliário, terá a sua disposição bancos e busto, este fazendo referência à política local.
Campo Maior ficou conhecida como cidade das carnaúbas devido a sua história ligada
ao comércio desse vegetal. As análises acima evidenciaram a participação da carnaúba na
transformação da estrutura física da cidade e atualmente se faz presente em seus diversos
espaços, a exemplo das praças, alamedas, ruas, quintais residenciais, espaços que foram sendo
arborizados com essa planta, compondo assim a paisagem cultural de Campo Maior. Esta
análise correspondente à paisagem da cidade será realizada a partir dos jardins públicos,
especificamente de três jardins: a Praça Luiz Miranda, a Praça Bona Primo e a Praça do
Complexo Valdir Fortes. Eles estão situados em pontos estratégicos da cidade, nos quais há
uma maior circulação de pessoas. Assim, estão mais visíveis ao olhar de quem passa. Buscou-
se analisar tais jardins públicos mediante a percepção de suas características, englobando sua
estrutura física, sua vegetação, seu mobiliário, portanto os aspectos que formam cada um
desses jardins. Destaca-se que esses não são os únicos espaços ajardinados, existindo também
outros na cidade. A partir desta delimitação do espaço da pesquisa, faz-se as análises de cada
jardim iniciando pela Praça Luiz Miranda, localizada no centro da cidade. Sua construção
ocorreu em 1976 e foi inaugurada no dia 1o de maio do mesmo ano. É também conhecida
como Praça da Prefeitura e tem um aspecto mais político, devido as suas instalações. Para
Reginaldo (1995), tanto os prédios do complexo administrativo como a Praça Luiz Miranda,
em pleno coração da cidade, oferecem destaques especiais, onde o “Palácio das Carnaúbas” se
sobressai imponentemente e se estabelece tacitamente o divisor do poder, atraindo a atenção e
transformando-se em cartão postal de Campo Maior.
Com relação à estrutura desse jardim, entendido como praça, possui traços sinuosos.
Segundo Aline de Figueirôa Silva (2010), esse traçado sinuoso resulta da divisão do terreno
em canteiros, com vegetação de pequeno e médio porte, entremeados por bancos. Essas são
características que correspondem ao traçado desse jardim, Praça Luiz Miranda, composto por
quatro canteiros: um circular e os demais triangulares. A vegetação varia de pequeno e médio
porte. Com relação ao mobiliário contido nesse jardim público, é composto por banco em
madeira e um busto do prefeito José Olympio da Paz (*04-09-1912 +14-04-1977), onde está
grafada a seguinte frase: “Homenagem do povo de Campo Maior a seu líder José Olympio da
Paz, como prefeito municipal, ‘os ricos menos poderosos e os pobres menos sofredores’”.
José Olympio assumiu dois mandatos no município de Campo Maior, sua terra natal, porém,
observou-se, nesse mesmo espaço, outra homenagem de aspecto político, referente ao
Raimundo Nonato Bona Carbureto, cuja frase exposta no monumento é: “Administração III
milênio, ‘Fala Povão’, 1o prefeito do Século XXI”. A partir do exposto, é possível notar que
46
esse jardim tem um aspecto mais político, evidenciado pelas suas instalações e as peças que
compõem seu mobiliário, referentes a gestões políticas de Campo Maior, no entanto não
exclui a possibilidade de se tornar um lugar de lazer. Essa constatação foi perceptível por
meio da pesquisa de campo no lugar, onde se observou a presença de pessoas com faixa etária
de quarenta a sessenta anos de idade, que usam esse espaço para encontrar amigos e se distrair
jogando dominó, baralho ou simplesmente conversar. Assim, esse jardim público é usado de
diversas maneiras, englobando ações que perpassam questões políticas como também lugar de
sociabilidade, de encontro com os amigos, sem deixar de destacar que funciona neste mesmo
jardim ponto de táxis e mototáxis, o que torna o lugar movimentado.
A paisagem desse jardim é composta tanto por plantas nativas, quanto por plantas
exóticas (Figura 13), destacando-se árvores de grande porte como as Carnaúbas (Copernicia
prurífera), as Oiticicas (Licania rigida), Jamelão (Syzygium cumini), Angico Branco
(Anadenthera colubrina), Flamboyants (Delonix regia), como também plantas de pequeno
porte, que estão mais presentes no canteiro circular, a exemplo da Boa-noite (Catharanthus
roseus). Essas plantas ornamentam a Praça Luiz Miranda e amenizam as altas temperaturas,
atraindo não só os visitantes, mas também a própria população local.
Entende-se que a Praça Luiz Miranda, enquanto jardim público, foi projetada não
apenas com caráter político, mas também disponível para a população campomaiorense,
sendo detectadas rampas para a locomoção de cadeirantes, o que demonstra que os jardins
históricos, como esse analisado, não são criados para ficar isolado ou apenas para ser visto,
mas para que a própria população faça uso desse espaço, obviamente de forma adequada, para
que não possa colocar em risco esse bem cultural. Na Figura 14, observa-se o traçado desse
jardim público, a sua composição paisagística, composta em sua maioria por carnaúbas e
algumas plantas não identificadas, as construções no entorno, a localização do prédio da
prefeitura e o palácio das carnaúbas, bem como as peças do mobiliário.
* Legenda: VERDE: Carnaúba VERMELHO: Oiticica RC: Monumento Raimundo Nonato Bona Carbureto
AZUL: Boa-noite AMARELO: Flamboyants JO: Monumento José Olympio da Paz
PRETO: planta não identificada
48
Em relação à Praça Bona Primo, segundo espaço de jardim proposto como objeto
deste estudo, afirma Reginaldo Lima (1995, p. 101),
[...] na Praça Bona Prima encontra-se a Catedral de Santo Antônio, os mais antigos
casarões que pertenceram a várias personalidades e tradicionais famílias
campomaiorenses, os quais, na sua quase totalidade, conservam os traços originais.
Na Praça, localizam-se também a residência oficial do Bispo da Diocese de Campo
Maior e a Casa Paroquial.
cimento, contendo também oito canteiros triangulares e simétricos, cuja vegetação varia de
pequeno e médio porte, configurando recantos de estar. Convém enfatizar que, na atualidade,
cada espaço que compõe este jardim possui rampas para cadeirantes, para que todos possam
usufruir do mesmo, não restringindo assim o seu acesso a poucos. Porém, este jardim tem um
aspecto mais religioso devido às influências do entorno, como a Catedral de Santo Antônio e
a estátua do Monsenhor Mateus, que terminam refletindo esses aspectos nessa praça,
percebida como jardim histórico. Percebe-se, nessa mesma imagem (Figura 15), a disposição
das peças mobiliárias da Praça, o Painel de arte (P) e o Memorial ao Monsenhor Mateus (M),
bem como as alamedas que compõem a Praça Bona Primo.
Com relação a sua composição florística, foi possível perceber a vinculação das
plantas nativas com as exóticas, destacando como tais plantas a Acácia Amarela (Acacia
farnesiana), a Faveira (Parkia multijuga), as Oiticicas (Licania rigida), a Boa-Noite
(Catharanthus roseu), as Carnaúbas (Copernicia prurífera), que estão no centro da Praça
formando um círculo (Figura 16), estando igualmente nos canteiros triangulares, e a planta da
Índia, como é conhecida popularmente, que, como um modismo, esta planta se espalha pelas
praças, calçadas e quintais residenciais de Campo Maior.
Dessa maneira, esse espaço ajardinado revela aspectos da história da cidade, pois,
situados em um tempo e espaço, foi sendo modificado até chegar ao seu estado atual,
constituindo-se em um jardim histórico, e cada transformação reflete a própria mudança pela
qual Campo Maior passou. Portanto, analisar esse jardim é, ao mesmo tempo, compreender e
estabelecer uma ponte de diálogo com o período histórico dessa cidade, e, como a mesma
mudou e continua mudando. Assim, esse mesmo espaço, no futuro, terá outros
acontecimentos para narrar.
51
Analisa-se agora a Praça Valdir Fortes (Figura 17), conhecida também como
Complexo Cultural. É um espaço destinado mais a eventos culturais, como o Sabor Maior,
realizado geralmente no mês de setembro, uma exposição do potencial culinário de Campo
Maior, predominando assim um aspecto mais cultural. No entanto, oferece outros pontos
atrativos, como a Secretaria Municipal de Assistência Social, a Cooperativa Artecam, a
Galeria de arte, o Artesanato Santo Antônio, a Cafeteria Bitorocara, o Boteco Lanches e a
Arte da Estação. Quanto à estrutura, esse jardim público possui um amplo espaço, porém sem
traços sinuosos (Figura 16). Observam-se inúmeras carnaúbas bem alinhadas, demonstrando
que o homem as dispôs de forma intencional, criando uma ordem e sentido para este lugar.
Nesse jardim, há três canteiros, dois com formatos triangulares e o terceiro com alguns
aspectos sinuosos, linhas irregulares, e vegetação variando de pequeno a médio porte,
predominando a Boa-Noite em conjunto com as carnaúbas e algumas não identificadas.
Convém enfatizar que, em cada canteiro, há algumas placas com o seguinte enunciado:
“Ambiente limpo não é o que limpamos, mas sim o que não sujamos”, “Praça limpa; povo
educado. Povo consciente; praça conservada”. Essas frases não são aleatórias. Elas remetem a
uma das funções dos jardins. Nesse caso, atenta-se para a função educativa, de uma relação
equilibrada do homem com a natureza. Esse aspecto é bem característico do trabalho do
paisagista Roberto Burle Marx.
No entanto, a paisagem desse jardim não se compõe apenas por carnaúbas ou Boa-
Noite, mas também se faz presente o Açude Grande, que está cercado por carnaúbas e
algumas plantas não identificadas, formando um cinturão. Segundo Fabrícia Medeiros (2011),
foi no governo de Eurípedes de Aguiar (1916-1920) que se deu início a construção do Açude
Grande em Campo Maior.
De forma geral, percebe-se que cada jardim público que foi analisado possui suas
próprias características e revela diferentes aspectos da cidade em diferentes períodos, e que
sua paisagem é um dos elementos que identificam Campo Maior, principalmente pela
predominância da carnaúba nos diferentes espaços da cidade. Assim, muitos a conhecem
como “cidade das carnaúbas”. Como se observa, nessa interação entre o homem e meio
encontra-se a própria paisagem, onde ações e transformações podem ser avaliadas pela
história, estabelecendo, portanto, um dialógo entre si, dialógo esse estabelecido neste trabalho
entre a paisagem e a história de Campo Maior.
Ressalta-se que esses jardins públicos são espaços cujas paisagens contribuem para
amenizar as altas temperaturas. Tornam-se lugares convidativos a encontros, a lazer, espaços
arborizados dos quais a população pode desfrutar, e que atualmente se faz tão necessário,
mediante a correria do dia-dia, as rápidas transformações. De acordo com Roberto Burle Marx
(2004, p. 74),
Nesta época em que o homem da cidade está mais do que esprimido e sufocado em
sua moradia, onde a ordem é “mínimo standards”, há necessidade de se criar
grandes espaços livres, onde se possa respirar, entrar em contado com a natureza, ter
a oportunidade de poder meditar, contemplar uma flor ou uma forma vegetal num
lugar sossegado, dar a juventude o prazer de desfrutar despreocupadamente o
esporte e a vida ao ar livre.
espaço privado. Com relação à Praça Monumento da Costa e Silva, Wilza Lopes et al (2013,
p. 192) salientam que
No momento em que surge a proposta de projetar esse jardim público em Teresina não
se pensou apenas em uma área de lazer e sim também em ser um monumento em homenagem
ao poeta Da Costa e Silva, uma das referências culturais da cidade, na qual pontua-se a
participação do paisagista Roberto Burle Marx, que fez uso de diversas espécies para a
composição florística dessa Praça, tais como a Carnaúba, Abricó-de-macaco (Couropita
guianensis Aubl), Boa-noite, Ipê-amarelo (Handranthus chrysotrichus), Bacuri (Platonia
insignis Mart), dentre outras espécies que permitiram ao paisagista relacionar os ritmos, as
texturas e volumes nas massas vegetais.
Verifica-se a criação da praça-monumento, cujo espaço foi aproveitado por muitas
pessoas de diferentes segmentos sociais, contudo ressalta-se que a mesma passou por
mudanças, pois a própria sociedade modificou-se, e atualmente a Praça apresenta algumas
modificações com relação ao projeto original, a exemplo das espécies, que hoje existem
apenas em número de 6 das 34 especificadas no projeto original, o que evidencia que algumas
foram retiradas e outras foram acrescentadas a esse jardim público.
Essas são as mudaças pelas quais passou esse jardim público, no qual Burle Marx
criou um “ambiente contemplativo, que explora a vegetação local distribuída no entorno do
espelho d’água central [...]. O espelho d’água reflete a beleza e os detalhes da vegetação,
atraindo os olhares dos visitantes” (SÁ CARNEIRO, 2010 apud LOPES et al., p. 208).
A participação do paisagista Roberto Burle Marx nesse projeto foi muito importante,
sendo que ele usou os mesmos princípios e concepções que usava ao projetar os jardins em
outras cidades, buscando uma relação das espécies com a paisagem local, bem como
relacionando aspectos e elementos dos jardins com a história da cidade, e, nesse caso,
55
enfatiza-se que esta praça-monumento comunga muitos aspectos dos jardins de Campo Maior,
cujos elementos apresentam também relação com a história e cultura da cidade.
Numa visão geral, observa-se que os jardins públicos abordados neste trabalho,
mesmo possuindo características e aspectos próprios, relacionados a seus lugares de origem,
estabelecem uma relação com a história e cultura local. Mesmo estando em espaços fisicos
diferentes e com necessidades de conservação próprias de cada um, pode-se visualizar que os
jardins têm em comum alguns aspectos correlacionados com sua realidade, problemas e
desafios de conservação, são patrimônios culturais, sinalizando as transformações da
sociedade e do homem. Assim, estabeleceu-se um diálogo, obviamente respeitando seu
espaço de origem e suas características, entre os jardins públicos.
Apresentaram-se, portanto, os jardins históricos de Campo Maior e verificou-se que
cada jardim analisado possui suas próprias dimensões, onde a planta ganha forma, cor, textura
e o artista que o projeta com sua visão de mundo imprime nele suas concepções, transmitindo
assim uma mensagem, sendo mais do que uma associação de plantas; é uma das formas que o
homem utilizou-se para se expressar a visão que tem do mundo e de si mesmo. E, ao conhecer
mais sobre os referidos jardins, conheceu-se mais sobre a própria história da cidade. A partir
da análise dos mesmos, dos seus elementos constituintes foi possível estabelecer relações e
conexões com fatos que se procederam na cidade.
56
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A paisagem como objeto de estudo e sua amplitude para outras áreas do conhecimento
possibilitaram o surgimento de novas concepções e perspectivas sobre a mesma, obviamente
pautados a partir de um embasamento teórico e metodológico específico. A paisagem, assim,
pode ser lida como um documento que expressa a relação do homem com seu meio,
mostrando as transformações que ocorreram ao longo do tempo, bem como pode ser
testemunha da história dos grupos humanos que ocuparam determinado espaço. Para cada
abordagem, seja da Geografia ou da História, constrói-se o entendimento sobre a paisagem, e
como essa paisagem passou por mudanças, estas algumas vezes são resultados das ações do
homem e, dessa forma, a paisagem também é um produto da sociedade da qual está inserida.
Pontua-se que, nesse caso, avalia-se a paisagem cultural como resultante da interação
do homem com o meio, na qual a UNESCO, em 1992, instituiu como patrimônio cultural,
abrindo um campo fértil de discussões, que podem ser direcionadas, dentre outros aspectos,
para a preservação desse patrimônio cultural, suscitando novas discussões e análises.
Com relação ao seu conceito, entende-se que seria inviável apreendê-lo em um único
conceito, restringindo e delimitando seu entendimento, pois até mesmo a UNESCO apresenta
vários entendimentos sobre a paisagem cultural. Têm-se as “paisagens claramente definidas”,
aquelas que surgem de uma intenção própria; “paisagem evoluída organicamente”, aquela que
acontece com o tempo; e a “paisagem cultural associativa”, aquela que adquire um significado
próprio.
Mediante esses entendimentos que possibilitaram o embasamento teórico, partiu-se
para análise dos jardins históricos do Brasil e posteriomente de Campo Maior. Analisou-se
desde a sua criação – e, nesse caso, contextualizou-se o momento em que isso se procedeu,
destacando as primeiras cidades que receberam seus jardins, bem como o contexto histórico e
os discursos que permearam sua criação – e avaliou-se também sua estrutura como um todo,
incluindo a paisagem cultural dos mesmos. Por isso, fez-se necessário um entendimento sobre
paisagem até chegar aos jardins históricos de Campo Maior, foco deste trabalho.
Campo Maior, “cidade das carnaúbas”, é assim conhecida pelos seus vastos campos
verdes, palco de acontecimentos históricos, a exemplo da Batalha do Jenipapo, acontecimento
de significância nacional. Cresceu e prosperou com o ciclo do gado e posteriomente com mais
ênfase com o ciclo da carnaúba. Essa planta possibilitou inúmeras mudanças na malha urbana
da cidade: realizaram-se novas construções, como postos de saúde, melhoramentos e
reconstruções de escolas. Tais fatos são resultantes da cera da carnaúba, que, mesmo
57
a história da cidade, prejudicando também seu aspecto patrimonial. Por isso, torna-se
necessária uma maior discussão sobre esses espaços ajardinados, que, a cada instante, estão
suscetíveis de transformações, causadas pelo tempo e pelas ações humanas, e ressalta-se que a
vegetação, um dos elementos que compõem os jardins, possui seu próprio ciclo evolutivo, o
que implica medidas específicas.
Dessa maneira, os jardins históricos de Campo Maior tornaram-se documentos de
análises, permitindo conhecer as mudanças pelas quais a cidade passou. Dialogou-se com
cada elemento que constituía os jardins públicos, com sua vegetação, em sua maioria
composta por carnaúbas, com seus aspectos arquitetônicos, incluindo seus traços sinuosos e
irregulares, o entorno das praças, com suas construções que formavam uma paisagem
específica para cada jardim. Nessa perspectiva, olhou-se para a praça como um todo.
Mediante essa observação, avaliou-se sua paisagem cultural, que, ao longo do tempo, foi
ganhando sentido e significados, pois é resultante da ação do homem e esse, por sua vez, parte
de um lugar, de uma sociedade com ideais, valores e cultura própria.
59
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GLOSSÁRIO
I. Título
CDD 306.09