Ana Santos
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Ac. - Acórdão
Al. - Alínea
Art. - Artigo
CC - Código Civil
CPC - Código de Processo Civil
CPTA - Código do Procedimento Tributário e Administrativo
CRP - Constituição da República Portuguesa
CIRE - Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas
CSC - Código das Sociedades Comerciais
CSM - Conselho Superior de Magistratura
DL - Decreto Lei
NCPC - Novo Código Processo Civil
RPCE - Regime Processual Civil Experimental
TRP - tribunal da Relação do Porto
TRE - Tribunal da Relação de Évora
TRC - Tribunal da Relação de Coimbra
TCA - Tribunal Central Administrativo
2
INTRODUÇÃO
1
Abreus Advogados, Setembro 2013, O Novo Código do Processo Civil – NCPC – Reforma
Radical?, Analysis, disponível em: www.abreuadvogados.com
2
Este direito encontra-se ainda salvaguardado a nível universal pelo art.º 10º da Declaração
Universal dos Direitos do Homem e pelo art.º 6º da Convenção Europeia dos Homens. Na
Constituição da República Portuguesa o art.º 20º da CRP que prevê o acesso ao direito e tutela
jurisdicional efetiva.
3
FARIA, Rita Lynce de, “A Tutela Cautelar Antecipatória no Processo Civil Português: Um
difícil equilíbrio entre a Urgência e a Irreversibilidade, Coleção Teses de Direito, Universidade
Católica Editora, Lisboa, 2016, p.48
3
É neste ponto que surgem os “procedimentos necessários para acautelar o
efeito útil da ação” previstos no art.º 2, nº2, ou seja, os procedimentos
cautelares regulados nos artigos 362º e seguintes.
4
Cfr. Apud, FARIA, Rita Lynce de, “A Tutela Cautelar Antecipatória…”, ob.cit., p.56-57
5
REGO, Carlos Lopes, “O Novo Processo Declarativo”, disponível em: www.sjt.pt , p.5-6
6
Acerca dos princípios gerias estruturantes do processo civil, ver RODRIGUES, Fernando
Pereira, “O Novo Processo Civil – Os princípios estruturantes”, Almedina, 2013
4
caducidade da providência cautelar que lhe beneficia. Esta instrumentalidade
tão profundamente enraizada no nosso sistema cautelar, tornou-se obsoleta, e
na prática esta situação não passa de uma mera repetição, no âmbito da ação
principal, da controvérsia que tinha acabado de ser apreciada e decidida no
âmbito do procedimento cautelar.
7
REGO, Carlos Lopes, “O Novo Processo Declarativo”, op.cit., p.6
5
1. Enquadramento histórico no ordenamento jurídico português
A tutela cautelar que se encontra hoje em vigor tem as suas raízes nos
primórdios da lei civil portuguesa, e para iniciarmos o nosso estudo da inversão
do contencioso – novo artigo 369º do CPC, que surgiu com a última reforma
processual em 2013 – farei um breve enquadramento histórico das origens dos
procedimentos cautelares no ordenamento civil português, dando especial
importância às grandes reformas processuais que se espelham na tutela
cautelar atualmente.
Nos anos seguintes foram feitas várias alterações e reformas, mas foi o
Prof. ALBERTO REIS que tomou a iniciativa para uma maior reestruturação a
nível processual e redigiu um projeto do diploma que deu origem ao Código de
1939, contendo o respetivo processo legislativo 10. Nas palavras de ARMINDO
MENDES11 é “um código extremamente evoluído para a época e que tomou em
consideração não só os grandes diplomas latinos do séc. XIX, o Código de
Processo Civil napoleónico, o Código italiano de 1865 e a “Ley de
Enjuiciamiento Civil” espanhola de 1880, mas também os códigos germânicos,
alemão e austríaco, do final do século XIX”.
8
Pode ser consultado em: http://www.fd.ulisboa.pt
9
O primeiro código de civil português viria instituído por Alexandre de Seabra, sendo
atualmente conhecido como Código de Seabra, e aprovado por carta de lei a 8 de novembro de
1876.
10
Cf. MENDES, Armindo Ribeiro, As sucessivas reformas do processo civil português, Revista
JULGAR Nº16, Coimbra Editora, 2002, p.79
11
MENDES, Armindo Ribeiro, As sucessivas reformas…, ob.cit., p.80
6
e protestos e os alimentos provisórios; e adiciona a restituição provisória da
posse baseada em esbulho violento, a suspensão de deliberações sociais, a
imposição de selos, o arrolamento e as cauções. Excluí a conciliação e as
denúncias e as tomadias, sendo estas integradas nos atos preventivos da ação
ordinária e no processo fiscal respetivamente.12
12
Cfr. LEITÃO, Hélder Martins, Os procedimentos cautelares, 7ºEdição, Almeida e Leitão,
Porto, 2000, p.22
13
Cfr. Código do Processo Civil,1961, disponível em: www.fd.ulisboa.pt, p.1785
14
Cfr. Código do Processo Civil, 1961, p.1785
15
Nas palavras de MENDES, Armindo Ribeiro, As sucessivas…, op.cit., p.87
16
Cfr. MENDES, Armindo Ribeiro, As sucessivas…, op.cit., p.87
17
A figura do solicitador de execução, agora denominado com agente de execução, tem origem
no “huissier de juistice” francês, neste sentido, MENDES, Armindo Ribeiro, “As sucessivas…”,
op.cit., p.87
7
profissional liberal que deveria ser chamado a praticar os atos materiais na
ação executiva; citações, penhoras e vendas de bens executados.
Apesar de em 2003 ter sido feita uma reforma na ação executiva, foi
apenas três anos mais tarde, em 2006 que foram feitas mudanças a nível da
ação declarativa. Relativamente aos procedimentos cautelares, com a
aprovação do “Regime Processual Civil Experimental” - que seria aplicado nas
ações declarativas cíveis a que não corresponda processo especial, às ações
especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de
contratos, e aos procedimentos cautelares – destaca-se o artigo 16º, prevendo
que, «quando tenham sido trazidos ao procedimento cautelar os elementos
necessários à resolução definitiva do caso, o tribunal pode, ouvidas as partes,
antecipar o juízo sobre a causa principal»; no entanto, este artigo será
posteriormente será analisado nesta dissertação.
18
Sendo eliminado o processo sumaríssimo do CPC.
8
que a situação presente seja transposta para uma vindoura decisão, antes que
seja tarde demais”.19
19
Cfr. Apud LEITÃO, Hélder Martins, Os procedimentos cautelares, op.cit, p.21
20
As situações referidas encontram-se previstas na lei.
21
Cfr. MENDES, António Alfredo e PROENÇA, Carlos, Procedimentos Cautelares: Noções e
Requisitos – Um Olhar Possivel com a Reforma Processual Civil de 2013, p.342 e 343,
disponível na URL: http://recil.grupolusofona.pt/bitstream/handle/10437/6395/jurismat4_339-
367.pdf?sequence=1
22
Pressupostos esses que são cumulativos.
9
segura das mesmas e assim poder decretar a providencia cautelar, alega o
art.º 365, nº1.
23
Cfr. Ac.do TRC de 28/06/2005, proc.1345/05, disponível em: www.dgsi.pt
24
Neste sentido, GONÇALVES, Marco Carvalho, Providências Cautelares, Almedina, 2ºEdição,
2016, p.94, elucida que as providencias cautelares de natureza conservatória encontram-se
associadas às situações de “pericolo da infruttuisità”, isto é, visam prevenir o dano que pode
resultar da verificação, na pendencia do processo de declaração, de factos que impossibilitem
a satisfação do direito que o autor pretende fazer valer contra o demandado.
25
Acerca da suspensão das deliberações sociais, LEBRE DE FREITAS assinala que estas
possuem simultaneamente natureza conservatória e antecipatória, uma vez que os seus efeitos
abrangem a não produção dos mesmos, e tal detalhe é antecipado, a titulo provisório pela
decisão da suspensão (FREITAS, José Lebre, Código de Processo Civil Anotado, vol.II, p.92)
apud, GONÇALVES, Marco Carvalho, As Providências Cautelares, op.cit.,nota 191, p.95
26
Ver MENDES, António Alfredo e PROENÇA, Carlos, Procedimentos Cautelares…op.cit.,
p.344
10
palavras de PAIS DO AMARAL27, “têm carácter antecipatório dos efeitos da
ação principal” e são associadas às situações de “pericolo da tardività”, na
medida em que previnem, mediante a antecipação do juízo final, a pretensão
do requerente. São exemplos de providencias cautelares antecipatórias os
alimentos provisórios, (art.º 384º e ss), a restituição provisória de posse (art.º
377º e ss) e o arbitramento de reparação provisório (art.º 384ºe ss).
27
PAIS DO AMARAL, Jorge Augusto, “Direito Processual Civil”, Almedina, 12º Edição, 2015,
p.39
28
Neste sentido, SOUSA, Miguel Teixeira, As Providencias Cautelares e a Inversão do
Contencioso, p.4, disponível na URL: https://sites.google.com/sites/ippcivil/recursos-
bibliograficos/5-papers
29
Cfr. LEITÃO, Hélder Martins, Os procedimentos cautelares, op.cit., p.35 e 36
11
que substituam a medida cautelar. No caso do arresto, este mantém-se
até ser convertido em penhora.
Nos alimentos provisórios, embargo de obra nova e suspensão de
deliberações sociais – obter julgamento preliminar e provisório sobre a
relação litigiosa (efeito declarativo através da formação antecipada de
um título) – tem por fim obter um efeito declarativo, a eficácia da
providência cessa logo que à declaração provisória se substitua a
definitiva. No caso dos alimentos provisórios, estes mantêm-se até ser
convertida em pensão de alimentos.
1.2. Pressupostos
30
Cfr., SOUSA, Miguel Teixeira, As Providências…op.cit.,p. 4 e 5, bem como GONÇALVES,
Marco Carvalho, As Providências Cautelares…op.cit., p.97 a 99
12
boni iuris – e da existência de lesão para aquele direito como resultado da
demora da ação – o periculum in mora.31
31
Juntamente com esta norma seguem-se os termos do art.365, nº1 no qual se exige a “prova
sumária do direito ameaçado” e se justifique “o receio da lesão”; bem como o disposto no art.º
368º, nº1 de uma “probabilidade serie da existência do direito” bem como “se mostre
suficientemente fundado o receio da sua lesão”.
32
FARIA, Rita Lynce de, “A Tutela Cautelar…” , op.cit., p.109 e 110
13
efetividade do direito da demora de uma ação judicial33. Por ser um
pressuposto que resulta da iminência do risco de lesão à efetividade do
direito na pendência da ação, tem como consequência a inexistência do
periculum quando a lesão já tenha ocorrido, pois uma vez verificado o
dano a tutela cautelar já não produz qualquer efeito útil. É devido à
lentidão dos tribunais e a consequente demora da decisão definitiva do
processo em rigor que se receia a lesão grave e dificilmente reparável
ao direito do requerente – corolários da efetivação do periculum in mora.
Compete ao requerente fazer prova de que não pode “aguardar a
decisão do processo principal sem sofrer um prejuízo de consequências
graves e irreparáveis”.
33
Neste sentido, v. Rita Lynce de Faria, A Tutela Cautelar Antecipatória…op.cit., p.132. É
complementado por um outro conceito processual, o interesse em agir, isto é, a necessidade
que justifica o recurso à via judicial.
14
1.3. Características
34
Cfr. PAIS AMARAL, Direito Processual Civil, op.cit., p.37
35
Como refere Rita Lynce de Faria, com esta simplificação foram encurtados os prazos, certas
fases processuais foram suprimidas ou simplificadas, entre outros. Para além disso, o
legislador concedeu ao julgador do procedimento cautelar a possibilidade de efetuar uma
análise meramente perfunctória do litigio, que se diferencia da análise mais profunda que é
efetuada nos processos de cognição plena. V. FARIA, Rita Lynce, A Tutela Cautelar…,
op.cit.,p.185 e 186
36
Cfr. Rita Lynce de Faria, A Tutela Cautelar Antecipatória…ob.cit.p.186
37
Ainda sobre a sumariedade do processo, António Alfredo Mendes e Carlos Proença,
Procedimentos Cautelares:…op.cit.,p.346, “É em nome da celeridade que a providência
apresenta uma estrutura mais simplificada e menos exaustiva na prova dos factos.”
15
Como disposto no art.º 364º, nº1 o procedimento cautelar é sempre
dependência de uma causa, que terá por objeto acautelar o interesse jurídico
que se pretende ver reconhecido na ação principal; desta forma, podemos dizer
que a providência cautelar em que se pede a prestação de alimentos
provisórios será dependência da ação de alimentos definitivos - art.º 384º e
seguintes. A instrumentalidade que se impõe com este nº1 conduz a uma
“duplicação de ações”, pois verifica-se uma repetição na ação principal, de todo
o litígio que já foi apreciado e debatido no âmbito cautelar. Contudo, esta
instrumentalidade é atenuada com a exceção38 da inversão do contencioso que
mais adiante trataremos.
Deve-se ter em conta a norma do nº 4 do art.º 364º, que nos diz que
nem o julgamento da matéria de facto, nem a decisão final do procedimento
cautelar tem qualquer influência no julgamento da ação principal.
38
Cfr. Art.º 364º, nº1 “Exceto se for decretada a inversão do contencioso”, art.º 369º.
16
1.4. A providência cautelar: comum e especificadas
Pode ser decretada quando existir fundado receio de que outrem cause
lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, bem como seja assegurado
a efetividade do direito ameaçado – art.º 362º, nº1. Para além destes três
requisitos, é necessário que o prejuízo resultante da providência não exceda o
valor do dano que com ela se pretende evitar – art.º 362º, nº2.
39
Aprovado pelo DL nº 53/2004 de 18/3.
40
Cfr. PAIS DO AMARAL, Direito Processual Civil, op.cit,, p.39
41
Cfr. PAIS DO AMARAL, Direito Processual Civil, op.cit, p.38
17
Começamos pela restituição provisória da posse expressa no art.º
377º, (e seguiremos a ordem no CPC nas restantes providências
especificadas), mais concretamente pelo conceito da posse.
42
Recorde-se que estamos dentro do âmbito das providências cautelares e que deste modo o
juízo necessário para se decidir acerca da existência da posse será baseado numa aparência
plausível e certa do direito da posse. Cf. LEITÃO, Hélder Martins, Dos Procedimentos
Cautelares, op.cit, p.61.
43
Existe esbulho sempre que alguém foi ilicitamente privado do exercício de retenção ou
fruição do objeto possuído.
44
Cf. LEITÃO, Hélder Martins, Dos Procedimentos Cautelares, op.cit., p.61
18
Passemos à suspensão das deliberações sociais que no entender de
TIAGO ARAÚJO45 , esta visa prevenir a produção de efeitos de uma
deliberação considerada viciada, ou seja, uma deliberação que não tenha
obedecido aos pressupostos e fundamentos para a sua validade antes da sua
execução.
Nos termos do art.º 380º, nº1, “se alguma associação ou sociedade, (…)
tomar deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer
sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações
seja suspensa, justificando a qualidade de sócio e mostrando que essa
execução pode causar dano apreciável.” Muitas coisas podem ser retiradas da
leitura desta norma, começando pelo prazo para formular o pedido de
suspensão de deliberações sociais que é de 10 dias, e que se conta a partir da
data da assembleia em que as deliberações foram tomadas ou após o
requerente ter tomado conhecimento46 das deliberações (caso este não tenha
sido convocado para a assembleia) – art.º 380º, nº3. No que diz respeito à
prova, no requerimento em que se pede a suspensão de deliberações sociais,
o requerente/sócio deve provar a sua qualidade de sócio e que a execução das
referidas deliberações sociais podem causar dano47 apreciável – art.º 380º, nº1,
última parte.
45
ARAÚJO, Tiago José Gomes Oliveira Augusto de, “O novo princípio da inversão do
contencioso aplicável á tutela cautelar da suspensão de deliberações sociais”, Dissertação de
Mestrado em Direito das Empresas – Especialização em Sociedades Comerciais, ISCTE, 2015,
p.22
46
É importante referir que se denota a preocupação de não prejudicar a outra parte quando
esta não tenha sido convocada, notificada ou citada dentro dos parâmetros da lei, respeitando
assim o principio do contraditório.
47
Nota-se que este “dano” não especifica a quem corresponde, se ao requerente/sócio se á
própria associação ou sociedade. Cf. LEITÃO, Hélder Martins, Dos Procedimentos Cautelares,
op.cit., p.84
19
correspondente48(…), a citação da associação ou sociedade é feita com a
cominação de que a contestação não é recebida sem entrar acompanhada da
cópia ou do documento em falta”. Ou seja, no que diz respeito a esta última
função da citação, retiramos a ideia que a contestação não será aceite sem os
parâmetros acima expostos; e sobre o prazo para contestar é de 10 dias, como
se verifica pela remissão feita do nº 1 do 381º para o 380º. Para terminar, ainda
no art.º 381º, no seu nº 2 é referido que o juiz pode decidir deixar de suspender
a deliberação quando o prejuízo desta for superior ao que poderia derivar do
seu cumprimento.
48
Que será previamente pedido pelo requerente/sócio para juntar ao seu requerimento e que,
segundo a lei, deve ser fornecido pela direção ao mesmo num prazo de 24h – art.º 380º, nº2.
49
Esta ação de anulação vem caracterizada no art.º 1433º, nº1 do CC, que prevê que as
deliberações da assembleia geral contrárias à lei ou aos estatutos são anuláveis. Esta ideia é
ainda reforçada pelo art.º 177º e 178º do CC.
20
Feito o requerimento para os alimentos provisórios, será designado o dia
para julgamento, no qual as partes são advertidas para comparecer, seja
pessoalmente ou representadas por procurador com poderes para tal, nos
termos do art.º 385º, nº1. A contestação é feita na própria audiência e o juiz
tenta obter a fixação de alimentos por mútuo acordo, sendo esta decisão logo
homologada por sentença - art.º 385º, nº2. Na falta de comparência de uma
das partes ou no caso de alguma parte não estiver de acordo, o juiz ordena a
produção de prova e decide por sentença oral o valor estipulado – art.º 385º,
nº3.
50
A sentença que define os alimentos provisórios pode ser alterada dentro dos parâmetros do
art.º 2012º e cessada ou anulada dentro das regras do art.º 2013º e 2019º do CC.
21
Para ser deferida pelo juiz, é necessário que se verifique uma situação
de necessidade em consequência dos danos sofridos e que seja indiciada a
existência de obrigação de indemnizar a cargo do requerido – art.º 388º, nº 2.
Esta providência cautelar não tem tramitação especifica, pelo que segue
os parâmetros dos alimentos provisórios52, com as devidas adaptações, como
é dito no art.º 389º. É importante acautelar o disposto no nº 2 do referido artigo:
“na falta de pagamento voluntário da reparação provisoriamente arbitrada a
decisão é, imediatamente, exequível, seguindo-se os termos da execução
especial de alimentos”, termos esses que se encontram nos artigos 933º a 937º
e dos quais, HÉLDER LEITÃO53, retira os seguintes aspetos: a nomeação de
bens à penhora pertence, exclusivamente ao exequente; a nomeação é feita no
próprio requerimento inicial; só após a realização da penhora é que se cita o
executado e os eventuais embargos acontecem em caso de alguma objeção à
execução.
52
Cfr. art º.385º para conferir a forma de tramitação aplicável a esta situação.
53
LEITÃO, Hélder Martins, Dos Procedimentos Cautelares, op.cit., p.127
54
Situações previstas no art.º 373º.
22
preventivo da ação de dívida que, a seguir, o credor intentará contra o devedor;
pode, em vez disso, surgir como incidente da mesma ação, porque o justo
receio de insolvência pode manifestar-se na pendência da ação; pode,
finalmente, constituir ato preparatório ou incidente da execução se o credor já
está munido de título executivo quando o justo receio ocorre”55.
55
REIS, Alberto, in Código de Processo Civil, Anotado, II vol., p.11, apud, LEITÃO, Hélder
Martins, Dos Procedimentos Cautelares, op.cit., p.130.
56
Relativamente ao regime da penhora, aplicam-se as normas dos artigos 735º e seguintes.
57
Rendimentos esses que são fixados nos termos previstos para os alimentos provisórios,
como disposto no nº3 do art.º 393º.
58
“A prudência normal é entendida como um conceito de direito, sedo que este aprecia as
condutas humanas numa média”; assim afirma HÉLDER LEITÃO, in Dos Procedimentos
Cautelares, op.cit., p.144.
23
O embargo de obra nova referido no art.º 397º é feito por aquele que
se julgue ofendido no seu direito de propriedade ou em qualquer outro direito
real ou pessoal de gozo ou na sua posse, em consequência de obra, trabalho
ou serviço novo que lhe cause ou ameace causar prejuízo. Ao requerer a
providência cautelar, podem seguir-se duas vias: o embargo judicial de obra
nova, que manda suspender a obra, serviço ou trabalho e que tem 30 dias
para ser requerida – art.º 397º, nº1 – ou através de via extrajudicial, no qual o
interessado faz diretamente o embargo, notificando verbalmente o dono da
obra, ou na falta deste o encarregado, para parar a obra, perante duas
testemunhas; porém este embargo perde os seus efeitos no prazo de 5 dias,
caso não seja requerida a ratificação judicial – art.º 397º, nº2 e nº3.
Existem também, obras que não podem ser embargadas “quando por
litigio se reportar a uma relação jurídico-administrativa, a defesa dos direitos ou
interesses lesados se deva efetivar através dos meios previstos na lei de
processo administrativo contencioso”, remata o art.º 399º, é o caso das obras
59
LEITÃO, Hélder Martins, Dos Procedimentos Cautelares, op.cit., p.160.
24
do Estado, pessoas coletivas públicas e entidades concessionarias de obras ou
serviços públicos.
O art.º 401 instrui que, apesar do embargo da obra, esta pode ser
autorizada a ser continuada, por meio de requerimento só embargado, quando
se reconheça que a demolição restituirá o embargante ao estado anterior á
continuação ou quando o prejuízo resultante da paragem da obra for superior
ao que pode suceder da sua continuação. Por fim, o art.º 402º, diz-nos que o
embargado que continuar a obra, sem autorização, depois da notificação e
enquanto o embargo durar, pode o embargante requerer que seja destruída a
parte inovada; que caso não seja destituída, dentro do prazo fixado, será
promovida, nos próprios autos, a execução para a prestação de facto devida.
60
Cfr. art.º 400º, n2º, última parte: “(…) quando o dono da obra não possa ou não queira
assinar, intervém duas testemunhas”.
25
aos bens depender de ação proposta ou a propor, tem o requerente de
convencer o tribunal da provável procedência do pedido correspondente. Após
a produção das provas, e se estas forem favoráveis a tal, o juiz decide pelo
decretamento do arrendamento e no respetivo despacho, nomeia-a um
depositário e um avaliador. Por norma do 408º, o depositário será o próprio
possuidor ou detentor de bens.
No que diz respeito aos arrolamentos especiais, o art.º 409º, nº1, alude
que qualquer dos cônjuges pode requerer o arrolamento de bens comuns ou de
bens próprios que estejam sob a administração do outro, como preliminar ou
incidente da ação de separação judicial de pessoas e bens, divórcio,
declaração de nulidade ou anulação de casamento; não sendo aplicável o
disposto no nº1 do art.º 403º aos arrolamentos ditos especiais.
26
1.5. Tramitação
61
“Das decisões de indeferimento liminar do requerimento inicial do procedimento cautelar é
sempre admissível recurso para a Relação – art.º 629, nº, alínea c).”, PAIS DO AMARAL,
Direito Processo Civil, op.cit, p.52
62
Acerca da natureza das exceções dilatórias, conferir os artigos 576º e 577º Quanto ao
conhecimento das mesmas, ver artigo 578º.
63
Dentro dos procedimentos cautelares comuns, pode o juiz substituir a medida requerida por
outra que considere mais adequada à tutela do direito ameaçado. Cf. PAIS DO AMARAL,
Direito Processo Civil, op.cit, p.52
27
O requerente apresenta o seu rol de testemunhas, que não pode ser
mais de cinco – art.º 294º, nº1; no entanto, esta norma apenas é aplicável à
parte, o que não causa impedimento ao Tribunal para ouvir pessoas não
arroladas, por sua livre iniciativa, assim dispõe o art.º 526º.
64
Pode não ser ouvido se puser em risco sério o fim ou a eficácia da providência – art.º 366º,
nº1.
65
Apesar de não se encontrar expressa na lei civil portuguesa, o juiz pode recusar a audição
de testemunhas quando se considerar suficientemente esclarecido, tal como acontece no art.º
363º da Ley de Enjuiciamento Civil; v. Nota 275, RAMOS DE FARIA, Paulo e LOURENÇO, Ana
Luísa, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil – os artigos da reforma, Vol. I,
Edições Almedina, 2º Edição, Coimbra, 2014
66
Cf. MENDES, António Alfredo e PROENÇA, Carlos, Procedimentos Cautelares…, ob.cit.,
p.349
28
Ao ser decretada a providência cautelar goza de garantia penal, pelo
que o art.º 375º decreta que incorre na pena do crime de desobediência
qualificada todo aquele que infrinja a providência cautelar decretada, sem
prejuízo das medidas adequadas à sua execução 67 coerciva. Para esta
responsabilidade ser exigível é necessário que o requerido seja notificado
pessoalmente com a cominação prevista na lei penal para o caso de
desobediência, remata PAIS DO AMARAL.68
67
A providência que imponha uma obrigação é passível de execução, constituindo título
executivo a decisão que decreta, nos termos do art.º 703º, nº1, alínea a).
68
PAIS DO AMARAL, Direito Processual Civil, op.cit., p.54
29
1.6. Recurso
30
Capítulo 2 - O Instituto da Inversão do Contencioso no
Processo Civil Português
69
Cf. DELCASSO, M. Jean-Paul Correa, Le titre exécutoire européen et l’inversion du
contentieux, Revue internationale de droit compare, vol53 n.º1, Janvier – mars 2001: 61-82,
p.65 apud, VAZ, Isabel, Inversão do Contencioso…, ob.cit., p.85
70
Cf. LEVAL, George de apud, BOULARBAH, Hakim, Requêt Unilatérale et Inversion do
Contentieux, Belgique: Larcier, 2010, p.214, apud, VAZ, Isabel, Inversão do contencioso…,
ob.cit., p.85
31
contencioso caracteriza-se pela posição ativa do devedor no que diz respeito à
iniciativa processual71.
Contudo, esta noção não pode ser tomada como definitiva da inversão,
pois como é dito por ISABEL VAZ, há situações em que a iniciativa permanece
no demandante e temos o diferimento do debate contraditório72.
Este conceito acaba por integrar a noção anterior, porque para surgir o
debate contraditório depois da decisão que precaveu o interesse do requerente
71
BOULARBAH, Hakim, Requêt Unilatérale et Inversion do Contentieux, apud, VAZ, Isabel,
Inversão do contencioso…, op. cit., p.86
72
Vaz, Isabel, Inversão do contencioso…, op. cit., p.85
73
Vaz, Isabel, Inversão do contencioso…, op.cit, p.87
32
é preciso que o demandado adote uma posição ativa perante o tribunal que
tomou a decisão, colocando-a em crise. O autor HAKIM74, entende que esta
noção é a que melhor caracteriza a inversão, uma vez que é a mais
abrangente.
No direito internacional, esta técnica já não é nova, ainda que, cada país
tenha a sua própria maneira de a aplicar. Quanto a nós, o mecanismo da
inversão do contencioso tem o référé do direito francês, como a sua maior fonte
de inspiração, pois este é caracterizado por se tratar de uma técnica de
transferência da iniciativa processual, que o nosso art.º 369º muito se lhe
assemelha; no entanto, na norma francesa, o requerido pode exercer a sua
defesa, ainda que seja de forma oral e muito sucinta.75
74
BOULARBAH, Hakim, Requêt Unilatérale et Inversion do Contentieux, apud, VAZ, Isabel,
Inversão do contencioso…, op.cit., p.87
75
Vaz, Isabel, Inversão do Contencioso…, op.cit., p.107
33
Mas vamos explorar um bocadinho mais o procedimento do référé, visto
que este consegue alcançar realmente a pretensão de poupar um contencioso
inútil, que nós apenas alcançamos pela metade. No disposto do art.º 484º e ss
do Código Civil francês, é possível encontrar as duas modalidades em que se
desdobram este procedimento, sendo elas: as decisões provisórias unilaterais,
“les ordonnances sur requête” e as decisões provisórias, mas não unilaterais,
“les ordonnances sur référé”. No art.º 484º do NCPC francês, é dito que o juiz,
a pedido de uma parte, pode emitir uma decisão provisória, por via da técnica
da sumarie dade, que garanta a efetividade de determinado direito, antes de
uma ação com processo ordinário, pelo que as medidas provisórias do
procedimento de référe são justificadas pela urgência de proteção de
determinados direitos76.
76
Cf. Vaz, isabel, Inversão do Contencioso…, op.cit., p.108
77
Neste sentido, VAZ, Isabel, Inversão do Contencioso…, op.cit., p.108
34
momento estas medidas podem ser substituídas por outras, não se formando
caso julgado com o procedimento.
35
2.1 Antecedentes da inversão do contencioso na lei portuguesa
36
exista processo principal já intentado; que tenham sido trazidos para o
processo todos os elementos necessários, e que a simplicidade do caso ou a
urgência na resolução definitiva o justifique, bem como, o respeito pelo
principio do contraditório, isto é, a audição de ambas as partes interessadas no
processo.
83
Cfr. Marco Carvalho Gonçalves, Providencias Cautelares, op.cit., p.135
84
Cfr. Ac.do TCA-Norte de 18.03.2011, proc.01924/10.2BEPRT, disponível em: www.dgsi.pt
85
Neste sentido, Rita Lynce de Faria, A Tutela Antecipatória…, op.cit., p.237. Cfr. ainda na
mesma obra (capitulo II, ponto 3.2), o que a autora nos diz sobre a substituição das
providências cautelares por tutelas definitivas.
86
DL nº108/2006, de 8 de junho, que, entretanto, foi revogado pela Lei nº41/2013, de 26 de
junho, que veio aprovar o novo CPC.
37
Exige-se o cumprimento de dois requisitos cumulativos: que o processo
seja detentor de todos os elementos necessários á resolução definitiva do caso
e a audição das partes87 (novamente o respeito pelo principio do contraditório).
Esta solução parecia a mais viável para ser adotada, contudo, após a
aplicação do mesmo, muitos manifestavam o seu receio desta ser uma norma
muito ampla e que necessitava de cuidados, como se pode ver no Relatório
Intercalar89 sobre a o RPCE:
“Eu tenho um pouco de medo desse artigo e desenvolvia-o mais. Diria, que tal
teria aplicabilidade apenas nas providências cautelares em que a parte
contestou, em que houve audiência, portanto acrescentaria alguns
requisitos, não deixaria tão amplo.” (J8)
“Não vai haver muitas vezes, quando houver é muito útil. (…) Temos o
problema do principio do pedido, eu penso que o juiz não pode nunca decidir
sem o acordo do autor e sem que o autor defina claramente qual é o
pedido que iria fazer no processo principal, (…). É preciso o acordo do
réu, sei que isto é mais duvidoso, mas continuo a achar que o juiz não pode
presumir que o réu gastou as suas armas naquele processo, ou que as
quis reservar para o processo principal. (…) Também não podemos cair na
situação de, (…) aquilo que as partes eventualmente querem é um processo
principal, inventem aqui uma urgência que o réu não conteste, uma situação
87
Paulo Ramos de Faria considera que a audição das partes daria “a possibilidade de discutir
as razões de facto e de direitos pertinentes à demanda já considerando a hipótese de a
pronúncia sobre elas ter natureza definitiva”, in FARIA, Paulo Ramos, Regime Processual Civil
Experimental Comentado, Edições Almedina, Legislação Anotada, Coimbra, 2010, p.226
88
Cfr. PINTO, Rui, Notas ao Código Processo Civil, Vol.I, 2º Edição, Coimbra Editora, 2015,
nota 2, p.311
89
Cfr. “Um ano de Regime Processual Civil Experimental – Relatório Intercalar”, elaborado pela
Direcção-Geral da Politica de Justiça, MJ, p.81 e 82 disponível em:
http://www.citius.mj.pt/portaldnn/linkclick.aspx?fileticket=%2FcC4r5Jy2N0%3D&tabid=59
38
qualquer justifique a providencia cautelar e estar aliados para conseguir num
procedimento cautelar aquilo que não consegue num processo definitivo” (J2)
90
A este respeito, Carlos Lopes Rego, em “Um ano de Regime Processual Civil Experimental –
Relatório Intercalar”, op.cit., p.108 e 109. Outro problema apontado era a violação do princípio
do pedido, enunciado por Nuno de Lemos Jorge.
91
DL nº149/95, de 24 de junho que aprovou o Regime Jurídico do Contrato de Locação
Financeira
92
Neste sentido, VAZ, Isabel Conceição Sampaio, “Inversão do Contencioso: Um contributo
para o estudo deste regime no seio das providências cautelares”, Dissertação de Mestrado,
Universidade do Minho, 2015, p.65
39
2.2. O artigo 369º do Código de Processo Civil
93
Neste sentido, Rui Pinto instrui-nos que, desde 2005, em Itália foi instaurada uma nova
norma no artigo 669º-novies do CPC italiano que determina que o ónus de propor ação
principal, não se aplica às providências de urgência do art.º 700, (as nossas providências
inominadas do art.º 362º), bem como às providências que antecipam os efeitos da sentença de
mérito (as nossas providências antecipatórias). Ver PINTO, Rui, Notas…,op.cit, p.297.
94
Quanto ao sistema jurídico francês, este não prevê qualquer ónus da propositura para o
requerente, beneficiando do référé, instituto regulado no Código Processo Civil francês nos art.º
484º a 492º, e que consiste “em um procedimento atípico e autônomo em relação ao
julgamento definitivo de mérito, não se afeiçoando à afirmada instrumentalidade hipotética das
medidas cautelares. O juiz oferece uma regulamentação provisória a uma situação litigiosa,
deixando ao juízo definitivo do mérito a análise da matéria contraditada.” Cf., ROSSONI, Igor
Bimkowski, “O sisteme de référé francês”, disponível em: http://hdl.handle.net/10183/58717
40
Caso o requerente não tome qualquer iniciativa nesse sentido, a providencia
cautelar acabará por reger definitivamente aquela situação jurídica.95”
95
FARIA, Rita Lynce de “Apreciação da proposta de inversão do contencioso cautelar
apresentada pela Comissão de Reforma do Código de Processo Civil”, in Estudos em
Homenagem ao Prof. Doutor José Lebre de Freitas, Volume I, Coimbra, Coimbra Editora, 2013,
p.51
96
V. Proposta de Lei nº113/XII – Exposição de Motivos, p.8 e 9, pode ser consultado na url:
www.parlamento.pt
41
É o caso do Conselho Oficial de Justiça97 que mostrava preocupação
sobre as regras de distribuição do ónus da prova quando a inversão fosse
decretada, preocupação partilhada no Parecer da Ordem dos Advogados 98,
que manifestava ainda preocupação sobre esta decisão não se configurar
como um processo justo e leal nas providências cautelares decretadas sem
audiência prévia do requerido. Já o Ministério Público duvidava que este
instituto acabasse com a “duplicação de ações”, motivo que levou à adoção
desta norma, por considerar que o ónus de propor ação principal apenas se
transfere do requerente para o requerido, prevendo mesmo um “aumento da
litigância no âmbito das providências cautelares, pois será sempre bastante
sedutor para o A. tentar obter por essa via de natureza urgente uma
decisão definitiva.”99
97
Parecer do Conselho Oficial de justiça sobre o Projeto do Novo Código de Processo Civil, de
26 de Outubro de 2012, disponível em: http://app.parlamento.pt/
98
Parecer da Ordem dos Advogados sobre a Proposta de Lei nº113/XXII/2ºGOV – Aprova o
Código de Processo Civil, de 9 de Janeiro de 2012, disponível em: http://app.parlamento.pt/
99
Parecer do Ministério Público sobre a Proposta de Lei nº113/XXII/2ºGOV – Aprova o Código
de Processo Civil, de 4 de Janeiro de 2013, disponível em: http://app.parlamento.pt/
100
REGO, Carlos Lopes, Os Princípios Orientadores…, op.cit., p.8
42
principal, pois por um lado, o ónus de propositura da ação em cuja dispensa se
traduz a inversão do contencioso já foi satisfeito, assim aponta RAMOS DE
FARIA E ANA LUISA LOUREIRO101; e por outro lado, tal ato causaria danos
gravemente prejudiciais na economia processual, forçando o requerido a
instaurar nova ação principal, quando uma ação já havia sido instaurada para
conhecer o direito do autor.
101
FARIA, Paulo Ramos e LOUREIRO, Ana Luísa, Primeiras Notas…, op.cit., p.329
102
Parecer do CSMP, sobre o Projeto de Lei nº113/XXI/2ªGOV – “Aprova o Código de
Processo Civil”, de 4 de Janeiro de 2013, disponível em: http://www.cej.mj.pt/cej
103
FARIA, Paulo Ramos e LOUREIRO, Ana Luísa, Primeiras Notas…, op.cit., p.329
104
VAZ, Isabel, Inversão do Contencioso…, op.cit., p.27
43
decretada a inversão do contencioso basta a vontade do requerente (que se
traduz no pedido da mesma), mas para se produzirem os efeitos da inversão é
necessário que, para além da vontade do requerente, e do juiz a decretar, o
requerido não intente a ação principal.
44
2.2.1 Pressupostos
105
Estes pressupostos são idênticos aos do art.º 16º do DL nº108/2006, de 8 de junho– agora
revogado – que eram necessários para a convolação da tutela cautelar em tutela final.
106
SOUSA, Miguel Teixeira, As Providências Cautelares…, op.cit., p.10
107
Acerca da prova sumária em que se baseia o juiz para averiguar a probabilidade séria da
existência do direito acautelado para o decretamento da providência cautelar, v. art.º 365º, nº1,
art.º 388º, nº2, art.º 392º, nº2 e art.º 405º, nº1.
108
SOUSA, Miguel Teixeira, As Providências Cautelares…, op.cit., p.10
45
O que se exige aqui é que o grau de convicção do juiz cautelar, seja
igual ao que se exige ao juiz numa ação principal, no entanto, esta convicção
deve ser obtida ao longo do procedimento;109 ou de igual modo, o juízo que
aqui se exige é equivalente aquele que confere ao juiz, proferir um despacho
saneador com valor de sentença – art.º 595º, nº1, al. b) e nº3. – e não basta,
por isso, que o juiz considere verificada a existência de um fumus boni iuris.
Compete ao juiz concluir que o estado do processo permite a apreciação do
pedido, sem ser necessária a apresentação de mais provas. RUI PINTO alega
que o juiz deve “olhar” para o ponto de vista processual de ambas as partes e
não apenas para o ponto de vista do autor; devendo nos autos “buscar se o
autor e o réu alegaram e fizeram prova, respetivamente, dos factos integrativos
da causa de pedir ou dos factos de impugnação ou de exceção”110
109
Neste sentido, FARIA, Paulo Ramos e LOUREIRO, Ana Luísa, Primeiras Notas…, op.cit.,
p.302
110
PINTO, Rui, Notas…, op.cit., p.314
111
Cf. PINTO, Rui, Notas…, op.cit., p.313
112
FARIA, Rita Lynce, A Tutela Cautelar Antecipatória…, op. cit., p.238
46
alertam que esta aquisição judicial de uma convicção segura acerca da
existência do direito acautelado, deverá ser puramente acidental, sob pena de
se adulterar o procedimento cautelar e abrindo caminho para fraudes no
domínio cautelar com via a obter decisões definitivas113.
113
FARIA, PAULO RAMOS/LOUREIRO, Ana Luísa, Primeiras Notas…op. cit., p.296 e 307 e
308 apud, FARIA, Rita Lynce, A Tutela Cautelar Antecipatória…op.cit., p.238
114
PINTO, Rui, Notas…, op.cit., p.315
115
Neste sentido, GONÇALVES, Marco, Providências Cautelares, op.cit., p.161, e ainda na
jurisprudência, no ac. RP 19-5-2014/Proc. 2727/13.8TBPVZ.P1 (MANUEL DOMINGOS
FERNANDES),declarou que “a inversão do contencioso prevista […] só é admissível […]
47
providência cautelar do art.º 7º do Regime de Locação Financeira, pois embora
a sua natureza seja antecipatória, não é aplicável a inversão do contencioso,
uma vez que já se encontra previsto a possibilidade de antecipação do juízo
sobre a causa principal.116
48
2.3. Defesa do requerido
49
fazer em conjunto com a oposição à providência decretada, sendo a matéria da
inversão do contencioso apreciada conjuntamente com a da referida
oposição118.
O art.º 372º, nº1 dispõe que, quando tenha sido dispensada a audição
prévia do requerido, a oposição deverá ser feita no prazo de 10 dias (desde a
data de notificação da decisão – art.º 293º, nº2, art.º 365º, nº3 e art.º 366º,
nº6).119 Nos termos do nº3 do art.º 373º após apresentada a oposição, o Juiz
poderá decidir pela manutenção ou revogação da decisão que inverteu o
contencioso.
118
Cf. PAIS DO AMARAL, Direito Processual Civil, op.cit., p.45
119
Este prazo, está ainda sujeito a dilação, que não poderá ultrapassar os 10 dias, conforme a
norma do nº6 do art.º 366º.
120
Acerca destas posições, apud, FARIA, Rita Lynce de, A Tutela Cautelar Antecipatória,
op.cit., p.243
121
V. CABRAL, Ana Margarida, PINHEIRO, Carlos André, ROBALO, Inês e NUNES, José
Henriques, A inversão do Contencioso, Centro de Estudos Judiciários, p.14, disponível em:
www.cej.mj.pt
122
Parecer da Ordem dos Advogados sobre a Proposta de Lei nº113/XII/2ª (GOV), disponível
em: http://app.parlamento.pt/
50
51
2.3.1 Ónus da propositura da ação
123
FARIA, Rita Lynce, A Tutela Cautelar Antecipatória…, op.cit., p.244
52
estava incluído, a primeira parte do art.º 371º, nº1, que diz “Sem prejuízo das
regras sobre a distribuição do ónus da prova (…)”, que despertou dúvidas
sobre quem teria de fazer prova dos factos alegados na ação principal.
124
Cf. Parecer do CSM, op.cit., disponível em: http://app.parlamento.pt/
53
2.3.2 Ação principal e os seus efeitos
125
Cf. V. CABRAL, Ana Margarida, PINHEIRO, Carlos André, ROBALO, Inês e NUNES, José
Henriques, A inversão do Contencioso, op.cit, p.14
126
Vaz, Isabel, A inversão do Contencioso..., op.cit., p.39
127
Ainda sobre esta questão, Miguel Teixeira Sousa, dá como exemplo a providência cautelar
de alimentos provisórios, na qual ocorre a exceção de litispendência quando, estando pendente
uma providencia cautelar de alimentos provisórios na qual foi requerida a inversão do
contencioso, se propõe uma ação de alimentos definitivos. Aqui, a exceção deverá ser alegada
na ação principal, uma vez que foi nesta que o demandado foi citado em segundo lugar, como
disposto no art.º 581º, nº1 e nº2., ver, SOUSA, Miguel Teixeira. A inversão do
contencioso…,op.cit., p.12 e 13
54
mesma forma que, deferida a inversão por decisão transitada, não existe
qualquer tipo de caso julgado - art.º 581º, nº1.
128
Cf. PINTO, Rui, Notas…, op.cit., p.323
55
2.3.4 Interrupção do prazo de caducidade
129
PAIS AMARAL, Direito Processual Civil, op.cit., p.47
130
GONÇALVES, Marco, Providências Cautelares, op.cit., p.162
56
Por fim, é importante distinguir a figura do impedimento com a da
interrupção, dado que a primeira diz respeito à caducidade, à extinção do
direito, e que a segunda se refere ao prazo. O legislador teve o infortúnio de
formular a norma com a primeira, quando a maneira mais correta de abordar a
norma seria ao referir-se à interrupção do prazo de caducidade, como é dito no
art.º 328 do CC; contudo, ainda foi a tempo de se redimir na parte final do nº3
do art.º 369º, como se pode ler, “(…) reiniciando-se a contagem do prazo (…)”.
Na obra, Primeiras Notas ao NCPC, de Ramos Faria e Ana Luísa Loureiro,
pode ler-se que este preceito “abre portas a estratégias processuais
indesejáveis”131.
131
FARIA, Ramos e LOUREIRO, Ana Luísa, Primeiras Notas…, op.cit., p.331
57
2.4 Recursos e os seus efeitos
132
O Acórdão referido pode ser consultado in www.dgsi.pt
133
Cf. PAIS AMARAL, Direito Processual Civil, op.cit., p.54; e da mesma opinião, v. FARIA,
Ramos e LOUREIRO, Ana Luísa, Primeiras Notas…, op.cit., p.334
134
O art.º 607, nº5 determina que o juiz é livre de apreciar as provas segundo a sua prudente
convicção acerca de cada facto.
135
VAZ, Isabel, A inversão do contencioso…, op.cit., p.40
58
ainda é reforçada pelos termos do art.º 630º, nº1 que determina que as
decisões tomadas no âmbito dos poderes discricionários não admitem recurso.
Esta ideia é reforçada pelo art.º 644º, nº3 determina ainda que, por se
tratar de uma decisão inserida num procedimento cautelar, a mesma só pode
ser impugnada com o recurso da decisão que ponha termo ao procedimento.
59
pretendida, não pode nunca a inversão do contencioso ser decretada em sede
de recurso137, tornando-se sempre definitiva a decisão que indefira a inversão
do contencioso.
No nº2 do art.º 372º é dito que o requerido pode impugnar, por qualquer
meio referido no número anterior, a decisão que tenha invertido o contencioso.
Ao ser decretada a providência cautelar sem a prévia audição do requerido,
este pode optar por uma, e apenas uma, das referidas opções: a do recurso e a
da oposição.
137
SOUSA, Miguel Teixeira, As providências cautelares…, op.cit., p.13
60
O que se verifica, e em concordância com a posição de RUI PINTO 138, o
requerido não tem ao seu dispor o mesmo sistema de recurso de uma
sentença de procedência que teria numa ação principal, mas sim sucessivas
etapas de impugnação, sendo elas: a dedução de oposição ao requerimento de
inversão do contencioso, recurso da própria decisão de inversão do
contencioso acessório do recurso de fundo da decisão sobre a providencia
cautelar – art.370º, nº2 e art.º 644º, nº3. Apenas com a não admissibilidade do
recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, como regra do art.º 370º, nº2,
parece haver limite para estas sucessíveis etapas de recurso.
138
PINTO, Rui, Notas…, op.cit., p.320
61
Capítulo 3 - Aplicação do instituto da inversão do contencioso nos
procedimentos cautelares especificados
62
suspensão das deliberações sociais, o requerido não precisa de esperar pela
decisão, podendo avançar logo para a propositura da ação principal.
139
Cf. TORRES, Marlene, As Providências cautelares – Novo Paradigma: a Problemática do
Regime de Inversão do Contencioso, Dissertação de Mestrado em Direito pela FDUC, Coimbra,
2015, op.cit., p.43
63
juntamente com os art.º 384º a 387º-, logrando chegar à conclusão de que a
providência cautelar requerida é adequada para realizar a composição
definitiva do litígio, autorizando a inversão do contencioso, desde que estejam
reunidos os seus requisitos legais do art.º 369º.
64
pedir esta providência cautelar é a demolição da obra futuramente, o que leva a
que a mesma esteja é dependente da ação principal, uma vez que a
providência cautelar de embargo de obra nova apenas suspende o progresso
da obra e não a demolição desta.
143
Neste sentido, XAVIER, Rita Lobo, Suspensão de deliberações sociais e inversão do
contencioso, in Direito das Sociedades em Revista, p.84, apud, TORRES, Marlene,
Providências Cautelares…, ob.cit.,p.42
65
Capítulo 4 - Análise jurisprudencial
66
requerida for de natureza antecipatória, como disposto pelo art.º 376º, nº4, não
sendo aplicável às providências especificadas do Arresto, Arrolamento e ao
Arbitramento de Reparação Provisória.
67
tutela cautelar cumpre uma função totalmente distinta daquela que será a tutela
definitiva”.144
144
Cf. O acórdão em análise.
68
4.2 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto com o processo nº
25601/16.1T8PRT.P1, datado de 29 de junho de 2017
69
providência subsequente, que se destinará a tomar definitiva a relação jurídica,
é esta a definição de Alberto Reais a que o TRP se socorre para justificar a sua
decisão. Dito isto, o juiz reitera que os pedidos formulados só poderiam ser
apreciados e decididos em processo declarativo comum e não em
procedimento cautelar, pelo que se conclui que estamos perante a nulidade do
erro na forma de processo.
Apesar do que é dito no art.º 369º, o juiz pode sim decretar a inversão do
contencioso, desde que sejam cumpridos os requisitos cumulativos legalmente
previstos. Contudo, é da competência do mesmo, corrigir o erro da forma do
processo, optando pela providência cautelar que melhor se adeque à situação.
No entanto, o que se verificou neste recurso, é que os pedidos formulados são
característicos de uma ação declarativa comum, não sendo abrangidos pela
tutela cautelar.
70
cumprimento do principio da adequação formal previsto no art.º 547º do CPC,
bem como um implícito respeito pelo principio da igualdade e do contraditório.
145
TORRES, Marlene, Providências Cautelares…, op.cit., p.52
146
Neste sentido, REGO, Carlos Lopes do, Os princípios…, op.cit., p.109
147
FARIA, Rita Lynce de, Apreciação da Proposta…, op.cit., p.57
71
O que se conclui é que a providencia cautelar apenas se converterá em
decisão definitiva e resolverá o litígio, mediante o pedido da inversão do
contencioso por parte do requerente, e mediante a inação por parte do
requerido, em não intentar ação principal.
72
apanhado de surpresa ao tomar conhecimento do processo, e no qual a
decisão já está tomada, vendo a sua defesa diminuída pelo desrespeito notório
pelo principio do contraditório.
73
dessa decisão, mas como das razões que a justificam, os meios de defesa e
dos prazos de que dispõe para se opor.
O art.º 879º, nº5, é outro exemplo, no qual “pode ser proferida uma
decisão provisória, irrecorrível e sujeita a posterior alteração ou confirmação no
próprio processo, quando o exame das provas oferecidas pelo requerente
permitir a possibilidade de lesão eminente e irreversível da personalidade física
ou moral e se, em alternativa: a) o tribunal não puder formar uma convicção
segura sobre a existência, extensão, ou intensidade da ameaça ou da
consumação da ofensa; b) razões justificativas de especial urgência impuserem
o decretamento da providência sem prévia audição da parte contrária”, isto é,
pode ser decretada uma medida provisória sem audição das partes contrárias
no âmbito da tutela definitiva, podendo o requerente apenas opor-se depois de
decretada a decisão.
149
Ver Ac. TRE, com o processo nº 833/1L.STBLLE.E1, de 12 de fevereiro de 2015
150
Cf. Art.º 21.º do CPC
74
A inovação surge na inversão e não na ausência de contraditório,
denotando-se uma distribuição no ónus do tempo, com a intenção de se
conseguir uma maior efetividade e eficácia dos efeitos jurídicos pretendidos.
Esta técnica foi implementada para alcançar uma maior celeridade na justiça
portuguesa, glorificando-se o princípio da economia processual. Temos como
exemplos, no âmbito do direito penal administrativo, na aplicação das coimas,
ou seja, quando somos notificados das coimas, a decisão já está tomada,
sendo que o debate contraditório só pode ser exercido após a notificação
dessa notificação, se assim o pretendermos.
75
cautelares desde que existisse a possibilidade de composição definitiva da
tutela cautelar, uma vez que o juiz pudesse formar convicção segura acerca da
existência do direito a acautelar na decisão principal.
Espero que, numa nova reforma da tutela cautelar este regime possa vir
a colmatar as falhas que já se teria proposto a resolver, e que se aproxime
mais do regime praticado pelo antigo art.º 16º, no qual não é necessária a
propositura de uma ação principal e que abranja todas as providências, sejam
elas de natureza antecipatória ou provisória.
76
Considerações Finais
77
dogma da instrumentalidade, o regime da inversão do contencioso previsto no
art.º 369º, é uma forma muito singela, de tutelar a urgência e a evidência dos
direitos que se pretendem acautelar.
78
Bibliografia
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Almedina, Coimbra, 2015
79
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RODRIGUES, Fernando Pereira, “O Novo Processo Civil – Os princípios
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TORRES, Marlene Sofia Costa, Providências Cautelares – Novo
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https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/28626/1/Providencias%20c
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“Um ano de Regime Processual Civil Experimental – Relatório
Intercalar”, elaborado pela Direcção-Geral da Politica de Justiça,
Ministério da Justiça, acedido 2 de fevereiro de 2017, disponível em:
http://www.citius.mj.pt/portaldnn/
Proposta de Lei nº113/XII – Exposição de Motivos, disponível em:
https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar
Pareceres:
80
Os seguintes pareceres estão disponíveis em:
http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/
Jurisprudência
Legislação
81
DL nº149/95, de 24 de junho que aprovou o Regime Jurídico do Contrato
de Locação Financeira
DL n.º 108/2006, de 08 de junho que aprovou o Regime Processual Civil
Experimental
82