A 05 V 14 N 3
A 05 V 14 N 3
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36298/gerais202114e16914
Resumo
Agentes penitenciários estão constantemente expostos às situações de violência e precárias condições de trabalho, as
quais estão associadas ao surgimento de enfermidades ocupacionais. O objetivo deste trabalho foi investigar as
condições e o processo de trabalho de agentes penitenciários e suas repercussões na saúde mental e na vida social e
familiar do trabalhador. Realizaram-se entrevistas com 5 gestores de unidades prisionais localizadas no Nordeste
brasileiro, 19 agentes penitenciários e 9 familiares desses trabalhadores. Detectou-se a desvalorização social da
profissão, que associada às precárias condições de trabalho vulnerabiliza esses trabalhadores nas seguintes dimensões:
subjetiva – evidenciada pelo sofrimento associado ao cotidiano do trabalho; familiar - articulada ao medo e às
estratégias de proteção desenvolvidas; laboral – devido à imprevisibilidade do trabalho; social – decorrente da
invisibilidade e da desvalorização do trabalho; e programática - caracterizada pela baixa visibilidade no âmbito das
políticas públicas.
Abstract
Correction officers are constantly exposed to situations of violence precarious work labor conditions, which are
associated to the emergence of occupational disorders. This study aims toinvestigate the conditions and the work
process of correction officers and the consequences on the workers’ mental health and social and family life. The
study was conducted in prisons located in the Brazilian Northeastern region. Interviews with 5 prison wardens, 19
correction officers and 9 relatives of these workers were conducted. Evident social devaluation of the profession was
observed, which associated with precarious work conditions, make these workers vulnerable in the following
dimensions: subjective, evidenced by the suffering associated with daily work; family, related to fear and coping
strategies developed; labor, due to the unpredictability of work; social, resulting from the invisibility and devaluation
of their work; and programmatic, characterized by low visibility in the scope of public policies.
incluir nas análises da lógica prisional não somente discussões relacionadas aos apenados,
como também direcionadas aos que trabalham nos cárceres, os quais são afetados por
processos mortificadores (Rauter, 2012; Goffman, 2015; Souza, 2015). Tais processos
referem-se a uma rígida rotina institucional, bem como à perda de espaços e de momentos
tanto dos apenados quanto dos trabalhadores do sistema prisional (Souza, 2015).
A vida do cárcere não se restringe aos limites da prisão. Mesmo vivendo em ambiente
Nesse sentido, o trabalho dos agentes penitenciários apresenta um alto risco, tendo
Araújo, 2018; Rumin, Barros, Cardozo, Cavalhero & Atelli, 2011). Como o horário de
condições de limpeza e higiene das celas; efetuar registros de suas atividades; fiscalizar a
Apesar de ser atrativa, uma vez que significa para muitos a tão desejada estabilidade
financeira, obtida por meio de concurso público, a profissão de agente penitenciário está
penitenciário precisa lidar no cárcere com situações para as quais não foi treinado3:
2018).
Torna-se evidente que a inserção nesse ambiente tão peculiar pode produzir
trabalhadores estão expostos a inúmeros fatores e situações, como agentes tóxicos, risco de
acidente e risco à integridade física (como no caso de profissões mais expostas a assaltos e
humana. Tanto o consumo abusivo de substâncias psicoativas (como forma de lidar com a
vezes não abrangidas pelos critérios diagnósticos das classificações internacionais (Goldberg
& Huxley, 1992), são citados na literatura como resultado desse cenário (Bezerra, Assis &
3 Quando o agente ingressa no sistema depois do concurso público, passa por um Curso de
Formação de Agentes Penitenciários com carga horária de 436 horas, sendo 268 horas teóricas e
168 horas de vivência penitenciária. Todavia, de acordo com a Secretaria de Justiça e Cidadania
(SEJUC) do estado em que esta pesquisa foi realizada, esse curso, que deveria ter a duração de seis
meses, na maioria das vezes acontece em um mês. Ou seja, esses trabalhadores não são
preparados para exercer o cargo, aprendendo o ofício no dia a dia, o que gera insegurança e
automatização nas tarefas e pode comprometer os processos de trabalho no cárcere.
certo conjunto de condições” (Ayres, França Júnior, Calazans & Saletti Filho, 2003, p. 45).
Essa perspectiva abarca todos os fenômenos que são excluídos das análises de risco por não
2018).
aos recursos sociais e a políticas públicas ligadas a tais necessidades e problemas dos
materiais, psicológicas, culturais, morais, jurídicas, políticas, que podem direcionar saberes
dos agentes penitenciários é necessário, portanto, ampliar o olhar do plano individual para o
Constantino, 2016). Para contribuir com o debate crítico sobre o sistema prisional brasileiro,
trabalhador.
Método
pesquisa mais ampla realizada em 194 das 34 unidades prisionais existentes em um estado
do Nordeste do Brasil, entre agosto de 2015 e setembro de 2016. Foi constituída de duas
da Saúde, 1994), e o Alcohol, Smoking and Substance Involvement Screening Test (ASSIST),
4
Unidades prisionais que fizeram parte da pesquisa mais ampla mencionada: 12 penitenciárias (6
estão localizadas na capital do estado, 4 ficam da região oeste, 1 na região agreste e 1 na região
central), 1 Unidade Psiquiátrica de Custódia e Tratamento (localizada na capital do estado), 1
Penitenciária Federal (localizada na região oeste do estado) e 5 Centros de Detenção Provisória
(todos localizados na capital).
prisional, o profissional ter outra ocupação na área de segurança, ter mais de 10 anos de
anos de idade, casados, com filhos, católicos, com renda familiar de 4 a 5 salários mínimos,
com ensino superior completo, com outra ocupação na área de segurança e com o costume
cocaína. Importante destacar que os relatos de ideação suicida foram de agentes que
e seus efeitos na vida do agente. Teve natureza qualitativa, por buscar compreender as
por essa categoria profissional (Romagnoli, 2009). Este artigo apresentará os resultados e as
Participantes
cárcere e seus efeitos na vida cotidiana, participaram dessa etapa de pesquisa não somente
agentes penitenciários que trabalham nas 5 unidades que se destacaram na etapa 1, como
também os gestores de tais unidades e familiares dos agentes. Nosso interesse era articular
como os diretores pensam e manejam os efeitos do trabalho na prisão, bem como com as
dos familiares dos agentes penitenciários, a fim de conhecer em que medida o trabalho
interfere na dinâmica familiar. Já que o objetivo dessa fase não era fazer um levantamento
Instrumentos
agentes, gestores e familiares (ver Tabela 1). As entrevistas, feitas de forma individual com
residências. O tempo médio de duração de cada entrevista variou entre 20 minutos e 1 hora
e meia.
penitenciário penitenciário
Como é seu dia a dia de A que você atribui o fato de O trabalho interfere na vida
de transtornos mentais
comuns e consumo de
drogas?
penitenciário?
Como são seus Que medidas poderiam ser A sua vida sofre influência
penitenciários?
utilizado o processo de análise temática (Minayo, 2004). No processamento das falas dos
objetivo de compreender uma realidade social, baseada nas práticas e declarações de seus
atores) tem o poder de revelar, expor determinadas linhas de força em um dado contexto
(Lourau, 1993). Tais analisadores serão explorados ao longo da discussão dos resultados.
Esta pesquisa contou com a aprovação do comitê de ética em pesquisa (parecer número
760.701).
Resultados e Discussões
agente penitenciário possibilitou a proposição inédita de uma mudança nas dimensões de tal
aqui de forma esquemática, é importante destacar que tais dimensões não podem ser vistas
vulnerabilidade vividos por agentes penitenciários nas cinco dimensões: (1) subjetiva (efeitos
nos modos de ser e existir que levam ao sofrimento); (2) familiar (têm suas relações
como o trabalho incide sobre o agente, quanto refletirmos acerca das lógicas de
era comum que parte dos momentos das entrevistas fosse dedicada a comentar as rebeliões
que aconteceram no estado no ano de 2015 e a forma como esses eventos afetaram o
trabalho e a vida de todos. Alguns profissionais chegaram a dizer que não aguentavam mais
tamanha pressão e medo, que temiam sair para trabalhar e não mais voltar devido à
violência.
agentes reafirmam a necessidade de punir quem cometeu crimes, apontando como ponto
positivo do trabalho desempenhado o fato de esse trabalho garantir que pessoas que
Essa lógica de punição não é algo próprio do agente. Rauter (2016) aponta que
enquanto sociedade temos escolhido a “solução penal e policial” para os conflitos sociais,
uma solução baseada no silenciamento dos conflitos, na eliminação de uma das partes. Para
a autora, essa lógica punitiva não resolve problemas relacionados ao aumento da violência,
Segundo Rauter (2016), para pensar a violência é preciso falar sobre a conflitividade
enquanto sociedade (pano de fundo para a questão do crime). A autora considera inevitável
uma sociedade na qual a competitividade individual é até mesmo tomada como virtude. Esse
elogio do individualismo e do consumo só pode colher como fruto o fato de que alguns
empreguem variados meios para obter os bens aos quais não têm acesso.
Dessa forma, para que servem as prisões? Para quem são destinadas? Essas foram
perguntas que surgiram no decorrer da pesquisa. Os agentes afirmavam não ver sentido no
próprio trabalho, pois eles tentam impedir que “pessoas más” voltem ao convívio social, mas
isso não impede que mais pessoas entrem nos presídios, que haja reinserção ou que
pessoas influentes, como políticos, juízes, entre outras, não recebam a punição devida.
A falha no sistema prisional foi apontada pelos entrevistados como fator de decepção
com o trabalho e motivo de sofrimento por parte dos trabalhadores, pois os agentes acabam
atuando como reprodutores de uma lógica de funcionamento fadada ao fracasso. Uma lógica
prisional e policial, uma lógica punitiva no lidar com os conflitos sociais, a qual só prende
pretos, pardos e pobres5. De acordo com Rauter (2016), “a prisão não pode construir nada
5De acordo com perfil da população carcerária brasileira traçado pelo Levantamento de Informações
Penitenciárias (Brasil, 2015).
de positivo, que fracassa totalmente e que age como “escola do crime” e, no entanto,
persistimos nesse tipo de “solução” que é sintoma e não solução” (p. 45).
no dia a dia, foi possível identificar nas unidades visitadas quatro tipos de características do
trabalho no sistema prisional, as quais se repetiram nas 5 unidades prisionais visitadas: (1)
automatizado sem nenhum controle e poder de decisão sobre o trabalho que desempenha;
(2) falta de treinamento para o desenvolvimento das funções; (3) estado de alerta constante
e risco de vida, tanto devido à insalubridade, quanto ao risco de rebeliões e fugas; (4) ritmo
intenso, pois o agente não consegue encontrar tempo de descanso durante as atividades
A forma como a rotina dos agentes é construída é marcada por forte verticalização
hierárquico formado por poucos e, para a grande massa de trabalhadores, cabe apenas a
submissão, muitas vezes sem direito a questionamento. É criada uma “máscara imaginária
para fazer com que o trabalhador pense que não tem nenhuma capacidade para participar
do processo de decisão, pois isto pertence a um saber específico” (Rauter, 2016, p. 120).
possível identificar dois cenários: (1) de falta de estrutura para a realização do trabalho e de
aprendizagem do ofício no dia a dia; (2) de imersão em rígidos protocolos, fazendo com que
Tais trabalhadores se veem de “mãos atadas” diante das consequências que o trabalho
coragem, habilidade com armas, estar sempre vigilante, preocupar-se com a segurança da
equipe e não ter medo diante da iminência de atos de violência – para conseguir trabalhar e
diversas vezes foi falado “se o agente não dá conta, não inventasse de ser agente”.
Interessante lembrar que os diretores das unidades prisionais, em sua maioria, são
acordo com Gaulejac (2007, p. 100), "são construídos sobre pressupostos raramente
ratios e de indicadores que se aplicam sem que haja possibilidade de discutir sua
pertinência". No mesmo sentido, Pagès, Bonetti, Gaulejac e Descendre (1987) atestam que os
legitimam dentro da organização (Host, Soboll e Cicmanec, 2013). Ou seja, podemos pensar
que o gestor da unidade, deixando de ser agente, passa a assumir o papel, o pensamento e
dimensão subjetiva evidencia a forma como o agente foi sofrendo transformações em seu
modo de vida e existência a partir das relações que o trabalho lhe impõe (Ferreira Neto,
2004).
afirma que não é possível se acostumar com o sofrimento. Outros agentes demonstram
insatisfação com as mudanças em suas vidas trazidas pelo trabalho, que aos poucos “se
pessoas que estão presas, como também em relação aos componentes da própria equipe,
pessoas que são agentes penitenciários devido à estabilidade do serviço público, mas não se
identificam com a carreira e estão estudando para mudar de emprego . Foi apontado que
esse tipo de agente parece “estar de passagem”, não se dedica à função, é mais relapso, não
faz o trabalho corretamente e é mais propenso aos erros. Esses aspectos, de acordo com
Ficou evidente a ideia de que um bom agente deve “vestir a camisa da instituição”, ou
laboral muitas vezes desprovida de significado social e sentido para o trabalhador. Nesse
Aqui a gente não sabe muito bem o que está fazendo e por que está fazendo. Eu
venho para cá trabalhar, mas não sei mais por que estou trabalhando nisso. Muitas vezes dá
vontade de desistir.
trabalhador (como não ter controle sobre os processos decisórios e não ter controle sobre as
pessoas, não se importa com a morte, perde a sensibilidade, a empatia com as pessoas.
Depois de trabalhar aqui não me espanto com muita coisa mais. Eu só quero sair daqui, não
aguento mais, sou uma pessoa doente por causa desse trabalho.
dos modos de agir, pensar e sentir - como indicado nas entrevistas a partir de
transformação do que gera o sofrimento no trabalho. Percebeu-se que os agentes que estão
fazendo planos para sair do trabalho no sistema prisional mostram-se mais entusiasmados
com a própria vida e esperançosos. Ficou claro que aqueles que desenvolvem estratégias de
inferioridade e derrota frente aos problemas do sistema prisional. Assim como o apenado,
para o agente, a luta para sair da cadeia funciona como um caminho possível e necessário
esse trabalho na unidade prisional, mas ao mesmo tempo afirmam que a categoria não
consegue se articular junto ao governo para que isso aconteça. Nenhum agente buscou
ajuda em saúde mental. Foi possível perceber que os sintomas relatados como decorrentes
trabalho mais próximos, pois os agentes dizem ter medo de ser vistos como loucos,
instituição”.
Fica cada vez mais evidente que “o cárcere leva todos que estão submetidos às suas
(Gaulejac, 2016, p.41). Tal despotencialização diz respeito à vida do preso, mas pode ser
processo de precarização entendido como uma política de governo da vida, que tem uma
dimensão macro e micropolítica, que visa não só atingir aspectos estruturais do trabalho,
mas especialmente a vida do trabalhador, que passa a ser alvo de investimento de lógicas
transformações produzidas no agente pelo trabalho no cárcere. Em uma das entrevistas com
penitenciário, não era mais o mesmo, que não se comportava como antes:
Sabe quando a gente compra uma coisa e ela funciona bem, aí o tempo vai passando
e essa coisa quebra, a gente tenta consertar, colar os pedaços, mas nunca mais será a
mesma de antes de quebrar? Pois é... Sinto meu marido assim, ele parece estar quebrado,
não funciona bem, não sorri como antes, não é feliz como antes, nossa vida mudou muito,
relação com a família e com a vida fora do cárcere. Todos os nove familiares entrevistados
dizem temer que o profissional não volte do trabalho, relatam maior aproximação com a
religião depois que o marido/filho começou a trabalhar como agente e gostariam que não
mais trabalhasse nessa função. Foi observado pelas esposas e mães maior agressividade,
Quando a gente quer se divertir, marcamos um churrasco com os amigos. Mas esses
amigos são sempre os colegas de trabalho dele. Eles ficam em um canto conversando e as
mulheres e crianças em outro lugar. Quando chega alguém estranho, eles olham
desconfiados e já vão colocando a mão na arma para se preparar para uma emboscada.
Muitos colegas passam por dificuldades no casamento por causa dessas coisas, não é todo
mundo que aguenta um marido assim. Os meninos têm medo dele às vezes.
2011). Durante as entrevistas, foi perceptível o quanto a dinâmica familiar foi afetada pelo
trabalho no cárcere, marcada principalmente pela dificuldade de convívio social livre, pela
busca de formas de proteção, como omitir a profissão ou citar qualquer informação que
possa revelar suas atividades profissionais. A família é instruída a não fazer comentários
mesmo no portão de casa. Cuidado com telefonemas estranhos, carros e motos suspeitos,
tudo deve fazer parte do plano de alerta em que vivem os agentes penitenciários, amigos e
familiares. O clima de terror é ainda pior para aqueles que suspeitam fazer parte da lista de
funcionários marcados para morrer elaborada pelos líderes das facções criminosas (Venco &
Barreto, 2010).
separação conjugal e conflitos com filhos. Dessa forma, as dificuldades vivenciadas no/pelo
trabalho acabam por gerar outro modo de vida que produz impactos na dinâmica familiar, o
que por sua vez acaba gerando mais sofrimento no agente e efeitos no seu trabalho. Assim,
sociais etc. Nesse ponto são claras as dificuldades vivenciadas pelos agentes de segurança
transparecer que um dos responsáveis pelas fugas e desorganização das unidades prisionais
é o agente penitenciário, que devido à corrupção “permite que os presos façam o que
agentes querem voltar a estudar para buscar outro emprego, mas, como além da profissão
de agente ainda fazem “bicos” para complementar a renda, não conseguem estudar por falta
de tempo. A dificuldade em ter acesso a serviços de saúde também se faz presente nos
discursos, pois falta dinheiro para buscar um da rede privada de saúde ou existe o receio de
relataram que por questão de segurança optaram por não morar na mesma cidade em que
trabalham, escolhendo um município distante da penitenciária. Escolha que faz com que os
agentes tanto invistam uma significativa quantia de dinheiro por mês em passagens e
trabalho ainda precisam esperar em média quatro horas para chegar em casa. Foi recorrente
temerem sua segurança, como também por constrangimento diante da reação das pessoas,
Uma vez eu estava em um churrasco de família e não percebi que tinha gente
desconhecida. No meio da conversa falei sobre o presídio e uma pessoa foi logo
perguntando se eu era agente penitenciário. Falei que sim. Ele olhou para mim de um jeito
que fiquei constrangido. Esse povo acha que nós somos carrascos, que a prisão não presta
relatados casos de agentes que tentaram e tiveram êxito na prática do suicídio. Tal prática
assume cada vez mais a característica de invisibilidade, ou seja, ocupações em que há uma
sujeito não é reconhecido como um sujeito, pelo fato de dedicar-se a um trabalho não
valorizado socialmente, como no caso dos agentes (Greco, Magnago, Urbanetto, Luz &
Prochnow, 2015).
investimento por parte do governo na segurança das unidades, contratação de mais agentes
Quando perguntados sobre o que estava sendo feito para que tais mudanças
eles não se sentem representados, já que os líderes sindicais não têm força contra o Estado
desorganizado e violador. Chama a atenção o fato de, mesmo diante do sofrimento relatado
por agentes, familiares e gestores, nada ter sido abordado quanto à necessidade da
Sistema Único de Saúde (SUS) para a população privada de liberdade, o governo federal
instituiu a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade
primeira vez é possível perceber que os trabalhadores do cárcere passam a fazer parte do
especificidades do sistema prisional foi aprovada pelo Conselho Nacional de Política Criminal
saúde; controle do grau de insalubridade de cada unidade prisional das respectivas unidades
trabalho e na vida do agente penitenciário, não basta a criação de condições favoráveis, mas
é preciso também considerar a saúde do agente como parte de um modo de produção que
uma análise dos processos de produção de saúde do trabalhador, a partir da não redução do
Considerações Finais
forma inédita e pioneira. Teve como desdobramento a geração de um banco de dados, que é
uma ferramenta importante não somente para futuros estudos sobre o sistema prisional
estadual e nacional (servindo de base para comparações com os demais estados do Brasil),
como também para orientar o planejamento de ações de saúde voltadas para essa categoria
profissional.
Constatamos, a partir dos dados aqui apresentados, que o trabalho dos agentes
de um sistema que deixa viver ou faz morrer tanto aqueles que são apenados, quanto os
cotidiano das prisões e seus efeitos na vida do profissional. Ela é um instrumento que ajuda
a manter a desigualdade social, ainda que sejam instituições que tenham propósitos de
“defesa social”. Essa condição institucional traz sérias consequências aos que ali cumprem
pena, mas também desdobramentos negativos para os profissionais que estão, todos os
dias, garantindo o seu funcionamento. Com base no conjunto de informações trazidas pelos
aparecimento.
suscita múltiplos desafios, de ordem biológica e médica, psicológica, social, jurídica e ética.
cuidado.
Para a construção de uma crítica nesse sentido, Bravo (2012) faz referência às
possibilidades de cuidado a pessoas privadas de liberdade (mas que pode ser pensado aqui
caráter ético e político: partindo dos seus efeitos nocivos, é essencial investir na eliminação
das instituições e práticas da prisão e criar outro modelo. Para isso, é necessário envolver a
sociedade, a partir da perspectiva de que esse é um problema de todos, que atinge certas
representações sociais que fazem uma distinção categórica entre bons e maus indivíduos,
sendo a cadeia o destino natural para os que transgridem as regras. Para Bravo (2012),
possíveis soluções é reafirmar o modelo social que sustenta tais instituições, baseadas na
incluídos nesse processo. Isso significa compreender que os agentes, enquanto guardiões da
trabalhar e viver.
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