A Educação Sexual Da Mulher Rural Na Região Sul de Moçambique e o Direito À Saúde
A Educação Sexual Da Mulher Rural Na Região Sul de Moçambique e o Direito À Saúde
A Educação Sexual Da Mulher Rural Na Região Sul de Moçambique e o Direito À Saúde
Bacharel em Enfermagem pelo Centro Universitário de Salvador, Bahia (2022), Técnica em Enfermagem
pelo Centro Educacional e Técnico Profissional de Araraquara, São Paulo. E-mail:
[email protected]
Florência Paulo Nhavenge-Timbane, A educação sexual da mulher rural na região Sul de ...
Mots clés: Éducation sexuelle; Femmes; Droit à la santé; Rural
Introdução
Moçambique é um país africano, localizado geograficamente no Sul do Continente
composto por 11 províncias: Niassa (capital: Lichinga); Cabo Delgado (capital: Pemba);
Nampula (capital: Nampula); Tete (capital: Tete); Zambézia (capital: Quelimane); Manica
(capital: Chimoio); Sofala (capital: Beira); Gaza (capital: Xai-Xai); Inhambane (capital:
Inhambane); Cidade de Maputo (capital: Maputo); Maputo (capital: Matola). Quanto à
distribuição percentual da população do país, por província, o recenseamento realizado
pelo Instituto Nacional de Estatística (2017, p.6), destacou que “as províncias de Nampula
e Zambézia, como as mais populosas, com 20,6% e 18,5%, respectivamente, perfazendo
39,1% da população do País”.
É um país composto por povos do grupo bantu falantes de mais de vinte línguas
espalhadas um pouco pelo país. A língua oficial é o português de acordo com a
Constituição da República de Moçambique (2004), no parágrafo nº1, do artigo 5º que diz
“na República de Moçambique, a língua portuguesa é a língua oficial”. E no parágrafo nº
2, do mesmo artigo, acrescenta-se que: “o Estado valoriza as línguas nacionais e
promove o seu desenvolvimento e utilização crescente como línguas veiculares e na
educação dos cidadãos” numa referência às numerosas línguas bantu faladas no país:
xirhonga, xichangana, cicopi, citswa, gitonga, ciwute, cindau, cimanhyka, cisena,
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Não existe uma cultura superior à outra e as culturas são dinâmicas. Elas evoluem
o tempo todo, à medida que as pessoas se movimentam no mundo. Por exemplo, as
desigualdades de gênero podem ser criticadas por certas culturas, mas é necessário
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tolerar e mudar o estado da situação porque o mundo avança e não se pode permitir que
a mulher seja humilhada, mutilada (nos ritos de iniciação feminina) e excluída dos
principais círculos da sociedade. Como mulher, eu defendo a igualdade, o
companheirismo e a parceria com o homem por forma a que a família e a sociedade
sejam mais seguras. A cultura do povo pode se adaptar à realidade, aos momentos e o
direito à liberdade à saúde sexual. Daí que se levanta a seguinte pergunta de partida: De
que forma a mulher recebe a educação sexual no contexto das tradições? Do problema
se avançam as seguintes hipóteses: i) a mulher ainda está ‘amarrada’ à cultura e à
religião que perpetua a superioridade do homem; ii) a mulher rural, por estar longe da
televisão, das tecnologias não consegue despertar para as práticas inovadoras da
liberdade sexual; iii) a mulher moçambicana ainda é educada na tradição patrilinearista e
não consegue singrar a liberdade à saúde sexual desejada.
A pesquisa visa conhecer a complexidade da cultura e da saúde da mulher rural na
região Sul de Moçambique. De forma específica, a pesquisa visa discutir aspectos
socioculturais da mulher; explicar as interferências da cultura da saúde da mulher; debater
os direitos à saúde da mulher moçambicana em especial na região sul de Moçambique. O
respeito pela igualdade de gênero reduziria em grande medida a violência contra a
mulher. Está claro que “a violência doméstica contra as mulheres é um problema de
saúde pública que afeta todas as cidades moçambicanas” (MEQUE; MALOA, 2021, p.98).
O artigo se divide em três partes. A primeira aborda o contexto sociocultural da
mulher em contexto da região sul de Moçambique. Em seguida, apresentam-se questões
legais sobre a saúde pública, focando para documentos essenciais que apontam os
direitos à saúde da mulher. A terceira seção aponta caminhos para uma educação em
saúde da mulher em Moçambique mais contundente que coloca a mulher na linha da
frente na luta contra atitudes que prejudicam o bem estar social. Ainda nesta seção se
apontam questões bioéticas com relação à saúde sexual da mulher. O texto termina
apresentando as considerações finais e referências.
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comportamentos violentos dos homens são incentivados pela cultura machista que são
aprendidas desde criança.
Para além da cultura, a religião tem influenciado na tomada de algumas atitudes
que provocam a desigualdade de gênero. De acordo com o Recenseamento Geral da
População realizada pelo Instituto Nacional de Estatística em 2017, a distribuição
percentual da população, por religião ou crença está da seguinte maneira: católica 27,3%,
islâmica 19,1%, evangélica/pentecostal 16,7%, sião/zione 16,3%, sem religião 13,5%,
anglicana 1,7%, outras 4,3% e desconhecido 1,2% (INE, 2022, p.31). A maioria da
população moçambicana professa a religião católica (27,3%), seguida da religião islâmica
(19,1%). No entanto, é notória a percentagem de pessoas sem religião (13,5%). Esses
dados nos mostram como a religião (doutrina religiosa) influencia (direta ou indiretamente)
em grande medida para a vida da população, assim como em seus comportamentos.
Paixão (2012) diz que por influência da religião, homens se aproveitam da
Bíblia/Alcorão para obrigar que a mulher seja submissa ao homem transformando-a num
ser inferior, incapaz de deliberar, incapaz de ter os seus próprios destinos. Paixão (2012,
p.55) critica afirmando que “a mulher não foi feita de uma parte de seus pés, para estar
sob ele, nem de sua cabeça, para estar acima dele”. O livro de Gênese (2: 18) diz: “disse
mais o Senhor Deus: não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora que
lhe seja idônea”. É por meio desta frase que o homem pensa que a mulher não é
essencial, ela é auxiliadora e menos importante. A soma da cultura machista e da doutrina
religiosa contribuem de certa forma para as desigualdades entre o homem e a mulher.
Vejamos o quadro 1 que mostra o rácio de vítimas de violência doméstica contra as
mulheres em cada 10 mil habitantes, Moçambique:
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Quadro 1: Rácio de vítimas de violência doméstica contra as mulheres em cada 10 mil habitantes,
Moçambique (2015-2016).
Fonte: Ministério da Saúde et al. (2017, p.26, apud MEQUE, MALOA, 2021, p.99)
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para 38,8%, respectivamente. O mesmo cenário foi registrado em nível dos governadores
e administradores, cuja percentagem aumentou, respectivamente, de 18.1% para 36.4% e
de 18.7% para 32.2%. Dos 250 deputados na Assembleia da República, 98 são mulheres
ocupando assim, a nível mundial em 14° lugar, com 39,2%. (ANDRADE, TIMBANE,
2022). Por exemplo, a pesquisa de Andrade e Timbane (2022) concluiu que Moçambique
continua a ser um país chauvinista uma vez que as práticas culturais ainda não mudaram.
O machismo é um fenômeno social que consiste no comportamento expresso por
opiniões e atitudes, de um indivíduo que recusa a igualdade de direitos e deveres entre os
gêneros, favorecendo e valorizando o sexo masculino em detrimento do feminino.
Outro artigo da Constituição que merece a nossa atenção é o Art. 4º, que diz que a
pessoa humana é inviolável. “todo o ser humano tem direito ao respeito da sua vida e à
integridade física e moral da sua pessoa. Ninguém pode ser arbitrariamente privado
desse direito.” As mulheres são as que mais precisam dessa proteção se observarmos a
partir da cultura machista construída na sociedade moçambicana. Estudos de Meque e
Maloa (2021, p.103) sustentam que “a Lei contra a violência doméstica em Moçambique,
foi aprovada em 2009, pela Assembleia da República de Moçambique. No entanto, em
Moçambique pouco se investiga sobre o impacto da Lei contra a violência doméstica (Lei
nº 29/2009).” A saúde pública é crucial e relevante e que não deveria ter em conta o
urbano e o rural.
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também poderiam ser espaços de aprendizagem sobre a saúde sexual da mulher, mas
também os conteúdos são censurados. As políticas conservadoras bloqueiam qualquer
tentativa. A religião, por sua vez coloca a mulher “submissa” e incompetente com relação
aos desejos e habilidades. Na área rural fica mais difícil ainda porque as mídias e as
tecnologias ainda não chegaram ou não há condições técnicas.
Em Moçambique, os crimes contra liberdade sexual por grupo de idade
aumentaram de 1672 em 2020 para 2074 em 2021, constituindo assim um aumento de
24,0%. Esse é um dado preocupante e precisa de atenção da sociedade como todo. O
quadro 2 mostra-nos casos de vítimas de crimes contra liberdade sexual por grupo de
idade, segundo tipo. Moçambique, 2020-2021. Nele se pode observar casos de vitimas
divididas por idades:
Quadro 2: Casos de vítimas de crimes contra liberdade sexual por grupo de idade, segundo tipo.
Moçambique, 2020 – 2021
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com 683 e 963 casos, 213 casos no grupo de 18-59 anos e 41 no grupo de 60 ou mais
anos e mais.
É preciso desenvolver políticas públicas para uma educação que se funda na
sexualidade. Em muitos momentos, a mulher é privada da sua sexualidade e em até
excluída da tomada de posição sobre a sua sexualidade. Sociedades machistas, como as
do sul de Moçambique, está claro que a mulher não ocupa lugar privilegiada. A violação
sexual de menores é frequente e é embasada na cultura e nas tradições. O relatório da
pesquisa de Osório e Mussa (2011, p.94) mostra que o “perfil do violador, a maioria tem
uma idade que varia entre os 16 e os 30 anos (60%). Normalmente, o prevaricador é
alguém próximo da vítima, com maior predominância o vizinho, com 34% dos casos,
seguido de um familiar (tio, primo, irmão), com cerca de 11%, e do pai, com cerca de 7%.
Evidencia-se, cumulativamente, que, em 52% dos casos, o violador é alguém próximo da
vítima e em 48% era desconhecido.” A raiz dos problemas é a falta de políticas públicas
que protejam a mulher e a ausência da cultura de denuncia contra violadores de crianças,
adolescentes e mulheres.
Ora, a violação sexual, sendo ela própria expressão de um poder que
contém em si a submissão do outro, atinge, pela sua visibilidade, em
primeiro lugar, a família, que não “soube” preservar a norma e questiona,
em segundo lugar, os elementos de coesão comunitária. Quando famílias
e comunidades procuram manter o silêncio, estão a proteger-se da
desordem que a violação sexual, principalmente de meninas, comporta: as
agressões que têm como objecto o corpo sexuado, significam mais do que
outros crimes, como, por exemplo, o homicídio, um abalo do modelo
patriarcal, tal como ele é percebido e praticado. Ou seja, se a violência
sexual a que as meninas (e também os meninos) são, ritual e
rotineiramente, sujeitas, é componente de uma socialização que
desenvolve mecanismos de controlo conformes à dominação, quando, na
dimensão de violação, ocorre no espaço público e também, e
principalmente, no espaço privado, verificam-se então duas situações: ou
se silencia ou se produz a exclusão da família que a publicitou. (OSÓRIO,
MUSSA, 2011, p.108).
A cultura e a religião fomentam essa desigualdade social e que faz com que as
mulheres temam fazer queixas na esquadra/delegacia de policia. Por exemplo, o estudo
de Arthur e Mejia (2006, p.8-9) mostram que “as mulheres que denunciam devem também
enfrentar uma grande hostilidade por parte dos familiares do seu marido ou companheiro,
que veem na sua atitude um atentado à ordem familiar e à autoridade e dignidade do seu
parente. Esta hostilidade pode traduzir-se em ameaças e agressões físicas, em
isolamento ou no impedimento de acesso aos recursos”. A religião por outro lado fortifica
as desigualdades sociais. A falta de conhecimento dos seus direitos à saúde sexual levam
muitas mulheres a sofrer violações de todo tipo.
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Quem nunca ouviu o ditado popular “em briga de marido e mulher não se mete a
colher”. Esse tabu afasta qualquer ajuda, qualquer apoio permitindo que o infrator faça o
que quiser com a mulher. Se ninguém mete a colher, significa que a mulher está entregue
às atrocidades violentas. Devemos ficar claros que o Estado tem mecanismos legais de
“meter a colher” para preservar a vida, para proteger os vulnerários. As leis estão aí e
precisam de ser respeitadas. O sexo ainda é tabu, daí que
A sexualidade feminina é objecto de um maior controlo (família, pai,
irmãos, noivo/marido, etc.) que a masculina. Os resultados da pesquisa
mostram como a socialização de cada uma/um determina o pressuposto
de que os homens devem controlar as mulheres e dominar nas relações
interpessoais. Na sequência disto, é também e somente ao homem que
cabe decidir como e com quem deve ter relações sexuais, retirando deste
modo a possibilidade de escolha das mulheres. É assim que, levada esta
questão para debate, verificámos que havia uma diversidade de opiniões
entre as raparigas da cidade de Maputo, que consideram que a mulher, do
mesmo modo que o homem, tem o direito a ter relações sexuais com
quem, onde e quando quiser, já que a negação desses direitos faz parte do
passado; enquanto, por outro lado, um outro conjunto de raparigas
considera que ela não tem esse direito. Nas outras unidades espaciais de
estudo, contudo, para as raparigas dentro e fora da escola, é aceite e
reafirmado que a rapariga não tem esse direito, porque: “não deve fazer o
que o homem faz, pois não tem os mesmos direitos”; “mulher é mulher e
assim foi educada e a sua natureza feminina não lhe permite tal
comportamento”; “deve obediência ao homem”; “não é correcto”; “não fica
bem”; “corre o risco de ser falada”; “só uma mulher leviana pode ter esse
tipo de comportamento”; “as mulheres não têm esse direito”; “são tão
diferentes do homem... até menstruam!” Ou, “este comportamento é
comum ao homem, a mulher é mais sensível e sentimental (...) fica mal
vista”, “a rapariga tem o direito a ter relações sexuais quando quiser, mas
não com quem quiser porque se tiver namorado só pode fazer amor com
ele”; e “não fica bem!” (CRUZ e SILVA, ANDRADE, OSORIO, ARTHUR,
2007, p.116).
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Como se pode observar nos mapas, a província de Maputo possui mais mulheres
com múltiplos parceiros (6%). Mas olhando para o mapa à direita, referente aos homens
fica claro que o machismo está presente. Observa-se que a província de Maputo-cidade
(38%), Maputo província (26%), Gaza (18%) e Inhambane (29%) possuem percentagens
elevadas de homens com múltiplos parceiros. Este fenômeno está atrelado a dois fatores:
religião e cultura. Com estes resultados apresentados nos mapas, é possível estabelecer
políticas de proteção à saúde sexual da mulher, fazendo com que a mulher rural não sofra
consequências dessa pressão cultura e religiosa. A região centro de Moçambique é a que
menos tem homens com múltiplos parceiros.
Em contrapartida, há vários crimes cometidos contra liberdade sexual da mulher.
Significa que a mulher não está protegida na prática porque as leis são elaboradas,
discutidas e aprovadas, mas a execução prática ainda é exígua. Mais uma vez, o quadro
3 mostra a região Sul de Moçambique (destacadas no quadro) como a que é mais
problemática. As crianças e os adolescentes (o a 17 anos) são os que mais sofrem esses
crimes. Como se pode resolver isso? Discutindo sobre a sexualidade e gênero desde o
ensino primário, secundário e médio. Conhecer os direitos é fundamental para que as
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jovens e adolescentes saibam dizer “NÃO”. E é importante que os homens saibam que
“NÃO” é “NÃO” mesmo. Esta cultura deve ser incentivada em ambos os sexos. O Art. 7º
da Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959) defende que a criança terá direito
a receber educação, que será gratuita e compulsória pelo menos no grau primário. Ser-
lhe-á propiciada uma educação capaz de promover a sua cultura geral e capacitá-la a, em
condições de iguais oportunidades, desenvolver as suas aptidões, sua capacidade de
emitir juízo e seu senso de responsabilidade moral e social, e a tornar-se um membro útil
da sociedade.
Quadro 3: Casos de crimes contra liberdade sexual por grupo de idade e sexo, segundo
Província. Moçambique, 2021
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A violação da mulher atingiu 48,6% em 2020 e 39,2% em 2021. Esse dado reforça
a ideia deste tipo de crime que é recorrente e, sobretudo em mulheres. As crianças
meninas com menos de 12 anos são as que mais são violadas (25,4%) em 2020 tendo
reduzido para 4,8% em 2021. Este dado (4,8%) precisa de ser mais estudado e analisado
porque essa redução é estranha e não se justifica. Precisa de argumentos profundos para
explicar tal redução brusca. Os dados deixam entender que os casos de estupro de
menores deveriam ser juntados com “outros atos sexuais com menores”. As meninas
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Considerações finais
Chegados ao fim, resta-nos apontar que esta proposta de artigo é de cunho
documental e bibliográfico. Questionou-se como a mulher recebe a educação sexual no
contexto das tradições. Percebe-se que a mulher ainda está ‘amarrada’ à cultura e à
religião que perpetuam a superioridade do homem. Desta forma a mulher rural, por estar
longe da televisão, das tecnologias não consegue despertar para as práticas inovadoras
da liberdade sexual. Seria importante que o Estado moçambicano, em especial o
Ministério da saúde e de educação pudessem trabalhar em parceria no estabelecimento
de políticas públicas que põem diretamente a mulher rural e a criança que em muitos
momentos são vulneráveis.
Os dados aqui apresentados sustentam a ideia de que as violações sexuais que
ocorrem especialmente nas zonas rurais são motivados pela cultura e pela religião que
ainda colocam a mulher como “auxiliar” e não essencial. A mulher moçambicana ainda é
educada na tradição patrilinearista e não consegue singrar a liberdade à saúde sexual
desejada. Nesta pesquisa conseguiu-se explicar as interferências da cultura da saúde da
mulher; debateu-se os direitos à saúde da mulher moçambicana em especial na região sul
de Moçambique.
A busca pela igualdade de gênero permite compreender que a mulher rural precisa
de apoio da sociedade e do Estado moçambicano na busca da sua afirmação e cidadania.
A educação sexual deve iniciar na família, primeiro combatendo o tabu sobre o sexo para
depois mostrar que a mulher deve ser independente e dona do seu corpo. A sexualidade
da mulher deve ser respeitada e inserida na cultura moderna. De acordo com Maúngue “a
situação e a condição da mulher em Moçambique estão relacionadas com a sua
escolaridade, seu vínculo de trabalho e sua presença nos fóruns de poder e de tomada de
decisão, comparativamente ao homem. Esses aspectos são decorrentes de como as
mulheres e os homens são socializados e como se manifestam as relações entre ambos,
bem como qual é o cenário do país rumo à igualdade de género.” (MAÚNGUE, 2021, p.3).
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Florência Paulo Nhavenge-Timbane, A educação sexual da mulher rural na região Sul de ...
Para citar este texto (APA): Nhavenge-Timbane, Florência Paulo (2022). A educação
sexual da mulher rural na região Sul de Moçambique e o direito à saúde. Njinga & Sepé:
Revista Internacional de Culturas, Línguas Africanas e Brasileiras. São Francisco do
Conde (BA), 2 (Especial): 349-366.
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